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C.S. LEWIS - OS QUATRO AMORES

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deveríamos adotar uma atitude prematuramente moral ou

avaliadora. De modo geral, a mente humana está muito mais

propensa a louvar e depreciar do que a descrever e definir. Deseja

fazer de toda a distinção uma distinção de valor. É assim que agem,

por exemplo, aqueles críticos fatais que nunca são capazes de

apontar a qualidade distintiva entre dois poetas sem colocá-los

numa ordem de preferência, como se fossem candidatos a algum

prêmio. Não deveríamos fazer nada disso com relação aos

prazeres. A realidade é muito complicada. Já fomos advertidos pelo

fato de que o prazer-Necessidade é o estado em que acabam os

prazeres de Apreciação quando as coisas vão mal (por vício).

De qualquer modo, para nós, a importância dos dois tipos de

prazer está na extensão em que prenunciam características em

nossos “amores” (assim propriamente chamados).

A pessoa sedenta, mas que acabou de beber uma grande

quantidade de água, poderá dizer: “Poxa vida, era isso o que eu

queria”. Assim também o alcoólatra depois de beber uma “dose”. A

pessoa que passa pela plantação de ervilhas em sua caminhada

matinal está mais propensa a dizer: “Este perfume é maravilhoso”.

Após o primeiro gole de um famoso vinho tinto, o especialista

poderá dizer: “Este é um grande vinho”. Quando prazeres-

Necessidade estão em evidência, tendemos a fazer afirmações a

respeito de nós mesmos no tempo passado; quando prazeres de

Apreciação estão em evidência, inclinamo-nos a fazer afirmações

sobre o objeto no tempo presente. É fácil perceber a razão disso.

Shakespeare descreve a satisfação de um desejo tirânico como

alguma coisa

Perdida a razão, e logo esquecida,

Odiada razão

Mas os mais inocentes e necessários prazeres-Necessidade têm

a seu respeito algo do mesmo caráter — apenas algo, é claro. Eles

não são odiados depois que os tivermos, mas certamente “morrem

em nós” de forma extraordinariamente abrupta e completa. A

torneira da pia e o copo cheio são mesmo muito atraentes quando

entramos em casa com sede depois de cortar a grama do jardim;

mas seis segundos depois se tornam vazios de qualquer interesse.

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