Mil Platôs. Vol 3
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descodificado e deve ser sobre-codificado por algo que denominaremos<br />
Rosto. É o mesmo que dizer que a cabeça, que todos os elementos volumecavidade<br />
da cabeça devem ser rostificados. Eles o serão pela tela<br />
esburacada, pelo muro branco-buraco negro, a máquina abstrata que irá<br />
produzir rosto. Mas a operação não pára aí: a cabeça e seus elementos não<br />
serão rostificados sem que o corpo inteiro não o possa ser, não seja levado a<br />
sê-lo, em um processo inevitável. A boca e o nariz, e antes de tudo os<br />
olhos, não se tornam uma superfície esburacada sem convocar todos os<br />
outros volumes e todas as outras cavidades do corpo. Operação digna do<br />
Dr. Moreau: horrível e esplêndida. A mão, o seio, o ventre, o pênis e a<br />
vagina, a coxa, a perna e o pé serão rostificados. O fetichismo, a<br />
erotomania, etc, são inseparáveis desses processos de rostificação. Não se<br />
trata absolutamente de tomar uma parte do corpo para fazê-la assemelharse<br />
a um rosto, ou representar um rosto de sonho como em uma nuvem.<br />
Nenhum antropomorfismo. A rostificação não opera por semelhança, mas<br />
por ordem de razões. É uma operação muito mais inconsciente e maquínica<br />
que faz passar todo o corpo pela superfície esburacada, e onde o rosto não<br />
tem o papel de modelo ou de imagem, mas o de sobrecodificação para<br />
todas as partes descodificadas. Tudo permanece sexual, nenhuma<br />
sublimação, mas novas coordenadas. E precisamente porque o rosto<br />
depende de uma máquina abstrata que ele não se contentará em recobrir a<br />
cabeça, mas afetará as outras partes do corpo, e mesmo, se necessário,<br />
outros objetos sem semelhança. Conseqüentemente, a questão é a de saber<br />
em que circunstâncias essa máquina é desencadeada, produzindo rosto e<br />
rostificação. Se a cabeça, mesmo humana, não é obrigatoriamente rosto, o<br />
rosto é produzido na humanidade, mas por uma necessidade que não é a<br />
dos homens "em geral". O rosto não é animal, mas tampouco é humano em<br />
geral, há mesmo algo de absolutamente inumano no rosto. É um erro agir<br />
como se o rosto só se tornasse humano a partir de um determinado limiar:<br />
close, aumento exagerado, expressão insólita, etc. O rosto é inumano no<br />
homem, desde o início; ele é por natureza close, com suas superfícies<br />
brancas inanimadas, seus buracos negros brilhantes, seu vazio e seu tédio.<br />
Rosto-bunker. A tal ponto que, se o homem tem um destino, esse será mais<br />
o de escapar ao rosto, desfazer o rosto e as rostificações, tornar-se<br />
imperceptível, tornar-se clandestino, não por um retorno à animalidade,<br />
nem mesmo pelos retornos à cabeça, mas por devires-animais muito<br />
espirituais e muito especiais, por estranhos devires que certamente<br />
ultrapassarão o muro e sairão dos buracos negros, que farão com que os<br />
próprios traços de rostidade se subtraiam enfim à organização do rosto, não