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#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves

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Impresso no Brasil – Printed in Brazil<br />

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<strong>Direito</strong>s exclusivos para o Brasil na língua portuguesa<br />

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Capa: Danilo Oliveira<br />

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Produção Digital: Equiretech<br />

Fechamento <strong>de</strong>sta edição: 03.01.<strong>2017</strong><br />

CIP – Brasil. Catalogação na fonte.<br />

Sindicato Nacional <strong>do</strong>s Editores <strong>de</strong> Livros, RJ.<br />

C35m<br />

<strong>Tartuce</strong>, <strong>Flávio</strong><br />

Manual <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r : direito material e processual / <strong>Flávio</strong> <strong>Tartuce</strong>, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção <strong>Neves</strong>.– 6.<br />

ed. rev., atual. e ampl. – Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, <strong>2017</strong>.<br />

Inclui bibliografia<br />

ISBN: 978-85-309-7450-3<br />

1. Brasil. [Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r (1990)]. 2. Defesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r - Brasil. I. <strong>Neves</strong>, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong><br />

Assumpção. II. Título.<br />

11-6847. CDU: 34:366.1(81)


A Carlos Cesar Danese Silva, meu pai.<br />

☼10.10.1946<br />

†12.10.2011<br />

“Despedida<br />

Na vida, há algumas poucas certezas e uma <strong>de</strong>las, sem dúvida, é o fato da <strong>de</strong>spedida, em que ou simplesmente partiremos ou<br />

apenas nos <strong>de</strong>spediremos… E o que dizer neste momento, em que toda palavra soa insuficiente, to<strong>do</strong> consolo é impotente e toda<br />

tentativa <strong>de</strong> discurso é menos importante que o conforto <strong>de</strong> um abraço?<br />

Não há sensação melhor na hora da tristeza <strong>do</strong> que a segurança da amiza<strong>de</strong>, o beijo <strong>de</strong> quem se ama e o carinho da<br />

solidarieda<strong>de</strong>, pois quem parte não sente… ou sente menos <strong>do</strong> que quem fica… Dor mesmo só cicatriza com o bálsamo <strong>do</strong> tempo<br />

no correr da vida…”<br />

(Ro<strong>do</strong>lfo Pamplona Filho)<br />

<strong>Flávio</strong> <strong>Tartuce</strong><br />

Na vida você po<strong>de</strong> ter duas espécies <strong>de</strong> irmão: aquele da<strong>do</strong> por seus pais<br />

e aquele que você elege como tal e que te acolhe durante sua existência.<br />

Tenho sorte <strong>de</strong> ter um irmão <strong>de</strong> sangue e um irmão <strong>de</strong> vida.<br />

Cada qual, com suas diferentes características,<br />

são pessoas fundamentais para mim,<br />

pelo que só tenho a agra<strong>de</strong>cer.<br />

Este livro é em homenagem aos meus irmãos<br />

Carlinhos e <strong>Flávio</strong> <strong>Tartuce</strong>.<br />

<strong>Daniel</strong>


NOTA DOS AUTORES<br />

Em <strong>2017</strong>, este Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r chega à sua 6ª edição e, como sempre, intenso foi o trabalho <strong>de</strong> atualização<br />

da obra.<br />

Para esta nova versão foram incluí<strong>do</strong>s os principais julgamentos <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça prolata<strong>do</strong>s no ano <strong>de</strong> 2016,<br />

especialmente aqueles publica<strong>do</strong>s nos seus Informativos <strong>de</strong> Jurisprudência, tanto em relação ao <strong>Direito</strong> Material quanto ao <strong>Direito</strong><br />

Processual.<br />

Também incluímos as principais ementas que constam da ferramenta Jurisprudência em Teses, <strong>do</strong> mesmo Tribunal da<br />

Cidadania, <strong>de</strong>stacan<strong>do</strong>-se a Edição n. 59, que trata <strong>do</strong> cadastro <strong>de</strong> inadimplentes. As teses estão acompanhadas das correspon<strong>de</strong>ntes<br />

análises críticas, como é comum nesta obra.<br />

Além da atualização jurispru<strong>de</strong>ncial, o livro traz novas reflexões <strong>do</strong>utrinárias <strong>do</strong>s autores, inclusive sobre temas<br />

contemporâneos e a respeito <strong>do</strong> Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Compartilhamos, ainda, algumas <strong>de</strong> nossas experiências práticas<br />

<strong>do</strong> último ano, mesmo que implicitamente.<br />

Esperamos que, na linha das edições anteriores, o livro seja bem recebi<strong>do</strong> pelo merca<strong>do</strong> editorial jurídico e que continue<br />

servin<strong>do</strong> <strong>de</strong> instrumento para a correta efetivação <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r no Brasil, por professores, alunos, advoga<strong>do</strong>s,<br />

promotores e julga<strong>do</strong>res.<br />

Bons estu<strong>do</strong>s, é o que sempre <strong>de</strong>sejamos!<br />

São Paulo, <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2016.<br />

Os autores


APRESENTAÇÃO<br />

Quan<strong>do</strong> os autores da presente obra se conheceram – nas Arcadas <strong>do</strong> Largo <strong>de</strong> São Francisco, nos i<strong>do</strong>s <strong>de</strong> 1994 – não<br />

pensavam que iriam se tornar professores e autores <strong>de</strong> obras jurídicas. Por uma daquelas graciosas surpresas da vida, os caminhos<br />

<strong>de</strong> ambos se cruzaram e seguiram em paralelo, tanto no aspecto pessoal quanto no profissional. Mergulha<strong>do</strong>s profundamente na<br />

vida acadêmica, cá estão eles, assinan<strong>do</strong>, a quatro mãos, este livro sobre o impactante tema <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, em uma<br />

visão interdisciplinar (material e processual).<br />

Nesses quase 20 anos <strong>de</strong> convivência, os autores estiveram juntos nos principais momentos <strong>de</strong> suas vidas profissionais,<br />

lecionan<strong>do</strong> nos mesmos cursos preparatórios para as carreiras jurídicas, escolas <strong>de</strong> pós-graduação, entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> classe, seminários<br />

e congressos jurídicos. Apesar <strong>de</strong> alguns <strong>de</strong>sencontros, <strong>de</strong> diferentes caminhos trilha<strong>do</strong>s, a vida sempre se encarregou <strong>de</strong> uni-los<br />

novamente. No aspecto pessoal, a fiel amiza<strong>de</strong> perdura, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os tempos à frente da Associação Atlética XI <strong>de</strong> Agosto.<br />

Para comemorar to<strong>do</strong> esse tempo <strong>de</strong> rara amiza<strong>de</strong>, nada melhor <strong>do</strong> que a construção <strong>de</strong> uma obra em conjunto, unin<strong>do</strong> a<br />

experiência <strong>de</strong> ambos na seara consumerista, um <strong>do</strong>s ramos jurídicos <strong>de</strong> maior incidência na contemporaneida<strong>de</strong>.<br />

O presente livro procura analisar os principais conceitos e construções que fazem parte da Lei 8.078, <strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong><br />

1990, nos aspectos materiais e processuais. A sua organização segue justamente a divisão meto<strong>do</strong>lógica constante naquela lei.<br />

Desse mo<strong>do</strong>, o Capítulo 1 procura situar o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r no or<strong>de</strong>namento jurídico nacional, a fim <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>limitar a sua forma <strong>de</strong> incidência, com amparo especial na festejada tese <strong>do</strong> diálogo das fontes. Em continuida<strong>de</strong>, o Capítulo 2<br />

<strong>do</strong> livro aborda os princípios estruturantes da matéria, retira<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s arts. 4.º e 6.º da Lei 8.078/1990, em uma visão teórica e<br />

prática. No Capítulo 3, são estuda<strong>do</strong>s os elementos da relação jurídica <strong>de</strong> consumo (elementos subjetivos e objetivos), ten<strong>do</strong> como<br />

parâmetros estruturais os arts. 2.º e 3.º <strong>do</strong> CDC, sem prejuízo <strong>de</strong> outros coman<strong>do</strong>s, caso <strong>do</strong>s seus arts. 17 e 29, que tratam <strong>do</strong><br />

conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r por equiparação ou bystan<strong>de</strong>r. O Capítulo 4 traz como cerne <strong>de</strong> estu<strong>do</strong> a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong>s<br />

fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos e presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços, um <strong>do</strong>s temas mais importantes <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r na atualida<strong>de</strong>,<br />

matéria tratada entre os arts. 8.º a 27 <strong>do</strong> CDC. O Capítulo 5 tem por objeto a proteção contratual <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, constante <strong>do</strong>s<br />

arts. 46 ao 54, seção que traz as regras fundamentais para a realida<strong>de</strong> negocial contemporânea consumerista. Ten<strong>do</strong> por objeto<br />

também as práticas comerciais, assim como o tópico anterior, o Capítulo 6 aborda a proteção <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res quanto à oferta e à<br />

publicida<strong>de</strong> (arts. 30 a 38). No Capítulo 7, igualmente com relação às práticas comerciais, verifica-se o estu<strong>do</strong> das práticas<br />

abusivas, ten<strong>do</strong> como parâmetro os arts. 30 a 42 da Lei Consumerista. O importante e atual tema <strong>do</strong>s cadastros <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res é<br />

a matéria <strong>do</strong> Capítulo 8, com análise da natureza <strong>do</strong>s cadastros positivos e negativos (arts. 43 e 44 <strong>do</strong> CDC), à luz da melhor<br />

<strong>do</strong>utrina e da atual jurisprudência nacional. O Capítulo 9 trata <strong>de</strong> aspectos materiais da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica.<br />

Esses nove primeiros capítulos foram <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong>s pelo coautor <strong>Flávio</strong> <strong>Tartuce</strong>.<br />

O Capítulo 10 analisa questões da <strong>de</strong>fesa individual <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo, com abordagem bem próxima <strong>do</strong> dia a dia <strong>do</strong><br />

profissional da área jurídica. O Capítulo 11 aborda a tutela coletiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo, <strong>de</strong> forma técnica e profunda. O<br />

Capítulo 12 trata da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica em aspectos processuais. No Capítulo 13, intitula<strong>do</strong> Or<strong>de</strong>m Pública<br />

e Tutela Processual <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, faz-se uma análise inédita a respeito da matéria, tão cara aos processualistas. Para finalizar, o<br />

Capítulo 14 apresenta consi<strong>de</strong>rações sobre o habeas data. Estes cinco últimos capítulos foram escritos pelo coautor <strong>Daniel</strong><br />

<strong>Amorim</strong> Assumpção <strong>Neves</strong>.<br />

Esclareça-se que a obra tem a i<strong>de</strong>ntificação seccionada <strong>do</strong>s autores na parte superior das páginas, diante <strong>de</strong> alguns<br />

distanciamentos i<strong>de</strong>ológicos <strong>do</strong>s escritores, como é comum entre os civilistas e processualistas quan<strong>do</strong> da abordagem <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong>


Consumi<strong>do</strong>r. Nessa alterida<strong>de</strong>, aliás, acreditam os autores, está presente a gran<strong>de</strong> contribuição <strong>do</strong> livro para a ciência jurídica.<br />

To<strong>do</strong>s os dispositivos <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r importantes à seara material e processual são <strong>de</strong>vidamente comenta<strong>do</strong>s,<br />

acompanha<strong>do</strong>s <strong>de</strong> posicionamentos <strong>do</strong>utrinários e jurispru<strong>de</strong>nciais recentes, bem como da análise <strong>de</strong> exemplos práticos, retira<strong>do</strong>s<br />

das experiências <strong>do</strong>s autores, seja na advocacia, na atuação consultiva ou na <strong>do</strong>cência.<br />

O livro é direciona<strong>do</strong> a to<strong>do</strong> o público jurídico: magistra<strong>do</strong>s, promotores <strong>de</strong> justiça, procura<strong>do</strong>res, advoga<strong>do</strong>s, estudantes <strong>de</strong><br />

graduação e pós-graduação, e aqueles que se preparam para os concursos públicos e as provas das carreiras jurídicas. Diante da<br />

clareza <strong>de</strong> linguagem e da forma <strong>de</strong> exposição <strong>do</strong>s temas, este trabalho também é indica<strong>do</strong> para leigos, que têm interesse em<br />

conhecer o <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r nacional.<br />

Para a prática, há interessantes digressões, inclusive com a análise <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis, em que muitos<br />

advoga<strong>do</strong>s iniciam suas carreiras – caso <strong>do</strong>s presentes autores –, especialmente lidan<strong>do</strong> com a matéria <strong>de</strong>ste livro.<br />

Espera-se que a presente obra seja bem recebida pelo público jurídico nacional, a exemplo <strong>de</strong> outras <strong>do</strong>s autores. Cumpre<br />

<strong>de</strong>stacar que este livro tem um toque especial, pois foi construí<strong>do</strong> sobre o alicerce da amiza<strong>de</strong> e <strong>do</strong> companheirismo, nasci<strong>do</strong>s na<br />

Gloriosa Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Largo <strong>de</strong> São Francisco.<br />

Saudações acadêmicas!<br />

São Paulo, outubro <strong>de</strong> 2011.<br />

Os autores


SUMÁRIO<br />

1.ª Parte<br />

DIREITO MATERIAL<br />

<strong>Flávio</strong> <strong>Tartuce</strong><br />

1.<br />

2.<br />

3.<br />

O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E SUA POSIÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO<br />

1.1. Primeiras palavras sobre o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. O CDC e a pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> jurídica<br />

1.2. O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r como norma principiológica. Sua posição hierárquica<br />

1.3. O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e a teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes<br />

1.4. O conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e a organização da presente obra<br />

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR<br />

2.1. Primeiras palavras sobre os princípios jurídicos<br />

2.2. Princípio <strong>do</strong> protecionismo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (art. 1º da Lei 8.078/1990)<br />

2.3. Princípio da vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (art. 4º, inc. I, da Lei 8.078/1990)<br />

2.4. Princípio da hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (art. 6º, inc. VIII, da Lei 8.078/1990)<br />

2.5. Princípio da boa-fé objetiva (art. 4º, inc. III, da Lei 8.078/1990)<br />

2.6. Princípio da transparência ou da confiança (arts. 4º, caput, e 6º, inc. III, da Lei 8.078/1990). A tutela da informação<br />

2.7. Princípio da função social <strong>do</strong> contrato<br />

2.8. Princípio da equivalência negocial (art. 6º, inc. II, da Lei 8.078/1990)<br />

2.9. Princípio da reparação integral <strong>do</strong>s danos (art. 6º, inc. VI, da Lei 8.078/1990). Os danos reparáveis nas relações <strong>de</strong><br />

consumo<br />

ELEMENTOS DA RELAÇÃO JURÍDICA DE CONSUMO<br />

3.1. A estrutura da relação jurídica <strong>de</strong> consumo. Visão geral<br />

3.2. Os elementos subjetivos da relação <strong>de</strong> consumo<br />

3.2.1. O fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos e o presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços. O conceito <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong><br />

3.2.2. O consumi<strong>do</strong>r. Teorias existentes. O consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> ou bystan<strong>de</strong>r<br />

3.3. Elementos objetivos da relação <strong>de</strong> consumo<br />

3.3.1. Produto<br />

3.3.2. Serviço


3.4.<br />

Exemplos <strong>de</strong> outras relações jurídicas contemporâneas e o seu enquadramento como relações <strong>de</strong> consumo<br />

3.4.1. O contrato <strong>de</strong> transporte e a incidência <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

3.4.2. Os serviços públicos e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

3.4.3. O con<strong>do</strong>mínio edilício e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

3.4.4. A incidência <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r para os contratos <strong>de</strong> locação urbana<br />

3.4.5. A Lei 8.078/1990 e a previdência privada complementar<br />

3.4.6. Prestação <strong>de</strong> serviços educacionais como serviço <strong>de</strong> consumo<br />

3.4.7. As ativida<strong>de</strong>s notariais e registrais e a Lei 8.078/1990<br />

3.4.8. As relações entre advoga<strong>do</strong>s e clientes e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

4.<br />

5.<br />

RESPONSABILIDADE CIVIL PELO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR<br />

4.1. A unificação da responsabilida<strong>de</strong> civil pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. A responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva e<br />

solidária como regra <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r (risco-proveito). A responsabilida<strong>de</strong> subjetiva <strong>do</strong>s profissionais<br />

liberais como exceção<br />

4.2. Análise <strong>do</strong>s casos específicos <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

4.2.1. As quatro hipóteses tratadas pela Lei 8.078/1990 em relação ao produto e ao serviço. Vício versus fato (<strong>de</strong>feito).<br />

Panorama geral e a questão da solidarieda<strong>de</strong><br />

4.2.2. Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo vício <strong>do</strong> produto<br />

4.2.3. Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo fato <strong>do</strong> produto ou <strong>de</strong>feito<br />

4.2.4. Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo vício <strong>do</strong> serviço<br />

4.2.5. Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo fato <strong>do</strong> serviço ou <strong>de</strong>feito<br />

4.3. O consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> e a responsabilida<strong>de</strong> civil. Aprofundamentos quanto ao tema e confrontações em relação<br />

ao art. 931 <strong>do</strong> Código Civil<br />

4.4. Exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

4.4.1. As exclu<strong>de</strong>ntes da não colocação <strong>do</strong> produto no merca<strong>do</strong> e da ausência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito<br />

4.4.2. A exclu<strong>de</strong>nte da culpa ou fato exclusivo <strong>de</strong> terceiro<br />

4.4.3. A exclu<strong>de</strong>nte da culpa ou fato exclusivo <strong>do</strong> próprio consumi<strong>do</strong>r<br />

4.4.4. O enquadramento <strong>do</strong> caso fortuito e da força maior como exclu<strong>de</strong>ntes da responsabilida<strong>de</strong> civil consumerista<br />

4.4.5. Os riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento como exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

4.5. O fato concorrente <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r como atenuante da responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res<br />

4.6. A responsabilida<strong>de</strong> civil pelo cigarro e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

4.7. A responsabilida<strong>de</strong> civil pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e o recall<br />

A PROTEÇÃO CONTRATUAL PELO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR<br />

5.1. O conceito contemporâneo ou pós-mo<strong>de</strong>rno <strong>de</strong> contrato e o <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Os contratos coliga<strong>do</strong>s e os<br />

contratos cativos <strong>de</strong> longa duração<br />

5.2. A revisão contratual por fato superveniente no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

5.3. A função social <strong>do</strong> contrato e a não vinculação das cláusulas <strong>de</strong>sconhecidas e incompreensíveis (art. 46 <strong>do</strong> CDC). A<br />

interpretação mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r (art. 47 <strong>do</strong> CDC)<br />

5.4. A força vinculativa <strong>do</strong>s escritos e a boa-fé objetiva nos contratos <strong>de</strong> consumo (art. 48 da Lei 8.078/1990). A aplicação<br />

<strong>do</strong>s conceitos parcelares da boa-fé objetiva<br />

5.4.1.<br />

5.4.2.<br />

5.4.3.<br />

Supressio e surrectio<br />

Tu quoque<br />

Exceptio <strong>do</strong>li


5.5.<br />

5.6.<br />

5.7.<br />

5.8.<br />

5.9.<br />

5.4.4.<br />

Venire contra factum proprium<br />

5.4.5. Duty to mitigate the loss<br />

O direito <strong>de</strong> arrependimento nos contratos <strong>de</strong> consumo (art. 49 da Lei 8.078/1990)<br />

A garantia contratual <strong>do</strong> art. 50 da Lei 8.078/1990<br />

As cláusulas abusivas no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Análise <strong>do</strong> rol exemplificativo <strong>do</strong> art. 51 da Lei 8.078/1990<br />

e suas <strong>de</strong>corrências<br />

5.7.1. Cláusulas que impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r por vícios <strong>de</strong> qualquer<br />

natureza <strong>do</strong>s produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição <strong>de</strong> direitos (art. 51, inc. I, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.2. Cláusulas que subtraiam ao consumi<strong>do</strong>r a opção <strong>de</strong> reembolso da quantia já paga (art. 51, inc. II, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.3. Cláusulas que transfiram responsabilida<strong>de</strong>s a terceiros (art. 51, inc. III, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.4. Cláusulas que estabeleçam obrigações consi<strong>de</strong>radas iníquas, abusivas, que coloquem o consumi<strong>do</strong>r em<br />

<strong>de</strong>svantagem exagerada, ou que sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equida<strong>de</strong> (art. 51, inc. IV, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.5. Cláusulas que estabeleçam inversão <strong>do</strong> ônus da prova em prejuízo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. VI, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.6. Cláusulas que <strong>de</strong>terminem a utilização compulsória <strong>de</strong> arbitragem (art. 51, inc. VII, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.7. Cláusulas que imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumi<strong>do</strong>r (art.<br />

51, inc. VIII, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.8. Cláusulas que <strong>de</strong>ixem ao fornece<strong>do</strong>r a opção <strong>de</strong> concluir ou não o contrato, embora obrigan<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r<br />

(art. 51, inc. IX, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.9. Cláusulas que permitam ao fornece<strong>do</strong>r, direta ou indiretamente, variação <strong>do</strong> preço <strong>de</strong> maneira unilateral (art.<br />

51, inc. X, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.10. Cláusulas que autorizem o fornece<strong>do</strong>r a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja<br />

conferi<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. XI, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.11. Cláusulas que obriguem o consumi<strong>do</strong>r a ressarcir os custos <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> sua obrigação, sem que igual<br />

direito lhe seja conferi<strong>do</strong> contra o fornece<strong>do</strong>r (art. 51, inc. XII, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.12. Cláusulas que autorizem o fornece<strong>do</strong>r a modificar unilateralmente o conteú<strong>do</strong> ou a qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> contrato,<br />

após sua celebração (art. 51, inc. XIII, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.13. Cláusulas que infrinjam ou possibilitem a violação <strong>de</strong> normas ambientais (art. 51, inc. XIV, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.14. Cláusulas que estejam em <strong>de</strong>sacor<strong>do</strong> com o sistema <strong>de</strong> proteção ao consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. XV, <strong>do</strong> CDC)<br />

5.7.15. Cláusulas que possibilitem a renúncia <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por benfeitorias necessárias (art. 51, inc. XVI,<br />

<strong>do</strong> CDC)<br />

Os contratos <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> crédito na Lei 8.078/1990 (art. 52) e o problema <strong>do</strong> superendividamento <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r. A nulida<strong>de</strong> absoluta da cláusula <strong>de</strong> <strong>de</strong>caimento (art. 53)<br />

O tratamento <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são pelo art. 54 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

6.<br />

A PROTEÇÃO QUANTO À OFERTA E À PUBLICIDADE NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR<br />

6.1. Panorama geral sobre a tutela da informação e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

6.2. A força vinculativa da oferta no art. 30 da Lei 8.078/1990<br />

6.3. O conteú<strong>do</strong> da oferta e a manutenção <strong>de</strong> sua integralida<strong>de</strong><br />

6.4. A responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva e solidária <strong>de</strong>corrente da oferta<br />

6.5. A publicida<strong>de</strong> no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Princípios informa<strong>do</strong>res. Publicida<strong>de</strong>s vedadas ou ilícitas<br />

6.5.1. A vedação da publicida<strong>de</strong> mascarada, clan<strong>de</strong>stina, simulada ou dissimulada (art. 36 <strong>do</strong> CDC)<br />

6.5.2. A vedação da publicida<strong>de</strong> enganosa (art. 37, § 1º, <strong>do</strong> CDC)<br />

6.5.3. A vedação da publicida<strong>de</strong> abusiva (art. 37, § 2º, <strong>do</strong> CDC)<br />

6.6. O ônus da prova da veracida<strong>de</strong> da informação publicitária


7.<br />

8.<br />

O ABUSO DE DIREITO CONSUMERISTA. AS PRÁTICAS ABUSIVAS VEDADAS PELA LEI 8.078/1990 E SUAS<br />

CONSEQUÊNCIAS PRÁTICAS<br />

7.1.<br />

7.2.<br />

7.3.<br />

7.4.<br />

7.5.<br />

Algumas palavras sobre o abuso <strong>de</strong> direito<br />

Estu<strong>do</strong> das práticas abusivas enumeradas pelo art. 39 <strong>do</strong> CDC<br />

7.2.1. Condicionar o fornecimento <strong>de</strong> produto ou <strong>de</strong> serviço ao fornecimento <strong>de</strong> outro produto ou serviço, bem<br />

como, sem justa causa, a limites quantitativos (art. 39, inc. I, <strong>do</strong> CDC)<br />

7.2.2. Recusar atendimento às <strong>de</strong>mandas <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, na exata medida <strong>de</strong> suas disponibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> estoque,<br />

e, ainda, <strong>de</strong> conformida<strong>de</strong> com os usos e costumes (art. 39, inc. II, <strong>do</strong> CDC)<br />

7.2.3. Enviar ou entregar ao consumi<strong>do</strong>r, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço (art.<br />

39, inc. III, <strong>do</strong> CDC)<br />

7.2.4. Prevalecer-se da fraqueza ou ignorância <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, ten<strong>do</strong> em vista a sua ida<strong>de</strong>, saú<strong>de</strong> e condição social,<br />

para ven<strong>de</strong>r-lhe produto ou serviço (art. 39, inc. IV, <strong>do</strong> CDC)<br />

7.2.5. Exigir <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r vantagem manifestamente excessiva (art. 39, inc. V, <strong>do</strong> CDC)<br />

7.2.6. Executar serviços sem a prévia elaboração <strong>de</strong> orçamento e autorização expressa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, ressalvadas as<br />

<strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> práticas anteriores entre as partes (art. 39, inc. VI, <strong>do</strong> CDC)<br />

7.2.7. Repassar informação <strong>de</strong>preciativa referente a ato pratica<strong>do</strong> pelo consumi<strong>do</strong>r no exercício <strong>de</strong> seus direitos (art.<br />

39, inc. VII, <strong>do</strong> CDC)<br />

7.2.8. Colocar, no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo, qualquer produto ou serviço em <strong>de</strong>sacor<strong>do</strong> com as normas expedidas pelos<br />

órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira <strong>de</strong> Normas<br />

Técnicas (ABNT) ou outra entida<strong>de</strong> cre<strong>de</strong>nciada pelo Conselho Nacional <strong>de</strong> Metrologia, Normalização e<br />

Qualida<strong>de</strong> Industrial – CONMETRO (art. 39, inc. VIII, <strong>do</strong> CDC)<br />

7.2.9. Recusar a venda <strong>de</strong> bens ou a prestação <strong>de</strong> serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante<br />

pronto pagamento, ressalva<strong>do</strong>s os casos <strong>de</strong> intermediação regula<strong>do</strong>s em leis especiais (art. 39, inc. IX, <strong>do</strong><br />

CDC)<br />

7.2.10. Elevar sem justa causa o preço <strong>de</strong> produtos ou serviços (art. 39, inc. X, <strong>do</strong> CDC)<br />

7.2.11. Aplicar fórmula ou índice <strong>de</strong> reajuste diverso <strong>do</strong> legal ou contratualmente estabeleci<strong>do</strong> (art. 39, inc. XIII, <strong>do</strong><br />

CDC)<br />

7.2.12. Deixar <strong>de</strong> estipular prazo para o cumprimento <strong>de</strong> sua obrigação ou <strong>de</strong>ixar a fixação <strong>de</strong> seu termo inicial a seu<br />

exclusivo critério (art. 39, inc. XII, <strong>do</strong> CDC)<br />

A necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> respeito ao tabelamento oficial, sob pena <strong>de</strong> caracterização <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito (art. 41 <strong>do</strong> CDC)<br />

O abuso <strong>de</strong> direito na cobrança <strong>de</strong> dívidas (art. 42, caput, <strong>do</strong> CDC). O problema <strong>do</strong> corte <strong>de</strong> serviço essencial. A<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> informações na cobrança (art. 42-A <strong>do</strong> CDC)<br />

A repetição <strong>de</strong> indébito no caso <strong>de</strong> cobrança abusiva (art. 42, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC)<br />

BANCO DE DADOS E CADASTRO DE CONSUMIDORES<br />

8.1. A natureza jurídica <strong>do</strong>s bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e cadastros e sua importante aplicabilida<strong>de</strong> social. Diferenças entre as<br />

categorias<br />

8.2. O conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong>s arts. 43 e 44 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e seus efeitos. A interpretação jurispru<strong>de</strong>ncial<br />

8.2.1. A inscrição ou registro <strong>do</strong> nome <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res<br />

8.2.2. A retificação ou correção <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s<br />

8.2.3. O cancelamento da inscrição<br />

8.2.4. A reparação <strong>do</strong>s danos nos casos <strong>de</strong> inscrição in<strong>de</strong>vida <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r. Crítica à Súmula 385 <strong>do</strong> STJ.<br />

Prazo para se pleitear a reparação<br />

8.2.5. O cadastro <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res e o alcance <strong>do</strong> art. 44 da Lei 8.078/1990<br />

8.3. O cadastro positivo. Breve análise da Lei 12.414, <strong>de</strong> 9 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 2011


9.<br />

A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (ART. 28 DA LEI<br />

8.078/1990). ASPECTOS MATERIAIS<br />

2.ª parte<br />

DIREITO PROCESSUAL<br />

<strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção <strong>Neves</strong><br />

10.<br />

TUTELA INDIVIDUAL DO CONSUMIDOR EM JUÍZO<br />

10.1. Introdução<br />

10.2. Meios <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos<br />

10.2.1. Introdução<br />

10.2.2. Jurisdição<br />

10.2.3. Equivalentes jurisdicionais<br />

10.2.3.1. Autotutela<br />

10.2.3.2. Autocomposição<br />

10.2.3.3. Mediação<br />

10.2.3.4. Conciliação e mediação no Novo CPC<br />

10.2.3.5. Arbitragem<br />

10.3. Tutela específica das obrigações <strong>de</strong> fazer e não fazer<br />

10.3.1. Introdução<br />

10.3.2. Tutela jurisdicional<br />

10.3.2.1. Tutela jurisdicional específica<br />

10.3.2.2. Tutela inibitória<br />

10.3.3. Procedimento previsto pelo art. 84 <strong>do</strong> CDC<br />

10.3.3.1. Introdução<br />

10.3.3.2. Obtenção <strong>de</strong> tutela específica ou <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> providências que assegurem o resulta<strong>do</strong><br />

prático equivalente ao <strong>do</strong> adimplemento<br />

10.3.3.3. Conversão em perdas e danos<br />

10.3.3.4. Tutela <strong>de</strong> urgência<br />

10.3.3.5. Tutela da evidência<br />

10.3.3.6. Atipicida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s meios executivos<br />

10.3.3.7. Multa<br />

10.4. Competência<br />

10.4.1. Introdução<br />

10.4.2. Competência da Justiça<br />

10.4.3. Competência territorial<br />

10.4.3.1. Cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro<br />

10.4.4. Competência <strong>do</strong> juízo<br />

10.5. Intervenções <strong>de</strong> terceiros<br />

10.5.1. Introdução<br />

10.5.2. Denunciação da li<strong>de</strong><br />

10.5.2.1. Vedação legal


10.6.<br />

10.7.<br />

10.5.2.2. Fundamentos da vedação legal<br />

10.5.3. Chamamento ao processo<br />

10.5.3.1. Introdução<br />

10.5.3.2. Espécie atípica <strong>de</strong> chamamento ao processo<br />

10.5.3.3. Ação diretamente proposta contra a segura<strong>do</strong>ra<br />

10.5.3.4. Vedação <strong>de</strong> integração <strong>do</strong> Instituto <strong>de</strong> Resseguros <strong>do</strong> Brasil<br />

Litisconsórcio alternativo e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

Inversão <strong>do</strong> ônus da prova<br />

10.7.1. Ônus da prova<br />

10.7.2. Regras <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong> ônus da prova<br />

10.7.3. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova<br />

10.7.3.1. Inversão convencional<br />

10.7.3.2. Inversão legal<br />

10.7.3.3. Inversão judicial<br />

10.7.4. Momento <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova<br />

10.7.5. Inversão da prova e inversão <strong>do</strong> adiantamento <strong>de</strong> custas processuais<br />

11.<br />

TUTELA COLETIVA DO CONSUMIDOR EM JUÍZO<br />

11.1. Introdução<br />

11.1.1. Tutela jurisdicional coletiva<br />

11.1.2. Origem da tutela jurisdicional coletiva<br />

11.1.3. Microssistema coletivo<br />

11.1.4. Marcos legislativos<br />

11.2. Espécies <strong>de</strong> direitos protegi<strong>do</strong>s pela tutela coletiva<br />

11.2.1. Introdução<br />

11.2.2. <strong>Direito</strong>s ou interesses?<br />

11.2.3. <strong>Direito</strong> difuso<br />

11.2.4. <strong>Direito</strong> coletivo<br />

11.2.5. <strong>Direito</strong>s individuais homogêneos<br />

11.2.6. I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s e diferenças entre os direitos coletivos lato sensu<br />

11.2.7. <strong>Direito</strong>s individuais indisponíveis<br />

11.3. Competência na tutela coletiva<br />

11.3.1. Competência absoluta: funcional ou territorial?<br />

11.3.2. Competência absoluta <strong>do</strong> foro<br />

11.3.3. Dano local, regional e nacional<br />

11.4. Legitimida<strong>de</strong><br />

11.4.1. Espécies <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong><br />

11.4.2. Cidadão<br />

11.4.3. Ministério Público<br />

11.4.4. Pessoas jurídicas da Administração Pública<br />

11.4.5. Associação<br />

11.4.5.1. Introdução


11.5.<br />

11.6.<br />

11.7.<br />

11.8.<br />

11.9.<br />

11.4.5.2. Constituição há pelo menos um ano<br />

11.4.5.3. Pertinência temática<br />

11.4.5.4. Representação a<strong>de</strong>quada (a<strong>de</strong>quacy of representantion)<br />

11.4.6. Defensoria Pública<br />

Relação entre a ação coletiva e a individual<br />

11.5.1. Introdução<br />

11.5.2. Litispendência<br />

11.5.3. Conexão e continência<br />

11.5.3.1. Conceito<br />

11.5.3.2. Insuficiência <strong>do</strong> conceito legal <strong>de</strong> conexão<br />

11.5.3.3. Vantagens e <strong>de</strong>svantagens da reunião <strong>do</strong>s processos<br />

11.5.3.4. Obrigatorieda<strong>de</strong> ou facultativida<strong>de</strong> na reunião <strong>de</strong> processos em razão da conexão<br />

11.5.3.5. Especificamente na relação entre ação coletiva e individual<br />

11.5.4. Suspensão <strong>do</strong> processo individual<br />

11.5.5. Extinção <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança individual<br />

Coisa julgada<br />

11.6.1. Introdução<br />

11.6.2. Coisa julgada secundum eventum probationis<br />

11.6.3. Coisa julgada secundum eventum litis<br />

11.6.4. Limitação territorial da coisa julgada<br />

Gratuida<strong>de</strong><br />

11.7.1. Introdução<br />

11.7.2. Isenção <strong>de</strong> adiantamento<br />

11.7.3. Con<strong>de</strong>nação em verbas <strong>de</strong> sucumbência<br />

Liquidação <strong>de</strong> sentença<br />

11.8.1. Conceito <strong>de</strong> liqui<strong>de</strong>z e obrigações liquidáveis<br />

11.8.2. Natureza jurídica da liquidação<br />

11.8.3. Legitimida<strong>de</strong> ativa<br />

11.8.4. Competência<br />

11.8.5. Espécies <strong>de</strong> liquidação <strong>de</strong> sentença<br />

11.8.6. <strong>Direito</strong> difuso e coletivo<br />

11.8.7. <strong>Direito</strong> individual homogêneo<br />

11.8.8. Liquidação individual das sentenças <strong>de</strong> direito difuso e coletivo<br />

Execução<br />

11.9.1. Processo <strong>de</strong> execução e cumprimento <strong>de</strong> sentença<br />

11.9.1.1. Execução por sub-rogação e indireta<br />

11.9.1.2. Prescrição<br />

11.9.2. Legitimida<strong>de</strong> ativa<br />

11.9.3. <strong>Direito</strong>s difusos e coletivos<br />

11.9.4. <strong>Direito</strong>s individuais homogêneos<br />

11.9.4.1. Introdução<br />

11.9.4.2. Execução por fluid recovery


11.9.5.<br />

11.9.4.3. Legitimida<strong>de</strong><br />

Regime jurídico das <strong>de</strong>spesas e custas processuais<br />

12.<br />

13.<br />

14.<br />

ASPECTOS PROCESSUAIS DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO CÓDIGO DE DEFESA DO<br />

CONSUMIDOR<br />

12.1. Introdução<br />

12.2. Responsabilida<strong>de</strong> patrimonial secundária<br />

12.3. Forma procedimental da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica<br />

12.3.1. Introdução<br />

12.3.2. Momento<br />

12.3.3. Procedimento<br />

12.3.4. Forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> sócio (ou da socieda<strong>de</strong> na <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração inversa)<br />

12.3.5. Recorribilida<strong>de</strong><br />

12.3.6. Frau<strong>de</strong> à execução<br />

12.4. Desconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica <strong>de</strong> ofício<br />

ORDEM PÚBLICA E TUTELA PROCESSUAL DO CONSUMIDOR<br />

13.1. Matérias <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa<br />

13.2. Preclusão temporal<br />

13.3. Preclusão consumativa<br />

13.4. Objeções e natureza <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública das normas consumeristas<br />

HABEAS DATA E DIREITO DO CONSUMIDOR<br />

14.1. Introdução<br />

14.2. <strong>Direito</strong> à informação e habeas data<br />

14.3. Hipóteses <strong>de</strong> cabimento<br />

14.3.1. Introdução<br />

14.3.2. <strong>Direito</strong> à informação<br />

14.3.3. <strong>Direito</strong> à retificação <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s<br />

14.3.4. Anotação sobre da<strong>do</strong> verda<strong>de</strong>iro<br />

14.4. Fase administrativa<br />

14.4.1. Interesse <strong>de</strong> agir<br />

14.4.2. Procedimento<br />

14.4.2.1. Fase pré-processual<br />

14.4.2.2. Fase processual<br />

14.5. Liminar<br />

14.6. Legitimida<strong>de</strong><br />

14.6.1. Legitimida<strong>de</strong> ativa<br />

14.6.2. Legitimida<strong>de</strong> passiva<br />

14.7. Competência<br />

14.8. Recursos<br />

BIBLIOGRAFIA


O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E SUA<br />

POSIÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO<br />

BRASILEIRO<br />

Sumário: 1.1. Primeiras palavras sobre o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. O CDC e a pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> jurídica –<br />

1.2. O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r como norma principiológica. Sua posição hierárquica – 1.3. O Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e a teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes – 1.4. O conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e a<br />

organização da presente obra.<br />

1.1.<br />

PRIMEIRAS PALAVRAS SOBRE O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. O<br />

CDC E A PÓS-MODERNIDADE JURÍDICA<br />

O Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, conheci<strong>do</strong> e <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> pelas iniciais CDC, foi instituí<strong>do</strong> pela Lei<br />

8.078/1990, constituin<strong>do</strong> uma típica norma <strong>de</strong> proteção <strong>de</strong> vulneráveis. Por <strong>de</strong>terminação da or<strong>de</strong>m constante <strong>do</strong> art. 48 das<br />

Disposições Finais e Transitórias da Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988, <strong>de</strong> elaboração <strong>de</strong> um Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r no prazo <strong>de</strong> cento<br />

e vinte dias, formou-se uma comissão para a elaboração <strong>de</strong> um anteprojeto <strong>de</strong> lei, composta por Ada Pellegrini Grinover<br />

(coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>ra), <strong>Daniel</strong> Roberto Fink, José Geral<strong>do</strong> Brito Filomeno, Kazuo Watanabe e Zelmo Denari. Também houve uma intensa<br />

colaboração <strong>de</strong> Antonio Herman <strong>de</strong> Vasconcellos e Benjamin, Eliana Cáceres, Marcelo Gomes Sodré, Mariângela Sarrubo, Nelson<br />

Nery Jr. e Régis Rodrigues Bonvicino.1<br />

Como norma vigente, o nosso Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r situa-se na especialida<strong>de</strong>, segunda parte da isonomia<br />

constitucional, retirada <strong>do</strong> art. 5º, caput, da CF/1988. A<strong>de</strong>mais, o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> Código Consumerista <strong>de</strong>monstra tratar-se <strong>de</strong> uma<br />

norma adaptada à realida<strong>de</strong> contemporânea da pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> jurídica. A expressão pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> é utilizada para simbolizar<br />

o rompimento <strong>do</strong>s paradigmas construí<strong>do</strong>s ao longo da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, quebra ocorrida ao final <strong>do</strong> século XX. Mais precisamente,<br />

parece correto dizer que o ano <strong>de</strong> 1968 é um bom parâmetro para se apontar o início <strong>de</strong>sse perío<strong>do</strong>, diante <strong>de</strong> protestos e<br />

movimentos em prol da liberda<strong>de</strong> e <strong>de</strong> outros valores sociais que eclodiram em to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>. 2 Em tais reivindicações po<strong>de</strong> ser<br />

encontrada a origem <strong>de</strong> leis contemporâneas com preocupação social, caso <strong>do</strong> Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

De acor<strong>do</strong> com os ensinamentos <strong>de</strong> Eduar<strong>do</strong> Bianca Bittar, a pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> significa “o esta<strong>do</strong> reflexivo da socieda<strong>de</strong> ante<br />

as suas próprias mazelas, capaz <strong>de</strong> gerar um revisionismo completo <strong>de</strong> seu modus actuandi et faciendi, especialmente consi<strong>de</strong>rada a<br />

condição <strong>de</strong> superação <strong>do</strong> mo<strong>de</strong>lo mo<strong>de</strong>rno <strong>de</strong> organização da vida e da socieda<strong>de</strong>. Nem só <strong>de</strong> superação se enten<strong>de</strong> viver a pósmo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>,<br />

pois o revisionismo crítico importa em praticar a escavação <strong>do</strong>s erros <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> para a preparação <strong>de</strong> novas<br />

condições <strong>de</strong> vida. A pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> é menos um esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> coisas, exatamente porque ela é uma condição processante <strong>de</strong> um<br />

amadurecimento social, político, econômico e cultural, que haverá <strong>de</strong> alargar-se por muitas décadas até a sua consolidação. Ela não<br />

encerra a mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, pois, em verda<strong>de</strong>, inaugura sua mescla com os restos da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>”. 3 Nota-se que a pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong><br />

representa uma superação parcial, e não total, da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, até porque a palavra “mo<strong>de</strong>rno” faz parte da construção<br />

morfológica <strong>do</strong> termo. Em verda<strong>de</strong>, é preciso rever conceitos, e não romper com eles totalmente. As antigas categorias são<br />

remo<strong>de</strong>ladas, refeitas, manten<strong>do</strong>-se, muitas vezes, a sua base estrutural. Isso, sem dúvida, vem ocorren<strong>do</strong> com o <strong>Direito</strong>, a partir <strong>de</strong>


um novo dimensionamento <strong>de</strong> antigas construções. A pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> figurar como uma revisitação das premissas da razão<br />

pura, por meio da análise da realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conceitos que foram nega<strong>do</strong>s pela razão anterior, pela mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> quadrada. Essa é a<br />

conclusão <strong>de</strong> Hilton Ferreira Japiassu, merecen<strong>do</strong> <strong>de</strong>staque os seus dizeres:<br />

“Diria que a chamada ‘pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>’ aparece como uma espécie <strong>de</strong> Renascimento <strong>do</strong>s i<strong>de</strong>ais bani<strong>do</strong>s e cassa<strong>do</strong>s por nossa<br />

mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> racionaliza<strong>do</strong>ra. Esta mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> teria termina<strong>do</strong> a partir <strong>do</strong> momento em que não po<strong>de</strong>mos mais falar da história<br />

como algo <strong>de</strong> unitário e quan<strong>do</strong> morre o mito <strong>do</strong> Progresso. É a emergência <strong>de</strong>sses i<strong>de</strong>ais que seria responsável por toda uma onda<br />

<strong>de</strong> comportamentos e <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>s irracionais e <strong>de</strong>sencanta<strong>do</strong>s em relação à política e pelo crescimento <strong>do</strong> ceticismo face aos valores<br />

fundamentais da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. Estaríamos dan<strong>do</strong> A<strong>de</strong>us à mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, à Razão (Feyerabend)? Quem acredita ainda que ‘to<strong>do</strong> real<br />

é racional e to<strong>do</strong> racional é real’ (Hegel)? Que esperança po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>positar no projeto da Razão emancipada, quan<strong>do</strong> sabemos que<br />

orientou-se para a instrumentalida<strong>de</strong> e a simples produtivida<strong>de</strong>? Que projeto <strong>de</strong> felicida<strong>de</strong> pessoal po<strong>de</strong> proporcionar-nos um mun<strong>do</strong><br />

crescentemente racionaliza<strong>do</strong>, calcula<strong>do</strong>r e burocratiza<strong>do</strong>, que coloca no centro <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> o econômico, entendi<strong>do</strong> apenas como o<br />

financeiro submeti<strong>do</strong> ao jogo cego <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>? Como po<strong>de</strong> o homem ser feliz no interior da lógica <strong>do</strong> sistema, on<strong>de</strong> só tem valor o<br />

que funciona segun<strong>do</strong> previsões, on<strong>de</strong> seus <strong>de</strong>sejos, suas paixões, necessida<strong>de</strong>s e aspirações passam a ser racionalmente<br />

administra<strong>do</strong>s e manipula<strong>do</strong>s pela lógica da eficácia econômica que o reduz ao papel <strong>de</strong> simples consumi<strong>do</strong>r?”4<br />

No contexto da presente obra, nota-se que o Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r constitui uma típica norma pósmo<strong>de</strong>rna,<br />

no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> rever conceitos antigos <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, tais como o contrato, a responsabilida<strong>de</strong> civil e a prescrição.<br />

O fenômeno pós-mo<strong>de</strong>rno, com enfoque jurídico, po<strong>de</strong> ser i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong> por vários fatores. O primeiro a ser cita<strong>do</strong> é a<br />

globalização, a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> unida<strong>de</strong> mundial, <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo geral para as ciências e para o comportamento das pessoas. Fala-se hoje<br />

em linguagem global, em economia globalizada, em merca<strong>do</strong> uno, em <strong>do</strong>enças e epi<strong>de</strong>mias mundiais e até em um <strong>Direito</strong><br />

unifica<strong>do</strong>. Quanto ao mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> agir, o oci<strong>de</strong>nte se aproxima <strong>do</strong> oriente, e vice-versa. A China consome o hambúrguer norteamericano,<br />

e os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s consomem o macarrão chinês. Alguns se alimentam <strong>de</strong> macarrão com hambúrguer, fundin<strong>do</strong> o<br />

oriente ao oci<strong>de</strong>nte, até <strong>de</strong> forma inconsciente, em especial nos países em <strong>de</strong>senvolvimento. No caso <strong>do</strong> CDC brasileiro, tal<br />

preocupação po<strong>de</strong> ser notada pela abertura constante <strong>do</strong> seu art. 7º, que admite a aplicação <strong>de</strong> fontes <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Compara<strong>do</strong>, caso<br />

