Revista Desporto&Sports - ed14 2019 (Versão Gratuita)
Na 14 edição da Revista Desporto&Sports discutimos se "os atletas estão mais fortes, mais rápido e melhore" ou se é apenas aparência. Falamos igualmente de como o desporto pode ser a #cura (ou pelo menos a prevenção) para doenças como o #alzheimer. Para além disso contamos com um vasto conjunto de autores que se debruçam sobre temas como: Messi - ainda o melhor do mundo?; os #ciclistas #jovens surpresa para 2019; a #Moral em jovens atletas; o despedimento de treinadores em Portugal e Brasil; #Lesão: #Lombalgia; #cérebro e futebol; e ainda #Neuer - um #goleio revolucionário. Temos ainda o super #especial de Jorge Silvério - psicólogo da selecção campeã da #Europa de #futsal - sobre como preparar uma grande #competição. Leia e divirta-se! Para ler a versão total, clique no link: https://www.magzter.com/magazines/listAllIssues/13078
Na 14 edição da Revista Desporto&Sports discutimos se "os atletas estão mais fortes, mais rápido e melhore" ou se é apenas aparência. Falamos igualmente de como o desporto pode ser a #cura (ou pelo menos a prevenção) para doenças como o #alzheimer. Para além disso contamos com um vasto conjunto de autores que se debruçam sobre temas como: Messi - ainda o melhor do mundo?; os #ciclistas #jovens surpresa para 2019; a #Moral em jovens atletas; o despedimento de treinadores em Portugal e Brasil; #Lesão: #Lombalgia; #cérebro e futebol; e ainda #Neuer - um #goleio revolucionário. Temos ainda o super #especial de Jorge Silvério - psicólogo da selecção campeã da #Europa de #futsal - sobre como preparar uma grande #competição. Leia e divirta-se!
Para ler a versão total, clique no link: https://www.magzter.com/magazines/listAllIssues/13078
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#Andebol - Qual o efeito do Time-out?<br />
V a m o s e n s i n á - l o a p r e v e r o v e n c e d o r d a C h a m p i o n s L e a g u e<br />
Desporto&<strong>Sports</strong><br />
Edição 14 • <strong>2019</strong><br />
www.desportoesports.com<br />
Psicologia<br />
de alto<br />
rendimento<br />
Jorge Silvério<br />
60<br />
PERGUNTAS SOBRE<br />
TREINO, SAÚDE,<br />
FITNESS, NUTRIÇÃO<br />
E CURIOSIDADES DO<br />
CORPO HUMANO<br />
Messi<br />
Porque é que o argentino<br />
continua a ser (de longe) o<br />
melhor do Mundo?<br />
As três<br />
joias<br />
do ciclismo<br />
mundial<br />
Novo ano, nova temporada de<br />
ciclismo e novos nomes para<br />
decorar.<br />
O QUE FAZ<br />
NEUER ser<br />
absolutamente<br />
ÚNICO?<br />
OS ATLETAS ESTÃO A FICAR MAIS<br />
FORTES, MAIS RÁPIDOS E MELHORES?
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Desporto<br />
&<strong>Sports</strong><br />
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10 revistas<br />
para Download
"Pode haver pessoas mais<br />
talentosas do que nós, mas não<br />
há desculpa para alguém que se<br />
esforça mais do que nós"<br />
Derek Jeter
Índice<br />
Pág.<br />
16<br />
O que faz de Manuel Neuer um goleiro tão único?<br />
28<br />
Grandes perguntas:<br />
futebol, treino e cérebro?<br />
Denis Greboggy: A técnica e a habilidade com<br />
a bola é fundamental para o sucesso. Mas mais<br />
importante ainda é o cérebro e a tomada de<br />
decisão.<br />
39<br />
O Jovem atleta e o seu<br />
crescimento Moral<br />
José Hernandez debate o peso do desporto como<br />
um espaço privilegiado para o desenvolvimento<br />
moral dos jovens.<br />
32<br />
#Portugal: Mudança de<br />
treinador<br />
Júlio Coelho opina sobre aquela que é sempre a<br />
decisão mais fácil – despedir o técnico – mas, nem<br />
sempre a mais certa e eficaz.<br />
36<br />
#Brasileirão: quais as<br />
causas das demissões dos<br />
técnicos?<br />
Ari Jr. e Cláudio Shikida debruçam-se sobre as<br />
causas de existirem tantos despedimentos no<br />
principal campeonato brasileiro<br />
Desporto&<strong>Sports</strong> - A revista para quem ama desporto
Www.desportoesports.com<br />
www.facebook.com/DesportoeEsport<br />
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24<br />
20<br />
12<br />
24<br />
#ESPECIAL Psicologia: Preparação para uma grande competição<br />
Jorge Silvério, psicólogo da seleção campeã da europa em futsal (Portugal), indica e explica os<br />
fatores a considerar durante a competição de uma grande prova.<br />
20<br />
Ciclismo: as três joias do ciclismo mundial<br />
Bruno Dias, do blog de ciclismo “etapa rainha”, aponta os três jovens talentos da modalidade a<br />
ter em conta em <strong>2019</strong>.<br />
50<br />
Lesões: Lombalgia<br />
Willians Longen discute o receio do agravamento desta dura lesão e a incapacidade relacionada<br />
com a pratica desportiva amadora e profissional<br />
12<br />
Mito ou realidade: Demasiados craques destrói as equipas?<br />
Há mesmo essa coisa de efeito negativo de “demasiado talento”?<br />
Pag. 42<br />
Porque Messi continua a<br />
ser (de longe) o melhor do<br />
Mundo?<br />
Ricardo Serrado – doutorado em história,<br />
autor e diretor do Museu do SCP – explica<br />
porque os “votantes” dos grandes prémios<br />
individuais para os “best” futebolistas se<br />
enganaram em 2018.
As proximas<br />
matérias<br />
só estão<br />
desponivéis<br />
na versão<br />
total da<br />
14 edição<br />
da nossa<br />
revista<br />
Clique abaixo para ler a versão total
Pág.<br />
58<br />
Os<br />
atletas<br />
estão a<br />
ficar<br />
mais<br />
fortes,<br />
mais<br />
rápidos<br />
e<br />
melhores
Desporto<br />
e Saúde mental<br />
Pag. 101<br />
É o pratica desportiva a cura para o Alzheimer e a demência?<br />
10 •
www.facebook.com/DesportoeEsport<br />
www.twitter.com/DesportoeEsport<br />
92<br />
70<br />
64<br />
64<br />
Champions como prever os<br />
resultados?<br />
Há indicadores que ajudam a prever (com<br />
grandes índices de probabilida-de) o<br />
vencedor da maior competição de clubes.<br />
Conheça-os neste especial.<br />
92<br />
O efeito do time-out no andebol<br />
A paragem de tempo é realmente vantajosa?<br />
Ou apenas uma falácia? O que nos diz a<br />
ciência?<br />
68<br />
Futebolistas profissionais vs.<br />
Futebolistas amadores<br />
De que forma se diferenciam os futebolistas<br />
em números? Surpreenda-se com as<br />
diferenças!<br />
90<br />
Fitas no corpo dos atletas?<br />
Para que servem? São eficazes?<br />
70<br />
O impacto da idade no ciclista e<br />
corredor<br />
Como o avançar da idade interfere com o<br />
ciclista? Tanto na montanha como no contra<br />
relógio.<br />
98<br />
Os efeitos do ciclismo no corpo<br />
O ciclismo é uma modalidade de extremos e<br />
isso afeta o corpo (coração, pulmões, etc).<br />
Entenda exatamente como.<br />
96<br />
Técnicas de respiração para<br />
futebolistas e jogadores de futsal<br />
Há uma forma certa e uma forma errada<br />
de respirar. Aprenda a certa - aquela que<br />
aumenta a performance.<br />
56<br />
Formula 1: o corpo dos pilotos<br />
O que acontece ao corpo dos pilotos durante<br />
as corridas? Que forçam atuam? Com que<br />
força?<br />
Pag. 72<br />
SUPER ESPECIAL<br />
#60 perguntas e respostas<br />
Respondemos, de forma simples e direta, a<br />
questões universais sobre fitness, musculação,<br />
saúde, nutrição e curiosidades sobre<br />
o corpo humano. Apostamos que temos as<br />
respostas a perguntas que sempre teve.<br />
• 11
Demasiados<br />
craques<br />
destrói<br />
as equipas?<br />
H á me s m o es s a co i s a<br />
d e “e f e i to neg at i vo” de<br />
d e m a s i a d o ta l e n to?<br />
Diogo Sampaio<br />
Faz 52 anos que Pelé e Garrincha atuaram juntos pela<br />
última vez. O Brasil venceu a Bulgária na fase de grupo do<br />
campeonato do Mundo de 1966, com um golo de cada um. A<br />
vitória não foi de modo algum surpreendente, a dupla venceu<br />
90% dos jogos em que atuou junta, e nunca perdeu nenhum<br />
encontro. Dois dos melhores futebolistas de sempre criaram<br />
o melhor índice de resultados da história do futebol mundial.<br />
Estranho? Lógico que não. Como diz Didier Deschamps, atual<br />
técnico da seleção gaulesa, “quanto mais eu tenho, melhor<br />
será”. A citação do selecionador francês reflete a crença generalizada<br />
que futebolistas talentosos são sempre a chave para o<br />
sucesso. E há suficientes provas empíricas que a crença pode<br />
bem ser verdadeira. Desde logo o primeiro caso enumerado:<br />
Pelé e Garrincha. Mas há mais: a tripla MSN – Messi, Suarez<br />
e Neymar – venceu 81% dos seus jogos quando atuaram juntos<br />
no Barcelona, e apenas perderam 12% dos jogos. Bebeto<br />
e Romario, nos 24 jogos que jogaram juntos com a camisa do<br />
Brasil, tiveram apenas uma derrota, e venceram o campeonato<br />
do Mundo de 94. O Manchester City conta hoje com jogadores<br />
como Aguero, De Bruyne, David Silva ou Gabriel Jesus, sendo<br />
o plantel mais valioso e talentoso do mundo. Naturalmente<br />
domina a Premier League. O PSG gastou 400 milhões de<br />
euros com Neymar e Mbappe tornando a luta pelo campeonato<br />
francês em uma quase formalidade.<br />
Exemplos como este sucedem-se pela história do futebol<br />
e a motivação dos managers e presidentes para comprarem<br />
sempre os melhores e encherem as suas equipas de craques<br />
torna-se obvia. Uma vontade que é compartilhada por fãs e<br />
adeptos que a cada janela de transferências salivam por novas<br />
contratações. No entanto, existem exemplos notáveis de que<br />
talento a mais prejudica o desempenho da equipa. Quem não<br />
se lembra da equipa de Galácticos do Real Madrid do inicio do<br />
milénio? Venceu tudo, depois, demasiado talento, quebrou a<br />
equipa.<br />
Um recente estudo aponta que de facto o talento tem um<br />
ponto de inflexão, além do qual, demasiados craques se tornam<br />
prejudiciais ao sucesso de uma equipa - R. Swaab “The Too-<br />
Much-Talent Effect: Team Interdependence Determines When<br />
More Talent Is Too Much or Not Enough”, Psychological<br />
Science 2014, Vol. 25(8).<br />
12 •
• 13
Luís Figo foi a primeira grande contratação<br />
para a era dos galácticos no Real Madrid -<br />
uma era que não terminou em vitórias.<br />
O “efeito negativo”<br />
O efeito negativo de “demasiado<br />
talento” emerge porque os conflitos de<br />
status entre os principais atletas que<br />
podem prejudicar a coordenação da equipa.<br />
A dupla de pesquisadores Malone<br />
e Crowston definiram este problema<br />
como “o processo de gestão de dependências<br />
entre atividades”. Um facto que<br />
influencia a coordenação necessária<br />
das equipas é o grau de dependência<br />
das tarefas. Quando a interdependência<br />
da tarefa é alta, como acontece no futebol,<br />
os membros do grupo estão obrigados<br />
a coordenar o seu comportamento<br />
para atingir o sucesso. Por outro lado,<br />
quando a interdependência das tarefas<br />
é baixa, o talento individual contribui<br />
mais significativamente para o sucesso<br />
– como iremos ver mais adiante, este é<br />
o caso do basebol.<br />
A extrema competição dentro<br />
das equipas, só em raras situações,<br />
é que não leva os futebolistas mais<br />
extraordinários a comportamentos<br />
egoístas afastando-os dos objetivos do<br />
grupo. Mais: a concorrência pode levar<br />
indivíduos a prejudicar ativamente os<br />
esforços de colegas do mesmo grupo,<br />
de modo a conquistarem lugares no<br />
topo da hierarquia.<br />
As pesquisas vão ainda mais longe,<br />
concluído que equipas compostas<br />
exclusivamente por indivíduos com<br />
altos índices de testosterona têm o seu<br />
efeito reduzido porque os membros<br />
guerreiam entre si pela conquista do<br />
domínio.<br />
Comportamentos muito semelhantes<br />
foram encontrados em aves de capoeira:<br />
ter demasiados machos produtores<br />
dominantes reduz a produção<br />
global de ovos. Na ausência de uma<br />
ordem claramente definida, a energia<br />
que normalmente seria direcionada<br />
para a coordenação é desviada para a<br />
conquista do domínio. É só a natureza<br />
a funcionar.<br />
# Método<br />
A amostra da pesquisa foi<br />
determinada pelos melhores<br />
talentos das seleções nacionais<br />
do ranking da FIFA.<br />
O índice de talento foi<br />
indexado à percentagem de<br />
futebolistas de cada equipa<br />
nacional que atua nos clubes<br />
de elite do mundo – foi<br />
usado o Deloitte Football<br />
Money para determinar esses<br />
clubes, com base na receita<br />
gerada (2008, 2009, 2010,<br />
2012, 2013, 2014). Mais<br />
números de jogadores com<br />
talento indicam uma proporção<br />
maior de talentos superiores<br />
em uma equipa. (Foram<br />
incluídas no estudo 207 equipas<br />
nacionais).<br />
Os dados de desempenho<br />
das seleções tiveram por<br />
base a sistema de classificação<br />
da FIFA durante o ano<br />
de 2010 e os períodos de<br />
qualificação para o Mundial<br />
do Brasil. Este sistema calcula<br />
o desempenho de uma<br />
determinada seleção, em<br />
todos os jogos internacionais,<br />
com base nos resultados, na<br />
importância de cada jogo,<br />
na força dos oponentes, etc,<br />
que são depois tratados em<br />
uma formula matemática.<br />
Mais pontos indicam melhor<br />
desempenho.<br />
14 •
% de performance da equipa<br />
% de talento da equipa<br />
GRÁFICO 1- Percentagem da performance das seleções de futebol<br />
em função de percentagem de jogadores de talento superior,<br />
no período compreendido entre 2010 a 2014<br />
A resposta é....<br />
SIM - demasiados craques é<br />
Extremamente destrutivo<br />
Basquetebol<br />
igual ao<br />
futebol. O<br />
Basebol não!<br />
No basquetebol a existência de<br />
vários (demasiados) atletas com<br />
muito talento também se mostra<br />
negativa para a performance<br />
da equipa; em número muito<br />
Intuitivamente, acredita-se que quanto<br />
mais talentosa uma equipa for, mais ela<br />
vencerá. Esta crença é generalizada,<br />
mas como o estudo de Swaab concluiu:<br />
é errada! Em primeiro lugar, foi<br />
bastante claro que o excesso de talento<br />
afeta negativamente a performance<br />
global da equipa, que se traduz por<br />
maus resultados. Mais: o beneficio<br />
(marginal) de muito talento quando<br />
alcança o ponto de inflexão cai em uma<br />
taxa muito mais acelerada do que seria<br />
expectável – ver gráfico 1.<br />
Swaab e a sua equipa apontaram<br />
que a principal razão para este efeito de<br />
inflexão se deve a níveis reduzidos de<br />
coordenação entre os atletas, num desporto<br />
que é invariavelmente coletivo e<br />
depende de tarefas entre os indivíduos,<br />
com o passe. O futebol requer interdependência,<br />
comunicação e sublimação<br />
do ego dos futebolistas; nem todos os<br />
craques são ricos nestas habilidades.<br />
Esta informação é extremamente<br />
valiosa para managers e treinadores<br />
que com estes dados em mão, podem<br />
construir um plantel mais ganhador, e<br />
potencialmente com menos conflitos.<br />
