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A influência do modernismo brasileiro na literatura angolana

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA<br />

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES<br />

LICENCIATURA PLENA EM LETRAS<br />

HABILITAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA<br />

CARLA MONYKE PEREIRA DE LIMA CAPITA<br />

A INFLUÊNCIA DO MODERNISMO BRASILEIRO NA LITERATURA ANGOLANA<br />

JOÃO PESSOA – PB<br />

JULHO DE 2011<br />

1


UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA<br />

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES<br />

LICENCIATURA PLENA EM LETRAS<br />

HABILITAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA<br />

A INFLUÊNCIA DO MODERNISMO BRASILEIRO NA LITERATURA ANGOLANA<br />

Trabalho apresenta<strong>do</strong> ao Curso de Licenciatura<br />

em Letras da Universidade Federal da Paraíba<br />

como requisito para obtenção <strong>do</strong> grau de<br />

Licencia<strong>do</strong> em Letras, habilitação em Língua<br />

Portuguesa.<br />

Profa. Dra. Elisalva Madruga Dantas, orienta<strong>do</strong>ra.<br />

JOÃO PESSOA – PB<br />

JULHO DE 2011<br />

2


CARLA MONYKE PEREIRA DE LIMA CAPITA<br />

A INFLUÊNCIA DO MODERNISMO BRASILEIRO NA LITERATURA ANGOLANA<br />

Trabalho apresenta<strong>do</strong> ao Curso de Licenciatura em Letras da Universidade Federal da Paraíba<br />

como requisito para obtenção <strong>do</strong> grau de Licencia<strong>do</strong> em Letras, habilitação em Língua<br />

Portuguesa.<br />

3


DEDICATÓRIA<br />

Ao Senhor JESUS, a quem devo tu<strong>do</strong>, até minha própria vida. ELE me fez chegar até aqui.<br />

Ao meu esposo Juliano Capita, uma das pessoas que me motivou a conhecer um pouco da<br />

<strong>literatura</strong> angola<strong>na</strong>. Sem palavras para descrevê-lo.<br />

Aos meus queri<strong>do</strong>s pais, Carlos Lima e Solange Lima, pelo grande amor e apoio nos estu<strong>do</strong>s.<br />

As minhas lindas irmãs, Camy Lima e Catry Lima, pessoas excepcio<strong>na</strong>is, supercarinhosas e<br />

amorosas para comigo.<br />

A minha avó Alaíde, uma pessoa ímpar e de um coração enorme.<br />

Dedico esse momento de minha vida a todas essas pessoas, pessoas que me amam e pessoas<br />

pelas quais tenho um imenso amor também.<br />

4


AGRADECIMENTOS<br />

Mais uma vez, minha eter<strong>na</strong> gratidão ao DEUS de minha vida.<br />

Aos meus amigos Paulo Aldemir Lopes e Camila Burgardt, pela ajuda e força que sempre me<br />

deram no decorrer <strong>do</strong> curso.<br />

A minha querida professora e orienta<strong>do</strong>ra Elisalva, um amor de pessoa, <strong>do</strong><strong>na</strong> de uma simpatia<br />

sem igual.<br />

5


As pessoas devem estudar, pois é a única maneira de poderem pensar sobre tu<strong>do</strong> com a sua<br />

cabeça e não com a cabeça <strong>do</strong>s outros. O homem tem de saber muito, sempre mais e mais,<br />

para poder conquistar a sua liberdade, para saber julgar.<br />

[Pepetela]<br />

6


RESUMO<br />

A monografia apresentada, a partir das pesquisas realizadas, visa mostrar, sobretu<strong>do</strong>, através<br />

da análise socioestilística <strong>do</strong> poema Exortação, <strong>do</strong> angolano Maurício Gomes, as relações<br />

existentes entre a poesia angola<strong>na</strong> e a brasileira e como as propostas estéticas e ideológicas<br />

<strong>do</strong>s poetas idealiza<strong>do</strong>res <strong>do</strong> movimento modernista <strong>brasileiro</strong>, vazadas, principalmente, <strong>na</strong><br />

consolidação da identidade brasileira, contribuíram de forma relevante para a construção da<br />

poesia angola<strong>na</strong>, empreendida pelos poetas reuni<strong>do</strong>s em torno <strong>do</strong> lema Vamos descobrir<br />

Angola!, empenha<strong>do</strong>s, por sua vez, <strong>na</strong> criação de uma identidade poética autenticamente<br />

angola<strong>na</strong>, liberta <strong>do</strong>s padrões europeus.<br />

Palavras-chave: Literatura; Modernismo; Ruptura; Identidade; Estética; Ideologia.<br />

7


RESUMEN<br />

La monografía presentada, con base en las investigaciones realizadas tiene como objetivo<br />

mostrar, sobreto<strong>do</strong>, a través del análisis socio-estilístico del poema Exhortación, del angoleño<br />

Mauricio Gomes, las relaciones existentes entre la poesía angoleña y la brasileña y como las<br />

propuestas estéticas e ideológica de los poetas idealiza<strong>do</strong>res del movimiento modernista<br />

brasileño, disemi<strong>na</strong>das principalmente en la consolidación de la identidad brasileña,<br />

contribuyeron de forma significativa para la construcción de la poesía angoleña, llevada a<br />

cabo por los poetas reuni<strong>do</strong>s en vuelta del lema ¡Vamos a descubrir Angola!, comprometi<strong>do</strong>s,<br />

por su vez, en la creación de u<strong>na</strong> identidad poética auténticamente angoleña, suelta de las<br />

normas europeas.<br />

Palabras claves: Literatura; Modernismo; Ruptura; Identidade; Estética; Ideología.<br />

8


SUMÁRIO<br />

INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 10<br />

1. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DE ANGOLA ................................................... 11<br />

1.1. Primeiras Manifestações Literárias ................................................................................ 14<br />

1.2. A importância de Cordeiro da Mata ............................................................................... 15<br />

2. ANGOLA E BRASIL ...................................................................................................... 17<br />

2.1. Movimento <strong>do</strong>s Novos Intelectuais de Angola ............................................................... 19<br />

2.2. Presença <strong>do</strong> Modernismo Brasileiro .............................................................................. 21<br />

3. ASPECTOS IDEOLÓGICOS E ESTÉTICOS DO POEMA “EXORTAÇÃO” ................. 25<br />

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 31<br />

REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 32<br />

9


INTRODUÇÃO<br />

Durante a graduação, tivemos contacto, através das aulas da Professora Elisalva<br />

Madruga, com as <strong>literatura</strong>s africa<strong>na</strong>s de língua portuguesa e tomamos conhecimento da sua<br />

relação com a <strong>literatura</strong> brasileira. Interessada no assunto, decidimos realizar a minha<br />

monografia de conclusão de curso ten<strong>do</strong> como objetivo geral mostrar, através da leitura crítica<br />

de alguns textos poéticos, a presença marcante da <strong>literatura</strong> brasileira <strong>na</strong> <strong>literatura</strong> angola<strong>na</strong> ao<br />

longo <strong>do</strong> tempo e como objetivo específico, a repercussão <strong>do</strong> Modernismo Brasileiro no<br />

momento de criação da <strong>literatura</strong> angola<strong>na</strong> propriamente dita.<br />

Com relação à presença marcante da <strong>literatura</strong> brasileira, tentaremos mostrar como<br />

desde as primeiras manifestações literárias angola<strong>na</strong>s essa relação se encontra presente. Em<br />

seguida, nos deteremos no objeto central <strong>do</strong> trabalho que será, como dissemos, trabalhar a<br />

relação da Literatura Angola<strong>na</strong> com o Modernismo <strong>brasileiro</strong>.<br />

Para exemplificar bem esse elo que une a nossa <strong>literatura</strong> a deles, faremos uma análise<br />

<strong>do</strong> poema Exortação, <strong>do</strong> escritor angolano Maurício Gomes, cujo discurso deixa bem<br />

explícita a <strong>influência</strong> <strong>do</strong>s nossos poetas, tanto em termos ideológicos como em termos<br />

estéticos.<br />

Ciente <strong>do</strong> pouco conhecimento existente acerca das <strong>literatura</strong>s africa<strong>na</strong>s de língua<br />

portuguesa, entre elas a angola<strong>na</strong>, consideramos importante em um primeiro momento traçar<br />

um pouco das coorde<strong>na</strong>das histórico/social de Angola, inclusive para entendermos a razão das<br />

afinidades <strong>do</strong>s escritores e poetas desse país com os escritores e poetas <strong>brasileiro</strong>s.<br />

Para a realização desse trabalho, além de livros sobre Literatura Angola<strong>na</strong>, mais<br />

especificamente sobre a poesia, e de trabalhos críticos sobre a relação existente entre essa<br />

<strong>literatura</strong> e a brasileira, recorremos, também, a obras relacio<strong>na</strong>das com a Literatura brasileira,<br />

principalmente no que concerne ao Modernismo em sua primeira fase, ou seja, a produção<br />

modernista <strong>do</strong>s anos 20 e ainda a obras de cunho histórico e sociológico.<br />

10


1. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DE ANGOLA<br />

Nas sociedades huma<strong>na</strong>s, muitas vezes nos deparamos com situações desiguais em que<br />

o homem é explora<strong>do</strong> pelo seu semelhante. Temos assim uma classe <strong>do</strong>mi<strong>na</strong><strong>do</strong>ra e uma<br />

<strong>do</strong>mi<strong>na</strong>da, classe de senhor e de servos ou escravos, de capitalistas e proletaria<strong>do</strong>s, de patrão e<br />

emprega<strong>do</strong>s. Essa diferença enseja e ensejou ao longo da história da humanidade muitos<br />

conflitos e muitas lutas, pois é inerente à <strong>na</strong>tureza huma<strong>na</strong> o desejo de liberdade.<br />

