FISIOLOGIA RESPIRATÃRIA David Ferez Prof Adjunto da ... - Unifesp
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<strong>FISIOLOGIA</strong> RESPIRATÓRIA<br />
<strong>David</strong> <strong>Ferez</strong><br />
<strong>Prof</strong> <strong>Adjunto</strong> <strong>da</strong> Disciplina de Anestesiologia, Dor e Terapia<br />
Intensiva <strong>da</strong> Escola Paulista de Medicina-UNIFESP.<br />
1. Estrutura e função<br />
2. Ventilação pulmonar<br />
3. Difusão dos gases<br />
4. Perfusão pulmonar<br />
5. Relação ventilação-perfusão<br />
6. Transporte de gases<br />
7. Controle <strong>da</strong> ventilação pulmonar<br />
8. Literatura consulta<strong>da</strong><br />
1. Estrutura e função pulmonar<br />
Os pulmões, direito e esquerdo, têm forma grosseiramente<br />
cônica com um ápice, uma base e três lados. Seu peso depende <strong>da</strong><br />
quanti<strong>da</strong>de de líquido presente, em média pesa 900 gramas na<br />
mulher e 1100 gramas no homem. O pulmão direito é ligeiramente<br />
maior que o esquerdo e é responsável por 55% <strong>da</strong> função pulmonar<br />
total.<br />
O pulmão direito apresenta três lobos (superior, médio e<br />
inferior) enquanto o pulmão esquerdo apresenta apenas dois<br />
1
(superior e inferior). Contudo, existe correspondência do lobo médio<br />
direito com a região do esquerdo chama<strong>da</strong> língula (figura 01).<br />
Figura - 01 Lobos pulmonares. Superior, médio e inferior à<br />
direita e superior e inferior à esquer<strong>da</strong>.<br />
Na cavi<strong>da</strong>de torácica a pleura visceral é uma fina membrana<br />
de tecido conjuntivo-elástico que envolve os pulmões e suas<br />
reentrâncias de forma independente. A pleura parietal reveste to<strong>da</strong><br />
a cavi<strong>da</strong>de torácica em sua face interna. Em condições normais<br />
uma quanti<strong>da</strong>de mínima de líquido, menos de 10 mililitros, está<br />
presente entre estas duas membranas. Este líquido é conhecido<br />
como líquido pleural.<br />
O líquido pleural é um ultrafiltrado do plasma, secretado por<br />
linfáticos <strong>da</strong> pleura parietal e absorvido por linfáticos <strong>da</strong> pleural<br />
2
visceral. A função principal do líquido pleural é lubrificar as<br />
superfícies do pulmão durante seu deslocamento nas fases<br />
inspiratória e expiratória (figura 02).<br />
Figura - 02 Pleuras parietal e visceral e suas reflexões.<br />
Apesar dos pulmões possuírem várias funções como a<br />
metabólica, endócrina etc, o seu principal papel é permitir que as<br />
trocas gasosas se realizem entre o ar do ambiente e o sangue. Para<br />
que este fenômeno ocorra com eficiência, este órgão teve que<br />
a<strong>da</strong>ptar sua estrutura a esta função.<br />
A quanti<strong>da</strong>de do deslocamento de um gás de uma região para<br />
outra através de uma membrana, depende de algumas variáveis. As<br />
mais importantes são a área <strong>da</strong> membrana e sua espessura.<br />
Portanto, é de se esperar que o pulmão possua uma superfície de<br />
3
troca eleva<strong>da</strong> e uma membrana muito fina. A área de troca de<br />
gases do pulmão, área alveolar, é aproxima<strong>da</strong>mente de 50 a 100<br />
metros quadrados e a espessura <strong>da</strong> membrana entre o alvéolo e o<br />
capilar, membrana alvéolo-capilar, é de 0,5 micrometro. Adequa<strong>da</strong><br />
à função <strong>da</strong>s trocas gasosa.<br />
Ca<strong>da</strong> pulmão contém aproxima<strong>da</strong>mente 300.000.000 de<br />
alvéolos os quais são os responsáveis primários pelas trocas<br />
gasosas. Os alvéolos são estruturas poligonais que grosseiramente<br />
podem ser representados como esféricos e apresentam diâmetro de<br />
0,3 milímetros.<br />
Chama a atenção o fato do pulmão conseguir manter uma<br />
superfície de troca tão extensa em um volume de apenas 4 litros <strong>da</strong><br />
cavi<strong>da</strong>de torácica. Isto se torna possível pelo sistema de dicotomia<br />
que o sistema respiratório apresenta.<br />
A traqueia é uma estrutura forma<strong>da</strong> por anéis cartilaginosos<br />
incompletos em forma de “U”. Na sua parte livre a cartilagem é<br />
substituí<strong>da</strong> por músculo liso. Seu epitélio é do tipo cilíndrico ciliado<br />
com inúmeras glândulas na submucosa e vasos (figura 03).<br />
4
“U”.<br />
Figura - 03 Estruturas que compõe a traqueia e sua forma de<br />
A traqueia se divide nos brônquios fontes principais direito e<br />
esquerdo. O brônquio principal direito é mais curto com apenas 2,5<br />
centímetros e de calibre mais grosso quando comparado com o<br />
brônquio fonte esquerdo, praticamente é uma continuação <strong>da</strong><br />
traqueia. O brônquio principal esquerdo é mais longo (5<br />
centímetros) e estreito, apresenta um ângulo mais agudo com a<br />
traqueia (figura 04).<br />
5
lobares.<br />
Figura - 04 Divisões <strong>da</strong> traqueia, brônquios principais e<br />
Os brônquios fontes principais direito e esquerdo se dividem<br />
em brônquios lobares e estes em segmentares. A dicotomia<br />
irregular se segue em 23 gerações até os alvéolos.<br />
Após os bronquíolos terminais (16 a geração) seguem-se os<br />
bronquíolos respiratórios (17 a geração) de onde saem <strong>da</strong> parede<br />
raros sacos alveolares. Seguindo os bronquíolos respiratórios<br />
nascem os ductos alveolares (20 a geração) que são ductos cujas<br />
paredes são constituí<strong>da</strong>s de sacos alveolares e, finalmente, tem-se<br />
a origem dos sacos alveolares (23 a geração) (figura 05).<br />