<strong>do</strong>s trata<strong>do</strong>s e convenções internacionais, in verbis: “Os direitos previstos neste Código não excluem outros <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> trata<strong>do</strong>s<br />

ou convenções internacionais <strong>de</strong> que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, <strong>de</strong> regulamentos expedi<strong>do</strong>s pelas<br />

autorida<strong>de</strong>s administrativas competentes, bem como <strong>do</strong>s que <strong>de</strong>rivem <strong>do</strong>s princípios gerais <strong>do</strong> direito, analogia, costumes e<br />

equida<strong>de</strong>”.<br />

A par <strong>de</strong>ssa unida<strong>de</strong> mundial, como afirma Erik Jayme, os Esta<strong>do</strong>s não seriam mais os centros <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r e da proteção da<br />

pessoa humana, ce<strong>de</strong>n<strong>do</strong> espaço, em larga margem, aos merca<strong>do</strong>s. Nesse senti<strong>do</strong>, as regras <strong>de</strong> concorrência acabariam por<br />

<strong>de</strong>terminar a vida e o comportamento <strong>do</strong>s seres humanos.5 De toda sorte, como prega o próprio <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>r em outro texto, ao<br />

discorrer sobre a realida<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Internacional Priva<strong>do</strong>, é preciso que os Esta<strong>do</strong>s busquem, em sua integração, para uma<br />

crescente unificação <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>, a conservação da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> cultural das pessoas, para proteger e garantir a sua personalida<strong>de</strong><br />

individual. 6 Em suma, segun<strong>do</strong> Erik Jayme, o <strong>Direito</strong> Internacional Priva<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve levar em consi<strong>de</strong>ração, basea<strong>do</strong> em critérios <strong>de</strong><br />

proximida<strong>de</strong>, as diferenças culturais incorporadas aos respectivos or<strong>de</strong>namentos jurídicos, prestan<strong>do</strong>-se a se tornar também um<br />

direito fundamental liga<strong>do</strong> à personalida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s cidadãos. 7 Nesse contexto, surge a proteção <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, fazen<strong>do</strong><br />

um cabo <strong>de</strong> guerra contra a excessiva proteção merca<strong>do</strong>lógica.<br />

Como outro ponto <strong>de</strong> reflexão a ser <strong>de</strong>staca<strong>do</strong> a respeito da pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> jurídica, há a abundância <strong>do</strong>s gêneros e espécies:<br />

abundância <strong>de</strong> sujeitos e <strong>de</strong> direitos, excesso <strong>de</strong> fatores que influenciam as relações jurídicas e eclosão sucessiva <strong>de</strong> leis, entre<br />

outros. Relativamente às leis, a realida<strong>de</strong> é <strong>de</strong> um Big Bang Legislativo, na qual se verifica uma explosão <strong>de</strong> normas jurídicas,<br />

como afirma Ricar<strong>do</strong> Luis Lorenzetti.8 No caso brasileiro, convive-se com mais <strong>de</strong> 40 mil leis, a <strong>de</strong>ixar o aplica<strong>do</strong>r <strong>do</strong> <strong>Direito</strong><br />

<strong>de</strong>snortea<strong>do</strong> a respeito <strong>de</strong> sua incidência no tipo (fattispecie). Mesmo em relação aos consumi<strong>do</strong>res, em muitas situações, há uma<br />

situação <strong>de</strong> dúvida sobre qual norma jurídica <strong>de</strong>ve incidir no caso concreto.<br />

No que concerne aos sujeitos pós-mo<strong>de</strong>rnos, reconhece-se um pluralismo, o que é intensifica<strong>do</strong> pela valorização <strong>do</strong>s direitos<br />

humanos e das liberda<strong>de</strong>s. Inúmeras são as preocupações legais em se tutelar os vulneráveis, a fim <strong>de</strong> se valorizar a pessoa humana,<br />

nos termos <strong>do</strong> que consta <strong>do</strong> art. 1º, III, da Constituição Fe<strong>de</strong>ral: consumi<strong>do</strong>res, trabalha<strong>do</strong>res, mulheres sob violência, crianças e<br />

a<strong>do</strong>lescentes, jovens, i<strong>do</strong>sos, indígenas, <strong>de</strong>ficientes físicos, negros. Além <strong>de</strong> proteger sujeitos, as normas ten<strong>de</strong>m a tutelar valores<br />

que são coloca<strong>do</strong>s à disposição da pessoa para a sua sadia qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida, como é o caso <strong>do</strong> meio ambiente, <strong>do</strong> Bem Ambiental.<br />

A par <strong>de</strong>ssa realida<strong>de</strong>, Claudia Lima Marques ensina:<br />

“Segun<strong>do</strong> Erik Jayme, as características da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna no direito seriam o pluralismo, a comunicação, a narração, o que<br />

Jayme <strong>de</strong>nomina ‘le retour <strong>de</strong>s sentiments’, sen<strong>do</strong> o Leitmotiv da pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> a valorização <strong>do</strong>s direitos humanos. Para Jayme,<br />

o direito como parte da cultura <strong>do</strong>s povos muda com a crise da pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. O pluralismo manifesta-se na multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

fontes legislativas a regular o mesmo fato, com a <strong>de</strong>scodificação ou a implosão <strong>do</strong>s sistemas genéricos normativos


(‘Zersplieterung’), manifesta-se no pluralismo <strong>de</strong> sujeitos a proteger, por vezes difusos, como o grupo <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res ou os que se<br />

beneficiam da proteção <strong>do</strong> meio ambiente, na pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> agentes ativos <strong>de</strong> uma mesma relação, como os fornece<strong>do</strong>res que se<br />

organizam em ca<strong>de</strong>ia e em relações extremamente <strong>de</strong>spersonalizadas. Pluralismo também na filosofia aceita atualmente, on<strong>de</strong> o<br />

diálogo é que legitima o consenso, on<strong>de</strong> os valores e princípios têm sempre uma dupla função, o ‘<strong>do</strong>uble coding’, e on<strong>de</strong> os valores<br />

são muitas vezes antinômicos. Pluralismo nos direitos assegura<strong>do</strong>s, nos direitos à diferença e ao tratamento diferencia<strong>do</strong> aos<br />

privilégios <strong>do</strong>s ‘espaços <strong>de</strong> excelência’”. 9<br />

Em certo senti<strong>do</strong>, como <strong>de</strong>corrência <strong>do</strong> pluralismo, há uma abundância <strong>de</strong> proteção legislativa na pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, a gerar<br />

situações <strong>de</strong> colisão entre esses direitos, conflitos estes que acabam por ser resolvi<strong>do</strong>s a partir da interpretação da Norma<br />

Constitucional, repouso comum da principiologia <strong>de</strong>ssa tutela fundamental. A <strong>de</strong>monstrar os efeitos práticos <strong>de</strong>ssa preocupação <strong>de</strong><br />

tutela, por exemplo, utilizan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> um símbolo cotidiano, ao ir ao banco, é comum a percepção <strong>de</strong> que a única fila que anda é a<br />

daqueles que têm algum tipo <strong>de</strong> priorida<strong>de</strong>. Eis outra amostragem <strong>do</strong> fenômeno pós-mo<strong>de</strong>rno, uma vez que a exceção se torna<br />

regra, e vice-versa. Como não po<strong>de</strong>ria ser diferente, a questão da tutela <strong>de</strong> vulneráveis e <strong>de</strong> proteção <strong>de</strong> conceitos que lhe são<br />

parcelares repercute na análise <strong>do</strong> problema jurídico contemporâneo.<br />

Na realida<strong>de</strong> pós-mo<strong>de</strong>rna há o duplo senti<strong>do</strong> das coisas (<strong>do</strong>uble sense). Nesse contexto, o certo po<strong>de</strong> ser o erra<strong>do</strong>, e o erra<strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong> ser o certo; o bem po<strong>de</strong> ser o mal, e o mal po<strong>de</strong> ser o bem; o alto po<strong>de</strong> ser baixo, e o baixo po<strong>de</strong> ser alto; o belo po<strong>de</strong> ser o<br />

feio, e o feio po<strong>de</strong> ser o belo; a verda<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser uma mentira, e a mentira po<strong>de</strong> ser uma verda<strong>de</strong>; o jurídico po<strong>de</strong> ser antijurídico, e<br />

o antijurídico po<strong>de</strong> ser o jurídico; a direita po<strong>de</strong> ser a esquerda, e o inverso po<strong>de</strong> ser igualmente váli<strong>do</strong>. Essas variações chocam<br />

aquela visão maniqueísta que impera no <strong>Direito</strong>, particularmente a <strong>de</strong> que sempre haverá um vitorioso e um <strong>de</strong>rrota<strong>do</strong> nas<br />

<strong>de</strong>mandas judiciais. Na realida<strong>de</strong>, aquele que se julga o vitorioso po<strong>de</strong> ser o maior <strong>de</strong>rrota<strong>do</strong>.<br />

Algumas produções cinematográficas da atualida<strong>de</strong> servem para <strong>de</strong>monstrar essa configuração <strong>do</strong> <strong>do</strong>uble sense, como é o caso<br />

<strong>de</strong> Guerra nas Estrelas (Star Wars), talvez o maior fenômeno cinematográfico da pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. Anote-se que tal paralelo foi<br />

traça<strong>do</strong> por Claudia Lima Marques, em aula ministrada no curso <strong>de</strong> pós-graduação lato sensu em <strong>Direito</strong> Contratual da Escola<br />

Paulista <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>, em São Paulo, no dia 12 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 2008. O tema da aula foi A teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes e o <strong>Direito</strong><br />

Contratual.<br />

Naquela ocasião, a jurista relacionou a evolução <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> à série Guerra nas Estrelas (Star Wars), escrita por George Lucas<br />

em 1977. O primeiro episódio é <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> A Ameaça Fantasma (1999); o segun<strong>do</strong>, O Ataque <strong>do</strong>s Clones (2002); o terceiro, A<br />

Vingança <strong>do</strong>s Sith (2005); o quarto, Uma Nova Esperança (1977); o quinto, O Império Contra-Ataca (1980); o sexto, o Retorno <strong>de</strong><br />

Jedi (1983) e o sétimo o Despertar da Força (2015). O penúltimo episódio, em que um filho que representa o bem (Luke<br />

Skywalker) acaba por lutar contra o próprio pai, que representa o mal (Darth Va<strong>de</strong>r, a versão maléfica <strong>de</strong> Anakin Skywalker), seria<br />

a culminância da pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, representan<strong>do</strong> o duplo senti<strong>do</strong> das coisas e a falta <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> posições (bem x mal). Ao<br />

final, o próprio símbolo <strong>do</strong> mal (Darth Va<strong>de</strong>r) é quem mata o Impera<strong>do</strong>r, geran<strong>do</strong> a vitória <strong>do</strong> bem contra o mal. A série continua,<br />

sen<strong>do</strong> possíveis novas reflexões no futuro.<br />

Ato contínuo, a realida<strong>de</strong> pós-mo<strong>de</strong>rna é marcada pela hipercomplexida<strong>de</strong>. De acor<strong>do</strong> com Antônio Junqueira <strong>de</strong> Azeve<strong>do</strong>, o<br />

próprio direito é um sistema complexo <strong>de</strong> segunda or<strong>de</strong>m.10 Na contemporaneida<strong>de</strong>, os prosaicos exemplos <strong>de</strong> negócios e atos<br />

jurídicos entre Tício, Caio e Mévio, comuns nas aulas <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Romano e <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> (ou até <strong>do</strong> presente), não<br />

conseguem resolver os casos <strong>de</strong> maior complexida<strong>de</strong>, particularmente aqueles relativos a colisões entre direitos consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s<br />

fundamentais, próprios da pessoa humana. A<strong>de</strong>mais, muitas situações envolven<strong>do</strong> os contratos <strong>de</strong> consumo superam aquela antiga<br />

visualização. A título <strong>de</strong> ilustração, imagine-se que um consumi<strong>do</strong>r brasileiro compra um produto americano acessan<strong>do</strong> seu<br />

computa<strong>do</strong>r no Brasil, estan<strong>do</strong> o prove<strong>do</strong>r da empresa ven<strong>de</strong><strong>do</strong>ra localiza<strong>do</strong> na Nova Zelândia. Pergunta-se: quais as leis aplicadas<br />

na espécie? Sem se preten<strong>de</strong>r ingressar no mérito da questão, o exemplo <strong>de</strong>monstra quão complexas po<strong>de</strong>m ser as simples relações<br />

<strong>de</strong> consumo.<br />

Por fim, <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> o caos contemporâneo, Ricar<strong>do</strong> Luis Lorenzetti fala em era da <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m, que, em síntese, po<strong>de</strong> ser<br />

i<strong>de</strong>ntificada pelos seguintes aspectos: a) enfraquecimento das fronteiras entre as esferas <strong>do</strong> público e <strong>do</strong> priva<strong>do</strong>; b) pluralida<strong>de</strong> das<br />

fontes, seja no <strong>Direito</strong> Público ou no <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>; c) proliferação <strong>de</strong> conceitos jurídicos in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s; d) existência <strong>de</strong> um<br />

sistema aberto, sen<strong>do</strong> possível uma extensa variação <strong>de</strong> julgamentos; e) gran<strong>de</strong> abertura para o intérprete estabelecer e reconstruir a<br />

sua coerência; f) mudanças constantes <strong>de</strong> posições, inclusive legislativas; g) necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação das fontes umas às outras;<br />

h) exigência <strong>de</strong> pautas mínimas <strong>de</strong> correção para a interpretação jurídica. 11 Como não po<strong>de</strong>ria ser diferente, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r enquadra-se perfeitamente em tal realida<strong>de</strong> pós-mo<strong>de</strong>rna. Primeiro, por trazer como conteú<strong>do</strong> questões <strong>de</strong> <strong>Direito</strong><br />

Priva<strong>do</strong> e <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Público. Segun<strong>do</strong>, por encerrar vários conceitos in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s, como o <strong>de</strong> boa-fé. Terceiro, por representar<br />

uma norma aberta, perfeitamente afeita a diálogos interdisciplinares, como se verá (diálogo das fontes). Quarto, por encerrar a<br />

pauta mínima <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.


1.2.<br />

O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR COMO NORMA PRINCIPIOLÓGICA.<br />

SUA POSIÇÃO HIERÁRQUICA<br />

O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é norma que tem relação direta com a terceira geração, era ou dimensão <strong>de</strong> direitos.12<br />

Nesse contexto, é comum relacionar as três primeiras gerações, eras ou dimensões com os princípios da Revolução Francesa.<br />

Pontue-se que a referida divisão das gerações <strong>de</strong> direitos foi i<strong>de</strong>alizada pelo jurista tcheco Karel Vasak, em 1979, em exposição<br />

feita em aula inaugural no Instituto Internacional <strong>do</strong>s <strong>Direito</strong>s Humanos, em Estrasburgo, França.<br />

Os direitos <strong>de</strong> primeira geração ou dimensão são aqueles relaciona<strong>do</strong>s com o princípio da liberda<strong>de</strong>. Os <strong>de</strong> segunda geração ou<br />

dimensão, com o princípio da igualda<strong>de</strong>. Os direitos <strong>de</strong> terceira geração ou dimensão são relativos ao princípio da fraternida<strong>de</strong>. Na<br />

verda<strong>de</strong>, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r tem relação com todas as três dimensões. Todavia, é melhor enquadrá-lo na terceira<br />

dimensão, já que a Lei Consumerista visa à pacificação social, na tentativa <strong>de</strong> equilibrar a díspar relação existente entre<br />

fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res.<br />

Na atualida<strong>de</strong>, já se fala em outras duas outras gerações ou dimensões <strong>de</strong> direitos. A quarta dimensão estaria sincronizada com<br />

a proteção <strong>do</strong> patrimônio genético (DNA), com a intimida<strong>de</strong> biológica. Por fim, a quinta dimensão seria aquela relativa ao mun<strong>do</strong><br />

digital ou cibernético, com o <strong>Direito</strong> Eletrônico ou Digital. Não se ignore que a relação <strong>de</strong> consumo também po<strong>de</strong> enquadrar as<br />

duas últimas dimensões. Vejamos, <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>talhada:<br />

1ª<br />

2ª<br />

3ª<br />

4ª<br />

5ª<br />

Geração: Princípio da Liberda<strong>de</strong>.<br />

Geração: Princípio da Igualda<strong>de</strong>.<br />

Geração: Princípio da Fraternida<strong>de</strong> (pacificação social). Aqui melhor se enquadraria o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Geração: Proteção <strong>do</strong> patrimônio genético.<br />

Geração: Proteção <strong>de</strong> direitos no mun<strong>do</strong> digital.<br />

Pois bem, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é ti<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>utrina como uma norma principiológica, diante da proteção<br />

constitucional <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, que consta, especialmente, <strong>do</strong> art. 5º, XXXII, da Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988, ao enunciar que<br />

“o Esta<strong>do</strong> promoverá, na forma da lei, a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r”. A propósito <strong>de</strong>ssa questão, precisas são as lições <strong>de</strong> Luiz Antonio<br />

Rizzatto Nunes:<br />

“A Lei n. 8.078 é norma <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública e <strong>de</strong> interesse social, geral e principiológica, o que significa dizer que é prevalente sobre<br />

todas as <strong>de</strong>mais normas especiais anteriores que com ela colidirem. As normas gerais principiológicas, pelos motivos que<br />

apresentamos no início <strong>de</strong>ste trabalho ao <strong>de</strong>monstrar o valor superior <strong>do</strong>s princípios, têm prevalência sobre as normas gerais e<br />

especiais anteriores”.13<br />

Destaque-se que, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, a respeito <strong>do</strong> caráter <strong>de</strong> norma principiológica, opinam Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong><br />

Andra<strong>de</strong> Nery, expon<strong>do</strong> pela prevalência contínua <strong>do</strong> Código Consumerista sobre as <strong>de</strong>mais normas, eis que “as leis especiais<br />

setorizadas (v.g., seguros, bancos, calça<strong>do</strong>s, transportes, serviços, automóveis, alimentos etc.) <strong>de</strong>vem disciplinar suas respectivas<br />

matérias em consonância e em obediência aos princípios fundamentais <strong>do</strong> CDC”. 14<br />

Diante <strong>de</strong> tais premissas, po<strong>de</strong>-se dizer que o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r tem eficácia supralegal, ou seja, está em um<br />

ponto hierárquico intermediário entre a Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988 e as leis ordinárias. Para tal <strong>de</strong>dução jurídica, po<strong>de</strong> ser<br />

utilizada a simbologia <strong>do</strong> sistema piramidal, atribuída a Hans Kelsen. 15 Vejamos:<br />

Como exemplo <strong>de</strong>ssa conclusão, po<strong>de</strong> ser cita<strong>do</strong> o problema relativo à Convenção <strong>de</strong> Varsóvia e à Convenção <strong>de</strong> Montreal,


trata<strong>do</strong>s internacionais <strong>do</strong>s quais o Brasil é signatário e que preveem tarifação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização no transporte aéreo internacional, nos<br />

casos <strong>de</strong> cancelamento e atraso <strong>de</strong> voos, bem como <strong>de</strong> extravio <strong>de</strong> bagagem. Deve ficar claro que tais trata<strong>do</strong>s internacionais não<br />

são convenções <strong>de</strong> direitos humanos, não ten<strong>do</strong> a força <strong>de</strong> emendas à Constituição, como consta <strong>do</strong> art. 5º, § 3º, da Constituição<br />

Fe<strong>de</strong>ral, na redação dada pela Emenda Constitucional 45/2004.<br />

Ora, tais convenções internacionais coli<strong>de</strong>m com o princípio da reparação integral <strong>do</strong>s danos, retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 6º, VI, da Lei<br />

8.078/1990, que reconhece como direito básico <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r a efetiva reparação <strong>do</strong>s danos patrimoniais e morais, individuais,<br />

coletivos e difusos, afastan<strong>do</strong> qualquer possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tabelamento ou tarifação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização em <strong>de</strong>sfavor <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

Diante da citada posição intermediária ou supralegal <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, a norma consumerista <strong>de</strong>ve prevalecer<br />

sobre as citadas fontes internacionais.<br />

Em complemento, para a efetiva incidência <strong>do</strong> CDC ao transporte aéreo, merece <strong>de</strong>staque a argumentação <strong>de</strong>senvolvida por<br />

Marco Fábio Morsello, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a norma consumerista sempre <strong>de</strong>ve prevalecer, por seu caráter mais especial, ten<strong>do</strong> o que<br />

ele <strong>de</strong>nomina como segmentação horizontal. De outra forma, sustenta que a matéria consumerista é agrupada pela função e não<br />

pelo objeto.16<br />

A<strong>de</strong>mais, não se po<strong>de</strong> esquecer que as fontes <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Internacional Público, caso das citadas convenções, não po<strong>de</strong>m entrar<br />

em conflito com as normas internas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, como é o caso <strong>do</strong> Código Consumerista. Nessa linha, preceitua o art. 17 da<br />

Lei <strong>de</strong> Introdução às Normas <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Brasileiro que “As leis, atos e sentenças <strong>de</strong> outro país, bem como quaisquer <strong>de</strong>clarações <strong>de</strong><br />

vonta<strong>de</strong>, não terão eficácia no Brasil, quan<strong>do</strong> ofen<strong>de</strong>rem a soberania nacional, a or<strong>de</strong>m pública e os bons costumes”.<br />

A prevalência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r sobre a Convenção <strong>de</strong> Varsóvia vem sen<strong>do</strong> aplicada há tempos pelos<br />

Tribunais Superiores. De início, vejamos <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 2009:<br />

“Recurso extraordinário. Danos morais <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> atraso ocorri<strong>do</strong> em voo internacional. Aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. Matéria infraconstitucional. Não conhecimento. 1. O princípio da <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r se aplica a to<strong>do</strong> o capítulo<br />

constitucional da ativida<strong>de</strong> econômica. 2. Afastam-se as normas especiais <strong>do</strong> Código Brasileiro da Aeronáutica e da Convenção <strong>de</strong><br />

Varsóvia quan<strong>do</strong> implicarem retrocesso social ou vilipêndio aos direitos assegura<strong>do</strong>s pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. Não<br />

cabe discutir, na instância extraordinária, sobre a correta aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r ou sobre a incidência, no<br />

caso concreto, <strong>de</strong> específicas normas <strong>de</strong> consumo veiculadas em legislação especial sobre o transporte aéreo internacional. Ofensa<br />

indireta à Constituição da República. 4. Recurso não conheci<strong>do</strong>” (STF – RE 351.750-3/RJ – Primeira Turma – Rel. Min. Carlos<br />

Britto – j. 17.03.2009 – DJe 25.09.2009, p. 69).<br />

Não tem si<strong>do</strong> diferente a conclusão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, em inúmeros julga<strong>do</strong>s. Por to<strong>do</strong>s, entre os mais recentes:<br />

“Processual civil. Embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração no agravo regimental no agravo <strong>de</strong> instrumento. Seguro. Ação regressiva.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> civil. In<strong>de</strong>nização. Cálculo. Convenção <strong>de</strong> Varsóvia. Inaplicabilida<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Incidência. Multa. Parágrafo único, art. 538 <strong>do</strong> CPC. Embargos rejeita<strong>do</strong>s” (STJ – EDcl-AgRg-Ag 804.618/SP – Quarta Turma –<br />

Rel. Min. Aldir Guimarães Passarinho Junior – j. 14.12.2010 – DJe 17.12.2010).<br />

“Agravo regimental no agravo <strong>de</strong> instrumento. Transporte aéreo internacional. Extravio <strong>de</strong> bagagem. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. Prevalência. Convenção <strong>de</strong> Varsóvia. Quantum in<strong>de</strong>nizatório. Redução. Impossibilida<strong>de</strong>. Dissídio não configura<strong>do</strong>. 1.<br />

A jurisprudência <strong>do</strong>minante <strong>de</strong>sta Corte Superior se orienta no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> prevalência das normas <strong>do</strong> CDC, em <strong>de</strong>trimento das<br />

normas insertas na Convenção <strong>de</strong> Varsóvia, aos casos <strong>de</strong> extravio <strong>de</strong> bagagem, em transporte aéreo internacional. 2. No que<br />

concerne à caracterização <strong>do</strong> dissenso pretoriano para redução <strong>do</strong> quantum in<strong>de</strong>nizatório, impen<strong>de</strong> ressaltar que as circunstâncias<br />

que levam o Tribunal <strong>de</strong> origem a fixar o valor da in<strong>de</strong>nização por danos morais são <strong>de</strong> caráter personalíssimo e levam em conta<br />

questões subjetivas, o que dificulta ou mesmo impossibilita a comparação, <strong>de</strong> forma objetiva, para efeito <strong>de</strong> configuração da<br />

divergência, com outras <strong>de</strong>cisões assemelhadas. 3. Agravo regimental a que se nega provimento” (STJ – AgRg-Ag 1.278.321/SP –<br />

Terceira Turma – Rel. Des. Conv. Vasco Della Giustina – j. 18.11.2010 – DJe 25.11.2010).<br />

“Agravo regimental. Recurso especial. Extravio <strong>de</strong> bagagem. In<strong>de</strong>nização ampla. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 1. É firme a<br />

jurisprudência <strong>de</strong>sta Corte no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que, após a edição <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, não mais prevalece a tarifação<br />

prevista na Convenção <strong>de</strong> Varsóvia. Incidência <strong>do</strong> princípio da ampla reparação. Prece<strong>de</strong>ntes. 2. Agravo regimental <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>”<br />

(STJ – AgRg-REsp 262.687/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Fernan<strong>do</strong> Gonçalves – j. 15.12.2009 – DJe 22.02.2010).<br />

Por to<strong>do</strong>s os argumentos expostos, a conclusão <strong>de</strong>ve ser a mesma em casos envolven<strong>do</strong> a mais recente Convenção <strong>de</strong><br />

Montreal, que, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, limita a in<strong>de</strong>nização no transporte aéreo internacional, na linha da tese <strong>de</strong>senvolvida pelo<br />

magistra<strong>do</strong> e jurista Marco Fábio Morsello, outrora citada. Essa, aliás, já vem sen<strong>do</strong> a conclusão <strong>do</strong>s nossos Tribunais, até o<br />

presente momento:<br />

“Agravo regimental no agravo <strong>de</strong> instrumento. Transporte aéreo internacional. Atraso <strong>de</strong> voo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Convenções internacionais. Responsabilida<strong>de</strong> objetiva. Riscos inerentes à ativida<strong>de</strong>. Fundamento inataca<strong>do</strong>. Súmula 283 <strong>do</strong> STF.


Quantum in<strong>de</strong>nizatório. Redução. Impossibilida<strong>de</strong>. Dissídio não configura<strong>do</strong>. 1. A jurisprudência <strong>do</strong>minante <strong>de</strong>sta Corte Superior se<br />

orienta no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> prevalência das normas <strong>do</strong> CDC, em <strong>de</strong>trimento das Convenções Internacionais, como a Convenção <strong>de</strong><br />

Montreal, precedida pela Convenção <strong>de</strong> Varsóvia, aos casos <strong>de</strong> atraso <strong>de</strong> voo, em transporte aéreo internacional. 2. O Tribunal <strong>de</strong><br />

origem fundamentou sua <strong>de</strong>cisão na responsabilida<strong>de</strong> objetiva da empresa aérea, ten<strong>do</strong> em vista que os riscos são inerentes à própria<br />

ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvida, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser reconheci<strong>do</strong> o caso fortuito como causa exclu<strong>de</strong>nte da responsabilização. Tais argumentos,<br />

porém, não foram ataca<strong>do</strong>s pela agravante, o que atrai, por analogia, a incidência da Súmula 283 <strong>do</strong> STF. 3. No que concerne à<br />

caracterização <strong>do</strong> dissenso pretoriano para redução <strong>do</strong> quantum in<strong>de</strong>nizatório, impen<strong>de</strong> ressaltar que as circunstâncias que levam o<br />

Tribunal <strong>de</strong> origem a fixar o valor da in<strong>de</strong>nização por danos morais são <strong>de</strong> caráter personalíssimo e levam em conta questões<br />

subjetivas, o que dificulta ou mesmo impossibilita a comparação, <strong>de</strong> forma objetiva, para efeito <strong>de</strong> configuração da divergência, com<br />

outras <strong>de</strong>cisões assemelhadas. 4. Agravo regimental a que se nega provimento” (STJ – AgRg no Ag 1.343.941/RJ – Terceira Turma<br />

– Rel. Des. Conv. Vasco Della Giustina – j. 18.11.2010 – DJe 25.11.2010).<br />

“Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Extravio <strong>de</strong> bagagem. Relação regida pelo CDC. Danos materiais e morais. Cabimento. Quantum. O extravio<br />

<strong>de</strong> bagagem enseja in<strong>de</strong>nização por danos morais e pelo valor gasto na aquisição <strong>de</strong> roupas e objetos <strong>de</strong> uso pessoal. Deve a<br />

in<strong>de</strong>nização por danos materiais em casos <strong>de</strong> extravio <strong>de</strong> bagagem, em viagens internacionais, equivaler a to<strong>do</strong> o prejuízo sofri<strong>do</strong>,<br />

<strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser integral, ampla, não tarifada, não se aplican<strong>do</strong> o Pacto <strong>de</strong> Varsóvia, nem a Convenção <strong>de</strong> Montreal, mas o Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. É evi<strong>de</strong>nte o dano moral <strong>do</strong> viajante que per<strong>de</strong> sua bagagem, sofren<strong>do</strong> constrangimentos, angústias e<br />

aflições. O quantum da in<strong>de</strong>nização por danos morais <strong>de</strong>ve ser fixa<strong>do</strong> com pru<strong>de</strong>nte arbítrio, para que não haja enriquecimento à<br />

custa <strong>do</strong> empobrecimento alheio, mas também para que o valor não seja irrisório” (TJMG – Apelação cível 7886810-<br />

67.2007.8.13.0024, Belo Horizonte – Nona Câmara Cível – Rel. Des. Pedro Bernar<strong>de</strong>s – j. 25.01.2011 – DJEMG 07.02.2011).<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Danos materiais e morais. Transporte aéreo internacional. Pacote turístico referente a reservas <strong>de</strong> hotel e<br />

passagem aérea, sain<strong>do</strong> <strong>de</strong> São Paulo com <strong>de</strong>stino a Miami, com conexão em Atlanta. Atraso e perda <strong>de</strong> voo <strong>de</strong> conexão por culpa<br />

da companhia aérea ré. O autor e sua família tiveram que <strong>do</strong>rmir no aeroporto e voltar ao Brasil com recursos próprios. Ausência <strong>de</strong><br />

amparo material. Aplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> CDC e não aplicabilida<strong>de</strong> da Convenção <strong>de</strong> Montreal. Presentes os pressupostos à in<strong>de</strong>nização.<br />

Danos materiais comprova<strong>do</strong>s. Danos morais corretamente fixa<strong>do</strong>s. Devi<strong>do</strong> o quantum arbitra<strong>do</strong>. A<strong>de</strong>quação – Sentença <strong>de</strong> parcial<br />

procedência confirmada. Ratificação <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>. Hipótese em que, estan<strong>do</strong> a r. sentença suficientemente motivada, houve a análise<br />

correta <strong>do</strong>s fundamentos <strong>de</strong> fato e <strong>de</strong> direito apresenta<strong>do</strong>s pelas partes, dan<strong>do</strong>-se à causa o <strong>de</strong>slin<strong>de</strong> justo e necessário –<br />

Aplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> art. 252, <strong>do</strong> RI <strong>do</strong> TJSP. Sentença mantida. Recurso não provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação cível 0281135-<br />

07.2010.8.26.0000 – Acórdão n. 4852799, São Paulo – Trigésima Oitava Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Spencer Almeida<br />

Ferreira – j. 24.11.2010 – DJESP 11.01.2011).<br />

De qualquer mo<strong>do</strong>, cabe ressaltar que a questão a respeito das Convenções <strong>de</strong> Varsóvia e <strong>de</strong> Montreal ainda pen<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

julgamento <strong>de</strong>finitivo pelo Pleno <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, haven<strong>do</strong> votos pela sua prevalência sobre a Lei 8.078/1990<br />

(Recurso Extraordinário n. 636.331 e Recurso Extraordinário no Agravo 766.618). O presente autor espera que a tese <strong>de</strong> superação<br />

<strong>do</strong> CDC por estes trata<strong>do</strong>s não prevaleça, o que representaria enorme retrocesso quanto à tutela <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

Também a ilustrar a concepção <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r como norma principiológica, merece <strong>de</strong>staque recente<br />

aresto <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que fez incidir a Lei 8.078/1990 a uma relação jurídica entre duas emissoras <strong>de</strong> televisão,<br />

ten<strong>do</strong> uma presta<strong>do</strong> ao público informações inverídicas sobre o <strong>de</strong>sempenho da outra, perante o IBOPE. Conforme a ementa, “o<br />

direito consumerista po<strong>de</strong> ser utiliza<strong>do</strong> como norma principiológica mesmo que inexista relação <strong>de</strong> consumo entre as partes<br />

litigantes porque as disposições <strong>do</strong> CDC veiculam cláusulas criadas para proteger o consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> práticas abusivas e <strong>de</strong>sleais <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços, inclusive as que proíbem a propaganda enganosa” (STJ – REsp 1.552.550/SP – Terceira Turma – Rel. Min.<br />

Moura Ribeiro – j. 01.03.2016 – DJe 22.04.2016). Nos termos <strong>do</strong> voto <strong>do</strong> Ministro Relator, “o relacionamento entre as emissoras<br />

<strong>de</strong> televisão e os telespecta<strong>do</strong>res caracteriza uma relação <strong>de</strong> consumo na medida em que elas prestam um serviço público<br />

concedi<strong>do</strong> e se beneficiam com a audiência, auferin<strong>do</strong> renda. Portanto, a emissora se submete aos princípios dita<strong>do</strong>s pelo CDC que<br />

tem por objetivo a transparência e harmonia das relações <strong>de</strong> consumo (CDC, art. 4º), <strong>do</strong> qual <strong>de</strong>corre o direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong><br />

proteção contra a publicida<strong>de</strong> enganosa (CDC, art. 6º)”. Ao final, uma emissora foi con<strong>de</strong>nada a in<strong>de</strong>nizar a outra em R$<br />

500.000,00, a título <strong>de</strong> danos morais.<br />

Visualizada a posição <strong>do</strong> CDC no or<strong>de</strong>namento jurídico nacional, bem como as concreções práticas <strong>de</strong>sse posicionamento,<br />

vejamos o estu<strong>do</strong> da aclamada teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes.<br />

1.3.<br />

O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E A TEORIA DO DIÁLOGO DAS<br />

FONTES<br />

Tema fundamental para a compreensão <strong>do</strong> campo <strong>de</strong> incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r refere-se à sua interação<br />

em relação às <strong>de</strong>mais leis, notadamente em relação ao vigente Código Civil.<br />

Como é notório, prevalecia, na vigência <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 1916, a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r


constituiria um microssistema jurídico autoaplicável e autossuficiente, totalmente isola<strong>do</strong> das <strong>de</strong>mais normas.17 Assim, naquela<br />

outrora vigente realida<strong>de</strong>, haven<strong>do</strong> uma relação <strong>de</strong> consumo, seria aplica<strong>do</strong> o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e não o Código<br />

Civil. Por outra via, presente uma relação civil, incidiria o Código Civil e não o CDC. Assim era ensinada a disciplina <strong>de</strong> <strong>Direito</strong><br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r na década <strong>de</strong> noventa e na primeira década <strong>do</strong> século XXI.<br />

Porém, essa concepção foi superada com o surgimento <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002 e da teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes. Tal tese foi<br />

<strong>de</strong>senvolvida na Alemanha por Erik Jayme, professor da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Hei<strong>de</strong>lberg, e trazida ao Brasil pela notável Claudia Lima<br />

Marques, da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul. A essência da teoria é <strong>de</strong> que as normas jurídicas não se excluem –<br />

supostamente porque pertencentes a ramos jurídicos distintos –, mas se complementam. No Brasil, a principal incidência da teoria<br />

se dá justamente na interação entre o CDC e o CC/2002, em matérias como a responsabilida<strong>de</strong> civil e o <strong>Direito</strong> Contratual. Do<br />

ponto <strong>de</strong> vista legal, a tese está baseada no art. 7º <strong>do</strong> CDC, que a<strong>do</strong>ta um mo<strong>de</strong>lo aberto <strong>de</strong> interação legislativa. Repise-se que, <strong>de</strong><br />

acor<strong>do</strong> com tal coman<strong>do</strong>, os direitos previstos no CDC não excluem outros <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> trata<strong>do</strong>s ou convenções internacionais <strong>de</strong><br />

que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, <strong>de</strong> regulamentos expedi<strong>do</strong>s pelas autorida<strong>de</strong>s administrativas<br />

competentes, bem como <strong>do</strong>s que <strong>de</strong>rivem <strong>do</strong>s princípios gerais <strong>do</strong> direito, analogia, costumes e equida<strong>de</strong>. Nesse contexto, é<br />

possível que a norma mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r esteja fora da própria Lei Consumerista, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o intérprete fazer a opção<br />

por esse preceito específico.<br />

Uma das principais justificativas que po<strong>de</strong>m surgir para a incidência refere-se à sua funcionalida<strong>de</strong>. É cediço que vivemos um<br />

momento <strong>de</strong> explosão <strong>de</strong> leis, um “Big Bang legislativo”, como simbolizou Ricar<strong>do</strong> Lorenzetti. O mun<strong>do</strong> pós-mo<strong>de</strong>rno e<br />

globaliza<strong>do</strong>, complexo e abundante por natureza, convive com uma quantida<strong>de</strong> enorme <strong>de</strong> normas jurídicas, a <strong>de</strong>ixar o aplica<strong>do</strong>r <strong>do</strong><br />

<strong>Direito</strong> até <strong>de</strong>snortea<strong>do</strong>. Repise-se a convivência com a era da <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m, conforme expõe o mesmo Lorenzetti.18 O diálogo das<br />

fontes serve como leme nessa tempesta<strong>de</strong> <strong>de</strong> complexida<strong>de</strong>.<br />

Desse mo<strong>do</strong>, diante <strong>do</strong> pluralismo pós-mo<strong>de</strong>rno, com inúmeras fontes legais, surge a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nação entre as leis<br />

que fazem parte <strong>do</strong> mesmo or<strong>de</strong>namento jurídico. 19 A expressão é feliz justamente pela a<strong>de</strong>quação à realida<strong>de</strong> social da pósmo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>.<br />

Ao justificar o diálogo das fontes, esclarece Claudia Lima Marques que “A bela expressão <strong>de</strong> Erik Jayme, hoje<br />

consagrada no Brasil, alerta-nos <strong>de</strong> que os tempos pós-mo<strong>de</strong>rnos não mais permitem esse tipo <strong>de</strong> clareza ou monossolução. A<br />

solução sistemática pós-mo<strong>de</strong>rna, em um momento posterior à <strong>de</strong>scodificação, à tópica e à microrrecodificação, procura uma<br />

eficiência não só hierárquica, mas funcional <strong>do</strong> sistema plural e complexo <strong>de</strong> nosso direito contemporâneo, <strong>de</strong>ve ser mais fluida,<br />

mais flexível, tratar diferentemente os diferentes, a permitir maior mobilida<strong>de</strong> e fineza <strong>de</strong> distinção. Nestes tempos, a superação <strong>de</strong><br />

paradigmas é substituída pela convivência <strong>do</strong>s paradigmas”. 20<br />

Como ensina a própria jurista, há um diálogo diante <strong>de</strong> influências recíprocas, com a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aplicação concomitante<br />

das duas normas ao mesmo tempo e ao mesmo caso, <strong>de</strong> forma complementar ou subsidiária. Há, assim, uma solução que é flexível<br />

e aberta, <strong>de</strong> interpenetração ou <strong>de</strong> busca, no sistema, da norma que seja mais favorável ao vulnerável.21 Ainda, como afirma a<br />

<strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>ra em outra obra, “O uso da expressão <strong>do</strong> mestre ‘diálogo das fontes’ é uma tentativa <strong>de</strong> expressar a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma<br />

aplicação coerente das leis <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong>, coexistentes no sistema. É a <strong>de</strong>nominada ‘coerência <strong>de</strong>rivada ou restaurada’<br />

(cohérence dérivée ou restaurée), que, em um momento posterior à <strong>de</strong>scodificação, à tópica e à microrrecodificação, procura uma<br />

eficiência não só hierárquica, mas funcional <strong>do</strong> sistema plural e complexo <strong>de</strong> nosso direito contemporâneo, a evitar a ‘antinomia’, a<br />

‘incompatibilida<strong>de</strong>’ ou a ‘não coerência’”. 22<br />

A possibilitar tal interação no que concerne às relações obrigacionais, sabe-se que houve uma aproximação principiológica<br />

entre o CDC e o CC/2002 no que tange aos contratos. Essa aproximação principiológica se <strong>de</strong>u pelos princípios sociais<br />

contratuais, que já estavam presentes na Lei Consumerista e foram transpostos para a codificação privada, quais sejam os<br />

princípios da autonomia privada, da boa-fé objetiva e da função social <strong>do</strong>s contratos. Nesse senti<strong>do</strong> e no campo <strong>do</strong>utrinário, na III<br />

Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, evento promovi<strong>do</strong> pelo Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral e pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça no ano <strong>de</strong> 2002,<br />

aprovou-se o Enuncia<strong>do</strong> n. 167, in verbis: “Com o advento <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002, houve forte aproximação principiológica<br />

entre esse Código e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, no que respeita à regulação contratual, uma vez que ambos são<br />

incorpora<strong>do</strong>res <strong>de</strong> uma nova teoria geral <strong>do</strong>s contratos”.<br />

Por isso, os <strong>de</strong>fensores <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, como o presente autor, não <strong>de</strong>vem temer o Código Civil <strong>de</strong> 2002, como temiam o<br />

Código Civil <strong>de</strong> 1916, norma essencialmente individualista e egoística. Como o Código Civil <strong>de</strong> 2002 po<strong>de</strong> servir também para a<br />

tutela efetiva <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, como se verá, supera-se, então, no que tange aos contratos, a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que o Código Consumerista<br />

seria um microssistema jurídico, totalmente isola<strong>do</strong> <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002.<br />

Simbologicamente, po<strong>de</strong>-se dizer que, pela teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes, supera-se a interpretação insular <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>, segun<strong>do</strong><br />

a qual cada ramo <strong>do</strong> conhecimento jurídico representaria uma ilha (símbolo cria<strong>do</strong> por José Fernan<strong>do</strong> Simão). O <strong>Direito</strong> passa a ser<br />

visualiza<strong>do</strong>, assim, como um sistema solar (interpretação sistemática e planetária), em que os planetas são os Códigos, os satélites<br />

são os estatutos próprios (caso <strong>do</strong> CDC) e o Sol é a Constituição Fe<strong>de</strong>ral, irradian<strong>do</strong> seus raios solares – seus princípios – por to<strong>do</strong>


o sistema (figura <strong>de</strong> Ricar<strong>do</strong> Luis Lorenzetti). Vejamos tais visualizações, <strong>de</strong> forma esquematizada:<br />

Deve ficar claro, contu<strong>do</strong>, e <strong>de</strong> antemão, que, apesar <strong>do</strong> termo “Código”, o CDC não tem um papel central no <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>,<br />

como tem o Código Civil Brasileiro. Isso porque os conceitos fundamentais priva<strong>do</strong>s constam da codificação privada, e não da Lei<br />

Consumerista. A título <strong>de</strong> exemplo, o CDC trata da prescrição e da <strong>de</strong>cadência, <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> consumo e da responsabilida<strong>de</strong><br />

civil consumerista. Todavia, os conceitos estruturantes <strong>de</strong> tais institutos constam <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002, como se verá na<br />

presente obra.<br />

Pois bem, Claudia Lima Marques <strong>de</strong>monstra três diálogos possíveis a partir da teoria exposta:23<br />

a)<br />

b)<br />

c)<br />

Haven<strong>do</strong> aplicação simultânea das duas leis, se uma lei servir <strong>de</strong> base conceitual para a outra, estará presente o<br />

diálogo sistemático <strong>de</strong> coerência. Exemplo: os conceitos <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> espécie po<strong>de</strong>m ser retira<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Código<br />

Civil, mesmo sen<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> consumo, caso <strong>de</strong> uma compra e venda (art. 481 <strong>do</strong> CC).<br />

Se o caso for <strong>de</strong> aplicação coor<strong>de</strong>nada <strong>de</strong> duas leis, uma norma po<strong>de</strong> completar a outra, <strong>de</strong> forma direta (diálogo <strong>de</strong><br />

complementarida<strong>de</strong>) ou indireta (diálogo <strong>de</strong> subsidiarieda<strong>de</strong>). O exemplo típico ocorre com os contratos <strong>de</strong> consumo<br />

que também são <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. Em relação às cláusulas abusivas, po<strong>de</strong> ser invocada a proteção <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res<br />

constante <strong>do</strong> art. 51 <strong>do</strong> CDC e, ainda, a proteção <strong>do</strong>s a<strong>de</strong>rentes constante <strong>do</strong> art. 424 <strong>do</strong> CC.<br />

Os diálogos <strong>de</strong> influências recíprocas sistemáticas estão presentes quan<strong>do</strong> os conceitos estruturais <strong>de</strong> uma<br />

<strong>de</strong>terminada lei sofrem influências da outra. Assim, o conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> sofrer influências <strong>do</strong> próprio<br />

Código Civil. Como afirma a própria Claudia Lima Marques, “é a influência <strong>do</strong> sistema especial no geral e <strong>do</strong> geral<br />

no especial, um diálogo <strong>de</strong> <strong>do</strong>ublé sens (diálogo <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nação e adaptação sistemática)”.<br />

Analisadas tais premissas fundamentais, é interessante trazer à colação, com os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s comentários, alguns julga<strong>do</strong>s<br />

nacionais que aplicaram a teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes, propon<strong>do</strong> uma interação entre o Código Civil <strong>de</strong> 2002 e o Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. De imediato, da recente jurisprudência <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, colaciona-se a seguinte ementa:<br />

“Ação civil pública. Contrato <strong>de</strong> arrendamento mercantil – leasing. Cláusula <strong>de</strong> seguro. Abusivida<strong>de</strong>. Inocorrência. 1. Não se po<strong>de</strong><br />

interpretar o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a tornar qualquer encargo contratual atribuí<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r como<br />

abusivo, sem observar que as relações contratuais se estabelecem, igualmente, através <strong>de</strong> regras <strong>de</strong> direito civil. 2. O CDC não<br />

exclui a principiologia <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> direito civil. Entre as normas consumeristas e as regras gerais <strong>do</strong>s contratos, insertas no<br />

Código Civil e legislação extravagante, <strong>de</strong>ve haver complementação e não exclusão. É o que a <strong>do</strong>utrina chama <strong>de</strong> Diálogo das<br />

Fontes. 3. Ante a natureza <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> arrendamento mercantil ou leasing, em que pese a empresa arrendante figurar como<br />

proprietária <strong>do</strong> bem, o arrendatário possui o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> conservar o bem arrenda<strong>do</strong>, para que ao final da avença, exercen<strong>do</strong> o seu<br />

direito, prorrogue o contrato, compre ou <strong>de</strong>volva o bem. 4. A cláusula que obriga o arrendatário a contratar seguro em nome da<br />

arrendante não é abusiva, pois aquele possui <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> conservação <strong>do</strong> bem, usufruin<strong>do</strong> da coisa como se <strong>do</strong>no fosse, suportan<strong>do</strong>, em<br />

razão disso, riscos e encargos inerentes a sua obrigação. O seguro, nessas circunstâncias, é garantia para o cumprimento da avença,<br />

protegen<strong>do</strong> o patrimônio <strong>do</strong> arrendante, bem como o indivíduo <strong>de</strong> infortúnios. 5. Rejeita-se, contu<strong>do</strong>, a venda casada, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o<br />

seguro ser realiza<strong>do</strong> em qualquer segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> livre escolha <strong>do</strong> interessa<strong>do</strong> 6. Recurso especial parcialmente conheci<strong>do</strong> e, nessa


extensão, provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1.060.515/DF – Quarta Turma – Rel. Des. Conv. Honil<strong>do</strong> Amaral <strong>de</strong> Mello Castro – j. 04.05.2010 –<br />