Colônia de Portugal durante cinco séculos, Angola conheceu de perto a situação de<br />

povo explora<strong>do</strong> e para chegar à condição de país independente, teve que, por muitos anos,<br />

enfrentar, através de lutas e guerras sangrentas, o regime coloniza<strong>do</strong>r. Conhecer, pois, sua<br />

história é “conhecer a vida <strong>do</strong>s povos de Angola, as suas lutas pelo progresso, a sua luta<br />

contra o <strong>do</strong>mínio estrangeiro.” (HISTÓRIA DE ANGOLA, p. 05).<br />

Situa<strong>do</strong> no continente africano, esse país pertencia ao reino <strong>do</strong> Congo, antes da<br />

chegada <strong>do</strong>s portugueses. O Congo tinha uma agricultura muito avançada e em esta<strong>do</strong> de<br />

desenvolvimento e o comércio também estava em alta, produzin<strong>do</strong> até excedentes, geran<strong>do</strong><br />

uma grande economia para a região. A sociedade tradicio<strong>na</strong>l que existia <strong>na</strong> África era bem<br />

diferente da sociedade colonial.<br />

A história de Angola está dividida em três perío<strong>do</strong>s: Idade Pré-Colonial, Idade<br />

Colonial e Idade Pós-Colonial.<br />

A Idade Pré-Colonial começa no século XIII e vai até 1575 (ano em que ocorre a<br />

fundação da cidade e capital Luanda). Os portugueses chegaram ao Congo em 1482, lidera<strong>do</strong>s<br />

pelo capitão Diogo Cão, e logo se espalharam por toda região.<br />

As relações entre o rei <strong>do</strong> Congo e rei de Portugal eram amigáveis, havia uma troca de<br />

favores, o Congo recebia muita atenção e armas de fogo de Portugal que serviam para conter<br />

as revoltas da população e de outros países, por sua vez, Portugal recebia escravos vin<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

Congo para aumentar sua riqueza de forma monopolizada, ou seja, ape<strong>na</strong>s Portugal podia<br />

estar à frente <strong>do</strong>s negócios relativos à escravidão e a contribuição <strong>do</strong> rei era importante para<br />

“produção” e fornecimento <strong>do</strong>s escravos.<br />

A Idade Colonial vai <strong>do</strong> século XV, de aproximadamente 1575 e termi<strong>na</strong> com a<br />

independência em 1975, quan<strong>do</strong> então se inicia o perío<strong>do</strong> Pós-Colonial.<br />

Como to<strong>do</strong> coloniza<strong>do</strong>r, à medida que fortalecia seu poder em Angola, os portugueses<br />

iam modifican<strong>do</strong> a forma de viver <strong>do</strong> povo angolano, através da imposição <strong>do</strong>s seus valores,<br />

seja em termos políticos, sociais, linguísticos e culturais. Para eles, a língua falada em Angola<br />

era “língua <strong>do</strong> cão” e o português passou a ser a língua obrigatória. Era ensi<strong>na</strong>da <strong>na</strong>s escolas e<br />

11


era com ela que se faziam todas as transações, fossem elas comerciais ou não, como bem o<br />

observa a crítica Inocência Mata, ao afirmar que, sen<strong>do</strong><br />

língua <strong>do</strong> coloniza<strong>do</strong>r e, como tal, da administração e da imprensa, <strong>do</strong> ensino<br />

e da socialização, a língua portuguesa funcionou também como língua de<br />

assimilação e, por isso, de alie<strong>na</strong>ção cultural, de eficácia glotofágica<br />

reforçada pelas medidas proibitivas em relação à utilização das línguas<br />

africa<strong>na</strong>s(autóctones e crioulas)e, consequentemente, contra o<br />

desenvolvimento e o funcio<strong>na</strong>mento simbólico que qualquer língua tem, a de<br />

realizar interpretações culturais da realidade, para além da função<br />

comunicativa. (2007, p. 84)<br />

A história foi desprezada e até a religião Católica foi fixada nessas terras, o próprio<br />

Rei <strong>do</strong> Congo se converteu ao Catolicismo (ocasio<strong>na</strong>n<strong>do</strong> conflitos religiosos no povo que já<br />

tinha uma religião), além da existência de forte discrimi<strong>na</strong>ção quanto à cor negra. A presença<br />

<strong>do</strong>s portugueses já era bem forte e evidente, já tinham o controle de toda extensão de terras<br />

angola<strong>na</strong>s.<br />

Os recursos agrícolas e minerais eram bastante explora<strong>do</strong>s, aumentan<strong>do</strong> assim, a<br />

ambição <strong>do</strong>s portugueses em lutar e conquistar prata para aumentar seu comércio.<br />

O comércio da colônia baseava-se no tráfico de escravos e <strong>na</strong> exploração de marfim,<br />

que tinham muito valor <strong>na</strong> Europa. Os comerciantes cresciam muito e o artesa<strong>na</strong>to local e<br />

outros produtos como o sal, por exemplo, iam perden<strong>do</strong> privilégio. Na verdade, Portugal<br />

estava interessa<strong>do</strong> mais no ouro e <strong>na</strong> prata, os escravos vieram a calhar devi<strong>do</strong> à precisão que<br />

se fazia de mão de obra <strong>na</strong> colônia portuguesa situada no Brasil.<br />

Os jesuítas envia<strong>do</strong>s pelo Brasil (colônia de Portugal também) faziam o papel de<br />

fiscalizar to<strong>do</strong> o comércio de Angola e alguns procuravam escravos, pois tinham grandes<br />

fazendas.<br />

Com o tempo, a colônia achou melhor mudar o méto<strong>do</strong> econômico e começar a trocar<br />

os escravos por trabalha<strong>do</strong>res assalaria<strong>do</strong>s e também aumentar a produção de outras<br />

merca<strong>do</strong>rias que lhe aumentassem o capital, além <strong>do</strong>s escravos. Os colonos angolanos<br />

queriam organizar um comércio interno de onde eles pudessem retirar mais lucro e pudessem<br />

contar com a ajuda e apoio <strong>do</strong> governo. Alguns Esta<strong>do</strong>s não estavam dispostos a isso, pois<br />

iam ficar no prejuízo e era necessária uma maior segurança <strong>na</strong> região contra revoltosos que<br />

pudessem surgir. O governo resolveu construir indústrias, o trabalho escravagista iria acabar,<br />

os colonos iriam produzir e haveria um acor<strong>do</strong> mútuo, que de certa forma deu certo. A<br />

agricultura se desenvolveu também <strong>na</strong> tentativa de acabar com a escravatura e quem<br />

continuasse a usar escravos e a fazer guerra sofreria grande punição. Contu<strong>do</strong>, “militares e<br />

certos comerciantes continuavam nessas guerras e a apanhar escravos para vender no Brasil”<br />

12


(HISTÓRIA DE ANGOLA, p. 108). Os escravos sofriam muito, passavam fome, ficavam<br />

<strong>do</strong>entes, morriam antes mesmo de começarem a “trabalhar”. Até a Igreja Angola<strong>na</strong> estava<br />

subordi<strong>na</strong>da à Igreja Brasileira.<br />

Com o passar <strong>do</strong> tempo, Portugal já não exercia controle total sobre a economia de<br />

Angola, o povo angolano começa a se impor e a <strong>do</strong>mi<strong>na</strong>r seu próprio capital. No mun<strong>do</strong> havia<br />

uma grande divergência sobre o mo<strong>do</strong> de trabalho. Alguns países começavam a extinguir o<br />

trabalho escravo porque o ramo industrial estava em crescimento e outros ainda continuavam,<br />

mas sempre pensan<strong>do</strong> no melhor para a economia e não nos escravos que eram obriga<strong>do</strong>s a<br />

viverem de tal forma. Um trata<strong>do</strong> foi assi<strong>na</strong><strong>do</strong> em 1825, no Brasil, deixan<strong>do</strong> de la<strong>do</strong> as<br />

colônias portuguesas. A economia angola<strong>na</strong> deu um grande salto, com tu<strong>do</strong> isso.<br />

O tráfico de escravos continuava para as Américas, mesmo com a abolição da<br />

escravatura em Angola, que ocorreu no ano de 1836. Mas, aos poucos foi ten<strong>do</strong> fim, dan<strong>do</strong><br />

lugar a outros tipos de comércio. O povo angolano lutou muito para conquistar essa liberdade.<br />

A vida política foi mudan<strong>do</strong> também quan<strong>do</strong> o capital angolano foi se separan<strong>do</strong> <strong>do</strong> Brasil. Os<br />

angolanos burgueses cultos escreviam em jor<strong>na</strong>is e revistas critican<strong>do</strong> a economia, o governo,<br />

entre outras coisas. Iam aparecen<strong>do</strong> escritores, jor<strong>na</strong>listas que defendiam os que mais sofriam.<br />

A liberdade de imprensa já estava presente nesse momento. Em 1899, a escravidão foi extinta<br />

de forma oficial, mas deixou alguns vestígios. O comércio de borracha, de marfim, de ga<strong>do</strong>,<br />

dentre outros, foi fican<strong>do</strong> fraco e o açúcar, café e milho estavam em alta. A vida livre <strong>do</strong>s<br />

africanos também não era tão fácil, tinham que pagar impostos ao governo e a jor<strong>na</strong>da de<br />

trabalho que lhes era imposta, assemelhava-se em muito ao trabalho escravo. Não havia<br />

respeito às leis que protegiam essas pessoas <strong>do</strong> trabalho escravo. Assim, foram surgin<strong>do</strong><br />

revoltas contra esse tipo de trabalho e mesmo dessa forma, a colônia ficava em crise devi<strong>do</strong> à<br />

escassez de escravos. Ao to<strong>do</strong>, foram cinco séculos de colonização, assim como no Brasil.<br />

Em dezembro de 1956 é forma<strong>do</strong> o MPLA, Movimento Popular de Libertação de<br />