6
...).<br />
Figura - 05 Sistema de dicotomização <strong>da</strong> traqueia (Z0-Z1-Z2-<br />
BR - Brônquios<br />
BL - Brônquios Lobares<br />
BLT - Bronquíolos Terminais<br />
BLT - Bronquíolos Respiratórios<br />
DA - Ductos Alveolares<br />
SA - Sacos Alveolares<br />
7
Quando se avança <strong>da</strong> estrutura traqueal até os alvéolos,<br />
observa-se a per<strong>da</strong> gradual <strong>da</strong>s cartilagens, glândulas secretoras e<br />
do epitélio cilíndrico ciliar. No bronquíolo terminal não se observa<br />
cartilagem em sua parede.<br />
Não se observa a existência de sacos alveolares <strong>da</strong> traqueia<br />
até os bronquíolos terminais, esta região apresenta somente a<br />
função condutora, pois não apresenta função respiratória mas<br />
somente a de condução dos gases. Esta região é denomina<strong>da</strong> de<br />
espaço morto anatômico e seu volume encerra 150 mililitros.<br />
Após o espaço morto anatômico passa-se para a região<br />
responsável pelas trocas gasosas, a zona respiratória. O volume <strong>da</strong><br />
zona respiratória corresponde a 2500 mililitros.<br />
Deve-se destacar que o fluxo de gás ocorre até os<br />
bronquíolos terminais. Após este ponto a transferência de gás é<br />
realiza<strong>da</strong> por difusão uma vez que, a somatória de to<strong>da</strong> a área de<br />
secção transversal dos bronquíolos respiratório se eleva de forma<br />
impressionante, diminuindo a resistência ao fluxo aéreo próximo a<br />
ZERO (figura 06).<br />
8
Figura - 06 Gerações <strong>da</strong>s vias aéreas, zona condutora e<br />
respiratória.<br />
A inervação pulmonar é autonômica e se faz pelos ramos do<br />
nervo vago e simpático torácico que formam plexos anteriores e<br />
posteriores ao hilo pulmonar de onde inervam seus vasos e<br />
brônquios.<br />
A irrigação pulmonar apresenta dois sistemas circulatórios<br />
diferentes. A mais importante, a circulação pulmonar, realiza<strong>da</strong> pela<br />
artéria pulmonar, participa <strong>da</strong>s trocas gasosas e supre os<br />
bronquíolos respiratórios, ductos alveolares e sacos alveolares. O<br />
outro sistema circulatório, a circulação brônquica, realiza<strong>da</strong> pela<br />
9
artéria brônquica, supre to<strong>da</strong> a árvore traqueal até os bronquíolos<br />
terminais e os linfonodos.<br />
A artéria pulmonar acompanha o sistema de divisão <strong>da</strong> árvore<br />
traqueal, que na região <strong>da</strong>s trocas alveolares se multiplica em<br />
dezenas de capilares. Estes capilares envolvem, como uma rede,<br />
os sacos alveolares. Apresentam diâmetro aproximado de 8<br />
micrômetros e um comprimento de 10 micrômetros. A área de seu<br />
leito é aproxima<strong>da</strong>mente igual a <strong>da</strong> área alveolar (70 a 100 metros<br />
quadrado). O total do volume do sangue capilar é de apenas 140<br />
mililitros. A circulação pulmonar é considera<strong>da</strong> um sistema de<br />
eleva<strong>da</strong> complacência e baixa resistência.<br />
As vênulas se reúnem após os capilares e, no sentido inverso,<br />
vão se agrupando até emergirem de ca<strong>da</strong> pulmão duas grandes<br />
veias que adentram pelo átrio esquerdo.<br />
As artérias brônquicas são dois pequenos vasos que se<br />
originam <strong>da</strong> aorta e acompanham os brônquios. A drenagem<br />
venosa deste sangue é realiza<strong>da</strong> principalmente para o sistema<br />
venoso pulmonar, veias ázigos e hemiázigos.<br />
O alvéolo pulmonar é constituído basicamente de dois tipos<br />
de células: o pneumócitos tipo-1 cuja função é a de revestimento,<br />
sendo uma célula muito delga<strong>da</strong> e o pneumócito tipo-2 que é uma<br />
célula mais robusta, com corpos lamelares em seu interior e sua<br />
função principal é a de secretar surfactante pulmonar (figura 07).<br />
A estrutura conheci<strong>da</strong> como membrana alvéolo-capilar é<br />
constituí<strong>da</strong> apenas pelo epitélio alveolar (pneumócito tipo-1) e<br />
endotélio capilar (figura 07).<br />
10
tipo2.<br />
Figura - 07 Estrutura alveolar, pneumócito tipo1 e pneumócito<br />
2. Ventilação pulmonar<br />
O movimento de líquidos e fluídos é governado pela lei de<br />
Poiseuille. Portanto, para que exista um fluxo <strong>da</strong> atmosfera até os<br />
alvéolos é necessário que ocorra uma diferença de pressão entre a<br />
atmosfera e o alvéolo na fase inspiratória ,na fase expiratória ocorre<br />
o inverso.<br />
11
Φ<br />
=<br />
ΔP.π .r<br />
η.L .8<br />
4<br />
Figura - 08 Lei de Poiseuille.<br />
Φ - fluxo.<br />
ΔP - variação <strong>da</strong> pressão entre as extremi<strong>da</strong>des.<br />
π - 3,14.<br />
r - raio do tubo<br />
η - viscosi<strong>da</strong>de do gás.<br />
L - comprimento do tubo.<br />
Na posição de repouso do complexo toraco-pulmonar<br />
observa-se pressão interpleural negativa. Isto se deve ao gradeado<br />
costal que exerce uma força de expansão e ao pulmão que, ao<br />
contrário, imprime uma força para se retrair.<br />
12
Figura - 09 Forças elásticas opostas do gradeado costal e<br />
pulmão durante o repouso no volume <strong>da</strong> capaci<strong>da</strong>de residual<br />
funcional.<br />
Como se pode deduzir a pressão interpleural é, nas condição<br />
normais sempre será negativa.<br />
Durante a fase inspiratória existe um aumento dos diâmetros<br />
<strong>da</strong> cavi<strong>da</strong>de torácica como os: laterolateral, craniocau<strong>da</strong>l e<br />
anteroposterior (figura 10).<br />
13
Figura -10 Aumento dos diâmetros torácicos<br />
