28.05.2013 Views

ANDREI JAN HOFFMANN ULLER A MÚSICA ... - Trentina do Brasil

ANDREI JAN HOFFMANN ULLER A MÚSICA ... - Trentina do Brasil

ANDREI JAN HOFFMANN ULLER A MÚSICA ... - Trentina do Brasil

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

<strong>ANDREI</strong> <strong>JAN</strong> <strong>HOFFMANN</strong> <strong>ULLER</strong><br />

A M⁄SICA ÕTALO-TRENTINA NOS MUNICÕPIOS DE NOVA TRENTO,<br />

RIO DOS CEDROS E RODEIO: ALGUMAS CONSIDERA«’ES SOBRE<br />

A HIST”RIA E A ATUALIDADE DESTA MANIFESTA« O.<br />

FLORIAN”POLIS - SC<br />

2008


UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA<br />

CENTRO DE ARTES<br />

DEPARTAMENTO DE M⁄SICA<br />

<strong>ANDREI</strong> <strong>JAN</strong> <strong>HOFFMANN</strong> <strong>ULLER</strong><br />

A M⁄SICA ÕTALO-TRENTINA NOS MUNICÕPIOS DE NOVA TRENTO,<br />

RIO DOS CEDROS E RODEIO: ALGUMAS CONSIDERA«’ES SOBRE<br />

A HIST”RIA E A ATUALIDADE DESTA MANIFESTA« O.<br />

Trabalho de Conclus„o de Curso apresenta<strong>do</strong> ao<br />

Centro de Artes da Universidade <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Santa<br />

Catarina, como requisito para obtenÁ„o <strong>do</strong> tÌtulo de<br />

Licenciatura em M˙sica.<br />

Orienta<strong>do</strong>ra: Tereza Mara Franzoni<br />

FLORIAN”POLIS-SC<br />

2008


<strong>ANDREI</strong> <strong>JAN</strong> <strong>HOFFMANN</strong> <strong>ULLER</strong><br />

A M⁄SICA ÕTALO-TRENTINA NOS MUNICÕPIOS DE NOVA TRENTO,<br />

RIO DOS CEDROS E RODEIO: ALGUMAS CONSIDERA«’ES SOBRE<br />

A HIST”RIA E A ATUALIDADE DESTA MANIFESTA« O.<br />

Trabalho de Conclus„o de Curso aprova<strong>do</strong> como requisito parcial para obtenÁ„o <strong>do</strong> grau de<br />

licencia<strong>do</strong>, no curso de GraduaÁ„o em M˙sica <strong>do</strong> Centro de Artes da Universidade <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong><br />

de Santa Catarina.<br />

Banca Examina<strong>do</strong>ra<br />

Orienta<strong>do</strong>ra: ___________________________________________________<br />

Prof Ms. Tereza Mara Franzoni<br />

Universidade <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Santa Catarina<br />

Membro: ___________________________________________________<br />

Prof. Dr. Marcos Tadeu Holler<br />

Universidade <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Santa Catarina<br />

Membro: ___________________________________________________<br />

Prof. Dr. Pedro Martins<br />

Universidade <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Santa Catarina<br />

FlorianÛpolis, 08/07/2008


Para Dorival Uller e Matilde Hoffmann Uller,<br />

‡ minha noiva Jusciele Nicolladelli e a to<strong>do</strong>s os<br />

meus antepassa<strong>do</strong>s.


AGRADECIMENTOS<br />

A minha FamÌlia, pelo apoio de sempre e tambÈm por ter ofereci<strong>do</strong> a oportunidade em<br />

estudar o que gosto (M˙sica).<br />

A Orienta<strong>do</strong>ra Tereza Mara Franzoni, uma das principais respons·veis na<br />

concretizaÁ„o deste trabalho concretiza<strong>do</strong>.<br />

A professora da Universidade de Trento Maria Rossana Dalmonte, pelo contato e<br />

tambÈm o livro cedi<strong>do</strong>.<br />

Ao Sr. Afonso Prates Silva e Sr. Maria Salete Santos Silva, respons·veis pelas<br />

traduÁıes da lÌngua italiana para a lÌngua portuguesa.<br />

A Luiz Giovanella Neto e Joana Giovanella, pela atenÁ„o, recepÁ„o, hospitalidade e<br />

ricas informaÁıes trocadas.<br />

A Jonas Ca<strong>do</strong>rin, por toda atenÁ„o e informaÁıes cedidas <strong>do</strong> grupo Pargoleti.<br />

A IsaÌas Girardi pela atenÁ„o e pelas informaÁıes <strong>do</strong> grupo Vecchio Scarpone.<br />

Ao professor SÈrgio Paulo Ribeiro de Freitas, pelas disciplinas ministradas de<br />

Harmonia, An·lise Musical, HistÛria da M˙sica, M˙sica e MÌdia e todas as aulas que<br />

transmitiu seu conhecimento.<br />

A to<strong>do</strong>s os professores <strong>do</strong> departamento de m˙sica que me ajudaram diretamente ou<br />

indiretamente no meu desenvolvimento musical.<br />

A Rafael Tomazoni e famÌlia, pelos <strong>do</strong>cumentos cedi<strong>do</strong>s.<br />

A Daniel Priori, pelo emprÈstimo da tese de <strong>do</strong>utora<strong>do</strong>.


Ao presidente <strong>do</strong> CÌrculo Trentino de Nova Trento, J˙lio Feller, pelas informaÁıes <strong>do</strong>s<br />

grupos musicais.<br />

Ao coordena<strong>do</strong>r <strong>do</strong> grupo de jovens trentinos de Rio <strong>do</strong>s Cedros, Andrei Taffner, pelas<br />

informaÁıes e fitas K7 cedidas.<br />

Rodeio.<br />

A to<strong>do</strong> corpo administrativo <strong>do</strong>s CÌrculos Trentinos de Nova Trento, Rio <strong>do</strong>s Cedros e<br />

A to<strong>do</strong>s aqueles que incentivam e divulgam as manifestaÁıes artÌsticas e culturais que<br />

valorizam a histÛria e a dignidade das pessoas. Em especial, agradeÁo aos cÌrculos trentinos e<br />

seu esforÁo neste senti<strong>do</strong>.


ìA arte n„o È assim um luxo para ser aprecia<strong>do</strong><br />

por uma minoria de estetas, mas sim um<br />

comportamento social necess·rio no qual to<strong>do</strong><br />

o ser humano deve tomar parteî<br />

(HAVILAND apud BATALHA).


RESUMO<br />

A presente pesquisa tem como assunto principal a m˙sica Ìtalo-trentina tocada e<br />

cantada por grupos musicais nos municÌpios de Nova Trento, Rio <strong>do</strong>s Cedros e Rodeio. O<br />

objetivo foi relatar que este tipo de manifestaÁ„o musical ocorre pauta<strong>do</strong> pela memÛria sobre<br />

a vida na regi„o de Trentino-Alto Adige antes da colonizaÁ„o italiana no <strong>Brasil</strong> <strong>do</strong> sÈculo XIX<br />

e, posterior a ela, pela prÛpria situaÁ„o <strong>do</strong> migrante durante a di·spora e em terra estrangeira.<br />

… tambÈm objetivo indicar como esta manifestaÁ„o musical pode sofrer modificaÁıes de<br />

acor<strong>do</strong> com as influÍncias externas que a rodeiam. Tais modificaÁıes podem ser observadas<br />

nas diferenÁas entre as partituras musicais de algumas canÁıes nas referÍncias italianas e nas<br />

publicaÁıes brasileiras. AlÈm <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> das canÁıes Ìtalo-trentinas, que em sua maior parte<br />

se manifestam nas principais festividades comemorativas da colonizaÁ„o italiana no <strong>Brasil</strong>,<br />

tambÈm foi dada Ínfase da contextualizaÁ„o histÛrica relacionada aos temas trata<strong>do</strong>s nas<br />

canÁıes, tais como, guerras, imigraÁ„o, paisagens geogr·ficas, gastronomia, religi„o, entre<br />

outros. Como os grupos musicais s„o comumente chama<strong>do</strong>s de folclÛricos, apresento alguns<br />

conceitos sobre este termo e sobre a forma como a antropologia da arte e a etnomusicologia<br />

vem trabalhan<strong>do</strong> com estas manifestaÁıes. A meto<strong>do</strong>logia utilizada envolveu: entrevistas<br />

com alguns participantes de grupos musicais que tocam a chamada m˙sica Ìtalo-trentina<br />

nestes municÌpios; pesquisa bibliogr·fica, principalmente no que se refere as informaÁıes<br />

histÛricas; an·lise de alguns <strong>do</strong>cumentos cedi<strong>do</strong>s pelos informantes e an·lise de algumas<br />

m˙sicas e partituras tocadas pelos grupos.<br />

Palavras-Chave: migraÁ„o italiana, m˙sica Ìtalo-trentina, grupos musicais, etnomusicologia.


LISTA DE ILUSTRA«’ES<br />

IlustraÁ„o 01 ñ ProgramaÁ„o <strong>do</strong> folheto de divulgaÁ„o da 18 festa <strong>Trentina</strong> <strong>do</strong> municÌpio de<br />

Rio <strong>do</strong>s Cedros<br />

IlustraÁ„o 02 ñ ProgramaÁ„o <strong>do</strong> folheto de divulgaÁ„o da 19 festa La Sagra <strong>do</strong> municÌpio de<br />

Rodeio<br />

IlustraÁ„o 03 ñ Atual It·lia e suas Regiıes<br />

IlustraÁ„o 04 ñ Regi„o de Trentino-Alto Adige e as provÌncias de Trento e Bolzano.<br />

IlustraÁ„o 05 ñ Alpes da regi„o Trentino-Alto Adige.<br />

IlustraÁ„o 06 ñ Alpes da regi„o Trentino-Alto Adige.<br />

IlustraÁ„o 07 ñ Trento sob ocupaÁ„o austrÌaca<br />

IlustraÁ„o 08 ñ Primeiras colÙnias italianas de SC<br />

IlustraÁ„o 09 ñ Esta<strong>do</strong> de Santa Catarina e os atuais municÌpios de Nova Trento, Rio <strong>do</strong>s<br />

Cedros e Rodeio.<br />

IlustraÁ„o 10 ñ Capa <strong>do</strong> folheto de divulgaÁ„o da 18 festa trentina, municÌpio de Rio <strong>do</strong>s<br />

Cedros<br />

IlustraÁ„o 11 ñ Capa <strong>do</strong> folheto de divulgaÁ„o da 19 festa La Sagra, municÌpio de Rodeio<br />

IlustraÁ„o 12 ñ CanÁ„o Monte Grappa tu sei la mia Patria<br />

IlustraÁ„o 13 ñ CanÁ„o Noi siam Partiti<br />

IlustraÁ„o 14 ñ CanÁ„o Valsugana<br />

IlustraÁ„o 15 ñ CanÁ„o Valsugana<br />

IlustraÁ„o 16 ñ Capa <strong>do</strong> disco <strong>do</strong> grupo Compagni Trentini ñ ìCantavano Cosiî<br />

IlustraÁ„o 17 ñ Contra capa <strong>do</strong> disco <strong>do</strong> grupo Compagni Trentini - ìCantavano Cosiî<br />

IlustraÁ„o 18 - Capa <strong>do</strong> disco <strong>do</strong> grupo Vecchio Scarpone<br />

IlustraÁ„o 19 - Contra capa <strong>do</strong> disco <strong>do</strong> grupo Vecchio Scarpone


SUM¡RIO<br />

INTRODU« O......................................................................................................... 10<br />

1 A NO« O DE FOLCLORE E A M⁄SICA ÕTALO-TRENTINA ........................ 12<br />

1.1 AS NO«’ES DE FOLCLORE E IDENTIDADE.................................................. 15<br />

1.2 RELA« O ENTRE IDENTIDADE E MANIFESTA«’ES EXPRESSIVAS ....... 19<br />

1.3 M⁄SICA ÕTALO-TRENTINA? POR QU ? ........................................................... 22<br />

2 A IMIGRA« O TRENTINA PARA SANTA CATARINA ................................ 28<br />

2.1 OS MOTIVOS DA EMIGRA« O ....................................................................... 31<br />

2.2 A FORMA« O DAS COL‘NIAS....................................................................... 36<br />

2.3 A RELIGI O DO ÕTALO-TRENTINO ................................................................ 42<br />

3 AS MANIFESTA«’ES EXPRESSIVAS MUSICAIS ......................................... 44<br />

3.1 AS PESQUISAS SOBRE A M⁄SICA TRENTINA DE TRADI« O ORAL........ 47<br />

3.2 A M⁄SICA ÕTALO-TRENTINA NOS MUNICÕPIOS DE NOVA TRENTO, RIO DOS<br />

CEDROS E RODEIO ................................................................................................ 62<br />

CONSIDERA«’ES FINAIS ................................................................................... 76<br />

REFER NCIAS BIBLIOGR¡FICAS..................................................................... 77


INTRODU« O<br />

A situaÁ„o sÛcio-econÙmica da It·lia durante a segunda metade <strong>do</strong> sÈculo XIX era<br />

bastante difÌcil, a populaÁ„o aumentara significativamente e a quantidade de camponeses<br />

agricultores - principal atividade da Època - sem propriedade de terra e trabalho era<br />

significativa. Tais condiÁıes, somadas ao avanÁo da revoluÁ„o industrial e a queda da<br />

produÁ„o agrÌcola devi<strong>do</strong> as pestes, resultaram em um processo de emigraÁ„o em grande<br />

escala. A esperanÁa de condiÁıes de vida melhores foi aproveitada pelas agÍncias de<br />

migraÁ„o. No caso <strong>do</strong> <strong>Brasil</strong>, isto resultou na entrada de Ìtalos-trentinos em v·rios esta<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

paÌs, entre eles Santa Catarina. Nele os migrantes italianos constituÌram colÙnias e se<br />

espalharam pela regi„o. Estes migrantes trouxeram em sua bagagem cultural: costumes,<br />

h·bitos e manifestaÁıes artÌsticas diversas, entre as quais a M˙sica, foco principal da<br />

pesquisa. A m˙sica continua sen<strong>do</strong> atualmente uma manifestaÁ„o importante entre aqueles de<br />

se dizem herdeiros <strong>do</strong>s migrantes italianos da segunda metade <strong>do</strong> sÈculo XIX, principalmente<br />

nas festividades que comemoram a migraÁ„o italiana para o <strong>Brasil</strong>.<br />

A quest„o que iniciou este trabalho foi: por quais motivos existem pessoas ou grupos<br />

musicais que cantam e tocam um tipo de m˙sica cuja referÍncia È o processo migratÛrio, a<br />

terra de origem e a situaÁ„o de deslocamento. Um tipo de m˙sica chamada de m˙sica italiana,<br />

m˙sica trentina ou m˙sica Ìtalo-trentina?<br />

Na busca de algumas respostas, foram feitas leituras sobre o assunto, assim como<br />

entrevistas com os principais respons·veis <strong>do</strong>s grupos musicais <strong>do</strong>s municÌpios estuda<strong>do</strong>s. Os<br />

motivos que me levaram a escolher o tema m˙sica Ìtalo-trentina em Santa Catarina, s„o tanto<br />

de ordem acadÍmica como pessoal. Primeiramente a idÈia surgiu de minhas observaÁıes das<br />

festividades italianas e das manifestaÁıes musicais realizadas em alguns municÌpios <strong>do</strong><br />

esta<strong>do</strong>. A partir daÌ procurei algum material escrito que descrevesse a m˙sica tradicional<br />

italiana em Santa Catarina. Ao encontrar pouco material, logo veio a indagaÁ„o sobre por que<br />

n„o existiam materiais em portuguÍs sobre o assunto. AlÈm disto, a prÛpria restriÁ„o da<br />

10


divulgaÁ„o deste tipo de m˙sica ‡s festividades italianas e a ausÍncia <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> deste tipo de<br />

m˙sica em meu percurso na universidade, foram tambÈm motivos para a escolha <strong>do</strong> tema.<br />

No primeiro capÌtulo, proponho uma discuss„o sobre a noÁ„o de folclore e suas<br />

implicaÁıes, ten<strong>do</strong> como ponto de partida para a discuss„o os termos ìfolclÛricoî e<br />

ìfolclorÌsticoî que adjetivam tanto os grupos musicais quanto a m˙sica cantada e tocada nas<br />

festividades Ìtalo-trentinas. Neste, procuro introduzir a concepÁ„o de identidade e grupo<br />

Ètnico, assim como a relaÁ„o entre identidade e manifestaÁ„o expressiva. TambÈm procurei<br />

situar geograficamente a regi„o que os migrantes trentinos habitavam e a qual se referem em<br />

suas m˙sicas. No segun<strong>do</strong> capÌtulo falo um pouco sobre a imigraÁ„o trentina para Santa<br />

Catarina, os motivos que levaram a este acontecimento, a formaÁ„o das primeiras colÙnias<br />

Ìtalo-trentinas e a import‚ncia de religiosidade para estes imigrantes. Neste capÌtulo procuro<br />

contextualizar historicamente a migraÁ„o italiana deste perÌo<strong>do</strong> apontan<strong>do</strong> relaÁıes com os<br />

temas de algumas canÁıes. No terceiro e ˙ltimo capÌtulo, apresento alguns relatos e notas<br />

sobre as manifestaÁıes musicais que ocorriam na regi„o Trentino-Alto Adige. Em seguida,<br />

proponho uma an·lise comparativa de partituras registradas por autores catarinenses,<br />

enfatizan<strong>do</strong> as transformaÁıes que uma determinada melodia pode ter e as contribuiÁıes das<br />

novas tecnologias e <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> da etnomusicologia para compreens„o destas transformaÁıes.<br />

… neste capÌtulo que apresento alguns grupos musicais que tocam m˙sicas Ìtalo-trentinas e<br />

descrevo os resulta<strong>do</strong>s das entrevistas que realizei com os principais respons·veis por estes<br />

grupos, procuran<strong>do</strong> identificar aspectos que justificam a existÍncia deste tipo de manifestaÁ„o<br />

musical.<br />

11


1 A NO« O DE FOLCLORE E A M⁄SICA ÕTALO-TRENTINA<br />

Para estudar as manifestaÁıes atuais da m˙sica Ìtalo-trentina 1 no Esta<strong>do</strong>, um momento<br />

privilegia<strong>do</strong> È a festa p˙blica de comemoraÁ„o da imigraÁ„o italiana para Santa Catarina. Este<br />

tipo de festa ocorre em v·rios municÌpios e nelas apresentam-se v·rios conjuntos musicais que<br />

tocam e cantam o que aqui estamos chaman<strong>do</strong> de m˙sica Ìtalo-trentina. … tambÈm nestas<br />

festas que podemos visualizar uma variedade de atores sociais compon<strong>do</strong> o cen·rio no qual se<br />

apresentam estas manifestaÁıes: Prefeituras Municipais, associaÁıes civis de cunho cultural e<br />

esportivo, empresas privadas realizan<strong>do</strong> exposiÁıes e negÛcios, artistas profissionais <strong>do</strong><br />

circuito comercial e os grupos musicais e corais que se auto nomeiam (ou que por vezes s„o<br />

assim identifica<strong>do</strong>s no contexto da festa) com os adjetivos folclÛrico, folclorÌstico, tradicional<br />

e folk. A prÛpria festa, muitas vezes, È identificada com a idÈia de tradiÁ„o (ver ilustraÁ„o 01<br />

e 02)<br />

1 Optou-se pelo it·lico para esta express„o e seus correlatos: m˙sica trentina, m˙sica italiana de tradiÁ„o oral,<br />

m˙sica folclÛrica italiana, m˙sica tradicional italiana, para indicar que esta È uma express„o utilizada pelos<br />

grupos estuda<strong>do</strong>s e pela literatura da ·rea, para identificaÁ„o de uma m˙sica cuja referÍncia remete a regi„o<br />

Trentino-Alto Adige, sen<strong>do</strong> portanto categoria genÈrica de uso corrente e n„o um conceito que delimita e<br />

descreve as caracterÌsticas deste tipo de m˙sica.<br />

12


IlustraÁ„o 01: ProgramaÁ„o da 18 festa <strong>Trentina</strong> <strong>do</strong> municÌpio de Rio <strong>do</strong>s Cedros<br />

Fonte: (Folheto da 18 Festa <strong>Trentina</strong>, Elabora<strong>do</strong> pelo CÌrculo Trentino de Rio <strong>do</strong>s Cedros,<br />

2007).<br />

13


IlustraÁ„o 02: ProgramaÁ„o da 19 Festa La Sagra <strong>do</strong> municÌpio de Rodeio.<br />

Fonte: (Folheto da 19 Festa La Sagra, Elabora<strong>do</strong> pelo CÌrculo Trentino de Rodeio, 2007).<br />

Assim como os grupos, a m˙sica Ìtalo-trentina tocada e cantada nestas festas tem si<strong>do</strong><br />

geralmente identificada com a idÈia de folclore, o que, via de regra remete n„o sÛ para a<br />

noÁ„o de algo que pertence ao passa<strong>do</strong> como para algo cujo lugar È a memÛria cristalizada no<br />

tempo. … sobre esta noÁ„o, e suas implicaÁıes que discuto a seguir neste primeiro capÌtulo.<br />

O intuito aqui È n„o sÛ compreender melhor as implicaÁıes teÛricas pr·ticas <strong>do</strong> uso<br />

deste termo, mas tambÈm introduzir a discuss„o sobre as noÁıes de identidade e<br />

manifestaÁıes expressivas, assim como a contribuiÁ„o destas para uma melhor compreens„o<br />

da m˙sica Ìtalo-trentina estudada.<br />

14


1.1 AS NO«’ES DE FOLCLORE E SUAS IMPLICA«’ES<br />

O termo folclore, de acor<strong>do</strong> com a publicaÁ„o de Rossini Tavares de Lima (1972),<br />

surge no inÌcio <strong>do</strong> sÈculo XIX atravÈs de uma carta que o arqueÛlogo inglÍs William John<br />

Thoms enviou a uma revista, e est· relaciona<strong>do</strong> ao estu<strong>do</strong> das antiguidades <strong>do</strong> povo inglÍs.<br />

Dentre os estu<strong>do</strong>s que Thoms explorava estavam as tradiÁıes populares, baladas lend·rias,<br />

provÈrbios locais, ditos vulgares, superstiÁıes e antigos costumes, entre outros aspectos. Os<br />

estu<strong>do</strong>s sobre estes temas contu<strong>do</strong>, antecedem a formulaÁ„o de Thoms: ìMuito antes de haver<br />

surgi<strong>do</strong> o nome ìfolcloreî, havia historia<strong>do</strong>res, literatos, m˙sicos, arqueÛlogos, sociÛlogos, e<br />

outros, estudan<strong>do</strong> os costumes e as tradiÁıes populares, a que mais tarde se deu o nome de<br />

folcloreî ( BRAND O apud TEIXEIRA, 1991 , p·g.02)<br />

Segun<strong>do</strong> Thompson, os estu<strong>do</strong>s surgem devi<strong>do</strong> a distinÁ„o cultural e subordinada <strong>do</strong>s<br />

pebleus perante aos patrÌcios. Devi<strong>do</strong> ao mantimento <strong>do</strong>s costumes, ritos e h·bitos da plebe,<br />

alguns estudiosos passaram a investigar e registrar tais elementos que sobreviveram a<br />

transformaÁ„o que a urbanizaÁ„o provocara. O surgimento <strong>do</strong> termo folclore se fez presente e<br />

esses costumes, ritos e h·bitos j· eram vistos como antiguidades ou resÌduos <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>,<br />

subordina<strong>do</strong>s e inferiores a modernidade e aos grupos hegemÙnicos.<br />

Quan<strong>do</strong> Isabel Aretz, uma das participantes <strong>do</strong> primeiro Congresso Interamericano de<br />

Etnomusicologia 2 e Folclore, realiza<strong>do</strong> em 1983, discorda <strong>do</strong> uso da express„o ìcultura<br />

popular tradicionalî, para identificar o que atÈ ent„o era chama<strong>do</strong> de folclore (CARVALHO,<br />

1991). Ela est· justamente defenden<strong>do</strong> a concepÁ„o criticada por Thompson, explica<br />

Carvalho:<br />

O folclore, que ela prefere denomina de ìcultura oral tradicionalî seria o ìque<br />

afunda suas raÌzes no tempo e que È a autÍntica cultura produzida pelo povoî,<br />

enquanto cultura popular seria a ìque anda entre o povo e que este assimilaî, sem<br />

haver interferi<strong>do</strong> no seu processo de criaÁ„o (1991, p·g. )<br />

Este tipo de concepÁ„o acabou fundamentan<strong>do</strong> a separaÁ„o entre a cultura popular,<br />

vista como influencia externa assimilada e folclore, vista como cultura pura <strong>do</strong> povo.<br />

2 ìEtnomusicologia: um ramo da Musicologia em que se d· Ínfase ao estu<strong>do</strong> da m˙sica em seu contexto cultural;<br />

a antropologia da m˙sica. Teve origem durante o final <strong>do</strong> sÈc. XIX, na Europa e nos EUA, com os trabalhos de<br />

Carl Stumpf, Erich M. von Hornsbostel, Curt Sachs, Alexander J. Ellis, Jesse Walter Fewkes, Franz Boas e<br />

outros. Os primeiros trabalhos tratavam na maior parte de psicologia da m˙sica, reconstruÁ„o da histÛria<br />

mundial da m˙sica, classificaÁ„o <strong>do</strong>s estilos e instrumentos musicais e, nos EUA, da an·lise da m˙sica indÌgena<br />

norte-americana. A pesquisa moderna combina as tÈcnicas antropolÛgicas de trabalhos de campo e etnografia<br />

com uma grande variedade de abordagens humanistas, especialmente a partir da musicologia e da estÈticaî<br />

(SADIE, 1994, p·g. 305).<br />

15


Considera-se nesta concepÁ„o que nos tempos passa<strong>do</strong>s existiam povos com culturas<br />

essencialmente autÍnticas, ou seja, que n„o estavam sujeitas as alteraÁıes e transformaÁıes.<br />

Outros teÛricos <strong>do</strong> folclore, no entanto j· haviam aponta<strong>do</strong> para a dinamicidade <strong>do</strong><br />

fenÙmeno. Este È o caso Edson Carneiro:<br />

O folclore È, portanto, din‚mico na sua essÍncia ñ est· em constante transformaÁ„o,<br />

dialeticamente È e n„o È o mesmo fenÙmeno ao mesmo tempo, como em geral<br />

acontece com to<strong>do</strong>s os fenÙmenos sociais. Estas aÁıes e reaÁıes s„o recÌprocas e<br />

simult‚neas e sempre d„o em resulta<strong>do</strong> um terceiro produto, uma sÌntese, que ,<br />

dependen<strong>do</strong> <strong>do</strong> vigor <strong>do</strong>s choques contr·rios, pode ser completamente diferente <strong>do</strong>s<br />

elementos que a formaram. Em constante transformaÁ„o ñ eis como devemos<br />

encarar o fato folclÛrico (1965, p·g.13 e 14).<br />

O complicante neste caso È o fato de que esta dinamicidade È vista como algo prÛprio<br />

