Dádiva e Emoção - CCHLA - Universidade Federal da Paraíba
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égide de uma obrigação aparece quase como uma<br />
contradição em relação à natureza do presente -<br />
expressar afeição. O caráter obrigatório do presente<br />
aparece na maior parte dos casos sob a forma <strong>da</strong>s <strong>da</strong>tas -<br />
Natal, aniversário, Dia <strong>da</strong>s Mães, Pais, etc -, rejeita<strong>da</strong>s<br />
por vários entrevistados, que recusam-se a respeitá-las<br />
como ocasiões para <strong>da</strong>r presentes. Um depoimento em<br />
particular merece ser citado, pela relação de oposição<br />
explícita que faz entre a natureza afetiva <strong>da</strong> dádiva e o<br />
caráter coercitivo <strong>da</strong>s <strong>da</strong>tas:<br />
“Porque eu acho que o presente envolve, assim, alguma coisa<br />
como o que que ele gosta, o que que ele...com o que que ele se<br />
sentiria feliz...é quase...eu acho que presente é ato de amor. Eu<br />
não dou presente porque é dia <strong>da</strong>s Mães, porque é Natal, por<br />
causa disso ou por causa <strong>da</strong>quilo. (...) Natal...eu <strong>da</strong>va...eu dou,<br />
sim. Algumas pessoas eu dou, sim. Porque são pessoas que têm<br />
hábito de me <strong>da</strong>r o presente, então eu me sinto assim<br />
constrangi<strong>da</strong> de não estar dentro do contexto. Posso até pensar<br />
que ela deva estar achando que eu...que eu não estou...que eu<br />
não gosto dela o suficiente...tá vendo, tá sempre ligado ao fator<br />
gostar. Mas eu costumo <strong>da</strong>r pra algumas. Outras, à medi<strong>da</strong> que<br />
elas vão se tornando mais queri<strong>da</strong>s e mais íntimas, aí eu<br />
simplesmente não dou. Passa Natal, Ano Novo...aí, de repente,<br />
vejo uma coisa que eu goste...(...) Então eu acho que quando a<br />
pessoa é amiga, qualquer coisinha deve ser <strong>da</strong><strong>da</strong> porque é<br />
carinho, é... presente é carinho. Quando a pessoa é mais, tem<br />
um relacionamento mais formal, aí você respeita as <strong>da</strong>tas. Sei<br />
lá, aniversário dela, você vai com um presente e... Natal, você<br />
vai, presente, você dá um presente, ela te dá um presente, eu<br />
acho isso o fim do mundo, eu não gosto, realmente eu não<br />
gosto. Mas um relacionamento mais amigável, mais afetivo, é<br />
aquele que não precisa <strong>da</strong>tas. Você pega um bombom, deixa na<br />
mesa <strong>da</strong> pessoa, man<strong>da</strong> comprar uma tortinha que você sabe<br />
que a pessoa gosta, deixa um pe<strong>da</strong>cinho...coisinha, presente<br />
gostoso é aquele...” (Patrícia)<br />
Esta entrevista<strong>da</strong> opõe niti<strong>da</strong>mente a dádiva como<br />
expressão de afeto à vivência <strong>da</strong> <strong>da</strong>ta como coerção,<br />
quando expõe sua “gramática” na qual a conquista<br />
progressiva de um maior grau de intimi<strong>da</strong>de nas relações<br />
começa a traduzir-se em uma liber<strong>da</strong>de em relação às<br />
<strong>da</strong>tas. Esta atitude, contudo, é permea<strong>da</strong> por<br />
ambigui<strong>da</strong>des, como quando a mesma entrevista<strong>da</strong>,<br />
falando sobre os presentes que dá a si mesma no Natal e<br />
no aniversário, faz uma distinção entre “<strong>da</strong>ta” e<br />
“referência”:<br />
“Então eu me acostumei de vez em quando, falo assim, ah, vou<br />
me <strong>da</strong>r presente de aniversário, mas meu presente de<br />
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