A Normalista Adolfo Caminha - PSB
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“Segue amanhã, pela manhã, com destino a Baturité, a fim de visitar a importante<br />
fábrica Proença, O Exmo. Sr. Presidente da Província. Acompanham o ilustre amigo do<br />
Ceará os nossos distintos amigos e correligionários Srs. Dr. José de Souza Nunes e José<br />
Pereira nosso colega de redação. S. Excia. pretende demorar-se alguns dias naquela<br />
cidade”.<br />
Maria do Carmo leu com surpresa a notícia da Província e não pode conter um<br />
gesto de despeito. Era desse modo que o Sr. Zuza estava doido por ela! Ir-se embora sem ao<br />
menos lhe comunicar! Nem sequer deixava um bilhetinho, um cartão com duas palavras,<br />
duas somente! Que custava escrever num pedaço de papel ⎯ Vou e volto ?<br />
Zangara-se deveras, atirando a folha para um lado, trombuda, furiosa.<br />
Estava tudo acabado, não falaria mais no Zuza, não lhe escrevia; que fosse bugiar!<br />
Moças havia muitas no Ceará: que procurasse uma lá a seu jeito e ela por sua vez trataria de<br />
arranjar noivo, mas noivo para casar, noivo sério, noivo de bem!<br />
Entretanto, Maria não tinha feito reparo na despedida do Zuza, um soneto<br />
endecassílabo, com sílabas de mais num versos e de menos noutros. Adeus ⎯ era o título e<br />
vinha na terceira página da Província. Depois é que viu, porque a Lídia mostrou-lhe.<br />
⎯ Já estavas fazendo mau juízo do rapaz, hein? disse a Campelinho.<br />
⎯ Certamente, confirmou Maria. Nem ao menos teve a lembrança de me avisar!<br />
⎯ Como querias tu que ele avisasse se ainda não lhe respondeste a carta?<br />
Maria esteve pensando com o jornal na mão, lendo e relendo os versos, e, meio<br />
arrufada, meio risonha:<br />
⎯ Embora! O dever dele era me participar. O homem é que faz tudo...<br />
E na manhã seguinte, muito cedo, pulou da rede e foi no bico dos pés, embrulhada<br />
no lençol, ver passar o trem através da vidraça.<br />
A locomotiva disparou numa rapidez crescente, soltando rolos de fumo e fagulhas<br />
que pareciam uma irrisão aos olhos da normalista. A sineta, num badalar contínuo,<br />
acordava os moradores do Trilho, àquela hora, ainda nos lençóis.<br />
Maria viu passar a enfiada de vagões estralejando sobre os trilhos e esteve muito<br />
tempo em pé ouvindo sino longínquo da locomotiva, que ia, como uma coisa doida, sertão<br />
a dentro! Começou então a sentir-se só, teve vontade de abrir num choro histérico como si<br />
lhe houvessem feito uma grande injustiça. Voltou para a tepidez do seu quarto e lá deixou-