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O Livro da Selva - Rudyard Kipling (1)

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centenas de metros para ver se em sua carga havia algo bom de comer. Ele assobiou de surpresa ao ver

Mowgli sendo arrastado até a copa de uma árvore e ouviu-o dizer na língua dos abutres: “Nós somos do

mesmo sangue, tu e eu”. Uma onda de galhos se fechou sobre o menino, mas Chil planou até a árvore

seguinte a tempo de ver a carinha morena surgir de novo. “Vê bem minha trilha!”, gritou Mowgli. “Diz a

Baloo, da Alcateia de Seeonee, e a Bagheera, da Pedra do Conselho.”

“Em nome de quem, irmão?” Chil jamais vira Mowgli antes, embora, é claro, tivesse ouvido falar dele.

“Mowgli, a Rã. Eles me chamam de Filhote de Homem! Vê bem minha trilhaaa!”

Mowgli gritou as últimas palavras conforme era atirado ao ar, mas Chil assentiu, subiu até ficar do

tamanho de uma poeira e ali permaneceu, observando com seus olhos de telescópio as copas das árvores

balançarem com o progresso da escolta do menino.

“Eles nunca vão longe”, disse o abutre, rindo. “Nunca fazem o que planejaram fazer. O Bandar-log está

sempre se metendo em coisas novas. Dessa vez, se vejo bem, se meteram em algo que vai causar muitos

problemas, pois Baloo não é nenhum filhote e Bagheera, que eu saiba, consegue matar mais que cabras.”

E Chil ficou ali balançando as asas com os pés encolhidos, esperando.

Enquanto isso, Baloo e Bagheera estavam fervendo de raiva e tristeza. Bagheera subiu árvores como

nunca subira antes, mas os galhos finos quebraram com seu peso e ele escorregou para baixo com vários

pedaços de tronco nas garras.

“Por que não avisaste o Filhote de Homem?”, rugiu ele para o pobre Baloo, que havia saído correndo

desajeitadamente na esperança de alcançar os macacos. “De que serviu quase matar o menino de

palmadas se não o avisaste?”

“Corre! Corre! Nós… nós ainda podemos alcançá-los!”, disse Baloo, ofegante.

“Nesse passo! Nem uma vaca cansada se cansaria. Professor da Lei… espancador de filhotes… se

segues rolando assim por um quilômetro, arrebentas. Senta e pensa! Faz um plano. Isso não é hora de

perseguição. Eles podem soltá-lo se chegarmos perto demais.”

“Arrula! Uuuu! Talvez já o tenham soltado, cansados de carregá-lo. Quem pode confiar no Bandar-log?

Joga morcegos mortos na minha cabeça! Dá-me ossos podres para comer! Atira-me nas colmeias das

abelhas selvagens para que elas me piquem até a morte e me enterra com a hiena, pois sou o mais triste

dos ursos! Arulala! Oooaaa! Ó Mowgli, Mowgli! Por que não te avisei para tomar cuidado com o Povo

dos Macacos em vez de bater na tua cabeça? Talvez eu tenha arrancado a lição do dia da mente dele, e

ele vai estar sozinho na Selva sem as Palavras Mestras.”

Baloo pôs as patas nas orelhas e rolou de um lado para o outro, gemendo.

“Pelo menos ele falou todas as palavras certas para mim há pouco tempo”, disse Bagheera, impaciente.

“Baloo, tu não tens memória nem respeito. O que a Selva ia pensar se eu, a Pantera-Negra, me enroscasse

que nem Sahi, o Porco-Espinho, e uivasse?”

“E eu ligo para o que a Selva pensa? Talvez ele já esteja morto.”

“Se eles não o atirarem árvore abaixo de brincadeira, ou o matarem por preguiça, não temo pelo

Filhote de Homem. Ele é sábio e foi bem ensinado e, acima de tudo, tem os olhos que dão medo ao Povo

da Selva. Mas — e isso é um grande mal —, está no poder do Bandar-log e eles, por viverem nas

árvores, não temem ninguém do nosso povo.” Bagheera lambeu uma das patas da frente, pensativo.

“Que tolo que sou! Oh, que tolo mais gordo, marrom e cavador de raízes que sou”, disse Baloo, se

desenroscando de súbito. “É verdade o que diz Hathi, o Elefante Selvagem: ‘Cada um tem seu medo’; e

eles, o Bandar-log, temem Kaa, a Cobra da Pedra. Ele consegue subir nas árvores tão bem quanto eles.

Rouba os macacos jovens à noite. O som do nome de Kaa os deixa gelados até a ponta do rabo. Vamos

falar com Kaa.”

“O que ele fará por nós? Kaa não é da nossa tribo, pois não tem pés… e tem olhos perversos”, disse

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