10JORNAL DA <strong>ACIL</strong>/Junho 2008IMIN 100Os pioneiros quedominaram o chão vermelhoJaponeses chegaram na década anterior à da criação do município. Por trás denomes impronunciáveis à época estavam homens que iriam se transformar num doseixos da construção de Londrina e do Norte do Paranáosé Antonio Pedrialispecial para a <strong>ACIL</strong>O Brasil comemora os 100 anos da chegada darimeira leva de imigrantes japoneses transportaapelo navio Kasato Maru, que aportou em Santosm 18 de junho de 1908. Trazia 781 migrantes. Amigração japonesa ampliou significativamente oaráter multi-étnico do brasileiro, incorporandoua cultura, usos e costumes ao cotidiano nacioal.É possível conceber o Brasil sem os japoneses?É possível conceber o Paraná e Londrina semles?O Paraná foi o segundo destino seguido porsses imigrantes, depois da temporada obrigatóriam São Paulo, primeiro na Hospedaria dos Imigranes,em Santos, para triagem e encaminhamento,m seguida para as fazendas de café daquele Estao.O Paraná entrou na rota desse povo em busca dema nova pátria na década de 1920, oferecendohesterras na região de Cambará, então o principalentro produtor de café do Estado, e, em seguida,a imensidão dos 515 mil alqueires paulistas aduiridosentre os rios Tibagi e Ivaí pela Companhiae Terras Norte do Paraná, derivada da Paranálantation, derivada da Brazil Plantation que, porua vez, era subsidiária da Sudan Plantation –mpresa privada de capital inglês.Tudo ainda não passava de um projeto quandoqui chegou a primeira caravana de japoneses comotencial de adquirir as terras que a companhianglesa pretendia colonizar. Se, como informa oGênese, até o Universo começoupelo verbo, foi também peloverbo que Londrina – o NorteNovo, enfim – teve início: foi aconversa dos ingleses que convenceuos japoneses a apostaremseu futuro numa região dominadapela floresta.Quando os primeiros japonesesconheceram o projeto dosingleses, o que havia era só umprojeto: um punhado de ranchosde palmito cobertos com sapé oulascas de madeira que abrigavamos funcionários da empresae alguns galpões, também deconstrução tosca. Havia, no entanto,duas fazendas: do agrimensorMabio Palhano, que vierano ano anterior, a serviço dosingleses, fazer a demarcação doslotes, e a Fazenda Quati, pertencenteao presidente da Provínciado Paraná Affonso Alvesde Camargo. Estava situada onde é hoje o JardimShangri-lá e era administrada por Bertholdo Durães.Oitenta pessoas trabalhavam na formação de 60mil cafeeiros.Os ingleses estabeleceram o primeiro acampamentoaqui em 21 de agosto de 1929, a partir do qualcomeçaram a estruturar o empreendimento gigantesco.Esse acampamento foi montado no“Patrimônio Três Bocas” – hoje Marco Zero. OFoto: José JulianiHomem em plantação de algodão, na região de Londrina:principal cultura no início do projeto daCompanhia de Terras deu lugar ao caféresponsável pela equipe pioneira enviada pela companhiaera o paulista de origem e formação inglesaGeorge Craig Smith. Três meses depois, Smith –então na faixa dos 20 anos – acompanhou a Londrinao primeiro grupo de interessados em conhecer opotencial do empreendimento. Eram nove japoneses.Foram os primeiros a adquirir os lotes dacompanhia.A comitiva viajou de Cambará, onde se hospedarano Hotel Shiraiwa, a bordo de uma caminhoneteFord. Além de Smith, a Companhia de Terras haviaescalado outro funcionário para acompanhar oscompradores em potencial. Era o também japonêsHikoma Udihara, experiente na fixação de seusconterrâneos ao longo da estrada de ferro NoroestePaulista e na região de Cambará, onde trabalharapara a Companhia Agrícola Barbosa, pertencenteao major Antônio Barbosa Ferraz Júnior. Udiharahavia sido contratado pelos ingleses como corretorjunto aos japoneses recém-chegados ao Brasil.Passaram a noite num galpão do PatrimônioTrês Bocas. Dormiram mal. O rugido das onças erainquietante.Dos nove japoneses, seis tinham potencial paraadquirir as terras. Estavam descartados o agrimensorKinsaku Saito, o jornalista Shinshi Furuhata eo corretor de terras no Japão Haruyoshi Oda – a eleseria atribuída a missão de atrair de lá interessadosem se fixar na região ainda selvagem. Dos seis,quatro fecharam negócio no ano seguinte: Mitsuji
JORNAL DA <strong>ACIL</strong>/Junho 200811Os primeiroscomerciantesGrupo de japoneses trazido pela Companhia de Terras Norte do Paraná nadécada de 1930: George Craig Smith é o único ocidental na imagemOhara e Toshio Tan, em 27 de março de 1930, eMassaharu Ohara e Massahiko Tomita, no diaseguinte. Em 1º de abril, Moshin Yamazaki eToshikazu Yamate, que não compuseram a primeiracomitiva, também compraram lotes.Compraram, mas não vieram. A infra-estruturaera inexistente, não havia como escoar a produção.Não havia sequer caminho para chegar aos lotesadquiridos da companhia.Não foram, no entanto, nenhum desses compradorespioneiros os primeiros a se estabelecernas terras. O primeiro japonês a fixar residênciaaqui foi Chojuro Hara. E veio sem depender dacompanhia. Empregou-se na Fazenda Quati, onde,em 8 de outubro de 1931, assinou