Angola, um parti<strong>do</strong> <strong>do</strong> povo que lutava pela independência. Foi persegui<strong>do</strong> por Portugal,<br />

houve prisões, mortes. O povo começa a lutar de forma armada e com mais força em favor da<br />

liberdade <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. Os escritores contribuíram e foram importantes para o MPLA, apesar de<br />

não ser um movimento literário, mas político.<br />

Angola tornou-se um país livre e independente em 11 de Novembro de 1975, depois<br />

de muito lutar para viver livre <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio português. Tem o MPLA à frente <strong>do</strong> governo até<br />

hoje.<br />

13


1.1. Primeiras Manifestações Literárias<br />

Embora haja notícia de um texto poético publica<strong>do</strong> em Angola por volta <strong>do</strong> século<br />

XVII, atribuí<strong>do</strong> a um militar, filho da então colônia, os estudiosos da Literatura apontam<br />

como marco inicial da produção literária angola<strong>na</strong> o livro de poemas, Espontaneidades da<br />

minha alma: às senhoras africa<strong>na</strong>s (1849), <strong>do</strong> escritor José da Silva Maia Ferreira. Nele, à<br />

semelhança <strong>do</strong> poema Canção <strong>do</strong> Exílio, <strong>do</strong> <strong>brasileiro</strong> Gonçalves Dias, Maia Ferreira exalta a<br />

terra africa<strong>na</strong>, declaran<strong>do</strong> seu amor por ela, e<strong>na</strong>ltecen<strong>do</strong> as belezas <strong>na</strong>turais, a fau<strong>na</strong>, a flora e<br />

os habitantes <strong>do</strong> lugar. Essa semelhança com a poesia brasileira deixa entrever que a relação<br />

entre as duas <strong>literatura</strong>s data de muito tempo.<br />

A fundação <strong>do</strong> jor<strong>na</strong>l Boletim Oficial, em 1845, sob a organização <strong>do</strong> gover<strong>na</strong><strong>do</strong>r-<br />

geral Pedro Alexandrino da Cunha, deu início, ainda que de maneira simples, ao jor<strong>na</strong>lismo<br />

em Angola. Através desse jor<strong>na</strong>l, eram divulgadas histórias de Angola, <strong>literatura</strong> em verso e<br />

em prosa, artigos relacio<strong>na</strong><strong>do</strong>s à religião, ao Catolicismo, ao comércio, à economia, etc. No<br />

entanto, só podia ser publica<strong>do</strong> o que fosse aprova<strong>do</strong> pelos portugueses para que não se<br />

escrevesse algo que atingisse Portugal. Mesmo assim, o jor<strong>na</strong>lismo e a imprensa foram de<br />

suma importância, no fi<strong>na</strong>l <strong>do</strong> século XIX, para a luta <strong>do</strong>s angolanos, pois serviram de porta<br />

para uma nova maneira de ver o mun<strong>do</strong>, um mun<strong>do</strong> mais próximo da realidade.<br />

Em torno de 1856, a imprensa passou a ter certa liberdade. Mais jor<strong>na</strong>is e revistas<br />

foram sen<strong>do</strong> funda<strong>do</strong>s, tais como, A Aurora (1855) e A Civilização da África Portuguesa<br />

(1866). Esse último teve curta duração, pois tanto defendia a colônia, como também defendia<br />

a abolição da escravatura, deixan<strong>do</strong> insatisfeitos alguns gover<strong>na</strong>ntes. Antônio Urbano<br />

Monteiro de Castro e Alfre<strong>do</strong> Júlio Cortez Mântua foram os funda<strong>do</strong>res desse jor<strong>na</strong>l e mais<br />

tarde lutaram para reativá-lo. Urbano mereceu destaque por ser um grande literato, <strong>na</strong> poesia e<br />

<strong>na</strong> prosa, de uma imensa riqueza cultural e simplicidade e clareza ao mesmo tempo. Teve uma<br />

colaboração forte como jor<strong>na</strong>lista e escritor <strong>na</strong> imprensa livre em Angola, escreven<strong>do</strong> sobre<br />

diversos assuntos. Mântua também teve seu papel reconheci<strong>do</strong>, <strong>na</strong> luta pelo desenvolvimento<br />

<strong>do</strong> país.<br />

Muitos outros jor<strong>na</strong>is foram surgin<strong>do</strong>, uns dura<strong>do</strong>uros, outros passageiros, funda<strong>do</strong>s<br />

até por europeus, que defendiam a liberdade de imprensa e abolição da escravidão, como por<br />

exemplo, Dr. Alfre<strong>do</strong> Trony, português e responsável pelo Jor<strong>na</strong>l de Luanda (1878), que de<br />

fato lutava pelos interesses <strong>do</strong> povo, se afastan<strong>do</strong> aos poucos <strong>do</strong> colonialismo, deixan<strong>do</strong>,<br />

assim, o governo revolta<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong>, por esse motivo, expulso <strong>do</strong> meio. Contu<strong>do</strong>, Dr. Alfre<strong>do</strong><br />

continuou sua luta em defesa <strong>do</strong>s ideais <strong>do</strong>s habitantes locais e criou outros periódicos, além<br />

14


de ser autor de novelas. Tu<strong>do</strong> isso foi conceden<strong>do</strong> voz aos intelectuais que estavam surgin<strong>do</strong>.<br />

Joaquim Dias Cordeiro da Mata (um <strong>do</strong>s primeiros idealiza<strong>do</strong>res da <strong>literatura</strong> angola<strong>na</strong>),<br />

Pedro Macha<strong>do</strong>, Fontes Pereira, entre outros, inconforma<strong>do</strong>s com a maneira como os<br />

portugueses estavam gover<strong>na</strong>n<strong>do</strong> Angola, começaram então a se revoltar contra a colonização<br />

violenta que mi<strong>na</strong>va a identidade <strong>do</strong> povo. Foram poetas, jor<strong>na</strong>listas que usaram a palavra<br />

como aliada no combate ao <strong>do</strong>mínio português. Muitos foram persegui<strong>do</strong>s e presos. Pedro<br />

Félix Macha<strong>do</strong> foi responsável também pela revista Luz e Crença junto com outros jor<strong>na</strong>listas<br />

e escritores, em que ratificava os desejos de Cordeiro da Mata de uma <strong>literatura</strong><br />

verdadeiramente angola<strong>na</strong>. A não aceitação <strong>do</strong> sistema presente <strong>na</strong> região e a necessidade de<br />

colocar <strong>na</strong> escrita o sentimento <strong>na</strong>tivista que começava a se fortalecer moviam os intelectuais,<br />

sen<strong>do</strong> muito importante mais tarde para o desenvolvimento <strong>do</strong> processo de angolanização que<br />

será retoma<strong>do</strong> por outros intelectuais.<br />

1.2. A importância de Cordeiro da Mata<br />

Joaquim Dias Cordeiro da Mata, <strong>na</strong>sci<strong>do</strong> em Angola, em 1587, autodidata, foi muito<br />

importante para o desenvolvimento da angolanidade. Dedica<strong>do</strong> totalmente à cultura angola<strong>na</strong>,<br />

publicou livros sobre a historia de Angola, escreveu romances, contos, poesias, estu<strong>do</strong>s<br />

filológicos, contribuin<strong>do</strong>, através deles, para o conhecimento de Angola e <strong>do</strong> quimbun<strong>do</strong>, uma<br />

das língua <strong>na</strong>tivas que era negada pelo coloniza<strong>do</strong>r. A preocupação com a língua, além de<br />

levá-lo a escrever uma gramática <strong>do</strong> quimbun<strong>do</strong>, leva-o também a a<strong>do</strong>tar termos dessa língua<br />

no seu livro de poemas Delírios (1890), fortalecen<strong>do</strong>, assim, o sentimento <strong>na</strong>tivista que<br />

norteava a produção da época. Tinha uma colu<strong>na</strong> no Jor<strong>na</strong>l de Luanda, por meio da qual<br />

exortava os conterrâneos a se unirem em favor <strong>do</strong> desenvolvimento de Angola. Já que existia<br />

até escritor europeu interessa<strong>do</strong> em escrever e cantar aquela terra, então, por que não os<br />

próprios <strong>na</strong>tivos fazerem tal coisa? Contu<strong>do</strong>, poucos atenderam ao chama<strong>do</strong>.<br />

Em 1901, um artigo preconceituoso, “Contra a lei, pela Grey”, foi publica<strong>do</strong> no 4º<br />

número <strong>do</strong> Gazeta de Luanda, apontan<strong>do</strong> o negro como preguiçoso, afirman<strong>do</strong> não ser ele<br />

"perfeitamente homem" e que colocá-lo <strong>na</strong> cadeia é "dar-lhe prêmio", pois ele vai gostar de<br />

"comer sem trabalhar". Como não poderia deixar de ser, esse artigo provocou uma profunda<br />

indig<strong>na</strong>ção entre os africanos que contra-atacaram com uma série de artigos que reuniram em<br />

um volume intitula<strong>do</strong> Voz de Angola claman<strong>do</strong> no deserto, ressaltan<strong>do</strong> os valores <strong>do</strong> homem<br />

15


negro e mostran<strong>do</strong> que o seu atraso é consequência da ação perniciosa <strong>do</strong> coloniza<strong>do</strong>r. Assim<br />

diz um desses artigos:<br />

"Acusam a raça preta de incapaz de civilização e desenvolvimento , quan<strong>do</strong><br />

se lhe não tem ministra<strong>do</strong> os meios de elevação, procuran<strong>do</strong> conservá-la no<br />

esta<strong>do</strong> de rudez e embrutecimento, exploran<strong>do</strong>-a assaz os esclavagistas, para,<br />

à custa <strong>do</strong> seu suor e trabalho, não remunera<strong>do</strong>, medrarem enriquecerem!"<br />

(VOZ DE ANGOLA CLAMANDO NO DESERTO, 1984, p. 83) (sic).<br />

A <strong>literatura</strong> desse perío<strong>do</strong> foi muito importante. Através dela, começa a se ter ideia <strong>do</strong><br />

sofrimento vivencia<strong>do</strong> pelo povo angolano em decorrência da opressão <strong>do</strong> coloniza<strong>do</strong>r. É<br />

também, através dela, que a semente da ruptura, desenvolvida mais tarde pela geração <strong>do</strong>s<br />

anos 40, germi<strong>na</strong> vigorosamente.<br />

A partir dessa época, a <strong>literatura</strong> vai cada vez mais se tor<strong>na</strong>n<strong>do</strong> o ca<strong>na</strong>l por meio <strong>do</strong><br />

qual tu<strong>do</strong> que estava silencia<strong>do</strong> começa a ser fala<strong>do</strong>, ainda que para isso tivessem que<br />

enfrentar as duras punições infligidas pelos <strong>do</strong>mi<strong>na</strong><strong>do</strong>res.<br />