Swaab “oferece” mesmo uma solução:<br />
contratar (ou selecionar) menos futebolistas<br />
super talentosos, como fez por<br />
exemplo o selecionador argentino, Alejandro<br />
Sabella, durante o Mundial de<br />
2014, ao deixar Carlos Tevez e Samir<br />
Nasri de fora dos convocados.<br />
Com isso, Sabella chegou à final do<br />
torneio, perdendo por uma bola no jogo<br />
decisivo contra a Alemanha.<br />
Louis Van Gaal foi ainda mais radical<br />
na sua abordagem quando assumiu o<br />
cargo de selecionador holandês após<br />
o campeonato da europa de 2012. Ele<br />
reformulou de alto a baixo a equipa e<br />
reduziu significativamente o número<br />
de futebolistas talentosos nas convocatórias.<br />
A seleção holandesa não só<br />
se qualificou sem dificuldades, como<br />
não perderam um único jogo oficial<br />
nesse período de dois anos. Tendo<br />
conseguido ainda um fantástico 3 lugar<br />
no torneio. Depois da sua saída, e do<br />
regresso de muitos craques, a seleção<br />
holandesa falhou a qualificação para os<br />
dois grandes torneios seguintes, o Europeu<br />
em França e o próximo Mundial<br />
na Rússia.<br />
Outra opção é investir mais tempo<br />
nos membros da equipa na coordenação<br />
de diferentes situações que<br />
podem criar conflitos. Para isso, é fundamental<br />
estabelecer uma hierarquia<br />
legítima e formalizar papéis e responsabilidades,<br />
dando a cada elemento<br />
uma visão clara de qual deve ser o seu<br />
comportamento. Incluir nos planteis<br />
atletas mais velhos e maduros, é também<br />
apontada como uma das soluções<br />
para reduzir conflitos.<br />
semelhante ao futebol. A alta<br />
interdependências de funções<br />
entre os atletas também é o<br />
principal factor como também<br />
acontece no futebol de onze, já<br />
que se encontrou níveis níveis<br />
reduzidos de coordenação<br />
nas equipas com demasiados<br />
craques. Quando a interdependência<br />
é relativamente baixa,<br />
caso do basebol, a relação<br />
entre os melhores talentos e o<br />
desempenho da equipa nunca se<br />
tornou negativa. Estes resultados<br />
sugerem que a relação entre<br />
talento e desempenho é precisa<br />
e transversal a diversas modalidades<br />
de grupo.<br />
• 15
16 •
O QUE FAZ DE NEUER UM<br />
GOLEIRO TÃO ÚNICO?<br />
O Goleiro que está a mudar o futebol Mundial<br />
Cesar Vieira Marques Filho<br />
Doutorando em Educação Física na Universidade Estadual de Campinas, Professor de ensino superior no Centro Universitário de<br />
Jaguariúna e Pesquisador em Pedagogia do Esporte.<br />
“71% das ações exercidas por Neuer (na copa2014) são<br />
ofensivas, tendo preferência por passes curtos com taxa de<br />
95% de acerto nestes lances.”<br />
M<br />
anuel Neuer é um atleta conhecido por<br />
suas características de jogos singulares<br />
e pela elevada qualidade. Mas, qual o<br />
real patamar alcançado por ele? Seria<br />
um dos grandes goleiros do século<br />
XXI? O melhor goleiro da história da excelente<br />
escola alemã? Ou quem sabe um dos maiores de<br />
todos os tempos? Difícil opinar. Entretanto, ao<br />
conhecermos uma série de aspectos que envolvem<br />
sua carreira, podemos compreender com mais perspicácia<br />
alguns “porquês” do nível de rendimento<br />
incomum atingido por ele.<br />
Nascido no ano de 1986, em Gelsenkirchen<br />
(Alemanha), Manuel Peter Neuer foi formado nas<br />
categorias de base do Schalke 04, equipe com a<br />
qual assinou seu primeiro contrato profissional,<br />
em 2005. Fez sua estréia na Bundesliga na temporada<br />
2006/2007 e na UEFA Champions League<br />
na temporada seguinte. Em 2011, tranferiu-se<br />
para o Bayer de Munique pelo valor aproximado<br />
de 18 milhões de euros. Ainda, atuou por todas<br />
as seleções de base alemãs, estreiando na seleção<br />
principal em 2009.<br />
Toda a sua carreira, até então, foi construída no<br />
futebol alemão, onde conqusitou as principais<br />
competições disputadas por clubes. Destacam-se<br />
os 6 títulos da Bundesliga, a UEFA Champions<br />
League de 2012/2013 e a Copa do Mundo de<br />
Clubes FIFA do mesmo ano. Com sua seleção,<br />
ostenta a conquista da Copa do Mundo de 2014.<br />
Dentre inúmeras premiações individuais, foi eleito<br />
4 vezes o Melhor Goleiro do Mundo pela FIFA,<br />
bem como melhor goleiro da Copo da Mundo de<br />
2014. Para além das conquistas, as atuações de<br />
Neuer chamaram atenção do mundo do futebol.<br />
Ao analisarmos seu desempenho em campo, ganham<br />
destaque 4 principais aspectos que tornam o<br />
goleiro único e ajudam a explicar o seu elevado<br />
rendimento:<br />
.<br />
• 17
1 - A relação direta com o modelo de jogo da equipe – coberturas defensivas<br />
É comum entender-se o goleiro de futebol como uma figura a parte no jogo. Muitos compreendem que o<br />
mesmo apenas defende a baliza, enquanto apenas os jogadores de linha organizam-se a partir de princípios táticos<br />
e estratégicos. Neuer rompe com este paradigma. Tanto no Bayer quanto na Seleção alemã, é comum ver<br />
o jogador se posicionando de forma adiantada, afastado da baliza. Não por coincidência, percebe-se o mesmo<br />
efeito na primeira linha de defensores. Os jogadores que compõe essa linha, ao avançarem, se aproximam do<br />
meias e atacantes, compactam a equipe, encurtam o espaço do adversário e possibilitam uma enorme pressão na<br />
busca por retomar a bola. Mas e o espaço deixado às suas costas? Como não ficar vulnerável aos contra-ataques<br />
e lançamentos longos? A resposta é simples: a responsabiliade é de Neuer. O goleiro se ocupa deste setor,<br />
realiza coberturas defensivas e intercepta passes e lançamentos adversários com frêquencia. Sua capacidade em<br />
desempenhar esta função com excelência é o que permite toda a organização defensiva da equipe, “sufocando”<br />
o adversário com elevada eficiência. Após o goleiro surpreender o mundo com estas características, muitas<br />
equipes adotaram elementos similares e até mesmo a formação dos goleiros passou a contemplar princípios de<br />
jogo relacionados a ocupação de espaços e coberturas defensivas. Talvez não seja presunção afirmar que Neuer<br />
impactou mundialmente os treinamentos de goleiros.<br />
2 - A relação direta com o modelo<br />
de jogo da equipe – construção<br />
ofensiva<br />
Neuer também exerce participação<br />
direta na organização<br />
ofensiva da equipe. Sua qualidade<br />
no jogo com os pés o permite<br />
contribuir na dinâmica de troca<br />
de passes. Quando precionada, a<br />
equipe tem a opção de lhe recuar<br />
a bola, podendo contar com um<br />
jogador a mais na construção de<br />
jogo. É comum ver o goleiro,<br />
mesmo cercado por adversários,<br />
encontrando opções de passes<br />
inteligentes. Ainda, os lançamentos<br />
longos do goleiro permitem<br />
uma construção de jogo mais<br />
direta, buscando companheiros<br />
posicionados às costas dos defensores<br />
adversários. Neste ponto,<br />
Neuer não fica restrito ao jogo<br />
com os pés. A capacidade de<br />
realizar longos lançamentos com<br />
as mãos (muitas vezes diretamente<br />
ao campo de ataque) e com incrível<br />
precisão, permite que sua<br />
equipe realize poderosos contraataques.<br />
Um estudo publicado em<br />
2018, chamado “Neuer x Romero:<br />
comparação técnico-tática entre<br />
os goleiros das seleções finalistas<br />
da Copa do Mundo FIFA 2014”,<br />
mostrou que, na referida competição,<br />
71% das ações exercidas<br />
por Neuer são ofensivas, tendo<br />
preferência por passes curtos<br />
com taxa de 95% de acerto nestes<br />
lances.<br />
18 •
3 - Concentração ininterrupta<br />
No futebol, a todo instante ocorrem acertos e erros<br />
dos jogadores. Os erros dos goleiros costumam chamar<br />
mais atenção, pois frequentemente resultam em gols dos<br />
adversários. Além disso, todo goleiro erra, sem exceção.<br />
Porém, existem dois momentos em que as falhas dos<br />
goleiros são mais comuns: jogos importantes e tensos,<br />
nos quais o nervosismo prejudica suas atuações. Ou,<br />
em contraponto, partidas tranquilas em que os goleiros<br />
estão sendo pouco exigidos, acabam se desconcentrando<br />
e falhando em um dos poucos momentos em que precisam<br />
intervir. Neuer também falha, é claro. Mas pouco,<br />
muito pouco. Um dos motivos é ressaltado por seu extreinador,<br />
Pep Guardiola. Ele aponta que o goleiro tem<br />
incomum capacidade de concentração, independentemente<br />
do grau de dificuldade do jogo, bem como se está<br />
sendo exigido com frequência ou não. Neuer está sempre<br />
atento, não tira os olhos do jogo e comporta-se como se<br />
estivesse participando diretamente de cada lance, mesmo<br />
que a bola esteja do outro lado do campo. Sua concentração<br />
é tão grande que o goleiro sai transpirando e com<br />
os batimentos cardíacos Acelerados de todos os jogos,<br />
mesmo que mal tenha encostado na bola. Esta característica<br />
contribui para Neuer ser um goleiro seguro, com<br />
raras falhas ao longo da carreira.<br />
4 - Técnica fora dos padrões<br />
É comum que, no futebol, exista uma elevada valorização<br />
da técnica. No caso dos goleiro, se torna uma<br />
supervalorização, talvez demasiada. Nos treinamentos,<br />
costumam ser realizadas inúmeras repetições de movimentos<br />
previamente estabelecidos. A busca é obsessiva<br />
por gestos motores considerados corretos, baseados<br />
em padrões tidos como ideais. Muitas vezes, uma simples<br />
concepção é desconsideradoa mais importante que<br />
executar uma ténica perfeita, é não sofrer o gol. Neuer<br />
parece ter essa afirmação como principal seu princípio.<br />
O goleiro utiliza gestos pouco convencionais, encontrando<br />
soluções criativas para resolver a situações que<br />
o jogo lhe impõem. Seus recursos são variados e costumam<br />
supreender os adversários, acostumados com um<br />
comportamento mais padronizado dos goleiros. Talvez aí<br />
se encontre outra lição que os proficionais que trabalham<br />
com treinamentos de goleiros deveriam aprender com<br />
Neuer: o mais importante é a eficância nas ações realizadas<br />
e não os gestos técnicos por meio dos quais elas são<br />
ocorrem.<br />
Estes 4 aspectos de Neuer ajudam explicar porque<br />
o goleiro é único. A eles, somam-se inúmeros outros<br />
fatores, como a estatura de 1,93m, a agilidade incomum,<br />
a lateralidade (é considerado ambidestro) e ainda sua<br />
elogiada postura enquanto atleta. O goleiro é reconhecido<br />
por seu profissionalismo e liderança, se tornando<br />
capitão do Bayer e da seleção alemã. Mas então, após<br />
ter conquistado a maior parte dos mais importantes títulos<br />
coletivos e individuais e revolucionado a posição<br />
de goleiro, em que patamar podemos situar Neuer na<br />
história do futebol mundial? Considerando que o goleiro<br />
está prestes a completar 33 anos e ainda pode ter um<br />
bom tempo de carreira pela frente, talvez seja mais prudente<br />
esperarmos que ela se encerre antes do opiniar,<br />
pois ainda podem existir muitas conquistas pela frente.<br />
Até lá, o melhor a fazer é desfrutar-mos das sempre<br />
impressionantes atuações da “muralha alemã”.<br />
6 títulos da Bundesliga, a UEFA Champions<br />
League de 2012/2013 e a Copa do Mundo<br />
de Clubes FIFA do mesmo ano. Com sua<br />
seleção, ostenta a conquista da Copa<br />
do Mundo de 2014. Dentre inúmeras<br />
premiações individuais, foi eleito 4 vezes<br />
o Melhor Goleiro do Mundo pela FIFA, bem<br />
como melhor goleiro da Copo da Mundo de<br />
2014 (Palmares de Neuer).<br />
• 19
#Ciclismo<br />
As 3 jóias do ciclismo mundial<br />
A<br />
B<br />
C<br />
Bruno Dias<br />
“Nortenho de gema, 33 anos, Bruno adora ciclismo e tudo o que se relaciona com bicicletas. O mês de maio e julho são sagrados e tem um carinho pelas<br />
clássicas da primavera e pela Volta a Portugal. Ao longo dos anos aprendeu a apreciar a Vuelta. Desde 2014 que tem um<br />
espaço onde escreve sobre a sua paixão, o ciclismo - Etapa Rainha”<br />
etaparainha@gmail.com www.etaparainha.com<br />
20 •
Novo ano, nova temporada de<br />
ciclismo e novos nomes para<br />
decorar. Tudo na vida tem<br />
o seu tempo e no ciclismo<br />
não é diferente. Enquanto os<br />
melhores ciclistas da última<br />
década e meia estão a chegar<br />
ao final das suas carreiras,<br />
jovens corredores cheios de<br />
ambição e famintos pelo sucesso<br />
tomam os seus lugares.<br />
Da nova geração que está<br />
a aparecer, há muita escolha<br />
desde os reis do ciclocross,<br />
Mathieu Van der Poel e Wout<br />
Van Aert, passando pelo<br />
vencedor do Tour de l’Avenir,<br />
Tadej Pogacar e acabando<br />
em mais uma coqueluche<br />
colombiana que assinou pela<br />
Trek-Segafredo mas que<br />
afinal acabou por ir para o<br />
Team Sky, Ivan Ramiro Sosa.<br />
No entanto, há três<br />
nomes que se destacam<br />
dos demais, são eles: Enric<br />
Mas, Egan Bernal e Remco<br />
Evenepoel. Vamos dar<br />
prioridade aos mais velhos<br />
e começamos por falar do<br />
“delfim de Contador”.<br />
A - Enric Mas,<br />
“Spain´s next<br />
big thing”<br />
Maiorquino de 24 anos, formado<br />
na fundação Contador onde<br />
deu nas vistas e rapidamente<br />
chamou a atenção das principais<br />
equipas do World Tour. Em<br />
2016 foi para a equipa satélite da<br />
Quick-Step, a Klein Constantina,<br />
onde realizou um ano positivo,<br />
entre as vitórias está a Volta ao<br />
Alentejo. No ano seguinte saltou<br />
para a equipa de Patrick Lefevere,<br />
foi uma temporada de aprendizagem,<br />
mesmo assim foi dando<br />
sempre sinais que é um ciclista de<br />
enorme qualidade.<br />
A montanha é o seu habitat<br />
natural, mas ao contrário do<br />
típico trepador defende-se muito<br />
bem no contrarrelógio individual,<br />
como o fez na última Vuelta,<br />
prova onde deu o salto para a<br />
elite mundial, ao terminar em 2º<br />
da geral. Na primeira parte da<br />
última temporada mostrou que<br />
estava a evoluir na direção certa,<br />
safou-se muito bem na Volta ao<br />
País Basco e também na Volta<br />
à Suiça, mas nada previa que<br />
fizesse uma Vuelta tão forte e<br />
conseguisse o pódio. Depois de<br />
ter passado por dificuldades na<br />
primeira etapa de montanha, o<br />
maiorquino foi crescendo durante<br />
a prova e culminou com uma<br />
terceira semana notável, a cereja<br />
no topo do bolo foi a vitória na<br />
20ª etapa. A forma como geriu o<br />
Da nova<br />
geração<br />
que está a<br />
aparecer, há<br />
muita escolha<br />
desde os reis<br />
do ciclocross,<br />
Mathieu Van<br />
der Poel e<br />
Wout Van Aert,<br />
passando<br />
pelo vencedor<br />
do Tour de<br />
l’Avenir, Tadej<br />
Pogacar e<br />
acabando<br />
em mais uma<br />
coqueluche<br />
colombiana<br />
que assinou<br />
pela Trek-<br />
Segafredo<br />
mas que afinal<br />
acabou por ir<br />