DJe 24.05.2010).<br />

Ainda no plano <strong>do</strong> STJ, anote-se que aquela jurisprudência superior já <strong>de</strong>bateu, com base no diálogo das fontes, a incidência<br />

ou não <strong>do</strong> prazo geral <strong>de</strong> prescrição <strong>do</strong> Código Civil na situação envolven<strong>do</strong> o tabagismo, por ser o prazo maior mais favorável ao<br />

consumi<strong>do</strong>r. Destaque-se que o tema ainda será aprofunda<strong>do</strong> na presente obra. No presente momento, colaciona-se apenas a<br />

ementa <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>, pela menção expressa à teoria:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r e civil. Art. 7º <strong>do</strong> CDC. Aplicação da lei mais favorável. Diálogo <strong>de</strong> fontes. Relativização <strong>do</strong> princípio da<br />

especialida<strong>de</strong>. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Tabagismo. Relação <strong>de</strong> consumo. Ação in<strong>de</strong>nizatória. Prescrição. Prazo. O mandamento<br />

constitucional <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve ser cumpri<strong>do</strong> por to<strong>do</strong> o sistema jurídico, em diálogo <strong>de</strong> fontes, e não somente por<br />

intermédio <strong>do</strong> CDC. Assim, e nos termos <strong>do</strong> art. 7º <strong>do</strong> CDC, sempre que uma lei garantir algum direito para o consumi<strong>do</strong>r, ela<br />

po<strong>de</strong>rá se somar ao microssistema <strong>do</strong> CDC, incorporan<strong>do</strong>-se na tutela especial e ten<strong>do</strong> a mesma preferência no trato da relação <strong>de</strong><br />

consumo. Diante disso, conclui-se pela inaplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> prazo prescricional <strong>do</strong> art. 27 <strong>do</strong> CDC à hipótese <strong>do</strong>s autos, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong><br />

incidir a prescrição vintenária <strong>do</strong> art. 177 <strong>do</strong> CC/1916, por ser mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r. Recente <strong>de</strong>cisão da 2ª Seção, porém,<br />

pacificou o entendimento quanto à incidência na espécie <strong>do</strong> prazo prescricional <strong>de</strong> 5 anos previsto no art. 27 <strong>do</strong> CDC, que <strong>de</strong>ve<br />

prevalecer, com a ressalva <strong>do</strong> entendimento pessoal da Relatora. Recursos especiais provi<strong>do</strong>s” (STJ – REsp 1009591/RS – Terceira<br />

Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi –, j. 13.04.2010 – DJe 23.08.2010).<br />

Também parece representar aplicação da teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes a recente Súmula n. 547 <strong>do</strong> STJ, <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 2015,<br />

segun<strong>do</strong> a qual “Nas ações em que se pleiteia o ressarcimento <strong>do</strong>s valores pagos a título <strong>de</strong> participação financeira <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r<br />

no custeio <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> re<strong>de</strong> elétrica, o prazo prescricional é <strong>de</strong> vinte anos na vigência <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 1916. Na vigência<br />

<strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002, o prazo é <strong>de</strong> cinco anos se houver previsão contratual <strong>de</strong> ressarcimento e <strong>de</strong> três anos na ausência <strong>de</strong><br />

cláusula nesse senti<strong>do</strong>, observada a regra <strong>de</strong> transição disciplinada em seu art. 2.028”. Trata-se <strong>de</strong> incidência <strong>de</strong>ssa teoria, pelo fato<br />

<strong>de</strong> se buscar a aplicação <strong>de</strong> prazos que estão previstos no Código Civil, pela ausência <strong>de</strong> norma específica no CDC.<br />

Em suma, como se retira <strong>de</strong> aresto <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2015, com precisão, “o <strong>Direito</strong> <strong>de</strong>ve ser compreendi<strong>do</strong>,<br />

em metáfora às ciências da natureza, como um sistema <strong>de</strong> vasos comunicantes, ou <strong>de</strong> diálogo das fontes (Erik Jayme), que permita<br />

a sua interpretação <strong>de</strong> forma holística. Deve-se buscar, sempre, evitar antinomias, ofensivas que são aos princípios da isonomia e<br />

da segurança jurídica, bem como ao próprio i<strong>de</strong>al humano <strong>de</strong> Justiça” (STJ – AgRg no REsp 1.483.780/PE – Primeira Turma –<br />

Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 23.06.2015, DJe 05.08.2015).<br />

Da mesma maneira, concretizan<strong>do</strong> a teoria e limitan<strong>do</strong> os juros cobra<strong>do</strong>s em cartão <strong>de</strong> crédito, <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Justiça<br />

da Bahia, entre tantas ementas que se repetem:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Cartão <strong>de</strong> crédito. Juros abusivos. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Juros: estipulação usurária pecuniária ou real.<br />

Trata-se <strong>de</strong> crime previsto na Lei 1.521/1951, art. 4º. Limitação prevista na Lei 4.595/1964 e nas normas <strong>do</strong> Conselho Monetário<br />

Nacional, regulação vigorante, ainda que <strong>de</strong>pois da revogação <strong>do</strong> art. 192 da CF/1988, pela Emenda Constitucional 40, <strong>de</strong> 2003.<br />

Manutenção da razoabilida<strong>de</strong> e limitação <strong>de</strong> prática <strong>de</strong> juros pelo art. 161 <strong>do</strong> CTN combinan<strong>do</strong> com 406 e 591 <strong>do</strong> CC/2002. A<br />

cláusula geral da boa-fé está presente tanto no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r (arts. 4º, III, e 51, IV, e § 1º, <strong>do</strong> CDC) como no<br />

Código Civil <strong>de</strong> 2002 (arts. 113, 187 e 422, <strong>do</strong> CC/2002), que <strong>de</strong>vem atuar em diálogo (diálogo das fontes, na expressão <strong>de</strong> Erik<br />

Jayme) e sob a luz da Constituição e <strong>do</strong>s direitos fundamentais para proteger os direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res (art. 7º <strong>do</strong> CDC).<br />

Relembre-se, aqui, portanto, o Enuncia<strong>do</strong> <strong>de</strong> n. 25 da Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, organizada pelo STJ em 2002, que afirma: ‘a<br />

cláusula geral contida no art. 422 <strong>do</strong> novo Código Civil impõe ao juiz interpretar e, quan<strong>do</strong> necessário, suprir e corrigir o contrato<br />

segun<strong>do</strong> a boa-fé objetiva, entendida como exigência <strong>de</strong> comportamento legal <strong>do</strong>s contratantes’. Recurso improce<strong>de</strong>nte” (TJBA –<br />

Recurso 0204106-62.2007.805.0001-1 – Segunda Turma Recursal – Rel. Juíza Nicia Olga Andra<strong>de</strong> <strong>de</strong> Souza Dantas – DJBA<br />

25.01.2010).<br />

Do Tribunal <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Norte, da mesma maneira tentan<strong>do</strong> uma aproximação conceitual entre os <strong>do</strong>is Códigos,<br />

colaciona-se:<br />

“Civil. CDC. Processo Civil. Apelação cível. Juízo <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong> positivo. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais. Contrato <strong>de</strong><br />

promessa <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> imóvel. Notificação cartorária. Cobrança in<strong>de</strong>vida. Prestação <strong>de</strong> serviços. Relação <strong>de</strong> consumo<br />

configurada. Incidência <strong>do</strong> Código Civil. Diálogo das fontes. Responsabilida<strong>de</strong> objetiva. Vício <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>. Dano moral.<br />

configura<strong>do</strong>. Dano à honra. Abalo à saú<strong>de</strong>. Quantum in<strong>de</strong>nizatório excessivo. Redução. Minoração da con<strong>de</strong>nação em honorários<br />

advocatícios. Recurso conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong> em parte” (TJRN – Acórdão 2009.010644-0, Natal – Terceira Câmara Cível – Rel. Juíza<br />

Conv. Maria Neize <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Fernan<strong>de</strong>s – DJRN 03.12.2009, p. 39).<br />

Tratan<strong>do</strong> da coexistência entre as leis, enuncia<strong>do</strong> fundamental da teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes, <strong>de</strong>staque-se <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal<br />

<strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul:


“Embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração. Ensino particular. Desnecessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>bater to<strong>do</strong>s os argumentos das partes. Aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Diálogo das fontes. 1. Formada a convicção pelo julga<strong>do</strong>r que já encontrou motivação suficiente para<br />

alicerçar sua <strong>de</strong>cisão, e fundamentada nesse senti<strong>do</strong>, consi<strong>de</strong>ram-se afastadas teses, normas ou argumentos porventura esgrimi<strong>do</strong>s<br />

em senti<strong>do</strong>s diversos. 2. Em matéria <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r vige um méto<strong>do</strong> <strong>de</strong> superação das antinomias chama<strong>do</strong> <strong>de</strong> diálogo das fontes,<br />

segun<strong>do</strong> o qual o diploma consumerista coexiste com as <strong>de</strong>mais fontes <strong>de</strong> direito como o Código Civil e Leis esparsas. Embargos<br />

<strong>de</strong>sacolhi<strong>do</strong>s” (TJRS – Embargos <strong>de</strong> Declaração 70027747146, Caxias <strong>do</strong> Sul – Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Liége Puricelli<br />

Pires – j. 18.12.2008 – DOERS 05.02.2009, p. 43).<br />

Por fim, sem prejuízo <strong>de</strong> inúmeros outros julga<strong>do</strong>s que utilizaram a teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes, merecem relevo os seguintes<br />

acórdãos <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> São Paulo, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> buscan<strong>do</strong> uma complementarida<strong>de</strong> entre o CC/2002 e o CDC:<br />

“Civil. Compromisso <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> imóvel. Transação. Carta <strong>de</strong> crédito. Relação <strong>de</strong> consumo. Lei 8.078/1990. Diálogo das<br />

fontes. Abusivida<strong>de</strong> das condições consignadas em carta <strong>de</strong> crédito. Valida<strong>de</strong> <strong>do</strong> instrumento quanto ao reconhecimento <strong>de</strong> dívida.<br />

Processual civil. Honorários. Princípio da sucumbência e da causalida<strong>de</strong>. Arbitramento em conformida<strong>de</strong> com o disposto no art. 20,<br />

§ 3º <strong>do</strong> CPC. Recurso <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação com Revisão 293.227.4/4 – Acórdão 3233316, São Paulo – Segunda Câmara<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Boris Padron Kauffmann – j. 09.09.2008 – DJESP 01.10.2008).<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Defeito em construção. Contrato <strong>de</strong> empreitada mista. Responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong> empreiteiro. Análise<br />

conjunta <strong>do</strong> CC e CDC. Diálogo das fontes. Sentença mantida. Recurso improvi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação com revisão 281.083.4/3 –<br />

Acórdão 3196517, Bauru – Oitava Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Caetano Lagrasta – j. 21.08.2008, DJESP 09.09.2008).<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil por vícios <strong>de</strong> construção. Desconformida<strong>de</strong> entre o projeto e a obra. Pare<strong>de</strong>s <strong>de</strong> espessura inferior às<br />

constantes <strong>do</strong> projeto, que provocam alterações acústicas e <strong>de</strong> temperatura nas unida<strong>de</strong>s autônomas. Responsabilida<strong>de</strong> da<br />

incorpora<strong>do</strong>ra e construtora pela correta execução <strong>do</strong> empreendimento. Vinculação da incorpora<strong>do</strong>ra e construtora à execução das<br />

benfeitorias prometidas, que integram o preço. Desvalorização <strong>do</strong> empreendimento. In<strong>de</strong>nização pelos vícios <strong>de</strong> construção e pelas<br />

<strong>de</strong>sconformida<strong>de</strong>s com o projeto original e a oferta aos adquirentes das unida<strong>de</strong>s. Inocorrência <strong>de</strong> prescrição ou <strong>de</strong>cadência da<br />

pretensão ou direito à in<strong>de</strong>nização. Incidência <strong>do</strong> prazo prescricional <strong>de</strong> soli<strong>de</strong>z da obra <strong>do</strong> Código Civil. Diálogo das fontes com o<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Ação proce<strong>de</strong>nte. Recurso improvi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação cível 407.157.4/8 – Acórdão 2635077,<br />

Piracicaba – Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Francisco Loureiro – j. 29.05.2008 – DJESP 20.06.2008).<br />

Superadas essas ilustrações, <strong>de</strong>ve ficar bem claro que a teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes é realida<strong>de</strong> inafastável <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r no Brasil. Sen<strong>do</strong> assim, tal premissa teórica, por diversas vezes, será utilizada como linha <strong>de</strong> argumentação na<br />

presente obra. De toda sorte, cumpre <strong>de</strong>stacar que a teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes surge para substituir e superar os critérios<br />

clássicos <strong>de</strong> solução das antinomias jurídicas (hierárquico, da especialida<strong>de</strong> e cronológico). Realmente, esse será o seu papel no<br />

futuro. No momento, ainda é possível conciliar os clássicos critérios com a aclamada tese.<br />

1.4.<br />

O CONTEÚDO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E A ORGANIZAÇÃO<br />

DA PRESENTE OBRA<br />

Este livro procura analisar os principais conceitos e construções que constam da Lei 8.078, <strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1990,<br />

conheci<strong>do</strong> como Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r em seus aspectos materiais e processuais. A sua organização segue justamente a<br />

divisão meto<strong>do</strong>lógica constante naquela lei.<br />

Desse mo<strong>do</strong>, superada a presente introdução, o Capítulo 2 <strong>de</strong>sta obra aborda os princípios estruturantes <strong>do</strong> Código Brasileiro<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, retira<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s arts. 4º e 6º da Lei 8.078/1990.<br />

Em continuida<strong>de</strong>, no Capítulo 3 são estuda<strong>do</strong>s os elementos da relação jurídica <strong>de</strong> consumo (elementos subjetivos e objetivos),<br />

ten<strong>do</strong> como parâmetros estruturais os arts. 2º e 3º <strong>do</strong> CDC, sem prejuízo <strong>de</strong> outros coman<strong>do</strong>s, caso <strong>do</strong>s seus arts. 17 e 29, que<br />

tratam <strong>do</strong> conceito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r por equiparação ou bystan<strong>de</strong>r.<br />

No Capítulo 4, o cerne <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> é a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos e presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços, um <strong>do</strong>s<br />

temas mais importantes <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r na atualida<strong>de</strong>, matéria tratada entre os arts. 8º a 27.<br />

O Capítulo 5 tem por objeto a proteção contratual <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, constante <strong>do</strong>s arts. 46 a 54, capítulo que também traz<br />

regras fundamentais para a realida<strong>de</strong> contemporânea consumerista.<br />

Ten<strong>do</strong> por objeto também as práticas comerciais, assim como o tópico anterior, o Capítulo 6 aborda a proteção <strong>do</strong>s<br />

consumi<strong>do</strong>res quanto à oferta e publicida<strong>de</strong>, com enfoque teórico e prático (arts. 30 a 38).<br />

No Capítulo 7, ainda com relação às práticas comerciais, verifica-se o estu<strong>do</strong> das práticas abusivas, ten<strong>do</strong> como parâmetro os<br />

arts. 30 a 42-A da Lei Consumerista.<br />

O importante e atual tema <strong>do</strong>s cadastros <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res é a matéria <strong>do</strong> Capítulo 8 <strong>de</strong>ste livro, com análise da natureza <strong>do</strong>s


cadastros positivos e negativos (arts. 43 e 44 <strong>do</strong> CDC), à luz da melhor <strong>do</strong>utrina e da atual jurisprudência. O Capítulo 9 trata <strong>de</strong><br />

aspectos materiais da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica tratada pelo CDC.<br />

Esses nove primeiros capítulos foram <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong>s pelo presente autor.<br />

O Capítulo 10 analisa questões da <strong>de</strong>fesa individual <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo. O Capítulo 11 aborda a tutela coletiva <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r. O Capítulo 12 trata <strong>de</strong> aspectos processuais relativos à <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica. No Capítulo 13, o<br />

tema é a Or<strong>de</strong>m Pública e o <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Por fim, o Capítulo 14 encerra o tema <strong>do</strong> habeas data na ótica <strong>do</strong> CDC. Os<br />

cinco últimos capítulos foram escritos pelo coautor <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção <strong>Neves</strong>, estan<strong>do</strong> <strong>de</strong>vidamente atualiza<strong>do</strong>s frente ao<br />

Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

Vejamos, então, to<strong>do</strong>s esses institutos, <strong>de</strong> forma sucessiva e aprofundada.<br />

1 Conforme se extrai da obra Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> Anteprojeto, <strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> Ada Pellegrini<br />

Grinover e outros (8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 1).<br />

2<br />

3<br />

4<br />

5<br />

6<br />

7<br />

8<br />

9<br />

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18<br />

19<br />

20<br />

21<br />

22<br />

23<br />

BITTAR, Eduar<strong>do</strong> C. B. O direito na pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 2005. p. 97-100.<br />

BITTAR, Eduar<strong>do</strong> C. B. O direito na pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, cit., p. 108.<br />

JAPIASSU, Hilton Ferreira. A crise da razão no oci<strong>de</strong>nte. Disponível em: .<br />

Acesso em: 17 mar. 2009.<br />

JAYME, Erik. O direito internacional priva<strong>do</strong> <strong>do</strong> novo milênio: a proteção da pessoa humana em face da globalização. Trad. Claudia Lima<br />

Marques e Nádia <strong>de</strong> Araújo. In: Marques, Claudia Lima; Araújo, Nádia <strong>de</strong> (Coord.). O novo direito internacional. Estu<strong>do</strong>s em<br />

homenagem a Erik Jayme. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 2005. p. 4.<br />

JAYME, Erik. Il diritto internazionale privato estense. Revista di Diritto Internazionale Privato e Processuale. Estrato. Diretta da Fausto Pocar,<br />

Tullio Treves, Sergio M. Carbone, Andrea Giardina, Riccar<strong>do</strong> Luzzatto, Franco Mosconi, Pa<strong>do</strong>va: Cedam, ano XXXII, n. 1,<br />

Gennaio/Marzo 1996. p. 18.<br />

JAYME, Erik. Il diritto internazionale privato estense, cit., p. 18.<br />

Ver: LORENZETTI, Ricar<strong>do</strong> Luis. Fundamentos <strong>do</strong> direito priva<strong>do</strong>. Trad. Vera Maria Jacob Fra<strong>de</strong>ra. São Paulo: RT, 1998. p. 44; LORENZETTI,<br />

Ricar<strong>do</strong> Luis. Teoria da <strong>de</strong>cisão judicial. Fundamentos <strong>de</strong> direito. Trad. Bruno Miragem. Notas e revisão da tradução Claudia Lima<br />

Marques. São Paulo: RT, 2009. p. 43.<br />

MARQUES, Claudia Lima. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: RT, 2004. p. 26, nota n. 3. Trata-se da introdução à<br />

obra coletiva escrita em coautoria com Antonio Herman <strong>de</strong> V. Benjamin e Bruno Miragem, em que a <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>ra expõe a teoria <strong>do</strong><br />

diálogo das fontes.<br />

AZEVEDO, Antonio Junqueira <strong>de</strong>. Parecer. O direito como sistema complexo e <strong>de</strong> 2ª or<strong>de</strong>m; sua autonomia. Ato nulo e ato ilícito.<br />

Diferença <strong>de</strong> espírito entre responsabilida<strong>de</strong> civil e penal. Necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prejuízo para haver direito a in<strong>de</strong>nização na<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil. Estu<strong>do</strong>s e pareceres <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong>. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 26-27.<br />

LORENZETTI, Ricar<strong>do</strong> Luis. Teoria da <strong>de</strong>cisão judicial. Fundamentos <strong>de</strong> direito, cit., p. 359-360.<br />

Sobre o tema: BOBBIO, Norberto. A era <strong>do</strong>s direitos. São Paulo: Campus, 2004.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 91.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 906.<br />

KELSEN, Hans. Teoria pura <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>. 8. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009.<br />

MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilida<strong>de</strong> civil no transporte aéreo. São Paulo: Atlas, 2006. p. 419.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, por exemplo: RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, cit., p. 93-94.<br />

To<strong>do</strong>s os referenciais teóricos <strong>do</strong> jurista argentino constam em: LORENZETTI, Ricar<strong>do</strong> Luis. Teoria da <strong>de</strong>cisão judicial, cit.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São<br />

Paulo: RT, 2005. p. 26.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: RT, 2008.<br />

p. 89.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, cit., p. 29.<br />

MARQUES, Claudia Lima. Manual <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, cit., p. 87.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, cit., p. 91.


PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO CÓDIGO DE<br />

DEFESA DO CONSUMIDOR<br />

Sumário: 2.1. Primeiras palavras sobre os princípios jurídicos – 2.2. Princípio <strong>do</strong> protecionismo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r<br />

(art. 1º da Lei 8.078/1990) – 2.3. Princípio da vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (art. 4º, inc. I, da Lei 8.078/1990) – 2.4.<br />

Princípio da hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (art. 6º, inc. VIII, da Lei 8.078/1990) – 2.5. Princípio da boa-fé objetiva<br />

(art. 4º, inc. III, da Lei 8.078/1990) – 2.6. Princípio da transparência ou da confiança (arts. 4º, caput, e 6º, inc. III, da<br />

Lei 8.078/1990). A tutela da informação – 2.7. Princípio da função social <strong>do</strong> contrato – 2.8. Princípio da<br />

equivalência negocial (art. 6º, inc. II, da Lei 8.078/1990) – 2.9. Princípio da reparação integral <strong>do</strong>s danos (art. 6º, inc.<br />

VI, da Lei 8.078/1990). Os danos reparáveis nas relações <strong>de</strong> consumo.<br />

2.1.<br />

PRIMEIRAS PALAVRAS SOBRE OS PRINCÍPIOS JURÍDICOS<br />

O estu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s princípios consagra<strong>do</strong>s pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é um <strong>do</strong>s pontos <strong>de</strong> partida para a compreensão<br />

<strong>do</strong> sistema a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pela Lei Consumerista como norma protetiva <strong>do</strong>s vulneráveis negociais. Como é notório, a Lei 8.078/1990<br />

a<strong>do</strong>tou um sistema aberto <strong>de</strong> proteção, basea<strong>do</strong> em conceitos legais in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s e construções vagas, que possibilitam uma<br />

melhor a<strong>de</strong>quação <strong>do</strong>s preceitos às circunstâncias <strong>do</strong> caso concreto.<br />

Nesse contexto, é interessante fazer a <strong>de</strong>vida confrontação principiológica entre o CDC e o Código Civil, até porque muitos<br />

<strong>do</strong>s conceitos que constam da codificação privada <strong>de</strong> 2002 encontram suas raízes na Lei 8.078/1990. Certo é que, diante <strong>de</strong><br />

diferenças principiológicas históricas e políticas, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r encontrava-se muito distante <strong>do</strong> Código Civil<br />

<strong>de</strong> 1916, realida<strong>de</strong> essa alterada a partir da vigência <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002, como foi exposto no capítulo introdutório <strong>de</strong>sta obra.<br />

O Código Civil <strong>de</strong> 1916 era uma norma essencialmente agrarista, patrimonialista e egoísta, que não protegia qualquer parte<br />

vulnerável da relação jurídica estabelecida. Na verda<strong>de</strong>, como expõe Ro<strong>do</strong>lfo Pamplona Filho em suas palestras, o Código Civil <strong>de</strong><br />

1916 era norma estruturada apenas para o amparo <strong>de</strong> uma figura jurídica: o fazen<strong>de</strong>iro casa<strong>do</strong>. Por outra via, o Código Civil <strong>de</strong><br />

2002, além <strong>de</strong> proteger o a<strong>de</strong>rente contratual como parte mais fraca da relação (arts. 423 e 424), consagra muitos preceitos já<br />

previstos na lei protetiva, tais como a vedação <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito e da onerosida<strong>de</strong> excessiva, a valorização da boa-fé objetiva e da<br />

tutela da confiança, a responsabilida<strong>de</strong> objetiva fundada no risco, a proibição <strong>do</strong> enriquecimento sem causa, entre outros.<br />

Diante da aproximação das duas leis, como foi <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> no Capítulo 1 <strong>de</strong>sta obra, Claudia Lima Marques, a partir <strong>do</strong>s<br />

ensinamentos <strong>de</strong> Erik Jayme, propõe diálogos <strong>de</strong> interação entre o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e o atual Código Civil,<br />

buscan<strong>do</strong> estabelecer premissas para um diálogo sistemático <strong>de</strong> coerência, <strong>de</strong> complementarida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> subsidiarieda<strong>de</strong>, <strong>de</strong><br />

coor<strong>de</strong>nação e adaptação sistemática.1 Nesse contexto <strong>de</strong> balizamento, Claudia Lima Marques leciona que “o novo Código Civil<br />

brasileiro, Lei 10.406, <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2002 (a seguir CC/2002), traz ao direito priva<strong>do</strong> brasileiro geral os mesmos princípios já<br />

presentes no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r (como a função social <strong>do</strong>s contratos, a boa-fé objetiva etc.)”. 2 Isso porque “a<br />

convergência <strong>de</strong> princípios entre o CDC e o CC/2002 é a base da inexistência principiológica <strong>de</strong> conflitos possíveis entre estas<br />

duas leis que, com igualda<strong>de</strong> e equida<strong>de</strong>, visam a harmonia nas relações civis em geral e nas <strong>de</strong> consumo ou especiais. Como<br />

ensina a Min. Eliana Calmon: ‘O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é diploma legislativo que já se amolda aos novos postula<strong>do</strong>s,<br />

inscritos como princípios éticos, tais como a boa-fé, lealda<strong>de</strong>, cooperação, equilíbrio e harmonia das relações’”. 3


Justamente por isso, repise-se que, quan<strong>do</strong> da III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral e pelo<br />

Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2004, foi aprova<strong>do</strong> o Enuncia<strong>do</strong> n. 167, com teor muito próximo ao texto acima<br />

transcrito. Conforme proposta <strong>do</strong> magistra<strong>do</strong> paraibano Wladimir Alcibía<strong>de</strong>s Marinho Falcão Cunha, o enuncia<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrinário<br />

aponta que, com o advento <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002, houve forte aproximação principiológica <strong>de</strong>sse Código em relação ao Código<br />

<strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r no que respeita à regulação contratual, eis que ambos são incorpora<strong>do</strong>res <strong>de</strong> uma nova teoria geral <strong>do</strong>s<br />

contratos. Das justificativas apresentadas pelo jurista, merece <strong>de</strong>staque o seguinte trecho:<br />

“Entretanto po<strong>de</strong>-se dizer que, até o advento <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002, somente o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r encampava essa<br />

nova concepção contratual, ou seja, somente o CDC intervinha diretamente no conteú<strong>do</strong> material <strong>do</strong>s contratos. Entretanto, o<br />

Código Civil <strong>de</strong> 2002 passou também a incorporar esse caráter cogente no trato das relações contratuais, intervin<strong>do</strong> diretamente no<br />

conteú<strong>do</strong> material <strong>do</strong>s contratos, em especial através <strong>do</strong>s próprios novos princípios contratuais da função social, da boa-fé objetiva e<br />

da equivalência material. Assim, a corporificação legislativa <strong>de</strong> uma atualizada teoria geral <strong>do</strong>s contratos protagonizada pelo CDC<br />

teve sua continuida<strong>de</strong> com o advento <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002, o qual, a exemplo daquele, encontra-se carrega<strong>do</strong> <strong>de</strong> novos<br />

princípios jurídicos contratuais e cláusulas gerais, to<strong>do</strong>s hábeis a proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r mais fraco nas relações contratuais<br />

comuns, sempre em conexão axiológica, valorativa, entre dita norma e a Constituição Fe<strong>de</strong>ral e seus princípios constitucionais.<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e o Código Civil <strong>de</strong> 2002 são, pois, normas representantes <strong>de</strong> uma nova concepção <strong>de</strong> contrato e,<br />

como tal, possuem pontos <strong>de</strong> confluência em termos <strong>de</strong> teoria contratual, em especial no que respeita aos princípios informa<strong>do</strong>res <strong>de</strong><br />

uma e <strong>de</strong> outra norma” (III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil. Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral. Org. Min. Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar. Brasília: CJF,<br />

2005).4<br />

Na mesma perspectiva, o Ministro <strong>do</strong> STF Luiz Edson Fachin, em artigo publica<strong>do</strong> em Portugal, menciona a existência <strong>de</strong> um<br />

approach entre o novo Código Civil brasileiro e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 5 De acor<strong>do</strong> com essa realida<strong>de</strong>, a<br />

compreensão <strong>do</strong>s princípios <strong>do</strong> CDC significa também, indiretamente, a percepção <strong>do</strong>s regramentos básicos <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong><br />

2002. Com este trabalho, portanto, o estudioso <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> tem condições <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r a sistemática <strong>de</strong> duas leis ao mesmo<br />

tempo, o que justifica a elaboração <strong>do</strong> presente capítulo, <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista técnico e meto<strong>do</strong>lógico. Em suma, a análise <strong>do</strong>s<br />

princípios jurídicos possibilita uma visão panorâmica <strong>do</strong> sistema jurídico, em uma antecipação <strong>de</strong> todas as abordagens que<br />

seguirão neste trabalho.<br />

Não se po<strong>de</strong> esquecer, ato contínuo, da importância <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s princípios jurídicos, que são regramentos básicos aplicáveis<br />

a uma <strong>de</strong>terminada categoria ou ramo <strong>do</strong> conhecimento. Os princípios são abstraí<strong>do</strong>s das normas, <strong>do</strong>s costumes, da <strong>do</strong>utrina, da<br />

jurisprudência e <strong>de</strong> aspectos políticos, econômicos e sociais. Reconhece-se, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> Rubens Limongi França, a força normativa <strong>do</strong>s<br />

princípios, bem como, mais recentemente, a sua posição constitucional e incidência imediata.6<br />

No aspecto conceitual, interessante a construção <strong>de</strong> Miguel Reale, para quem “Os princípios são ‘verda<strong>de</strong>s fundantes’ <strong>de</strong> um<br />

sistema <strong>de</strong> conhecimento, como tais admitidas, por serem evi<strong>de</strong>ntes ou por terem si<strong>do</strong> comprovadas, mas também por motivos <strong>de</strong><br />

or<strong>de</strong>m prática <strong>de</strong> caráter operacional, isto é, como pressupostos exigi<strong>do</strong>s pelas necessida<strong>de</strong>s da pesquisa e da praxis”. 7 Entre os<br />

consumeristas, cumpre <strong>de</strong>stacar a visão <strong>de</strong> Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery, os quais lecionam que os princípios são<br />

“regras <strong>de</strong> conduta que norteiam o juiz na interpretação da norma, <strong>do</strong> ato ou negócio jurídico. Os princípios gerais <strong>de</strong> direito não se<br />

encontram positiva<strong>do</strong>s no sistema normativo. São regras estáticas que carecem <strong>de</strong> concreção. Têm como função principal auxiliar<br />

o juiz no preenchimento das lacunas”. 8<br />

De toda sorte, alerte-se que os princípios não são aplica<strong>do</strong>s apenas em casos <strong>de</strong> lacunas da lei, <strong>de</strong> forma meramente<br />

subsidiária, mas também <strong>de</strong> forma imediata, para corrigir normas injustas em <strong>de</strong>terminadas situações. Em muitas concreções<br />

envolven<strong>do</strong> entes priva<strong>do</strong>s – inclusive fornece<strong>do</strong>res e consumi<strong>do</strong>res –, os princípios têm incidência imediata, como se verá na<br />

presente obra. Na esteira <strong>de</strong>ssas últimas conclusões, não se po<strong>de</strong> esquecer que, muitas vezes, os princípios encontram-se expressos<br />

nas normas jurídicas, mas não necessariamente. No caso <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, muitos <strong>do</strong>s princípios a seguir <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong>s<br />

po<strong>de</strong>m ser retira<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s arts. 1º, 4º e 6º da Lei 8.078/1990. Todavia, existem princípios que são implícitos ao sistema protetivo,<br />

caso <strong>do</strong> princípio da função social <strong>do</strong>s contratos.<br />

Conforme notícia vinculada por mensagem eletrônica enviada pelo Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Política <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

(BRASILCON), a importância vital <strong>do</strong>s princípios consumeristas para to<strong>do</strong> o <strong>Direito</strong> foi reconhecida pela International Law<br />

Association (ILA-Londres), um <strong>do</strong>s principais fóruns <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Internacional <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> da realização <strong>do</strong> 75.º Congresso<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Internacional, realiza<strong>do</strong> em Sófia (Bulgária), nos dias 26 a 30 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 2012. Na ocasião, foi elaborada a<br />

Declaração <strong>de</strong> Sófia sobre o Desenvolvimento <strong>de</strong> Princípios Internacionais <strong>de</strong> Proteção <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, com a edição <strong>do</strong>s<br />

seguintes regramentos fundamentais a respeito da matéria: “a) Princípio da vulnerabilida<strong>de</strong> – os consumi<strong>do</strong>res são vulneráveis<br />

frente aos contratos <strong>de</strong> massa e padroniza<strong>do</strong>s, em especial no que concerne à informação e ao po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> negociação; b) Princípio da<br />

proteção mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r – é <strong>de</strong>sejável, em <strong>Direito</strong> Internacional Priva<strong>do</strong>, <strong>de</strong>senvolver standards e aplicar normas<br />

que permitam aos consumi<strong>do</strong>res beneficiarem-se da proteção mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r; c) Princípio da justiça contratual – as


egras e o regulamento <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong>vem ser efetivos e assegurar transparência e justiça contratual; d) Princípio <strong>do</strong><br />

crédito responsável – crédito responsável impõe responsabilida<strong>de</strong> a to<strong>do</strong>s os envolvi<strong>do</strong>s no fornecimento <strong>de</strong> crédito ao consumi<strong>do</strong>r,<br />

inclusive fornece<strong>do</strong>res, corretores, agentes e consultores; e) Princípio da participação <strong>do</strong>s grupos e associações <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res –<br />

grupos e associações <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res <strong>de</strong>vem participar ativamente na elaboração e na regulação da proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r”.<br />

Como se verá, os princípios expostos pela presente obra estão muito próximos <strong>do</strong>s edita<strong>do</strong>s naquele importante evento<br />

internacional. Vejamos, então, o seu estu<strong>do</strong>, <strong>de</strong> forma pontual.<br />

2.2.<br />

PRINCÍPIO DO PROTECIONISMO DO CONSUMIDOR (ART. 1º DA LEI 8.078/1990)<br />

Do texto legal, o princípio <strong>do</strong> protecionismo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> ser retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 1º da Lei 8.078/1990, segun<strong>do</strong> o qual o<br />

Código Consumerista estabelece normas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública e interesse social, nos termos <strong>do</strong> art. 5º, inc. XXXII, e <strong>do</strong> art. 170, inc.<br />

V da Constituição Fe<strong>de</strong>ral, além <strong>do</strong> art. 48 <strong>de</strong> suas Disposições Transitórias. Não se po<strong>de</strong> esquecer que, conforme o segun<strong>do</strong><br />

coman<strong>do</strong> constitucional cita<strong>do</strong>, a proteção <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res é um <strong>do</strong>s fundamentos da or<strong>de</strong>m econômica brasileira.<br />

A natureza <strong>de</strong> norma <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública e interesse social justifica plenamente o teor da Lei 12.291/2010, que torna obrigatória<br />

a exibição <strong>de</strong> um exemplar <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r em to<strong>do</strong>s os estabelecimentos comerciais <strong>do</strong> País, sob pena <strong>de</strong><br />

imposição <strong>de</strong> multa no valor <strong>de</strong> R$ 1.064,10 (hum mil e sessenta e quatro reais e <strong>de</strong>z centavos). Na verda<strong>de</strong>, mais <strong>do</strong> que isso,<br />

diante <strong>de</strong> sua inegável importância para a socieda<strong>de</strong>, o <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>veria ser matéria obrigatória na gra<strong>de</strong> <strong>do</strong> ensino<br />

médio nas escolas <strong>do</strong> Brasil. Por óbvio, <strong>de</strong>ve ser ainda disciplina autônoma e compulsória nas faculda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>, o que não<br />

ocorre, muitas vezes.9<br />

O princípio <strong>do</strong> protecionismo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r enfeixa algumas consequências práticas que não po<strong>de</strong>m ser esquecidas.<br />

A primeira consequência é que as regras da Lei 8.078/1990 não po<strong>de</strong>m ser afastadas por convenção entre as partes, sob pena<br />

<strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> absoluta. Como fundamento para essa conclusão, po<strong>de</strong> ser citada a previsão <strong>do</strong> art. 51, inc. XV, <strong>do</strong> próprio CDC,<br />

segun<strong>do</strong> o qual são nulas <strong>de</strong> pleno direito as cláusulas abusivas que estejam em <strong>de</strong>sacor<strong>do</strong> com o sistema <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r. O tema ainda será aprofunda<strong>do</strong> no Capítulo 5 <strong>de</strong>ste livro, que trata da proteção contratual.<br />

Como segunda consequência, cabe sempre a intervenção <strong>do</strong> Ministério Público em questões envolven<strong>do</strong> problemas <strong>de</strong><br />

consumo. A Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985) reconhece a legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Ministério Público para as <strong>de</strong>mandas<br />

coletivas envolven<strong>do</strong> danos materiais e morais aos consumi<strong>do</strong>res (art. 1º). Tal incremento na atuação <strong>do</strong> Ministério Público<br />

representa a própria evolução da instituição, eis que, como bem aponta o promotor <strong>de</strong> justiça gaúcho Julio César Finger, “A parte<br />

mais visível <strong>de</strong>sse ‘novo’ Ministério Público foi a constitucionalização e a posterior popularização das ações civis públicas para a<br />

efetivação <strong>de</strong> direitos coletivos e difusos. As ações movidas pelo Ministério Público serviram <strong>de</strong> base para a formação <strong>de</strong> uma<br />

‘<strong>do</strong>utrina’ nacional acerca <strong>do</strong> que se configurariam esses ‘novos direitos’”. 10<br />

Como terceira consequência, toda a proteção constante da Lei Protetiva <strong>de</strong>ve ser conhecida <strong>de</strong> ofício pelo juiz, caso da<br />

nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> eventual cláusula abusiva. Assim sen<strong>do</strong>, fica claro que representa uma total afronta ao princípio <strong>do</strong> protecionismo <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r o teor da Súmula 381 <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, segun<strong>do</strong> a qual, nos contratos bancários, é veda<strong>do</strong> ao julga<strong>do</strong>r<br />

conhecer <strong>de</strong> ofício das abusivida<strong>de</strong>s das cláusulas contratuais. A crítica à referida ementa igualmente será aprofundada no Capítulo<br />

5 <strong>de</strong>ste livro, com as <strong>de</strong>vidas referências <strong>do</strong>utrinárias.<br />

Cabe frisar que, como feliz iniciativa, o Projeto <strong>de</strong> Lei 281/2012 – uma das projeções legislativas <strong>de</strong> Reforma <strong>do</strong> CDC em<br />

curso no Congresso Nacional – preten<strong>de</strong> ampliar o senti<strong>do</strong> <strong>de</strong>sse protecionismo, incluin<strong>do</strong> um parágrafo único ao art. 1º da Lei<br />

8.078/1990, com a seguinte redação: “As normas e os negócios jurídicos <strong>de</strong>vem ser interpreta<strong>do</strong>s e integra<strong>do</strong>s da maneira mais<br />

favorável ao consumi<strong>do</strong>r”. Como se verá em vários trechos <strong>de</strong>ste livro, tal caminho hermenêutico já po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve ser a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong>,<br />

visan<strong>do</strong> a efetiva tutela <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res brasileiros.<br />

Ressaltan<strong>do</strong> ainda mais a importância <strong>do</strong> princípio em questão, <strong>de</strong>staque-se, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2013, a emergência <strong>do</strong> Decreto 7.963,<br />

que institui o Plano Nacional <strong>de</strong> Consumo e Cidadania e cria a Câmara Nacional das Relações <strong>de</strong> Consumo. Nos termos <strong>do</strong> seu art.<br />

1º, tal Plano tem como finalida<strong>de</strong> promover a proteção e <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em to<strong>do</strong> o território nacional, por meio da<br />

integração e articulação <strong>de</strong> políticas, programas e ações. O Plano Nacional <strong>de</strong> Consumo e Cidadania será executa<strong>do</strong> pela União em<br />

colaboração com Esta<strong>do</strong>s, Distrito Fe<strong>de</strong>ral, Municípios e com a socieda<strong>de</strong>. São suas diretivas fundamentais: a) educação para o<br />

consumo; b) a<strong>de</strong>quada e eficaz prestação <strong>do</strong>s serviços públicos; c) garantia <strong>do</strong> acesso <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r à justiça; d) garantia <strong>de</strong><br />

produtos e serviços com padrões a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>, segurança, durabilida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>sempenho; e) fortalecimento da participação<br />

social na <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res; f) prevenção e repressão <strong>de</strong> condutas que violem direitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r; e g)<br />

auto<strong>de</strong>terminação, privacida<strong>de</strong>, confi<strong>de</strong>ncialida<strong>de</strong> e segurança das informações e da<strong>do</strong>s pessoais presta<strong>do</strong>s ou coleta<strong>do</strong>s, inclusive<br />

por meio eletrônico (art. 2º).