<strong>do</strong> contexto atual, <strong>do</strong> processo de urbanizaÁ„o e racionalizaÁ„o moderna. Este pressuposto de<br />

fun<strong>do</strong> mantÈm a idÈia de folclore como um tipo de costume anterior a urbanizaÁ„o, reforÁan<strong>do</strong><br />

os complicantes prÛprios da idÈia de sobrevivÍncia j· cita<strong>do</strong>s.<br />

Em uma nova reuni„o em 1987, Nestor Garcia Canclini propıe uma nova concepÁ„o:<br />

Como conseq¸Íncia da heterogeneidade e da din‚mica <strong>do</strong> momento presente<br />

Canclini propıe descartar a escorregadia noÁ„o de autenticidade, presente na<br />

conceituaÁ„o de v·rios autores, e sugere o critÈrio de ìrepresentatividade<br />

sociocultural: n„o importa tanto os objetos, m˙sica e h·bitos tradicionais por sua<br />

capacidade de permanecerem ìpurosî, iguais a si mesmos, como porque<br />

representam o mo<strong>do</strong> de conceber e viver daqueles que os produzem e<br />

usamî(1987:9). A intenÁ„o de Canclini, que coincide com a da maioria <strong>do</strong>s<br />

participantes daquele Congresso, È praticamente acabar com a distinÁ„o entre<br />

popular e folclÛrico, ou melhor, tu<strong>do</strong> passaria a cair dentro da noÁ„o de ìculturas<br />

popularesî (CARVALHO, 1991, p·g. 7).<br />

Os meios de comunicaÁ„o, assim como a ind˙stria cultural s„o vistos como grandes<br />

acelera<strong>do</strong>res das transformaÁıes, assim como a urbanizaÁ„o e as opÁıes religiosas e<br />

espirituais de cada grupo humano, ou de cada indivÌduo. Estes fatores levariam a dissoluÁ„o<br />

de delimitaÁıes rÌgidas entre diferentes ·reas da cultura. Segun<strong>do</strong> Carvalho devi<strong>do</strong> a esses<br />

aspectos prÛprios da modernidade, aquilo que chamamos de cultura cl·ssica, cultura erudita,<br />

cultura popular e outras estariam sujeitas a constante dissoluÁ„o e redefiniÁ„o:<br />

O grande herdeiro da tradiÁ„o cl·ssica alem„ e das sofisticadas culturas da Viena<br />

fin-de-siÈcle e da Rep˙lica de Weimar, encontra a prÛpria cultura da elite ocidental<br />

de hoje como desintegrada, desfeita, em vias de descaracterizaÁ„o e apresentan<strong>do</strong><br />

graves sintomas de perda de memÛria. Tanto os folcloristas como os filÛsofos<br />

crÌticos apontam para a crise das culturas ìautÍnticasî (a cl·ssica e a folclÛrica) e se<br />

16


lamentam <strong>do</strong> fato de que È a intermÈdia que est· mais viva: a cultura popular<br />

urbana e a cultura de massa (CARVALHO, 1991, p·g. 10).<br />

Neste senti<strong>do</strong>, mesmo o que Carvalho chama de cultura de massa, termo utiliza<strong>do</strong> para<br />

denominar a cultura que se difunde pelos meios de comunicaÁ„o, atingin<strong>do</strong> uma grande parte<br />

da populaÁ„o. Poderia para este autor, ser visto em seus aspectos positivos no que se refere a<br />

revitalizaÁ„o de manifestaÁıes ligadas a tradiÁ„o. 3<br />

A crÌtica ao conceito de folclore gerou uma sÈrie de outros conceitos que procuravam,<br />

por um la<strong>do</strong>, delimitar as especificidades <strong>do</strong>s costumes e manifestaÁıes produzidas por um<br />

determina<strong>do</strong> setor da populaÁ„o, por outro, diferenciar estes <strong>do</strong>s outros setores. A utilizaÁ„o<br />

<strong>do</strong> conceito de cultura adjetiva<strong>do</strong> de palavras que buscavam diferenciar os setores a que se<br />

referiam, tais como: cultura popular, cultura de massa, cultural de elite, etc; trouxe um outro<br />

tipo de problema.<br />

Conforme aponta Thompson, a idÈia de cultura poderia sugerir a concepÁ„o de uma<br />

concord‚ncia de idÈias e opiniıes, um ìsistema consensualî de ìvalores compartilha<strong>do</strong>sî,<br />

suprimin<strong>do</strong> novamente a idÈia de mudanÁa, disputa e conflito (1998, p·g. 17). Na vis„o deste<br />

autor este foi um <strong>do</strong>s principais problemas <strong>do</strong> uso <strong>do</strong> termo ìcultura popularî. E que,<br />

poderÌamos tambÈm estender aos termos ìcultura de eliteî, ìcultura de massaî, etc.<br />

As implicaÁıes advin<strong>do</strong>s <strong>do</strong> uso destes e de outros conceitos e as tentativas em<br />

resolver os problemas daÌ advin<strong>do</strong>s, faz com que os estudiosos das manifestaÁıes artÌsticas<br />

tambÈm busquem sua prÛpria nomenclatura e adjetivem os fenÙmenos estuda<strong>do</strong>s ora de uma<br />

forma ora de outra. Bernardi (1999), por exemplo, vai falar <strong>do</strong> ìhibridismoî entre o ìaltoî<br />

referin<strong>do</strong>-se aqui a chamada ìm˙sica cl·ssicaî, e o ìbaixoî, ou seja, a chamada ìm˙sica<br />

popularî:<br />

3 Explica Carvalho: por exemplo, o vertiginoso crescimento de uma vertente mais comercial e kitsch da m˙sica<br />

ìsertanejaî no <strong>Brasil</strong> (an·loga ao estilo country comercial nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s) tem contribuÌ<strong>do</strong> enormemente<br />

para que as grandes obras da canÁ„o sertaneja tradicional sejam reabilitadas e revalorizadas (a ponto de elas <strong>do</strong><br />

serem agora chamadas de ìcl·ssicosî sertanejos pelos cultores <strong>do</strong> gÍnero tipicamente comercial) (CARVALHO,<br />

1991, p·g. 9).<br />

[O caso da m˙sica sertaneja, cita<strong>do</strong> por Carvalho, È um exemplo de que apesar da mÌdia divulgar m˙sicas com<br />

interesses estritamente comerciais, elas dialogam com outras expressıes musicais, ligadas a tradiÁ„o. Outro<br />

exemplo de como o folclÛrico, o popular e o cl·ssico podem se misturar, pode ser visto na obra liter·ria de<br />

Goethe. Segun<strong>do</strong> Carvalho, a formaÁ„o de Goethe È mista: aprendera a arte das marionetes como um autÍntico<br />

ìmestre folkî e chegou a conhecer to<strong>do</strong> o repertÛrio tradicional das histÛrias, em seguida trabalhou mais de<br />

cinq¸enta anos na construÁ„o de uma obra liter·ria que unia a mitologia grega, a tradiÁ„o crist„ e uma lenda<br />

folclÛrica. O resulta<strong>do</strong> segun<strong>do</strong> Carvalho, È sempre o movimento] Simplifican<strong>do</strong>, pois, a descriÁ„o de um<br />

processo histÛrico sumamente complexo, pode-se dizer que desde ent„o, as duas tradiÁıes ìpurasî (a popular e a<br />

cl·ssica) foram se diluin<strong>do</strong> paulatinamente, misturan<strong>do</strong>-se ‡s vezes entre si, transforman<strong>do</strong>-se ao longo desse<br />

processo. Isto quer dizer que t„o logo Goethe conseguiu plasmar essa ìperfeitaî esfera da cultura, ela comeÁou<br />

outra vez a estilhaÁar-se, n„o j· em duas, mas em in˙meras partes, geran<strong>do</strong> uma multiplicidade de formas, tanto<br />

orais como escritas e, finalmente eletrÙnicas (como a cultura de massa circulan<strong>do</strong> pelas v·rias camadas sociais<br />

da populaÁ„o <strong>do</strong>s paÌses europeus e latino americanos atÈ os dias de hoje (CARVALHO, 1991, p·g. 12).<br />

17


Nas canÁıes populares italianas transmitidas por tradiÁ„o oral, como um lembrete<br />

constante, o elemento hÌbri<strong>do</strong> est· presente: por um la<strong>do</strong>, os seus textos-poemas se<br />

aproximam <strong>do</strong> ìaltoî quanto ao uso da mÈtrica versificada; por outro, aproximamse<br />

<strong>do</strong> ìbaixoî ao incorporarem tem·ticas <strong>do</strong> cotidiano de um grupo social<br />

campesino (BERNARDI, 1999, p·g. 118).<br />

Macchiarella destacan<strong>do</strong> a observaÁ„o de Bolognini, sem questionar propriamente a<br />

idÈia de tradiÁ„o, ressalta o aspecto din‚mico, mutante e transforma<strong>do</strong>r das chamadas<br />

ìcanÁıes popularesî, sugerin<strong>do</strong> que, o que observamos hoje È uma intensificaÁ„o das<br />

transformaÁıes, e que tais transformaÁıes aconteciam tambÈm no passa<strong>do</strong>, onde uma das<br />

influÍncias È a decorrÍncia <strong>do</strong> avanÁo das tecnologias:<br />

De resto as transformaÁıes na cultura e na m˙sica tradicional n„o s„o uma<br />

novidade da nossa Època. Disto, como È visto, se lamentava a cerca de um sÈculo<br />

atr·s Nepomuceno Bolognini, cujo interesse pelas tradiÁıes populares era pelo<br />

apontamento <strong>do</strong>s mesmos, motiva<strong>do</strong> pelo me<strong>do</strong> de seu desaparecimento por causa<br />

da invas„o apressada <strong>do</strong>s povos que vem num percurso desenfrea<strong>do</strong> nos postos de<br />

terceira classe das ferrovias e <strong>do</strong>s bondes a vapor ou a cavalo que seja<br />

(MACCHIARELLA, 1999, p·g. 113, traduzi<strong>do</strong> por Maria Salete Santos<br />

Silva). 4<br />

O intuito È mostrar que as manifestaÁıes expressivas musicais v„o se modifican<strong>do</strong> ao<br />

longo <strong>do</strong>s anos, poden<strong>do</strong> sobressair algumas de suas caracterÌsticas, possibilitan<strong>do</strong> que um<br />

sujeito, de algum lugar e de alguma maneira classifique estas manifestaÁıes em diferentes<br />

gÍneros. N„o È minha intenÁ„o questionar a utilizaÁ„o <strong>do</strong>s termos folk, folclÛrico e tradiÁ„o<br />

nos folhetos de divulgaÁ„o das festividades. Ao contr·rio, a intenÁ„o È compreendÍ-las e<br />

mostrar que tambÈm elas dialogam com a produÁ„o cientÌfica, ora se aproprian<strong>do</strong> de<br />

categorias deste meio, ora fornecen<strong>do</strong> a matÈria prima necess·ria ‡ produÁ„o conceitual. As<br />

festas comemorativas da colonizaÁ„o italiana, em alguma medida remetem para o passa<strong>do</strong> e<br />

para um vÌnculo histÛrico e identit·rio, cujo apelo tem resson‚ncia nos municÌpios nos quais<br />

se realizam. Neste senti<strong>do</strong> os termos cita<strong>do</strong>s parecem remeter para a idÈia de uma ìorigem<br />

comumî e de ìhistÛriaî e ìvaloresî compartilha<strong>do</strong>s. Por outro la<strong>do</strong>, a festa tambÈm dialoga<br />

com manifestaÁıes e valores contempor‚neos presentes em outras apresentaÁıes, mas<br />

4 ìDel resto le trasformazioni nella cultura e nella musica tradizionali non sono certo uma novit‡ della nostra<br />

epoca. Di esse, come visto, si lagnava circa un secolo fa Nepomuceno Bolognini il cui interesse verso le<br />

tradizioni popolari era per l`appunto motivato dal timore della loro scomparsa a causa dell` invadente<br />

affratellamento dei popoli che viene, viene a corsa sfrenata nei posti di terza classe delle ferrovie e dei tram a<br />

vapore o a cavalli che siaî (MACCHIARELLA, 1999, p·g. 113).<br />

18


incorpora<strong>do</strong>s e ressignifica<strong>do</strong>s pelos grupos ditos folclÛricos. Aspecto que procurarei<br />

desenvolver no ˙ltimo capÌtulo deste trabalho.<br />

1.2 RELA« O ENTRE IDENTIDADE E MANIFESTA«’ES EXPRESSIVAS<br />

Quan<strong>do</strong> as pessoas constroem uma identidade, tem a intenÁ„o de se diferenciar, seja<br />

esta diferenciaÁ„o de car·ter positivo (idÈia de superioridade) negativo (de inferioridade), ou<br />

apenas comparativo (de percepÁ„o da diferenÁa).<br />

Neste senti<strong>do</strong> a construÁ„o de uma identidade, seja individual ou coletiva, È um<br />

processo relacional, que diz respeito ‡ tentativa de diferenciaÁ„o <strong>do</strong> outro. Uma das<br />

dimensıes desta diferenciaÁ„o È o ‚mbito cultural. Segun<strong>do</strong> Seyferth:<br />

Barth chamou a atenÁ„o para a aÁ„o recÌproca que marca as relaÁıes interÈtnicas,<br />

afirman<strong>do</strong> que a identidade Ètnica n„o È algo imut·vel, mas situacionalmente<br />

vari·vel e em permanente negociaÁ„o, daÌ sua Ínfase na fronteira intergrupal e na<br />

interaÁ„o <strong>do</strong>s atores sociais atravÈs dela (2004, p·g. 190).<br />

Utilizan<strong>do</strong> o conceito de Barth, Seyferth vai procurar mostrar como a identidade Ètnica<br />

<strong>do</strong>s ìteuto-brasileiroî, em especial de uma parcela da populaÁ„o colonial letrada, foi se<br />

construin<strong>do</strong> a partir <strong>do</strong>s cantos, poesias, romances e crÙnicas, publica<strong>do</strong>s em periÛdicos da<br />

regi„o. Uma literatura que vai justamente florescer no contexto interÈtnico <strong>do</strong> contato entre<br />

alem„es, brasileiros e outros colonos, entre os quais italianos.<br />

A proposta de Barth, onde a constituiÁ„o de grupos Ètnicos, e conseq¸entemente da<br />

identidade sÛ se d· num contexto relacional e, como mostra Seyferth, eminentemente<br />

conflituoso, encontra eco na maior parte da produÁ„o antropolÛgica. No entanto, tanto nos<br />

estu<strong>do</strong>s identifica<strong>do</strong>s com a idÈia de folclore, como naqueles que falam das manifestaÁıes<br />

tradicionais, conforme j· foi dito, tambÈm a identidade tende a ser descrita com caracterÌsticas<br />

fixas.<br />

A prÛpria Seyferth num texto publica<strong>do</strong> h· 18 anos atr·s sugeria fatores que podem<br />

definir um tipo de identidade Ètnica, sen<strong>do</strong> eles a lÌngua materna, a religi„o, a cultura de<br />

origem, a capacidade de trabalho, a en<strong>do</strong>gamia e os h·bitos alimentares. Estes foram<br />

tambÈm, via de regra, critÈrios utiliza<strong>do</strong>s por v·rios autores para caracterizar os colonos Ìtalo-<br />

trentinos e seus descendentes: a lÌngua e o dialeto; a maneira de se expressar com a fala e com<br />

as m„os; a voz com intensidade alta ao conversar; a religiosidade; os h·bitos alimentares<br />

19


como a polenta, vinho, massas em geral; o jogo de cartas, mora e bocha e atÈ mesmo traÁos<br />

fÌsicos e psicolÛgicos, como no caso da citaÁ„o abaixo:<br />

O povo trentino italiano È descrito como de Ìn<strong>do</strong>le sÈria, freq¸entemente severa,<br />

laboriosa, com uma acentuada avers„o ‡ improvisaÁ„o f·cil, ‡ aventura espiritual ou<br />

econÙmica. Portanto, conserva<strong>do</strong>r. [...] Ele [o Ìtalo-trentino] pareÁa muito fecha<strong>do</strong> em<br />

si mesmo e no seu mun<strong>do</strong>, mas È inteligente e perspicaz, constante e voluntarioso,<br />

quieto e arisco aos entusiasmos excessivos, robusto fisicamente e espiritualmente<br />

sadio; fortemente liga<strong>do</strong> ‡ famÌlia, ‡ casa, a seu povoa<strong>do</strong> e a seus vales. [...] Tu<strong>do</strong> o<br />

que È tradicional È seguro e bom; o novo deve ser cautelosamente avalia<strong>do</strong>: este È o<br />

pensamento oculto mas sempre presente na mente <strong>do</strong> homem trentino. [...] O homem<br />

trentino <strong>do</strong> sÈculo XIX È descrito como de temperamento sang¸Ìneo-bilioso. Tem<br />

altura mediana, cabelo escuro, cor vivaz, musculatura forte e definida, um tÛrax bem<br />

desenvolvi<strong>do</strong>, ombros largos e quadra<strong>do</strong>s e pescoÁo curto. A cabeÁa geralmente<br />

grande, de olhar vivo e penetrante e tem uma express„o <strong>do</strong> rosto grave e sagaz<br />

(BONATTI; LENZI, 2006, p·g. 24 e 25).<br />

Assim como no caso das manifestaÁıes culturais tratadas como folclore, a prÛpria<br />

ìidentidadeî foi vista como algo que podia ser descrito atravÈs de caracterÌsticas fÌsicas,<br />

psicolÛgicas e sÛcio culturais fixas que independeriam <strong>do</strong> contexto relacional no qual o grupo<br />

em quest„o estava inseri<strong>do</strong>.<br />

Assim como o conceito de cultura muitas vezes trouxe consigo a idÈia de um sistema<br />

consensual e sem conflitos, os conceitos de identidade, etnicidade e grupo Ètnico, trouxeram<br />

consigo, a idÈia de raÁa e de determinismo biolÛgico, conforme aponta Franzoni:<br />

Ainda que, nas formulaÁıes de Barth (1998) estivesse presente n„o sÛ a idÈia de<br />

uma interaÁ„o contextual, negociada, construÌda sob bases simbÛlicas e cujos<br />

processos estariam em constante reconstruÁ„o, pressupon<strong>do</strong> um saber cultural<br />

compartilha<strong>do</strong>, a quest„o que parece estar colocada na polÍmica sobre a etnicidade<br />

e seus limites enquanto categoria antropolÛgica, È justamente a acusaÁ„o em torno<br />

da essencializaÁ„o <strong>do</strong> conceito, ìassombra<strong>do</strong>î pelas idÈias de ìraÁaî e de<br />

ìheranÁaî. Tanto a acusaÁ„o feita por Kuper, quanto a suspeita de Poutignat e<br />

Streife-Fenart remetem a dificuldade de tratar estas categorias como categorias e<br />

n„o como fatos, por si sÛ, explicativos, ou seja, como premissas das quais parte a<br />

an·lise. Dificuldade muitas vezes colocada em funÁ„o das trajetÛrias destes<br />

conceitos nos contextos polÌticos nacionais e internacionais em que s„o produzi<strong>do</strong>s<br />

e significa<strong>do</strong>s (2004, p·g.9).<br />

Muitos estu<strong>do</strong>s tÍm procura<strong>do</strong> chamar atenÁ„o para o contexto relacional das<br />

manifestaÁıes culturais, sejam elas consideradas tradicionais ou n„o, apontan<strong>do</strong> para os<br />

conflitos e as formas de negociaÁ„o das identidades, para a relaÁ„o entre elementos escolhi<strong>do</strong>s<br />

e contexto polÌtico. Assim como para as relaÁıes entre histÛria e cultura. O estu<strong>do</strong> de<br />

Thompson (1999) sobre ìa cultura popular tradicionalî inglesa, o estu<strong>do</strong> de Seyferth (2004)<br />

20


sobre a literatura teuto-brasileira o inÌcio <strong>do</strong> sÈc. XX e o estu<strong>do</strong> de Martins (2007) sobre<br />

ìestratÈgias de inserÁ„o social de grupos migrantesî em Portugal, s„o exemplos neste senti<strong>do</strong>.<br />

No caso deste ˙ltimo, vale chamar atenÁ„o para o conceito de manifestaÁıes expressivas<br />

utiliza<strong>do</strong> por Martins: ìEnten<strong>do</strong> como manifestaÁıes expressivas todas as manifestaÁıes<br />

capazes de exprimir uma forma ou conte˙<strong>do</strong> estÈtico alia<strong>do</strong>s a qualquer conte˙<strong>do</strong> identit·rioî<br />

(MARTINS, 2007, p·g.2).<br />

Com este conceito o autor define algumas das manifestaÁıes culturais de migrantes<br />

caboverdianos em Portugal tradicionalmente tratadas como ìmanifestaÁıes folclÛricasî. Seu<br />

objetivo È compreender como estas manifestaÁıes servem como ìinstrumentoî de integraÁ„o<br />

destes migrantes tanto no contexto portuguÍs quanto no merca<strong>do</strong> de trabalho como enquanto<br />

estratÈgia de reconstruÁ„o da identidade pessoal e social.<br />

Neste trabalho, as transformaÁıes estÈticas s„o analisadas no contexto relacional,<br />

assim como a prÛpria identidade caboverdiana que sÛ È possÌvel em Portugal. As<br />

manifestaÁıes expressivas: o Funan·, o Batuque e o Kol· San Jon, assim como o rap, o break<br />

dance e o grafite s„o analisadas no contexto da di·spora, ou seja de grupos que migraram ou<br />

descendem daqueles que migraram e cujas referÍncias culturais est„o marcadas pelo<br />

deslocamento.<br />

21


1.3 M⁄SICA ÕTALO-TRENTINA? POR QU ?<br />

Quan<strong>do</strong> falamos em m˙sica Ìtalo-trentina, como assim ficou conhecida uma<br />

determinada tradiÁ„o musical de alguns <strong>do</strong>s municÌpios <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Santa Catarina, estamos<br />

nos referin<strong>do</strong> a uma manifestaÁ„o musical cujo apelo identit·rio de seus participantes e<br />

aprecia<strong>do</strong>res remete para o processo de colonizaÁ„o italiana em SC, no sÈculo XIX, n„o sÛ<br />

identifican<strong>do</strong>-se com a nacionalidade de origem, no caso a italiana, mas com uma regi„o<br />

especÌfica da It·lia, a regi„o de Trento. Situo a seguir esta regi„o:<br />

Atualmente, esta regi„o È conhecida como Trentino-Alto Adige e situa-se ao norte da<br />

It·lia. Na divis„o polÌtica administrativa atual deste paÌs a regi„o constitui a maior parte<br />

polÌtico territorial de divis„o interna, sen<strong>do</strong> subdividida em provÌncias. A regi„o Trentino-<br />

Alto Adige, possui atualmente duas provÌncias, a provÌncia de Trento com 223 municÌpios e a<br />

provÌncia de Bolzano com 116 municÌpios.<br />

22


Regi„o Capital<br />

01 ñ Valle d'Aosta Aosta<br />

02 ñ Piemonte Torino<br />

03 ñ Lombardia Milano<br />

04 ñ Trentino-Alto Adige Trento<br />

05 - Friuli-Venezia Giulia Trieste<br />

06 ñ VÍneto Venezia<br />

07 ñ Lig˙ria Genova<br />

08 - Emilia-Romagna Bologna<br />

09 ñ Toscana Firenze<br />

10 ñ Marche Ancona<br />

11 ñ ⁄mbria Perugia<br />

12 ñ Lazio Roma<br />

13 ñ Abruzzo L'Aquila<br />

14 ñ Molise Campobasso<br />

15 ñ Camp‚nia Napoli<br />

16 ñ Puglia Bari<br />

17 ñ Basilicata Potenza<br />

18 ñ Cal·bria Catanzaro<br />

19 - SicÌlia Palermo<br />

20 ñ Sardegna Cagliari<br />

IlustraÁ„o 03: Atual It·lia e suas regiıes.<br />

Fonte: http://pinoulivi.com/verpor/territor2.htm, acesso em 09/08/2007.<br />

23


Como mostra a ilustraÁ„o 03, a regi„o Trentino-Alto Adige est· situada ao Norte da<br />

It·lia e possui como regiıes vizinhas o territÛrio de VÍneto e a Lombardia. TambÈm faz<br />

fronteira com a ¡ustria ao Norte.<br />

ProvÌncias Siglas MunicÌpios<br />

TRENTO TN 223<br />

Bolzano BZ 116<br />

339<br />

IlustraÁ„o 04: Regi„o de Trentino-Alto Adige e as provÌncias de Trento e Bolzano.<br />

Fonte: http://pinoulivi.com/verpor/territor2.htm, acesso em 09/08/2007.<br />

O ambiente geogr·fico desta regi„o se caracteriza principalmente pela quantidade de<br />

montanhas, onde nos mais altos picos h· a concentraÁ„o de neve. Tal caracterÌstica fÌsica <strong>do</strong><br />

solo indica que n„o È um <strong>do</strong>s melhores lugares para a agricultura conforme afirma Grandi<br />

cita<strong>do</strong> por Silva:<br />

Regi„o 04 ProvÌncias Siglas<br />

Trentino-Alto Adige<br />

TRENTO<br />

Bolzano<br />

TN<br />

BZ<br />

A regi„o trentina caracteriza-se por ser ì˙nica de montanha, praticamente privada<br />

de territÛrio plano alÈm <strong>do</strong>s 100 metros acima <strong>do</strong> mar, o que significa que, quan<strong>do</strong><br />

se fala da utilizaÁ„o da sua superfÌcie, se faz no senti<strong>do</strong> vertical sen<strong>do</strong> que 69,9%<br />

<strong>do</strong> territÛrio situa-se alÈm <strong>do</strong>s 1.000 metros, isto determina um forte limite ‡<br />

superfÌcie agr·ria cultiv·vel (2001, p·g. 19).<br />

24


As ilustraÁıes 05 e 06 procuram dar visibilidade ‡ descriÁ„o anterior.<br />

IlustraÁ„o 05: Alpes da regi„o Trentino-Alto Adige.<br />

Fonte: http://www.italytraveller.com/images/home_trentino.jpg, acesso em 05/02/2008.<br />