para o Team<br />
Sky, Ivan<br />
Ramiro Sosa.<br />
No entanto,<br />
há três<br />
nomes que<br />
se destacam<br />
dos demais,<br />
são eles:<br />
Enric Mas,<br />
Egan Bernal<br />
e R emco<br />
esforço ao longo das 3 semanas<br />
e a frieza com que abordou os<br />
diferentes momentos da corrida<br />
são revela a maturidade que já<br />
possui em tão tenra idade.<br />
Alberto Contador no dia da<br />
sua retirada disse que Enric Mas<br />
era: “Spain´s next big thing”. Pela<br />
amostra de 2018, é bem provável<br />
que tenha razão e estejamos<br />
perante um ciclista que pode marcar<br />
a próxima década. Em <strong>2019</strong><br />
deverá estrear-se no Tour.<br />
• 21
B - Egan<br />
Bernal, “A<br />
Águia de<br />
Zipaquirá”<br />
Em 2016 Gianni Savio (dono<br />
da equipa italiana Androni-<br />
Giocattoli) apresentou um<br />
jovem colombiano de seu Egan<br />
Bernal, que vinha do BTT e que<br />
segundo ele tinha um potencial<br />
ilimitado.<br />
Paolo Alberati, ex-ciclista<br />
e agente do colombiano foi o<br />
primeiro a dar conta do talento<br />
que tinha em mãos, e fez<br />
questão de o apresentar a Gianni<br />
Savio, que ficou impressionado<br />
com os resultados extraordinários<br />
dos testes fisiológicos nomeadamente<br />
no consumo de oxigénio<br />
(VO2 max).<br />
O primeiro ano como<br />
profissional correu muito bem,<br />
adaptou-se facilmente à estrada<br />
e obteve resultados interessantes<br />
para um miúdo de 19<br />
anos. Tudo apontava que em<br />
2017 iria estrear-se numa grande<br />
volta, neste caso o Giro d’Italia,<br />
mas a equipa de Savio acabaria<br />
por não ser convidada. A segunda<br />
temporada na Androni-<br />
Giocattoli foi um sucesso, com<br />
várias vitórias onde se destaca o<br />
domínio avassalador no Tour de<br />
l’Avenir.<br />
Como era de esperar, não<br />
tardaram a chegar as propostas<br />
à Androni, uma delas do Team<br />
Sky, seria o destino do fenómeno<br />
colombiano.<br />
2018 foi o ano da estreia no<br />
World Tour e mais uma vez,<br />
Bernal não desiludiu. Com<br />
apenas 21 anos realizou uma<br />
temporada de enorme qualidade.<br />
Venceu a Colombia Oro y Paz<br />
e a Volta a Califórnia, deu espetáculo<br />
na Romandia, Catalunha<br />
e no Tour foi um gregário de<br />
luxo, Chris Froome pode agradecer<br />
o pódio a ele. A equipa<br />
britânica decidiu oferecer-lhe<br />
um novo contrato de 5 anos,<br />
ou seja até 2023. Curiosamente<br />
umas semanas mais tarde a Sky<br />
revelou que irá abandonar o<br />
ciclismo no final de <strong>2019</strong>, uma<br />
decisão que não vai impedir<br />
a ascensão de Bernal seja na<br />
equipa britânica caso arranjem<br />
patrocinadore(s) ou noutra<br />
estrutura do World Tour.<br />
Em <strong>2019</strong> a equipa decidiu darlhe<br />
a liderança da equipa no<br />
Giro, será a primeira grande<br />
volta onde irá com ambições à<br />
geral. No próximo mês de maio<br />
podemos estar a assistir ao nascimento<br />
de uma nova era no<br />
ciclismo.<br />
C - Remco<br />
Evenepoel, “O<br />
canibal júnior”<br />
Se Egan Bernal era o talento<br />
que criava mais expectativas<br />
nos últimos anos, há um menino<br />
belga que o destronou no<br />
último ano, chama-se Remco<br />
Evenepoel, tem apenas 18 anos<br />
e já acaba de chegar ao World<br />
Tour.<br />
A história de Remco<br />
Evenepoel é muito curiosa,<br />
sensivelmente a meio de 2017<br />
decidiu trocar o futebol pelo<br />
ciclismo. O belga jogava nas<br />
camadas jovens do Anderlecht<br />
e chegou a jogar nas seleções<br />
jovens da Bélgica. Nas primeiras<br />
provas rapidamente deu<br />
nas vistas e foi chamado para o<br />
mundial em Bergen, onde teve<br />
azar e foi obrigado a abandonar<br />
na prova em linha de juniores,<br />
um ano depois seria tudo muito<br />
diferente, mas já lá vamos.<br />
Em 2018 competiu 35<br />
dias, venceu em 23 deles, um<br />
domínio avassalador em todo o<br />
tipo de terrenos e sobre todos os<br />
adversários da sua idade, como<br />
aconteceu no europeu, onde<br />
ganhou com quase 10 minutos<br />
de vantagem sobre o 2º na prova<br />
em linha e venceu facilmente o<br />
contrarrelógio. A diferença foi<br />
tão abismal que o jovem belga<br />
chegou a pedir para competir no<br />
escalão sub-23, a UCI não acedeu<br />
ao pedido.<br />
O grande objetivo de<br />
Evenepoel no último ano era o<br />
mundial, um assunto que tinha<br />
ficado pendente em 2017. E<br />
em Innsbruck rapidamente deu<br />
nas vistas, na prova júnior do<br />
contrarrelógio, mais uma vez<br />
esteve noutro planeta, rodou a<br />
uma média perto dos 50 Km/h<br />
com andamentos limitados, o<br />
segundo ficou a mais de 2 Km/h<br />
do belga. Mas o melhor estava<br />
guardado para a prova em linha,<br />
como aconteceu em Bergen viuse<br />
envolvido numa queda mas<br />
desta vez não abandonou, recuperou<br />
mais de minuto e meio<br />
para os da frente e depois deixou<br />
toda a gente para trás com<br />
uma facilidade desconcertante.<br />
Esta superioridade absurda fez<br />
com que muitos vissem nele o<br />
novo Eddy Merckx.<br />
Várias equipas do World<br />
Tour não quiseram esperar e<br />
tentaram ter o belga nas suas<br />
fileiras, a escolha de Evenepoel<br />
recaiu na Quick-Step Floors<br />
(Deceuninck-Quick Step em<br />
<strong>2019</strong>), passa directamente dos<br />
juniores para a principal divisão<br />
do ciclismo mundial, a pressão é<br />
enorme.<br />
No entanto, a equipa e o<br />
próprio ciclista já puseram um<br />
pouco de água na fervura nas<br />
expectativas, este primeiro ano<br />
no World Tour será sobretudo<br />
de aprendizagem e de adaptação<br />
à dinâmica das corridas, que é<br />
completamente diferente daquilo<br />
que está habituado.<br />
22 •
<strong>Revista</strong>s Desporto&<strong>Sports</strong><br />
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• 23
Alto rendimento e a mente do atleta<br />
Psicologia<br />
Preparação para uma grande competição<br />
Jorge SILVÉRIO<br />
Psicólogo Selecção Nacional A Futsal Campeã Europeia 2018
#Especial<br />
Na preparação para uma grande<br />
competição há um conjunto<br />
muito alargado de factores que é<br />
preciso considerar e planear sob<br />
pena de ficarmos mais perto do<br />
fracasso.<br />
Falhar o planeamento é<br />
planear o falhanço<br />
Esta é uma máxima que deve<br />
nortear tudo aquilo que rodeia<br />
a preparação para uma grande<br />
competição desde o<br />
pormenor mais ínfimo<br />
até ao planeamento<br />
dos treinos e dos<br />
jogos.<br />
Assim, o primeiro<br />
factor a considerar<br />
será o objectivo<br />
que se pretende<br />
atingir nessa competição<br />
pois desde o<br />
momento zero toda<br />
a comunicação de<br />
todos os envolvidos<br />
deve veicular a<br />
“Se pensarmos, apenas um pouco, chegamos à conclusão<br />
que é uma loucura gastar milhares de horas e consequentemente<br />
milhões de euros com a preparação técnica,<br />
táctica e física e descurar a preparação emocional<br />
e mental que podem deitar todo esse esforço “por água<br />
abaixo” em instantes. ”<br />
mesma mensagem desde o técnico<br />
de equipamentos até ao líder<br />
máximo da comitiva. Definido<br />
o objectivo, é necessário pensar<br />
em todos os passos para o<br />
atingir e em todos os obstáculos<br />
previsíveis para saber como os<br />
ultrapassar caso eles surjam. Já<br />
Séneca salientava que “quando<br />
se navega sem destino qualquer<br />
vento é desfavorável”.<br />
A definição do programa de<br />
actividades deve ser realizada<br />
com particular<br />
cuidado<br />
estipulando<br />
tempo para o<br />
treino físico,<br />
técnico,<br />
táctico e<br />
mental, para<br />
o necessário<br />
descanso,<br />
alimentação<br />
adequada<br />
e correcta e para<br />
a recuperação<br />
fisiológica e só<br />
depois para outras actividades<br />
necessárias hoje em dia, mas<br />
que não devem interferir com<br />
as atrás referidas (promoção,<br />
divulgação, marketing, relações<br />
públicas, etc.).<br />
Normalmente, muitas das<br />
grandes competições ocorrem no<br />
fim de uma época extremamente<br />
desgastante e torna-se muito<br />
importante que os atletas estejam<br />
na melhor forma possível devendo-se<br />
trabalhar os factores mentais,<br />
de maneira a que a tenacidade<br />
(capacidade de enfrentar<br />
situações difíceis e lidar com a<br />
adversidade) dos atletas e a sua<br />
motivação estejam ao máximo.<br />
Trabalhar as suas capacidades<br />
técnicas, tácticas, físicas e<br />
psicológicas de maneira a que<br />
a tenacidade seja incrementada.<br />
Trabalhar no treino todas as<br />
situações previsíveis de ocorrerem<br />
num jogo confrontando<br />
cada atleta com situações difíceis<br />
e adversas que lhe permitam<br />
aprender a ultrapassá-las.
Trabalhar a auto-confiança de<br />
cada um, a capacidade de lidar<br />
com a ansiedade (não basta<br />
dizer que é preciso ficar menos<br />
ansioso). Trabalhar factores como<br />
a concentração, a auto-eficácia e<br />
a auto-estima. Acompanhar cada<br />
atleta de forma individualizada<br />
para saber como ele está a reagir<br />
às notícias de possíveis transferências<br />
e à ausência prolongada<br />
do contacto familiar. Promover e<br />
reforçar o espírito de grupo dentro<br />
da equipa apesar das inevitáveis<br />
“azias” devido ao facto de se<br />
ser suplente ou titular e de isso<br />
poder significar um contrato mais<br />
ou menos milionário. Potenciar<br />
um conhecimento profundo dos<br />
adversários para que cada atleta<br />
possa prever e planear a sua atitude<br />
competitiva. Finalmente treinar<br />
os atletas para as condições<br />
ambientais que vão encontrar e<br />
para o que significa lidar com os<br />
espectadores, os adeptos mas também<br />
com a comunicação social.<br />
Tudo isto exige muito trabalho<br />
planificado e não esperar que<br />
surja algum milagre. Não nos<br />
podemos esquecer que a sorte<br />
favorece as mentes preparadas,<br />
como enfatizava Pasteur!<br />
Existem muitas áreas onde a<br />
Psicologia do Desporto pode ser<br />
útil: diminuição da ansiedade,<br />
aumento da auto-confiança, atenção<br />
e concentração, motivação,<br />
liderança, relação treinadoratleta,<br />
coesão (espírito de equipa),<br />
esgotamento (burnout), sobretreino,<br />
recuperação de lesões,<br />
imaginação e visualização mental<br />
e controlo da dor.<br />
Em países onde a Psicologia do<br />
Desporto está mais disseminada<br />
fala-se cada vez com mais intensidade<br />
da preparação psicológica<br />
à qual se atribui uma importância<br />
ao nível das preparações técnica,<br />
táctica e física. Se pensarmos,<br />
apenas um pouco, chegamos à<br />
conclusão que é uma loucura<br />
gastar milhares de horas e consequentemente<br />
milhões de euros<br />
com a preparação técnica, táctica<br />
e física e descurar a preparação<br />
emocional e mental que podem<br />
deitar todo esse esforço “por água<br />
abaixo” em instantes.
#Grandes Perguntas<br />
futebol<br />
treino<br />
CÉREBRO?<br />
"O futebol é um jogo que se<br />
joga com a cabeça e em<br />
que se usam os pés"<br />
Johan Cruyff
Dênis de Lima Greboggy<br />
Bacharel, licenciado em Educação Física e especialista em Neurociências pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).<br />
Mestre em Educação Física pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Atualmente é professor de Treinamento Esportivo e Futebol/<br />
Futsal na PUCPR desde 2015, finalizando doutoramento em Biociências pela mesma universidade.<br />
denisgreboggy@gmail.com<br />
A frase sobre jogar futebol<br />
com a cabeça, dita por Cruyff,<br />
certamente permeia a atualidade<br />
dos modelos de treino desse<br />
esporte e faz muitos treinadores<br />
e jogadores pensarem: Como<br />
jogar com a cabeça? Não preciso<br />
focar nas habilidades com os<br />
pés, passes, lançamentos, chutes,<br />
a famigerada técnica? Muitos<br />
famosos do mundo do futebol<br />
defendem que sim, a técnica<br />
é extremamente importante e<br />
deve ser priorizada muito além<br />
das demais “partes” do jogo.<br />
Contudo, a tomada de decisão<br />
de qualquer esporte coletivo de<br />
invasão (tática) está no primeiro<br />
plano, ou seja, para começar, é<br />
importante dizer que o futebol é<br />
um esporte primeiramente tático,<br />
sendo a técnica uma manifestação<br />
do mesmo e certamente<br />
não menos importante, foi isso<br />
que Cruyff quis dizer.<br />
Quando se fala de tática no<br />
futebol, o cérebro acaba sendo o<br />
carro chefe de tudo, pois tomar<br />
decisões corretas, ao mesmo<br />
tempo, faz com que uma equipe<br />
tenha sucesso. Um dos fatores de<br />
extrema importância diz respeito<br />
à habituação e aos processos neurais,<br />
ou seja, ao ter uma equipe<br />
em mãos, é necessário habituar<br />
os jogadores a realizarem comportamentos<br />
sem que precisem<br />
pensar para fazer, isto é, realizar<br />
automaticamente. Quando se<br />
pensa demais, perde-se tempo, e<br />
no futebol frações de segundos<br />
fazem diferença, principalmente<br />
no alto rendimento, onde os<br />
detalhes definem uma partida.<br />
As emoções e sentimentos estão<br />
intimamente ligados aos processos<br />
de habituação. Quando se está a criar<br />
exercícios de treino, há a necessidade<br />
de que emoções positivas e negativas<br />
sejam associadas a eles, criando<br />
assim o que é chamado de marcador<br />
somático 1 . Este, por sua vez desencadeia<br />
reações no corpo do jogador,<br />
criando sensações específicas. Ao se<br />
repetirem determinados exercícios,<br />
automaticamente as decisões serão<br />
conduzidas pelas por esses sentimentos<br />
e que reforçam (condicionam) tais<br />
decisões. Em outras palavras, a tomada<br />
de decisão será guiada por sentimentos<br />
positivos condicionados a<br />
cada jogador, em dados momentos do<br />
jogo (ataque, defesa e transições). O<br />
sistema límbico (ver figura na página<br />
seguinte) é o responsável pelas<br />
emoções. Quando estas são positivas,<br />
auxiliam na retenção de comportamentos<br />
táticos mais eficazes.<br />
Entretanto, emoções negativas geram<br />
sentimentos negativos, impedindo<br />
condutas assertivas. Porém há de<br />
se pensar: como fazer isto? Vamos<br />
exemplificar!<br />
1<br />
[...] quando para o jogador surge um mau<br />
resultado associado a uma dada opção de<br />
resposta em uma situação de jogo, por mais<br />
rápida que seja ele pode sentir uma sensação<br />
visceral desagradável. Como a sensação é<br />
corporal, atribui-se ao fenômeno o termo<br />
técnico de estado somático (em grego,<br />
soma quer dizer corpo); porque o estado<br />
“marca” uma imagem, chamada de marcador<br />
[...].Trecho adaptado do livro O Erro de<br />
Descartes escrito por António R. Damásio<br />
em 1994.
