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Vamos Garotas! - Senac

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CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC<br />

Gabriela Ordones Penna<br />

<strong>Vamos</strong> <strong>Garotas</strong>!<br />

Alceu Penna: moda, corpo e emancipação feminina.<br />

(1938-1957)<br />

São Paulo<br />

2007


GABRIELA ORDONES PENNA<br />

<strong>Vamos</strong> <strong>Garotas</strong>!<br />

Alceu Penna: moda, corpo e emancipação feminina.<br />

(1938-1957)<br />

São Paulo<br />

2007<br />

Dissertação de Mestrado apresentada ao<br />

Centro Universitário <strong>Senac</strong> – Campus Santo<br />

Amaro, como exigência parcial para<br />

obtenção do grau de Mestre em Moda,<br />

Cultura e Arte.<br />

Orientadora: Profa. Dra. Maria Claudia<br />

Bonadio<br />

2


P397z<br />

Penna, Gabriela Ordones<br />

<strong>Vamos</strong> <strong>Garotas</strong>!<br />

Alceu Penna: moda, corpo e emancipação feminina<br />

(1938-1957) / Gabriela Ordones Penna – São Paulo, 2007.<br />

165. f: il. color.<br />

Orientadora: Profa. Dra Maria Claudia Bonadio<br />

Dissertação de Mestrado – Centro Universitário <strong>Senac</strong> – Campus Santo Amaro –<br />

São Paulo, 2007.<br />

1. “As <strong>Garotas</strong> do Alceu” 2. Alceu Penna 3. Imprensa - O Cruzeiro. 4. Mulher –<br />

moda e corpo. 5. Rio de Janeiro. I. Bonadio, Maria Claudia. II. Centro Universitário<br />

<strong>Senac</strong> - Campus Santo Amaro. Mestrado Moda, Cultura e Arte. III. Título.<br />

CDD391<br />

3


Gabriela Ordones Penna<br />

<strong>Vamos</strong> <strong>Garotas</strong>!<br />

Alceu Penna: moda, corpo e emancipação<br />

feminina<br />

Dissertação de Mestrado apresentada ao<br />

Centro Universitário <strong>Senac</strong> – Campus Santo<br />

Amaro, como exigência parcial para<br />

obtenção do grau de Mestre em Moda,<br />

Cultura e Arte.<br />

Orientadora: Profa. Dra. Maria Claudia<br />

Bonadio<br />

A banca examinadora da Dissertação de Mestrado em sessão pública realizada em<br />

04/09/07, considerou a candidata:<br />

1) Examinadora: Profa. Dra. Maria Gabriela Marinho<br />

2) Examinadora: Profa. Dra. Denise Bernuzzi Sant´Anna<br />

3) Presidente: Profa. Dra. Maria Claudia Bonadio<br />

4


Dedico esse trabalho à Thereza<br />

Penna, que me incentivou e apoiou<br />

em todos os momentos, tornando<br />

essa pesquisa um momento de<br />

descobertas e redescobertas.<br />

5


SUMÁRIO<br />

AGRADECIMENTOS............................................................................................................................ 07<br />

RESUMO.................................................................................................................................................. 10<br />

INTRODUÇÃO<br />

1. Olá <strong>Garotas</strong>, muito prazer.................................................................................................................. 11<br />

2. “<strong>Garotas</strong>”: muitas mulheres em uma representação....................................................................... 13<br />

3. Estruturação dos capítulos e corpus documental............................................................................. 16<br />

4. Balizas cronológicas............................................................................................................................. 19<br />

5. Ser Alceu Penna é... ser versátil.......................................................................................................... 22<br />

CAPÍTULO 1. “GAROTAS” CARIOCAS E JOVENS: UMA NOVA PERSPECTIVA<br />

1.1 “<strong>Garotas</strong> maravilhosas”: Rio de Janeiro 1938 -1957...................................................................... 31<br />

1.2 O espaço urbano alia-se às cariocas................................................................................................. 46<br />

1.3 Um broto de “Garota” : a emergência do conceito de juventude................................................. 56<br />

CAPÍTULO 2. UMA REVISTA MODERNA: O CRUZEIRO DAS “GAROTAS”<br />

2.1 Os Diários Associados: rumo à integração nacional....................................................................... 64<br />

2.2 O Cruzeiro: a revista dos arranha-céus............................................................................................71<br />

2.3 Uma história: “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”.............................................................................................. 83<br />

CAPÍTULO 3. O CORPO E A MODA DAS “GAROTAS DO ALCEU”: UM ESPELHO DO<br />

AMANHÃ<br />

3.1 A moda e o corpo das “<strong>Garotas</strong>”: um reflexo de transformações................................................ 97<br />

3.2 A ousadia discreta das “<strong>Garotas</strong>”: objetos de desejo.................................................................... 116<br />

CAPÍTULO 4. “GAROTAS”... ALGO A SER INDEFINIDO<br />

4.1 Um homem que desenhou mulheres: o olhar diferenciado........................................................... 125<br />

4.2 Imagem e texto na coluna “As <strong>Garotas</strong>”: uma relação humorística............................................ 129<br />

4.3 <strong>Garotas</strong> modernas ou emancipadas? Uma análise imagética e textual da coluna...................... 135<br />

CONCLUSÃO......................................................................................................................................... 148<br />

FONTES E BIBLIOGRAFIAS.............................................................................................................. 151<br />

CRÉDITO DAS ILUSTRAÇÕES......................................................................................................... 162<br />

6


AGRADECIMENTOS<br />

A coluna “As <strong>Garotas</strong>” esteve presente no imaginário de muitos brasileiros. Assim,<br />

escrever sobre uma coluna tão significativa e, ao mesmo tempo, pouco explorada pelo<br />

meio acadêmico, foi um desafio e, com certeza, não teria conseguido sem a ajuda de<br />

algumas pessoas especiais.<br />

Agradeço à Thereza Penna, minha querida tia-avó e irmã de Alceu Penna, que<br />

carinhosamente abriu as portas de seu apartamento no Rio de Janeiro para mim e minha<br />

orientadora a Profa. Dra Maria Claudia Bonadio, nos mostrando o seu acervo sobre o<br />

ilustrador. Coletamos várias imagens que serviram para a minha dissertação e para o<br />

Projeto Figurino: Alceu Penna (2005-2007), bem como para a exposição resultante dele “O<br />

Brasil na ponta do lápis: Alceu Penna, modas e figurinos” no <strong>Senac</strong>-SP (2007).<br />

Agradeço a CAPES pelo apoio concedido pela bolsa de estudos, sem a qual não<br />

teria conseguido concretizar esse percurso acadêmico.<br />

Ao DEDOC do Jornal Estado de Minas e a todos os seus funcionários atenciosos.<br />

Obrigada em especial à Ivonete, Karla, Irene e Rafael. Sem esse acervo completo, cuidado<br />

e organizado da revista O Cruzeiro e A Cigarra, bem como o de croquis originais da<br />

coluna “<strong>Garotas</strong>”, eu jamais teria conseguido coletar os dados e imagens que precisava.<br />

Obrigada aos meus pais, Aníbal Penna e Patrícia Ordones, que foram o meu porto-<br />

seguro e fortaleza nessa caminhada difícil, mas muito compensadora. Seus esforços em<br />

procurar registros sobre a coluna “<strong>Garotas</strong>” e sobre Alceu Penna, bem como indicar<br />

pessoas que eu deveria conversar foram de imensa ajuda.<br />

À minha tia, Simone Ordones, que tão generosamente me abrigou em sua casa<br />

durante o período do mestrado e tornou possível o meu sonho de escrever essa dissertação.<br />

7


Agradeço ao meu avô Aluízio Ordones pelo carinho e apoio incondicional. Aos<br />

meus avós Carmelita Gontijo Penna, Josaphat Penna e Zélia de Moura Ordones, aonde<br />

quer que estejam.<br />

Tenho muito a agradecer, também, a paciência dos meus irmãos Marina e Aluisio<br />

Ordones. Vocês foram demais!<br />

Não poderia ter chegado até aqui se não fosse a minha excepcional orientadora<br />

Profa. Dra. Maria Claudia Bonadio (queria que me orientasse o resto da vida!), que<br />

acreditou em mim e no meu trabalho desde o primeiro momento. Foi generosa e<br />

profissional, me auxiliando e estando sempre à postos quando precisava de qualquer coisa,<br />

mesmo que não fosse relativo à dissertação. Obrigado pelos constantes incentivos em<br />

buscar novas perspectivas acadêmicas e profissionais. Tenho certeza que você já faz parte,<br />

de coração, da família Penna.<br />

À Heloisa Buarque de Hollanda e à editora do Caderno Feminino do Jornal Estado<br />

de Minas, Anna Marina pelos maravilhosos depoimentos sobre a importância da coluna<br />

“As <strong>Garotas</strong>”.<br />

Ao Ruy Castro pela generosidade e disposição em ajudar com o meu trabalho.<br />

Obrigada pelo texto de abertura da exposição “O Brasil na ponta do lápis: Alceu Penna,<br />

modas e figurinos”, que acabei empregando, com muito orgulho, na minha dissertação.<br />

Ao corpo docente do mestrado Moda, Cultura e Arte pelo profissionalismo no<br />

ensino e a generosidade em compartilhar tantos conhecimentos. Em especial à Maria Lúcia<br />

Bueno Ramos, Ana Lúcia Castro, Eliane Robert de Morais, Magnólia Costa e Luiz Octávio<br />

Camargo. Às funcionárias brilhantes Juliana e Tissyana.<br />

Às Profas. Dras. Maria Gabriela Marinho e Denise Bernuzzi Sant´Anna, que<br />

aceitaram o convite, primeiramente, para estarem na minha banca de qualificação e<br />

posteriormente na minha banca final. À Profa. Dra. Maria Eduarda Guimarães por ter sido<br />

8


suplente na minha qualificação e banca final. À Profa. Dra. Solange Wajnman que aceitou<br />

ser suplente na minha banca final. Agradeço as contribuições para o crescimento do meu<br />

trabalho, abrindo novas perspectivas a ele, muitas vezes, despercebidas por mim.<br />

Aos meus colegas de mestrado, em especial Adriana Hegen, Juliana Schmitt,<br />

Silvana Holzmeister, Celinha, Cris Gurgel, Oneide de Carvalho, Mauro Fiorani, Alexandra<br />

Riquelme e a todos que fizeram dessa jornada algo interessante e divertido.<br />

À Profa. Daniela Nunes Figueira que, a partir dos desenhos coletados do ilustrador<br />

Alceu Penna, coordenou os trabalhos de modelagem resultantes da exposição sobre o<br />

ilustrador no <strong>Senac</strong>-SP. Ao Prof. Lázaro Mourilo responsável pela bela montagem. Às<br />

alunas do Projeto Figurino que se dedicaram firmemente no resgate da memória do<br />

profissional.<br />

À Giselda Moreira Garcia e Giselle Safar do Centro Integrado de Moda – CIMO,<br />

que me proporcionaram horizontes profissionais e uma oportunidade de expor, pela<br />

palestra “Alceu Penna: a trajetória de um designer versátil” (2007), o conteúdo da minha<br />

pesquisa de mestrado até aquele momento.<br />

Obrigada a Cyro Del Nero que, no início do mestrado, me recebeu, juntamente com<br />

meu pai, em sua casa. Sua atenção pela memória de Alceu Penna será sempre lembrada.<br />

Às Profas. Ivone Lourdes e Glória Gomide da PUC-MG, bem como ao Prof. Caio<br />

César Giannini, que sempre me auxiliaram durante a minha graduação em Publicidade e<br />

Propaganda na instituição e continuam, até hoje, sendo muito gentis e solícitos.<br />

À querida Profa. Dra. Ana Maria Rabelo Gomes, que me auxiliou na época da<br />

elaboração do meu anteprojeto para o mestrado. Obrigada pela sua atenção e carinho.<br />

Por fim, ao meu querido companheiro Luis André Nobre que tão carinhosamente e<br />

pacientemente me “suportou” nos momentos de crise, cansaço e desânimo. Sem você nada<br />

estaria completo.<br />

9


RESUMO<br />

A moda e o corpo atuam como importantes meios de comunicação da mulher com a<br />

sociedade. Por meio deles, a mulher estabelece um diálogo com o mundo, refletindo suas<br />

aspirações e frustrações. Sendo assim, este trabalho consiste em demonstrar, pelo estudo de<br />

imagens da “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”, como Alceu Penna contribuiu para a formação de uma<br />

imagem moderna da mulher, na coluna, transmitindo, pelos corpos e a moda das<br />

“<strong>Garotas</strong>”, imagens da emancipação feminina.<br />

ABSTRACT<br />

The fashion and the body acts as important medias of the woman with the society. For way<br />

of them, the woman establishes a dialogue with the world, reflecting its aspirations and<br />

frustrations. Being thus, this work consists of demonstrating, through the images´s study of<br />

"As <strong>Garotas</strong> do Alceu", in which way Alceu Penna contributed for the formation of a<br />

modern image of the woman, in the column, transmitting, through the bodies and the<br />

fashion of the "<strong>Garotas</strong>", images of the feminine emancipation.<br />

10


INTRODUÇÃO<br />

1- Olá, <strong>Garotas</strong>, muito prazer<br />

Seria interessante situar o leitor sobre como a coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu” cruzou<br />

o meu caminho. Entre tantos assuntos, por que eu escolhi este para ser o objeto da minha<br />

dissertação de mestrado? Não que fosse mera coincidência, mas o ilustrador Alceu de<br />

Paula Penna é meu tio-avô, irmão do meu avô paterno, Josaphat. Desde pequena, os seus<br />

desenhos estiveram presentes na minha vida, inspirando a imaginação. Era comum meu<br />

avô chegar com cópias de trabalhos do Alceu, especialmente no almoço de domingo (com<br />

uma Amandita escondida no casaco), pois sabia que eu adorava passar as tardes<br />

desenhando. Aí, uma vez munida de todas aquelas figuras, eu ia, compenetrada, tentar<br />

fazer pelo menos um parecido. Quanta presunção a minha! Por muitos anos eu não sabia,<br />

pela questão da idade, avaliar aquele trabalho como algo além de belos desenhos.<br />

Meu avô, sua irmã Thereza e meu pai, Aníbal, sempre foram grandes fontes de<br />

conhecimento do trabalho do ilustrador, pois me “abasteciam” de novos desenhos,<br />

reportagens e conhecimentos sobre ele. Sempre gostei de desenhar e apreciava as artes<br />

visuais: Alceu Penna era um “prato cheio”. Quanto mais eu conhecia o seu trabalho, mais<br />

eu o admirava e me interessava por um assunto constante em seus trabalhos: a moda.<br />

Além da influência do meu tio-avô, tive uma ajuda da minha mãe, Patrícia Ordones,<br />

para tomar gosto por moda, pois ela trabalhou, durante um bom tempo, como jornalista<br />

nessa área no Jornal de Casa 1 e no Jornal de Shopping 2 em Belo Horizonte.<br />

Curioso que, a despeito do meu interesse pelo assunto, optei, na ocasião do<br />

vestibular, por Publicidade e Propaganda na PUC-MG. Planejava trabalhar com Design<br />

1<br />

Publicação do Diário do Comércio que circula, até hoje, semanalmente, direcionada ao público feminino.<br />

2<br />

Publicação dos Diários Associados já extinta.<br />

11


Gráfico e Direção de Arte e acabei fazendo muitos estágios na área. Completei a<br />

graduação, mas já no sexto período (mais da metade do curso) eu sabia que não queria<br />

trabalhar como publicitária. Na ocasião, fiz uma reavaliação de interesses e decidi que era<br />

hora de me voltar para a moda, que sempre permeou a minha vida, de uma forma ou de<br />

outra.<br />

Meu trabalho de conclusão de curso não podia ter seguido outro direcionamento.<br />

Meu grupo apresentou um projeto experimental um estudo de site para a marca mineira de<br />

roupas Elvira Matilde, que explorava mecanismos para venda de vestuário pela internet. 3<br />

Foi a minha primeira experiência acadêmica com a moda e aquilo me instigou a buscar um<br />

mestrado.<br />

Há algum tempo, eu me interessava em estudar a obra de Alceu Penna,<br />

principalmente, porque minha tia-avó Thereza sempre manifestou o desejo em dar<br />

continuidade à sua memória de alguma maneira. A pesquisa do mestrado foi uma<br />

oportunidade de concretizar esses objetivos, algo que acabou por me aproximar ainda mais<br />

da moda.<br />

Essa dissertação, posso dizer, é uma concretização de um sonho, há muito tempo<br />

almejado, em contribuir para o resgate do traço e importância do meu tio-avô, um homem,<br />

a meu ver, à frente de seu tempo.<br />

3 http://www.elviramatilde.com.br/<br />

12


2- As <strong>Garotas</strong>: muitas mulheres em uma representação<br />

Não sei quantas almas tenho. Cada momento mudei.<br />

Continuamente me estranho. Nunca me vi nem achei. De tanto ser,<br />

só tenho alma. Quem tem alma não tem calma. Quem vê é só o que<br />

vê. Quem sente não é quem é. Atento ao que sou e vejo, torno-me<br />

eles e não eu. Cada meu sonho ou desejo. É do que nasce e não<br />

meu. Sou minha própria paisagem, assisto à minha passagem,<br />

diverso, móbil e só. Não sei sentir-me onde estou , por isso, alheio,<br />

vou lendo, como páginas, meu ser (...). 4<br />

Nos últimos anos, têm-se ampliado os estudos sobre a história da moda brasileira,<br />

em especial, sobre um personagem importante nessa narrativa: Alceu Penna. No decorrer<br />

da minha pesquisa, percebi esforços variados, principalmente desde a década de 1990, no<br />

campo de trabalhos acadêmicos como os de Ruth Joffily 5 , Maria Claudia Bonadio 6 , Carla<br />

Bassanezzi e Leslye Bombonatto Ursini 7 e Marina Bruno Santo Anastácio 8 .<br />

Outra iniciativa que resgatou a memória do ilustrador foi o Projeto Figurino: Alceu<br />

Penna, desenvolvido no <strong>Senac</strong>-SP, do qual participei colaborando com a pesquisa histórica,<br />

que contribuiu para a sua memória instigando alunos e professores. 9 O projeto visou a<br />

familiarizar os alunos de graduação com a obra do ilustrador e a reprodução de looks de<br />

alguns de seus modelos. Nesse sentido, as alunas realizaram estudos sobre modelagem da<br />

época, percebendo os significados da moda e do corpo para as mulheres que eram jovens<br />

no período.<br />

4 PESSOA, Fernando. Não sei quantas almas tenho. Disponível em:<br />

http://users.isr.ist.utl.pt/~cfb/VdS/v096.txt. Acessado em 19 de junho de 2007.<br />

5 JOFFILY, Ruth. Jornalismo de Moda. Jornalismo feminino e a obra de Alceu Penna. Dissertação de<br />

mestrado apresentada ao departamento de Comunicação da UFRJ, 2002.<br />

6 BONADIO, Maria Claudia. O fio sintético é um show! Moda, política e publicidade Rhodia S/A. 1960-<br />

1970. Tese de Doutorado. Campinas, 2005<br />

7 BASSANEZI, Carla. URSINI, Bombonatto Leslye. O Cruzeiro e As <strong>Garotas</strong>. In: Cadernos Pagu. Núcleo<br />

de Estudos de gênero. Unicamp, 1995<br />

8 ANASTÁCIO, Marina Bruno Santo. <strong>Garotas</strong> do Alceu: moda feminina brasileira nas páginas de “O<br />

Cruzeiro” entre 1938 e 1958. Monografia, UFRJ, Rio de Janeiro, 2003.<br />

9 O Projeto Figurino teve a coordenação geral da Profa Dra Maria Claudia Bonadio e das atividades de<br />

modelagem pela Profa Daniela Nunes Figueira. Esse núcleo de pesquisa resultou a exposição “O Brasil na<br />

ponta do lápis: Alceu Penna, modas e figurinos” no Centro Universitários <strong>Senac</strong>-SP em maio de 2007.<br />

13


Verifiquei que Alceu Penna é explorado em crônicas e textos não acadêmicos<br />

também. Alguns dos autores que trabalham nesse sentido são Joaquim Ferreira dos<br />

Santos 10 , Alberto Vilas 11 e Gonçalo Junior 12 , que lançam informações sobre a<br />

representatividade do seu trabalho no cenário brasileiro. Eles enfocam, sobretudo, a coluna<br />

“As <strong>Garotas</strong>”, o trabalho mais conhecido do ilustrador.<br />

O conjunto de sua obra traz informações importantes sobre a história brasileira, em<br />

especial das mulheres, assim como a imprensa nacional, moda, arte, entre outros,<br />

necessitando, portanto, de uma dedicação maior por parte dos estudiosos. Dessa maneira,<br />

essa dissertação integra os esforços em ampliar as reflexões sobre a sua produção, em<br />

especial, “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”.<br />

Na coluna, o corpo e a moda ocupam posição de destaque, tanto que a maioria dos<br />

autores citados neste trabalho que a abordam, tangenciam esses assuntos, de uma maneira<br />

ou de outra. Entretanto, mesmo com as valorosas iniciativas, existe uma necessidade de<br />

estudo maior sobre eles na coluna “As <strong>Garotas</strong>”, objetivo que procurei perseguir nesse<br />

trabalho.<br />

Na ocasião da elaboração do meu anteprojeto, a obra “Alceu Penna e as <strong>Garotas</strong> do<br />

Brasil: moda e imprensa 1933/1980”, de Gonçalo Junior, foi um começo para mim, pois<br />

além de fazer um mapeamento da carreira do ilustrador ele tratava, brevemente, da<br />

contribuição das “<strong>Garotas</strong>” para o cenário feminino, colocando-as como um exemplo de<br />

futura emancipação.<br />

Instigada por ela, pesquisei alguns desenhos dele que tinha em casa e confirmei que<br />

a mulher era retratada diferencialmente na coluna, principalmente para os padrões morais<br />

vigentes. Isso me chamou a atenção e me interessou, pois, apesar de ser quase um consenso<br />

10<br />

SANTOS, Joaquim Ferreira dos. Feliz 1958: o ano que não devia terminar. Rio de Janeiro: Record, 2003<br />

11<br />

VILLAS, Alberto. O mundo acabou. São Paulo: Globo, 2006<br />

12<br />

JUNIOR, Gonçalo. Alceu Penna e as garotas do Brasil: moda e imprensa 1933/1980. São Paulo: Clube<br />

dos Quadrinhos, 2004.<br />

14


que elas eram muito avançadas para a época, seria uma oportunidade de aprofundar essa<br />

reflexão.<br />

Os estudos imagéticos, juntamente com o auxílio dos textos da coluna, me<br />

pareceram bons mecanismos para estudá-la, pois era pela visualidade da coluna (cores,<br />

formas, composição, etc.) e pelos textos maliciosos que a figura feminina ousada se<br />

destacava. O corpo e a moda das “<strong>Garotas</strong>”, juntamente com todos os recursos visuais<br />

empregados, trabalhavam juntos para comunicar uma mulher em processo de transição.<br />

Em linhas gerais, este trabalho consiste em demonstrar, por meio do estudo da<br />

coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”, como Alceu Penna contribuiu para a construção de uma<br />

imagem moderna da mulher 13 , mostrando nos corpos e na moda das “<strong>Garotas</strong>” “imagens<br />

da emancipação feminina” 14 .<br />

13 Mulher moderna: compreendo como uma mulher que, apesar de compartilhar de elementos tradicionais<br />

relativos ao seu papel como mãe e esposa, por exemplo, consegue ir além deles, permitindo-se ter outras<br />

aspirações, como uma profissão, uma vida ligada mais aos prazeres que aos compromissos de um lar, ter<br />

vários relacionamentos ao mesmo tempo, enfim, experimentar papéis menos tradicionais, gozando, assim, de<br />

maior liberdade. O conceito de mulher moderna será trabalhado com maiores detalhes no capítulo 3.<br />

14 Entendo como imagens da emancipação feminina um estágio em que a mulher ainda não se libertou<br />

completamente das amarras da sociedade patriarcal, mas demonstra que já está caminhando para isso.<br />

15


3- Estruturação dos capítulos e corpus documental<br />

O primeiro capítulo, “<strong>Garotas</strong> cariocas e jovens: uma nova perspectiva”, traz<br />

elementos do contexto mostrado pelas “<strong>Garotas</strong>”. Na parte inicial, procurou-se apresentar e<br />

analisar imagens e textos presentes na coluna caracterizando as ilustrações pelo seu estilo<br />

de vida, o grupo social, os costumes e preferências. Esse enfoque é relevante, pois<br />

confirma as imagens propagadas na coluna, auxiliando no entendimento do contexto e das<br />

ilustrações como figuras femininas cariocas. Na segunda parte do capítulo, trato das<br />

“<strong>Garotas</strong>” como jovens, uma categoria etária que começava a se definir no cenário<br />

brasileiro nos anos 1950. Nele procuro identificá-las como pertencentes a esse grupo, que<br />

tinha vestuário, linguagem, hábitos e preferências particulares e que, naquele momento,<br />

buscava uma identidade própria.<br />

O segundo capítulo, “Uma revista em especial: O Cruzeiro das ‘<strong>Garotas</strong>’”, trata,<br />

inicialmente, do império brasileiro das comunicações daquele período, os Diários<br />

Associados, discorrendo sobre a sua história, importância no cenário da imprensa do<br />

Brasil, bem como, de forma breve, os periódicos e propriedades do grupo, em especial as<br />

revistas O Cruzeiro e A Cigarra. Em um segundo momento, é abordado somente O<br />

Cruzeiro, trazendo elementos como a sua história, características, público-alvo e conteúdo,<br />

evidenciado o seu papel como um marco no formato de revistas. O trabalho de Alceu<br />

Penna para a publicação é colocado em evidência, bem como a sua importância. Por fim, a<br />

coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu” é estudada com maior dedicação, sendo investigadas as<br />

principais características, os respectivos redatores envolvidos, bem como o período de<br />

vigência de cada um.<br />

O terceiro capítulo, “O corpo e a moda das ‘<strong>Garotas</strong> do Alceu’: um espelho do<br />

amanhã”, aborda inicialmente o corpo e a moda como meios de comunicação da mulher na<br />

16


sociedade. A maneira com que a mulher contemporânea à coluna se relacionava com eles é<br />

analisada, indicando-se, comparativamente, como era essa relação para “As <strong>Garotas</strong>”,<br />

perpassando temas como a cultura física e os comportamentos. Na segunda parte é<br />

trabalhado o conceito de mulher moderna veiculado pelos meios de comunicação,<br />

especialmente em O Cruzeiro. Nesse sentido é explorado até que ponto o perfil feminino<br />

das “<strong>Garotas</strong>” vai ao encontro desse ideal e de que maneira eles se separam.<br />

No quarto capítulo, “’<strong>Garotas</strong>’... algo a ser indefinido”, é analisada a questão do<br />

ilustrador, um homem que desenhou mulheres, enfocando a produção e interpretação da<br />

imagem como um modo particular de o indivíduo ver o mundo e absorver o contexto em<br />

que está inserido. Na segunda parte, a forte ligação entre as imagens, os textos e o humor<br />

será abordada. Por fim, será feita uma análise de imagens da coluna, juntamente com o<br />

auxílio dos textos, salientando os dois lados contraditórios das “<strong>Garotas</strong>”: ousado e<br />

recatado<br />

***<br />

Atualmente, os acervos mais completos disponíveis sobre O Cruzeiro e a coluna<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu” são: o jornal Estado de Minas, em Belo Horizonte, e a Biblioteca<br />

Mário de Andrade, em São Paulo 15 . Optei pelo acervo do Estado de Minas, pois, além de<br />

resguardar a coleção completa da revista em microfilme, o jornal também a disponibiliza<br />

em papel, devidamente encadernada e de fácil manuseio. Além disso, o arquivo tem<br />

originais conservados da coluna “<strong>Garotas</strong>”, os quais trouxeram elementos novos a respeito<br />

do processo de sua elaboração.<br />

Outra fonte de pesquisa foi o acervo de Thereza Penna. Nele existem registros<br />

sobre a carreira do ilustrador em geral, tais como capas de revistas, cadernos de desenhos,<br />

15<br />

O acervo de O Cruzeiro foi para o Estado de Minas, publicação dos Diários Associados, após a falência da<br />

revista, em 1980. O jornal foi a única publicação dos Diários Associados com dinheiro e estrutura suficientes<br />

para comprar o arquivo.<br />

17


publicidade e uma enormidade de outras referências pouco conhecidas. As conversas com<br />

Thereza foram igualmente importantes, já que ela conviveu por anos de forma próxima<br />

com seu irmão.<br />

18


4- Balizas cronológicas<br />

A coluna “As <strong>Garotas</strong>” conta ao longo de sua vigência com diversas colaborações<br />

de redatores, que auxiliaram “a dar vida” a essas figurinhas tão populares no Brasil em<br />

meados do século XX. As contribuições mais freqüentes e homogêneas, portanto, mais<br />

relevantes foram as de Alceu Penna, Accioly Netto (Lyto), Millôr Fernandes (Vão Gôgo),<br />

Edgar Alencar (A. Ladino) e Maria Luiza Castelo Branco. 16<br />

Examinando as características de cada um deles, percebe-se que, excetuando a<br />

redatora Maria Luiza, todos os outros formam um conjunto singular. Os temas e textos<br />

desse grupo são mais sensuais, maliciosos e bem-humorados e, portanto, se relacionam<br />

melhor com a imagem da mulher moderna propagada pela coluna. Esse perfil pode ser<br />

percebido, por exemplo, no texto de A. Ladino: “E ao invés das <strong>Garotas</strong> submissas,<br />

obedientes e quietinhas, como seria do nosso agrado, temos que enfrenta-las de igual para<br />

igual.” 17 .<br />

Os temas e textos da redatora Maria Luiza Castello Branco são mais monótonos e<br />

assumem um tom de conselho para as leitoras, deixando de lado a ousadia para tratar de<br />

temas mais tradicionais como o casamento. A passagem a seguir, fala de um chá de<br />

panelas, um evento preparatório para o casamento, em nada semelhante à ousadia e malícia<br />

do primeiro grupo de redatores: “Para dar uma sacudidela nas amigas a Garota resolve dar<br />

um “Chá de panelas”: cada uma das convidadas traz um utensílio para sua futura casa. ” 18<br />

16<br />

Os redatores serão estudados com mais profundidade no capítulo 02, especificamente no item sobre a<br />

coluna “<strong>Garotas</strong>”.<br />

17<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “Mas as <strong>Garotas</strong> de hoje são assim!”. Texto A. Ladino. In: O CRUZEIRO. 09 de<br />

outubro de 1948. p. 34 e 35<br />

18<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> e o chá de panela”. Texto Maria Luiza. In: O CRUZEIRO. 31 de outubro<br />

1959, p. 40-41.<br />

19


Assim, o trabalho terá um recorte cronológico feito pelos textos. O período a ser<br />

estudado vai do início da coluna em 1938, quando Alceu Penna ilustra e escreve os textos<br />

até 1957, quando Edgar Alencar (A. Ladino) finda sua colaboração.<br />

Esse período também se torna oportuno para a análise, pois, além de compartilhar<br />

de textos singulares ele caracteriza-se por transformações importantes no contexto<br />

brasileiro e na própria publicação de O Cruzeiro, os quais seriam importantes destacar.<br />

Além de ser o ano de início da coluna, 1938 torna-se um ponto de partida<br />

importante, pois antecede o conflito da Segunda Guerra Mundial e marca a crescente<br />

influência do american way of life na América Latina, principalmente pelo cinema. Esse<br />

momento vai evidenciar a transição e o convívio das influências francesas e norte-<br />

americanas no país, importante para a compreensão da coluna em geral.<br />

Além disso, é também, ocasião do Estado Novo, um período marcado pela<br />

emergência de um determinado ideal nacional. Esse tom é reproduzido na coluna,<br />

ilustrando uma figura feminina que, mesmo diante de influências estrangeiras, permanece<br />

essencialmente brasileira, cultivando hábitos característicos de um morador do Rio de<br />

Janeiro como ir às praias e aos bailes de carnaval.<br />

Sob a perspectivada publicação O Cruzeiro, a exploração da década de 1940 é<br />

igualmente preciosa, pois ela sofre uma reformulação, presenciando vendagens grandiosas.<br />

Os conteúdos femininos, incluindo a coluna “As <strong>Garotas</strong>”, ganharam uma atenção especial<br />

nessa empreitada. Essas informações levam a crer que o público leitor da revista aumentou<br />

e, consequentemente, o da coluna também, que começava a se tornar bastante conhecida.<br />

O período de análise desse trabalho se finda em 1957, pois além de ser o ano de<br />

mudança de redator, os últimos anos da seção coincidem com um período de reestruturação<br />

da imprensa e de novos veículos moda/mulher, que compartilharam de um direcionamento<br />

distinto de O Cruzeiro. A revista Manchete (1952), uma importante concorrente da<br />

20


publicação, vai introduzir um formato gráfico mais avançado, impressa em um papel de<br />

melhor qualidade e contando com uma diagramação mais cuidadosa e atraente. A revista<br />

Claudia (1961), por exemplo, coloca em pauta de forma mais aberta que na publicação das<br />

“<strong>Garotas</strong>”, temas como sexo e comportamento, sendo direcionada a uma mulher que<br />

ansiava por uma identidade em meio à explosão consumista.<br />

Em termos de contexto político-econômico, o Brasil também entra em uma nova<br />

fase, marcada pelo governo de JK, que introduzirá metas desenvolvimentistas e de abertura<br />

de mercado que alterarão o panorama do país em termos de padrões de consumo, imprensa,<br />

tecnologia, transportes entre outros.<br />

Esses fatos, juntamente com o estudo do período dos redatores citados, só<br />

acrescentam informações valiosas ao trabalho, onde o recorte pelos textos complementa as<br />

informações fornecidas pelo contexto nacional contemporâneo à coluna, auxiliando na<br />

delimitação da linha cronológica a ser seguida.<br />

21


5 - Ser Alceu Penna é... ser versátil<br />

“Impossível esquecer o impacto causado por seus desenhos:<br />

as cores, o movimento, a vivacidade e a criatividade. O balanço das<br />

saias e dos corpos de suas <strong>Garotas</strong> ou o brilho e a sensualidade<br />

esfuziante de suas fantasias para shows e bailes de carnaval. Alceu<br />

misturava, como poucos, texturas, brilhos, babados, sonhos”. (Ruy<br />

Castro. Exposição “O Brasil na ponta do lápis”: Alceu Penna,<br />

modas e figurinos) 19<br />

Alceu de Paula Penna nasceu em 1915 na cidade de Curvelo, norte de Minas<br />

Gerais. Em 1932 ele muda para o Rio de Janeiro e matricula-se na Escola Nacional de<br />

Belas Artes. O primeiro emprego que conseguiu quando chegou à capital foi no<br />

suplemento infantil de O Jornal, publicação do empresário Assis Chateaubriand. Esse<br />

emprego o levaria a conhecer Accioly Netto, inicialmente secretário de redação da revista<br />

O Cruzeiro e, mais tarde, responsável por sua reformulação, a partir da década 1940. Em<br />

Fig 01. Alceu Penna desenhando. O<br />

ilustrador não costumava trabalhar fora<br />

de casa. Apreciava a companhia de sua<br />

irmã Thereza e o conforto da sua sala de<br />

estar. Sem data.<br />

1933, após esse contato, Alceu Penna dá início a<br />

um longo período de colaborações para a revista,<br />

incluindo editoriais de moda, capas e ilustrações de<br />

contos.<br />

Em 1936, fruto de uma indicação de<br />

Accioly Netto, que viria a se tornar um grande<br />

amigo, Alceu Penna inicia trabalhos para os mais<br />

diversos cassinos da época, contribuindo com os<br />

figurinos, cenários e cardápios:<br />

19<br />

CASTRO, Ruy. Texto de abertura da exposição “O Brasil na ponta do lápis: Alceu Penna, modas e<br />

figurinos”. Centro Universitário <strong>Senac</strong>-SP. Maio 2007<br />

22


Alceu Penna desenhou diversos croquis<br />

para cassinos e shows, que encantavam<br />

pela mistura inusitada de cores e formas.<br />

Fig.02 a. Figurino inspirado na ópera<br />

Carmem. Sem data.<br />

Fig 02 b. Figurino Bolero. Sem data.<br />

“Até o fechamento das luxuosas casas de jogo pelo<br />

Presidente Eurico Gaspar Dutra, em 1946, ele trabalha em<br />

todos os cassinos mais famosos do Rio. Além da Urca, atua<br />

regularmente no Copacabana, no Icaraí e no Atlântico.” 20<br />

O carnaval estava, desde o início, presente na<br />

sua trajetória e era um tema popular nas páginas da<br />

revista O Cruzeiro. Ele venceu concursos da Prefeitura<br />

do Rio de Janeiro em 1935, referentes às categorias de<br />

corso, baile e rua. Em 1936 foi a vez de Alceu<br />

Penna concorrer no Palace Hotel, quando se consagrou<br />

o grande destaque dos dois concursos: “Como no<br />

concurso de 1935, coube a maioria dos prêmios, ao<br />

jovem desenhista mineiro Alceu de Paula Penna, que<br />

levantou cinco das nove colocações (...).” 21 Mais tarde,<br />

em 1974, vai assinar as fantasias do bloco Canários das<br />

Laranjeiras, no Rio de Janeiro.<br />

Alceu Penna assinou inúmeras ilustrações de<br />

sugestões para fantasias em O Cruzeiro, Globo Juvenil<br />

(periódico de quadrinhos) e na Cigarra (publicação<br />

feminina), que eram ansiosamente aguardadas:<br />

20<br />

JUNIOR, Gonçalo. Alceu Penna e as garotas do Brasil: moda e imprensa 1933/1980. São Paulo: Clube<br />

dos Quadrinhos, 2004, p. 40.<br />

21<br />

“O Concurso da A.A.B”. In: Revista O Cruzeiro. 15 de fevereiro, 1936, p.37.<br />

23


As fantasias de carnaval criadas para O<br />

Cruzeiro eram muito aguardadas pelas<br />

leitoras, que corriam com eles para a<br />

costureira. A variedade de modelos era<br />

impressionante.<br />

Fig. 03 a e 03 b. “Cada terra tem seu<br />

uso”. Sugestão de fantasias de Alceu<br />

Penna, para O Cruzeiro. 04 de fevereiro<br />

de 1939.<br />

“Produzia desenhos que atendiam aos variados tipos<br />

femininos que compunham seu público: desde as mais<br />

modestas, com fantasias menos luxuosas ou modelos<br />

improvisados para o carnaval de rua, até as mais abastadas,<br />

com sugestões sofisticadas para os bailes de gala.” 22<br />

Alceu Penna se aproximou também das histórias<br />

em quadrinhos, sendo um dos pioneiros no Brasil, já que<br />

não havia muitos quadrinistas nacionais. Entre 1937 e<br />

1938 ilustrou para O Globo Juvenil, propriedade do<br />

empresário Roberto Marinho, adaptações de obras como<br />

O Fantasma de Canterville, de Oscar Wilde, juntamente<br />

com Nelson Rodrigues, além de Rei Arthur, Alice no<br />

País das Maravilhas, entre outros.<br />

Em 1938 começa a desenvolver a coluna “As<br />

<strong>Garotas</strong> do Alceu” em O Cruzeiro, a qual duraria até<br />

1964. Ela foi inspirada nas “Gibson Girls”, de Charles<br />

Dana Gibson, autor de desenhos de lindas e glamourosas<br />

mulheres. A coluna apresentava, semanalmente, uma<br />

diversidade de ousadas jovens, acompanhada de textos<br />

bem-humorados. Tomando como inspiração a mulher,<br />

bem como os modismos cariocas, Alceu Penna criou um<br />

22 ANASTÁCIO, Marina Bruno Santo. <strong>Garotas</strong> do Alceu: moda feminina brasileira nas páginas de “O<br />

Cruzeiro” entre 1938 e 1958. Monografia, UFRJ, Rio de Janeiro, 2003, p.5.<br />

24


universo de inspiradoras beldades. “Pelas páginas de O Cruzeiro, o país botou na cabeça<br />

que, além de metrópole e centro gerador de cultura, hábitos e modismos, o Rio tem<br />

O ilustrador nas suas temporadas<br />

no exterior trazia as novidades em<br />

moda, de forma adaptada para as<br />

leitoras de O Cruzeiro.<br />

Fig.04 a. Croqui de modelo do<br />

costureiro Balenciaga, Sem data.<br />

também as mulheres mais bonitas.” 23<br />

A coluna ilustrada levou milhares de leitores a<br />

copiarem a moda, os gestos, penteados e até mesmo a<br />

maquiagem das “<strong>Garotas</strong>”:<br />

“(...) elas parecem ter adquirido vida própria. Seus vestidos e<br />

penteados foram copiados, suas poses e atitudes chegaram a<br />

serem imitadas. Saíram das páginas da revista e foram parar<br />

nos “cadernos de recordação”, corte e costura e economia<br />

doméstica de algumas meninas ou nos sonhos e expectativas<br />

afetivas de certos rapazes. Assim, pode-se dizer que os<br />

desenhos de Alceu Penna propagaram modos e modas”. 24<br />

Em 1939 ele viaja para Nova Iorque como<br />

correspondente para O Cruzeiro na Feira Mundial 25 . Sua<br />

intenção, além de conhecer o país, é investigar o<br />

mercado editorial norte-americano. Ele tenta publicar nos<br />

EUA e, apesar de falar muito bem a língua inglesa,<br />

verifica que a barreira do idioma lhe coloca em<br />

desvantagem.<br />

Fig.04 b. Croqui de um modelo do<br />

costureiro Fath. Sem data. Durante a sua temporada no exterior ele se<br />

compromete a enviar regularmente material para a coluna “<strong>Garotas</strong>” e, também, sobre<br />

Carmen Miranda que, na ocasião, excursionava pelas terras norte-americanas. Segundo<br />

23 JUNIOR, Gonçalo. Op cit, p. 14.<br />

24 BASSANEZI, Carla. URSINI, Bombonatto Leslye. O Cruzeiro e As <strong>Garotas</strong>. In: Cadernos Pagu. Núcleo<br />

de Estudos de gênero. Unicamp, 1995, p. 247.<br />

25 Uma das atrações da Feira de Nova Iorque era o pavilhão brasileiro chamado “Café do Brasil”. Alguns<br />

arquitetos como Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, contemporâneos de Alceu Penna na Escola de Arquitetura,<br />

estavam participando do projeto na ocasião. Esse pavilhão evidenciava o poder de atuação da “política de boa<br />

vizinhança” dos EUA para com a América Latina, buscando estreitar as relações entre os países.<br />

