IGARAPÉ LOURDES - Kanindé
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COSMOLOGIA<br />
Os Ikolen e os Karo Rap buscam manter suas cerimônias<br />
tradicionais, como pajelança, encontro dos pajés (que<br />
ocorre no mês agosto), o uso da medicina tradicional,<br />
a Ipena’op Kanã Wajo Akanâ Pe (Festa do Jacaré), a<br />
Ip Japijeje Te’et Na Na Te’a (Festa da Pescaria).<br />
Com o contato outras festas foram incorporadas como<br />
as festas juninas, Natal, Ano Novo, aniversários e o Dia<br />
do Indio.<br />
Moore informava, em 1978, que três anos antes os<br />
Gavião tinham abandonado quase todas as crenças e<br />
rituais tradicionais, “... A última grande festa com muitos<br />
jacarés vivos, com chicha, etc, foi mais ou menos<br />
em 1970. Um chefe de posto proibiu festas exceto<br />
duas: a “Festa do Milho Verde”, dos Goihanei, no inverno<br />
e a “Festa do Pajé”...”. Moore informa que o<br />
servidor da FUNAI acreditava que “... as festas prejudi-<br />
cariam a saúde e baixaria a produção”.<br />
As festas foram retomadas a partir de 1976 (antes todos<br />
freqüentavam a igreja e tinham deixado de fazer<br />
festa), que o pajé está trabalhando de novo (1978)<br />
e há algumas festas. Entre abril e junho de 1977 havia<br />
muito movimento de festa e de pajé na aldeia<br />
Cachoeira. O pajé estava trabalhando para curar o<br />
velho Kepe, pai do Wilson e Colombo, que tinha um<br />
problema do coração. O pajé chamou os espíritos<br />
Oritxitxia que apareceram de noite na frente do povo<br />
e do pesquisador (sic). Quando o doente morreu a<br />
festa acabou – eles queimaram a casa do finado e não<br />
falam mais seu nome. (Moore, 1978).<br />
Apesar da pressão dos missionários e da sociedade nacional,<br />
os Ikolen e Karo Rap continuam com suas práticas<br />
tradicionais de pajelança.<br />
A LENDA DO MILHO<br />
COMO GOIHANEI O TROUXE<br />
8<br />
O Goihanei é o dono do milho verde, foi ele que o<br />
trouxe para o povo Gavião. E é ele que cuida para que<br />
haja boas safras, todo ano tem de comemorar e vestir<br />
as roupas de Goihanei, que são feitas da palha do buriti.<br />
Usam cocar, penacho, roupas de índio, roupas de<br />
Goihanei, o homem do milho. Conta que é muito<br />
importante que seu povo não esqueça e que os<br />
chamem Goihanei, mas só quem os conhecem, e<br />
quem os vê, é o Pajé.<br />
Chamam-se Goihanei, porque vivem nas águas.<br />
E esta festa não é inventada, já vem de muitos anos –<br />
desde o começo do povo que estava nascendo daquela<br />
pedra, daquela rocha.<br />
Os Gavião ainda tem sementes do milho originais que<br />
Goihanei lhes trouxe.<br />
É importante lembrar como é que veio o milho:<br />
Primeiro a mulher engravidou, sem fazer relação, sem<br />
usar homem.<br />
Tem uma fruta que se chama Xum Xum-ra (Tsyn Tsynra),<br />
que nasce de uma árvore muito grande, grossa e<br />
bonita, muito especial para o povo Gavião.<br />
As índias iam apanhar Xum Xum-ra e tinha um pouco<br />
que estava no chão.<br />
Quando chegavam, a índia grávida perguntava:<br />
- E aí Tinha muita fruta lá<br />
- Não, respondíamos, nós trouxemos um pouquinho.<br />
Então ela ia e dizia:<br />
- Vou ver se acho pelo menos um pouco para eu<br />
comer!<br />
Todas as índias iam naquela árvore para se alimentar –<br />
o nome dela é Xum-Xum-ra (Tsyn-Tsyn-ra).<br />
Aí, quando chegava clã, ela sentava, abria as pernas e<br />
de sua vagina, saia o Arco-Íris. Ia lá ao alto da árvore,<br />
balançava e as frutas caíam. Era muita fruta. Ela juntava,<br />
enchia o paneiro. Vinha para a maloca com o<br />
paneiro cheio, cheinho. Vinha para sua casa na aldeia<br />
e, ao entrar as outras mulheres se assustavam:<br />
- Puta merda, onde tu pegaste tanta fruta mulher<br />
- Ah, achei ali mesmo e juntei – respondia.<br />
Mas as demais mulheres desconfiaram, pois a história<br />
sempre se repetia.Então, resolveram segui-la para ver o<br />
que estava acontecendo. Então viram quando ela abriu<br />
as pernas e o Arco-Íris saiu de lá de dentro. Correram<br />
22<br />
8 Narrado por Catarino Sebirop Gavião a Samuel Cruz – Notas e fitas gravadas em campo, 2004.