primeira mao julho 2019
Revista laboratório do Curso de comunicação da Ufes
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POESIA EM REDE<br />
A PROFUNDIDADE DA VIDA TRADUZIDA EM RIMAS E VERSOS<br />
DENTRO DO INSTAGRAM<br />
lavynia lorenção e maria fernanda conti<br />
Navegar<br />
pelas redes<br />
sociais<br />
em busca de<br />
conteúdos<br />
singulares<br />
sempre foi<br />
uma constante<br />
para mim;<br />
páginas e perfis<br />
me prendem<br />
por horas enquanto<br />
viajo por suas postagens.<br />
Em uma “navegação” recente,<br />
na qual buscava inspirações e motivações,<br />
me encontrei passeando por<br />
perfis de poesias no Instagram. Era<br />
um lugar em que não esperava encontrar<br />
esse gênero. Para os mais antenados<br />
nas redes, os versos de Rupi<br />
Kaur (@rupikaur_), João Doederlein<br />
(@akapoeta), Lucão (@lucaoescritor)<br />
e Zack Magiezi (@zackmagiezi)<br />
não desaparecem do feed. Conhecidos<br />
como “instapoetas”, esses jovens<br />
conquistam cada vez mais leitores no<br />
Instagram. Juntos, acumulam quase<br />
6 milhões de seguidores, com versos<br />
que falam sobre amor, feminismo e<br />
assuntos do cotidiano.<br />
Aquilo me surpreendeu e me<br />
prendeu, pois em meio aos corpos e<br />
vidas perfeitas, havia um lugar onde<br />
encontrar um frescor de realidade<br />
através da escrita. Dentro da enxurrada<br />
de informações da internet, esses<br />
escritores viralizam com textos<br />
curtos, linguagem simples, gírias<br />
e, em sua maioria, temas afetivos e<br />
motivacionais. Embora tenham suas<br />
particularidades, também apostam<br />
no quesito visual, com o apoio de<br />
desenhos, projetos gráficos e caligrafias<br />
estilizadas. As novas fronteiras<br />
traçadas pelos poetas me intrigou,<br />
mas como disse Sérgio Sampaio nos<br />
anos 70, “um livro de poesia na gaveta<br />
não adianta nada/lugar de poesia<br />
é na calçada”, e aquela era a calçada<br />
deles, o espaço onde atraiam todos<br />
os tipos de pessoa e davam voz aos<br />
seus pensamentos.<br />
Os guardanapos de Pedro Gabriel<br />
Anhorn, ou Antônio (@eumechamoantonio),<br />
seu pseudônimo, repercutem<br />
desde 2012. Além de fãs por todo o<br />
país, Pedro conquistou o mercado editorial<br />
e, após estourar na rede, lançou<br />
três livros. Segundo ele, o Instagram<br />
é um dos responsáveis pelo alcance<br />
de seu trabalho. “Por ser um território<br />
sem fronteiras, possibilitou diálogos<br />
que seriam inviáveis há algum tempo.<br />
Hoje, eu converso em tempo real<br />
com minha leitora de Manaus ou com<br />
meu leitor de Porto Alegre”, afirma o<br />
escritor. Já os desenhos em nanquim<br />
e as frases de autoconhecimento da<br />
pernambucana Clarice Freire (@podeluaoficial)<br />
mostram que esse terreno<br />
é ocupado por todas as vozes. “Não<br />
imaginei que a internet seria um lugar<br />
tão propício e fértil, sobretudo para<br />
a poesia nacional. Ainda mais para<br />
mim, uma mulher nordestina. Antigamente,<br />
só quem estivesse no eixo RJ-<br />
-SP conquistava relevância, mas hoje<br />
todo mundo está sendo escutado”,<br />
relata a jovem.<br />
Contudo, nem tudo são flores:<br />
tornar-se refém do medo de ficar<br />
para trás é fácil quando o “sucesso”<br />
na plataforma vem acompanhado de<br />
números explícitos, que refletem curtidas,<br />
comentários e compartilhamentos<br />
instantâneos do seu trabalho. “É<br />
preciso entender que o alcance orgânico<br />
é uma consequência que não depende<br />
exclusivamente do seu esforço.<br />
Há algoritmos que mudam frequentemente,<br />
há o tempo do leitor no mundo<br />
offline, há a concorrência cada vez<br />
maior de novos perfis com um conteúdo<br />
muito parecido com o seu…”, reflete<br />
Pedro Gabriel. O segredo, portanto,<br />
é não se iludir, seguir sua essência e<br />
ouvir aquela voz interna que nos diz<br />
muito em silêncio: a intuição. Mais do<br />
que isso, Clarice defende, por sua vez,<br />
que “o importante é fazer um trabalho<br />
que seja pessoalmente relevante, o<br />
qual você poste e compartilhe porque<br />
acredita naquilo, independentemente<br />
de qualquer like ou stories”, aconselha.<br />
INTERLÚDIO PARA<br />
OS CAPIXABAS<br />
Mais próximo do que eu imaginava,<br />
vários representantes capixabas<br />
navegam pelas águas da poesia no<br />
Instagram. Sem pretensão, Isabella<br />
Mariano, 27, começou a escrever<br />
seus verbos em cadernos antigos<br />
que achava pela casa. Os amigos e<br />
os professores, ao verem a qualidade<br />
do que produzia, a estimularam<br />
na divulgação do trabalho. Depois<br />
disso, não parou mais, e hoje se destaca<br />
como uma das poetas de maior<br />
alcance da Grande Vitória.<br />
Isabella acredita que a internet<br />
pode ter democratizado a literatura.<br />
“Penso que o processo artístico só<br />
se completa quando alcança o leitor.<br />
Dentro da internet a gente conquistou<br />
isso”, defende. Ela também vê que<br />
o Instagram possibilitou o diálogo<br />
não só com os seguidores, mas com<br />
outros poetas, criando parcerias e<br />
inspirações. “Converso com gente<br />
do Rio de Janeiro, Salvador, do interior<br />
do Espírito Santo… São pessoas como<br />
eu, que estão tentando produzir sua<br />
6 <strong>julho</strong> <strong>2019</strong>