PESQUISAQuem disse quebagaço é resto?PESQUISA PARA PRODUÇÃO DE ETANOL DO BAGAÇO DA CANAPROVA QUE ESSA MATÉRIA-PRIMA AINDA TEM MUITO CALDOMaiara DouradoFoi-se o tempo em que o bagaço <strong>da</strong>cana-de-açúcar era consideradomero resíduo de produção, semgrandes utili<strong>da</strong>des e de poucoaproveitamento. A gama de possibili<strong>da</strong>desque essa matéria-prima, hoje, podeoferecer não se restringe mais a alimentaçãode gado ou adubação <strong>da</strong> terra.Quem comprova isso são pesquisadoresbrasileiros que desenvolveram uma tecnologiaque permite produzir etanol apartir do bagaço <strong>da</strong> cana.Se levarmos em conta a tecnologia alcooleirapara produção de biocombustívelatravés de cana-de-açúcar, o Brasil é,sem dúvi<strong>da</strong>, pioneiro. Na era do aquecimentoglobal e com a tendência de suprimirca<strong>da</strong> dia mais a emissão de gasespoluentes, o estímulo para pesquisasdesse tipo tem aumentado.Nesse cenário, a pesquisa para obtençãode etanol do bagaço de cana apresenta-secomo alternativa adicional paraaproveitamento deste resíduo em benefício<strong>da</strong> produção do biocombustível.Além disso, pode vir a contribuir para reduziros <strong>da</strong>nos causados pela queima dobagaço ou seu descarte no meio ambiente.Para todos que trabalham com essetipo de pesquisa a expectativa é uma só:o aumento do volume do etanol produzidonas destilarias.De acordo com o professor <strong>da</strong> Escolade Engenharia de Lorena <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>dede São Paulo (EEL-USP), Adilson Ro-montagem sobre foto: são joão abr/stock.schng18 CANAL, Jornal <strong>da</strong> Bioenergia - ABRIL 2009
erto Gonçalves, o objetivo é produzirmais etanol por tonela<strong>da</strong> decana cultiva<strong>da</strong> e fazer um aproveitamentomais racional e eficientedos resíduos gerados, que, no caso,são principalmente o bagaço e apalha <strong>da</strong> cana-de-açúcar. Gonçalvesacredita que há uma enormedeman<strong>da</strong> internacional por fornecimentode etanol e que a produçãoconvencional não supriria nempequenas parcelas dessa deman<strong>da</strong>."O Brasil não pode almejar ser oúnico fornecedor de etanol domundo, mas deve ser um dos maisimportantes. Aumentar a produçãopor meio convencional significa oaumento <strong>da</strong> área planta<strong>da</strong>, o quegera maior custo e pode começar agerar problemas ambientais", crescentao professor.Em resumo, a ideia é aumentar aprodutivi<strong>da</strong>de sem aumentar a áreaplanta<strong>da</strong> e sem, consequentemente,aumentar os impactos ambientais.No entanto, a pesquisa ain<strong>da</strong>está em an<strong>da</strong>mento, o que exigepaciência e maiores investimentosdo setor produtivo. Desse processo,conseguiu-se obter somente 3% deetanol, mas há a possibili<strong>da</strong>de de seatingir até 60% de obtenção doproduto.A professora doutora Cecília Laluce,<strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de Estadual Paulista(Unesp), admite que a obtençãodos <strong>da</strong>dos em pesquisa sejalenta, mas que a eficiência do projetodepende de pessoal bem formadoe treinado para atuar no setorprodutivo, além do desenvolvimentode sistemas de refrigeraçãomais eficientes <strong>da</strong>s dornas (tanquesde fermentação) e do controle doscontaminantes no processo de obtençãode etanol.Mais dinheiro para pesquisasPara o projeto deslanchar, é precisoinvestimentos e financiamentoem bolsas para pesquisadores, alémde estabelecer parcerias com o setorindustrial e ain<strong>da</strong> escapar <strong>da</strong>burocracia para utilização dos recursospúblicos. "Projetos na escalaque estamos fazendo estão na ordemde R$100.000 ao ano o que émuito pouco, perto dos grandes investimentosna construção civil",lembra o professor <strong>da</strong> USP. Segundoele, ao atingir seu pleno desenvolvimento,o processo pode dobrara quanti<strong>da</strong>de de etanol pela mesmaquanti<strong>da</strong>de de cana colhi<strong>da</strong>.Em contraparti<strong>da</strong>, o projeto traz apossibili<strong>da</strong>de de uma quebra na relaçãode interdependência entre etanole açúcar. Isso porque o preço desse biocombustívelestá atrelado ao preçodo açúcar. Segundo o professor Gonçalvesespera-se uma ruptura nesteparadigma e que o etanol passe a termaior competitivi<strong>da</strong>de que a gasolina.Uma outra cadeia de produção seriainstala<strong>da</strong> a partir do conceito de biorrefinariae vários outros profissionaisestariam envolvidos, como ocorre nacadeia produtiva do petróleo.Professora Cecília acredita que oimpacto <strong>da</strong> pesquisa sobre o mercadointerno vai depender do consumidore <strong>da</strong> oferta do combustível. Se asexportações não aumentarem, o preçopoderá se tornar menor com o aumento<strong>da</strong> oferta do produto e suamaior disponibili<strong>da</strong>de no mercado.CANAL, Jornal <strong>da</strong> Bioenergia - ABRIL 2009 19