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O Nós por Nós é<br />
um aplicativo do<br />
Forum de Juventudes<br />
RJ que surge<br />
de uma cartografia<br />
social realizada<br />
com Jovens Negros<br />
e pobres de 15 favelas<br />
do estado do<br />
RJ sobre o impacto<br />
na militarização<br />
na vida deles. A<br />
partir do resultado<br />
da cartografia, os<br />
jovens produziram<br />
o aplicativo como<br />
uma ferramenta de<br />
luta.<br />
divulgação de dados pessoais. O PL 5276/2016, que trata do<br />
assunto, atualmente tramita na Câmara dos Deputados. A<br />
legislação protege os dados pessoais tanto no que diz respeito<br />
ao uso por entes privados quanto públicos e ainda<br />
impede a transferência internacional de dados para países<br />
com leis de proteção menos rigorosas do que a nossa.<br />
Joana Varon, integrante da Coding Rights, organização<br />
liderada por mulheres que promove direitos no mundo<br />
digital, explica que vivemos atualmente num contexto<br />
de capitalismo de dados. “Tudo o que a gente faz na rede é<br />
registrado. E esses dados são utilizados como modelos de<br />
negócios das empresas que a gente usa pra navegar na rede<br />
e que a gente usa nos serviços digitais”, resume.<br />
Enquanto isso, também avançam na Câmara e no<br />
Senado algumas iniciativas de Projetos de Lei que caminham<br />
na direção contrária da promoção da privacidade e<br />
da liberdade de expressão na web, como o PL 2390/15 que<br />
propõe a criação de um “Cadastro Nacional de Acesso à Internet”.<br />
O cadastro incluiria informações como endereço e<br />
CPF do usuário e teria como função combater práticas de<br />
pedofilia na internet. Segundo o PL, a cada nova conexão,<br />
o usuário teria de fornecer todos os dados pessoais para<br />
que a conexão seja liberada.<br />
O cadastro obrigatório põe em xeque não só direitos<br />
individuais mas também coletivos e ameaça organizações e<br />
movimentos sociais que trabalham com a defesa e promoção<br />
de direitos humanos e que têm o anonimato como retaguarda<br />
para resistir à perseguição ou retaliação. É o caso<br />
do aplicativo Nós por Nós. Lançado em março de 2016, o<br />
aplicativo, voltado para denúncias de violações de direitos<br />
cometidas por policiais no Rio de Janeiro, recebeu em<br />
quase um ano de funcionamento 250 denúncias. Segundo<br />
relatório “Você matou meu filho”, publicado pela Anistia Internacional,<br />
de 2005 a 2014 foram registrados 8.466 casos<br />
de homicídio decorrentes de intervenção policial no estado<br />
do Rio de Janeiro; 5.132 casos apenas na capital.<br />
Ao checar o andamento de todas as 220 investigações<br />
de homicídios decorrentes de intervenção policial no<br />
ano de 2011 na cidade, a Anistia descobriu que foi apresentada<br />
denúncia em apenas um caso. Até abril de 2015<br />
(mais de três anos depois), 183 investigações seguiam em<br />
aberto. O medo e a descrença no sistema judicial são os<br />
principais fatores apontados para a falta de denúncia.<br />
Um dos idealizadores do aplicativo, Fransérgio Goulart,<br />
afirma que a ideia da ferramenta é justamente facilitar<br />
a reação da população atingida pela violência de Estado.<br />
“Tinha já algo se iniciando, mas o aplicativo Nós por Nós<br />
facilitou e potencializou essas denúncias. E a grande novi-<br />
dade é que temos para onde encaminhar a denúncia (rede<br />
de apoio) defensoria, Ministério Público, ONGs de direitos<br />
humanos de forma articulada”, contou. Para fazer uma denúncia<br />
por meio de vídeo, foto, áudio ou texto no Nós por<br />
Nós, o usuário não precisa fazer nenhum cadastro anterior<br />
que permita sua identificação, o que no caso do teor da ferramenta,<br />
é um detalhe vital para o funcionamento.<br />
Além do PL 2390/15, uma série de inciativas decorrentes<br />
dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito<br />
de Crimes Cibernéticos, conhecida como CPI Ciber,<br />
afetam a privacidade e a liberdade de expressão na rede.<br />
O relatório final da comissão apresentado em março deste<br />
ano, reúne oito propostas de projetos de leis que, segundo<br />
a própria comissão, objetivam combater os crimes cometidos<br />
na internet.<br />
<strong>Direito</strong>s na rede<br />
Diante deste cenário, entidades da sociedade civil<br />
brasileira criaram em julho de 2016 a Coalizão <strong>Direito</strong>s<br />
na Rede, como uma forma de combater as crescentes<br />
tentativas de retirada de direitos. Em manifesto lançado<br />
durante o VI Fórum da internet, ocorrido em julho<br />
de 2016, as entidades afirmam que o objetivo da coalizão<br />
é defender princípios fundamentais para a garantia<br />
de acesso universal à Internet: respeito à neutralidade da<br />
rede, liberdade de informação e de expressão, segurança<br />
e respeito à privacidade e aos dados pessoais, assim<br />
como assegurar mecanismos democráticos e multiparticipativos<br />
de governança.<br />
Segundo a Coalizão, além de atacar a privacidade, a<br />
liberdade de expressão e comunicação e o direito à informação<br />
de cidadãos conectados, este conjunto de propostas<br />
legislativas não leva em conta as características da rede<br />
e instaura uma espécie de “censura preventiva”.<br />
Os níveis de vigilância massiva da série Black Mirror<br />
vêm causando furor em discussões e tentativas de<br />
prognósticos que se multiplicam nas redes sociais. Se as<br />
iniciativas analisadas avançarem, trabalhar, estudar, locomover-se,<br />
informar-se, comunicar-se, organizar protestos,<br />
denunciar violações de direitos, entre outras ações essenciais<br />
para democracia, devem ficar bem comprometidas.<br />
Se depender da pressão das empresas e de alguns entes do<br />
Estado, a realidade fictícia da série está mais próxima do<br />
que podemos imaginar.<br />
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DIREITO À COMUNICAÇÃO NO BRASIL 2016<br />
DIREITO À COMUNICAÇÃO NO BRASIL 2016<br />
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