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Sonetos, de Luís de Camões Texto-base - Canal do Estudante

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Eu cantei já, e agora vou choran<strong>do</strong><br />

o tempo que cantei tão confia<strong>do</strong>;<br />

parece que no canto já passa<strong>do</strong><br />

se estavam minhas lágrimas crian<strong>do</strong>.<br />

Cantei; mas se me alguém pergunta: —Quan<strong>do</strong>?<br />

—Não sei; que também fui nisso engana<strong>do</strong>.<br />

É tão triste este meu presente esta<strong>do</strong><br />

que o passa<strong>do</strong>, por le<strong>do</strong>, estou julgan<strong>do</strong>.<br />

Fizeram-me cantar, manhosamente,<br />

contentamentos não, mas confianças;<br />

cantava, mas já era ao som <strong>do</strong>s ferros.<br />

De quem me queixarei, que tu<strong>do</strong> mente?<br />

Mas eu que culpa ponho às esperanças<br />

on<strong>de</strong> a Fortuna injusta é mais que os erros?<br />

000<br />

Este soneto não foi disponibiliza<strong>do</strong> pela<br />

FCCN - Fundação para a Computação Científica Nacional ,<br />

<br />

que realizou a edição digital <strong>de</strong>sta obra.<br />

Agra<strong>de</strong>cemos sua compreensão.<br />

Eu vivia <strong>de</strong> lágrimas isento,<br />

num engano tão <strong>do</strong>ce e <strong>de</strong>leitoso<br />

que em que outro amante fosse mais ditoso,<br />

não valiam mil glórias um tormento.<br />

Ven<strong>do</strong>-me possuir tal pensamento,<br />

<strong>de</strong> nenhüa riqueza era envejoso;<br />

vivia bem, <strong>de</strong> nada receoso,<br />

com <strong>do</strong>ce amor e <strong>do</strong>ce sentimento.<br />

Cobiçosa, a Fortuna me tirou<br />

<strong>de</strong>ste meu tão contente e alegre esta<strong>do</strong>,<br />

e passou-me este bem, que nunca fora:<br />

em troco <strong>do</strong> qual bem só me <strong>de</strong>ixou<br />

lembranças, que me matam cada hora,<br />

trazen<strong>do</strong>-me à memória o bem passa<strong>do</strong>.<br />

O Feri<strong>do</strong> sem ter cura perecia<br />

o forte e duro Télefo temi<strong>do</strong>,<br />

por aquele que n'água foi meti<strong>do</strong>,<br />

a quem ferro nenhum cortar podia.<br />

Ao Apolíneo Oráculo pedia<br />

conselho para ser restituí<strong>do</strong>;<br />

respon<strong>de</strong>u que tornasse a ser feri<strong>do</strong><br />

por quem o já ferira, e sararia.<br />

111<br />

065

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