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EDIÇÃO 06 | MARÇO DE 2013 | FASE II - Agulha Revista de Cultura

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ou quem propriamente ele é fiel. Sua astúcia inquestionável está na dubieda<strong>de</strong>. Para elas,<br />

quanto mais se vive, mais se vê. Para a poesia, quem <strong>de</strong>fine a extensão do olhar é a<br />

intensida<strong>de</strong>. Em conversa com a pintora húngara Susana Wald, ela me diz que lamenta que<br />

estejamos sempre a justificar o que fazemos, como se a vida nos impusesse outra coisa. A<br />

vida somos nós e não nos impomos algo distante <strong>de</strong> nós. Por que criar uma i<strong>de</strong>ia tão<br />

negativa do que somos na vida? Quase sempre estamos curando alguma ferida. A arte, em<br />

seu melhor sentido, é um posto <strong>de</strong> emergência para as almas feridas. Não era para ser<br />

engraçadinha como quem vem aqui rir um pouco <strong>de</strong> tudo. Até seria, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que cada um<br />

levasse a sério essa necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> rir um pouco <strong>de</strong> tudo. Mais um provérbio? Um plano <strong>de</strong><br />

fuga, que tal? Um sonho. A vida está gravada em nós muito mais a partir do sinal <strong>de</strong> dor do<br />

que propriamente <strong>de</strong> alegria. O que não me agrada na condição tripartida <strong>de</strong> um velho<br />

amuleto é que à ciência corresponda a dúvida, à religião a crença e à arte o maravilhar-se.<br />

Este trevo <strong>de</strong> três folhas jamais me convenceu. Quando ponho a minha vida em uma tigela,<br />

eu o faço no sentido <strong>de</strong> que tanto ela seja provada por todos como que também eu me<br />

renove ao toque <strong>de</strong> cada lábio.<br />

Aqui <strong>de</strong>veria haver um silêncio inquietante na forma <strong>de</strong> uma pergunta irrevelável: essa<br />

coisa não tem fim? É verda<strong>de</strong>. Em qualquer cultura os provérbios ensinam a não <strong>de</strong>morar<br />

muito em voo. É curioso porque aponta na direção <strong>de</strong> uma presunção <strong>de</strong> que estamos<br />

sempre muito próximos das gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>scobertas, ao mesmo tempo em que po<strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciar<br />

um cuidado para que o santo <strong>de</strong> casa não <strong>de</strong>sista nunca do martírio ao qual <strong>de</strong>vota sua vida.<br />

NOTAS<br />

1. “Não há mais moda”, entrevista conduzida por Luciana Stein. Época # 336, São Paulo, 25/10/2004.<br />

2. Ciclo <strong>de</strong> palestras e <strong>de</strong>bates: “Além do mercado: Literatura/As revistas literárias”. Instituto Goethe.<br />

São Paulo, SP. Outubro <strong>de</strong> 2001.<br />

3. “O corpo <strong>de</strong>spedaçado <strong>de</strong> Orfeu”. <strong>Revista</strong> Poesia Sempre # 8. Rio <strong>de</strong> Janeiro. Junho <strong>de</strong> 1997.<br />

4. “Poéticas do pós-mo<strong>de</strong>rno”. <strong>Revista</strong> Poesia Sempre # 8. Rio <strong>de</strong> Janeiro. Junho <strong>de</strong> 1997.<br />

5. “O ofício do poeta” (discurso proferido em Munique, em 1976).<br />

6. “Sobre O sistema da moda e a análise estrutural das narrativas”. Entrevista a Raymond Bellour. Les<br />

Lettres Françaises. Paris. Março <strong>de</strong> 1967.<br />

Floriano Martins (Brasil, 1957). Poeta, ensaísta, tradutor. Contato:<br />

arcflorianomartins@gmail.com. Página ilustrada com obras <strong>de</strong> Lucebert (Holanda), artista<br />

convidado da presente edição <strong>de</strong> ARC.<br />

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