Figura: Estruturas neuroanatômicas envolvidas no processamento das emoções<br />
Fonte: Pinel, (2005), p. 450<br />
Uma equipe está em posse de bola após a outra<br />
disparar contra seu gol, ou seja, tiro de meta. Muitos<br />
treinadores, nessa situação, não gostam de alongar o<br />
chute para frente do meio campo, mas sair jogando<br />
com os defesas centrais, laterais e volantes (médios<br />
defensivos) no primeiro terço do gramado (grande<br />
área e intermediária defensiva). Caso os jogadores<br />
não tiverem experiências positivas nesta saída de<br />
bola, certamente criarão emoções e sensações corporais<br />
que os habituarão a dar o famoso chutão para<br />
frente, na tentativa de se livrar da bola, pois o medo<br />
de perdê-la vem à tona, e sensações negativas no<br />
corpo são criadas. É como se fosse uma reação de<br />
luta ou fuga. Entretanto, se o treinador cria com os<br />
jogadores possíveis respostas para a saída de jogo<br />
desejada, e a mesma é repetida sistematicamente<br />
com o devido sucesso (manter a posse de bola),<br />
emoções e sentimentos positivos serão criados e<br />
esses engatilham as decisões futuras na mesma situação<br />
sem o abalo psicológico. De outra forma, quanto<br />
mais eu vivo uma situação no treino e a repito<br />
sistematicamente, mais propenso estou a realizar no<br />
jogo sem maiores prejuízos.<br />
Obviamente, tudo parece muito fácil assim<br />
no papel, e na prática como gerenciar tudo isso?<br />
É necessário um conhecimento colossal sobre as<br />
neurociências, assunto que deveria ser abordado em<br />
todos os cursos de formação de treinadores, independente<br />
de nível e federação. Saber como o cérebro<br />
aprende e reage às situações boas ou ruins no jogo<br />
de futebol não é opção, é obrigação. A formação<br />
de hábitos deve acontecer desde criança, seguindo<br />
uma lógica evolutiva até a idade adulta. É assim que<br />
clubes de sucesso fazem, adotando uma forma única<br />
de jogar e ensinando-a progressivamente.<br />
Estar exposto a determinadas ideias de jogo<br />
desde cedo é salutar, entretanto, muitos falam sobre<br />
suprimir a criatividade e mecanizar tomadas de<br />
decisão. Isso é praticamente impossível de acontecer,<br />
pois no futebol existe uma coisa chamada imprevisibilidade.<br />
Terei de responder a um adversário sem<br />
saber de todas as suas ações, improvisando soluções<br />
que não são previamente elaboradas no treinamento.<br />
O mais importante é quanto mais estruturado estou a<br />
um estilo de jogo, menos preciso pensar sobre ele, e<br />
o improviso virá de uma maneira ou de outra.
“Um dos fatores de extrema importância diz respeito à habituação e aos processos<br />
neurais, ou seja, ao ter uma equipe em mãos, é necessário habituar os<br />
jogadores a realizarem comportamentos sem que precisem pensar para fazer,<br />
isto é, realizar automaticamente. Quando se pensa demais, perde-se tempo, e no<br />
futebol frações de segundos fazem diferença, principalmente no alto rendimento,<br />
onde os detalhes definem uma partida.”<br />
Outro fator preponderante para um treinador de futebol alcançar o sucesso é ter uma equipe multidisciplinar,<br />
em especial um psicólogo cognitivo e um neurologista em sua equipe. Parece estranho, porém entender<br />
como acontecem as emoções e sentimentos de cada jogador, auxilia no processo de treino. Seria uma quebra<br />
de paradigmas um jogador conversar com um psicólogo sobre o time, suas expectativas e aflições e tais informações<br />
serem compreendidas pelo treinador e demais membros da equipe técnica para o planejamento de treinamentos<br />
e jogos. Muitas vezes o vilão de uma equipe é o próprio treinador. Cada sujeito percebe as coisas de<br />
maneira diferente e tal percepção molda o cérebro. Reações diferentes acontecem dentro de uma equipe quando<br />
um jogador é expulso de uma partida. Quantos treinadores criam situações de inferioridade numérica para<br />
gerarem marcadores somáticos, auxiliando assim a reação de maneira positiva a um evento negativo? São poucos.<br />
Não estou aqui para dizer que os treinadores devem ser neurocientistas, mas terem a mentalidade aberta e<br />
serem menos vaidosos.<br />
Certamente relacionar coisas tão complexas como futebol, treino e cérebro é uma missão árdua, pois são<br />
assuntos que estão se interconectando a pouco tempo no mundo científico. Contudo, ao tentar elucidar você,<br />
leitor, sobre tais relações, construímos uma massa crítica interessante para o aprofundamento de debates e<br />
evolução do futebol.<br />
REFERÊNCIAS<br />
DAMÁSIO, António R. O erro de Descartes: emoção, razão e o cérebro. São Paulo: Companhia das Letras,<br />
1996. 330 p.<br />
LENT, Roberto. Cem bilhões de neurônios: conceitos fundamentais de neurociência. 2. ed. São Paulo: Atheneu,<br />
2010. xxvi, 765 p.<br />
PINEL, J.P.J. A biopsicologia da emoção, do estresse e da saúde: Medo, o lado<br />
obscuro da emoção. In: PINEL, J.P.J. Biopsicologia. Trad. Ronaldo Cataldo Costa. 5.ed. Porto Alegre: Artmed,
#Portugal<br />
As Mudanças de treinador<br />
o que se autoproclama de “Indústria”<br />
A<br />
mudança de treinador tem<br />
sido a solução mais fácil<br />
de tomar pelos dirigentes<br />
dos clubes de futebol,<br />
quando os resultados<br />
desportivos não surgem ou<br />
Júlio estão abaixo do esperado.<br />
Diz-se “mais fácil” pela<br />
simples razão de que é<br />
Professor do Ensino<br />
muito mais fácil despedir<br />
Superior na área da<br />
1 pessoa do que 7 ou 8.<br />
Gestão, ex-dirigente Contudo, esta decisão<br />
desportivo, autor do livro também acarreta algum<br />
“Formar Jovens Futebolistas:<br />
um projeto formativo toma. No fundo, trata-se<br />
desconforto a quem a<br />
dos 6 aos 18 anos” de colocar uma pessoa<br />
no desemprego. O tempo<br />
jcoelho@ipleiria.pt<br />
que ficam no desemprego<br />
ou querem ficar, é outra<br />
história. Vamos ao essencial: essa<br />
decisão é tomada com a clara convicção<br />
que o “efeito psicológico”<br />
junto do grupo de trabalho seja<br />
positivo. Esperam-se que as novas<br />
caras, eventuais novos métodos de<br />
trabalho e opções táticas possam<br />
potenciar as qualidades dos atletas<br />
do plantel. No entanto, “certezas”<br />
ninguém as tem! Espantoso, é que<br />
quando esses mesmos treinadores<br />
são contratados, um dos fortes<br />
argumentos é o de serem importantes<br />
para “o projeto” que se<br />
pretende desenvolver. Mas depois,<br />
são os resultados desportivos que<br />
comandam as decisões dos gestores<br />
COELHO<br />
desportivos, por influência dos<br />
sócios e simpatizantes, sempre que<br />
os pontos na classificação começam<br />
a faltar. O treinador é o “elo mais<br />
fraco” de uma cadeia de elementos<br />
que constituem uma estrutura de<br />
uma equipa de futebol. Sem dúvida,<br />
que nos casos de sucesso desportivo,<br />
eles são o que mais beneficiam,<br />
mas depois quando há algum<br />
insucesso são os primeiros a sofrer.<br />
Ao dirigente – gestor, cabe naturalmente<br />
dirigir, mas depois deve<br />
também organizar planear e controlar,<br />
nas suas diferentes frentes.<br />
A par da esfera desportiva está a<br />
esfera financeira, estando ambas no<br />
centro das atenções de todos, sendo<br />
a última cada vez mais escrutinada<br />
pelas instâncias que superintendem<br />
a “indústria”. Contudo, desses<br />
todos, os sócios e simpatizantes<br />
pouco se importam com a componente<br />
financeira dos seus clubes – a<br />
não ser para servir de arremesso<br />
aos seus adversários em conversas<br />
de café. A esses só interessam os<br />
resultados desportivos, aqueles que<br />
balizam o despedimento e as novas<br />
contratações de treinadores e atletas.<br />
" Quando os recursos financeiros não abundam,<br />
como é o caso português, entre muitos outros, devem<br />
ser os bons projetos a prevalecer, numa “indústria”<br />
altamente competitiva em termos nacionais e<br />
internacionais."<br />
32 •
#Opinião<br />
Mal das empresas que depois de definirem um<br />
“projeto”, por definição de médio ou longo prazo,<br />
e contratarem pessoas para o executarem, acabem<br />
pouco depois por os despedir. Se assim fosse, das<br />
duas uma: ou a contratação tinha resultado de um<br />
erro de casting, ou então “o projeto” não era adequado.<br />
Mas nos clubes de futebol que tanto gostam de<br />
se autointitular como fazendo parte de uma “indústria”<br />
e que tudo fazem para a defender, acabam<br />
por cometer “erros de palmatória” em matéria de<br />
gestão. Prova disso é que as chamadas “chicotadas<br />
psicológicas” raramente resultam. Surgem ora no<br />
início, ora a meio dos campeonatos, mas sempre<br />
surgem à margem dos argumentos utilizados no início<br />
dessas relações laborais – “o projeto”. Ou seja,<br />
no início era o projeto que justificava a contratação,<br />
mas depois, são “os resultados” que comandam as<br />
decisões. Afinal, que projetos são esses que acabam<br />
por nada valer para justificar a continuidade das<br />
pessoas que a eles foram alocados no início. Bem<br />
sabemos que, no futebol em particular, são os resultados<br />
que definem os alinhamentos das decisões,<br />
mas talvez seja altura dos sócios e simpatizantes<br />
perceberem que os projetos são sempre de médio<br />
e longo prazo e que se forem bons, os resultados<br />
seguramente virão. Será que em Portugal nunca<br />
teremos projetos do tipo do Manchester United<br />
ou do Arsenal, que foram tendo vários sucessos<br />
desportivos ao longo dos anos, e só depois de muitos<br />
anos e das mudanças de treinador, nunca mais<br />
os resultados vieram. Quando os recursos financeiros<br />
não abundam, como é o caso português,<br />
entre muitos outros, devem ser os bons projetos a<br />
prevalecer, numa “indústria” altamente competitiva<br />
em termos nacionais e internacionais. Um clube<br />
de futebol transmite, acima de tudo, “um turbilhão<br />
de emoções” abafando a razão. Na indústria é ao<br />
contrário. Por conseguinte, em Portugal, o Futebol<br />
só começará a consolidar-se como uma “verdadeira<br />
indústria”, quando a razão se sobrepuser à emoção.<br />
• 33
34 •
Super Especial na sexta edição da Nossa <strong>Revista</strong><br />
Um “Ladrão de ideias” chamado<br />
GUARDIOLA<br />
Os segredos do treino do tecnico nr.1 do Mundo<br />
“O mais maravilhoso do meu trabalho é<br />
imaginar o jogo que vai acontecer amanhã.<br />
Gosto de ficar sonhando com o futuro”<br />
“[Existem outras formas<br />
que podem ser bem sucedidas,<br />
mas] a minha forma de jogo é a<br />
minha forma de jogo.” Pep tem<br />
absoluta razão nas duas sentenças:<br />
primeiro, existem diversas<br />
formas táticas de se vencer um<br />
jogo; e segundo, nenhuma é tão<br />
reconhecível e espetacular como<br />
aquela que ele implementa nas<br />
suas equipas. Caça obsessiva pela<br />
bola; pressão constante sobre os<br />
adversários; centenas de passes<br />
na procura do espaço… a beleza<br />
do jogo das equipas de Guardiola<br />
é indiscutível. As ideias do técnico<br />
catalão são as mais atrativas<br />
da última década. No entanto,<br />
a sua força está na sua capacidade<br />
de comunicar; até porque,<br />
a melhor das ideias rapidamente<br />
se torna no maior dos desastres<br />
se não for facilmente entendida,<br />
principalmente no futebol moderno,<br />
onde os balneários são<br />
verdadeiras torres de babel, com<br />
múltiplas línguas.<br />
Mas, segundo Pep, comunicar<br />
é fácil quando as conversas são<br />
conduzidas com paixão; quando<br />
as palavras não são suficientes,<br />
Pep usa todo o corpo para dizer<br />
o que quer. Ele abraça os jogadores,<br />
beija-os, joga-os para a<br />
frente, empurra-os… eles? Eles<br />
respondem da mesma forma e<br />
com a mesma paixão. É só ver<br />
como Ribéry ou Boateng comemoraram<br />
os seus golos com Pep<br />
para entender que a boa comunicação<br />
precisa de uma boa dose<br />
de paixão. Quando, em março de<br />
2014, o Bayern já era campeão<br />
alemão, Franck Ribéry foi até<br />
Guardiola na comemoração do<br />
campeonato e disse: “Eu amote!<br />
Você está no meu coração”.<br />
O mesmo se passou com Lahm,<br />
Robben e tantos outros. Quando<br />
o jogador Pierre-Emile Højbjerg<br />
lhe contou em particular que<br />
seu pai sofria de cancro, os dois<br />
choraram juntos. O treinador<br />
fez tudo o que pôde para apoiar<br />
o jovem jogador e seu pai, que<br />
morreu alguns meses depois.<br />
Højbjerg disse recentemente: “O<br />
Pep é como um segundo pai para<br />
mim”.<br />
A principal vantagem de Pep<br />
Guardiola conta a “concorrência”<br />
é a constante insatisfação e<br />
a necessidade de perguntar sem<br />
parar, e sem medo de questionar<br />
a toda a hora o caminho que<br />
definiu. E coragem para o alterar;<br />
muitas vezes fê-lo da noite para<br />
o dia.<br />
Os mais próximos, dizem que<br />
normalmente ele só se permite<br />
cinco minutos para comemorar<br />
uma vitória. Cinco minutos, não<br />
mais. Depois, começa a análise<br />
fria e racional do jogo com seus<br />
colaboradores mais próximos<br />
e também a preparação para a<br />
próxima partida e o estudo do<br />
próximo adversário. Ele adora<br />
vencer. Mas ele exige de si: a<br />
busca do jogo perfeito! Ele sabe<br />
que é uma quimera, mas não<br />
deixa de tentar.<br />
Para além disso, Guardiola lê<br />
tudo a quem tem acesso e possa<br />
de alguma maneira ajuda-lo a<br />
entender melhor todos os detalhes<br />
do que é treinar hoje uma<br />
equipa de futebol de topo, que<br />
em muitos aspetos é tão desafiante<br />
quanto gerir uma...<br />
• 35
#Brasileirão<br />
Quais as causas das demissões dos técnicos?<br />
Ari Francisco de Araujo Jr. Cláudio D. Shikida<br />
Professor Economia Ibmec Minas (Brasil) arifaj@gmail.com<br />
Professor PPGOM - UFPel (Brasil) claudio.shikida@ufpel.edu.br<br />
Por que damos tanto peso para um<br />
técnico quando avaliamos uma equipe<br />
de futebol? Mourinho, Guardiola,<br />
Tite, são mesmo importantes? O<br />
treinador é normalmente visto<br />
como um “líder” responsável pelos<br />
resultados de suas equipes. Afinal,<br />
cabe a ele a definição da estratégia de curto prazo<br />
