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Erico Verissimo - Olhai os Lirios do Campo.pdf - Website Prof. Assis

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um sorriso servil e constrangi<strong>do</strong> de quem pede perdão. Perdão por não ter<br />

dinheiro, por ser alfaiate, por andar mal vesti<strong>do</strong>, por não passar de um pobre<br />

diabo. Eugênio desviou <strong>os</strong> olh<strong>os</strong>, muito vermelho, mas aquele sorriso ficou a<br />

<strong>do</strong>er-lhe. Lembrou-se de um cachorrinho que tivera havia muit<strong>os</strong> an<strong>os</strong>, pobre<br />

vira-lata pela<strong>do</strong> e sarnento. Vinha lamber as mã<strong>os</strong> d<strong>os</strong> que lhe davam<br />

pontapés...<br />

E, pela primeira vez naquela noite, Ângelo, dirigiu-se ao filho:<br />

- Genoca, tu não estás precisan<strong>do</strong> de mais uma roupa?<br />

Sem ousar fitá-lo, Eugênio respondeu:<br />

- Não, pai, muito obriga<strong>do</strong>. Agora estou bem de roupa.<br />

Como aquilo lhe roia! Por que era ele assim tão ruim? Por que não<br />

rompia todas as barreiras? Por que não se erguia para abraçar o pai, para lhe<br />

pedir perdão pelo que lhe fizera? Sentiu um nó na garganta.<br />

- Não vês que eu tenho um corte de casimira muito bonito aí...<br />

- Não, pai. Muito obriga<strong>do</strong>.<br />

Havia timidez e ternura no oferecimento <strong>do</strong> pai. Era como se ele quisesse<br />

compensar com o presente de uma roupa a culpa de não ser rico, de não ter<br />

p<strong>os</strong>ição, de não dar melhor sorte a<strong>os</strong> filh<strong>os</strong>.<br />

Silêncio. Ernesto fumava, de olh<strong>os</strong> baix<strong>os</strong>.<br />

D. Alzira voltava da cozinha.<br />

- O fogo apagou e eu preciso água quente para lavar <strong>os</strong> prat<strong>os</strong>. Tenho de<br />

ir rachar lenha...<br />

Ernesto levantou.<br />

- Eu vou, mãe.<br />

Quan<strong>do</strong> ele falou, Eugênio sentiu um bafio de cachaça.<br />

- Pois então vai, Nestinho. Pega a machadinha em cima <strong>do</strong> tanque.<br />

Cuida<strong>do</strong>, não vai-te cortar.<br />

Ernesto saiu. Caminhava encurva<strong>do</strong> como um velho. E não tinha ainda<br />

vinte an<strong>os</strong>! Eugênio seguiu-o com <strong>os</strong> olh<strong>os</strong>. Lembrou-se d<strong>os</strong> temp<strong>os</strong> em que <strong>os</strong><br />

<strong>do</strong>is iam junt<strong>os</strong> para o colégio. Seria saudade o que sentia agora? Ou apenas<br />

estranha emoção que lhe causava a atitude <strong>do</strong> pai?

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