16


2. ANGOLA E BRASIL<br />

A <strong>literatura</strong> angola<strong>na</strong> sofreu várias <strong>influência</strong>s. Muitos fatores cooperaram para seu<br />

desenvolvimento. Se dentre as <strong>influência</strong>s inter<strong>na</strong>s, temos os poetas e escritores, cujas<br />

produções serviram de importante subsídio para “a proposta <strong>do</strong>s responsáveis pelo<br />

movimento que, a partir <strong>do</strong>s anos 40, começa a agitar o meio cultural angolano em prol da<br />

construção de uma <strong>literatura</strong> marcadamente <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l.” (MADRUGA, 1998, p. 20), dentre as<br />

<strong>influência</strong>s exter<strong>na</strong>s, são citadas como mais expressivas, o marxismo, o neorrealismo<br />

português e o <strong>modernismo</strong> <strong>brasileiro</strong>.<br />

À maneira <strong>do</strong>s modernistas <strong>brasileiro</strong>s, os escritores começaram a se empenhar em<br />

trazer para a <strong>literatura</strong>, de mo<strong>do</strong> crítico, a realidade angola<strong>na</strong>, o sofrimento <strong>do</strong> povo,<br />

sobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong> povo negro, vitima<strong>do</strong> duplamente <strong>na</strong> condição de coloniza<strong>do</strong> e negro. O<br />

aumento da produção jor<strong>na</strong>lística e a utilização cada vez maior de termos da língua <strong>na</strong>tiva<br />

constituíram fatores importantes para o crescimento e consolidação de um sentimento<br />

<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lista que vai despertan<strong>do</strong> nos angolanos uma imensa vontade de sair <strong>do</strong> papel de povo<br />

coloniza<strong>do</strong> e de trabalhar em prol da construção de uma identidade própria.<br />

Na década de 30, surge um movimento revolucionário intitula<strong>do</strong> Negritude, lidera<strong>do</strong><br />

pelos estudantes negros Aimé Césaire, Leon Damas e Leopold Senghor. Composto ainda por<br />

outros estudantes que reivindicavam o papel e a presença <strong>do</strong> negro dentro da sociedade, tal<br />

como os brancos. Ganhou grande aceitação, pois colaborou muito no processo de afirmação<br />

<strong>do</strong> negro e da sua cultura, ten<strong>do</strong> em vista que, “o resgate da identidade africa<strong>na</strong> implica a<br />

reestruturação <strong>do</strong> ser negro, mutila<strong>do</strong> ao longo <strong>do</strong>s séculos”. (MADRUGA, 1998, p. 69).<br />

A partir da década de 40, a <strong>literatura</strong> angola<strong>na</strong> começa a ganhar forças e a modificar o<br />

quadro da história literária <strong>do</strong> país e colaborar para a mudança também <strong>do</strong> quadro<br />

sociopolítico marca<strong>do</strong> pela opressão, pela exploração e pela subestimação, devi<strong>do</strong> à<br />

colonização. Os movimentos anteriores servirão de base para tu<strong>do</strong> que vamos encontrar pela<br />

frente. A poesia será um meio de os angolanos cantarem sua terra e suas esperanças de se<br />

tor<strong>na</strong>rem livres de um país preso a uma cultura europeia que se afirma superior a todas as<br />

outras.<br />

Na <strong>literatura</strong> que vai despontan<strong>do</strong>, o negro já começa a se conscientizar de sua<br />

situação, um ser que foi violenta<strong>do</strong>, coloniza<strong>do</strong>, desrespeita<strong>do</strong> e discrimi<strong>na</strong><strong>do</strong> pelos brancos<br />

europeus, e começa a lutar para mudar o rumo de tu<strong>do</strong> isso.<br />

17


O escritor Agostinho Neto, primeiro presidente de Angola, quan<strong>do</strong> o país se tornou<br />

república, e importante poeta angolano, retrata esse momento em um poema intitula<strong>do</strong> Adeus<br />

à hora da largada. Segue alguns trechos:<br />

“...Amanhã<br />

Entoaremos hinos à liberdade<br />

Quan<strong>do</strong> comemorarmos<br />

A data de abolição desta escravatura.”<br />

Agostinho Neto utiliza o lirismo em seus poemas para expor a situação da África e de<br />

Angola, frente a tu<strong>do</strong> que tem se passa<strong>do</strong> <strong>na</strong>quele continente e <strong>na</strong>quela colônia em<br />

decorrência <strong>do</strong>s desmandes <strong>do</strong> coloniza<strong>do</strong>r. Seus poemas nos falam <strong>do</strong> choro africano, apesar<br />

de ao mesmo tempo, para<strong>do</strong>xalmente, utilizar de forma recorrente a metáfora <strong>do</strong>s “olhos<br />

secos” insistentemente repetida no poema Criar. Mas é um choro seco, desprovi<strong>do</strong> de<br />

qualquer sentimentalismo, o coração <strong>do</strong> povo africano devi<strong>do</strong> a to<strong>do</strong> sofrimento, precisava se<br />

tor<strong>na</strong>r seco e duro, para que não se desviasse de seus objetivos. O povo africano desejava criar<br />

uma nova história para si. Agostinho trabalha em um de seus poemas termos semânticos com<br />

cargas positivas e cargas negativas, significan<strong>do</strong> os <strong>do</strong>is extremos: afirmação e negação.<br />

Tentan<strong>do</strong> desencadear no povo um processo de conscientização de luta por seus ideais, ele<br />

conclama as pessoas a viverem de acor<strong>do</strong> com suas realidades, de tal forma que, a língua de<br />

seus antepassa<strong>do</strong>s faça parte de suas vidas também. Sua obra mais importante foi Sagrada<br />

Esperança (1979) em que reunia poesias de caráter combativo e lírico. Ele tinha muita<br />

esperança <strong>na</strong> mudança da situação e no reconhecimento <strong>do</strong> seu povo.<br />

Um outro poeta muito importante para a nova <strong>literatura</strong> que emerge a partir <strong>do</strong>s anos<br />

40 é o angolano Viriato da Cruz, que mais tarde vai liderar o movimento <strong>do</strong>s Novos<br />

Intelectuais de Angola. Um de seus poemas bem conheci<strong>do</strong> é o que tem por título Mamã<br />

Negra (Canto da Esperança), em que é exposto o sofrimento da África devi<strong>do</strong> à escravidão.<br />

Porém, como o próprio subtítulo – Canto da Esperança – anuncia, o poema traz também uma<br />

esperança e, mais <strong>do</strong> que isso, uma certeza <strong>do</strong> fim de to<strong>do</strong> aquele sofrimento, de toda aquela<br />

exploração. Segue exemplo:<br />

Mas vejo também que a luz roubada aos teus olhos, ora esplende<br />

demoniacamente tenta<strong>do</strong>ra-como a Certeza...<br />

cintilantemente firme-como a Esperança...<br />

em nós outros teus filhos,<br />

geran<strong>do</strong>, forman<strong>do</strong>, anuncian<strong>do</strong><br />

-o dia da humanidade<br />

O DIA DA HUMANIDADE...<br />

18


Tanto o poema Criar como o poema Mamã Negra revelam um futuro que está por vir,<br />

um futuro divisa<strong>do</strong> pelos olhos desses poetas.<br />

2.1. Movimento <strong>do</strong>s Novos Intelectuais de Angola<br />

Foi um movimento literário, surgi<strong>do</strong> em 1948, composto por um grupo de jovens<br />

intelectuais, negros, brancos, mestiços, lidera<strong>do</strong>s por Viriato da Cruz. Eles aproveitaram os<br />

ideais <strong>na</strong>tivistas de escritores passa<strong>do</strong>s, tais como, Cordeiro da Mata e Paixão Franco, para<br />

voltarem-se às suas raízes angola<strong>na</strong>s e estudarem a terra, as regiões geográficas, a língua e<br />

dialetos locais, a fim de que a população conhecesse um pouco da sua história. A realidade<br />

angola<strong>na</strong> tornou-se matéria de poesia, despertan<strong>do</strong> <strong>na</strong>s pessoas a vontade de se libertarem da<br />

condição de coloniza<strong>do</strong>s e a de tor<strong>na</strong>rem Angola livre das amarras europeias. Esse<br />

movimento, a partir de 1950, também ficou conheci<strong>do</strong> como o “Movimento <strong>do</strong>s Novos<br />

Intelectuais de Angola”, por tomarem como base as propostas <strong>do</strong>s chama<strong>do</strong>s “Velhos<br />

Intelectuais”, aqueles intelectuais já mencio<strong>na</strong><strong>do</strong>s, que no fi<strong>na</strong>l <strong>do</strong> século XIX já tinham em<br />

mente essa libertação.<br />

O grupo <strong>do</strong>s Novos Intelectuais de Angola estava, pois, empenha<strong>do</strong> em propagar<br />

conhecimentos, instruir o povo de sua terra, para que não pensassem ape<strong>na</strong>s no trabalho, mas<br />

sim, também, <strong>na</strong> cultura que estava permean<strong>do</strong> a vida pacata <strong>do</strong>s angolanos. O Modernismo<br />

<strong>brasileiro</strong> também serviu de grande <strong>influência</strong> para esse movimento, pois os encorajava a<br />

produzir uma <strong>literatura</strong> tipicamente angola<strong>na</strong>. De acor<strong>do</strong> com Mata, é sabi<strong>do</strong> que<br />

em sociedades emergentes, com um passa<strong>do</strong> colonial recente, a <strong>literatura</strong> é<br />

um veículo muito importante <strong>na</strong> construção da identidade literária. Isto é:<br />

por razões que têm a ver com a especificidade <strong>do</strong> processo libertário, a<br />

identidade literária tornou-se uma componente fundamental <strong>do</strong> cadinho da<br />

identidade que se pretende <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. (2007, p. 86)<br />

