geraldo sarno - Instituto Moreira Salles
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um pedófilo que inicia com ele um jogo de sedução em um bar. Joe executa uma<br />
dança bem coreografada, simbolizando talvez suas defesas últimas para lidar com<br />
aquela situação extrema. (Em diversos momentos, Bertolucci lança mão do nonsense<br />
para quebrar momentos de grande tensão, quase insuportáveis. A figura paterna falida<br />
aparece de surpresa na figura de um médico. Este aparece para atender Joe em<br />
crise grave de abstinência da droga. Caterina está desesperada. Espera-se o médico<br />
clássico, paternal, que trará segurança e orientação, aliviando o medo e a incerteza.<br />
Em vez disso o episódio termina com o médico dizendo que Caterina não lhe deve<br />
nada, ao invés disso, retira do bolso uma máquina Polaroid e fotografa a deusa-diva<br />
Caterina. O masculino novamente se submete à grande deusa.<br />
A única figura masculina preservada em toda a trama é o antigo professor de canto<br />
de Caterina. Quando esta o visita, recolhido em sua aposentadoria e velhice, ainda<br />
mostra uma vitalidade de forma mágica. O professor aparece em mítica viagem de<br />
Caterina ao seu passado, onde também visita a casa de Verdi. O Mestre de canto e<br />
Verdi dominam como foco de interesse de Caterina, que reage com grande agressividade<br />
narcísica quando Joe diz não se interessar por aqueles valores simbolizados pela<br />
casa onde Verdi morou.<br />
As roupas e os sapatos<br />
Bertolucci joga com o simbolismo das roupas para expressar questões identitárias e<br />
psicológicas. Quando Caterina parte em busca de Mustafá, o traficante, para tentar<br />
afastá-lo de Joe usa as roupas do filho tentando uma aproximação. Há ai uma confusão<br />
de papéis. As roupas expressam os papéis sociais, a persona. Em situação incestuosa,<br />
mãe e filho estão com papéis misturados. Caterina é incapaz de exercer um papel<br />
de mãe organizadora e doadora de afeto para seu filho, mas antes se mistura com ele,<br />
incapaz de estabelecer limites no espaço incestuoso.<br />
O simbolismo das roupas reaparece na busca do pai. Revelado a Joe seu pai verdadeiro,<br />
ele parte em busca do referencial paterno. Ao encontrá-lo em seu trabalho como<br />
arte-terapeuta de crianças, há uma simbólica troca de sapatos. Joe calça os sapatos do<br />
pai, este é obrigado a calçar os sapatos de Joe. Quando Joe o segue em direção à sua<br />
casa, as roupas de Joe são iguais às de seu pai, paletó e calças idênticos e de mesma<br />
cor. Joe imita o caminhar e gestos do pai. Chegando à casa de Giuseppe, há a troca<br />
simbólica de sapatos. Embora, de imediato o rapaz não seja aceito – novamente a influência<br />
negativa da mãe de Giuseppe que pressiona para que Joe não tenha entrada<br />
na casa – há um ritual simbólico de troca de sapatos, troca de energia, um processo de<br />
assimilação da energia do pai. As roupas simbolizam uma nova atitude para o mundo,<br />
o social que só a figura paterna é capaz de plasmar no filho. Os sapatos têm também<br />
simbolismo específico, são fálicos, e associados a uma inserção no mundo, pois eles<br />
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