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Jornal Paraná Julho 2016

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OPINIÃO<br />

Carros a diesel? Nein, danke<br />

O preço da poluição do ar é pago em mortes precoces, sobretudo<br />

por problemas cardiovasculares, como infartos e derrames<br />

MARCELO LEITE (*)<br />

Poucas colunas colheram<br />

tantas reações,<br />

nos últimos<br />

tempos, quanto a<br />

"Temer movido a diesel".<br />

Talvez tenha sido a pequena<br />

provocação do título, uma<br />

cutucada na onça ideológica<br />

que ronda qualquer debate<br />

no Brasil de hoje e cujos esturros<br />

impedem ouvir todo o<br />

resto.<br />

Surpreendeu, porém, ver<br />

que ainda há quem defenda<br />

o óleo diesel como propelente<br />

para veículos leves, ou<br />

seja, carros de passeio.<br />

Fora ser um combustível<br />

fóssil, que lança dióxido de<br />

carbono (CO 2 ) na atmosfera<br />

e assim agrava o efeito estufa,<br />

a queima desse derivado<br />

de petróleo produz a<br />

poluição do ar mais tóxica.<br />

O primeiro e grande problema<br />

do diesel é a fuligem,<br />

produto da combustão imperfeita<br />

do óleo. É um dos<br />

principais componentes do<br />

material particulado fino,<br />

capaz de penetrar fundo no<br />

pulmão e depositar materiais<br />

danosos à saúde diretamente<br />

sobre as células<br />

(não bastasse, também<br />

contribui para o aquecimento<br />

global).<br />

Em segundo<br />

lugar, o consumo<br />

de<br />

diesel emite<br />

óxidos<br />

de nitrogênio<br />

e<br />

compostos<br />

de enxofre<br />

que também<br />

são perniciosos<br />

para<br />

seres<br />

humanos.<br />

Fora dos<br />

g r a n d e s<br />

centros urbanos<br />

ainda predomina<br />

no Brasil o padrão<br />

S500, sendo que os motores<br />

a diesel mais modernos,<br />

como os que equipam carros<br />

na Europa, têm filtros<br />

que só funcionam bem com<br />

o S10.<br />

“E ainda tem gente<br />

O impedimento a comercializar<br />

diesel para veículos<br />

leves, no Brasil, não tem,<br />

contudo, origem no combate<br />

à poluição do ar. A restrição,<br />

que data dos anos<br />

1970, serve para limitar a<br />

importação desse combustível<br />

e manter seu subsídio<br />

para os transportes coletivos<br />

e de carga.<br />

Se faz bem para a saúde<br />

dos brasileiros, para que então<br />

mudar a regra? Só para<br />

ficar mais parecido com a<br />

Europa?<br />

aqui no Brasil achando<br />

que devemos seguir<br />

o exemplo alemão.”<br />

Na realidade,<br />

até os europeus<br />

já estão<br />

r e v e n d o<br />

suas políticas<br />

perm<br />

i s s i v a s<br />

com o diesel<br />

em carros<br />

de passeio.<br />

E não<br />

é só por<br />

causa dos<br />

trambiques<br />

para passar<br />

nos testes de<br />

emissão que<br />

vieram à tona com<br />

o escândalo da Volkswagen,<br />

mas por causa da poluição.<br />

O diário "Frankfurter<br />

Rundschau" trouxe uma reportagem<br />

apontando a Alemanha<br />

- sim, ela, a pátria do<br />

Partido Verde - como a<br />

campeã do continente em<br />

emporcalhamento do ar. E<br />

pôs a culpa no diesel.<br />

A Comissão Europeia tem<br />

dois processos contra o governo<br />

alemão por desrespeito<br />

aos limites de emissão<br />

de particulado fino e de dióxido<br />

de nitrogênio. No segundo<br />

caso, o limite europeu<br />

de 40 microgramas<br />

por metro cúbico de ar vem<br />

sendo ultrapassado em 29%<br />

de todas as estações medidoras<br />

no país de Angela<br />

Merkel.<br />

No caso do material particulado<br />

fino, são poucas as<br />

estações em que o teto europeu<br />

termina superado,<br />

como em Stuttgart e Leipzig.<br />

Mas só porque o padrão<br />

na UE é menos exigente<br />

que o recomendado<br />

pela Organização Mundial<br />

da Saúde, explica o jornalista<br />

Frank-Thomas Wenzel;<br />

valesse o critério da OMS,<br />

96% das estações alemãs<br />

estariam medindo níveis excessivos.<br />

O preço da poluição do ar,<br />

aqui como lá, é pago em<br />

mortes precoces, sobretudo<br />

por problemas cardiovasculares,<br />

como infartos e derrames.<br />

A OMS calculou que o<br />

custo econômico desses<br />

óbitos para a Alemanha, em<br />

2010, havia sido de US$<br />

145 bilhões, segundo o<br />

"Rundschau".<br />

E ainda tem gente aqui no<br />

Brasil achando que devemos<br />

seguir o exemplo alemão.<br />

(*) Marcelo Leite é reporter<br />

especial da Folha de<br />

S.Paulo, colunista e autor<br />

de vários livros.<br />

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<strong>Julho</strong> <strong>2016</strong> - <strong>Jornal</strong> <strong>Paraná</strong>

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