Os Novos Intelectuais de Angola tiveram algumas publicações, tais como, Antologia<br />

<strong>do</strong>s novos poetas de Angola (1950) e a revista Mensagem (1951-1952), entre outros. A revista<br />

Mensagem, organizada pela Associação <strong>do</strong>s Naturais de Angola (ANANGOLA), teve grande<br />

importância para a <strong>literatura</strong> angola<strong>na</strong>. Participavam dela Agostinho Neto, Viriato da Cruz,<br />

Mário Pinto de Andrade e outros autores. Outra revista que teve uma boa aceitação nesse<br />

perío<strong>do</strong> foi a Cultura (1957-1961), não mais organizada pela ANANGOLA, pois essa foi<br />

fechada por divergências políticas. Escritores bem reconheci<strong>do</strong>s faziam parte de sua<br />

elaboração, alguns já cita<strong>do</strong>s, como Viriato e Agostinho e mais outros, a exemplo de<br />

19


Luandino Vieira, Carlos Erve<strong>do</strong>sa e Oscar Ribas. Alguns <strong>do</strong>s temas principais da revista<br />

Mensagem eram o reconhecimento <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> negro e as críticas ao sistema colonial. Em<br />

Cultura essa não aceitação <strong>do</strong> coloniza<strong>do</strong>r foi bem marcante, os poetas confessavam seus<br />

sentimentos e o desejo de terem uma identidade própria.<br />

Em 1948, quan<strong>do</strong> surgiu, o movimento <strong>do</strong>s Novos Intelectuais de Angola tinha como<br />

lema “Vamos Descobrir Angola”, pois constituíam objetivos principais <strong>do</strong> grupo a<br />

valorização da cultura angola<strong>na</strong>, a luta pelo término <strong>do</strong> colonialismo, além <strong>do</strong> reconhecimento<br />

da importância <strong>do</strong> negro para a construção <strong>do</strong> país, tu<strong>do</strong> isso de forma escrita, que em outras<br />

horas seriam silenciadas. O negro foi humilha<strong>do</strong>, menospreza<strong>do</strong> pelos coloniza<strong>do</strong>res, trata<strong>do</strong><br />

como uma merca<strong>do</strong>ria sem valor e esse movimento veio para lutar em defesa desse que<br />

colaborou com o crescimento <strong>do</strong> país. Criticou o branco coloniza<strong>do</strong>r, que obteve to<strong>do</strong>s os<br />

favores <strong>do</strong>s negros, mas nem sequer soube reconhecer o trabalho deles, pelo contrário,<br />

afirmava com convicção que o negro não gostava de trabalhar. Queriam que até as punições<br />

fossem diferentes, que suas atitudes fossem julgadas pela cor carregada no corpo. O negro<br />

tinha que se sujeitar ao branco em tu<strong>do</strong>, não podia sequer reclamar se não fosse bem pago<br />

pelos serviços massacrantes e desumanos a que era obriga<strong>do</strong> a submeter-se. O poema<br />

Exortação, de Mauricio Gomes de Almeida, que será objeto de nossa análise <strong>na</strong>s pági<strong>na</strong>s<br />

adiante, escrito no fi<strong>na</strong>l da década de 40, teve bastante aceitação entre os que compunham o<br />

Movimento Vamos Descobrir Angola.<br />

Movimentos não só literários, mas também políticos apareceram, como o MPLA<br />

(Movimento Popular de Libertação de Angola), ten<strong>do</strong> por objetivo tentar mudar o percurso<br />

político em favor da libertação, contan<strong>do</strong> com a adesão de muitos escritores, alguns, inclusive,<br />

foram até presos, exila<strong>do</strong>s, mas não silencia<strong>do</strong>s.<br />

No ano de 1975, Angola tor<strong>na</strong>-se um país independente e a <strong>literatura</strong> contribuiu muito<br />

para essa vitória, ela trouxe de volta tu<strong>do</strong> que o coloniza<strong>do</strong>r apagou dentro da cultura <strong>do</strong>s<br />

angolanos. Surgiu O UEA, União <strong>do</strong>s Escritores Angolanos, responsável pelas publicações<br />

<strong>do</strong>s escritores e de muitas outras obras que não foram permitidas circularem no perío<strong>do</strong><br />

coloniza<strong>do</strong>r. Apesar da libertação <strong>do</strong> país, a <strong>literatura</strong> apresentou uma diminuição <strong>na</strong> sua<br />

produção, devi<strong>do</strong> às turbulências pelas quais passou a região com o fim <strong>do</strong> regime colonial. A<br />

exaltação da terra continuava existin<strong>do</strong> e se propagan<strong>do</strong> mesmo que a passos lentos nesse<br />

perío<strong>do</strong>, agora de uma maneira mais livre.<br />

Inocência Mata chega à conclusão que<br />

20


2.2. Presença <strong>do</strong> Modernismo Brasileiro<br />

vale dizer que nesta fase actual de reconstrução de Angola no pós-guerra(...)<br />

as novas perspectivas devem passar, também, pela implementação <strong>do</strong>s<br />

direitos cívicos, pela pedagogia da diferença, pela reconstrução identitária,<br />

individual e colectiva, que se fragmentou de forma inexorável durante,<br />

sobretu<strong>do</strong>, as duas décadas de guerra civil. Começar pelas línguas pode ser<br />

coisa boa: afi<strong>na</strong>l, a língua é a <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lidade <strong>do</strong> pensamento, como já dizia o<br />

<strong>brasileiro</strong> José de Alencar no longínquo século XIX. (2007, p. 165)<br />

O Modernismo <strong>brasileiro</strong> serviu como base para a construção literária de Angola, por<br />

conta de suas propostas de valorização da cultura genui<strong>na</strong>mente brasileira e seu espírito de<br />

ruptura com o europeísmo vigente no país. A <strong>literatura</strong> modernista tinha um forte apelo<br />

<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lista e isso era também o que estava impulsio<strong>na</strong>n<strong>do</strong> os angolanos.<br />

O Brasil foi toma<strong>do</strong> como exemplo por Angola, tanto no que diz respeito à <strong>literatura</strong>,<br />

como à sua independência <strong>do</strong> país coloniza<strong>do</strong>r.<br />

A partir desse perío<strong>do</strong>, se estreitou cada vez mais o vínculo entre esses países. A<br />

presença <strong>do</strong> Brasil <strong>na</strong> Angola foi bem marcante. Ambos com objetivos bem comuns:<br />

valorização da terra <strong>na</strong>tal e <strong>do</strong> habitante local. Para o Brasil, o referencial de brasilidade eram<br />

os índios e para a Angola, os negros, como referência de Angolanidade.<br />

Angola, a exemplo <strong>do</strong>s nossos antropófagos, soube aproveitar o que a <strong>literatura</strong><br />

brasileira pôde oferecer e mesclou-a a sua arte poética. Até porque, como sabemos, to<strong>do</strong> texto<br />

traz sempre marcas de outros já existentes.<br />

O projeto <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lista <strong>do</strong>s modernistas <strong>brasileiro</strong>s foi um <strong>do</strong>s principais pontos que<br />

levou à aproximação <strong>do</strong>s angolanos com a produção literária desse momento. As experiências<br />

de vida, a vontade de exaltar a <strong>na</strong>tureza e a pátria impactaram as obras. A <strong>literatura</strong> angola<strong>na</strong><br />

inicia um processo de rompimento com os modelos vigentes à época, modelos tradicio<strong>na</strong>is<br />

portugueses, dan<strong>do</strong> lugar a uma poesia totalmente autêntica, de cunho <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. Essa ruptura<br />

seguiu os moldes <strong>brasileiro</strong>s. O Brasil <strong>do</strong>s anos 20, apesar de independente politicamente,<br />

iniciou um processo de resgate de sua cultura que durante um bom tempo foi “escondida”<br />

pelo coloniza<strong>do</strong>r.<br />

As propostas ideológicas e estéticas <strong>do</strong>s nossos modernistas, como as de Mário e<br />

Oswald de Andrade, foram de grande importância para os angolanos, que também<br />

procuravam defender sua língua, lutar por novas formas poéticas, livres <strong>do</strong>s padrões europeus.<br />

Diferentemente de outras vanguardas, o passa<strong>do</strong>, tanto para os modernistas <strong>brasileiro</strong>s como<br />

para os angolanos <strong>do</strong>s anos 50, não era descarta<strong>do</strong>, porém servia como reflexão para a<br />

21


construção de um futuro diferente. Na <strong>literatura</strong> angola<strong>na</strong>, o quimbun<strong>do</strong> (língua <strong>na</strong>tiva) que<br />

antes era visto como “língua <strong>do</strong> cão”, passa a fazer parte da composição literária.<br />

O tradicio<strong>na</strong>lismo é importante <strong>na</strong> <strong>literatura</strong>, por buscar expor o passa<strong>do</strong> e mesclar<br />

elementos atuais que constituem a realidade <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, trazen<strong>do</strong> de volta todas as origens <strong>do</strong><br />

povo, pois “desrecalcar os valores culturais reprimi<strong>do</strong>s pelo coloniza<strong>do</strong>r tor<strong>na</strong>va-se<br />

imprescindível” (MADRUGA, 1998, p. 40).<br />

No Manifesto da Poesia Pau-Brasil, é vista a defesa da origi<strong>na</strong>lidade, a crítica ao<br />

academicismo, ao mimetismo, no que diz respeito à poesia e a movimentos anteriores, tais<br />

como, Par<strong>na</strong>sianismo e Naturalismo. Para esse manifesto, tu<strong>do</strong> que falasse <strong>do</strong> Brasil, da<br />

matéria-prima brasileira, seria assunto poético. Lutava contra a poesia importada (feita com<br />

material que vinha de fora) e se voltava mais para uma poesia baseada <strong>na</strong> realidade local e <strong>na</strong><br />

valorização da língua <strong>na</strong>tiva. Combatiam os modelos clássicos e visavam à liberdade de<br />

criação e de expressão.<br />

Já no Manifesto Antropofágico, percebemos uma reação ao aparelhamento colonial e à<br />

sociedade patriarcal, critican<strong>do</strong> a religião e a falsa moral, vai transforman<strong>do</strong> o que é negativo<br />

em positivo (tabu em totem), pois há uma grande valorização da cultura indíge<strong>na</strong> e negra. O<br />