(escalação do time, por exemplo), de médio prazo<br />
(poupar jogadores para um próximo jogo) e de<br />
longo prazo (indicação de aquisição de jogadores).<br />
Além disso, é responsável por motivar os jogadores,<br />
minimizando problemas de ação coletiva<br />
(por exemplo, comportamento free-rider ou “andar<br />
à boléia”) para obter o melhor resultado do trabalho<br />
em equipe dos mesmos.<br />
Então, por que clubes de futebol partem para<br />
a decisão limite de demitir um técnico e contratar<br />
outro? A contratação ou demissão deve ser vista<br />
como uma importante decisão, pois se trata da<br />
ruptura de estratégia de planejamento montada<br />
por uma equipe para enfrentar ao menos uma temporada<br />
ou o rompimento com uma estratégia de<br />
longo prazo. Diferentemente de empresas, a avaliação<br />
de demissões de técnicos é relativamente<br />
mais simples devido à existência dos dados, pois<br />
o desempenho de treinadores são mais facilmente<br />
observáveis do que as de CEOs. Desta forma,<br />
podemos avaliar indiretamente o papel da gerência<br />
sobre o desempenho de uma firma a partir das<br />
peculiaridades do mercado esportivo.<br />
Alguns autores afirmam que a quebra de contrato<br />
pode acontecer quando o desempenho do<br />
clube é fraco desportivamente. Tal fato poderia<br />
levar o conselho administrativo (presidentes e<br />
diretores de clubes) a trocar membros de seu corpo<br />
diretivo como os técnicos, com maior frequência<br />
(especialmente no Brasil). É comum que uma<br />
sequência de resultados ruins leve à queda de<br />
treinadores e consequente mudança na forma de<br />
gestão do time tal qual uma mudança na cultura<br />
organizacional de uma empresa. A pressão da torcida<br />
também é fator importante sobre a situação<br />
do técnico quando observamos período de desempenho<br />
insatisfatório de um time.<br />
Alguns autores sugerem quatro hipóteses<br />
para a troca de treinadores: “ciclo vicioso”,<br />
“bode expiatório”, senso comum e “curto e longo<br />
prazo”.<br />
36 •
A<br />
hipótese do “Ciclo Vicioso” sugere<br />
que os treinadores são importantes<br />
e que suas trocas não são boas.<br />
Desta forma, substituir um técnico<br />
seria um processo de destruição<br />
de tudo o que foi construído pela<br />
liderança atual, pois o novo treinador<br />
adotará uma nova política que<br />
irá sobrepor todos os pontos já<br />
trabalhados por seu antecedente.<br />
Muitas mudanças normalmente<br />
ocorrem com as substituições de<br />
técnicos no Brasil (em outros países<br />
tal problema pode ter relevância<br />
menor). Os novos treinadores possuem<br />
comissão própria, definem<br />
novos treinamentos, tratamento<br />
de fisioterapia, estratégias para o<br />
jogo, entre outros pontos. Desta<br />
forma, a moral entre os jogadores<br />
será afetada, alterando o equilíbrio<br />
organizacional, e consequentemente,<br />
o desempenho da equipe.<br />
Tal fato pode vir a gerar novas trocas<br />
de treinador, ou seja, um “Ciclo<br />
Vicioso”.<br />
Será que o técnico é tão importante<br />
assim? Alguns dizem que não,<br />
como os adeptos da segunda hipótese,<br />
a do “Bode Expiatório”. Neste<br />
caso, considera-se que o papel do<br />
treinador é limitado, ou seja, cabe<br />
ao treinador escolher apenas diferentes<br />
estratégias de jogo. Assim, a<br />
troca de treinador teria como único<br />
objetivo diminuir a pressão sobre<br />
a direção da equipe (presidência e<br />
diretoria) quando os resultados são<br />
fracos.<br />
Outros acreditam que a substituição<br />
do técnico pode trazer um<br />
efeito positivo sobre o desempenho<br />
do time por meio de algum fator<br />
motivacional, ou seja, independentemente<br />
da qualidade dos treinadores,<br />
a mudança, em si, seria uma<br />
espécie de choque positivo nas<br />
expectativas da equipe. Tal explicação<br />
é chamada de hipótese do<br />
“Senso Comum”.<br />
Finalmente, a hipótese do<br />
“Curto e Longo Prazo”, supõe<br />
que, embora possa haver um efeito<br />
positivo no curto prazo (como na<br />
hipótese do “Senso Comum”), este<br />
efeito se dissipa no longo prazo,<br />
limitando o sucesso almejado com<br />
a mudança do técnico.<br />
Não está claro na literatura qual<br />
a direção de causalidade das principais<br />
variáveis envolvidas, ou seja,<br />
não se tem, no estágio atual das<br />
pesquisas, uma clara noção de se é<br />
a troca de técnico que gera o bom<br />
desempenho, se é o oposto, se há<br />
causalidade nas duas direções ou<br />
até se não há qualquer relação entre<br />
elas. Neste sentido, o que os trabalhos<br />
de pesquisadores da área de<br />
esportes costuma fazer é uma avaliação<br />
estatística dos dados observados<br />
de mudanças de treinadores em<br />
A 18ª etapa é aquela que tem o perfil mais intimidante, com cinco<br />
#Opinião<br />
ligas importantes no mundo.<br />
Num artigo publicado na revista<br />
acadêmica brasileira <strong>Revista</strong><br />
Brasileira de Futsal e Futebol,<br />
avaliamos a importância do desempenho<br />
das equipes como determinantes<br />
das mudanças de treinadores<br />
(probabilidade de demissão) utilizando<br />
dados do Campeonato de<br />
Futebol Brasileiro (série “A”) nas<br />
temporadas 2010-2014 (em uma<br />
estimação Probit). Neste período<br />
foram observadas 167 trocas de<br />
treinadores (uma média de 33,4<br />
trocas/ano). Considerando-se vinte<br />
times, tal movimentação significa<br />
aproximadamente duas trocas por<br />
time em cada campeonato, número<br />
bastante elevado. Para fins de comparação,<br />
num trabalho para a liga<br />
portuguesa principal, José António<br />
Ciríaco Silvestre relata que ocorreram<br />
44 trocas durante as cinco<br />
temporadas analisadas (uma média<br />
de 9,6 por temporada) - 2004/5 a<br />
2008/9.<br />
Conforme a Figura 1, podemos<br />
observar, por exemplo, que o<br />
desempenho é relevante. Notase<br />
claramente que as equipes em<br />
posições piores no campeonato<br />
demitem seus técnicos em uma<br />
frequência relativamente bem<br />
elevada.<br />
ascensões. Na<br />
Figura 1 - Demissões (eixo vertical) x Posição da Equipe no Campeonato (eixo horizontal)<br />
• 37
Nossos resultados estão em linha com os de<br />
Silvestre para a liga portuguesa. Em resumo, um<br />
misto de características pessoais e de desempenho<br />
contribuem, em média, para explicar as demissões.<br />
Os resultados sugerem que, por exemplo, quanto<br />
mais próximo do fim do campeonato, menos tempo<br />
um novo treinador teria para trabalhar e a demissão<br />
do mesmo acarretaria em dificuldades para reverter<br />
a situação complicada que o clube possa estar<br />
vivendo. Ou seja, a probabilidade de demissões é<br />
menor nas rodadas finais do campeonato. Também<br />
contribui negativamente para demissões o fato do<br />
técnico ser reconhecidamente um “vencedor”, como<br />
também se a equipe apresentou bom desempenho na<br />
rodada anterior.<br />
Como se percebe, um bom treinador não é tão<br />
diferente de um bom CEO. Seu bom desempenho<br />
– o que inclui o de seus liderados – parece explicar<br />
bem a sua permanência no clube. Entretanto, inovações<br />
em treinamentos, novas tecnologias médicas,<br />
variantes de esquemas táticos não demoram muito<br />
para serem adotados pelos clubes – vivemos em um<br />
mundo no qual a informação flui facilmente – o que<br />
mostra que ser um treinador longevo em um clube<br />
está longe de ser uma tarefa simples.<br />
Referências:<br />
Araujo Junior, Ari Francisco de., Shikida, Cláudio<br />
D., Ferreira, Vitor Greco. Determinantes das<br />
Mudanças de Liderança: o caso do campeonato<br />
brasileiro de futebol. <strong>Revista</strong> Brasileira de Futsal e<br />
Futebol, v.10, n.37, 2018.<br />
Silvestre, José António Ciríaco Guerreiro. Uma<br />
análise econométrica sobre o impacto de uma<br />
mudança de treinador no desempenho desportivo de<br />
uma equipe de futebol. Dissertação UTL, Lisboa,<br />
2011.<br />
38 •
#ETERNAS QUESTÕES<br />
A MORAL E O ESPORTE<br />
O Jovem atleta e o seu<br />
crescimento Moral<br />
José A E Hernandez<br />
PPG Psicologia Social - UERJ PhD Professor at the State University of Rio de Janeiro<br />
hernandez.uerj@gmail.com<br />
O<br />
esporte oferece um espaço privilegiado para desenvolver princípios e valores que<br />
podem contribuir para a estruturação e organização da vida social através da formação<br />
dos praticantes, especialmente das crianças e dos jovens. Piaget (1932/1977), psicólogo<br />
suíço, em seu famoso livro “O Juízo Moral na Criança”, explicou que os jogos infantis são<br />
admiráveis instituições sociais porque, ao promoverem a comunicação interpessoal, criam o relacionamento<br />
grupal. A criança, jogando, apreende a realidade social, pois o jogo recria as situações<br />
vividas na vida real. Assim, compreendendo como as regras são construídas e necessárias na delimitação<br />
das atividades, a criança percebe quais são os seus limites e, também, os limites dos outros.<br />
Lawrence Kohlberg (1984), psicólogo norte-americano e discípulo de Piaget, em sua Teoria de<br />
Desenvolvimento Moral, determinou três níveis hierárquicos com dois subníveis cada um. O<br />
primeiro nível é o chamado Moral Pré-Convencional, subdividido em Obediência-Punição e<br />
Hedonismo Instrumental Relativista. Nesses dois subníveis, os indivíduos seguem as regras dos<br />
jogos mas, ainda predominantemente, pensando em seus interesses próprios (pensamento típico das<br />
crianças de até seis anos de idade).<br />
O segundo nível é denominado de Moral Convencional (da idade escolar até aos 12 anos) e<br />
começa pelo subnível das Relações Interpessoais. Neste, há um pensamento de que o comportamento<br />
correto é determinado pelas convenções e regras sociais criadas pelas autoridades e que<br />
os indivíduos devem agir para agradar às expectativas morais dos outros. O objetivo é ser bom<br />
menino ou boa menina. Na sequência, no segundo subnível, da Orientação para a Lei e a Ordem,<br />
predomina o pensamento de manutenção incondicional da lei e da ordem social que orienta o comportamento<br />
moral do indivíduo para obediência das mesmas sem questionamentos.<br />
Por fim, vem o nível Moral Pós-Convencional (em geral, dos 13 anos em diante). O Contrato<br />
Social é o primeiro subnível, onde o certo e o errado estão baseados em contratos sociais construídos<br />
por meio de acordos mútuos, condicionados aos interesses e às necessidades da coletividade,<br />
que podem ser modificados democraticamente. O segundo subnível é dos Princípios Éticos<br />
Universais, no topo do desenvolvimento moral humano, e é caracterizado pela transcendência aos<br />
contratos sociais, onde o pensamento é regido por uma ética universal de igualdade e dignidade.<br />
"... quando Messi está a jogar futebol, o seu cérebro é como uma<br />
portentosa "máquina" de decisão, avaliando e definindo, de forma<br />
automática, num conjunto de inúmeros processos inconscientes,<br />
quais as ações mais eficientes a executar".<br />
• 39
Esses conhecimentos produzidos do âmbito da<br />
Psicologia Cognitiva têm sido aplicados nos ambientes<br />
desportivos. Stephen, Bredemeier e Shields (1997),<br />
psicólogos do esporte norte-americanos, desenvolveram o<br />
Questionário de Julgamento sobre Comportamento Moral<br />
de Jovens no Esporte, baseados em Kohlberg, para avaliar<br />
o nível do raciocínio moral de atletas. Após uma série<br />
de pesquisas, os atletas foram avaliados e classificados,<br />
na maioria, nos subníveis da Moral Pré-Convencional<br />
(adequados às crianças pré-escolares) ou, no máximo, no<br />
subnível da Moral Convencional do bom garoto (adequado<br />
às crianças em idade escolar). Esses resultados apoiaram a<br />
hipótese de que os níveis de raciocínio moral nos desportistas<br />
seriam hierarquicamente inferiores aos níveis de raciocínio<br />
moral de não atletas no contexto da vida cotidiana.<br />
No Brasil, Hernandez, Rocha, Voser e Duarte Jr. (2017)<br />
apresentaram a jovens atletas homens, de 15 a 17 anos de<br />
idade, das categorias infantil e juvenil do futebol, pertencentes<br />
a um clube esportivo de Porto Alegre/RS, o dilema<br />
moral da Trapaça, no qual um atleta fictício é levado a<br />
fazer escolhas morais durante uma competição. Na análise<br />
dos dados, os jogadores apresentaram respostas que representaram<br />
um raciocínio moral predominantemente de nível<br />
Pré-Convencional, ou seja, abaixo do esperado para suas<br />
idades cronológicas.<br />
Na tentativa de explicar esses resultados, Bredemeier<br />
e Shields (1985) criaram a Teoria de Raciocínio de Jogo<br />
que sustenta a ideia de que o ambiente do desporto seria,<br />
de alguma forma, um mundo isolado da vida cotidiana, um<br />
espaço lúdico. A participação do atleta no esporte envolveria<br />
uma transformação na sua cognição e no seu afeto, uma<br />
suspensão temporária das obrigações morais da vida diária.<br />
O raciocínio moral dos atletas sofreria uma mudança na<br />
estrutura básica da vida cotidiana para o esporte, uma<br />
transformação moral em que o egocentrismo seria o pensamento<br />
mais apropriado.<br />
Mas Kavussanu e Ring (2016), questionando a Teoria<br />
de Raciocínio de Jogo, sugeriram que nossos pensamentos<br />
e ações morais, em diferentes contextos sociais, inclusive<br />
no desportivo, podem ser manifestações de um favorecimento<br />
injusto do grupo a que pertencemos e da desconsideração<br />
com o outro grupo. Este fenômeno dos pequenos<br />
grupos já foi largamente investigado pela Psicologia Social<br />
nas últimas décadas. Os indivíduos são pressionados a<br />
agirem conforme as normas e os objetivos do grupo sob<br />
pena de serem submetidos a duras sanções.<br />
No esporte, como em quase todas as áreas da atividade<br />
humana, há uma fortíssima influência dos interesses<br />
econômicos e estes permeiam o relacionamento social em<br />
geral. Os grupos esportivos, especialmente, sofrem essas<br />
influências, pois precisam de resultados positivos, quase<br />
a qualquer custo, para satisfazer a torcida e os patrocinadores,<br />
que investiram muito dinheiro nos mesmos. O<br />
esporte, portanto, não seria um mundo lúdico diferente e<br />
