Versão completa em PDF
Versão completa em PDF
Versão completa em PDF
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
o p o r t u n i d a d e<br />
Fr a n c i s Fr a n ç a<br />
Operação de risco<br />
Brasil decide competir no mercado de s<strong>em</strong>icondutores,<br />
hoje dominado por gigantes multinacionais. Se der certo,<br />
a iniciativa pode fomentar uma indústria inovadora.<br />
Mas a possibilidade de fracasso ainda gera desconfiança.<br />
P<br />
ara esta reportag<strong>em</strong> chegar às suas<br />
mãos, foram necessárias centenas de<br />
chips. Eles estavam no computador de<br />
qu<strong>em</strong> escreveu, nos servidores que transmitiram<br />
os dados pela internet, nas máquinas<br />
que fabricaram o papel, nas impressoras<br />
da gráfica, nos veículos que a<br />
entregaram. E se você olhar <strong>em</strong> volta,<br />
verá que neste momento está cercado por<br />
eles, nos telefones, aparelhos eletrônicos<br />
e <strong>em</strong> tudo mais que tenha passado por<br />
processo industrial. Essa montanha de<br />
shutterstock<br />
chips, também chamados de s<strong>em</strong>icondutores,<br />
movimenta cerca de US$ 250 bilhões<br />
por ano <strong>em</strong> um mercado que o Brasil<br />
frequentava apenas como comprador.<br />
Este ano o cenário começa a mudar com a<br />
inauguração do Centro de Excelência <strong>em</strong><br />
Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec),<br />
<strong>em</strong> Porto Alegre (RS), considerado pelos<br />
fundadores o primeiro passo para transformar<br />
o Sul do Brasil no Vale do Silício<br />
da América Latina.<br />
O Governo Federal investiu cerca de<br />
R$ 350 milhões na <strong>em</strong>preitada, e <strong>em</strong> nov<strong>em</strong>bro<br />
do ano passado assinou a criação<br />
da <strong>em</strong>presa pública Ceitec S/A. A estatização<br />
garante o repasse de recursos via Ministério<br />
da Ciência e Tecnologia até que o<br />
centro se torne autossuficiente, o que está<br />
programado para acontecer <strong>em</strong> três anos.<br />
Depois da federalização já foram repassados<br />
mais R$ 45 milhões para o custeio das<br />
atividades <strong>em</strong> 2009. O investimento é uma<br />
tentativa de reduzir a pressão sobre a balança<br />
comercial, já que os componentes<br />
microeletrônicos representam um quinto<br />
de toda a importação do país, segundo a<br />
Associação Brasileira da Indústria Elétrica<br />
e Eletrônica (Abinee). Só <strong>em</strong> s<strong>em</strong>icondutores,<br />
as importações custaram ao Brasil<br />
US$ 4 bilhões no ano passado, 18% a<br />
mais do que <strong>em</strong> 2007. Considerando todos<br />
os itens de microeletrônica, <strong>em</strong> 2008 o déficit<br />
chegou a US$ 22 bilhões.<br />
Críticas ao projeto questionam se vale a<br />
pena investir tanto dinheiro público para<br />
entrar <strong>em</strong> um mercado já maduro e dominado<br />
por gigantes multinacionais. De fato<br />
o Ceitec não vai resolver o probl<strong>em</strong>a da<br />
balança comercial, mas é peça fundamental<br />
no quebra-cabeça. “O custo da importação<br />
de componentes já é maior do que o<br />
país exporta de ferro, frango ou café, e<br />
esse déficit cresce <strong>em</strong> média 30% ao ano.<br />
Se o Brasil não começar a participar do<br />
mercado de microeletrônica, daqui a pouco<br />
não vamos mais conseguir pagar a<br />
conta da tecnologia”, diz Luiz Francisco<br />
Gerbase, vice-presidente da Abinee e diretor<br />
