REVISTA 19.indd - UFBA - Direito - Universidade Federal da Bahia

O direito constitucional à moradia, no contexto dos direitos sociais e econômicos
a infl uenciar na concretização dos institutos. Primeiramente, portanto, é mister
discutir o que se entende por moradia. A expressão moradia foi inserida no artigo
6º (Capítulo II: Dos Direitos Sociais) da Constituição Federal de 1988 pela
Emenda Constitucional n.º 26/2000, que, todavia, não defi niu o alcance do termo.
Perdeu-se com isso a possibilidade de uma interpretação autêntica – ou seja, aquela
constante do próprio texto legal – restando recorrer a outros métodos interpretativos
1 . Combinando-se, então, a interpretação gramatical com a função semântica
da linguagem, tome-se o sentido denotativo da palavra, qual seja: “Moradia. S.f.
1. Morada. (...) Lugar onde se mora ou habita; habitação. 2. V. casa. 3. Estada ou
lugar de estada habitual.” 2
O que o Direito entende por moradia (do latim morari, isto é: demorar,
fi car 3 )? Em linhas gerais, a “casa” de que trata o verbete acima pode não se
confi gurar apenas na construção ou prédio térreo convencional, mas sim no
local de habitação do indivíduo, que pode ser um apartamento, uma barraca
junto à praia em que resida o pescador ou um trailler que abrigue uma família
circense... Não é o mesmo que falar em um direito à casa própria, mas, sim, a
um local que sirva de abrigo e residência, salvaguardada a dignidade da pessoa
humana 4 , princípio maior na Constituição Federal de 1988, mostrando-se impertinente
aqui, por desnecessária, a distinção técnica entre residência e domicílio,
nos termos civis 5 .
A evolução discursiva e axiológica da Constituição, no sentido da inclusão
deste direito passa, contudo, por uma questão histórica que transcende a só discussão
lingüística, para abranger a evolução do próprio desenho estatal que se
deseja empreender no texto constitucional, como se passa a analisar.
1. Para uma melhor compreensão dos métodos hermenêuticos, sugere-se aqui, em especial, a lição de FERRAZ
JÚNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito: Técnica, Decisão, Dominação. 2.ed. São Paulo:
Atlas, 1994, p. 286-293. Nesta mesma obra, o autor destaca a função simbólica da língua, às p. 257-260.
2. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, [s.d.],
p. 944.
3. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18.ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p.
317.
4. AZEVEDO, Álvaro Villaça de. Bem de Família. 5.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 109-110.
Ver também SILVA, José Afonso da. ob. cit., p. 317.
5. Uma vez que, no uso corrente, pouca distinção se faz em relação às expressões, no que tange ao intuito
de moradia, conforme se verifi ca em FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. ob. cit., p. 1223, a saber:
"Domicílio. S.m. 1. Casa de residência; habitação fi xa. 2. Jur. Lugar onde alguém reside com ânimo de
permanecer. (...)", p.488; e "Residência. S.f. 1. Morada habitual em lugar certo; domicílio. 2. Casa ou lugar
onde se reside ou habita; domicílio. 3. V. casa. (...)".
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