paralelo ao mundo real, mas apenas um reflexo deste, pois<br />
o egocentrismo, o individualismo, o imediatismo e o desrespeito<br />
ao outro, muitas vezes utilizados no meio esportivo<br />
em busca de bons resultados, são típicos do nosso cotidiano.<br />
E você, leitor, como vê essa questão? O ambiente<br />
desportivo é um espaço lúdico e isolado do mundo real ou<br />
apenas um reflexo do mesmo?<br />
Referências<br />
Bredemeier, B. J., & Shields, D. L. (1985). Game<br />
Reasoning and Interactional Morality. The Journal of<br />
Genetic Psychology, 147(2), 257-275.<br />
Kavussanu, M., Boardley, I. D., Sagar, S. S., & Ring, C.<br />
(2013). Bracketed Morality Revisited: How Do Athletes<br />
Behave in Two Contexts? Journal of Sport & Exercise<br />
Psychology, 35, 449-463.<br />
Kohlberg, L. (1984). Essays on Moral Development, II:<br />
The Psychology of<br />
Moral Development. San Francisco: Harper & Row.<br />
Stephens, D. E., Bredemeier, B. L., & Shields, D. L.<br />
(1997). Construction of a Measure Designed to Assess<br />
Players’ Descriptions and Prescriptions for Moral Behavior<br />
in Youth Sport Soccer. International Journal of Sport<br />
Psychology, 28, 370-390.<br />
Piaget, J. (1932/2010). O Juízo Moral na Criança. São<br />
Paulo: Summus.<br />
40 •
www.facebook.com/DesportoeEsport/<br />
www.twitter.com/DesportoeEsport<br />
Ciclismo, Futebol, andebol, Ténis, Futsal, Corrida<br />
#<strong>Sports</strong><br />
Os melhores artigos e os melhores textos<br />
são escritos em<br />
www.desportoesport.com<br />
• 41
Lionel<br />
Messi<br />
Porque<br />
é que Ele<br />
continua<br />
a ser (de<br />
longe) o<br />
melhor do<br />
Mundo?<br />
Ricardo SERRADO<br />
Doutorando em história e teoria das ideias pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas e<br />
Director do Museu Sporting. Desenvolve estudos sobre a história do futebol, tendo já publicado<br />
8 livros e inúmeros artigos sobre a tematica ricardoserrado@gmail.com<br />
42 •
• 43
O futebol é uma das<br />
atividades mais universais<br />
e aparentemente<br />
mais simples de entender<br />
do mundo. Esta globalização<br />
e simplicidade<br />
inerentes ao jogo permitem<br />
que uma percentagem<br />
elevadíssima<br />
da população do planeta<br />
tenha uma opinião sobre<br />
o fenómeno. Seja nas<br />
redes sociais, na televisão<br />
ou na imprensa, é<br />
desmesurado o número<br />
de pessoas que se pronunciam<br />
sobre a modalidade.<br />
Não há muita gente<br />
a falar de astrofísica,<br />
nem de história, nem tão<br />
pouco de física quântica.<br />
Ao invés, sobre futebol<br />
todos emitem opinião,<br />
independentemente de<br />
terem (ou terem tido)<br />
algum contacto com a<br />
modalidade, para além<br />
do de adepto. Porquê?<br />
Muito provavelmente<br />
devido à aparente simplicidade<br />
com que se<br />
reveste o futebol que, ao<br />
contrário da astrofísica,<br />
da história e da mecânica<br />
quântica, é muito mais<br />
acessível ao conhecimento<br />
intuitivo do ser<br />
humano.<br />
AO futebol como campo de<br />
patriotismos<br />
A universalidade e aparente simplicidade do futebol é algo indiscutivelmente positivo.<br />
A forma intuitiva com que o jogo se apresenta aos olhos das pessoas permite<br />
que toda gente possa exercer raciocino sobre a modalidade o que, entre outras coisas,<br />
aproxima pessoas e culturas, embora também as possa dividir quando se coloca uma<br />
bandeira nacional acima da natureza comum a todos os seres humanos. Por isso, apesar<br />
de muitas vezes as pessoas não terem qualquer relação com a modalidade a não<br />
ser como adeptos de um determinado clube, o futebol é um terreno muito fértil em<br />
opiniões. É das poucas atividades em que os leigos por vezes parecem saber mais do<br />
que os especializados. Esta multiplicidade de opiniões enriquece o futebol e dá-lhe<br />
um cunho popular indiscutivelmente positivo, ligado essencialmente á sua génese e às<br />
idiossincrasias do jogo que acabaram por conquistar um número extraordinariamente<br />
elevado de pessoas um pouco por todo o planeta.<br />
Assim, válida ou menos válida, no futebol todos emitem apreciação, mesmo que<br />
por vezes a mesma seja fundamentada em tudo menos no conhecimento do jogo. Por<br />
exemplo, para muitos argentinos Messi é o melhor futebolista do mundo, enquanto<br />
para muitos portugueses é Ronaldo. Se indagarmos as razões da sua escolha, muitas<br />
delas irão apontar alguns critérios para essa decisão, contudo, a realidade é que a sua<br />
conclusão e na maior parte das vezes determinada, exclusivamente, pela nacionalidade<br />
dos futebolistas, independentemente de algumas pessoas até poderem apresentar<br />
argumentos aparentemente desligados desse fator. Os portugueses, por exemplo, têm<br />
por hábito dizer que Ronaldo é melhor porque ao contrário de Messi já provou ser<br />
o melhor em três campeonatos distintos. Será isto um argumento realmente válido,<br />
relacionado com a qualidade superior de Ronaldo, ou uma narrativa construída unicamente<br />
com o propósito de dar consistência a uma preferência subjectiva, ligada a<br />
um sentimento patriótico? Se Messi tem de provar que para ser melhor tem de jogar<br />
noutros campeonatos, então também teria Pelé, Maradona (que só teve sucesso no<br />
Nápoles), Di Stefano, Eusébio, Platini, e tantos outros.<br />
Afirmar que um determinado futebolista é o melhor apenas porque nasceu numa<br />
determinada área geográfica – porque comunga da mesma cultura - ou dizer que um<br />
jogador é o melhor do mundo porque teve sucesso em mais campeonatos do que<br />
outro é falacioso, pois as razões apresentadas assentam em argumentos que nada têm<br />
que ver com futebol nem tão pouco com a qualidade do futebolista. O primeiro argumento<br />
prende-se com um patriotismo bacoco no qual o sujeito projeta as conquistas<br />
do seu futebolista de eleição nos seus próprios sucessos pessoais. O que está aqui<br />
inerente não é a qualidade do futebolista tout court mas, fundamentalmente, o facto<br />
de ele representar o desejo de afirmação de um povo que se projeta nos sucessos de<br />
uma personalidade. Já o segundo argumento resulta como forma de sustentação do<br />
primeiro. Ou seja, de que forma se pode argumentar, por exemplo, que Ronaldo é<br />
superior a Messi? Podem-se enumerar feitos do português que o argentino não tenha<br />
realizado, mesmo que os mesmos não estejam relacionados com a qualidade do futebolista,<br />
como referir que Ronaldo já teve sucesso em 3 campeonatos diferentes ao<br />
passo que Messi nunca saiu do Barcelona. Ainda há pouco tempo um comentador<br />
afeto ao FC Porto, na CMTV, afirmou que o facto de Ronaldo ir para a Juventus era<br />
mais um sinal de superioridade de Ronaldo perante Messi.<br />
44 •
“Messi domina totalmente o jogo porque: possui uma excelente relação com<br />
a bola, uma excelente relação com o jogo, e ainda uma extraordinária relação<br />
com o golo. Em suma, Messi incorpora em si a arquitetura de jogo de um Xavi ou<br />
de Laudrup, a habilidade de um Ronaldinho, o domínio de jogo de um Zidane e a<br />
relação com o golo de um Cristiano Ronaldo. Isto torna-o, provavelmente, o futebolista<br />
mais completo e temível da história do futebol. ”<br />
A minha questão é: o que é que isto<br />
tem a ver com a qualidade futebolística<br />
de Ronaldo ou de Messi? Considero<br />
este argumento uma ideia sofista engendrada<br />
especificamente para explicar<br />
uma preferência patriótica - um argumento<br />
inócuo que é utilizado depois<br />
de se ter definido como melhor um<br />
determinado jogador apenas por razões<br />
nacionalistas, e não um critério que seja<br />
utilizado de facto para analisar a qualidade<br />
do futebolista. Em grande medida<br />
este argumento pode ser equiparado<br />
a escolher na Eurovisão a música portuguesa<br />
como a melhor apenas por ser<br />
portuguesa e, depois, tentar encontrar<br />
argumentos supostamente válidos para<br />
defender que é a melhor canção.<br />
No que concerne ao tema que<br />
estamos a discutir, o que está em cima<br />
da mesa é quem é o melhor futebolista<br />
do mundo e qualquer tese que afirme<br />
que um determinado jogador é melhor<br />
que outro com base no seu patriotismo,<br />
mesmo que depois se tente encontrar<br />
critérios para sustentar um sentimento<br />
subjetivo nacionalista, estará sempre<br />
condenada ao fracasso. Pessoalmente,<br />
tenho muita dificuldade em compreender<br />
alguém que admira uma<br />
personalidade pela zona geográfica<br />
em que nasceu – afigura-se-me um<br />
pensamento antiquado, arreigado a<br />
sentimentalismos nacionalistas que<br />
tendem invariavelmente a definir o ser<br />
humano por aquilo que os distingue<br />
(pela linguagem, cultura, cor da pele,<br />
etc.) e não por aquilo que os aproxima<br />
(a natureza comum a todos os seres humanos)<br />
- quando aquilo que realmente<br />
deveria interessar deveria ser o mérito,<br />
a qualidade e a competência. Um bom<br />
exemplo disto é a defesa a Ronaldo das<br />
acusações de violação vindas de vários<br />
setores da vida social portuguesa, nomeadamente<br />
de políticos com grandes<br />
responsabilidades da governação<br />
de Portugal – como o Presidente da<br />
República e do Primeiro-ministro –<br />
sem terem qualquer conhecimento do<br />
caso e, mais grave do que isso, ignorando<br />
por completo as razões da queixosa<br />
e não questionando os indiscutíveis<br />
indícios que parecem estar no processo<br />
contra Ronaldo.<br />
No que concerne ao melhor futebolista<br />
do mundo, muitos portugueses<br />
têm dificuldade em admitir que Messi<br />
possa ser melhor que Ronaldo. Uma<br />
grande parte deles, nomeadamente<br />
políticos e outras figuras públicas, consideram,<br />
inclusive, um crime de lesa<br />
pátria sequer ponderar nessa hipótese<br />
ou afirmá-la publicamente. Ronaldo é<br />
o melhor porque é português e afirmar<br />
o contrário é antipatriótico. O grande<br />
problema é que este e outros argumentos<br />
semelhantes não têm nada a ver<br />
com futebol e não é possível ter uma<br />
ideia credível sobre o jogo sem nos desprendermos<br />
de questões extrafutebol<br />
como cores patrióticas, clubes, etc. Por<br />
isso é importante definirmos se estamos<br />
a discutir futebol, ou se estamos a discutir<br />
patriotismos e clubismos.<br />
Qual a objetividade e credibilidade<br />
de uma opinião que defende que Messi<br />
é o melhor futebolista do mundo apenas<br />
por ser Argentino ou por ser do<br />
Barcelona? Ou que Ronaldo é melhor<br />
porque é português ou porque jogou<br />
em mais campeonatos? Para se poder<br />
discutir futebol os argumentos têm de<br />
se cingir exclusivamente ao jogo de<br />
futebol, sem qualquer condicionalismos<br />
clubísticos e\ou patrióticos.<br />
• 45
AMessi como jogador<br />
total<br />
No meu entender, um futebolista define-se, resumidamente,<br />
através de dois fatores centrais: relação<br />
com a bola (técnica, criatividade, habilidade) e<br />
relação com o jogo (visão de jogo, gestão de ritmos,<br />
ocupação de espaços, compreensão das movimentações<br />
dos colegas e adversários, capacidade de<br />
passe, capacidade de desarme, etc.). O somatório<br />
destes dois fatores resulta naquilo que podemos designar<br />
de qualidade futebolística. Em poucas palavras,<br />
como em qualquer outro jogo, o melhor futebolista é<br />
aquele que melhor domina o jogo. Alguns dominam<br />
aspetos defensivos com grande eficácia (Maldini,<br />
Ricardo Carvalho, Laurent Blanc, etc.), enquanto<br />
outros dominam os equilíbrios do jogo com enorme<br />
mestria (Paulo Sousa, Patrick Vieira, Dechamps,<br />
etc.). Existem uns que dominam a velocidade do<br />
jogo e a capacidade de conseguir espaços privilegiados<br />
para criar ocasiões de golo (Ryan Giggs, Luis<br />
Figo, Robert Pires, entre outros) e outros a gestão<br />
dos tempos e a criação de desequilíbrios ofensivos<br />
(M. Laudrup, Xavi, Iniesta, Modric, etc.), enquanto<br />
outros têm uma ótima relação com o golo (Ronaldo<br />
“fenómeno”, Cristiano Ronaldo, Jardel, Klinsmann<br />
etc.). Há ainda aqueles com uma extraordinária<br />
relação com a bola (Ronaldinho, Riquelme,<br />
Robinho, Okocha, etc.) mas cujos impressionantes<br />
malabarismos não são condizentes com o rendimento<br />
individual e coletivo exigido. Depois há alguns,<br />
muito poucos, que dominam o jogo ofensivo na sua<br />
plenitude; aqueles que não só parece que nasceram<br />
com uma bola colada aos pés mas também com a<br />
arquitetura do jogo dentro do seu cérebro (Maradona,<br />
Zidane, Platini, Pelé, etc.).<br />
Por fim, existe Messi cujo corpo parece ter enraizado<br />
nas suas células todos os segredos do jogo. Não só<br />
parece ter nascido com uma bola nos pés (como<br />
Ronaldinho) e com a arquitetura do jogo no seu<br />
cérebro (como Zidane), como ainda tem a capacidade<br />
de fazer uma quantidade de golos igual ou<br />
superior àqueles que têm uma ótima relação com o<br />
golo (como Cristiano Ronaldo). Em poucas palavras,<br />
Messi domina totalmente o jogo porque: possui uma<br />
excelente relação com a bola, uma excelente relação<br />
com o jogo, e ainda uma extraordinária relação com<br />
o golo. Em suma, Messi incorpora em si a arquitetura<br />
de jogo de um Xavi ou de Laudrup, a habilidade<br />
de um Ronaldinho, o domínio de jogo de um Zidane<br />
e a relação com o golo de um Cristiano Ronaldo. Isto<br />
torna-o, provavelmente, o futebolista mais completo<br />
e temível da história do futebol.<br />
46 •
O rendimento<br />
objetivo de Lionel Messi<br />
Os argumentos apresentados ao lado podem ser considerados subjetivos, mas não são. Podem ser comprovados<br />
de forma objetiva à luz do rendimento de Messi, Ronaldo, Modric e Salah na última época.<br />
Golos Assist. MVP Dribles Oc.<br />
criadas<br />
Passes<br />
crts.<br />
Passes<br />
lgs.<br />
flts.<br />
Sofr.<br />
Messi 52 21 35 302 158 2762 125 158 65%<br />
Ronaldo 54 11 15 73 71 1280 31 67 55%<br />
Salah 50 14 10 122 105 1135 32 54 63%<br />
Modric 5 11 10 111 83 2892 267 92 42%<br />
final.<br />
Tabela 1. Rendimento em números dos principais futebolistas na época 2017/2018<br />