Estes aumentos nos diâmetros ocorrem às custas de<br />
contração muscular como: diafragma, intercostais externos e<br />
intercartilaginosos paraesternais.. Nesta fase a pressão interpleural<br />
torna-se ain<strong>da</strong> mais negativa.<br />
A fase expiratória é realiza<strong>da</strong> pelo relaxamento muscular e<br />
recolhimento elástico passivo pulmonar. Nesta etapa a pressão<br />
interpleural torna-se menos negativa. A pressão interpleural é<br />
parcialmente transmiti<strong>da</strong> aos alvéolos.<br />
A pressão atmosférica é convenciona<strong>da</strong> como ZERO. Na fase<br />
inspiratória a pressão alveolar torna-se negativa (abaixo de zero).<br />
Na etapa expiratória, ao contrário, a pressão alveolar fica acima de<br />
zero (positiva). Esta mu<strong>da</strong>nça nas pressões alveolares gera o fluxo<br />
inspiratório e expiratório do pulmão em conformi<strong>da</strong>de com a lei de<br />
Poiseuille.<br />
14
A pressão transmural é defini<strong>da</strong> como a diferença entre a<br />
pressão interpleural e a alveolar e dela depende a distensão dos<br />
alvéolos durante a inspiração (figuras 11 e 12).<br />
Figura - 11 Analogia com o complexo toraco-pulmonar com<br />
uma bexiga inseri<strong>da</strong> em um frasco e sua curva de complacência.<br />
15
Figura - 12 Curvas <strong>da</strong> pressão interpleural, fluxo, volume e<br />
pressão alveolar.<br />
Como já foi visto, a distensão dos alvéolos depende <strong>da</strong><br />
pressão transmural. Os alvéolos centrais, distantes <strong>da</strong> cavi<strong>da</strong>de<br />
pleural, são igualmente distendidos devido a arquitetura entre os<br />
alvéolos que favorece a transmissão <strong>da</strong>s forças até aquelas regiões<br />
(figura 13).<br />
16
Figura 13 -Interdependência alveolar.<br />
Tabela - 1 Musculatura respiratória<br />
músculos inspiratórios<br />
músculos expiratórios<br />
principais acessórios principais acessórios<br />
intercostais esternocleidomastoideo passiva intercostais<br />
externos<br />
Intercartilagilagin<br />
osos<br />
paraesternais<br />
Diafragma<br />
escalenos:<br />
anterior<br />
médio<br />
posterior<br />
internos<br />
abdominais:<br />
reto<br />
oblíquos<br />
transverso<br />
A compreensão <strong>da</strong> relação entre as mu<strong>da</strong>nças de pressão<br />
transpulmonar e o volume pulmonar, que resulta na curva de<br />
17
complacência pulmonar, é de importância capital, pois estabelece<br />
algumas características <strong>da</strong> inflação pulmonar (figura 14).<br />
Figura -14 Curva de complacência.<br />
A complacência toraco-pulmonar é defini<strong>da</strong> como a relação<br />
entre variação de volume e a pressão necessária para promover<br />
aquela mu<strong>da</strong>nça.<br />
Como se observa, a curva de complacência toraco-pulmonar<br />
durante a inflação pulmonar não é a mesma que a durante a fase<br />
de deflação. Este fenômeno é conhecido como histerese pulmonar.<br />
Deve-se entender que a complacência toraco-pulmonar é a<br />
somatória <strong>da</strong> curva de complacência pulmonar e a curva de<br />
complacência do gradeado costal (figura 15).<br />
18
Figura - 15 Curva de complacência torácica e pulmonar.<br />
A complacência pulmonar torna-se reduzi<strong>da</strong> quando o pulmão<br />
apresenta-se edemaciado, com fibrose ou nas doenças de depósito<br />
alveolar. Nestas situações para uma mesma variação de volume é<br />
necessária uma grande variação de pressão.<br />
Cabe ressaltar a diferença existente entre os conceitos de<br />
complacência estática e dinâmica.<br />
A complacência estática envolve a relação entre o volume e a<br />
pressão em um determinado ponto estático <strong>da</strong> curva. Não leva em<br />
consideração a resistência ao fluxo de gases. Na complacência<br />
dinâmica, como é obti<strong>da</strong> de forma progressiva durante a fase de<br />
insuflação pulmonar, a resistência ao fluxo inspiratório eleva a<br />
pressão obti<strong>da</strong> (figura 16).<br />
19
Figura - 16 Avaliação <strong>da</strong> complacência estática e dinâmica.<br />
Os asmáticos apresentam complacência dinâmica reduzi<strong>da</strong>,<br />
entretanto sua complacência estática é próxima ao normal uma vez<br />
que, a eleva<strong>da</strong> pressão traqueal é secundária à resistência ao fluxo<br />
de gases inspiratório.<br />
Outro fator de importância e que influência a curva volume e<br />
pressão é o fenômeno <strong>da</strong> tensão superficial.<br />
Sempre que existir a interface entre um líquido e um gás<br />
existirá uma tendência <strong>da</strong>s moléculas superficiais se manterem<br />
mais coesas uma vez que, não há moléculas na fase gasosa para<br />
atrai-las.<br />
Esta força de atração entre as moléculas superficiais de uma<br />
interface líquido-gás é conheci<strong>da</strong> como tensão superficial. A tensão<br />
20
superficial induz as moléculas a manterem a menor área possível<br />
de contato com a região gasosa. Quando este conceito é aplicado,<br />
por exemplo, a uma bolha de sabão, observa-se que rapi<strong>da</strong>mente<br />
ela adquire a forma de uma esfera. A esfera é a figura geométrica<br />
de menor área por uni<strong>da</strong>de de volume, portanto é a menor área de<br />
contato entre o ar interior e o seu revestimento líquido.<br />
A pressão necessária para manter esta bolha insufla<strong>da</strong>,<br />
opondo-se à tensão superficial, é subordina<strong>da</strong> pela lei de Lapace<br />
(figura 17).<br />
Figura -17 Relação <strong>da</strong> tensão superficial com o raio <strong>da</strong> esfera<br />