IlustraÁ„o 06: Alpes da regi„o Trentino-Alto Adige.<br />

Fonte: www.italytraveller.com/it/r/trentino/a/<strong>do</strong>lomiti, acesso em 05/02/2008.<br />

25


Apesar desta caracterÌstica limitante para o cultivo na regi„o Trentino-Alto Adige, a<br />

maioria da populaÁ„o que l· vivia no sÈculo XIX, perÌo<strong>do</strong> da emigraÁ„o para a AmÈrica,<br />

trabalhava na agricultura. Estas caracterÌsticas, tanto da geografia como o fazer e o trabalho<br />

cotidiano da gente trentina, foram frequentemente tematizadas nas canÁıes que s„o objeto <strong>do</strong><br />

presente trabalho.<br />

Esta regi„o, foi muito disputada entre os impÈrios, estan<strong>do</strong> atÈ 1918 sob o <strong>do</strong>mÌnio da<br />

¡ustria, sen<strong>do</strong> chamada de Tirol 5 . De acor<strong>do</strong> com a publicaÁ„o Provincia Autonoma di Trento<br />

Assessorato A`ll Emigrazione Gli ultimi duecento anni, esta regi„o foi anexada ‡ It·lia h·<br />

apenas 90 anos, antes e durante 114 anos, foi provÌncia da ¡ustria: de 1803 a 1918<br />

(PROVINCIA Autonoma di Trento Assessorato A`ll Emigrazione, 1990, p·g. 24).<br />

IlustraÁ„o 07: Trento sob ocupaÁ„o austrÌaca<br />

Fonte: (PROVINCIA AUTONOMA DI TRENTO, 1994, p·g. 17).<br />

5 TambÈm chama<strong>do</strong> de Tirol Meridional ou Tirol Italiano (GROSSELLI, 1987, p·g. 31).<br />

26


Parte <strong>do</strong>s migrantes que vieram desta regi„o para Santa Catarina, estavam situa<strong>do</strong>s em<br />

territÛrio austrÌaco e n„o italiano, motivo pelo qual s„o denomina<strong>do</strong>s de tiroleses, ainda que<br />

pertencessem a regi„o e fizessem parte <strong>do</strong> Trentino. Devi<strong>do</strong> ‡ prÛpria atribuiÁ„o <strong>do</strong> impÈrio<br />

austrÌaco, os habitantes que emigrassem perdiam momentaneamente sua cidadania austrÌaca:<br />

A emigraÁ„o provocar· automaticamente a perda da cidadania austrÌaca e <strong>do</strong><br />

incolato. ( O incolato era o direito que cada cidad„o austrÌaco tinha ‡ residÍncia e<br />

obrigava os municÌpios a assistir aos cidad„os indigentes que n„o pudessem fazer<br />

frente ‡ satisfaÁ„o de suas exigÍncias vitais da famÌlia )î ( GROSSELLI apud<br />

BONATTI; LENZI, 2006, p·g. 37).<br />

Conforme Vicenzi (2000) os prÛprios habitantes n„o se consideravam austrÌacos,<br />

sen<strong>do</strong> o italiano a lÌngua <strong>do</strong>minante ao sul <strong>do</strong> Tirol (Trentino), enquanto na regi„o norte <strong>do</strong><br />

Tirol (Alto Adige), que est· mais prÛxima de Innsbruck, capital <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tirol, foi o<br />

alem„o que esteve e est· presente ainda hoje. AlÈm da presenÁa destas duas lÌnguas, tambÈm<br />

h· uma terceira lÌngua, a ladina 6 :<br />

Nesta regi„o ocorreram diversas guerras, entre elas podemos citar a Guerra da CrimÈia<br />

que teve o seu fim em 1855, Guerra contra SavÛia em 1859, Guerra da Pr˙ssia contra a<br />

¡ustria em 1866, Guerra Franco-Prussiana em 1870 onde a It·lia se unificou e a 1 Grande<br />

Guerra Mundial que iniciou em 1914 e teve seu fim em 1918. Algumas destas tambÈm foram<br />

tematizadas nas canÁıes, como por exemplo, a canÁ„o Bella Ciao.<br />

O principal aspecto a ser destaca<strong>do</strong> aqui È que a regi„o Trentino-Alto Adige foi palco<br />

de uma consider·vel diversidade cultural, resulta<strong>do</strong> das disputas entre as naÁıes austrÌacas e<br />

italianas e tambÈm <strong>do</strong> fato de ser esta regi„o, um portal de acesso aos exÈrcitos de outros<br />

paÌses. Faz-se importante chamar atenÁ„o para este aspecto, pois evidencia uma regi„o em<br />

violenta transformaÁ„o com intensas trocas culturais. As manifestaÁıes artÌsticas aÌ<br />

produzidas por certo participaram deste rico e violento di·logo cultural e se hoje nos parecem<br />

manifestaÁıes ìcristalizadasî, que ìafundam suas raÌzes no tempoî, a histÛria aponta para um<br />

processo criativo bem mais din‚mico.<br />

6 ìLadino, ladin (ladinisch): lÌngua rom‚nica preservada em alguns vales <strong>do</strong> S¸dtirol e Trentino. Sua origem<br />

remonta ‡ latinizaÁ„o imposta pelos romanos aos celtas da G·lia Cisalpina no sÈculo II a.C.; no sÈculo VII<br />

recebeu alguma influÍncia <strong>do</strong> mÈdio-alto alem„o. … uma das mais antigas lÌnguas faladas na Europa, sem ter<br />

sofri<strong>do</strong> grandes transformaÁıes nos ˙ltimos 1500 anos. A minoria ladina conta hoje com v·rias publicaÁıes e<br />

estu<strong>do</strong>s de sua lÌngua, dividida nos seus dialetos, entre eles: Anpezan, Badiot, Dolomitan, Fo<strong>do</strong>m, Gadertal,<br />

GherdÎina e Fascianî http://www.grupotirol.com/frames.php?pag=regiao.htm, acesso em 05/02/2008.<br />

27


2 A IMIGRA« O TRENTINA PARA SANTA CATARINA<br />

Para falar sobre a imigraÁ„o trentina para Santa Catarina, faz-se necess·rio contar um<br />

pouco da histÛria <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> catarinense assim como tambÈm da histÛria externa que levou<br />

estas pessoas a atravessarem o oceano ‡ procura de novas terras.<br />

Sabe-se que antes das campanhas migratÛrias <strong>do</strong> sÈculo XIX, habitavam o territÛrio<br />

catarinense, povos indÌgenas e brasileiros que descendiam pre<strong>do</strong>minantemente de portugueses<br />

e de v·rios povos africanos. Entre os povos indÌgenas estavam os XoklÈng, mais conheci<strong>do</strong>s<br />

como botocu<strong>do</strong>s, os Kaigang, os povos <strong>do</strong>s Sambaquis 7 e os Guarani, no litoral. AlÈm <strong>do</strong>s<br />

indÌgenas, existiam tambÈm os caboclos, que eram parte da populaÁ„o negra e mestiÁa:<br />

Inicialmente [Santa Catarina] foi povoada por indÌgenas, cujos primeiros vestÌgios,<br />

segun<strong>do</strong> a arqueologia, datam de aproximadamente 5.500 anos a. C. Em Època<br />

mais recente, quan<strong>do</strong> das primeiras incursıes de brancos pela regi„o (entre 1542 e<br />

1775), ela encontrava-se habitada principalmente por tribos Kaingang, alÈm de se<br />

registrar a presenÁa de tribos Xokleng e Guarani. A segunda fase de povoamento<br />

se d· com a presenÁa de caboclos ou sertanejos, que ocuparam a terra no sistema de<br />

ìposseî. Entre eles inclui-se parte de populaÁ„o negra e mestiÁa, sobre a qual se<br />

dispıe de poucos da<strong>do</strong>s, face ‡ inexistÍncia desse tipo de estu<strong>do</strong> para a regi„o.<br />

Sabe-se, entretanto, que tanto <strong>do</strong> litoral quan<strong>do</strong> <strong>do</strong> oeste catarinense afluiu este tipo<br />

de populaÁ„o ( SILVA, 2001, p·g. 44).<br />

Quan<strong>do</strong> da chegada <strong>do</strong>s imigrantes italianos, a regi„o era ainda <strong>do</strong>minada pela mata<br />

virgem, e o ˙nico meio de locomoÁ„o era via fluvial ou atravÈs das estreitas ìpicadasî, a<br />

maioria feitas pelos prÛprios caboclos (SILVA, 2001). Estas serviram como auxÌlio para o<br />

processo de ocupaÁ„o <strong>do</strong>s colonos europeus. ìNo entanto, ele afirma que aonde o italiano<br />

chegou, primeiro chegou o caboclo, abrin<strong>do</strong>, deste mo<strong>do</strong>, o caminho das futuras picadas.î<br />

(SILVA, 2001, p·g. 58 e 59). Neste processo realizou-se uma dupla exclus„o, ou seja,<br />

inicialmente a terra foi ocupada por indÌgenas e depois caboclos, porÈm quan<strong>do</strong> se iniciou a<br />

imigraÁ„o no sÈculo XIX, os indÌgenas migraram cada vez mais para o interior <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> e<br />

assim tambÈm ocorreu com os caboclos.<br />

Apesar da chegada em uma terra praticamente virgem, nada aparenta ter si<strong>do</strong> f·cil para<br />

os imigrantes trentinos, desde a viajem, onde ficavam dias ao navio com poucos recursos de<br />

7 Sambaquis È o monte de conchas com vestÌgios humanos deixa<strong>do</strong>s pelos povos que antecederam os guaranis<br />

28


higiene e alimentaÁ„o, resultan<strong>do</strong> em epidemias onde muitas pessoas viam a falecer durante a<br />

viajem, principalmente os mais fracos, crianÁas e i<strong>do</strong>sos. No ponto de chegada, pisan<strong>do</strong> em<br />

terra firme, as dificuldades continuaram. Recepciona<strong>do</strong>s atravÈs de barracıes com piso de<br />

barro bati<strong>do</strong> (ver canÁ„o Noi Siam Partiti), muitos haviam de <strong>do</strong>rmir uma ou duas semanas no<br />

ch„o. Em seguida estava a longa jornada que os mesmos tinham que fazer para chegar no<br />

respectivo lote de terra, onde o caminho por eles percorri<strong>do</strong>s eram atravÈs de estreitas picadas<br />

entre a mata e horas via fluvial atravÈs de jangadas. Unin<strong>do</strong> todas estas dificuldades est„o<br />

inseri<strong>do</strong>s tambÈm os prÛprios animais que viviam na mata, ameaÁan<strong>do</strong> a sobrevivÍncia:<br />

insetos transmissores de <strong>do</strong>enÁas, onÁas, cobras, entre outros. E ainda aos ataques <strong>do</strong>s<br />

indÌgenas, que ao verem seus locais sen<strong>do</strong> apropria<strong>do</strong>s, n„o exitaram de roubar utensÌlios <strong>do</strong>s<br />

colonos e atÈ matar. ApÛs anos de luta a sobrevivÍncia alimenta<strong>do</strong> pelo desejo de se<br />

estabelecerem tranquilamente, as dificuldades surgiram no ‚mbito polÌtico e governamental,<br />

caracteriza<strong>do</strong> no perÌo<strong>do</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> Novo (1937-1945) e a presidÍncia de Get˙lio Vargas. A<br />

campanha de NacionalizaÁ„o tinha como objetivo a padronizaÁ„o da identidade nacional<br />

brasileira, e prezava para que v·rios artefatos culturais estrangeiros fossem elimina<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

paÌs. Dentre eles a lÌngua de origem, os jogos, as canÁıes, a grade curricular das escolas, as<br />

associaÁıes, tu<strong>do</strong> o que representasse ser de identidade estrangeira:<br />

A campanha de nacionalizaÁ„o, de certa forma, eliminou os canais formais de<br />

atualizaÁ„o da etnicidade da maioria <strong>do</strong>s grupos, ao proibir instituiÁıes como a<br />

escola prim·ria com ensino em lÌngua estrangeira, a publicaÁ„o de jornais, revistas,<br />

almanaques, ao fechar muitas das sociedades culturais e recreativas, etc. O objetivo<br />

da campanha de nacionalizaÁ„o era forÁar a assimilaÁ„o por meio da<br />

obrigatoriedade <strong>do</strong> ensino em portuguÍs, supon<strong>do</strong> que isto teria como resulta<strong>do</strong><br />

uma utilizaÁ„o cada vez menor das lÌnguas de origem. E ao proibir qualquer<br />

publicaÁ„o, festa, atividades recreativas, de cunho Ètnico, esperava impor valores<br />

nacionais brasileiros que viesse substituir o sentimento de pertencer a outras<br />

nacionalidades (SEYFERTH, 1990, p·g. 90).<br />

Com isso n„o apenas os italianos sofreram, mas tambÈm os imigrantes alem„es e<br />

japoneses. Na obra de C·tia Dalmolin e o seu presente texto sobre imigrantes e descendentes<br />

no perÌo<strong>do</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> Novo de Santa Maria e Regi„o, quem falasse em lÌngua italiana,<br />

cantasse canÁıes folclÛricas em italiano, jogasse cartas, mora ou bocha 8 , durante este perÌo<strong>do</strong><br />

era denuncia<strong>do</strong> e preso:<br />

8 ìEm to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> e portanto tambÈm no <strong>Brasil</strong> os Italianos apresentam 3 tipos de jogos que se constituem num<br />

folclore caracterÌstico: a) o jogo da MORA; b) o jogo das BOCHAS; c) o jogo de CARTASî (CORRADIN,<br />

1972, p·g. 233).<br />

29


Certamente, dentre to<strong>do</strong>s os casos de prisıes efetuadas naquele perÌo<strong>do</strong>, <strong>do</strong>is<br />

merecem uma atenÁ„o especial. Estranhamente ambos n„o foram divulga<strong>do</strong>s pela<br />

imprensa e encontram-se registra<strong>do</strong>s somente na memÛria popular da Quarta ColÙnia.<br />

O primeiro foi a pris„o de 19 pessoas de Dona Francisca, em junho de 1943, em<br />

Cachoeira <strong>do</strong> Sul. O motivo, segun<strong>do</strong> Alfre<strong>do</strong> Segabinazzi, que foi um <strong>do</strong>s presos na<br />

Època, teria si<strong>do</strong> um baile na casa de Lino Tessele, onde cantavam algumas m˙sicas<br />

que faziam referÍncia ‡s canÁıes <strong>do</strong> folclore italiano, como Quel mazzolin dei fiori e<br />

La Bela Bruneta (DALMOLIN, 2005, p·g. 87)<br />

Segun<strong>do</strong> Dalmolin, atravÈs de entrevistas e depoimentos, alguns eram tortura<strong>do</strong>s e atÈ<br />

morriam na pris„o:<br />

Outro caso retrata<strong>do</strong> por Dalmolin:<br />

Em Vale VÍneto, hoje distrito de S„o Jo„o <strong>do</strong> PolÍsine, tambÈm foram efetuadas<br />

prisıes. O caso mais conheci<strong>do</strong> È o de Serafim Moro, que foi deti<strong>do</strong> tambÈm em<br />

Cachoeira <strong>do</strong> Sul, vin<strong>do</strong> a falecer na pris„o, no dia 19 de fevereiro de 1943 [...] N„o<br />

se sabe ao certo o que aconteceu na pris„o para que tal pessoa viesse a falecer [...]<br />

Mora<strong>do</strong>res da Quarta ColÙnia e, especialmente, de Vale VÍneto, comentam que tal<br />

Ûbito aconteceu em raz„o das torturas e maus-tratos que ele sofrera na pris„o<br />

(DALMOLIN, 2005, p·g. 88)<br />

No interior de Faxinal <strong>do</strong> Soturno, em Santos Anjos, uma professora que lecionava<br />

na localidade era a principal respons·vel pelas den˙ncias. Na vila chegaram a ser<br />

deti<strong>do</strong>s, tambÈm em Cachoeira <strong>do</strong> Sul, os senhores Aquiles Dalasta e o italiano<br />

AntÙnio Ceretta. Este ˙ltimo, segun<strong>do</strong> depoimentos, tambÈm faleceu na pris„o<br />

(DALMOLIN, 2005, p·g. 89).<br />

Logo, alÈm de passarem por dificuldades de sobrevivÍncia, tambÈm passaram por<br />

dificuldades Ètnicas e culturais, sen<strong>do</strong> completamente discrimina<strong>do</strong>s. Portanto para os que<br />

vivenciaram o perÌo<strong>do</strong> da campanha de nacionalizaÁ„o, cantar seus cantos de origem, falar sua<br />

lÌngua materna e observar associaÁıes e festividades italianas sen<strong>do</strong> concretizadas hoje, talvez<br />

tenha um significa<strong>do</strong> muito mais relevante <strong>do</strong> que para as novas geraÁıes que n„o<br />

conheceram e vivenciaram esta histÛria.<br />

30


2.1 OS MOTIVOS DA EMIGRA« O<br />

Em relaÁ„o ao trabalho e atividades que a populaÁ„o da regi„o trentina ou tirolesa<br />

exercia na regi„o Trentino-Alto Adige, Silva apresenta a seguinte nota:<br />

ainda esclarece que uma estatÌstica relativa ao ano de 1890 revelava que 71,10% da<br />

populaÁ„o ativa dessa regi„o tinha como profiss„o a agricultura, e mais 10%,<br />

ìprofiss„o prim·riaî, diversa daquela, mas ligada ao mun<strong>do</strong> rural. Em 1889, o<br />

n˙mero de emigra<strong>do</strong>s legais alÈm-mar chegava a 25.000. No inÌcio <strong>do</strong>s anos 90,<br />

90,7% da populaÁ„o estava alÈm-mar e 8% emigrara temporariamente. A<br />

agricultura e a criaÁ„o constituÌam-se na principal fonte de renda da populaÁ„o<br />

(SILVA, 2001, p·g. 19).<br />

PorÈm nem to<strong>do</strong>s os camponeses possuÌam suas prÛprias terras para a subsistÍncia da<br />

famÌlia na regi„o Trentino-Alto Adige. Muitas vezes trabalhavam em propriedade alheias,<br />

sen<strong>do</strong> que alguns camponeses, em Època de crise migravam, ‡ procura de trabalho, a outros<br />

paÌses. Aproximadamente 25.000 famÌlias da regi„o Trentino-Alto Adige emigraram para a<br />

AmÈrica. Tal emigraÁ„o foi um fato que na Època satisfazia os interesses das trÍs partes: a<br />

It·lia, o camponÍs e o <strong>Brasil</strong>. Para resolver a crise econÙmica da It·lia, era necess·rio que<br />

diminuÌsse o n˙mero de habitantes: ìFoi a prÛpria emigraÁ„o que constituiu um futuro<br />

possÌvel para quem ficouî (SILVA, 2001, p·g. 234). Afirma Silva e acrescenta:<br />

A expuls„o maciÁa era um fato que permitiu a um autor da Època afirmar que ìa<br />

emigraÁ„o, para a It·lia, È uma necessidade. Precisamos que partam de 200 a 300<br />

mil indivÌduos por ano, para que possam encontrar trabalho os que ficam<br />

(LONGHITANO apud SILVA, 2001, p·g. 28).<br />

Por parte <strong>do</strong>s camponeses, era o interesse de sair da misÈria, da exploraÁ„o <strong>do</strong>s <strong>do</strong>nos<br />

de grandes propriedades de terras; alÈm de livrar seus herdeiros de terem que combater nos<br />

campos de guerra. Neste senti<strong>do</strong>, o sonho da AmÈrica, reunia para os camponeses, v·rias<br />

realizaÁıes, a propriedade de terra, a fuga da guerra e fuga da exploraÁ„o por parte <strong>do</strong>s<br />

grandes propriet·rios . Era, no dizer de Silva, a possibilidade de rebelar-se contra a situaÁ„o<br />

que viviam:<br />

De fato, a ìfugaî para a ìMÈricaî manifestava um certo espÌrito de rebeli„o, uma<br />

forma de rebelar-se contra os siori ñ senhores <strong>do</strong>nos de terra. A raiva camponesa,<br />

embora contida devi<strong>do</strong> ‡ moral e Ètica catÛlicas que permeavam as <strong>do</strong> campÙnio,<br />

aparecia em cartas enviadas da AmÈrica e canÁıes populares. A prÛpria AmÈrica<br />

ìse transformou em ësonhoí porque representava a verdadeira liberdade, (...) Neste<br />

sonho estava presente tu<strong>do</strong> o que a classe camponesa anelava: a terra em<br />

abund‚ncia e sobretu<strong>do</strong> de propriedade, mas tambÈm a falta de ricos e <strong>do</strong> seu<br />

sistema social, e enfim a promessa que a famÌlia camponesa teria si<strong>do</strong> finalmente<br />

31


unida e que seu chefe ou o filho n„o teriam si<strong>do</strong> envia<strong>do</strong>s cada quatro ou cinco anos<br />

a combater na guerra. Uma extens„o de terra suficientemente grande, livre de<br />

qualquer vÌnculo, em que pudessem manter a prÛpria famÌlia, era o centro essencial<br />

das esperanÁas camponesas. Esta terra era virgem, n„o conhecia organizaÁıes<br />

sociais, o camponÍs n„o teria encontra<strong>do</strong> aÌ os ëricosí, suas leis e tambÈm isso era<br />

importante para quem tinha si<strong>do</strong> liberta<strong>do</strong> da servid„o da gleba havia menos de<br />

trinta anos e que desde sempre tinha si<strong>do</strong> considera<strong>do</strong> seu inferior ( 2001, p·g. 32).<br />

J· por parte <strong>do</strong> ImpÈrio <strong>Brasil</strong>eiro, o interesse era justamente o desenvolvimento <strong>do</strong><br />

prÛprio paÌs, que segun<strong>do</strong> a vis„o de alguns idealiza<strong>do</strong>res, sÛ seria possÌvel com a inserÁ„o de<br />

pessoas brancas:<br />

As razıes para o estabelecimento de uma polÌtica de imigraÁıes estrangeiras n„o se<br />

resumiam ao setor econÙmico: havia razıes de ordem cultural e Ètnica. A<br />

preocupaÁ„o das elites brasileiras com a proporÁ„o excessivamente grande de<br />

negros e de ìpessoas de corî na composiÁ„o da populaÁ„o brasileira ñ vistos como<br />

um obst·culo ao desenvolvimento <strong>do</strong> PaÌs ñ levou ao desenvolvimento da<br />

ìideologia <strong>do</strong> branqueamentoî, no interior da qual se defendia a importaÁ„o de<br />

brancos, estes, sim, prepara<strong>do</strong>s para o trabalho sÈrio e produtivo. Uma polÌtica de<br />

imigraÁ„o era vista como a ˙nica possibilidade de livrar o <strong>Brasil</strong> da degradaÁ„o<br />

(SILVA, 2001, p·g. 62).<br />

AlÈm desta idÈia de que o paÌs sÛ poderia se desenvolver mediante a inserÁ„o da raÁa<br />

branca, a imigraÁ„o tambÈm seria importante para fazer a ligaÁ„o entre o interior <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> e o<br />

litoral, assim como defender o local de invasıes de outros paÌses. DaÌ porque a escolha feita<br />

pelo governo imperial das ·reas a serem colonizadas. Assim a necessidade de proteÁ„o <strong>do</strong><br />

territÛrio das pretensıes argentinas e a necessidade de abrir vias de comunicaÁ„o, determinou<br />

as ·reas a serem colonizadas (SILVA, 2001, p·g. 64)<br />

Os ˙nicos que n„o demonstravam interesse e foram de certa forma prejudica<strong>do</strong>s com<br />

esta polÌtica de imigraÁ„o, foram os indÌgenas e caboclos. Tanto que os prÛprios indÌgenas<br />

eram considera<strong>do</strong>s uma ameaÁa para os colonos europeus, pois os mesmos, perceben<strong>do</strong> que as<br />

terras onde viviam iam sen<strong>do</strong> apossadas pelos colonos e ten<strong>do</strong> que moverem-se cada vez mais<br />

para o interior <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>, acabaram por fazer parte de um conflito, cujas conseq¸Íncias duram<br />

atÈ hoje. Tais conflitos resultaram em perdas de ambas as partes.<br />

Em Santa Catarina, antes da entrada <strong>do</strong>s trentinos ou tiroleses, vieram os alem„es,<br />

sen<strong>do</strong> que a primeira colÙnia alem„ foi S„o Pedro de Alc‚ntara (1829) (GROSSELLI, 1987,<br />

p·g. 275). PorÈm foi a colÙnia alem„ Blumenau (1850) que teve maior influÍncia junto aos<br />

tiroleses e trentinos que chegaram. O grande idealiza<strong>do</strong>r desta colÙnia foi Dr. Hermann Otto<br />

Blumenau, que tinha como objetivo dividir os lotes de terras e instalar os imigrantes alem„es.<br />

Depois da chegada <strong>do</strong>s trentinos e tiroleses no porto de ItajaÌ, os migrantes se instalavam na<br />

sede da colÙnia Blumenau. Como as terras melhores ficaram para os que chegaram primeiro,<br />

32


os trentinos e tiroleses tiveram que enfrentar a longa caminhada atravÈs das picadas ou via<br />

fluvial para adquirirem novos lotes de terras, este desbravamento era destina<strong>do</strong> para as<br />

margens de Blumenau, ou seja, hoje cidades prÛximas de Blumenau, isto se deve a um ponto<br />

de vista estratÈgico <strong>do</strong> prÛprio Dr. Blumenau, pois como nas margens haviam indÌgenas, os<br />

mesmos eram uma ameaÁa para a prÛpria colÙnia. Os trentinos e tiroleses, neste caso serviram<br />

literalmente de escu<strong>do</strong> para os que haviam chega<strong>do</strong> primeiro na regi„o (SILVA, 2001).<br />

Dentre as causas da emigraÁ„o para a AmÈrica vale ressaltar as constantes disputas<br />

entre o impÈrio austrÌaco e italiano, o que fez com que muitos trentinos se alistassem no<br />

serviÁo militar para a defesa e conquista <strong>do</strong> Trentino. As guerras eram freq¸entes:<br />

O serviÁo militar na It·lia era obrigatÛrio para to<strong>do</strong>s os jovens, durante 6 ou 8 anos.<br />

Ela [It·lia] tambÈm n„o ficou isenta dessas convulsıes polÌticas e de guerras quase<br />

seguidas, especialmente na fase de 1830 a 1870 ( VICENZI, 2000, p·g. 35 e 36 ).<br />