Seguin<strong>do</strong> na análise <strong>do</strong>s <strong>de</strong>mais regramentos fundamentais <strong>do</strong> CDC, frise-se que to<strong>do</strong>s os princípios a seguir são <strong>de</strong>corrências<br />

naturais <strong>do</strong> princípio <strong>do</strong> protecionismo, retira<strong>do</strong> também da última norma citada, e que surgiu para amparar o vulnerável negocial<br />

na socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong> massa (mass consumption society). Como bem explica Rizzatto Nunes a respeito <strong>do</strong> protecionismo,<br />

“o fato é que todas as normas instituídas no CDC têm como princípio e meta a proteção e a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r”.11<br />

2.3.<br />

PRINCÍPIO DA VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR (ART. 4º, INC. I, DA LEI<br />

8.078/1990)<br />

Pela leitura <strong>do</strong> art. 4º, inc. I, <strong>do</strong> CDC é constatada a clara intenção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r em <strong>do</strong>tar o consumi<strong>do</strong>r, em todas as situações,<br />

da condição <strong>de</strong> vulnerável na relação jurídica <strong>de</strong> consumo. De acor<strong>do</strong> com a realida<strong>de</strong> da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo, não há como<br />

afastar tal posição <strong>de</strong>sfavorável, principalmente se forem levadas em conta as revoluções pelas quais passaram as relações jurídicas<br />

e comerciais nas últimas décadas. Carlos Alberto Bittar comenta muito bem essas <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s, <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> que “essas<br />

<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s não encontram, nos sistemas jurídicos oriun<strong>do</strong>s <strong>do</strong> liberalismo, resposta eficiente para a solução <strong>de</strong> problemas que<br />

<strong>de</strong>correm da crise <strong>de</strong> relacionamento e <strong>de</strong> lesionamentos vários que sofrem os consumi<strong>do</strong>res, pois os Códigos se estruturaram com<br />

base em uma noção <strong>de</strong> parida<strong>de</strong> entre as partes, <strong>de</strong> cunho abstrato”.12 Diante da vulnerabilida<strong>de</strong> patente <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, surgiu<br />

a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> elaboração <strong>de</strong> uma lei protetiva própria, caso da nossa Lei 8.078/1990.<br />

Com efeito, há tempos não se po<strong>de</strong> falar mais no po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> barganha antes presente entre as partes negociais, nem mesmo em<br />

posição <strong>de</strong> equivalência nas relações obrigacionais existentes na socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo. Os antigos elementos subjetivos da<br />

relação obrigacional (cre<strong>do</strong>r e <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r) ganharam nova <strong>de</strong>nominação no merca<strong>do</strong>, bem como outros tratamentos legislativos.<br />

Nesse contexto <strong>de</strong> mudança, diante <strong>de</strong>ssa frágil posição <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r é que se justifica o surgimento <strong>de</strong> um estatuto jurídico<br />

próprio para sua proteção. Conforme as lições <strong>de</strong> Claudia Lima Marques, Antonio Herman V. Benjamin e Bruno Miragem, “a<br />

vulnerabilida<strong>de</strong> é mais um esta<strong>do</strong> da pessoa, um esta<strong>do</strong> inerente <strong>de</strong> risco ou um sinal <strong>de</strong> confrontação excessiva <strong>de</strong> interesses<br />

i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong> no merca<strong>do</strong> (assim Ripert, Le règle morale, p. 153), é uma situação permanente ou provisória, individual ou coletiva<br />

(Fiechter-Boulvard, Rapport, p. 324), que fragiliza, enfraquece o sujeito <strong>de</strong> direitos, <strong>de</strong>sequilibran<strong>do</strong> a relação. A vulnerabilida<strong>de</strong><br />

não é, pois, o fundamento das regras <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong> sujeito mais fraco, é apenas a ‘explicação’ <strong>de</strong>stas regras ou da atuação <strong>do</strong><br />

legisla<strong>do</strong>r (Fiechter-Boulvar, Rapport, p. 324), é a técnica para as aplicar bem, é a noção instrumental que guia e ilumina a<br />

aplicação <strong>de</strong>stas normas protetivas e reequilibra<strong>do</strong>ras, à procura <strong>do</strong> fundamento da igualda<strong>de</strong> e da justiça equitativa”. 13<br />

Entre os juristas europeus, Gui<strong>do</strong> Alpa questiona as razões para a proteção legal <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. Entre essas, aponta a tutela<br />

da pessoa como o principal motivo para tal amparo.14 Desse mo<strong>do</strong>, não há como afastar, como principal justificativa para o<br />

surgimento <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, a proteção da dignida<strong>de</strong> da pessoa humana, que entre nós está consagrada no art.<br />

1º, III, da Constituição da República.<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> raciocínio, não se olvi<strong>de</strong> a exposição <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r aos meios <strong>de</strong> oferta e informação, sen<strong>do</strong> impossível que<br />

a parte tenha conhecimento amplo sobre to<strong>do</strong>s os produtos e serviços coloca<strong>do</strong>s no merca<strong>do</strong>. A publicida<strong>de</strong> e os <strong>de</strong>mais meios <strong>de</strong><br />

oferecimento <strong>do</strong> produto ou serviço estão relaciona<strong>do</strong>s a essa vulnerabilida<strong>de</strong>, eis que <strong>de</strong>ixam o consumi<strong>do</strong>r à mercê das vantagens<br />

sedutoras expostas pelos veículos <strong>de</strong> comunicação e informação.<br />

Com a mitigação <strong>do</strong> mo<strong>de</strong>lo liberal da autonomia da vonta<strong>de</strong> e a massificação <strong>do</strong>s contratos, percebe-se uma discrepância na<br />

discussão e aplicação das regras comerciais, o que justifica a presunção <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong>, reconhecida como uma condição<br />

jurídica, pelo tratamento legal <strong>de</strong> proteção. Tal presunção é absoluta ou iure et <strong>de</strong> iure, não aceitan<strong>do</strong> <strong>de</strong>clinação ou prova em<br />

contrário, em hipótese alguma. 15 Trazen<strong>do</strong> interessante conclusão a respeito <strong>de</strong>ssa presunção absoluta, insta colacionar <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong><br />

Tribunal <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul:<br />

“Plano Nosso Mo<strong>do</strong>. TIM Celular S.A. Estação móvel celular. Prestação <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> telefonia móvel a microempresa. Comodato.<br />

Mau funcionamento. Inc. II, <strong>do</strong> art. 333, <strong>do</strong> CPC. Prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial não inicia<strong>do</strong>. VIII, <strong>do</strong> art. 6º, <strong>do</strong> CDC. Hipossuficiência.<br />

Verossimilhança. Vulnerabilida<strong>de</strong>. Art. 4º <strong>do</strong> CDC. (1) ‘o CDC não faz distinção entre pessoa física ou jurídica, ao formular o<br />

conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r, quan<strong>do</strong> estes adquirem serviços na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>stinatário final, que buscam o atendimento <strong>de</strong> sua<br />

necessida<strong>de</strong> própria; ainda mais quan<strong>do</strong> se trata <strong>de</strong> bem <strong>de</strong> consumo, além <strong>de</strong> haver um <strong>de</strong>sequilíbrio entre as partes’. (…). Ainda,<br />

impõe-se dizer que o <strong>de</strong>mandante, conforme o art. 4º <strong>do</strong> CDC é vulnerável, pois não possui conhecimento técnico-científico <strong>do</strong><br />

serviço que contratou, este conceito diz respeito à relação <strong>de</strong> direito material, ten<strong>do</strong> presunção absoluta, não admitin<strong>do</strong> prova em<br />

contrário’ (Recurso 71000533554, Porto Alegre, 3ª Turma Recursal Cível, TJRS, j. 13.07.2004, unânime, Rel. Dra. Maria <strong>de</strong><br />

Lour<strong>de</strong>s Galvão Braccini <strong>de</strong> Gonzalez)” (TJRS – Recurso Cível 71000533554, Porto Alegre – Terceira Turma Recursal Cível – Rel.<br />

Des. Maria <strong>de</strong> Lour<strong>de</strong>s Galvão Braccini <strong>de</strong> Gonzalez – j. 13.07.2004).<br />

O que se percebe, portanto, é que o conceito <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> é diverso <strong>do</strong> <strong>de</strong> hipossuficiência. To<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r é sempre<br />

vulnerável, característica intrínseca à própria condição <strong>de</strong> <strong>de</strong>stinatário final <strong>do</strong> produto ou serviço, mas nem sempre será


hipossuficiente, como se verá a seguir. Assim, enquadran<strong>do</strong>-se a pessoa como consumi<strong>do</strong>ra, fará jus aos benefícios previstos nesse<br />

importante estatuto jurídico protetivo. Assim, po<strong>de</strong>-se dizer que a vulnerabilida<strong>de</strong> é elemento posto da relação <strong>de</strong> consumo e não<br />

um elemento pressuposto, em regra.16 O elemento pressuposto é a condição <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r. Vejamos, <strong>de</strong> forma esquematizada:<br />

Sintetizan<strong>do</strong>, constata-se que a expressão consumi<strong>do</strong>r vulnerável é pleonástica, uma vez que to<strong>do</strong>s os consumi<strong>do</strong>res têm tal<br />

condição, <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> uma presunção que não admite discussão ou prova em contrário. Para concretizar, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a melhor<br />

concepção consumerista, uma pessoa po<strong>de</strong> ser vulnerável em <strong>de</strong>terminada situação – sen<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>ra –, mas em outro caso<br />

concreto po<strong>de</strong>rá não assumir tal condição, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> da relação jurídica consubstanciada no caso concreto. A título <strong>de</strong> exemplo,<br />

po<strong>de</strong>-se citar o caso <strong>de</strong> um empresário bem-sucedi<strong>do</strong>. Caso esse empresário adquira um bem <strong>de</strong> produção para sua empresa, não<br />

po<strong>de</strong>rá ser enquadra<strong>do</strong> como <strong>de</strong>stinatário final <strong>do</strong> produto, não sen<strong>do</strong> um consumi<strong>do</strong>r vulnerável. Entretanto, adquirin<strong>do</strong> um bem<br />

para uso próprio e <strong>de</strong>le não retiran<strong>do</strong> lucro, será consumi<strong>do</strong>r, haven<strong>do</strong> a presunção absoluta <strong>de</strong> sua vulnerabilida<strong>de</strong>.<br />

Por <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iro, este autor enten<strong>de</strong> que, para se reconhecer a vulnerabilida<strong>de</strong>, pouco importa a situação política, social,<br />

econômica ou financeira da pessoa, bastan<strong>do</strong> a condição <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r, enquadramento que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da análise <strong>do</strong>s arts. 2º e 3º da<br />

Lei 8.078/1990, para daí <strong>de</strong>correrem to<strong>do</strong>s os benefícios legislativos, na melhor concepção <strong>do</strong> Código Consumerista. Deve-se<br />

<strong>de</strong>ixar claro que enten<strong>de</strong>r que a situação da pessoa natural ou jurídica po<strong>de</strong>rá influir na vulnerabilida<strong>de</strong> é confundir o princípio da<br />

vulnerabilida<strong>de</strong> com o da hipossuficiência, objeto <strong>de</strong> estu<strong>do</strong> a partir <strong>de</strong> agora.<br />

2.4.<br />

PRINCÍPIO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO CONSUMIDOR (ART. 6º, INC. VIII, DA LEI<br />

8.078/1990)<br />

Ao contrário <strong>do</strong> que ocorre com a vulnerabilida<strong>de</strong>, a hipossuficiência é um conceito fático e não jurídico, funda<strong>do</strong> em uma<br />

disparida<strong>de</strong> ou discrepância notada no caso concreto. Assim sen<strong>do</strong>, to<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r é vulnerável, mas nem to<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r é<br />

hipossuficiente. Logicamente, o significa<strong>do</strong> <strong>de</strong> hipossuficiência não po<strong>de</strong>, <strong>de</strong> maneira alguma, ser analisa<strong>do</strong> <strong>de</strong> maneira restrita,<br />

<strong>de</strong>ntro apenas <strong>de</strong> um conceito <strong>de</strong> discrepância econômica, financeira ou política.<br />

A hipossuficiência, conforme ensina a <strong>do</strong>utrina, po<strong>de</strong> ser técnica, pelo <strong>de</strong>sconhecimento em relação ao produto ou serviço<br />

adquiri<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> essa a sua natureza perceptível na maioria <strong>do</strong>s casos. Nessa linha, aponta Roberto Senise Lisboa que “O<br />

reconhecimento judicial da hipossuficiência <strong>de</strong>ve ser feito, <strong>de</strong>starte, à luz da situação socioeconômica <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r perante o<br />

fornece<strong>do</strong>r (hipossuficiência fática). Todavia, a hipossuficiência fática não é a única modalida<strong>de</strong> contemplada na noção <strong>de</strong><br />

hipossuficiência, à luz <strong>do</strong> art. 4º da Lei <strong>de</strong> Introdução. Também caracteriza hipossuficiência a situação jurídica que impe<strong>de</strong> o<br />

consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> obter a prova que se tornaria indispensável para responsabilizar o fornece<strong>do</strong>r pelo dano verifica<strong>do</strong> (hipossuficiência<br />

técnica). Explica-se. Muitas vezes o consumi<strong>do</strong>r não tem como <strong>de</strong>monstrar o nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> para a fixação da<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, já que este é quem possui a integralida<strong>de</strong> das informações e o conhecimento técnico <strong>do</strong> produto ou<br />

serviço <strong>de</strong>feituoso”.17<br />

Desse mo<strong>do</strong>, o conceito <strong>de</strong> hipossuficiência vai além <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> literal das expressões pobre ou sem recursos, aplicáveis nos<br />

casos <strong>de</strong> concessão <strong>do</strong>s benefícios da justiça gratuita, no campo processual. O conceito <strong>de</strong> hipossuficiência consumerista é mais<br />

amplo, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser aprecia<strong>do</strong> pelo aplica<strong>do</strong>r <strong>do</strong> direito caso a caso, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> reconhecer a disparida<strong>de</strong> técnica ou<br />

informacional, diante <strong>de</strong> uma situação <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconhecimento, conforme reconhece a melhor <strong>do</strong>utrina e jurisprudência. 18 Pelos<br />

inúmeros julga<strong>do</strong>s, vejamos <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, em que a questão é <strong>de</strong>batida para a <strong>de</strong>vida inversão <strong>do</strong> ônus<br />

da prova:<br />

“<strong>Direito</strong> Processual Civil. Recurso especial. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais e materiais. Ocorrência <strong>de</strong> saques in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s <strong>de</strong><br />

numerário <strong>de</strong>posita<strong>do</strong> em conta poupança. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova. Art. 6º, VIII, <strong>do</strong> CDC. Possibilida<strong>de</strong>. Hipossuficiência técnica<br />

reconhecida. O art. 6º, VIII, <strong>do</strong> CDC, com vistas a garantir o pleno exercício <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, estabelece que a<br />

inversão <strong>do</strong> ônus da prova será <strong>de</strong>ferida quan<strong>do</strong> a alegação por ele apresentada seja verossímil, ou quan<strong>do</strong> constatada a sua<br />

hipossuficiência. Na hipótese, reconhecida a hipossuficiência técnica <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, em ação que versa sobre a realização <strong>de</strong><br />

saques não autoriza<strong>do</strong>s em contas bancárias, mostra-se imperiosa a inversão <strong>do</strong> ônus probatório. Diante da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> permitir<br />

ao recorri<strong>do</strong> a produção <strong>de</strong> eventuais provas capazes <strong>de</strong> ilidir a pretensão in<strong>de</strong>nizatória <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>verão ser remeti<strong>do</strong>s os<br />

autos à instância inicial, a fim <strong>de</strong> que oportunamente seja prolatada uma nova sentença. Recurso especial provi<strong>do</strong> para <strong>de</strong>terminar a<br />

inversão <strong>do</strong> ônus da prova na espécie” (STJ – REsp 915.599/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 21.08.2008 –


DJe 05.09.2008).<br />

Como antes se adiantou, <strong>de</strong>corrência direta da hipossuficiência é o direito à inversão <strong>do</strong> ônus da prova a favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r,<br />

nos termos <strong>do</strong> art. 6º, VIII, da Lei 8.0788/1990, que reconhece como um <strong>do</strong>s direitos básicos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r “a facilitação da<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> seus direitos, inclusive com a inversão <strong>do</strong> ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quan<strong>do</strong>, a critério <strong>do</strong> juiz, for<br />

verossímil a alegação ou quan<strong>do</strong> for ele hipossuficiente, segun<strong>do</strong> as regras ordinárias <strong>de</strong> experiências”. A matéria é <strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />

interesse para a <strong>de</strong>fesa individual e coletiva <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res em juízo, assunto que será aprofunda<strong>do</strong> no Capítulo 10 da presente<br />

obra.<br />

De toda sorte, vale rever aquela ilustração anterior. No caso <strong>do</strong> empresário bem-sucedi<strong>do</strong> que adquire um bem para consumo<br />

próprio, será ele consumi<strong>do</strong>r, sen<strong>do</strong>, portanto, vulnerável. Todavia, o enquadramento ou não como hipossuficiente <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da<br />

análise das circunstâncias <strong>do</strong> caso concreto. Sen<strong>do</strong> ele <strong>de</strong>sconhece<strong>do</strong>r <strong>do</strong> produto ou serviço que está adquirin<strong>do</strong> – o que, aliás, é a<br />

regra no mun<strong>do</strong> prático –, po<strong>de</strong>rá ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> hipossuficiente.<br />

Concluin<strong>do</strong> o presente item, po<strong>de</strong>-se dizer que a hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r constitui um plus, um algo a mais, que traz a<br />

ele mais um benefício, qual seja a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pleitear, no campo judicial, a inversão <strong>do</strong> ônus <strong>de</strong> provar, conforme estatui o<br />

art. 6º, VIII, da Lei 8.078/1990. Nesse ponto, cumpre repisar mais uma vez, diferencia-se da vulnerabilida<strong>de</strong>, conceito jurídico<br />

in<strong>de</strong>clinável que justifica toda a proteção constante <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, em to<strong>do</strong>s os seus aspectos e seus preceitos.<br />

2.5.<br />

PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA (ART. 4º, INC. III, DA LEI 8.078/1990)<br />

Regramento vital <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, representan<strong>do</strong> seu coração, é o princípio da boa-fé objetiva, constante<br />

da longa redação <strong>do</strong> seu art. 4º, inciso III. Enuncia tal coman<strong>do</strong> que constitui um <strong>do</strong>s princípios da Política Nacional das Relações<br />

<strong>de</strong> Consumo a “harmonização <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong>s participantes das relações <strong>de</strong> consumo e compatibilização da proteção <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r com a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento econômico e tecnológico, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a viabilizar os princípios nos quais se<br />

funda a or<strong>de</strong>m econômica (art. 170 da Constituição Fe<strong>de</strong>ral), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre<br />

consumi<strong>do</strong>res e fornece<strong>do</strong>res”. Nesse contexto, nas relações negociais consumeristas <strong>de</strong>ve estar presente o justo equilíbrio, em<br />

uma correta harmonia entre as partes, em to<strong>do</strong>s os momentos relaciona<strong>do</strong>s com a prestação e o fornecimento.<br />

Dentro <strong>de</strong>ssas i<strong>de</strong>ias, é <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> importância a observação <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> boa-fé, principalmente pela evolução sistemática <strong>de</strong><br />

sua construção. Não se po<strong>de</strong> esquecer que o conceito <strong>de</strong> boa-fé contratual que consta <strong>do</strong> atual Código Civil tem sua raiz na<br />

construção consumerista da Lei 8.078/1990. Justamente por isso, quan<strong>do</strong> da I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, realizada pelo Conselho da<br />

Justiça Fe<strong>de</strong>ral e pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça em 2002, reconheceu-se a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> relacionar a boa-fé objetiva prevista<br />

no Código Civil com a regra constante <strong>do</strong> art. 4º, III, <strong>do</strong> CDC, pelo teor <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 27: “na interpretação da cláusula geral da<br />

boa-fé, <strong>de</strong>ve-se levar em conta o sistema <strong>do</strong> Código Civil e as conexões sistemáticas com outros estatutos normativos e fatores<br />

metajurídicos”. Nota-se que o enuncia<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrinário reconhece a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> diálogos entre as duas leis no que concerne a tal<br />

princípio, em uma feliz tentativa <strong>de</strong> conexão legislativa.<br />

Como é notório, a boa-fé objetiva representa uma evolução <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> boa-fé, que saiu <strong>do</strong> plano psicológico ou<br />

intencional (boa-fé subjetiva), para o plano concreto da atuação humana (boa-fé objetiva). Pelo conceito anterior <strong>de</strong> boa-fé<br />

subjetiva, relativo ao elemento intrínseco <strong>do</strong> sujeito da relação negocial, a boa-fé estaria incluída nos limites da vonta<strong>de</strong> da pessoa.<br />

Esse conceito <strong>de</strong> boa-fé subjetiva, condiciona<strong>do</strong> somente à intenção das partes, acaba <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> <strong>de</strong> la<strong>do</strong> a conduta, que nada mais é<br />

<strong>do</strong> que a própria concretização <strong>de</strong>ssa vonta<strong>de</strong>. E como se sabe, conforme o dito popular, não basta ser bem intenciona<strong>do</strong>, pois <strong>de</strong><br />

pessoas bem intencionadas o inferno está cheio.<br />

Cumpre esclarecer que foi com o jusnaturalismo, e toda a influência católica e cristã, que a boa-fé ganhou sua nova faceta,<br />

concernente a conduta <strong>do</strong>s negociantes, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>nominada boa-fé objetiva. Nessa fase, foi fundamental o pensamento <strong>de</strong> Hugo<br />

Grotius, que <strong>de</strong>u uma nova dimensão à boa-fé, ao atrelá-la à interpretação <strong>do</strong>s negócios jurídicos, particularmente no campo<br />

contratual.19 No <strong>Direito</strong> Compara<strong>do</strong>, outros pensa<strong>do</strong>res, como Pufen<strong>do</strong>rf, procuraram trazer a boa-fé para o campo da conduta,<br />

relacionan<strong>do</strong>-a com uma “regra histórica <strong>de</strong> comportamento”. 20 Da subjetivação saltou-se para a objetivação, o que é consolida<strong>do</strong><br />

pelas codificações privadas europeias.<br />

No BGB Alemão, por exemplo, está prevista a boa-fé objetiva no parágrafo 242, segun<strong>do</strong> o qual o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r está obriga<strong>do</strong> a<br />

cumprir a prestação <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com os requisitos <strong>de</strong> fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> e boa-fé, levan<strong>do</strong> em consi<strong>de</strong>ração os usos e bons costumes. No<br />

<strong>Direito</strong> alemão, duas expressões são utilizadas para apontar as modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> boa-fé ora expostas. O termo Guten Glauben – que<br />

quer dizer, literalmente, bom pensamento – <strong>de</strong>nota a boa-fé subjetiva, enquanto Treu und Glauben – fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> e pensamento – a<br />

boa-fé objetiva.<br />

Da atuação concreta das partes na relação contratual é que surge o conceito <strong>de</strong> boa-fé objetiva, que, nas palavras <strong>de</strong> Claudia


Lima Marques, Herman Benjamin e Bruno Miragem, constitui uma regra <strong>de</strong> conduta. 21 Na mesma linha, conforme reconhece o<br />

Enuncia<strong>do</strong> n. 26 da Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral, aprova<strong>do</strong> na I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, a boa-fé objetiva vem a ser a exigência <strong>de</strong><br />

um comportamento <strong>de</strong> lealda<strong>de</strong> <strong>do</strong>s participantes negociais, em todas as fases <strong>do</strong> negócio. A boa-fé objetiva tem relação direta com<br />

os <strong>de</strong>veres anexos ou laterais <strong>de</strong> conduta, que são <strong>de</strong>veres inerentes a qualquer negócio, sem a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> previsão no<br />

instrumento. Entre eles merecem <strong>de</strong>staque o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> cuida<strong>do</strong>, o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> respeito, o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> lealda<strong>de</strong>, o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> probida<strong>de</strong>, o<br />

<strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar, o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> transparência, o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> agir honestamente e com razoabilida<strong>de</strong>. 22<br />

Atualizan<strong>do</strong> a obra, frise-se que a boa-fé objetiva também foi valorizada <strong>de</strong> maneira consi<strong>de</strong>rável pelo Novo Código <strong>de</strong><br />

Processo Civil, consolidan<strong>do</strong>-se na norma a boa-fé objetiva processual. Nos termos <strong>do</strong> seu art. 5º, aquele que <strong>de</strong> qualquer forma<br />

participa <strong>do</strong> processo <strong>de</strong>ve comportar-se <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a boa-fé. Em reforço, to<strong>do</strong>s os sujeitos <strong>do</strong> processo <strong>de</strong>vem cooperar entre<br />

si para que se obtenha, em tempo razoável, <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> mérito justa e efetiva (art. 6º <strong>do</strong> CPC/2015, consagra<strong>do</strong>r <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong><br />

colaboração processual). Destaque-se, também, a vedação das <strong>de</strong>cisões-surpresa pelos julga<strong>do</strong>res, pois o art. 10 <strong>do</strong> Estatuto<br />

Processual emergente enuncia que o juiz não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir, em grau algum <strong>de</strong> jurisdição, com base em fundamento a respeito <strong>do</strong><br />

qual não se tenha da<strong>do</strong> às partes oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se manifestar, ainda que se trate <strong>de</strong> matéria sobre a qual <strong>de</strong>va <strong>de</strong>cidir <strong>de</strong> ofício.<br />

Como se verá em outros trechos <strong>de</strong>ste livro, tal regra tem aplicação para as relações <strong>de</strong> consumo, especialmente no caso <strong>de</strong><br />

reconhecimento <strong>de</strong> ofício da nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusulas abusivas. Merece ser mencionada, ainda, a regra <strong>do</strong> art. 489, § 3º, <strong>do</strong> CPC/2015,<br />

pelo qual a <strong>de</strong>cisão judicial <strong>de</strong>ve ser interpretada a partir da conjugação <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os seus elementos e em conformida<strong>de</strong> com o<br />

princípio da boa-fé.<br />

Na órbita consumerista, Claudia Lima Marques, Herman Benjamin e Bruno Miragem lecionam que a boa-fé objetiva tem três<br />

funções básicas:<br />

1ª)<br />

2ª)<br />

3ª)<br />

Servir como fonte <strong>de</strong> novos <strong>de</strong>veres especiais <strong>de</strong> conduta durante o vínculo contratual, os <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong>s <strong>de</strong>veres anexos, que serão por<br />

nós oportunamente estuda<strong>do</strong>s (função cria<strong>do</strong>ra).<br />

Constituir uma causa limita<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> exercício, antes lícito, hoje abusivo, <strong>do</strong>s direitos subjetivos (função limita<strong>do</strong>ra).<br />

Ser utilizada como concreção e interpretação <strong>do</strong>s contratos (função interpreta<strong>do</strong>ra).23<br />

Os mesmos juristas <strong>de</strong>monstram que “boa-fé é cooperação e respeito, é conduta esperada e leal, tutelada em todas as relações<br />

sociais”. 24 Dessa forma, por esse princípio, exige-se no contrato <strong>de</strong> consumo o máximo <strong>de</strong> respeito e colaboração entre as partes,<br />

<strong>de</strong>ven<strong>do</strong> aquele que atua com má-fé ser penaliza<strong>do</strong> por uma interpretação a contrario sensu, ou por sanções que estão previstas na<br />

própria lei consumerista, como a <strong>de</strong>cretação da nulida<strong>de</strong> <strong>do</strong> negócio ou a imputação da responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva.<br />

A boa-fé objetiva traz a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> equilíbrio negocial, que, na ótica <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ve ser manti<strong>do</strong> em to<strong>do</strong>s os<br />

momentos pelos quais passa o negócio jurídico. Sobre o tema, o argentino Carlos Gustavo Vallespinos ensina que “en este ámbito<br />

po<strong>de</strong>mos señalar que la búsqueda <strong>de</strong>l equilibrio negocial se manifiesta en la necesidad <strong>de</strong> un mayor intervencionismo estatal a la<br />

hora <strong>de</strong> pon<strong>de</strong>rar to<strong>do</strong> el fenómeno negocial entre consumi<strong>do</strong>res o usuarios y los provee<strong>do</strong>res profesionales, es <strong>de</strong>cidir abarcativo<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> la etapa previa al contrato, publicidad incluida, hasta el perío<strong>do</strong> poscontractual, pasan<strong>do</strong> por lo atinente al conteni<strong>do</strong> y<br />

ejecución <strong>de</strong>l contrato”.25<br />

Verificadas tais conceituações, vejamos algumas regras que traduzem, na Lei 8.078/1990, a melhor expressão concreta <strong>do</strong><br />

princípio em análise.<br />

De início, o art. 9º <strong>do</strong> CDC valoriza a boa-fé objetiva, ao prever o <strong>de</strong>ver <strong>do</strong> presta<strong>do</strong>r ou fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> informar o consumi<strong>do</strong>r<br />

quanto ao perigo e à nocivida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produto ou serviço que coloca no merca<strong>do</strong>, visan<strong>do</strong> à proteção da sua saú<strong>de</strong> e da sua segurança.<br />

A imputação <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva, prevista nos arts. 12, 14 e 18 <strong>do</strong> Código Consumerista, traz as consequências<br />

<strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> <strong>de</strong>srespeito a tal <strong>de</strong>ver, haven<strong>do</strong> uma ampliação <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>, inclusive pela informação mal prestada. Em<br />

tais hipóteses, a boa-fé objetiva é <strong>de</strong>terminante para apontar a responsabilida<strong>de</strong> pré-contratual, <strong>de</strong>corrente da má informação, da<br />

publicida<strong>de</strong> enganosa e abusiva.<br />

Em relação aos meios <strong>de</strong> oferta, o Código Consumerista consagra normas <strong>de</strong> interessante conteú<strong>do</strong>. Entre elas, o princípio da<br />

boa-fé objetiva faz-se sentir no seu art. 31, que estabelece a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> informações precisas quanto à essência, quantida<strong>de</strong> e<br />

qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço; <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, traz em seu bojo o regramento em questão, o que vem sen<strong>do</strong> observa<strong>do</strong> na<br />

prática, com a imposição <strong>de</strong> sanções específicas em casos em que se percebe a má-fé na fase <strong>de</strong> oferta <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço.<br />

No Código <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, a valorização da boa-fé objetiva também po<strong>de</strong> ser visualizada pela proibição <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong><br />

simulada, abusiva e enganosa, conforme os seus arts. 36 e 37, respectivamente.<br />

Partin<strong>do</strong> para outro aspecto, o art. 39 <strong>do</strong> Código Consumerista estabelece o conceito <strong>de</strong> abuso <strong>de</strong> direito como precursor da<br />

ilicitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> ato <strong>de</strong> consumo, em rol exemplificativo <strong>de</strong> situações, com a penalização civil <strong>de</strong> condutas cometidas pelos presta<strong>do</strong>res<br />

e fornece<strong>do</strong>res que não agem <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a boa-fé esperada nas relações pessoais.


Por fim, na esfera contratual, o art. 48 <strong>do</strong> CDC regula especificamente as responsabilida<strong>de</strong>s pré-contratual e pós-contratual <strong>do</strong><br />

negócio <strong>de</strong> consumo, conceitos inerentes ao princípio da boa-fé objetiva. De acor<strong>do</strong> com esse dispositivo, todas as <strong>de</strong>clarações <strong>de</strong><br />

vonta<strong>de</strong> constantes <strong>de</strong> escritos particulares, recibos e pré-contratos <strong>de</strong>correntes da relação <strong>de</strong> consumo vinculam o fornece<strong>do</strong>r ou<br />

presta<strong>do</strong>r, ensejan<strong>do</strong> inclusive a execução específica, prevista no art. 84 da Lei Consumerista.<br />

Aqui fica muito bem evi<strong>de</strong>nciada a exigência <strong>de</strong> uma conduta leal <strong>do</strong>s contratantes em todas as fases <strong>do</strong> negócio jurídico. Essa<br />

responsabilida<strong>de</strong> presente em todas as fases <strong>do</strong> negócio também po<strong>de</strong> ser observada no capítulo específico que trata da oferta,<br />

publicida<strong>de</strong> e propaganda (arts. 30 a 38 da Lei 8.078/1990). O tema ainda será aprofunda<strong>do</strong> em capítulos específicos <strong>de</strong>sta obra,<br />

com os correspon<strong>de</strong>ntes exemplos práticos. De toda sorte, não se po<strong>de</strong> esquecer que, em qualquer esfera negocial, a boa-fé objetiva<br />

tem incidência em todas as suas fases. Nesse senti<strong>do</strong>, os Enuncia<strong>do</strong>s ns. 25 e 170, aprova<strong>do</strong>s nas Jornadas <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil,<br />

estabelecen<strong>do</strong> que o juiz <strong>de</strong>ve aplicar e as partes <strong>de</strong>vem respeitar a boa-fé objetiva nas fases pré-contratual, contratual e póscontratual.<br />

2.6.<br />

PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA OU DA CONFIANÇA (ARTS. 4º, CAPUT, E 6º,<br />

INC. III, DA LEI 8.078/1990). A TUTELA DA INFORMAÇÃO<br />

O mun<strong>do</strong> contemporâneo é caracteriza<strong>do</strong> pela enorme velocida<strong>de</strong> e volume crescente <strong>de</strong> informações – elementos<br />

i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong>res da melhor concepção da mass consumption society –, armas <strong>de</strong> sedução utilizadas pelos fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res<br />

para atraírem os consumi<strong>do</strong>res à aquisição <strong>de</strong> produtos e serviços.<br />

Com o passar <strong>do</strong>s tempos, novas informações vão surgin<strong>do</strong>, o que não significa a sua distribuição igualitária entre as pessoas,<br />

eis que as informações ficam em po<strong>de</strong>r somente <strong>de</strong> uma parcela <strong>de</strong> indivíduos. Nesse contexto, juristas observaram esse déficit <strong>de</strong><br />

informação no <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, caso <strong>de</strong> Carlos Alberto Bittar, para quem o “alto po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> que <strong>de</strong>sfruta a publicida<strong>de</strong> na socieda<strong>de</strong><br />

atual em razão da expansão <strong>de</strong> seu mais importante veículo, a televisão (que impõe gostos, hábitos e costumes a to<strong>do</strong>s),<br />

indistintamente, encontra no Código normas <strong>de</strong> equilíbrio necessárias e com medidas <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r suscetíveis <strong>de</strong>, em<br />

caso <strong>de</strong> violação, restaurar sua posição ou sancionar comportamentos lesivos”.26<br />

A informação, no âmbito jurídico, tem dupla face: o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar e o direito <strong>de</strong> ser informa<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> o primeiro<br />

relaciona<strong>do</strong> com quem oferece o seu produto ou serviço ao merca<strong>do</strong>, e o segun<strong>do</strong>, com o consumi<strong>do</strong>r vulnerável. A propósito<br />

<strong>de</strong>ssa visão ampliada, o <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>r argentino Juan Manuel Aparicio comenta:<br />

“Esta exigencia referida a la información presupone un <strong>do</strong>ble objetivo: que el consumi<strong>do</strong>r esté en condiciones <strong>de</strong> prestar un<br />

consentimiento en forma reflexiva; que celebra<strong>do</strong> el contrato, adquiri<strong>do</strong> el bien o contrata<strong>do</strong> el servicio, el consumi<strong>do</strong>r tenga el<br />

conocimiento necesario para el satisfactorio empleo y aprovechamiento <strong>de</strong> ellos; y, si existe algún peligro, reciba las instrucciones<br />

que le permitan prevenir el riesgo. El <strong>de</strong>ber <strong>de</strong> información repercute sobre el entero <strong>de</strong>senvolvimiento <strong>de</strong>l iter contractual, aunque<br />

tiene particular transcen<strong>de</strong>ncia y protagonismo en el momento que prece<strong>de</strong> a la conclusión <strong>de</strong>l negocio”.27<br />

Quanto ao texto da Lei Consumerista, estabelece o seu art. 6º, inc. III, que constitui direito básico <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res “a<br />

informação a<strong>de</strong>quada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong>, características,<br />

composição, qualida<strong>de</strong>, tributos inci<strong>de</strong>ntes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”. A menção aos tributos foi<br />

introduzida pela Lei 12.741, <strong>de</strong> 8 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2012, que visa a dar maior transparência a respeito <strong>do</strong>s impostos pagos pelos<br />

consumi<strong>do</strong>res, o que <strong>de</strong>ve ser informa<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>talhada.<br />

Em complemento, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o art. 1º da nova norma, “Emiti<strong>do</strong>s por ocasião da venda ao consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>rias e<br />

serviços, em to<strong>do</strong> território nacional, <strong>de</strong>verá constar, <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos fiscais ou equivalentes, a informação <strong>do</strong> valor aproxima<strong>do</strong><br />

correspon<strong>de</strong>nte à totalida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s tributos fe<strong>de</strong>rais, estaduais e municipais, cuja incidência influi na formação <strong>do</strong>s respectivos preços<br />

<strong>de</strong> venda. § 1º A apuração <strong>do</strong> valor <strong>do</strong>s tributos inci<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong>verá ser feita em relação a cada merca<strong>do</strong>ria ou serviço,<br />

separadamente, inclusive nas hipóteses <strong>de</strong> regimes jurídicos tributários diferencia<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s respectivos fabricantes, varejistas e<br />

presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços, quan<strong>do</strong> couber. § 2º A informação <strong>de</strong> que trata este artigo po<strong>de</strong>rá constar <strong>de</strong> painel afixa<strong>do</strong> em local<br />

visível <strong>do</strong> estabelecimento, ou por qualquer outro meio eletrônico ou impresso, <strong>de</strong> forma a <strong>de</strong>monstrar o valor ou percentual,<br />

ambos aproxima<strong>do</strong>s, <strong>do</strong>s tributos inci<strong>de</strong>ntes sobre todas as merca<strong>do</strong>rias ou serviços postos à venda. § 3º Na hipótese <strong>do</strong> § 2º, as<br />

informações a serem prestadas serão elaboradas em termos <strong>de</strong> percentuais sobre o preço a ser pago, quan<strong>do</strong> se tratar <strong>de</strong> tributo com<br />

alíquota ad valorem, ou em valores monetários (no caso <strong>de</strong> alíquota específica); no caso <strong>de</strong> se utilizar meio eletrônico, este <strong>de</strong>verá<br />

estar disponível ao consumi<strong>do</strong>r no âmbito <strong>do</strong> estabelecimento comercial” (Lei 12.741/2012).<br />

Ainda no que diz respeito ao art. 6º, inciso III, <strong>do</strong> CDC, o recente Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015),<br />

instituiu um parágrafo único em tal diploma da Lei 8.078/1990, estabelecen<strong>do</strong> que as informações prestadas aos consumi<strong>do</strong>res<br />

<strong>de</strong>vem ser acessíveis às pessoas com <strong>de</strong>ficiência, observa<strong>do</strong> o disposto em regulamento específico. Acreditamos que a norma vem


em boa hora, pois o cita<strong>do</strong> Estatuto regulamenta a Convenção <strong>de</strong> Nova York, trata<strong>do</strong> <strong>de</strong> direitos humanos <strong>do</strong> qual o País é<br />

signatário, com força <strong>de</strong> Emenda à Constituição.<br />

Partin<strong>do</strong> para ilustrações concretas, como concluiu o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça a respeito da proteção <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res<br />

quanto à informação, em problema relativo ao serviço <strong>de</strong> telefonia, “a exposição <strong>de</strong> motivos <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r,<br />

sob esse ângulo, esclarece a razão <strong>de</strong> ser <strong>do</strong> direito à informação no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que: ‘O acesso <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res a uma informação<br />

a<strong>de</strong>quada que lhes permita fazer escolhas bem seguras conforme os <strong>de</strong>sejos e necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cada um’ (Exposição <strong>de</strong> Motivos <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Diário <strong>do</strong> Congresso Nacional, Seção II, 3 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1989, p. 1.663). (…). A informação ao<br />

consumi<strong>do</strong>r, tem como escopo: ‘i) consciencialização crítica <strong>do</strong>s <strong>de</strong>sejos <strong>de</strong> consumo e da priorização das preferências que lhes<br />

digam respeito; ii) possibilitação <strong>de</strong> que sejam averigua<strong>do</strong>s, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com critérios técnicos e econômicos acessíveis ao leigo, as<br />

qualida<strong>de</strong>s e o preço <strong>de</strong> cada produto ou <strong>de</strong> cada serviço; iii) criação e multiplicação <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s para comparar os<br />

diversifica<strong>do</strong>s produtos; iv) conhecimento das posições jurídicas subjetivas próprias e alheias que se manifestam na<br />

contextualida<strong>de</strong> das séries infindáveis <strong>de</strong> situações <strong>de</strong> consumo; v) agilização e efetivação da presença estatal preventiva,<br />

media<strong>do</strong>ra, ou <strong>de</strong>cisória, <strong>de</strong> conflitos <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo’ (Alci<strong>de</strong>s Tomasetti Junior. O objetivo <strong>de</strong> transparência e o regime<br />

jurídico <strong>do</strong>s <strong>de</strong>veres e riscos <strong>de</strong> informação das <strong>de</strong>clarações negociais para consumo, in Revista <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, n. 4,<br />

São Paulo: Revista <strong>do</strong>s Tribunais, número especial, 1992, pp. 52-90). (…). Deveras, é forçoso concluir que o direto à informação<br />

tem como <strong>de</strong>sígnio promover completo esclarecimento quanto à escolha plenamente consciente <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong> maneira a<br />

equilibrar a relação <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, colocan<strong>do</strong>-o em posição <strong>de</strong> segurança na negociação <strong>de</strong> consumo, acerca<br />

<strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s relevantes para que a compra <strong>do</strong> produto ou serviço oferta<strong>do</strong> seja feita <strong>de</strong> maneira consciente” (STJ – REsp 976.836/RS<br />

– Primeira Seção – Rel. Min. Luiz Fux – j. 25.08.2010 – DJe 05.10.2010).<br />

No contexto <strong>de</strong> valorização da transparência e da confiança nas relações negociais privadas, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r estabelece um regime próprio em relação aos meios <strong>de</strong> se propagar a informação, ten<strong>de</strong>nte a assegurar que a<br />

comunicação <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r e a <strong>do</strong> produto ou serviço se façam <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com regras preestabelecidas, a<strong>de</strong>quadas a ditames éticos<br />

e jurídicos que regulam a matéria. Nesse ínterim, vejamos julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> STJ, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 466, tratan<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

conteú<strong>do</strong> <strong>de</strong> bebida alcoólica:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. <strong>Direito</strong> à informação. A questão posta no REsp cinge-se em saber se, a <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> existir regulamento classifican<strong>do</strong><br />

como ‘sem álcool’ cervejas que possuem teor alcoólico inferior a meio por cento em volume, seria da<strong>do</strong> à socieda<strong>de</strong> empresária<br />

recorrente comercializar seu produto, possui<strong>do</strong>r <strong>de</strong> 0,30g/100g e 0,37g/100g <strong>de</strong> álcool em sua composição, fazen<strong>do</strong> constar <strong>do</strong> seu<br />

rótulo a expressão ‘sem álcool’. A Turma negou provimento ao recurso, consignan<strong>do</strong> que, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> fato <strong>de</strong> existir<br />

norma regulamentar que classifique como sen<strong>do</strong> ‘sem álcool’ bebidas cujo teor alcoólico seja inferior a 0,5% por volume, não se<br />

afigura plausível a pretensão da fornece<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> levar ao merca<strong>do</strong> cerveja rotulada com a expressão ‘sem álcool’, quan<strong>do</strong> essa<br />

substância encontra-se presente no produto. Ao assim proce<strong>de</strong>r, estaria ela induzin<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r a erro e, eventualmente,<br />

levan<strong>do</strong>-o ao uso <strong>de</strong> substância que acreditava inexistente na composição <strong>do</strong> produto e po<strong>de</strong> revelar-se potencialmente lesiva à sua<br />

saú<strong>de</strong>. Destarte, enten<strong>de</strong>u-se correto o tribunal a quo, ao <strong>de</strong>cidir que a comercialização <strong>de</strong> cerveja com teor alcoólico, ainda que<br />

inferior a 0,5% em cada volume, com informação ao consumi<strong>do</strong>r, no rótulo <strong>do</strong> produto, <strong>de</strong> que se trata <strong>de</strong> bebida sem álcool vulnera<br />

o disposto nos arts. 6º e 9º <strong>do</strong> CDC ante o risco à saú<strong>de</strong> <strong>de</strong> pessoas impedidas <strong>do</strong> consumo” (STJ – REsp 1.181.066/RS – Rel. Des.<br />

Conv. Vasco Della Giustina – j. 15.03.2011).<br />

Ainda ilustran<strong>do</strong>, outro <strong>de</strong>cisum <strong>do</strong> STJ, publicada no seu Informativo n. 500, concluiu pela nulida<strong>de</strong> da cláusula exclu<strong>de</strong>nte<br />

<strong>de</strong> cobertura securitária, diante da falta <strong>de</strong> clareza <strong>de</strong> sua elaboração, afastan<strong>do</strong> a compreensão pela pessoa natural comum, diante<br />

da utilização <strong>de</strong> termos técnicos jurídicos. A ementa foi assim publicada, para as <strong>de</strong>vidas reflexões: “Contrato <strong>de</strong> seguro. Cláusula<br />

abusiva. Não observância <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar. A Turma <strong>de</strong>cidiu que, uma vez reconhecida a falha no <strong>de</strong>ver geral <strong>de</strong> informação,<br />

direito básico <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r previsto no art. 6º, III, <strong>do</strong> CDC, é inválida cláusula securitária que exclui da cobertura <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização<br />

o furto simples ocorri<strong>do</strong> no estabelecimento comercial contratante. A circunstância <strong>de</strong> o risco segura<strong>do</strong> ser limita<strong>do</strong> aos casos <strong>de</strong><br />

furto qualifica<strong>do</strong> (por arrombamento ou rompimento <strong>de</strong> obstáculo) exige, <strong>de</strong> plano, o conhecimento <strong>do</strong> a<strong>de</strong>rente quanto às<br />

diferenças entre uma e outra espécie – qualifica<strong>do</strong> e simples – conhecimento que, em razão da vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r,<br />

presumidamente ele não possui, ensejan<strong>do</strong>, por isso, o vício no <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar. A condição exigida para cobertura <strong>do</strong> sinistro –<br />

ocorrência <strong>de</strong> furto qualifica<strong>do</strong> –, por si só, apresenta conceituação específica da legislação penal, para cuja conceituação o próprio<br />

meio técnico-jurídico encontra dificulda<strong>de</strong>s, o que <strong>de</strong>nota sua abusivida<strong>de</strong>” (STJ, REsp 1.293.006/SP – Rel. Min. Massami Uyeda<br />

– j. 21.06.2012).<br />

Ainda no que toca às concretizações <strong>do</strong> princípio em estu<strong>do</strong>, o mesmo Tribunal Superior <strong>de</strong>duziu, também no ano <strong>de</strong> 2012,<br />

que viola o direito à plena informação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r a conduta da empresa que explora o serviço <strong>de</strong> transporte coletivo ao não<br />

informar na roleta <strong>do</strong> ônibus o sal<strong>do</strong> remanescente <strong>do</strong> vale-transporte eletrônico. Assim, “no caso, a opera<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> sistema <strong>de</strong> valetransporte<br />

<strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> informar o sal<strong>do</strong> <strong>do</strong> cartão para mostrar apenas um gráfico quan<strong>do</strong> o usuário passava pela roleta. O sal<strong>do</strong>


somente era exibi<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> inferior a R$ 20,00. Caso o valor remanescente fosse superior, o porta<strong>do</strong>r <strong>de</strong>veria realizar a consulta<br />

na internet ou em ‘valida<strong>do</strong>res’ localiza<strong>do</strong>s em lojas e supermerca<strong>do</strong>s. Nessa situação, a Min. Relatora enten<strong>de</strong>u que a opera<strong>do</strong>ra<br />

<strong>do</strong> sistema <strong>de</strong> vale-transporte <strong>de</strong>ve possibilitar ao usuário a consulta ao crédito remanescente durante o transporte, sen<strong>do</strong><br />

insuficiente a disponibilização <strong>do</strong> serviço apenas na internet ou em poucos guichês espalha<strong>do</strong>s pela região metropolitana. A<br />

informação incompleta, representada por gráficos disponibiliza<strong>do</strong>s no momento <strong>de</strong> uso <strong>do</strong> cartão, não supre o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> prestar<br />

plena informação ao consumi<strong>do</strong>r” (STJ – REsp 1.099.634/RJ – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 08.05.2012 – publica<strong>do</strong> no seu<br />

Informativo n. 497).<br />

No que concerne a tal tutela, <strong>de</strong> início, <strong>de</strong>staque-se a previsão <strong>de</strong> proteção contra publicida<strong>de</strong> enganosa e abusiva, conforme<br />

art. 6º, inc. IV, da Lei 8.078/1990, inclusive pelo lega<strong>do</strong> constitucional, por tratar o Texto Maior da regulamentação das<br />

informações que são levadas ao público e ao meio social. Nesse ínterim, o art. 220, § 3º, inc. II, da CF/1988 utiliza a expressão<br />

propaganda; o art. 22, inc. XXIX, e o § 4º <strong>do</strong> art. 220 tratam da propaganda comercial; o art. 5º, LX, disciplina a publicida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s<br />

atos processuais. Por fim, o seu art. 5º, XIV, dispõe sobre o direito à informação como direito fundamental.<br />

O amparo da informação transparente po<strong>de</strong> ser retira<strong>do</strong> especificamente <strong>do</strong> art. 4º, caput, <strong>do</strong> CDC, segun<strong>do</strong> o qual “A Política<br />

Nacional <strong>de</strong> Relações <strong>de</strong> Consumo tem por objetivo o atendimento das necessida<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, o respeito à sua dignida<strong>de</strong>,<br />

saú<strong>de</strong> e segurança, a proteção <strong>de</strong> seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida, bem como a transparência e<br />

harmonia das relações <strong>de</strong> consumo”. A i<strong>de</strong>ia central <strong>do</strong> dispositivo é <strong>de</strong>, como bem aponta Claudia Lima Marques, “possibilitar a<br />

aproximação contratual mais sincera e menos danosa entre consumi<strong>do</strong>r e fornece<strong>do</strong>r. Transparência significa informação clara e<br />

correta sobre o produto a ser vendi<strong>do</strong>, sobre o contrato a ser firma<strong>do</strong>, significa lealda<strong>de</strong> e respeito nas relações entre fornece<strong>do</strong>r e<br />

consumi<strong>do</strong>r, mesmo na fase pré-contratual, isto é, na fase negocial <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> consumo”.28 Como se po<strong>de</strong> notar, a tutela da<br />

transparência e da confiança constitui um <strong>de</strong>s<strong>do</strong>bramento da incidência da boa-fé objetiva nas relações consumeristas.<br />

A concretizar tal proteção, repise-se que, entre os seus arts. 30 e 38, a Lei 8.078/1990 traz regulamentação própria quanto à<br />

matéria, relacionan<strong>do</strong> regras aplicadas ao princípio da transparência ou da confiança. Como, muitas vezes, a intenção <strong>de</strong> formar<br />

um negócio tem sua base em uma publicida<strong>de</strong>, essas regras são muito importantes, inclusive porque <strong>de</strong>notam a responsabilida<strong>de</strong><br />

pré-contratual prevista pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, assunto a ser aborda<strong>do</strong> oportunamente nesta obra. Entre to<strong>do</strong>s os<br />

coman<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>staque-se <strong>de</strong> imediato o art. 30 <strong>do</strong> CDC, segun<strong>do</strong> o qual o meio <strong>de</strong> oferta vincula o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> contrato. Dessa<br />

forma, o produto ou serviço <strong>de</strong>verá estar na exata medida como previsto no meio <strong>de</strong> oferta, sob pena <strong>de</strong> o fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r<br />

respon<strong>de</strong>r pelos vícios ou danos causa<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> também, se for o caso, substituir o produto ou executar novamente o serviço.<br />

Eventualmente, repise-se, cabe ainda o cumprimento força<strong>do</strong> <strong>do</strong> meio <strong>de</strong> oferta, por meio <strong>de</strong> tutela processual específica, nos<br />

termos <strong>do</strong>s arts. 35 e 84 da Lei Consumerista.<br />

Partin<strong>do</strong>-se para a análise <strong>de</strong> alguns julga<strong>do</strong>s que mencionam a tutela da transparência e da confiança, colaciona-se <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong><br />

Tribunal Gaúcho, que fez incidir essa proteção em problema ocorri<strong>do</strong> no serviço <strong>de</strong> transporte para um importante jogo <strong>de</strong> futebol:<br />

“Apelação cível. Transporte. Pacote turístico. Ingresso para assistir ao embate futebolístico Grêmio x Boca Juniors. Privação.<br />

Relação <strong>de</strong> consumo. Dever <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>. Quebra da confiança. Reveses material e moral diagnostica<strong>do</strong>s. 1. Tutela da confiança: o<br />

merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo reclama a observância continente e irrestrita ao <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s serviços e produtos nele<br />

comercializa<strong>do</strong>s, ampara<strong>do</strong> no princípio da confiança, que baliza e norteia as relações <strong>de</strong> consumo. Inobserva<strong>do</strong> este <strong>de</strong>ver <strong>de</strong><br />

qualida<strong>de</strong> e, via reflexa, a tutela da confiança – pedra angular para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> –, a Lei impõe gravames <strong>de</strong><br />

or<strong>de</strong>m contratual e extracontratual ao infrator. 2. Reveses material e moral: diagnosticada a mácula no serviço oferta<strong>do</strong> pela ré –<br />

privação <strong>de</strong> comparecer à partida futebolística <strong>de</strong> notório relevo, envolven<strong>do</strong> clubes <strong>de</strong> tradição in<strong>de</strong>smentível no certame –, rompese<br />

o laço <strong>de</strong> confiança que ata consumi<strong>do</strong>r e fornece<strong>do</strong>r <strong>do</strong> produto, ensejan<strong>do</strong> a in<strong>de</strong>nização por revés moral. Dano material<br />

insofismável. Apelo <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJRS – Acórdão 70029751328, Pelotas – Décima Segunda Câmara Cível – Rel. Des. Umberto<br />

Guaspari Sudbrack – j. 28.05.2009 – DOERS 12.06.2009, p. 57).<br />

Do mesmo mo<strong>do</strong>, para ilustrar, vejamos <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal Paulista, na qual se concluiu que a empresa <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />

que presta informações obscuras a respeito <strong>do</strong> contrato celebra<strong>do</strong> fere o princípio da transparência:<br />

“Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Cláusula exclu<strong>de</strong>nte da realização <strong>de</strong> cirurgias neurológicas, bem como da cobertura <strong>de</strong> colocação <strong>de</strong> próteses e<br />

órteses. Aplicação <strong>de</strong> prótese neurológica indispensável ao próprio ato cirúrgico, com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> evitar intervenção mais grave<br />

ao paciente e mais dispendiosa à opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Obscurida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s termos prótese e órtese ao consumi<strong>do</strong>r, que ferem<br />

princípio da transparência da oferta. Aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e da Lei 9.656/1998 aos contratos relacionais<br />

celebra<strong>do</strong>s antes <strong>de</strong> sua vigência, especialmente naquilo que consagra os princípios maiores <strong>do</strong> equilíbrio contratual e boa-fé<br />

objetiva. Ausência <strong>de</strong> prova sobre a negativa <strong>de</strong> adaptação <strong>do</strong> contrato à Lei 9.656/1998. Abusivida<strong>de</strong> da cláusula exclu<strong>de</strong>nte. Ação<br />

parcialmente proce<strong>de</strong>nte. Recursos improvi<strong>do</strong>s” (TJSP – Apelação cível 0000735-92.2010.8.26.0160 – Acórdão 4943464,<br />

Descalva<strong>do</strong> – Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Francisco Loureiro – j. 10.02.2011 – DJESP 25.02.2011).


