You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
I<br />
Passagens da Antiguidade Romana ao<br />
Ocidente Medieval: leituras historiográficas<br />
de um período limítrofe 1<br />
Introdução<br />
Delimitar um grande período historiográfico no tempo, separando-o de um que se<br />
estende atrás dele e de outro que começa depois, é uma operação que traz indeléveis<br />
marcas ideológicas e culturais que nos falam da sociedade na qual está mergulhado o<br />
próprio historiador, dos seus diálogos intertextuais, de visões de mundo, que de resto<br />
estende-se para muito além do historiador que está estabelecendo seus recortes para<br />
a compreensão da história. Os próprios desenvolvimentos da historiografia – os novos<br />
campos históricos e domínios que surgem, a emergência de novas relações<br />
interdisciplinares, os enfoques a abordagens que se sucedem como novidades ou como<br />
reapropriação de antigas metodologias – trazem obviamente uma contribuição<br />
importante para que a cada vez se veja o problema da passagem de um a outro<br />
período histórico sob novos prismas.<br />
Examinaremos sob esta perspectiva a questão da Antiguidade e de sua oscilação de<br />
fronteiras temporais em relação à Idade Média, quando se tem em vista uma<br />
periodização da história no Ocidente. Será oportuno partir da constatação de que o<br />
acontecimento fundamental que rege muito habitualmente esta fronteira – ainda que se<br />
discutindo qual o momento mais emblemático a ser considerado – é recorrentemente o<br />
fim do Império Romano, ou o fim da civilização greco-romana, para considerar o<br />
problema em uma perspectiva mais ampla.<br />
Este acontecimento – que de resto não teria maior importância para as diversas<br />
histórias possíveis de serem construídas em relação às espacialidades não europeias –<br />
busca colocar precisamente em relevo a importância do Ocidente na história do mundo.<br />
De igual maneira, aqui temos um acontecimento-demarcador que também favorece<br />
uma historiografia cristã específica, pois o mundo antigo vai cedendo lugar ao mundo<br />
medieval à medida que a Igreja Cristã vai se afirmando como força política importante,<br />
como aspecto definidor de uma nova civilização e, sobretudo, de uma nova cultura. É<br />
interessante observar, aliás, que a Antiguidade e a Idade Média são parceiras no<br />
projeto de fornecerem ao Ocidente Moderno e ao Contemporâneo dois de seus<br />
principais traços definidores de identidade: os valores greco-romanos que futuramente<br />
se tornariam uma base para a cultura burguesa, e o cristianismo, que se tornaria a<br />
religião predominante no Ocidente. Identitariamente, o Ocidente poderia ser