Julgo que o que impressiona nesta tabela não é o rendimento<br />
superior de Messi, que qualquer pessoa minimamente<br />
atenta ao que se passou na época transata poderia adivinhar.<br />
O que impressiona é a diferença abissal entre o rendimento<br />
do argentino e os 3 nomeados para o prémio The Best. Messi<br />
não só tem um rendimento mais elevado em praticamente<br />
todos os aspetos, como possui um rendimento escandalosamente<br />
superior. Há aspetos cuja comparação é quase<br />
inexequível, como por exemplo no número de dribles, em<br />
que Messi atinge números superiores aos outros 3 jogadores<br />
juntos. Se num ou outro critério Messi tem um desempenho<br />
idêntico a Ronaldo (golos) e a Modric (passes) em todos os<br />
outros aqui analisados Messi é esmagador. O argentino foi,<br />
de longe, o futebolista que mais ocasiões de golo criou (158)<br />
e o que mais duelos individuais concretizou com sucesso<br />
(302), o que foi mais vezes considerado o melhor em campo<br />
(35), o que de longe sofreu mais faltas (158), e o que precisou<br />
de rematar menos para fazer mais golos (65% de eficácia).<br />
É importante notar ainda que Messi joga numa posição<br />
do campo muito mais povoada que Modric, sendo ainda alvo<br />
de marcações muito mais apertadas do que o croata, o que<br />
condiciona substancialmente as suas ações. Não deixa por<br />
isso de ser ainda mais surpreendente o facto de ter registos<br />
muito superiores aos do jogador do Real Madrid em muitos<br />
aspetos ou de, inclusive, ter um número de passes acertados<br />
muito próximo dele.<br />
No que concerne ao número de golo é também surpreendente<br />
os 52 remates certeiros que fez. Note-se que<br />
Messi não é, ao contrário de Ronaldo e de Salah, uma<br />
avançado centro. Ao contrário do português e do egípcio,<br />
Messi atua, tanto no Barcelona como na seleção argentina,<br />
relativamente longe da zona de golo, basicamente na zona<br />
10 mas descendo à zona 8 e por vezes à zona 6 para iniciar<br />
as jogadas da sua equipa. Marcar 52 golos a jogar a 10, com<br />
investidas muitas vezes na zona 8 e até na zona 6, é no meu<br />
entender, muito mais impressionante que marcar 52 golos a<br />
jogar a 9.<br />
Em poucas palavras, em função dos critérios de rendimento<br />
acima analisados, Lionel Messi foi o jogador do<br />
mundo com maior rendimento global da época transata.<br />
Se atribuíssemos 1 ponto por cada critério de rendimento,<br />
Messi teria 6 pontos, contra 2 de Modric, 1 de Ronaldo e 0<br />
de Salah. Isto vai ao encontro do que tenho vindo a referir.<br />
Messi é um playmaker que assiste, faz passes, dribla, e cria<br />
uma quantidade enorme de ocasiões de golos por jogo, mas<br />
é também um goleador que fez 52 golos na época passada,<br />
tendo sido pela 5.ª vez o melhor marcador dos campeonatos<br />
europeus, com 34 tentos no campeonato espanhol.<br />
• 47
Messi como<br />
personificação da<br />
estética no futebol<br />
Para além da sua produtividade objetiva, devo<br />
dizer que de um ponto de vista meramente subjetivo,<br />
Messi é o único jogador no futebol atual que me<br />
transmite emoção. Cada pessoa valoriza no futebol (e<br />
na vida) aquilo que mais se aproxima dos seus ideais<br />
de vida. Parece-me que uma pessoa que diga que<br />
Messi é melhor apenas por ser argentino será alguém<br />
que valoriza, claramente, um sentimento nacionalista<br />
acima do jogo ou, inclusive, da qualidade futebolística<br />
do atleta.<br />
Pessoalmente, não consigo conceber um jogo de<br />
futebol desligado da sua estética. A beleza do jogo é,<br />
tal como o patriotismo, um critério subjectivo dirão<br />
alguns. Ora, será de facto uma opinião subjetiva,<br />
indiscutivelmente, mas não é comparável ao sentimento<br />
patriótico. Isto porque o futebol como espectáculo,<br />
como a música, pode ser uma forma de arte,<br />
uma manifestação de beleza, e a arte é universal, um<br />
fator de igualdade humana e não de diferenciação<br />
como o patriotismo. O patriotismo dividirá sempre as<br />
pessoas, a arte, como o futebol, per se, poderá sempre<br />
aproximá-las.<br />
Nunca apreciei particularmente goleadores –<br />
jogadores de último toque. Sempre gostei dos N.10<br />
– dos jogadores imprevisíveis, com a habilidade de<br />
decidir um desafio com um passe de rotura e cujo<br />
domínio do jogo lhes permitem interpretá-lo como<br />
ninguém, de o segurar por cordas e geri-lo a seu belo<br />
prazer. A meu ver, Messi é a personificação do N.10.<br />
A sua criatividade, habilidade e capacidade técnica<br />
transmitem-me um sentido estético que apenas os<br />
grandes génios, como Hans Zimmer, John Williams<br />
ou Freddie Mercury, por exemplo, conseguem transmutar<br />
através das suas obras. A forma como interpreta<br />
o jogo e decide em função do que o mesmo está<br />
a pedir - ora com um passe curto, um passe longo<br />
ou um drible, ora acelerando ora pautando os ritmos<br />
- é única na história do futebol mundial. A maneira<br />
como se relaciona com jogo é verdadeiramente transcendente.<br />
Messi não é apenas um goleador, muito<br />
longe disso. É um futebolista que compreende e<br />
participa em todo o jogo ofensivo da sua equipa,<br />
colocando ao serviço do coletivo um manancial de<br />
ferramentas verdadeiramente notável. Por isso, ao<br />
contrário de Cristiano Ronaldo, Messi é muito mais<br />
do que uma máquina de fazer golos. Ao contrário de<br />
Xavi, Modric e de Iniesta, é muito mais do que um<br />
playmaker. Messi é um futebolista que possui todos<br />
os segredos do jogo dentro das células do seu corpo.<br />
Que joga, faz jogar, assiste e marca, tudo isto<br />
com uma mestria inigualável. Messi sozinho ganha<br />
jogos, não necessariamente com golos, mas com<br />
tudo aquilo que ele cria quando participa neles.<br />
48 •
A questão que se coloca é: como é que Messi teve, uma<br />
vez mais, o maior rendimento futebolístico da Europa, com<br />
clara vantagem para os outros, e mesmo assim não venceu<br />
o “The Best”, nem foi sequer um dos 3 nomeados? Como<br />
é que um rendimento de tal forma superlativo não pode ser<br />
suficiente para se ser o melhor futebolista do mundo quando<br />
aquilo que se pretende eleger deveria ser, de facto, o melhor<br />
futebolista numa determinada época e não quem venceu<br />
mais títulos.<br />
Aparentemente, ser o melhor marcador dos campeonatos<br />
europeus com 34 golos e o jogador com maior rendimento<br />
global a larga distância dos outros já não é suficiente para<br />
Messi. É preciso títulos dirão alguns. Sim, provavelmente,<br />
premiar o mérito individual e não coletivo. Os troféus coletivos,<br />
como a Champions, Mundial e campeonatos nacionais<br />
deveriam servir como critério mas não de forma tão decisiva<br />
como o são hoje em dia. Atualmente, um futebolista poderá<br />
ter um desempenho extraordinário numa determinada época,<br />
durante 10 meses, que acabará por nunca vencer o galardão<br />
de melhor futebolista se não vencer a Champions ou não<br />
estiver presente no final de uma grande competição. Modric<br />
fez um excelente Mundial, Ronaldo fez uma fase de grupos<br />
da Champions esmagadora a nível de golos e Salah um<br />
campeonato inglês extraordinário. Mas, no fim, foi Messi<br />
o melhor de todos durante o ano. Os números demonstramno<br />
de forma inequívoca. Aliás, não precisamos de ir aos<br />
A credibilidade do The Best e da<br />
Ballon D´Or?<br />
e Messi foi campeão espanhol e venceu a taça do Rei,<br />
provas em que Ronaldo e Modric ficaram muito longe de<br />
poderem vencer, com prestações muito mais modestas que o<br />
argentino, enquanto Salah acabou o ano sem um único titulo<br />
colectivo apesar da grande época interna que realizou. Messi<br />
não venceu a Champions e fez um Mundial muito abaixo<br />
das espectativas, dirão outros. Verdade. Contudo, estamos a<br />
eleger o futebolista com maior rendimento (o jogador com<br />
maior produtividade), não aquele que venceu os títulos mais<br />
importantes. Não deveria ser o jogador com maior rendimento<br />
e preponderância durante o ano, e não apenas num<br />
mês (como aconteceu com Modric, não obstante ter sido, de<br />
facto, o melhor jogador do Mundial) que deveria contar?<br />
Não deveria ser o jogador com mais rendimento durante<br />
o maior números de jogos e não necessariamente o melhor<br />
marcador da Champions, como sucedeu com Ronaldo?<br />
Recorde-se que o The Best e a Bola de ouro deveriam<br />
números, basta vê-lo jogar todas as semanas. Não venceu<br />
o The Best nem vencerá a Bola de Ouro por 3 razões: 1)<br />
não fez um bom mundial; 2) não venceu a champions; 3) o<br />
troféu não é (embora devesse ser) para o jogador com maior<br />
rendimento do ano mas para aquele que venceu os principais<br />
troféus internacionais. Modric foi o melhor jogador do Mundial<br />
e Ronaldo o melhor marcador da Champions. Parece-me<br />
indiscutível.<br />
Mas o melhor jogador do mundo continua a ser Messi,<br />
o que, em função da superioridade esmagadora do seu<br />
rendimento anual, me parece ainda mais indiscutível. Ao<br />
não terem Messi entre os finalistas estes prémios perdem<br />
a pouca credibilidade que já tinham. De qualquer das<br />
formas eles valem o que valem. Em certos aspetos é como<br />
a Eurovisão. Será mesmo a música que vence a que tem<br />
mais qualidade? Alguém se lembra da música que ganhou<br />
o ano passado?<br />
• 49
Lombalgia<br />
WILLIANS C. LONGEN<br />
Fisioterapeuta, Pós-Graduado em Ciências do Esporte e Medicina Esportiva, Mestre em Ergonomia, Doutor em Ciências da<br />
Saúde, Professor e Pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva-PPGSCol (Mestrado Profissional) / Universidade<br />
do Extremo Sul Catarinense - UNESC willians@unesc.net<br />
Referências:<br />
Leite AAA, Santos I, Lucas SS, Cavalcante Neto J. Dor Lombar e Exercício Físico: uma revisão sistemática. <strong>Revista</strong> Baiana de Saúde Pública. 2015. 39. 442. 10.22278/2318-2660.2015.v39.n2.a1709.; Lon<br />
Exercício Aeróbico e da Terapia Manual sobre Marcadores Bioquímicos de Lesão Musculoesquelética e Parâmetros Funcionais em Motoristas Profissionais com Lombalgia Crônica Inespecífica. Tese de<br />
Universidade do Extremo Sul Catarinense-UNESC. 2013. Disponível em: http://repositorio.unesc.net/handle/1/3445; Longen WC, Brandolfi JA. Inatividade Física na Perpetuação do Quadro Sintomático<br />
Lombalgia Crônica Inespecífica. <strong>Revista</strong> Inspirar Movimento & Saúde. v. 15, 2018. p. 38-43.; Marcelo ALM, Martins MS, Longen WC. Avaliação da Funcionalidade e da Força Dinamométrica Lombar d<br />
Inova Saúde. 2015;4(2):115-27. http://dx.doi.org/10.18616/is.v4i2.2224; Martins MS, Longen WC. Atividade Física Comunitária: efeitos sobre a funcionalidade na lombalgia crônica. Rev Bras Promoção<br />
Disponível em: http://dx.doi. org/10.5020/18061230.2017.6659; Pereira CC, Debiase DF, Farias JM, Madeira K, Longen WC. Análise do risco ergonômico lombar de trabalhadores da construção civil atr<br />
Rev Produção Online. 2015;15:914-24. http://dx.doi.org/10.14488/1676-1901.v15i3.1888; Santos LG, Madeira K, Longen WC. Prevalence of Self-Reported Spinal Pain in Brazil: results of the national hea<br />
Columna. v. 16. 2017. p. 198-201.; World Health Organization. International Classification of Impairments, Disabilities and Handcaps (ICIDH). A Manual of Classification Relating to the Consequences<br />
Genebra: World Health Organization; 1980 [citado em 12 jan. <strong>2019</strong>]. Disponível em: whqlibdoc. who.int/publications/1980/9241541261_eng.pdf<br />
50 •
Management of Chronic Non-Specific Low<br />
Back Pain (European Comission COST<br />
B13) registra que a lombalgia crônica<br />
inespecífica, que envolve a grande maioria<br />
dos casos, é uma disfunção que não está<br />
conectada a uma doença específica tal como<br />
infecção, tumor, osteoropose, espondilite<br />
anquilosante, fratura, processo inflamatório,<br />
síndrome radicular ou da cauda equina.<br />
A lombalgia relacionada às atividades<br />
ocupacionais, incluindo ocupações como o<br />
esporte amador e profissional, representa<br />
uma das causas mais comuns de percepção<br />
de incapacidade em trabalhadores com<br />
menos de 45 anos de idade, sendo um forte<br />
determinante de absenteísmo (falta ao trabalho).<br />
É uma disfunção que apresenta predileção<br />
por adultos jovens e é responsável<br />
por aproximadamente 1/4 dos casos firmados<br />
como de invalidez prematura. Portanto,<br />
trata-se de um fenômeno complexo e que<br />
historicamente já flutuou com entendimentos<br />
diferenciados e divergentes sobre a sua<br />
condição e impactos efetivos sobre a funcionalidade<br />
e capacidades humanas.<br />
Discutindo o Receio de Agravamento e<br />
Incapacidade Relacionada à Práticas<br />
Esportivas Amadoras ou Competitivas<br />
gen WC. Efeitos do<br />
Doutorado. Criciúma:<br />
e Funcional da<br />
e Mineiros do Carvão.<br />
Saúde. 2017;30:112-20.<br />
avés do método NIOSH.<br />
lth research. Coluna/<br />
of Disease [Internet].<br />
E<br />
ntre os transtornos físico funcionais<br />
mais encontrados estão os que afe<br />
tam a coluna vertebral, em especial<br />
os que envolvem o segmento lombar.<br />
A incidência de queixas musculoesqueléticas<br />
lombares é altíssima e representa<br />
frequente causa de incapacidade funcional,<br />
atingindo níveis expressivos na população<br />
em geral. Mas o que representam tais queixas<br />
ou elevados índices de incapacidade? O<br />
que está efetivamente comprometido? Estas<br />
são algumas reflexões e provocações que<br />
este texto procura destacar.<br />
De acordo com a duração, a lombalgia<br />
pode ser aguda (início súbito e duração<br />
menor do que seis semanas), subaguda<br />
(duração de seis a 12 semanas) e crônica<br />
(duração maior do que 12 semanas). Outra<br />
classificação é baseada na condição funcional,<br />
na qual o quadro agudo engloba as<br />
pessoas severamente limitadas, portanto<br />
incapazes de permanecer em pé por mais de<br />
15 minutos, de sentar por mais de 30 minutos,<br />
ou de caminhar mais de 250 metros<br />
sem que sua dor se agrave. O quadro subagudo<br />
envolve as pessoas que conseguem<br />