25


O ilustrador demonstrou a sua<br />

versatilidade ao criar diversos<br />

anúncios como esse, para o famoso<br />

sabão Sulfuroso. A bela figura<br />

feminina ousada é explorada pelo<br />

proficional até nos anúncios.<br />

Fig. 05. Cartaz de Alceu Penna para o<br />

sabão Sulfuroso. Sem data.<br />

Thereza Penna o ilustrador trabalhou como consultor<br />

informal das fantasias da atriz e cantora, sua conhecida<br />

desde os tempos dos cassinos (informação oral julho<br />

2007).<br />

Uma nova etapa surge em sua carreira quando<br />

Walt Disney (1901-1966) visita o Brasil em 1941.<br />

Nesse período há um esforço de aproximação dos EUA<br />

com os países sul-americanos, fruto da política de “boa<br />

vizinhança”. Um dos objetivos do empresário é<br />

divulgar o filme de animação Fantasia. Inspirado pela<br />

viagem, Disney decide criar o personagem Zé Carioca.<br />

Segundo Gonçalo Junior, Alceu Penna é chamado pelo<br />

Itamaraty, provavelmente em virtude da sua experiência internacional, para acompanhá-lo<br />

na sua visita. Disney se impressiona com o talento de Alceu Penna e o contato rende ao<br />

ilustrador um convite para trabalhar nos estúdios do norte-americano. Para a surpresa de<br />

todos, Alceu Penna prefere ficar no Brasil, onde já era reconhecido, pois no exterior<br />

concluiu que seria “mais um na multidão”.<br />

Alceu Penna também emprestou seu talento para a publicidade: cigarros Odalisca<br />

(1938), Casa Levy (1938), Melhoral (1947), Glostora (1947) (uma brilhantina para os<br />

cabelos), o sabão Sulfuroso, embalagens para o Café Globo, fraldas infantis. Além disso,<br />

ele desenvolveu um estudo de uniformes para a Shell e algumas lanchonetes.<br />

26


Outros trabalhos se destacam, como os desenhos para o livro de partituras O Sapo<br />

Dourado (1934), de Hekel Tavares, além de O Palhacinho Quebrado, de Murilo Araújo<br />

(1945). Na coleção Disquinho, da gravadora Continental, ele ilustrou Chapeuzinho<br />

Vermelho (1959) e A Cigarra e a Formiga (1959).<br />

Alceu Penna e Erté possuíam um estilo dinâmico de ilustração. O<br />

movimento era um fator central, assim como a composição de cores.<br />

Nos primeiros anos de carreira o ilustrador parecia se inspirar nos<br />

desenhos de J Carlos, sendo um grande admirador de seu trabalho.<br />

Coluna direita: Fig. 06 a. 06 b. Croquis de Alceu Penna para shows<br />

ou cassinos. Sem data<br />

Coluna esquerda: Fig. 07 a. Capa livro “J Carlos: Época, vida e obra”<br />

de Álvaro Cotrim (Alvarus). Fig. 07 b. Ilustração de Erté “Alphabet<br />

Cloak”. Sem data.<br />

presentes na sua estante.<br />

As seções de moda da<br />

revista Cigarra – Suplemento<br />

Feminino e de O Cruzeiro –<br />

Portifólio Modas foram marcos na<br />

carreira do ilustrador, trazendo as<br />

principais novidades em moda<br />

internacionais, devidamente<br />

adaptadas ao país, além de propor<br />

inúmeros figurinos para as<br />

populares festas de carnaval e<br />

junina.<br />

Em pesquisa ao acervo de<br />

Thereza Penna, irmã do ilustrador,<br />

em junho de 2006, pude constatar<br />

na sua biblioteca livros que eram<br />

constantemente utilizados por ele.<br />

Dessa forma, algumas referências<br />

em desenho ficaram mais claras,<br />

como Erté (1892-1990) e J. Carlos<br />

(1884-1950), alguns dos nomes<br />

27


Após essa observação, ficou clara a influência de Erté e J. Carlos nos desenhos do<br />

As capas da Tricô e Crochê<br />

contavam com a ajuda de<br />

Mercedes Penna, mãe do<br />

ilustrador que tecia tramas<br />

diferentes para dar vida à capa.<br />

Os calendários Santistas de tão<br />

sensuais eram frequentemente<br />

censurados.<br />

Fig.09 a. Capa revista Tricô e<br />

Crochê. Exemplar pertencente à<br />

Mercedes Penna, mãe de Alceu.<br />

Sem data.<br />

Fig. 09 b. Ilustração Calendário<br />

Santista. 1945-46<br />

ilustrador, mais precisamente, no início de sua carreira,<br />

na década de 1930, e, também, nos croquis para shows e<br />

cassinos. A forma do rosto arredondada, as sobrancelhas<br />

finas, os olhos ligeiramente puxados e a boca pequena<br />

são características comuns em ambos os ilustradores e<br />

detectadas nos desenhos de Alceu Penna. Os seus croquis<br />

de shows e cassinos, assim como as ilustrações de Erté,<br />

mostram roupas pomposas, em cores fortes e<br />

contrastantes, que enfatizam o movimento.<br />

Naturalmente, o traço do profissional se modificaria ao<br />

longo de sua carreira, recebendo outras influências, tais<br />

como a norte-americana.<br />

A partir de 1945, ele inicia as ilustrações para os<br />

Calendários Santista, criados para divulgar os produtos<br />

da empresa Moinhos Santista S/A 26 . As ilustrações dos<br />

calendários eram mais sensuais e provocativas que as<br />

“<strong>Garotas</strong>” e, portanto, sofreram algumas censuras. Ele irá<br />

colaborar, também, com a revista Tricô e Crochê (1946-<br />

52), publicação de trabalhos manuais femininos<br />

pertencente à mesma empresa. Segundo Thereza Penna,<br />

a sua mãe, Mercedes, auxiliava na produção das capas ao fazer tricôs para as ilustrações,<br />

de forma a deixá-las com texturas mais reais (informação oral extraída em junho, 2006).<br />

26<br />

Inicialmente, em 1905, é uma empresa de moagem de trigo e fabricação de derivados na cidade de Santos,<br />

SP. Posteriormente ela ampliou suas atividades para o setor de alimentos, passando também para a área têxtil,<br />

minero-químico, seguro, imobiliário, comércio exterior e transporte.<br />

28


Já na década de 1950, devido ao fechamento dos cassinos, Alceu Penna desenvolve<br />

figurinos para o teatro e shows como a peça Escândalos (1950), com Bibi Ferreira, e Quem<br />

roubou meu samba (1953), de Silveira Sampaio, no Hotel Glória.<br />

Alceu Penna, segundo sua irmã Thereza, não gostava de ser denominado estilista<br />

(informação oral extraída em fevereiro de 2006). Esse lado, entretanto, ficou muito<br />

evidente quando iniciou a participação nos shows-desfiles da multinacional francesa<br />

Rhodia S/A, assinando figurinos, juntamente com outros talentos, como o costureiro Dener<br />

Pamplona e Guilherme Guimarães. 27<br />

Foi nesse momento que sua ligação com São Paulo se estreita, levando-o a viagens<br />

constantes à cidade. Cyro Del Nero lembra as particularidades de suas visitas a trabalho:<br />

“Meu amigo querido Alceu Penna era um homem de hábitos.<br />

Quando vinha à São Paulo ficava sempre no mesmo hotel e no mesmo<br />

apartamento, por causa da cama que tinha um colchão aprovado por ele.<br />

O hotel era na Praça da Bandeira e para ir para a Standard Propaganda<br />

nos encontrar – na Praça Roosevelt – ele subia a Ladeira da Memória e<br />

seguia pela Consolação.” 28<br />

Em 1972 Alceu Penna desenha figurinos para o show Brazil Export, dirigido por<br />

Abelardo Figueiredo no Canecão, uma casa de shows famosa no Rio de Janeiro. Em 1973<br />

assina a coleção de verão da Fios Pessina e, em 1974, a coleção da Ducal Jeans/Madras,<br />

intitulada Golden Years. Nesse mesmo ano, inicia a sua colaboração com a revista<br />

Manequim, da Editora Abril, em que assina artigos sobre noivas e carnaval.<br />

27 A Rhodia estava presente no país desde 1919, porém, foi só a partir de 1955 que dá início à fabricação do<br />

fio sintético: “Em 1960, a empresa francesa implementa no país uma política de publicidade calcada na<br />

produção de editoriais de moda para revistas e de desfiles, os quais conjugavam elementos da cultura<br />

nacional (música, arte e pintura), a fim de associar o produto da multinacional à criação de uma ‘moda<br />

brasileira’”. In: BONADIO, Maria Claudia. O fio sintético é um show! Moda, política e publicidade Rhodia<br />

S/A. 1960-1970. Tese de Doutorado. Campinas, 2005, p. 10.<br />

28 TOLEDO. Marina Sartori de. A teatralização da moda brasileira: Os desfiles da Rhodia nos anos 60.<br />

Dissertação de mestrado em Artes Cênicas, ECA/USP, São Paulo, 2004, p. 24<br />

29


Fig 08 a. Figurino de Alceu<br />

Penna para Elza Soares. Show<br />

Brazil Export, no Canecão.<br />

1972.<br />

Fig. 08 b. Croqui para o<br />

figurino da “Viúva do<br />

Palhaço” do show da Rhodia<br />

Stravaganza. 1969.<br />

Segundo Thereza Penna, a partir da segunda metade da<br />

década de 1970, o ilustrador diminui o ritmo das atividades<br />

profissionais, em razão de problemas de pressão. Seu traço já<br />

não tem a mesma firmeza, em virtude dos fortes medicamentos<br />

que é obrigado a tomar (informação oral, extraída em junho<br />

2006). Ela acompanhou, firme e cuidadosa, os últimos dias de<br />

seu irmão. Em 13 de janeiro de 1980, Alceu Penna morre<br />

vítima de problemas circulatórios no Rio de Janeiro.<br />

O ilustrador foi um dos pioneiros do desenho de moda<br />

no Brasil e, também, da orientação de moda nos tempos dos<br />

editoriais de O Cruzeiro, Cigarra e outras. Seu traço, atual até<br />

hoje, ensina muito sobre os percursos da história da moda e da<br />

imprensa nacionais.<br />

30


1. CAPÍTULO. “GAROTAS” CARIOCAS E JOVENS: UMA NOVA<br />

PERSPECTIVA<br />

1.1 “<strong>Garotas</strong> maravilhosas”: Rio de janeiro 1938 -1957<br />

Este capítulo descreve e analisa o contexto em que se insere a coluna “As <strong>Garotas</strong><br />

do Alceu” – o Rio de Janeiro – procurando conectar as ilustrações a esse cenário no<br />

período de sua vigência. Serão observados nas ilustrações elementos, tais como o estilo de<br />

As <strong>Garotas</strong> podem ser consideradas uma das primeiras musas da Cidade<br />

Maravilhosa. Refletindo os hábitos cariocas, como ir à praia, elas davam o<br />

que falar.<br />

Fig 11. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> em Copacabana. 04 de<br />

janeiro de 1941. Texto Lyto.<br />

vida, o grupo social a que<br />

indicam pertencer, os seus<br />

gostos e costumes. 29<br />

A cidade havia se<br />

tornado o centro e modelo<br />

cultural para todo o Brasil,<br />

desde a chegada da Corte<br />

Real Portuguesa, em 1808,<br />

emergindo como cidade<br />

moderna moldada pelos<br />

padrões europeus de civilidade, que se prolongam ao longo da primeira metade do século<br />

XX 30 : “O Rio passa a editar não só as novas modas e comportamentos, mas acima de tudo<br />

os sistemas de valores, o modo de vida, a sensibilidade, o estado de espírito e as<br />

29 Entende-se por estilo de vida “(...) um conjunto unitário de preferências distintas que exprimem, na lógica<br />

específica de cada subespaço simbólico (mobília, vestimenta, linguagem ou héxis corporal) a mesma<br />

intenção expressiva (...)”. Assim, é pelas preferências de cada conjunto, não coincidentes com as de outros,<br />

que se define a imagem ou identificação de um estilo de vida. “As <strong>Garotas</strong>” tinham algumas preferências<br />

distintas de outras meninas, reveladas pelas roupas, linguagem, corpo, demarcando um estilo de vida à parte.<br />

BOURDIEU, Pierre. In: ORTIZ, Renato. A sociedade de Pierre Bourdieu. São Paulo, 2003, p.74.<br />

30 Sobre o assunto ver: RAINHO, Maria do Carmo Teixeira. A cidade e a moda: novas pretensões, novas<br />

distinções: Rio de Janeiro, século XIX. Brasília: Ed. UnB, 2002 e NEEDELL, Jeffrey D. Belle Époque<br />

tropical: sociedade e cultura de elite no Rio de Janeiro na virada do século. São Paulo: Companhia das<br />

Letras, 1993.<br />

31


disposições pulsionais que articulam a modernidade como experiência existencial e<br />

íntima.” 31<br />

Apesar de a revista O Cruzeiro circular nacionalmente, Alceu Penna desenhou suas<br />

“<strong>Garotas</strong>” como cariocas, inspirando-se na cidade e no estilo de vida dos seus habitantes.<br />

Analisando a coluna, percebe-se que, entre os muitos programas sociais, elas gostavam de<br />

ir à praia, tomar um lanche na Confeitaria Colombo e curtir as noites no Teatro Municipal,<br />

ou seja, típicos programas cariocas.<br />

Esse era o modelo difundido pelas ilustrações e textos:<br />

“O Cruzeiro, em seus primeiros anos, ao fazer circular imagens<br />

do Brasil em suas páginas e pretendendo ser um veículo integrador do<br />

território nacional, acabou por levar consigo os costumes da gente do Rio<br />

de Janeiro que era, na época, o portão de entrada para o Brasil e onde as<br />

novidades chegavam primeiro. O Rio é então apresentado por O Cruzeiro<br />

como modelo e índice de desenvolvimento para um país inteiro.” 32<br />

A coluna “As <strong>Garotas</strong>” surgiu em pleno Estado Novo (1937-1945). As bases do<br />

governo totalitário foram geradas antes, na Revolução de 1930. O projeto modernizador foi<br />

marcado pelo fortalecimento do Estado e conseqüente centralização do poder, conquistada<br />

através de uma linha intervencionista: “A intervenção do Estado tendia a ser mais intensa<br />

no setor da indústria básica. O Estado era, na verdade, um agente de industrialização.” 33<br />

Assim, o presidente implantou uma política nacionalista que, segundo Edgar<br />

Carone, estava focada na valorização do produto brasileiro, rejeitando a influência<br />

estrangeira que ameaçava a soberania do país: “Nacionalismo significa restrição à<br />

iniciativa estrangeira tanto política quanto econômica (...). No entanto, sendo representante<br />

31 SEVCENKO, Nicolau. A Capital irradiante: técnica, ritmos e ritos do Rio. In: SEVCENKO, Nicolau.<br />

História da vida privada volume 03. São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 522.<br />

32 URSINI, Leslye Bombonatto. A revista O Cruzeiro na virada da década de 1930. Dissertação mestrado.<br />

Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 2000, p. 52.<br />

33 TOTA, Antônio Pedro. Estado Novo. São Paulo: Brasiliense, 1987, p. 26.<br />

32


de uma tendência geral, o fato se traduz numa ameaça ao capitalismo estrangeiro e<br />

representa barragem à sua maior expansão.” 34<br />

O nacionalismo econômico-político se expandiu para o setor cultural 35 : “A questão<br />

da cultura passa a ser concebida em termos de organização política, ou seja, o Estado cria<br />

aparatos culturais próprios, destinados a produzir e a difundir sua concepção de mundo<br />

para o conjunto da sociedade.” 36<br />

Nesse sentido será buscada a construção de um ideal nacional programado através<br />

das elites intelectuais 37 : “Na verdade não existe uma única identidade, mas uma história da<br />

‘ideologia da cultura brasileira’ que varia ao longo dos anos e segundo interesses políticos<br />

dos grupos que a elaboraram.” 38<br />

O samba viverá, a partir dos anos 1930, uma fase de difusão em escala nunca antes<br />

vista, ao lado do carnaval, contando com o rádio para a sua ampla divulgação. 39 Ele passa<br />

a ser um dos símbolos mais marcantes da cultura brasileira, ou seja, do que se pretendia ser<br />

34<br />

CARONE, Edgar. O Estado Novo (1937-1945). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1988, p. 72.<br />

35<br />

O governo, na tentativa de promover uma cultura brasileira apropriada, lançou mão de recursos como as<br />

datas comemorativas, buscando a legitimidade e envolvimento da população nesse projeto. Getúlio Vargas<br />

criou, por exemplo, o “Dia da Música Popular” em 4 de janeiro de 1939, tornando-se admirado no meio<br />

artístico, apesar da ditadura: “Era de novo a ditadura escarrada, agora sob o nome de Estado Novo, e seria<br />

natural que muitos artistas se pusessem contra ele. Mas, pelas leis que passara beneficiando a música popular,<br />

o teatro, o cinema, o rádio, os cassinos, Getúlio parecia ter crédito ilimitado junto à categoria.” In: CASTRO,<br />

Ruy. Carmen: uma biografia. São Paulo: Cia das Letras, 2005, p.175.<br />

36<br />

VELLOSO, Mônica Pimenta. In: OLIVEIRA, Lucia Lippi; VELLOSO, Mônica Pimenta; GOMES, Ângela<br />

Maria de Castro. Estado novo: ideologia e poder. Rio de Janeiro: Zahar, 1982, p.72.<br />

37<br />

As elites foram encarregadas da manipulação de todo o conteúdo que se pretendia nacional: “(...) O Estado<br />

Novo assumiu posturas marcadamente elitistas, empenhando-se na elevação da nação brasileira a ‘um<br />

patamar de civilização’ que a colocasse ‘em pé de igualdade com as nações mais desenvolvidas do mundo”.<br />

In: VICENTE, Eduardo. A música popular sob o Estado Novo (1937-1945). Projeto de iniciação científica<br />

PIBIC/CNPq. UNICAMP, 1994, p. 6. Disponível em:<br />

http://www.multirio.rj.gov.br/seculo21/pdf/samba/estado_novo_ok.pdf. Acessado em 03 de julho de 2007.<br />

38<br />

ORTIZ, Renato. A moderna tradição brasileira: cultura brasileira e indústria cultural. São Paulo:<br />

Brasiliense, 1994, p. 183.<br />

39<br />

A radiodifusão no Brasil desenvolveu-se rapidamente depois da Revolução de 1930, vindo a superar de<br />

longe o cinema como instrumento de cultura de massa. Cobrindo todo o território nacional, sendo um<br />

instrumento especial na universalização dos gostos e costumes, dando à música popular dimensão<br />

extraordinária, em um momento que a televisão não era a realidade. In: SODRÉ, Nelson Werneck. Síntese de<br />

História da Cultura Brasileira. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1996, p.92. O rádio foi um dos pilares<br />

na difusão da ideologia do Estado Novo e sofreu ao lado de outros meios de comunicação um forte controle<br />

do DIP, o Departamento de Imprensa e Propaganda: “(...) Capanema idealiza um departamento de<br />

propaganda com o objetivo de ‘atingir todas as camadas populares’, instrumento que deveria ser um aparelho<br />

vivaz de alcance, dotado de forte poder de irradiação e infiltração, tendo por função o esclarecimento,<br />

preparo, orientação edificadas numa palavra, a cultura de massa.”. In: ORTIZ, Renato. Op cit, p.51.<br />

33


nacional. 40 O ritmo foi destacado de suas origens, aproximando-se da cultura urbana e do<br />

progresso 41 : “O samba urbano surgiu entre os compositores do Estácio, bairro proletário do<br />

centro com a zona norte, que buscavam uma batida nova, favorável ao ritmo do desfile da<br />

escola de samba. Como a marchinha, o samba alcançava os demais segmentos da<br />

sociedade pelo rádio e carnaval.” 42<br />

Será, particularmente, o samba urbano que terá presença na coluna. A seção<br />

“<strong>Garotas</strong> carnaval” em 14 de fevereiro de 1942 deixava claro o humor e duplo-sentido<br />

desse tipo de música: “A Margarida disse que só andará de automóvel e ônibus no<br />

carnaval. Mas porque? Tem medo que cantem “... tem galinha no bonde!”<br />

O samba na coluna vinha, normalmente, vinculado à festa carnavalesca. 43 “As<br />

<strong>Garotas</strong>” compartilhavam dessa experiência em ambientes da classe média e elite. “<strong>Garotas</strong><br />

de Fevereiro”, em 7 de fevereiro de 1942 apresenta as figuras em plena folia vestindo<br />

40<br />

No Brasil não havia, até então, uma fixação de gêneros musicais. A indústria fonográfica se ampliou no<br />

período, aparecendo novos intérpretes, inclusive brancos da classe média como Noel Rosa, que impulsionam<br />

e deram visibilidade ao estilo. O samba começa uma aproximação das classes mais abastadas e, naturalmente,<br />

é apropriado e modificado para adequar-se às novas demandas. In: VIANNA, Hermano. O mistério do<br />

samba. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2002. Oportunamente, de alvo de preconceito ele foi alçado a símbolo<br />

nacional. Foram criados os sambas exaltação, verdadeiros aparelhos ideológicos do Estado Novo, como<br />

Aquarela do Brasil. Ary Barroso, o compositor da música, disse que, ao criá-la, “foi sentindo toda a grandeza<br />

e opulência da nossa terra”, comprovando a capacidade de idealização do país nos versos da canção, que veio<br />

a se tornar mais popular que o próprio Hino Nacional. In: ZAN, José Roberto. Música popular brasileira,<br />

indústria cultural e identidade. In: EccoS Ver. Cient., Uninove, São Paulo (n.): 1 e v. 3: 105-122, p. 110.<br />

Certamente, nesse sentido, o Estado soube explorar a capacidade de integração e difusão de ideais contidos<br />

na música em benefício próprio.<br />

41<br />

O samba brasileiro pode ser dividido em duas primeiras fases: o antes da década de 1930 e depois desse<br />

período. O samba no início do século era praticado principalmente por comunidades negras e mestiças, que<br />

levaram consigo essa manifestação da Bahia, sua terra natal, para o Rio de Janeiro, na ocasião do fim do<br />

tráfico negreiro em 1850. Como eram festeiros, as confraternizações eram chamadas de sambas, assim como<br />

a música presente. In: SANDRONI, Carlos. Transformações no samba carioca no século XX. Disponível em:<br />

http://www.dc.mre.gov.br/brasil/textos/78a83%20Po.pdf. Acessado em 28 de setembro de 2006. Assim, o<br />

samba carioca pode ser interpretado como uma adaptação da herança escrava negra, que da Bahia migrou<br />

para o cenário carioca, sendo modificado pelo ritmo das escolas de samba. In: SODRÉ, Muniz. Samba, o<br />

dono do corpo: ensaios. Rio de Janeiro: Codecri, 1979.<br />

42<br />

COSTA, Tânia Garcia da. O “it verde amarelo” de Carmen Miranda (1930-1946).. São Paulo: Annablume;<br />

Fapesp, 2004, p. 34.<br />

43<br />

A festa carnavalesca vai estar intimamente atrelada ao samba urbano nascido no Rio de Janeiro,<br />

contribuindo para a sua difusão como símbolo nacional. In: VIANNA, Hermano. Op cit, p. 122. Antes, a<br />

festa era reprimida pela polícia com o pretexto da violência entre os blocos. Em 1932 foi totalmente<br />

regularizada, cabendo à prefeitura a sua promoção. Com o Estado Novo, o carnaval sofreu mais<br />

modificações, pelo estabelecimento de concursos entre as escolas de samba, que deveriam criar sambasenredos<br />

com temas folclóricos, literários ou biográficos. Essa era uma forma de inibir a criação de conteúdos<br />

não pertinentes e perpetuar a ideologia estado-novista. In: COSTA, Tânia Garcia da. Op cit, p.59.<br />

34


fantasias impecáveis: “Este mês é o<br />

mês do Momo e as <strong>Garotas</strong> ‘fans’<br />

da orgia meditam (sabe Deus<br />

como) na escolha da fantasia.”<br />

Em “Batucada das<br />

<strong>Garotas</strong>”, em 12 de fevereiro de<br />

1944, uma “Garota” relata um<br />

episódio ocorrido com sua amiga<br />

em que o marido desta expressou<br />

grande indignação frente à hora<br />

que ela tinha chegado da folia,<br />

entoando uma canção de carnaval:<br />

O samba e a festa carnavalesca estavam não apenas entre os<br />

símbolos nacionais promovidos pelo discurso do Estado Novo,<br />

mas também das “<strong>Garotas</strong>”, que continuarão a perpetuar a<br />

dimensão urbana adquirida por eles no período, pelos anos<br />

“Vai, vai, vai... Não pense que eu<br />

seguintes com entusiasmo.<br />

Fig 12 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> de<br />

vou chorar... Mulher igual a você<br />

fevereiro”. 07 de fevereiro de 1942. Texto Lyto.<br />

Fig 12 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Municipal com as<br />

eu encontro em qualquer lugar.”<br />

<strong>Garotas</strong>”. 18 de fevereiro de 1956. Texto A. Ladino “No Municipal com as<br />

<strong>Garotas</strong>”, em 18 de fevereiro de 1956, apesar de fugir ao período em questão, reforça a<br />

dimensão urbana da festa carnavalesca carioca que será perpetuada: “As <strong>Garotas</strong> atraentes<br />

são jóias resplandecentes do baile monumental. Prêmios, prêmios não ganharam, mas todas<br />

se conformaram, pois podem dizer contentes às coleguinhas ausentes: eu fui ao<br />

Municipal.”<br />

Dentro desse contexto, as manifestações cívicas entraram como mais um suporte<br />

ideológico do governo, buscando ao mesmo tempo aproximar-se das massas e estabelecer<br />

certa distância, ao se apresentar de forma idealizada: “O Estado Novo é o primeiro<br />

momento em que se procura dar sentido mítico ao Estado (...) esse processo será<br />

35


As “<strong>Garotas</strong>” demonstravam o seu patriotismo na data<br />

comemorativa da independência do Brasil, em um momento que<br />

o Estado Novo procurou forjar uma unidade nacional.<br />

Fig 13 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> de<br />

setembro”. 05 de setembro de 1942. Texto Millôr Fernandes<br />

As ilustrações estavam mais para o descanso que para o<br />

trabalho. Aproveitavam o máximo a vida com passeios e<br />

viagens. Ainda bem, que Getulio Vargas não precisou delas para<br />

dar continuidade ao seu projeto modernizador.<br />

Fig 13 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> em férias”.<br />

17 de novembro de 1945. Texto Vão Gôgo.<br />

desenvolvido através da imprensa,<br />

do rádio e do cinema, bem como<br />

da promoção de festas populares e<br />

cerimônias cívicas em exaltação às<br />

principais datas nacionais e feitos<br />

do governo.” 44<br />

“<strong>Garotas</strong> de setembro”, em<br />

5 de setembro de 1942, fazia<br />

referência à data comemorativa da<br />

independência do país, o 7 de<br />

Setembro: “Vivas, vibrantes,<br />

libertas, da pátria um luzido<br />

membro, formam aqui filas<br />

concretas as ‘<strong>Garotas</strong>’ de setembro<br />

(...) Salve ufana brasileira, não<br />

tens lança, tens espada, mas se te<br />

beijam faceira, quero crer que...<br />

fazes nada.”<br />

Tendo em vista o projeto de construção de um país moderno, o Estado gerou uma<br />

ideologia de valorização do trabalho, sendo encarado como uma ferramenta pela qual a<br />

população participaria desse esforço. Além disso, era necessário apagar tudo que ia contra<br />

esse ideal: “Era preciso combater tanto o subversivo, identificado ao inimigo externo, ao<br />

44 VICENTE. Eduardo. Cit, p. 05<br />

36


As influências do cinema norte-americano são sentidas desde o<br />

início da coluna, reproduzindo a beleza e atitudes<br />

hollywoodinas, com o devido tempero brasileiro.<br />

Fig 14 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Garota Cinema”. 26<br />

de novembro de 1938. Texto Alceu Penna<br />

Na temporada de Alceu Penna em NY, o estilo de vida norteamericano<br />

foi trazido para as leitoras e leitores de O Cruzeiro,<br />

comprovada pela tradicional luta de boxe no Madison Square<br />

Garden.<br />

Fig. 14 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> e a luta de<br />

Box. 27 de julho de 1940<br />

estrangeiro de pátria e de ideais, quanto o<br />

malandro, o inimigo interno que se definia<br />

como avesso ao trabalho e às leis e regras<br />

da ordem constituída.” 45<br />

Dessa maneira, reuniram-se esforços<br />

para tentar apagar a noção arraigada de que<br />

o brasileiro era preguiçoso e malandro 46 :<br />

“(...) nos anos 30 procura-se transformar<br />

radicalmente o conceito de homem<br />

brasileiro. Qualidades como preguiça,<br />

indolência, consideradas inerentes à raça<br />

mestiça são substituídas por uma ideologia<br />

do trabalho.” 47<br />

Observando esse incentivo, as<br />

ilustrações não pareciam seguir, de maneira<br />

geral, à risca o propósito do Estado Novo.<br />

“As <strong>Garotas</strong>”, de maneira geral, até pela<br />

condição de jovens, não apareciam<br />

encarando responsabilidades, como um<br />

emprego. Eram ilustradas curtindo a vida e o relax: “Na serra, no campo, no lago ou na<br />

praia, lá se vão novamente de férias as nossas garotas. Vão e voltam como as andorinhas e<br />

como as andorinhas são inconstantes e aéreas.” 48<br />

45 GOMES, Ângela Maria de Castro. In: OLIVEIRA, Lucia Lippi; VELLOSO, Mônica Pimenta; GOMES,<br />

Ângela Maria de Castro. Estado novo: ideologia e poder. Rio de Janeiro: Zahar, 1982, p. 164<br />

46 A figura do malandro que sempre permeou a vida popular, especialmente manifestado no samba -<br />

malandro, modifica-se para enquadrar-se aos novos anseios. Ele torna-se civilizado, se parecendo um galã de<br />

Hollywood, não anda mais armado e despiu-se do lenço no pescoço e chapéu de palha, à exemplo do samba<br />

de Ary Barroso “Mulatinho bamba” gravado por Carmen Miranda em 1935. In: COSTA. Tânia Garcia da.<br />

Op cit, p. 56<br />

47 ORTIZ. Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo: Brasiliense, 1985, p. 42<br />

37


Nesse período, até mesmo em eventos nacionais populares como<br />

o carnaval, a influência norte-americana se fazia presente na<br />

coluna. Uma ilustração está vestida com um conjunto de short e<br />

blusa estampados com motivos da bandeira dos EUA. Apesar<br />

disso, havia influências da artista Carmen Miranda, também,<br />

notada pelas fantasias inspiradas na sua famosa baiana.<br />

Fig. 15. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> & Carnaval em<br />

14 de fevereiro de 1942. Texto Alceu Penna<br />

“As <strong>Garotas</strong>”, em linhas<br />

gerais, absorveram diretrizes<br />

nacionalistas do período pela<br />

valorização dos cenários brasileiros,<br />

da música, festas, bem como da<br />

mulher e do seu vestuário, ainda que<br />

fossem espelhados na cultura<br />

carioca. As ilustrações, mesmo<br />

assim, não se fecharam às<br />

influências estrangeiras,<br />

especialmente a norte-americana: “O<br />

traço comum às mudanças que então<br />

ocorriam no Brasil na maneira de ver, sentir, explicar e expressar o mundo era a marcante<br />

influência que aquelas mudanças recebiam do american way of life.” 49<br />

Devido à Segunda Guerra Mundial, o relacionamento entre Brasil e EUA foi<br />

fortalecido, estreitando-se essa ligação pela política de “Boa vizinhança” (1933-1945),<br />

buscando apagar a lembrança imperialista, nada simpatizante, do Big Stick: “Os métodos<br />

mudaram, mas os objetivos permanecem os mesmos: minimizar a influência européia na<br />

América Latina, manter a liderança norte-americana e encorajar a estabilidade política no<br />

continente.” 50<br />

No campo cultural os norte-americanos valeram-se de táticas como a Missão<br />

Rockefeller, para aproximar a nação do Brasil, trazendo os artistas, incluindo Walt Disney<br />

que na ocasião lançava sua última produção - Fantasia: “(...) além de Disney vieram com a<br />

48<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> em férias”. Texto Vão Gôgo. In: O CRUZEIRO. 17 de novembro de<br />

1945, p. 22 e 23<br />

49<br />

MOURA. Gerson. O Tio Sam chega ao Brasil: a penetração cultural americana. São Paulo: Brasiliense,<br />

1984, p.08<br />

50<br />

MOURA. Gerson. Op cit, p. 18<br />

38


“As <strong>Garotas</strong>” tentavam copiar as americanas do norte na<br />

destreza da cozinha, embora o esforço fosse em vão. Os<br />

hábitos alimentares, também, sofrerão influências, fazendo as<br />

figurinhas trocarem caviar por um suculento beef.<br />

Fig 16 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> e a arte da<br />

culinária”. 26 de novembro de 1938. Texto A. Ladino<br />

Fig 16 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Para Agradar as<br />

<strong>Garotas</strong>”. 11 de março de 1944. Texto Alceu Penna<br />

missão cultural famosos artistas do<br />

cinema americano: Tyrone Power,<br />

Henry Fonda, Douglas Fairbanks. O<br />

Rio de Janeiro exultava com os astros<br />

e o governo brasileiro aproximava<br />

ainda mais dos americanos.” 51<br />

Observando o impacto dessa<br />

política na coluna, é perceptível que<br />

os costumes e estilo de vida dos EUA<br />

serão trazidos de maneira próxima<br />

para “As <strong>Garotas</strong>”, quando Alceu<br />

Penna viaja para a Feira de Mundial<br />

em Nova York. 52 Em 27 de julho de<br />

1940, em “<strong>Garotas</strong> e a luta de Box”, o<br />

cenário era um torneio de box amador<br />

no Madison Square Garden, um<br />

programa tipicamente norte-<br />

americano: “Não podendo assistir ao<br />

encontro Godoy x Loe Louis, as “<strong>Garotas</strong>” me carregaram para o Madson. Para encurtar<br />

razões – tive que me retirar antes do fim, para evitar um conflito, dada a torcida ‘violenta’<br />

das meninas, em favor dos boxeus... bonitinhos...”<br />

Na realidade a influência norte-americana será presente durante todo o Estado<br />

Novo. Entretanto, as aproximações com a cultura estrangeira deveriam respeitar um limite,<br />

algo ignorado por Carmen Miranda, que não escapou de uma recepção fria ao voltar de sua<br />

51 TOTA, Antônio Pedro. Op cit, p. 54.<br />

52 Alceu Penna foi para os EUA em 20 de setembro 1939 e permaneceu lá até junho de 1941.<br />

39


turnê pelos EUA, fugindo do ideal musical brasileiro aprovado pelo Estado Novo 53 : “A<br />

denúncia da ‘americanização de Carmen Miranda mostrava que existia no Brasil de 1940<br />

um movimento difuso que defendia a correta utilização desses novos símbolos nacionais.<br />

A mistura do samba com a música norte-americana, por exemplo, não podia ultrapassar<br />

determinados limites.” 54<br />

A figura de Carmen Miranda ecoou não apenas nos EUA, mas aqui no país. É<br />

notável perceber na coluna a quantidade de fantasias de carnaval inspiradas no figurino da<br />

artista. Muitos turbantes com penduricalhos, colares, frutas amarradas, tecidos coloridos e<br />

contrastantes.<br />

O cinema será outra evidência da influência dos EUA na coluna, presente desde os<br />

primórdios dela. 55 Em 10 de dezembro de 1938, em “<strong>Garotas</strong> de festas”, certo ator famoso<br />

de Hollywood aparenta causar comoção nas ilustrações: “A Elvira se apaixonou de tal<br />

maneira pelo Tyrone Power que quase morreu. E curou-se? Com um sósia...”<br />

Essa influência cinematográfica tende a crescer após a Segunda Guerra Mundial,<br />

sendo um importante porta-voz na difusão de gostos e estilos do american way of life, em<br />

meio à Guerra Fria: “(...) após a Segunda Guerra, o cinema se tornou a vitrine por<br />

excelência da exibição de glamourização dos novos materiais, objetos utilitários e<br />

equipamentos de conforto e decoração doméstica.” 56<br />

53 Carmen Miranda, ao se apresentar no cassino da Urca em julho de 1940, não entendeu de imediato o seu<br />

insucesso. O que os presentes em seu show viram foi uma Carmen demasiadamente estilizada, cantando algo<br />

que não era supostamente a música brasileira pura, gesticulando em excesso (hábito adquirido nos EUA para<br />

suprir a falta de comunicação) e, pior, saudando a platéia com um good night, people! A artista foi aclamada<br />

pelo povo em sua chegada, mas ali ela cantava para o alto escalão do Estado Novo. A frieza, olhada por esse<br />

ângulo, fez completo sentido: “Carmen abriu com ‘South American Way’. Pelo menos três minutos<br />

seguintes, gelo na platéia. O samba-rumba, muito fraco para os padrões brasileiros, teve de arrastar-se<br />

sozinho até a última nota.” In: CASTRO, Ruy. Op cit, 249-250.<br />

54 VIANNA, Hermano. Op cit, p. 131.<br />

55 A influência do cinema norte-americano data desde a década de 1920 no Brasil. Segundo Susan Besse, as<br />

salas de projeção proliferaram a partir de 1910 e, na década de 1920, ir ao cinema estava entre os<br />

passatempos mais populares para jovens e velhos, homens e mulheres, pobres e ricos. In: BESSE, Susan.<br />

Modernizando a desigualdade: reestruturação da ideologia de gênero no Brasil 1914-40. São Paulo:<br />

Universitária SP, 1999, p.26.<br />

56 SEVCENKO, Nicolau. Op cit, p.602.<br />

40


O bom gosto francês aparecia tanto na moda de gala quanto nos<br />

programas inspirados no país. Apesar da influência norteamericana<br />

maciça, ambas vertentes serão presenciadas na coluna.<br />

Fig.17 Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> e a comedie<br />

française”. 27 de maio de 1950. Texto A. Ladino<br />

Em “<strong>Garotas</strong> e a arte da<br />

culinária”, de 22 de abril de 1950,<br />

as ilustrações buscam inspiração<br />

nos hábitos das mulheres norte-<br />

americanas ao encarnarem a<br />

“rainha do lar”: “As <strong>Garotas</strong> viram<br />

no cinema o desembaraço com que<br />

as americanas do norte vão para a<br />

cozinha.”<br />

Os EUA promoviam o<br />

consumo de objetos ligados ao seu estilo de vida, levando, discretamente, seu imperialismo<br />

cultural: “Ao importar o cadillac, os chicletes, a coca-cola e o cinema, não importamos<br />

apenas objetos e mercadorias, mas também todo um complexo de valores e condutas que<br />

se acham implicados nesses produtos.” 57<br />

Em “Para agradar as <strong>Garotas</strong>”, de 11 de março de 1944, a cultura norte-americana<br />

parecia afetar até o paladar das “<strong>Garotas</strong>”, que buscavam alternativas ao gosto francês:<br />

“Para agradar ao paladar das <strong>Garotas</strong> alguns aconselham champanhe, caviar e marrom-<br />

glacê. Hoje estamos certos de que um quilo de beef será mais recomendável.”<br />

Além de todos os produtos que traziam o estilo de vida do país internalizado, essa<br />

influência ficava clara até no vocabulário. “Conselhos das <strong>Garotas</strong>”, em 7 de agosto de<br />

1943, evidencia o emprego de algumas palavras em inglês no cotidiano pelas “<strong>Garotas</strong>”,<br />

comprovando o quão fundo foi esse imperialismo: “Quando não souberes o destino de uma<br />

estrada, nunca andes nela com um boy. O destino em geral é o espeto.”<br />

57<br />

CORBISIER, Roland. Formação e probabilidade da cultura Brasileira. Rio de Janeiro: ISEB, 1958, p. 69.<br />

In: ORTIZ. Renato. A moderna tradição brasileira: cultura brasileira e indústria cultural. São Paulo:<br />

Brasiliense, 1994, p. 69.<br />

41


Apesar da emergência do modelo norte-americano, o francês continuava sendo uma<br />

referência em bom gosto e tradição. “As <strong>Garotas</strong>” o apreciavam, sendo isso evidenciado<br />

pelos costureiros franceses, pelo vocabulário usado na coluna e mesmo pelos programas<br />

influenciados pela cultura do país, que garantiam certa aparência de sofisticação: “Jean<br />

Louis Barrault! Madeleine Renaud! As <strong>Garotas</strong> tinham que assistir às noitadas<br />

maravilhosas da ‘Comedie Française’ no Municipal.” 58<br />

Os dois modelos passam a conviver, lado a lado, disputando constantemente o lugar<br />

de prestígio: “É interessante notar, que apesar da preponderância francesa, as diversas<br />

influências passam a coexistir no mundo da moda com maior flexibilidade de aceitação,<br />

conforme representado na coluna <strong>Garotas</strong> (...).” 59<br />

Em “<strong>Garotas</strong> qual é seu tipo?”, de 29 de agosto de 1942, são apresentados variados<br />

tipos de “<strong>Garotas</strong>”, das quais destaco a Granfina que curiosamente mistura elementos<br />

norte-americanos e franceses, em um tom de valorização dos dois países: “A autêntica, que<br />

já esteve na Europa ou Estados Unidos, foi educada no Sion ou no Sacré Coeur. Produto<br />

nacional, ‘não se dá bem aqui’. Fala francês e inglês. Finge detestar tudo, mas intimamente<br />

possui gostos burgueses.”<br />

Influências estrangeiras continuaram a crescer, principalmente durante o governo<br />

do presidente JK, a partir de 1956, configurando-se como o auge do americanismo no<br />

Brasil. Ainda na trilha do desenvolvimento, o país passa a vivenciar uma urbanização e<br />

industrialização em proporções desconhecidas. Com uma política desenvolvimentista e de<br />

abertura do mercado, o Brasil assistiu a uma invasão de indústrias estrangeiras, como a<br />

automobilística. O presidente propunha realizar 50 anos em 5, mesmo à custa de uma<br />

58<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> e a Comedie Française”. Texto A. Ladino. In: O CRUZEIRO. 27 de maio<br />

de 1950, p.38 e 39.<br />

59<br />

ANASTÁCIO, Marina Bruno Santo. <strong>Garotas</strong> do Alceu: moda feminina brasileira nas páginas de “O<br />

Cruzeiro” entre 1938 e 1958. Monografia, UFRJ, Rio de Janeiro, 2003, p. 38.<br />

