Graciliano ramos - vidas secas (livro completo)
Graciliano ramos - vidas secas (livro completo)
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E essa categoria, ele a conquistou com as "<strong>vidas</strong> <strong>secas</strong>" que<br />
povoam o seu mundo romanesco. Este mundo romanesco é um mundo<br />
sem amor. A sua concepção da vida está toda limitada, de um<br />
lado pelos instintos humanos, do outro por um destino cego e<br />
fatalista. Mas não esqueço o que essa visão do mundo<br />
significa de sofrimento e de tormentos íntimos na figura do<br />
seu criador. Por isso a circunstância de aceitar-se ou não<br />
toda a concepção da vida, que ressalta dos romances do Sr.<br />
<strong>Graciliano</strong> Ramos, não deve impedir ninguém de admirar o<br />
artista que a sustenta; o artista que transforma este mundo<br />
árido e sombrio numa verdadeira categoria de arte. Além<br />
disso, quem sabe, estes romances podem constituir mais do que<br />
uma obra de arte, isto é: a libertação de um homem que se<br />
evade de um mundo que detesta, embora carregando o destino de<br />
somente criar mundos semelhantes. E aqui está uma lição: a<br />
de que nem sempre a imaginação dispõe de recursos para<br />
dominar a vida real .<br />
Outubro de .<br />
( Com as suas idéias e a sua experiência de hoje, este<br />
Autor não mais aí escreveria "nem sempre". Escreveria<br />
"nunca").<br />
- As "memórias" do romancista explicam a natureza e a<br />
espécie dos seus romances Sim, um mundo sem amor e sem<br />
alegria, o da ficção do SF. <strong>Graciliano</strong> Ramos. Aparece nos<br />
seus romances toda uma galeria de personagens egoístas,<br />
cruéis, insensíveis. Paulo Honório, em S. Bernardo, erguese<br />
como um símbolo, marcado pelo ciúme, pela maldade, pelo<br />
egoísmo, pelo temperamento áspero e solitário. Os seres deste<br />
mundo de ficção em quatro romances - um dos mais<br />
impressionantes, sobretudo pela construção literária e pelo<br />
senso artístico, em toda a literatura brasileira - são em<br />
geral desgraçados, criaturas em desencontro com o destino,<br />
humilhadas e destroçadas. Não encontram sentido para a<br />
vida, não se associam nem se solidarizam em movimentos de<br />
ascensão; carregam, com a ausência de fé, um tamanho poder de<br />
negação que só encontra correspondência numa espécie de<br />
niilismo moral, num desejo secreto de aniquilamento e<br />
destruição. O ambiente que os envolve tem qualquer coisa de,<br />
deserto ou de casa fechada e fria. Nenhuma salvação, nenhum<br />
socorro virá do exterior. Os personagens estão entregues aos<br />
seus próprios destinos. E não contam sequer com a piedade do<br />
romancista. O Sr. <strong>Graciliano</strong> Ramos movimenta as suas figuras<br />
humanas com uma tamanha impassibilidade que logo indica o<br />
desencanto e a indiferença com que olha para a humanidade.<br />
Que me lembre, só a um dos seus personagens ele trata com<br />
verdadeira simpatia, e este não é gente, mas um cachorro, em<br />
Vidas Secas. Contudo, a piedade que não lhes concede