índio é sempre exalta<strong>do</strong>, critican<strong>do</strong>, assim, a herança <strong>do</strong> coloniza<strong>do</strong>r que “acabou” com<br />

grande parte da cultura brasileira, que por muito tempo estava europeizada.<br />

O diálogo entre as <strong>literatura</strong>s brasileira e angola<strong>na</strong> acentua-se <strong>na</strong> década de 40 e a<br />

partir daí vai-se fortalecen<strong>do</strong> através <strong>do</strong>s textos poéticos a identidade <strong>do</strong> povo angolano.<br />

Muitos temas são comuns a essas <strong>literatura</strong>s: a valorização da <strong>na</strong>tureza e da cor local. A terra<br />

é cantada <strong>na</strong>s duas <strong>literatura</strong>s, a fim de afirmarem suas <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lidades, e os índios no Brasil,<br />

como os negros em Angola, passam a ter um lugar de destaque <strong>na</strong>s produções da época.<br />

Nos tempos <strong>do</strong> Romantismo, a terra já tinha si<strong>do</strong> assunto de muitas obras também em<br />

ambas as <strong>literatura</strong>s. No entanto, nesse perío<strong>do</strong>, os poetas e escritores ainda não tinham se<br />

liberta<strong>do</strong> <strong>do</strong> viés europeu. A terra envolvia tanto o espaço geográfico <strong>do</strong> lugar, como o povo<br />

que vivia nela.<br />

A infância é outro tema bastante explora<strong>do</strong> por essas <strong>literatura</strong>s por simbolizar uma<br />

fase marcada pela liberdade. Metaforicamente, a infância <strong>na</strong>s <strong>literatura</strong>s africa<strong>na</strong>s de língua<br />

portuguesa representa também o perío<strong>do</strong> anterior à chegada <strong>do</strong> coloniza<strong>do</strong>r. Essas <strong>literatura</strong>s<br />

mantiveram um elo muito forte.<br />

Jorge de Lima, escritor <strong>brasileiro</strong>, é aponta<strong>do</strong> como um <strong>do</strong>s poetas que teve<br />

identificação com os poetas angolanos, pois trata <strong>do</strong> tema <strong>do</strong> negro. Segun<strong>do</strong> o crítico<br />

português Pires Laranjeira, os poemas Mamã Negra (Canto da Esperança) de Viriato da Cruz<br />

22


e Olá!Negro de Jorge de Lima são bem semelhantes, são poemas longos, musicaliza<strong>do</strong>s num<br />

mesmo ritmo, buscan<strong>do</strong> uma identidade puramente <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, utilização de uma linguagem<br />

coloquial e vocabulário comum. Os <strong>do</strong>is poemas têm por tema o negro, o tempo e o espaço<br />

que são marca<strong>do</strong>s de maneira também igual. A<strong>na</strong>lisan<strong>do</strong> esses poemas, a crítica Elisalva<br />

Madruga Dantas, ao mesmo tempo em que reitera as aproximações feitas pelo referi<strong>do</strong> crítico,<br />

destaca algumas diferenças, a exemplo <strong>do</strong> tratamento da<strong>do</strong> às figuras representativas da raça<br />

negra por ambos os poetas. Enquanto para Jorge de Lima elas são vistas ape<strong>na</strong>s como parte <strong>do</strong><br />

folclore <strong>brasileiro</strong>, e mostram em da<strong>do</strong>s momentos traços negativos, para Viriato da Cruz,<br />

essas figuras traduzem positividade.<br />

Em um da<strong>do</strong> momento, <strong>na</strong> poesia de Jorge, o poeta que canta o negro é visto como<br />

falso, como no trecho <strong>do</strong> poema Olá!Negro: “Os poetas, os liberta<strong>do</strong>res, os que derramaram/<br />

babosas torrentes de falsa piedade/ não compreendiam que tu ias rir!”, e <strong>na</strong> poesia de Viriato,<br />

ao contrário, ele é valoriza<strong>do</strong> como voz que se ergue em favor <strong>do</strong> negro, no poema Mamã<br />

Negra. Percebemos isso no trecho que se segue: “Vozes vindas <strong>do</strong>s ca<strong>na</strong>viais <strong>do</strong>s arrozais <strong>do</strong>s<br />

cafezais <strong>do</strong>s/[seringais <strong>do</strong>s algo<strong>do</strong>ais...”.<br />

Em alguns momentos, a poesia de Jorge mostra-se mais preocupada com os<br />

sentimentos <strong>do</strong> homem branco <strong>do</strong> que com a desalie<strong>na</strong>ção <strong>do</strong> negro, mais uma vez exposto no<br />

poema Olá!Negro “... eu melhor compreen<strong>do</strong> agora os teus blues / nesta hora triste da raça<br />

branca, negro!”. Já em Viriato, vemos isso de forma contrária, pela maneira crítica como fala<br />

da opressão <strong>do</strong> negro e aponta para a construção da mudança dessa situação:<br />

Mas vejo também que a luz roubada aos teus olhos, ora esplende<br />

demoniacamente tenta<strong>do</strong>ra-como a Certeza...<br />

cintilantemente firme-como a Esperança...<br />

em nós outros teus filhos,<br />

geran<strong>do</strong>, forman<strong>do</strong>, anuncian<strong>do</strong><br />

-o dia da humanidade<br />

O DIA DA HUMANIDADE...<br />

Olá!Negro traz dúvida, “O dia está <strong>na</strong>scen<strong>do</strong> ou será a tua gargalhada que vem /<br />

vin<strong>do</strong>?”. Mamã Negra, poema já cita<strong>do</strong> anteriormente, traz a certeza de um futuro diferente.<br />

Assim, percebemos como o negro no poema de Jorge de Lima continuava a ser ape<strong>na</strong>s<br />

um objeto poético. Era aceitável no plano estético, mas, no plano social, era visto como um<br />

ser inferior em relação à raça branca. Em alguns aspectos se via ainda o preconceito em<br />

relação ao negro, presente no espaço <strong>brasileiro</strong>.<br />

Um outro escritor <strong>brasileiro</strong> que cantou o negro em sua poesia foi o gaúcho Oliveira<br />

Silveira. E o fez, identifican<strong>do</strong>-se com o negro, ressaltan<strong>do</strong> seus valores e, muitas vezes,<br />

23


enfocan<strong>do</strong>-o como sujeito e não como objeto, como no poema Negra Fulô. Segue um trecho<br />

<strong>do</strong> poema:<br />

A nega em vez de deitar<br />

pegou um pau e sampou<br />

<strong>na</strong>s guampas <strong>do</strong> sinhô.<br />

-_Essa nega Fulô!<br />

- Esta nossa Fulô!,<br />

dizia intimamente satisfeito<br />

o velho pai João<br />

pra escândalo <strong>do</strong> bom Jorge de Lima,<br />

seminegro e cristão.<br />

E a mãe-preta chegou bem creti<strong>na</strong><br />

fingin<strong>do</strong> uma <strong>do</strong>r no coração.<br />

- Fulô! Fulô! ó Fulô!<br />

a sinhá burra e besta perguntou<br />

onde é que tava o sinhô<br />

que o diabo lhe man<strong>do</strong>u<br />

- Ah, foi você matou!<br />

-É sim, fui eu que matou –<br />

A língua, da maneira como era falada entre as pessoas, sem as marcas europeias,<br />

também está <strong>na</strong> base das preocupações, tanto <strong>do</strong>s modernistas <strong>brasileiro</strong>s como <strong>do</strong>s poetas<br />

angolanos <strong>do</strong> Movimento <strong>do</strong>s Novos Intelectuais de Angola.<br />

Como os <strong>brasileiro</strong>s que trouxeram para a <strong>literatura</strong> a língua tipicamente brasileira,<br />

com to<strong>do</strong>s os coloquialismos e gírias existentes, visan<strong>do</strong> à sua valorização, os angolanos<br />

também passaram a inserir nos seus textos literários o quimbun<strong>do</strong>, língua falada em Luanda,<br />

antes menosprezada pelos portugueses, que passa a ser valorizada e inclusive a ter status<br />

literário. Com esse procedimento se fortalece o sentimento <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lista.<br />