(Lei de Laplace).<br />
Devido à lei de Laplace é de se esperar que pequenas bolhas<br />
descarreguem todo o seu conteúdo nas bolhas maiores uma vez<br />
21
que, o raio <strong>da</strong> esfera menor imprime uma grande pressão interna,<br />
muito maior que a <strong>da</strong> bolha de maior raio.<br />
Esta analogia aplica<strong>da</strong> aos alvéolos pulmonares, permite o<br />
raciocínio de que isto também poderia ocorrer nos pulmões. Os<br />
alvéolos menores evacuariam seu conteúdo aéreo nos alvéolos<br />
maiores. Contrariamente, os alvéolos menores são extremamente<br />
estáveis.<br />
A estabili<strong>da</strong>de destes alvéolos repousa na presença <strong>da</strong><br />
surfactante pulmonar, substância secreta<strong>da</strong> pelos pneumócitos tipo-<br />
2 que permite esta convivência estável entre alvéolos de raios<br />
diferentes. A surfactante pulmonar diminuí acentua<strong>da</strong>mente a<br />
tensão superficial dos alvéolos com raios menores em comparação<br />
com os alvéolos de raios maiores.<br />
A natureza exata <strong>da</strong> surfactante pulmonar é ain<strong>da</strong><br />
desconheci<strong>da</strong>. Contudo, a dipalmitoil-lecitina é um dos seus<br />
principais componentes. Os efeitos deste material sobre a tensão<br />
superficial são impressionantes. Ao se estu<strong>da</strong>r o comportamento<br />
desta substância em relação à área <strong>da</strong> superfície observa-se um<br />
fenômeno muito interessante.<br />
Induzindo-se a variação <strong>da</strong> área de superfície e observando a<br />
tensão superficial, verifica-se que a tensão superficial <strong>da</strong> água é<br />
constante. Quando se adiciona detergente existe diminuição <strong>da</strong><br />
tensão superficial, mas mantém-se constante. Contrariamente, a<br />
surfactante pulmonar apresenta um comportamento diferente.<br />
Quando a superfície é grande a tensão superficial é eleva<strong>da</strong> e<br />
quando a superfície é pequena a tensão superficial é menor.<br />
Portanto, nos alvéolos maiores, com maior superfície, a surfactante<br />
22
seria menos efetiva na diminuição <strong>da</strong> tensão superficial. Nos<br />
alvéolos menores, com menor superfície, a surfactante seria mais<br />
efetiva. O fenômeno serviria para promover a estabilização dos<br />
alvéolos menores sobre os maiores (figura 18).<br />
Figura -18 O gráfico demonstra a relação <strong>da</strong> tensão<br />
superficial em relação à área. Para superfícies pequenas a tensão<br />
superficial é mínima, demonstrando uma eleva<strong>da</strong> eficiência <strong>da</strong><br />
surfactante pulmonar em diminuir a tensão superficial. Nas áreas<br />
maiores a tensão superficial se eleva denotando uma menor<br />
eficiência <strong>da</strong> surfactante.<br />
A própria arquitetura pulmonar também pode ser<br />
responsabiliza<strong>da</strong>, em parte, pela manutenção <strong>da</strong> estabili<strong>da</strong>de<br />
alveolar, pois sempre que um alvéolo tende a entrar em colapso, é<br />
contraposto pelos alvéolos vicinais. Contrariamente, na insuflação<br />
em excesso de um alvéolo, seus semelhantes vizinhos se opõem a<br />
esta distensão.<br />
23
Figura -19 A arquitetura pulmonar contribuí para a<br />
estabilização dos alvéolos.<br />
As bases pulmonares recebem a maior parte do gás inspirado<br />
na posição ereta. Existe uma maior captação deste elemento nas<br />
bases, diminuindo à medi<strong>da</strong> que nos aproximamos do ápice<br />
pulmonar (figura 20).<br />
24
Figura - 20 A ventilação pulmonar se faz principalmente para<br />
a base pulmonar.<br />
Este achado repousa no fato <strong>da</strong> base pulmonar apresentar<br />
pressão interpleural menos negativa do que no ápice pulmonar. Isto<br />
é secundário principalmente pelo peso pulmonar. Qualquer objeto<br />
na posição supina requer maior pressão nas bases.<br />
Outro ponto que reflete o fenômeno <strong>da</strong>s bases pulmonares<br />
serem mais ventila<strong>da</strong>s que os ápices e a curva de complacência<br />
alveolar. Como já foi exposta, a curva referi<strong>da</strong> é de forma sigmóide.<br />
Como a pressão interpleural é menos negativa nas bases, pois<br />
sofre grande influência do peso pulmonar, faz com que os alvéolos<br />
aí situados durante o repouso tenham um volume pequeno.<br />
Contudo, durante a inspiração, pequenas variações de pressão<br />
interpleural ocasiona grandes variações de volume alveolar, pois<br />
encontram-se na região ótima <strong>da</strong> curva de complacência.<br />
Como a pressão interpleural é muito mais negativa nos ápices<br />
pulmonares os alvéolos aí situados, durante o repouso, têm um<br />
volume elevado. Entretanto, como se encontra na faixa ruim <strong>da</strong><br />
curva de complacência, grande variação de pressão provoca<br />
pequena variação de volume, a ventilação desta região é pobre<br />
quando compara<strong>da</strong> com as bases (figura 21).<br />
25
Figura - 21 Curva de complacência pulmonar e sua relação<br />
com as regiões pulmonares. A base pulmonar encontra-se na faixa<br />
ideal <strong>da</strong> curva. O ápice pulmonar encontra-se na região ruim <strong>da</strong><br />
curva.<br />
Nas pequenas vias aéreas, provavelmente próximas ao<br />
bronquíolo terminal, onde se perde o arcabouço de cartilagem, a<br />
diminuição <strong>da</strong> pressão negativa intratorácica na fase expiratória,<br />
associa<strong>da</strong> ao peso pulmonar, provoca sequestro de parte do<br />
volume de gás expiratório. Portanto, as regiões basais são<br />
