QUE ESPETÁCULOA mais antiga brinca<strong>de</strong>iraDALTON CAMARGOSNo Teatro Goldoni, uma divertida adaptação <strong>de</strong> três contos<strong>de</strong> Decamerão, apesar do gosto <strong>de</strong> piada requentadaALEXANDRE MARINOSexo não é brinca<strong>de</strong>ira! Ou é? Airreverente montagem <strong>de</strong> Contos <strong>de</strong>Alcova, da diretora Miriam Virna, éuma tentativa <strong>de</strong> brincar com coisaséria. Mas sexo, como se sabe, é odivertimento mais antigo do mundo,tanto que a humanida<strong>de</strong> continua aí,brincando e se multiplicando, por maisproblemas que a explosão <strong>de</strong>mográficapossa causar. Assim, a adaptação <strong>de</strong>três contos <strong>de</strong> Decamerão, do italianoGiovanni Boccaccio, tem um gosto<strong>de</strong> piada requentada, mas... vá lá, édivertido.Apesar do tema, não há erotismono palco – portanto, não se <strong>de</strong>ve ir aoteatro na condição <strong>de</strong> voyeur <strong>de</strong> cenaspicantes. Uma boa <strong>de</strong>sculpa paracomparecer ao Teatro Bordoni, da CasaD’Itália, on<strong>de</strong> a peça permanece emcartaz até 28 <strong>de</strong> <strong>maio</strong>, é ver as soluções<strong>de</strong>senvolvidas por Miriam Virna paracontar as três histórias.Para começar, o cenário é umimenso colchão no centro do palco, emtorno do qual se acomoda (não muitobem) a platéia. O texto é uma adaptaçãolivre, aliás muito livre, do original<strong>de</strong> Boccaccio, e mantém o humor ea irreverência, com a ajuda <strong>de</strong> umcorinho musical, nas vozes <strong>de</strong> atores eagregados, comandado pelo violão <strong>de</strong>Rodrigo Bezerra. Os atores dialogamfalando ou cantando, eventualmente aoritmo do rock, da bossa nova, <strong>de</strong> algumacoisa que lembra o gospel, misturasassim. Em dado momento, i<strong>de</strong>ntifica-seaté o som <strong>de</strong> uma castanhola, marcandoo compasso <strong>de</strong> uma cançãozinhaflamenca.As narrativas têm em comum suaspersonagens centrais, três mulhereslutando pelo direito ao prazer. Oque também não é novo – afinal, asmulheres já se libertaram há muitotempo. Os atores – Adalto Serra,24
Camila Meskel, Natássia Garcia,Similião Aurélio e William Ferreira –fazem intensa movimentação no palco,numa coreografia meio anárquica.Todos vestem roupas iguais, digamosassim, unissex, e trocam <strong>de</strong> papéis epersonagens constantemente – às vezesum ator interpreta uma mulher, àsvezes uma atriz interpreta um homem,eventualmente fazem esse troca-trocatodos juntos, é uma versatilida<strong>de</strong>impressionante. Isso não foi o teatroque inventou, mas adora usar e abusar,mesmo que o espectador pense que nãofaz muito sentido.O primeiro conto é sobre umamulher que, movida pelo <strong>de</strong>sinteressedo marido, <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> arranjar um amante;o segundo é sobre uma inverossímilarmação <strong>de</strong> três amigos para faturaruma bela mulher (bem, só se aqueleator que a interpreta convencero prezado leitor/espectador); e aterceira história se passa <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> umconvento, abordando uma velhíssimaquestão: a carência sexual das mulherescastas. Como se vê, são voltas e voltasem torno <strong>de</strong> velhas questões.Talvez uma das coisas maisengraçadas <strong>de</strong> Contos <strong>de</strong> Alcova sejao macarrônico portunhol falado pelospersonagens da última narrativa, quepelo menos faz rir o espectador maiscarrancudo, cujo humor não seja tocadopelas piadas <strong>de</strong> fundo sexual. Afinal,nesses tempos em que esquisitíssimostrapalhões tomaram as ré<strong>de</strong>as dapolítica hispano-americana (peraí – nãoapenas hispano!) e o País é obrigadoa rir <strong>de</strong> vergonha para não chorar <strong>de</strong>tristeza, fazer troça com a língua (êpa!)<strong>de</strong>les po<strong>de</strong> ser um bom remédio. Aomenos contra os sintomas.Contos <strong>de</strong> AlcovaDireção e adaptação: Miriam Virna. Com AdaltoSerra, Camila Meskel, Natássia Garcia, SimiliãoAurélio e William Ferreira. De quinta a sábado,às 21h; domingo, às 20h, no Teatro Goldoni(Casa D’Itália, 208/209 Sul, 3244-3333).Ingressos: 10 e <strong>R$</strong> 5. Em cartaz até 28/5.ANGÉLICA TORRESBrasília dançaMostra radiografa movimento dos criadoresque se foram e dos que atuam na cida<strong>de</strong>Os amantes da dança que agucemos sentidos e agen<strong>de</strong>m o que pu<strong>de</strong>remdos eventos oferecidos pela mostraDança XYZ que, por nove noites e oitodias, até o dia 28, vai monopolizar aSala Martins Penna, o Teatro PlínioMarcos (Funarte) e o Centro Dançado DF. Ao todo, serão encenadossete espetáculos, exibidas váriasperformances, oferecidas quatrooficinas <strong>de</strong> dança e promovidos dois<strong>de</strong>bates entre os coreógrafos e opúblico.Será ainda lançado o livro A Históriaque se Dança - 45 <strong>Ano</strong>s do Movimentoda Dança em Brasília, e apresentadaa mostra A Dança entre as Asas e osEixos, um registro fotográfico <strong>de</strong> quatrodécadas da produção local (1960-2006),feito por profissionais da cida<strong>de</strong>.O público indubitavelmente aplau<strong>de</strong>a iniciativa dos curadores, Yara <strong>de</strong>Cunto e Marconi Valadares, porque nãoé toda hora que se po<strong>de</strong> ver diferentesespetáculos <strong>de</strong> dança, um por noite,e gratuitamente. Toda a programaçãoda mostra, aliás, é generosamentefranqueada. Os organizadores querem,com isso, contribuir para a produção<strong>de</strong> uma radiografia da dança praticadaem Brasília. Portanto, o evento reúnecriadores que passaram pela cida<strong>de</strong> eque hoje atuam fora, seja no país ou noexterior, e os que mantêm seu trabalhoaqui.A dupla Jabor & Seabra traz umaprodução belgo-brasileira. MauraBaiocchi vem <strong>de</strong> São Paulo, MárciaDuarte, <strong>de</strong> Salvador e Cristina Moura,do Rio. Giselle Rodrigues e LucianaLara e Lenora Lobo mostram a dança<strong>de</strong> quem ficou na cida<strong>de</strong>.SÁTIRO VALENÇA<strong>25</strong>