realizar as atividades funcionais citadas nos<br />
casos agudos, no entanto, que apresentam<br />
dificuldades para Atividades de Vida Diária<br />
(AVD´s) como suspender objetos, limpar,<br />
lavar roupas, amarrar o próprio calçado,<br />
entre outras ações do cotidiano de vida de<br />
qualquer pessoa.<br />
Já o quadro crônico é aquele que não<br />
impede o indivíduo de realizar suas AVD´s,<br />
porém em atividades de longa duração e<br />
maior intensidade como algumas práticas<br />
esportivas e laborativas, dependendo do<br />
tipo de exigência corporal e de intensidade<br />
envolvidas, manifestam dor e dificuldades<br />
e/ou incapacidade de manutenção da atividade.<br />
O European Guidelines For The<br />
Os grupos de risco para dor na coluna<br />
lombar envolvem indivíduos que desenvolvem<br />
suas atividades predominantemente<br />
na posição sentada.<br />
Tais condições agravam-se quando o<br />
corpo é condicionado a manter-se ou é<br />
solicitado constantemente a flexionar-se<br />
para frente nesta posição. Isto inclui por<br />
exemplo pilotos de qualquer tipo de veículo<br />
de competição, seja automotor, motociclismo,<br />
práticas aeronáuticas com pilotagem,<br />
aquáticas, bem como, remo, certas modalidades<br />
náuticas, ciclismo e várias outras<br />
práticas de permanência sentada. Em alguns<br />
estudos são destacados os fatores individuais<br />
associados à obesidade, ao sedentarismo<br />
e à deficiência muscular como fatores<br />
associados à lombalgia.<br />
• 51
Um estudo realizado pelo nosso Laboratório de<br />
Biomecânica, o LABIOMEC da Universidade do Extremo<br />
Sul Catarinense-UNESC, em parceria com um grupo de<br />
Fisiologia e Bioquímica do Exercício, denotou que a realização<br />
de atividade física aeróbica até um nível de intensidade<br />
moderada, em indivíduos com lombalgia crônica inespecífica,<br />
melhorou parâmetros bioquímicos e biomecânicos<br />
dos voluntários do estudo. Bem como, que os quadros<br />
sintomáticos e funcionais, apresentaram evolução positiva<br />
para a maioria destas pessoas. Tais efeitos ocorreram em<br />
parte pela redução dos níveis de lesão tecidual musculoesquelética,<br />
estimular o sistema de defesa antioxidante<br />
e analgésico de opióides ambos endógenos, reduzindo<br />
o quadro álgico, melhorando a funcionalidade, portanto<br />
reduzindo os níveis de incapacidade. Além dos aspectos<br />
biomecânicos e bioquímicos, a percepção quanto à dor e<br />
o encorajamento relacionado ao movimento e redução do<br />
receio da realização de atividades são fatores envolvidos.<br />
Os resultados encontrados corroboraram com a noção<br />
de que o exercício aeróbico em intensidade e duração moderada<br />
produz efeito positivo na percepção da dor e suas<br />
consequentes respostas adaptativas, bem como, em certos<br />
benefícios em manter ativo o indivíduo com lombalgia<br />
crônica inespecífica, em detrimento do fomento à inatividade.<br />
É fundamental considerar que a cultura do medo instalada<br />
na percepção da grande maioria pessoas envolvendo a<br />
realização das Atividades de Vida Diária (AVD´s) e atividades<br />
laborativas e esportivas, na presença da lombalgia<br />
representa uma realidade que prevalece, num fenômeno<br />
complexo que envolve aspectos como dor e receio de incapacidade.<br />
O nível de atividade funcional é uma variável que pode<br />
apresentar associação com incapacidade. Trabalhos que<br />
avaliaram indivíduos com dor lombar mostraram que a<br />
dor está associada com menores níveis de atividade física.<br />
Segundo Van Middelkoop o quadro de inatividade progressivo<br />
que tende a ser instalado pela síndrome da dor lombar<br />
crônica deve ser atenuado com intervenções que fomentem<br />
a atividade. No entanto, devemos nos questionar, que atividade<br />
e quanto de atividade?<br />
Existem evidências a partir de estudos controlados<br />
randomizados de que programas de exercícios melhoram<br />
especialmente os aspectos dor e função. Porém, o fato de<br />
grupos ativos contarem com menor probabilidade de sofrer<br />
de dor e incapacidade em relação aos seus congêneres sedentários,<br />
não determina que a realização de qualquer tipo<br />
de atividade física cotidiana, sem critérios seja um fator<br />
de proteção para a coluna. Nesse sentido, é determinante o<br />
tipo de exercício a ser realizado durante o quadro, a intensidade<br />
do mesmo, a carga diária e semanal de atividade,<br />
as posturas corporais empregadas, respeitar as preferenciar<br />
direcionais de movimento relacionadas ao quadro lombálgico.<br />
Segundo alguns trabalhos o tratamento com exercícios<br />
aeróbicos promove a melhora do funcionamento dos tecidos<br />
lombares dolorosos e diminui a cinesiofobia, elevando<br />
a confiança dos pacientes quanto à utilização da sua coluna<br />
nas atividades diárias.<br />
Na Classificação Internacional de Funcionalidade,<br />
Incapacidade e Saúde - CIF, o do¬mínio de estrutura e da<br />
função do corpo se caracteriza pelas funções fisiológicas<br />
e/ou psicológicas dos sistemas corporais e por suas partes<br />
anatômicas. Na lombalgia é comum verificar algumas<br />
alterações nesse domínio, como dor, fraqueza e desequilíbrios<br />
musculares, espasmo muscular, diminuição da<br />
flexibilidade muscular, diminuição da mobilidade articular,<br />
entre outras alterações que podem perpetuar os quadros<br />
sintomáticos. Estas alterações são classificadas como síndromes<br />
de disfunção e síndromes posturais, representando<br />
a maioria das causas de lombalgia crônica inespecífica.<br />
O declínio da funcionalidade é muito frequente na<br />
lombalgia crônica e mostra associação com redução da<br />
Qualidade de Vida dos indivíduos afetados. Esta condição<br />
funcional depende mais do grau de manutenção da atividade<br />
de vida do que da intensidade da dor em si.<br />
Em casos que envolvem sinais e sintomas mais graves<br />
ou sistêmicos concomitantes a lombalgia, deve-se buscar<br />
aprofundamento clínico e diagnóstico. No entanto, a<br />
grande maioria dos casos de lombalgia tem como recomendação<br />
essencial receber suporte na atenção primária<br />
em saúde. Isto é destacado no trabalho intitulado: Clinical<br />
practice guidelines for the management of non-specific low<br />
back pain in primary care: an updated overview, publicado<br />
em novembro de 2018 no European Spine Journal. Este<br />
estudo envolveu um apanhado de 15 diretrizes de prática<br />
clínica no manejo da lombalgia, publicadas entre 2008 e<br />
2017.<br />
Referente ao diagnóstico de pacientes com lombalgia<br />
inespecífica, as diretrizes de prática clínica recomendam<br />
que a história seja levantada e exame físico para identificar<br />
a existência de bandeiras vermelhas (red flags), testes neurológicos<br />
para identificar a síndrome radicular, uso de imagem<br />
se a patologia séria é suspeita, sendo desencorajado o<br />
seu uso rotineiro e a avaliação de fatores psicossociais. Nos<br />
casos agudos, que são aqueles de lombalgia há menos de 3<br />
meses, as diretrizes recomendam conferir a mensagem e a<br />
segurança no prognóstico favorável, aconselhamento sobre<br />
o retorno às atividades normais, evitando o repouso no<br />
leito, o uso de anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) e<br />
opioides fracos para curtos períodos. Para o tratamento de<br />
pacientes com lombalgia crônica, as diretrizes recomendam<br />
o uso de AINEs e antidepressivos, terapia ergométrica e<br />
intervenções psicossociais. Nos casos que não apresentam<br />
melhora após 4 semanas, recomenda-se o encaminhamento<br />
a um especialista ou em caso de suspeita desde o início de<br />
patologias específicas ou radiculopatia.<br />
As Diretrizes Clínicas de manejo da lombalgia preconizam<br />
que a grande maioria dos casos de dor nesta região<br />
da coluna vertebral devem ser conduzidas à nível de atenção<br />
básica em saúde. A crença positiva de que haverá boa<br />
evolução envolvendo a grande maioria dos casos é decisiva<br />
e impactante no prognóstico.<br />
A lombalgia deve ser encarada como um quadro transitório<br />
que requer alguns cuidados em relação às práticas<br />
esportivas e de vida diária, no entanto, sem a necessidade<br />
de abandoná-las completamente, mas sim, buscar<br />
compreender suas relações de causa e efeito, regulações<br />
necessárias e de retorno processual aos níveis previamente<br />
alcançados.<br />
52 •
Isto<br />
só<br />
está<br />
no Aceda aos conteúdos em:<br />
blog desportoesport.com<br />
#FUTSAL<br />
QUAL O<br />
ESFORÇO<br />
FÍSICO?<br />
Como é a fisiologia dos<br />
atletas de topo do<br />
futsal mundial? E em<br />
comparação com os<br />
futebolistas?<br />
O U<br />
P O P U L A R I D A D E ?<br />
• 53
54 •
#Liderança e Motivação<br />
José Mourinho<br />
Um CEO nos relvados do futebol<br />
José Mourinho é um<br />
CEO. Em tudo: como<br />
gere as equipas, como<br />
treina e nas metodologias.<br />
A sua filosofia é<br />
baseada na organização<br />
máxima, no detalhe a<br />
todo o pormenor, na<br />
visão a curto e médio prazo e a<br />
gestão dos recursos humanos é “executada”<br />
a top e de acordo com as<br />
mais recentes práticas empresariais,<br />
assente na motivação dos seus colaboradores.<br />
E tu isto só é possível, pela<br />
sua capacidade de liderança; sempre<br />
incontestável em todos os clubes que<br />
treinou. Às vezes ganhou-a; outras<br />
vezes conquistou-a à força.<br />
Os jogadores foram sempre conquistados<br />
com “inteligência emocional”;<br />
quem não se lembra das<br />
palavras de Zlatan Ibrahimovic, “por<br />
Mourinho seria capaz de matar” ou<br />
das lagrimas de Materazzi quando<br />
mourinho abandonou o Internacional<br />
de Milão. Isto é uma conquista de<br />
dia-a-dia: de dialogo, de readaptação<br />
de objetivos individuais e de atenção<br />
para as diferentes “sensibilidades e<br />
necessidades de cada atleta”.<br />
Sistematização<br />
do jogo<br />
José Mourinho é bem conhecido<br />
pela qualidade do processo defensivo<br />
das equipas que treina. As suas equipas<br />
sofrem poucos golos e os seus<br />
jogadores cometem poucos ou quase<br />
nenhuns erros – diga-se daqueles<br />
“erros não forçados”. Segundo a<br />
filosofia de mourinho, a organização<br />
defensiva centra-se na sistematização<br />
de padrões e na disposição da<br />
equipa por blocos. Mourinho aponta<br />
a simplicidade como a melhor<br />
forma de fazer chegar a informação<br />
aos jogadores - “curto e objetivo”,<br />
como gosta de dizer. Informação em<br />
demasiado é contraproducente e está<br />
em total desacordo com a “atenção<br />
disponibilizada” dos futebolistas nos<br />
parâmetros atuais do futebol espetáculo<br />
e nos seus atletas como “movie<br />
stars”. O técnico português opta por<br />
palestras com dois ou três pequenos<br />
vídeos e durante a semana dos<br />
jogos mais importantes, esses mesmos<br />
vídeos, estão em permanente<br />
“play” um pouco por todo o edifício<br />
do clube, desde aos balneários, à sala<br />
medica ou os refeitórios. Onde estiverem<br />
os jogadores, estão os vídeos.<br />
A avaliação da progressão<br />
de cada futebolista deve ser feita<br />
segundo três parâmetros...<br />
“Eu não tenho problemas<br />
em beijar, chorar,<br />
ou “bater” nos meus<br />
jogadores. Tudo pertence<br />
à família. Eu aprendi isso<br />
com minha esposa e minha<br />
própria família. Na minha<br />
família, estamos abertos<br />
a ser criticado pelos meus<br />
filhos e o mesmo se aplica<br />
aos meus jogadores."<br />
Deve-se estar aberto a<br />
compartilhar emoções e<br />
ideias.“<br />
José Mourinho<br />
L<br />
iderança Transformacional.<br />
O nome é estranho, mas o<br />
conceito é simples. Mudar<br />
sistematicamente os objetivos<br />
de cada jogador de forma<br />
individualizada para que eles<br />
se aproximem da filosofia e<br />
necessidades do clube e da<br />
equipa. Este é talvez a tarefa<br />
mais dura dos treinadores<br />
modernos dos grandes clubes<br />
europeus. Hoje os futebolistas<br />
top são PMEs – pequenas e<br />
médias empresas, inseridos<br />
em inúmeros negócios e com<br />
dezenas de pessoas a seu<br />
cargo. Assim nem sempre as<br />
suas energias estão focadas no<br />
clube – não raras vezes interesses<br />
comerciais e financeiros<br />
metem-se no caminho. Ai<br />
entra a necessidade de controlar<br />
o grupo como um todo<br />
mas com um tratamento individualizado<br />
e instaurar no balneário<br />
uma filosofia comum<br />
com objetivos comuns, que na<br />
mente de cada jogador/homem<br />
passa a ser o seu objetivo principal.<br />
• 55
"A idade não é uma barreira.<br />
É um limite que colocamos na<br />
nossa mente"<br />
Jackie Joyner-Kersee
Leia todas<br />
as matérias<br />
na versão<br />
total da<br />
14 edição<br />
da nossa<br />
revista<br />
Clique abaixo para ler (+ 100 páginas)<br />
58 •
REFERÊNCIAS DE<br />
IMAGENS:<br />
Capa – GQ, imagem<br />
de demokracie,<br />
footyrenders; frases<br />
motivacionais – sportingnews,<br />
wagnernoel;<br />
Demasiados craques<br />
destrói as equipas? -<br />
desporto.sapo e revista<br />
Desporto&<strong>Sports</strong>; O<br />
que faz de Neuer um<br />
goleiro tão único? -<br />
Pinterest, desktopbackground;<br />
Ciclismo: as<br />
três joias do ciclismo<br />
mundial – fotos fornecidas<br />
pelo autor do<br />
texto e thebikecomesfirst,<br />
cyclingmagazine.<br />
Canstockphoto; Alto<br />
rendimento e a mente<br />
do atleta – publico,<br />
futeboldeformacao,<br />
desporto.sapo, sapo,<br />
osbelenenses; Futebol,<br />
treino e cérebro – wicoach,<br />
goal, otempo;<br />
#Portugal: Mudança<br />
de treinador – Ojogo;<br />
#Brasileirão: quais as<br />
causas das demissões<br />
dos técnicos<br />
– terceirotempo; O<br />
Jovem atleta e o seu<br />
crescimento moral –<br />
Irishtimes, thebullspen;<br />
Lionel Messi: porque<br />
ele continua a ser<br />
(de longe) o melhor<br />
do mundo? – Pinterest,<br />
7-themes, youtube,<br />
wallpapercave, lajmi;<br />
Lesões: Lombalgia –<br />
suasaude;<br />
• 59
w w w . d e s p o r t o e s p o r t s . c o m<br />
D o w n l o a d<br />
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