princípio”: responder à violência das falanges. Se preciso, com violênciaainda maior.(AMORIM, 2004, p.99)Mais uma vez, apresenta-se claramente a parcela de culpa <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>para o surgimento das organizações crimi<strong>no</strong>sas. Policiais são cita<strong>do</strong>s como um <strong>do</strong>sinteressa<strong>do</strong>s, estimula<strong>do</strong>res e beneficia<strong>do</strong>s pela onda de <strong>crime</strong>s que assolava asdependências <strong>do</strong> presídio. A existência de facções com o fim de obter vantagens,patrimoniais ou não, <strong>no</strong> interior <strong>do</strong> presídio já se apresenta como um poder paraleloao estatal. Isto porque, na realidade, quem controla os presos são os líderes dasfalanges, embora seja este controle uma obrigação <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, o responsável pelaadministração e manutenção das unidades prisionais em to<strong>do</strong> o país.O mais desola<strong>do</strong>r em tu<strong>do</strong> isto é constatar que o Esta<strong>do</strong>, apesar daslições <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, permanece <strong>no</strong> seu erro. Os problemas de outrora são facilmenteconstata<strong>do</strong>s <strong>no</strong>s dias atuais em <strong>no</strong>ssos presídios. Estes continuam abrigan<strong>do</strong> juntoto<strong>do</strong> e qualquer tipo de preso, independentemente <strong>do</strong>s tipos penais que tenham si<strong>do</strong>pratica<strong>do</strong>s por ele, o que transforma qualquer presídio em uma verdadeirauniversidade <strong>do</strong> <strong>crime</strong>. As instalações precárias ainda se fazem presentes, bemcomo o problema da super lotação. A corrupção de agentes estatais permanece,caso contrário não seriam encontra<strong>do</strong>s <strong>no</strong>s presídios armas, telefones celular,drogas, entre outros.Onze prisioneiros pertencentes ao Coman<strong>do</strong> Vermelho haviam searticula<strong>do</strong> para executar uma tentativa de fuga <strong>no</strong> dia 18 de agosto de 1979.Todavia, apesar <strong>do</strong> pla<strong>no</strong> ter si<strong>do</strong> muito bem arquiteta<strong>do</strong>, a evasão <strong>do</strong>s prisioneirosnão se concretiza, pois um <strong>do</strong>s presidiários, que possuía passagem livre entre todasas falanges, delata a tentativa de fuga ao capitão. Esta delação vai precipitar aguerra entre as falanges pela hegemonia <strong>do</strong> poder dentro <strong>do</strong> presídio, ocasionan<strong>do</strong>um massacre que ficou conheci<strong>do</strong> como “A Noite de São Bartolomeu” (AMORIM,2004, p. 121).O responsável pela delação assi<strong>no</strong>u sua sentença de morte perante oComan<strong>do</strong> Vermelho, que decidiu que o fato não poderia passar impune. A partir deentão se inicia uma investigação para apurar quem havia alerta<strong>do</strong> o capitão sobre afuga. O resulta<strong>do</strong> da investigação, como é mostra<strong>do</strong> por Amorim, é catastrófico e vaipiorar ainda mais as relações entre as falanges:
A sentença de morte é irrecorrível. Alguém vai mesmo morrer. To<strong>do</strong>s oshomens que aceitam a orientação <strong>do</strong> Coman<strong>do</strong> Vermelho, dentro e fora daGaleria LSN, procuram a pista que leve ao delator. [...] por uma dessasinfelicidades da vida, as melhores informações apontam na direção dapessoa errada. É um preso que há tempos carrega a suspeita de colaborarcom a administração <strong>do</strong> presídio. Só para piorar: é inter<strong>no</strong> <strong>do</strong> território daFalange Jacaré, na Galeria C. Foi assassina<strong>do</strong> a facadas <strong>no</strong> dia 13 desetembro de 1979. Mas não tinha nada a ver com o peixe. (AMORIM, 2004,p.126)A Falange <strong>do</strong> Jacaré, como já era de se esperar, não deixa passarimpune a morte de um de seus “súditos”, pois o <strong>crime</strong> para eles consistiu em umadeclaração expressa de hostilidade. Grandes inimigos <strong>do</strong> Coman<strong>do</strong> Vermelho, oschefes de aludida falange começam a estudar uma forma de se vingarem <strong>do</strong> gruporival. O mo<strong>do</strong> encontra<strong>do</strong> é desmoralizar as “leis” <strong>do</strong> Coman<strong>do</strong> Vermelho dentro <strong>do</strong>seu território. O pla<strong>no</strong> era muito simples: um inter<strong>no</strong> da Galeria B, área <strong>do</strong>minadapela Falange LSN, assalta um companheiro de cela e repassa o dinheiro para um<strong>do</strong>s comandantes da Falange Jacaré (AMORIM, 2004, p. 131). A morte <strong>do</strong>transgressor foi descrita <strong>no</strong> livro de memórias de Silva :[...] um preso <strong>do</strong> <strong>no</strong>sso coletivo assaltou um companheiro, rompen<strong>do</strong> opacto de não-violência que havíamos estabeleci<strong>do</strong> entre nós. Comoagravante, assumiu uma posição desafia<strong>do</strong>ra quan<strong>do</strong> o assunto foi trazi<strong>do</strong> àluz: estava inspira<strong>do</strong> e apoia<strong>do</strong> pela quadrilha que então <strong>do</strong>minava toda aIlha Grande, cobran<strong>do</strong> pedágios, matan<strong>do</strong> e estupran<strong>do</strong>. O produto <strong>do</strong>roubo, quan<strong>do</strong> investigamos, já fora envia<strong>do</strong> para fora <strong>do</strong> “fundão”. Era umaprovocação. Aceitar sua impunidade seria uma confissão de fraqueza,desunião e pusilanimidade. Nesses momentos críticos é que a vida se põe àprova. Em <strong>no</strong>sso caso, o cadáver <strong>do</strong> preso assaltante, retira<strong>do</strong> aindaensangüenta<strong>do</strong> e quente pelos guardas, ao longo das galerias, anunciou atoda Ilha grande que não estávamos intimida<strong>do</strong>s, nem rendi<strong>do</strong>s, nembrincan<strong>do</strong>. Quem, diante de nós, quisesse manter os velhos hábitos dascadeias – estupran<strong>do</strong>, matan<strong>do</strong> e assaltan<strong>do</strong> – que se preparasse para asconseqüências.(SILVA, 1991 apud AMORIM, 2004, p. 132)Como se pode observar, os <strong>do</strong>is principais grupos que comandavam opresídio de Ilha Grande, Falange Jacaré e Falange LSN, desde a tentativa de fugaem massa frustrada, encontravam-se em uma verdadeira luta pela soberaniaperante os inter<strong>no</strong>s. As duas demonstrações de poder acima relatadas não tinhamsi<strong>do</strong> suficientes para determinar a superioridade de uma sobre a outra.Assim sen<strong>do</strong>, os responsáveis pelo Coman<strong>do</strong> Vermelho, Falange LSN,lançam o ultimato aos líderes da Falange Zona Norte. Estes, dentro <strong>do</strong> prazoimprorrogável de 48 horas, deveriam escolher entre a<strong>do</strong>tar as regras da organizaçãoou serem executa<strong>do</strong>s. Em um momento de introspecção, os presos da Falange Zona