1 Narrativas de experiências sexuais em torno da internet: a ...
1 Narrativas de experiências sexuais em torno da internet: a ...
1 Narrativas de experiências sexuais em torno da internet: a ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
t<strong>em</strong> uma experiência sexual para contar. Neste fragmento toma discursivamente uma postura <strong>de</strong><br />
agência, permiti<strong>da</strong> pelo índice lexical “pegar”. Contudo esta postura é questiona<strong>da</strong> pelos outros<br />
participantes, quando estes se espantam: “O QUÊ? Já pegou mulher lá? /Eh, ele já pegou mulher!” (l.<br />
13/14).<br />
Esses questionamentos parec<strong>em</strong> ter levado Fábio a construir uma avaliação <strong>da</strong>quela história.<br />
Ao justificar seu comportamento “eu já louca <strong>de</strong> cerveja” (l. 16), Fábio lança aquela experiência sexual<br />
ao campo do não habitual, no sentido <strong>de</strong> que uma experiência com o sexo oposto não ratifica a<br />
i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> que evoca. Aqui, a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> homossexual que Fábio constrói é posta <strong>em</strong> xeque pelos<br />
participantes, que colaboram na construção <strong>de</strong> uma outra performance para Fábio, pois a idéia <strong>de</strong><br />
agência trazi<strong>da</strong> com verbo “pegar” parece que lhe é nega<strong>da</strong> pelo grupo.<br />
Fábio agora assume um outro posicionamento. Durante a narração, cita a voz dos<br />
personagens “Aí:: fica comigo-fica comigo!”/ “Eu não quero, mapoa!”/(l. 18/19) “Fica comigo”, aí eu<br />
falei: “vai, então, pega logo!” (l. 21), <strong>de</strong>monstrando ter acesso epistêmico sobre o evento narrado e<br />
construindo a amiga <strong>de</strong> Cristina como a agência na história. Fábio a coloca numa posição ativa no<br />
<strong>de</strong>senrolar <strong>da</strong> ação narra<strong>da</strong>, já que é ela qu<strong>em</strong> toma a iniciativa <strong>de</strong> querer “ficar” com Fábio.<br />
Esse posicionamento é ratificado quando ele redireciona a agência e utiliza o verbo “pegar”<br />
para se referir à amiga <strong>de</strong> Cristina, pois a ação <strong>de</strong> pegar agora cabe a ela. Essa é uma performance<br />
comumente evoca<strong>da</strong> pela masculini<strong>da</strong><strong>de</strong> heg<strong>em</strong>ônica, pois viv<strong>em</strong>os <strong>em</strong> uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>em</strong> que, no<br />
senso comum, o hom<strong>em</strong> é construído como aquele que possui uma incontinência sexual, sendo as<br />
<strong>de</strong>mais i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>s vítimas <strong>de</strong>ssa incontinência. Contudo, o modo como narrador se posiciona e<br />
posiciona a garota vai <strong>de</strong> encontro ao esperado <strong>de</strong> um hom<strong>em</strong> e <strong>de</strong> uma mulher, já que há uma inversão<br />
dos papéis e qu<strong>em</strong> precisa ser sacia<strong>da</strong> ali é a garota.<br />
Esses posicionamentos contam que Fábio, quando veste a máscara <strong>de</strong> “hetero” é levado a fazer<br />
performances f<strong>em</strong>ininas. Essa narrativa colabora para enten<strong>de</strong>rmos o modo como a matrix<br />
heterossexual é aprisionadora e não permite uma movimentação para além do binômio “homo-hetero”.<br />
De modo que fixa i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um contínuo aparent<strong>em</strong>ente lógico reivindicado pela<br />
heterossexuali<strong>da</strong><strong>de</strong> compulsória: gênero, sexo e <strong>de</strong>sejo.<br />
Assim, Fábio movimenta-se <strong>em</strong> direção ao híbrido, contudo este posicionamento lhe é<br />
questionado <strong>da</strong>do a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> que evoca. Mesmo assim, aquelas narrativas subvert<strong>em</strong> a matrix<br />
heterossexual, pois nos convocam a pensar as nossas i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>sexuais</strong> como não fixas e<br />
historicamente situa<strong>da</strong>s, po<strong>de</strong>ndo mu<strong>da</strong>r nos contextos sociais pelos quais circulamos.<br />
i FABRÍCIO, B.F. (2006)“Narrativização <strong>da</strong> experiência: o triunfo <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m sobre o acaso”. In Magalhares, I.; Griogoleto, M.; Coracini<br />
M. J. (Org.) Práticas I<strong>de</strong>ntitárias: Língua e Discurso. São Carlos: Claraluz, p. 191-209.<br />
6