Por fim, quanto às ilustrações, a <strong>de</strong>monstrar a incidência <strong>do</strong> princípio em estu<strong>do</strong>, <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Minas Gerais cite-se acórdão<br />

com gran<strong>de</strong> interesse prático, segun<strong>do</strong> o qual os bancos <strong>de</strong>vem <strong>de</strong>talhar aos consumi<strong>do</strong>res, em prol da transparência, todas as<br />

transações que são feitas nas contas <strong>do</strong>s seus correntistas, <strong>de</strong>ver esse que é <strong>de</strong>srespeita<strong>do</strong> muitas vezes:<br />

“Ação <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> contas. Explanação <strong>do</strong>s lançamentos em conta corrente. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> correntista. Interesse processual<br />

manifesto. In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> fornecimento <strong>de</strong> extratos bancários <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>s a simples conferência, o correntista possui<br />

interesse em propor a ação <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> contas se paira dúvida quanto à correção <strong>do</strong>s valores lança<strong>do</strong>s na sua conta.<br />

Notadamente nos contratos em que há múltiplas e complexas operações <strong>de</strong> crédito e débito, a prestação <strong>de</strong> contas afigura-se<br />

essencial para o reconhecimento <strong>do</strong>s lançamentos que um <strong>do</strong>s contratantes faz à conta <strong>do</strong> outro. A<strong>de</strong>mais, em homenagem aos<br />

princípios da transparência e da informação consagra<strong>do</strong>s no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, exsurge o <strong>de</strong>ver da instituição<br />

bancária <strong>de</strong> esclarecer <strong>de</strong> forma pormenorizada a administração financeira <strong>do</strong> contrato” (TJMG – Apelação cível 0142839-<br />

61.2008.8.13.0024, Belo Horizonte – Décima Terceira Câmara Cível – Rel. Des. Cláudia Maia – j. 09.12.2010 – DJEMG<br />

01.02.2011).<br />

Concluin<strong>do</strong>, como se nota, pela lei protetiva há uma ampla proteção em matéria <strong>de</strong> informação, inclusive em consonância com<br />

o previsto no art. 5º, XIV, da CF/1988, pelos riscos <strong>de</strong>correntes da exposição das pessoas a um gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s<br />

informativos, próximo ao infinito. Vale citar as palavras <strong>de</strong> Ricar<strong>do</strong> Luis Lorenzetti, que discorre muito bem sobre a informação<br />

nos seguintes termos: “Assinalou-se que o direito à informação é um pressuposto da participação <strong>de</strong>mocrática livre, porque a<br />

<strong>de</strong>mocracia po<strong>de</strong> se frustrar diante da ausência <strong>de</strong> participação, e, para participar, <strong>de</strong>ve-se estar informa<strong>do</strong>. A concepção <strong>do</strong> <strong>Direito</strong><br />

Priva<strong>do</strong> como controle difuso <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r justifica esta afirmação. Com esta finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estabelecer uma norma <strong>de</strong> <strong>de</strong>limitação <strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong>r e <strong>de</strong> participação, tem-se adverti<strong>do</strong> duas fases sobre a informação, o direito à informação importa no direito <strong>de</strong> informar a <strong>de</strong><br />

ser informa<strong>do</strong>”.29<br />

2.7.<br />

PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO<br />

O Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é prova evi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> que não se po<strong>de</strong> aceitar o contrato da maneira como antes<br />

era consagra<strong>do</strong>, regi<strong>do</strong> pelo mo<strong>de</strong>lo estanque da autonomia da vonta<strong>de</strong> e <strong>de</strong> sua consequente força obrigatória (pacta sunt<br />

servanda). A socieda<strong>de</strong> mu<strong>do</strong>u, eis que vivemos sob o <strong>do</strong>mínio <strong>do</strong> capital, e com isso <strong>de</strong>ve-se modificar o mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> se ver e se<br />

analisar os pactos, sobretu<strong>do</strong> os contratos <strong>de</strong> consumo. Como já pronuncia<strong>do</strong> em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso ao Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, o<br />

Código Consumerista representa forte mitigação <strong>de</strong>ssa obrigatorieda<strong>de</strong> da convenção, mormente nas hipóteses em que o negócio<br />

jurídico celebra<strong>do</strong> encerra uma situação <strong>de</strong> injustiça (STJ – AgRg no REsp 767.771/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Jorge<br />

Scartezzini – j. 05.09.2006 – DJ 20.11.2006, p. 325).<br />

Em prol <strong>de</strong>ssa relativização <strong>do</strong> pacta sunt servanda, o Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r traz como princípio fundamental, embora<br />

implícito, a função social <strong>do</strong>s contratos, conceito básico para a própria concepção <strong>do</strong> negócio <strong>de</strong> consumo. O objetivo principal da<br />

função social <strong>do</strong>s contratos é tentar equilibrar uma situação que sempre foi díspar, em que o consumi<strong>do</strong>r sempre foi vítima das<br />

abusivida<strong>de</strong>s da outra parte da relação <strong>de</strong> consumo. Nesse senti<strong>do</strong>, Ada Pellegrini Grinover e Antônio Herman <strong>de</strong> Vasconcellos e<br />

Benjamin apontam que:<br />

“A socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo, ao contrário <strong>do</strong> que se imagina, não trouxe apenas benefícios para seus atores. Muito ao revés, em certos<br />

casos, a posição <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ste mo<strong>de</strong>lo, piorou em vez <strong>de</strong> melhorar. Se antes fornece<strong>do</strong>r e consumi<strong>do</strong>r encontravamse<br />

em situação <strong>de</strong> relativo equilíbrio <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r e barganha (até porque se conheciam), agora é o fornece<strong>do</strong>r que, inegavelmente,<br />

assume a posição <strong>de</strong> força na relação <strong>de</strong> consumo e que, por isso mesmo, ‘dita as regras’. E o direito não po<strong>de</strong> ficar alheio a tal<br />

fenômeno. O merca<strong>do</strong>, por sua vez, não apresenta, em si mesmo, mecanismos eficientes para superar tal vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r. Nem mesmo para mitigá-la. Logo, imprescindível a intervenção <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> nas suas três esferas: o Legislativo<br />

formulan<strong>do</strong> as normas jurídicas <strong>de</strong> consumo; o Executivo, implementan<strong>do</strong>-as; e o Judiciário, dirimin<strong>do</strong> os conflitos <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong>s<br />

esforços <strong>de</strong> formulação e <strong>de</strong> implementação”.30<br />

Como outrora foi <strong>de</strong>staca<strong>do</strong> em outras obras, a função social <strong>do</strong>s contratos constitui um principio contratual <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública<br />

– conforme consta <strong>do</strong> art. 2.035, parágrafo único, <strong>do</strong> CC/2002 –, pelo qual o contrato <strong>de</strong>ve ser, necessariamente, interpreta<strong>do</strong> e<br />

visualiza<strong>do</strong> <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o contexto da socieda<strong>de</strong>. 31 Trata-se <strong>de</strong> um princípio expresso na codificação geral privada, ao enunciar<br />

o seu art. 421 que a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> contratar será exercida em razão e nos limites da função social <strong>do</strong>s contratos. O senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> último<br />

coman<strong>do</strong> é o <strong>de</strong> que a finalida<strong>de</strong> coletiva <strong>do</strong>s negócios representa clara limitação ao exercício da autonomia privada no campo<br />

contratual.<br />

No âmbito <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, a função social <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong>ve ser reconhecida como princípio implícito,<br />

como bem observam Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery, ao lecionarem que a revisão <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> consumo tem


como fundamentos as cláusulas gerais da função social <strong>do</strong> contrato e da boa-fé objetiva, fundadas nas teorias da base <strong>do</strong> negócio<br />

(Larenz) e da culpa in contrahen<strong>do</strong> (Ihering).32<br />

Do ponto <strong>de</strong> vista prático, a função social <strong>do</strong> contrato constitui um regramento que tem tanto uma eficácia interna (entre as<br />

partes contratantes) quanto uma eficácia externa (para além das partes contratantes). Essa dupla eficácia <strong>do</strong> princípio foi<br />

reconhecida quan<strong>do</strong> das Jornadas <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, promovidas pelo Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral e pelo Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça. Como não po<strong>de</strong>ria ser diferente, tais conclusões têm plena aplicação na órbita <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> consumo. Ora, se os<br />

contratos civis estão submeti<strong>do</strong>s a tais premissas, o que dizer, então, <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> consumo? No último plano, a eficiência <strong>do</strong><br />

princípio se justifica ainda mais, pois, como bem leciona Claudia Lima Marques, o CDC é uma lei <strong>de</strong> função social, que traz<br />

“como consequência modificações profundas nas relações juridicamente relevantes na socieda<strong>de</strong>, em especial quan<strong>do</strong> esta lei,<br />

como o CDC, introduz um rol <strong>de</strong> direitos (…). No caso <strong>do</strong> CDC, esta lei <strong>de</strong> função social intervém <strong>de</strong> maneira imperativa em<br />

relações jurídicas <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong>, antes <strong>do</strong>minadas pela ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> autonomia da vonta<strong>de</strong>”. 33<br />

Sobre a eficácia externa <strong>do</strong> princípio, quan<strong>do</strong> da I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2002, aprovou-se o Enuncia<strong>do</strong> n. 21,<br />

estabelecen<strong>do</strong>-se que a função social <strong>do</strong> contrato representa uma exceção ao princípio da relativida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s efeitos <strong>do</strong> contrato,<br />

possibilitan<strong>do</strong> a tutela externa <strong>do</strong> crédito, ou seja, a eficácia <strong>do</strong> contrato perante terceiros. 34 Como exemplo <strong>de</strong>ssa aplicação, a<br />

jurisprudência <strong>do</strong> STJ vinha enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> que a vítima <strong>de</strong> um aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> trânsito po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>mandar diretamente a segura<strong>do</strong>ra <strong>do</strong><br />

culpa<strong>do</strong>, mesmo não haven<strong>do</strong> uma relação contratual <strong>de</strong> fato entre eles. Vejamos um <strong>de</strong>sses acórdãos:<br />

“Processual civil. Recurso especial. Prequestionamento. Aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> trânsito. Culpa <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>. Ação in<strong>de</strong>nizatória. Terceiro<br />

prejudica<strong>do</strong>. Segura<strong>do</strong>ra. Legitimida<strong>de</strong> passiva ad causam. Ônus da sucumbência. Sucumbência recíproca. Carece <strong>de</strong><br />

prequestionamento o recurso especial acerca <strong>de</strong> tema não <strong>de</strong>bati<strong>do</strong> no acórdão recorri<strong>do</strong>. A ação in<strong>de</strong>nizatória <strong>de</strong> danos materiais,<br />

advin<strong>do</strong>s <strong>do</strong> atropelamento e morte causa<strong>do</strong>s por segura<strong>do</strong>, po<strong>de</strong> ser ajuizada diretamente contra a segura<strong>do</strong>ra, que tem<br />

responsabilida<strong>de</strong> por força da apólice securitária e não por ter agi<strong>do</strong> com culpa no aci<strong>de</strong>nte. Os ônus da sucumbência <strong>de</strong>vem ser<br />

proporcionalmente distribuí<strong>do</strong>s entre as partes, no caso <strong>de</strong> sucumbência recíproca. Recurso provi<strong>do</strong> na parte em que conheci<strong>do</strong>”<br />

(STJ – REsp 444.716/BA – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 11.05.2004 – DJ 31.05.2004, p. 300).<br />

A <strong>de</strong>cisão transcrita reconhece em seu bojo que a função social <strong>do</strong>s contratos está estribada no princípio da solidarieda<strong>de</strong><br />

social, retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 3º, inc. I, da Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988. Com isso, ampliam-se as responsabilida<strong>de</strong>s, o que gera o <strong>de</strong>ver<br />

<strong>de</strong> reparar por parte da segura<strong>do</strong>ra, mesmo não ten<strong>do</strong> um contrato assina<strong>do</strong> e firma<strong>do</strong> formalmente com a vítima <strong>do</strong> aci<strong>de</strong>nte. De<br />

fato, esse entendimento anterior <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça representava um gran<strong>de</strong> avanço em matéria <strong>de</strong> ampliação <strong>do</strong>s<br />

efeitos contratuais.<br />

Porém, infelizmente, a jurisprudência <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça acabou por rever esse seu entendimento anterior,<br />

passan<strong>do</strong> a concluir que a vítima não po<strong>de</strong> ingressar com ação apenas e diretamente contra a segura<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> culpa<strong>do</strong>, mas somente<br />

contra ambos. Vejamos os principais trechos <strong>de</strong> uma das publicações constantes <strong>do</strong> Informativo n. 490 daquela Corte: “Recurso<br />

repetitivo. Seguro <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil. Ajuizamento direto exclusivamente contra a segura<strong>do</strong>ra. A Seção firmou o<br />

entendimento <strong>de</strong> que <strong>de</strong>scabe ação <strong>do</strong> terceiro prejudica<strong>do</strong> ajuizada, direta e exclusivamente, em face da segura<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> aponta<strong>do</strong><br />

causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano, porque, no seguro <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil facultativo, a obrigação da segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> ressarcir os danos sofri<strong>do</strong>s<br />

por terceiros pressupõe a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>, a qual, <strong>de</strong> regra, não po<strong>de</strong>rá ser reconhecida em <strong>de</strong>manda na qual este<br />

não interveio, sob pena <strong>de</strong> vulneração <strong>do</strong> <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> processo legal e da ampla <strong>de</strong>fesa. Esse posicionamento fundamenta-se no fato <strong>de</strong><br />

o seguro <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil facultativa ter por finalida<strong>de</strong> neutralizar a obrigação <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> em in<strong>de</strong>nizar danos causa<strong>do</strong>s a<br />

terceiros nos limites <strong>do</strong>s valores contrata<strong>do</strong>s, após a obrigatória verificação da responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> no sinistro. Em<br />

outras palavras, a obrigação da segura<strong>do</strong>ra está sujeita à condição suspensiva que não se implementa pelo simples fato <strong>de</strong> ter<br />

ocorri<strong>do</strong> o sinistro, mas somente pela verificação da eventual obrigação civil <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>. Isso porque o seguro <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> civil facultativo não é espécie <strong>de</strong> estipulação a favor <strong>de</strong> terceiro alheio ao negócio, ou seja, quem sofre o prejuízo<br />

não é beneficiário <strong>do</strong> negócio, mas sim o causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano. Acrescente-se, ainda, que o ajuizamento direto exclusivamente contra<br />

a segura<strong>do</strong>ra ofen<strong>de</strong> os princípios <strong>do</strong> contraditório e da ampla <strong>de</strong>fesa, pois a ré não teria como <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r-se <strong>do</strong>s fatos expostos na<br />

inicial, especialmente da <strong>de</strong>scrição <strong>do</strong> sinistro. (…)” (STJ – REsp 962.230/RS – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 08.02.2012).<br />

A conclusão revisada causa estranheza, eis que, presente a solidarieda<strong>de</strong>, a vítima po<strong>de</strong> escolher contra quem <strong>de</strong>mandar, nos<br />

termos da opção <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda reconhecida pelo art. 275 <strong>do</strong> CC. A<strong>de</strong>mais, a nova posição acaba representan<strong>do</strong> um retrocesso em<br />

relação ao entendimento anterior na perspectiva da função social <strong>do</strong> contrato e da solidarieda<strong>de</strong> social que <strong>de</strong>ve guiar todas as<br />

relações negociais. A <strong>de</strong>monstrar a discordância <strong>de</strong> parte da <strong>do</strong>utrina em relação a tal mudança <strong>de</strong> posição <strong>do</strong> STJ, na VI Jornada<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil (2013) aprovou-se o seguinte enuncia<strong>do</strong>: “o seguro <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil facultativo garante <strong>do</strong>is interesses, o<br />

<strong>do</strong> segura<strong>do</strong> contra os efeitos patrimoniais da imputação <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> e o da vítima à in<strong>de</strong>nização, ambos <strong>de</strong>stinatários da<br />

garantia, com pretensão própria e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte contra a segura<strong>do</strong>ra” (Enuncia<strong>do</strong> n. 544). De toda forma, essa discordância da


<strong>do</strong>utrina <strong>de</strong>finitivamente não convenceu o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que, em 2015, editou a Súmula 529, expressan<strong>do</strong> que “No<br />

seguro <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil facultativo, não cabe o ajuizamento <strong>de</strong> ação pelo terceiro prejudica<strong>do</strong> direta e exclusivamente em<br />

face da segura<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> aponta<strong>do</strong> causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano”.<br />

A respeito da eficácia interna da função social <strong>do</strong> contrato, com aplicação entre as partes, está ela prevista no Enuncia<strong>do</strong> n.<br />

360, da IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, proposto pelo autor <strong>de</strong>sta obra. No âmbito da Lei 8.078/1990, tal irradiação po<strong>de</strong> ser retirada<br />

<strong>de</strong> vários dispositivos. De início, fica claro que o princípio da função social, em termos <strong>de</strong> sua eficácia entre as partes, é retira<strong>do</strong> da<br />

interpretação contratual mais benéfica ao consumi<strong>do</strong>r, conforme regra <strong>do</strong> art. 47 <strong>do</strong> CDC.35 Nota-se que um <strong>do</strong>s impactos <strong>do</strong><br />

princípio em questão é justamente proteger a parte vulnerável da relação negocial, o que po<strong>de</strong> ser retira<strong>do</strong> da norma e <strong>de</strong> outras da<br />

Lei <strong>de</strong> Consumo.<br />

Do mesmo mo<strong>do</strong> sintoniza<strong>do</strong> com o princípio da função social <strong>do</strong> contrato, não se po<strong>de</strong> afastar a relevância <strong>do</strong> art. 51 <strong>do</strong> CDC<br />

para a nova visualização <strong>do</strong>s pactos e avenças celebra<strong>do</strong>s sob a sua égi<strong>de</strong>. Ora, quan<strong>do</strong> o Código Consumerista reconhece a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma cláusula consi<strong>de</strong>rada abusiva <strong>de</strong>clarar a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um negócio, está totalmente antena<strong>do</strong> com a intervenção<br />

estatal nos contratos e com aquilo que se espera <strong>de</strong> um direito contemporâneo mais justo e equilibra<strong>do</strong>. Isso é reconheci<strong>do</strong> pela<br />

obra <strong>de</strong> Claudia Lima Marques, Herman Benjamin e Bruno Miragem, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que “O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

inova consi<strong>de</strong>ravelmente o espírito <strong>do</strong> direito das obrigações, e relativo à máxima pacta sunt servanda. A nova lei vai reduzir o<br />

espaço antes reserva<strong>do</strong> para a autonomia da vonta<strong>de</strong> proibin<strong>do</strong> que se pactuem <strong>de</strong>terminadas cláusulas, vai impor normas<br />

imperativas, que visam proteger o consumi<strong>do</strong>r, reequilibran<strong>do</strong> o contrato, garantin<strong>do</strong> as legítimas expectativas que <strong>de</strong>positou no<br />

vínculo contratual”.36<br />

Na verda<strong>de</strong>, observa-se que a primeira tentativa relevante <strong>de</strong> trazer ao nosso sistema o princípio da função social <strong>do</strong>s contratos<br />

ocorreu com a promulgação da Lei 8.078/1990. Com o Código Civil <strong>de</strong> 2002, ocorreu uma ampliação <strong>do</strong> uso <strong>de</strong> tal regramento,<br />

inicialmente pelas previsões expressas que constam <strong>do</strong>s seus arts. 421 e 2.035, parágrafo único, bem como <strong>de</strong> outros dispositivos<br />

legais específicos.<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> estu<strong>do</strong> da eficácia interna <strong>do</strong> princípio, conforme antes exposto e com base na melhor <strong>do</strong>utrina, a função<br />

social <strong>do</strong>s contratos na órbita <strong>de</strong> consumo tem relação simbiótica com a manutenção <strong>do</strong> equilíbrio <strong>do</strong>s contratos, com a equida<strong>de</strong><br />

contratual e com a plena possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> revisão <strong>do</strong>s negócios. Como já pronuncia<strong>do</strong> em se<strong>de</strong> jurispru<strong>de</strong>ncial, “o juiz da equida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ve buscar a Justiça comutativa, analisan<strong>do</strong> a qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consentimento. Quan<strong>do</strong> evi<strong>de</strong>nciada a <strong>de</strong>svantagem <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r,<br />

ocasionada pelo <strong>de</strong>sequilíbrio contratual gera<strong>do</strong> pelo abuso <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r econômico, restan<strong>do</strong>, assim, feri<strong>do</strong> o princípio da equida<strong>de</strong><br />

contratual, <strong>de</strong>ve ele receber uma proteção compensatória. Uma disposição legal não po<strong>de</strong> ser utilizada para eximir <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> o contratante que age com notória má-fé em <strong>de</strong>trimento da coletivida<strong>de</strong>, pois a ninguém é permiti<strong>do</strong> valer-se da<br />

lei ou <strong>de</strong> exceção prevista em lei para obtenção <strong>de</strong> benefício próprio quan<strong>do</strong> este vier em prejuízo <strong>de</strong> outrem” (STJ – REsp<br />

436.853/DF – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 04.05.2006 – DJ 27.11.2006, p. 273).<br />

O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r inseriu a regra <strong>de</strong> que mesmo uma simples onerosida<strong>de</strong> excessiva ao consumi<strong>do</strong>r,<br />

<strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> fato superveniente, po<strong>de</strong>rá ensejar a chamada revisão contratual (art. 6º, inc. V). Nesse contexto, <strong>de</strong>ve-se enten<strong>de</strong>r<br />

que o papel da função social <strong>do</strong> contrato está intimamente liga<strong>do</strong> ao ponto <strong>de</strong> equilíbrio que o negócio jurídico celebra<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<br />

atingir e manter. Dessa forma, um contrato que traz uma onerosida<strong>de</strong> excessiva a uma das partes – consi<strong>de</strong>rada vulnerável – não<br />

está cumprin<strong>do</strong> o seu papel sociológico, necessitan<strong>do</strong> <strong>de</strong> revisão pelo órgão judicante. O tema ainda será aprofunda<strong>do</strong> no capítulo<br />

referente à proteção contratual, caben<strong>do</strong>, no presente tópico, estabelecer apenas a conexão com o regramento em análise.<br />

Por fim, é preciso conectar a eficácia interna da função social <strong>do</strong>s contratos com a conservação <strong>do</strong>s negócios jurídicos,<br />

encaran<strong>do</strong>-se a extinção <strong>do</strong> negócio como a última medida, a ultima ratio. No campo <strong>do</strong>utrinário, tal relação foi reconhecida pelo<br />

Enuncia<strong>do</strong> n. 22 <strong>do</strong> Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral, aprova<strong>do</strong> na I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, in verbis: “a função social <strong>do</strong> contrato,<br />

prevista no art. 421 <strong>do</strong> novo Código Civil, constitui cláusula geral, que reforça o princípio <strong>de</strong> conservação <strong>do</strong> contrato,<br />

asseguran<strong>do</strong> trocas úteis e justas”. No mesmo senti<strong>do</strong>, Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery apontam a conservação <strong>do</strong><br />

contrato e <strong>do</strong> negócio jurídico como um <strong>do</strong>s regramentos básicos da Lei 8.078/1990, eis que “sempre que possível interpreta-se o<br />

contrato <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a fazer com que suas cláusulas tenham aplicação, extrain<strong>do</strong>-se <strong>de</strong>las um máximo <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong>”.37<br />

Como exemplo concreto <strong>de</strong>ssa tendência <strong>de</strong> conservação, cite-se a teoria <strong>do</strong> adimplemento substancial (substancial<br />

performance), amplamente admitida pela <strong>do</strong>utrina e pela jurisprudência. Conforme o Enuncia<strong>do</strong> n. 361, aprova<strong>do</strong> na IV Jornada<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil: “O adimplemento substancial <strong>de</strong>corre <strong>do</strong>s princípios gerais contratuais, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a fazer prepon<strong>de</strong>rar a função<br />

social <strong>do</strong> contrato e o princípio da boa-fé objetiva, balizan<strong>do</strong> a aplicação <strong>do</strong> art. 475”. São autores <strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong> os juristas Jones<br />

Figueirê<strong>do</strong> Alves e Eduar<strong>do</strong> Bussatta, que têm trabalhos <strong>de</strong> referência sobre o instituto. 38<br />

Pela teoria <strong>do</strong> adimplemento substancial, em hipóteses em que a obrigação tiver si<strong>do</strong> quase toda cumprida, sen<strong>do</strong> a mora<br />

insignificante, não caberá a extinção <strong>do</strong> negócio, mas apenas outros efeitos jurídicos, visan<strong>do</strong> sempre à manutenção da avença. A


jurisprudência superior tem aplica<strong>do</strong> a teoria em casos <strong>de</strong> mora <strong>de</strong> pouca relevância em contratos <strong>de</strong> financiamento:<br />

“Agravo regimental. Venda com reserva <strong>de</strong> <strong>do</strong>mínio. Busca e apreensão. In<strong>de</strong>ferimento. Adimplemento substancial <strong>do</strong> contrato.<br />

Comprovação. Reexame <strong>de</strong> prova. Súmula 7/STJ. 1. Ten<strong>do</strong> o <strong>de</strong>cisum <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> origem reconheci<strong>do</strong> o não cabimento da busca<br />

e apreensão em razão <strong>do</strong> adimplemento substancial <strong>do</strong> contrato, a apreciação da controvérsia importa em reexame <strong>do</strong> conjunto<br />

probatório <strong>do</strong>s autos, razão por que não po<strong>de</strong> ser conhecida em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso especial, ut Súmula 7/STJ. 2. Agravo regimental não<br />

provi<strong>do</strong>” (STJ – Ag. Rg. 607.406/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Fernan<strong>do</strong> Gonçalves – j. 09.11.2004 – DJ 29.11.2004, p. 346).<br />

“Alienação fiduciária. Busca e apreensão. Deferimento liminar. Adimplemento substancial. Não viola a lei a <strong>de</strong>cisão que in<strong>de</strong>fere o<br />

pedi<strong>do</strong> liminar <strong>de</strong> busca e apreensão consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> o pequeno valor da dívida em relação ao valor <strong>do</strong> bem e o fato <strong>de</strong> que este é<br />

essencial à ativida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>ra. Recurso não conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp 469.577/SC – Quarta Turma – Rel. Min. Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

Aguiar – j. 25.03.2003 – DJ 05.05.2003, p. 310 – RNDJ 43/122).<br />

Nos <strong>do</strong>is casos, tanto na venda com reserva <strong>de</strong> <strong>do</strong>mínio quanto na alienação fiduciária em garantia (discute-se se é contrato ou<br />

direito real), foi afastada a busca e apreensão da coisa com a consequente resolução <strong>do</strong> contrato, pois a parte havia cumpri<strong>do</strong> o<br />

negócio jurídico substancialmente. Quanto a esse cumprimento relevante, <strong>de</strong>ve ser analisa<strong>do</strong> casuisticamente, ten<strong>do</strong> em vista a<br />

finalida<strong>de</strong> econômico-social <strong>do</strong> contrato e da obrigação.<br />

Aliás, como têm pontua<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrina e jurisprudência italianas, a análise <strong>do</strong> adimplemento substancial passa por <strong>do</strong>is filtros. O<br />

primeiro <strong>de</strong>les é objetivo, a partir da medida econômica <strong>do</strong> <strong>de</strong>scumprimento, <strong>de</strong>ntro da relação jurídica existente entre os<br />

envolvi<strong>do</strong>s. O segun<strong>do</strong> é subjetivo, sob o foco <strong>do</strong>s comportamentos das partes no processo contratual.39 Acreditamos que tais<br />

parâmetros também possam ser perfeitamente utiliza<strong>do</strong>s nos casos brasileiros, incrementan<strong>do</strong> a sua aplicação em nosso País. Vale<br />

lembrar que no Código Civil Italiano há previsão expressa sobre o adimplemento substancial, no seu art. 1.455, segun<strong>do</strong> o qual o<br />

contrato não será resolvi<strong>do</strong> se o inadimplemento <strong>de</strong> uma das partes tiver escassa importância, levan<strong>do</strong>-se em conta o interesse da<br />

outra parte.<br />

Em suma, para a caracterização <strong>do</strong> adimplemento substancial, entram em cena fatores quantitativos e qualitativos, conforme o<br />

preciso enuncia<strong>do</strong> aprova<strong>do</strong> na VII Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, <strong>de</strong> 2015: “para a caracterização <strong>do</strong> adimplemento substancial (tal qual<br />

reconheci<strong>do</strong> pelo Enuncia<strong>do</strong> n. 361 da IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil – CJF), leva-se em conta tanto aspectos quantitativos quanto<br />

qualitativos” (Enuncia<strong>do</strong> n. 586).<br />

Como outro exemplo relativo à interação entre conservação negocial e função social <strong>do</strong> contrato, vale citar recente e correto<br />

acórdão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 569, que diz respeito à chamada exceção da ruína. Nos<br />

termos <strong>do</strong> aresto, que citam as lições Cláudia Lima Marques e Bruno Miragem, “os emprega<strong>do</strong>s <strong>de</strong>miti<strong>do</strong>s sem justa causa e os<br />

aposenta<strong>do</strong>s que contribuíram para plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> coletivo empresarial que tenha si<strong>do</strong> extinto não têm direito <strong>de</strong> serem manti<strong>do</strong>s<br />

nesse plano se o estipulante (ex-emprega<strong>do</strong>r) e a opera<strong>do</strong>ra re<strong>de</strong>senharam o sistema estabelecen<strong>do</strong> um novo plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />

coletivo a fim <strong>de</strong> evitar o seu colapso (exceção da ruína) ante prejuízos crescentes, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que tenham si<strong>do</strong> asseguradas aos inativos<br />

as mesmas condições <strong>de</strong> cobertura assistencial proporcionadas aos emprega<strong>do</strong>s ativos (…). De fato, pela exceção da ruína –<br />

instituto que, conforme <strong>de</strong>finição <strong>do</strong>utrinária, representa a circunstância liberatória <strong>de</strong>corrente da ‘situação <strong>de</strong> ruína em que o<br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>ria incorrer, caso a execução <strong>do</strong> contrato, atingida por alterações fáticas, não fosse sustida’ –, o vínculo contratual<br />

original po<strong>de</strong> sofrer ação liberatória e adapta<strong>do</strong>ra às novas circunstâncias da realida<strong>de</strong>, com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> manter a relação<br />

jurídica sem a quebra <strong>do</strong> sistema, sen<strong>do</strong> imprescindível a cooperação mútua para modificar o contrato <strong>do</strong> mo<strong>do</strong> menos danoso às<br />

partes. É por isso que, nos contratos cativos <strong>de</strong> longa duração, também chama<strong>do</strong>s <strong>de</strong> relacionais, basea<strong>do</strong>s na confiança, o<br />

rigorismo e a perenida<strong>de</strong> <strong>do</strong> vínculo existente entre as partes po<strong>de</strong>m sofrer, excepcionalmente, algumas flexibilizações, a fim <strong>de</strong><br />

evitar a ruína <strong>do</strong> sistema e da empresa, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser respeita<strong>do</strong>s, em qualquer caso, a boa-fé, que é bilateral, e os <strong>de</strong>veres <strong>de</strong><br />

lealda<strong>de</strong>, <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> (interna e externa) e <strong>de</strong> cooperação recíprocos. (…). Cumpre <strong>de</strong>stacar, também, que a função social e a<br />

solidarieda<strong>de</strong> nos planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> coletivos assumem gran<strong>de</strong> relevo, ten<strong>do</strong> em vista o mutualismo existente, caracteriza<strong>do</strong>r <strong>de</strong> um<br />

pacto tácito entre as diversas gerações <strong>de</strong> emprega<strong>do</strong>s passa<strong>do</strong>s, atuais e futuros (solidarieda<strong>de</strong> intergeracional), trazen<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ver<br />

<strong>de</strong> to<strong>do</strong>s para a viabilização <strong>do</strong> próprio contrato <strong>de</strong> assistência médica. Desse mo<strong>do</strong>, na hipótese em apreço, não há como preservar<br />

in<strong>de</strong>finidamente a sistemática contratual original se verificada a exceção <strong>de</strong> ruína” (STJ – REsp 1.479.420/SP – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong><br />

Villas Bôas Cueva – j. 1º.9.2015, DJe 11.9.2015).<br />

Feitas tais consi<strong>de</strong>rações, por to<strong>do</strong> o exposto até aqui, o contrato <strong>de</strong>ve ser, regra geral, manti<strong>do</strong> e conserva<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> admitida a<br />

sua resolução ou revisão somente quan<strong>do</strong> estiver presente uma situação <strong>de</strong>sfavorável ao consumi<strong>do</strong>r, com repercussões no mun<strong>do</strong><br />

fático, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a tornar insuportável a manutenção <strong>do</strong> seu relacionamento negocial. Tem-se, na espécie, um princípio diferente <strong>do</strong><br />

princípio da força obrigatória <strong>do</strong> contrato previsto no <strong>Direito</strong> Civil clássico (pacta sunt servanda), mas a regra continua sen<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

manutenção da autonomia privada exposta pelas partes no momento da celebração da avença. De toda sorte, a manutenção <strong>do</strong><br />

negócio, com sua concreta correção ou revisão, acaba representan<strong>do</strong> uma espécie <strong>de</strong> punição para a parte que impôs o


<strong>de</strong>sequilíbrio ou a situação <strong>de</strong> injustiça ao consumi<strong>do</strong>r.<br />

O senti<strong>do</strong> da conservação contratual po<strong>de</strong> ser retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 51, § 2º, da Lei 8.078/1990, que estabelece a vedação <strong>de</strong><br />

nulida<strong>de</strong> automática <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o negócio, pela presença <strong>de</strong> uma cláusula abusiva. Enuncia tal coman<strong>do</strong> que “a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma<br />

cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quan<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua ausência, apesar <strong>do</strong>s esforços <strong>de</strong> integração, <strong>de</strong>correr um<br />

ônus excessivo a qualquer das partes”. Para a manutenção <strong>do</strong> negócio, <strong>de</strong>vem-se buscar formas <strong>de</strong> integração, <strong>de</strong>cretan<strong>do</strong>-se a<br />

nulida<strong>de</strong> da cláusula <strong>de</strong>sproporcional, mas manten<strong>do</strong>-se to<strong>do</strong> o resto <strong>do</strong> negócio jurídico. Trata-se <strong>de</strong> aplicação, na ótica<br />

consumerista, da antiga máxima segun<strong>do</strong> a qual a parte inútil <strong>do</strong> negócio não prejudica, em regra, a sua parte útil (utile per inutile<br />

non vitiatur).<br />

Encerran<strong>do</strong> o presente tópico, percebe-se que o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r valoriza sobremaneira, naquilo que for<br />

possível, a vonta<strong>de</strong> anteriormente manifestada, visan<strong>do</strong> a sua manutenção diante <strong>de</strong> uma confiança <strong>de</strong>positada, o que liga o<br />

princípio da conservação contratual à boa-fé objetiva. Como o intuito é o aproveitamento <strong>do</strong> negócio jurídico, diante da sua<br />

importância para a socieda<strong>de</strong>, a conservação também possui um traço que a relaciona com o princípio da função social <strong>do</strong>s<br />

contratos, o que parece ser a melhor opção principiológica.<br />

2.8.<br />

PRINCÍPIO DA EQUIVALÊNCIA NEGOCIAL (ART. 6º, INC. II, DA LEI 8.078/1990)<br />

Pelo princípio da equivalência negocial, é garantida a igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> condições no momento da contratação ou <strong>de</strong><br />

aperfeiçoamento da relação jurídica patrimonial. De acor<strong>do</strong> com a norma <strong>do</strong> inciso II, art. 6º, <strong>do</strong> CDC, fica estabeleci<strong>do</strong> o<br />

compromisso <strong>de</strong> tratamento igual a to<strong>do</strong>s os consumi<strong>do</strong>res, consagrada a igualda<strong>de</strong> nas contratações. A respeito <strong>de</strong>ssa<br />

equivalência, mais uma vez são oportunas as lições <strong>de</strong> Claudia Lima Marques, Antônio Herman V. Benjamin e Bruno Miragem:<br />

“Com o advento <strong>do</strong> CDC, o contrato passa a ter seu equilíbrio, conteú<strong>do</strong> ou equida<strong>de</strong> mais controla<strong>do</strong>s, valorizan<strong>do</strong>-se o seu<br />

sinalagma. Segun<strong>do</strong> Gernhuber, sinalagma é um elemento imanente estrutural <strong>do</strong>s contratos, é a <strong>de</strong>pendência genética, condicionada<br />

e funcional <strong>de</strong> pelo menos duas prestações correspectivas, é o nexo final que, oriun<strong>do</strong> da vonta<strong>de</strong> das partes, é molda<strong>do</strong> pela lei<br />

(Gernhuber, p. 52). Sinalagma não significa apenas bilateralida<strong>de</strong>, como muitos acreditam, influencia<strong>do</strong>s pelo art. 1.102 <strong>do</strong> Co<strong>de</strong><br />

Civil francês, mas sim contrato, convenção, é um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> organização (Organisationmo<strong>de</strong>ll) das relações privadas<br />

(etimologicamente, a palavra grega significa contrato ou convenção e só no direito romano, e em sua interpretação na Ida<strong>de</strong> Média,<br />

passou a ser consi<strong>de</strong>rada sinônimo <strong>de</strong> bilateralida<strong>de</strong> perfeita nos contratos). O papel prepon<strong>de</strong>rante da lei sobre a vonta<strong>de</strong> das partes,<br />

a impor uma maior boa-fé nas relações <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>, conduz o or<strong>de</strong>namento jurídico a controlar mais efetivamente este sinalagma e,<br />

por consequência, o equilíbrio contratual”.40<br />

A par <strong>de</strong>ssa tentativa <strong>de</strong> concretizar a igualda<strong>de</strong>, fundamentada na isonomia constitucional, no máximo, o que se po<strong>de</strong> aceitar<br />

são privilégios aos consumi<strong>do</strong>res que necessitem <strong>de</strong> proteção especial, ti<strong>do</strong>s como hipervulneráveis, caso <strong>de</strong> i<strong>do</strong>sos, porta<strong>do</strong>res <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ficiências, crianças e a<strong>do</strong>lescentes, que merecem proteção por duplo ou triplo motivo. 41<br />

No contexto <strong>de</strong> equivalência, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r veda que os <strong>de</strong>stinatários finais sejam expostos a práticas<br />

<strong>de</strong>sproporcionais, o que po<strong>de</strong> ser senti<strong>do</strong> pela inteligência <strong>do</strong>s arts. 39 e 51, que afastam, respectivamente, <strong>de</strong>terminadas cláusulas<br />

e práticas abusivas, gera<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> absoluta e <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> <strong>do</strong> caso concreto.<br />

Além disso, o art. 8º da Lei Consumerista estabelece a vedação <strong>de</strong> produtos e serviços que acarretem riscos à saú<strong>de</strong> <strong>do</strong>s<br />

consumi<strong>do</strong>res, sem exceção, o que também vai ao encontro à tentativa <strong>de</strong> igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> tratamento. Em tais situações, no caso <strong>de</strong><br />

danos, to<strong>do</strong>s terão direito à reparação integral, patrimonial, moral e estética, aplican<strong>do</strong>-se a teoria própria <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil,<br />

prevista pela Lei 8.078/1990.<br />

A<strong>de</strong>mais, pelo princípio da equivalência negocial, assegura-se ao consumi<strong>do</strong>r o direito <strong>de</strong> conhecer o produto ou o serviço que<br />

está adquirin<strong>do</strong>, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> plena liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolha e <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver anexo <strong>de</strong> informar. É oportuno, nesse senti<strong>do</strong>, citar<br />

o Decreto 4.680, <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 2003, que regulamenta o direito à informação, preven<strong>do</strong> o seu art. 1º o <strong>de</strong>ver <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong><br />

informar quanto aos “alimentos e ingredientes alimentares <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>s ao consumo humano ou animal, que contenham ou sejam<br />

produzi<strong>do</strong>s a partir <strong>de</strong> organismos geneticamente modifica<strong>do</strong>s, sem prejuízo <strong>do</strong> cumprimento das <strong>de</strong>mais normas aplicáveis”. De<br />

acor<strong>do</strong> com essa estrutura proporcional, a lei proíbe qualquer tipo <strong>de</strong> discriminação no momento <strong>de</strong> contratar, sob o pretexto<br />

constitucional <strong>de</strong> que to<strong>do</strong>s são iguais perante a lei, existin<strong>do</strong> também o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> o presta<strong>do</strong>r ou fornece<strong>do</strong>r informar to<strong>do</strong>s sobre<br />

os riscos inerentes à prestação ou ao fornecimento.<br />

Essa é a lógica e o senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> que consta no art. 9º da Lei 8.078/1990, ao consagrar o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar quanto aos produtos e<br />

serviços potencialmente nocivos ou perigosos à saú<strong>de</strong> e segurança. Esse coman<strong>do</strong> legal mantém relação íntima com a segunda<br />

geração <strong>de</strong> direitos, relacionada com o princípio da igualda<strong>de</strong> lato sensu, ou isonomia, previsto no art. 5º, caput, da CF/1988. Na<br />

prática, tem-se exigi<strong>do</strong> o respeito a esse <strong>de</strong>ver por parte <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res, chegan<strong>do</strong>-se a impor graves


consequências, inclusive penais, no caso <strong>do</strong> seu <strong>de</strong>scumprimento.<br />

Por tu<strong>do</strong> isso, percebe-se um contato direto entre o princípio da equivalência negocial e a boa-fé objetiva, haven<strong>do</strong> uma<br />

exigência <strong>de</strong> condutas <strong>de</strong> lealda<strong>de</strong> por parte <strong>do</strong>s profissionais da relação <strong>de</strong> consumo, que <strong>de</strong>verão, <strong>de</strong> maneira igualitária, fornecer<br />

condições iguais nas fases pré-contratual, contratual e pós-contratual <strong>do</strong> negócio jurídico.<br />

A encerrar este tópico, ten<strong>do</strong> a coletivida<strong>de</strong> como objeto <strong>de</strong> tratamento legal, o art. 10 <strong>do</strong> Código Consumerista veda ao<br />

fornece<strong>do</strong>r a conduta <strong>de</strong> colocar no merca<strong>do</strong> produto ou serviço que apresente alto grau <strong>de</strong> nocivida<strong>de</strong> à saú<strong>de</strong> e à segurança <strong>de</strong><br />

to<strong>do</strong>s, o que, <strong>de</strong> igual mo<strong>do</strong>, é expressão correta <strong>do</strong> princípio da equivalência. Nesse caso, há o <strong>de</strong>ver geral <strong>de</strong> vigilância e<br />

informação, que atinge inclusive a fase pós-contratual, momento posterior ao <strong>do</strong> aperfeiçoamento <strong>do</strong> contrato. Para as situações em<br />

que houver danos coletivos, os arts. 81 e 82 <strong>do</strong> Código Consumerista trazem a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> interesses e direitos<br />

individuais homogêneos, coletivos em senti<strong>do</strong> estrito e difusos, o que é gran<strong>de</strong> repercussão <strong>do</strong> princípio ora comenta<strong>do</strong>, haja vista<br />

somente ser possível a proteção coletiva nos casos <strong>de</strong> equivalência entre os prejudica<strong>do</strong>s.<br />

2.9.<br />

PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL DOS DANOS (ART. 6º, INC. VI, DA LEI<br />

8.078/1990). OS DANOS REPARÁVEIS NAS RELAÇÕES DE CONSUMO<br />

No que concerne à responsabilida<strong>de</strong> civil na ótica consumerista – tema que merecerá abordagem em capítulo próprio –, o<br />

regramento fundamental é a reparação integral <strong>do</strong>s danos, que assegura aos consumi<strong>do</strong>res as efetivas prevenção e reparação <strong>de</strong><br />

to<strong>do</strong>s os danos suporta<strong>do</strong>s, sejam eles materiais ou morais, individuais, coletivos ou difusos.<br />

Em um primeiro momento, se existirem danos materiais no caso concreto, nas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> danos emergentes – o que<br />

efetivamente se per<strong>de</strong>u –, ou lucros cessantes – o que razoavelmente se <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> lucrar –, o consumi<strong>do</strong>r terá direito à reparação<br />

integral, sen<strong>do</strong> veda<strong>do</strong> qualquer tipo <strong>de</strong> tarifação ou tabelamento, previsto por lei, entendimento jurispru<strong>de</strong>ncial ou convenção<br />

internacional. Nessa linha, conforme o Enuncia<strong>do</strong> n. 550 <strong>do</strong> CJF/STJ, aprova<strong>do</strong> na VI Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, em 2013, “a<br />

quantificação da reparação por danos extrapatrimoniais não <strong>de</strong>ve estar sujeita a tabelamento ou a valores fixos”. Obviamente, tal<br />

linha <strong>de</strong> pensar tem plena incidência para as relações jurídicas <strong>de</strong> consumo.<br />

