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Simon Lau e Fabiana Pinheiro<br />

RECRIANDO<br />

A FESTA DE BABETTE<br />

NO CERRADO<br />

A<br />

nossa história gastronômica<br />

desta edição está baseada<br />

no filme franco-dinamarquês<br />

de 1987, A FESTA DE<br />

BABETTE, que se passa em uma pequena<br />

vila na Dinamarca no ano de 1871.<br />

Duas irmãs, extremamente religiosas,<br />

que pregavam a salvação através da<br />

renúncia, acolhem uma senhora refugiada<br />

da guerra civil francesa, Babette,<br />

que aceita trabalhar como cozinheira<br />

em troca de um lugar onde morar.<br />

Babette observa que todos na vila não<br />

se preocupam com o ato de comer, o alimento<br />

para eles era apenas um elemento<br />

necessário para a sobrevivência, não<br />

importando o sabor, a aparência ou qualquer<br />

outro aspecto dos pratos servidos.<br />

Certo dia, depois de quatorze anos morando<br />

na Dinamarca, Babette recebe a<br />

noticia de que havia sido premiada na<br />

loteria francesa e decide gastar todo o<br />

dinheiro para oferecer um jantar para<br />

as senhoras que lhe acolheram e seus<br />

respectivos convidados.<br />

O evento movimenta toda a aldeia, desde<br />

a seleção dos alimentos, à entrega de<br />

caixas vindas do exterior. As movimentações<br />

são visíveis a todos, devido às proporções<br />

gigantescas que assumem.<br />

O jantar acontece aos moldes franceses,<br />

com um menu harmonizado composto<br />

por pratos servidos em ordem específica,<br />

com talheres, prataria, copos e taças<br />

postos à mesa, um ritual nunca visto até<br />

então pela maioria dos convidados.<br />

MENU ORIGINAL<br />

• Consommé de tartaruga verdadeira.<br />

• Blinis Demidoff com smetana (creme azedo)<br />

e ovas de salmão.<br />

• Cailles en sarcophage (codornas recheadas<br />

com trufas de verão e foie gras,<br />

dentro de massa folhada).<br />

• Brie de Meaux au lait cru Andre Collet<br />

Comte Le Montagnard.<br />

• Baba au rhum com frutas secas.<br />

• Café com petit-fours.<br />

Pouco a pouco, os participantes começam<br />

a perceber um prazer com a comida<br />

que não parecia estar associado ao<br />

conceito de pecado. Durante o jantar, os<br />

personagens se sentem mais felizes,<br />

conversam entre si e enfrentam o medo<br />

já arraigado em seu imaginário e deixam-se<br />

seduzir pelos prazeres da vida.<br />

O filme expõe o papel da religião como<br />

“regulador” dos vícios da sociedade, a<br />

fim de organizar e doutrinar segundo<br />

sua perspectiva. O tema central gira em<br />

torno aos hábitos da sociedade por trás<br />

do alimento e deixa claro a diferença<br />

entre a gula e o comer bem.<br />

BABETTE E A REALIDADE DE BRA-<br />

SÍLIA Divulgar ”A Festa de Babette”,<br />

que é uma das maiores homenagens<br />

à arte da culinária e ao prazer de servir<br />

e se deliciar com cada detalhe das<br />

refeições, é importantíssimo para<br />

rever o atual contexto gastronômico<br />

de Brasília, não só por destacar a importância<br />

de uma boa comida, mas<br />

principalmente porque este ano várias<br />

casas fecharam suas portas na capital.<br />

Restaurantes tradicionais e contemporâneos<br />

encerraram suas atividades<br />

por motivos variados que vão desde a<br />

escassez de mão de obra qualificada,<br />

passando pela violência urbana até<br />

a dificuldade com o fornecimento e<br />

pontualidade dos fornecedores. Mas o<br />

principal fator sem dúvida está associado<br />

ao comportamento da clientela<br />

local, cada vez menos propensa a reservar<br />

parte do seu tempo à desfrutar<br />

da alimentação fora do lar.<br />

MENU RECRIADO<br />

Babette, uma mulher marcada pela<br />

tragédia econômica e política do seu<br />

tempo, perdeu tudo, o marido, o filho, a<br />

pátria, a profissão de chef de um sofisticado<br />

restaurante francês e se exilou<br />

na Jutlândia (Dinamarca). Mas na primeira<br />

oportunidade demonstrou que<br />

o que parecia ser incondicionalmente<br />

linear e monótono na vida das pessoas<br />

podia mudar graças a um momento único<br />

proporcionado pelo prazer oferecido<br />

nos pratos servidos.<br />

FESTA NO CERRADO Há mais de<br />

10 anos venho oferecendo a “Festa<br />

de Babette” aqui na capital federal.<br />

No evento, os convidados assistem<br />

ao filme e degustam o menu original<br />

preparado por Babette. Mas sempre<br />

me pergunto como a francesa criaria<br />

seus incríveis pratos no Cerrado: usaria<br />

os produtos locais para dar sutis<br />

toques às suas receitas, ou quem<br />

sabe, recriaria um menu com produtos<br />

nativos a partir das técnicas culinárias<br />

francesas?<br />

Nossa única certeza é que no jantar<br />

seria preparado um menu sem compromissos<br />

com a nova cozinha nórdica<br />

ou com a nova cozinha brasileira.<br />

Madame Babette seria transportada<br />

no tempo, desde a remota Jutlândia<br />

até o Planalto Central, e com suas<br />

técnicas artesanais de quase 150<br />

anos atrás se depararia com produtos<br />

exóticos e surpreendentes e lhes prepararia,<br />

sem preconceitos ou culpas,<br />

com um único propósito: de servir<br />

com excelência.<br />

• Sopa de tartaruga do rio Araguaia, servida<br />

com mangaritos, bolinhas de tartaruga,<br />

taioba e crocante de polvilho.<br />

• Timbale de Tucunaré com purê de palmito<br />

e crosta de pão.<br />

• Pamonha com guariroba,<br />

moelas na lata e redução de pato.<br />

• Queijo de cabra trufado com geleia de Cajá-manga.<br />

• Sorvete de coco com cachaça<br />

sobre geleia de cajuzinho do cerrado.<br />

• Café com petit-fours.<br />

EVOKESET2014<br />

EVOKESET2014

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