24


3. ASPECTOS IDEOLÓGICOS E ESTÉTICOS DO POEMA “EXORTAÇÃO”<br />

O poema Exortação, <strong>do</strong> escritor angolano Maurício de Almeida Gomes, publica<strong>do</strong><br />

cem anos depois <strong>do</strong> poema Minha Terra, de José da Silva Maia Ferreira, assi<strong>na</strong>la bem o novo<br />

momento que se inicia <strong>na</strong>s décadas de 40 e 50. Um momento marca<strong>do</strong> por um forte<br />

sentimento <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lista. Como se pode ver, a partir <strong>do</strong> título, o poema exorta, ou seja, convida<br />

de forma veemente os poetas angolanos a realizarem uma poesia voltada para sua terra e suas<br />

origens.<br />

Vejamos o poema:<br />

Ribeiro Couto e Manuel Bandeira,<br />

poetas <strong>do</strong> Brasil,<br />

<strong>do</strong> Brasil, nosso irmão,<br />

disseram:<br />

“ – É preciso criar a poesia brasileira,<br />

de versos quentes, fortes, como o Brasil,<br />

sem macaquear a <strong>literatura</strong> lusíada”.<br />

Angola grita pela minha voz,<br />

Pedin<strong>do</strong> a seus filhos nova poesia!<br />

Deixemos moldes arcaicos,<br />

ponhamos de la<strong>do</strong>,<br />

corajosamente,<br />

suaves endeixas<br />

brandas queixas<br />

e cantemos a nossa terra<br />

e toda a sua beleza.<br />

Angola, grande promessa <strong>do</strong> futuro,<br />

forte realidade <strong>do</strong> presente,<br />

inspira novas idéias,<br />

encerra ricos motivos.<br />

É preciso inventar a poesia de Angola!<br />

Fecho meus olhos e sonho,<br />

abrin<strong>do</strong> de par em par o coração,<br />

e vejo a projeção dum filme colori<strong>do</strong><br />

com tintas de fantasia<br />

e ce<strong>na</strong>s de magia:<br />

As imagens são paisagens, gentes, feras.<br />

E sucedem-se lenta, lenta, lentamente...<br />

Assisto maravilha<strong>do</strong><br />

ao despenhar gemente<br />

das quedas d´água <strong>do</strong> Duque de Bragança...<br />

Vejo crescer florestas colossais<br />

no Maiombe, onde o verde é símbolo<br />

de tanta esperança...<br />

25


Amboim fecun<strong>do</strong>, Amboim cafezeiro,<br />

de alcantis envoltos sempre em nevoeiro denso,<br />

como um fumo cheiroso<br />

<strong>do</strong> seu café gostoso,<br />

tão famoso no mun<strong>do</strong>...<br />

O deserto de Namibe a espreguiçar-se<br />

num bocejo mole,<br />

estenden<strong>do</strong> tentáculos de areia<br />

como polvo gigante<br />

- visão aluci<strong>na</strong>nte,<br />

miragem<br />

no escrínio esquisito<br />

que guarda avaramente<br />

a jóia mais horrivelmente linda<br />

e única no mun<strong>do</strong><br />

- a Welwitshnia mirabilis, -<br />

que em si encerra mistério tão profun<strong>do</strong>...<br />

É preciso escrever a poesia de Angola!<br />

Vejo anharas infindáveis,<br />

onde noivam no capim,<br />

pelo amor amansadas,<br />

feras bravas, in<strong>do</strong>máveis...<br />

Vejo lagos de safira,<br />

tão calmos como olhos ternos, chorosos de tímidas gazelas...<br />

E terras rendilhadas <strong>do</strong> litoral,<br />

secas, rugosas, escalvadas,<br />

onde rei<strong>na</strong> o imbondeiro,<br />

gigantesco Prometeu agrilhoa<strong>do</strong>,<br />

visão estranha, infer<strong>na</strong>l, horrenda,<br />

verde páli<strong>do</strong>, branco, cinzento,<br />

lembran<strong>do</strong> líquen mágico, colossal...<br />

Baías, cabos, estuários,<br />

praias more<strong>na</strong>s,<br />

mares verdes, mares azuis,<br />

e rios de aspecto inofensivo<br />

mas cheios de jacarés...<br />

Terras de mandioca e batata <strong>do</strong>ce,<br />

campos de sisal, mi<strong>na</strong>s e metais,<br />

goiabeiras, palmeiras, cajueiros,<br />

areais imensos, cheios de diamantes,<br />

chuvadas torrenciais,<br />

filas tristes de negros carrega<strong>do</strong>res gemen<strong>do</strong>,<br />

cantan<strong>do</strong> tristemente seus cantares...<br />

pla<strong>na</strong>ltos, montanhas e fogueiras,<br />

feiticeiros dançan<strong>do</strong> loucamente:<br />

Angola é grande e rica e bela e vária.<br />

É preciso criar a poesia de Angola!<br />

Terra enorme onde o inseto impera:<br />

mosquito da febre e mosca tzé-tzé,<br />

26


cobrin<strong>do</strong> tu<strong>do</strong> de sono.<br />

Olhai o senhor arquiteto Salalé,<br />

tão pequenino, tão teimoso e diligente...<br />

Como ele projeta e constrói castelos,<br />

milhões de vezes maiores que ele é,<br />

para vergonha nossa,<br />

que pouco fazemos,<br />

presos de fútil, preguiçoso dandismo...<br />

Encostai o ouvi<strong>do</strong> atento<br />

ao coração <strong>do</strong> povo negro,<br />

escutareis, só vós, poetas da minha terra,<br />

que estais por <strong>na</strong>scer,<br />

aquilo que para outros é segre<strong>do</strong> defeso,<br />

mistério da esfíngica, malsi<strong>na</strong>da alma negra.<br />

Criai ânimo, ganhai alento,<br />

e vibrantemente cantai a nossa terra!<br />

É preciso forjar a poesia de Angola!<br />

Essa nova poesia,<br />

Será vazada em forma candente<br />

Sem limites nem peias,<br />

Diferente!...<br />

Mas onde estão os filhos de Angola,<br />

Se os não oiço cantar e exaltar<br />

Tanta beleza e tanta tristeza,<br />

Tanta <strong>do</strong>r e tanta ânsia<br />

Desta terra e desta gente?<br />

Essa nova poesia,<br />

Forte, ter<strong>na</strong>, nova e bela,<br />

Amálgama de lágrimas e sangue,<br />

Sublimação de muito sofrimento,<br />

Afirmação duma certeza.<br />

Poesia inconformista,<br />

Diferente, será revolucionária,<br />

Como arte literária, desprezan<strong>do</strong> regras estabelecidas,<br />

Idéias feitas, pieguices, transcendências...<br />

Poesia nossa, única, inconfundível,<br />

diferente,<br />

quente, que lembre o nosso sol,<br />

suave, lembran<strong>do</strong> nosso luar...<br />

que cheire o cheiro <strong>do</strong> mato,<br />

tenha as cores <strong>do</strong> nosso céu,<br />

o nervosismo <strong>do</strong> nosso mar,<br />

o paroxismo das queimadas,<br />

o cantar das nossas aves,<br />

rugir de feras, gritos de negros,<br />

gritos de há muitos anos,<br />

de escravos, de engenhos das roças,<br />

no espaço vibran<strong>do</strong>, vibran<strong>do</strong>...<br />

27


Sons magoa<strong>do</strong>s, tristíssimos, enervantes,<br />

de quissanges e marimbas...<br />

versos que encerrem e expliquem<br />

to<strong>do</strong> o mistério desta terra,<br />

versos nossos, úmi<strong>do</strong>s, diferentes,<br />

que, quan<strong>do</strong> recita<strong>do</strong>s,<br />

nos façam reviver o drama negro<br />

e suavizem corações,<br />

iluminem consciências,<br />

e evoquem paisagens<br />

e mostrem caminhos,<br />

rumos,<br />

auroras...<br />

Uma poesia nossa, nossa, nossa!<br />

- cântico, reza, salmo, sinfonia,<br />

que uma vez cantada,<br />

rezada,<br />

escutada,<br />

faça toda a gente sentir<br />

faça toda a gente dizer:<br />

1949 - É poesia de Angola!<br />

O poema começa fazen<strong>do</strong> alusão a <strong>do</strong>is poetas <strong>brasileiro</strong>s modernistas, Ribeiro Couto<br />

e Manuel Bandeira, que se empenharam, sobretu<strong>do</strong> esse último, <strong>na</strong> criação de uma poesia que<br />

rompesse com os padrões europeus e se fizesse à luz da própria realidade brasileira.<br />

“É preciso criar a poesia brasileira,<br />

De versos quentes, fortes, como o Brasil,<br />

Sem macaquear a <strong>literatura</strong> lusíada”.<br />

Necessidade que passa a ser sentida entre os angolanos, conforme expressa veemente<br />

o eu-lírico nos refrões que perpassam to<strong>do</strong> o poema, relacio<strong>na</strong><strong>do</strong>s com a criação de uma<br />

poesia verdadeiramente angola<strong>na</strong>.<br />

Ainda nessa primeira estrofe, com o verso “... <strong>do</strong> Brasil, nosso irmão...”, é visível a<br />

grande afinidade que existe entre os poetas angolanos e os <strong>brasileiro</strong>s, principalmente no que<br />

concerne ao rompimento com a cultura coloniza<strong>do</strong>ra e com os seus modelos poéticos.<br />

O eu-lírico recorre a uma afirmação <strong>do</strong>s poetas <strong>brasileiro</strong>s para mostrar como deveria<br />

ser construída a nova poesia de Angola, uma poesia o mais <strong>na</strong>tural possível, tipicamente<br />

angola<strong>na</strong>, uma “Poesia inconformista / Diferente (que) será revolucionária, / Como arte<br />

literária, desprezan<strong>do</strong> regras estabelecidas, / Idéias feitas, pieguices, transcendências...”.<br />

28


O poema Exortação é uma metapoética, pois, além de ser uma poesia angola<strong>na</strong>,<br />

mostra como essa poesia deve ser feita. Esteticamente, como já foi dito, fala da ruptura e, ao<br />

mesmo tempo, a realiza, visan<strong>do</strong> dar vez a uma poesia mais livre, construída a partir da<br />

realidade de Angola, com sua própria rima, sua própria musicalidade. Angola passa então a<br />

ser vista com outros olhos, não mais como uma realidade exótica, mas como uma realidade<br />

promissora.<br />

Nessa linha metapoética, observa-se que já a partir da segunda estrofe o eu-lírico<br />

começa a esboçar como deve ser feita, em termos estéticos e ideológicos, essa poesia.<br />