De uma mesma situação danosa terá o consumi<strong>do</strong>r direito à reparação por danos morais, aqueles que atingem seus direitos da<br />

personalida<strong>de</strong>. Não se po<strong>de</strong> esquecer que a Súmula 37 <strong>do</strong> STJ admite a cumulação, em uma mesma ação, <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> reparação<br />

<strong>de</strong> danos materiais e morais, <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> mesmo fato, o que tem plena aplicação às relações <strong>de</strong> consumo.<br />

Ato contínuo, <strong>de</strong>ve-se atentar para o fato <strong>de</strong> que, para a jurisprudência superior, o dano estético constitui uma terceira<br />

modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dano, separável <strong>do</strong> dano moral, caben<strong>do</strong> <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> in<strong>de</strong>nização por tais prejuízos. Estabelece a Súmula 387<br />

<strong>do</strong> STJ que é perfeitamente possível a cumulação <strong>de</strong> danos estéticos e danos morais. O entendimento parece ser o mais correto, em<br />

prol da tendência <strong>de</strong> ampliação <strong>de</strong> novas categorias <strong>de</strong> danos. Em reforço, no dano estético há uma lesão a mais à personalida<strong>de</strong>, à<br />

dignida<strong>de</strong> humana. Como exemplo da presença <strong>de</strong> dano estético em relação <strong>de</strong> consumo, cite-se a hipótese <strong>de</strong> erro médico em<br />

cirurgia plástica estética, subsumin<strong>do</strong>-se plenamente ao Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r (nesse senti<strong>do</strong>: STJ – REsp 236.708/MG – Quarta<br />

Turma – Rel. Des. Conv. Carlos Fernan<strong>do</strong> Mathias – j. 10.02.2009 – DJe 18.05.2009).<br />

Além <strong>do</strong>s danos individuais, representan<strong>do</strong> notável avanço, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r admite expressamente no seu<br />

art. 6º, inc. VI, a reparação <strong>de</strong> danos morais coletivos e <strong>do</strong>s danos difusos, categorias que merecem ser aqui diferenciadas para<br />

aprofundamentos posteriores. Anote-se que a conclusão a respeito da reparação <strong>de</strong>sses danos é a mesma no âmbito civil, conforme<br />

se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong> <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 456, da V Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil <strong>do</strong> Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral e <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça,<br />

evento <strong>de</strong> 2011: “A expressão ‘dano’ no art. 944 abrange não só os danos individuais, materiais ou imateriais, mas também os<br />

danos sociais, difusos, coletivos e individuais homogêneos a serem reclama<strong>do</strong>s pelos legitima<strong>do</strong>s para propor ações coletivas”.<br />

O dano moral coletivo é modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dano que atinge, ao mesmo tempo, vários direitos da personalida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> pessoas<br />

<strong>de</strong>terminadas ou <strong>de</strong>termináveis (danos morais soma<strong>do</strong>s ou acresci<strong>do</strong>s). Deve-se compreen<strong>de</strong>r que os danos morais coletivos<br />

atingem direitos individuais homogêneos e coletivos em senti<strong>do</strong> estrito, em que as vítimas são <strong>de</strong>terminadas ou <strong>de</strong>termináveis. Por<br />

isso, a in<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>stinada para elas, as vítimas concretas <strong>do</strong> evento. Serve como inspiração para tal <strong>de</strong>dução o art. 81<br />

<strong>do</strong> CDC. Pela norma, os interesses ou direitos individuais homogêneos são os <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> origem comum, sen<strong>do</strong> possível<br />

i<strong>de</strong>ntificar os direitos <strong>do</strong>s prejudica<strong>do</strong>s. Já os interesses ou direitos coletivos em senti<strong>do</strong> estrito são os transindividuais e<br />

indivisíveis, <strong>de</strong> que seja titular grupo, categoria ou classe <strong>de</strong> pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação<br />

jurídica base.<br />

Em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> jurisprudência superior – apesar <strong>de</strong> algumas resistências –, o principal julga<strong>do</strong> que admitiu a reparação <strong>do</strong>s danos<br />

morais coletivos foi prolata<strong>do</strong> pela Terceira Turma <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça no famoso caso das pílulas <strong>de</strong> farinha. O<br />

Tribunal enten<strong>de</strong>u por bem in<strong>de</strong>nizar as mulheres que tomaram as citadas pílulas e vieram a engravidar, o que não estava


planeja<strong>do</strong>. A in<strong>de</strong>nização foi em face da empresa Schering <strong>do</strong> Brasil, que fornecia a pílula anticoncepcional Microvlar, presente na<br />

<strong>de</strong>cisão uma apurada análise da extensão <strong>do</strong> dano em relação às consumi<strong>do</strong>ras. A longa ementa da <strong>de</strong>cisão merece ser aqui<br />

transcrita, para as <strong>de</strong>vidas reflexões:<br />

“Civil e processo civil. Recurso especial. Ação civil pública proposta pelo PROCON e pelo Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> São Paulo. Anticoncepcional<br />

Microvlar. Acontecimentos que se notabilizaram como o ‘caso das pílulas <strong>de</strong> farinha’. Cartelas <strong>de</strong> comprimi<strong>do</strong>s sem princípio ativo,<br />

utilizadas para teste <strong>de</strong> maquinário, que acabaram atingin<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>ras e não impediram a gravi<strong>de</strong>z in<strong>de</strong>sejada. Pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

con<strong>de</strong>nação genérica, permitin<strong>do</strong> futura liquidação individual por parte das consumi<strong>do</strong>ras lesadas. Discussão vinculada à<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> respeito à segurança <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, ao direito <strong>de</strong> informação e à compensação pelos danos morais sofri<strong>do</strong>s. Nos<br />

termos <strong>de</strong> prece<strong>de</strong>ntes, associações possuem legitimida<strong>de</strong> ativa para propositura <strong>de</strong> ação relativa a direitos individuais homogêneos.<br />

Como o mesmo fato po<strong>de</strong> ensejar ofensa tanto a direitos difusos, quanto a coletivos e individuais, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> apenas da ótica com<br />

que se examina a questão, não há qualquer estranheza em se ter uma ação civil pública concomitante com ações individuais, quan<strong>do</strong><br />

perfeitamente <strong>de</strong>limitadas as matérias cognitivas em cada hipótese. A ação civil pública <strong>de</strong>manda ativida<strong>de</strong> probatória congruente<br />

com a discussão que ela veicula; na presente hipótese, analisou-se a colocação ou não das consumi<strong>do</strong>ras em risco e responsabilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> <strong>de</strong>srespeito ao <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informação. Quanto às circunstâncias que envolvem a hipótese, o TJSP enten<strong>de</strong>u que não<br />

houve <strong>de</strong>scarte eficaz <strong>do</strong> produto-teste, <strong>de</strong> forma que a empresa permitiu, <strong>de</strong> algum mo<strong>do</strong>, que tais pílulas atingissem as<br />

consumi<strong>do</strong>ras. Quanto a esse ‘mo<strong>do</strong>’, verificou-se que a empresa não mantinha o mínimo controle sobre pelo menos quatro aspectos<br />

essenciais <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong> produtiva, quais sejam: a) sobre os funcionários, pois a estes era permiti<strong>do</strong> entrar e sair da fábrica com o<br />

que bem enten<strong>de</strong>ssem; b) sobre o setor <strong>de</strong> <strong>de</strong>scarga <strong>de</strong> produtos usa<strong>do</strong>s e/ou inservíveis, pois há <strong>de</strong>poimentos no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que era<br />

possível encontrar medicamentos no ‘lixão’ da empresa; c) sobre o transporte <strong>do</strong>s resíduos; e d) sobre a incineração <strong>do</strong>s resíduos. E<br />

isso acontecia no mesmo instante em que a empresa se <strong>de</strong>dicava a manufaturar produto com potencialida<strong>de</strong> extremamente lesiva aos<br />

consumi<strong>do</strong>res. Em nada socorre a empresa, assim, a alegação <strong>de</strong> que, até hoje, não foi possível verificar exatamente <strong>de</strong> que forma as<br />

pílulas-teste chegaram às mãos das consumi<strong>do</strong>ras. O panorama fático a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pelo acórdão recorri<strong>do</strong> mostra que tal <strong>de</strong>monstração<br />

talvez seja mesmo impossível, porque eram tantos e tão graves os erros e <strong>de</strong>scui<strong>do</strong>s na linha <strong>de</strong> produção e <strong>de</strong>scarte <strong>de</strong><br />

medicamentos, que não seria hipótese infundada afirmar-se que os placebos atingiram as consumi<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> diversas formas ao<br />

mesmo tempo. A responsabilida<strong>de</strong> da fornece<strong>do</strong>ra não está condicionada à introdução consciente e voluntária <strong>do</strong> produto lesivo no<br />

merca<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Tal i<strong>de</strong>ia fomentaria uma terrível discrepância entre o nível <strong>do</strong>s riscos assumi<strong>do</strong>s pela empresa em sua<br />

ativida<strong>de</strong> comercial e o padrão <strong>de</strong> cuida<strong>do</strong>s que a fornece<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>ve ser obrigada a manter. Na hipótese, o objeto da li<strong>de</strong> é <strong>de</strong>limitar a<br />

responsabilida<strong>de</strong> da empresa quanto à falta <strong>de</strong> cuida<strong>do</strong>s eficazes para garantir que, uma vez ten<strong>do</strong> produzi<strong>do</strong> manufatura perigosa,<br />

tal produto fosse afasta<strong>do</strong> das consumi<strong>do</strong>ras. A alegada culpa exclusiva <strong>do</strong>s farmacêuticos na comercialização <strong>do</strong>s placebos parte <strong>de</strong><br />

premissa fática que é inadmissível e que, <strong>de</strong> qualquer mo<strong>do</strong>, não teria o alcance <strong>de</strong>seja<strong>do</strong> no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> excluir totalmente a<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. A empresa fornece<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>scumpre o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informação quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> divulgar,<br />

imediatamente, notícia sobre riscos envolven<strong>do</strong> seu produto, em face <strong>de</strong> juízo <strong>de</strong> valor a respeito da conveniência, para sua própria<br />

imagem, da divulgação ou não <strong>do</strong> problema. Ocorreu, no caso, uma curiosa inversão da relação entre interesses das consumi<strong>do</strong>ras e<br />

interesses da fornece<strong>do</strong>ra: esta alega ser lícito causar danos por falta, ou seja, permitir que as consumi<strong>do</strong>ras sejam lesionadas na<br />

hipótese <strong>de</strong> existir uma pretensa dúvida sobre um risco real que posteriormente se concretiza, e não ser lícito agir por excesso, ou<br />

seja, tomar medidas <strong>de</strong> precaução ao primeiro sinal <strong>de</strong> risco. O <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> compensar danos morais, na hipótese, não fica afasta<strong>do</strong><br />

com a alegação <strong>de</strong> que a gravi<strong>de</strong>z resultante da ineficácia <strong>do</strong> anticoncepcional trouxe, necessariamente, sentimentos positivos pelo<br />

surgimento <strong>de</strong> uma nova vida, porque o objeto <strong>do</strong>s autos não é discutir o <strong>do</strong>m da maternida<strong>de</strong>. Ao contrário, o produto em questão é<br />

um anticoncepcional, cuja única utilida<strong>de</strong> é a <strong>de</strong> evitar uma gravi<strong>de</strong>z. A mulher que toma tal medicamento tem a intenção <strong>de</strong> utilizálo<br />

como meio a possibilitar sua escolha quanto ao momento <strong>de</strong> ter filhos, e a falha <strong>do</strong> remédio, ao frustrar a opção da mulher, dá<br />

ensejo à obrigação <strong>de</strong> compensação pelos danos morais, em liquidação posterior. Recurso especial não conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp<br />

866.636/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 29.11.2007 – DJ 06.12.2007, p. 312).<br />

Três são as conclusões <strong>do</strong> julga<strong>do</strong> que merecem ser <strong>de</strong>stacadas. A primeira é a <strong>de</strong> que o PROCON, como entida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa<br />

<strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, tem legitimida<strong>de</strong> para <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> direitos individuais homogêneos com clara repercussão social. A segunda, que<br />

mais nos interessa, é no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que os danos morais po<strong>de</strong>m ser coletivos e não só individuais, o que é claro pela simples leitura<br />

<strong>do</strong> art. 6º, inc. VI, da Lei 8.078/1990. A terceira conclusão é a <strong>de</strong> que as mulheres que engravidaram sofreram lesões à<br />

personalida<strong>de</strong> diante <strong>de</strong> uma situação não esperada ou não planejada. Assim, obviamente, não é o nascimento <strong>do</strong> filho que causa o<br />

dano moral, mas sim a frustração <strong>de</strong> uma opção pessoal. Perfeitas são todas as conclusões <strong>de</strong>sse exemplar acórdão, que merece o<br />

<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> estu<strong>do</strong> por to<strong>do</strong>s os opera<strong>do</strong>res <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>.<br />

A respeito <strong>do</strong> dano difuso, po<strong>de</strong> ele ser visualiza<strong>do</strong> como um dano social. Para Antonio Junqueira <strong>de</strong> Azeve<strong>do</strong>, os danos<br />

sociais “são lesões à socieda<strong>de</strong>, no seu nível <strong>de</strong> vida, tanto por rebaixamento <strong>de</strong> seu patrimônio moral – principalmente a respeito<br />

da segurança – quanto por diminuição na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida”.42 Na esteira <strong>do</strong>s ensinamentos <strong>do</strong> jurista, constata-se que tais<br />

prejuízos po<strong>de</strong>m gerar repercussões materiais ou morais, o que os diferencia <strong>do</strong>s danos morais coletivos, pois os últimos são<br />

apenas extrapatrimoniais. Os danos sociais <strong>de</strong>correm <strong>de</strong> condutas socialmente reprováveis ou comportamentos exemplares<br />

negativos, como quer o próprio Junqueira <strong>de</strong> Azeve<strong>do</strong>.43<br />

Pois bem, os danos sociais são difusos, pois envolvem situações em que as vítimas são in<strong>de</strong>terminadas ou in<strong>de</strong>termináveis,


nos termos <strong>do</strong> art. 81, parágrafo único, inc. I, <strong>do</strong> CDC, segun<strong>do</strong> o qual são interesses ou direitos difusos os transindividuais, <strong>de</strong><br />

natureza indivisível, <strong>de</strong> que sejam titulares pessoas in<strong>de</strong>terminadas e ligadas por circunstâncias <strong>de</strong> fato. Como não é possível<br />

<strong>de</strong>terminar quais são as vítimas, a in<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>stinada para um fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> proteção – <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com os direitos atingi<strong>do</strong>s<br />

–, ou mesmo para uma instituição <strong>de</strong> carida<strong>de</strong>, a critério <strong>do</strong> juiz.<br />

Nessa linha, há <strong>de</strong>cisão importante, <strong>do</strong> sempre pioneiro Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul, reconhecen<strong>do</strong> a reparação<br />

<strong>do</strong>s danos difusos e sociais. O caso envolve a frau<strong>de</strong> <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> loterias (caso Toto Bola), o que gerou danos à socieda<strong>de</strong>.<br />

Fixada a in<strong>de</strong>nização, os valores foram reverti<strong>do</strong>s a favor <strong>do</strong> fun<strong>do</strong> gaúcho <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. Vejamos, mais uma vez,<br />

a ementa <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>:<br />

“Toto Bola. Sistema <strong>de</strong> loterias <strong>de</strong> chances múltiplas. Frau<strong>de</strong> que retirava ao consumi<strong>do</strong>r a chance <strong>de</strong> vencer. Ação <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong><br />

danos materiais e morais. Danos materiais limita<strong>do</strong>s ao valor das cartelas comprovadamente adquiridas. Danos morais puros não<br />

caracteriza<strong>do</strong>s. Possibilida<strong>de</strong>, porém, <strong>de</strong> excepcional aplicação da função punitiva da responsabilida<strong>de</strong> civil. Na presença <strong>de</strong> danos<br />

mais propriamente sociais <strong>do</strong> que individuais, recomenda-se o recolhimento <strong>do</strong>s valores da con<strong>de</strong>nação ao fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong><br />

interesses difusos. Recurso parcialmente provi<strong>do</strong>. Não há que se falar em perda <strong>de</strong> uma chance, diante da remota possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

ganho em um sistema <strong>de</strong> loterias. Danos materiais consistentes apenas no valor das cartelas comprovadamente adquiridas, sem reais<br />

chances <strong>de</strong> êxito. Ausência <strong>de</strong> danos morais puros, que se caracterizam pela presença da <strong>do</strong>r física ou sofrimento moral, situações <strong>de</strong><br />

angústia, forte estresse, grave <strong>de</strong>sconforto, exposição à situação <strong>de</strong> vexame, vulnerabilida<strong>de</strong> ou outra ofensa a direitos da<br />

personalida<strong>de</strong>. Presença <strong>de</strong> frau<strong>de</strong>, porém, que não po<strong>de</strong> passar em branco. Além <strong>de</strong> possíveis respostas na esfera <strong>do</strong> direito penal e<br />

administrativo, o direito civil também po<strong>de</strong> contribuir para orientar os atores sociais no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> evitar <strong>de</strong>terminadas condutas,<br />

mediante a punição econômica <strong>de</strong> quem age em <strong>de</strong>sacor<strong>do</strong> com padrões mínimos exigi<strong>do</strong>s pela ética das relações sociais e<br />

econômicas. Trata-se da função punitiva e dissuasória que a responsabilida<strong>de</strong> civil po<strong>de</strong>, excepcionalmente, assumir, ao la<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua<br />

clássica função reparatória/compensatória. ‘O <strong>Direito</strong> <strong>de</strong>ve ser mais esperto <strong>do</strong> que o torto’, frustran<strong>do</strong> as in<strong>de</strong>vidas expectativas <strong>de</strong><br />

lucro ilícito, à custa <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res <strong>de</strong> boa-fé. Consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>, porém, que os danos verifica<strong>do</strong>s são mais sociais <strong>do</strong> que<br />

propriamente individuais, não é razoável que haja uma apropriação particular <strong>de</strong> tais valores, evitan<strong>do</strong>-se a disfunção alhures<br />

<strong>de</strong>nominada <strong>de</strong> overcompensation. Nesse caso, cabível a <strong>de</strong>stinação <strong>do</strong> numerário para o Fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> Defesa <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>s Difusos,<br />

cria<strong>do</strong> pela Lei 7.347/1985, e aplicável também aos danos coletivos <strong>de</strong> consumo, nos termos <strong>do</strong> art. 100, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC.<br />

Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> dano social ocorri<strong>do</strong> no âmbito <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul, a con<strong>de</strong>nação <strong>de</strong>verá reverter para o fun<strong>do</strong> gaúcho<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Recurso parcialmente provi<strong>do</strong>” (TJRS – Recurso Cível 71001281054 – Primeira Turma Recursal Cível,<br />

Turmas Recursais – Rel. Des. Ricar<strong>do</strong> Torres Hermann – j. 12.07.2007).<br />

No ano <strong>de</strong> 2013 surgiu outro acórdão sobre o tema, que merece especial <strong>de</strong>staque, por sua indiscutível amplitu<strong>de</strong> perante toda<br />

a coletivida<strong>de</strong>. O julga<strong>do</strong>, da Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> São Paulo, con<strong>de</strong>nou a empresa AMIL a<br />

pagar uma in<strong>de</strong>nização <strong>de</strong> R$ 1.000.000,00 (um milhão <strong>de</strong> reais) a título <strong>de</strong> danos sociais, valor que <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> ao Hospital<br />

das Clínicas <strong>de</strong> São Paulo. A con<strong>de</strong>nação se <strong>de</strong>u diante <strong>de</strong> reiteradas negativas <strong>de</strong> coberturas médicas, notoriamente praticadas por<br />

essa opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Vejamos sua ementa:<br />

“Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> cobertura para internação. Sentença que julgou proce<strong>de</strong>nte pedi<strong>do</strong> feito pelo segura<strong>do</strong>, <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> que,<br />

por se tratar <strong>de</strong> situação <strong>de</strong> emergência, fosse dada a <strong>de</strong>vida cobertura, ainda que <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> carência, mantida. Dano moral.<br />

Caracterização em razão da peculiarida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se cuidar <strong>de</strong> paciente acometi<strong>do</strong> por infarto, com a recusa <strong>de</strong> atendimento e,<br />

consequentemente, procura <strong>de</strong> outro hospital em situação nitidamente aflitiva. Dano social. Contratos <strong>de</strong> seguro-saú<strong>de</strong>, a propósito<br />

<strong>de</strong> hipóteses reiteradamente analisadas e <strong>de</strong>cididas. In<strong>de</strong>nização com caráter expressamente punitivo, no valor <strong>de</strong> um milhão <strong>de</strong> reais<br />

que não se confun<strong>de</strong> com a <strong>de</strong>stinada ao segura<strong>do</strong>, revertida ao Hospital das Clínicas <strong>de</strong> São Paulo. Litigância <strong>de</strong> má-fé.<br />

Configuração pelo caráter protelatório <strong>do</strong> recurso. Aplicação <strong>de</strong> multa. Recurso da segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong> e <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> provi<strong>do</strong> em<br />

parte” (TJSP, Apelação 0027158-41.2010.8.26.0564 – 4.ª Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – São Bernar<strong>do</strong> <strong>do</strong> Campo – Rel. Des.<br />

Teixeira Leite – j. 18.07.2013).<br />

Frise-se que o aresto reconhece o dano moral individual suporta<strong>do</strong> pela vítima, in<strong>de</strong>nizan<strong>do</strong>-a em R$ 50.000,00 (cinquenta mil<br />

reais), em cumulação com o relevante valor menciona<strong>do</strong>, a título <strong>de</strong> danos sociais. Quanto ao último montante, consta <strong>do</strong> voto<br />

vence<strong>do</strong>r, com maestria, “que uma acentuada importância em dinheiro po<strong>de</strong> soar como alta a uma primeira vista, mas isso logo se<br />

dissipa em se comparada ao lucro exagera<strong>do</strong> que a segura<strong>do</strong>ra obtém negan<strong>do</strong> coberturas e obrigan<strong>do</strong> que seus contrata<strong>do</strong>s,<br />

enquanto pacientes, a buscar na Justiça o que o próprio contrato lhes garante. Aliás, não só se ganha ao regatear e impor recusas<br />

absurdas, como ainda agrava o sistema <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> pública, obrigan<strong>do</strong> a busca <strong>de</strong> alternativas nos hospitais não convenia<strong>do</strong>s e que<br />

cumprem missão humanitária, fazen<strong>do</strong> com que se <strong>de</strong>s<strong>do</strong>brem e gastem mais para curar <strong>do</strong>entes que possuem planos <strong>de</strong> assistência<br />

médica. Portanto, toda essa comparação permite, e autoriza, nessa <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> um segura<strong>do</strong>, impor uma in<strong>de</strong>nização punitiva <strong>de</strong><br />

cunho social que será revertida a uma das instituições <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mais atuantes, o que, quem sabe, irá servir para <strong>de</strong>spertar a noção<br />

<strong>de</strong> cidadania da segura<strong>do</strong>ra”. O presente autor tem a honra <strong>de</strong> ter si<strong>do</strong> cita<strong>do</strong> no julgamento, fundamentan<strong>do</strong> gran<strong>de</strong> parte das suas<br />

<strong>de</strong>duções jurídicas.


O valor da in<strong>de</strong>nização social foi fixa<strong>do</strong> <strong>de</strong> ofício pelos julga<strong>do</strong>res, o que po<strong>de</strong> ocorrer em casos tais, por ser a matéria <strong>de</strong><br />

or<strong>de</strong>m pública. Como fundamento legal para tanto, por se tratar <strong>de</strong> questão atinente a direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, cite-se o art. 1º <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, que dispõe ser a Lei 8.078/1990 norma <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública e interesse social. Sen<strong>do</strong> assim, toda a<br />

proteção constante da Lei Consumerista po<strong>de</strong> ser reconhecida <strong>de</strong> ofício pelo julga<strong>do</strong>r, inclusive o seu art. 6º, inc. VI, que trata <strong>do</strong>s<br />

danos morais coletivos e <strong>do</strong>s danos sociais ou difusos, consagran<strong>do</strong> o princípio da reparação integral <strong>do</strong>s danos na ótica<br />

consumerista.<br />

Por oportuno, anote-se que, quan<strong>do</strong> da VI Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, realizada em 2013, foi feita proposta <strong>de</strong> enuncia<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>utrinário com o seguinte teor: “É legítimo ao juiz reconhecer a existência <strong>de</strong> interesse coletivo amplo em ação individual,<br />

con<strong>de</strong>nan<strong>do</strong> o réu a pagar, a título <strong>de</strong> dano moral e em benefício coletivo, valor <strong>de</strong> <strong>de</strong>sestímulo correspon<strong>de</strong>nte à prática lesiva<br />

reiterada <strong>de</strong> que foi vítima o autor da ação”. A proposta, formulada por Adalberto Pasqualotto, não foi aprovada por uma pequena<br />

margem <strong>de</strong> votos, infelizmente.<br />

Apesar <strong>de</strong>ssa não aprovação, acredita-se que o seu teor po<strong>de</strong> ser perfeitamente aplicável na atualida<strong>de</strong>, sen<strong>do</strong> o tema <strong>do</strong>s danos<br />

sociais uma das atuais vertentes <strong>de</strong> avanço da matéria <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil. Em complemento, ressalte-se que há proposta <strong>de</strong><br />

inclusão <strong>de</strong> norma no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> se admitir expressamente toda a proteção consumerista <strong>de</strong> ofício pelo juiz, conforme o Projeto <strong>de</strong><br />

Lei 281/2012. Nesse contexto, o art. 5º <strong>do</strong> CDC ganharia mais um inciso, estabelecen<strong>do</strong> como novo instrumento da Política<br />

Nacional das Relações <strong>de</strong> Consumo, “o conhecimento <strong>de</strong> ofício pelo Po<strong>de</strong>r Judiciário, no âmbito <strong>do</strong> processo em curso e<br />

assegura<strong>do</strong> o contraditório, <strong>de</strong> violação a normas <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r”.<br />

A propósito <strong>de</strong>ssa proposta <strong>de</strong> alteração, pontue-se que há entendimento da 2º Seção <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça pela<br />

impossibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> conhecimento <strong>de</strong> ofício <strong>do</strong>s danos sociais ou difusos em <strong>de</strong>mandas em curso no Juiza<strong>do</strong> Especial Cível. Nos<br />

termos <strong>do</strong> acórdão proferi<strong>do</strong> em reclamação perante o Tribunal da Cidadania, “na espécie, proferida a sentença pelo magistra<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

piso, competia à Turma Recursal apreciar e julgar o recurso inomina<strong>do</strong> nos limites da impugnação e das questões efetivamente<br />

suscitadas e discutidas no processo. Contu<strong>do</strong>, ao que se percebe, o acórdão reclama<strong>do</strong> valeu-se <strong>de</strong> argumentos jamais suscita<strong>do</strong>s<br />

pelas partes, nem <strong>de</strong>bati<strong>do</strong>s na instância <strong>de</strong> origem, para impor ao réu, <strong>de</strong> ofício, con<strong>de</strong>nação por dano social. Nos termos <strong>do</strong><br />

Enuncia<strong>do</strong> 456 da V Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil <strong>do</strong> CJF/STJ, os danos sociais, difusos, coletivos e individuais homogêneos <strong>de</strong>vem<br />

ser reclama<strong>do</strong>s pelos legitima<strong>do</strong>s para propor ações coletivas. Assim, ainda que o autor da ação tivesse apresenta<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

fixação <strong>de</strong> dano social, há ausência <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> da parte para pleitear, em nome próprio, direito da coletivida<strong>de</strong>” (STJ – Rcl<br />

13.200/GO – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – Segunda Seção – j. 08.10.2014 – DJe 14.11.2014).<br />

Essa posição fica em xeque nos casos envolven<strong>do</strong> órgãos colegia<strong>do</strong>s comuns, como ocorreu naquela <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal<br />

Paulista, antes exposta. Vejamos como a jurisprudência superior irá se pronunciar no futuro, especialmente em <strong>de</strong>mandas que<br />

envolvam matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, caso da tutela <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

Partin<strong>do</strong> para o último exemplo a respeito <strong>do</strong>s danos sociais, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2016, merece <strong>de</strong>staque <strong>de</strong>cisum <strong>do</strong> STJ que con<strong>de</strong>nou<br />

empresa <strong>de</strong> cigarro por publicida<strong>de</strong> abusiva dirigida ao público infantojuvenil. O julga<strong>do</strong> faz menção a danos morais coletivos,<br />

quan<strong>do</strong> na verda<strong>de</strong> trata <strong>de</strong> danos sociais ou difusos, pois os valores da con<strong>de</strong>nação são direciona<strong>do</strong>s ao fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong>s<br />

direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral. Lamenta-se a redução <strong>do</strong> quantum <strong>de</strong>beatur, <strong>de</strong> R$ 14.000.000,00 – conforme<br />

con<strong>de</strong>nação no TJDF –, para apenas R$ 500.000,00.<br />

Conforme a ementa, “os fatos que ensejaram a presente <strong>de</strong>manda ocorreram anteriormente à edição e vigência da Lei nº<br />

10.167/2000 que proibiu, <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>finitiva, propaganda <strong>de</strong> cigarro por rádio e televisão. Com efeito, quan<strong>do</strong> da veiculação da<br />

propaganda vigorava a Lei nº 9.294/96, cuja redação original restringia entre 21h00 e 06h00 a publicida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produto. O texto<br />

legal prescrevia, ainda, que a publicida<strong>de</strong> <strong>de</strong>veria ser ajustada a princípios básicos, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong>, portanto, ser dirigida a crianças<br />

ou a<strong>do</strong>lescentes nem conter a informação ou sugestão <strong>de</strong> que o produto pu<strong>de</strong>sse trazer bem-estar ou benefício à saú<strong>de</strong> <strong>do</strong>s seus<br />

consumi<strong>do</strong>res. Isso consta <strong>do</strong>s incisos II e VI <strong>do</strong> § 1º, art. 3º da referida lei. (…). A teor <strong>do</strong>s artigos 36 e 37, <strong>do</strong> CDC, nítida a<br />

ilicitu<strong>de</strong> da propaganda veiculada. A uma, porque feriu o princípio da i<strong>de</strong>ntificação da publicida<strong>de</strong>. A duas, porque revelou-se<br />

enganosa, induzin<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r a erro porquanto se a<strong>do</strong>tasse a conduta indicada pela publicida<strong>de</strong>, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte das<br />

consequências, teria condições <strong>de</strong> obter sucesso em sua vida. Além disso, a modificação <strong>do</strong> entendimento lança<strong>do</strong> no v. acórdão<br />

recorri<strong>do</strong>, o qual concluiu, após realização <strong>de</strong> contun<strong>de</strong>nte lau<strong>do</strong> pericial, pela caracterização <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> enganosa e, por<br />

conseguinte, i<strong>de</strong>ntificou a responsabilida<strong>de</strong> da ora recorrente pelos danos suporta<strong>do</strong>s pela coletivida<strong>de</strong>, sem dúvida <strong>de</strong>mandaria a<br />

exegese <strong>do</strong> acervo fático-probatório <strong>do</strong>s autos, o que é veda<strong>do</strong> pelas Súmulas 5 e 7 <strong>do</strong> STJ. Em razão da inexistência <strong>de</strong> uma<br />

mensagem clara, direta que pu<strong>de</strong>sse conferir ao consumi<strong>do</strong>r a sua i<strong>de</strong>ntificação imediata (no momento da exposição) e fácil (sem<br />

esforço ou capacitação técnica), reputa-se que a publicida<strong>de</strong> ora em <strong>de</strong>bate, <strong>de</strong> fato, malferiu a redação <strong>do</strong> art. 36, <strong>do</strong> CDC e,<br />

portanto, cabível e <strong>de</strong>vida a reparação <strong>do</strong>s danos morais coletivos. (…)” (STJ – REsp 1.101.949/DF – Quarta Turma – Rel. Min.<br />

Marco Buzzi – j. 10.05.2016 – DJe 30.05.2016).


Pois bem, por tu<strong>do</strong> o que foi exposto, com intuito didático, é possível elaborar a seguinte tabela comparativa entre as últimas<br />

categorias <strong>de</strong>monstradas:<br />

Danos morais coletivos<br />

Atingem vários direitos da personalida<strong>de</strong>.<br />

<strong>Direito</strong>s individuais homogêneos ou coletivos em senti<strong>do</strong><br />

estrito – vítimas <strong>de</strong>terminadas ou <strong>de</strong>termináveis.<br />

In<strong>de</strong>nização é <strong>de</strong>stinada para as próprias vítimas.<br />

Danos sociais ou difusos<br />

Causam um rebaixamento no nível <strong>de</strong> vida da<br />

coletivida<strong>de</strong> (Junqueira).<br />

<strong>Direito</strong>s difusos – vítimas in<strong>de</strong>terminadas. Toda a<br />

socieda<strong>de</strong> é vítima da conduta.<br />

In<strong>de</strong>nização para um fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> proteção ou instituição <strong>de</strong><br />

carida<strong>de</strong>.<br />

Esclareça-se que não há qualquer óbice para a cumulação <strong>do</strong>s danos morais coletivos e <strong>do</strong>s danos sociais ou difusos em uma<br />

mesma ação. Isso foi reconheci<strong>do</strong> pela Quarta Turma <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, no julgamento <strong>do</strong> Recurso Especial<br />

1.293.606/MG, em setembro <strong>de</strong> 2014. Conforme o Relator Ministro Luis Felipe Salomão, “as tutelas pleiteadas em ações civis<br />

públicas não são necessariamente puras e estanques. Não é preciso que se peça, <strong>de</strong> cada vez, uma tutela referente a direito<br />

individual homogêneo, em outra ação uma <strong>de</strong> direitos coletivos em senti<strong>do</strong> estrito e, em outra, uma <strong>de</strong> direitos difusos,<br />

notadamente em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> ação manejada pelo Ministério Público, que <strong>de</strong>tém legitimida<strong>de</strong> ampla no processo coletivo. Isso<br />

porque, embora <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> direito não possa pertencer, a um só tempo, a mais <strong>de</strong> uma categoria, isso não implica dizer que, no<br />

mesmo cenário fático ou jurídico conflituoso, violações simultâneas <strong>de</strong> direitos <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> uma espécie não possam ocorrer”.<br />

Sem prejuízo <strong>do</strong>s danos materiais, estéticos, morais individuas, morais coletivos e difusos, tem se sustenta<strong>do</strong>, na esfera das<br />

relações <strong>de</strong> consumo, a reparação <strong>do</strong> dano por perda <strong>de</strong> uma chance, categoria amplamente aceita pela <strong>do</strong>utrina e pela<br />

jurisprudência. Entre os estudiosos, <strong>de</strong>stacam-se os trabalhos <strong>do</strong>s jovens juristas Sérgio Savi,44 Rafael Peteffi da Silva 45 e <strong>Daniel</strong><br />

Carnaúba. 46<br />

A perda <strong>de</strong> uma chance está caracterizada quan<strong>do</strong> a pessoa vê frustrada uma expectativa, uma oportunida<strong>de</strong> futura, que, <strong>de</strong>ntro<br />

da lógica <strong>do</strong> razoável, ocorreria se as coisas seguissem o seu curso normal. A partir <strong>de</strong>ssa i<strong>de</strong>ia, como expõem os juristas cita<strong>do</strong>s,<br />

essa chance <strong>de</strong>ve ser séria e real. Buscan<strong>do</strong> critérios objetivos para a aplicação da teoria, Sérgio Savi leciona que a perda da chance<br />

estará caracterizada quan<strong>do</strong> a probabilida<strong>de</strong> da oportunida<strong>de</strong> for superior a 50% (cinquenta por cento). 47 Na V Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong><br />

Civil, evento realiza<strong>do</strong> pelo Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral e pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça em 2011, foi aprova<strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>utrinário apresentan<strong>do</strong> a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> chance séria e real, mas rejeitan<strong>do</strong> a utilização <strong>de</strong> percentuais. Vejamos o Enuncia<strong>do</strong> n. 444,<br />

proposto por Rafael Peteffi: “A responsabilida<strong>de</strong> civil pela perda <strong>de</strong> chance não se limita à categoria <strong>de</strong> danos extrapatrimoniais,<br />

pois, conforme as circunstâncias <strong>do</strong> caso concreto, a chance perdida po<strong>de</strong> apresentar também a natureza jurídica <strong>de</strong> dano<br />

patrimonial. A chance <strong>de</strong>ve ser séria e real, não fican<strong>do</strong> adstrita a percentuais apriorísticos”.<br />

A ilustrar a prática, na ótica consumerista, o Tribunal <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul responsabilizou um hospital por morte <strong>de</strong> recémnasci<strong>do</strong>,<br />

haven<strong>do</strong> a perda <strong>de</strong> chance <strong>de</strong> viver (TJRS – Processo 70013036678, Caxias <strong>do</strong> Sul – Décima Câmara Cível – Juiz Rel.<br />

Luiz Ary Vessini <strong>de</strong> Lima – j. 22.12.2005). Fala-se ainda em perda <strong>de</strong> chance <strong>de</strong> cura <strong>do</strong> paciente, pelo emprego <strong>de</strong> uma técnica<br />

malsucedida pelo profissional da área <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>.48 Do Tribunal Paranaense, enceran<strong>do</strong> exemplo da última hipótese:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Hospital. Paciente interna<strong>do</strong> em esta<strong>do</strong> grave, vítima <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>nte vascular cerebral, cujo quadro exigia<br />

intervenção cirúrgica imediata. Não realização <strong>do</strong> procedimento por questões financeiras. culpa caracterizada. Responsabilida<strong>de</strong><br />

objetiva. Falha na prestação <strong>do</strong>s serviços. In<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>vida. Pensão mensal. Danos morais. Fixação equitativa. Culpa da<br />

emprega<strong>do</strong>ra não <strong>de</strong>monstrada. Improcedência <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> em face <strong>de</strong>la. Recurso parcialmente provi<strong>do</strong>. 1. Patenteada está a conduta<br />

culposa <strong>do</strong> requeri<strong>do</strong>, enseja<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar, pois, inobstante a indicação imediata <strong>de</strong> cirurgia, em paciente que se<br />

encontrava interna<strong>do</strong> em suas <strong>de</strong>pendências, vítima <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>nte vascular cerebral, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> realizá-la, motiva<strong>do</strong>, exclusivamente,<br />

pela impossibilida<strong>de</strong> econômica da família em custeá-la, sequer oferecen<strong>do</strong>-lhe a opção <strong>de</strong> fazê-la <strong>de</strong> forma gratuita, pela<br />

beneficência. 2. Se não está em discussão a conduta <strong>de</strong>sempenhada pelo médico, no exercício <strong>de</strong> seu mister, mas sim a intervenção<br />

direta <strong>do</strong> hospital nos serviços presta<strong>do</strong>s ao paciente, que não o foram a contento, caracteriza<strong>do</strong> está o <strong>de</strong>feito na prestação <strong>do</strong>s<br />

serviços pelo hospital, incidin<strong>do</strong>, na espécie, a responsabilida<strong>de</strong> objetiva, ex vi <strong>do</strong> art. 14, caput, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. 3. Se o ato ilícito subtraiu da vítima a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reverter a gravida<strong>de</strong> <strong>do</strong> quadro que se instalara e, com isso, a<br />

probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> salvaguarda <strong>de</strong> sua vida, ainda que com eventuais sequelas, perfeitamente cabível a aplicação da teoria da perda da<br />

chance, para se acolher o pleito in<strong>de</strong>nizatório em razão <strong>do</strong> óbito. 4. Devida é a pensão mensal à esposa, pela morte <strong>de</strong> seu mari<strong>do</strong>, a<br />

vigorar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o evento, até quan<strong>do</strong> completaria 70 (setenta) anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, no importe <strong>de</strong> 2/3 <strong>do</strong> último rendimento percebi<strong>do</strong> à<br />

época, anota<strong>do</strong> em sua CTPS, com constituição <strong>de</strong> capital que assegure o cabal cumprimento da obrigação. 5. A fixação <strong>do</strong><br />

montante <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> a título <strong>de</strong> dano moral fica ao pru<strong>de</strong>nte arbítrio <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> pesar, nestas circunstâncias, a gravida<strong>de</strong> e


duração da lesão, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem <strong>de</strong>ve reparar o dano e as condições <strong>do</strong> ofendi<strong>do</strong>, cumprin<strong>do</strong> levar em conta que a<br />

reparação não <strong>de</strong>ve gerar o enriquecimento ilícito, constituin<strong>do</strong>, ainda, sanção apta a coibir atos da mesma espécie” (TJPR –<br />

Apelação Cível 0604589-4, Londrina – Décima Câmara Cível – Rel. Juiz Convoca<strong>do</strong> Vitor Roberto Silva – DJPR 25.03.2010, p.<br />

204).<br />

Em outro campo, o Tribunal Gaúcho responsabilizou um curso preparatório para concursos públicos que assumiu o<br />

compromisso <strong>de</strong> transportar o aluno até o local da prova. Porém, houve atraso no transporte, o que gerou a perda da chance <strong>de</strong><br />

disputa em concurso público, exsurgin<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar (TJRS – Processo 71000889238, Cruz Alta – Segunda Turma<br />

Recursal Cível – Juiz Rel. Clovis Moacyr Mattana Ramos – j. 07.06.2006).<br />

Do ano <strong>de</strong> 2012, colaciona-se acórdão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que con<strong>de</strong>nou re<strong>de</strong> <strong>de</strong> supermerca<strong>do</strong>s pela frustração <strong>de</strong><br />

consumi<strong>do</strong>ra em receber um prêmio <strong>de</strong> uma promoção publicitária (Informativo n. 495 <strong>do</strong> STJ):<br />

“Danos materiais. Promoção publicitária <strong>de</strong> supermerca<strong>do</strong>. Sorteio <strong>de</strong> casa. Teoria da perda <strong>de</strong> uma chance. A Turma, ao acolher os<br />

embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração com efeitos modificativos, <strong>de</strong>u provimento ao agravo e, <strong>de</strong> logo, julgou parcialmente provi<strong>do</strong> o recurso<br />

especial para con<strong>de</strong>nar o recorri<strong>do</strong> (supermerca<strong>do</strong>) ao pagamento <strong>de</strong> danos materiais à recorrente (consumi<strong>do</strong>ra), em razão da perda<br />

<strong>de</strong> uma chance, uma vez que não lhe foi oportunizada a participação em um segun<strong>do</strong> sorteio <strong>de</strong> uma promoção publicitária<br />

veiculada pelo estabelecimento comercial no qual concorreria ao recebimento <strong>de</strong> uma casa. Na espécie, a promoção publicitária <strong>do</strong><br />

supermerca<strong>do</strong> oferecia aos concorrentes novecentos vales-compras <strong>de</strong> R$ 100,00 e trinta casas. A recorrente foi sorteada e, ao<br />

buscar seu prêmio – o vale-compra –, teve conhecimento <strong>de</strong> que, segun<strong>do</strong> o regulamento, as casas seriam sorteadas àqueles que<br />

tivessem si<strong>do</strong> premia<strong>do</strong>s com os novecentos vales-compras. Ocorre que o segun<strong>do</strong> sorteio já tinha si<strong>do</strong> realiza<strong>do</strong> sem a sua<br />

participação, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> as trinta casas sorteadas entre os <strong>de</strong>mais participantes. De início, afastou a Min. Relatora a reparação por<br />

dano moral sob o entendimento <strong>de</strong> que não houve publicida<strong>de</strong> enganosa. Segun<strong>do</strong> afirmou, estava claro no bilhete <strong>do</strong> sorteio que<br />

seriam sortea<strong>do</strong>s 930 ganha<strong>do</strong>res – novecentos receberiam vales-compra no valor <strong>de</strong> R$ 100,00 e outros trinta, casas na importância<br />

<strong>de</strong> R$ 40.000,00, a ser <strong>de</strong>posita<strong>do</strong> em ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança. Por sua vez, reputou <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> o ressarcimento pelo dano material,<br />

caracteriza<strong>do</strong> pela perda da chance da recorrente <strong>de</strong> concorrer entre os novecentos participantes a uma das trinta casas em disputa. O<br />

acórdão reconheceu o fato incontroverso <strong>de</strong> que a recorrente não foi comunicada pelos promotores <strong>do</strong> evento e sequer recebeu o<br />

bilhete para participar <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> sorteio, portanto ficou impedida <strong>de</strong> concorrer, efetivamente, a uma das trinta casas. Conclui-se,<br />

assim, que a reparação <strong>de</strong>ste dano material <strong>de</strong>ve correspon<strong>de</strong>r ao pagamento <strong>do</strong> valor <strong>de</strong> 1/30 <strong>do</strong> prêmio, ou seja, 1/30 <strong>de</strong> R$<br />

40.000,00, corrigi<strong>do</strong>s à época <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> sorteio” (STJ – EDcl no AgRg no Ag 1.196.957/DF – Rel. Min. Maria Isabel Gallotti – j.<br />

10.04.2012).<br />

Apesar <strong>de</strong> não envolver, a priori, uma relação <strong>de</strong> consumo, cumpre <strong>de</strong>stacar o acórdão mais comenta<strong>do</strong> a respeito <strong>do</strong> tema,<br />

qual seja, aquele pronuncia<strong>do</strong> pelo STJ em conheci<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> envolven<strong>do</strong> o programa Show <strong>do</strong> Milhão, <strong>do</strong> SBT. Uma participante<br />

<strong>do</strong> programa, originária <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> da Bahia, chegou à última pergunta, a “pergunta <strong>do</strong> milhão”, que, se respondida corretamente,<br />

geraria o prêmio <strong>de</strong> um milhão <strong>de</strong> reais. A pergunta então formulada foi a seguinte: “A Constituição reconhece direitos <strong>do</strong>s índios<br />

<strong>de</strong> quanto <strong>do</strong> território brasileiro? 1) 22%; 2) 2%; 3) 4% ou 4) 10%”.<br />

A participante não soube respon<strong>de</strong>r à pergunta, levan<strong>do</strong> R$ 500 mil para casa. Mas, na verda<strong>de</strong>, a Constituição Fe<strong>de</strong>ral não<br />

consagra tal reserva, ten<strong>do</strong> a participante constata<strong>do</strong> que a pergunta formulada estava totalmente errada. Foi então a juízo<br />

requeren<strong>do</strong> os outros R$ 500 mil, ten<strong>do</strong> obti<strong>do</strong> êxito em primeira e segunda instâncias, ação que teve curso no Tribunal <strong>de</strong> Justiça<br />

da Bahia. O STJ confirmou em parte as <strong>de</strong>cisões anteriores, reduzin<strong>do</strong> o valor para R$ 125 mil, ou seja, os R$ 500 mil dividi<strong>do</strong>s<br />

pelas quatro assertivas, sen<strong>do</strong> essa a sua real chance <strong>de</strong> acerto (STJ – REsp 788.459/BA – Quarta Turma – Rel. Min. Fernan<strong>do</strong><br />