intensamente comprimi<strong>da</strong>s e não tem todo o seu gás eliminado<br />
durante a expiração. Este volume sequestrado é conhecido como<br />
volume de fechamento <strong>da</strong>s vias aéreas.<br />
Como já discutido, o movimento de gases através <strong>da</strong> árvore<br />
traqueal é subordinado à lei de Poiseuille, entretanto, esta lei só se<br />
aplica aos fluxos laminares. Nas baixas veloci<strong>da</strong>des de fluxo aéreo,<br />
26
este se apresenta com um padrão laminar. Contrariamente, nos<br />
fluxo elevados obtém-se certa instabili<strong>da</strong>de do padrão laminar,<br />
principalmente nas regiões de bifurcações. Na presença de fluxo<br />
muito elevado ocorre completa desorganização do padrão laminar<br />
levando à turbulência (figura 22).<br />
O fluxo turbulento apresenta proprie<strong>da</strong>des diferentes do<br />
laminar, portanto não é regido mais pela lei de Poiseuille. Para um<br />
mesmo volume conduzido através de um conduto, o fluxo turbulento<br />
necessita de uma pressão muito mais eleva<strong>da</strong> que o laminar (figura<br />
23).<br />
Figura - 22 Aspecto morfológico do fluxo turbulento e laminar.<br />
27
Figura - 23 Relação entre pressão de “driving” e fluxo<br />
(turbilhonar e laminar).<br />
3. Difusão dos gases<br />
A difusão de um gás ocorre quando existe movimento <strong>da</strong>s<br />
moléculas de uma área na qual o gás exerce uma eleva<strong>da</strong> pressão<br />
parcial para outra de baixa pressão parcial.<br />
A difusão dos gases através <strong>da</strong> membrana alvéolo-capilar fica<br />
na dependência <strong>da</strong> lei de Fick. Esta lei estabelece que a veloci<strong>da</strong>de<br />
de transferência de um gás através de uma membrana permeável<br />
ao gás é proporcional à área desta membrana e ao gradiente de<br />
pressão parcial deste gás entre os lados. Estabelece também que é<br />
inversamente proporcional à espessura desta membrana (figura<br />
24).<br />
28
Figura - 24 - Fatores que determinam a difusão dos gases<br />
através de uma membrana (Lei de Fick).<br />
Vgás =<br />
A .Δ(P1−<br />
P2). Κ<br />
T<br />
Figura - 25 Lei de Fick.<br />
A - Área de superfície<br />
Δ(P1-P2) - Gradiente de pressão<br />
K - Constante<br />
T - Espessura <strong>da</strong> membrana<br />
29
A constante K <strong>da</strong> lei de Fick é estabeleci<strong>da</strong> pela lei de<br />
Grahan. Esta lei institui que a constante K é diretamente<br />
proporcional à solubili<strong>da</strong>de do gás na membrana e inversamente<br />
proporcional à raiz quadra<strong>da</strong> do peso molecular do mesmo.<br />
Κ =<br />
η<br />
2<br />
PM<br />
Figura - 26 Lei de Grahan<br />
η - Solubili<strong>da</strong>de do gás na membrana<br />
PM - Peso molecular do gás<br />
O tempo necessário para o sangue capilar passar por todo um<br />
alvéolo é de aproxima<strong>da</strong>mente de 0,75 segundos. Entretanto, em<br />
apenas 0,25 segundos (1/3 do total) já se encontra em equilíbrio<br />
com o gás alveolar.<br />
4. Perfusão pulmonar<br />
A circulação pulmonar tem seu início na artéria pulmonar que<br />
recebe sangue venoso impulsionado pelo ventrículo direito. Esta<br />
30
artéria se divide em miríades de ramificações semelhantes à via<br />
aérea. Os capilares pulmonares revestem to<strong>da</strong> a parede alveolar<br />
formando o “leito capilar”. O sangue então oxigenado é coletado<br />
pelas vênulas e conduzido às veias pulmonares, em número de<br />
quatro, ao átrio esquerdo.<br />
A circulação pulmonar, ao contrário <strong>da</strong> circulação sistêmica, é<br />
de baixa resistência e de alta complacência. As pressões são<br />
excepcionalmente baixas quando compara<strong>da</strong>s com as <strong>da</strong> circulação<br />
sistêmica. A pressão média <strong>da</strong> artéria pulmonar é de apenas 15<br />
milímetros de mercúrio sendo a pressão sistólica de 24 milímetros<br />
de mercúrio e a diastólica de 8 milímetros de mercúrio.<br />
Figura - 27 Pressões <strong>da</strong> circulação pulmonar.<br />
As baixas pressões <strong>da</strong> circulação pulmonar impõem pequeno<br />
trabalho ao ventrículo direito. O valor real <strong>da</strong> pressão capilar<br />
pulmonar é desconhecido, mas acredita-se que seja intermediário<br />
31
entre a pressão arterial e venosa <strong>da</strong> circulação pulmonar, portanto<br />
aproxima<strong>da</strong>mente de 8 milímetros de mercúrio.<br />
Devido ao regime de baixa pressão e alta complacência, a<br />
circulação pulmonar sofre grande influência <strong>da</strong> gravi<strong>da</strong>de quando<br />
compara<strong>da</strong> com a circulação sistêmica. Este padrão é, portanto,<br />
influenciado pela postura. Na posição ereta as bases são melhor<br />
perfundi<strong>da</strong>s que as regiões apicais. Na posição supina a região<br />
dorsal recebe o maior fluxo quando comparado com a ventral. Já na<br />
posição lateral, o pulmão inferior é mais perfundido do que o<br />
superior (figura28).<br />
Figura - 28 As bases pulmonares recebem a maior parte <strong>da</strong><br />
perfusão pulmonar.<br />
Os capilares pulmonares recebem pouco suporte do tecido<br />
conjuntivo e sofrem também influências <strong>da</strong> pressão alveolar. No<br />
32
ápice pulmonar a pressão interpleural muito negativa faz com que<br />
os alvéolos permaneçam muito insuflados, o que comprime os<br />
vasos justa-alveolares. O oposto ocorre nas bases, a pressão<br />
interpleural menos negativa permite que os alvéolos desta região<br />
fiquem menos insuflados e, portanto, não exercem compressão<br />