42


inflação galopante: “A industrialização era apresentada, tal e qual nos anos 30, como chave<br />

da emancipação de todos e a conquista do bem-estar geral.” 60<br />

Os bens de consumo diversificaram-se e invadiram os lares brasileiros, tornando<br />

cada vez mais prática a vida doméstica:<br />

“Dispúnhamos, também, de todas as maravilhas<br />

eletrodomésticas: o ferro elétrico, que substituiu o ferro a carvão (...) o<br />

chuveiro elétrico; o liquidificador e a batedeira de bolo; a geladeira; o<br />

secador de cabelos (....) o aspirador de pó, substituindo as vassouras e o<br />

espanador; a enceradeira, no lugar do escovão(...).” 61<br />

Uma febre do “novo” e “moderno” se instalava no gosto nacional: “Da simples<br />

lâmina de barbear ao mais requintado automóvel, não havia nos anos 50 e 60 bem de<br />

consumo que não pretendesse “moderno”, “novo”, “inédito.” 62 A modernização tornou-se<br />

um ideal a ser alcançado a fim de nos livramos do atraso em que nos encontrávamos frente<br />

a nações mais desenvolvidas.<br />

Os eletrodomésticos eram anunciados como supostos libertadores da mulher,<br />

dotados de certa aura fantástica:<br />

“Do mesmo modo, as ilustrações das propagandas de fogões, com<br />

fornos que transbordam assados, suflês e outros pratos, enquanto<br />

mulheres elegantemente vestidas apreciavam o espetáculo, sugeriam que<br />

se tratava de máquinas de cozinhar mágicas, com capacidade de preparar<br />

refeições por algum processo de imaculada concepção.” 63<br />

60 FIGUEREDO, Anna Cristina Camargo Moraes. Liberdade é uma calça velha, azul e desbotada.<br />

Publicidade, cultura de consumo e comportamento político no Brasil (1954-1964), São Paulo: Hucitec 1998,<br />

p.62<br />

61 MELLO, João Manuel Cardoso de; NOVAIS, Fernando A. Capitalismo Tardio e sociabilidade moderna.<br />

In: SCHWARCZ, Lilia Moritz (Org.). História da Vida Privada v.4. São Paulo: Companhia das letras, 1998,<br />

p. 564.<br />

62 FIGUEREDO, Anna Cristina Camargo Moraes. Op cit, p.31.<br />

63 FORTY, Adrian. Objeto de desejo: design e sociedade desde 1750. São Paulo: Cosac & Naif, 2007, p.283.<br />

43


Paralelamente a esse movimento de desenvolvimento, a classe média brasileira<br />

ampliou-se aproveitando de todas as novidades: “Nos anos 50 do século XX o Brasil viveu<br />

um período de ascensão da classe média, com possibilidades de acesso à informação, ao<br />

lazer e ao consumo.” 64<br />

Muitos empregos, especialmente no setor terciário, foram criados, já que o aparato<br />

urbano crescia e precisava de uma estrutura eficiente de funcionamento:<br />

“O leque de ocupações no mercado de trabalho aumenta<br />

consideravelmente promovendo a expansão e incorporação das classes<br />

médias (além do proletário industrial). Cresce de forma significativa o<br />

número de trabalhadores dos serviços urbanos (bancos, comércio,<br />

propaganda, transportes, comunicação), da administração de empresas<br />

industriais, funcionários do governo, serviços burocráticos em geral,<br />

profissionais liberais etc.” 65<br />

Em vista desse movimento, a classe média presenciou uma sistemática salarização,<br />

ou seja, um declínio do trabalho autônomo e da prática privada:<br />

“Empregos em escritórios aumentaram, indicando o aparecimento<br />

no censo de uma nova categoria ‘ocupações relativas ao funcionamento<br />

de escritórios’. Mais mulheres entraram como parte da força de trabalho<br />

não manual, especialmente como funcionárias públicas, professoras,<br />

vendedoras, assistentes sociais e datilógrafas.” 66<br />

Examinando os hábitos e posses das “<strong>Garotas</strong>”, tais como os locais freqüentados<br />

por elas e as roupas, sempre na última moda, percebe-se à primeira vista que,<br />

provavelmente, ou representavam moças pertencentes à classe média ou à elite.<br />

64<br />

ALVES, Andréia Matias; FILHO-COURA, Pedro. Avaliação das ações das mulheres sob violência no<br />

espaço familiar, atendidas no Centro de Apoio à Mulher (Belo Horizonte), entre 1996 e 1998. Artigo retirado<br />

de: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-81232001000100020&script=sci_arttext&tlng=en. Acessado<br />

em 28de outubro de 2006.<br />

65<br />

BASSANEZI, Carla. Virando as páginas, revendo as mulheres: revistas femininas e relações homemmulher,<br />

1945-1964. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996, p.69.<br />

66<br />

OWENSBY, Brian P. Intimate Ironies: modernity and the making of middle class in Brazil. Califórnia:<br />

Stanford University Press, 1999, p.49.<br />

44


Entretanto, as “<strong>Garotas</strong>” se diferenciavam da elite em certos aspectos: o desejo de<br />

ascensão social e a preocupação com dinheiro. É freqüente no discurso dessas meninas a<br />

vontade de encontrar um rapaz que possa proporcionar uma vida financeira mais<br />

confortável, com alguns luxos: “O garimpo não é, como se poderia supor, nas minas ou nas<br />

As ilustrações costumavam freqüentar as noites elegantes no<br />

Municipal, mas não deixavam de se preocupar com os preços das<br />

poltronas, indicando destoar das elites.<br />

Fig. 18. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> no Municipal.<br />

Texto Alceu Penna. 25 de julho de 1942.<br />

mostrados pelas ilustrações indicam pertencimento à classe média.<br />

lavras. E o filão conduz diretamente<br />

ao dedo de um bacharel, promissor<br />

bom partido.” 67 Elas reclamam,<br />

também, do preço dos ingressos nas<br />

noites do Teatro Municipal: “Você<br />

não ficou emocionada com o<br />

espetáculo de ontem? Tinha que<br />

ficar. Paguei 120$000 por uma<br />

poltrona.” 68 Essas situações destoam<br />

dos hábitos da elite e, assim, levam a<br />

crer que a aparência e os hábitos<br />

“As <strong>Garotas</strong>”, representantes do segmento médio, não indicavam estar apenas em<br />

sintonia com as transformações no contexto do país, mas também se conectaram<br />

intimamente ao espaço urbano carioca, absorvendo o seu desenvolvimento.<br />

67<br />

“As garotas do Alceu”. “As <strong>Garotas</strong> no Garimpo”. Texto Maria Luiza. In: O CRUZEIRO, 5 de dezembro<br />

de 1959, p.48-49.<br />

68<br />

“As garotas do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> no Municipal”. Texto Alceu Penna. In: O CRUZEIRO. 25 de julho de<br />

1942, p. 20-21.<br />

45


1.2 O espaço urbano alia-se às cariocas<br />

Além de representarem essa classe em ascensão, “As <strong>Garotas</strong>” compartilhavam do<br />

habitat correspondente a ela: as grandes cidades, no caso o Rio de Janeiro. O universo<br />

retratado na coluna se concentrava na área urbana, em bairros como Copacabana, Arpoador<br />

e o Centro da cidade, mais especificamente, a Avenida Rio Branco.<br />

Desde o início do século XX, a Avenida Rio Branco, inicialmente chamada de<br />

Avenida Central, abrigava o espírito das elites da Belle Époque no país: “(...) a nova<br />

avenida exprimia os desejos da elite brasileira de ver “sua” capital mais parecida com a<br />

Paris de Haussman que com uma cidade tropical e mestiça.” 69 Desde 1925, a Avenida Rio<br />

Branco abrigava a famosa Cinelândia: “(...) Capitólio, Glória, Império e Odeon (...)<br />

formariam a Cinelândia, grande centro de lazer para a população.” 70<br />

Mesmo com as grandes modernizações presenciadas no Brasil, especialmente na<br />

década de 1950, a Avenida Rio Branco continuava a gozar de um status ímpar. Ainda nos<br />

seus arredores, concentravam-se outros points, como a Tabacaria Londres, a notável<br />

Livraria Odeon, o Café Belas-Artes e a Galeria Cruzeiro. Ela abrigou um intenso comércio<br />

e atrações culturais diversas: “(...) concentrou obras como a Escola Nacional de Belas<br />

Artes, a Biblioteca Nacional, o Supremo Tribunal, o Palácio Monroe e o Teatro<br />

Municipal.” 71<br />

“As <strong>Garotas</strong>” freqüentavam a região central e tinham destino certo na hora de<br />

lanchar e fofocar: “Depois de lerem ‘A ceia dos Cardeais’, as <strong>Garotas</strong> resolveram lanchar<br />

na ‘Colombo’ e contar a suas impressões da semana passada. E lá, entre um sorvetes e uns<br />

69 SANDRONI, Carlos. Transformações do samba carioca no século XX. In:<br />

http://www.dc.mre.gov.br/brasil/textos/78a83%20Po.pdf. Acessado em 28 de setembro de 2006 p.82.<br />

70 LIMA, Vera; MENDONÇA, Vera Rodrigues de e CRIB; Tanaka. Avenida Rio Branco,<br />

161. In: Anais do Museu Histórico Nacional, volume 35, 2003. p. 333.<br />

71 TANAKA, Crib. LIMA, Vera. Mendonça, Vera Rodrigues. Op cit, p. 332.<br />

46


iscoitos, fizeram-se confidências. E por incrível que pareça só disseram a verdade, tão<br />

somente a verdade.” 72<br />

É interessante perceber que, provavelmente por esses locais serem privilegiados, os<br />

problemas sociais não apareciam de forma tão marcante na coluna, sendo a atmosfera<br />

retratada na coluna leve e descontraída. “As <strong>Garotas</strong>”, por representarem os segmentos<br />

médios da sociedade, tinham uma condição financeira boa e eram ilustradas em freqüentes<br />

temporadas de descanso: “Cansadas de tanto carnaval, de tanta buate, de tanto cinema, de<br />

tanto tanto, as garotas entraram de férias, como se férias não lhes fossem a vida inteira.” 73<br />

Mesmo sendo selecionados os locais ilustrados na coluna, a cidade não apresentava<br />

grande freqüência de episódios de violência e insegurança, como os vistos nos dias atuais:<br />

“(...) foi em 58 que resumiu toda a felicidade de ser brasileiro no fim dos anos cinqüenta,<br />

vivendo sem militares no cangote e só se assustando, no máximo, com os óculos escuros<br />

do Ronaldo Souza Castro, o assassino de Aída Curi.” 74 A cidade ainda não tinha uma<br />

legião de arranha-céus e poluição, como descreve Danuza Leão: “ Era muito bom morar no<br />

Rio: as praias quase vazias, poucos carros nas ruas.” 75<br />

No espaço urbano o desenvolvimento chegava, ampliando-se a rede de transportes.<br />

“As <strong>Garotas</strong>”, já havia algum tempo, circulavam pelo Rio de Janeiro em ônibus,<br />

enfrentando os percursos em pé, se fosse preciso, como figuras independentes: “<strong>Garotas</strong><br />

alucinantes de atrativos transbordantes, cheias de graça e de fé, como aves em sobressalto,<br />

invadem o ônibus de assalto e viajam todas em pé.” 76<br />

72 . “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “O lanche das <strong>Garotas</strong>”. Texto A. Ladino. In: O CRUZEIRO 6 de maio de 1950,<br />

p.42 e 43.<br />

73 “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> em férias”. Texto A. Ladino. In: O CRUZEIRO. 3 de abril de 1954, p.46<br />

e 47.<br />

74 SANTOS, Joaquim Ferreira dos. Feliz 1958: o ano que não devia terminar. Rio de Janeiro: Record, 2003,<br />

p.16<br />

75 LEÃO, Danuza. Quase tudo: memórias. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 27<br />

76 “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “Um ônibus e <strong>Garotas</strong> em pé”. Texto de Frivolino. In: O CRUZEIRO. 20 de julho<br />

de 1946, p.23 e 24.<br />

47


As ilustrações são apresentadas como figuras urbanas, ligadas<br />

à agitação do Rio de Janeiro, mas, ocasionalmente, aderiam a<br />

temporadas no campo.<br />

Fig. 19 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> em ferias”.<br />

Texto A. Ladino. 03 de abril de 1954.<br />

Os transportes se modernizavam e “As <strong>Garotas</strong>” noticiaram o<br />

movimento, andando em ônibus e de pé, mostrando<br />

flexibilidade ao encarar os novos desafios impostos por uma<br />

cidade em desenvolvimento.<br />

Fig. 19 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Um ônibus e<br />

<strong>Garotas</strong> em pé”. 27 de maio de 1950. Texto A. Ladino<br />

Nesse período a população<br />

urbana ainda era minoria, frente a<br />

um Brasil predominantemente<br />

agrário, situação que começa a se<br />

modificar na década de 1970. O Rio<br />

de Janeiro se tornava, cada vez<br />

mais, um pólo atrativo para todos<br />

aqueles que tentavam “ganhar a<br />

vida” com mais sucesso. Se a<br />

cidade vivenciava um aumento do<br />

setor terciário, o mesmo não era<br />

visto no setor agrário, que decaía<br />

atraindo cada vez mais o<br />

trabalhador rural para os grandes<br />

centros: “Matutos, caipiras, jecas:<br />

certamente era com esses olhos que,<br />

em 1950, os 10 milhões de<br />

citadinos viam os outros 41 milhões de brasileiros que moravam no campo, nos vilarejos e<br />

cidadezinhas de menos de 20 mil habitantes.” 77<br />

Os meios de comunicações e os transportes, mesmo com as modernizações, ainda<br />

não haviam alcançado pleno desenvolvimento a ponto de integrar eficientemente o país<br />

todo. A revista O Cruzeiro será uma das primeiras tentativas, por parte das comunicações,<br />

de uma efetiva integração anterior ao surgimento da televisão na década de 1950. 78 Entre<br />

outros fatores, essa falta de conexão entre as regiões será um dos responsáveis pelo<br />

77 MELLO, João Manuel Cardoso de. NOVAIS. Fernando A. Op cit, p.574<br />

78 A revista O Cruzeiro será tratada no capitulo 2 com maiores detalhes.<br />

48


estabelecimento do Rio de Janeiro como modelo para o Brasil, propagado amplamente<br />

pelos meios de comunicação: “Apesar de todo o processo de centralização iniciado pela<br />

revolução de 1930 e fortalecido pelo Estado Novo, a sociedade brasileira, no período em<br />

que a consideramos, é ainda fortemente marcada pelo localismo.” 79<br />

Mesmo sendo figuras urbanas, aos fins de semana “As <strong>Garotas</strong>” eram ilustradas,<br />

algumas vezes, abandonando a cidade em busca de diversão: “Elas estão em Petrópolis,<br />

elas e eles. Tomando refresco, passeando de bicicleta, jogando tênis e descansando da<br />

folga do Rio.” 80 O passeio ao campo para elas indicava apenas um descanso da rotina da<br />

cidade: “De varinha de pescar, com um romance barato diante dos olhos, de roupa de<br />

montaria, escalando morros elas tomam novo alento para novas brincadeiras, pois a cidade<br />

continua...” 81<br />

Entre outras atividades, “As <strong>Garotas</strong>” quando se encontravam na cidade gostavam<br />

de passar o tempo entre as praias e as piscinas do Rio de Janeiro. O hotel Copacabana<br />

Palace, propriedade da família Guinle, nesse período, era um ambiente em que circulava a<br />

alta-sociedade carioca, bem como celebridades nacionais e internacionais, e tinha a piscina<br />

mais concorrida: “O supra-sumo do luxo eram festas no Goldem Room do Copacabana<br />

Palace. Lá aconteciam os desfiles de moda, lá se escolhiam a Glamour Girl e a Charm<br />

Girl, lá se apresentavam os grandes nomes da música internacional.” 82<br />

79<br />

ORTIZ, Renato. A moderna tradição brasileira: cultura brasileira e indústria cultural. 5. ed. São Paulo:<br />

Brasiliense, 1994, p. 49<br />

80<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> em Petrópolis”. Texto: Rui Costa. O CRUZEIRO. 1 de abril de 1944,<br />

p.46-47.<br />

81<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> em férias”. Texto A. Ladino. In: O CRUZEIRO. 3 de abril de1954, p.46<br />

e 47.<br />

82<br />

LEÃO, Danuza. Op. Cit, p. 27.<br />

49


A pele bronzeada será um dos traços mais marcantes do<br />

estilo de vida carioca, amplamente divulgado pelas<br />

ilustrações.<br />

Fig. 20. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Sol é maluco<br />

por <strong>Garotas</strong>”. 22 de outubro de 1955. Texto A. Ladino.<br />

comentários.” 83<br />

“As <strong>Garotas</strong>” não perdiam a<br />

oportunidade de se verem cobertas de<br />

um sol radiante e uma boa piscina: “E<br />

enquanto as <strong>Garotas</strong> molham o corpo<br />

nas águas claras da piscina vão<br />

deixando transpirar, para benefício do<br />

corpo, um pouco de veneno, na forma<br />

agradável de conselhos e<br />

A praia era um local descontraído em que as cariocas exibiam as curvas, embora<br />

ainda timidamente, de seus corpos bronzeados na areia: “Morenidade parece ser uma<br />

espécie de palavra de ordem na cidade, a conquista de uma cor considerada a perfeição do<br />

corpo. O que, por sua vez, indica um aspecto essencial ao charme da praia: é o lócus por<br />

excelência da exibição corporal.” 84<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu” não ficavam fora disso: “E presas nos maiôs as <strong>Garotas</strong><br />

saúdam o sol e dele recebem as carícias luminosas. Uma praia sem sol quase não tem<br />

graça. Mas mesmo com sol, que seria da graça das praias se não houvesse <strong>Garotas</strong>?...” 85<br />

Na coluna elas freqüentavam a Praia de Copacabana e iam ao Arpoador, em Ipanema,<br />

reduto dos modernos e “arejados”: “Ipanema foi o berço de várias revoluções de<br />

comportamento, na moda nas artes plásticas, no cinema, na música popular, na Imprensa<br />

(...). 86<br />

83<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> na piscina”. Texto sem referência. In: O CRUZEIRO. 10 de março de<br />

1945, p.45.<br />

84<br />

FARIAS, Patrícia. Corpo e classificação de cor numa praia carioca. In: Mirian Goldenberg (Org.). Nu &<br />

Vestido: dez antropólogos revelam a cultura do corpo carioca. Rio de Janeiro: Record, 2002, p. 264.<br />

85<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “Sol é maluco por <strong>Garotas</strong>!” Texto de A. Ladino. In: O CRUZEIRO. 22 de<br />

outubro de 1955, p. 110 e 111.<br />

86<br />

CASTRO, Ruy. Ela é carioca: uma enciclopédia de Ipanema. São Paulo: Companhia das Letras, 1999,<br />

p.11<br />

50


O período de vigência da coluna vai assistir, cada vez mais, ao cultivo da pele<br />

bronzeada, principalmente pelas cariocas, como Danuza Leão: “Depois de me lambuzar<br />

com os óleos da moda – cada uma queria ser a mais queimada do grupo –, atravessávamos<br />

a rua e,<br />

com Murilinho de Almeida (...) íamos para a piscina do Copa, onde as crianças<br />

tomavam aula de natação com a campeã Maria Lenk.” 87<br />

Nas ilustrações das “<strong>Garotas</strong>” a pele clara, em alguns momentos, marcadamente<br />

bronzeada, vai ilustrar os hábitos e padrão de beleza do cidadão carioca:<br />

“Foi a praia que<br />

criou aquela<br />

mocinha queimada e de óculos escuros, que fala uma linguagem que você da<br />

Tijuca ou Madureira, não compreenderá.” 88 .<br />

Desde o início do século, a pele levemente bronzeada transformou-se em status,<br />

principalmente na Europa, referindo-se às pessoas que tinham condições de desfrutar de<br />

férias de veraneio. 89 No Brasil, a elite, por algum tempo, ligará a pele clara ao status<br />

social. 90 A pele rosada, apenas para conferir um aspecto saudável, é que será mais<br />

valorizada: “Durante o decênio de 1920, apesar dos movimentos intelectuais que tentam<br />

reabilitar as<br />

raízes negras da nação, ou valorizar a miscigenação cultural especificamente<br />

brasileira,<br />

a ideologia do branqueamento persiste, bem ancorada no pensamento das<br />

elites.” 91<br />

Nos anos 1930 a situação começa a se modificar. A praia e o bronzeado tornaram-<br />

se elementos relacionados ao Rio de Janeiro:<br />

“(...) a elevação da categoria moreno como<br />

87<br />

LEÃO, Danuza. Op cit, p. 56<br />

88<br />

ANASTÁCIO, Marina Bruno Santo. Op cit, p.42.<br />

89<br />

Segundo Wilson, a pele bronzeada fora anteriormente o sinal do trabalhador e repudiada pelos mais<br />

requintados: “Por volta dos anos 20, que a pele bronzeada passou a ser um sinal daqueles que tinham<br />

possibilidade de viajar. A pele bronzeada, desde essa época, passou a ser associada à modernidade”.<br />

In:<br />

WILSON, Elizabeth. Enfeitada de sonhos: moda e modernidade. Lisboa: Ed 70, 1985, p.44<br />

90<br />

Essa valorização tem origem na teoria do branqueamento, muito aceita, especialmente, entre o período da<br />

Abolição da Escravatura e a Primeira Guerra Mundial. Segundo a teoria, pela miscigenação, a população<br />

ficaria cada vez mais branca com o passar das gerações. Um dos principais defensores do branqueamento é o<br />

teórico Oliveira Vianna. In: SCHPUN. Mônica Raisa.<br />

Beleza em Jogo: cultura física e comportamento em<br />

São Paulo nos anos<br />

20. São Paulo: SENAC, 1999<br />

Op cit, p.116.<br />

91<br />

SCHPUN, Mônica Raisa. Op cit, p. 116.<br />

51


forma favorita de inclusão numa totalidade: a dos habitantes da cidade. Assim, quem é<br />

carioca é moreno – e quem não<br />

for...” 92<br />

Nesse<br />

período a origem mestiça do brasileiro é resgatada, embora na prática a cor<br />

branca ainda fosse estimada. 93<br />

“Por fim, na representação vitoriosa dos anos 1930, o mestiço<br />

transformou-se em ícone nacional, em símbolo de nossa identidade<br />

cruzada no sangue, sincrética na cultura, isto é, no samba, capoeira,<br />

candomblé, futebol. Redenção verbal que não se concretiza no cotidiano,<br />

a valorização do nacional é acima de tudo uma retórica que não tem<br />

contrapartida na valorização das populações mestiças discriminadas.” 94<br />

colocada como uma das características mais singulares do brasileiro: “(...) muitos<br />

daqueles<br />

que se<br />

Ao mesmo tempo em que a coluna se conecta ao estilo de vida carioca, absorvendo<br />

a cultura do corpo bronzeado, ela paralelamente propaga o perfil branco elitista, o que é<br />

comprovado pela ausência de “<strong>Garotas</strong>” de outras raças, como negras, mulatas, entre<br />

outras, não refletindo a realidade da miscigenação do país. Aliás, a mistura de raças será<br />

propuseram a definir uma especificidade nacional selecionaram a ‘conformação<br />

racial’ encontrada no país, destacando a particularidade da miscigenação.” 95<br />

Ao lado dos corpos bronzeados e do ambiente descontraído da praia, outras<br />

diversões eram bastante valorizadas entre os cariocas. O Jockey Club era, também, palco<br />

de eventos sociais disputados pelas elites e muito noticiados nas colunas sociais como a de<br />

92 FARIAS, Patrícia. Op cit, p.281.<br />

93 A valorização da mestiçagem atendia aos propósitos do Estado Novo em construir uma unidade nacional:<br />

“A tendência de valorizar a mestiçagem é uma opção pela ‘unidade da pátria’ pela homogenização.” In:<br />

VIANNA, Hermano. Op cit, p. 71. Teóricos como Gilberto Freyre em Casa Grande & Senzala foram<br />

responsáveis pela sustentação desse novo posicionamento. Segundo Regina Abreu, a figura do mulato<br />

carioca é resgatada, sendo a miscigenação uma característica valorizada por singularizar o Brasil. O conceito<br />

de raça foi nesse momento substituído pelo de cultura. In: ABREU, Regina. A capital contaminada:<br />

construção da identidade nacional pela negação do espírito carioca. In: LOPES, Antônio Herculando. (Org)<br />

Entre Europa e África: a invenção do carioca. Rio de Janeiro: Fundação Casa Rui Barbosa: Top books, 2000,<br />

p. 167-186.<br />

94 SCHWARCZ, Lilia Moritz. Nem preto nem branco, muito pelo contrário: cor e raça na intimidade. In:<br />

NOVAIS, Fernando A.; SCHWARCZ, Lilia Moritz. História da vida privada no Brasil: volume 4: contrastes<br />

da intimidade contemporânea. São Paulo: Companhia das Letras, 1997, p. 178<br />

95 SCHWARCZ, Lilia Moritz.Op cit, p. 178<br />

52


Jacinto Thormes e Ibrahim Sued: “Em julho havia o Grande prêmio Brasil. O Sweeps-take,<br />

no Jockey Club do Rio de Janeiro, compreendia uma semana de festividades, dois jantares<br />

nos salões<br />

do clube, uma noitada no Copa e duas tardes no prado.” 96<br />

“As <strong>Garotas</strong>”, com seus compromissos sociais, freqüentavam as noites elegantes no<br />

Municipal e notavam tudo, menos o espetáculo: “Dizem que aquela soprano tem um<br />

repertório enorme! É. E com aquele vestido parece muito maior ainda!” 97 Eventos como o<br />

Grande Prêmio Brasil, no hipódromo da Gávea, reuniam o high society, sendo um local<br />

para ver e ser visto. Os bailes movimentavam a cidade também, como os do Ginástico e do<br />

Clube da Aeronáutica, e “As <strong>Garotas</strong>”, é claro, não perdiam esse tipo de evento: “O Baile é<br />

um acontecimento social. Reúne<br />

pessoas numa congregação mais ou menos íntima,<br />

aproximativa,<br />

agrupadora.” 98<br />

A lista de “As dez mais elegantes”, do colunista Ibrahim Sued, assim como “As<br />

Certinhas do Lalau”, de Stanislaw Ponte Preta, eram muitos aguardadas. Carmem Mayrink<br />

Veiga, Danuza Leão e a atriz Ilka Soares eram nomes freqüentes nessas listas. O concurso<br />

de miss, contudo, era o mais popular entre as “<strong>Garotas</strong>”. A maioria das mocinhas no Brasil<br />

sonhava em concorrer e desfilar na passarela, sob os flashes atentos dos fotógrafos. “As<br />

<strong>Garotas</strong>” já reinavam, também, nos concursos de beleza: “O reinado das <strong>Garotas</strong> é tudo o<br />

que há de mais real. Toda Garota se sente tanto ou quanto Rainha. E muitas<br />

delas avaliam<br />

o seu prestígio<br />

e o seu fascínio pelo número de vassalos que conta (...).” 99<br />

“As <strong>Garotas</strong>” foram concebidas por Alceu Penna tendo como inspiração o cenário<br />

carioca e as especificidades da classe média urbana, refletindo um estilo de vida particular.<br />

96 DURAND, José Carlos. Moda, Luxo e economia. São Paulo: Babel cultura, 1998, p.70.<br />

97 “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> no Municipal”. Texto Alceu Penna. In: O CRUZEIRO. 25 de julho de<br />

1942, p. 20 e 21.<br />

98 . “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> num baile”. Texto sem referência. In: O CRUZEIRO. 5 de junho de<br />

1943, p. 40 e 41.<br />

99 “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “O reinado das <strong>Garotas</strong>”. Texto A Ladino. In: O CRUZEIRO. 7 de setembro de<br />

1957, p.58 e 59.<br />

53


É possível<br />

que, por pertencerem a esse universo, elas se mostrassem despreocupadas e<br />

pouco conscientes com os problemas sociais, que estavam longe da sua realidade.<br />

A vida social intensa que a capital abrigava se encaixava perfeitamente<br />

ao estilo de<br />

vida da juventude emergente da classe média. Pelos encantos dessas ilustrações, Alceu<br />

Penna conectou intimamente os jovens ao cenário da Cidade Maravilhosa.<br />

54


1.3 Um broto de “Garota”: a emergência do conceito de juventude<br />

Foi especialmente na década de 1950<br />

concretas. Era a primeira vez que essa categoria<br />

era reconhecida: “(...) o processo que<br />

“As<br />

<strong>Garotas</strong>” estavam passando pela experiência da primeira<br />

paixão,<br />

divididas entre receios e desejos.<br />

Fig. 21. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. 1° amor das <strong>Garotas</strong>. Texto<br />

sem<br />

referência.<br />

10 de novembro de 1945.<br />

misturavam<br />

com as dos adultos.” 101<br />

vida e seus desafios, desabrochando<br />

como uma flor.<br />

que a cultura jovem tomou formas mais<br />

conduz à codificação da<br />

adolescência como fase em si<br />

atingiu a maturação plena após<br />

a Segunda Guerra<br />

100<br />

Mundial.” Os jovens<br />

passaram a desenvolver<br />

atividades típicas para a sua<br />

faixa etária, assim como gostos<br />

e estilo de vida: “Nas cidades,<br />

várias atividades juvenis não<br />

se confundiam nem se<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu” exibiam a atmosfera juvenil em suas páginas. Elas se<br />

autodenominavam “brotos”, uma gíria comum na época para designar os adolescentes. A<br />

lógica por trás do termo parece remeter à mulher que está começando a experimentar a<br />

100<br />

PASSERINI, Luisa. A Juventude, metamorfose da mudança social. Dois debates sobre os jovens: a Itália<br />

fascista e os EUA da década de 1950. In: História dos Jovens volume 2. São Paulo: Companhia das Letras,<br />

1996, p. 352<br />

101<br />

BASSANEZI, Carla. Mulheres nos Anos Dourados. In: PRIORI, Mary. História das Mulheres no Brasil.<br />

São Paulo: Contexto,<br />

1997, p.620.<br />

56


Como jovenzinhas<br />

que se prezem, as ilustrações queriam<br />

o autógrafo do astro internacional do momento, ao<br />

mesmo tempo em que cultivavam uma vaidade e tanto.<br />

Fig. 22 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: A beleza das<br />

<strong>Garotas</strong>. Texto Alceu Penna. 01 agosto de 1942.<br />

Fig. 22 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> e os<br />

autógrafos. Texto A. Ladino. 11 de outubro de 1952<br />

Essa teoria pode ser comprovada<br />

pela seção “<strong>Garotas</strong> e a Broticultura”, em<br />

que as ilustrações aparecem regando<br />

botões de flores:<br />

“A broticultura tem<br />

tomado grande incremento nesses últimos<br />

tempos. Os brotos estão dominando em<br />

todos os reinos da natureza. E as <strong>Garotas</strong><br />

por causa desse cartaz estão com tudo e<br />

cheias de prosa.”<br />

especialmente pelas mulheres mais<br />

compartilhado também pelas adolescentes: “A juventude está associada<br />

a um padrão de<br />

beleza e isso envolve um aumento progressivo com os cuidados do corpo, cuidados que,<br />

vaidade, fato evidenciado na seção de 01 de agosto de 1942, “A beleza das <strong>Garotas</strong>”, que<br />

102<br />

A juventude está associada à<br />

beleza como algo admirado e almejado,<br />

maduras, que com a crescente valorização<br />

de um perfil jovem se atiravam em<br />

cuidados para manter por mais tempo o<br />

frescor característico dessa idade, algo<br />

em geral, tendem a atenuar e dissimular a idade sócio-biológica e causar a impressão de<br />

vitalidade perene.” 103<br />

“As <strong>Garotas</strong>”, mesmo sendo naturalmente jovens, se interessavam por rituais de<br />

beleza que pudessem potencializar os seus predicados. Elas aparentavam cultivar a<br />

102<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> e a broticultura”.<br />

Texto A Ladino. In: O CRUZEIRO. 8 abril 1950, p.38<br />

e 39.<br />

103<br />

VIANNA, Letícia C.R. A idade mídia: uma reflexão sobre o mito da juventude na cultura de massa. Série<br />

Antropologia 121, Brasília, 1992, p.2. Disponível em: http://www.unb.br/ics/dan/Serie121empdf.pdf. Acessado em 10 de<br />

agosto de 2006.<br />

57


evela ao leitor os profissionais da estética por trás das suas aparências: “O leitor é um<br />

esteta naturalmente. Gosta de apreciar o belo. (...) Por isso quando contempla na rua a<br />

silhueta<br />

provocante de uma “Garota”, nem lhe passa pela cabeça o conjunto de artistas<br />

anônimos que burilaram o motivo ondulante de sua admiração.”<br />

Na batalha para se manterem jovens e belas,<br />

a escolha correta da roupa se tornava<br />

imprescindível:<br />

“O sistema de valores da sociedade adolescente acentuava a importância<br />

da aparência por meio das roupas, popularidade, atrativos externos.” 104 Na coluna a<br />

maratona para escolher o melhor modelo era muito penosa, especialmente para os<br />

namorados, que eram obrigados a esperar<br />

as indecisas figuras: “Pois sim! Vão esperando,<br />

sentados,<br />

rapazes incautos, de muito topete e pouco bom senso. Uma Garota quando diz<br />

que vem já já é porque começou a vestir-se. E quando ela começa a vestir-se o mundo pára<br />

e espera...” 105<br />

Ao lado dessa corrida pelas aparências, freqüentemente, “As <strong>Garotas</strong>” eram<br />

ilustradas em situações em que seus pensamentos voavam longe, mais próximos<br />

dos<br />

bonitões<br />

rapazes e das fofocas da última festa, aliás, um típico comportamento adolescente:<br />

“Fixava-se o cabelo, mas não os pensamentos. E eles voavam com os toques<br />

das <strong>Garotas</strong><br />

do Alceu, a bíblia do visual fashion e intelectual dos brotinhos.” 106<br />

Ao mesmo tempo<br />

em que os jovens, em geral, tendiam a ter gostos e<br />

comportamentos comuns,<br />

como a vaidade exacerbada e a insegurança, ao mesmo tempo,<br />

compartilhavam de estilos de vida<br />

específicos. A coluna apresentou um universo ligado à<br />

juventude da classe média carioca, que começava a adquirir representatividade, fixando<br />

locais específicos de diversão, bem como comportamentos: “(...) um viver urbano na zona<br />

104<br />

PASSERINI, Luisa. Op cit, p.358<br />

105<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “A Garota vem já já”. Texto A Ladino. In: O CRUZEIRO. 14 de janeiro de 1956,<br />

p. 70 e 71.<br />

106<br />

SANTOS, Joaquim<br />

Ferreira dos. Op cit, p. 57<br />

58


sul, em festas, nos cinemas, nos barzinhos, na praia, praticando esportes, regado a muita<br />

música “moderna” (Dick Farney e Lúcio Alves), jazz e Frank Sinatra.” 107<br />

A linguagem desse grupo etário também se fazia particular, sendo, para o pavor dos<br />

pais conservadores, repleta de gírias como “é de lascar o cano” (ruim demais),<br />

“que<br />

mocotó”<br />

(que coxa!) ou “da fuzarca” (farra). 108<br />

Em “Lanhe das <strong>Garotas</strong>” publicada em 06 de maio de 1950, as ilustrações também<br />

se animavam com as gírias durante um papo com as amigas, marcado por um ar de<br />

informalidade e descontraído:<br />

“Um artista, um tarzan, mais tarde um senhor de idade que<br />

me fez declaração. Dei pelota nos três!”<br />

O estilo de vida jovem era, comumente, impregnado de uma rotina agitada, repleta<br />

de eventos com uma animação<br />

desconhecida em outra idade. “As <strong>Garotas</strong>” apareciam em<br />

cenários agitados mesmo quando, supostamente, estavam descansando: “As <strong>Garotas</strong><br />

estão<br />

de férias, descansando (...) para elas repousar significa andar a cavalo, subir montanhas,<br />

dançar noites inteiras, nadar<br />

centenas de metros, ir ao cinema, etc., etc., etc.” 109<br />

O rock, um ritmo norte-americano tão agitado quanto a vida dos jovens que o<br />

escutavam, começava a tornar-se mais presente no Brasil nos anos 1950:<br />

para o jovem a afirmação da sua identidade.” 110<br />

“Um novo comportamento começou a se delinear, interferindo<br />

em uma sociedade conservadora. Elvis Presley com sua voz rouca e<br />

sensual, seus rebolados, seu modo de vestir colocou em cena uma nova<br />

estética: o corpo é a mensagem. Essa movimentação corporal representa<br />

107<br />

PEREIRA. Simone<br />

Luci. Imprensa e Juventude nos anos 50. INTERCOM – Sociedade Brasileira de<br />

Estudos Interdisciplinares da Comunicação. XXIV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, p. 3.<br />

Disponível<br />

em: http://reposcom.portcom.intercom.org.br/bitstream/1904/4373/1/NP2PEREIRA.pdf.<br />

Acessado em 10 de maio de 2006<br />

108<br />

SANTOS, Joaquim Ferreira dos. Op cit, p. 10<br />

109<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “As <strong>Garotas</strong> descansam”. Texto João Moço. In: O CRUZEIRO. 18 de março de<br />

1944, p.46 e 47.<br />

110<br />

GUMES, Nadja Vladi Cardoso. RG: Jovem: Culturas Juvenis e a formação das identidades da juventude.<br />

Belo Horizonte, 2003, p. 2. Disponível em:<br />

http://reposcom.portcom.intercom.org.br/dspace/bitstream/1904/4992/1/NP13GUMES.pdf.<br />

Acessado em 28<br />

de outubro de 2006<br />

59


Carlos Gonzaga regrava “Diana” (1958), sucesso de Paul Anka, e Celly Campelo<br />

grava a música “Estúpido Cupido” (1959): “O rock começava aqui. Mas não era<br />

exatamente<br />

como no resto do mundo. As famílias não se assustavam. E as cobras<br />

transviadas do Snack iam ter que esperar o “pega pra capar” dos anos 60.” 111<br />

lançamento de “Chega de Saudade”, música interpretada por João Gilberto no fim da<br />

década. Esse estilo musical foi protagonizado, sobretudo, pelos jovens da classe média<br />

intelectualizada:<br />

“Caracterizada pela sintetização de elementos musicais do jazz,<br />

da música erudita,<br />

e da música popular brasileira urbana das décadas<br />

anteriores, a bossa nova traduziu, de certa forma, as expectativas de um<br />

Brasil moderno, alimentadas por uma parte da classe média brasileira<br />

112<br />

durante a vigência da política desenvolvimentista de JK” .<br />

O cinema participou, também, ao lado da música, na difusão do estilo de vida<br />

jovem. A cultura teeneager, em evidência nos EUA, propagava-se no Brasil,<br />

principalmente, através do cinema hollywoodiano. Começava a surgir uma produção<br />

cinematográfica voltada para os jovens, com ídolos teen como James Dean e Marlon<br />

Brando, que, em certa medida, vendiam um estilo de vida do seu país de origem e o<br />

propagavam como identidade juvenil: “Os meios de comunicação são o palco para a<br />

propagação de imagens juvenis de rebeldia, heroísmo, moda, gostos e identidades. A<br />

juventude é uma fonte de modo de expressão que apropria e é apropriada pelo<br />

consumo.” 113<br />

Enquanto isso, um novo ritmo surge – a bossa nova – que teve como marco<br />

“As garotas” também adoravam cinema, acompanhando a programação e,<br />

principalmente, como boas tietes, colecionavam autógrafos: “Elas têm suas preocupações e<br />

111 SANTOS, Joaquim Ferreira dos. Op cit, p.131.<br />

112 ZAN. José Roberto. Op cit, p.16<br />

113 GUMES, Nadja Vladi Cardoso. Op cit, p. 03<br />

o<br />

60


algumas<br />

são de ordem intelectual como, por exemplo, a de colecionar autógrafos. São<br />

eméritas colecionadoras (...).” 114<br />

protagonizou o filme “Juventude Transviada” (1955),<br />

definindo a essência de ser<br />

adolescente, ou seja, de nunca ser totalmente compreendido pela sociedade e pelos pais:<br />

meno que, nessa escala,<br />

provavelmente não teve paralelo desde a era romântica do início do<br />

século XIX: o herói cuja vida e juventude acabavam juntas. Essa figura,<br />

antecipada na década de 1950 pelo astro de cinema James Dean (...).” 115<br />

“A ‘nova’ autonomia da juventude como uma camada social<br />

separada foi simbolizada por um fenô<br />

Outros ícones do cinema ofereceram diversas identidades ligadas à juventude,<br />

oscilando entre a ousadia e o recato, assim como “As <strong>Garotas</strong>”, que pareciam absorver um<br />

pouco dessas duas influências. A atriz Marilyn Monroe idealizou a vamp maliciosa:<br />

“Marilyn Monroe, vamp molhada de Tormenta das Paixões, nua sob o vestido vermelho,<br />

sexo devorador, rosto desinibido, é quase um símbolo do novo relançamento do star<br />

system.” Já o perfil inocente sensual foi imortalizado por Brigitte Bardot, em “Deus<br />

criou a mulher” (1957), e Audrey Hepburn, em “Sabrina” (1954): “Muitos jovens das<br />

classes médias em ascensão queriam imitar seus ídolos, mas estavam apenas iniciando uma<br />

trajetória de liberação e rebeldia que, nas décadas seguintes, se tornaria um fenômeno de<br />

massa.”<br />

O cinema norte-americano revelou imagens ousadas e transgressoras. James Dean<br />

116<br />

117<br />

114<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> e os autógrafos”. Texto A ladino. In: O CRUZEIRO. 11 de outubro de<br />

1952, p.76 e 77.<br />

115<br />

HOBSBAWM, Eric J. Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das<br />

Letras, 1995, p.318<br />

116<br />

MORIN, Edgar. As estrelas:<br />

mito e sedução no cinema. Rio de Janeiro: José Olympio, 1989, p.18.<br />

117<br />

SAN´TANNA, Denise Bernuzzi. Representações Sociais da liberdade e do controle de si. In: Revista<br />

Eletrônica do Arquivo do Estado n° 5. São Paulo, 2005. Disponível em:<br />

http://www.historica.arquivoestado.sp.gov.br/materias/anteriores/edicao05/materia01/. Acessado<br />

em 10 de<br />

outubro de 2006. São Paulo, 2005, p.01.<br />

61


A juventude compartilhava, além de um estilo de vida<br />

característico também. Em linhas gerais, a imagem juvenil no Brasil era associada, para os<br />

118<br />

rapazes, ao penteado pega-rapaz, o blue jeans, o Glostora no cabelo e, para os mais<br />

rebeldes, os óculos “Ronaldo” 119 e a jaqueta de couro:<br />

“(...) a jaqueta preta, com ou s<br />

usada quase invariavelmente por grupos musicais que assumiam uma<br />

postura rebelde (...) Essas convenções<br />

de Hollywood sobre adolescentes, na década de 1950, em<br />

deles tenha usado o rock.” 120<br />

em o jeans e camiseta, sempre foi<br />

foram estabelecidas pelos filmes<br />

bora apenas um<br />

Os óculos “gatinho” para<br />

as moças eram muito populares também. O sucesso desse<br />

O jovem brasileiro nos anos 1950, à medida que<br />

ganhava destaque na sociedade,<br />

via-se dividido entre dois perfis distintos,<br />

ideal de amor romântico, propagado pelos meios culturais, onde nem os artistas fugiam a<br />

esta construção.” 122<br />

específico, um visual<br />

modelo foi tão grande, que algumas óticas chegaram a vendê-lo sem as lentes de grau. O<br />

rabo-de-cavalo (muito presente nos penteados das “<strong>Garotas</strong>”), o bambolê, as alpargatas no<br />

pé e goma de mascar na boca, compuseram também a imagem das jovenzinhas da época.<br />