Gonçalves – j. 08.11.2005 – DJ 13.03.2006, p. 334).<br />

Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, este autor vê com ressalvas o enquadramento da perda <strong>de</strong> uma chance como nova categoria <strong>de</strong> dano.<br />

Isso porque tais danos são, na gran<strong>de</strong> maioria das situações, prejuízos hipotéticos ou eventuais, sen<strong>do</strong> certo que o sistema <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> civil brasileiro exige o dano presente e efetivo, o que po<strong>de</strong> ser retira<strong>do</strong> <strong>do</strong>s arts. 403 e 186 <strong>do</strong> Código Civil. A<br />

perda <strong>de</strong> uma chance, na verda<strong>de</strong>, trabalha com suposições, com o se. Além disso, as situações <strong>de</strong>scritas pelos a<strong>de</strong>ptos da teoria<br />

po<strong>de</strong>m ser resolvidas em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> danos materiais e morais, sem que a vítima tenha necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> provar que a chance é séria e<br />

real, o que é funda<strong>do</strong> em mera probabilida<strong>de</strong>. Ressalte-se, todavia, que o presente autor está acompanhan<strong>do</strong> as manifestações<br />

<strong>do</strong>utrinárias e jurispru<strong>de</strong>nciais e, no futuro, po<strong>de</strong> ser que esse parecer seja altera<strong>do</strong>…<br />

Não obstante tal entrave, na prática brasileira tem-se percebi<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>s totalmente <strong>de</strong>scabi<strong>do</strong>s <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização com base na<br />

festejada teoria. A título <strong>de</strong> exemplo, colaciona-se a <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> São Paulo na Apelação Cível 512.944.4/0-<br />

00, julgada em 4 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 2008 pela 4 a Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, e que teve como relator o Des. Francisco Loureiro. Na<br />

<strong>de</strong>manda, um consumi<strong>do</strong>r pleiteava in<strong>de</strong>nização da Coca-Cola por não ter consegui<strong>do</strong> participar <strong>de</strong> promoção que po<strong>de</strong>ria levá-lo<br />

para a Copa <strong>do</strong> Mun<strong>do</strong> da Alemanha. Pleiteava danos morais por perda <strong>de</strong> uma chance.<br />

O Tribunal, por unanimida<strong>de</strong>, concluiu pela não incidência da teoria, pois as chances eram remotas. Além disso, afastou a


eparação imaterial, pela ausência <strong>de</strong> lesão à personalida<strong>de</strong>. A ementa, com precisão, foi assim elaborada: “Responsabilida<strong>de</strong> civil.<br />

Danos morais. Consumi<strong>do</strong>r que não conseguiu inserir os códigos exigi<strong>do</strong>s pela promoção após efetuar seu cadastro no site<br />

indica<strong>do</strong>. Alegação <strong>de</strong> dano moral in<strong>de</strong>nizável em razão da perda da chance <strong>de</strong> concorrer à viagem para a Alemanha e assistir à<br />

Copa <strong>do</strong> Mun<strong>do</strong>. Inexistência <strong>de</strong> danos morais, por ausência <strong>de</strong> violação a direitos da personalida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> sofrimento apreciável.<br />

Impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se in<strong>de</strong>nizar danos hipotéticos ou eventuais, se não mensurável economicamente a chance perdida. Ação<br />

improce<strong>de</strong>nte. Recurso improvi<strong>do</strong>”. Ora, <strong>de</strong>mandas como a exposta, fundadas em pedi<strong>do</strong>s <strong>de</strong>scabi<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>vem ser rejeitadas <strong>de</strong><br />

plano pelo Po<strong>de</strong>r Judiciário, pois revelam intenções mesquinhas e egoísticas.<br />

Superada a análise <strong>do</strong>s danos reparáveis na órbita das relações <strong>de</strong> consumo, o princípio da reparação integral <strong>de</strong> danos gera a<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res como regra das relações <strong>de</strong> consumo. Consigne-se que essa<br />

responsabilida<strong>de</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> culpa visa à facilitação das <strong>de</strong>mandas em prol <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, representan<strong>do</strong> um<br />

aspecto material <strong>do</strong> acesso à justiça. A responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res ou presta<strong>do</strong>res beneficia tanto o consumi<strong>do</strong>r<br />

padrão (stan<strong>de</strong>r) quanto o consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> (bystan<strong>de</strong>r). Em um senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> ampliação, o art. 17 da Lei 8.078/1990<br />

consi<strong>de</strong>ra consumi<strong>do</strong>r qualquer vítima da relação <strong>de</strong> consumo, o que faz com que a gran<strong>de</strong> maioria das relações <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> seja enquadrada no contexto <strong>do</strong> Código Consumerista. To<strong>do</strong>s esses aspectos relativos ao <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar serão<br />

aprofunda<strong>do</strong>s no Capítulo 4 <strong>de</strong>sta obra.<br />

Outro aspecto que apresenta estreita ligação com a reparação integral é a regra da solidarieda<strong>de</strong> retirada da responsabilida<strong>de</strong><br />

consumerista. Enuncia o art. 7º, parágrafo único, da Lei 8.078/1990 que, “Ten<strong>do</strong> mais <strong>de</strong> um autor a ofensa, to<strong>do</strong>s respon<strong>de</strong>rão<br />

solidariamente pela reparação <strong>do</strong>s danos previstos nas normas <strong>de</strong> consumo”. Como se extrai da melhor <strong>do</strong>utrina <strong>de</strong> Claudia Lima<br />

Marques, Antonio Herman Benjamin e Bruno Miragem, “O parágrafo único <strong>do</strong> art. 7º traz a regra geral sobre a solidarieda<strong>de</strong> da<br />

ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos e serviços”.49 O tema, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, será aborda<strong>do</strong> no Capítulo 4 <strong>de</strong>ste livro.<br />

Por <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iro, é interessante apontar que, para alguns <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res, o Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r a<strong>do</strong>tou também o princípio da<br />

segurança, que geraria justamente a responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res, afastan<strong>do</strong>-se a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prova<br />

<strong>do</strong> elemento culpa. 50 Com to<strong>do</strong> o respeito, parece-nos que tal conclusão po<strong>de</strong> ser retirada <strong>do</strong> princípio da reparação integral <strong>do</strong>s<br />

danos, que justifica to<strong>do</strong> o sistema <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pela norma consumerista. Desse mo<strong>do</strong>, não haveria<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se criar um regramento diferente <strong>do</strong> que aqui foi exposto.<br />

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MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo:<br />

RT, 2004. p. 24-52.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 30.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 30.<br />

Tal posicionamento <strong>do</strong> jurista po<strong>de</strong> ser encontra<strong>do</strong> em: CUNHA, Wladimir Alcebía<strong>de</strong>s Marinho Falcão. Revisão judicial <strong>do</strong>s contratos. Do<br />

CDC ao Código Civil <strong>de</strong> 2002. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2007.<br />

FACHIN, Luiz Edson. Novo Código Civil brasileiro e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r: um approach <strong>de</strong> suas relações jurídicas. In:<br />

MONTEIRO, António Pinto (dir.). Estu<strong>do</strong>s <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, n. 7. Coimbra: Centro <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> Consumo, 2005. p. 111.<br />

Sobre a visão clássica <strong>do</strong>s princípios, veja: LIMONGI FRANÇA, Rubens. Princípios gerais <strong>de</strong> direito. Atual. Antonio S. Limongi França e<br />

<strong>Flávio</strong> <strong>Tartuce</strong>. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. Sobre a força constitucional <strong>do</strong>s princípios jurídicos: BONAVIDES, Paulo. Curso <strong>de</strong> direito<br />

constitucional. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 275.<br />

REALE, Miguel. Lições preliminares <strong>de</strong> direito. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 299.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 141.<br />

Essa necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inclusão na gra<strong>de</strong> <strong>do</strong>s cursos superiores <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> é observada muito bem por Claudia Lima Marques (Manual <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 46-49).<br />

FINGER, Julio Cesar. O Ministério Público Pós-88 e a efetivação <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> Democrático <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>: po<strong>de</strong>mos comemorar? In: RIBEIRO,<br />

Carlos Vinicius Alves (org.). Ministério Público. Reflexões sobre princípios e funções institucionais. São Paulo: Atlas, 2010. p. 88.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 94.<br />

BITTAR, Carlos Alberto. <strong>Direito</strong>s <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 5. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 2002. p. 2.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 120.<br />

ALPA, Gui<strong>do</strong>. Il diritto <strong>de</strong>i consumatori. Roma: Laterza, 2002. p. 23.


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Nesse senti<strong>do</strong>, por to<strong>do</strong>s: LISBOA, Roberto Senise. Responsabilida<strong>de</strong> civil nas relações <strong>de</strong> consumo. São Paulo: RT, 2001. p. 85.<br />

Construção inspirada em: GRAU, Eros Roberto. O <strong>Direito</strong> Posto e o <strong>Direito</strong> Pressuposto. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.<br />

LISBOA, Roberto Senise. Responsabilida<strong>de</strong> civil nas relações <strong>de</strong> consumo, cit., p. 90. No mesmo senti<strong>do</strong>, anotam Nelson Nery Jr. e Rosa<br />

Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery (Código Civil comenta<strong>do</strong> e legislação extravagante. 3. ed. São Paulo: RT, 2005. p. 957).<br />

Como bem aponta Claudia Lima Marques, “existem três tipos <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong>: a técnica, a jurídica, a fática. E um quarto tipo <strong>de</strong><br />

vulnerabilida<strong>de</strong> básica ou intrínseca <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, a informacional” (MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.;<br />

BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 88).<br />

MENEZES CORDEIRO, António Manuel da Rocha e. A boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2001. p. 212.<br />

MENEZES CORDEIRO, António Manuel da Rocha e. A boa-fé no direito civil, cit., p. 224.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman <strong>de</strong> V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed.<br />

São Paulo: RT, 2010. p. 124.<br />

Sobre o tema da boa-fé objetiva e <strong>do</strong>s <strong>de</strong>veres anexos, por to<strong>do</strong>s: MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito priva<strong>do</strong>. São Paulo: RT,<br />

1999.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman <strong>de</strong> V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed.<br />

São Paulo: RT, 2010. p. 125.<br />

MARQUES, Claudia Lima Marques; BENJAMIM, Antônio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 125.<br />

VALLESPINOS, Carlos Gustavo. Contratos. Presupuestos. Cór<strong>do</strong>ba: Advocatus, Sala <strong>de</strong> Derecho Civil, Colégio <strong>de</strong> Aboga<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Cór<strong>do</strong>ba,<br />

1999. p. 45.<br />

BITTAR, Carlos Alberto. <strong>Direito</strong>s <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, cit., p. 50.<br />

APARICIO, Juan Manuel. Contratos: presupuestos, cit., p. 115.<br />

MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 5. ed. São Paulo: RT, 2006. p. 594.<br />

LORENZETTI, Ricar<strong>do</strong> Luis. Fundamentos <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>. Trad. Vera Jacob Fra<strong>de</strong>ra. São Paulo: RT, 1998. p. 511.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini; BENJAMIN, Antonio Herman <strong>de</strong> Vasconcellos e. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos<br />

autores <strong>do</strong> anteprojeto. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 6.<br />

Veja-se o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> tal conceito em: TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. <strong>Direito</strong> Civil. Teoria geral <strong>do</strong>s contratos e contratos em espécie. 6. ed.<br />

São Paulo: GEN/Méto<strong>do</strong>, 2011. vol. 3; TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. Função social <strong>do</strong>s contratos. Do Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r ao Código<br />

Civil <strong>de</strong> 2002. 2. ed. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2010.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 912.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 64.<br />

Sobre o tema, veja-se: PENTEADO, Luciano <strong>de</strong> Camargo. Efeitos contratuais perante terceiros. São Paulo: Quartier Latin, 2007.<br />

No mesmo senti<strong>do</strong>: MORAIS, Ezequiel. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r Comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2011. p. 234.<br />

Os juristas apontam que existe no art. 51 <strong>do</strong> CDC uma finalida<strong>de</strong> educativa, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> estar presentes nos contratos <strong>de</strong> consumo os<br />

<strong>de</strong>veres <strong>de</strong> clareza na redação e <strong>de</strong>staque. Mais adiante, os juristas reconhecem o “diálogo sistemático <strong>de</strong> coerência” entre o Código<br />

Civil e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, eis que “no CC/2002 a autonomia da vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong>s civis e <strong>do</strong>s empresários nas relações<br />

entre eles também conhece como limite a função social <strong>do</strong> contrato (art. 421), a conduta conforme a boa-fé e a probida<strong>de</strong> (art. 422)<br />

e a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> abuso <strong>do</strong> direito (art. 187)” (MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 623).<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 942.<br />

ALVES, Jones Figueirê<strong>do</strong>. A teoria <strong>do</strong> adimplemento substancial. In: DELGADO, Mário Luiz; ALVES, Jones Figueirê<strong>do</strong>. Questões<br />

controvertidas no novo Código Civil. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2005. vol. 4; BUSSATTA, Eduar<strong>do</strong>. Resolução <strong>do</strong>s contratos e teoria <strong>do</strong><br />

adimplemento substancial. São Paulo: Saraiva, 2007.<br />

CHINÉ, Giuseppe; FRATINI, Marco; ZOPPINI, Andrea. Manuale di Diritto Civile. Roma: Nel Diritto, IV Edizioni, 2013, p. 1369; citan<strong>do</strong> a<br />

Decisão n. 6463, da Corte <strong>de</strong> Cassação Italiana, prolatada em 11 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 2008.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIM, Antonio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 148.<br />

Sobre o tema: NISHIYAMA, A<strong>do</strong>lfo Mamoru. A proteção constitucional <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 229-238.<br />

AZEVEDO, Antonio Junqueira <strong>de</strong>. Por uma nova categoria <strong>de</strong> dano na responsabilida<strong>de</strong> civil: o dano social. In: FILOMENO, José Geral<strong>do</strong><br />

Brito; WAGNER JÚNIOR, Luiz Guilherme da Costa; GONÇALVES, Renato Afonso (Coord.). O Código Civil e sua interdisciplinarida<strong>de</strong>. Belo<br />

Horizonte: Del Rey, 2004. p. 376.


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50<br />

AZEVEDO, Antonio Junqueira <strong>de</strong>. Por uma nova categoria <strong>de</strong> dano na responsabilida<strong>de</strong> civil: o dano social. In: FILOMENO, José Geral<strong>do</strong><br />

Brito; WAGNER JÚNIOR, Luiz Guilherme da Costa; GONÇALVES, Renato Afonso (Coord.). O Código Civil e sua interdisciplinarida<strong>de</strong>. Belo<br />

Horizonte: Del Rey, 2004. p. 376.<br />

SAVI, Sérgio. Responsabilida<strong>de</strong> civil por perda <strong>de</strong> uma chance. São Paulo: Atlas, 2006.<br />

SILVA, Rafael Peteffi da. Responsabilida<strong>de</strong> civil pela perda <strong>de</strong> uma chance. São Paulo: Atlas, 2007.<br />

CARNAÚBA, <strong>Daniel</strong>. Responsabilida<strong>de</strong> civil pela perda <strong>de</strong> uma chance. A álea e a técnica. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2013.<br />

SAVI, Sérgio. Responsabilida<strong>de</strong> civil por perda <strong>de</strong> uma chance. São Paulo: Atlas, 2006. p. 33.<br />

Sobre o tema: ROSÁRIA, Grácia Cristina Moreira <strong>do</strong>. Perda da chance <strong>de</strong> cura na responsabilida<strong>de</strong> civil médica. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen<br />

Juris, 2009.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIM, Antônio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 314.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, discorren<strong>do</strong> sobre tal princípio: CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Atlas, 2008. p.<br />

43.


ELEMENTOS DA RELAÇÃO JURÍDICA DE<br />

CONSUMO<br />

Sumário: 3.1. A estrutura da relação jurídica <strong>de</strong> consumo. Visão geral – 3.2. Os elementos subjetivos da relação <strong>de</strong><br />

consumo: 3.2.1. O fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos e o presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços. O conceito <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>; 3.2.2. O<br />

consumi<strong>do</strong>r. Teorias existentes. O consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> ou bystan<strong>de</strong>r – 3.3. Elementos objetivos da relação <strong>de</strong><br />

consumo: 3.3.1. Produto; 3.3.2. Serviço – 3.4. Exemplos <strong>de</strong> outras relações jurídicas contemporâneas e o seu<br />

enquadramento como relações <strong>de</strong> consumo: 3.4.1. O contrato <strong>de</strong> transporte e a incidência <strong>do</strong> Código <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r; 3.4.2. Os serviços públicos e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r; 3.4.3. O con<strong>do</strong>mínio edilício e o<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r; 3.4.4. A incidência <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r para os contratos <strong>de</strong> locação<br />

urbana; 3.4.5. A Lei 8.078/1990 e a previdência privada complementar; 3.4.6. Prestação <strong>de</strong> serviços educacionais<br />

como serviço <strong>de</strong> consumo; 3.4.7. As ativida<strong>de</strong>s notariais e registrais e a Lei 8.078/1990; 3.4.8. As relações entre<br />

advoga<strong>do</strong>s e clientes e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

3.1.<br />

A ESTRUTURA DA RELAÇÃO JURÍDICA DE CONSUMO. VISÃO GERAL<br />

Para justificar a incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, é preciso estudar a estrutura da relação jurídica <strong>de</strong> consumo,<br />

na perspectiva <strong>de</strong> seus elementos subjetivos e objetivos, ou seja, das partes relacionadas e o seu conteú<strong>do</strong>.<br />

Sobre o tema da relação jurídica em senti<strong>do</strong> amplo, como bem aponta Maria Helena Diniz, citan<strong>do</strong> Del Vecchio, “a relação<br />

jurídica consiste num vínculo entre pessoas, em razão <strong>do</strong> qual uma po<strong>de</strong> preten<strong>de</strong>r um bem a que outra é obrigada. Tal relação só<br />

existirá quan<strong>do</strong> certas ações <strong>do</strong>s sujeitos, que constituem o âmbito pessoal <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminadas normas, forem relevantes no que atina<br />

ao caráter <strong>de</strong>ôntico das normas aplicáveis à situação. Só haverá relação jurídica se o vínculo entre pessoas estiver norma<strong>do</strong>, isto é,<br />

regula<strong>do</strong> por norma jurídica, que tem por escopo protegê-lo”.1 Desse mo<strong>do</strong>, na esteira das lições <strong>do</strong>s juristas, constata-se que são<br />

elementos da relação jurídica, adapta<strong>do</strong>s para a relação <strong>de</strong> consumo: 2<br />

a)<br />

b)<br />

c)<br />

Existência <strong>de</strong> uma relação entre sujeitos jurídicos, substancialmente entre um sujeito ativo – titular <strong>de</strong> um direito – e um sujeito<br />

passivo – que tem um <strong>de</strong>ver jurídico. Na relação <strong>de</strong> consumo, tais elementos são o fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos e o presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços<br />

– <strong>de</strong> um la<strong>do</strong> – e o consumi<strong>do</strong>r – <strong>do</strong> outro la<strong>do</strong>. Na gran<strong>de</strong> maioria das vezes, as partes são cre<strong>do</strong>ras e <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>ras entre si, eis que<br />

prevalecem nas relações <strong>de</strong> consumo as hipóteses em que há proporcionalida<strong>de</strong> das prestações (sinalagma). Isso ocorre, por<br />

exemplo, na compra e venda <strong>de</strong> consumo e na prestação <strong>de</strong> serviços, principais situações negociais típicas <strong>de</strong> consumo.<br />

Presença <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>do</strong> sujeito ativo sobre o objeto imediato, que é a prestação, e sobre o objeto mediato da relação, que é o bem<br />

jurídico tutela<strong>do</strong> (coisa, tarefa ou abstenção). Na relação <strong>de</strong> consumo, o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> exigir a entrega <strong>do</strong> produto ou a<br />

prestação <strong>de</strong> serviço, nos termos <strong>do</strong> que foi convenciona<strong>do</strong> e <strong>do</strong> disciplina<strong>do</strong> na Lei Consumerista. Nos termos <strong>do</strong> art. 3º <strong>do</strong> CDC,<br />

constata-se que os elementos objetivos, que formam a prestação da relação <strong>de</strong> consumo, são o produto e o serviço.<br />

Evidência na prática <strong>de</strong> um fato ou acontecimento propulsor, capaz <strong>de</strong> gerar consequências para o plano jurídico. De acor<strong>do</strong> com<br />

Maria Helena Diniz, “po<strong>de</strong> ser um acontecimento, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte ou não da vonta<strong>de</strong> humana, a que a norma jurídica dá a função <strong>de</strong><br />

criar, modificar ou extinguir direitos. É ele que tem o condão <strong>de</strong> vincular os sujeitos e <strong>de</strong> submeter o objeto ao po<strong>de</strong>r da pessoa<br />

concretizan<strong>do</strong> a relação”. 3 No plano <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, esse fato é substancialmente um negócio jurídico, guia<strong>do</strong> pela<br />

autonomia privada, que é o direito que a pessoa tem <strong>de</strong> se autorregulamentar no plano contratual.


Superada essa análise estrutural, que embaralha o direito clássico ao contemporâneo, vejamos, <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>talhada, os<br />

elementos da relação jurídica <strong>de</strong> consumo, retira<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s arts. 2º e 3º da Lei 8.078/1990.<br />

3.2.<br />

3.2.1.<br />

OS ELEMENTOS SUBJETIVOS DA RELAÇÃO DE CONSUMO<br />

O fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos e o presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços. O conceito <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong><br />

A englobar tanto o fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos quanto o presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços, estabelece o art. 3º, caput, da Lei 8.078/1990 que<br />

“Fornece<strong>do</strong>r é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes <strong>de</strong>spersonaliza<strong>do</strong>s,<br />

que <strong>de</strong>senvolvem ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou<br />

comercialização <strong>de</strong> produtos ou prestação <strong>de</strong> serviços”. A palavra fornece<strong>do</strong>r está em senti<strong>do</strong> amplo, a englobar o fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong><br />

produtos – em senti<strong>do</strong> estrito – e o presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços.<br />

Nota-se que o dispositivo amplia <strong>de</strong> forma consi<strong>de</strong>rável o número das pessoas que po<strong>de</strong>m ser fornece<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> produtos e<br />

presta<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> serviços. Po<strong>de</strong> ela ser uma pessoa natural ou física, caso, por exemplo, <strong>de</strong> um empresário individual que <strong>de</strong>senvolve<br />

uma ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> subsistência. Cite-se a hipótese <strong>de</strong> uma senhora que fabrica chocolates em sua casa e os ven<strong>de</strong> pelas ruas <strong>de</strong> uma<br />

cida<strong>de</strong>, com o intuito <strong>de</strong> lucro direto. Po<strong>de</strong> ainda ser uma pessoa jurídica, o que acontece na gran<strong>de</strong> maioria das vezes com as<br />

empresas que atuam no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo. Enuncia o coman<strong>do</strong> em análise que o fornece<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> ser ainda um ente<br />

<strong>de</strong>spersonaliza<strong>do</strong> ou <strong>de</strong>spersonifica<strong>do</strong>, caso da massa falida, <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> irregular ou <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> fato. Entre os<br />

últimos, Rizzatto Nunes cita o exemplo das pessoas jurídicas <strong>de</strong> fato, caso <strong>de</strong> um camelô.4<br />

A respeito da finalida<strong>de</strong> lucrativa ou não da pessoa jurídica fornece<strong>do</strong>ra, é interessante reproduzir o entendimento <strong>do</strong> Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que “Para o fim <strong>de</strong> aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, o reconhecimento <strong>de</strong> uma<br />

pessoa física ou jurídica ou <strong>de</strong> um entre <strong>de</strong>spersonaliza<strong>do</strong> como fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços aten<strong>de</strong> aos critérios puramente objetivos,<br />

sen<strong>do</strong> irrelevantes a sua natureza jurídica, a espécie <strong>do</strong>s serviços que prestam e até mesmo o fato <strong>de</strong> se tratar <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong><br />

civil, sem fins lucrativos, <strong>de</strong> caráter beneficente e filantrópico, bastan<strong>do</strong> que <strong>de</strong>sempenhem <strong>de</strong>terminada ativida<strong>de</strong> no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

consumo mediante remuneração” (STJ – REsp 519.310/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 20.04.2004). Desse<br />

mo<strong>do</strong>, entida<strong>de</strong>s beneficentes po<strong>de</strong>m perfeitamente ser enquadradas como fornece<strong>do</strong>ras ou presta<strong>do</strong>ras, sem qualquer entrave<br />

material.<br />

Os fornece<strong>do</strong>res ou presta<strong>do</strong>res po<strong>de</strong>m ser pessoas jurídicas <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Público ou <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>. Entre as primeiras,<br />

merecem relevo os serviços públicos que estão abrangi<strong>do</strong>s pelo CDC, inclusive com tratamento específico no seu art. 22, tema que<br />

ainda será aborda<strong>do</strong> no presente capítulo. Entre as últimas, os gran<strong>de</strong>s fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res são empresas privadas, inclusive<br />

com atuação em vários países (empresas multi ou transnacionais). Nesse contexto, a dicção legal estabelece que o fornece<strong>do</strong>r po<strong>de</strong><br />

ser uma pessoa nacional ou estrangeira, sen<strong>do</strong> irrelevante qualquer tipo <strong>de</strong> limitação.<br />

Na verda<strong>de</strong>, o que interessa mesmo na caracterização <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r é o fato <strong>de</strong> ele <strong>de</strong>senvolver uma ativida<strong>de</strong>,<br />

que vem a ser a soma <strong>de</strong> atos coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>s para uma finalida<strong>de</strong> específica, como bem pontua Antonio Junqueira <strong>de</strong> Azeve<strong>do</strong>:<br />

“‘Ativida<strong>de</strong>’, noção pouco trabalhada pela <strong>do</strong>utrina, não é ato, e sim conjunto <strong>de</strong> atos. ‘Ativida<strong>de</strong>’ foi <strong>de</strong>finida por Túlio Ascarelli<br />

como a ‘série <strong>de</strong> atos coor<strong>de</strong>náveis entre si, em relação a uma finalida<strong>de</strong> comum’ (Corso di diritto commerciale. 3. ed. Milano:<br />

Giuffrè, 1962. p. 147). Para que haja ativida<strong>de</strong>, há necessida<strong>de</strong>: (i) <strong>de</strong> uma pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atos; (ii) <strong>de</strong> uma finalida<strong>de</strong> comum que<br />

dirige e coor<strong>de</strong>na os atos; (iii) <strong>de</strong> uma dimensão temporal, já que a ativida<strong>de</strong> necessariamente se prolonga no tempo. A ativida<strong>de</strong>,<br />

ao contrário <strong>do</strong> ato, não possui <strong>de</strong>stinatário específico, mas se dirige ad incertam personam (ao merca<strong>do</strong> ou à coletivida<strong>de</strong>, por<br />

exemplo), e sua apreciação é autônoma em relação aos atos que a compõem”.5<br />

A par <strong>de</strong>ssa construção, se alguém atuar <strong>de</strong> forma isolada, em um ato único, não po<strong>de</strong>rá se enquadrar como fornece<strong>do</strong>r ou<br />

presta<strong>do</strong>r, como na hipótese <strong>de</strong> quem ven<strong>de</strong> bens pela primeira vez, ou esporadicamente, com ou sem o intuito concreto <strong>de</strong> lucro.<br />

Como bem observa José Fernan<strong>do</strong> Simão, há, na relação <strong>de</strong> consumo, o requisito da habitualida<strong>de</strong>, retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong><br />

ativida<strong>de</strong>, sen<strong>do</strong> interessante a ilustração <strong>do</strong> jurista:<br />

“O sujeito que, após anos <strong>de</strong> uso <strong>do</strong> carro, resolve vendê-lo, certamente não será fornece<strong>do</strong>r nos termos <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. Entretanto, se o mesmo sujeito tiver <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> carros em seu nome e habitualmente os ven<strong>de</strong>r ao público, estaremos<br />

diante <strong>de</strong> uma relação <strong>de</strong> consumo e ele será consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r”.6<br />

Pelo mesmo raciocínio, não po<strong>de</strong> ser ti<strong>do</strong> como fornece<strong>do</strong>r aquele que ven<strong>de</strong> esporadicamente uma casa, a fim <strong>de</strong> comprar<br />

outra, para a mudança <strong>de</strong> seu en<strong>de</strong>reço. Do mesmo mo<strong>do</strong>, alguém que ven<strong>de</strong> coisas usadas, <strong>de</strong> forma isolada, visan<strong>do</strong> apenas<br />

<strong>de</strong>sfazer-se <strong>de</strong>las.<br />

Ainda, para a visualização da ativida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, po<strong>de</strong> servir como amparo o art. 966 <strong>do</strong> Código Civil, que aponta os


equisitos para a caracterização <strong>do</strong> empresário, in verbis: “Consi<strong>de</strong>ra-se empresário quem exerce profissionalmente ativida<strong>de</strong><br />

econômica organizada para a produção ou a circulação <strong>de</strong> bens ou <strong>de</strong> serviços.” Na <strong>do</strong>utrina empresarial, merecem atenção os<br />

comentários no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que não se po<strong>de</strong> falar em ativida<strong>de</strong> quan<strong>do</strong> há o ato ocasional <strong>de</strong> alguém, mas, sim, em relação àquele<br />

que atua “<strong>de</strong> mo<strong>do</strong> sazonal ou mesmo periódico, porquanto, neste caso, a regularida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s intervalos temporais permite que se<br />

entreveja configurada a habitualida<strong>de</strong>”. 7 A mesma conclusão serve para a relação <strong>de</strong> consumo, visan<strong>do</strong> a caracterizar o fornece<strong>do</strong>r<br />

<strong>de</strong> produtos ou presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços, em um mais um diálogo <strong>de</strong> complementarida<strong>de</strong> entre o CDC e o CC/2002.<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>, a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvida <strong>de</strong>ve ser tipicamente profissional, com intuito <strong>de</strong> lucro direto ou vantagens<br />

indiretas. 8 A norma <strong>de</strong>screve algumas <strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s, em rol meramente exemplificativo (numerus apertus), eis que a Lei<br />

Consumerista a<strong>do</strong>tou um mo<strong>de</strong>lo aberto como regra <strong>do</strong>s seus preceitos. Vejamos, com as <strong>de</strong>vidas exemplificações:<br />

–<br />

–<br />

–<br />

–<br />

–<br />

–<br />

–<br />

–<br />

Ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produção – caso <strong>do</strong>s fabricantes <strong>de</strong> gêneros alimentícios industrializa<strong>do</strong>s.<br />

Ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> montagem – hipótese das monta<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> automóveis nacionais ou estrangeiras.<br />

Ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> criação – situação <strong>de</strong> um autor <strong>de</strong> obra intelectual que coloca produtos no merca<strong>do</strong>.<br />

Ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> construção – caso <strong>de</strong> uma construtora e incorpora<strong>do</strong>ra imobiliária.<br />

Ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> transformação – comum na panificação das padarias, supermerca<strong>do</strong>s e afins.<br />

Ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> importação – como no caso das empresas que trazem veículos fabrica<strong>do</strong>s em outros países para ven<strong>de</strong>r<br />

no Brasil.<br />

Ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> exportação – caso <strong>de</strong> uma empresa nacional que fabrica calça<strong>do</strong>s e ven<strong>de</strong> seus produtos no exterior.<br />

Ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> distribuição e comercialização – <strong>de</strong> produtos e serviços <strong>de</strong> terceiros ou próprios, <strong>de</strong>senvolvidas, por<br />

exemplo, pelas empresas <strong>de</strong> telefonia e pelas gran<strong>de</strong>s lojas <strong>de</strong> eletro<strong>do</strong>mésticos.<br />

Por fim, em um senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> ampliação ainda maior, a <strong>do</strong>utrina construiu a i<strong>de</strong>ia <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>. A partir da tese <strong>de</strong><br />

Leonar<strong>do</strong> Bessa, tal figura seria um intermediário na relação <strong>de</strong> consumo, com posição <strong>de</strong> auxílio ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong><br />

produtos ou presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços, caso das empresas que mantêm e administram bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.9 A categoria<br />

conta com o apoio da nossa melhor <strong>do</strong>utrina, caso <strong>de</strong> Claudia Lima Marques, que cita o seu exemplo <strong>do</strong> estipulante profissional ou<br />

emprega<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s seguros <strong>de</strong> vida em grupo e leciona:<br />

“A figura <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>, aquele que não é fornece<strong>do</strong>r <strong>do</strong> contrato principal <strong>de</strong> consumo, mas é intermediário, antigo<br />

terceiro, ou estipulante, hoje é o ‘<strong>do</strong>no’ da relação conexa (e principal) <strong>de</strong> consumo, por <strong>de</strong>ter uma posição <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r na relação outra<br />

com o consumi<strong>do</strong>r. É realmente uma interessante teoria, que será muito usada no futuro, amplian<strong>do</strong> – e com justiça – o campo <strong>de</strong><br />

aplicação <strong>do</strong> CDC”. 10<br />

A construção, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, conta com a a<strong>de</strong>são <strong>de</strong>ste autor, sen<strong>do</strong> certo que há <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal Mineiro que<br />

equiparou o órgão que mantém o cadastro à instituição financeira em relação <strong>de</strong> consumo:<br />

“In<strong>de</strong>nização. Fornece<strong>do</strong>r. Contratação <strong>de</strong> empréstimo e financiamento. Frau<strong>de</strong>. Negligência. Injusta negativação. Dano moral.<br />

Montante in<strong>de</strong>nizatório. Razoabilida<strong>de</strong> e proporcionalida<strong>de</strong>. Prequestionamento. Age negligentemente o fornece<strong>do</strong>r, equipara<strong>do</strong> à<br />

instituição financeira, que não prova ter toma<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os cuida<strong>do</strong>s necessários, a fim <strong>de</strong> evitar as possíveis frau<strong>de</strong>s cometidas por<br />

terceiro na contratação <strong>de</strong> empréstimos e financiamentos. (…)” (TJMG – Apelação cível 1.0024.08.958371-0/0021, Belo Horizonte<br />

– Nona Câmara Cível – Rel. Des. José Antônio Braga – j. 03.11.2009 – DJEMG 23.11.2009).<br />

Mais recentemente, na mesma linha, o Tribunal <strong>do</strong> Paraná aplicou o conceito <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> para o agente<br />

financeiro, responsável pelo empréstimo visan<strong>do</strong> à aquisição <strong>do</strong> bem <strong>de</strong> consumo. Do negócio <strong>de</strong>correu a inscrição in<strong>de</strong>vida <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r no cadastro <strong>de</strong> inadimplentes, o que gerou a responsabilização solidária <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is envolvi<strong>do</strong>s na contratação. Nos<br />

termos da ementa: “Aplicação <strong>do</strong> CDC. Fornece<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova. Fatos aduzi<strong>do</strong>s na inicial não refuta<strong>do</strong>s<br />

pela ré. Apelação (2). Agente financeiro. Integrante da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res <strong>do</strong> produto. Mútuo coliga<strong>do</strong> à compra e venda.<br />

Responsabilização solidária pelos danos <strong>de</strong>correntes da relação jurídica comerciante consumi<strong>do</strong>r. Inscrição in<strong>de</strong>vida nos órgãos <strong>de</strong><br />

restrição ao crédito. Dano moral in re ipsa. Prescindibilida<strong>de</strong> da comprovação <strong>do</strong> dano. Cobrança abusiva. Inversão <strong>do</strong> ônus da<br />

prova. Fatos a<strong>de</strong>sivo. Autora. Majoração <strong>do</strong>s danos morais. Pedi<strong>do</strong> não acolhi<strong>do</strong>. Responsabilização autônoma da terceira ré que<br />

aumenta o valor a ser recebi<strong>do</strong> pela autora. Termo inicial <strong>do</strong>s juros <strong>de</strong> mora. Responsabilida<strong>de</strong> contratual. Juros conta<strong>do</strong>s da<br />

citação. Devolução <strong>do</strong> sofá. Impossibilida<strong>de</strong>. Vedação ao enriquecimento sem causa. Parcelas quitadas não foram objeto <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong><br />

inicial. Apelação Cível 1 e Recurso a<strong>de</strong>sivo conheci<strong>do</strong>s e parcialmente provi<strong>do</strong>s. Apelação Cível 2 conhecida e não provida”<br />

(TJPR – Apelação Cível 1284659-8, Londrina – Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Guilherme Freire <strong>de</strong> Barros Teixeira – DJPR<br />

24.02.2015, p. 335).


Do Tribunal Gaúcho, igualmente com conteú<strong>do</strong> interessante e na mesma linha <strong>do</strong> último aresto, foram consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s<br />

fornece<strong>do</strong>res equipara<strong>do</strong>s os <strong>do</strong>is entes relaciona<strong>do</strong>s com o contrato <strong>de</strong> empréstimo <strong>de</strong> dinheiro para funcionários públicos.<br />

Vejamos a sua ementa, com <strong>de</strong>staque especial:<br />

“Recurso inomina<strong>do</strong>. IPERGS. Instituto <strong>de</strong> Previdência <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul. FUSEPE. Fundação <strong>do</strong>s Servi<strong>do</strong>res<br />

Públicos <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul. Pretensão <strong>de</strong> cancelamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconto <strong>de</strong> contribuição associativa e <strong>de</strong>volução em <strong>do</strong>bro<br />

<strong>de</strong> valores in<strong>de</strong>vidamente <strong>de</strong>sconta<strong>do</strong>s. Litisconsórcio passivo necessário. Inocorrência. Prazo para expedição <strong>de</strong> RPV. Lei Estadual<br />

nº 13.756/2011. Sentença reformada em parte. No tocante à preliminar <strong>de</strong> litisconsórcio passivo necessário, para a formação <strong>do</strong> qual<br />

a Lei exige seja ele unitário ou expressamente previsto, vislumbra-se evi<strong>de</strong>nte que a relação jurídica discutida não se enquadra em<br />

nenhuma <strong>de</strong>ssas hipóteses, na medida em que a parte <strong>de</strong>mandante sofria <strong>de</strong>scontos <strong>de</strong> valores que eram repassa<strong>do</strong>s pelo IPERGS à<br />

FUSEPE, a título <strong>de</strong> contribuição para a manutenção da qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> associa<strong>do</strong>, condição necessária para a fruição <strong>do</strong> empréstimo<br />

bancário que a referida fundação intermediava para os seus associa<strong>do</strong>s. Relação, portanto, diversa da que estava constituída entre a<br />

parte <strong>de</strong>mandante e o banco priva<strong>do</strong>. Caso concreto em que a parte autora encaminhou, na via administrativa, <strong>de</strong> forma expressa, o<br />

pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> cancelamento da cobrança <strong>de</strong> contribuição à FUSEPE, após o total adimplemento <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> empréstimo<br />

intermedia<strong>do</strong>, razão pela qual, diante <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> não ser compelida a manter-se filiada – Art. 8º, V, CF/88 – Têm-se por in<strong>de</strong>vidas<br />

as cobranças realizadas a partir <strong>do</strong> protocolo <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sligamento. Pela aplicação <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>, ten<strong>do</strong><br />

os <strong>de</strong>manda<strong>do</strong>s participa<strong>do</strong> <strong>de</strong> alguma forma da execução <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> mútuo bancário que configura relação <strong>de</strong> consumo, cabível<br />

a aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r para obrigar a parte <strong>de</strong>mandada à <strong>de</strong>volução em <strong>do</strong>bro <strong>do</strong>s valores in<strong>de</strong>vidamente<br />

<strong>de</strong>sconta<strong>do</strong>s, a teor <strong>do</strong> artigo 42, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC, na medida em que à conduta lesiva não se po<strong>de</strong> conferir a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

erro justificável. (…)” (TJRS – Recurso Cível 0058556-77.2015.8.21.9000, Caxias <strong>do</strong> Sul – Segunda Turma Recursal da Fazenda<br />

Pública – Rel. Des. Mauro Caum Gonçalves – j. 26.08.2016 – DJERS 27.09.2016).<br />

Com tal interessante conceito, que <strong>de</strong>ve ser incrementa<strong>do</strong> nos próximos anos, encerra-se o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r como<br />

elemento subjetivo da relação <strong>de</strong> consumo.<br />

3.2.2.<br />

O consumi<strong>do</strong>r. Teorias existentes. O consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> ou bystan<strong>de</strong>r<br />

Enuncia expressamente o art. 2º da Lei 8.078/1990 que “Consumi<strong>do</strong>r é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza<br />

produto ou serviço como <strong>de</strong>stinatário final”. Vislumbran<strong>do</strong>-se o seu enquadramento inicial, o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> ser, pelo texto<br />

expresso, uma pessoa natural ou jurídica, sem qualquer distinção. A questão da pessoa jurídica como consumi<strong>do</strong>ra po<strong>de</strong> gerar<br />

perplexida<strong>de</strong>s.11 Porém, na opinião <strong>do</strong> presente autor, foi correta a opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r consumerista.<br />

A respeito da pessoa jurídica consumi<strong>do</strong>ra, como bem aponta José Geral<strong>do</strong> Brito Filomeno, apesar <strong>de</strong> resistências pessoais,<br />

“Prevaleceu, entretanto, como <strong>de</strong> resto em algumas legislações alienígenas inspiradas na nossa, a inclusão das pessoas jurídicas<br />

igualmente como ‘consumi<strong>do</strong>res’ <strong>de</strong> produtos e serviços, embora com a ressalva <strong>de</strong> que assim são entendidas aquelas como<br />

<strong>de</strong>stinatárias finais <strong>do</strong>s produtos e serviços que adquirem, e não como insumos necessários ao <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong><br />

lucrativa”. 12 Na opinião <strong>de</strong>ste autor, estan<strong>do</strong> configura<strong>do</strong>s os elementos da relação <strong>de</strong> consumo, não se cogita qualquer discussão a<br />

respeito <strong>de</strong> tal enquadramento, uma vez que, conforme outrora exposto, a vulnerabilida<strong>de</strong> é elemento posto da relação <strong>de</strong> consumo.<br />

Em outras palavras, é irrelevante ser a pessoa jurídica forte ou não economicamente, pois tal constatação acaba confundin<strong>do</strong> a<br />

hipossuficiência com a vulnerabilida<strong>de</strong>. De toda sorte, a jurisprudência <strong>do</strong> STJ já concluiu pela possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se mitigar a<br />

vulnerabilida<strong>de</strong> da pessoa jurídica, afastan<strong>do</strong>-se a subsunção <strong>do</strong> CDC, pela presença <strong>de</strong> uma presunção relativa, tese à qual o<br />

presente autor não se filia:<br />

“Processo civil e consumi<strong>do</strong>r. (…). Relação <strong>de</strong> consumo. Caracterização. Destinação final fática e econômica <strong>do</strong> produto ou serviço.<br />

Ativida<strong>de</strong> empresarial. Mitigação da regra. Vulnerabilida<strong>de</strong> da pessoa jurídica. Presunção relativa. (…). Ao encampar a pessoa<br />

jurídica no conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r, a intenção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r foi conferir proteção à empresa nas hipóteses em que, participan<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

uma relação jurídica na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>ra, sua condição ordinária <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>ra não lhe proporcione uma posição <strong>de</strong><br />

igualda<strong>de</strong> frente à parte contrária. Em outras palavras, a pessoa jurídica <strong>de</strong>ve contar com o mesmo grau <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> que<br />

qualquer pessoa comum se encontraria ao celebrar aquele negócio, <strong>de</strong> sorte a manter o <strong>de</strong>sequilíbrio da relação <strong>de</strong> consumo. A<br />

‘parida<strong>de</strong> <strong>de</strong> armas’ entre a empresa-fornece<strong>do</strong>ra e a empresa-consumi<strong>do</strong>ra afasta a presunção <strong>de</strong> fragilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sta. Tal consi<strong>de</strong>ração<br />

se mostra <strong>de</strong> extrema relevância, pois uma mesma pessoa jurídica, enquanto consumi<strong>do</strong>ra, po<strong>de</strong> se mostrar vulnerável em<br />

<strong>de</strong>terminadas relações <strong>de</strong> consumo e em outras não. Recurso provi<strong>do</strong>” (STJ – RMS 27.512/BA – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy<br />

Andrighi – j. 20.08.2009 – DJe 23.09.2009).<br />

O consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> ser ainda um ente <strong>de</strong>spersonaliza<strong>do</strong>, mesmo não constan<strong>do</strong> expressamente menção a ele na Lei<br />

Consumerista. Inci<strong>de</strong> a equivalência das posições jurídicas, uma vez que tais entes po<strong>de</strong>m ser fornece<strong>do</strong>res, como antes exposto,<br />

caben<strong>do</strong>, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, a sua qualificação como consumi<strong>do</strong>res. A título <strong>de</strong> exemplo, cite-se julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal Paulista, que<br />

consi<strong>de</strong>rou o con<strong>do</strong>mínio edilício – trata<strong>do</strong> como ente <strong>de</strong>spersonaliza<strong>do</strong> – consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> uma prestação <strong>de</strong> serviços:


“Contrato. Prestação <strong>de</strong> serviços. Relação <strong>de</strong> consumo. Con<strong>do</strong>mínio e presta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> engenharia e manutenção. Código<br />

<strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Aplicabilida<strong>de</strong>. Con<strong>do</strong>mínio, ente <strong>de</strong>spersonaliza<strong>do</strong>, com capacida<strong>de</strong> processual, po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r final <strong>do</strong>s serviços presta<strong>do</strong>s pela agravada. Recurso provi<strong>do</strong> nesse aspecto” (TJSP – Agravo <strong>de</strong> Instrumento 1.009.340-<br />

00/1, Santos – Trigésima Segunda Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Orlan<strong>do</strong> Pistoresi – j. 26.01.2005).<br />

Apesar <strong>de</strong> a conclusão final da <strong>de</strong>cisão ser perfeita, <strong>de</strong>ve ser feita a ressalva <strong>de</strong> que este autor segue o entendimento segun<strong>do</strong> o<br />

qual o con<strong>do</strong>mínio edilício po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> pessoa jurídica, conforme consta <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 90, <strong>do</strong> Conselho da Justiça<br />

Fe<strong>de</strong>ral, da I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, que sintetiza o pensamento da melhor <strong>do</strong>utrina contemporânea.13<br />

Tratan<strong>do</strong> também <strong>do</strong> con<strong>do</strong>mínio edilício, recente <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça consi<strong>de</strong>rou-o legitima<strong>do</strong> a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r<br />

os interesses <strong>do</strong>s seus componentes perante a incorpora<strong>do</strong>ra imobiliária, em tratamento regi<strong>do</strong> pelo CDC. Nos termos da ementa,<br />

“polêmica em torno da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova para se atribuir a incorpora<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>mandada a <strong>de</strong>monstração da<br />

<strong>de</strong>stinação integral <strong>do</strong> produto <strong>de</strong> financiamento garanti<strong>do</strong> pela alienação fiduciária <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s imobiliárias na incorporação em<br />

questão (patrimônio <strong>de</strong> afetação). Aplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r ao con<strong>do</strong>mínio <strong>de</strong> adquirentes <strong>de</strong> edifício<br />

em construção, nas hipóteses em que atua na <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong>s seus condôminos frente a construtora/incorpora<strong>do</strong>ra. O<br />

con<strong>do</strong>mínio equipara-se ao consumi<strong>do</strong>r, enquanto coletivida<strong>de</strong> que haja intervin<strong>do</strong> na relação <strong>de</strong> consumo. Aplicação <strong>do</strong> disposto<br />

no parágrafo único <strong>do</strong> art. 2º <strong>do</strong> CDC. Imposição <strong>de</strong> ônus probatório excessivamente complexo para o con<strong>do</strong>mínio <strong>de</strong>mandante,<br />

ten<strong>do</strong> a empresa <strong>de</strong>mandada pleno acesso às provas necessárias à <strong>de</strong>monstração <strong>do</strong> fato controverti<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1.560.728/MG<br />