As quedas da produÁ„o da seda e da uva tambÈm contribuÌram para a emigraÁ„o. A<br />

maioria da populaÁ„o era constituÌda de agricultores, a queda <strong>do</strong> cultivo da seda e da uva<br />

devi<strong>do</strong> a <strong>do</strong>enÁas, tais como a epidemia pebrina e a criptÛgama, fez aumentar o interesse em<br />

emigrar para procurar uma vida melhor que propiciasse a prÛpria propriedade de terra sem<br />

estar sujeito a exploraÁ„o <strong>do</strong>s sioris 9 .<br />

A transformaÁ„o econÙmica causada pela revoluÁ„o industrial foi outro fator<br />

importante. Como o grande respons·vel para a emigraÁ„o em massa a transformaÁ„o que a<br />

industrializaÁ„o capitalista causou. Neste senti<strong>do</strong>, o processo migratÛrio deve ser analisa<strong>do</strong><br />

no contexto <strong>do</strong> crescimento <strong>do</strong> capitalismo mundial (SILVA, 2001).<br />

Como os camponeses na maioria das vezes produziam para a sua prÛpria subsistÍncia,<br />

sen<strong>do</strong> que alguns n„o possuÌam suas prÛprias terras para cultivo, trabalhan<strong>do</strong> assim para os<br />

latif˙ndios, chama<strong>do</strong>s de sioris, <strong>do</strong>nos de terras; grande parte da produÁ„o agrÌcola<br />

permanecia aos propriet·rios, restan<strong>do</strong> pouco para a famÌlia <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r camponÍs. Por<br />

isto, muitos agricultores migravam a paÌses vizinhos a procura de um trabalho com maiores<br />

rendimentos:<br />

A emigraÁ„o era um fenÙmeno conheci<strong>do</strong> pelas populaÁıes camponesas trentinas<br />

tambÈm em Èpocas anteriores ‡ segunda metade <strong>do</strong> sÈculo XIX. O camponÍs,<br />

especialmente quan<strong>do</strong> homem, adulto e apto para o trabalho, sabia o que significava<br />

deixar a prÛpria casa em busca de uma ocupaÁ„o que lhe permitisse atingir ‡quela<br />

9 Sioris (Ricos) era o nome que os agricultores trentinos chamavam para aqueles que detinham o poder, tanto<br />

polÌticos como econÙmicos. (GROSSELI, 1987, p·g. 99)<br />

33


enda mÌnima necess·ria ‡ sobrevivÍncia. [...] Em fins de outono muitos homens<br />

aban<strong>do</strong>nan<strong>do</strong> os campos, desciam em direÁ„o a It·lia ou atravessavam os Alpes.<br />

Dirigiam-se, de preferÍncia, para as regiıes italianas limÌtrofes da Lombardia e <strong>do</strong><br />

VÍneto, mas muitos se aventuravam mais ao sul, na EmÌlia, Romanha, Toscana,<br />

Esta<strong>do</strong>s pontifÌcios. Outros se dirigiam para o Tirol alem„o e para a SuÌÁa<br />

(GROSSELLI, 1987, p·g. 75).<br />

A emigraÁ„o, portanto n„o È simplesmente a procura pelo melhor e sim tambÈm um<br />

ato de oposiÁ„o ‡s transformaÁıes econÙmicas que aconteciam, tais aspectos tambÈm s„o<br />

descritos em algumas canÁıes Ìtalo-trentinas:<br />

...como ˙ltima resposta, a emigraÁ„o, que mesmo sen<strong>do</strong> uma fuga da misÈria cruel<br />

que devastava algumas regiıes da It·lia, n„o deixou de ter um car·ter polÌtico. Esse<br />

aspecto È nÌti<strong>do</strong> nas canÁıes e poesias populares [grifo meu] que acompanhavam<br />

os viajantes sem volta: nelas se vÍ claramente que a emigraÁ„o n„o era sÛ a busca<br />

<strong>do</strong> El<strong>do</strong>ra<strong>do</strong>, mas uma recusa em continuar sob exploraÁ„o (SILVA, 2001, p·g. 30).<br />

A exploraÁ„o da m„o de obra <strong>do</strong> agricultor tambÈm foi uma influÍncia para o Íxo<strong>do</strong>.<br />

Tal indignaÁ„o <strong>do</strong>s agricultores trentinos devi<strong>do</strong> ‡ exploraÁ„o que se sujeitavam <strong>do</strong>s<br />

latifundi·rios, est· descrito em um canto, depoimento cita<strong>do</strong> por Vicenzi sobre a chegada <strong>do</strong>s<br />

primeiros trentinos ao porto de ItajaÌ:<br />

ApÛs quase <strong>do</strong>is meses de viagem, chegavam finalmente ao seu destino. O ponto<br />

final estava ‡ vista. ItajaÌ se aproximava...Reanima<strong>do</strong>s por t„o grato evento,<br />

saudavam incessantemente com vivas de alegria a nova terra <strong>do</strong>s seus sonhos. ñ<br />

ìLa Mericaî, como eles a chamavam, estava prÛxima. ìViva la Merica...Ecco la<br />

liberta...Ecco la nostra speranza!...î Uns choravam emociona<strong>do</strong>s, outros agitavam<br />

sues lenÁos e outros entoavam cantos. ñ ìQuan<strong>do</strong> saremo in Merica, in Merica<br />

vederemo: I siori i mena grassa e lÍ siore lÍ zapa s˘...î ñ Quan<strong>do</strong> chegarmos na<br />

AmÈrica, na AmÈrica haveremos de ver, os senhores (<strong>do</strong> Tirol) carregan<strong>do</strong> esterco e<br />

as senhoras a capinar...( VICENZI, 2000, p·g. 45 e 47 ).<br />

Grosselli tambÈm apresenta que muitos cantos foram cria<strong>do</strong>s devi<strong>do</strong> ao<br />

descontentamento entre a classe de agricultores e a burguesia que possuÌam as terras:<br />

ìAos ricos <strong>do</strong> Tirol/ nÛs lhe daremos a enxada/ a enxada e tambÈm a p·/ depois iremos ao<br />

<strong>Brasil</strong>/ a beber o bom vinho./ Os ricos a conduzir os bois/ as ricas o ara<strong>do</strong>/ e os camponeses<br />

na AmÈrica / a beber o vinho novoî (GROSSELLI, 1987, p·g.100).<br />

Acrescenta ainda que esta canÁ„o È conhecida ainda hoje nas zonas de emigraÁ„o de<br />

Santa Catarina, onde foi acrescenta<strong>do</strong> uma nova estrofe que fala da vontade de fazer <strong>do</strong>s<br />

bigodes <strong>do</strong>s senhores (patrıes) muitas escovas para ilustrar as botas <strong>do</strong>s camponeses. O<br />

34


grande aspecto a ser destaca<strong>do</strong> que Grosselli est· demonstran<strong>do</strong> È o car·ter composicional da<br />

m˙sica, agricultores trentinos crian<strong>do</strong> novas estrofes para a canÁ„o em terras catarinenses.<br />

A publicidade a respeito <strong>do</strong>s locais que ofereciam o estabelecimento de migrantes foi<br />

tambÈm uma grande influencia no aumento <strong>do</strong> interesse por parte daqueles que desejavam<br />

emigrar. As agÍncias de colonizaÁ„o representavam ser a AmÈrica como um perfeito …den,<br />

onde o mel escorria das ·rvores e a terra produzia por si sÛ. AlÈm disto, prometiam<br />

gratuitamente a habitaÁ„o de lotes de terras com ferramentas para trabalho e sementes para a<br />

agricultura (LEDRA, 1989). Um <strong>do</strong>s motivos que aumentou a intensificaÁ„o da imigraÁ„o de<br />

italianos em Santa Catarina, foi o contrato firma<strong>do</strong> entre o ImpÈrio <strong>Brasil</strong>eiro e Joaquim<br />

Caetano Pinto J˙nior no ano de 1874, tinha por objetivo introduzir em um prazo de 10 anos a<br />

quantidade de 100.000 imigrantes europeus, dentre eles estavam Alem„es, AustrÌacos, SuÌÁos,<br />

Italianos <strong>do</strong> norte, Bascos, Belgas, Suecos, Dinamarqueses e Franceses. E segun<strong>do</strong> Piazza em<br />

termos de polÌtica imigratÛria, talvez tenha si<strong>do</strong> o maior contrato havi<strong>do</strong> na HistÛria <strong>do</strong> <strong>Brasil</strong>.<br />

(PIAZZA, 1982).<br />

35


2.2 A FORMA« O DAS COL‘NIAS<br />

N„o È possÌvel afirmar que as primeiras colÙnias trentinas s„o as atuais cidades de<br />

Nova Trento, Rio <strong>do</strong>s Cedros e Rodeio. Pois se sabe que a ocupaÁ„o <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>, assim como<br />

as divisıes polÌtico administrativas foram se delimitan<strong>do</strong> com o passar <strong>do</strong> tempo, È o que<br />

demonstra a ilustraÁ„o 08 os migrantes chegavam nos portos <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> e assim se dirigiam<br />

para o interior, ou se estabeleciam no lugar de chegada.<br />

36


IlustraÁ„o 08: Primeiras colÙnias italianas de SC.<br />

Fonte: (PIAZZA,1982, p·g.168).<br />

Em 1875, inÌcio da imigraÁ„o trentina na maior parte <strong>do</strong> <strong>Brasil</strong>, muitas famÌlias<br />

devi<strong>do</strong> ao cansaÁo da viagem transoce‚nica, se estabeleceram em outras regiıes, demonstra<strong>do</strong><br />

no trecho a seguir:<br />

37


O navio que trazia o 1 grupo de imigrantes Ìtalo-trentinos, zarpou <strong>do</strong> porto de<br />

Trieste, em vÈsperas de Natal de 1874. [...] Depois de trÍs dias de folga, o navio j·<br />

bem abasteci<strong>do</strong>, fez-se ao largo. Ao chegar ‡s costas <strong>do</strong> EspÌrito Santo, o<br />

comandante man<strong>do</strong>u entrar no porto de VitÛria, para corrigir pequenas avarias <strong>do</strong><br />

barco. Em VitÛria desembarcaram duas famÌlias. Dirigiram-se para a fazenda<br />

Santa Teresa, onde se haveriam de empregar e dar inÌcio ‡ sua nova vida. [...] Em<br />

Santos atracou novamente. Neste ponto desembarcaram trÍs famÌlias. Eram os<br />

Tafner, os Slomp e os Perini, que se dirigiram para S„o Paulo, mas logo em seguida<br />

haveriam de voltar para Santa Catarina, em Rio <strong>do</strong>s Cedros, junto com aquele 1<br />

grupo, com o qual viajaram. De santos para diante, a viagem transcorreu num<br />

clima de profunda nostalgia. Os passageiros estavam cansa<strong>do</strong>s e aborreci<strong>do</strong>s. O<br />

n˙meros deles havia diminuÌ<strong>do</strong> com a permanÍncia de diversas famÌlias em VitÛria<br />

e em Santos (VICENZI, 2000, p·g. 45 e 47).<br />

O mesmo processo aconteceu no Esta<strong>do</strong> Catarinense, pois muitas famÌlias trentinas se<br />

dirigiram para regiıes prÛximas de sua chegada, o que impossibilita afirmar com certeza de<br />

qual colÙnia se formou primeiro.<br />

O livro HistÛria de Santa Catarina, de Oswal<strong>do</strong> Rodrigues Cabral, demonstra que<br />

antes de 1875 houve uma tentativa de colonizaÁ„o italiana, sen<strong>do</strong> esta considerada a segunda<br />

colÙnia, Nova Trento:<br />

A primeira tentativa <strong>do</strong> estabelecimento de colonos italianos na ProvÌncia data de<br />

1836, com a fundaÁ„o da ColÙnia Nova It·lia ou Dom Afonso, nas proximidades da<br />

Freguesia de S„o Jo„o Batista, ent„o pertencen<strong>do</strong> ao municÌpio de S„o Miguel. [...]<br />

Cento e oitenta colonos sar<strong>do</strong>s foram encaminha<strong>do</strong>s para as referidas terras ñ e<br />

nisto ficou to<strong>do</strong> o movimento, que n„o foi segui<strong>do</strong> por nenhuma outra entrada de<br />

imigrantes. A firma n„o cumpriu as cl·usulas <strong>do</strong> contrato e, em 1845 as terras<br />

foram declaradas devolutas e a concess„o caduca, quan<strong>do</strong> grande parte <strong>do</strong>s colonos<br />

daquela ˙nica leva j· se havia retira<strong>do</strong> para outros lugares, muitos deles<br />

desanima<strong>do</strong>s com as incursıes <strong>do</strong>s silvÌcolas, bem como em conseq¸Íncia de uma<br />

grande enchente, ocorrida em 1838. [...] Foi esta a primeira e ˙nica tentativa<br />

verificada na primeira metade <strong>do</strong> sÈculo XIX. Nova Trento foi a segunda colÙnia<br />

italiana constituÌda em Santa Catarina e os seus comeÁos sÛ se verificariam no<br />

inÌcio <strong>do</strong> ˙ltimo quartel <strong>do</strong> sÈculo passa<strong>do</strong>. Situada no vale <strong>do</strong> rio Tijucas, a sua<br />

instalaÁ„o, entretanto, liga-se intimamente ‡ vida da ColÙnia Brusque (CABRAL,<br />

1970, p·g. 118).<br />

Na tese de <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> de Bernardi a respeito da imigraÁ„o italiana de Santa Catarina,<br />

divide em quatro momentos, sen<strong>do</strong> os <strong>do</strong>is primeiros relaciona<strong>do</strong>s com a formaÁ„o da<br />

primeira tentativa de imigraÁ„o italiana (colÙnia Nova It·lia) e da formaÁ„o <strong>do</strong>s municÌpios<br />

de Nova Trento, Rio <strong>do</strong>s Cedros e Rodeio:<br />

O primeiro momento foi a chegada de um grupo de imigrantes oriun<strong>do</strong>s da ilha de<br />

Sardenha, em 1836, que formou a colÙnia Nova It·lia, no vale <strong>do</strong> Rio Tijucas. No<br />

segun<strong>do</strong> momento, em decorrÍncia da polÌtica imperial de colonizaÁ„o com<br />

imigrantes europeus, especialmente em funÁ„o de contrato com Joaquim Caetano<br />

Pinto J˙nior, em 1875, aportaram imigrantes italianos que fundaram a ColÙnia<br />

Blumenau (nos atuais municÌpios de Rio <strong>do</strong>s Cedros, Rodeio, Ascurra, Api˙na etc.)<br />

38


e, em 1875, a ColÙnia Brusque (atualmente Botuver·, Nova Trento, Luiz Alves<br />

etc.) (BERNARDI, 2003, p·g. 52).<br />

Logo, como tambÈm demonstra<strong>do</strong> na ilustraÁ„o 09, os migrantes Ìtalo-trentinos que<br />

foram em direÁ„o a colÙnia Blumenau, movimentaram-se para regiıes vizinhas que hoje<br />

constituem novos municÌpios, dentre eles Rio <strong>do</strong>s Cedros e Rodeio. J· para aqueles que se<br />

dirigiram para a colÙnia Brusque, tambÈm se movimentaram para regi„o vizinha, que tambÈm<br />

constituÌram novos municÌpios, dentre eles Nova Trento. A ilustraÁ„o a seguir procura<br />

retratar a descriÁ„o anterior:<br />

IlustraÁ„o 09: Esta<strong>do</strong> de Santa Catarina e os atuais municÌpios de Nova Trento, Rio <strong>do</strong>s<br />

Cedros e Rodeio.<br />

A import‚ncia È que estes trÍs municÌpios, Nova Trento, Rio <strong>do</strong>s Cedros e Rodeio, s„o<br />

fortemente caracteriza<strong>do</strong>s como colÙnias italianas, sejam em sua maioria da populaÁ„o<br />

migrantes trentinos, tiroleses ou atÈ mesmo de outras regiıes da It·lia. Isto est· claramente<br />

visÌvel nas festividades que os mesmos municÌpios fazem a cada ano. Alguns exemplos de<br />

divulgaÁ„o da festa est„o mostra<strong>do</strong>s a seguir:<br />

39


IlustraÁ„o 10: Folheto de divulgaÁ„o da 18 festa trentina, municÌpio de Rio <strong>do</strong>s Cedros<br />

Fonte: (Folheto da 18 Festa <strong>Trentina</strong>, elabora<strong>do</strong> pelo CÌrculo Trentino de Rio <strong>do</strong>s Cedros,<br />

2007).<br />

40


IlustraÁ„o 11: Folheto de divulgaÁ„o da 19 festa La Sagra, municÌpio de Rodeio<br />

Fonte: (Folheto da 19 Festa La Sagra, elabora<strong>do</strong> pelo CÌrculo Trentino de Rodeio, 2007).<br />

41


2.3 A RELIGI O DO ÕTALO-TRENTINO<br />

A religi„o catÛlica esteve fortemente caracterizada entre os imigrantes Ìtalo-trentinos<br />

como demonstra Silva:<br />

A moral camponesa [trentina] era a moral catÛlica, e a ˙nica verdadeira autoridade<br />

reconhecida pelo camponÍs [trentino] se identificava com a hierarquia eclesi·stica.<br />

A autoridade estatal era pura contingÍncia histÛrica: n„o era o Kaiser a suprema<br />

autoridade, mas o Papa de Roma (GROSSELLI apud SILVA, 2001).<br />

Mas a falta de uma representaÁ„o religiosa oficial (padre) fora significativa logo apÛs a<br />

chegada <strong>do</strong>s imigrantes Ìtalo-trentinos em Santa Catarina. Com a intenÁ„o de preencher este<br />

vazio religioso, os prÛprios imigrantes construÌam suas capelas, sen<strong>do</strong> que as primeiras<br />

capelas foram construÌdas com folhas de guaricanas (espÈcie de palmito) e somente depois<br />

substituÌdas por madeira e alvenaria. Como no inÌcio n„o havia a presenÁa de um padre, os<br />

prÛprios Ìtalo-trentinos elegiam uma pessoa para improvisar a celebraÁ„o de uma cerimÙnia<br />

religiosa (missa), geralmente a pessoa escolhida pelo grupo era considerada a mais instruÌda e<br />

inteligente:<br />

(...) era costume, como faziam em suas comunas na It·lia, escolher um homem<br />

virtuoso e idÙneo para presidir as funÁıes religiosas. Era chama<strong>do</strong> de prevosto, que<br />

em portuguÍs seria ìcapel„oî. Rezavam todas as oraÁıes em latim e em italiano.<br />

Os c‚nticos eram quase to<strong>do</strong>s em italiano e outros em latim, como as ladainhas,<br />

Veni Creator, Miserere, Magnificat. (...) Assim paramenta<strong>do</strong>, estava tambÈm<br />

sempre presente aos sepultamentos. Cantava-se o Miserere, Libera Me e<br />

recitava-se o De Profundis [grifos meus] (SILVA, 2001, p·g. 79).<br />

Como È nota<strong>do</strong> na citaÁ„o anterior, durante a cerimÙnia os cantos eram reproduzi<strong>do</strong>s<br />

em lÌngua italiana e tambÈm em latim, que fazem parte <strong>do</strong>s cantos especÌficos da liturgia<br />

romana. Segun<strong>do</strong> Pargolesi cita<strong>do</strong> por Macchiarella (ver citaÁ„o p·gina 47), que faz uma<br />

descriÁ„o genÈrica de algumas caracterÌsticas musicais <strong>do</strong> canto tradicional no Trentino, os<br />

cantos tradicionais trentinos recordam certos cantos lit˙rgicos da igreja. Possivelmente os<br />

cantos cria<strong>do</strong>s fora dela (cantos tradicionais), foram influencia<strong>do</strong>s pelos cantos lit˙rgicos.<br />

religiosas:<br />

Outros tÌtulos de cantos tambÈm s„o cita<strong>do</strong>s por Silva atravÈs das cerimÙnias<br />

A Semana Santa <strong>do</strong>s colonos era comemorada solenemente: no Domingo havia a<br />

prociss„o de ramos, com cantos entoa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> melhor mo<strong>do</strong> possÌvel. Nos ˙ltimos<br />

dias rezava-se o OfÌcio das Trevas, sen<strong>do</strong> os salmos executa<strong>do</strong>s com melodia<br />

42


simplificada; as imagens encontravam-se cobertas e em lugar <strong>do</strong>s sinos e<br />

campainhas, soava a matraca ñ a ëracolaí <strong>do</strong>s colonos. Na Sexta-Feira Santa havia<br />

a Via-Crucis solene e o beijo da cruz. O <strong>do</strong>mingo de P·scoa pouco diferia <strong>do</strong>s<br />

demais <strong>do</strong>mingos [...] Em diversos lugares o padre leigo [n„o oficial] celebrava<br />

tambÈm a missa <strong>do</strong>minical: A piedade audiovisual <strong>do</strong> imigrante pouco tinha a dizer<br />

quanto ao cunho teolÛgico-jurÌdico da cerimÙnia, interessan<strong>do</strong>-lhe sobretu<strong>do</strong> o<br />

aspecto externo. O padre-leigo surgia paralelamente e, apÛs o sinal da cruz, em<br />

latim, fazia as oraÁıes iniciais da missa, ‡s quais seguiam-se o Kyrie, o GlÛria, o<br />

Cre<strong>do</strong>, o Sanctus e o Agnus Dei, canta<strong>do</strong>s pelo coro e entremea<strong>do</strong>s de outras<br />

oraÁıes [grifos meus], alÈm <strong>do</strong> serm„o. N„o havia consagraÁ„o e comunh„o, mas<br />

dava-se a benÁ„o final e a assemblÈia sentia-se satisfeita com a solenidade, que se<br />

encerrava com o Dio sia benedetto (SILVA, 2001, p·g. 81)<br />

Em um depoimento a respeito da construÁ„o de uma nova igreja, s„o aponta<strong>do</strong>s por<br />

Silva outros tÌtulos de cantos:<br />

A instalaÁ„o da igreja foi realizada solenemente em abril de 1915 pelo padre<br />

Modestino Oeschtering. De acor<strong>do</strong> com Deretti, ìtoda a populaÁ„o estava<br />

presente, entoan<strong>do</strong> Te deum Laudamos, Lodate Maria, Dolce Cuor del mio<br />

Ges˙ e outros c‚nticos italianos [grifos meus]. O padre Modestino proferiu breve<br />

alocuÁ„o em italiano, felicitan<strong>do</strong> a populaÁ„oî (SILVA, 2001, p·g. 93 e 94).<br />

Os religiosos oficiais que existiam no inÌcio da imigraÁ„o Ìtalo-trentina eram os de<br />

origem alem„ (franciscanos). E as escolas paroquiais eram os principais locais respons·veis<br />

pela educaÁ„o da comunidade. Devi<strong>do</strong> as divergÍncias entre os franciscanos e os Ìtalo-<br />

trentinos, causadas pela reformulaÁ„o educacional <strong>do</strong>s franciscanos e tambÈm por questıes<br />

culturais, houve conflitos entre ambas as partes que preocupava as autoridades. Para resolver<br />

esta situaÁ„o o governo italiano em 1916 interveio com o envio de padres italianos<br />

(salesianos) que segun<strong>do</strong> Bonatti e Lenzi foram quatro padres: ì J· em outubro <strong>do</strong> mesmo ano<br />

[1916] era confirma<strong>do</strong> o embarque de quatro padres salesianos, que iriam atender os fiÈis das<br />

parÛquias de populaÁ„o italiana no Vale <strong>do</strong> ItajaÌ î (BONATTI; LENZI, 2006, p·g. 124).<br />

A partir da chegada (1916) <strong>do</strong>s salesianos, foram os mesmos os principais<br />

respons·veis pelas cerimÙnias religiosas e tambÈm pela educaÁ„o das novas geraÁıes Ìtalo-<br />

brasileiras em Santa Catarina.<br />

43


3 AS MANIFESTA«’ES EXPRESSIVAS MUSICAIS<br />

Como È nota<strong>do</strong> no primeiro capÌtulo, vale ressaltar que as an·lises feitas neste trabalho<br />

s„o de certa forma delimita<strong>do</strong>ras pela identificaÁ„o da m˙sica estudada com um certo<br />

territÛrio e com uma histÛria comum por parte daqueles que cantam e se identificam com este<br />

tipo de m˙sica. No entanto concordamos com Carvalho, para quem, a atribuiÁ„o de limites<br />

n„o passa de um h·bito <strong>do</strong> pensamento diz ele: ìquan<strong>do</strong> se pensa o mun<strong>do</strong> a partir de um<br />

centro, postula-se a existÍncia de uma fronteira: para<strong>do</strong>xalmente, essa fronteira parece<br />

esfumar-se quan<strong>do</strong> dela tentamos nos aproximarî (CARVALHO, 1994, p·g. 4).<br />

AlÈm da delimitaÁ„o territorial, o trabalho tambÈm est· foca<strong>do</strong> em uma determinada<br />

identificaÁ„o Ètnica, a italiana. A disciplina que relaciona m˙sica e etnia È a Etnomusicologia.<br />

Esta disciplina, segun<strong>do</strong> Bernardi surgiu recentemente: ìEm 1956, uma convenÁ„o de<br />

estudiosos da FiladÈlfia decidiu renomear a disciplina Musicologia Comparada por<br />

Etnomusicologia, atribuin<strong>do</strong>-lhe, como objeto especÌfico, o estu<strong>do</strong> das m˙sicas originadas em<br />

tradiÁ„o oralî (2003, p·g.115).<br />

Segun<strong>do</strong> Bruno Nettl, era de costume os etnomusicÛlogos da primeira metade <strong>do</strong> sÈc.<br />

XX considerarem a m˙sica como fenÙmeno est·tico, ausente de mudanÁas, sem estar sujeita a<br />

transformaÁıes com o passar <strong>do</strong> tempo:<br />

De fato, poderia descrever a atitude da profiss„o de etnomusicÛlogo mais ou<br />

menos assim: a Etnomusicologia era o estu<strong>do</strong> das m˙sicas est·ticas, que n„o<br />

mudavam, a n„o ser se induzidas por forÁas externas, e os resulta<strong>do</strong>s da mudanÁa<br />

deveriam ser ignora<strong>do</strong>s (NETTL, 2006, p·g.13).<br />

O contr·rio ocorria com a Musicologia histÛrica, que visava mudanÁas e inovaÁıes em<br />

um determina<strong>do</strong> estilo musical. Nettl afirma que este tipo de concepÁ„o acabava por excluir<br />

aqueles que n„o inovavam. J· a partir de 1950, as concepÁıes mudam, os etnomusicÛlogos<br />

passam a considerar o fator din‚mico que a prÛpria m˙sica carrega, sen<strong>do</strong> o principal tÛpico<br />

para os etnomusicÛlogos e os historia<strong>do</strong>res em M˙sica que n„o deixam de visar as mudanÁas.<br />