121<br />

um influenciado pelos discursos morais e de<br />

desenvolvimento do país e outro em sintonia com as imagens do cinema norte-americano:<br />

“Nos discursos dos anos 50, é possível perceber um padrão de jovem responsável, que se<br />

ocupa em trabalhar, estudar, ‘construir um futuro’, apresenta-se em concomitância com um<br />

118<br />

Glostora era marca de uma espécie de pomada masculina usada para modelar e deixar os cabelos com<br />

aspecto<br />

lustroso. Segundo Alberto Villas, Glostora distinguia o cavalheiro de todos os demais, porque fixava<br />

sem<br />

empastar e amaciava sem engordurar. VILLAS, Alberto. O Mundo acabou. São Paulo: Globo, 2006,<br />

p.110<br />

119<br />

De acordo com Joaquim Ferreira dos Santos, eram os óculos escuros usados por Ronaldo de Souza Castro<br />

o assassino de Aída Curi – jovem que se atirou de um prédio na Avenida Atlântica, no fim dos anos 1950,<br />

para fugir de um suposto assédio. Esses óculos simbolizavam a juventude transviada. In: SANTOS, Joaquim<br />

Ferreira dos. Op cit, p. 137<br />

120<br />

CRANE, Diana. A moda e seu papel social: classe, gênero e identidade das roupas. São Paulo: Editora<br />

<strong>Senac</strong> São Paulo, 2006, p.360.<br />

121<br />

GONTIJO. Silvana. 80 anos de moda no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1987, p.77<br />

122<br />

PEREIRA, Simone Luci. Op cit,<br />

p. 09.<br />

62


“As <strong>Garotas</strong>” usavam também os óculos estilo gatinho, muito popular<br />

entre as jovens do período.<br />

Fig. 23. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. <strong>Garotas</strong> na areia. Texto sem<br />

referência. 10 de novembro de 1945.<br />

“As <strong>Garotas</strong>” também<br />

eram ilustradas em situações,<br />

muitas vezes, contraditórias. A<br />

liberdade se alternava com<br />

ar independente, que não era muito comum para a época, especialmente para uma jovem:<br />

“As garotas<br />

são todas uns anjinhos (que Deus me perdoe!)... Capazes de atear qualquer<br />

“transviado”. Do jovem,<br />

nesse período, era esperado saber dosar ingredientes modernos e<br />

tradicionais,<br />

tentando estabelecer um equilíbrio entre eles.<br />

atitudes um tanto quanto<br />

conservadoras. Elas sentiam-se<br />

censuradas, muitas vezes, ao<br />

entregarem-se aos prazeres de<br />

um beijo: “Momento terrível<br />

para as <strong>Garotas</strong> é aquele em<br />

que elas são forçadas a cortar a trajetória de um beijo.” 123 Ao mesmo tempo emanavam um<br />

incêndio, desses que não há bombeiro que apague.” 124<br />

Em um Brasil, que passava por uma grande modernização, em que velhos<br />

parâmetros sociais de conduta colocavam-se ao lado dos novos, era muito natural que a<br />

figura do jovem “certinho” convivesse com a do jovem “moderninho” ou até mesmo<br />

123<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “Alto, <strong>Garotas</strong>!” Texto A Ladino. In: O CRUZEIRO. 10 de abril de 1948, p.22 e<br />

23.<br />

124<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “As <strong>Garotas</strong> mais revolucionárias”. Texto sem referência. In: O CRUZEIRO. 13<br />

de setembro de 1947, p.22 e 23.<br />

63


CAPÍTULO<br />

2. UMA REVISTA MODERNA: O CRUZEIRO DAS “GAROTAS”<br />

2.1 Os Diários Associados: rumo à integração nacional<br />

fundou<br />

Assis Chateaubriand Bandeira de Mello (1891-1968) foi um homem visionário que<br />

um grande império jornalístico na primeira metade do século XX: os Diários<br />

Associados. Nascido em Umbuzeiro, na Paraíba, formou-se em Direito, mesmo sendo o<br />

jornalismo a sua grande vocação. Começou sua carreira no Jornal de Pernambuco e foi<br />

para o Rio de Janeiro em 1917. Chateaubriand, mesmo advogando, prática que logo<br />

abandonou, chegou a contribuir<br />

para vários jornais, incluindo o La Nacion, de Buenos<br />

Aires. Foi redator-chefe<br />

do Jornal do Brasil e, até mesmo, correspondente do Correio da<br />

Manhã em assuntos internacionais.<br />

Em 1924 adquiriu<br />

seu primeiro periódico, O Jornal, por uma quantia modesta: “(...)<br />

em 1924 quando Assis Chateaubriand Bandeira de Mello saindo da maioridade, comprou<br />

fiado o matutino O Jornal, por 100 contos de réis, com dinheiro dado por um inglês,<br />

125<br />

gerente do Banco de Londres.” Aliás, é nesse periódico, considerado um dos principais<br />

dos Diários Associados, que Alceu Penna conseguirá seu primeiro emprego, ilustrando o<br />

suplemento infantil.<br />

Logo depois, Chateaubriand consegue lançar outros jornais, como o Diário da<br />

Noite, o Diário de São Paulo e o Jornal do Commércio, um dos mais antigos do país. Irá<br />

concretizar, também, um sonho antigo: comprar o Diário de Pernambuco, publicação onde<br />

iniciou sua carreira. Em 1934, dando seqüência aos seus planos, o jornalista inaugura sua<br />

primeira estação de rádio – a Tupi.<br />

125<br />

NASSER, David. Diários Associados: ascensão e queda. In: ESTADO DE SÃO PAULO. 15 de julho de<br />

1980, p. 5.<br />

64


O jornalista, desde jovem, já ambicionava grandes feitos: “Seu objetivo, desde<br />

jovem, era implantar uma cadeia<br />

de jornais, para promover a integração nacional (...).” 126<br />

Audacioso, ampliava a sua cadeia de periódicos<br />

dando apenas uma entrada e se<br />

preocupando em liquidar o resto da quantia mais tarde. Aliás, essa é uma característica que<br />

irá acompanhá-lo: ser um mal<br />

pagador.<br />

Chateaubriand acumulou<br />

uma extensa rede de contatos e amizades influentes, que<br />

formariam a base do seu império.<br />

Desde a Revolução de 1930, quando se tornou aliado de<br />

Getúlio Vargas, conseguiu um<br />

enorme apoio financeiro do governo para suas empreitadas:<br />

“O Rio<br />

era o centro do poder de Chateaubriand, vigoroso<br />

jornalista, conseguiu lançar o Diário da Noite, outro que vendia uma<br />

barbaridade” .<br />

conforme o<br />

volta<br />

qu<br />

127 Entretanto, como característica ele fazia alianças<br />

seu interesse: “A atenção dos governantes esteve sempre<br />

da aos Diários Associados devido à sua condição de poderosa<br />

má ina manipuladora da opinião pública (...) fez acordos com JK e mais<br />

que todos um relacionamento bastante controvertido com Getúlio<br />

128<br />

Vargas.”<br />

O grupo<br />

Diários Associados reuniu algumas<br />

importantes revistas do país, como O<br />

Cruzeiro. Em 1928 Chateaubriand,<br />

atraído pela idéia de lançar uma revista diferente, em<br />

formato inovador, arrecada uma<br />

pequena fortuna para os padrões da época, a fim de<br />

comprar o título Empresa Gráfica O Cruzeiro de Edmundo Miranda Jordão. Investiu-se<br />

bastante no parque gráfico e nas instalações da revista recém-nascida, que mais tarde seria<br />

a maior do Brasil. Com certeza, O Cruzeiro, a primeira revista ilustrada nacional, marcou a<br />

história da imprensa, sendo na época a menina-dos-olhos dos Diários Associados com<br />

126<br />

COSTA, Camillo Teixeira da. Jornalismo: do lirismo às empresas modernas. In: Cadernos de Entrevistas.<br />

Belo Horizonte: PUC MINAS. Departamento de Comunicação. V.1 n°1, fevereiro de 1996, p. 26.<br />

127<br />

NASSER, David. Diários Associados: ascensão e queda. Op cit, p. 5.<br />

128<br />

CUNDARI, Paula Casari. Assis Chateaubriand e a implantação da TV no Brasil. Dissertação mestrado.<br />

Instituto Metodista de Ensino Superior.<br />

São Bernardo do Campo, São Paulo, 1984, p. 35.<br />

65


A Cigarra se tornou muito<br />

popular e com um<br />

direcionamento feminino<br />

declarado, abordava temas<br />

como relacionamentos,<br />

beleza e o mundo das<br />

celebridades.<br />

Fig. 24 a. Capa Cigarra.<br />

Sem data.<br />

Fig 24 b. Suplemento<br />

feminino em A Cigarra.<br />

Ilustração de Alceu Penna.<br />

Janeiro de 1945<br />

tiragens de recordes. Ela será uma das responsáveis por iniciar<br />

a consolidação do ideal de seu fundador: integrar o Brasil<br />

através da imprensa.<br />

Depois de O Cruzeiro, a revista A Cigarra foi<br />

comprada pelo grupo, se tornando uma importante publicação<br />

do período para mulheres. Ela foi criada em 1914 por Gelásio<br />

Pimenta, mas apresentava desempenho insatisfatório. Em 1933<br />

é adquirida pelos Diários Associados, circulando até 1956. A<br />

direção ficou a cargo de Freddy Chateaubriand, sobrinho de<br />

Assis.<br />

Quando incorporada ao grupo,<br />

no interior de O Cruzeiro, somente em São Paulo. Essa prática<br />

não repercutiu positivamente nas vendas e, a partir dessa<br />

experiência, A Cigarra tornou-se uma publicação de<br />

circulação independente. O seu conteúdo era diversificado e<br />

continha um editorial bastante comum às publicações<br />

femininas da época: “A Cigarra mantinha a mesma receita<br />

editorial: contos, relatos de viagem, pequenas crônicas e<br />

reportagens, moda, beleza, uma seção de cartas muito movimentada.”<br />

a publicação circulava<br />

o sendo<br />

considerada<br />

uma publicação feminina, não foi pensada originalmente para esse público,<br />

alguns pesquisadores ao tratarem de A Cigarra, na verdade se dava na quase ausência de<br />

comentários sobre política e confrontos sociais em suas páginas.” 130<br />

129 Mesm<br />

mas seu conteúdo acabou configurando-a como tal: “ O conteúdo ameno, proclamado por<br />

129<br />

BUITONI, Dulcilia Helena Schroeder. Imprensa Feminina. São Paulo: Ática, 1990, p. 45.<br />

130<br />

AZEVEDO. Lílian H.<br />

de. Mulheres revistas: Educação, sociabilidade e cidadania na revista A Cigarra<br />

(1914-1920). Artigo apresentado no INTERCOM. XXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação –<br />

Salvador/BA, setembro, 2002, p. 02.<br />

66


Alceu Penna foi uma presença marcante na publicação, sobretudo, a partir da<br />

década de 1940. “O suplemento modas” da revista contou com a sua contribuição,<br />

incluindo<br />

desenhos de sugestões de fantasias, bem explicadas, que iam das carnavalescas<br />

às de festa junina. A partir de 1948, ele irá, juntamente com Elza Marzullo, responsável<br />

pela coluna de beleza no O Cruzeiro, assinar “O Suplemento feminino”: “Conselhos de<br />

beleza, maquiagem para a noite, conselhos de moda (modelos americanos<br />

desenhados por<br />

Alceu) (...)” 131 .<br />

Além de ilustrações de moda, na revista, Alceu Penna investiu nos quadrinhos, na<br />

década de 1950, em parceria com a cronista Helena Ferraz, sob o pseudônimo de Álvaro<br />

Armando. Os dois criaram o “Marido da Madame”, que contava a história, em forma de<br />

textos rimados, de Gonçalo e Lolita, um casal de classe média alta.<br />

Chateaubriand, entre muitas empreitadas, foi um pioneiro, responsável pelo<br />

lançamento da primeira emissora de TV do Brasil, a Tupi (1950-1980), que contou com<br />

filiais no Rio de Janeiro e São Paulo. Em 1947 ele funda o Masp – Museu<br />

de Arte de São<br />

Paulo –, em ação conjunta com Pietro Maria Bardi, jornalista e crítico de arte, reunindo<br />

cerca de 100 milhões de dólares em patrimônio. Accioly Netto, que viria a ser o redator-<br />

chefe de O Cruzeiro, relembra que era comum Chateaubriand reunir colecionadores de arte<br />

em uma confraternização e depois anunciar no microfone que alguns deles estavam doando<br />

obras para o museu e, claro, sem-graça, esses colecionadores não protestavam. 132<br />

Os Diários Associados enfrentaram uma fase difícil após a morte de Chateaubriand,<br />

em 4 de abril de 1968, transformando-se em Condomínio Associado, controlado pelo<br />

senador João Calmon. O grupo já estava amargando uma forte concorrência de novos<br />

Disponível em:<br />

http://www.intercom.org.br/papers/xxvci/comunicacoes/COMUNICACOES_AZEVEDO.pdf. Acessado em<br />

30 de outubro de 2006.<br />

131<br />

BUITONI, Dulcilia Helena Schroeder. Mulher de Papel.<br />

São Paulo: Loyola, 1981, p. 75.<br />

132<br />

NETTO, Accioly. Império de Papel: Os bastidores de O Cruzeiro. Porto Alegre: Sulina,<br />

1998, p. 36.<br />

67


conglomerados<br />

que se fortaleciam no cenário nacional, como O Grupo Abril 133 e<br />

Bloch 134 .<br />

A Editora Bloch lança em 1952 a revista<br />

Manchete, configurando-se na maior rival<br />

de O Cruzeiro: “Imigrante russo naturalizado brasileiro que aqui chegou com a família em<br />

1922, Adolpho Bloch apostava<br />

que havia lugar no mercado para mais uma revista de<br />

circulação nacional, ou seja, que poderia concorrer com O Cruzeiro.” 135<br />

Ela se diferenciava,<br />

assim, como O Cruzeiro, por uma atenção ao fotojornalismo e<br />

diagram ação: “(...) a Ed.<br />

Bloch lança Manchete, revista de caráter mais moderno, que<br />

incorporava inovações gráficas, inclusive com mais páginas a cores, sempre em papel de<br />

qualidade,<br />

com um bom corpo de redatores e de colaboradores, excelentes fotógrafos,<br />

ilustradores e diagramadores.” 136 Com um projeto semelhante ao de O Cruzeiro, a revista<br />

Manchete ia se tornando aos poucos superior: “O apogeu da Manchete coincidiu com o<br />

declínio de O Cruzeiro e com a transferência de dezessete jornalistas deste periódico para a<br />

Manchete, em 1958, por divergirem da postura ética do proprietário. 137 ”<br />

133<br />

Fundado em 1950<br />

por Victor Civita como Editora Abril, o Grupo Abril é hoje um dos maiores e mais<br />

influentes grupos d e comunicação da América Latina. A editora começou com a publicação O Pato Donald<br />

num pequeno<br />

escritório no Centro de São Paulo. Em 1960, num empreendimento inovador e ousado, Victor<br />

Civita resolveu<br />

publicar obras de referência em fascículos. Foi um fenômeno editorial. Ao mesmo tempo, o<br />

crescimento da família Disney e o lançamento de Zé Carioca, em 1961, estimularam os quadrinhos nacionais.<br />

A Abril é responsável pelas publicações Capricho, Quatro Rodas, Placar, Playboy, Vip e Veja, hoje a maior<br />

revista do país e a quarta maior revista semanal de informação do mundo. In: www. abril.com.br.<br />

134<br />

A Bloch foi fundada por Adolpho Bloch, em 1952. Bloch, anteriormente, chegou atrabalhar na Rio<br />

Gráfica, de Roberto Marinho. O grupo possuiu duas gráficas, editora e distribuidora de livros didáticos,<br />

fábricas de tinta, revistas, entre elas Desfile, Fatos e Fotos e Ele e Ela, emissoras de rádio e TV, que<br />

formavam a Rede Manchete. Ele sobrevive até o ano de 2000. Entre suas principais publicações está a revista<br />

Manchete e Jóia, uma publicação que servia basicamente aos produtos da multinacional Rhodia. “(...) Em<br />

1979 com uma receita operacional de Cr$ 1 bilhão 179 millhões a Bloch Editores apresentava um balanço de<br />

crescimento de vendas de 7,4% (acima da mediado setor 6,3 %) (...)”. In: Governo concede TVs aos grupos<br />

Bloch e Sílvio Santos. 1° Caderno. JORNAL DO BRASIL. 20 de março de 1981, p.15.<br />

135<br />

ANDRADE, Ana Maria Ribeiro de; CARDOSO, José Leandro Rocha. Aconteceu, virou manchete. In:<br />

Revista Brasileira História, São Paulo, v. 21, n. 41, 2001. Disponível em:<br />

<br />

Acessado em 10 de outubro de 2006.<br />

136<br />

BUITONI, Dulcilia Helena Schroeder.<br />

Op cit, p.87.<br />

137<br />

ANDRADE, Ana Maria Ribeiro de. CARDOSO, José Leandro Rocha. Op cit, p. 2.<br />

68


A Editora Abril lançou também, em 1958, a Capricho, que vai apostar inicialmente<br />

em um gênero feminino nascente: as fotonovelas. Sua divulgação foi bastante estruturada<br />

sob a direção<br />

do publicitário J.Thompson:<br />

“Nos primeiros números, as seções fixas, além das fotonovelas,<br />

são: contos, psicologia, moda e beleza, vida e atualidades, fatos reais e<br />

variedades. As matérias sempre muito curtas – a maioria de meia página<br />

–, “cortam” as fotonovelas, como se fossem uma “pausa para o<br />

descanso”, evidenciando que a fotonovela ocupa lugar de destaque na<br />

ordem de prioridade interna.” 138<br />

Na década de 1950 a revista Seleções, uma adaptação da Reader´s Digest, norte-<br />

americana, existente desde 1942, engrossa os concorrentes de O Cruzeiro: “(...) pesquisas<br />

feitas pelo ibope, como realizada em 1950, mostram que Seleções era a principal<br />

139<br />

concorrente de O Cruzeiro (...).” Ela contava com poucas ilustrações e o tom dos textos<br />

era crítico, ao passo que a revista de Chateaubriand era essencialmente ilustrada, dotada de<br />

um tom mais<br />

descontraído. Seleções era a marca de um imperialismo crescente no país:<br />

“Não é segredo para ninguém que a política editorial de Seleções do Reader´s Digest é<br />

ditada dos EUA (...) são os americanos que orientam intelectualmente ambas<br />

publicações.” 140<br />

A má administração e desorganização dos Diários Associados, juntamente com a<br />

concorrência que se fortalece, fazem o grupo entrar em um período de decadência,<br />

culminando com a perda da concessão da rede Tupi de TV em julho de 1981. Outros<br />

contratos de concessão são assinados para ocuparem o lugar da antiga rede de TV: “Os<br />

contratos de concessão dos canais de TV da antiga Tupi foram assinados (...) Eles<br />

138<br />

CASTRO, Ana Lucia. Revistas femininas: aspectos históricos, produção e usos sociais. Dissertação de<br />

mestrado, São Paulo, 1994, p. 59.<br />

139<br />

MIRA, Maria Celeste. O leitor e a banca de revista: a segmentação da cultura no século XX. São Paulo:<br />

Olhos D´água/ FAPESP,<br />

2001, p.27.<br />

140<br />

SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Graal, 1977, p.456.<br />

69


possibilitam o surgimento de duas novas redes nacionais transmissoras de imagens: a SBT<br />

a Manchete (...).” 141<br />

e<br />

Os Diários Associados hoje editam jornais importantes, como O Estado de Minas<br />

(MG), O Jornal do Commércio (RJ), o Correio Brasiliense (Brasília), O Diário de<br />

Pernambuco (Recife), entre outros. Controla emissoras de rádio como a Tupi AM (RJ), a<br />

Guarani FM (BH), e de TV, como a Alterosa (BH) e TV Clube (Recife, Pernambuco),<br />

entre outros. Hoje os Associados são controlados por um grupo acionário, de propriedade<br />

dos funcionários mais proeminentes<br />

das empresas. Mesmo tendo enfrentado um período<br />

difícil, o grupo é, até os dias de hoje, um grande império das comunicações, que controlou<br />

mais de 100 jornais, revistas, estações de rádio e TV, agências de notícias. As principais<br />

publicações da imprensa pertenciam<br />

ao grupo, entre elas o grande fenômeno editorial O<br />

Cruzeiro. Foi uma empresa<br />

pioneira no campo das comunicações, pertencendo a um<br />

tempo em que a televisão<br />

não era a realidade geral, lançando-se na difícil tarefa de integrar<br />

o Brasil de norte a sul.<br />

141 Contratos de concessão de canais<br />

agosto de 1981, p. 36.<br />

são assinados. In: Folha Ilustrada. FOLHA DE SÃO PAULO. 20 de<br />

70


2.2 O Cruzeiro: a revista dos “ arranha-céus”<br />

A revista O Cruzeiro foi um marco na imprensa<br />

nacional. O primeiro número<br />

chegou às bancas em 05 de dezembro de 1928. Seu lançamento literalmente parou a então<br />

maior e mais importante avenida<br />

do Rio de Janeiro: a Rio Branco. Uma chuva de papel,<br />

que estava sendo atirada do alto<br />

dos edifícios, cobria as ruas, chamando as pessoas a<br />

comprarem a publicação: “ (. ..) Compre amanhã O Cruzeiro, em todas as bancas, a revista<br />

contemporânea dos arranha-céu<br />

O Cruzeiro tinha um projeto<br />

audacioso para a época:<br />

“ (...) Cruzeiro de Chateaubriand era uma revista com papel de<br />

melhor qualidade, repleta de fotografias, contaria com os melhores<br />

articulistas<br />

e escritores do Brasil e do exterior, e assinaria todos os<br />

serviços estrangeiros de artigos e fotografias (...) seria semanal.<br />

Com<br />

tiragem de<br />

50 mil exemplares (...) que circulariam em todas as capitais e<br />

prin pais<br />

cidades do Brasil.” 143<br />

ci<br />

No lançamento da publicação,<br />

a tiragem passa dos 48.000 exemplares, custando em<br />

to rno de 1$000, o exemplar.<br />

s.” 142<br />

A revista era de variedades,<br />

pois abordava diversos assuntos e seu público-alvo era<br />

a mplo: “O Cruzeiro trazia um pouco<br />

de tudo e se dirigia a todos, homens, mulheres, jovens<br />

ou não, longe da preocupação h oje obrigatória de descobrir preferências de cada um,<br />

seus<br />

gostos, expectativas ou estilo de vida. Era<br />

a revista da família brasileira.” 144<br />

Ela foi a primeira revista ilustrada a circular nacionalmente e foi, durante muito<br />

tempo, a mais lida: “Quando O Cruzeiro atingiu a sua fase de maior sucesso, era uma<br />

142 NETTO, Accioly. Op cit, p. 36.<br />

143 MORAIS, Fernando. Chatô: o rei do Brasil. São Paulo: Cia das Letras, 1994, p. 178.<br />

144 MIRA, Maria Celeste. Op cit, p. 13.<br />

71


O Cruzeiro reunia assuntos<br />

diversos, agradando à homens e<br />

mulheres. Foi uma tentativa de<br />

integração nacional de um país,<br />

ainda, naquele período,<br />

dominado<br />

pelo localismo. Pretendia ser a<br />

porta-voz de toda a modernidade.<br />

Fig. 25 a. Capa O Cruzeiro, feita<br />

por Alceu Penna. 24 de dezembro<br />

de 1938<br />

Fig. 25<br />

b. Capa O Cruzeiro<br />

inaugural.<br />

05 de dezembro de 1928<br />

revista essencialmente<br />

eclética, destinada a ser lida por um<br />

público diversificado,<br />

de todas as classes sociais, incluindo<br />

homens e m<br />

O Cruzeiro se encaixava<br />

no projeto audacioso dos<br />

Diários Associados<br />

de integrar o Brasil através da<br />

imprensa,<br />

resgate à<br />

ulheres.” 145<br />

compartilhando, durante o Estado Novo, do<br />

identidade nacional. Realmente, noticiou<br />

acontecimentos em diversas regiões do país, como<br />

Pará,<br />

Rondônia, entre outros estados. A revista normalmente<br />

dava import ância, por exemplo, a toda produção nacional<br />

de destaque,<br />

como Carmen Miranda, que ganhou diversas<br />

reportagens<br />

na revista durante o período de sua carreira<br />

meteórica. Em uma reportagem de 03 de agosto de 1957,<br />

intitulada<br />

“A Arte Moderna do Brasil em Buenos Aires”,<br />

destaca-se o orgulho de terem expostas na Argentina obras<br />

de artistas nacionais renomados, como Heitor dos Prazeres<br />

e Di Cavalcanti: “O público e críticos de arte argentinos<br />

puderam apreciar de perto as telas, os desenhos, as<br />

esculturas dos mestres das artes plásticas do Brasil.”<br />

Entretanto, mesmo sendo recebida como uma<br />

revista com “a cara do Brasil”, ela mostrou, na prática, mais os eventos relativos ao Rio de<br />

Janeiro, o modelo cultural dominante: “Ao mesmo tempo em que O Cruzeiro mostra o<br />

Brasil para o Brasil permeia os entendimentos dos leitores a fim de ajustá-los à visão de<br />

mundo moderno veiculada pela própria revista.” 146<br />

14 5<br />

NETTO, Accioly.Op cit, p. 123.<br />

72


O Cruzeiro prestou bastante atenção ao seu<br />

público feminino leitor, especialmente após a<br />

entrada de Accioly Netto, abordando receitas<br />

culinárias e matérias sobre o cinema norte<br />

americano.<br />

Fig.<br />

26 a. Coluna Lar doce Lar: Mais salgadinhos<br />

de salsichas. Assinada por Thereza Penna, irmã de<br />

Alceu, no O Cruzeiro. 13 de dezembro<br />

de 1958.<br />

Fig. 26 b. Reportagem O Cruzeiro: Vivi!. Sobre<br />

a<br />

atriz norte-americana Hedy Lammar. 05 de<br />

dezembro<br />

de 1938.<br />

intitulada<br />

“Última página”.<br />

Em seus primeiros números, tinha uma<br />

característica curiosa: ao lado das reportagens,<br />

havia o tempo necessário para lê-las:<br />

“Assim, para ler a entrevista com o<br />

presidente de Portugal, Oscar Carmona, o leitor iria<br />

precisar de treze minutos e vinte segundos. O conto<br />

‘Salva pelo amor’ demandaria um tempo maior: 26<br />

minutos e vinte segundos. A reportagem sobre a<br />

realização do filme Helena de Tróia, da Metro<br />

147<br />

Goldwyn Mayer, dez minutos exatos.”<br />

Com um projeto arrojado, a publicação<br />

contava<br />

com muitas contribuições de peso,<br />

desde o setor de ilustrações, com Anita Malfati<br />

e Di Cavalcanti, além de nomes literários, como<br />

Manuel Bandeira, Mário de Andrade, Murilo<br />

Rubião e Graciliano Ramos. Raquel de Queiroz<br />

assinava, no final da edição, uma crônica,<br />

O conteúdo da publicação era variado. Havia desde colunas sociais, seções de moda<br />

(em sua<br />

maioria, feitas por Alceu Penna), reportagens sobre o Brasil e o exterior, até<br />

mesmo culinária. Curiosamente, é Thereza Penna a responsável, durante um bom tempo,<br />

pela coluna de culinária da revista Lar Doce Lar, que teve como antecessora Helena<br />

146<br />

URSINI, Leslye Bombonato. A revista O Cruzeiro na virada da década de 1930. Dissertação mestrado.<br />

Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 2000, p. 53.<br />

147<br />

BARBOSA, Marialva. O Cruzeiro: uma revista síntese de uma época da história da imprensa brasileira.<br />

São Paulo, 2002, p.6. Disponível em:<br />

http://www.eca.usp.br/alaic/material%20congresso%202002/congBolivia2002/trabalhos%20completos%20B<br />

olivia%202002/GT%20%207%20%20Juan%20Gargurevich/marialva%20Historia%20da%20comunicacao.d<br />

oc. Acessado em 10 de outubro de 2006.<br />

73


As seções de humor ficaram imortalizadas<br />

por talentos como Péricles<br />

e Millôr<br />

Fernandes, que salientaram a característica<br />

marcante da publicação:<br />

oferecer<br />

diversidade, mas com conteúdo.<br />

Sangirardi: “São tantas as variedades de<br />

salgadinhos que se podem fazer com salsichas, que<br />

podemos assegurar que as receitas chegam a<br />

centenas. É também um ingrediente que quase<br />

sempre se tem em casa, servindo para o<br />

enriquecimento de qualquer ‘menu’ (...).” 148 O<br />

cinema era uma pauta constante na revista. Havia a<br />

seção “Cinelândia”, assinada por Pedro Lima, que<br />

se dedicava às fofocas do meio, noticiando a vida<br />

das estrelas como Judy Garland e Greta Garbo.<br />

As seções de humor se tornariam célebres<br />

pelas mãos de talentos como Millôr Fernandes em<br />

“O Pif Paf” e Péricles de Andrade Maranhão no<br />

“Amigo da Onça”: “Em 06 de junho de 42, Péricles<br />

já estava na empresa. Tinha 17 ano s. Passou<br />

a fazer<br />

Fig 27 a. O Pif Paf. Seção<br />

de humor,<br />

assinada por Millôr Fernandes, em O<br />

Cruzeiro. 17 de outubro de 1959.<br />

dupla com Millôr, no Poste Escrito e no<br />

Fig 27 b. O Amigo da Onça. Seção de<br />

humor assinada por Péricles, em O<br />

Cruzeiro.<br />

11 de janeiro de 1964. personagem Oliveira, O trapalhão – um português<br />

para variar – antecessor de O Amigo da Onça, que logo o consagraria.” 149<br />

A revista promovia, também, edições especiais em datas comemorativas, como<br />

Natal e carnaval, alavancando enormes vendagens: “O número de Natal, por exemplo, era<br />

sempre uma edição luxuosa, com algumas páginas impressas em papel especial (cartolina e<br />

papel couchê), muitas vezes com tarjas na cor prata.” 150<br />

148<br />

Coluna “Lar doce lar”. “Mais salgadinhos de salsichas”. Thereza Penna. In: O CRUZEIRO. 13 de<br />

dezembro 1958.<br />

149<br />

CARVALHO, Luiz Maklouf. Cobras criadas: David Nasser e O Cruzeiro. São Paulo: <strong>Senac</strong>, 2001, p. 57.<br />

150<br />

NETTO, Accioly.<br />

Op cit, p.136.<br />

74


No início dos anos 1930, O Cruzeiro nem bem nascia e já perdia fôlego. Em 1933,<br />

Accioly Netto assumiria o controle<br />

da redação no sentido de reestruturar a revista, usando<br />

todos os recursos, inclusive a pirataria<br />

151 : “Como não há dinheiro, vale até inventar, criar<br />

fatos para justificar as imagens.<br />

O próprio Accioly Netto escreve uma coluna nesse<br />

formato com o pseudônimo de Marius<br />

Swenderson, ‘o correspondente de ao Cruzeiro em<br />

Hollywood’.” 152 A passagem da coluna de Swenderson evidenciava que O Cruzeiro estava<br />

de olho nos padrões internacionais: “Foi sem dúvida, o magazine que criou o moderno<br />

tipo<br />

de beleza feminina. A grande revista, com<br />

as exigências da publicidade decorativa, dignas<br />

de seu apuro gráfico (...).” 153<br />

A partir da década de 1940,<br />

observando os esforços de reformulação, a revista<br />

começa a se reerguer:<br />

“(...) foi a partir de 1940 que a revista incorporaria o padrão de qualidade<br />

das publicações internacionais, incluindo, desde então, nas suas primeiras<br />

página s, um<br />

detalhado expediente, em que se podia constatar a<br />

especialização<br />

dos seus serviços em vários departamentos, nos moldes<br />

154<br />

das famosas<br />

revistas Life, Look, Paris Match e outras.”<br />

A publicidade da revista<br />

também<br />

sofreu mudanças. A partir de 1933, quem<br />

ass umirá o posto é J.Thompson,<br />

angariando verbas consideráveis para a publicação. Em<br />

1951 uma comitiva<br />

formada por Accioly Netto, Alceu Penna e outros visitou as redações<br />

das<br />

principais revistas norte-americanas,<br />

a fim de se atualizarem e trazerem práticas<br />

151<br />

O Cruzeiro conseguia fotografias para preencher suas páginas junto às agências estrangeiras como a<br />

Atlantic Photo Berlim e a Consortium Paris e, possivelment e, junto à própria editora da revista a Empresa<br />

Gráfica Cruzeiro. In: URSINI, Leslye Bombonato. Op cit, p.53<br />

152<br />

JUNIOR, Gonçalo. Alceu Penna e as <strong>Garotas</strong> do Brasil: moda e imprensa 1933/1980. São Paulo: Clube<br />

dos Quadrinhos, 2004. p. 36.<br />

153<br />

“Cover Girl: Como a revista ilustrada criou um novo tipo de beleza feminina”. In: O CRUZEIRO. 6 de<br />

janeiro de 1945, p. 59-64.<br />

154<br />

MAUAD. Ana Maria. Sob o olhar: um exercício de análise da fotografia nas revistas ilustradas cariocas,<br />

na primeira metade do século XX. In: Anais do Museu Paulista v. 13, número 001. São Paulo,<br />

2005.<br />

Disponível em: http://redalyc.uaemex.mx/redalyc/pdf/273/27313105.pdf.<br />

Acessado em: 10 de outubro de<br />

2006, p. 24<br />

75


O direcionamento feminino da<br />

publicação ficava evidente com as<br />

colunas regulares de beleza e<br />

comportamento, que auxiliavam<br />

com dúvidas tanto de mulheres<br />

solteiras como das casadas.<br />

Fig 28 a. Coluna Elegância e<br />

beleza. Assinada por Elza<br />

Marzullo, O Cruzeiro. Destacava<br />

os milagres da boa maquiagem e<br />

dicas para não engordar. 06 de<br />

julho de 1957.<br />

Fig 28 b. Coluna De mulher para<br />

Mulher. Assinada por Maria<br />

Teresa, em O Cruzeiro. Destacava<br />

“a arte” de agradar os homens. 27<br />

de julho de 1957.<br />

inovadoras<br />

para a revista brasileira. Após um início<br />

difícil,<br />

O Cruzeiro finalmente se recupera: “Tornou-se<br />

uma<br />

das revistas de maior vendagem na história do país,<br />

quanto<br />

mais para sua época. Saiu inicialmente com 50<br />

mil exemplares, passando dos 700 mil na edição histórica<br />

sobre o suicídio<br />

de Vargas.” 155 Em 1949 a tiragem era de<br />

300.000<br />

e, em 1955, pulava para 630.000. 156<br />

variedades,<br />

mas, no decorrer do seu projeto de<br />

reformulação,<br />

o segmento feminino ganhou maior<br />

destaque:<br />

“(...) dedica também ao público feminino a<br />

seção<br />

Carta de Mulher, onde publicam correspondências<br />

das<br />

leitoras (...).” 157 A coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”,<br />

surgida<br />

em 1938, atraiu o público feminino, levando as<br />

mulheres<br />

a acompanhar a moda e os modos dessas<br />

figurinhas.<br />

presentes,<br />

aproximando-se das mulheres com um tom de<br />

conselho.<br />

Havia a coluna “Elegância e Beleza”, de Elza<br />

Marzullo: “Para realizar os mesmos milagres, você<br />

precisará<br />

O Cruzeiro era, originalmente, uma revista de<br />

As colunas de etiqueta e beleza se faziam<br />

de um bom espelho de aumento, um olho<br />

analítico e tudo o que chamamos de maquilagem.” 158 A revista contava, também, com “De<br />

mulher para mulher”, de Maria Teresa: “Quando uma moça deixa de gostar de um rapaz<br />

155<br />

MIRA, Maria Celeste. Op cit, p. 23.<br />

156<br />

HONS, André de Seguin dês. Lê Brésil. Presse et histoire 1930-85. Paris: L' Harmattan, p.28.<br />

157<br />

BARBOSA, Marialva. Op cit, p.8.<br />

158<br />

Coluna “Elegância e Beleza”. In:<br />

O CRUZEIRO.06 de julho de 1957. Sem paginação.<br />

76


Alceu Penna emprestou a sua<br />

versatilidade em contos e editoriais na<br />

revista. As novidades em moda eram<br />

devidamente explicadas, com textos que<br />

auxiliavam as leitoras a montar as peças.<br />

Fig. 29 a. Conto Bahia de Gilka<br />

Machado, ilustrado por Alceu Penna,<br />

em O Cruzeiro. 08 de outubro de 1938.<br />

Fig. 29 b. Portifólio Modas, em O<br />

Cruzeiro. Assinado por Alceu Penna.<br />

Moda norte americana, B. Altaman &<br />

Co, 5 ª Avenida. 17 de julho de 1943.<br />

que a ama, ou mesmo quando o amou apesar da ternura<br />

que ele lhe dedica, deve ser franca.” 159 Havia também<br />

uma coluna de etiqueta social, assinada por Emily Post<br />

– um provável pseudônimo –, em que Alceu Penna<br />

assinava ilustrações, no final da década de 1940.<br />

Accioly Netto relembra do período de<br />

reestruturação<br />

da revista, assim como o que foi<br />

explorado nesse projeto: “Explorou bastante a figura<br />

feminina em diferentes situações, nas festas da alta<br />

sociedade ou nos desfiles de moda que se realizavam<br />

periodicamente no Goldem Room do Copacabana<br />

Palace.” 160 Percebe-se um intenso colunismo social,<br />

que não deixava de ser um chamariz para as mulheres,<br />

atraindo-as pela atmosfera de sonho e a possibilidade<br />

de espiar o que as “famosas” estavam usando. Havia as<br />

colunas sociais “G de A”, “O Jockey Club Mundano”,<br />

além da seção “Spot Light”, que cobria, sobretudo,<br />

acontecimentos e celebridades do teatro, entre outros.<br />

Essa era assinada por Crock, pseudônimo de Accioly<br />

Netto.<br />

Entre todos os profissionais que trabalharam em<br />

O Cruzeiro, Alceu Penna ocupou um lugar especial. Accioly Netto recorda: “(...) Alceu<br />

Penna, ele que foi um dos responsáveis pelo enorme sucesso da revista, com a qual<br />

159<br />

Coluna “De mulher para mulher”. In: O CRUZEIRO. 27 de julho de 1957. Sem paginação.<br />

160<br />

NETTO, Accioly. Op cit, p.48.<br />

77


161<br />

colaborou durante nada menos que 28 anos.” Ziraldo, que também trabalhou na<br />

publicação, relembra da importância do ilustrador:<br />

“A equipe de jornalistas, repórteres,<br />

ilustradores e humoristas de O Cruzeiro criaram vários mitos naqueles tempos – que não<br />

vão muito longe. Não tenho, porém, conhecim ento da história da nossa imprensa, de<br />

nenhum outro artista que tenha influenciado, com seu trabalho,<br />

o comportamento de toda<br />

uma geração (talvez só o Pasquim, com seu conjunto<br />

de colaboradores, tenha conseguido<br />

isto, alguns anos mais tarde) (...).” 162<br />

Millôr Fernandes, além de ter contribuído com<br />

os textos da coluna, auxiliou na arte-<br />

final das “<strong>Garotas</strong>”:<br />

“Eu achava Alceu um<br />

gênio, acompanhando seu desenho no O<br />

Cruzeiro e também no O Jornal (...) Trabalhamos anos dia a dia lado a<br />

e medo, comecei a passar algumas horas, duas<br />

fundo de seus desenhos. Não foi<br />

po de encantamento e medo.<br />

Você não sabe o<br />

tudo,<br />

inapelavelmente.” 163<br />

lado (...) Foi aí que, cheio d<br />

ou três vezes por semana, enchendo o<br />

muito tempo, mas foi tem<br />

pavor que eu tinha de errar<br />

Se O Cruzeiro foi importante na carreira de Alceu Penna, a recíproca é ainda mais<br />

verdadeira. Ele ilustrou a tradicional coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”, uma<br />

das principais<br />

atrações<br />

da revista, assim como contos, até o final da década de 1930, em quase todas as<br />

edições, como “O Casal Solteiro”, em 23 de agosto de 1947, de Mayse Greig. Além disso,<br />

Alceu Penna ilustrou colunas, como “Spot Light”, assinada por Crock e produziu tanto o<br />

texto como a ilustração de sugestões de beleza como na reportagem “Cabelos mais curtos”,<br />

em 04 de outubro de 1941: “Cabelos curtos! Foi o grito que a revista norte-americana<br />

Vogue lançou, no princípio da estação, para revolucionar o mercado<br />

de penteados.” Na<br />

161<br />

NETTO. Accioly. Op cit, p.125.<br />

162<br />

Apresentação do catálogo da exposição “<strong>Garotas</strong> do Alceu”, realizada em julho de 1983, no Palácio das<br />

Artes.<br />

163<br />

MILLÔR. Fernandes. Apresentações. Rio de Janeiro: Record, 2004, p.31.<br />

78


Nos anos 1950, sobretudo, os editoriais fotografados<br />

acompanhados de textos do ilustrador eram freqüentes.<br />

Fig. 30 a. Reportagem sobre os lançamentos da Maison de<br />

Christian Dior, de Alceu Penna, para O Cruzeiro. 28 de<br />

agosto de 1957.<br />

Fig. 30 b. Reportagem sobre a coleção de Lanvin Castillo,<br />

inspirada no Japão, de Alceu Penna, para O Cruzeiro. 03 de<br />

agosto de 1957.<br />

década de 1960, Alceu Penna também<br />

assinou reportagens, com boas<br />

fotografias, sobre como fazer enfeites de<br />

Natal.<br />

No setor de moda da revista, o<br />

ilustrador se tornou uma referência. A<br />

coluna “<strong>Garotas</strong>” já o tinha tornado<br />

conhecido, aproximando-o do universo<br />

regulamente,<br />

a seção de moda<br />

“Portifólio<br />

Modas”, a partir da década de 1940. Nela eram propostos modelos variados,<br />

informais, mais adequados<br />

ao espaço doméstico: “Bergdorf criou e Alceu desenhou os três<br />

modelos que estampamos em nossa página. São três maravilhosas sugestões, não apenas<br />

quanto ao estilo, mas também quanto à combinação das cores.” 164<br />

feminino e, além disso, havia<br />

acumulado no seu currículo muitas<br />

viagens como correspondente de O<br />

Cruzeiro para Europa e EUA, cobrindo<br />

os principais desfiles.<br />

para diversas ocasiões, desde vestidos de noite a trajes para o dia-a-dia.<br />

Alceu Penna assinava,<br />

Em editoriais ilustrados, divididos por temas diversos (estampados, moda praia,<br />

baile, etc...), ele sugeria usos e cores apropriadas para o país, algo, na época, pouco usual.<br />

