15.05.2015 Views

Prosa - Academia Brasileira de Letras

Prosa - Academia Brasileira de Letras

Prosa - Academia Brasileira de Letras

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

A Torre <strong>de</strong> Babel e o neokantismo<br />

Mas, retomemos a figura da torre. As comparações seriam, no plano histórico,<br />

as pirâmi<strong>de</strong>s egípcias e os zigurates mesopotâmicos, cujo <strong>de</strong>senho Breughel <strong>de</strong>ve<br />

ter conhecido, dada a semelhança com sua Torre (ou com suas torres: mais semelhança,<br />

aliás, no caso do quadro menor). E ainda as pirâmi<strong>de</strong>s truncadas dos<br />

maias e dos astecas, cuja origem ao que suponho continua sendo um enigma. Os<br />

zigurates <strong>de</strong>vem ter sido o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Breughel, e <strong>de</strong> resto a narrativa bíblica fala<br />

em tijolos, que eram (e não a pedra) o material usado pelos cal<strong>de</strong>us.<br />

No Canto primeiro do “Purgatório”, Dante refere um monte, que é o<br />

próprio Purgatório (dove l’umano spirito si purga) e que é como o tronco <strong>de</strong> um<br />

cone, com sete planos em volta. Em 1465, Domenico di Michelino pintou<br />

um retrato <strong>de</strong> Dante, corpo inteiro, com um livro na mão, tendo ao fundo a<br />

“Montanha do Purgatório”: no alto <strong>de</strong>sta, uma alusão ao Paraíso. A montanha,<br />

semelhante a um zigurate (e também a um bolo <strong>de</strong> noiva), antecipa em<br />

alguma medida a Torre <strong>de</strong> Breughel, que na verda<strong>de</strong> tem algo <strong>de</strong> monte e algo<br />

<strong>de</strong> zigurate. Breughel está mais próximo do drama da junção / conflito entre<br />

o natural e o humano.<br />

Erich Auerbach menciona os “sete terraços” da Torre <strong>de</strong> Babel, lembrando<br />

o número sete presente nas jornadas gnósticas (Dante trazendo para a Comédia<br />

elementos orientais).<br />

<br />

Retornemos aos séculos XVI e XVII (O príncipe em 1513, o Leviatã em<br />

1651). Em Maquiavel a política se acha <strong>de</strong>scrita como um domínio in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte<br />

da ética e da teologia: os homens fazem e <strong>de</strong>sfazem as situações. Em<br />

Hobbes a natureza humana condiciona a passagem do estado “<strong>de</strong> natureza”,<br />

com seus perigos, para o Estado social, através do contrato: novamente o humano,<br />

isto é, o político, superando o natural, isto é, o pré-político. O processo<br />

<strong>de</strong> secularização, com seu preço da perda das transcendências, impôs ao homem<br />

a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> assumir autorias. Cada vez mais se discutem problemas<br />

institucionais, inventam-se doutrinas. O Oci<strong>de</strong>nte da transição pós-revoluções<br />

liberais é crescentemente um fórum <strong>de</strong> <strong>de</strong>bates.<br />

199

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!