A preservaÁ„o, ent„o, passa a ser destaque nos estu<strong>do</strong>s de fontes prim·rias. Como a mudanÁa<br />

passa a ser um <strong>do</strong>s principais focos <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> etnomusicolÛgico, v·rias indagaÁıes surgiram a<br />

44


espeito afirma Nettl: ìo que muda (ou È muda<strong>do</strong>)? Como abordar os v·rios tipos de<br />

mudanÁa? O que faz com que as pessoas mudem (ou n„o) sua m˙sica? Como a mudanÁa<br />

musical se relaciona com a mudanÁa cultural?î (NETTL, 2006, p·g. 14) TambÈm ¥varios<br />

pesquisa<strong>do</strong>res procuraram elaborar formulaÁıes teÛricas sobre a mudanÁa. Segun<strong>do</strong> Alan<br />

Merriam cita<strong>do</strong> por Nettl, o ponto de partida estaria em fazer a distinÁ„o entre a mudanÁa que<br />

ocorre devi<strong>do</strong> ao contato com outras culturas e a mudanÁa devi<strong>do</strong> a fatores internos da<br />

cultura. ApÛs 1970 os etnomusicÛlogos passam a focar a mudanÁa que ocorre devi<strong>do</strong> o<br />

contato com as demais culturas. Os pesquisa<strong>do</strong>res passaram a sugerir tipologias de mudanÁas.<br />

Nettl apresenta um conceito que se chama ëenergia musicalí:<br />

[...] sugeri um conceito que chamei de ëenergia musicalí, como uma constante<br />

dentro da qual mudanÁas e continuidades de estilo, repertÛrio, tecnologia e aspectos<br />

<strong>do</strong>s componentes sociais da m˙sica s„o manipuladas por uma sociedade, a fim de<br />

acomodar as necessidades tanto de mudanÁa quanto de continuidade (NETTL,<br />

2006, p·g. 16).<br />

Um ponto interessante destaque nas experiÍncias de Nettl, È que o prÛprio conceito de<br />

mudanÁa pode possuir valores e funÁıes diferentes dependen<strong>do</strong> de cada contexto cultural.<br />

Sobre mudanÁa musical atravÈs de quatro contextos culturais distintos: os Black Foot (PÈ-<br />

Preto, povo nativo da planÌcie central da AmÈrica <strong>do</strong> Norte), a m˙sica carn·tica de Madras, a<br />

Escola de M˙sica da Universidade de Illinois e a m˙sica de Teer„ na PÈrsia.<br />

Algumas conclusıes afirmadas por Nettl: ìessas quatro culturas pensam de mo<strong>do</strong><br />

diferente sobre o que constitui principalmente a mudanÁa musical [...]. A estabilidade e a<br />

mudanÁa musicais constituem valores estÈticos e talvez Èticosî (NETTL, 2006, p·g. 21)<br />

Para os Black Foot a mudanÁa musical ocorre pelo acrÈscimo de novas canÁıes, a<br />

expans„o <strong>do</strong> repertÛrio que segun<strong>do</strong> o informante questiona<strong>do</strong> por Nettl cerca de 100 novas<br />

m˙sicas chegam a reserva e somente substituem as antigas. J· a mudanÁa musical da Escola<br />

de M˙sica da Universidade de Illinois, ocorre pelo acrÈscimo de novos elementos estilÌsticos,<br />

que segun<strong>do</strong> Nettl genericamente n„o È uma caracterÌstica desta escola mas sim da cultura<br />

musical acadÍmica da AmÈrica <strong>do</strong> Norte. J· em Madras, o informante considera a mudanÁa<br />

musical aquela que È alterada pela influencia de elementos que constituem uma outra cultura,<br />

no caso a fus„o com a harmonia da m˙sica ocidental por exemplo, vin<strong>do</strong> a alterar a pr·tica<br />

interpretativa. Segun<strong>do</strong> o informante questiona<strong>do</strong> por Nettl, instrumentos musicais ocidentais<br />

na m˙sica carn·tica s„o aceit·veis desde que a m˙sica soe como eles (povo nativo da regi„o)<br />

queiram. Para a m˙sica Persa algumas mudanÁas musicais s„o destacadas: o sistema b·sico<br />

(radif), experimentaÁ„o de mo<strong>do</strong>s e sub-mo<strong>do</strong>s diferentes, sons tipicamente ocidentais, novas<br />

45


teorias, ensino da m˙sica em diversas instituiÁıes distintas, menos improvisaÁ„o, mudanÁa da<br />

afinaÁ„o para a escala crom·tica. Segun<strong>do</strong> Nettl essas mudanÁas musicais para os Black Foot<br />

e os acadÍmicos da Escola de M˙sica da Universidade de Illinois n„o eram vistos de forma<br />

negativa, sen<strong>do</strong> considerada a mudanÁa algo natural. Para os persas as mudanÁas ocorreram<br />

para preservar o sistema b·sico. J· para o informante de Madras a mudanÁa È vista como algo<br />

ruim.<br />

Neste capÌtulo procurei identificar algumas pesquisas que foram realizadas sobre as<br />

manifestaÁıes expressivas musicais no sÈculo XIX e inÌcio <strong>do</strong> sÈculo XX no territÛrio<br />

trentino, pois foi o perÌo<strong>do</strong> em que ocorreu o Íxo<strong>do</strong> para a AmÈrica. De acor<strong>do</strong> com as<br />

estatÌsticas de Piazza, foi aproximadamente de 1870 atÈ 1930 o perÌo<strong>do</strong> mais significativo da<br />

imigraÁ„o italiana. Diante disto apresentarei algumas caracterÌsticas da m˙sica deste perÌo<strong>do</strong><br />

para mais adiante fazer uma comparaÁ„o com as manifestaÁıes musicais observadas no<br />

<strong>Brasil</strong>.<br />

46


3.1 AS PESQUISAS SOBRE A M⁄SICA TRENTINA DE TRADI« O ORAL<br />

Ignazio Macchiarella, na obra Introduzione al Canto di Tradizione Orale nel<br />

Trentino(1999), realiza uma an·lise da bibliografia que vai <strong>do</strong> sÈculo XIX atÈ a ˙ltima dÈcada<br />

<strong>do</strong> sÈculo XX, sobre a m˙sica popular no Trentino-Alto Adige. Este autor faz tambÈm uma<br />

proposta de an·lise musical e de transcriÁ„o musical. As pesquisas sobre a m˙sica de tradiÁ„o<br />

oral da regi„o Trentino-Alto Adige iniciaram-se j· no inÌcio <strong>do</strong> sÈculo XIX, neste perÌo<strong>do</strong> a<br />

regi„o pertencia ao ImpÈrio Austro-H˙ngaro 10 . PorÈm tais pesquisas relatavam em grande<br />

parte observaÁıes individuais <strong>do</strong>s cantos, instrumentos musicais e coleta <strong>do</strong>s textos verbais;<br />

n„o havia muitas informaÁıes a respeito da execuÁ„o musical. O principal objetivo era a<br />

coleta <strong>do</strong>s textos <strong>do</strong>s cantos, pois para os pesquisa<strong>do</strong>res <strong>do</strong> sÈculo XIX, canto popular<br />

equivalia ‡ poesia popular, sem grandes consideraÁıes a respeito da execuÁ„o musical:<br />

Como È conheci<strong>do</strong> o interesse <strong>do</strong>s folcloristas <strong>do</strong> sÈculo XIX no estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> canto<br />

popular È endereÁa<strong>do</strong> exclusivamente ao texto verbal <strong>do</strong>s cantos, tanto que a mesma<br />

definiÁ„o canto popular equivale a poesia popular e n„o tem nenhuma consideraÁ„o<br />

a execuÁ„o musical (MACCHIARELLA, 1999, p·g 25, traduzi<strong>do</strong> por Maria<br />

Salete Santos Silva). 11<br />

O fato da regi„o estar sobre <strong>do</strong>mÌnio <strong>do</strong> impÈrio Austro-H˙ngaro atÈ 1918, fez com<br />

que algumas pesquisas, fossem feitas por estudiosos e pesquisa<strong>do</strong>res austrÌacos, sen<strong>do</strong> que<br />

tais pesquisas sobre a regi„o Trentino-Alto Adige, que hoje pertence ‡ It·lia, s„o de<br />

propriedade austrÌaca (MACCHIARELLA, 1999). Uma das pesquisas foi a coordenada pelo<br />

austrÌaco Joseph Von Sonnleithner (MACCHIARELLA, 1999), o mÈto<strong>do</strong> que ele utilizou foi<br />

o envio de um question·rio para as autoridades trentinas, perguntan<strong>do</strong> sobre quais eram os<br />

cantos, melodias e danÁas mais freq¸entes na regi„o. A pesquisa n„o obteve muitos<br />

resulta<strong>do</strong>s, devi<strong>do</strong> ‡ falta de colaboraÁ„o por parte de algumas autoridades. PorÈm os<br />

resulta<strong>do</strong>s obti<strong>do</strong>s se encontram em quatro fascÌculos onde em um deles est· o primeiro<br />

registro <strong>do</strong>cumental sobre a m˙sica popular desta regi„o:<br />

Tais <strong>do</strong>cumentos, hoje conserva<strong>do</strong>s em quatro fascÌculos no arquivo da<br />

Gesellschaft der Musikfreunde de Viena (n. XXI, XXII, XXIII e XXIV della<br />

Sonnleithner- Sammlung) transformam-se em importante valor <strong>do</strong>cument·rio. O<br />

primeiro fascÌculo (n. XXI) foi estuda<strong>do</strong> e reproduzi<strong>do</strong> por Antonio Carlini. Trata-<br />

10 ìApÛs muitos sÈculos, mais de um milÍnio de lutas polÌticas, a ¡ustria e a Hungria se uniram e formaram, em<br />

1867, um impÈrio dual com parlamentos e governo prÛprios, o ImpÈrio Austro-H˙ngaroî (BONATTI; LENZI,<br />

2006, p·g. 21)<br />

11 ìcomo Ë noto, l`intereese dei folkloristi ottocenteschi nello studio del canto popolare Ë indirizzato<br />

esclusivamente al texto verbale dei canti, tanto che la stessa definizione canto popolare equivale a poesia<br />

popolare e non tiene in nessuna considerazione l`esecuzione musicaleî (MACCHIARELLA,1999, p·g 25).<br />

47


se de uma coleÁ„o de vinte e uma melodias certamente desunte 12 da execuÁ„o, isto<br />

È apresentada ao vivo e n„o copiada da origem impressa [...] [que] constitui o<br />

primeiro n˙cleo <strong>do</strong>cumenta<strong>do</strong> da m˙sica popular e de uso popular no Trentino. As<br />

melodias guardam verdadeiramente execuÁıes violinÌsticas sem acompanhamento<br />

(MACCHIARELLA, 1999, p·g 22 e 23, traduzi<strong>do</strong> por Maria Salete S. Silva). 13<br />

Na segunda metade <strong>do</strong> sÈculo XIX, um <strong>do</strong>s pesquisa<strong>do</strong>res mais significativos foi<br />

Nepomuceno Bolognini (MACCHIARELLA, 1999) que teve como foco a forma da canÁ„o<br />

Maitinade. A Maitinade È uma canÁ„o de romance, uma serenata onde o namora<strong>do</strong> cantor e<br />

os instrumentistas ficam tocan<strong>do</strong> abaixo da janela onde est· situada a bela dama. Seus relatos<br />

afirmam que este tipo de canÁ„o È semelhante a outras regiıes da It·lia:<br />

Concluin<strong>do</strong> seu estu<strong>do</strong> Bolognini afirma: A maior parte strambotti maitinade temos<br />

tambÈm em comum nÛs [trentinos] com todas as provÌncias italianas iguais aquelas<br />

que s„o cantadas na SicÌlia, em N·poles, na Toscana, Piemonte, Romagna, Veneto<br />

etc... com pouca diferenÁa de forma ( MACCHIARELLA, 1999, p·g 27, traduzi<strong>do</strong><br />

por Maria Salete S. Silva). 14<br />

Uma das caracterÌsticas que os pesquisa<strong>do</strong>res apresentam nos estu<strong>do</strong>s sobre os cantos<br />

que ocorriam no Trentino, È a atribuiÁ„o de categorias para os mesmos, isto est· demonstra<strong>do</strong><br />

nas obras e È o caso <strong>do</strong> trabalho de Bolognini que conforme indica Macchiarella:<br />

Tais materiais s„o subdividi<strong>do</strong>s em oito categorias: maitinade; cantos de recrutas;<br />

cantos de amor e de paquera; cantos narrativos e danÁa<strong>do</strong>s; cantos de trabalho<br />

masculinos; cantos femininos referentes a fiaÁ„o; cantos referentes a gravidez, ao<br />

parto e a inf‚ncia; enfim canÁonetas e estorinhas de paqueras ( MACCHIARELLA,<br />

1999, p·g 30, traduzi<strong>do</strong> por Maria Salete S. Silva ). 15<br />

O mesmo acontece no trabalho de Albino Zenatti e de sua m„e Fanny Cipriani Zenatti:<br />

12 Algumas palavras nesta e em citaÁıes seguintes foram mantidas em italiano.<br />

13 ìTali <strong>do</strong>cumenti, oggi conservati in quattro fascicoli presso l`Archivio della Gesellschaft der Musikfreunde di<br />

Vienna (n. XXI, XXII, XXIII e XXIV della Sonnleithner- Sammlung) reivestono tuttavia um importante valore<br />

<strong>do</strong>cumentario. Il primo fascicolo (n. XXI) Ë stato attentamente studiato e ripro<strong>do</strong>tto da Antonio Carlini. Si tratta<br />

di una collezione di ventuno melodie da ballo ìsicuramente desunte da esecuzioni, cioË tratte ìdal vivoî e non<br />

copiate da fonti a stampa [...] [che] costituiscono il primo n˙cleo <strong>do</strong>cumentario della musica popolare e di uso<br />

popolare in Trentinoî Le melodie riguardano verosimilmente esecuzioni violinistiche senza accompagnamentoî<br />

( MACCHIARELLA, 1999, p·g 22 e 23 ).<br />

14 ìConcluden<strong>do</strong> la sua trattazione Bolognini afferma che ìla massima parte degli strambotti (maitinade) li<br />

avremmo anche noi [trentini] comuni com tutte le provincie italiane, eguali e quelli che vengono cantati nella<br />

Sicilia, e nel Napoletano, e in Toscana, Piemonte, Romagna, Veneto ecc., com poche differenze di formaî(<br />

BOLOGNINI apud MACCHIARELLA, 1999, p·g 27 ).<br />

15 ìTale materiale viene suddiviso in otto categorie: maitinade; canti dei coscritti; canti d`amore e del<br />

corteggiamento; canti narrativi e ballate; canti del lavoro maschili, canti femminili connessi alla filatura; canti<br />

connessi alla gravidanza, al parto e all`infanzia; ed infine canzoncine, storielle, filastrocche, eccî (<br />

MACCHIARELLA, 1999, p·g 30 ).<br />

48


Os textos s„o claramente regula<strong>do</strong>s e ordena<strong>do</strong>s em cinco capÌtulos: I. Maitinade,<br />

II. EstÛria religiosa oraÁıes e cantos de questuanti, III. Cantilenas de namoricos,<br />

de jogos, de sortilÈgio, invocaÁıes, esconjuros, IV. AdivinhaÁıes, V. Cantos e<br />

provÈrbios com alusıes polÌticas (MACCHIARELLA, 1999, p·g 30, traduzi<strong>do</strong> por<br />

Maria Salete S. Silva ). 16<br />

TambÈm È o caso <strong>do</strong> trabalho de Silvio Pedrotti, Canti popolari trentini, que segun<strong>do</strong><br />

Macchiarella separa as cento e sessenta e sete canÁıes que constituem o volume em categorias<br />

possivelmente liga<strong>do</strong>s aos temas <strong>do</strong>s textos verbais das canÁıes:<br />

O volume <strong>do</strong> conjunto apresenta cento e sessenta e sete cantos: Paqueras e cantos<br />

de inf‚ncia de roda; cantos <strong>do</strong>s recrutas militares; cantos <strong>do</strong>s encarceira<strong>do</strong>s, <strong>do</strong>s<br />

profughi , <strong>do</strong>s emigrantes; cantos de trabalho; cantos de amor; cantos da vida<br />

familiar; cantos de malttia; cantos espirituais e congratulatÛrios; baila<strong>do</strong>s,<br />

brincadeiras e argumentos v·rios. A raz„o de tal organizaÁ„o n„o s„o explicitadas<br />

embora resulte evidente que tenham em consideraÁ„o somente o conte˙<strong>do</strong> <strong>do</strong>s<br />

textos verbais ( MACCHIARELLA, 1999, p·g 69, traduzi<strong>do</strong> por Maria Salete<br />

S. Silva). 17<br />

Atualmente esta categorizaÁ„o para os cantos permanece, È o que est· demonstra<strong>do</strong><br />

atravÈs <strong>do</strong>s registros fonogr·ficos <strong>do</strong> Museu <strong>do</strong>s Usos e Costumes da Gente <strong>Trentina</strong>, situa<strong>do</strong><br />

na cidade de San Michele All` Adige 18 , que est„o disponÌveis gratuitamente em seu prÛprio<br />

site da internet. Os sons e as canÁıes de tradiÁ„o oral de uma parte da regi„o Trentino-Alto<br />

Adige est„o divididas nas seguintes categorias: Alpina (Alpini), Autoria (Autore) Canta-<br />

histÛrias (Cantastorie), Canto (Cantinela), Canto Narrativo (Canto Narrativo), CanÁ„o<br />

(Canzone), Carnaval (Carnavale), ConscriÁ„o (Coscrizione), CanÁ„o Acumulativa (Canzone<br />

Cumulativa), Duplos Senti<strong>do</strong>s (Doppi Sensi), EmigraÁ„o (Emigrazione), Filastrocca, Guerra<br />

(Guerra), AdivinhaÁ„o (In<strong>do</strong>vinello), Em funÁ„o (In Funzione), Hino (Inno), Lamento<br />

(Lamento), Louvor (Lauda), LÌrico monostrÛfico (Lirico-Monostrofico), Manfrina, Militar<br />

(Militare), Monacazione, Montanha (Montagna), Ninar (Ninna Nanna), Absurdas (Nonsense),<br />

OraÁ„o (Orazione), PatriÛtico (Pattriotico), Polka (Polka), Religioso (Religioso), Chama<strong>do</strong><br />

(Richiamo), Ritual (Rito), Romance (Romanza), SatÌrico (Satirico), Estrofe (Strofette),<br />

Instrumental (Strumentale), Tratomarzo (Trato Marzo), Valsa (Valsa). Este tipo de<br />

16 ìi testi sono chiaramente regolarizzati ed ordinati in cinque capitoli: I. Mattinate, II. Storie religiose preghiere<br />

e canti di questuanti, III. Cantilene, filastrocche giuochi di sorteggio invocazioni e scongiuri, IV. In<strong>do</strong>vinelli, V.<br />

Canti e proverbi con allusioni politicheî ( MACCHIARELLA, 1999, p·g 30 ).<br />

17 ìIl volume presenta complessivamente centosessantasette canti. Questi sono ordinati in: Filastrocche e canti<br />

dell`infanzia; canti dei militari; canti di carcerati, di profughi e di emigranti; canti del lavoro; canti d`amore;<br />

canti della vita familiare; canti di malttia; canti spirituali e augurali; ballate, scherzi e argomenti varii. Le ragioni<br />

di tale ordinamento non sono esplicitate comunque risulta evidente che tengono in considerazione solamente il<br />

contenuto dei testi verbaliî ( MACCHIARELLA, 1999, p·g 69).<br />

18 http://www.museosanmichele.it/, acesso em 31/10/2007<br />

49


classificaÁ„o segun<strong>do</strong> Macchiarella, È um interessante projeto de pesquisa sobre repertÛrio<br />

vocal e m˙sica instrumental <strong>do</strong> mesmo museu que teve inÌcio a mais de 20 anos, resultan<strong>do</strong><br />

na obra Identit‡ musicale della Val dei MÚcheni. Culture e canti di uma comunit‡<br />

plurilÌng¸e, de Renato Morelli:<br />

Nos primeiros anos de oitenta o museu <strong>do</strong>s usos e costumes da gente trentina de<br />

San Michele all`Adige da um andamento de um interessante projeto de<br />

<strong>do</strong>cumentaÁ„o etnomusicolÛgica tu<strong>do</strong> agora em desenvolvimento. Na primeira fase<br />

a atividade se concentra em torno <strong>do</strong> patrimÙnio <strong>do</strong> ìValle dei Mocheniî<br />

constituÌ<strong>do</strong> de um rico conjunto de repertÛrios vocais e de m˙sicas instrumentais<br />

conecta<strong>do</strong> a v·rios tipos de danÁa. Esta procura que vem abalizada por Renato<br />

Morelli na parte musical e Pl·ci<strong>do</strong> Staro na parte coreutica tem trazi<strong>do</strong> ‡ uma<br />

realizaÁ„o de vasta <strong>do</strong>cumentaÁ„o que consiste em v·rias centenas de trechos<br />

sonoros e filma<strong>do</strong>s em vÌdeo realizada em pr·tica em to<strong>do</strong>s os vilarejos <strong>do</strong> Vale e<br />

depositadas junto ao museu. O resulta<strong>do</strong> da pesquisa sobre repertÛrios vocais s„o<br />

ilustra<strong>do</strong>s no volume de Renato Morelli: Identidade musical <strong>do</strong> Val dei Mocheni<br />

Cultura e canto de uma comunidade plurilinguÌstica. Outro a constituir a mais<br />

substancial contribuiÁ„o sobre a m˙sica tradicional de uma especÌfica zona trentina<br />

cheio de mais de trezentas transcriÁıes musicais a respeito de uma minuciosa<br />

seleÁ„o de <strong>do</strong>cumentos <strong>do</strong>s mais significativos e de numerosas fontes <strong>do</strong> arquivo<br />

relativo ao passa<strong>do</strong> e compreende tambÈm um interessante estu<strong>do</strong> antropolÛgico<br />

preliminar (MACCHIARELLA, 1999, p·g 81, traduzi<strong>do</strong> por Maria Salete S.<br />

Silva). 19<br />

De alguma maneira este tipo de classificaÁ„o para as canÁıes repercutiu tambÈm nas<br />

publicaÁıes brasileiras, È o caso <strong>do</strong> livro ...E Cantavam ñ ColeÁ„o de Cantos Populares da<br />

Regi„o de imigraÁ„o Italiana no Rio Grande <strong>do</strong> Sul, que possui os cantos dividi<strong>do</strong>s em seis<br />

categorias: Saudades da p·tria; Cantos da Vida Militar; Amor e Juventude; Vinho e<br />

Brincadeiras; Cantos Religiosos e Cantigas de CrianÁas. Na obra est„o as letras <strong>do</strong>s cantos e<br />

tambÈm a melodia escrita em notaÁ„o tradicional (partituras). O mesmo acontece para as<br />

obras de JosÈ Ac·cio Santana, Folclore Catarinense ñ Caderno 1 ñ CanÁıes Italianas onde o<br />

autor separa os cantos religiosos <strong>do</strong>s demais cantos e dispıe tambÈm escritos na partitura. Na<br />

tese de <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> de Paulo Bernardi entitulada CanÁ„o <strong>do</strong> Imigrante Italiano: sua leitura a<br />

partir de uma localidade rural catarinense, o mesmo fez uma pesquisa de campo na linha de<br />

19 ìNei primi anni Ottanta il Museo degli Usi e Costumi della Gente <strong>Trentina</strong> di San Michele all` Adige d‡ il via<br />

ad um interessante progetto di <strong>do</strong>cumentazione etnomusicologica tutt`ora in corso. Nella prima fase l`attivit‡ si<br />

concentra intorno al patrimonio della Valle dei MÚcheni costituito da um ricco insieme di repertori vocali e di<br />

musiche strumentali connesse a vari tipi di balli. Tale ricerca , che viene affidata a Renato Morelli per la parte<br />

musicale e a Placida Staro per la parte coreutica, ha portato alla realizzazione di una vasta <strong>do</strong>cumentazione,<br />

consistente in diverse centinaia di brani sonori e filmati video, realizzata in pratica in tutti i paesi della Valle e<br />

depositata presso la sede del Museo. I resultati della ricerca sui repertori vocali sono illustrati nel volume di<br />

Renato Morelli, Identit‡ musicale della Val dei MÚcheni. Culture e canti di uma comunit‡ plurilÌng¸e. Il<br />

volume, oltre a costituire il pi˘ corposo contributo <strong>do</strong>cumentario sulla musica tradizionale di una specifica zona<br />

del Trentino ñ ricco di pi˘ di trecento trascrizioni musicali che riguardano uma accurata selezione dei <strong>do</strong>cumenti<br />

pi˘ significativi, e di numerose fonti d`archivio relative al passato- comprende anche um interessante studio<br />

antropologico preliminareî ( MACCHIARELLA, 1999, p·g 81).<br />

50


Lajea<strong>do</strong> <strong>do</strong>s Pintos, a trÍs mil metros <strong>do</strong> centro da cidade de ConcÛrdia, separou as canÁıes<br />

em <strong>do</strong>ze grupos tem·ticos: infantil; rituais; trabalho; comida, bebida e lazer; solda<strong>do</strong> e guerra;<br />

migraÁ„o; natureza; humor; cotidiano; narrativas; eventos sociais e locais; mar. Percebe-se<br />

que tais publicaÁıes tiveram focos em locais distintos, no esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio Grande <strong>do</strong> Sul e em<br />

um municÌpio <strong>do</strong> oeste catarinense, demonstran<strong>do</strong> assim de como os trentinos se dispersaram<br />

desde sua primeira chegada.<br />

Em relaÁ„o ‡s caracterÌsticas musicais relatadas pelos estudiosos <strong>do</strong> sÈc. XIX,<br />

Macchiarella cita a primeira antologia musical feita na provÌncia de Trento em 1892, Canto<br />