sobre os vasos justa-alveolares (figura 29).<br />
Figura - 29 Zonas de West.<br />
Outro fato importante é que, sob baixos volumes pulmonares,<br />
os vasos extra-alveolares encontram-se tortuosos e imprimem uma<br />
resistência vascular mais eleva<strong>da</strong>. À medi<strong>da</strong> que aumenta o volume<br />
pulmonar, os vasos retificam-se e a resistência vascular diminui.<br />
Contudo, com volumes pulmonares ain<strong>da</strong> maiores a pressão intra-<br />
33
alveolar eleva-se, induzindo ao colapso dos capilares justaalveolares.<br />
Nestas condições existe uma maior resistência vascular<br />
pulmonar.<br />
Estes fenômenos são os responsáveis pela variação bifásica<br />
<strong>da</strong> resistência vascular pulmonar quando compara<strong>da</strong> com o volume<br />
pulmonar utilizado (figura 30)<br />
Figura - 30 Relação <strong>da</strong> resistência vascular e o volume<br />
pulmonar utilizado.<br />
Um elevado número de capilares pulmonares encontra-se<br />
colapsados durante o ciclo respiratório. Quando ocorre aumento do<br />
fluxo sanguíneo para os pulmões, estes capilares abrem-se<br />
enquanto outros se dilatam e, naturalmente, a resistência pulmonar<br />
34
diminui. O fenômeno é conhecido como recrutamento e distensão<br />
vascular. Concluindo, na circulação pulmonar normal, o aumento do<br />
fluxo sanguíneo relaciona-se com um que<strong>da</strong> na resistência vascular<br />
pulmonar, ao contrário do que se esperaria (figura 31).<br />
Figura - 31 Fenômenos do recrutamento e distensão vascular<br />
<strong>da</strong> circulação pulmonar.<br />
Vários fatores neuroquímicos também interferem na<br />
resistência vascular pulmonar. A hipóxia alveolar é um dos mais<br />
importantes a ser analisado. O alvéolo que não sofre ventilação<br />
alveolar normal ou sofre ventilação alveolar com uma mistura<br />
hipóxica possui gás alveolar pobre em oxigênio. A baixa<br />
concentração de oxigênio causa vasoconstrição dos vasos<br />
pulmonares <strong>da</strong>quela área na tentativa de impedir a desoxigenação<br />
sanguínea por aquele gás.<br />
35
Várias outras substâncias influenciam a resistência vascular<br />
pulmonar (tabela 02).<br />
Tabela - 02<br />
dilatadores<br />
constritores<br />
agonistas beta-adrenérgico hipóxia<br />
acetilcolina<br />
hipercarbia<br />
agonistas h 2<br />
agonistas alfa-adrenérgicos<br />
bradicinina agonistas h 1<br />
prostaglandina e 1 & i 2<br />
serotonina<br />
teofilina<br />
angiotensina<br />
óxido nítrico<br />
Vários dos mediadores que induzem a vasodilatação<br />
pulmonar relacionam-se à liberação de óxido nítrico pelas células<br />
endoteliais <strong>da</strong> circulação pulmonar. Estes mediadores estimulam a<br />
enzima óxido nítrico sintetase constitucional a produzir óxido nítrico<br />
a partir do aminoácido L-citrulina, elevando os níveis celulares de<br />
GMPc, um potente vasodilatador.<br />
5. Relação ventilação/perfusão<br />
A adequação entre a ventilação e o fluxo sanguíneo dentro<br />
<strong>da</strong>s várias regiões pulmonares é critico para que ocorra uma troca<br />
gasosa adequa<strong>da</strong>.<br />
A relação entre ventilação e perfusão pulmonar ideal é de<br />
uma uni<strong>da</strong>de, ou seja, para ca<strong>da</strong> uni<strong>da</strong>de de ventilação alveolar<br />
36
(mililitros/minuto) haveria uma uni<strong>da</strong>de de fluxo pulmonar<br />
(mililitros/minuto).<br />
Os dois distúrbios <strong>da</strong> relação ventilação/perfusão (V/Q) são<br />
conhecidos como efeito espaço morto e efeito shunt.<br />
O efeito espaço morto ocorre sempre que a ventilação<br />
regional é maior que a perfusão (?V/Q?), portanto a relação V/Q<br />
maior que a uni<strong>da</strong>de. Este fenômeno pode ser resumido como<br />
alvéolos bem ventilados, contudo mal perfundidos.<br />
O efeito shunt aparece quando a perfusão regional excede a<br />
ventilação(?V/Q?), portanto a relação V/Q maior que a uni<strong>da</strong>de.<br />
Este fenômeno é conhecido como alvéolos mal ventilados, mas<br />
bem perfundidos (figura 32).<br />
Figura - 32 Efeito espaço morto e shunt.<br />
37
No efeito shunt devido a má ventilação dos alvéolos, o gás<br />
presente em seu interior se equaliza com a pressão parcial do gás<br />
presente no sangue venoso, antes de ocorrer seu colapso. Ao<br />
contrário, no efeito espaço morto o gás alveolar estabiliza-se com o<br />
gás atmosférico assemelhando-se a este.<br />
Como foi abor<strong>da</strong>do anteriormente, a base pulmonar recebe a<br />
maior parcela <strong>da</strong> perfusão, assim como a <strong>da</strong> ventilação. Seria de se<br />
esperar que, as relações ventilação-perfusão nas várias regiões<br />
pulmonares fossem próximas à uni<strong>da</strong>de, a base mais perfundi<strong>da</strong><br />
recebe maior ventilação e o ápice menos perfundido recebe menor<br />
ventilação. Este fato é o que ocorre dentro de alguns limites,<br />
contudo a base é proporcionalmente muito mais perfundi<strong>da</strong> que<br />
ventila<strong>da</strong> ocorrendo o oposto no ápice que é muito menos<br />
perfundido do que ventilado. Como consequência observa-se que a<br />
razão entre a ventilação e perfusão (V/Q) é menor que um na base<br />
e maior que um nos ápices, ou seja predomina o efeito shunt nas<br />
bases pulmonares (V/Q) e efeito espaço morto nos ápices (V/Q).<br />
Nas regiões intermediárias do pulmão a relação ventilação-perfusão<br />
é perto do ideal (próximas à uni<strong>da</strong>de) (figura 33).<br />
38
Figura - 33 Relação do efeito shunt ou espaço morto nas<br />
