O anticristo
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volta ao ego. Nos ensinamentos de Buda o egoísmo é um dever. A “única coisa necessária”, a questão
“como posso me libertar do sofrimento”, é o que rege e determina toda a dieta espiritual (– talvez alguém
lembrar-se-á daquele ateniense que também declarou guerra ao “cientificismo” puro, a saber, Sócrates,
que também elevou o egoísmo à condição de princípio moral).
XXI
As necessidades do budismo são um clima extremamente ameno, muita gentileza e liberalidade nos
costumes, e nenhum militarismo; ademais, que seu início provenha das classes mais altas e educadas.
Alegria, serenidade e ausência de desejo são os objetivos principais, e eles são alcançados. O budismo
não é uma religião na qual a perfeição é meramente objeto de aspiração: a perfeição é algo normal. – No
cristianismo os instintos dos subjugados e dos oprimidos vêm em primeiro lugar: apenas os mais
rebaixados buscam a salvação através dele. Nele o passatempo prevalecente, a cura favorita para o
enfado, é a discussão sobre pecados, a autocrítica, a inquisição da consciência; nele a emoção produzida
pelo poder (chamada de “Deus”) é insuflada (pela reza); nele o bem mais elevado é considerado algo
inatingível, uma dádiva, uma “graça”. Também falta transparência: o encobrimento e os lugares
obscurecidos são cristãos. Nele o corpo é desprezado e a higiene é acusada de lascívia; a Igreja distanciase
até da limpeza (– a primeira providência cristã após a expulsão dos mouros foi fechar os banhos
públicos, dos quais havia 270 apenas em Córdoba). Também é cristã uma certa crueldade para consigo e
para com os outros; o ódio aos incrédulos; o desejo de perseguir. Idéias sombrias e inquietantes ocupam o
primeiro plano; os estados mentais mais estimados, portando os nomes mais respeitáveis, são
epileptiformes; a dieta é determinada com o fim de engendrar sintomas mórbidos e supra-estimulação
nervosa. Também é cristã toda a inimizade mortal aos senhores da terra, aos “aristocratas” – juntamente
com uma rivalidade secreta contra eles (– resignam-se do “corpo” – querem apenas a “alma”...). É cristão
todo o ódio contra o intelecto, o orgulho, a coragem, a liberdade, a libertinagem intelectual; o ódio aos
sentidos, à alegria dos sentidos, à alegria em geral, é cristão...
XXII
Quando o cristianismo abandonou sua terra natal, aqueles das classes mais baixas, o submundo da