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Revista Dr Plinio 208

Julho 2015

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Luzes da Civilização Cristã<br />

para ninguém ver. Ela coloca à vista de todo mundo. De<br />

outro lado, ela está aqui, eu quase diria como um professor<br />

numa cátedra, um juiz num tribunal ou, amesquinhando<br />

muito, uma rainha num trono. Há qualquer coisa<br />

de pitoresco teatral italiano dentro disso. Está presente<br />

aí um verniz italiano. Nota-se alma dentro disso a mais<br />

não poder; vivacidade!<br />

O latino e o germânico<br />

nas de casa não usavam esse avental. É<br />

uma criada muito graduada que foi fazer<br />

compras com o menino da casa. O<br />

menino, vestido à século XIX: chapéu<br />

de marinheiro, com uma borlazinha, um<br />

pompom em cima, e uma golazinha.<br />

Nota-se nessa cena que algumas das<br />

pessoas se conhecem, outras até estão<br />

conversando. Mas não há nenhum indício<br />

de que todas se conheçam. Então, em que<br />

sentido se pode dizer que não são desconhecidas,<br />

como por exemplo, a multidão<br />

que passa pelo Viaduto do Chá 1 , onde as<br />

pessoas ignoram umas as outras?<br />

Embora os personagens estampados<br />

nessas figuras sejam desconhecidos, a<br />

cidade é tal que cada pessoa que passa<br />

sabe mais ou menos que categoria tem a<br />

outra, qual sua profissão, quais seus hábitos,<br />

qual seu estilo de vida. Por exemplo,<br />

essa mulher, por sua atitude, dá a entender que se<br />

considera muito superior àqueles outros e leva uma vida<br />

mais ordenada e mais limpa do que eles. E estes, indiretamente,<br />

respondem para ela que, sem negar que ela<br />

seja mais, eles têm um vidão livre, solto e à vontade que<br />

acham bem gostoso. Porque estão todos bem satisfeitos.<br />

Esses homens podem não saber o nome da senhora,<br />

mas sabem como ela é, como ela vive. É uma cidade pequena,<br />

com categorias e estilos de vida definidos, onde<br />

ninguém é inteiramente anônimo para outro. É diferente<br />

da avalanche de anônimos do Viaduto do Chá.<br />

Nessa cena do gueto, há algo de italiano na desordem<br />

com uma forma de pitoresco que o italiano sabe pôr e<br />

que outros não sabem. É um predicado italiano. Essa<br />

mulher cozinhando tem um pitoresco italiano no espalhafato.<br />

Normalmente, uma pessoa que faz isso, esconde<br />

Sem dúvida, há uma grande diferença entre esta desordem<br />

e a ordem do povo alemão, por uma razão muito<br />

simples: isso toca na índole do povo.<br />

O italiano é exuberante, sente, pensa e tem vontade<br />

de dizer tanta coisa, que não<br />

encontra tempo para arrumar<br />

muito as coisas.<br />

Mais ainda, isso tem muita<br />

relação com o modo de ser do<br />

brasileiro, não pela grande imigração<br />

italiana em São Paulo,<br />

porque o Brasil todo é assim,<br />

até no Nordeste, zona muito<br />

pouco italianizada; e o nordestino<br />

é mais ainda do que o brasileiro<br />

do Sul, nesse sentido.<br />

Nós, latinos, pensamos muitas<br />

vezes falando, e, se não temos<br />

ocasião de falar, não chegamos<br />

a completar o nosso pensamento.<br />

A extroversão é um<br />

modo de ser nosso para concluir<br />

o nosso pensamento. Nossos<br />

caros espanhóis falam muito<br />

e também completam muito<br />

o pensamento quando falam.<br />

O alemão é o contrário: para completar o pensamento,<br />

ele precisa recolher-se. E daí resulta que o latino tanto fala<br />

que não tem muito tempo para se arranjar. E o alemão<br />

tanto se recolhe que pensa enquanto arranja as coisas.<br />

Então, ele está pondo em ordem um papel, arranjando<br />

uma cortina, regando o gerânio, etc., e enquanto faz<br />

isso está filosofando, em todos os graus possíveis da Filosofia:<br />

desde a mais alta até a mais popular.<br />

O latino está sempre elucubrando uma coisa para o<br />

conhecimento do mundo. O alemão está elucubrando<br />

para si, depois para seus próximos, posteriormente para<br />

um clã que ele forma e com o qual ele vai pressionar<br />

outros, e depois com a nação com a qual ele pressiona o<br />

mundo. Mas a propagação da influência, para os latinos,<br />

se faz à maneira do azeite; e para os alemães, à maneira<br />

do gládio. São formas diferentes.<br />

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