No editorial “Lar”, em 28 de setembro de 1946, Alceu Penna dava dicas para modelos<br />

164 Seção modas. “O Lar”. In: O CRUZEIRO. 28 de setembro de 1946, p.67.<br />

79


Além dessa seção, havia as reportagens<br />

qualidade e em cores. Alceu Penna trazia aos<br />

leitores um texto comentando as novidades e<br />

coleções de moda, como a pertinência para<br />

a adoção de certas linhas. Nomes como<br />

Balenciaga, Castillo, Dior eram freqüentes:<br />

“Longe, porém, de parecerem costumes<br />

típicos, os vestidos de Lanvin Castilho são ultraparisienses,<br />

incluindo, apenas esta sugestão<br />

oriental para dar uma graça especial.” 165 É<br />

normalmente assinadas, mas não se tem registro<br />

se provinham de O Cruzeiro ou do<br />

exterior.<br />

O Cruzeiro, em muitos aspectos, tinha<br />

uma dose de nacionalização, seja nos<br />

conteúdos, nas fotografias ou ilustrações, mesmo com a pirataria de fotos e textos vindos<br />

do exterior. As reportagens sobre o Brasil eram freqüentes,<br />

contando com uma cobertura<br />

fotográfica extensa, noticiando diversos locais<br />

e fatos nacionais, muitas vezes, explorando<br />

r egiões distantes da, até então, capital do país.<br />

“É, contudo, O Cruzeiro, que permanece<br />

como o melhor representante<br />

desta tendência,<br />

a que se juntam duas particularidades: o<br />

jornalismo de aventura e a redescoberta do B<br />

beldades do estado, em poses glamourosas e figurino<br />

impecável, evidenciando para todo o<br />

país qu s 167 e não só as cariocas eram belas e chique . Em outra, o estado de São Paulo é<br />

ressaltado em “Inverno no Guarujá”, destacando as belezas da Praia do Guarujá, colocando<br />

que, mesmo no inverno, esse<br />

litoral era movimentado, repleto de rapazes e moças<br />

confraternizando. 168<br />

de moda com fotografias de ótima<br />

importante salientar que as fotografias eram<br />

rasil.” 166<br />

O Nordeste recebeu atenção na reportagem “<strong>Garotas</strong> do Ceará,” que noticiava as<br />

165<br />

Reportagem “Castillo inspirou-se no Japão”. In: O CRUZEIRO. 3 de agosto de 1957. Sem paginação.<br />

166<br />

HONS, André de Seguin dês. Op cit, p. 29<br />

167<br />

Reportagem “<strong>Garotas</strong> do Ceará”. In: O CRUZEIRO.<br />

4 de dezembro de 1948, p. 100-103.<br />

168<br />

Reportagem “Inverno no Guarujá”. In:<br />

O CRUZEIRO. 27 de maio de 1944, p. 36-37.<br />

80


O modelo de nacionalidade propagado por O<br />

Cruzeiro<br />

estava atrelado ao Rio de Janeiro.<br />

Fig 31 a.<br />

Reportagem sobre o concurso Miss Brasil<br />

1957, em que Teresinha Morango era a vencedora. O<br />

Cruzeiro. 06 de setembro de 1957.<br />

Fig 31 b. Reportagem sobre as belezas de<br />

Copacabana. O Cruzeiro. 29 de maio de 1943.<br />

A partir de 1943, entram para<br />

o time<br />

da revista dois nomes que inaugurariam uma<br />

nova forma de fazer jornalismo - David<br />

Nasser e Jean Manzon: “Esse novo método de<br />

abordagem jornalística, em que a fotografia<br />

tem papel essencial, nasceu com as revistas<br />

ilustradas alemãs e francesas, entre o final dos<br />

anos 20 e o começo dos anos 30, e<br />

consolidou-se com o lançamento da revista<br />

americana Life, em novembro de 1936.” 169<br />

Jean Manzon vinha de uma carreira na<br />

revista francesa<br />

Paris Match e espantou-se<br />

com a precariedade dos recursos gráficos de<br />

O Cruzeiro. O francês sugeriu a implantação<br />

da dobradinha, repórter-fotógrafo, muito<br />

comum em revistas estrangeiras.<br />

O par perfeito era David Nasser e, assim, todas as<br />

reportagens começaram a ser assinadas pela dupla.<br />

Essa parceria duraria 15 anos na revista:<br />

169<br />

CARVALHO, Luiz Maklouf. Op cit, p. 63.<br />

170<br />

MORAIS, Fernando. Op cit, p. 419.<br />

“Semanas depois, Manzon está amarrado<br />

a uma espécie de gaiola<br />

improvisada, do lado de fora da fuselagem de um Fockwulfe 160 da FAB<br />

que voa a 180 km/h sobre a Serra do Roncador (...) a reportagem<br />

“Enfrentando os Chavantes” (assim mesmo com ch e não com o correto<br />

x) ganhou 18 páginas inteiras de O Cruzeiro, com fatos jamais vistas de<br />

selvagens atacando a flechadas e golpes de bordura, a poucos metros de<br />

distância, um avião.” 170<br />

81


As reportagens eram quase sempre sensacionalistas e vinham em séries:<br />

“Se o modelo da fotorreportagem introduziu uma nova noção de<br />

tempo por meio de um modo específico de edição de imagens, as<br />

seqüências de fotorreportagens sobre um mesmo tema expandem ainda<br />

mais essa temporalidade, incorporando um atributo característico de<br />

certos tipos de ficção que é a construção em capítulos. Como estratégia<br />

comercial estimulava o consumo da revista e induzia o público a<br />

171<br />

colecioná-la.”<br />

O texto de Nasser era estrondoso e apocalíptico. O que não<br />

sabia, ele inventava,<br />

dando um ar de legitimidade à notícia. As fotos de Manzon auxiliavam o texto de Nasser,<br />

fazendo-o crescer: “Enquadramento perfeito, ângulos novos, closes<br />

de arrepiar, caras e<br />

bocas que pareciam em movimento, um estilo completamente novo se comparado<br />

ao das<br />

fotos da imprensa brasileira incluindo O Cruzeiro.” 172<br />

Já no início da década de 1960, a revista começa a ter prejuízos<br />

consideráveis. “Só<br />

a revista O Cruzeiro acumulava a cada ano um prejuízo de 340 milhões<br />

de cruzeiros (200<br />

mil dólares da época, cerca de 820 mil dólares de 1994).” 173<br />

Muitas estrelas da casa foram saindo, como Manzo n, que se fixou na concorrente<br />

Manchete. A falta de recursos culminou com a descredibilidade<br />

de matérias pagas e<br />

anúncios excessivos: “Um dos problemas que levam ao seu fim é a decisão de exceder o<br />

percentual de anúncios, chegando a 70% do total das páginas. Ao mesmo tempo as<br />

matérias pagas se tornaram quase uma regra (...).”<br />

A publicação encerra as atividades em 1975. Em uma nova tentativa de reerguer a<br />

histórica revista, ela é transferida para Hélio de Bianco. A revista sobrevive até 1980 e,<br />

com ela, encerra-se um importante capítulo na história da imprensa e do Brasil.<br />

171 COSTA, Helouise. Diacuí: a fotorreportagem como projeto etnocida. São Paulo, p.2. Disponível em:<br />

http://www.studium.iar.unicamp.br/17/diacui/diacui.pdf. Acessado em 17 de outubro de 2006.<br />

172 CARVALHO, Luiz Maklouf. Op cit, p. 64.<br />

173 MORAIS, Fernando. Op cit. P. 676.<br />

174 JUNIOR, Gonçalo. Op cit, p. 136.<br />

174<br />

82


2.3 A coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”<br />

Em 19 de novembro<br />

de 1938 surgia a coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu” na revista O<br />

Cruzeiro.<br />

As “<strong>Garotas</strong>” foram anunciadas pela revista como “endiabradas e irrequietas” e<br />

um ícone de uma revista que acompanhava a vida moderna. O título da coluna inaugural<br />

era “<strong>Garotas</strong> da Praia”: “Olha, depois vá dizer que não sou econômica. Fiz um belo maillot<br />

A primeira edição de “As <strong>Garotas</strong>” não poderia ter como fundo outro lugar<br />

senão as praias, ponto de encontro, cada vez mais freqüente dos cariocas.<br />

Fig 32. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu” inaugural, em 19 de novembro de<br />

1938.<br />

e mais este lenço para a<br />

cabeça com meio metro de<br />

seda!” Curiosamente, até a<br />

década de 1960, sobretudo, a<br />

coluna permanecerá na seção<br />

de humor da publicação, para<br />

posteriormente aderir<br />

a uma<br />

seção particular, destinada<br />

aos jovens.<br />

A coluna era<br />

composta por textos e<br />

ilustrações 175 , sendo a relação entre eles próxima: um enriquece e complementa a “leitura”<br />

do outro. As imagens nos mostram “<strong>Garotas</strong>” belas e ousadas, com diálogos à sua altura:<br />

picantes<br />

e atrevidos. Os textos são escritos em tom humorístico e crítico. Às vezes vêm em<br />

versos, com rima, outras, apenas em diálogo. Normalmente, a coluna tinha textos<br />

introdutórios, que contextualizam as situações apresentadas pelas “<strong>Garotas</strong>”.<br />

Os textos da coluna podem ser divididos entre as contribuições<br />

dos seus redatores.<br />

É importante ressaltar que, durante a minha pesquisa, notei que elas são, muitas vezes,<br />

175 A relação entre ilustração e texto será abordada no capítulo 4.<br />

83


irregulares, alternando, em um mesmo período, participações de<br />

redatores diferentes. Os<br />

períodos mais homogêneos quanto às colaborações são<br />

Ladino) e Maria Luiza.<br />

Segundo Thereza Penna, as ilustrações eram criadas<br />

primeiro que os textos. Era<br />

comum Alceu Penna deixar várias prontas, para depois serem<br />

legendadas quando precisava<br />

viajar. (Informação oral novembro de 2006.)<br />

Na coluna, que começa em 1938 e acaba por volta<br />

do começo de 1941, Alceu<br />

Penna divide as participações com Accioly Netto (Lyto). É interessante notar, porém, que a<br />

partir do final de 1939, quando Alceu Penna viaja para os EUA, os textos serão todos dele.<br />

Em 28 de agosto de 1943 Alceu Penna assinava “Na terra<br />

onde mandavam as <strong>Garotas</strong>”:<br />

“Segura só aqui nestes músculos florzinha. Veja como<br />

“<strong>Garotas</strong> Yatching” em 21 de Janeiro de 1939: “Eu francamente<br />

gosto mais de passear de<br />

automóvel, ao luar, porque quando a gasolina acaba, volto<br />

para casa de patins.”<br />

A participação de Millôr Fernandes é composta por<br />

dois momentos, a que ele assina<br />

apenas Millôr, do final de 1942 até o início de 1944, e a assinada por Vão Gôgo, que vai<br />

assina “<strong>Garotas</strong> Vamps” em 27 de janeiro de 1945: “ Um copo de vinho, teu corpo em flor,<br />

as rosas<br />

mais belas do mercado de Omar, eis meu sonho Garota. O teu, porém, não será o<br />

e o pobre fica com medo e amansa que nem um cordeiro.”<br />

dos redatores Edgar Alencar (A.<br />

é forte tua mulher.” Lyto assina<br />

até o final de 1946. Nas duas fases ele divide as participações com Alceu Penna. Vão Gôgo<br />

mesmo. E infelizmente eu sou pobre, pobre, pobre de marré de si.”<br />

A contribuição de Edgar Alencar (A. Ladino) começa no final de 1946, logo após<br />

Millôr Fernandes, e começa a desaparecer no final de 1957. A. Ladino assina “Tática das<br />

<strong>Garotas</strong>” em 13 de maio de 1950: “Se o Carlos banca o matreiro, bato o pé, sacudo o dedo,<br />

84


“As <strong>Garotas</strong>”, pela pouca<br />

idade, se davam ao luxo de se<br />

preocuparem com viagens, rapazes, roupas e o ócio. Curtir a vida<br />

era uma expressão de ordem da coluna.<br />

Fig 33 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: Malas e <strong>Garotas</strong>. Texto<br />

sem referência. 23 de novembro de 1940.<br />

A seguir começam a<br />

aparecer textos de Maria Luiza<br />

Castello Branco. Essa fase,<br />

especialmente, será marcada por<br />

um tom mais conservador,<br />

diferente dos textos anteriores.<br />

Nesse período, Amélia<br />

Whitaker, a Dona Lili, mulher<br />

de<br />

Leão Gondim, diretor de O<br />

Cruzeiro, estava na presidência<br />

da publicação. Ela interferiu em<br />

várias seções, inclusive nas<br />

“<strong>Garotas</strong>”, como assinalou<br />

Accioly Netto: “Mas por<br />

interferência de Dona Lili, elas<br />

passaram a serem feitas pela inexperiente Lia Castello Branco. E as <strong>Garotas</strong> passaram a<br />

falar coisas chatas, sempre em tom de conselho.” 176<br />

Existiram outras contribuições de redatores, que vão aparecer mais em 1944 e 1946.<br />

O irmão de Alceu Penna, Aloysio, será um deles assinando “Pensamentos das <strong>Garotas</strong>” em<br />

26 de fevereiro<br />

de 1944: “As mulheres devem levar, e não serem levadas.” Houve outros,<br />

como João Velho 177 em “A batucada das <strong>Garotas</strong>”, assinando legendas em 12 de fevereiro<br />

de 1944: “Cada vez que você decota um pouco mais o vestido, vem com esta história de<br />

176<br />

NETTO, Accioly. Op cit, p. 82.<br />

177<br />

Não há registros de quem seja João Velho. Possivelmente é um pseudônimo de um redator que colaborou<br />

de forma ocasional na coluna.<br />

85


Hawai...” Milton Brandão 178 será mais um exemplo em “<strong>Garotas</strong> e o horóscopo do mês”,<br />

em 10 de janeiro de 1942: “Se ele nasceu sob aquarius pode ser um bom partido... mas,<br />

parece um ‘salafrarius’ com pinta de ‘distinguido’.”<br />

É interessante que os redatores enfocados neste trabalho produzissem textos mais<br />

interessantes para o público feminino do que a única mulher, de que se tem registro, que<br />

contribuiu como redatora na coluna. Mesmo não pertencendo ao universo das mulheres,<br />

esses redatores<br />

compartilhavam de um modo de escrever diferenciado (a escrita feminina),<br />

que dialogava com as mulheres e cativava até mesmo os homens, como já explorado:<br />

“De uma maneira fundamental, pode-se dizer que (...) a escrita<br />

feminina não ser exatamente a escrita das mulheres, mas estar sempre<br />

relacionada à mulher, seja pelo grande número de mulheres que escrevem<br />

nessa dicção, seja pela evidência com que esse discurso se manifesta no<br />

texto das mulheres, ou ainda pela mulheridade que está implicada na<br />

escrita feminina, mesmo quando é praticada por homens (há sempre aí,<br />

nesse tipo de discurso, uma certa voz de mulher, um certo olhar de<br />

mulher.” 179<br />

A escrita feminina pode ser identificada na coluna pela impressionante sonoridade,<br />

expressada através das rimas, que provocam um ritmo de leitura diferenciado, sensível, em<br />

que a palavra em si é um componente extra do texto: “(...) mais que a história que se vai<br />

contar, mais que o enredo que se desenvolve, importam o som das palavras, a textura de<br />

voz, os contornos do ritmo, os movimentos respiratórios do texto (...).” 180<br />

Paralelamente aos textos particulares, a coluna era caracteristicamente temática,<br />

com títulos definidos, apresentando,<br />

semanalmente, uma diversidade de assuntos como “O<br />

Banho das garotas”, em 31 de janeiro de 1942, “<strong>Garotas</strong> e meditação”, em 28 de julho de<br />

1956, e “<strong>Garotas</strong> em exame”, em 22 de novembro de 1952. Não havia personagens<br />

178<br />

Não há registros de quem seja. Possivelmente é um pseudônimo de um redator que colaborou de forma<br />

ocasional na coluna.<br />

179<br />

BRANCO, Lúcia Castello. O que é a escrita feminina? São Paulo: Brasiliense, 1991, p. 20.<br />

180<br />

BRANCO, Lúcia<br />

Castello. Op cit, p. 22.<br />

86


definidos, ora apresentando os seus nomes<br />

e muitas vezes não. A coluna compunha uma<br />

diversidade de “<strong>Garotas</strong>”: cabelos<br />

“<strong>Garotas</strong>, qual o seu tipo”, em 29 de<br />

agosto de 1942, mostrava a variedade de tipos, entre<br />

os quais destaco a morena: “Descendentes<br />

de várias que vampirizaram o mundo, desde o<br />

episódio da maçã. Nasceu em juiz<br />

de Fora, Belém ou Caxias. Temperamental e imita<br />

Heddy Lammar.”<br />

181<br />

As cores das ilustrações era um outro ponto marcante e diferencial.<br />

Curiosamente Alceu Penna era daltônico.<br />

Thereza Penna conta que tinha que colocar<br />

legendas nas tintas do irmão para ele<br />

não se confundir. (Informação oral extraída em junho<br />

de 2006.) Durante toda a sua carreira,<br />

as cores vivas empregadas em suas criações vão<br />

qualificá-lo como um grande colorista.<br />

É interessante perceber que,<br />

no momento inicial da coluna, o desenho de Alceu<br />

Penna é diferenciado, se comparado aos anos seguintes, especialmente a partir do início da<br />

década de 1940, período em que<br />

ele<br />

vai pela primeira vez aos EUA. As ilustrações das<br />

“ <strong>Garotas</strong>” têm olhos pequenos, muitas<br />

vezes representados por traços, que se assemelham<br />

a um asterisco.<br />

Analisando o c onjunto de sua obra, percebe-se que essa é uma<br />

característica que se repete em outros trabalhos<br />

na época, como nas ilustrações para<br />

figurinos de cassinos e ilustrações diversas feitas na própria revista O Cruzeiro. A partir da<br />

década de 1940, o desenho de Alceu Penna vai se modificando. O rosto das ilustrações das<br />

“<strong>Garotas</strong>” torna-se mais detalhado, os olhos ganham ênfase e contornos maiores, assim<br />

como a boca fica mais evidente.<br />

loiros, morenos, ruivos, curtos, longos, presos, soltos.<br />

181<br />

As cores na coluna serão tratadas, com mais precisão, no capítulo 4, como parte da análise das imagens<br />

das “<strong>Garotas</strong>”.<br />

87


As Gibson Girls inspiraram a coluna<br />

“<strong>Garotas</strong>” e tinham em comum a<br />

maneira<br />

diferenciada, mais ousada de<br />

retratar a mulher.<br />

Fig 34 a. Camille Clifford, atriz,<br />

conhecida por ser uma Gibson Girl.<br />

1905.<br />

Fig 34 b. Ilustração Gibson Girl. 1909<br />

A coluna surgiu de um<br />

pedido de Accioly Netto<br />

a Alceu Penna, para criar as primeiras pin-ups<br />

brasileiras 182 . As ilustrações foram inspiradas nas<br />

“Gibson Girls”, de Charles Dana Gibson, um norte-<br />

americano de Roxbury, Massachusetts. Seus desenhos<br />

fizeram história no final do século XIX e nas primeiras<br />

décadas do século XX. Gibson começou seu trabalho<br />

na Life Magazine, mas chegou a contribuir com outras<br />

revistas, como a Bazzar<br />

e Weekly. Com a criação das<br />

Gibson Girls, teve seu nome alçado ao estrelato:<br />

“Existia um merchandising das Gibson Girls (....).<br />

Livros grandes, ‘álbuns de mesa’, como eram<br />

chamados, pratos de porcelana,<br />

cinzeiros, roupas, capas<br />

de travesseiro, capas de cadeiras, colheres de<br />

lembrança, telas, leques, sombrinhas, todos<br />

estampavam as criações de Gibson.”<br />

182<br />

As Gibson Girls podem ser consideradas os primeiros exemplares famosos de pin ups. Alberto Vargas<br />

(1896 - 1982) e George Petty (1894 -1975) tornaram-se, mais tarde, expoentes do gênero. As pin ups<br />

estamparam pôsteres e calendários, tornando-se populares, entre os soldados americanos, durante a Segunda<br />

Guerra Mundial. Betty Grable ficou famosa nas estampas desses pôsteres, assim como Josephine Backer,<br />

Lauren Bacall, Marilyn Monroe, Kim Novak, entre outras.<br />

183<br />

Artigo “Charles Dana Gibson's elegant drawings captured the spirit of an age”, p. 4. Disponível em<br />

http://www.gibson-girls.com<br />

183<br />

88


Elas se tornaram um ideal de beleza vigente na<br />

época:<br />

“Na virada do século X riedade de indústrias de<br />

músicas, poemas, livros e ilustrações populares que exaltavam a beleza, a<br />

virtude e a vitalidade da garota americ<br />

Chandler Christy and Harrison Fisher<br />

da garota adolescente um ícone<br />

americano.” 184<br />

X, existia uma va<br />

ana. Desenhos de Gibson, Howard<br />

(...) todos contribuíram para fazer<br />

do excepcionalismo e progresso material<br />

As figuras representavam mulheres jovens e ativas:<br />

“As Gibson Girls deram<br />

um novo enfoque no vestir e na moda.<br />

Suas roupas poderiam ser reproduzidas<br />

de forma simples e fácil. Elas<br />

refletiam uma condição prática da mulher. A proliferação das roupas no<br />

estilo Gibson Girl apontava para<br />

uma mulher trabalhadora, tornando esse<br />

estilo disponível nas lojas de departamento, pelos catálogos, refletindo<br />

185<br />

mudanças na indústria da moda.”<br />

Normalmente elas eram ilustradas com roupas impecáveis, na última moda, com<br />

cabelos penteados amarrados no topo da cabeça, bem volumosos, usando enormes chapéus.<br />

A silhueta era curvilínea, com uma cintura marcada e os traços finos e delicados.<br />

Algumas semelhanças são notáveis entre as Gibson Girls e a coluna “As <strong>Garotas</strong> do<br />

Alceu”. Além, claro, de representarem mulheres que<br />

ousavam em moda e comportamento,<br />

os dois exemplares mostravam situações específicas. As Gibsons Girls eram retratadas<br />

tomando um chá da tarde e “As <strong>Garotas</strong>” passeando<br />

em Copacabana, por exemplo. Havia<br />

legendas acompanhando as figuras de Gibson como<br />

“A debutante” e “O dia dos sonhos”,<br />

ambos de 1909, assim como nas “<strong>Garotas</strong>”. Em 1900, “Em qualquer lugar na costa sul”,<br />

184<br />

BRUMBERG, Joan Jacobs. The Body Project: an intimate history of american girls. New York, 1997, p.<br />

21.<br />

185<br />

CRAICK, Jennifer. The face of fashion:<br />

cultural studies in fashion: Londres: Routledge, 1997, p. 74.<br />

89


Assim como as Gibson Girls, as “<strong>Garotas</strong>” tiveram<br />

representantes no mundo real. Damas da sociedade carioca<br />

frequentemente eram apontadas como um exemplo de uma<br />

“Garota”.<br />

Fig 35 a. Reportagem <strong>Garotas</strong> do Alceu, em O Cruzeiro<br />

Desfile “Charme”, para o evento beneficente Providência dos<br />

Desamparados. 30 de outubro de 1948.<br />

Fig. 35 b. Foto desfile Providência dos Desamparados com as<br />

damas da sociedade vestidas de Alceu Penna. 1948<br />

186 JUNIOR, Gonçalo. Op cit, p.56.<br />

mostrava-se um grupo de garotas<br />

sentadas na praia conversando, com<br />

vestidos leves e elegantes, apropriados<br />

para a ocasião.<br />

Clifford, que se encaixavam no padrão<br />

de beleza das ilustrações de Gibson,<br />

sensualidade passam a ser chamadas<br />

de ‘Gibson Girls’.” 186<br />

da alta sociedade, o que levava muitas<br />

delas a serem chamadas de “<strong>Garotas</strong><br />

do Alceu”. Esse aspecto foi<br />

evidenciado pelos desfiles<br />

beneficentes, chamados “Providência<br />

dos Desamparados”, no Copacabana<br />

Palace:<br />

Comumente, mulheres<br />

proeminentes, como a atriz Camille<br />

eram chamadas de Gibson Girls: “O<br />

artista ajuda tanto a popularizar a pin-<br />

up que até as próprias americanas que<br />

se encaixam no seu estilo de<br />

Era comum Alceu Penna fazer<br />

croquis de vestidos para as mulheres<br />

90


“E hoje apresentamos<br />

novamente aos leitores as famosas<br />

“<strong>Garotas</strong> do Alceu”, mas agora em carne e osso. (...) As garotas todas<br />

pertencentes à alta sociedade carioca, estavam ‘belas e delicadas quais<br />

borboletas da primavera’, como<br />

diriam nossos eufóricos cronistas<br />

sociais.” 187<br />

Segundo Thereza Penna, Anna Marina, editora do<br />

Estado de Minas, foi considerada uma representante<br />

das “<strong>Garotas</strong>” em Minas Gerais. A<br />

editora relembra a importância dessas figurinhas:<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu<br />

garotas dos anos 50, modelo<br />

tudo delas: o penteado, a roup<br />

televisão era um sonho, as notícias e<br />

levavam dias para chegar até<br />

do que estava em moda lá fora, processava as tendências e, pioneiro,<br />

criava com seus desenhos um<br />

toda uma geração. Autênticas, as <strong>Garotas</strong> não passaram, continuam na<br />

moda até hoje.” 188<br />

representavam, principalmente para as<br />

de comportamento, de estilo. Copiava-se<br />

a, o savoir vivre. Numa época em que a<br />

fotos do outro lado do mundo<br />

aqui. Alceu Penna recebia as informações<br />

estilo brasileiro. Com isso, influenciou<br />

A beleza das “<strong>Garotas</strong>”, entretanto, se diferencia<br />

tanto das pin-ups quanto das<br />

maior: o delas mesmas.<br />

As ilustrações mostram meninas que usam<br />

Caderno Feminino do jornal<br />

G ibson Girls, especificamente, pois, geralmente,<br />

não é passiva e serve a um objetivo<br />

a beleza e as armas de sedução para<br />

conseguir mimos, namorar quantos rapazes fossem possíveis, enfim, conseguirem o que<br />

querem e fazer o que bem entendem. Elas não estão acostumadas a serem contrariadas:<br />

“Nada mais justo do que respeitarmos os enfados dessas criaturinhas, que são anjos de<br />

189<br />

candura quando não são contrariadas.” A conquista, para as “<strong>Garotas</strong>”, não é passiva. A<br />

beleza é fatal e elas “atacam” sem piedade suas “presas”: “Esta é uma página dedicada a<br />

187<br />

Reportagem “<strong>Garotas</strong> do Alceu” sobre o desfile “Charme”. Providência dos Desamparados. In: O<br />

CRUZEIRO. 30 de outubro 1948, p. 86-89.<br />

188<br />

MARINA, Anna.<br />

Texto manuscrito. Belo Horizonte, 2006.(mimeo). 9 de novembro de 2006.<br />

189<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “Não contrarie as <strong>Garotas</strong>”. Texto A. Ladino. In: O CRUZEIRO. 10 de dezembro<br />

de 1955, p.78-79.<br />

91


As ilustrações de Alceu Penna não economizavam na fofoca,<br />

mas elas podiam! Até aula de moda para as suas fiéis leitoras<br />

elas davam.<br />

Fig. 36.a Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: Cuidado! <strong>Garotas</strong>.<br />

Texto Alceu Penna. 08 de novembro de 1941.<br />

Fig. 36 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> dão aula<br />

de moda. Texto Maria Luiza. 25 de outubro de 1958.<br />

belas, feras, a feras belas e a belas<br />

ferinas. São todas<br />

perigosas, todas<br />

traiçoeiras. Tenham cuidado, portanto,<br />

quando avistarem alguma delas.” 190<br />

É interessante perceber que a<br />

coluna foi além da sua designação. Ela<br />

aproximou-se do gênero da crônica,<br />

pois apresentava fatos do cotidiano<br />

dessas meninas, situações, muitas<br />

vezes, íntimas e mundanas. A crônica<br />

conterá algumas particularidades que<br />

vão ao encontro da coluna: “Focaliza,<br />

via de regra, um tema restrito, em<br />

prosa amena, quase coloquial (...)<br />

graças a isso, estabelece-se uma<br />

atmosfera de intimidade entre leitor e<br />

cronista, que refere experiências<br />

pessoais ou expende juízos originais<br />

acerca dos fatos versados.” 191 Os textos das “<strong>Garotas</strong>” tinham um tom coloquial, como se<br />

elas estivessem conversando intimamente entre si e com o leitor: “O Júlio pensa, que<br />

tonto! Que eu não estou observando, mas ele que vá pensando que a ‘mamãe’ dorme no<br />

ponto!” 192 Situações do cotidiano eram a essência dos assuntos abordados, por exemplo,<br />

190<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “As <strong>Garotas</strong> e as feras”. Texto Alceu Penna. In: O CRUZEIRO. 15 de maio de<br />

1943, p.40-41.<br />

191<br />

PAES, José<br />

Paulo; MASSAUD. Moisés. Pequeno dicionário de literatura brasileira. São Paulo, p.82.<br />

192<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “<strong>Garotas</strong><br />

manjando”. In: O CRUZEIRO. 25 de agosto de 1956, p.58-59.<br />

92


quando as meninas enfrentavam os temidos exames: “Ao professor Ludgero de agradar<br />

tanto me esforço, que ele teria remorso se me sapecar um zero.” 193<br />

A coluna alcançou uma grande popularidade durante os anos de sua veiculação.<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu” chegaram a ser programa na Rede Tupi, uma emissora dos<br />

Associados, em 1941: “Viraram até programa de TV no começo da TV Tupi,<br />

protagonizadas por Lourdinha Bittencourt, Salomé Coteli, Nilsa Magrassi e Solange<br />

França, sob a direção de Paulo Gracindo e patrocinado pelo Jóquei Club Brasileiro.” 194<br />

Durante a minha pesquisa ao acervo de O Cruzeiro, deparei-me com edições<br />

singulares da coluna pelos temas abordados.<br />

“Das <strong>Garotas</strong> para as garotas”, em 29 de<br />

setembro de 1942, mostrava Alceu Penna respondendo a<br />

carinhosamente referidas por ele, também, como suas “<strong>Garotas</strong>”. Não se sabe se foram,<br />

realmente, perguntas de leitoras ou se foram inventadas.<br />

Uma leitora, do Rio de Janeiro,<br />

indagava sobre a atitude indiferente de seu namorado e eis o que elas responderam: “Não<br />

se preocupe com isso! Vá usando a maior quantidade de<br />

‘visgo’ que puder. Em qualquer<br />

caso, porém, lembre-se do provérbio: ‘Não corra atrás de um bonde, nem de um homem.<br />

Há de passar outro depois’.” Se verdadeiras, as perguntas<br />

refletiam a grande referência que<br />

essas figuras representavam para as mulheres da época,<br />

a ponto de recorrerem ao seu<br />

criador para conselhos íntimos.<br />

questões de suas leitoras,<br />

Um outro exemplar curioso<br />

da coluna foi “<strong>Garotas</strong><br />

e as <strong>Garotas</strong> de O Cruzeiro”, em<br />

11 de agosto de 1956, que mostrava a opinião das “<strong>Garotas</strong>”<br />

(ilustrações) sobre a forma em<br />

que eram retratadas em O Cruzeiro: “Apesar dos comentários, às vezes muito ordinários,<br />

aqui não temos rivais. E sempre somos bonitas, mas verdades sejam ditas, mas na vida nós<br />

somos mais.” Essa abordagem aponta para uma figura feminina menos<br />

passiva em relação<br />

193<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. “Exame das <strong>Garotas</strong>”. In: O CRUZEIRO. 22 de novembro de 1958. Sem<br />

paginação.<br />

194<br />

NETTO, Accioly. Op cit, p. 125.<br />

93


à sua representação, no caso pelos redatores da coluna, especialmente, em se tratando, eles,<br />

de figuras masculinas, sobretudo.<br />

Uma edição especial, “<strong>Garotas</strong> na Berlinda”,<br />

em 15 de abril de 1944, mostrava<br />

profissionais importantes dentro da revista manifestando<br />

suas opiniões sobre as figuras de<br />

Alceu Penna. É aparente pelos versos da<br />

seduzidos pelas “<strong>Garotas</strong>”. Eis o que Millôr<br />

dizia: “Ó jovem garota bela, ó bela, jovem<br />

pequena, vossas curvas tentadoras é que vos colocam em cena.” David Nasser já dizia de<br />

outra maneira: “<strong>Garotas</strong> da minha vida, amores<br />

do meu amor... Onde estais, sonhos<br />

perdidos, saudade, sonho sem cor...”<br />

Edições singulares convocando suas leitoras a participar no<br />

esforço de guerra eram apresentadas com muito charme<br />

e poucos<br />

sabiam resistir os seus apelos.<br />

Fig 37 Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> à postos.<br />

Texto<br />

sem referência. 17 de outubro de 1942.<br />

do conflito não será amplamente explorado nas páginas da coluna.<br />

edição que todos da redação já tinham sido<br />

A coluna “<strong>Garotas</strong>”<br />

refletiu, também, momentos<br />

pelos<br />

quais o país estava passando,<br />

como quando o Brasil entra na<br />

Segunda Grande Guerra, em 1942.<br />

“<strong>Garotas</strong> a postos”, em 17 de<br />

outubro de 1942, chamava a<br />

atenção para o período de<br />

sacrifícios, em como cada leitora<br />

poderia ser útil ao país: “Se,<br />

porém, se julga com aptidões<br />

diferentes poderá ingressar ao Corpo de Saúde e Pronto-Socorro, além de tratar dos feridos<br />

em caso de ataque aéreo.” É interessante que, apesar desse exemplar, o racionamento fruto<br />

“As <strong>Garotas</strong>” protagonizaram calendários também, exibidos no último número do<br />

mês de dezembro, sendo muito aguardados. Uma “Garota” a cada mês era apresentada,<br />

94


Os calendários das “<strong>Garotas</strong>” tendiam a ser um pouco<br />

mais maliciosos. O corpo ficava mais à mostra<br />

lembrando bastante as pin-ups.<br />

Fig. 38 a. Reportagem Calendário <strong>Garotas</strong>, em O<br />

Cruzeiro, sobre os bastidores da produção do<br />

calendário . 06 de dezembro de 1952.<br />

Fig. 38 b. Calendário<br />

<strong>Garotas</strong>. Sem data.<br />

com motivos típicos referentes. No mês de<br />

dezembro, por exemplo, os motivos eram<br />

natalinos, no mês de abril, os motivos eram<br />

relacionados à Páscoa, e assim por diante. O<br />

tom<br />

decotes, mostrando<br />

uma boa extensão dos<br />

ups.<br />

bastidores<br />

da criação do calendário:<br />

“Alceu Penna, em seu atelier, desenhando<br />

algumas páginas<br />

do ‘Calendário das <strong>Garotas</strong>’,<br />

servindo de modelo, a bailarina Irene Hozlo, uma<br />

das mais<br />

famosas belezas dos palcos cariocas,<br />

cuja plástica perfeita muito auxiliou o artista na<br />

concepção de seus desenhos.” 195<br />

seu irmão<br />

costumava trabalhar em casa e não<br />

possuía um<br />

2006), fatos que levam a crer que a situação foi<br />

criada para a reportagem. Como a matéria<br />

acima descrita evidenciou, é provável que Alceu Penna tenha se inspirado em belas<br />

registro<br />

que ele tinha uma mulher, em especial, como<br />

modelo.<br />

A coluna sobreviveu até 1964 na revista<br />

das ilustrações era sensual, já que as<br />

figuras apareciam com pouca roupa, com<br />

seus corpos, lembrando os calendários de pin-<br />

A revista O Cruzeiro noticiou os<br />

Na verdade, segundo Thereza Penna,<br />

ateliê (informação oral junho<br />

mulheres<br />

de sua época para desenhar suas “<strong>Garotas</strong>”. Mesmo assim, não se tem um<br />

O Cruzeiro. As “<strong>Garotas</strong>” inspiraram,<br />

durante 28 anos, moças e rapazes do Brasil e deixaram recordações. Talvez elas tivessem<br />

195<br />

Reportagem “Calendário das <strong>Garotas</strong>”. In: O CRUZEIRO. 6 de dezembro de 1952, sem paginação.<br />

95


alcançado tamanha popularidade porque, mesmo não sendo figuras estranhas a suas<br />

leitoras, elas conseguiam estar um pouco à frente delas. “N´O Cruzeiro, ao contrário da<br />

fotografia cuja função era resgatar o presente passando, pode-se dizer que a ilustração ia<br />

onde a fotografia não conseguia: ao passado distante – e idílico – e<br />

presentado como se avizinhando.” 196<br />

a<br />

196 URSINI, Leslye Bombonatto.Op cit, p. 50.<br />

ao futuro, sempre<br />

96


3. O CORPO<br />

E A MODA DAS “GAROTAS DO ALCEU”: UM ESPELHO DO<br />

AMANHÃ<br />

3.1 A moda<br />

e o corpo das “<strong>Garotas</strong>”: um reflexo de transformações<br />

seus<br />

mesmo<br />

A moda e o corpo atuam como um espelho de uma época e revelam um imaginário<br />

específico, estabelecendo uma comunicação com o mundo em que estão inseridos. A<br />

cultura, os costumes, as regras de conduta social, o modo de pensar e agir de uma<br />

sociedade podem ser revelados, por meio das roupas e da maneira com que o corpo é<br />

revelado ou escondido: “(...) as mudanças da moda ligam-se a transformações mais vastas<br />

e completas, do modo de ser, sentir e pensar de uma sociedade (...)” 197 .<br />

Visto como canal de comunicação, o corpo relaciona-se<br />

com a cultura presente e<br />

acontecimentos, absorvendo suas características, através de uma troca<br />

comunicacional: “Os índios Cadúveos, no passado tribal de comunicação oral, concebiam<br />

que um corpo sem pintura é um corpo mudo” 198 . Assim, através dele podemos entender a<br />

cultura de uma sociedade. Segundo Célia Maria Antonacci Ramos: “Com esses gestos, os<br />

homens registram a conquista do corpo como lugar na cultura” 199 .<br />

O<br />

corpo e a moda possuem territórios de múltiplos significados: “O corpo é ao<br />

tempo a coisa mais sólida, mais elusiva, ilusória, concreta, metafórica, sempre<br />

presente e distante: um sítio, um instrumento, um entorno, uma singularidade e uma<br />

multiplicidade”. 200<br />

197<br />

SOUZA. Gilda de Melo e. O espírito das roupas: a moda no século dezenove. São Paulo: Cia das Letras<br />

1987, p. 23.<br />

198<br />

RAMOS. Célia Maria Antonacci. Tatuagem e Globalização: uma incorporação dialógica em tempos de<br />

globalização. In: Corpo Território da Cultura.(Org) BUENO, Maria Lúcia. CASTRO, Ana Lúcia. São Paulo:<br />

Annablume, 2005, p. 98<br />

199<br />

RAMOS. Célia Maria Antonacci. Op cit. p. 91<br />

200<br />

TURNER. Bryan. S. El Cuerpo y la sociedad: exploraciones em teoria social. México: Fondo de Cultura<br />

Econômica. 1989, p. 33<br />

97


Através dos gestos e expressões corporais uma rede de significação não-verbal é<br />

posta em evidência: “O corpo age, põe em ação o gesto, por intermédio da mobilidade, que<br />

amplia significadamente o potencial de significação da linguagem corporal” 201 .<br />

O corpo possui em si uma capacidade de troca de informações com o ambiente que,<br />

não necessariamente, precisa da moda para concretizar. Entretanto, obstante essa<br />

independência comunicacional, tanto o corpo quanto a moda estão intimamente<br />

conectados. A moda adquire expressão através do corpo e vice-versa. Estão ligados e em<br />

constante interação, pois a moda projeta-se no corpo e esse na moda, funcionando como<br />

“parceiros”:<br />

“A Antropologia é rica em estudos que demonstram ser o corpo um espaço de<br />

construção de significados simbólicos, deixando como legado a idéia de que o uso que dele<br />

fazemos, somado ao vestuário, aos ornamentos e pinturas corporais, compõem um universo<br />

no qual inscrevem-se valores e comportamentos”. 202<br />

O corpo e a moda das “<strong>Garotas</strong> do Alceu” pensados<br />

como canais de comunicação,<br />

evidenciam,<br />

em parte, a realidade vivenciada pelas moças contemporâneas à coluna, que<br />

viviam sob o comando de uma sociedade patriarcal. Mesmo refletindo o universo das<br />

leitoras de O Cruzeiro, a coluna, ao mesmo tempo em que se aproxima dessa realidade,<br />

parece dar pistas de certos avanços em direção a uma situação menos conservadora para a<br />

mulher.<br />

Mesmo assim, elas representaram um papel importante no imaginário feminino no<br />

sentido de se tornarem um modelo: “A descrição do indivíduo é a descrição<br />

de seu<br />

ambiente social. Ou seja, o discurso, tanto quanto a roupa ou o próprio indivíduo, traduz<br />

sempre um ato de remissão a uma determinada concepção de ordem social, e é sempre a<br />

201<br />

LURIE, Alison A linguagem das roupas. Rio de janeiro, 1997, p. 71<br />

202<br />

BUENO, Maria Lúcia. CASTRO, Ana Lúcia. Corpo Território da Cultura. Citação da introdução. Op. cit,<br />

p. 10<br />

98


ela que se faz referência, é sempre ela que orienta não apenas<br />

a forma de pensar o mundo,<br />

mas também a forma de pensar a si próprio dentro desse mundo”. 203<br />

No período em que a coluna surgiu o Estado<br />

Novo tentava conformar o país em um<br />

modelo específico voltado ao progresso. Esse direcionamento<br />

exigiu um controle geral sob<br />

as massas e, especialmente, de seus corpos, que<br />

ocuparam posição de destaque nessa<br />

política: “O domínio, a consciência de seu corpo só<br />

puderam ser adquiridos pelo efeito do<br />

investimento no corpo pelo poder: a ginástica, os exercícios, o desenvolvimento muscular,<br />

a nudez, a exaltação do belo corpo (...)”. 204<br />

A prática de esportes que, desde os anos 1920 se tornava<br />

mais freqüente, toma lugar<br />

central no governo de Getúlio Vargas: “Muitas pedagogias<br />

participam desse movimento,<br />

mas a disciplina das massas passa necessariamente<br />

pela do corpo. (...) O esporte define as<br />

norm as de saúde e beleza, instaura competição e auto-realização, desenha temporalidade<br />

racional, autônoma e exemplar, simplifica e unific<br />

O presidente regulamentou o seu ensino<br />

a”. 205<br />

em todo território nacional no início da<br />

década de 1930: “A 18 de abril de 1931, o ensino<br />

secundário sofre reforma, sendo<br />

estabelecida a obrigatoriedade dos exercícios de educação<br />

física para todas as classes (...).<br />

Todos os programas são precedidos de uma orientação metodológica e a que diz respeito à<br />

educação física<br />

específica, a finalidade será ‘proporcionar aos alunos o desenvolvimento<br />

harmonioso<br />

do corpo e do espírito, concorrendo, assim para formar o homem de ação física<br />

e moralmente sadio, alegre e resoluto, cônscio do seu valor e responsabilidade”. 206<br />