Popolari trentini per Canto e Pianoforte, sob autoria de Coronato Pargolesi, apresentan<strong>do</strong> as<br />

seguintes descriÁıes sobre o canto tradicional trentino:<br />

Muito interessante È a breve descriÁ„o das caracterÌsticas gerais <strong>do</strong> canto tradicional<br />

trentino: A maior parte <strong>do</strong>s cantos s„o realiza<strong>do</strong>s ‡ duas ou trÍs vozes ( primeiro<br />

tenor , segun<strong>do</strong> tenor e baixo); nas audiÁıes cantadas tambÈm em unÌssono outras<br />

agora com som e coro ou simplesmente em solo em forma de serenata. Nos seus<br />

cantos o povo tentou os versos mais usa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> cen·rio hendecassÌlabo se encontra<br />

pelo menos na mattinate ou como dizem em Rendena: maittinade ou no vale de<br />

Laguna: macinade. Este verso È musica<strong>do</strong> por to<strong>do</strong>s tanto na parte de cima como<br />

abaixo da mesma maneira. O primeiro hendecassÌlabo È uma onda a girar-se em<br />

torno a tÙnica superior , o segun<strong>do</strong> marca invÈs uma lenta, talvez tortuosa descida<br />

<strong>do</strong>minante sobre qual se fecha: o terceiro È igual ao primeiro, o quarto igual ao<br />

segun<strong>do</strong> e assim segue alternan<strong>do</strong> atÈ o fim da estrofe. De tal mo<strong>do</strong> ‡ formar uma<br />

espÈcie de salmodia que recorda certos cantos lit˙rgicos da Igreja ( PARGOLESI<br />

apud MACCHIARELLA, 1999, p·g 34, traduzi<strong>do</strong> por Maria Salete S. Silva). 20<br />

No ano de 1919, outra antologia fora publicada, Canti di Soldati, elabora<strong>do</strong> por Piero<br />

Jahier, que ficou respons·vel pela coleta <strong>do</strong>s textos verbais, e Vittorio Gui, respons·vel pela<br />

harmonizaÁ„o (MACCHIARELLA, 1999). A respeito das caracterÌsticas musicais, a<br />

harmonizaÁ„o È a quatro vozes, as duas vozes superiores procedem por terÁa paralela e<br />

correspondem a linha melÛdica <strong>do</strong>s cantos tradicionais. As duas vozes inferiores foram<br />

construÌdas com o intuito de enquadrar os cantos no sistema da harmonia tonal<br />

(MACCHIARELLA, 1999).<br />

20 ìMolto interessante Ë la breve descrizione delle caratteristiche generali del canto tradizionale trentino: La<br />

maggior parte dei [...] canti sono eseguiti dal popolo a dueparti, o a tre (tenori 1mi, tenori 2ndi e bassi); ne uddi<br />

cantati a due parti, o a tre (tenori 1mi, tenori 2di e bassi); ne udii cantati anche all`unisono altri ancora com a soli<br />

e coro [...] o semplicemente a solo, in forma di serenata [...] Ne`suoi canti il popolo tentÚ i versi pi˘ usitati, dal<br />

senario all`endecasillabo si riscontra per lo pi˘ nelle mattinate, o come dicono in Rendena: maitinade, Ú nella val<br />

Lagarina: macinade. Questo verso Ë musicato da per tutto, su per gi˘, alla stessa maniera. Il primo<br />

endecassilabo Ë um vago aggirarsi intorno alla tonica superiore, il secon<strong>do</strong> segna invece una lenta, talvolta<br />

tortuosa discesa alla <strong>do</strong>minante, sulla quale si ferma; il terzo Ë eguale al primo, il quarto al secon<strong>do</strong>, e cosi via<br />

alternan<strong>do</strong> sino alla fine della strofa. In tal guisa formasi una specie di salmodia che ricorda certi canti liturgici<br />

della Chiesa.î ( PARGOLESI apud MACCHIARELLA, 1999, p·g 34).<br />

51


Outra obra que demonstra as caracterÌsticas musicais <strong>do</strong>s cantos tradicionais trentinos<br />

È a dissertaÁ„o de Franco Sartori, Intorno alla natura musicale del popolo trentino, 1925.<br />

Segun<strong>do</strong> Macchiarella, Sartori conclui:<br />

Tenho visto cantar os nossos camponeses e tenho dito para mim mesmo: eis a<br />

natureza musical. Tenho escuta<strong>do</strong> tocar uma ocarina 21 , uma harmÙnica um viol„o<br />

tocar no baile e tenho dito pra mim. Eis a natureza rÌtmica <strong>do</strong> nosso povo rude e<br />

s„o. Vejo com emoÁ„o oper·rios e trabalha<strong>do</strong>res de todas as artes vencer a fadiga e<br />

o sono para bem figurar na banda <strong>do</strong> vilarejo, no coro, no cÌrculo ban<strong>do</strong>linÌstico.<br />

Ouvi um rude camponÍs, instrutor na capela de sua aldeia, falar da sonata em l·<br />

bemol de Beethoven ao piano, que dizia nunca senti uma m˙sica mais sÛlida e<br />

m·scula <strong>do</strong> que esta: mas este homem n„o faz m˙sica ele constrÛi montanhas s„o<br />

palavras suas. … da<strong>do</strong> ‡ este povo o nutrimento espiritual de que precisa. Assim a<br />

nossa regi„o n„o ser· sÛ terra de silÍncio mas tambÈm de vida de arte de cantos e de<br />

ecos sonoros entre pulos e saltos ( SARTORI apud MACCHIARELLA, 1999, p·g<br />

44, traduzi<strong>do</strong> por Maria Salete S. Silva). 22<br />

AlÈm de uma descriÁ„o genÈrica das manifestaÁıes musicais em Sartori, est„o tambÈm<br />

alguns instrumentos musicais utiliza<strong>do</strong>s: ocarina, acorde„o, viol„o e ban<strong>do</strong>lim. AlÈm desta<br />

citaÁ„o precedida, a respeito <strong>do</strong>s instrumentos musicais presentes nas manifestaÁıes musicais<br />

da regi„o Trentino-Alto Adige, s„o v·rias as indicaÁıes feitas por Macchiarella, dentre eles<br />

est„o: tambor, acorde„o, flauta, viol„o, violino, clarineta, timbale, cÌtara, clarins e<br />

contrabaixo.<br />

Ainda na primeira metade <strong>do</strong> sÈculo XX, em 1935 Giovanni Zanettin elabora Canti<br />

popolari gi‡ in uso a Cembra racolti e armonizzati. Segun<strong>do</strong> Macchiarella se trata de uma<br />

coleÁ„o de transcriÁıes <strong>do</strong>s cantos coleta<strong>do</strong>s entre 1920 e 1935. Neste trabalho h·<br />

transcriÁıes de cantos que estavam esqueci<strong>do</strong>s entre o povo, n„o se cantavam mais, logo o<br />

prÛprio autor declara que as transcriÁıes n„o foram baseadas atravÈs de execuÁıes musicais<br />

ao vivo e sim na sua memÛria auditiva, atravÈs das canÁıes que escutou durante sua juventude<br />

(MACCHIARELLA,1999). As caracterÌsticas musicais demonstradas por Macchiarella s„o:<br />

21 ìOcarina: uma flauta-vaso na forma de uma cabaÁa oval alongada, oca e geralmente feita de barro. Em um<br />

<strong>do</strong>s la<strong>do</strong>s h· um tubo achata<strong>do</strong> com um orifÌcio na base; o intÈrprete sopra pelo tubo e, assim, atravÈs <strong>do</strong> orifÌcio,<br />

colocan<strong>do</strong> em vibraÁ„o a massa de ar dentro <strong>do</strong> instrumento. A ocarina ocidental padr„o foi provavelmente<br />

inventada por Giuseppe Donati, de Budrino, It·lia, c. 1860, com oito orifÌcios para os de<strong>do</strong>s na parte frontal e <strong>do</strong>i<br />

para os polegares na parte posterior; a altura sÛ È afetada pelo n˙mero de orifÌcios abertos. … comum como<br />

instrumento infantil no Ocidente, e algumas variantes s„o usadas na m˙sica folclÛricaî (SADIE, 1994, p·g. 665).<br />

22 ìHo sentito cantare i nostri contadini; e ho detto tra me: ecco la natura musicale. Ho sentito un`ocarina, una<br />

fisarmonica, una chitarra suonare da ballo e ho detto tra me: ecco la natura ritmica del nostro popolo ignaro e<br />

sano. Ve<strong>do</strong> con commozione operai e lavoratori di tutte le arti vincere la fatica e il sonno per ben figurare nella<br />

banda del villaggio, nel coro, nel circolo man<strong>do</strong>linistico. Ho udito un rozzo contadino, istruttore della Cappella<br />

del suo paese, dire della sonata in la bemolle di Beethoven per pianoforte: ìmai ho sentito una musica pi˘ solida<br />

e maschia di questa: ma quest`uomo non fa della musica; egli costruisce montagne!î Sono parole sue. Ma date<br />

a questo popolo il nutrimento spirituale di cui abbisogna [...] cosi la nostra regione non sara solo terra di silenzio<br />

e di eroi; ma anche di vita, di arte, di canti e di echi sonori tra balza e balzaî ( SARTORI apud<br />

MACCHIARELLA, 1999, p·g 44).<br />

52


A notaÁ„o È sobre <strong>do</strong>is pentagramas em clave de violino e de baixo e È articulada<br />

quase sempre na parte vocal. Normalmente no pentagrama superior s„o escritas as<br />

duas partes que procedem em forte igualdade de ritmo [homoritmia] por intervalo<br />

de terÁa paralela. Os perfis melÛdicos destes delinea<strong>do</strong>s passam ser considera<strong>do</strong>s<br />

no to<strong>do</strong> como atendÌveis transcriÁıes <strong>do</strong>s cantos tradicionais se bem que<br />

evidentemente regulariza<strong>do</strong>s por quanto se refira ao ritmo. Falta alguma indicaÁ„o<br />

sobre a lÛgica e os elementos executa<strong>do</strong>s enquanto o andamento È indica<strong>do</strong> atravÈs<br />

da express„o consoante da gram·tica culta: moderato, andante, alegro etc<br />

(MACCHIARELLA, 1999, p·g. 52, Maria Salete S. Silva). 23<br />

Assim como repercuti o mo<strong>do</strong> de classificaÁ„o das canÁıes, tambÈm aparecem nas<br />

publicaÁıes brasileiras algumas das caracterÌsticas que est„o apresentadas na obra de<br />

Macchiarella, tais como o canto a mais vozes:<br />

23 ìLa notazione Ë su due pentagrammi, in chiave di violino e di basso, ed Ë articolata quase sempre in tre parti<br />

vocali. Di norma nel pentagramma superiore sono scritte le due parti che proce<strong>do</strong>no in rigida omoritmia per<br />

intervalli di terza parallela. I profili melodici da esse delineati possono essere considerati nel complesso come<br />

attendibili trascrizioni di canti tradizionali, sebbene evidentemente regolarizzati per quanto riguarda il ritmo.<br />

Manca qualsiasi indicazione circa l`agogica e gli elementi esecutivi, mentre l`andamento Ë indicato attraverso le<br />

consuete espressioni della grammatica colta: moderato, andante, allegro ecceteraî (MACCHIARELLA, 1999,<br />

p·g. 51 e 52).<br />

53


IlustraÁ„o 12: CanÁ„o Monte Grappa tu sei la mia Patria<br />

Fonte: (CORRADIN, 1972, p·g. 50).<br />

54


As terÁas paralelas em homoritmia:<br />

IlustraÁ„o 13: CanÁ„o Noi Siam Partiti<br />

Fonte: (SANTANA, 1982, p·g.23).<br />

55


AlÈm desta caracterÌstica musical, interessante tambÈm notar como a letra retrata a<br />

idÈia da emigraÁ„o para a AmÈrica. AtravÈs da tese de <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> de Bernardi h· uma<br />

interessante an·lise da letra retratan<strong>do</strong> o contexto histÛrico da emigraÁ„o:<br />

[...] influÍncias da propaganda de agentes de emigraÁ„o, conjugada com um esta<strong>do</strong><br />

de carÍncia em termos materiais e financeiros: siamo partiti col nostro onore ñ<br />

partimos (apenas) com nossa honra; prolongada viagem terrestre e naval em<br />

reduzidas condiÁıes humanas: trenta sei giorni di macchina e vapore ñ trinta e seis<br />

dias de m·quina (trem, carro) e de navio; o desencanto ao chegar ‡ sonhada<br />

AmÈrica, com a percepÁ„o de outras formas de privaÁ„o no lugar da cuccagna [um<br />

lugar <strong>do</strong>s sonhos onde a vida n„o encontra dificuldades] e da fartura imaginadas na<br />

sau<strong>do</strong>sa Italia bella (All`AmÈrica noi siamo arrivati ñ ¿ AmÈrica temos chega<strong>do</strong>/<br />

no abbiam trovato ni paglia e ni fieno ñ N„o encontramos nem palha nem feno/<br />

abbiam <strong>do</strong>rmito sul nu<strong>do</strong> terreno - <strong>do</strong>rmimos sobre a terra nua / come lÍ bestie<br />

abbiamo ripos‡!- repousamos como animais); a construÁ„o de uma vida real e de<br />

uma nova identidade: abbiamo formato paesi e citt‡ ñ formamos vilas e cidades<br />

(BERNARDI, 2003)<br />

PorÈm apesar das publicaÁıes brasileiras apresentarem caracterÌsticas musicais que se<br />

assemelham com os estu<strong>do</strong>s no Trentino-Alto Adige, existe muitas diferenÁas entre uma<br />

vers„o e outra de um mesmo canto, demonstro aqui uma mesma canÁ„o presente em <strong>do</strong>is<br />

livros catarinenses:<br />

56


IlustraÁ„o 14: CanÁ„o Valsugana<br />

Fonte: (VICENZI, 1970, p·g. 174).<br />

57


IlustraÁ„o 15: CanÁ„o Valsugana<br />

Fonte: (SANTANA, 1982, p·g.15).<br />

58


Tanto a gravaÁ„o sonora, a escrita musical como qualquer tipo de notaÁ„o musical, s„o<br />

formas parciais de registro da m˙sica implican<strong>do</strong> uma certa cristalizaÁ„o <strong>do</strong> momento<br />

estuda<strong>do</strong>. Neste senti<strong>do</strong>, as partituras demonstram um momento est·tico da m˙sica, onde o<br />

autor por meio da grafia musical convencional, considerada culta, intelectual, ìfotografaî uma<br />

melodia de car·ter folclÛrico, executada pelo povo. Estes mesmos autores apresentam<br />

diferentes caracterÌsticas musicais em relaÁ„o a uma mesma canÁ„o.<br />

Podemos observar as seguintes diferenÁas entre elas: a altura em que a melodia est·<br />

escrita È diferente entre uma vers„o e outra. Mesmo se transpusÈssemos a melodia de uma<br />

vers„o na mesma altura que a outra, em alguns compassos a melodia È diferente. Outra<br />

quest„o a ser apontada È que o primeiro exemplo (ilustraÁ„o 14) est· escrito apenas uma linha<br />

melÛdica, enquanto o segun<strong>do</strong> exemplo (ilustraÁ„o 15) est· escrito em duas linhas melÛdicas<br />

(duas vozes). Outra distinÁ„o claramente notada È a maneira como o texto est· inseri<strong>do</strong> na<br />

melodia; no ˙ltimo verso da primeira estrofe (a veder come la sta), no primeiro exemplo<br />

(ilustraÁ„o 14) a palavra veder se repete, j· no segun<strong>do</strong> exemplo (ilustraÁ„o 15) È outra<br />

palavra que se repete, come.<br />

Estes aspectos indicam uma incerteza e imprecis„o em relaÁ„o ‡ origem das canÁıes,<br />

ou seja, n„o se sabe quem as criou, a letra original da canÁ„o, muito menos as frases<br />

melÛdicas e rÌtmicas, que de um cantor a outro podem ser executadas de diferentes maneiras.<br />

Devi<strong>do</strong> a esta imprecis„o e ausÍncia de fidelidade com que apresentam os registros escritos<br />

sobre determinada express„o musical, o fonÛgrafo (grava<strong>do</strong>r sonoro) foi uma grande<br />

ferramenta que influenciou e ainda influencia o estu<strong>do</strong> da m˙sica, e teve grande repercuss„o<br />

para a m˙sica popular <strong>do</strong> sÈculo XX, sen<strong>do</strong> uma ferramenta fundamental para o estu<strong>do</strong> da<br />

etnomusicologia:<br />

Em conson‚ncia com a diversidade <strong>do</strong> panorama musical na primeira metade <strong>do</strong><br />

sÈculo XX, as diferenÁas nacionais continuaram a ser sublinhadas; com efeito, a<br />

maior rapidez das comunicaÁıes contribuiu inicialmente para acentuar ainda mais<br />

os contrastes entre culturas. As pr·ticas musicais nacionalistas <strong>do</strong> sÈculo XX<br />

diferem em v·rios aspectos das <strong>do</strong> sÈculo XIX. Procedeu-se a um estu<strong>do</strong> muito<br />

mais sistem·tico <strong>do</strong> material popular e com mÈto<strong>do</strong>s cientÌficos rigorosos. A<br />

m˙sica popular deixou de ser recolhida pelo processo rudimentar, que consistia em<br />

tentar transcreve-la em notaÁ„o convencional, para passar a sÍ-lo com a fidelidade<br />

que a utilizaÁ„o <strong>do</strong> fonÛgrafo e <strong>do</strong> grava<strong>do</strong>r tornou possÌvel; os espÈcimes<br />

recolhi<strong>do</strong>s foram analisa<strong>do</strong>s objetivamente, com tÈcnicas desenvolvidas no ‚mbito<br />

da nova disciplina da etnomusicologia, permitin<strong>do</strong> descobrir a verdadeira natureza<br />

da m˙sica, em vez de ignorar as suas ìirregularidadesî ou de tentar enquadra-las<br />

nas regras da m˙sica erudita, como tantas vezes haviam feito os rom‚nticos. Este<br />

conhecimento mais rigoroso levou a um maior respeito pelas caracterÌsticas<br />

prÛprias da m˙sica de tradiÁ„o oral. Em vez de procurarem incluir o vocabul·rio da<br />

59


m˙sica popular em estilos mais ou menos tradicionais, os compositores utilizaramno<br />

na criaÁ„o de novos estilos, em particular no alargamento <strong>do</strong> campo da<br />

tonalidade (GROUT, 1988, p·g. 698).<br />

O fonÛgrafo passou a existir a pouco tempo, atravÈs <strong>do</strong> cientista Thomas Alva Edison,<br />

em 1877 foi elabora<strong>do</strong> o primeiro fonÛgrafo. Este utensÌlio que reproduz com maior<br />

fidelidade uma execuÁ„o sonora, atravÈs <strong>do</strong> seu desenvolvimento hoje temos o grava<strong>do</strong>r<br />

sonoro. A vantagem que o grava<strong>do</strong>r sonoro possui para o estu<strong>do</strong> da m˙sica È que ao gravar<br />

uma execuÁ„o sonora, a mesma poder· ser reproduzida v·rias vezes, o que facilita na<br />

compreens„o e elaboraÁ„o de uma an·lise interpretativa da m˙sica, para ent„o tentar<br />

enquadr·-la em uma grafia musical que represente com maior fidelidade possÌvel.<br />

Como j· exposto anteriormente, a etnomusicologia È uma disciplina recente, sen<strong>do</strong><br />

que sua principal ferramenta para seu estu<strong>do</strong> È o grava<strong>do</strong>r sonoro, logo as gravaÁıes tambÈm<br />

s„o recentes. Na It·lia a fita magnÈtica passou a existir depois de 1948: ìComo È visto na<br />

It·lia o uso de registro magnÈtico no campo sÛ vem depois de 1948 graÁas a obra pioneira de<br />

Giorgio Nataletti e da ent„o Eliar, muito depois se compara<strong>do</strong> aos outros paÌses europeusî<br />

(CARPITELLA apud MACCHIARELLA, 1999, p·g 60, traduzi<strong>do</strong> por Maria Salete S.<br />

Silva). 24<br />

O ponto de partida para a pesquisa etnomusicolÛgica no Trentino sÛ se iniciou com as<br />

gravaÁıes feitas por Alan Lomax e Diego Carpitella, de 1954 a 1955. Sen<strong>do</strong> assim,<br />

anteriormente n„o havia referÍncia de gravaÁıes sonoras sobre as maneiras de como uma<br />

melodia era cantada ou tocada da regi„o Trentino-Alto Adige, logo a idÈia de como eram<br />

executa<strong>do</strong>s os cantos e os instrumentos musicais, se constrÛi baseada em relatos e descriÁıes<br />

<strong>do</strong>s estudiosos e pesquisa<strong>do</strong>res, sen<strong>do</strong> que em momento algum pode se considerar como uma<br />

fiel representaÁ„o. Algumas descriÁıes e relatos foram apresenta<strong>do</strong>s anteriormente,<br />

principalmente os que apresentavam caracterÌsticas musicais semelhantes ‡quelas encontradas<br />

nas publicaÁıes brasileiras que falam sobre a m˙sica Ìtalo-trentina.<br />

Apesar da import‚ncia da coleta de da<strong>do</strong>s musicais atravÈs <strong>do</strong>s primeiros registros<br />

fonogr·ficos sobre uma determinada canÁ„o ou canÁıes, a execuÁ„o musical atual da mesma<br />

canÁ„o, ou das canÁıes, podem conter caracterÌsticas musicais distintas das que eram tocadas<br />

e cantadas em tempos passa<strong>do</strong>s, onde a diferenÁa pode aparecer na melodia, ritmo, texto<br />

verbal, andamento, entre outros. Uma mesma melodia pode se transformar, mudar, ou seja, a<br />

24 ìComo Ë noto in It·lia l`avvio di registrazioni magnetiche su campo avviene solo <strong>do</strong>po il 1948, grazie<br />

all`opera pionieristica di Giorgio Nataletti e della allora Eliar, molto in ritar<strong>do</strong> respetto agli altri paesi europeiî (<br />

CARPITELLA apud MACCHIARELLA, 1999, p·g 60 ).<br />

60


dinamicidade que a prÛpria m˙sica est· sujeita. Esta dinamicidade, alÈm de demonstrada nas<br />

partituras anteriores das publicaÁıes catarinenses, est· enfatizada na obra de Macchiarella<br />

como cita a seguir:<br />

Como se nota a tradiÁ„o oral n„o È fixa, mas continuamente se transforma, segun<strong>do</strong><br />

o processo que fogem de uma definiÁ„o precisa e atualizan<strong>do</strong> continuamente o<br />

prÛprio repertÛrio basea<strong>do</strong> no gosto comum de seus intÈrpretes<br />

(MACCHIARELLA, 1999, p·g. 136, traduzi<strong>do</strong> por Maria Salete S. Silva). 25<br />

Tais indÌcios indicam que as manifestaÁıes expressivas musicais da Regi„o Trentino-<br />

Alto Adige, assim como <strong>do</strong>s migrantes Ìtalo-trentinos que tocam em SC possuem influÍncias<br />

diversas. Sen<strong>do</strong> que algumas manifestaÁıes expressivas musicais carregam consigo<br />

caracterÌsticas de canÁıes austrÌacas, estan<strong>do</strong> algumas inclusive com a letra da canÁ„o em<br />

alem„o. PorÈm, como j· comentei, a maneira de estabelecer limites entre culturas, tem si<strong>do</strong>,<br />

muitas vezes um meio de defesa e identidade da prÛpria naÁ„o, fortemente caracteriza<strong>do</strong> pelas<br />

idÈias rom‚nticas durante o sÈculo XIX.<br />

As manifestaÁıes expressivas est„o sujeitas a muitas mudanÁas e, neste senti<strong>do</strong>,<br />

apresentam caracterÌsticas de diversas culturas. Quan<strong>do</strong> s„o classificadas dentro de<br />

determina<strong>do</strong>s gÍneros, isto geralmente decorre da escolha de alguma ou de algumas destas<br />

caracterÌsticas, que se sobressaem em relaÁ„o as demais. Tal ponto comum serve de<br />

referÍncia para as manifestaÁıes expressivas musicais de outras regiıes <strong>do</strong> mesmo paÌs, o que<br />

resultar· em posse, uma barreira cujo objetivo È a diferenciaÁ„o das demais naÁıes.<br />

Este aspecto demonstra a dinamicidade que as caracterÌsticas musicais podem ter de<br />

acor<strong>do</strong> com o passar <strong>do</strong>s anos, ou seja, transformam, dialogam com outros gÍneros e mudam<br />

em algo que pode n„o condizer com as caracterÌsticas musicais <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>. Este car·ter<br />

din‚mico, n„o È algo que acontece exclusivamente no canto de tradiÁ„o oral no Trentino como<br />

cita Macchiarella, atualmente presencia-se na m˙sica em geral como comenta Bastos:<br />

[...] o que se passa no cen·rio mundial da m˙sica deste sÈculo e o caso brasileiro È<br />

paradigm·tico a esse respeito evoca com extrema felicidade o episÛdio <strong>do</strong>s livros<br />

conversantes de Borges: o maxixe dialoga com o tango, que conversa com a<br />

habanera, que proseia com o blues, com o foxtrote, que troca idÈias com Chopin,<br />

Satie, Ravel, Debussy, com o flaminco, com o fa<strong>do</strong>, com a valsa, com a polca, com<br />

o schottische (chÛte), com a Ûpera..., tu<strong>do</strong> isto configuran<strong>do</strong> uma sÈrie entermin·vel<br />

de gÍneros, registros e autores conversantes, num processo de d·logo no qual a<br />

delimitaÁ„o de fronteiras atende simultaneamente ‡s setas contrastiva e inclusiva<br />

(BASTOS, 1994, p·g.3).<br />

25 Come Ë noto la tradizione orale non Ë fissa, ma continuamente si evolve, trasforman<strong>do</strong>si secon<strong>do</strong> processi che<br />

sfuggono ad uma precisa definizione, ed attualizzan<strong>do</strong> continuamente i propri repertori in base al gusto comune<br />

dei suoi interpretiî (MACCHIARELLA, 1999, p·g. 136).<br />

61


3.2 A M⁄SICA ÕTALO-TRENTINA NOS MUNICÕPIOS DE NOVA TRENTO, RIO DOS<br />

CEDROS E RODEIO.<br />

O chama<strong>do</strong> ìcanto popularî, aponta<strong>do</strong> como sen<strong>do</strong> o mais caracterÌstico da execuÁ„o<br />

musical tanto descrito na obra de Macchiarella como tambÈm nas publicaÁıes brasileiras, È<br />

um <strong>do</strong>s itens que constitui a chamada ìcultura popularî. Diz Taylor cita<strong>do</strong> por Brand„o e<br />

Teixeira : ì [...] a cultura popular compreende as narrativas tradicionais como os cantos<br />

populares, os mitos, lendas, costumes tradicionais preserva<strong>do</strong>s e transmiti<strong>do</strong>s oralmente de<br />

uma geraÁ„o ‡ outra, e ainda as formas populares de linguagens, seus dialetos e ditosî (1994).<br />

