Presença musical italiana na formação do teatro brasileiro - ArtCultura
Presença musical italiana na formação do teatro brasileiro - ArtCultura
Presença musical italiana na formação do teatro brasileiro - ArtCultura
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
32FARIA, João Roberto. Idéiasteatrais: o século XIX no Brasil.São Paulo: Perspectiva,2001, p. 155. Mais adiante,dirá João Roberto que “alémde Macha<strong>do</strong>, Alencar, LuisLeitão e Joaquim Manoel deMace<strong>do</strong>, vários escritores eintelectuais importantes[...]manifestaram-se sobre a situação<strong>do</strong> <strong>teatro</strong> <strong>brasileiro</strong> nosanos que se seguiram à ence<strong>na</strong>çãode Orphée aus Enfers, noAlcazar”, p. 160.sem par, administra <strong>do</strong> início ao fim da comédia a trama amorosa dajovem irmã Carlotinha e o restrito círculo de existência <strong>do</strong> escravo Pedro.Eduar<strong>do</strong>, o protagonista eleva<strong>do</strong> da alta comédia, realista, brasileira,sonha alturas que não consegue alcançar, em função de um aparentementeduplo protagonismo constituí<strong>do</strong> à base de um espelho inverti<strong>do</strong>,e sobretu<strong>do</strong> porque a trama mantém-se suspensa, presa <strong>do</strong> inícioao fim da peça aos fios entreteci<strong>do</strong>s por uma exclusiva, contínua, elegantee etérea conversação moral, liberal e exemplar, que praticamentenão varia o tom e não se faz jamais ação. Na linearidade dessa prosódia,o jorro <strong>musical</strong> anuncia<strong>do</strong> fica conti<strong>do</strong> e se restringe a aquelas peque<strong>na</strong>s<strong>do</strong>ses de suave e pitoresco sabor, destiladas pela traquinice <strong>do</strong> Fígaroescravo amoroso aqui referidas.E não poderia ser de outro mo<strong>do</strong>, pois que a comédia de José deAlencar, ali onde procurou soerguer as aspirações civiliza<strong>do</strong>ras <strong>do</strong> <strong>teatro</strong><strong>brasileiro</strong> em formação no século XIX, bem sob os ditames <strong>do</strong>s ideaisburgueses, e deven<strong>do</strong>, para tanto, retratar e ao mesmo tempo propor oque seria um país melhor porque moderno, exprime, como foi dito, oponto máximo da contradição própria daquele querer formar-se não sócomo o espelho <strong>do</strong> outro, mas também com o espelho <strong>do</strong> outro, que,nesse caso, resulta em espelho diverso. De sua superfície as idéias liberais<strong>do</strong> momento escorrem como água e perdem pé <strong>na</strong> estilhaçada realidade<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, escravocrata, sulcada de mo<strong>do</strong> profun<strong>do</strong> por seus contrastesextrema<strong>do</strong>s.A <strong>musical</strong>idade reanimada <strong>do</strong> fi<strong>na</strong>l <strong>do</strong> séculoO retrato parcial e inverti<strong>do</strong> construí<strong>do</strong> pela comédia realista decostume no Brasil parece indicar que as experiências iniciadas com otrabalho farsesco empreendi<strong>do</strong> por Martins Pe<strong>na</strong> teriam chega<strong>do</strong> a ummomento crucial, segun<strong>do</strong> termos <strong>do</strong> projeto iluminista. Demonstra-ouma significativa passagem <strong>do</strong> malogro da ence<strong>na</strong>ção de O Jesuíta deJosé de Alencar em 1875, pois “para tristeza <strong>do</strong> escritor, a ence<strong>na</strong>ção foium enorme fracasso. Depois de <strong>do</strong>is espetáculos, não havia mais públicointeressa<strong>do</strong> no drama histórico concebi<strong>do</strong> para glorificar a luta pela independênciano país” e “<strong>na</strong> mesma noite em que O Jesuíta estreava, a 18de setembro, estavam em cartaz as operetas Orphée aus Enfers e La fille deMme Angot. 32Para a perspectiva ilustrada, o paulatino sucesso <strong>do</strong> <strong>teatro</strong> musica<strong>do</strong>pareceu indicar um <strong>do</strong>s principais motivos <strong>do</strong> que via como a decadência<strong>do</strong> <strong>teatro</strong> <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. Uma falência que parecia poder abarcar a inteiraexperiência da produção cômica teatral brasileira, não fosse o fato queesta, sempre sob o perfil da comédia de costume, voltava a ligar-se complenitude à música que a ela sempre estivera bastante próxima, à parte adensa mas breve experiência realista.De fato, antes que a comédia perdesse totalmente o lugar conquista<strong>do</strong>durante o processo de formação <strong>do</strong> <strong>teatro</strong> <strong>brasileiro</strong>, novamente<strong>teatro</strong> e música — estes <strong>do</strong>is mun<strong>do</strong>s artísticos que o projeto teatralciviliza<strong>do</strong>r, <strong>na</strong> dialética entre grandes experimentos dramatúrgicos e gosto<strong>do</strong> público, não parecia querer ver coliga<strong>do</strong>s — aproximaram-se novamentenos últimos anos <strong>do</strong> século, em virtude especialmente da enormee divertidíssima criação dramatúrgica espetacular de Arthur Azeve<strong>do</strong>78<strong>ArtCultura</strong>, Uberlândia, v. 9, n. 15, p. 61-81, jul.-dez. 2007