MOÇAMBIQUE
PBr7lX
PBr7lX
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
MATHEUS SERVA PEREIRA<br />
Nas páginas de O Africano, as depreciações vinculadas às práticas<br />
culturais locais que não eram consideradas civilizadas fugiam<br />
das leituras racistas recorrentes. Todavia, os praticantes dos batuques<br />
não fugiam das leituras calcadas nas lógicas do progresso<br />
europeu que depreciavam outras formas de viver no mundo. João<br />
Albasini, utilizando-se do pseudônimo de João da Regras, em fevereiro<br />
de 1916, ao reclamar do procedimento utilizado para o<br />
recrutamento dos chamados indígenas para o serviço militar, defendia<br />
que o melhor lugar para se encontrar indivíduos capazes<br />
para a reformulação das tropas seria nos “arredores da cidade”,<br />
onde estaria “uma bem folgada rapaziada que não trabalha – a<br />
maior parte –, que frequenta batuques, que anda de corpo bem<br />
tratado”. 22 Portanto, os frequentadores dos batuques seriam gente<br />
folgada, da malandragem.<br />
Uma das primeiras referências que pude encontrar a respeito<br />
da produção musical da camada populacional negra no espaço<br />
urbano e os conflitos que isso poderia gerar, especialmente no<br />
ambiente de trabalho, é de 1894, quando Lourenço Marques ainda<br />
não havia se tornado capital da colônia. 23 O documento pouco<br />
nos informa a respeito dos praticantes ou da música que era tocada.<br />
O que podemos saber é que, em abril de 1894, o chefe da Capitania<br />
dos Portos de Lourenço Marques, ao dirigir-se para uma<br />
inspeção no farol da Ponta Vermelha, encontrou o vigia semafórico<br />
fora do seu posto de trabalho e em companhia de soldados,<br />
estando um deles “a tocar em um harmônio pertencente ao vigia<br />
semafórico” na porta do farol. 24 Em resposta ao abandono do posto<br />
de trabalho, as medidas adotadas foram a apreensão do instrumento<br />
e a suspensão do ordenado do vigia por oito dias. Aquele<br />
que tocava o harmônio não chegou a sofrer nenhuma represália,<br />
pois conseguiu fugir antes de ser anotado o seu número de identificação.<br />
A referência a um harmônio não deixa de ser inusitada.<br />
A probabilidade de se tratar de um órgão instrumental portátil é<br />
baixa. O mais plausível é que o chefe da Capitania dos Portos tenha<br />
utilizado a palavra para se referir a mbila, no plural timbila,<br />
56