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O CASTELO DA Luz - CloudMe

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A DEUSA DO MUNDO INTERIOR<br />

Fechada cm sua cela, incapaz de sair, Shamira apertou forte as pálpebras e mordeu a<br />

língua em horror, quando o rato transpôs a passagem.<br />

Suspensa por correntes ao teto estava uma bela mulher, de pele clara e face apática. Os<br />

cabelos, louros, compridos e ondulados, caíam-lhe às costas, indicando seu traço mais absurdo<br />

— um par de longas asas de penas brancas, marcadas por rajas de sangue.<br />

A deusa! A deusa Ishtar. A deusa do mundo interior. A deusa de Nimrod!<br />

A condenada não era realmente mulher, mas uma entidade celestial, como aquelas<br />

descritas no Livro de Magan, um dos antigos compêndios de misticismo aja autoria se atribui<br />

aos sábios da extinta cidade de Enoque. Esses celestes, até onde se sabia, foram criados pela luz<br />

do Altíssimo e serviram como arautos em sua criação. Foram eles a primeira raça do universo, e<br />

muito antes da feitura do homem já vagavam pelas estrelas, desbravando o infinito.<br />

Mas quem teria capturado criatura tão majestosa, e por quê?<br />

Era impossível, mesmo para um necromante, ter certeza se a alada ainda vivia, pela<br />

gravidade de seus ferimentos. Não só as asas, mas todo o corpo estava coberto de lesões e<br />

hematomas, como o dos soldados que regressam da guerra.<br />

Mas então, quando o rato circulou a pilastra, a própria Shamira estremeceu à visão do<br />

espetáculo dantesco. Usando uma faca magica de ritual, o feiticeiro Zamir rasgava as costelas da<br />

deusa, deixando verter o sangue da pobre entidade dependurada. Enquanto isso, ajoelhado aos<br />

pés da celeste, Nimrod sorvia o fluido vermelho, engolindo com ardor as gotas de plasma.<br />

Bebendo o sangue da deusa!<br />

O sangue humano é o alimento de muitos espíritos e frequentemente é usado como<br />

material nos rituais de bruxaria. Mas a necromante nunca ouvira falar de um homem que tivesse<br />

provado o sangue imortal e não tinha idéia dos efeitos resultantes de tal cerimónia. Era certo,<br />

porém, que os filhos de Nod (que viviam em Enoque) muito pesquisaram sobre a natureza<br />

angélica. Se o busca-dor tivesse mesmo os tomos antigos de feitiçaria, provavelmente fosse<br />

experto nas propriedades ocultas da anatomia celestial, e então a feiticeira inferiu o mais lógico.<br />

É o sangue da deusa que torna, o soberano invencível.<br />

A situação hedionda desconcertou a mulher, que quis vomitar, mas deteve o impulso. A<br />

concentração vacilou, e foi quebrado o encanto. Na sala, o rato, liberto, fugiu para a escuridão, e<br />

os profanos avançaram com sua orgia macabra.<br />

No calabouço, uma figura solitária percorreu as alcovas e parou em frente à cela de<br />

Shamira. Sacou do cinto um molho de chaves e destrancou cada uma das três fechaduras.<br />

Quem será? — assustou-se a mulher. E se o bruxo tivesse detectado seu feitiço de<br />

consciência animal? Que destino ele poderia arquitetar para ela, além da execução? Se Zamir<br />

conhecia os segredos ancestrais, certamente saberia como amaldiçoá-la, convertendo-a em uma<br />

criatura inumana, como faziam os magos de Nod.<br />

A porta se abriu, e Shamira viu não um guarda, mas um escravo, um sujeito alto,<br />

moreno e forte, que trabalhava como serviçal em alguma ala do palácio. Não portava armas, só<br />

uma veste comum, e não parecia agressivo.<br />

— Sou amigo de Adnari — esclareceu, e o coração da moça quase pulou de alívio. —A<br />

menina me contou que você conhece a saída.<br />

— Um escravo por aqui... e sozinho? — ela murmurou, ainda meio abalada. Nenhum<br />

vigia circulava pelos corredores, e a masmorra parecia desguarnecida.<br />

— Você tem de se apressar. O rei e o buscador desceram às câmaras inferiores. Sempre<br />

que isso acontece, as sentinelas são ordenadas a deixar a prisão. A evacuação temporária<br />

permitiu o meu ingresso.<br />

Zamir e Nimrod zelavam pela conservação do mistério, embora Adnari tenha dito que<br />

alguns escravos chegaram a contemplar "a face da deusa". Na verdade, a presença física da<br />

divindade não era um tabu, e sim a dependência do governante de seu sangue. Se algum<br />

aristocrata descobrisse a fonte da invencibilidade do rei, certamente tentaria roubá-la.

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