203<br />

BERGAMO, Alexandre. Elegância e atitude: diferenças sociais e de gênero no mundo da moda. In:<br />

Cadernos Pagu, Campinas, n. 22, 2004, p.88<br />

204<br />

FOUCAULT. Michel. A Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Graal, 2004, p.146<br />

205<br />

SCHUPUN. Mônica Raisa. Beleza em jogo: cultura física e comportamento em São Paulo nos anos 1920.<br />

São Paulo: <strong>Senac</strong>, 1999, p.12<br />

206<br />

ACCIOLY. Aluízio Ramos. MARINHO. Inezil Penna. História e organização da Educação Física e dos<br />

Desportos. Rio de Janeiro: Batista de Souza, 1956, p.174<br />

99


O esporte possuiu uma dimensão de sociabilidade. “As<br />

<strong>Garotas</strong>” demonstram descontração ao praticar esportes<br />

e um interesse maior além da boa forma: paquerar!<br />

Fig. 39 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Bicicletas e<br />

<strong>Garotas</strong>” em 05 de Agosto de 1946. Texto A. Ladino<br />

Fig. 39 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”:<br />

“<strong>Garotas</strong> e<br />

equitação” em 16 de janeiro de 1943. Texto Millôr<br />

Fernandes<br />

Nesse período e, também,<br />

posteriormente, “As <strong>Garotas</strong>” foram<br />

ilustradas em situações em que<br />

praticavam atividades físicas. Como a<br />

coluna era centrada em figuras juvenis<br />

e, portanto, dinâmicas, é natural que os<br />

esportes encaixassem perfeitamente em<br />

seu estilo de vida.<br />

“<strong>Garotas</strong> e equitação” em 16 de<br />

janeiro de 1943 mostra as ilustrações<br />

dominado a prática da equitação:<br />

“Muitas garotas escrevem-nos<br />

indagando se a equitação é coisa custosa<br />

de aprender. Por esse motivo<br />

resolvemos<br />

instruí-las sobre em que<br />

consiste, na realidade, a arte de montar.<br />

Sigam nossos passos ou, falando em linguagem própria, o nosso trote e aprendam<br />

conosco”.<br />

As atividades físicas tornam-se cada vez mais incentivadas, não apenas pelo lado da<br />

saúde, mas também do bem-estar: “Mas menos do que o fim da vontade de controlar os<br />

corpos, essa exaltação<br />

do bem-estar emerge como uma nova estratégia para legitimá-la.<br />

Pois controlar<br />

o corpo implica agora colocá-lo em movimento muito mais do que cerceá-<br />

lo” 207 .<br />

207<br />

SANT´ANNA. Denise Bernuzzi. Corpo e História. In: Cadernos de Subjetividade. Núcleo de Estudos e<br />

Pesquisas da Subjetividade. Programa de Estudos Pós Graduados em Psicologia Clínica PUC-SP. v 01, nº 02.<br />

São Paulo, 1993,<br />

p. 256<br />

100


O bem-estar, especialmente após a Segunda<br />

Guerra Mundial, passa ser valorizado,<br />

colocando em pauta algo até então inédito em relação aos cuidados corporais - o prazer:<br />

“(...) a apologia do bem-estar – ora traduzido em termos de prazer, ora compreendido como<br />

sinônimo de satisfação pessoal e harmonia entre<br />

o corpo e mente – paralela à galopante<br />

desnaturalização do sofrimento.” 208<br />

Mesmo no período anterior ao pós-guerra,<br />

“As <strong>Garotas</strong>” compartilhavam de uma<br />

relação com os esportes mais fluida, ou seja, para<br />

elas estar em movimento significava um<br />

momento<br />

de descontração. O martírio fruto obrigação<br />

em exercitar-se não aparece, de<br />

forma geral, na coluna.<br />

As ilustrações, por exemplo, combinavam o exercício como uma oportunidade de<br />

paquera,<br />

ou seja, encaravam a situação como uma oportunidade de estar mais visível e<br />

exposta aos olhos do sexo oposto. Os corpos em movimento na coluna apontavam para o<br />

seu desnudamento e a conseqüente exploração da sensualidade através do corpo: “Nunca<br />

houve um homem tão gozado como o Silvinho! Disse que gosta de me ver de bicicleta só<br />

para apreciar as minhas curvas!” 209<br />

É interessante perceber que existiu um lado conservador no incentivo dos esportes<br />

em relação às mulheres durante<br />

o governo totalitário, pois não eram todas as atividades<br />

esportivas<br />

que eram recomendadas ao sexo feminino: “Algumas medidas normatizadoras<br />

em relação ao esporte feminino foram levadas à cabo posteriormente pelo Estado Novo,<br />

como aquelas que vedavam às mulheres a prática de esportes incompatíveis com a sua<br />

natureza” 210 .<br />

Ao examinar<br />

as seções de “As <strong>Garotas</strong>” é possível constatar que elas não<br />

exploravam esportes tradicionalmente exercidos por homens como o futebol. Elas se<br />

208<br />

SANT´ANNA. Denise Bernuzzi. Op cit, p. 256<br />

209<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. Bicicletas & <strong>Garotas</strong>. In: O CRUZEIRO. 05 de Agosto de 1946, p.22 e 23<br />

210<br />

KNIJNIK, Jorge Dorfman. A mulher brasileira e o esporte: seu corpo, sua história. São Paulo: Mackenzie,<br />

2003, p.62<br />

101


As ilustrações não competiam com os homens no esporte,<br />

ao contrário,<br />

preferiam tê-los agarradinho<br />

a elas. .<br />

Fig 40. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> patinando”<br />

19 de janeiro de 1946. Texto Vão Gôgo<br />

limitavam a atividades mais leves como a<br />

na natação,<br />

tação, equitação, patinação ou ciclismo,<br />

co colocando<br />

locando seus corpos em movimento,<br />

se sem,<br />

m, contudo, ferir os preceitos<br />

tra tradicionais<br />

dicionais impostos às mulheres: “Se a<br />

ele elegância<br />

gância e delicadeza eram ‘atributos<br />

fe femininos’<br />

mininos’ altamente valorizados, as<br />

pr práticas<br />

áticas físicas permitidas se restringiam<br />

àq àquelas<br />

uelas que se conciliavam com as idéias<br />

que prevaleciam sobre a natureza fraca do corpo e do sistema reprodutivo femininos”. 211<br />

que prevaleciam sobre a natureza fraca do corpo e do sistema reprodutivo femininos”. 211<br />

Paralelamente à crescente importância dada aos esportes, a moda norte-americana,<br />

ganha cada vez mais espaço, principalmente para a juventude. Esse movimento pode ser<br />

observado, desde os anos 1920 no Brasil, não somente no Rio de Janeiro, mas em São<br />

Paulo: “Na metrópole emergente (São Paulo), estar na moda era era estar sintonizado sintonizado com o<br />

que ocorria em Paris, Londres, e a partir da década de 20, Estados Unidos, cuja influência influência<br />

seria fortalecida pelo cinema. Era preciso afirmar a modernidade imitando os grandes<br />

centros já estabelecidos” 212 centros já estabelecidos” .<br />

212 .<br />

Os EUA ampliam sua influência no Brasil com a “política de boa vizinhança” e ela<br />

se acentua, ainda mais, após a Segunda Guerra Mundial com a Europa devastada. A moda<br />

feminina assiste a uma difusão em larga escala de trajes para esportes e atividades ao ar<br />

livre, privilegiando talentos como Claire Mc Cardell, que inspirará alguns vestidos casuais<br />

das “<strong>Garotas</strong>”.<br />

211<br />

ADELMAN. Mirian. Mulheres atletas: re-significações da corporalidade feminina. In: Estudos feministas,<br />

Florianópolis 11(2): 360, julho-dezembro 2003, p.446. Disponível em:<br />

http://www.scielo.br/pdf/ref/v11n2/19131.pdf. Acessado em maio de 2007<br />

212<br />

BONADIO. Maria Claudia. Moda: costurando mulher e espaço público. Estudo sobre sociabilidade<br />

feminina na cidade de São Paulo 1910-1930. Pré-projeto de Mestrado apresentado ao Departamento de<br />

História da UNICAMP, 1997, p.06<br />

102


“As <strong>Garotas</strong>” mal chegaram a NY e já estavam aflitas para<br />

adquirir a moderna moda das norte-americanas. Essa será<br />

uma influência forte na coluna.<br />

Fig 41. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> & New<br />

York” 19 de janeiro de 1946. 29 de Junho de 1940.<br />

Texto<br />

Alceu Penna<br />

pouco,<br />

começava<br />

a delinear um estilo de vida<br />

adolescente e fizeram roupas com o “visual jovem”<br />

especificamente para essa faixa etária”<br />

213<br />

Após a Guerra o comércio de roupas prontas começa a ser, cada vez mais,<br />

legitimado. Esse movimento abriu definitivamente o mercado da moda para os Estados<br />

Unidos, que desde o século XIX já desenvolvia técnicas para a confecção industrial:<br />

“Depois da 2ª Guerra o poder real da moda produzida em série foi, pela primeira vez,<br />

reconhecido. Somente então a idéia de tirania tornou-se firmemente associada ao design de<br />

roupas elegantes para as mulheres”. 214<br />

As roupas práticas americanas<br />

agradavam à emergente juventude,<br />

devidamente representada pelas<br />

“<strong>Garotas</strong>” que, pouco a<br />

particular, sendo a moda um elemento<br />

importante de identificação: “Os<br />

produtores americanos também<br />

mapearam com precisão o mercado<br />

O cinema e os costureiros norte-americanos ofereciam alternativas em moda e<br />

beleza diferente da tradicional Alta Costura francesa, o que, sem dúvida, vai ao encontro<br />

das idéias de modernidade e progresso tão incorporadas pela revista O Cruzeiro: “Na<br />

verdade, essa idéia de maior variedade, criatividade, originalidade e mesmo liberdade da<br />

moda lançada pelas atrizes americanas também está ligada à ideologia de progresso (...) Os<br />

213<br />

MENDES, Valerie. LA HAYE, Amy. A moda<br />

do século XX: Martins Fontes, 2003, p. 146<br />

214<br />

HOLLANDER. Anne. TORT. Alexandre Carlos. O sexo e as roupas: a evolução do traje moderno.<br />

Rio de<br />

Janeiro: Rocco, 1996, p. 206<br />

103


As roupas preferidas das “<strong>Garotas</strong>” mostravam o corpo e<br />

suas formas. Adeptas da roupa norte americana no dia a dia,<br />

elas aderiram à sua descontração e sensualidade.<br />

Fig 42. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> em<br />

shorts”. 18 de outubro de 1952. Texto A. Ladino<br />

vantajosas quanto à<br />

para a Feira Mundial em New York em<br />

1939,<br />

voltaram a New York para a inauguração da Feira Mundial. (...) Nos primeiros dias, e nas<br />

primeiras semanas, o tempo foi pouco para visitar<br />

os cinemas, os theatros, as estações de<br />

rádio, e, principalmente as casas de modas”. 216<br />

Estados Unidos carregam todas as<br />

conotações de modernidade, permitem<br />

identificações mais<br />

imagem que se faz do futuro.” 215<br />

A coluna “As <strong>Garotas</strong>” desde a<br />

temporada de Alceu Penna nos EUA<br />

demonstravam apreciar bastante<br />

as modas desse país: “Depois de uma<br />

temporada em Washington, as <strong>Garotas</strong><br />

O visual norte-americano das “<strong>Garotas</strong>” foi,<br />

sobretudo, representado pelas calças<br />

cigarretes, que podiam vir acompanhadas de suéteres<br />

e, também, os dos práticos e sensuais<br />

s horts: Em um tempo em que a mulher não gozava<br />

de muita liberdade no vestir e que as<br />

c alças femininas e shorts ainda eram vistos com algumas ressalvas, essas ilustrações, de<br />

fato, faziam escolhas incomuns, mesmo que, aparentemente,<br />

de forma acidental: “Rasguei<br />

as calças na canela pulando um cerca de arame farpado e tive que cortá-la como recurso<br />

extremo.<br />

Agora todas as minhas amigas estão fazendo o mesmo, julgando que se trata da<br />

última moda...”. 217<br />

dos anos<br />

Os shorts, apesar de usados para práticas esportivas desde os anos 1930, só no final<br />

1960 começam a aparecer nas ruas efetivamente: “O short tomou conta das<br />

<strong>Garotas</strong>. Ou melhor, as <strong>Garotas</strong> tomaram conta do short. Às vezes o short deixa de sê-lo<br />

215<br />

SCHUPUN. Mônica Raisa. Op cit, p. 127<br />

216<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. <strong>Garotas</strong> & New York. In: O CRUZEIRO. 29 de Junho de 1940, p.22 e 23<br />

217<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”.<br />

As <strong>Garotas</strong> descansam. In: O CRUZEIRO. 18 de março de 1944, p.46 e 47<br />

104


para se transformar em calças compridas para o cinema e os passeios de auto, ou ‘pesca-<br />

siris’ para os piqueniques e bailaricos campestres. O short ajuda o movimento das <strong>Garotas</strong><br />

e por isso mesmo elas o tem como sua indumentária preferencial...” 218<br />

elegância. A alternância de<br />

influências será uma característica constante nos anos de<br />

vigência<br />

da coluna.<br />

A moda austera no período do conflito não chegou a afetar<br />

em muito o visual das “<strong>Garotas</strong>”, que continuavam a<br />

aparecer com roupas coloridas e visual diversificado.<br />

Apesar da distancia,<br />

percebe-se elementos muito usados no<br />

período com os<br />

chapéus.<br />

Fig.43. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> e os<br />

chapéus<br />

novos”. 13 de maior de 1939. Texto Alceu Penna<br />

formais.<br />

A coluna, mesmo ostentando as linhas da moda dos EUA, também privilegiava o<br />

bom gosto francês. Essa moda, ao contrário da norte-americana, seguiu linhas distintas de<br />

O corpo e a moda da mulher<br />

francesa, especialmente durante o<br />

governo de Vichy valorizavam a<br />

seriedade e discrição: “(...) a mulher se<br />

afasta da ‘masculinização dos costumes<br />

femininos’, cobiçada antes da Guerra<br />

pela adoção dos cabelos curtos ou do<br />

cigarro. Escapando a esse ‘perigo’ por<br />

uma atitude julgada saudável, ela<br />

redescobre (...) seu lugar no lar, seu<br />

papel de mãe. Seu corpo se adapta a<br />

essa função natural redescoberta... Os seios, os quadris se ‘ajustam’, a cintura se afina”. 219<br />

A influência francesa na coluna se fazia presente, sobretudo, nos vestidos de noite.<br />

Ao se vestirem de acordo com esses ditames, as ilustrações apareciam incorporar certo<br />

rigor na aparência. As luvas, por exemplo, eram acessórios muito presentes nas ocasiões<br />

218<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. <strong>Garotas</strong> em shorts. A. Ladino. In: O CRUZEIRO. 18 de outubro de 1952, p. 76 e<br />

77<br />

219<br />

VEILLON. Dominique. Moda & Guerra. Um retrato da França ocupada. Rio de Janeiro: Jorge Zahar<br />

Editor, 2004, p.212<br />

105


A coluna “<strong>Garotas</strong>” exibe a presença de conjuntos de saias e blusas, além dos<br />

tailleurs, modelos muito usados durante a Segunda<br />

Guerra Mundial. Os chapéus eram,<br />

também, freqüentes na década de 1940. Entretanto, essa linha não seria a predominante<br />

no<br />

período. As roupas coloridas, os vestidos de gala esvoaçantes<br />

para bailes, com metros e<br />

metros de tecidos, a despeito da escassez de matéria<br />

prima, seriam ilustrados, amplamente,<br />

nos corpos das “<strong>Garotas</strong>”.<br />

Com o fim do conflito, a França aos poucos<br />

retomou as suas atividades no setor da<br />

moda, especialmente da<br />

Alta Costura. A<br />

conservadorismo como nos tempos da Guerra,<br />

porém a austeridade cede espaço às roupas<br />

mais glamourosas, que utilizam uma fartura de<br />

tecidos, imortalizadas pelo New Look de<br />

Christian Dior lançado em 1947.<br />

cabelo, usados, principalmente, pelas adolescentes, faixa etária<br />

correspondente às<br />

“<strong>Garotas</strong>”.<br />

nova silhueta continuaria a delinear o<br />

As saias rodadas, volumosas, com a cintura marcada, muitas vezes por um cinto<br />

apertado eram cada vez mais freqüentes na coluna, principalmente a partir dos anos 1950.<br />

Os chapéus enfeitados cedem lugar à simplicidade dos rabos de cavalo e laços de fita no<br />

Após a Segunda Guerra Mundial, sobretudo, impulsionada por esse movimento da<br />

volta ao lar, a mulher adotou características excepcionalmente femininas. O corpo e a<br />

moda dialogavam com esse momento de resgate aos valores tradicionais: “Uma<br />

feminilidade que foi historicamente construída, naturalizada, universalizada e essencializada<br />

como inerente<br />

à “natureza” das mulheres, como sua “marca”, não obstante a pluralidade de<br />

suas histórias. A força instauradora das representações de feminilidade revela-se na<br />

106


A partir da década de 1950, os vestidos inspirados no<br />

New Look de Dior serão a coqueluche na coluna, para<br />

os eventos sociais, especialmente os de gala. Os corpos<br />

voltam a exibir o conservadorismo sob o comando da<br />

silhueta “cinturinha<br />

de pilão”.<br />

Fig.44 Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> dão<br />

cada baixo!”.<br />

01 de novembro de 1952. Texto A.<br />

Ladino<br />

elásticas como a Vespa, para moldar a “cinturinha de pilão”.<br />

permanência desse “pudor”, dessa marca de<br />

silêncio que envolve as mulheres e que pesa<br />

primeiramente<br />

sobre seus corpos”. 220<br />

A silhueta estava de acordo com os<br />

novos padrões rígidos de conduta e<br />

apresentação da mulher no pós-guerra. O<br />

corpo voltava a estar sob a vigilância<br />

constante do olhar masculino em oposição<br />

aos tempos do conflito. Ele se viu confinado<br />

a um novo espartilho: as modernas cintas<br />

A esbelteza era cada vez mais valorizada, entretanto, sem características andróginas<br />

como as vivenciadas nos anos 1920. As<br />

curvas eram<br />

bem vindas: “Era o que os homens<br />

preferiam: as cheinhas, de corpo violão sete cordas. Se uma delas passasse por perto seria<br />

louvada com um discreto galanteio: ‘Que estouro boazuda’.” 221<br />

Obstante a isso, Elza Marzulo que assinava a coluna “Elegância e Beleza” na<br />

revista O Cruzeiro, já alertava<br />

as jovens para os perigos do excesso de magreza: “O medo<br />

de engordar<br />

quando se torna uma obsessão, isto é, quando não é confortado por uma exata<br />

indicação médica, é pura e simples doença: é uma psicose cujas vítimas são levadas a não<br />

alcançar um escopo estético, mas a por em sério e grave risco a sua saúde”. 222<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu” exibiam um formato de corpo condizente com o padrão<br />

estabelecido na época. Eram magras e longilíneas, mas possuíam curvas, ostentando uma<br />

220<br />

RIOS. Gilma Maria. Educação Física e a “masculinização da mulher moderna”. Universidade Presidente<br />

Antonio Carlos. Unipac Araguari, MG, p. 02. Disponível em:<br />

http://www.fazendogenero7.ufsc.br/artigos/G/Gilma_Rios_38_B.pdf. Acessado em 07 de março, 2007.<br />

221<br />

SANTOS. Joaquim Ferreira dos.<br />

Feliz 1958: o ano que não devia terminar. Rio de Janeiro: Record, 2003,<br />

p. 12<br />

222<br />

MARZULLO. Elza. Coluna Elegância e Beleza. In: O CRUZEIRO 06 de julho de 1957<br />

107


cinturinha minúscula. Mesmo possuindo, muitas vezes,<br />

um vestuário que expunha mais a<br />

pele, elas não fugiam do ideal feminino de corpo, aquele<br />

ainda confinado às cintas elásticas<br />

e submisso à uma certa artificialidade.<br />

A mulher deveria camuflar suas imperfeições<br />

com a ajuda dos cosméticos e vigiar<br />

sempre, para que seu marido nunca visse a sua verdadeira<br />

face: “(...) fingir ser bela, fingir,<br />

sobretudo perante o homem amado, que se tem a cintura fina, o porte de rainha e uma voz<br />

aveludada é, para os conselheiros de um passado<br />

recente, uma estratégia correta e mesmo<br />

s<br />

audável”. 223<br />

A beleza ainda era um tanto programada e a naturalidade dos brotos dos anos 1960<br />

ainda não era a realidade, embora não estivesse<br />

tão distante de sua emergência: “É na<br />

individualização, e também no artifício, às vezes sistemático, que se aprofundou a beleza<br />

nas democracias<br />

entre as duas guerras: a idéia sempre mais aguçada de que a beleza se<br />

constrói<br />

pela técnica e os materiais.” 224<br />

“<strong>Garotas</strong> e camuflagem” em 21 de novembro de 1942 as ilustrações se entregavam<br />

aos tratamentos de beleza, camuflando suas imperfeições, comparando certos artifícios às<br />

estratégias de guerra: “Uma aplicação dessas cintas em sacos de areia não constituiria uma<br />

armadilha formidável?”<br />

A aparência das ilustrações do início da coluna se assemelha<br />

ao modelo de beleza<br />

encarnado<br />

pela figura da vamp hollywoodiana, embora não fossem tão fatais quanto às<br />

divas Jean Harlow e Marlene Dietrich, exemplos do gênero: “Na órbita do filme noir, essa<br />

sedutora insubmissa e temível inaugurou a era do glamour (...).” 225 Os traços são mais<br />

finos, os olhos puxados e a maquiagem é levemente carregada nos olhos. No entanto<br />

apesar da semelhança, com o avançar do tempo, elas pareciam estar mais próximas da<br />

223<br />

SANT´ANNA, Denise Bernuzzi. Cuidados de si e embelezamento feminino: fragmentos para uma história<br />

do corpo no Brasil. In: Políticas do Corpo: elementos para uma história das práticas corporais. São Paulo:<br />

Estação Liberdade, 1995, p. 127<br />

224<br />

VIGARELLO. Georges. A história da beleza. Rio de Janeiro: Ediouro, 2006, p. 167<br />

225<br />

FAUX. Dorothy Schefer. A beleza do século. São Paulo: Cosac & Naif. Edições, 2000,<br />

p.146<br />

108


Nessa seção a maquiagem e alguns recursos de beleza como<br />

um poderoso sutiã ou uma cinta, estavam na lista das<br />

“<strong>Garotas</strong>” para camuflar suas imperfeições. Essa será uma<br />

prática comum às mulheres do período. Aqui esses artifícios<br />

serão comparados à artilharia de guerra, evidenciando a<br />

batalha que era se manter bela.<br />

Fig.45 Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> e<br />

camuflagem". 21 de novembro de 1942. Texto Alceu Penna.<br />

ups.<br />

beleza da virgem inocente e rebelde dos<br />

cinemas: “A virgem inocente ou<br />

rebelde, com imensos olhos crédulos, de<br />

lábios entreabertos ou suavemente<br />

sarcásticos (Mary Pickford e Lilian Gish<br />

nos EUA, Suzanne Gandais na França<br />

226<br />

(...)” . “As <strong>Garotas</strong>” irão estampar<br />

do ideal de beleza encarnado pelas pin-<br />

demonstrar uma desenvoltura outrora<br />

desconhecida; sob o signo das marcas ‘Made in<br />

Hollywood’, a feminilidade das femmes fatales da década anterior parecia ter se tornado do<br />

dia para noite, um artifício da velha e cansada Europa.” 227<br />

uma beleza cada vez mais jovial. Os<br />

olhos tornam-se maiores e o sorriso se<br />

alarga, aproximando-se cada vez mais<br />

A figura perniciosa da vamp muito feminina, mas demasiadamente liberal, cedia<br />

lugar a um novo modelo, a jovem esbelta e de maçãs-do-rosto coradas: “Principalmente<br />

nos últimos anos da década de 50, quando os gestos dedicados a embelezar começavam a<br />

A indústria de beleza já estava em sintonia com a mudança que se operava. O sex<br />

appeal dos brotos era a nova inspiração. A maquiagem deveria ser mais leve, nada de cores<br />

escuras e truques excessivamente artificiais: “Usava-se laquê em salões de cabeleireiro, a<br />

depilação era comumente feita com gilete e depilar as sobrancelhas nem sempre era visto<br />

como coisa de mulher de boa família. A sombra para as pálpebras, quando podia ser usada,<br />

era considerada adequada para festas noturnas. Esmalte de cor forte costumava<br />

despertar<br />

226 MORIN. Edgar. Estrelas: mito e sedução no cinema. Rio de Janeiro, 1989, p.08<br />

227 SANT´ANNA. Denise Bernuzzi. Do glamour ao sex-appeal: notas sobre o embelezamento feminino entre<br />

1940 e 1960. In: História &Perspectivas. Uberlândia (23): 115-128 julh/dez.2000, p. 116<br />

109


suspeitas.” 228 A cor dos esmaltes das “<strong>Garotas</strong>”, ignorando<br />

essa regra, era normalmente<br />

vermelho rubi, assim como os lábios.<br />

Com o avançar da década de 1950 a beleza<br />

feminina passa, cada vez mais, a ser<br />

encarada como um trabalho e dever cotidiano<br />

acreditava, ela passou a encarar os cosméticos<br />

imperfeições e não apenas escondê-las. Os novos<br />

recursos em maquiagem tornaram-se<br />

imprescindíveis. Elza Marzullo novamente dá dicas<br />

em sua coluna no O Cruzeiro: “A<br />

beleza pode ser conquistada. Analisando a<br />

principalmente, a que é empregada por suas amigas, as quais naturalmente você vê sem<br />

pintura, chegará a conhecer os pequenos milagres<br />

cosméticos”. 229<br />

Tradicionalmente, as regras de beleza caminhavam<br />

juntas com as de elegância, pois<br />

controle dos corpos: “(...) o ideal de elegância perpassa<br />

também o discurso do “deve ser”<br />

para as mulheres dos anos 50. Ressalta-se inclusive<br />

que não adianta só “beleza pura”, mas<br />

tem de ter elegância e charme”. 230<br />

da mulher. Ao contrário do que se<br />

como uma chance de corrigir as suas<br />

maquilagem de outras mulheres e,<br />

conseguidos com os modernos<br />

s ozinha ela não bastava. A elegância ocupava a importante tarefa de disciplinação e<br />

228<br />

SANT´ANNA. Denise Bernuzzi. Op cit, p.120<br />

229<br />

MARZULLO. Elza. Coluna Elegância e Beleza. In: O CRUZEIRO. 06 de julho de 1957<br />

230<br />

PEREIRA, Simone Luci. Imprensa e Juventude nos anos 50. INTERCOM – Sociedade Brasileira de<br />

Estudos Interdisciplinares da Comunicação. XXIV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.<br />

Disponível em: http://reposcom.portcom.intercom.org.br/bitstream/1904/4373/1/NP2PEREIRA.pdf.<br />

Acessado em 10 de maio de 2006, p. 08<br />

110


A beleza das “<strong>Garotas</strong>” acompanhou as mudanças nos<br />

padrões de beleza do cinema Hollywoodiano, migrando,<br />

mesmo que aos poucos, da fatalidade para a ousadia jovial.<br />

Fig. 46 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> a<br />

bordo”. 30 de novembro de 1938. Texto Alceu Penna<br />

Fig. 46 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Que te quero<br />

Garota”. 26 de outubro de 1957. Texto A. Ladino.<br />

A expressão “só é feia quem<br />

quer” se aplica a esse contexto. O<br />

descuidado com<br />

o corpo e as roupas<br />

eram sinais de fracasso feminino, sob o<br />

ponto de vista de uma sociedade<br />

patriarcal, em que a ascensão máxima<br />

da mulher era um bom casamento. A<br />

jovem solteira deveria cuidar da sua<br />

aparência, a fim de atrair candidatos.<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu” eram<br />

ilustradas de forma impecável. Olhando<br />

sob o ponto de vista atual é coerente que<br />

pensemos nelas como figuras<br />

demasiadamente artificiais. Estavam<br />

sempre maquiadas, cabelos penteados e<br />

unhas feitas. Eram ilustradas se<br />

portando<br />

de forma polida e elegante. Entretanto, ao observar mais atentamente é<br />

constatado que, para a época, em que o corpo feminino era objeto de extrema vigilância e<br />

controle as ilustrações exibiam pelo corpo e a moda, mais liberdade do que era costumeiro<br />

no dia a dia da maiorias das moças do<br />

período. De certa maneira, as ilustrações já<br />

anunciavam uma etapa nova que caracterizaria a transição dos anos 1950 para 1960:<br />

“Beleza mais livre (...) secretamente trabalhada pela dinâmica da igualdade.” 231<br />

Na corrida pela beleza, a indústria de cosméticos e higiene se aperfeiçoavam.<br />

Novos produtos começam a aparecer no mercado, substituindo ultrapassadas formas de se<br />

231 VIGARELLO. Georges.Op cit, p. 171<br />

111


embelezar: “(...) segue-se a modernização da beleza, sobretudo das mulheres. O rouge foi<br />

sendo preterido pelo blush, o pó de arroz pelo pó compacto,<br />

as máscaras caseiras de beleza,<br />

de abacate, pepino, camomila etc pelos modernos cosméti<br />

“As <strong>Garotas</strong>” refletiram a crescente invasão de<br />

cosméticos no mercado por<br />

empresas estrangeiras consagradas, que apareciam até mesmo<br />

em seções em que o tema<br />

era a culinária: “Os morangos devem ser servidos com creme.<br />

Não há creme chantili. Será<br />

que creme Pond´s serve?” 233<br />

cos”. 232<br />

Uma boa aparência era imprescindível para uma<br />

jovem,<br />

que desejava escolher entre<br />

vários partidos aquele que a mais interessava. A beleza<br />

deveria<br />

servir ao homem, ou seja,<br />

ao seu desfrute, impedindo que a sua verdadeira individualidade<br />

emergisse: “Mulheres<br />

enfeitam-se,<br />

vestem-se de negro ou se cores e encantam. Mascaram e são suas próprias<br />

máscaras no batom que marca seus lábios, no pó facial sobre a tez que quer sem manchas,<br />

sem máculas. Congelam no tempo linear pelo mascaramento do real. Semideusas da<br />

modernidade, as mulheres escapam ao real pelo viés da simulação e constroem existências<br />

inabarcáveis totalmente pela razão masculina. Existência da ordem do ritual, do<br />

processual.” 234<br />

A grande variedade de produtos em oferta no mercado provocou um<br />

redirecionamento da propaganda.<br />

A beleza se torna um produto, embalado e<br />

democratizado:<br />

“(...) Daí a ‘generalização’ dessa beleza, impensável até então, ao alcance<br />

da retórica lisa e versátil do mercado.” 235<br />

232<br />

MELLO. João Manuel Cardoso de. NOVAIS. Fernando A. Capitalismo Tardio e sociabilidade moderna.<br />

In: SCHWARCZ. Lilia Moritz (org.). História da Vida Privada v.04. São Paulo: Companhia das letras,<br />

1998, p. 568<br />

233<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. <strong>Garotas</strong> e a arte culinária. In: O CRUZEIRO. 22 de Abril de 1950, p.118 e 119<br />

234<br />

ROMERO, Elaine. Corpo,<br />

mulher e sociedade. Campinas: Papirus, 1995. p 132<br />

235<br />

VIGARELLO. Georges. Op cit, p. 171<br />

112


O Cruzeiro procurou conscientizar sobre a suposta “nova mulher<br />

moderna”, já tratando de esclarecer que a designação não deveria<br />

ferir os princípios da moral e bons costusmes.<br />

Fig.47 “A mulher e<br />

Era necessário romper<br />

resistências em adotar novos<br />

artigos, instruindo o consumidor<br />

a absorver novos hábitos:<br />

“Assim, bem antes dos anos<br />

1960 já era possível encontrar<br />

diversos anúncios cujo objetivo<br />

era provocar identificação entre<br />

m nova edição”. 28 de setembro de 1957 os consumidores e bens de<br />

consumo<br />

mediante apelos dirigidos à subjetividade daqueles.” 236<br />

O Cruzeiro, como veículo porta-voz das elites e da ideologia dominante, defendeu<br />

em sua linha editorial uma mulher que atendesse aos interesses da modernização do país,<br />

mas que fosse alienada aos problemas políticos femininos, não<br />

ferindo aos interesses<br />

conservadores:<br />

“Com tantas dificuldades e problemas que sempre circundaram o mundo<br />

feminino, a revista de grande tiragem nacional procurou enfatizar muito mais libido,<br />

vaidade e mito fantasioso das mulheres, num período definido como moderno, do que<br />

tratar dos problemas da dura realidade da maioria das brasileiras, que viviam na mais<br />

completa submissão”. 237<br />

A revista chegou a realizar uma reportagem dedicada, exclusivamente, a apontar o<br />

novo modelo de mulher moderna: “Uma enquête realizada por O Cruzeiro na América<br />

Latina demonstra que a jovem deste continente realiza um sadio equilíbrio entre as virtudes<br />

tradicionais e a liberdade da educação moderna, sem perder a feminilidade”. 238<br />

236<br />

FIGUEREDO, Anna Cristina Camargo Moraes. Liberdade é uma calça velha, azul e desbotada.<br />

Publicidade, cultura de consumo e comportamento político no Brasil (1954-1964), 1998<br />

237<br />

CERPA. Leoní. A máscara da modernidade: a mulher na revista O cruzeiro (1928-1945). Passo Fundo:<br />

UPF, 2003, p.73<br />

238<br />

O CRUZEIRO. A mulher em nova edição.<br />

28 de Setembro de 1957, p.24 e 25<br />

113


O conceito de mulher moderna vigente no período da coluna diferenciava-se<br />

daquele popularizado nos anos 1920, sobretudo, pelos EUA: “(...) o desafio competitivo<br />

que<br />

o modelo da mulher americana moderna lançava, tanto ao velho estilo de vida<br />

patriarcal<br />

como ao novo estilo de vida coletivista, tinha menos a ver com a bandeira do que<br />

com<br />

a sua representação em produtos, na moda, nas notícias e no cinema. Na sua realidade<br />

tão<br />

diversa, as mulheres modernas emergiram das lutas anteriores pela emancipação<br />

política,<br />

econômica e sexual. (...) Por volta dos anos 20, empenhados agentes da<br />

modernidade<br />

tinham de ter em conta os anseios e símbolos de liberdade e individualidade<br />

as mulheres”. 239<br />

d<br />

A exaltação do consumo servia, portanto, ao ideal de desenvolvimento, mas não<br />

significou<br />

para a mulher conquistar independência: “O que se percebe é que a mulher<br />

alcançava<br />

apenas uma independência consumista, e ainda com o dinheiro dos maridos,<br />

orque poucas usufruíam uma liberdade financeira própria”. 240<br />

p<br />

“As <strong>Garotas</strong>” como mocinhas jovens e, provavelmente, dependentes dos pais,<br />

compartilhavam,<br />

até certa medida, do pensamento que deveriam ser sustentadas pelos seus<br />

namorados<br />

ou futuros maridos. “Para as garotas” em 15 de maio de 1954, salienta o lado<br />

materialista<br />

dessas ilustrações, que colocam seus namorados na obrigação de enchê-las de<br />

mimos<br />

caros: “O Antônio tem mania de me dar orquídeas, mas ele revela gosto fino. São<br />

muito<br />

caras as orquídeas, mas estou cheia de orquídeas e de pulseira de níquel.”<br />

Paralelamente às inúmeras definições e indefinições sobre a mulher, as ilustrações<br />

refletiram<br />

medos, inseguranças, alegrias, desejos de muitas mulheres da classe média<br />

brasileira.<br />

Pode se dizer muito sobre aquele tempo, pela observação dos traços que<br />

compunham<br />

os seus corpos e a moda. Em meio a uma corrida rumo ao desenvolvimento,<br />

uma<br />

visão se destacou, graciosa e ao mesmo tempo controversa, chamada “As <strong>Garotas</strong> do<br />

239<br />

COTT. Nancy F. A mulher moderna: o estilo americano dos anos 20.<br />

DUBY. Georges. PERROT.<br />

Michelle. História das mulheres: o século XX, v.5. Roma: Afrontamento, 1991, p. 95.<br />

240<br />

CERPA. Leoní. Op cit, p. 79<br />

114


Alceu”, ensinado os brotinhos da época os benefícios incomparáveis da malícia e do bom-<br />

humor<br />

ao burlarem a ordem existente.<br />

115


3.2 A ousadia discreta das “<strong>Garotas</strong>”: objetos de desejo<br />

A coluna atraiu nos anos de sua veiculação<br />

admiravam como modelos de beleza e comportamento e os homens as<br />

admiravam por seus<br />

dotes físicos e charme invejáveis. As moças do período queriam<br />

ser uma “Garota” e os<br />

rapazes desejavam se casar com uma delas.<br />

Heloisa Buarque de Hollanda relembra a admiração<br />

que sentia pela coluna: “É<br />

inevitável, para mim, voltar no tempo quando<br />

um público diverso. As mulheres as<br />

penso em Alceu Penna. Lembro-me<br />

imediatamente de minha ansiedade, ainda adolescente,<br />

esperando o Cruzeiro aparecer nas<br />

bancas e eu, correndo as páginas da revista, para encontrar<br />

as “<strong>Garotas</strong>” da semana. Não só<br />

para mim, mas para minha geração de meninas que iam ao cinema Rian à tarde e depois<br />

iam em grupo tomar sunday de Morango com waffles<br />

nas Americanas, Alceu Penna era um<br />

modelo de comportamento. Sentíamos suas páginas<br />

como modernas, atuais, descoladas.<br />

Era m frases, gestos, formas de olhar e seduzir, as roupas, chapéus, maiôs, fantasias. Ah!<br />

As fantasias de carnaval, fielmente copiadas pelas costureiras<br />

do bairro...”<br />

Se para as moças da época, “As <strong>Garotas</strong>” tornaram-se<br />

modelos, para os rapazes elas<br />

eram objetos de desejo. Alberto Villas relembra<br />

o lugar<br />

ocupado pelas ilustrações em seu<br />

imaginário: “Um dia sonhei que estava me casando com uma garota do Alceu. Ela vestia<br />

um vestido branco com uma cauda enorme e segurava um buquê de flores cor-de-rosa e<br />

verde. De repente, acordei.”<br />

242<br />

As ilustrações eram cercadas de uma magia inalcançável, uma estética perfeita,<br />

quase que boas<br />

demais para serem verdade. E de fato eram mesmo. Sua imagem tornou-se<br />

um fetiche: “A incorporação do fetichismo é evidente em nossa sociedade, e pode ser vista<br />

241<br />

HOLLANDA, Heloisa Buarque. Texto manuscrito. Rio de Janeiro, 2006.(mimeo).<br />

242<br />

VILLAS. Alberto. O mundo acabou. São Paulo: Globo, 2006, p.261<br />

241<br />

116


A coluna atraiu tanto o público feminino quanto o<br />

masculino. O banho das “<strong>Garotas</strong>”, uma situação íntima,<br />

poderia suscitar as mais loucas fantasias masculinas, ao<br />

mesmo tempo, que as roupas na última moda, atraíam os<br />

olhos<br />

femininos curiosos.<br />

Fig.48 a.<br />

Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “O banho das<br />

<strong>Garotas</strong>”. 31 de janeiro de 1942. Texto Alceu Penna<br />

Fig.48 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> em<br />

passeios”. 02 de novembro de 1946. Texto A. Ladino<br />

em diversos contextos que<br />

representam, de um modo ou de outro,<br />

uma propriedade mágica do objeto<br />

fetichizado”. 243<br />

É sabido, como explorado no<br />

primeiro capítulo que as “<strong>Garotas</strong>”<br />

foram inspiradas nas pin-ups, mais<br />

precisamente<br />

nas Gibson Girls. Essa<br />

inspiração é crucial para as pensarmos<br />

como objetos de desejo masculino. As<br />

ilustrações apareciam vestidas com<br />

trajes decotados, em poses<br />

convidativas e sensuais: “A vamp era<br />

a mulher viciosa, capaz de introduzir<br />

qualquer homem no paraíso tenebroso<br />

e escaldante do erotismo. (...) Com a<br />

pin-up, não há nada disto. Ela existe e<br />

isto basta. Ela possui olhos grandes, uma boca larga que ri, mostrando os dentes muito<br />

brancos, um busto que poderia servir de cabide, nádegas que fariam com que um atirador<br />

revirasse os olhos, coxas acolchoadas e tornozelos decentes. Seios nádegas, sorriso: eis de<br />

que é composta a pin-up, e esta ausência de mistério acaba por ser o mais misterioso dos<br />

mistérios.” 244<br />

243<br />

BOTTI. Mariana Meloni Vieira. Fotografia e fetiche: um olhar sobre a imagem da mulher. In: Cadernos<br />

Pagu (21) 2003, p. 105<br />

244<br />

PIPER, Rudolf. <strong>Garotas</strong> de papel: história da pin-up brasileira em 170 ilustrações. São Paulo:<br />

Ed Global,<br />

1976, p. 88<br />

117


Na coluna as ilustrações não possuem um apelo sexual<br />

tão explícito quanto as pin-<br />

ups, pois deveriam agradar ao público feminino também,<br />

no entanto, compartilhavam do<br />

código de sedução delas. “As <strong>Garotas</strong>”, muitas vezes,<br />

posam para o leitor, ou seja, olham<br />

diretamente para ele, quase como um convite a<br />

importante, pois é decotada, apresentando peças que<br />

mostram pernas, colo, braços, sem<br />

revelar tudo: “Acompanhado desse olhar, por vezes<br />

lúdico, sério ou insinuante, temos a<br />

indumentária, que reforça o convite. A escolha por<br />

vestir<br />

a modelo ao invés de representá-<br />

la nua<br />

é, em certo sentido, uma escolha fetichista” 245 .<br />

apreciá-la. A roupa também é parte<br />

Partindo dessa perspectiva, “As <strong>Garotas</strong>” mostram sua porção conservadora:<br />

a<br />

mulher como objeto de desejo e, portanto, de apreciação. Simone de Beauvoir fala sobre a<br />

face estática e submissa dos corpos femininos: “O ideal da beleza feminina é variável, mas<br />

certas exigências permanecem constantes: entre outras exigi-se que seu corpo ofereça as<br />

qualidades inertes e passivas de um objeto, porquanto a mulher se destina a ser possuída<br />

de outra coisa senão de si mesmo: precisa deter o desejo”. 246<br />

(...) não deve ser promessa<br />

Além do corpo, o contexto em que se inseriam as ilustrações era propício para<br />

aflorar a sensualidade. A praia era um dos programas mais ilustrados nas páginas das<br />