regiões pulmonares.<br />
O efeito shunt é o responsável pela diminuição <strong>da</strong> pressão<br />
parcial de oxigênio no sangue arterial. Contudo, o efeito espaço<br />
morto não consegue promover o aumento do oxigênio naquele<br />
sangue. O fenômeno decorre <strong>da</strong> curva de dissociação oxigêniohemoglobina<br />
é de morfologia sigmoide e encontra-se em seu platô.<br />
Nesta faixa <strong>da</strong> curva, mesmo grandes variações <strong>da</strong> PO 2 promove<br />
pequenas variações na saturação <strong>da</strong> hemoglobina. Outro fator<br />
determinante é que o montante de sangue nesta região (efeito<br />
espaço-morto) é pequeno, insuficiente para compensar o efeito<br />
shunt (figura 34).<br />
39
Figura - 34 O efeito shunt determina hipóxia. O efeito espaço<br />
morto não determina hiperóxia assim como não corrige a hipóxia do<br />
efeito shunt.<br />
6. Transporte dos gases<br />
O transporte de oxigênio dos pulmões até os tecidos é<br />
simples, ocorrendo apenas de dois modos: dissolvido no plasma ou<br />
ligado à hemoglobina.<br />
O oxigênio dissolvido no plasma obedece à lei de Henry que<br />
estabelece que a concentração de um gás dissolvi<strong>da</strong> em um líquido<br />
é diretamente proporcional a sua pressão parcial, a determina<strong>da</strong><br />
temperatura. A quanti<strong>da</strong>de dissolvi<strong>da</strong> no plasma de oxigênio é<br />
proporcional à pressão parcial deste (figura 35).<br />
40
C = K . P<br />
Figura - 35 Equação <strong>da</strong> Lei de Henry - A solubili<strong>da</strong>de de um<br />
gás em um determinado líquido, a determina<strong>da</strong> temperatura, é<br />
proporcional à pressão parcial do gás sobre a solução e à constante<br />
de solubili<strong>da</strong>de deste gás naquele líquido.<br />
C - Quanti<strong>da</strong>de do gás diluído no líquido.<br />
K - Constante de solubili<strong>da</strong>de<br />
P - Pressão parcial do gás<br />
A constante de dissolução do oxigênio no plasma é de 0,003,<br />
isto é, para ca<strong>da</strong> milímetro de mercúrio <strong>da</strong> pressão parcial de<br />
oxigênio haverá 0,003 mililitros de oxigênio em 100 mililitros de<br />
plasma, na temperatura de 37 o C. Portanto, para uma pressão<br />
alveolar normal de oxigênio de 100 milímetros de mercúrio existirá<br />
apenas 0,3 mililitros de oxigênio para ca<strong>da</strong> 100 mililitros de plasma.<br />
É lógico deduzir que só esta forma de transporte de oxigênio é<br />
inadequa<strong>da</strong> para os seres humanos.<br />
O principal transporte de oxigênio dentro do sistema<br />
circulatório dos vertebrados é muito facilitado pelas hemoglobinas<br />
uma vez que, são extremamente a<strong>da</strong>pta<strong>da</strong>s à esta função. As<br />
hemoglobinas são proteínas conjuga<strong>da</strong>s. Ca<strong>da</strong> um dos quatro<br />
grupos HEME <strong>da</strong> molécula normal de hemoglobina está ligado a<br />
uma cadeia polipeptídica a GLOBINA. Esta cadeia polipeptídica<br />
pode ser do tipo alfa e do tipo beta formando a hemoglobina A do<br />
adulto (Hg A - 2 alfa / 2 beta). Existem outras hemoglobinas que<br />
41
podem ser cita<strong>da</strong>s: hemoglobina fetal (Hg F), hemoglobina<br />
falciforme (Hb S) etc.<br />
A constante de dissolução do oxigênio na hemoglobina é de<br />
1,34 sendo, portanto muito maior que a do plasma. A representação<br />
gráfica <strong>da</strong> pressão parcial de oxigênio versus o teor de oxigênio na<br />
hemoglobina é conheci<strong>da</strong> como curva de dissociação <strong>da</strong> oxihemoglobina.<br />
Esta curva tem uma morfologia sigmoide (figura 36).<br />
Figura - 36 Curva <strong>da</strong> dissociação <strong>da</strong> oxi-hemoglobina.<br />
Para facilitar a interpretação dos fatores que modificam a<br />
afini<strong>da</strong>de <strong>da</strong> hemoglobina pelo oxigênio foi definido o fator P 50 . O<br />
42
P 50 é a pressão parcial de oxigênio necessária para saturar 50% <strong>da</strong><br />
hemoglobina (figura 37).<br />
Figura - 37 P 50 é a pressão parcial de oxigênio necessária<br />
para saturar 50% <strong>da</strong> hemoglobina.<br />
Alguns fatores modificam a afini<strong>da</strong>de <strong>da</strong> hemoglobina pelo<br />
oxigênio. Os fatores que aumentam a afini<strong>da</strong>de <strong>da</strong> hemoglobina<br />
pelo oxigênio desviam a curva para esquer<strong>da</strong>, diminuindo o P 50 .<br />
Contrariamente, os fatores que diminuem a afini<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />
hemoglobina pelo oxigênio desviam a curva para a direita, elevando<br />
o P 50 .<br />
43
O dióxido de carbono é um dos fatores mais importantes<br />
envolvidos neste fenômeno. Esse gás diminui a afini<strong>da</strong>de do<br />
oxigênio pela hemoglobina, desvia a curva para a direita elevando o<br />
P 50 (efeito Bohr) (figura 38) (tabela 03).<br />
Figura - 38 Fatores que modificam a curva de dissociação <strong>da</strong><br />
hemoglobina.<br />
Tabela - 03<br />
diminuição <strong>da</strong> afini<strong>da</strong>de<br />
acidose<br />
hipercarbia<br />
hipertermia<br />
aumento <strong>da</strong> afini<strong>da</strong>de<br />
alcalose<br />
hipocarbia<br />
hipotermia<br />
44
aumento do 2,3-dpg<br />
diminuição do 2,3-dpg<br />
monóxido de carbono<br />
O transporte total de oxigênio dos pulmões aos tecidos fica na<br />
dependência do conteúdo de oxigênio presente no sangue (CaO 2 ),<br />
ou seja o ligado à hemoglobina mais o dissolvido no plasma e do<br />
débito cardíaco (figura 39).<br />