contrato deprestação de serviços com vigência para três anos.Seis dias depois, aí sim, chegaram os primeirosclientes da companhia destinados a fixar residênciano desconhecido: as famílias YoshitamiKazahaya, Kootaro Hayassaka e Kunijiro Hara.Escola japonesa, onde hoje fica a rua Hugo Cabral,em foto tirada em 1938: educação e culturanipônicas preservadas entre os imigrantesA última etapa da viagem deles fora Ourinhos,onde se hospedaram no Hotel Ogawa. Os Kazahayae Hayassaka vinham de Monte Alto (SP). Já seconheciam, portanto, e vieram a conhecer os Hara,procedentes da também paulista Duartina, somentenaquele hotel. Tiveram tempo de sobra para seconhecerem, aliás. Choveu torrencialmente durantetrês dias e somente no quarto dia o transporteprovidenciado pela Companhia de Terras pôdeiniciar a viagem. Era um caminhão e uma jardineira.A jardineira para as mulheres e filhos doschefes de família, o caminhão para a mudança – oshomens tiveram direito a uma passagem de trematé Cambará.As três primeiras famílias a se estabelecer noempreendimento inglês só conheceram a terradestinada a eles no dia seguinte à chegada aodestino, quando, então, assinaram os documentosde compra. Foram destinados para a Colônia Um,ou Ikku, onde hoje se situa o aeroporto e imediações.Haviam trazido provisões, porquesabiam que aqui ainda nada seproduzia e nada se comercializava.Abrigaram-se num barracão da companhiaaté abrir uma clareira nos lotes eerguer seus ranchos. E foram sábiosna escolha do que plantar: Hara dedicou-seao arroz (havia aberto trêsalqueires), Kazahaya ao milho eHayassaka ao feijão. Tinham, assim,os itens básicos da alimentação. Aproteína lhes seria fornecida pela floresta,abundante em animais.Chegada a colheita, comprovaramque haviam escolhido o caminho certopara o futuro: a fertilidade da terrarendeu 50 sacos de arroz por alqueiree 150 balaios de milho. A produtividadedo feijão (cujo volume a histórianão registrou) também foi altíssima.Dessa fartura resultou talvez oprimeiro empreendimento comercialde Londrina que não dependia da Companhiade Terras: o comércio de arroz.Foto: Nippon Como a produção de Hara era excessivadiante da necessidade de sua famíliae de seus conterrâneos, ele instalouum moinho para beneficiamentoKunijiro Hara talvez tenha sido o primeirocomerciante local, vendendo o excedente de suaprodução de arroz. A atividade comercial atrairiaoutros conterrâneos. Taichi Okabayashi abre em1933 um armazém de secos e molhados e setorna pai da primeira nissei nascida nopatrimônio que viria a ser Londrina - é EstelaOkabayashi Fuzii, que se aposentou comoprofessora da Universidade Estadual deLondrina. No ano seguinte, Goro Oya inaugurauma fábrica de implementos agrícolas e carroçase Guissaku Nishioka, a Casa Azul, na ruaSergipe. O empreendimento se converteria numareferência para os pequenos agricultores.Nishioka expandiria suas atividades para ocomércio e beneficiamento de café e seria umdos fundadores da Associação Comercial. Elefaleceu em 1949.O primeiro empreendimento industrial,embora de pequenas dimensões, de um migrantejaponês foi a fábrica de shoyu Akebano, ouAurora, montada pelo casal Kiku e MasatoshiIshitani, que se estabeleceram em 1939. Afábrica funcionou até 1972.O Cine-Teatro Municipal, que encantouplatéias nas décadas de 40 e 50 e situava-se naRua Rio de Janeiro entre a Avenida Paraná e ruaSergipe, foi uma iniciativa de Satoru Nishiyama.A rua Sergipe, aliás, foi o centro comercialdos japoneses e seus descendentes durante 40anos. Não é à toa que um dos primeiros edifícioslondrinenses, construído lá (esquina com a Riode Janeiro), na década de 1950, se chamaTóquio. Bazares, farmácias, relojoarias, umsupermercado – Casa Garça, da família Ogawa –e até dois bancos, América do Sul e Tozan,marcaram essa rua. O comércio japonês naSergipe entrou em declínio nos anos 80. Masestabelecimentos que fizeram história aindaestão lá, entre eles as Casas Ajita e o BazarAjimura, que, além de manter a mesma atividadecomercial desde a fundação, preserva a históriaatravés de seu mobiliário e fachada. (J.A.P)do produto, aproveitando-se da queda d’água existenteem sua propriedade. Um ano depois, ele teriacinco moinhos.O potencial da terra roxa ganhou fama e atraiunovos colonos que, a partir de então, chegariam emlevas sucessivas. E os sítios de Hara, Hayassaka eKazahaya transformaram-se no mostruário da Companhiade Terras: os interessados em comprarseus lotes eram levados até eles para que conhecessemo que a terra era capaz de produzir.Um ano após a chegada dessas três famílias,eram 400 as estabelecidas. Seis meses depois,esse número saltaria para 700.A esses pioneiros japoneses deve-se também aintrodução do café. Os três primeiros, mais seusvizinhos Kawabata e Yamassaki, foram buscar sementes– abrindo caminho a facão – em Sertanópolis,a 40 quilômetros de distância, tornando-se, alémde produtores, fornecedores para os interessados.O café se imporia às demais culturas, tornando-seo principal atrativo para o rápido – e explosivo –povoamento do Norte do Paraná.