“<strong>Garotas</strong>”. Era sem dúvida um espaço de liberações corporais e aproximações. Elas<br />

exibiam suas curvas, adquiriam um belo bronzeado e, frequentemente, jogavam seu<br />

charme para os rapazes: “Na areia fresca e macia que tanto repouso enseja, a Garota só<br />

deseja boa sombra... e companhia” 247 .<br />

Os corpos desnudados, outrora<br />

encobertos por tecidos e tabus se libertavam em<br />

direção a uma nova e incerta realidade. Na praia se desfrutava de liberações, tanto do ponto<br />

de vista das roupas, pelo uso de trajes de banho que mostravam partes do corpo<br />

normalmente escondidas, quanto da possibilidade de estar em contato com o sexo oposto.<br />

245<br />

BOTTI. Mariana Meloni Vieira. Op cit, p. 125<br />

246<br />

BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980, p. 200<br />

247<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. Na barraca das <strong>Garotas</strong>. In: O CRUZEIRO.<br />

05 de novembro de 1955, p .26 e 27<br />

118


A praia possibilitou muitos encontros para “As <strong>Garotas</strong>” e<br />

as mocinhas da época. Corpos à mostra e sensualidade aos<br />

olhos do sexo oposto, ao mesmo tempo em que aproximava,<br />

colocava novos receios em relação ao corpo.<br />

Fig.49 Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “O banho das<br />

<strong>Garotas</strong>”. 31 de janeiro de 1942. Texto A. Ladino<br />

A praia tornava-se um local de<br />

socialização entre rapazes e moças e,<br />

se por um lado havia as liberações,<br />

também existiam as coações, os<br />

receios que a proximidade dos rapazes<br />

pudesse por abaixo a reputação da<br />

moçinha: “Calma, deitada na areia,<br />

desacata a vida alheira, mas não entres<br />

no mar, não, pois o teu maiô estético, de tão bonito e sintético pode atrair tubarão”<br />

A insegurança de exibir o corpo em trajes de banho, também cerceava o clima de<br />

liberdade. O desejo incontido de agradar aos olhos do sexo oposto<br />

torna-se uma coação<br />

que, como as cintas elásticas sufocantes, tentavam moldar os corpos em um determinado<br />

padrão. “As <strong>Garotas</strong>” como qualquer moça da época, estavam divididas, cotidianamente,<br />

entre a ousadia e o recato.<br />

Esse comportamento não era estranho para uma sociedade conservadora, à despeito<br />

de todas as modernizações. Clarisse Lispector escreveu, sob o pseudônimo de Helen<br />

Palmer, a seção “Correio Feminino” no Correio da Manhã entre 1959 e 1961. Nesse espaço<br />

ela dava dicas de beleza e comportamento que, em muito, refletiram a realidade feminina<br />

do período: “A mulher deve ser primeiro<br />

que tudo feminina. Deve ter a habilidade de se<br />

controlar<br />

a ponto de deixar que outras pessoas se tornem mais importantes que ela dentro<br />

do seu estrito meio de relações”. 249<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu” materializaram uma mulher mascarada pelo desejo de<br />

agradar, mas ao mesmo tempo, rompiam esse padrão para incorporar um modelo mais<br />

248<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. <strong>Garotas</strong> cuidado com o tubarão! In: O CRUZEIRO. 03 de março de 1953, p. 70 e<br />

71<br />

249<br />

NUNES. Maria Aparecida (org). Correio Feminino. Qualidades para tornar a mulher In: Correio da<br />

Manhã. LISPECTOR, Clarisse. 22 de janeiro<br />

1960, p.100<br />

119<br />

248 .


pessoal em sintonia com as suas vontades, mesmo que essas não fossem exatamente as<br />

esperadas: “Despistando os namorados e a todos mais despistando, mesmo de olhinhos<br />

fechados as <strong>Garotas</strong> vão manjando” 250 .<br />

Esse conservadorismo vai começar a ser burlado com a crescente urbanização e<br />

ampliação das possibilidades de encontro entre os sexos. Mesmo com as regras que<br />

pautavam a aproximação entre rapazes e moças, essas transformações geraram um impacto<br />

na formatação do namoro: “Os hábitos de ir a bailes, festas, cinema, praia e de fazer o<br />

footing proporcionam contatos cada vez mais freqüentes e diretos entre jovens de ambos os<br />

sexos. Estas práticas, ao longo do tempo ‘destroem’ (substituindo por processos mais<br />

íntimos) antigas formas de namoro e modificam a iniciativa da escolha do cônjuge que se<br />

transfere dos pais para os próprios indivíduos interessados.” 251<br />

Eram nesses espaços de convivência que a jovem solteira poderia entrar no jogo da<br />

conquista. Esse jogo, entretanto, composto de olhares, sorrisos e expressão corporal<br />

receptiva tinha que ser pautado pela moral e bons costumes, deixando a iniciativa, o flerte<br />

para os rapazes: “A minúcia dos gestos e a escolha<br />

das roupas expressam a unidade<br />

esperada entre comportamentos e a ordem social da qual o indivíduo faz parte. Os<br />

comportamentos, embora expressos como algo alheio que possa ser aprendido, não passa<br />

de procedimentos de autocontrole para que o indivíduo não fira a unidade esperada entre<br />

ele e a ordem social a que pertence”. 252<br />

“As <strong>Garotas</strong>”, ao contrário do esperado, flertavam com os rapazes participando,<br />

mesmo que, disfarçadamente, do jogo da conquista. A expressão corporal das ilustrações<br />

ao se verem interessadas em algum rapaz era<br />

sempre acompanhada de um olhar de canto,<br />

um sorriso discreto e maroto: “IT, sorriso e menelo, atrevimento e receio, que torna a<br />

250<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. <strong>Garotas</strong> manjando. In: O CRUZEIRO. 25 de Agosto de 1956, p. 58 e 59<br />

251<br />

BASSANEZZI. Carla. Virando as páginas, revendo as mulheres. Revistas femininas e relações<br />

entre<br />

homem e mulher (1945-1964). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996, p. 80<br />

252<br />

BERGAMO. Alexandre. Op cit, p.<br />

90<br />

120


garota ‘a tal’, eflúvio gostoso e quente, imponderável presente que nos faz bem e nos faz<br />

mal” 253 . Mesmo deixando o homem achar que está sendo conquistado, como era o costume<br />

da época, elas investiam ativamente no flerte, uma iniciativa masculina, abusando do seu<br />

charme e beleza: “É das causas mais singelas a que o Rio descontrola: é que as <strong>Garotas</strong>,<br />

seis delas, estão dando bola.” 254<br />

O corpo e a moda das “<strong>Garotas</strong>”, frequentemente, eram usados como “armas” para<br />

conseguir coisas dos rapazes através da sedução, uma prática que destoava das normas de<br />

boa conduta: “(...) considerava-se que o culto á beleza deveria levar em conta os princípios<br />

médicos higiênicos e nunca a sedução. Para isso, os discursos higienistas de educadores e<br />

médicos procuravam frear a libido feminina, estabelecendo limites entre a ‘vaidade<br />

das<br />

mulheres honradas’ e a ‘libertinagem das de condutas duvidosas’ (...).” 255<br />

A beleza das ilustrações não estava a serviço dos homens, pois atendia a um<br />

interesse maior: o delas: “Dos truques dessas pequenas não há que possa escapar,<br />

estrategistas serenas, elas sabem despistar. E, guerrilheiras capazes, que lutam sempre a<br />

sorrir, para vencê-las rapazes, só há um jeito, aderir.” 256<br />

Era para a época um consenso, que as mulheres utilizavam o choro para desarmar<br />

os homens e conseguir o que queriam, como até hoje, muitas ainda o utilizam. Era uma<br />

tática comum ao chamado sexo frágil, que se posicionava de modo passivo na sociedade,<br />

não gozando de nenhum poder de iniciativa: “Não raro estas mulheres aconselharam,<br />

inclusive, suas filhas a ‘Fazer coisas não aparentando estar fazendo’, a exigir coisas sem<br />

parecer estar exigindo, a ‘fazer tudo com muito jeito e tato’, porque afinal, ‘homem não<br />

gosta de saber que está sendo mudado’.” 257<br />

253<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. charme it., ophm... In: O CRUZEIRO. 25 de fevereiro de 1956, p. 58 e 59<br />

254<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. <strong>Garotas</strong> dando bola. In: O CRUZEIRO. 03 de Agosto de 1946, p.23<br />

255<br />

CERPA.<br />

Leoní. Op cit, p. 82<br />

256<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. A tática das <strong>Garotas</strong>. Texto<br />

A. Ladino. 13 de maio de 1950, p.46 e 47<br />

257<br />

COUTINHO. Maria Lúcia Rocha. Tecendo por trás dos panos: a mulher brasileira nas relações familiares.<br />

Rio de Janeiro: Rocco, 1994, p.101<br />

121


“As <strong>Garotas</strong>” assumiam uma posição diferente. Sua arma secreta era seu charme,<br />

seus encantos e sorriso: “Depois de um dia de lucidez, alguém descobriu que o pranto<br />

incha os olhos, avermelha o nariz, enfeia. E assim como se evoluiu do tacape para a<br />

metralhadora, assim as mulheres evoluíram do choro para o sorriso. Uma Garota de dentes<br />

bonitos tem no sorriso uma arma de trinta e dois gumes...” 258<br />

Ao longo desses 26 anos de coluna modelos provindos do cinema geravam uma<br />

multiplicidade de inspirações para os jovens, assim também como a imprensa e os<br />

exemplos do cotidiano. O que seria aceitável? : “Ser brotinho em 1958 (...) é ficar dividida<br />

entre o erotismo soft de BB, as freiras do Colégio Imaculada Conceição em Botafogo ou<br />

<strong>Garotas</strong> do Alceu, de O Cruzeiro”. 259<br />

ser comportadamente atrevidinha como as<br />

O jovem como faixa etária à parte, era uma novidade, e muitas vezes, esses não<br />

sabiam se portar em relação ao seu corpo e moda. Em ambientes públicos as mulheres<br />

deveriam se portar com descrição, não era bem visto uma moça ir a festas<br />

desacompanhada, ou mesmo ficar até de madrugada nelas e se exceder nas bebidas. O<br />

código de conduta era rígido, especialmente para as senhoritas. Obstante a isso, “As<br />

<strong>Garotas</strong>”, mesmo compartilhando desse código cometiam seus excessos: “Querendo bancar<br />

grã fina e mostrar seus predicados, bebe tanto a Rosalina que confessa seus pecados!”. 260<br />

Questões sobre a sexualidade,<br />

a menstruação, o primeiro sutiã eram freqüentemente<br />

tratadas entre mulheres com muito pudor, sendo jamais discutidas abertamente. Em vista<br />

de tamanha artificialidade, era pouco provável, que alguma mulher nutrisse intimidade e<br />

conhecimento sobre seu próprio corpo: “Todas essas mulheres andavam soterradas debaixo<br />

de toalhinhas, anáguas, combinações e sutiãs de enchimento e preconceitos.” 261<br />

258<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. O sorriso é a arma das <strong>Garotas</strong>. In: O CRUZEIRO. 08 de março de 1958, p. 76 e<br />

77.<br />

259<br />

SANTOS. Joaquim Ferreira dos. Op cit, p. 49<br />

260<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. <strong>Garotas</strong> dão cada baixo. In: O CRUZEIRO. 01 de novembro de 1952, p.76 e 77<br />

261<br />

SANTOS, Joaquim Ferreira dos. Op cit, p. 56<br />

122


Estar consigo mesma era um dever, ao contrário de hoje, que deve ser um prazer,<br />

ou seja, um momento de auto-conhecimento: “(...) o corpo feminino é reconhecido como<br />

objeto do olhar e do desejo (aspectos que logo se tornam alvo das campanhas<br />

publicitárias), mas aparece calado devido ao pudor que lhe é exigido como marca de<br />

feminilidade”. 262<br />

“As <strong>Garotas</strong>” nesse sentido foram representadas de forma mais à vontade com seu<br />

corpo, mas não apenas com ele. Levando em conta que a moda e o corpo funcionam como<br />

“parceiros”, era natural que elas estivessem á vontade com suas roupas também. Mesmo<br />

não entrando em temas como a sexualidade, de forma explícita, as páginas da coluna<br />

exibiam essa temática de forma discreta.<br />

Se por um lado, “As <strong>Garotas</strong>” demonstraram uma maior intimidade com o corpo e<br />

foram adeptas de uma moda sedutora e prática, que valorizasse seus atributos físicos, em<br />

parte, era porque existiam apenas nas<br />

páginas de O Cruzeiro. Não tinham que enfrentar se,<br />

por ventura, excedessem em algum tipo de bebida ou paquerassem abertamente um rapaz,<br />

as verdadeiras conseqüências de quebrar o código dos bons costumes. “As <strong>Garotas</strong>”,<br />

mesmo sendo de papel, inspiraram mulheres reais. Desde mulheres da sociedade, como<br />

exemplificado no desfile da Providência dos Desamparados, até moças comuns, todas<br />

queriam ser uma<br />

das “<strong>Garotas</strong>”.<br />

Ruy Castro discorre sobre a importância das “<strong>Garotas</strong>” como modelo de beleza e<br />

comportamento, destacando a sua singularidade: “O traço do ilustrador mineiro<br />

acompanhou e esteve à frente<br />

de muitas transformações que o Brasil viveu. Suas <strong>Garotas</strong><br />

262<br />

ANGELI, Daniela. Uma breve história das representações do corpo feminino na sociedade. Rev. Estud.<br />

Fem. [online].<br />

2004, vol. 12, no. 2 [cited 2007-03-13], pp. 243-245.Disponível em:<br />

.<br />

ISSN 0104-026X. doi: 10.1590/S0104-026X2004000200017<br />

123


tinham it e ensinavam às mulheres que ter personalidade e ser independente não era uma<br />

utopia.<br />

Os rapazes ficavam malucos e queriam ser maridos, namorados ou qualquer outra<br />

coisa dessas meninas tão características do charme e do meneio brasileiros. Pois a página<br />

de<br />

Alceu lhes ensinou que, para conquistá-las, teriam de mudar seus conceitos e aceitar<br />

uma nova<br />

mulher”. 263<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu” representavam um imaginário de uma sociedade em<br />

transição, ou seja, no compasso da renovação de costumes e tecnologias. A modernidade<br />

estava no ar, e com ela, o sabor da mudança e o desejo do novo. Elas compartilhavam da<br />

realidade vivenciada pelas moças da época, viviam as mesmas angústias e obstáculos, além<br />

de gostarem das mesmas coisas. Seu corpo e moda estavam sujeitos às mesmas restrições e<br />

vigilâncias,<br />

em uma época que a formalidade ainda se sobrepunha. Alceu Penna<br />

representou uma tendência que pairava no ar, ainda tímida, que se tornou mais concreta nas<br />

páginas das espevitadas “<strong>Garotas</strong>”.<br />

263<br />

CASTRO. Ruy. Texto de apresentação da exposição “O Brasil na ponta do lápis: Alceu Penna, modas e<br />

figurinos”. Centro Universitário <strong>Senac</strong>-SP. Maio 2007<br />

124


CAPÍTULO 4. “GAROTAS”... ALGO A SER INDEFINIDO<br />

4.1 Um homem que desenhou mulheres: o olhar diferenciado<br />

Toda imagem produzida pelo homem contém a visão de mundo dele, revelando,<br />

assim, traços de sua subjetividade.<br />

O olhar do homem é condicionado pelo contexto em<br />

que sua cultura está inserida:<br />

“O modo de ver o mundo, as apreciações de ordem moral e<br />

valorativa, os diferentes<br />

comportamentos sociais e mesmo as posturas corporais são<br />

produtos de uma<br />

herança cultural, ou seja, o resultado da operação de uma determinada<br />

cultu<br />

ra.” 264<br />

Essa imagem não terá a neutralidade como característica e sempre evidenciará seu<br />

modo de ver determinado objeto, pessoa ou até mesmo uma paisagem:<br />

“As imagens que formam nosso mundo são símbolos, sinais,<br />

mensagens e alegorias. Ou talvez sejam apenas presenças vazias que<br />

completamos com o nosso desejo, experiências, questionamentos e<br />

remorso. Qualquer que seja o caso, as imagens, assim como as palavras<br />

são a matéria de que somos feitos.” 265<br />

Quando Van Gogh pintou os famosos girassóis, ele os fez tão singulares que são<br />

identificados como “Os girassóis de Van Gogh”, e não como uma simples retratação desse<br />

tipo de flor. Os girassóis pintados eram diferentes e jamais seriam iguais a outro tipo de<br />

produção com esse tema, pois naquela imagem continha algo muito particular: o modo de<br />

ver do pintor, ou seja, o seu olhar do mundo.<br />

264<br />

LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Rio<br />

de Janeiro: Zahar, 1996, p.70.<br />

265<br />

FIGUEIREDO, Rubens; MANGUEL,<br />

Alberto;EICHEMBERG, Rosaura; STRAUCH, Claudia. Lendo<br />

imagens: uma história de amor e ódio. São Paulo: Companhia das Letras, 2001, p. 21.<br />

125


Esse modo de ver está, portanto, condicionado a diversos fatores, como a<br />

individualidade do produtor da imagem, sua cultura e costumes, bem como ao contexto em<br />

que foi produzida, podendo revelar muito sobre o criador e o tempo por ele vivido:<br />

“As imagens foram feitas, de princípio, para evocar a aparência de algo<br />

ausente. Pouco a pouco, porém, tornou-se evidente que uma imagem<br />

podia sobreviver àquilo que representava; nesse caso, mostrava como<br />

alguém tinha sido – e, conseqüentemente, como o tema havia sido visto<br />

por outras pessoas. Mais tarde ainda, a visão específica do fazedor de<br />

imagens foi também reconhecida como parte integrante do registro. A<br />

266<br />

imagem tornou-se<br />

um registro de como X tinha visto Y.”<br />

É interessante perceber que, da mesma forma que uma determinada imagem reflete<br />

o olhar de uma pessoa, a sua apreciação também depende daquele que a vê. O olhar do<br />

criador da imagem e o do apreciador são igualmente subjetivos, ou seja, mesmo desejando<br />

ser um registro imparcial, o olhar estará sempre condicionado: “Todavia, embora todas as<br />

imagens corporizem um modo de ver, a nossa percepção e nossa apreciação de uma<br />

imagem dependem também do nosso próprio modo de ver. Por exemplo, Sheila pode ser<br />

uma entre vinte pessoas, mas por motivos pessoais, só temos olhos para ela.” 267<br />

A mulher foi, ao longo do tempo, extensamente abordada em pinturas, ilustrações e<br />

fotografias. Percebe-se que esse tipo de pintura é um movimento particular, pois revela,<br />

como discutido anteriormente, o modo de ver a figura feminina em um determinado<br />

momento histórico, que freqüentemente foi retratado por figuras masculinas: “(...) como<br />

qualquer representação a imagem é um jogo, guiado por regras culturais que evoluíram e<br />

que continuarão a evoluir. A imagem da mulher tem uma história em si mesma.” 268<br />

266<br />

BERGUER, John. Modos de Ver. Lisboa: Edições 70, 1972, p.14.<br />

267<br />

BERGUER,<br />

John. Op cit, p.14.<br />

268<br />

DUBY, Georges; PERROT, Michelle. Imagens da Mulher. São Paulo: Afrontamento, 1992, p. 140.<br />

126


Alceu Penna, ao criar as ilustrações das “<strong>Garotas</strong>”, como não podia deixar de ser,<br />

corporizou seu próprio modo de ver a figura feminina. A imagem um pouco contraditória<br />

que temos<br />

das mulheres é entendida pela ótica do autor, que vivenciou um período em que<br />

elementos novos conviviam com os velhos paradigmas:<br />

fotografadas, edificadas ou encenadas, atribuímos à elas o caracter<br />

de ódio), conferimos à imagem imutável uma vida infinita e<br />

el.” 269<br />

“Quando lemos imagens – de qualquer tipo, sejam pintadas, esculpidas,<br />

temporal da narrativa. Ampliamos o que é limitado por uma moldura para<br />

um antes e um depois e, por meio da arte de narrar história (sejam de<br />

amor ou<br />

inesgotáv<br />

Por outro lado, não podemos deixar de perceber que a malícia tomava um espaço<br />

maior nas ilustrações, destacando,<br />

de forma sutil, essas figuras do cenário feminino comum<br />

da época, algo que não<br />

pode ser explicado pela simples influência do contexto do país<br />

naquele momento. Nesse sentido as imagens são entendidas<br />

menos por um movimento<br />

exterior e mais interior, que parte do próprio ilustrador e de sua sensibilidade ao lidar com<br />

a realidade: “As imagens em si mesmas não são falsas nem verdadeiras, são expressões de<br />

anseios e sentimentos correspondentes ao que a realidade é ou ao que pode vir a ser.”<br />

O olhar de Alceu Penna em relação à mulher parece emergir do próprio contexto<br />

em que estava inserido, mas também de sua sensibilidade ao lidar com essa realidade.<br />

Examinando os registros profissionais de Alceu Penna, percebe-se que ele concebeu muitas<br />

ilustrações de figurinos para cassinos e shows, tendo trabalhado nesses lugares ao longo de<br />

sua carreira. Haja vista a extensa atividade do profissional nessa área, ele provavelmente<br />

esteve em contato, mais do que a grande maioria das pessoas, com um ambiente liberal e<br />

269<br />

FIGUEIREDO, Rubens; MANGUEL, Alberto; EICHEMBERG, Rosaura; STRAUCH, Claudia. Op cit p.<br />

27.<br />

270<br />

COSTA, Cristina. A imagem da mulher: um estudo de arte brasileira. Rio de Janeiro: <strong>Senac</strong>,<br />

2002, p.161.<br />

127<br />

270


descontraído, algo que deve ter contribuído, em certa medida, para a sua retratação<br />

incomum<br />

da mulher.<br />

Não podemos esquecer que, mesmo Alceu Penna tendo convivido em meio ao<br />

mundo dos espetáculos, ele ainda assim era um homem, ou seja, algo que teria potencial<br />

para influenciar o seu traço de maneira inquestionável, como de fato o fez. O modo com<br />

que seu gênero atuou nos seus desenhos pode ser percebida, sobretudo, pela exploração<br />

da<br />

sensualidade.<br />

Essa perspectiva deriva da sua visão, portanto masculina, em apreciar a<br />

mulher como objeto de desejo.<br />

Alceu Penna conseguiu desenhar figuras belas e, ao mesmo tempo, modernas e<br />

arejadas, sem cair nas tradicionais representações femininas:<br />

“A mulher sempre foi um dos temas preferidos dos ilustradores e<br />

cartunistas. Vistas pelos homens, elas se dividiam em tipos bem<br />

definidos. As belas bem vestidas, charmosas, interesseiras e loucas para<br />

casar. A galeria das feias incluía as feministas e as feras, munidas da<br />

271<br />

vassoura e do rolo de macarrão.”<br />

Pode-se dizer, em linhas gerais, que o conjunto de seus desenhos não afirmaram<br />

estereótipos, e muito menos depreciaram a figura feminina pela exploração constante da<br />

malícia. Em “As <strong>Garotas</strong>”, devido ao seu olhar incomum, Alce u Penna<br />

ilustrou mulheres<br />

que, mesmo<br />

se encaixando nos padrões conservadores, deram aos leitores de O Cruzeiro<br />

um respiro da realidade monótona e preconceituosa da época.<br />

271<br />

MATTAR, Denise. Texto de abertura do livro da exposição Traço, Humor e Cia. Museu de Arte Brasileira<br />

(MAB). Fundação Armando Álvares Penteado. 24 de maio a 298 de junho de 2003, p.8.<br />

128


4.2 Imagem e texto na coluna “As <strong>Garotas</strong>”: uma relação humorística<br />

“(...) o humor sobrevive aos tempos<br />

século, continuou deliciando leitoras e leitores até hoje. Sua função<br />

não se modificou, e políticos e<br />

sarcástico de uma cena ou frase infeliz<br />

‘Eu tenho medo do Chico<br />

Cardoso. E era para ter... Só<br />

lembranças mais festejadas foi<br />

humorista.” 272<br />

, importante na virada do<br />

artistas continuam temendo o efeito<br />

no traço de um humorista.<br />

Caruso’ disse Fernando Henrique<br />

que, ao deixar o governo, uma das<br />

a coleção de charges que ganhou do<br />

Como já explorado, a coluna foi locada, por muitos anos, na seção de humor de O<br />

Cruzeiro, fato que atesta a importância desse na sua<br />

caracterização. É provável que grande<br />

parte do sucesso que a coluna alcançou ao propagar<br />

idéias avançadas em relação à mulher<br />

deva-se, principalmente, à exploração imagética<br />

juntamente com a textual. Em “As<br />

<strong>Garotas</strong>” a imagem necessita do texto e vice- versa, estabelecendo um vínculo de<br />

dependência.<br />

Essa relação<br />

existe, pois as retratações visuais, essencialmente, são passíveis de<br />

múltiplas<br />

interpretações, ao passo que os textos, mesmo podendo abarcar alguns<br />

entendimentos, conseguem cercar o significado geral associado às imagens: “(...) toda<br />

imagem é polissêmica e pressupõe subjacente a seus significados uma cadeia ‘flutuante’ de<br />

significados, podendo o leitor escolher alguns e ignorar outros.” 273<br />

O elemento do riso pode associar-se à retratação imagética, quando estereótipos são<br />

banalizados,<br />

assim como situações levadas demasiadamente a sério, ocupando um papel<br />

importante na coluna ao questionar realidades. “<strong>Garotas</strong> e o lar”, em 31 de julho de 1943,<br />

coloca as ilustrações na função de dona de casa. Aparentemente, o estereótipo da “rainha<br />

do lar” permanece intacto ao observar as imagens. Entretanto, o texto revela, por exemplo,<br />

272<br />

CORRÊA, Thomaz Souto. In: MATTAR, Denise. Texto de abertura do livro da exposição Traço, Humor<br />

e Cia. Museu de Arte Brasileira (MAB). Fundação Armando Álvares Penteado. 24 de maio a 298 de junho de<br />

2003, p.77.<br />

273<br />

BARTHES, Roland. O óbvio e o obtuso. Lisboa:<br />

Ed. 70, 1982, p. 32.<br />

129


que elas não estão ligando muito para o desempenho desse papel: “Porque você não<br />

costura para mim enquanto eu leio?”<br />

Quem olha para essas ilustrações não imaginam que além de<br />

não levarem o menor jeito para tarefas domésticas, elas não<br />

ligavam a mínima para isso. Divertir-se era o lema das<br />

“<strong>Garotas</strong>”.<br />

cotidi<br />

Fig.50. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> e o lar”.<br />

31 de julho de 1943. Texto Alceu Penna<br />

Nesse sentido, ao mesmo<br />

tempo em que o humor abria a<br />

possibilidade de explorar realidades<br />

incomuns na coluna e jamais<br />

discutidas em aberto, ele transformava<br />

aquelas ilustrações inanimadas em<br />

entidades mais reais, aproximando-as<br />

dos leitores e leitoras de O Cruzeiro:<br />

“(...) se o riso, essa epifania da<br />

emoção não nos dá nada de<br />

duradouro, pelo menos humaniza e nos faz parte daquela integridade acabada da existência<br />

ana.” 274<br />

A aproximação provocada pelo humor torna a comunicação mais simpática. “As<br />

<strong>Garotas</strong>” compartilharam desse efeito, pois, ao apresentarem situações, por exemplo, em<br />

que faziam malabarismos para conciliar dois namorados ou faziam um comentário<br />

engraçado sobre o vestido de uma amiga, não se mostravam vulgares ou mesmo chatas, e<br />

sim engraçadas.<br />

A seção “A ressaca das <strong>Garotas</strong>”, em 09 de março de 1946, mostrava uma<br />

idealização da mulher às avessas. Nela as ilustrações estão sofrendo dos males de terem<br />

abusado das bebidas, uma situação que não ficava bem a mocinha nenhuma, mas encarada<br />

pela lente do bom humor. Em um determinado trecho da coluna, um rapaz se interessa por<br />

uma “Garota” nesse particular estado, notadamente com segundas intenções: “Não quero<br />

274<br />

TOMÉ, Elias Saliba. Dimensão cômica da vida privada na República. NOVAIS, Fernando A.;<br />

SEVCENKO, Nicolau. História da vida privada no Brasil: vol. 3: República: da belle époque à era do rádio.<br />

São Paulo: Companhia das Letras, 1997, p.<br />

364.<br />

130


gim nem cachaça, nem quero beber mais nada, só qu ero agora teus lábios minha adega<br />

Uma situação complicada para uma boa moça de família:<br />

cair na farra do<br />

carnaval e extrapolar no álcool. “As<br />

<strong>Garotas</strong>”<br />

encaravam tudo com bom humor e sem maiores<br />

dramas.<br />

Fig.<br />

ig. 51 Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “A ressaca das<br />

<strong>Garotas</strong>”. 09 de março de 1946. Texto Alceu Penna.<br />

divin izada.”<br />

figura s demasiadamente perfeitas, se<br />

encai encaixaram<br />

xaram no perfil do “novo herói”<br />

descr ito por Gilles Lipovetsky, pois<br />

apre sentam<br />

“As <strong>Garotas</strong>”, por não serem<br />

uma atitude cool frente à<br />

vida , mesmo tendo sido criadas em um<br />

perío período<br />

anterior 275 do anterior : “O novo herói não<br />

275 : “O novo herói não<br />

se le va à sério, desdramatiza o real e<br />

caracteriza-se por uma atitude<br />

maliciosamente desprendida ante os acontecimentos (...) não há entr ada para ninguém que<br />

se leve a sério, ninguém é sedutor se não for simpático.” 276<br />

se leve a sério, ninguém é sedutor se não for simpático.” 276<br />

Mesmo diante da simpatia das ilustrações, os textos da coluna, aliados às imagens,<br />

não seriam sozinhos tão eficazes em disseminar a malícia na coluna, se não fosse pelo<br />

humor contido neles. Esse recurso proporcionou um desvio da seriedade dos assuntos<br />

abordados, permitindo, ao mesmo tempo, exprimir de uma forma despretensiosa idéias não<br />

tão aceitas para os padrões conservadores f emininos. Aliás, essa será uma prática bastante<br />

comum entre os humoristas em geral, que irão explorar explorar o riso para criticar criticar realidades, sem,<br />

275<br />

As “<strong>Garotas</strong>” podiam ser figuras perfeitas esteticamente, mas seus comportamentos não o eram, pois<br />

ficavam de ressaca, tinham muitos namorados e paqueravam abertamente, atitudes que violavam as normas<br />

de bom comportamento da época. Essa característica vai ao encontro das idéias de Gilles Lipovetsky ao<br />

discorrer sobre as facetas do humor na pós-modernidade, ao falar do “novo herói”, que é descontraído mesmo<br />

em situações tensas, exemplificando com personagens como James Bond, que por essa atitude são<br />

extremamente sedutores e populares. In: LIPOVETSKY, Gilles. A era do vazio: ensaio sobre o<br />

individualismo contemporâneo.<br />

Lisboa: Relógio D'Água, 1983, p. 132.<br />

276<br />

LIPOVETSKY, Gilles. Op cit, p. 132.<br />

131


Na seção os textos casam-se com as imagens. Se apenas<br />

observássemos a imagem das “<strong>Garotas</strong>” não conseguiríamos<br />

entender a malícia colocada: a aluna que seduz o professor.<br />

Aparentemente, elas apenas estão cercas de livros, preocupadas<br />

com as provas.<br />

Fig. 52. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> em provas”. 29<br />

de outubro de 1955. Texto A. Ladino.<br />

vista, sob o disfarce anedótico de<br />

uma piada.”<br />

De maneira a não confrontar,<br />

o humor era um recurso que criava<br />

uma atmosfera de duplicidade, ou<br />

seja, algo que nunca se dizia<br />

abertamente, mas se insinuava nas entrelinhas: “(...) o cômico também sempre constituiu,<br />

no caso do Brasil em especial, uma forma de sublimar<br />

emoções.” 278<br />

qua se sempre são mais graves do<br />

que possam parecer à primeira<br />

ou pudores, ao dizer sem querer dizer, disfarçando o que intencionava manifestar,<br />

algo que<br />

não funcionaria sem a dimensão do cômico:<br />

contudo, perder de vista a<br />

descontração: “Os humoristas<br />

A seção “<strong>Garotas</strong> em provas”, em 29 de outubro de 1955, explorava o duplo<br />

sentido: “Não sei para que prova escrita. Se o professor fosse mais inteligente e menos<br />

míope veria logo que meu saber está na cara.” Esse exemplo fornece uma dimensão de<br />

algo socialmente condenável até os dias de hoje: a aluna seduzir o professor. No caso, a<br />

passagem remete à investida interesseira da “Garota”, que tenta conseguir uma nota melhor<br />

com a utilização dos seus atributos físicos.<br />

Os textos da coluna alcançaram as suas leitoras, sem esbarrar em constrangimentos<br />

277<br />

BARBOSA, Francisco de Assis. In: ZIRALDO. 1964-1984: 20 anos de prontidão. Rio de Janeiro:<br />

Record, 1984, p. 7.<br />

278<br />

TOMÉ, Elias Saliba.<br />

Op cit, p. 364.<br />

132<br />

277


“Há no humor uma vocação dialética espontânea, que o leva a<br />

questionar os princípios que enrijecem as certezas que se cristalizam, as<br />

conclusões que se pretendem definitivas. O humor força a consciência a<br />

se abrir para<br />

o novo, para o inesperado, para o fluxo infinitamente rico da<br />

vida, para a inesgotabilidade do real.” 279<br />

“Na barraca das <strong>Garotas</strong>”, em 5 de novembro de 1955, exemplifica a duplicidade<br />

imputada aos engraçados textos da coluna, que, se colocados de forma mais direta, não<br />

seriam possíveis de estar em uma revista familiar da época. Nessa seção as ilustrações se<br />

encontram na praia e munidas de más intenções, atrás de uma companhia masculina: “Na<br />

barraca que se expande, com franjas ao derredor, se a hospitalidade é grande, a hospedeira<br />

é maior.” Pode-se entender nas entrelinhas, também, que a figurinha desejava estreitar as<br />

aproximações, talvez, para algo além dos olhares, uma atitude complicada para uma moça<br />

de família, que desejava manter a sua reputação.<br />

Mesmo diante da simpatia das ilustrações, os textos da coluna, aliados às imagens,<br />

não seriam sozinhos tão eficazes em disseminar a malícia na coluna, se não fosse pelo<br />

humor contido neles. Esse recurso proporcionou um desvio da seriedade dos assuntos<br />

abordados, permitindo, ao mesmo tempo, exprimir de uma forma despretensiosa idéias não<br />

tão aceitas para os padrões conservadores femininos. Aliás, essa será uma prática bastante<br />

comum entre os humoristas em geral, que irão explorar o riso para criticar realidades, sem,<br />

contudo, perder de vista a descontração: “Os humoristas quase sempre são mais graves do<br />

que possam parecer à primeira vista, sob o disfarce anedótico de uma piada.” 280<br />

Na<br />

coluna “As <strong>Garotas</strong>” uma figura feminina atípica foi difundida por meio dos<br />

textos e imagens. A relação bem-sucedida entre esses elementos, acrescida do humor,<br />

279<br />

KONDER, Leandro. Barão de Itararé: o humorista da democracia. Coleção Encanto Radical. São Paulo:<br />

Editora Brasiliense, 1983. p.65.<br />

280<br />

BARBOSA, Francisco de Assis. In: ZIRALDO. 1964-1984: 20 anos de prontidão. Rio de Janeiro:<br />

Record, 1984, p. 7.<br />

133


evelou o talento de um ilustrador e redatores que, como “As <strong>Garotas</strong>”, não se encaixavam<br />

em<br />

nenhum tipo de classificação.<br />

134


4.3 <strong>Garotas</strong> modernas ou emancipadas? Uma análise imagética e textual da coluna<br />

A relação particular estabelecida entre o corpo e a moda na coluna “As <strong>Garotas</strong> do<br />

Alceu” nos aponta para uma incerta realidade da mulher brasileira. A análise imagética e<br />

textual da coluna procura esclarecer até que ponto as imagens da emancipação feminina<br />

vão ao encontro das figuras de Alceu Penna e em que momento elas se separam.<br />

As seções a serem estudadas, a seguir, foram escolhidas por representarem o<br />

constante conflito entre a ousadia e o recato protagonizado pelas “<strong>Garotas</strong>”. Elas<br />

enfatizam, também, como o corpo e a moda se manifestam nessa aparente contradição.<br />

Em “<strong>Garotas</strong> de Sarongs”, de 10 de abril de 1943, as ilustrações aparecem<br />

adornadas com colares e usando saias floridas. Esse traje, constituído de um pedaço de<br />

tecido envolto nos quadris, é popular, sobretudo, na Ásia e nas ilhas do Pacífico. Segundo<br />

o texto, escrito pelo próprio Alceu Penna, elas trouxeram essa moda para as praias cariocas<br />

provando<br />

estarem sempre por dentro das inovações.<br />

O traje aparece como novidade e servirá para atrair o olhar feminino ansioso por<br />

imitar “As <strong>Garotas</strong>”. É fato também que, pela sensualidade com que são ilustradas e pela<br />

expressão corporal em pose, como se as “<strong>Garotas</strong>” estivessem sendo observadas, é<br />

sugerido que haveria uma apreciação masculina.<br />

A moda dos Sarongs aparece como ponto central da coluna, mas o corpo das<br />

ilustrações é também um protagonista. Em uma passagem da coluna, a relação entre o<br />

corpo e a moda avança para além das imagens: “Sabes qual a diferença<br />

entre as <strong>Garotas</strong> de<br />

ontem e de hoje? As <strong>Garotas</strong> de ontem costumavam exibir as modas. Mas hoje, com os<br />

sarongs, as modas exibem as <strong>Garotas</strong>.”<br />

135


Fig.53. “<strong>Garotas</strong> de Sarongs” em 10 de abril de 1943. Texto Alceu Penna. “As <strong>Garotas</strong>” convidam o leitor a apreciar a<br />

beleza dos seus corpos e chamam a atenção das leitoras para uma nova moda, inspirada nos trajes havaianos chamados<br />

Sarongs. A coluna dialoga com moças e rapazes ao mesmo tempo. Uma diversidade de beldades são ilustradas por<br />

Penna, desde o tipo morena da pele bronzeada até a loura platinada de pele alva. Os Sarongs combinavam com todas!<br />

Esse trecho evidencia o corpo, estabelecendo-o como parte importante da<br />

composição da moda e da beleza feminina. Ela sublinha uma tendência, cada vez maior, de<br />

a moda exibir e acentuar o formato do corpo, e não escondê-lo em enormes quantidades de<br />

tecido, fato que não deixa de acentuar a íntima relação entre esses elementos: “A relação<br />

entre corpo e moda é ambígua, na medida em que a moda atua na formatação do corpo, ao<br />

valorizar determinadas zonas, enquanto o corpo limita a moda, impondo proporções,<br />

volumes, medidas para a criação do estilista.” 281<br />

“Na terra onde mandavam<br />

as <strong>Garotas</strong>”, de 28 de agosto de 1943, Alceu Penna nos<br />

convida<br />

a mergulhar em um universo em que a sociedade está sob o comando das<br />

mulheres, em uma inversão dos papéis entre homem e mulher: “Consta que houve um<br />

281 CASTRO. Ana Lúcia. Identidades e Estilos de vida. In: CASTRO. Ana Lúcia. RAMOS. Maria Lúcia<br />

Bueno. Corpo Território da Cultura. São Paulo: Annablume, 2005, p.141.<br />

136


eino – isso foi há muito tempo – em que as mulheres mandavam nos homens. Esse reino<br />

era o das amazonas (...) Bom será saber como as coisas corriam naquele tempo que agora<br />

parecem estar voltando.”<br />

Fig 54. “ Na terra onde mandavam as <strong>Garotas</strong>” em 28 de agosto de 1943. Texto Alceu Penna.. O ilustrador aspirou<br />

um mundo em que as suas graciosas ilustrações estivessem no comando. Longe de estar fantasiando ele mostrou uma<br />

tendência que começava a se tornar mais consistente para as mulheres brasileiras. Com muito humor, “As <strong>Garotas</strong>”<br />

deixavam de ser, pelo menos nas páginas de O Cruzeiro, o sexo frágil.<br />

À primeira vista, a coluna parece nos mostrar um universo fantasioso, se analisado<br />

pelo ângulo da sociedade conservadora da época. Entretanto, pelo exame da coluna,<br />

notamos que Alceu Penna nos apresenta menos uma situação fantasiosa e mais um<br />

prenúncio de que os papéis tradicionalmente impostos às mulheres estavam prestes a sofrer<br />

mudanças.<br />

As ilustrações estão caracterizadas como guerreiras, um papel ocupado na história,<br />

sobretudo, por homens. Além dessa alusão, elas estão, em certa medida, incorporando<br />

atitudes típicas masculinas, como a “Garota” que inclina um homem para beijá-lo.<br />

Contudo, “As <strong>Garotas</strong>”, mesmo como guerreiras, não abolem a sensualidade<br />

e<br />

137


feminilidade, vestindo-se com um uniforme provocante, mostrando bastante as pernas.<br />

Pensando assim, especificamente nas vestimentas sensuais, elas ainda servem a um olho<br />

masculino externo, mesmo em uma situação em que parecem estar no comando.<br />

Nessa seção o ilustrador parecia tentar codificar para os leitores e leitoras de O<br />