regional no Rio Grande do Sul.<br />
Primeiro passo<br />
Ainda serão necessários muitos anos<br />
para que a indústria brasileira de s<strong>em</strong>icondutores<br />
consiga reverter o déficit,<br />
mas o Brasil precisa começar e já perdeu<br />
t<strong>em</strong>po d<strong>em</strong>ais – a China começou o processo<br />
s<strong>em</strong>elhante há 10 anos. A proposta<br />
do Ceitec é justamente servir de estopim.<br />
O plano não é vender bilhões de dólares,<br />
mas preparar o campo para atrair<br />
outras <strong>em</strong>presas e multiplicar os investimentos.<br />
“O Ceitec é uma bandeira, não<br />
um prédio. O que vai resolver o probl<strong>em</strong>a<br />
da balança comercial é um plano<br />
estratégico nacional para a microeletrônica,<br />
não iniciativas isoladas. Nas<br />
economias desenvolvidas esse setor corresponde<br />
a 12% do PIB. O Brasil também<br />
pode chegar lá, mas para isso precisamos<br />
começar”, diz Gerbase.<br />
De acordo com o presidente do Ceitec,<br />
Eduard Weichselbaumer, mais do que gerar<br />
volume <strong>em</strong> dólares, o objetivo é criar<br />
propriedade intelectual no país e um ambiente<br />
favorável para a instalação da indústria<br />
de microeletrônica. “S<strong>em</strong> indústria<br />
de s<strong>em</strong>icondutores a microeletrônica<br />
não se desenvolve. As <strong>em</strong>presas do setor<br />
não vinham para cá porque não havia infraestrutura.<br />
Precisamos oferecer insumos<br />
como água e energia com uma qualidade<br />
diferente do consumidor comum,<br />
estrutura de fornecedores e mão-de-obra<br />
qualificada. E é esse alicerce que estamos<br />
montando”, diz ele. A inauguração está<br />
prevista para julho e <strong>em</strong>bora a preocupação<br />
principal seja servir de base, o Ceitec<br />
espera também ampliar a produção, e, <strong>em</strong><br />
dois anos, atingir uma nova fase, com<br />
mais capital – público ou privado.<br />
Base na experiência<br />
O projeto começou <strong>em</strong> 2000, a partir de<br />
uma parceria entre governos, universidades<br />
e a Motorola, que doou equipamentos<br />
para montar uma sala limpa para fabricação<br />
de s<strong>em</strong>icondutores. Em 2005 começaram<br />
as obras do complexo de 14.600 m²,<br />
que inclu<strong>em</strong> a fábrica onde estão as salas<br />
limpas e o centro de projetos, onde fica o<br />
núcleo de design de chips. Cerca de 80<br />
profissionais trabalham hoje no Ceitec,<br />
40 deles ligados diretamente ao design de<br />
chips e outros 40 envolvidos na montag<strong>em</strong><br />
da fábrica e na administração. O plano<br />
é chegar até o final do ano com 120<br />
pessoas. A equipe é de alta qualificação.<br />
Para cada oito engenheiros é necessário<br />
um líder de time com 15 anos de experiência.<br />
Como o Brasil não t<strong>em</strong> tradição <strong>em</strong><br />
s<strong>em</strong>icondutores, boa parte desses profissionais<br />
v<strong>em</strong> do exterior – estrangeiros ou<br />
brasileiros que trabalham fora do país.<br />
O próprio presidente do Ceitec é al<strong>em</strong>ão.<br />
Com quase 30 anos de experiência<br />
na área de s<strong>em</strong>icondutores, Weichselbaumer<br />
participou do lançamento de diversas<br />
<strong>em</strong>presas do setor nos mercados euro-<br />
Sede do Ceitec:<br />
investimento<br />
público beira os<br />
R$ 400 milhões<br />
DIVULGAÇÃO<br />
24<br />
Locus • Abril 2009<br />
Locus • Abril 2009<br />
25