18.04.2013 Views

Leituras de Bocage - Repositório Aberto da Universidade do Porto

Leituras de Bocage - Repositório Aberto da Universidade do Porto

Leituras de Bocage - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

12 leituras <strong>de</strong> bocage<br />

MACEDO E BOCAGE: UM DUELO DE VAIDADES<br />

Maria Ivone <strong>de</strong> Ornellas <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong><br />

Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> Lusófona <strong>de</strong> Humani<strong>da</strong><strong>de</strong>s e Tecnologias<br />

Posteri<strong>da</strong><strong>de</strong>, és tu quem sobre a campa,<br />

[...] O selo me hás-<strong>de</strong> pôr <strong>da</strong> glória, e honra, [...]<br />

O nome aclamarão <strong>do</strong> homem que soube,<br />

Às Musas <strong>da</strong>r emprego, à Pátria glória.<br />

Mace<strong>do</strong>, A Meditação<br />

Eis os tempos, a inveja, a morte, o Letes<br />

[...] Zoilos, tremei! Posteri<strong>da</strong><strong>de</strong>, és minha!<br />

<strong>Bocage</strong><br />

São <strong>de</strong> crise os tempos no fim <strong>do</strong> século XVIII, vive-se o perío<strong>do</strong> mais agita<strong>do</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o cisma <strong>da</strong><br />

Reforma. As Luzes introduzem a dimensão crítica no pensar e constituem em si mesmas uma pararevolução<br />

que, num crescen<strong>do</strong> <strong>de</strong> consciência colectiva, resulta na Revolução Francesa, epicentro <strong>de</strong><br />

uma ruptura na vivência <strong>do</strong>s povos <strong>da</strong> Europa <strong>do</strong> Oci<strong>de</strong>nte. Assiste-se a uma ruptura civilizacional. De<br />

gestação prolonga<strong>da</strong>, a nova mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> acaba por englobar to<strong>da</strong>s as latitu<strong>de</strong>s <strong>da</strong> cultura europeia. O<br />

fenómeno revolucionário, ao mu<strong>da</strong>r a monarquia em república, dá lugar a textos fun<strong>da</strong><strong>do</strong>res na or<strong>de</strong>m<br />

política, económica e social (lembramos a Déclaration <strong>de</strong>s Droits <strong>de</strong> l’Homme et du Citoyen). Estes seduzem<br />

povos e vivências com as neófitas propostas <strong>de</strong> forma <strong>de</strong> governação e, no mínimo, questionam o<br />

mo<strong>de</strong>lo tradicional monárquico <strong>de</strong> signo absoluto. Os gestos éticos e estéticos transfiguram-se igualmente,<br />

passam por um fenómeno <strong>de</strong> ressemantização que enforma o logos <strong>da</strong> nova cultura.<br />

Uma nação periférica, subordina<strong>da</strong> intelectualmente aos centros hegemónicos, as mais <strong>da</strong>s vezes<br />

limita-se a ecoar o que noutras latitu<strong>de</strong>s se produz. O discurso tradicional <strong>da</strong> Igreja ou Vulgata orto<strong>do</strong>xa,<br />

apesar <strong>do</strong> bem sucedi<strong>do</strong> movimento apologético <strong>do</strong> século XVII e mesmo <strong>do</strong> XVIII, per<strong>de</strong>ra<br />

certa eficácia combativa. Vivia-se o “sonho <strong>de</strong> uma razão cristã marca<strong>da</strong> pela recor<strong>da</strong>ção <strong>de</strong> ter si<strong>do</strong><br />

a norma <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a razão” 1 . Apesar <strong>do</strong>s esforços profiláticos leva<strong>do</strong>s a cabo pela tradição, to<strong>do</strong>s os<br />

<strong>do</strong>mínios <strong>da</strong> vivência e <strong>do</strong> pensamento reajustam-se ao novo ritmo <strong>da</strong> História. Apresentava-se níti<strong>do</strong><br />

que estava a terminar a era <strong>da</strong> religião como cultura <strong>do</strong>minante. De certo mo<strong>do</strong> o filosofismo acabava<br />

por fazer parte <strong>de</strong> uma filosofia geral. A presença <strong>de</strong> livres-pensa<strong>do</strong>res e <strong>de</strong> libertinos (mesmo reduzi<strong>do</strong>s<br />

à expressão mais fraca, isto é, apenas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m moral) iniciara a opinião pública na discussão<br />

<strong>de</strong> certos temas, criara especta<strong>do</strong>res <strong>do</strong> teatro <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias, ca<strong>da</strong> vez menos afecta<strong>do</strong>s pelo escân<strong>da</strong>lo <strong>da</strong>s<br />

novi<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Na “história <strong>do</strong> oci<strong>de</strong>nte, a secularização é um acontecimento cultural em que o mun<strong>do</strong> e a<br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong> entram, pela primeira vez, nos projectos racionais <strong>da</strong> compreensão humana, o que significa<br />

1 Frase <strong>de</strong> Emile Poulat cit. por Moisés Lemos MARTINS, in O Olho <strong>de</strong> Deus no Discurso Salazarista, <strong>Porto</strong>, Ed. Afrontamento,<br />

1990, p. 43.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!