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Leituras de Bocage - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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1 leituras <strong>de</strong> bocage<br />

e realizam a simetria <strong>da</strong> resposta: “Como hás-<strong>de</strong>, oh zoilo, eternizar meu nome,/Se os fa<strong>do</strong>s permanência<br />

a ti ve<strong>da</strong>ram” <strong>da</strong> bocageana Pena <strong>de</strong> Talião:<br />

Sátiras prestam, sátiras se estimam<br />

quan<strong>do</strong> nelas calúnia o fel não verte;<br />

[...]Repimpa<strong>do</strong> nos púlpitos, que aviltas,<br />

Afofas teus sermões, venais fazen<strong>da</strong>s<br />

[...] Trovejas, enrouqueces, não comoves,<br />

Gelas a contrição no centro d’alma: [...]<br />

Arrotas ante o vulgo a Enciclopédia<br />

[...] Arranhas mortos, atassalhas vivos;<br />

Não me envilece ali <strong>de</strong> fra<strong>de</strong> o sol<strong>do</strong> [...]<br />

A rapsódia servil, poema intruso,<br />

Pilhagem que fizeste em cem volumes,<br />

[...] Braveja, <strong>de</strong>tractor, braveja insano, [...]<br />

De gor<strong>do</strong> original versão mirra<strong>da</strong>,<br />

Sulca<strong>do</strong> o Stácio teu <strong>de</strong> unha<strong>da</strong>s minhas,<br />

[...] Ousa mais; a Lusía<strong>da</strong> não sumas<br />

Que o número <strong>de</strong> versos fez poema, [...]<br />

Expõe no tribunal <strong>da</strong> eterni<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

Monumentos <strong>de</strong> audácia, e não <strong>de</strong> engenho:<br />

[...] Mas venha o mais: Epístolas, Sonetos,<br />

O<strong>de</strong>s, Canções, Metamorfoses, tu<strong>do</strong>...<br />

Na frente põe teu nome, e estou vinga<strong>do</strong>. 11<br />

Mais tar<strong>de</strong>, Mace<strong>do</strong> <strong>de</strong>ixar-nos-á uma <strong>de</strong>finição <strong>do</strong> autor satírico: “inimigo <strong>do</strong>s homens; ninguém<br />

o ama, e se algum o respeita, é mais possuí<strong>do</strong> <strong>do</strong> temor, que <strong>da</strong> estima; to<strong>do</strong>s receiam tê-lo por especta<strong>do</strong>r<br />

<strong>da</strong>s próprias acções, e o <strong>de</strong>testam, como público verdugo <strong>da</strong> reputação [...] <strong>de</strong>sagra<strong>da</strong> sempre<br />

pelo maligno humor que <strong>de</strong>le transpira.” 12 Pena que não lhe tivessem ocorri<strong>do</strong> tais i<strong>de</strong>ias então e pela<br />

vi<strong>da</strong> fora.<br />

Como Manuel Maria du <strong>Bocage</strong> não <strong>de</strong>sse seguimento à polémica, Agostinho reivindicou para si<br />

o papel <strong>de</strong> vence<strong>do</strong>r. Na correspondência troca<strong>da</strong> entre Rousseau e Grimm, a propósito <strong>da</strong> célebre<br />

polémica em torno <strong>do</strong> tema proposto pela Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Dijon - Si les progrès <strong>de</strong>s sciences et <strong>de</strong>s arts ont<br />

contribué à corrompre ou à épurer les mœurs -, o premia<strong>do</strong> comenta: “Je ne puis pas me persua<strong>de</strong>r que, pour<br />

avoir raison, on soit indispensablement obligé <strong>de</strong> parler le <strong>de</strong>rnier” 13 , bem oposto à conclusão <strong>do</strong><br />

ofendi<strong>do</strong> Agostinho.<br />

Numa época <strong>de</strong> transição em que se <strong>de</strong>frontam cânones estéticos, o que estava em causa, tanto<br />

para <strong>Bocage</strong> como para Mace<strong>do</strong>, era o reconhecimento <strong>da</strong> geniali<strong>da</strong><strong>de</strong> e ca<strong>da</strong> um chamava a si os<br />

louros <strong>de</strong> outorgar o título <strong>de</strong> nobreza ao género di<strong>da</strong>scálico. Num ambiente <strong>de</strong> mornas inquietu<strong>de</strong>s<br />

poéticas, <strong>de</strong>frontavam-se <strong>do</strong>is temperamentos egolátricos e mitómanos, tão característicos <strong>da</strong> psicologia<br />

<strong>da</strong> época. E Agostinho acusa: “Brilha a frente <strong>do</strong> Mérito, e Virtu<strong>de</strong>/De uma luz imortal, <strong>de</strong> um<br />

louro eterno,/Desfecha a Inveja pavorosos raios” 14 . A querela estalou brava e foi alimenta<strong>da</strong> por duas<br />

facções: <strong>de</strong> um la<strong>do</strong>, elmanistas, a corte verseja<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> <strong>Bocage</strong>; <strong>do</strong> outro, a milícia <strong>da</strong> efémera Nova<br />

Arcádia ou “corja vil” 15 , <strong>de</strong> on<strong>de</strong> havia si<strong>do</strong> expulso o sonetista. O “motim literário” elevou a temperatura<br />

morna <strong>do</strong> elogio mútuo, fulanizou em sátiras insultuosas elmanistas e árca<strong>de</strong>s e legou-nos um<br />

11 I<strong>de</strong>m, pp. 333-341. Itálico nosso.<br />

12 Cf. MACEDO, Semanario <strong>de</strong> Instrucção, e Recreio, Lisboa, na Imp. Regia, 1813, t. II, N.º 41, p. 233.<br />

13 “Lettre a Grimm” [Melchior], 1751, in Oeuvres <strong>de</strong> J. J. Rousseau, t. IV, Paris, Chez Lefèvre, Libraire, 1819[-1820], p. 50. Rousseau<br />

apresentara à Aca<strong>de</strong>mia o polémico Discours sur les Sciences et les Arts.<br />

14 Cf. “Entre as perseguições <strong>da</strong> Inveja se apura, e <strong>de</strong>scobre mais Merito, e o Talento. Monologo”, in Semanario <strong>da</strong> Instrucção, e<br />

Recreio, t. I, N.º 8, p. 134.<br />

15 Cf. Jacinto <strong>do</strong> PRADO COELHO, “A Nova Arcádia”, in Dicionário <strong>de</strong> Literatura (dir. Jacinto <strong>do</strong> Pra<strong>do</strong> Coelho), 3.º vol., 3.ª<br />

ed., <strong>Porto</strong>, Figueirinhas, 1978, p. 740.

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