CaO 2 = 0,003 . PaO 2 + (1,34 . SaO 2 . Hb)<br />
DO 2 = CaO 2 . DC<br />
Figura - 39 Transporte de oxigênio aos tecidos<br />
DO 2 - Transporte de oxigênio aos tecidos<br />
DC - Débito cardíaco<br />
CaO 2 - Conteúdo arterial de oxigênio<br />
PaO 2 - Pressão parcial de oxigênio no plasma<br />
SaO 2 - Saturação <strong>da</strong> hemoglobina<br />
Hg - Concentração de hemoglobina no sangue<br />
45
O dióxido de carbono é transportado dos tecidos até os<br />
pulmões de forma mais complexa do que o oxigênio. Ele é<br />
transferido dissolvido no plasma, como bicarbonato ou combinado<br />
com proteínas, em especial com a própria hemoglobina na forma<br />
de carbamino, que são ligações covalentes entre os radicais NH 2<br />
<strong>da</strong>s proteínas (globina) com o dióxido de carbono (NH 2 -CO 2 ).<br />
O dióxido de carbono dissolvido no plasma também segue a<br />
lei de Henry. A constante de dissolução do dióxido de carbono no<br />
plasma é 0,06 (vinte vezes maior que a do oxigênio).<br />
O dióxido de carbono transportado na forma de bicarbonato<br />
segue a reação química: CO 2 + H 2 O ↔ H 2 CO 2 ↔ H + + HCO - 3 . É a<br />
forma mais importante de transporte de dióxido de carbono.<br />
Os compostos carbamínicos são formados pela combinação<br />
do CO 2 com os grupos aminos terminais, nas proteínas plasmáticas.<br />
Neste processo a proteína mais importante é a globina <strong>da</strong><br />
hemoglobina seguindo a reação química: Hb-NH2 + CO2 ↔ Hb-<br />
NHCOOH. A carboxi-hemoglobina tem maior capaci<strong>da</strong>de de<br />
ligações carbamino que a oxi-hemoglobina (efeito Hal<strong>da</strong>ne).<br />
A representação gráfica <strong>da</strong> pressão parcial de dióxido de<br />
carbono versus o teor de dióxido de carbono no sangue total é<br />
conheci<strong>da</strong> como curva de dissociação do dióxido de carbono. Esta<br />
curva tem uma morfologia mais retilínea do que a curva de<br />
dissociação <strong>da</strong> oxi-hemoglobina (figura 40).<br />
46
Figura - 40 Curva de dissociação do dióxido de carbono.<br />
Podem-se resumir os fenômenos envolvidos na seguinte<br />
figura (figura 41).<br />
47
Figura 41 Modos de transporte do dióxido de carbono.<br />
7. Controle <strong>da</strong> ventilação pulmonar<br />
48
A frequência, profundi<strong>da</strong>de e padrão respiratório são<br />
determinados pela contração sistemática do músculo diafragma,<br />
músculos intercostais e outras estruturas relaciona<strong>da</strong>s. A regulação<br />
fisiológica <strong>da</strong> respiração envolve um complexo mecanismo de<br />
reflexos. Os dois sistemas principais envolvidos são o mecanismo<br />
neuronal e outro químico.<br />
Para fins didáticos existe ao nível do tronco cerebral um<br />
centro inspiratório e um centro expiratório responsável pela<br />
ritmici<strong>da</strong>de <strong>da</strong> ventilação pulmonar. O núcleo respiratório dorsal tem<br />
a função principalmente inspiratória sendo formado principalmente<br />
pelo núcleo do trato solitário. O núcleo respiratório ventral é<br />
formado pelo núcleo ambíguo e retroambíguo. O grupo respiratório<br />
dorsal apresenta conexões com o grupo respiratório ventral (figura<br />
42).<br />
49
pulmonar.<br />
Figura - 42 Núcleos responsáveis pelo controle <strong>da</strong> ventilação<br />
No grupo respiratório dorsal, observa-se eferências para o<br />
nervo frênico que, assim, estimula a contração do diafragma. Por<br />
outro lado, recebe aferências viscerais através do nervo<br />
glossofaríngeo (IX) e vago (X). O IX par leva informações sobre o<br />
PO 2 , PCO 2 e pH obtidos através dos quimioreceptores presentes na<br />
caróti<strong>da</strong> e aorta. Já o X par leva informações sobre os receptores<br />
de estiramento presentes nos pulmões.<br />
O grupo respiratório dorsal é, portanto, o local primário <strong>da</strong><br />
gênese do ritmo respiratório. É provavelmente responsável pelo<br />
“driving” do músculo diafragma e do grupo respiratório ventral.<br />
50
Por outro lado, o grupo respiratório ventral apresenta<br />
neurônios com função inspiratória e expiratória.<br />
Os centros mais superiores (centro apneustico, pneumotáxico<br />
e córtex) modulam a ritmici<strong>da</strong>de e profundi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> ventilação<br />
induzi<strong>da</strong> pelos grupos ventral e dorsal (figura 43).<br />
Figura - 43 Relação dos locais ablação com os ritmos<br />
respiratórios.<br />
O estímulo químico central <strong>da</strong> ventilação é um dos mais<br />
importantes. O aumento <strong>da</strong> PCO 2 provoca a uma diminuição do pH<br />
liquórico que, por sua vez, estimula quimioreceptores presentes no<br />
51
tronco cerebral. Os quimioreceptores irão estimular os centros<br />
respiratórios já descritos.<br />
A hipóxia é também um estímulo <strong>da</strong> ventilação pulmonar,<br />
contudo só observa-se resposta importante quando a PO 2 cai<br />
abaixo de 50 milímetros de mercúrio.<br />
Deve-se levar em consideração que a hipercapnia<br />
potencializa a resposta ventilatória à hipóxia (figura 44). Por outro<br />
lado, a hipóxia também potencializa a resposta <strong>da</strong> ventilação à<br />
hipercapnia (figura 45).<br />
Figura - 44 Relação <strong>da</strong> resposta ventilatória e a hipoxemia.<br />
52
Figura - 45 Relação <strong>da</strong> resposta ventilatória e a hipercapnia.<br />
8. Literatura consulta<strong>da</strong><br />
Fisiologia Respiratória - 6ª Edição 2002 - West, John B<br />
Tratado de Fisiologia Médica de Guyton & Hall – 11 a Edição<br />
2009 - John E. Hall<br />
53