Esteticamente, deverá deixar de la<strong>do</strong> “moldes arcaicos”, “suaves endeixas”, “brandas<br />

queixas” e, ideologicamente, deve cantar a terra e sua beleza. Mas não de forma idealista,<br />

enfocan<strong>do</strong> ape<strong>na</strong>s as maravilhas, mas de mo<strong>do</strong> também crítico, mostran<strong>do</strong> a realidade sofrida,<br />

amargurada e triste, que impede o desenvolvimento de Angola. A terra e tu<strong>do</strong> que nela se faz<br />

presente (fau<strong>na</strong>, flora, topografia, povo, etc.) é, portanto, fonte de inspiração para os poetas. A<br />

poesia deve ser um espelho de Angola, que é rica em histórias, em fatos que podem ser<br />

canta<strong>do</strong>s. O eu-lírico, ao usar termos como, “corajosamente”, “inspira”, “ricos”, demonstra<br />

que o povo angolano tem uma bravura, uma fortaleza, que os possibilita se libertarem das<br />

algemas portuguesas e construírem um futuro diferente.<br />

A partir da quinta estrofe até a décima quarta, o eu-lírico faz uma descrição de Angola,<br />

cantan<strong>do</strong> emocio<strong>na</strong><strong>do</strong> os aspectos da região, as paisagens locais, mostran<strong>do</strong> de forma<br />

detalhada o que as constituem, a exemplo da região <strong>do</strong> Amboim, onde é cultiva<strong>do</strong> o café “tão<br />

famoso no mun<strong>do</strong>”; as quedas d´água <strong>do</strong> “Duque de Bragança”, “o deserto <strong>do</strong> Namibe”, entre<br />

tantas outras realidades.<br />

Aproprian<strong>do</strong>-nos das imagens <strong>do</strong> poema, para nós a terra angola<strong>na</strong> cantada pelo poeta,<br />

por sua grandeza, pode ser vista, assim como o deserto de Namibe, “como um polvo gigante”,<br />

e seus filhos como a “Wellwitshnia Mirabilis”, ou seja, como “jóias” que só ela a possui.<br />

Já as imagens de Angola, retratadas <strong>na</strong> no<strong>na</strong> estrofe, confirmam o que dissemos acima<br />

acerca da visão crítica <strong>do</strong> poeta, <strong>na</strong> medida em que mostram uma realidade um tanto adversa,<br />

em decorrência das “terras rendilhadas <strong>do</strong> litoral, / secas, rugosas, escalvadas / onde rei<strong>na</strong> o<br />

imbondeiro, / gigantesco Prometeu agrilhoa<strong>do</strong>, / visão estranha, infer<strong>na</strong>l, horrenda, / verde<br />

páli<strong>do</strong>, branco, cinzento, / lembran<strong>do</strong> líquen mágico, colossal...”.<br />

Na estrofe 11ª, a referência aos negros, ao mesmo tempo em que revela a dureza da<br />

exploração, mostra a forma por eles encontrada de resistirem ao sofrimento, através <strong>do</strong> canto,<br />

da dança, <strong>do</strong>s seus cultos religiosos, conforme podemos deduzir da menção aos “feiticeiros<br />

dançan<strong>do</strong> loucamente”, como a expurgar to<strong>do</strong> o mal.<br />

29


Chaman<strong>do</strong> a atenção para o trabalho <strong>do</strong> “Salalé”, ou seja, <strong>do</strong> cupim, inseto “tão<br />

pequenino, tão teimoso e diligente...”, em resumo, tão sem importância, mas que é capaz de<br />

construir castelos altíssimos, o eu-lírico critica a preguiça <strong>do</strong> povo angolano, entre o qual se<br />

inclui, por fazer muito pouco por sua terra, não cantar “tanta beleza” e “tanta tristeza”.<br />

A partir dessas considerações em torno da terra e <strong>do</strong> seu povo, o eu-lírico retoma a<br />

preocupação com o fazer da poesia angola<strong>na</strong> e dedica as oito estrofes fi<strong>na</strong>is à metapoética.<br />

A ideia de ruptura mais uma vez fica claramente explícita ao dizer que “Essa nova<br />

poesia, / Será... / Sem limites nem peias, / Diferente!...”.<br />

Portanto, uma poesia liberta de qualquer cerceamento, voltada para tu<strong>do</strong> que diz<br />

respeito à realidade angola<strong>na</strong> e que “faça toda a gente sentir / faça toda a gente dizer: / - É<br />

poesia de Angola!”.<br />

Observe-se que, ao fi<strong>na</strong>lizar o poema com um refrão que diz É poesia de Angola!, o<br />

eu-lírico quebra a estrutura <strong>do</strong>s refrões anteriores que sempre traziam um verbo que remetia à<br />

necessidade de inventar, escrever, criar, forjar a poesia angola<strong>na</strong>, reiteran<strong>do</strong>, desse mo<strong>do</strong>, o<br />

caráter metapoético, a partir da homologação entre o que diz e o que faz.<br />

Se a to<strong>do</strong> o tempo, o eu-lírico, imbuí<strong>do</strong> de uma esperança no dia de amanhã tão grande<br />

quanto a floresta de Maiombe, mostra como se deve fazer estética e ideologicamente a poesia<br />

angola<strong>na</strong>, ao fi<strong>na</strong>lizar o poema, ele termi<strong>na</strong> fazen<strong>do</strong> a poesia de Angola. O poema Exortação<br />

além de ser de fato um poema angolano, comprova indiscutivelmente a relação existente entre<br />

a <strong>literatura</strong> de Angola e a nossa <strong>literatura</strong>.<br />

30


CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

As investigações por nós realizadas, comprovaram o quanto a <strong>literatura</strong> brasileira<br />

contribuiu para a consecução <strong>do</strong>s objetivos pretendi<strong>do</strong>s pelos angolanos no concernente à<br />

angolanização da <strong>literatura</strong>, seja em termos estéticos, seja em termos ideológicos. Vimos<br />

também que a identificação entre os poetas angolanos e os <strong>brasileiro</strong>s, embora remonte ao<br />

fi<strong>na</strong>l <strong>do</strong> século XIX, intensificou-se bem mais a partir da década de 40 <strong>do</strong> século XX, quan<strong>do</strong><br />

começa o movimento lidera<strong>do</strong> por poetas e escritores angolanos de se voltarem para sua terra,<br />

de criarem uma poesia construída, a partir de sua própria realidade e não mais à maneira da<br />

cultura coloniza<strong>do</strong>ra. Desse mo<strong>do</strong>, Angola iniciava um processo, que embora tenha motiva<strong>do</strong><br />

também os intelectuais <strong>do</strong> fi<strong>na</strong>l <strong>do</strong> século XIX, agora ressurgia com mais força: o de não<br />

deixar que suas histórias e suas raízes se perdessem. Para melhor compreensão desse<br />

momento e das razões que aproximavam os poetas e escritores angolanos <strong>do</strong>s <strong>brasileiro</strong>s, é<br />

que procuramos mostrar um pouco <strong>do</strong> contexto sócio/histórico/literário de Angola.<br />

A <strong>literatura</strong> foi, como fica bem evidencia<strong>do</strong> no trabalho, uma maneira <strong>do</strong>s escritores<br />

exporem os seus sentimentos, sobretu<strong>do</strong> o seu desejo de serem livres e independentes. A<br />

poesia era, pois, uma forma de lutar por to<strong>do</strong>s os anseios daquele povo. Aliás, é a partir da<br />

<strong>literatura</strong> que surgem os grupos políticos que mais adiante conduzirão à independência<br />

política de Angola. Os poetas, os escritores eram também os líderes <strong>do</strong> MPLA, ou seja, <strong>do</strong><br />

Movimento Popular de Libertação de Angola. Registre-se que o primeiro presidente de<br />

Angola, após a independência foi um <strong>do</strong>s poetas dessa geração das décadas de 40 e 50,<br />

Agostinho Neto, uma das grandes vozes da negritude africa<strong>na</strong> de língua portuguesa.<br />

A busca pela <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lidade literária e política foi um <strong>do</strong>s grandes pontos de aproximação<br />

entre as <strong>literatura</strong>s brasileira e angola<strong>na</strong>.<br />

Fi<strong>na</strong>lizamos afirman<strong>do</strong> que ao adentrar no espaço literário angolano, a <strong>literatura</strong><br />

brasileira, sem dúvida, deixou uma contribuição riquíssima para emergência da <strong>literatura</strong> de<br />

Angola, para a consolidação das suas propostas <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>listas e para a concretização <strong>do</strong>s seus<br />

ideais libertários. Ideais esses pelos quais tanto batalharam os modernistas <strong>brasileiro</strong>s e os<br />

poetas angolanos, visan<strong>do</strong>, como já dissemos a preservação de suas raízes.<br />

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REFERÊNCIAS<br />

ERVEDOSA, Carlos. Roteiro da <strong>literatura</strong> angola<strong>na</strong>. 2. ed. Lisboa: Edições 70, 1979.<br />

GOMES, Maurício. Exortação. In: FERREIRA, Manuel. No Reino de Caliban. Antologia<br />

panorâmica da poesia africa<strong>na</strong> de expressão portuguesa. Angola e São Tomé e Príncipe, 2º<br />

volume. Lisboa: Seara Nova, 1976, p. 85 – 89.<br />

MADRUGA, Elisalva. Nas trilhas da descoberta: (repercussão <strong>do</strong> Modernismo <strong>brasileiro</strong> <strong>na</strong><br />

<strong>literatura</strong> angola<strong>na</strong>). João Pessoa, PB: Ed. Universitária/UFPB, 1998.<br />

MATA, Inocência. A <strong>literatura</strong> africa<strong>na</strong> e a crítica pós-colonial: reconversões. São Paulo –<br />

Luanda, Angola: Edições de Angola, Lda. 2007.<br />

OLIVEIRA, Silveira. Outra nega Fulô. In: Cadernos Negros. Os Melhores Poemas. São<br />

Paulo: Quilombhoje, 1998, p. 109 – 110.<br />

TELES, Gilberto Men<strong>do</strong>nça. Vanguarda europeia e <strong>modernismo</strong> <strong>brasileiro</strong>: apresentação<br />

<strong>do</strong>s principais poemas metalinguísticos, manifestos, prefácios e conferências vanguardistas,<br />

de 1857 a 1972. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.<br />

VÁRIOS. História de Angola. Porto: Edições Afrontamento, 1975.<br />

VÁRIOS. Voz de Angola claman<strong>do</strong> no Deserto. Lisboa: Edições 70/União <strong>do</strong>s Escritores<br />

Angolanos, 1984.<br />

SITE CONSULTADO<br />

Acesso em: 05 set. 2010<br />

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