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Acesso a Justica - Mauro Cappelletti

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funções, que eram tradicionalmente exclusivas dos advogados, não mais precisam sê-lo.<br />

2.O desenvolvimento de planos de assistência jurídica mediante “convênio”ou “em grupo”<br />

Os desenvolvimentos de planos de assistência jurídica mediante “convênio” ou “em grupo”, nos anos mais<br />

recentes, estão entre as reformas de mais amplo alcance, aqui discutidas. Nessa área encontramos planos e<br />

propostas audaciosos com o objetivo de tornar os advogados acessíveis, mediante custos razoáveis aos indivíduos<br />

das classe média e baixa, cujos direitos e interesses têm sido nosso foco central. Sem dúvida, já que é inevitável<br />

que tenhamos um número sempre crescente de conflitos jurídicos, essa tentativa de promover o acesso aos<br />

advogados pode, na realidade, complementar as reformas que tendem a dispensar a necessidade de advogados.<br />

Ambos os tipos de reforma são essenciais para reivindicar eficientemente os “novos” direitos dos indivíduos e<br />

dos grupos.<br />

Embora a terminologia ainda não esteja claramente definida, “planos de convênio para serviços jurídicos”<br />

podem ser descritos, em traços gerais, como mecanismos através dos quais os indivíduos concorrem com algo<br />

semelhante a uma contribuição social ou um prêmio de seguro, para obterem, sem custos, ou com custos<br />

reduzidos, alguns serviços jurídicos pré-determinados, quando surja a necessidade de utilizá-los, O objetivo<br />

consiste em distribuir o risco entre todos aqueles que pagam essa mensalidade ou prêmio.<br />

Os planos em grupo também podem ser pagos antecipadamente, no sentido de que também envolvem a<br />

distribuição dos riscos. Podem, no entanto, simplesmente representar uma relação pela qual os serviços jurídicos<br />

se tornem disponíveis, aos membros de um determinado grupo, mediante uma contribuição reduzida. O potencial<br />

desses planos é enorme, considerada a “economia de escala, o uso dos advogados tanto para prevenção, quanto<br />

para solução de casos, a divisão dos riscos entre os membros do grupo e, dependendo da clientela em questão, a<br />

definição de parâmetros no processo de negociação dos benefícios e custos de um plano”. Uma distinção básica<br />

entre esses planos — e a fonte de muitos debates — diz respeito à capacidade do participante para escolher seu<br />

próprio advogado.<br />

O sistema aberto, geralmente, tem como característica a escolha relativamente livre de advogado que, então,<br />

é pago pelo plano, enquanto os sistemas “fechados” restringem, em maior ou menor grau, essa escolha e um<br />

determinado número de advogados. Existem, naturalmente, inúmeras gradações entre um e outro sistema. Os<br />

países europeus têm tido uma experiência longa e crescentemente positiva com o “seguro de despesas jurídicas”,<br />

ou seja, planos de assistência jurídica, pagos antecipadamente e com sistema de livre escolha do profissional,<br />

operados por companhias de seguros.<br />

Esse tipo de seguro surgiu inicialmente como uma decorrência das políticas de seguros contra acidentes de<br />

automóvel, no início do século. A cobertura para automóveis ainda é o componente mais importante, mas um<br />

amplo espectro de coberturas podem ser atualmente obtidas em diversos países, especialmente na Alemanha e na<br />

Suíça. Por prêmio relativamente baixo, um operário alemão e sua família podem receber cobertura para despesas<br />

jurídicas decorrentes da propriedade e utilização de um automóvel, da propriedade de um imóvel, da indenização<br />

por danos, para defesa criminal, para causas trabalhistas ou de seguridade social, de direitos contratuais e de<br />

causas de direito de família ou de sucessões.<br />

A importância crescente do seguro jurídico torna-se evidente pelo volume sempre maior de transações<br />

realizadas, bem como pelo fato de que, em 1974, o Lloyd’s de Londres decidiu ingressar nesse campo e tornar tal<br />

seguro acessível pela primeira vez na Grã-Bretanha. Além disso, esses esquemas despertaram a atenção de muitas<br />

pessoas preocupadas com o problema do acesso à Justiça. A discussão a respeito do potencial do seguro para<br />

despesas jurídicas, na Europa, tornou-se recentemente um aspecto importante do movimento de acesso à justiça,<br />

que ali tem lugar. Isso advém do fato de a cobertura, ampliada por custos relativamente baixos, auxiliar, sem<br />

dúvida alguma, a tornar a máquina jurídica mais acessível àqueles que detenham tal seguro.<br />

Já foi sugerido, no entanto, que o sistema privado europeu de seguro para despesas jurídicas, com objetivo<br />

de lucro e livre escolha, talvez não seja o melhor tipo de serviço jurídico de grupo. A objeção é a mesma que já foi<br />

encontrada na comparação entre os sistemas “judicare” e “staff attorney” de assistência judiciária, ou seja, os<br />

planos de livre escolha deixam a critério do indivíduo distinguir quando é desejável uma providência jurídica,<br />

quando serão úteis os serviços de um advogado e qual advogado constitui a melhor escolha.<br />

Além disso, é evidente que os lucros da seguradora dependem de sua capacidade de prever e planejar o<br />

número de causas que serão apresentadas. Normalmente, essa previsibilidade diz respeito aos atos fortuitos,<br />

porém não às ações intencionais dos requerentes. Logo, se esses planos não quiserem arriscar ou destruir sua

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