Cruzeiro uma tendência, ainda tímida, de liberação feminina. Essa mensagem era<br />

contundente, principalmente para as leitoras, pois mostrava uma mulher mais liberada,<br />

mas, ao mesmo tempo, bela e feminina, quebrando o estereótipo da feminista, que por<br />

querer uma igualdade maior entre os sexos era tachada de feia e rabugenta.<br />

Estava implícito na visão de Alceu Penna que, para experimentar posições<br />

masculinas na sociedade, as mulheres não precisariam encarnar linhas austeras no<br />

comportamento e no vestir, o que constituiu um exemplo e tanto para as leitoras: “Algumas<br />

imagens nos levam a rememorar, outras a moldar nosso comportamento; ou a consumir<br />

algum produto ou serviço; ou a formar conceitos ou reafirmar<br />

pré-conceitos que temos<br />

sobre determinado<br />

assunto; outras despertam fantasias e desejos.” 282<br />

Em “Três <strong>Garotas</strong> e Páris na sinuca”, de 24 de julho de 1943, Alceu Penna recria<br />

uma cena mitológica em que o deus Páris premia com uma maçã a deusa mais bonita,<br />

como escreve o redator Vão Gôgo: “Senhoras, seus encantos a sua beleza é um tesouro, a<br />

mais bela ganhará uma rica maçã de ouro.” Minerva e Juno são rejeitadas por Páris por<br />

terem mais<br />

atributos intelectuais do que físicos. Ele escolhe Vênus, porque ela tem a beleza<br />

como seu atributo maior: “Para falar mesmo a verdade seu presidente da mesa tenho só<br />

vivacidade e um bocado de beleza.”<br />

O tema dessa coluna nos revela a mulher como uma visão que satisfaz ao olho<br />

masculino. A mulher só é notada pelos seus atributos físicos, relegando a sua identidade<br />

àquela imagem idealizada.<br />

282 KOSSOY, Boris. Realidades e Ficções na trama fotográfica. São Paulo: Ateliê Editorial, p.44.<br />

138


Fig. 55. “Três <strong>Garotas</strong> e Páris na sinuca” em 24 de julho de 1943. Texto Vão Gôgo. As <strong>Garotas</strong> equilibram signos do<br />

conservadorismo e da ousadia com muito cuidado. Se por um lado são objetos de desejo masculino, por outro não se<br />

inibem ao mostrarem boa dose de pele para os leitores de O Cruzeiro.<br />

De acordo com Berguer, dentro de si a mulher carrega uma porção feminina, a<br />

vigiada, e outra masculina, a vigilante, que observa a sua imagem tal como deve ser<br />

apresentada ao homem: “O vigilante da mulher dentro de si própria é masculino: a vigiada,<br />

feminina. Assim, a mulher transforma-se a si própria em objeto – e muito especialmente<br />

num objeto<br />

visual: uma visão.” 283<br />

O corpo da ilustração central, diferentemente das outras duas, está seminu e os<br />

seios estão cobertos por um simples leque. Todos os olhares se convertem para ela.<br />

Podemos inferir que ela seria a Vênus, premiada pela sua incrível beleza, e talvez por isso<br />

esteja com o corpo mais exposto que as outras figuras. Mesmo quando a coluna trata a<br />

mulher de forma conservadora, ela ousa ao apresentar o corpo quase nu em suas páginas.<br />

283 BERGUER. Op cit, p. 51.<br />

139


Em “<strong>Garotas</strong>, Maio e casamentos”, de 1 de maio de 1954, as “<strong>Garotas</strong>” são<br />

mostradas inspiradas<br />

a se casar, principalmente no mês considerado o da noivas:<br />

“Vou fazer uma novena para meu santo milagroso, para ver se ele<br />

tem pena, e me remete um esposo”. O texto mostra a urgência e pressa<br />

para que se concretize o casamento, colocado como ritual muito<br />

importante e, como de fato era, para a mulher da época: “Proclamava-se<br />

que o casamento era ‘o estado perfeito’ e também uma obrigação à qual<br />

ninguém poderia se furtar.” 284<br />

As cores predominantes são o azul no fundo e branco na roupa das ilustrações,<br />

representando a pureza entregue ao noivo. O vermelho aparece, embora em menor<br />

quantidade, provavelmente, indicando a conquista amorosa e o romance.<br />

A posição corporal das ilustrações, especialmente a maior, novamente indica um<br />

observador masculino externo. Entretanto, as imagens das noivas “<strong>Garotas</strong>” suscitam,<br />

também, uma apreciação feminina, já que o casamento era um evento muito esperado pelas<br />

moças<br />

da época, sendo a coluna uma boa vitrine para elas: “Bela, mulher e imagem são<br />

termos<br />

com o emprego de um determinado<br />

texto, em um tom bem-humorado e irônico, remetendo<br />

a uma<br />

que estão tão intimamente associados que quase se confundem. Homens e<br />

mulheres, estamos sujeitos às seduções terrivelmente associadas da imagem e da beleza<br />

feminina imaginada.” 285<br />

A temática da seção, mesmo essencialmente tradicional, desvia dessa característica<br />

faceta não tão comportada das “<strong>Garotas</strong>”: “Maio é o mês por excelência dos<br />

casamentos e por isso mesmo é o ideal das <strong>Garotas</strong>....esses anjos de candura.” Esse recurso<br />

coloca, mais uma vez, o recurso do riso, enfatizando a duplicidade nos textos de forma<br />

despretensiosa.<br />

284 BESSE, Susan. Modernizando a desigualdade: reestruturação da ideologia de gênero no Brasil 1914-40.<br />

São Paulo: Universitária SP, 1999, p. 73.<br />

285 DUBY, Georges; PERROT, Michelle. Op cit, p.140.<br />

140


Fig 56. “<strong>Garotas</strong>, Maio e casamentos” em 01 de maio de 1954. Texto A. Ladino. Como qualquer mocinha da época, toda<br />

Garota desejava se casar em um modelo luxuoso. As ilustrações se aproximaram das suas leitoras ao desejarem também o<br />

sonho do matrimônio, mesmo que esse lado ficasse um pouco de lado na maioria das vezes.<br />

Em “Garota, o peixe morre pela boca!”, de 29 de setembro de 1956, o redator Edgar<br />

Alencar, o A. Ladino, escreve: “<strong>Garotas</strong>, se você quer segurar o preferido e, logo que<br />

liberem,<br />

transformá-lo em um bom marido, a tarefa é muito pouca, nada tem de<br />

extraordinária: basta só algumas gotas da velha arte culinária, pois vocês sabem, <strong>Garotas</strong>,<br />

que o peixe cai pela boca.”<br />

Essa edição nos remete ao tema da identidade feminina ligada às atividades<br />

domésticas, como a culinária, muito em voga com a figura da “rainha do lar”, após a<br />

Segunda Guerra Mundial. Uma moça disposta a conseguir um bom partido deve mostrar<br />

como é prendada. Essa é uma exigência masculina e revela como ele quer vê-la, atuando<br />

141


como construtor da sua identidade: “O seu próprio sentido daquilo que é, é suplantado pelo<br />

sentido de ser apreciada como tal por outrem.” 286<br />

Fig 57. “Garota, o peixe morre pela boca!” em 29 de setembro de 1956. Texto A. Ladino. Toda mocinha da época que<br />

desejasse possuir um leque extenso de pretendentes deveria cultivar as prendas domésticas<br />

como a culinária. As <strong>Garotas</strong>,<br />

mesmo não levando jeito para a coisa, se esforçavam bastante para agradar os rapazinhos, incorporando a identidade<br />

feminina tradicional.<br />

A posição corporal das ilustrações é direcionada para um olhar externo, ou seja, a<br />

um espectador, por sinal masculino. No canto esquerdo superior, a “Garota” olha para esse<br />

espectador, como para se certificar de que seu olhar está lá, observando e avaliando, fato<br />

comprovado pelas ilustrações menores, que exibem os seus quitutes. A “Garota” ao centro,<br />

que coloca uma iguaria na boca de um rapaz, demonstra que está ao seu dispor, propondo<br />

realizar os maiores caprichos gastronômicos.<br />

Nota-se que,<br />

apesar de estarem em uma atividade doméstica como a culinária, não<br />

estão mal arrumadas, pelo contrário, estão maquiadas e penteadas, com uma roupa, mesmo<br />

286 BERGUER, Jonh. Op cit, p. 50.<br />

142


que adequada<br />

à cozinha (com o avental), bem composta. Essa evidência está de acordo<br />

com a norma rígida com que a aparência era regida, em um momento em que a<br />

formalidade, até para os homens, era um imperativo e a beleza para as mulheres, uma<br />

ordem, conquistada com uma boa maquiagem: “A maquiagem é a única expressão<br />

possível, ou mesmo a única verdade. E também construção voluntária, objeto de<br />

perseverança, de determinação (...).” 287<br />

É interessante reparar que há uma grande atenção, de forma geral na coluna, para a<br />

cor vermelha. Retomo nesse ponto o fato de que Alceu Penna era daltônico. Uma pessoa<br />

com visão normal é capaz de ver as<br />

cores tais como elas são, podendo fazer, portanto,<br />

combinações<br />

que lhe agradam aos olhos, prestando atenção ou não no significado<br />

intrínseco a elas. O ilustrador, por ser daltônico, leva a crer que escolhia as cores mais pela<br />

representação do que pela sua beleza. Esse pensamento nos apresenta uma dimensão<br />

cuidadosa na escolha das cores empregadas na coluna, pois provavelmente não eram feitas<br />

ao acaso. O vermelho como cor recorrente<br />

nas ilustrações remete ao perfil sedutor<br />

constante<br />

das “<strong>Garotas</strong>”, bem como à sua malícia e volúpia.<br />

Nessa edição em especial, o vermelho é a cor que mais se sobressai, presente no<br />

detalhe do avental da “Garota” central, no título da coluna, no suéter da ilustração no canto<br />

direito inferior, no avental e fita de cabelo da “Garota” no canto direito superior. O tema é<br />

a sedução, sem dúvida, mas nos moldes conservadores, ou seja, a mulher que atrai o sexo<br />

oposto pelas prendas de futura esposa. O vermelho entra como a cor do desejo, da<br />

conquista e parece que, por essa ser discreta, a sua utilização também o é: “Nas artes<br />

visuais, a cor não é apenas um elemento decorativo ou estético. É o fundamento da<br />

expressão (....)” 288<br />

287 VIGARELLO, Georges. Op cit, p. 167.<br />

288 MODESTO, Farina. Psicodinâmica das cores em comunicação. São Paulo, 1986, p.23.<br />

143


Mesmo abordando um tema conservador como a mulher no lar, a coluna fornece<br />

pistas discretas de que “As <strong>Garotas</strong>”<br />

não serviam muito para esse tipo de papel. Esse fato<br />

não seria plenamente percebido sem a ajuda do texto, que, mesmo reforçando, consegue<br />

contradizer a imagem que está sendo mostrada: “Não há nenhum conflito entre os dois<br />

tipos de informação. Cada uma tem as suas especificidades. Mas as implicações da<br />

natureza universal da informação visual não se esgotam em seu uso como substitutivo da<br />

informação verbal.” 289 O texto consegue imputar uma outra perspectiva à imagem<br />

mostrada: “Mexer com massas, que espiga! Vou meter mãos pelos pés, que esse rolo de<br />

pastéis só serve mesmo é para briga.”<br />

Em “Uma Garota infernal”, de 19 de outubro de 1957, a “Garota” é ilustrada<br />

vestindo-se<br />

de capetinha, com tridente e rabo pontudo. Essa imagem, apesar de nos remeter<br />

a uma figura má, tende a encantar e seduzir o espectador. A “Garota” olha fixamente para<br />

ele, em uma posição corporal aberta<br />

e convidativa. A roupa é uma espécie de collant, que<br />

realça as<br />

formas da ilustração.<br />

A análise que tendemos a fazer desse exemplar da coluna é que ela contém uma<br />

figura feminina maliciosa. Ao mesmo tempo, também podemos perceber uma imagem nos<br />

moldes tradicionais, que parece ter como objetivo preencher<br />

os desejos masculinos.<br />

A cor predominante na coluna, no caso, é novamente o vermelho, refletindo a<br />

sedução, mas também sinalizando o perigo: “A paixão aquece o fogo. Há o jogo entre o<br />

amor e pecado e uma relação com o fato: o vermelho como representante do fogo,<br />

aquecerá os amantes e o mesmo fogo indicará a cor da proibição: não toque no fogo.”<br />

Esse perigo alerta os rapazes incautos a tomarem cuidado com o poder que essas figuras<br />

exercem sobre eles.<br />

289<br />

DONIS, A. DONDIS. Sintaxe da linguagem visual. São Paulo: Martins Fontes, 1997, p. 185.<br />

290<br />

GUIMARÃES, Luciano. A cor como informação: a construção biofisica, lingüística e cultural da<br />

simbologia da cores. São Paulo, 2000, p. 118.<br />

144<br />

290


Fig 58. “Uma Garota infernal” em 19 de outubro de 1957. Texto A. ladino. A “Garota” corrompia os mais incautos<br />

rapazes. Ela encarnou nessa edição a mulher tentadora, que leva os homens a cometer loucuras. Como de costume, as<br />

ilustrações demonstravam muita intimidade com seus corpos, sem o receio de explorar a sensualidade, algo pouco<br />

incentivado para as moças de reputação.<br />

Nesse mesmo sentido, a mulher é representada como a tentação, o perigo que leva<br />

os homens à perdição, tal como o exemplo de Adão e Eva, quando essa come a maçã<br />

proibida e os condena a abandonar o paraíso.<br />

Aqui está implícito que a mulher é<br />

responsável<br />

pelos deslizes masculinos, e não ele próprio.<br />

Esse é um posicionamento que leva a figura feminina ao constante sentimento de<br />

culpa ao usar a sedução. A construção da sua identidade dá-se pelo olho masculino, ou<br />

seja, tal como ele quer vê-la, e não como ela é de verdade, imputando um sentimento de<br />

culpa e embaraço em relação ao seu corpo. Essas<br />

atitudes são originadas da visão<br />

pecaminosa<br />

em relação à mulher, afirmadas pela tradição cristã ocidental, como salienta<br />

Bryan Turner: “Meu argumento é que, essas atitudes frente ao corpo são, ao menos em<br />

145


parte, um reflexo do conjunto da tradição cristã do Ocidente. Meu corpo é carne: é o local<br />

do apetite corruptor, do desejo pecaminoso e da irracionalidade privada.” 291<br />

Os versos de A. Ladino adicionam elementos não percebidos pela apreciação da<br />

imagem em si: “Garota cheia de bossa, como o Petróleo, bem nossa, tropical, primaveril,<br />

você, Garota flamante, é um hino belo e vibrante, à pujança do Brasil.”<br />

Esse trecho da coluna sublinha uma associação entre a brasileira e a sensualidade,<br />

entretanto de uma forma um tanto quanto nacionalista. Esse trecho parece apontar para o<br />

surgimento da mulher brasileira tipo exportação. Esse perfil associou os predicados e a<br />

sensualidade dessa figura feminina às suas raízes miscigenas, fato ancorado no mito das<br />

três raças (branco, índio, negro) criado no período do Estado Novo para forjar uma unidade<br />

nacional: “A mestiçagem brasileira nunca foi um fenômeno homogêneo. Os defensores do<br />

mestiço como símbolo nacional tiveram que escolher, entre várias mestiçagens ocorridas<br />

e enquadravam nos seus projetos de identidade nacional.” 292<br />

no Brasil aquelas que melhor s<br />

Essa relação<br />

talvez comece a surgir com mais força no momento e, provavelmente, o<br />

redator, assim como intelectuais da época se inspiraram nessa suposta particularidade do<br />

povo brasileiro para explicar essa característica.<br />

É tendencioso colocar “As <strong>Garotas</strong> do Alceu” em qualquer tipo de rótulo:<br />

modernas, emancipadas, comportadamente ousadas. No entanto, elas não parecem se<br />

encaixar em nenhum deles, sendo isso uma característica constante, de uma forma geral,<br />

nas seções pesquisadas. Elas não eram a “melindrosa”, a “rainha do lar” ou as “feministas<br />

feias”, eram outra coisa no meio desses estereótipos.<br />

A verdade é que podemos, de maneira geral, interpretar as imagens da coluna por<br />

diversos<br />

ângulos e, assim mesmo, em todos, modelos novos e antigos de mulher serão<br />

291<br />

TURNER, Bryan. S. El Cuerpo y la sociedad: exploraciones em teoria social. México: Fondo de Cultura<br />

Econômica.<br />

1989, p. 33<br />

292<br />

VIANNA, Hermano. Op cit, p.68.<br />

146


apresentados convivendo ou entrando em conflito entre si: “Por definição, as imagens<br />

visuais<br />

sempre propiciam diferentes leituras para os diferentes receptores que as apreciam<br />

ou que dela se utilizam enquanto objetos de estudo.” 293<br />

Se existiu uma intenção, algo discutível, por parte do autor Alceu Penna e do<br />

conjunto de redatores que colaboraram com a coluna, foi a de não estabelecer nenhum tipo<br />

de classificação da mulher. A coluna demonstrou as inúmeras situações em que o novo e o<br />

antigo se esbarravam e como “As <strong>Garotas</strong>” lidavam com eles. Como ser moderna e ao<br />

mesmo tempo não ficar falada?<br />

Até onde ir com o meu namorado, sem que ele pense que<br />

sou demasiadamente<br />

experiente? Como aproveitar as ousadias da moda sem, contudo, ser<br />

vulgar? Tudo indica que esses questionamentos pertenciam tanto às “<strong>Garotas</strong>” quanto a<br />

muitas mocinhas no período de vigência da coluna. É fácil entender, assim, por que a<br />

coluna foi tão popular. O diálogo e a identificação existiam entre a coluna e as leitoras, e<br />

não o discurso normatizador.<br />

A coluna não estava preocupada<br />

em estabelecer um padrão de comportamento entre<br />

as suas leitoras, já que as ilustrações eram em si contraditórias. É fato que a coluna refletiu<br />

a sociedade da época, em processo de intensas modernizações, fruto de avanços na<br />

indústria e urbanização. Os novos padrões conviviam com os velhos, já anunciando que os<br />

velhos estavam fadados a desaparecer. Alceu Penna nos deixou uma sugestão de um<br />

modelo de mulher mais independente e individual, que, mesmo vivendo em uma sociedade<br />

ainda conservadora, muitas vezes prestava atenção em seus anseios e sonhos, colocando-se<br />

em primeiro lugar em relação ao homem e aos papéis tradicionalmente impostos a ela.<br />

293 KOSSOY, Boris. Op cit, p. 45.<br />

147


CONCLUSÃO<br />

“As <strong>Garotas</strong>” viveram seu auge entre as décadas de 1940 e 1950, um momento em<br />

que a mulher se via<br />

solapada entre anúncios de cremes e pó-compacto, buscando<br />

reinventar-se, inspirando-se<br />

no cinema e nas revistas ilustradas, ansiosa por uma<br />

redescoberta. Na verdade,<br />

a coluna pouco auxiliou na tarefa de imputar uma determinada<br />

identidade<br />

a ela, pois se ocupou mais das contradições que do discurso homogêneo da<br />

moral e dos bons costumes.<br />

Esse discurso, repleto de regras, que inundavam a literatura e a imprensa,<br />

funcionava na realidade como um apoio na verdadeira crise da identidade feminina, que só<br />

cresceria com o passar dos anos, como discutido por Betty Friedan: “A imagem pública<br />

que desafia a razão e tem pouco a ver com a realidade, teve o poder de modelar<br />

excessivamente a vida da mulher. Mas essa imagem não possuía tal força se não existisse<br />

uma crise de identidade.” 294<br />

A coluna, ao omitir-se dos tradicionais estereótipos femininos, abriu espaço para<br />

uma nova figura feminina, que estava querendo emergir. Esse novo tipo de mulher ainda<br />

não era<br />

a realidade e precisaria esperar os movimentos, a partir dos anos 1960, que<br />

procuraram quebrar valores tradicionais profundamente arraigados: “O movimento jovem<br />

da década de 1960 não foi apenas altamente inovador em termos políticos, foi, talvez, antes<br />

de tudo, um movimento revolucionário na medida em que colocou em xeque os valores<br />

conservadores da organização social (...).” 295<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”, ao mesmo tempo em que eram o espelho da mulher<br />

propagada pelas comunicações, de moral conservadora, mas em sintonia com a<br />

modernidade, se tornaram figuras marginais, na medida em que fugiam desse padrão em<br />

294<br />

FRIEDAN, Betty. Mística feminina. Petrópolis: Vozes, 1971, p.67.<br />

295<br />

PINTO, Céli Regina Jardim. Uma história do Feminismo no Brasil. São Paulo: Fundação Perseu Abramo,<br />

2003,<br />

p. 42.<br />

148


direção a um novo modelo. Marilza Mestre fala sobre um conceito de marginalidade na<br />

construção do feminino, que se aplica ao exemplo materializado pelas “<strong>Garotas</strong>”:<br />

“Natalie Zemon Davies entende por marginalidade a condição daquele (a)<br />

que está às margens da média de comportamento aceito socialmente<br />

como normal. Ela entende que alguns tendem (por diversas razões<br />

contingenciais) a fugir do repertório padrão, e assim ocorre a<br />

variabilidade necessária para que novos padrões comportamentais possam<br />

ser selecionados pela cultura e que esta sofra as mudanças.” 296<br />

“As <strong>Garotas</strong>”, mesmo representando um tipo de mulher mais livre das amarras da<br />

sociedade<br />

patriarcal e dos papéis tradicionalmente atribuídos a ela, não materializaram a<br />

emancipação<br />

feminina completa. Um quadro da emancipação feminina, em sua forma<br />

completa,<br />

apontado por Françoise Thébaud, é a constituição de um espaço<br />

verdadeiramente<br />

comum entre homens e mulheres, um espaço de igualdade de direitos e<br />

portunidades, preservando a diferença de identidades. 297 o<br />

Essa igualdade até hoje não se<br />

concretizou<br />

plenamente e, assim, muitas batalhas ainda teriam que ser travadas após o<br />

período<br />

da coluna para que os efeitos da revolução feminina começassem a tomar formas<br />

mais<br />

concretas.<br />

Em um primeiro momento pensei que com o desfecho da dissertação chegaria a<br />

respostas<br />

mais concretas sobre “As <strong>Garotas</strong>”. Hoje, olhando para trás, penso que esse<br />

pensamento<br />

só empobreceria a análise e não corresponderia à totalidade do objeto<br />

estudado.<br />

É, na verdade, difícil lidar com a indefinição. Tive o intuito, inicialmente, de<br />

dizer<br />

exatamente o que foram as ilustrações de Alceu Penna. No entanto, perceber as<br />

contradições<br />

e a profundidade do que elas representaram foi um grande aprendizado<br />

retirado<br />

dessa experiência. “As <strong>Garotas</strong>” foram recatadas e modernas, bobinhas e espertas,<br />

296<br />

MESTRE, Marilza. A marginalidade como fator de construção do feminino. Disponível em:<br />

http://www.utp.br/psico.utp.online/site1/artigo_marilza_mestre1.pdf,<br />

p. 3. Acessado em 3 de março de 2007.<br />

297<br />

DUBY, Georges; PERROT, Michelle. História das mulheres: o século XX, v.5. Roma: Afrontamento,<br />

1991.<br />

149


doces e ásperas, entre tantos outros paradoxos que as tornam praticamente impossíveis de<br />

definir.<br />

150


FONTES E BIBLIOGRAFIA:<br />

1-<br />

Arquivos, acervos e bibliotecas consultadas:<br />

Biblioteca<br />

do Centro Universitário <strong>Senac</strong>. SP<br />

Biblioteca do Instituto de<br />

Filosofia e Ciências Humanas Universidade Estadual de<br />

C ampinas. UNICAMP<br />

Biblioteca Pontifícia<br />

Universidade Católica. PUC-MG<br />

Biblioteca Pública do Estado de Minas Gerais Luiz de Bessa. BH<br />

Arquivo<br />

do<br />

Jornal Estado de Minas. BH<br />

Acervo pessoal Thereza de Paula Penna. RJ<br />

2- Exposições visitadas:<br />

“As <strong>Garotas</strong><br />

do Alceu”. Museu de Arte da Pampulha. Belo Horizonte. 18 de abril de 2005<br />

a 01 de maio de 2005<br />

“Carmem Miranda para sempre”.<br />

Memorial da América Latina. São Paulo. 08 de março a<br />

16<br />

de abril de 2006<br />

“O Brasil na ponta do lápis: Alceu Penna, modas e figurinos”. Centro Universitário <strong>Senac</strong>.<br />

São Paulo. 09 a 26 de maio de 2007 - Campus Universitário <strong>Senac</strong> - SP<br />

3-<br />

Eventos:<br />

Evento<br />

Minas Cult. Desfile de estilistas mineiros, sob a direção de Paulo Borges,<br />

inspirados pelo trabalho de Alceu Penna. Praça da Estação. Belo Horizonte. 16 de abril de<br />

2005<br />

1.<br />

Fontes e Bibliografia<br />

1.1. Fontes<br />

1.1.1. Fontes orais<br />

Thereza de Paula Penna. Rio de Janeiro: 01 fevereiro de 2006, 07 de junho de 2006,<br />

02<br />

novembro<br />

de 2006.<br />

151


1.1.2. Fontes escritas:<br />

O, CRUZEIRO (Acervo Jornal Estado de Minas)<br />

1928 – 1980<br />

“As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. In: O CRUZEIRO (Acervo Jornal Estado de Minas)<br />

1938 – 1964<br />

CIGARRA, A (Acervo Jornal Estado de Minas)<br />

1930<br />

– 1950<br />

ESTADO DE MINAS (Arquivo Estado de Minas)<br />

16/04/00<br />

CASTRO.<br />

Ruy. Texto de abertura da exposição “O Brasil na ponta do lápis: Alceu Penna,<br />

modas e figurinos”. Centro Universitário <strong>Senac</strong>-SP. Maio 2007<br />

HOLLANDA,<br />

Heloisa Buarque. Texto manuscrito. Rio de Janeiro, 2006 (mimeo).<br />

MARINA, Anna.<br />

Texto manuscrito. Belo Horizonte, 2006 (mimeo). 09 de novembro de<br />

2006.<br />

1.2 Catálogos de exposições:<br />

Apresentação do catálogo da exposição “<strong>Garotas</strong> do Alceu”, realizada em julho de 1983,<br />

no Palácio<br />

das Artes.<br />

1.3<br />

Memórias e Biografias:<br />

CARVALHO. Luiz Maklouf. Cobras criadas: David Nasser e O Cruzeiro. São Paulo:<br />

<strong>Senac</strong>, 2001<br />

CASTRO,<br />

Ruy . Carmem: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2005<br />

DÓRIA. Carlos. Bordado da Fama: Uma biografia de Dener. São Paulo, 1998<br />

JUNIOR, Gonçalo. Alceu Penna e as <strong>Garotas</strong> do Brasil: moda e imprensa 1933/1980.<br />

São Paulo: Clube dos Quadrinhos, 2004<br />

LEÃO,<br />

Danuza. Quase tudo: memórias. São Paulo: Companhia das Letras, 2005<br />

MORAIS. Fernando. Chatô: o rei do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1994<br />

152


NETTO. Accioly. Império de Papel: Os bastidores de O Cruzeiro. Porto Alegre: Sulina,<br />

1998<br />

NUNES. Maria Aparecida (org). Correio Feminino. Qualidades para tornar a mulher In:<br />

Correio<br />

da Manhã. LISPECTOR, Clarisse. 22 de janeiro 1960<br />

SANTOS. Joaquim Ferreira dos. Feliz 1958: o ano que não devia terminar. Rio de Janeiro:<br />

Record,<br />

2003<br />

VILLAS. Alberto. O Mundo acabou. São Paulo: Globo, 2006<br />

1.4<br />

Obras e textos literários:<br />

MILLÔR. Fernandes. Apresentações. Rio de Janeiro: Record, 2004<br />

PESSOA. Fernando. Não sei quantas almas tenho. Disponível em:<br />

http://users.isr.ist.utl.pt/~ cfb/VdS/v096.txt. Acessado em 19 de junho de 2007.<br />

2. Bibliografia<br />

2. 1. Obras de referência:<br />

CASTRO,<br />

Ruy. Ela é carioca: uma enciclopédia de Ipanema. São Paulo: Companhia das<br />

Letras, 1999<br />

PAES. José Paulo.MASSAUD. Moisés. Pequeno dicionário de literatura brasileira. São<br />

Paulo<br />

2.2 Livros, teses, relatórios e artigos científicos:<br />

ABREU.<br />

Regina. A capital contaminada: construção da identidade nacional pela negação<br />

do espírito carioca. In: LOPES. Antônio Herculando. (org) Entre Europa e África: a<br />

invenção do carioca. Rio de Janeiro: Fundação Casa Rui Barbosa: Top books, 2000<br />

ACCIOLY. Aluízio Ramos. MARINHO. Inezil Penna. História e organização da<br />

Educação Física e dos Desportos. Rio de Janeiro: Batista<br />

de Souza, 1956<br />

ADELMAN. Mirian. Mulheres atletas: re-significações da corporalidade femi nina.<br />

In:<br />

Estudos feministas, Florianópolis 11(2): 360, julho-dezembro 2003, p.446. Disponível em:<br />

http://www.scielo.br/pdf/ref/v11n2/19131.pdf. Acessado em maio de 2007<br />

153


ALVES. Andréia Matias. FILHO-COURA. Pedro. Avaliação das ações das mulheres sob<br />

violência no espaço familiar, atendidas no Centro de Apoio à Mulher (Belo Horizonte),<br />

entre 1996 e 1998. Artigo retirado de:<br />

http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S141381232001000100020&script=sci_arttext&tlng=<br />

en. Acessado em: 28/10/06<br />

ANASTÁCIO,<br />

Marina Bruno Santo. <strong>Garotas</strong> do Alceu: moda feminina brasileira nas<br />

páginas de “O Cruzeiro” entre 1938 e 1958. Monografia, UFRJ, Rio de Janeiro, 2003<br />

ANDRADE, Ana Maria Ribeiro de. CARDOSO, José Leandro<br />

Rocha. Aconteceu, virou<br />

manchete. In: Revista Brasileira História, São Paulo, v. 21, n. 41, 2001. Disponível<br />

em:http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010201882001000200013&l<br />

ng=en&nrm=iso. Acessado em:<br />

10 de outubro de 2006.<br />

ANGELI, Daniela. Uma breve história das representações do corpo feminino na sociedade.<br />

Rev. Estud. Fem. [online]. 2004, vol. 12, no. 2 [cited 2007-03-13], pp. 243-245.Disponível<br />

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AZEVEDO. Lílian H. de. Mulheres revistas:<br />

Educação, sociabilidade e cidadania na<br />

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Brasileiro de Ciências da Comunicação. Salvador/BA, setembro, 2002<br />

BARBOSA. Francisco de Assis. ZIRALDO. 1964-1984: 20 anos de prontidão. Rio<br />

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http://www.eca.usp.br/alaic/material%20congresso%202002/congBolivia2002/trabalhos%<br />

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20Historia%20da%20comunicacao.doc. Acessado<br />

em 10 de outubro de 2006.<br />

BARTHES, Roland. O óbvio e o obtuso. Lisboa: Ed. 70, 1982<br />

B ASSANEZI, Carla. Mulheres nos Anos Dourados . In: PRIORI, Mary. História das<br />

Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1997<br />

_________________.<br />

Virando as páginas, revendo as mulheres: revistas femininas e<br />

relações<br />

homem-mulher, 1945-1964. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996<br />

BASSANEZI, C arla. URSINI, Bombonatto Leslye. O Cruzeiro e As <strong>Garotas</strong>.<br />

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CHARLES DANA GIBSON´S ELEGANT DRAWINGS CAPTURED THE SPIRIT<br />

OF<br />

AN AGE, p. 04. Disponível em http://www.gibson-girls.com/index.html<br />

161


CRÉDITO DAS ILUSTRAÇÕES<br />

INTRODUÇÃO<br />

Fig 01. Alceu Penna desenhando. Sem data. Acervo Gabriela Ordones Penna<br />

Fig.02 a. Figurino inspirado na ópera Carmem. Sem data. Acervo<br />

Thereza Penna.<br />

Fig 02 b. Figurino Bolero. Sem data. Acervo Thereza Penna.<br />

Fig. 03 a e 03 b. “Cada terra tem seu uso”. Sugestão de fantasias de Alceu Penna, para O<br />

Cruzeiro. 04 de fevereiro de 1939. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 04 a Croqui de modelo do costureiro Balenciaga, Sem data. Acervo Thereza Penna<br />

Fig. 04 b Croqui de um modelo do costureiro Fath. Sem data. Acervo<br />

Thereza Penna<br />

Fig. 05 Cartaz sabão Sulfuroso. Sem data. Acervo Thereza Penna.<br />

Fig. 06 a 06 b Croquis de Alceu Penna para shows ou cassinos. Sem data.<br />

Acervo Thereza<br />

Penna<br />

Fig. 07 a Capa livro “J Carlos: Época, vida e obra” de Álvaro Cotrim<br />

Fig. 07 b Ilustração de Erté “Alphabet Cloak”. Sem data.<br />

(Alvarus).<br />

Fig<br />

08 a Figurino de Alceu Penna para Elza Soares. Show Brazil Export, no Canecão.<br />

1972. Acervo Thereza Penna.<br />

Fig. 08 b Croqui para o figurino da “Viúva do Palhaço” do show da Rhodia Stravaganza.<br />

1969. Acervo Thereza Penna.<br />

Fig.09<br />

a Capa revista Tricô e Crochê. Exemplar pertencente à Mercedes<br />

Penna, mãe de<br />

Alceu. Sem data. Acervo Thereza Penna.<br />

Fig. 09 b Ilustração Calendário Santista. 1945-46. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 10a. Croqui feito para show. Possivelmente para o Brazil Export no Canecão em<br />

1972.<br />

Acervo Thereza Penna.<br />

Fig. 10 b. Croqui feito para Ducal Jeans e Madras denominado Golden Years 1973.<br />

Acervo Thereza Penna.<br />

CAPITULO 01<br />

Fig 11. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> em Copacabana. 04 de janeiro de 1941.<br />

Texto<br />

Lyto. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

162


Fig 12 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> de fevereiro”. 07 de fevereiro de 1942.<br />

Texto<br />

Lyto. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig<br />

12 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Municipal com as <strong>Garotas</strong>”. 18 de fevereiro de<br />

1956. Texto A. Ladino. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig<br />

13 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> de setembro”. 05 de setembro de 1942.<br />

Texto Millôr Fernandes. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 13 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong><br />

do Alceu”. “<strong>Garotas</strong> em férias”. 17 de novembro de 1945.<br />

Texto Vão Gôgo. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 14 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Garota Cinema”. 26 de novembro de 1938.<br />

Texto Alceu Penna. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado<br />

de Minas.<br />

Fig. 14 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> e a luta de Box. 27 de julho de 1940. O<br />

Cruzeiro. Acervo<br />

Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 15. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> & Carnaval em 14 de fevereiro de 1942.<br />

Texto Alceu Penna. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 16 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> e a arte da culinária”. 26 de novembro<br />

de 1938.<br />

O Cruzeiro. Texto A. Ladino. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 16 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Para Agradar as <strong>Garotas</strong>”. 11 de março de<br />

1944. Texto Alceu Penna. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas<br />

Fig.17 Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> e a comedie française”. 27 de maio de<br />

1950. Texto<br />

A. Ladino. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas<br />

Fig. 18. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> no Municipal. Texto Alceu Penna. 25 de<br />

julho de 1942. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas<br />

Fig. 19 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> em ferias”. Texto A. Ladino. 03 de abril<br />

de 1954. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 19 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Um ônibus e <strong>Garotas</strong> em pé”. 27 de maio de<br />

1950.<br />

Texto A. Ladino. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 20. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Sol é maluco por <strong>Garotas</strong>”. 22 de outubro de<br />

1955. Texto A. Ladino. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 21. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. 1° amor das <strong>Garotas</strong>. Texto sem referência. 10 de<br />

novembro<br />

de 1945. O Cruzeiro. Acervo<br />

Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 22 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: A beleza das <strong>Garotas</strong>. Texto Alceu Penna. 01<br />

agosto de 1942. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig.<br />

22 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> e os autógrafos. Texto A. Ladino. 11 de<br />

outubro de 1952. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 23. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”. <strong>Garotas</strong> na areia.<br />

Texto sem referência. 10 de<br />

novembro de 1945.<br />

163


CAPITULO 02<br />

Fig. 24a. Capa Cigarra. Sem data. Acervo Estado de Minas.<br />

Fig 24 b. Suplemento feminino em A Cigarra. Janeiro de 1945. Acervo Estado de Minas.<br />

Fig. 25 a. Capa O Cruzeiro, feita por Alceu Penna. 24 de dezembro de 1938. Acervo<br />

Jornal<br />

Estado de Minas.<br />

Fig. 25 b. Capa O Cruzeiro inaugural. 05 de dezembro de 1928. Acervo Estado de Minas.<br />

Fig. 26 a. Coluna Lar doce Lar: Mais salgadinhos de salsichas. O Cruzeiro. 13 de<br />

dezembro de 1958. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 26 b. Reportagem O Cruzeiro: Vivi! 05 de dezembro de 1938. Acervo Jornal Estado<br />

de Minas.<br />

Fig<br />

27 a. O Pif Paf. O Cruzeiro 17 de outubro de 1959. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 27 b. O Amigo da Onça. O Cruzeiro 11 de janeiro de 1964. Acervo Jornal Estado de<br />

Minas.<br />

Fig<br />

28 a. Coluna Elegância e beleza. O Cruzeiro. 06 de julho de 1957. Acervo Estado de<br />

Minas<br />

Fig<br />

28 b. Coluna De mulher para Mulher. O Cruzeiro 27 de julho de 1957. Acervo Jornal<br />

Estado de Minas.<br />

F ig. 29 a. Conto Bahia. O Cruzeiro 08 de outubro de 1938. Acervo Jornal Estado de<br />

Minas.<br />

Fig. 29 b. Portifólio Modas. O Cruzeiro 17 de julho de 1943. Acervo<br />

Jornal Estado de<br />

Minas.<br />

F ig. 30 a. Reportagem sobre os lançamentos da Maison de Christian Dior, de Alceu Penna,<br />

para O Cruzeiro. 28 de agosto de 1957. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 30 b. Reportagem sobre a coleção de Lanvin Castillo,<br />

inspirada no Japão, de Alceu<br />

Penna, para O Cruzeiro. 03 de agosto de 1957. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 31 a. Reportagem sobre o concurso Miss Brasil 1957, em que Teresinha Morango<br />

era a<br />

vencedora.<br />

O Cruzeiro. 06 de setembro de 1957. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 31 b. Reportagem sobre as belezas de Copacabana. O Cruzeiro. 29 de maio de 1943.<br />

Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 32. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu” 19 de novembro de 1938. O Cruzeiro. Acervo<br />

Estado<br />

de Minas.<br />

Fig 33 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: Malas e <strong>Garotas</strong>. Texto sem<br />

referência. 23 de<br />

novembro<br />

de 1940. O Cruzeiro. Acervo Estado de Minas.<br />

Fig 33 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: Pausa e meditação das <strong>Garotas</strong>. Texto A. Ladino.<br />

28 de julho de 1956. O Cruzeiro. Acervo Estado de Minas.<br />

Fig 34 a. Camille Clifford, atriz, conhecida por ser uma Gibson Girl. 1905.<br />

http://www.gibson-girls.com/gibson-3.html. Acessado em 25 de outubro<br />

de 2006.<br />

164


Fig 34 b. Ilustração Gibson Girl. 1909. http://www.gibson-girls.com/gibson-3.html.<br />

Acessado em 25 de outubro de 2006.<br />

Fig 35 a. Reportagem <strong>Garotas</strong> do Alceu. O Cruzeiro 30 de outubro de 1948. Acervo Jornal<br />

Estado de Minas.<br />

Fig. 35 b. Foto desfile Providência dos Desamparados com as damas da sociedade vestidas<br />

de Alceu Penna 1948. Acervo Thereza Penna.<br />

Fig. 36.a Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: Cuidado! <strong>Garotas</strong>. Texto Alceu Penna. 08 de<br />

novembro de 1941. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig.<br />

36 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> dão aula de moda. Texto Maria Luiza.<br />

25 de outubro de 1958. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig<br />

37 Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: <strong>Garotas</strong> à postos. Texto sem referência. 17 de<br />

outubro<br />

de 1942. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 38 a. Reportagem<br />

Calendário <strong>Garotas</strong>. 06 de dezembro de 1952. O Cruzeiro. Acervo<br />

Jornal<br />

Estado de Minas.<br />

Fig.<br />

38 b. Calendário <strong>Garotas</strong>. Sem data. Acervo Gabriela Ordones Penna<br />

CAPITULO 03<br />

Fig. 39 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Bicicletas e <strong>Garotas</strong>” em 05 de Agosto de<br />

1946. Texto A. Ladino. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig.<br />

39 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> e equitação” em 16 de janeiro de 1943.<br />

Texto Millôr Fernandes. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 40. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> patinando” 19 de janeiro de 1946. Texto<br />

Vão Gôgo. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig<br />

41. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> & New York” 19 de janeiro de 1946. 29<br />

de Junho de 1940. Texto Alceu Penna. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 42. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> em shorts”. 18 de outubro de 1952. Texto<br />

A. Ladino. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig.43. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> e os chapéus novos”. 13 de maio de<br />

1939. Texto Alceu Penna. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig.44<br />

Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> dão cada baixo!”. 01 de novembro de<br />

1952. Texto A. Ladino. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig.45<br />

Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> e camuflagem". 21 de novembro de 1942.<br />

Texto Alceu Penna. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 46 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> a bordo”. 30 de novembro de 1938.<br />

Texto Alceu Penna. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

165


Fig. 46 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Que te quero Garota”. 26 de outubro de 1957.<br />

Texto A. Ladino. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig.47 “A mulher em nova edição”. 28 de setembro de 1957. O Cruzeiro. Acervo Jornal<br />

Estado de Minas.<br />

Fig.48 a. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “O banho das <strong>Garotas</strong>”. 31 de janeiro de 1942.<br />

Texto Alceu Penna. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig.48 b. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> em passeios”. 02 de novembro de 1946.<br />

Texto A. Ladino. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig.49 Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “O banho das <strong>Garotas</strong>”. 31 de janeiro de 1942.<br />

Texto A. Ladino. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas<br />

CAPÍTULO 04<br />

Fig.50 Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> e o lar”. 31 de julho de 1943. Texto Alceu<br />

Penna. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 51 Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “A ressaca das <strong>Garotas</strong>”. 09 de março de 1946.<br />

Texto Alceu Penna. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 52. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> em provas”. 29 de outubro de 1955.<br />

Texto A. Ladino. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig.53. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong> de Sarongs” em 10 de abril de 1943. O<br />

Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 54. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Na terra onde mandavam as <strong>Garotas</strong>” em 28 de<br />

agosto de 1943. Texto Alceu Penna. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig. 55. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Três <strong>Garotas</strong> e Páris na sinuca” em 24 de julho<br />

de 1943. Texto Vão Gôgo. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 56. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “<strong>Garotas</strong>, Maio e casamentos” em 01 de maio de<br />

1954. Texto A. Ladino. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 57. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Garota, o peixe morre pela boca!” em 29 de<br />

setembro de 1956. O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

Fig 58. Coluna “As <strong>Garotas</strong> do Alceu”: “Uma Garota infernal” em 19 de outubro de 1957.<br />

O Cruzeiro. Acervo Jornal Estado de Minas.<br />

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