Para este mesmo autor o surgimento da cultura popular È incerto:<br />

… uma criaÁ„o pessoal. AlguÈm fez, em um dia de algum lugar. Mas a sua<br />

reproduÁ„o ao longo <strong>do</strong> tempo tende a ser coletivizada, e a autoria cai no chama<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>mÌnio p˙blico. De um ponto de vista rigoroso, s„o as toadas, cantos, lendas,<br />

mitos, altos populares, danÁas folclÛricas, saberes que, no correr de sua prÛpria<br />

reproduÁ„o de pessoa a pessoa, de geraÁ„o a geraÁ„o, foram incorporadas ao mo<strong>do</strong><br />

de vida e ao repertÛrio coletivo da cultura de uma determinada comunidade:<br />

pesca<strong>do</strong>res, camponeses, lavra<strong>do</strong>res, bÛias-frias, gente da periferia da cidade<br />

(BRAND O; TEIXEIRA, 1994, p·g. 2).<br />

A dificuldade em determinar o surgimento, a autoria, ou mesmo a ìorigemî est·<br />

tambÈm no fato de que a renovaÁ„o È um fator pre<strong>do</strong>minante da cultura popular, conforme<br />

explica Brand„o (1994). Para este autor:<br />

Enquanto resiste a desaparecer e, preservan<strong>do</strong> uma mesma estrutura b·sica, a to<strong>do</strong> o<br />

momento se modifica. O que significa que a to<strong>do</strong> o momento se recria. E È a<br />

sociedade maior respons·vel por essas mudanÁas nas tradiÁıes. O ser humano È<br />

basicamente criativo e recria<strong>do</strong>r e os artistas populares que lidam com o canto, a<br />

danÁa, o artesanato modificam continuamente aquilo que um dia aprenderam a<br />

fazer (BRAND O, 1994, p·g.2).<br />

A idÈia de algo que preserva determina<strong>do</strong>s elementos ao mesmo tempo que se renova<br />

e se recria, que È vivi<strong>do</strong> como tradiÁ„o e memÛria no prÛprio ato em que È transmiti<strong>do</strong> e<br />

modifica<strong>do</strong>, È o que me parece mais prÛximo <strong>do</strong> que observei na m˙sica Ìtalo-trentina. Por<br />

algum motivo alguns conjuntos musicais fazem quest„o de executarem a m˙sica trentina, seja<br />

como uma forma de assumir uma identidade, seja talvez por admiraÁ„o a uma determinada<br />

histÛria, que tambÈm pode estar relaciona<strong>do</strong> a busca de um ref˙gio seguro, de uma ìorigemî<br />

que o informe e diga quem È:<br />

62


Manter algum tipo de identidade ñ Ètnica. Local ou regional ñ parece ser essencial<br />

para que as pessoas se sintam seguras unidas por laÁos inoportunos a seus<br />

antepassa<strong>do</strong>s, a um local, a uma terra, a costumes e h·bitos que lhe d„o seguranÁa,<br />

que lhes informam quem s„o e de onde vÍm, enfim, para quem n„o se percam no<br />

turbilh„o de informaÁıes, mudanÁas repentinas etc (BRAND O; TEIXEIRA, 1994<br />

p·g.3).<br />

Para coletar informaÁıes a respeito de quais grupos musicais tocam ou j· tocaram<br />

m˙sica Ìtalo-trentina nos municÌpios de Nova Trento, Rio <strong>do</strong>s Cedros e Rodeio, foi realiza<strong>do</strong><br />

um primeiro contato com os cÌrculos trentinos 26 de cada municÌpio.<br />

No municÌpio de Nova Trento, de acor<strong>do</strong> com as informaÁıes <strong>do</strong> presidente <strong>do</strong> cÌrculo<br />

Trentino di Nova Trento, J˙lio Feller, È uma cidade com freq¸entes manifestaÁıes musicais,<br />

possuin<strong>do</strong> os seguintes grupos que tocam m˙sica Ìtalo-trentina: o grupo Pargoleti (traduÁ„o:<br />

meninos), constituÌ<strong>do</strong> de coralistas e tambÈm instrumentistas; a banda Padre Sabbatini, que<br />

toca somente m˙sica instrumental e o Grupo Vocale I-Grisi (traduÁ„o: os grisalhos), que sÛ<br />

realiza execuÁıes vocais, ou seja, coral.<br />

Em entrevista com Jonas Ca<strong>do</strong>rin, funda<strong>do</strong>r <strong>do</strong> grupo Pargoleti, o grupo iniciou suas<br />

atividades no ano de 2007 e os motivos para a criaÁ„o <strong>do</strong> grupo foi o de gravar m˙sicas<br />

natalinas em dialeto italiano que eram cantadas por grupos de serenata antigamente, cerca de<br />

40 ou mais anos atr·s. O nome <strong>do</strong> grupo foi sugeri<strong>do</strong> por Jonas Ca<strong>do</strong>rin inspira<strong>do</strong> na<br />

express„o ìDivino Pargoletoî (TraduÁ„o: Divino Menino) 27 encontra<strong>do</strong> na letra Tu scendi<br />

dalle Stelle (TraduÁ„o: Tu desces das Estrelas). O grupo ensaia na sede <strong>do</strong> cÌrculo trentino de<br />

Nova Trento e tambÈm na casa de Jonas Ca<strong>do</strong>rin. Os integrantes que constituem o grupo e<br />

seus respectivos instrumentos musicais s„o: Samoel Tomasoni (clarinetista), S·lvio Cecatto<br />

(1 voz), Filinto Marchi (clarinetista, 2 voz), Fernan<strong>do</strong> Piva (baixo vocal), Jo„o Ca<strong>do</strong>rin (2<br />

voz, clarinetista e gaita de boca), Vinicius Dalri Kaspar (bombardino), Martinho Macha<strong>do</strong><br />

(viol„o, guitarra, cavaco, arranjo e mixagem) e Jonas Ca<strong>do</strong>rin (viol„o e 1 voz).<br />

Como Jonas Ca<strong>do</strong>rin È respons·vel pelas relaÁıes p˙blicas e tambÈm<br />

democraticamente pelo repertÛrio, logo È considera<strong>do</strong> lÌder <strong>do</strong> grupo. O grupo n„o possui<br />

coreografias ensaiadas, porÈm Ca<strong>do</strong>rin complementa que cada um pode ficar a vontade para<br />

gesticular se quiser durantes as apresentaÁıes. O grupo possui um Cd grava<strong>do</strong> com o tÌtulo<br />

ìUn Ricor<strong>do</strong> di Nataleî constituin<strong>do</strong> 11 m˙sicas natalinas cantadas em italiano em serenatas<br />

26 CÌrculos trentinos: È um Ûrg„o respons·vel em representar e reativar a cultura de origem trentina. Atualmente<br />

existem v·rias cidades que possuem o cÌrculo trentino, principalmente aquelas em que a imigraÁ„o trentina fora<br />

significativa.<br />

27 TraduÁ„o por Jonas Ca<strong>do</strong>rin. Os termos ìDivino Pargoletoî referem-se ao menino Jesus.<br />

63


da cidade. A respeito das letras, segun<strong>do</strong> Ca<strong>do</strong>rin, expressam sentimentos de namora<strong>do</strong>s,<br />

traiÁ„o, blasfÍmias, embriaguÍs, mulheres...<br />

Em geral os instrumentistas tocam mais de um instrumento musical, e segun<strong>do</strong><br />

Ca<strong>do</strong>rin o tempo mÈdio em que os instrumentistas levam para aprender a tocar È de <strong>do</strong>is anos<br />

de aulas teÛricas e pr·ticas na sede da banda de m˙sica 28 ou como autodidatas. A respeito da<br />

aquisiÁ„o <strong>do</strong>s instrumentos musicais, alguns s„o de uso pessoal e outros s„o toma<strong>do</strong>s<br />

empresta<strong>do</strong>s da banda de m˙sica. Para afinaÁ„o <strong>do</strong>s instrumentos, geralmente utilizam<br />

afina<strong>do</strong>res ou se baseiam em um <strong>do</strong>s instrumentos musicais que j· est· afina<strong>do</strong>. O grupo<br />

procura utilizar os mesmos instrumentos musicais utiliza<strong>do</strong>s em serenatas na cidade em<br />

tempos passa<strong>do</strong>s. Os instrumentos que tocam a base de acompanhamento s„o o viol„o,<br />

clarineta, bombardino, gaita de boca e pandeiro meia lua. Segun<strong>do</strong> Ca<strong>do</strong>rin na cidade de<br />

Nova Trento n„o existe pessoas que fabricam instrumentos musicais. Os cantores cantam<br />

tanto em unÌssono como tambÈm a mais vozes com a intenÁ„o de n„o cansar o p˙blico<br />

ouvinte. A disposiÁ„o <strong>do</strong> grupo nas apresentaÁıes È a seguinte seq¸Íncia em semicÌrculo: 2<br />

voz, baixo, 1 voz e instrumentos musicais.<br />

O grupo quan<strong>do</strong> consegue partituras, utilizam para tocar e em algumas situaÁıes<br />

fazem suas prÛprias partituras. AlÈm de o grupo interpretar as m˙sicas, tambÈm compıe<br />

m˙sicas prÛprias e arranjos; as m˙sicas s„o adaptadas ao grupo com arranjos musicais<br />

elabora<strong>do</strong>s pelo prÛprio grupo, e possui no momento duas m˙sicas de composiÁ„o prÛpria e<br />

est· se preparan<strong>do</strong> para a gravaÁ„o de um Cd com m˙sicas para animar festas e danÁas.<br />

Para as apresentaÁıes o grupo n„o possui agenda fixa e est· aberto para convites em<br />

festas de tradiÁ„o, restaurantes, festas de igreja, entre outros. Para Ca<strong>do</strong>rin o mais importante<br />

nas apresentaÁıes È a afinaÁ„o e animaÁ„o para conquistar o p˙blico, que nem sempre entende<br />

o que o grupo est· cantan<strong>do</strong>, isto devi<strong>do</strong> ao dialeto e o gramatical n„o ser a lÌngua corrente em<br />

boa parte <strong>do</strong>s locais que se apresentam.<br />

O grupo faz o que faz porque segun<strong>do</strong> Ca<strong>do</strong>rin os prÛprios integrantes gostam de<br />

cantar e se reunir para preparar para as pessoas, tambÈm para matar a saudade porque cantar<br />

em italiano permite sentir sensaÁıes que È peculiar, pois os integrantes cresceram ouvin<strong>do</strong><br />

seus pais e avÛs manifestan<strong>do</strong> seus sentimentos atravÈs da lÌngua, que j· È pouco cultivada<br />

atualmente, embora ainda seja significativa e admirada pelas pessoas que ouvem o grupo.<br />

28 Banda musical Padre Sabbatini<br />

64


Em contato com o cÌrculo trentino de Rio <strong>do</strong>s Cedros, descobri que atualmente<br />

existem <strong>do</strong>is grupos musicais: o grupo Compagni Trentini e o grupo coral Colibri. O<br />

primeiro, Compagni Trentini, tambÈm possui coralistas, porÈm h· tambÈm instrumentos<br />

musicais, como o saxofone, acorde„o, viol„o elÈtrico, que servem como acompanhamento<br />

harmÙnico e o toque de melodias nas canÁıes. J· o grupo Colibri, È somente coral.<br />

Em uma entrevista pessoal com LuÌs Giovanella Neto, regente musical <strong>do</strong> grupo<br />

Compagni Trentini, obtive algumas informaÁıes sobre o grupo. O Compagni Trentini se<br />

formou em 1992 com o encerramento das atividades de um outro grupo musical, chama<strong>do</strong><br />

Santa Notte 29 . Faziam parte <strong>do</strong> grupo os seguintes integrantes: LuÌs Giovanella e Joana<br />

Giovanella (esposa), Alcides Kretzer, Laurinda Longo, Elsevir Nardelli e Isolde<br />

Nardelli(esposa), Erci Menestrina, Osvaldino Osti e Maria <strong>do</strong> Carmo Almeida. Os<br />

funda<strong>do</strong>res <strong>do</strong> grupo foram Alcides Kretzer e Osval<strong>do</strong> Osti e os motivos para sua criaÁ„o foi<br />

segun<strong>do</strong> Giovanella continuar o folclore a tradiÁ„o e a cultura Ìtalo-trentina, constituin<strong>do</strong> na<br />

Època o ˙nico grupo musical com estas caracterÌsticas no municÌpio de Rio <strong>do</strong>s Cedros. O<br />

cria<strong>do</strong>r <strong>do</strong> nome foi Osval<strong>do</strong> Osti, o mesmo fez uma lista conten<strong>do</strong> diversos nomes em<br />

italiano, atravÈs de uma votaÁ„o entre os integrantes foi decidi<strong>do</strong> o nome Compagni Trentini,<br />

que em portuguÍs significa Companheiros Trentinos. Os locais de ensaio foram diversos,<br />

atualmente acontecem na Casa tÌpica italiana 30 , situada no Parque de eventos prefeito<br />

Valmor Busarello 31 . Atualmente os integrantes <strong>do</strong> grupo e suas respectivas funÁıes s„o LuÌs<br />

Giovanella como apresenta<strong>do</strong>r, conta<strong>do</strong>r de piadas em dialeto trentino, acordeonista e<br />

maestro, sen<strong>do</strong> os demais cantores Joana Giovanella, Alcides Kretzer, Laurinda Longo,<br />

Elsevir Nardelli, Isolde Nardelli, Erci Menestrina, Osvaldino Osti e Maria <strong>do</strong> Carmo Almeida.<br />

Quanto ‡ descendÍncia, Giovanella explica que nem to<strong>do</strong>s s„o descendentes de imigrantes<br />

trentinos.<br />

LuÌs Giovanella foi um <strong>do</strong>s respons·veis em transmitir as melodias das canÁıes para<br />

os demais cantores, sen<strong>do</strong> tambÈm considera<strong>do</strong> o lÌder <strong>do</strong> grupo. Como resulta<strong>do</strong> desta<br />

pr·tica musical o grupo Compagni Trentini lanÁou um Cd com o tÌtulo Cantavano Cosi,<br />

29 Segun<strong>do</strong> Giovanella este grupo tambÈm executava m˙sicas italianas trentinas, o encerramento das atividades<br />

deste grupo fez com que alguns integrantes <strong>do</strong> mesmo formassem o Compagni Trentini.<br />

30 Segun<strong>do</strong> Taffner a casa tÌpica foi inaugurada em 2005. Essa casa tÌpica, chamada anteriormente pelos<br />

imigrantes de la baita [que servia de depÛsito para os utensÌlios de trabalho] È atualmente a reconstruÁ„o de uma<br />

antiga casa existente na cidade h· mais de 100 anos. A casa antiga foi desmanchada <strong>do</strong> lugar onde se encontrava,<br />

e depois de reformada, foi reconstruÌda. AlÈm <strong>do</strong>s ensaios que acontecem <strong>do</strong> grupo Compagni Trentini, a Casa<br />

tÌpica tambÈm È Sede Social <strong>do</strong> CÌrculo Trentino de Rio <strong>do</strong>s Cedros.<br />

31 Segun<strong>do</strong> Taffner, o Parque de eventos prefeito Valmor Busarello foi inaugura<strong>do</strong> na data de 03 de agosto de<br />

1991. A Festa <strong>Trentina</strong> ocorre desde 1989, sen<strong>do</strong> que de 1989 a 1990, a festa foi realizada nas dependÍncias<br />

externas (p·tio) da Igreja matriz de Rio <strong>do</strong>s Cedros. A partir de 1991, todas as festas trentinas realizadas<br />

aconteceram no parque de eventos.<br />

65


(Cantavam assim). O repertÛrio deste Cd È constituÌ<strong>do</strong> pelas seguintes m˙sicas: Inno al<br />

Trentino, Marinariello, Vinassa Vinassa, MËrica MÈrica, Bella me Done un Bacio, Doman<br />

C`Ë Festa, La Montanara, Romagna Mia, Quel Mazzolin di Fiori, Noi Siam Partiti, La<br />

Moricella, Le Rose Bianchi, Richetto Va Nell`Orto. Nas apresentaÁıes, alÈm <strong>do</strong> grupo<br />

executar o repertÛrio que est· no Cd, o grupo executa canÁıes italianas populares <strong>do</strong>s anos 50<br />

e 60 (TornerÚ, por exemplo).<br />

Segun<strong>do</strong> Giovanella os cantos Ìtalos-trentinos falam sobre filhos que foram para a<br />

guerra, estÛrias de vida, peripÈcias, aventuras, romances e paixıes. A respeito <strong>do</strong> repertÛrio,<br />

j· houve casos em que o grupo tocou tango, samba e marcha alem„. Para estes gÍneros o<br />

grupo realizou coreografia especÌfica com a intenÁ„o de melhor representar a cultura <strong>do</strong><br />

determina<strong>do</strong> gÍnero. O acorde„o È o principal instrumento utiliza<strong>do</strong>, porÈm o grupo j·<br />

utilizou contrabaixo, tecla<strong>do</strong>, pist„o 32 , viol„o, guitarra, saxofone e bateria; complementa<br />

Giovanella que contratava instrumentistas para certas apresentaÁıes <strong>do</strong> grupo. Em relaÁ„o<br />

ao aprendiza<strong>do</strong> de m˙sica LuÌs Giovanella comeÁou a tocar com 10 anos de idade, aprendeu<br />

um pouco de m˙sica no colÈgio <strong>do</strong>s padres salesianos <strong>do</strong> municÌpio de Ascurra e seguiu<br />

adiante como autodidata. O acorde„o 33 de Giovanella foi compra<strong>do</strong> por conta prÛpria atravÈs<br />

de sua esposa, um presente, j· o acorde„o 34 que era para ser herda<strong>do</strong> <strong>do</strong> pai, foi perdi<strong>do</strong> na<br />

enchente no municÌpio de Rio <strong>do</strong> Sul em 1983. Durante as apresentaÁıes quan<strong>do</strong> n„o havia<br />

outros instrumentos musicais, somente o acorde„o tocava a base de acompanhamento<br />

harmÙnico.<br />

A maioria das m˙sicas executadas pelo grupo È em unÌssono 35 e duas vozes, porÈm h·<br />

tambÈm m˙sicas que s„o cantadas a quatro vozes. A disposiÁ„o <strong>do</strong> grupo nas apresentaÁıes,<br />

Giovanella vira<strong>do</strong> de frente para o p˙blico sen<strong>do</strong> que logo atr·s estavam os coralistas<br />

dispostos em duas filas (mulheres dispostos a frente e homens atr·s), um integrante ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

outro e as vozes divididas da seguinte maneira, ao la<strong>do</strong> direito de Giovanella (vira<strong>do</strong> de frente<br />

para o p˙blico) contraltos e baixos, ao seu la<strong>do</strong> esquer<strong>do</strong>, sopranos e tenores. PorÈm durante<br />

a coordenaÁ„o de regÍncia, em determina<strong>do</strong>s momentos Giovanella virava para os coralistas.<br />

Os demais instrumentos musicais, quan<strong>do</strong> havia, ficavam geralmente na mesma linha que os<br />

coralistas no la<strong>do</strong> esquerda <strong>do</strong> coro. Nas apresentaÁıes para algumas m˙sicas o grupo utiliza<br />

32 ìpist„o: Nos instrumentos da famÌlia <strong>do</strong>s metais, o componente mÛvel de uma v·lvula de pist„o (em oposiÁ„o<br />

a v·lvulas rotativas). A corneta de pistıes, ou cornet ‡ pistons, ‡s vezes È chamada simplesmente de ëpistomí ou<br />

ëpistoní (o que tambÈm ocorre, em portuguÍs, com o trompete; daÌ chamar-se ‡s vezes de pistonista o executante<br />

<strong>do</strong> trompete) [...]î (SADIE, 1994, p·g.727).<br />

33 O acorde„o referi<strong>do</strong> È da marca Todeschini 120 baixos super 7.<br />

34 Conta Giovanella que o acorde„o a ser herda<strong>do</strong> era um de marca Universal 120 baixos.<br />

35 ⁄nico som; uma ˙nica melodia cantada igualmente pelos cantores.<br />

66


partituras, tais como Ave Maria <strong>do</strong> Morro, Va Pensiero, Signore de Licine. O grupo n„o<br />

possui composiÁıes prÛprias, porÈm algumas piadas contadas em dialeto trentino durante as<br />

apresentaÁıes s„o de criaÁıes prÛprias. Segun<strong>do</strong> Giovanella no municÌpio de Rio <strong>do</strong>s Cedros,<br />

n„o conhece alguÈm que fabrica algum instrumento musical.<br />

Geralmente o grupo se apresenta nas festividades italianas e nos eventos organiza<strong>do</strong>s<br />

pelos cÌrculos trentinos. Os cÌrculos trentinos n„o est„o somente em atividade no <strong>Brasil</strong>, uns<br />

exemplos s„o os casos das apresentaÁıes musicais que o grupo Compagni Trentini realizou<br />

nas cidades de Corrientes e Entre Rios atravÈs <strong>do</strong> CÌrculo Trentino da Argentina. O mais<br />

importante nas apresentaÁıes para Giovanella È agradar, envolver e ganhar o p˙blico, assim<br />

como mostrar ìo valor culturalî, porque acredita que a ìm˙sica folclÛrica italianaî possui<br />

valores e, como ele mesmo aponta, apesar das mudanÁas os valores persistem, pois ìmexe<br />

com a identidade das pessoasî.<br />

Possivelmente, os motivos que levam estes m˙sicos a tocarem a m˙sica Ìtalo-trentina,<br />

v„o mais alÈm da idÈia de preservaÁ„o da tradiÁ„o, pois alÈm <strong>do</strong> cultivo cultural, est„o<br />

tambÈm as apresentaÁıes que se constroem como resulta<strong>do</strong> de ensaios, amizade,<br />

companheirismo como atos de sociabilidade. Logo, o motivo genÈrico, endereÁa<strong>do</strong> ao<br />

p˙blico, È o cultivo da tradiÁ„o, porÈm alÈm deste, existem tambÈm motivos pessoais para a<br />

construÁ„o <strong>do</strong> conjunto musical, basea<strong>do</strong>s na rede de sociabilidade e na prÛpria construÁ„o<br />

das identidades individuais e coletivas. As evidÍncias destas motivaÁıes contu<strong>do</strong>, v„o<br />

aparecer em outro depoimento, sobre o qual falo adiante. Interessante notar que anterior a<br />

origem <strong>do</strong> grupo Compagni Trentini, existia o grupo Santa Notte. Este da<strong>do</strong> indica que<br />

anteriormente a valorizaÁ„o e a preservaÁ„o da cultura Ìtalo-trentina, atravÈs da m˙sica,<br />

tambÈm esteve presente na regi„o.<br />

Nas ilustraÁıes abaixo, est„o representadas a capa e contra capa <strong>do</strong> disco <strong>do</strong> grupo<br />

Compagni Trentini:<br />

67


IlustraÁ„o 16: Capa <strong>do</strong> disco <strong>do</strong> grupo Compagni Trentini ñ ìCantavano Cosiî<br />

Fonte: (Fita K7 Compagni Trentini, 1996).<br />

A forma como o grupo se apresenta indica a ilustraÁ„o que deseja passar ao p˙blico.<br />

V·rias caracterÌsticas parecem apontar para o passa<strong>do</strong> como no caso <strong>do</strong>s trajes utiliza<strong>do</strong>s. As<br />

garrafas de vinho sobre a mesa, fazem referÍncia ‡ relaÁ„o entre italianos e a produÁ„o da uva,<br />

assim como ao prÛprio vinho, bebida que no caso <strong>do</strong> <strong>Brasil</strong>, foi produzida principalmente por<br />

migrantes de descendÍncia italiana. Quanto ao acorde„o este parece ser tambÈm o<br />

instrumento musical que acompanhou as famÌlias italianas que vieram para o <strong>Brasil</strong>. A<br />

pr·tica deste instrumento parece ter si<strong>do</strong> tambÈm cultivada nas escolas onde padres italianos<br />

lecionavam. Ten<strong>do</strong> este da<strong>do</strong> apareci<strong>do</strong> tambÈm nos depoimentos coleta<strong>do</strong>s.<br />

68


IlustraÁ„o 17: Contra capa <strong>do</strong> disco <strong>do</strong> grupo Compagni Trentini - ìCantavano Cosiî<br />

Fonte: (Fita K7 Compagni Trentini, 1996).<br />

O que mais chama atenÁ„o na ilustraÁ„o 17 È justamente a mensagem que o grupo<br />

deseja transmitir, alÈm de um agradecimento ‡s pessoas que tornaram possÌvel o registro<br />

fonogr·fico, est· tambÈm ‡ valorizaÁ„o <strong>do</strong>s h·bitos e costumes <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> que conforme<br />

afirmam foram fundamentais para a construÁ„o de uma ìnova civilizaÁ„oî, ì...por<br />

entenderem que os valores <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> contribuÌram o progresso <strong>do</strong>s povosî. Compartilham,<br />

nesta mensagem, com a vis„o de que os europeus foram a parcela das ìraÁasî que<br />

contribuÌram com o progresso da AmÈrica. As imagens <strong>do</strong> presente e <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> mesclam-se,<br />

num conjunto de m˙ltiplas referÍncias.<br />

Seja qual for o grupo, tanto musical como de danÁa, de jogo (cartas, mora ou bocha),<br />

que tÍm como objetivos preservar e transmitir a cultura italiana, estes podem encontrar<br />

possibilidades de vÌnculos com diversos Ûrg„os que apÛiam a valorizaÁ„o cultural: cÌrculos<br />

trentinos, consula<strong>do</strong> italiano, embaixada da It·lia, entre outros. Tal valorizaÁ„o Ètnica e<br />

cultural È encontrada tambÈm nas prÛprias polÌticas de Esta<strong>do</strong>,que, nos ˙ltimos anos teve a<br />

69


intenÁ„o de promover a idÈia de um Esta<strong>do</strong> multicultural em Santa Catarina. Um exemplo<br />

recente È a canÁ„o MÈrica MÈrica que se tornou a canÁ„o oficial da imigraÁ„o italiana para<br />

Santa Catarina:<br />

Governo de SC declara a m˙sica ìMÈrica, MÈrica, MÈricaî tema da colonizaÁ„o<br />

italiana no Esta<strong>do</strong>. O Circolo Trentino de Nova Trento informa que a popular<br />

canÁ„o ìMÈrica, MÈrica, MÈricaî agora È considerada oficialmente tema da<br />

colonizaÁ„o italiana no Esta<strong>do</strong> de Santa Catarina. A escolha foi aprovada pela<br />

