Espumas Flutuantes Castro Alves
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Mas não trazia o dia! Os homens pasmos Esqueciam no horror dessas ruínas Suas paixões: E as<br />
almas conglobadas Gelavam-se num grito de egoísmo Que demandava "luz". Junto às fogueiras<br />
Abrigavam-se... e os tronos e os palácios, Os palácios dos reis, o albergue e a choça Ardiam por<br />
fanais. Tinham nas chamas As cidades morrido. Em torno às brasas Dos seus lares os homens se<br />
grupavam, P'ra à vez extrema se fitarem juntos. Feliz de quem vivia junto às lavas Dos vulcões<br />
sob a tocha alcantilada!<br />
Hórrida esp'rança acalentava o mundo! As florestas ardiam!... de hora em hora Caindo se<br />
apagavam; creditando, Lascado o tronco desabava em cinzas. E tudo... tudo as trevas envolviam.<br />
As frontes ao clarão da luz doente<br />
Tinham do inferno o aspecto... quando às vezes As faíscas das chamas borrifavam-nas. Uns, de<br />
bruços no chão, tapando os olhos<br />
Choravam. Sobre as mãos cruzadas — outros — Firmando a barba, desvairados riam. Outros<br />
correndo à toa procuravam<br />
O ardente pasto p'ra funéreas piras. Inquietos, no esgar do desvario, Os olhos levantavam p'ra o<br />
céu torvo,<br />
Vasto sudário do universo - — espectro —, E após em terra se atirando em raivas, Rangendo os<br />
dentes, blásfemos, uivavam!<br />
Lúgubre grito os pássaros selvagens Soltavam, revoando espavoridos Num voo tonto co'as inúteis<br />
asas! As feras 'stavam mansas e medrosas! As víboras rojando s'enroscavam Pelos membros dos<br />
homens, sibilantes,<br />
Mas sem veneno . . . a fome Ihes matavam! E a guerra, que um momento s'extinguira, De novo se<br />
fartava. Só com sangue<br />
Comprava-se o alimento, e após à parte Cada um se sentava taciturno, P'ra fartar-se nas trevas<br />
infinitas! Já não havia amor!... O mundo inteiro Era um só pensamento, e o pensamento Era a<br />
morte sem glória e sem detença! O estertor da fome apascentava-se<br />
Nas entranhas... Ossada ou carne pútrida Ressupino, insepulto era o cadáver.<br />
Mordiam-se entre si os moribundos: Mesmo os cães se atiravam sobre os donos, Todos exceto um<br />
só... que defendia O cadáver do seu, contra os ataques Dos pássaros, das feras e dos homens, Até<br />
que a fome os extinguisse, ou fossem Os dentes frouxos saciar algures! Ele mesmo alimento não<br />
buscava...<br />
Mas, gemendo num uivo longo e triste, Morreu lambendo a mão, que inanimada Já não podia lhe<br />
pagar o afeto.<br />
Faminta a multidão morrera aos poucos. Escaparam dous homens tão-somente De uma grande<br />
cidade. E se odiavam. . . .<br />
Foi junto dos lições quase apagados De um altar, sobre o qual se amontoaram Sacros objetos p'ra<br />
um profano uso,<br />
Que encontraram-se os dous... e, as cinzas mornas Reunindo nas mãos frias de espectros,<br />
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