AssemblÈia Legislativa e sancionada pelo governa<strong>do</strong>r Luiz Henrique da Silveira,<br />

sen<strong>do</strong> instituÌda, posteriormente, pela Lei N˙mero 14.239, de cinco de dezembro de<br />

2007. A determinaÁ„o passa a fazer parte das comemoraÁıes <strong>do</strong>s 130 anos de<br />

colonizaÁ„o italiana em Santa Catarina. O texto integral da m˙sica e a sua partitura<br />

podem ser encontra<strong>do</strong>s na p·gina 2 <strong>do</strong> Di·rio Oficial de SC, ediÁ„o de n˙mero<br />

18.261, de 5/12/2007. 36<br />

A dissertaÁ„o de mestra<strong>do</strong> de PatrÌcia Ruon (2005), apresenta em uma das partes de<br />

um capÌtulo sobre os corais e grupos folclÛricos que cantam e tocam m˙sica Ìtalo-trentinas.<br />

No texto de Ruon, fica claro o conjunto de relaÁıes institucionais e polÌticas intra e extra<br />

locais nas quais est„o envolvi<strong>do</strong>s estes grupos:<br />

A cidade de Rio <strong>do</strong>s Cedros dispıe de um grupo folclÛrico ativo, cria<strong>do</strong> em 1989 e<br />

lanÁa<strong>do</strong> na primeira Festa <strong>Trentina</strong> na cidade. … o Grupo FolclÛrico Colibri que<br />

est· ‡ disposiÁ„o da Prefeitura, mas È independente dela, sen<strong>do</strong> manti<strong>do</strong> por<br />

promoÁıes prÛprias, com o patrocÌnio de empresas da regi„o para o transporte,<br />

alimentaÁ„o e hospedagem. O grupo tambÈm tem apoio <strong>do</strong> CÌrculo Trentino para a<br />

aquisiÁ„o de trajes tÌpicos, viagens para apresentaÁıes e outras coisas necess·rias<br />

para se manter. O nome <strong>do</strong> grupo folclÛrico foi escolhi<strong>do</strong> pelo padre Jo„o Baptista<br />

Delsale e ìsignifica a liberdade de cantar e danÁar a histÛria, transmitin<strong>do</strong> alegria a<br />

to<strong>do</strong>s os povosî, segun<strong>do</strong> a coordena<strong>do</strong>ra Marialva Longo. O primeiro CD <strong>do</strong><br />

grupo foi lanÁa<strong>do</strong> em 2002, intitula<strong>do</strong> ì<strong>Brasil</strong>-<strong>Brasil</strong>ianoî, lembran<strong>do</strong> a fus„o <strong>do</strong>s<br />

povos italiano e brasileiro, com canÁıes nas duas lÌnguas; em 2004 foi lanÁa<strong>do</strong> o<br />

segun<strong>do</strong> CD, com m˙sicas cantadas em portuguÍs. AtÈ 1997 tambÈm havia<br />

participaÁ„o de meninos, mas hoje o grupo È composto por 37 meninas de origens<br />

diversas, com idade entre seis e 17 anos, que ensaiam todas as terÁas e quintasfeiras.<br />

Com isto, juntaram-se os grupos mirim, infantil e juvenil <strong>do</strong>s Pequenos<br />

Cantores de Rio <strong>do</strong>s Cedros, existentes atÈ 1996. [...] (2005, p·g. 100 e 101).<br />

Outro aspecto importante apresenta<strong>do</strong> na tese de Ruon, È a respeito da busca <strong>do</strong>s trajes<br />

tÌpicos na tradiÁ„o de origem (It·lia), onde a tradiÁ„o n„o est· ligada com a concepÁ„o de<br />

pobreza:<br />

Para o diretor da Associazione Trentini nel Mon<strong>do</strong>, Rino Zan<strong>do</strong>nai, a a<strong>do</strong>Á„o de<br />

trajes tÌpicos desta forma, sem pesquisa, reflete um problema; ele diz que n„o È<br />

f·cil encontrar materiais que permitem conhecer e reproduzir fielmente os costumes<br />

36 http://www.trentini.com.br/?pagina=noticiaslocais_item&id=524&unidade=26&idioma=port, acesso em<br />

09/04/2008.<br />

70


da tradiÁ„o e que o cÌrculo pode ajudar, mas n„o tem e n„o encontra muitos<br />

instrumentos para fazer isto, seja porque n„o h· um acervo na It·lia que re˙ne isto,<br />

seja porque quan<strong>do</strong> ainda existe um costume tÌpico na It·lia, È fruto de uma<br />

tradiÁ„o de riqueza, nunca de pobreza, o traje tÌpico que vestiam as pessoas È muito<br />

caro. (2005, p·g. 102)<br />

J· no municÌpio de Rodeio segun<strong>do</strong> informaÁıes de Laura Scoz, secret·ria <strong>do</strong> cÌrculo<br />

trentino de Rodeio, existe um grupo coral onde os integrantes se re˙nem informalmente, e<br />

tambÈm um grupo de danÁa que se chama Folktrentino di Rodeio onde o mesmo possui<br />

m˙sicos para a realizaÁ„o da danÁa. Apesar de hoje n„o haver um grupo musical sÛli<strong>do</strong> para a<br />

cidade de Rodeio, existiam <strong>do</strong>is grupos musicais, o Giro in It·lia e o grupo Vecchio<br />

Scarpone. Entretanto estes <strong>do</strong>is grupos n„o est„o mais em atividade.<br />

Em entrevista realizada com um <strong>do</strong>s funda<strong>do</strong>res <strong>do</strong> grupo Vecchio Scarpone, as<br />

atividades <strong>do</strong> grupo se iniciaram no ano de 1997. O grupo foi funda<strong>do</strong> por IsaÌas Girardi e<br />

M·rio Piccinini, que eram integrantes de um outro grupo musical italiano, o Giro in It·lia. O<br />

motivo principal pela criaÁ„o <strong>do</strong> grupo foi o de montar um conjunto que executassem somente<br />

m˙sicas italianas, j· que o Giro in It·lia da qual IsaÌas e M·rio faziam parte, executavam<br />

tambÈm m˙sicas de outros gÍneros alÈm da italiana. O respons·vel pela atribuiÁ„o <strong>do</strong> nome<br />

ao grupo foi o sogro <strong>do</strong> M·rio Piccinini, DesidÈrio PerÛn (<strong>do</strong>no da revista Insieme 37 ). O<br />

nome Vecchio Scarpone È de uma m˙sica cujo autor È desconheci<strong>do</strong> e que fez uma poesia<br />

olhan<strong>do</strong> para uma velha bota usada na guerra. O local de ensaio era na casa <strong>do</strong> pai de uma<br />

das cantoras.<br />

Os integrantes que constituÌam o grupo e seus respectivos instrumentos musicais de<br />

<strong>do</strong>mÌnio eram M·rio Piccinini (Guitarrista), Antonio Zonta (Baixista), Ajuir Frainer<br />

(Baterista), IsaÌas Girardi (Tecla<strong>do</strong> e Acorde„o), Leonar<strong>do</strong> Bertoldi ( Tecla<strong>do</strong> e Acorde„o),<br />

Almir Venturi, Arcanjo Cristofolini, Jair Tessarollo, Josemari Frainer, Popa Frainer e Gisela<br />

PerÛn Piccinini (Cantores). Segun<strong>do</strong> IsaÌas Girardi, to<strong>do</strong>s os integrantes s„o descendentes de<br />

imigrantes trentinos. M·rio Piccinini era considera<strong>do</strong> lÌder <strong>do</strong> grupo. O grupo possui um Cd<br />

grava<strong>do</strong> com a mensagem Tributo alla memoria italiana, constitui um repertÛrio de 14<br />

m˙sicas: Vecchio Scarpone, Simpatici Italiani, La Bella Moriccella, Mechimecomica, La<br />

Piccinina, Il Geghege, Fiori Trasteverini, Felicita, Samba Italiano, Paesanella, L`imigrante<br />

Italiano, La Tramontana, Vita di Campagna, Bella Pastora, Una Vecchia Canzone Italiana.<br />

37 Insieme È uma revista publicada pelo Organo Ufficiale dellí Associazione Stampa Italiana in <strong>Brasil</strong>e ñASIB,,<br />

que trata sobre assuntos gerais como por exemplo eventos culturais, festas, acor<strong>do</strong>s bilaterais, serviÁos para<br />

reconhecimento da cidadania italiana, entre outros.<br />

71


N„o existia uma coreografia especÌfica para o grupo, entretanto, enquanto executavam as<br />

m˙sicas o grupo realizava pequenos movimentos.<br />

AlÈm <strong>do</strong>s instrumentos musicais cita<strong>do</strong>s, o grupo utilizava tambÈm ban<strong>do</strong>lim,<br />

cavaquinho, viol„o, castanholas e gaita de boca. Os cantores em determinadas canÁıes<br />

cantavam em unÌssono e outras a quatro vozes, soprano, contralto, tenor e baixo. Segun<strong>do</strong><br />

Girardi, dentre os ritmos toca<strong>do</strong>s pelo grupo estavam a tarantella, mazurka, valsa, polka,<br />

marcha e outras essencialmente <strong>do</strong> folclore e popular da It·lia. Cada instrumentista possuÌa<br />

sua pasta de m˙sicas com as respectivas escalas para os instrumentos. Para a afinaÁ„o <strong>do</strong>s<br />

instrumentos, os instrumentistas utilizavam afina<strong>do</strong>r eletrÙnico. Em algumas m˙sicas o grupo<br />

utilizava partituras, principalmente quan<strong>do</strong> havia solo de acorde„o. Segun<strong>do</strong> Girardi, no<br />

municÌpio de Rodeio, durante a dÈcada de 50 e 60, a famÌlia Frainer fabricava acordeıes, hoje<br />

apenas <strong>do</strong>is irm„os restauram acordeıes na cidade. Em relaÁ„o ao aprendiza<strong>do</strong> de m˙sica,<br />

IsaÌas Girardi aprendeu no colÈgio <strong>do</strong>s padres Salesianos.<br />

A disposiÁ„o <strong>do</strong>s instrumentistas durante as apresentaÁıes eram os seis cantores na<br />

frente, logo atr·s os demais instrumentistas e o baterista atr·s de to<strong>do</strong>s. As apresentaÁıes<br />

eram realizadas sempre em finais de semana, o grupo se apresentou de 1998 atÈ 2005 e dentre<br />

este perÌo<strong>do</strong> chegou a apresentar nos Esta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Mato Grosso <strong>do</strong> Sul, EspÌrito Santo, Rio de<br />

Janeiro, S„o Paulo, Paran·, Santa Catarina e Rio Grande <strong>do</strong> Sul, sen<strong>do</strong> que no ano de 1997 o<br />

grupo se dedicou apenas aos ensaios. O mais importante nas apresentaÁıes para Girardi era<br />

manter a alegria, o grupo se apresentar afina<strong>do</strong> e interagir tanto com o p˙blico como com os<br />

prÛprios integrantes.<br />

O grupo fez o que fez devi<strong>do</strong> a to<strong>do</strong>s os integrantes serem amantes da m˙sica italiana,<br />

infelizmente se desfez no final de 2005, no auge, por problemas envolven<strong>do</strong> o trabalho de<br />

cada um, com falta de tempo, por ser muito cansativo. PorÈm IsaÌas complementa que o<br />

reca<strong>do</strong> foi da<strong>do</strong> e atualmente tem saudades das viagens, das grandes apresentaÁıes, algumas<br />

delas para mais de 15.000 especta<strong>do</strong>res, da amizade e companheirismo. ApÛs isso cada<br />

integrante seguiu o seu rumo na vida.<br />

72


Nas ilustraÁıes abaixo est„o representadas a capa e contra capa <strong>do</strong> disco <strong>do</strong> grupo<br />

Vecchio Scarpone:<br />

IlustraÁ„o 18: Capa <strong>do</strong> disco grupo Vecchio Scarpone<br />

Fonte: (Cd <strong>do</strong> grupo Vecchio Scarpone, 2002).<br />

Alguns aspectos importantes que fazem relaÁ„o com a cultura de origem est„o<br />

retrata<strong>do</strong>s atravÈs da ilustraÁ„o 18, o nome <strong>do</strong> prÛprio grupo, as cores verde branca e<br />

vermelha (cores da bandeira italiana), os trajes tÌpicos, o mapa italiano e tambÈm a prÛpria<br />

mensagem em bilÌng¸e da capa, Tributo alla Memoria Italiana- Tributo ‡ MemÛria Italiana.<br />

Outro aspecto importante demonstra<strong>do</strong> na capa, È a idÈia de continuidade <strong>do</strong> trabalho <strong>do</strong><br />

grupo, representa<strong>do</strong> como Volume 1.<br />

73


IlustraÁ„o 19: Contra capa <strong>do</strong> disco <strong>do</strong> grupo Vecchio Scarpone<br />

Fonte: (Cd <strong>do</strong> grupo Vecchio Scarpone, 2002).<br />

J· na ilustraÁ„o 19 (contracapa da ilustraÁ„o 18) apresenta caracterÌsticas que n„o<br />

somente remete para a concepÁ„o tradicional, mas sim a Ínfase em que o grupo se encontra<br />

alÈm <strong>do</strong> tradicional, mais recentes, aspectos modernos, onde a transmite a idÈia de uma<br />

concepÁ„o de um grande show musical para uma grande quantidade de pessoas, o tamanho <strong>do</strong><br />

palco, os instrumentos e utensÌlios desenvolvi<strong>do</strong>s com o avanÁo da tecnologia que fazem parte<br />

de uma Època mais recente, tais como a iluminaÁ„o, os microfones e instrumentos musicais<br />

elÈtricos que s„o amplifica<strong>do</strong>s seus sons atravÈs de caixas ac˙sticas. Isto com o objetivo de<br />

ampliar a capacidade de intensidade sonora (volume), fazen<strong>do</strong> com que atinja um maior<br />

n˙mero de ouvintes. TambÈm o elemento din‚mico est· bem caracteriza<strong>do</strong> em um tÌtulo de<br />

74


uma das m˙sicas que constituem o Cd, a faixa Samba Italiano. Ambos os termos, tanto o<br />

Samba como o Italiano, devi<strong>do</strong> a um h·bito de pensamento remetem a caracterÌsticas que n„o<br />

possuem relaÁıes, porÈm est· comprova<strong>do</strong> que ambos podem se misturar.<br />

75


CONSIDERA«’ES FINAIS<br />

H· muito que fazer no que diz respeito ao estu<strong>do</strong> das manifestaÁıes musicais no<br />

esta<strong>do</strong> de Santa Catarina, pois o mesmo È palco de diversas culturas distintas alÈm da Ìtalo-<br />

trentina. … fundamental salientar que este projeto poder· ser amplia<strong>do</strong> em futuras pesquisas.<br />

Foi esta uma das principais intenÁıes acadÍmicas para a elaboraÁ„o <strong>do</strong> mesmo; um bom<br />

alicerce para futuros projetos de pesquisa, sejam eles tanto de especializaÁ„o e mestra<strong>do</strong><br />

quanto de <strong>do</strong>utora<strong>do</strong>.<br />

Algumas idÈias que podem constituir novos projetos s„o: a obtenÁ„o de da<strong>do</strong>s atravÈs<br />

de registros fonogr·ficos, pesquisas sobre os grupos musicais existentes ou j· extintos,<br />

composiÁ„o de arranjos musicais para este tipo de manifestaÁ„o, entre outras. Como estas<br />

manifestaÁıes expressivas musicais s„o em parte produto de uma origem setentrional italiana,<br />

outra lacuna a ser preenchida È a traduÁ„o para a lÌngua portuguesa <strong>do</strong>s materiais escritos<br />

sobre este tipo de manifestaÁ„o.<br />

A pesquisa em fontes histÛricas na regi„o Trentino-Alto Adige tambÈm pode ser um<br />

viÈs interessante para comparaÁ„o com as manifestaÁıes existentes no <strong>Brasil</strong>. AlÈm disto<br />

existem diversas redes polÌticas econÙmicas e culturais que envolvem estas manifestaÁıes<br />

artÌsticas. Muitos <strong>do</strong>s materiais e depoimentos a que tive acesso apontam neste senti<strong>do</strong>. O<br />

prÛprio cÌrculo trentino existe numa tÍnue relaÁ„o entre o plano local onde concretamente se<br />

realizam estas manifestaÁıes e o plano global ou internacional que envolvem esta<strong>do</strong>s<br />

nacionais e suas implicaÁıes.<br />

As publicaÁıes bilÌng¸es, algumas das quais citadas neste TCC, tambÈm indicam uma<br />

relaÁ„o muito prÛxima e profÌcua de troca entre os paÌses para os quais se destinaram os<br />

migrantes Ìtalo-trentinos <strong>do</strong> sÈculo XIX. Estas relaÁıes por certo influenciam nas<br />

manifestaÁıes musicais nestes paÌses e no di·logo destes com a referÍncia de ìorigemî.<br />

Neste senti<strong>do</strong> o trabalho, mais <strong>do</strong> que chegar a uma conclus„o propriamente dita,<br />

procurou fundamentar o estu<strong>do</strong> sobre estas manifestaÁıes musicais em relaÁ„o a algumas de<br />

suas implicaÁıes, abrin<strong>do</strong> assim, caminhos para novas pesquisas.<br />

76


REFER NCIAS BIBLIOGR¡FICAS<br />

BATALHA, LuÌs. Antropologia uma perspectiva holÌstica. Universidade TÈcnica de Lisboa<br />

- Instituto Superior de CiÍncias Sociais e PolÌticas: Lisboa, 2005.<br />

BERNARDI, Paulo. CanÁ„o <strong>do</strong> Imigrante Italiano: sua leitura a partir de uma localidade<br />

rural catarinense (1996-1999). FlorianÛpolis: UFSC, 2003.<br />

BONATTI, M·rio Pe.; LENZI, Mauro. As Primeiras FamÌlias <strong>Trentina</strong>s de Rio <strong>do</strong>s<br />

Cedros - AssociaÁ„o Educacional Leonar<strong>do</strong> da Vinci ( ASSELVI ). Indaial: editora Asselvi,<br />

2006.<br />

CARNEIRO, Edison. Din‚mica <strong>do</strong> Folclore. Rio de Janeiro: editora civilizaÁ„o brasileira<br />

S.A., 1965.<br />

CARVALHO, JosÈ Jorge de. As duas faces da TradiÁ„o. O cl·ssico e o popular na<br />

Modernidade Latino americana. In: SÈrie Antropologia. UNB ñ BrasÌlia, 1991. DisponÌvel<br />

em http://www.unb.br/ics/dan/Serie109empdf.pdf, acesso em 13/06/2008.<br />

CARVALHO, Jorge de; SEGATO, Rita Laura. Sistemas Abertos e TerritÛrios Fecha<strong>do</strong>s:<br />

para uma nova compreens„o das interfaces entre m˙sica e identidades sociais. In: SÈrie<br />

Antropologia, UNB-BrasÌlia, 1994. DisponÌvel em<br />

http://www.unb.br/ics/dan/Serie164empdf.pdf, acesso em 13/06/2008.<br />

CÕRCULO Trentino de Rodeio. 19 La Sagra, Rodeio, 2007. [ Folheto de divulgaÁ„o]<br />

CÕRCULO Trentino de Rio <strong>do</strong>s Cedros. 18 Festa <strong>Trentina</strong>, Rio <strong>do</strong>s Cedros, 2007. [Folheto de<br />

divulgaÁ„o]<br />

COMPAGNI TRENTINI. Cantavano Cosi. ProduÁ„o Musical: Grupo Folkloristico<br />

Compagni Trentini. Blumenau: Studio Phoenix, p. 1996. Fita K7 (aprox. 60 min)<br />

CORRADIN, Giuseppe. E cantavam: coleÁ„o de cantos populares da regi„o de imigraÁ„o<br />

italiana no Rio Grande <strong>do</strong> Sul. Porto Alegre: CIBAI, 1972.<br />

DALMOLIN, C·tia. MordaÁa Verde Amarela: imigrantes e descendentes no Esta<strong>do</strong> Novo<br />

em Santa Maria e Regi„o. In: C·tica Dalmolin (organiza<strong>do</strong>ra). MordaÁ„o Verde Amarela:<br />

imigrantes e descendentes no Esta<strong>do</strong> Novo. Santa Maria: Pallotti, 2005.<br />

FRANZONI, Tereza Mara. Cultura e Etnicidade: uma pequena viagem com olhares<br />

contempor‚neos. FlorianÛpolis: UFSC, 2004.<br />

GROSSELI, Renzo Maria. Vencer ou morrer: camponeses Trentinos (VÍnetos e<br />

Lombar<strong>do</strong>s) nas florestas brasileiras de Santa Catarina 1875-1900. TraduÁ„o: Solange<br />

Ugo Luques e Ciro Mioranza ñ FlorianÛpolis: Ed. da UFSC, 1987.<br />

GROUT, Donald J.; PALISCA, Claude J.. HistÛria da M˙sica Ocidental. Gradiva: 5<br />

ediÁ„o, 2007.<br />

77


SEYFERTH, Giralda. ImigraÁ„o e Cultura no <strong>Brasil</strong>. BrasÌlia: Editora Universidade de<br />

BrasÌlia, 1990.<br />

_____. A idÈia de Cultura Teuto-<strong>Brasil</strong>eira: literatura, identidade e os significa<strong>do</strong>s da<br />

etnicidade. In: Horizontes AntropolÛgicos, ano 10, n.22, jul./dez. 2004.<br />

SILVA, Marilda R. G. Checcucci GonÁalves da. ImigraÁ„o Italiana e vocaÁıes religiosas<br />

no Vale <strong>do</strong> ItajaÌ. Campinas, SP: Editora da Furb / Editora da Unicamp / Centro de<br />

MemÛria da Unicamp, 2001.<br />

LEDRA, Victorio. Cancioneiro <strong>do</strong> Imigrante Italiano. Blumenau: FURB. Co-ed.: ASSAC ñ<br />

AssociaÁ„o ArtÌstico-Cultural de Brusque, 1989.<br />

LIMA, Rossini Tavares de. AbecÍ <strong>do</strong> Folclore. S„o Paulo: 5 ediÁ„o, editora Ricordi, 1972.<br />

MACCHIARELLA, Ignazio. Introduzione al Canto di Tradizione Orale nel Trentino.<br />

Dipartamento di Scienze Filologiche e Storiche. Universit‡ degli studi di Trento: 1999.<br />

MARTINS, Pedro. A tradiÁ„o e o espet·culo como estratÈgia de inserÁ„o social de grupo<br />

migrantes. In: VII RAM - UFRGS, Porto Alegre, <strong>Brasil</strong>, 2007 - GT 27 Antropologia das<br />

MigraÁıes Internacionais. CoordenaÁ„o: Igor JosÈ de RenÛ Macha<strong>do</strong>(UFSCar, <strong>Brasil</strong>) e<br />

Beatriz Padilla (ISCTE, Lisboa, Portugal)<br />

MENEZES BASTOS, Rafael JosÈ de. A ìorigem <strong>do</strong> sambaî como invenÁ„o <strong>do</strong> <strong>Brasil</strong>:<br />

sobre ìFeitio de OraÁ„oî de Vadico e Noel Rosa(por que as canÁıes tem m˙sica?). In:<br />

ANPOCS ñ AssociaÁ„o Nacional de PÛs-GraduaÁ„o e Pesquisa em CiÍncias Sociais.<br />

DisponÌvel em http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_31/rbcs31_09.htm,<br />

acesso em 13/06/2008.<br />

NETTL, Bruno. O estu<strong>do</strong> comparativo da mudanÁa musical: estu<strong>do</strong>s de caso de quatro<br />

culturas. In: Revista AnthropolÛgicas, ano 10, volume 17(1), 2006.<br />

PIAZZA, Walter Fernan<strong>do</strong>. A ColonizaÁ„o de Santa Catarina. FlorianÛpolis: [ BRDE ñ<br />

PremiaÁ„o <strong>do</strong> Concurso Regional de HistÛria ] 1982.<br />

PROVINCIA Autonoma di Trento Assessorato A`ll Emigrazione. Gli ultimi duecento anni/<br />

Os ˙ltimos duzentos anos. [Collana di Monografie ìLa Patria D`origineî ñ ediÁ„o bilÌng¸e]<br />

Trento, 1994.<br />

RUON, PatrÌcia. O Õtalo-Trentino no desenvolvimento <strong>do</strong> Vale <strong>do</strong> ItajaÌ (SC): estu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s<br />

municÌpios de LuÌs Alves, Rio <strong>do</strong>s Cedros e Rio <strong>do</strong> Oeste. DissertaÁ„o (Mestra<strong>do</strong> em<br />

Desenvolvimento Regional) FundaÁ„o Universidade Regional de Blumenau, Blumenau, 2005.<br />

SADIE, Stanley; LATHAM, Alison. Dicion·rio Grove de m˙sica: ediÁ„o concisa. Vers„o<br />

traduzida por Eduar<strong>do</strong> Francisco Alves. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1994.<br />

SANTANA, JosÈ Ac·cio. CanÁıes italianas /recolhidas e musicografadas por JosÈ Acacio<br />

Santana. FlorianÛpolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 1982. - 100 partituras.<br />

78


TEIXEIRA, Francisco Martins; BRAND O, Thadeu. Cultura Popular e Atividade<br />

TurÌstica. In: Faculdade C‚mara Cascu<strong>do</strong>. DisponÌvel em<br />

http://www.fcamaracascu<strong>do</strong>.com.br/home/media/Art.%20Cult%20pop%20e%20ativ%20tur.p<br />

df, acesso 13/06/2008.<br />

THOMPSON, E. P. Costumes em Comum. TraduÁ„o: Rosaura Eichemberg. Revis„o<br />

TÈcnica: Antonio Negro, Cristina Meneguello, Paulo Fontes. S„o Paulo: Companhia das<br />

Letras, 1998.<br />

VECCHIO SCARPONE. Tributo alla MemÛria Italiana. DireÁ„o Geral: M·rio Piccinini.<br />

TÈcnico de GravaÁ„o: Gean Carlos Coelho. Indaial: Multi Sound Studio Digital, p. 2002. Cd<br />

(aprox. 50min)<br />

VICENZI, Victor. Canti dei nossi nonni: canÁıes italianas: cultura popular [seleÁ„o P.<br />

Victor Vicenzi] 1970.<br />

_____. HistÛria e ImigraÁ„o Italiana de Rio <strong>do</strong>s Cedros. 3 ediÁ„o, 2000.<br />

79

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!