– Terceira Turma – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 18.10.2016 – DJe 28.10.2016).<br />

Ainda no tocante aos entes <strong>de</strong>spersonaliza<strong>do</strong>s, vejamos <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal Fluminense que tratou o espólio como<br />

consumi<strong>do</strong>r, em caso envolven<strong>do</strong> a prestação <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> telefonia:<br />

“Cessão <strong>do</strong> direito ao uso <strong>de</strong> linha telefônica. Morte <strong>do</strong> titular. Art. 1.572. Código Civil <strong>de</strong> 1916. Obrigação <strong>de</strong> fazer. Ação <strong>de</strong><br />

obrigação <strong>de</strong> fazer. Uso <strong>de</strong> linha telefônica. In<strong>de</strong>vida rescisão <strong>do</strong> contrato. Com o falecimento <strong>do</strong> titular <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> uso <strong>de</strong> linha<br />

telefônica, este se transmite aos her<strong>de</strong>iros, na forma <strong>do</strong> art. 1.572 <strong>do</strong> Código Civil, integran<strong>do</strong> o acervo hereditário. Desta forma, é<br />

possível o espólio pleitear em ação <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> fazer a instalação <strong>de</strong> linha telefônica, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que esteja em dia com pagamentos.<br />

Os serviços interrompi<strong>do</strong>s, com afronta ao disposto na Lei 9.472/1997 e no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, merecem ser<br />

restabeleci<strong>do</strong>s. Afasta-se a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por dano moral, uma vez que o espólio é ente <strong>de</strong>spersonaliza<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong>-lhe<br />

conferida apenas capacida<strong>de</strong> processual, como parte formal. Recurso provi<strong>do</strong> em parte” (TJRJ – Acórdão 14.509/2002, Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro – Décima Quarta Câmara Cível – Rel. Des. Walter D’ Agostino – j. 17.12.2002).<br />

Mais uma vez, diante da equivalência das posições jurídicas, o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> ser pessoa <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> ou <strong>de</strong> <strong>Direito</strong><br />

Público. Entre as primeiras, cite-se uma pessoa natural ou uma empresa que adquire um eletro<strong>do</strong>méstico em uma loja <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>partamentos. Entre as últimas, consigne-se a hipótese <strong>de</strong> uma prefeitura como consumi<strong>do</strong>ra, conforme o entendimento<br />

jurispru<strong>de</strong>ncial:<br />

“Administrativo. Serviço <strong>de</strong> telefonia. Falta <strong>de</strong> pagamento. Bloqueio parcial das linhas da Prefeitura. Município como consumi<strong>do</strong>r.<br />

1. A relação jurídica, na hipótese <strong>de</strong> serviço público presta<strong>do</strong> por concessionária, tem natureza <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, pois o pagamento<br />

é feito sob a modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tarifa, que não se classifica como taxa. 2. Nas condições indicadas, o pagamento é contraprestação,<br />

aplicável o CDC, e o serviço po<strong>de</strong> ser interrompi<strong>do</strong> em caso <strong>de</strong> inadimplemento, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que antecedi<strong>do</strong> por aviso. 3. A continuida<strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> serviço, sem o efetivo pagamento, quebra o princípio da isonomia e ocasiona o enriquecimento sem causa <strong>de</strong> uma das partes,<br />

repudia<strong>do</strong> pelo <strong>Direito</strong> (interpretação conjunta <strong>do</strong>s arts. 42 e 71 <strong>do</strong> CDC). 4. Quan<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r é pessoa jurídica <strong>de</strong> direito<br />

público, a mesma regra <strong>de</strong>ve lhe ser estendida, com a preservação apenas das unida<strong>de</strong>s públicas cuja paralisação é inadmissível. 5.<br />

Recurso especial provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 742.640/MG – Segunda Turma – Rel. Min. Eliana Calmon – j. 06.09.2007 – DJ 26.09.2007,<br />

p. 203).<br />

Admite-se que o consumi<strong>do</strong>r seja pessoa nacional ou estrangeira. Em relação ao último, imagine-se o caso <strong>de</strong> um turista, em<br />

férias no Brasil, que fica intoxica<strong>do</strong> com um alimento consumi<strong>do</strong> na praia ou em um restaurante, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> <strong>de</strong>mandar os agentes<br />

causa<strong>do</strong>res <strong>do</strong> dano com base na responsabilida<strong>de</strong> objetiva prevista pela Lei 8.078/1990.<br />

Pois bem, vistas as elucidações inaugurais, o principal qualifica<strong>do</strong>r da condição <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r é que <strong>de</strong>ve ele ser <strong>de</strong>stinatário<br />

final <strong>do</strong> produto ou serviço. Tal elemento é o que <strong>de</strong>sperta as maiores dúvidas a respeito da matéria, surgin<strong>do</strong> teorias divergentes<br />

no que toca a essa qualificação. Vejamos tais teorias, <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>talhada.<br />

a) Teoria finalista<br />

Na essência, a teoria finalista ou subjetiva foi a a<strong>do</strong>tada expressamente pelo art. 2º <strong>do</strong> Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r para a qualificação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, pela presença <strong>do</strong> elemento da <strong>de</strong>stinação final <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço. Tem<br />

prevaleci<strong>do</strong> no Brasil a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que o consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>stinatário final fático e econômico, conforme as preciosas lições <strong>de</strong>


Claudia Lima Marques:<br />

“Destinatário final seria aquele <strong>de</strong>stinatário fático e econômico <strong>do</strong> bem ou serviço, seja ele pessoa jurídica ou física. Logo, segun<strong>do</strong><br />

essa interpretação teleológica, não basta ser <strong>de</strong>stinatário fático <strong>do</strong> produto, retirá-lo da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> produção, levá-lo para o escritório<br />

ou residência – é necessário ser <strong>de</strong>stinatário econômico <strong>do</strong> bem, não adquiri-lo para revenda, não adquiri-lo para uso profissional,<br />

pois o bem seria novamente um instrumento <strong>de</strong> produção, cujo preço será incluí<strong>do</strong> no preço final <strong>do</strong> profissional para adquiri-lo.<br />

Nesse caso, não haveria exigida ‘<strong>de</strong>stinação final’ <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço, ou, como afirma o STJ, haveria consumo intermediário,<br />

ainda <strong>de</strong>ntro das ca<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> produção e <strong>de</strong> distribuição. Essa interpretação restringe a figura <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r àquele que adquire<br />

(utiliza) um produto para uso próprio e <strong>de</strong> sua família, consumi<strong>do</strong>r seria o não profissional, pois o fim <strong>do</strong> CDC é tutelar <strong>de</strong> maneira<br />

especial um grupo da socieda<strong>de</strong> que é mais vulnerável”.14<br />

Resumin<strong>do</strong> tal entendimento a respeito <strong>do</strong>s requisitos da <strong>de</strong>stinação final, po<strong>de</strong>-se dizer que:<br />

1º<br />

2º<br />

Destinação final fática – o consumi<strong>do</strong>r é o último da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> consumo, ou seja, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong>le, não há ninguém na<br />

transmissão <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço.<br />

Destinação final econômica – o consumi<strong>do</strong>r não utiliza o produto ou o serviço para o lucro, repasse ou transmissão<br />

onerosa.<br />

Como <strong>de</strong>staca<strong>do</strong> pela própria Claudia Lima Marques no trecho transcrito, vários julga<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça<br />

a<strong>do</strong>tam esse posicionamento categórico. A ilustrar, por to<strong>do</strong>s:<br />

“Conflito <strong>de</strong> competência. Socieda<strong>de</strong> empresária. Consumi<strong>do</strong>r. Destinatário final econômico. Não ocorrência. Foro <strong>de</strong> eleição.<br />

Valida<strong>de</strong>. Relação <strong>de</strong> consumo e hipossuficiência. Não caracterização. 1. A jurisprudência <strong>de</strong>sta Corte sedimenta-se no senti<strong>do</strong> da<br />

a<strong>do</strong>ção da teoria finalista ou subjetiva para fins <strong>de</strong> caracterização da pessoa jurídica como consumi<strong>do</strong>ra em eventual relação <strong>de</strong><br />

consumo, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong>, portanto, ser <strong>de</strong>stinatária final econômica <strong>do</strong> bem ou serviço adquiri<strong>do</strong> (REsp 541.867/BA). 2. Para que o<br />

consumi<strong>do</strong>r seja consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> <strong>de</strong>stinatário econômico final, o produto ou serviço adquiri<strong>do</strong> ou utiliza<strong>do</strong> não po<strong>de</strong> guardar qualquer<br />

conexão, direta ou indireta, com a ativida<strong>de</strong> econômica por ele <strong>de</strong>senvolvida; o produto ou serviço <strong>de</strong>ve ser utiliza<strong>do</strong> para o<br />

atendimento <strong>de</strong> uma necessida<strong>de</strong> própria, pessoal <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. No caso em tela, não se verifica tal circunstância, porquanto o<br />

serviço <strong>de</strong> crédito toma<strong>do</strong> pela pessoa jurídica junto à instituição financeira <strong>de</strong>certo foi utiliza<strong>do</strong> para o fomento da ativida<strong>de</strong><br />

empresarial, no <strong>de</strong>senvolvimento da ativida<strong>de</strong> lucrativa, <strong>de</strong> forma que a sua circulação econômica não se encerra nas mãos da pessoa<br />

jurídica, socieda<strong>de</strong> empresária, motivo pelo qual não resta caracterizada, in casu, relação <strong>de</strong> consumo entre as partes. 3. Cláusula <strong>de</strong><br />

eleição <strong>de</strong> foro legal e válida, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong>, portanto, ser respeitada, pois não há qualquer circunstância que evi<strong>de</strong>ncie situação <strong>de</strong><br />

hipossuficiência da autora da <strong>de</strong>manda que possa dificultar a propositura da ação no foro eleito. 4. Conflito <strong>de</strong> competência<br />

conheci<strong>do</strong> para <strong>de</strong>clarar competente o Juízo Fe<strong>de</strong>ral da 12ª Vara da Seção Judiciária <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> São Paulo” (STJ – CC 92.519/SP<br />

– Segunda Seção – Rel. Min. Fernan<strong>do</strong> Gonçalves – j. 16.02.2009 – DJe 04.03.2009).<br />

“Competência. Relação <strong>de</strong> consumo. Utilização <strong>de</strong> equipamento e <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> crédito presta<strong>do</strong> por empresa administra<strong>do</strong>ra <strong>de</strong><br />

cartão <strong>de</strong> crédito. Destinação final inexistente. A aquisição <strong>de</strong> bens ou a utilização <strong>de</strong> serviços, por pessoa natural ou jurídica, com o<br />

escopo <strong>de</strong> implementar ou incrementar a sua ativida<strong>de</strong> negocial, não se reputa como relação <strong>de</strong> consumo e, sim, como uma ativida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> consumo intermediária. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong> para reconhecer a incompetência absoluta da Vara Especializada<br />

<strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, para <strong>de</strong>cretar a nulida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s atos pratica<strong>do</strong>s e, por conseguinte, para <strong>de</strong>terminar a remessa <strong>do</strong> feito a uma<br />

das Varas Cíveis da Comarca” (STJ – REsp 541.867/BA – Segunda Seção – Rel. Min. Antônio <strong>de</strong> Pádua Ribeiro – Rel. p/Acórdão<br />

Min. Barros Monteiro – j. 10.11.2004 – DJ 16.05.2005, p. 227).<br />

A<strong>do</strong>tan<strong>do</strong> essas premissas, na I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Comercial, promovida pelo Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral em outubro <strong>de</strong><br />

2012, foi aprova<strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrinário no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que não se aplica o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r nos contratos entre<br />

empresários que tenham por objetivo o suprimento <strong>de</strong> insumos para as suas ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> produção, comércio ou prestação <strong>de</strong><br />

serviços (Enuncia<strong>do</strong> n. 20).<br />

Todavia, a verda<strong>de</strong> é que existem outras teorias a respeito da caracterização <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Uma <strong>de</strong>las, como se verá, até se<br />

justifica, eis que a aplicação cega e literal da teoria finalista po<strong>de</strong> gerar situações <strong>de</strong> injustiça.<br />

b) Teoria maximalista<br />

A teoria maximalista ou objetiva procura ampliar sobremaneira o conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r e daí a construção da relação<br />

jurídica <strong>de</strong> consumo. Como bem apresenta Claudia Lima Marques, “os maximalistas viam nas normas <strong>do</strong> CDC o novo regulamento<br />

<strong>do</strong> merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo brasileiro, e não normas orientadas para proteger somente o consumi<strong>do</strong>r não profissional. O CDC seria um<br />

código geral sobre o consumo, um código para a socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo, que institui normas e princípios para to<strong>do</strong>s os agentes <strong>do</strong><br />

merca<strong>do</strong>, os quais po<strong>de</strong>m assumir os papéis ora <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res, ora <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res. A <strong>de</strong>finição <strong>do</strong> art. 2º <strong>de</strong>ve ser interpretada


o mais extensivamente possível, segun<strong>do</strong> esta corrente, para que as normas <strong>do</strong> CDC possam ser aplicadas a um número cada vez<br />

maior <strong>de</strong> relações <strong>de</strong> consumo”.15<br />

Entre os maximalistas, <strong>de</strong>staca-se o trabalho muito bem articula<strong>do</strong> <strong>de</strong> Alinne Arquette Leite Novaes, que lhe valeu o título <strong>de</strong><br />

mestre em <strong>Direito</strong> Civil pela Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> da Universida<strong>de</strong> Estadual <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, sob a orientação <strong>do</strong> Professor<br />

Gustavo Tepedino. Nessa obra, a partir <strong>de</strong> uma interpretação <strong>do</strong> art. 29 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – que traz o conceito<br />

<strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r por equiparação ou bystan<strong>de</strong>r –, a <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que o Código Consumerista <strong>de</strong>ve ser aplica<strong>do</strong> a to<strong>do</strong>s os<br />

contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, aqueles com conteú<strong>do</strong> imposto por uma das partes. Vale transcrever as suas palavras finais, conclusivas <strong>do</strong><br />

cita<strong>do</strong> trabalho:<br />

“Concluímos, então, dizen<strong>do</strong> que o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é totalmente aplicável aos contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, em virtu<strong>de</strong> da<br />

extensão <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r, equiparan<strong>do</strong> a este todas as pessoas expostas às práticas previstas nos seus Capítulos V e VI,<br />

estan<strong>do</strong>, como é sabi<strong>do</strong>, os contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são disciplina<strong>do</strong>s <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sse último. E isso ocorre porque a intenção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r, ao<br />

elaborar o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, foi garantir justiça e equida<strong>de</strong> aos contratos realiza<strong>do</strong>s sob sua égi<strong>de</strong>, para equilibrar<br />

partes contratuais em posições diferentes, tutelan<strong>do</strong> <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> especial o partícipe contratual, que julgou ser vulnerável. Assim,<br />

enten<strong>de</strong>u o legisla<strong>do</strong>r que a simples exposição às práticas por ele previstas no CDC era suficiente para gerar uma situação <strong>de</strong><br />

insegurança e <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong>, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>, portanto, que o simples fato <strong>de</strong> se submeter a um contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são colocava o<br />

a<strong>de</strong>rente em posição inferior, se equiparan<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r”.16<br />

Com to<strong>do</strong> o respeito que merece, não se filia a tal forma <strong>de</strong> pensar, eis que, conforme o Enuncia<strong>do</strong> n. 171 <strong>do</strong> CJF/STJ,<br />

aprova<strong>do</strong> na III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, menciona<strong>do</strong> pelos arts. 423 e 424 <strong>do</strong> CC, não se confun<strong>de</strong> com o<br />

contrato <strong>de</strong> consumo. Ora, para a caracterização <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, leva-se em conta a forma <strong>de</strong> contratação, haven<strong>do</strong> uma<br />

imposição, por uma das partes da relação negocial. Por outra via, o contrato <strong>de</strong> consumo tem como conteú<strong>do</strong> os elementos<br />

subjetivos e objetivos que aqui estão sen<strong>do</strong> expostos.<br />

Na prática, é comum que o contrato <strong>de</strong> consumo seja <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, e vice-versa. Mas não necessariamente, pois o contrato po<strong>de</strong><br />

ser <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são sem ser <strong>de</strong> consumo. Cite-se, por exemplo, o contrato <strong>de</strong> franquia ou franchising, na relação franquea<strong>do</strong>r e<br />

franquea<strong>do</strong>. Para o último é imposto, na gran<strong>de</strong> maioria das situações, o conteú<strong>do</strong> <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o negócio, por meio <strong>do</strong> manual <strong>do</strong><br />

franquea<strong>do</strong>. Porém, o franquea<strong>do</strong> não é consumi<strong>do</strong>r, pois não é <strong>de</strong>stinatário final fático e econômico <strong>do</strong>s produtos ou serviços<br />

(nesse senti<strong>do</strong>, por to<strong>do</strong>s: TJRS – Apelação Cível 70031345077, Porto Alegre – Décima Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Pedro<br />

Celso Dal Prá – j. 10.09.2009 – DJERS 18.09.2009, p. 103; e TJSP, Agravo <strong>de</strong> Instrumento 7343481-2 – Acórdão n. 3616551, São<br />

Paulo – Vigésima Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Salles Vieira – j. 23.04.2009 – DJESP 01.06.2009).<br />

A propósito, ainda no que diz respeito à franquia, recente julgamento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, publica<strong>do</strong> no seu<br />

Informativo n. 569, aduz que “no contrato <strong>de</strong> franquia empresarial, estabelece-se um vínculo associativo entre socieda<strong>de</strong>s<br />

empresárias distintas, o qual, conforme a <strong>do</strong>utrina, caracteriza-se pelo ‘uso necessário <strong>de</strong> bens intelectuais <strong>do</strong> franquea<strong>do</strong>r<br />

(franchisor) e a participação no aviamento <strong>do</strong> franquea<strong>do</strong> (franchise)’. Dessa forma, verifica-se, novamente com base na <strong>do</strong>utrina,<br />

que o contrato <strong>de</strong> franquia tem relevância apenas na estrita esfera das empresas contratantes, traduzin<strong>do</strong> uma clássica obrigação<br />

contratual inter partes. A<strong>de</strong>mais, o STJ já <strong>de</strong>cidiu por afastar a incidência <strong>do</strong> CDC para a disciplina da relação contratual entre<br />

franquea<strong>do</strong>r e franquea<strong>do</strong> (AgRg no REsp 1.193.293/SP – Terceira Turma – DJe 11.12.2012; e AgRg no REsp 1.336.491/SP –<br />

Quarta Turma – DJe 13.12.2012). Aos olhos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, entretanto, trata-se <strong>de</strong> mera intermediação ou revenda <strong>de</strong> bens ou<br />

serviços <strong>do</strong> franquea<strong>do</strong>r, que é fornece<strong>do</strong>r no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo, ainda que <strong>de</strong> bens imateriais. Aliás, essa arquitetura comercial<br />

– na qual o consumi<strong>do</strong>r tem acesso a produtos vincula<strong>do</strong>s a uma empresa terceira, estranha à relação contratual diretamente<br />

estabelecida entre consumi<strong>do</strong>r e ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r – não é novida<strong>de</strong> no cenário consumerista e, além disso, não ocorre apenas nos contratos<br />

<strong>de</strong> franquia. Desse mo<strong>do</strong>, extrain<strong>do</strong>-se <strong>do</strong>s arts. 14 e 18 <strong>do</strong> CDC a responsabilização solidária por eventuais <strong>de</strong>feitos ou vícios <strong>de</strong><br />

to<strong>do</strong>s que participem da introdução <strong>do</strong> produto ou serviço no merca<strong>do</strong> (REsp 1.058.221/PR – Terceira Turma – DJe 14.10.2011; e<br />

REsp 1.309.981/SP – Quarta Turma – DJe 17.12.2013) – inclusive daqueles que organizem a ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fornecimento –, as<br />

franquea<strong>do</strong>ras atraem para si responsabilida<strong>de</strong> solidária pelos danos <strong>de</strong>correntes da ina<strong>de</strong>quação <strong>do</strong>s serviços presta<strong>do</strong>s em razão da<br />

franquia, ten<strong>do</strong> em vista que cabe a elas a organização da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> franquea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> serviço” (STJ – REsp 1.426.578/SP – Rel. Min.<br />

Marco Aurélio Bellizze – j. 23.06.2015, DJe 22.09.2015).<br />

Em suma, a correta conclusão <strong>do</strong> acórdão é no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que entre franquea<strong>do</strong>r e franquea<strong>do</strong>, internamente, não há uma<br />

relação <strong>de</strong> consumo. Todavia, tal relação está presente frente aos adquirentes finais <strong>do</strong>s produtos e <strong>do</strong>s serviços advin<strong>do</strong>s <strong>de</strong>sse<br />

negócio, haven<strong>do</strong> solidarieda<strong>de</strong> entre franquea<strong>do</strong>r e franquea<strong>do</strong> frente ao consumi<strong>do</strong>r, nos casos da presença <strong>de</strong> vícios <strong>do</strong> produto<br />

ou <strong>do</strong> serviço, conforme será <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong> no próximo capítulo <strong>de</strong>sta obra.<br />

Seguin<strong>do</strong> no estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> tema, a rebater a visão maximalista, <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista organizacional e meto<strong>do</strong>lógico <strong>do</strong> sistema<br />

jurídico, o Código Civil <strong>de</strong> 2002 não po<strong>de</strong> per<strong>de</strong>r total prestígio diante <strong>do</strong> CDC, como lei central <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>. A<strong>de</strong>mais,


diante da aplicação da teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes, a tese maximalista per<strong>de</strong> sua razão <strong>de</strong> ser, em certo senti<strong>do</strong>. Não se po<strong>de</strong><br />

esquecer, além disso, que muitos <strong>do</strong>s preceitos que constam da codificação civil privada estão em harmonia com as regras da Lei<br />

Consumerista.<br />

De toda sorte, em algumas situações <strong>de</strong> patente discrepância, hipossuficiência ou vulnerabilida<strong>de</strong>, justifica-se a ampliação <strong>do</strong><br />

conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r e da relação <strong>de</strong> consumo. Surge, nesse contexto, o que é <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> como teoria finalista aprofundada,<br />

uma variante da teoria maximalista que se justifica plenamente. Deve ficar claro que, por tu<strong>do</strong> o que já foi aqui exposto, prefere-se<br />

o termo “hipossuficiente” para justificar a incidência da teoria. Porém, tanto <strong>do</strong>utrina quanto jurisprudência utilizam também o<br />

conceito <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> para tal conclusão.<br />

c) Teoria finalista aprofundada ou mitigada<br />

Mais uma vez, a teoria é fruto <strong>do</strong> trabalho <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> Claudia Lima Marques, a maior <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>ra brasileira sobre o tema<br />

<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Nesse ínterim, cumpre colacionar seus ensinamentos:<br />

“Realmente, <strong>de</strong>pois da entrada em vigor <strong>do</strong> CC/2002 a visão maximalista diminuiu em força, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> muito importante para isto a<br />

atuação <strong>do</strong> STJ. Des<strong>de</strong> a entrada em vigor <strong>do</strong> CC/2002, parece-me crescer uma tendência nova da jurisprudência, concentrada na<br />

noção <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r final imediato (Endverbraucher), e <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> (art. 4º, I), que po<strong>de</strong>ríamos <strong>de</strong>nominar aqui <strong>de</strong> finalismo<br />

aprofunda<strong>do</strong>.<br />

É uma interpretação finalista mais aprofundada e madura, que <strong>de</strong>ve ser saudada. Em casos difíceis envolven<strong>do</strong> pequenas empresas<br />

que utilizam insumos para a sua produção, mas não em sua área <strong>de</strong> expertise ou com uma utilização mista, principalmente na área <strong>de</strong><br />

serviços, provada a vulnerabilida<strong>de</strong>, conclui-se pela <strong>de</strong>stinação final <strong>de</strong> consumo prevalente. Essa nova linha, em especial <strong>do</strong> STJ,<br />

tem utiliza<strong>do</strong>, sob o critério finalista e subjetivo, expressamente a equiparação <strong>do</strong> art. 29 <strong>do</strong> CDC, em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> pessoa jurídica<br />

que comprove ser vulnerável e atue fora <strong>do</strong> âmbito <strong>de</strong> sua especialida<strong>de</strong>, como hotel que compra gás. Isso porque o CDC conhece<br />

outras <strong>de</strong>finições <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r. O conceito-chave aqui é o <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong>”.17<br />

Há, portanto, um tempero na teoria maximalista (teoria maximalista temperada, aprofundada ou mitigada), conjugan<strong>do</strong>-a<br />

com a teoria finalista, segun<strong>do</strong> as lições <strong>de</strong> Claudia Lima Marques. De toda sorte, alguns juristas continuam enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> tratar-se <strong>de</strong><br />

aplicação da teoria maximalista, corrente a que está filia<strong>do</strong> o presente autor, o que está <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com uma visão mais simplificada<br />

da matéria.18<br />

De fato, em muitas situações envolven<strong>do</strong> pessoas notadamente hiperssuficientes – seja a disparida<strong>de</strong> econômica, financeira,<br />

política, social, técnica ou informacional –, a teoria maximalista justifica-se plenamente. É possível ainda afirmar, na esteira das<br />

lições <strong>de</strong> Claudia Lima Marques, que, pela ampliação categórica, a vulnerabilida<strong>de</strong> passa a ser elemento pressuposto da relação<br />

jurídica <strong>de</strong> consumo e não um elemento posto, como no capítulo anterior foi <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong>.<br />

Nesse contexto, vejamos algumas pontuações baseadas em exemplos <strong>de</strong> Luiz Antonio Rizzatto Nunes. 19 Imaginem-se duas<br />

relações jurídicas continuadas, entre uma monta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> veículos e uma concessionária <strong>de</strong> automóveis, bem como entre a última e<br />

uma pessoa que adquire um veículo para uso próprio:<br />

No esquema acima, a primeira relação entre a monta<strong>do</strong>ra e a concessionária não é uma relação <strong>de</strong> consumo, mas uma relação<br />

civil pura, eis que a concessionária não é <strong>de</strong>stinatária final fática, pois após tal sujeito há a pessoa que adquire o veículo e o utiliza<br />

para uso próprio. Além disso, não é a concessionária <strong>de</strong>stinatária final econômica, pois utiliza o veículo para sua ativida<strong>de</strong> lucrativa<br />

primordial. Por outra via, há relação <strong>de</strong> consumo, regida pelo CDC, entre a concessionária e a pessoa que adquire o veículo para


uso próprio, sen<strong>do</strong> o último <strong>de</strong>stinatário final fático e econômico <strong>do</strong> bem.<br />

Em mais uma concretização, a última pessoa é substituída por uma gran<strong>de</strong> empresa que adquire uma frota <strong>de</strong> veículos para sua<br />

ativida<strong>de</strong> primordial, que vem a ser a entrega <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>rias. Vejamos o diagrama:<br />

No que concerne à primeira relação jurídica (monta<strong>do</strong>ra e concessionária), nada muda, manten<strong>do</strong>-se a relação civil, regida<br />

substancialmente pelo Código Civil <strong>de</strong> 2002. Porém, a relação estabelecida entre a empresa especializada em entregas e a<br />

concessionária não é uma relação <strong>de</strong> consumo pela teoria finalista. Isso porque tal empresa até po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>stinatária final fática <strong>do</strong>s<br />

veículos, mas não é <strong>de</strong>stinatária final econômica, por utilizar tais bens em sua ativida<strong>de</strong> econômica pre<strong>do</strong>minante.<br />

Por fim, a empresa especializada em entregas rápidas será substituída por um taxista ou um caminhoneiro, que adquire o<br />

veículo para sua manutenção profissional:<br />

Manten<strong>do</strong>-se mais uma vez a conclusão <strong>de</strong> que a primeira relação é civil, surge dúvida atroz a respeito da segunda relação,<br />

diante da patente disparida<strong>de</strong> que atinge o taxista e o caminhoneiro. Lembre-se <strong>de</strong> que, pela teoria finalista, ambos não seriam<br />

consumi<strong>do</strong>res, já que retiram <strong>do</strong> veículo adquiri<strong>do</strong> a sua ativida<strong>de</strong> lucrativa primordial. Não haveria, portanto, a <strong>de</strong>stinação<br />

econômica exigida para a caracterização <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Em casos como esse é que a <strong>do</strong>utrina e a jurisprudência têm reconheci<strong>do</strong> a<br />

aplicação da teoria maximalista mitigada ou da teoria finalista aprofundada.<br />

Eluci<strong>de</strong>-se com o exemplo <strong>de</strong> Rizzatto Nunes a respeito das canetas adquiridas pelo aluno e pelo professor para uma aula que<br />

será ministrada.20 Se o aluno tiver um problema com a caneta (v.g., a caneta estourou e manchou sua camisa), po<strong>de</strong>rá fazer uso <strong>do</strong><br />

CDC em face <strong>do</strong> comerciante e <strong>do</strong> fabricante, por ser <strong>de</strong>stinatário final fático e econômico <strong>do</strong> bem adquiri<strong>do</strong>. Por outra via, o<br />

professor não po<strong>de</strong>ria fazer uso <strong>do</strong> CDC, por ser <strong>de</strong>stinatário final <strong>do</strong> objeto, mas não <strong>de</strong>stinatário final econômico, uma vez que<br />

utiliza a caneta em sua ativida<strong>de</strong> profissional direta. Como bem observa o jurista, “Isso não só seria ilógico como feriria o princípio<br />

da isonomia constitucional; além <strong>do</strong> mais, não está <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o sistema <strong>do</strong> CDC”. 21<br />

No contexto <strong>de</strong> ampliação <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r, vejamos os acórdãos relativos ao taxista pronuncia<strong>do</strong>s pelo STJ:<br />

“<strong>Direito</strong> civil. Vício <strong>do</strong> produto. Aquisição <strong>de</strong> veículo zero quilômetro para uso profissional. Responsabilida<strong>de</strong> solidária. Há


esponsabilida<strong>de</strong> solidária da concessionária (fornece<strong>do</strong>r) e <strong>do</strong> fabricante por vício em veículo zero quilômetro. A aquisição <strong>de</strong><br />

veículo zero quilômetro para uso profissional como táxi, por si só, não afasta a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aplicação das normas protetivas <strong>do</strong><br />

CDC. To<strong>do</strong>s os que participam da introdução <strong>do</strong> produto ou serviço no merca<strong>do</strong> respon<strong>de</strong>m solidariamente por eventual vício <strong>do</strong><br />

produto ou <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação, ou seja, imputa-se a toda a ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fornecimento a responsabilida<strong>de</strong> pela garantia <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> e<br />

a<strong>de</strong>quação <strong>do</strong> referi<strong>do</strong> produto ou serviço (arts. 14 e 18 <strong>do</strong> CDC). Ao contrário <strong>do</strong> que ocorre na responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong><br />

produto, no vício <strong>do</strong> produto a responsabilida<strong>de</strong> é solidária entre to<strong>do</strong>s os fornece<strong>do</strong>res, inclusive o comerciante, a teor <strong>do</strong> que<br />

preconiza o art. 18 <strong>do</strong> menciona<strong>do</strong> Co<strong>de</strong>x” (STJ – REsp 611.872/RJ – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – j. 02.10.2012, publica<strong>do</strong><br />

no Informativo n. 505).<br />

“Civil. Processual civil. Recurso especial. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Veículo com <strong>de</strong>feito. Responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r.<br />

In<strong>de</strong>nização. Danos morais. Valor in<strong>de</strong>nizatório. Redução <strong>do</strong> quantum. Prece<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong>sta Corte. 1. Aplicável à hipótese a legislação<br />

consumerista. O fato <strong>de</strong> o recorri<strong>do</strong> adquirir o veículo para uso comercial – taxi – não afasta a sua condição <strong>de</strong> hipossuficiente na<br />

relação com a empresa-recorrente, ensejan<strong>do</strong> a aplicação das normas protetivas <strong>do</strong> CDC. 2. Verifica-se, in casu, que se trata <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>feito relativo à falha na segurança, <strong>de</strong> caso em que o produto traz um vício intrínseco que potencializa um aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo,<br />

sujeitan<strong>do</strong>-se o consumi<strong>do</strong>r a um perigo iminente (<strong>de</strong>feito na mangueira <strong>de</strong> alimentação <strong>de</strong> combustível <strong>do</strong> veículo, propician<strong>do</strong><br />

vazamento causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> incêndio). Aplicação da regra <strong>do</strong> art. 27 <strong>do</strong> CDC. 3. O Tribunal a quo, com base no conjunto fáticoprobatório<br />

trazi<strong>do</strong> aos autos, enten<strong>de</strong>u que o <strong>de</strong>feito fora publicamente reconheci<strong>do</strong> pela recorrente, ao proce<strong>de</strong>r ao recall com vistas<br />

à substituição da mangueira <strong>de</strong> alimentação <strong>do</strong> combustível. A pretendida reversão <strong>do</strong> <strong>de</strong>cisum recorri<strong>do</strong> <strong>de</strong>manda reexame <strong>de</strong><br />

provas analisadas nas instâncias ordinárias. Óbice da Súmula 7/STJ. 4. Esta Corte tem entendimento firma<strong>do</strong> no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que<br />

‘quanto ao dano moral, não há que se falar em prova, <strong>de</strong>ve-se, sim, comprovar o fato que gerou a <strong>do</strong>r, o sofrimento, sentimentos<br />

íntimos que o ensejam. Prova<strong>do</strong> o fato, impõe-se a con<strong>de</strong>nação’ (Cf. AGA 356.447-RJ, DJ 11.06.2001). 5. Consi<strong>de</strong>radas as<br />

peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> caso em questão e os princípios <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>ração e da razoabilida<strong>de</strong>, o valor fixa<strong>do</strong> pelo Tribunal a quo, a titulo <strong>de</strong><br />

danos morais, em 100 (cem) salários mínimos, mostra-se excessivo, não se limitan<strong>do</strong> à compensação <strong>do</strong>s prejuízos advin<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

evento danoso, pelo que se impõe a respectiva redução à quantia certa <strong>de</strong> R$ 5.000,00 (cinco mil reais). 6. Recurso conheci<strong>do</strong><br />

parcialmente e, nesta parte, provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 575.469/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. Jorge Scartezzini – j. 18.11.2004 – DJ<br />

06.12.2004, p. 325).<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Taxista. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Financiamento para aquisição <strong>de</strong> automóvel. Aplicação <strong>do</strong> CDC. O CDC<br />

inci<strong>de</strong> sobre contrato <strong>de</strong> financiamento celebra<strong>do</strong> entre a CEF e o taxista para aquisição <strong>de</strong> veículo. A multa é calculada sobre o<br />

valor das prestações vencidas, não sobre o total <strong>do</strong> financiamento (art. 52, § 1º, <strong>do</strong> CDC). Recurso não conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp<br />

231.208/PE – Quarta Turma – Rel. Min. Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar – j. 07.12.2000 – DJ 19.03.2001, p. 114).<br />

Pelo mesmo raciocínio, a <strong>de</strong>cisão mais recente <strong>do</strong> STJ a respeito <strong>do</strong> caminhoneiro:<br />

“Civil. Relação <strong>de</strong> consumo. Destinatário final. A expressão <strong>de</strong>stinatário final, <strong>de</strong> que trata o art. 2º, caput, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r abrange quem adquire merca<strong>do</strong>rias para fins não econômicos, e também aqueles que, <strong>de</strong>stinan<strong>do</strong>-os a fins econômicos,<br />

enfrentam o merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo em condições <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong>; espécie em que caminhoneiro reclama a proteção <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r porque o veículo adquiri<strong>do</strong>, utiliza<strong>do</strong> para prestar serviços que lhe possibilitariam sua mantença e a da<br />

família, apresentou <strong>de</strong>feitos <strong>de</strong> fabricação. Recurso especial não conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp 716.877/SP – Terceira Turma – Rel. Min.<br />

Ari Pargendler – j. 21.03.2007 – DJ 23.04.2007, p. 257).<br />

Outros acórdãos mais recentes fazem incidir as mesmas premissas, confirman<strong>do</strong> as palavras expostas por Claudia Lima<br />

Marques. Conforme publica<strong>do</strong> na ferramenta Jurisprudência em Teses (Edição n. 39), <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania, em 2015, “o<br />

Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça admite a mitigação da teoria finalista para autorizar a incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

nas hipóteses em que a parte (pessoa física ou jurídica), apesar <strong>de</strong> não ser <strong>de</strong>stinatária final <strong>do</strong> produto ou serviço, apresenta-se em<br />

situação <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong>” (tese n. 1).<br />

Seguin<strong>do</strong> nas concretizações <strong>de</strong>ssa tese, vejamos <strong>de</strong>cisão publicada em 2010 no Informativo n. 441 <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça, a respeito da aquisição da aquisição <strong>de</strong> máquina <strong>de</strong> bordar para pequena produção <strong>de</strong> subsistência:<br />

“A jurisprudência <strong>do</strong> STJ a<strong>do</strong>ta o conceito subjetivo ou finalista <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r, restrito à pessoa física ou jurídica que adquire o<br />

produto no merca<strong>do</strong> a fim <strong>de</strong> consumi-lo. Contu<strong>do</strong>, a teoria finalista po<strong>de</strong> ser abrandada a ponto <strong>de</strong> autorizar a aplicação das regras<br />

<strong>do</strong> CDC para resguardar, como consumi<strong>do</strong>res (art. 2º daquele Código), <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s profissionais (microempresas e empresários<br />

individuais) que adquirem o bem para usá-lo no exercício <strong>de</strong> sua profissão. Para tanto, há que <strong>de</strong>monstrar sua vulnerabilida<strong>de</strong><br />

técnica, jurídica ou econômica (hipossuficiência). No caso, cuida-se <strong>do</strong> contrato para a aquisição <strong>de</strong> uma máquina <strong>de</strong> bordar<br />

entabula<strong>do</strong> entre a empresa fabricante e a pessoa física que utiliza o bem para sua sobrevivência e <strong>de</strong> sua família, o que <strong>de</strong>monstra<br />

sua vulnerabilida<strong>de</strong> econômica. Destarte, correta a aplicação das regras <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, a impor a nulida<strong>de</strong> da cláusula<br />

<strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro que dificulta o livre acesso <strong>do</strong> hipossuficiente ao Judiciário. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: REsp 541.867-BA, DJ<br />

16.05.2005; REsp 1.080.719-MG, DJe 17.08.2009; REsp 660.026-RJ, DJ 27.06.2005; REsp 684.613-SP, DJ 1º.07.2005; REsp<br />

669.990-CE, DJ 11.09.2006, e CC 48.647-RS, DJ 05.12.2005” (STJ – REsp 1.010.834-GO – Rel. Min. Nancy Andrighi – j.<br />

03.08.2010).


Deve ficar claro que, para o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, a hipossuficiência ou vulnerabilida<strong>de</strong> (a última, conforme as<br />

<strong>de</strong>cisões) <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>vidamente <strong>de</strong>monstrada para que se mitigue a teoria finalista. Nesse senti<strong>do</strong>, <strong>de</strong>cisão extraída <strong>do</strong> seu<br />

Informativo n. 236:<br />

“Em ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais e materiais, a empresa alega a suspensão in<strong>de</strong>vida <strong>do</strong> fornecimento <strong>de</strong> energia elétrica<br />

pela concessionária. Por outro la<strong>do</strong>, a ré sustentou preliminares <strong>de</strong> ilegitimida<strong>de</strong> ativa, incompetência da vara <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r por não existir relação <strong>de</strong> consumo e inépcia da inicial. O Tribunal a quo manteve a <strong>de</strong>cisão agravada que rejeitou as<br />

preliminares. Daí o REsp da concessionária ré. A Turma, em princípio, examinou a questão relativa à admissibilida<strong>de</strong> e<br />

processamento <strong>de</strong>sse REsp e reconheceu que, como a discussão versa sobre competência, po<strong>de</strong>ria influenciar to<strong>do</strong> o curso<br />

processual, justifican<strong>do</strong>, pela excepcionalida<strong>de</strong>, o julgamento <strong>do</strong> REsp, sem que ele permanecesse reti<strong>do</strong>, conforme tem admiti<strong>do</strong> a<br />

jurisprudência. A Turma também reconheceu a legitimida<strong>de</strong> ativa da recorrida, pois cabe à locatária, no caso a empresa, o<br />

pagamento das <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> luz (art. 23 da Lei <strong>do</strong> Inquilinato). Mas proveu o recurso quanto à inexistência <strong>de</strong> consumo e a<br />

consequente incompetência da vara especializada em <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Argumentou-se que a pessoa jurídica com fins<br />

lucrativos caracteriza-se, na hipótese, como consumi<strong>do</strong>ra intermediária e a uniformização infraconstitucional da Segunda Seção<br />

<strong>de</strong>ste Superior Tribunal perfilhou-se à orientação <strong>do</strong>utrinária finalista ou subjetiva, na qual o consumi<strong>do</strong>r requer a proteção da lei. O<br />

Min. Relator ressaltou que existe um certo abrandamento na interpretação finalista a <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res profissionais,<br />

como pequenas empresas e profissionais liberais, ten<strong>do</strong> em vista a hipossuficiência. Entretanto, no caso concreto, a questão da<br />

hipossuficiência da empresa recorrida em momento algum restou reconhecida nas instâncias ordinárias. Isso posto, a Turma<br />

reconheceu a nulida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s atos processuais pratica<strong>do</strong>s e <strong>de</strong>terminou a distribuição <strong>do</strong> processo a um <strong>do</strong>s juízos cíveis da comarca.<br />

Prece<strong>de</strong>nte cita<strong>do</strong>: REsp 541.867-BA” (STJ – REsp 661.145/ES – Rel. Min. Jorge Scartezzini – j. 22.02.2005).<br />

Do mesmo mo<strong>do</strong>, julga<strong>do</strong> mais atual, que afastou a aplicação <strong>do</strong> CDC à relação contratual para aquisição <strong>de</strong> insumos para a<br />

agricultura, por se tratar <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> produtor rural. Como reconhece o próprio acórdão, a conclusão <strong>de</strong>ve ser pela existência da<br />

relação consumerista no caso <strong>de</strong> pequena agricultura <strong>de</strong> subsistência:<br />

“<strong>Direito</strong> civil. Produtor rural <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> porte. Compra e venda <strong>de</strong> insumos agrícolas. Revisão <strong>de</strong> contrato. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. Não aplicação. Destinação final inexistente. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova. Impossibilida<strong>de</strong>. Prece<strong>de</strong>ntes. Recurso especial<br />

parcialmente provi<strong>do</strong>. I. Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> produtor rural e o contrato referin<strong>do</strong>-se, na sua origem, à compra <strong>de</strong> insumos<br />

agrícolas, não se aplica o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, pois não se trata <strong>de</strong> <strong>de</strong>stinatário final, conforme bem estabelece o art. 2º<br />

<strong>do</strong> CDC, in verbis: ‘Consumi<strong>do</strong>r é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como <strong>de</strong>stinatário final’.<br />

II. Não haven<strong>do</strong> relação <strong>de</strong> consumo, torna-se inaplicável a inversão <strong>do</strong> ônus da prova prevista no inc. VIII <strong>do</strong> art. 6º, <strong>do</strong> CDC, a<br />

qual, mesmo nas relações <strong>de</strong> consumo, não é automática ou compulsória, pois <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> criteriosa análise <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>r a fim <strong>de</strong><br />

preservar o contraditório e oferecer à parte contrária oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> provar fatos que afastem o alega<strong>do</strong> contra si. III. O gran<strong>de</strong><br />

produtor rural é um empresário rural e, quan<strong>do</strong> adquire sementes, insumos ou <strong>de</strong>fensivos agrícolas para o implemento <strong>de</strong> sua<br />

ativida<strong>de</strong> produtiva, não o faz como <strong>de</strong>stinatário final, como acontece nos casos da agricultura <strong>de</strong> subsistência, em que a relação <strong>de</strong><br />

consumo e a hipossuficiência ficam bem <strong>de</strong>lineadas. IV. De qualquer forma, embora não seja aplicável o CDC no caso <strong>do</strong>s autos,<br />

nada impe<strong>de</strong> o prosseguimento da ação com vista a se verificar a existência <strong>de</strong> eventual violação legal, contratual ou injustiça a ser<br />

reparada, agora com base na legislação comum. V. Recurso especial parcialmente provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 914.384/MT – Terceira<br />

Turma – Rel. Min. Massami Uyeda – j. 02.09.2010 – DJe 01.10.2010).<br />

Como se po<strong>de</strong> notar, o enquadramento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá da presença <strong>de</strong> uma parte qualificada como gran<strong>de</strong> ou<br />

pequena, forte ou fraca. Assim, ainda ilustran<strong>do</strong>, se um advoga<strong>do</strong> adquire insumos para seu escritório, haverá relação <strong>de</strong> consumo,<br />

mesmo sen<strong>do</strong> os bens utiliza<strong>do</strong>s para sua pequena produção. Por outra via, se um gran<strong>de</strong> escritório adquire tais insumos, não<br />

haverá relação <strong>de</strong> consumo. Do mesmo mo<strong>do</strong>, o raciocínio serve para o médico que adquire seringas (pela relação <strong>de</strong> consumo) e<br />

para o hospital que faz o mesmo (pela não existência da relação <strong>de</strong> consumo). Fica então a dúvida a respeito da situação em que o<br />

adquirente tem um porte médio. Em casos tais, tu<strong>do</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>r, se ele é um jurista maximalista ou não. Na verda<strong>de</strong>, no<br />

último caso, po<strong>de</strong>-se falar em um posicionamento minimalista, pouco explora<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>utrina, mas existente.<br />

A encerrar a exposição a respeito da teoria em questão, didático julgamento <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2012 expõe muito bem quais os limites<br />

<strong>do</strong> finalismo aprofunda<strong>do</strong>. De acor<strong>do</strong> com a publicação constante <strong>do</strong> Informativo n. 510 <strong>do</strong> STJ, “a <strong>de</strong>terminação da qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve, em regra, ser feita mediante aplicação da teoria finalista, que, numa exegese restritiva <strong>do</strong> art. 2º <strong>do</strong> CDC,<br />

consi<strong>de</strong>ra <strong>de</strong>stinatário final tão somente o <strong>de</strong>stinatário fático e econômico <strong>do</strong> bem ou serviço, seja ele pessoa física ou jurídica.<br />

Dessa forma, fica excluí<strong>do</strong> da proteção <strong>do</strong> CDC o consumo intermediário, assim entendi<strong>do</strong> como aquele cujo produto retorna para<br />

as ca<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> produção e distribuição, compon<strong>do</strong> o custo (e, portanto, o preço final) <strong>de</strong> um novo bem ou serviço. Vale dizer, só<br />

po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, para fins <strong>de</strong> tutela pelo CDC, aquele que exaure a função econômica <strong>do</strong> bem ou serviço,<br />

excluin<strong>do</strong>-o <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>finitiva <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo. Todavia, a jurisprudência <strong>do</strong> STJ, toman<strong>do</strong> por base o conceito <strong>de</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r por equiparação previsto no art. 29 <strong>do</strong> CDC, tem evoluí<strong>do</strong> para uma aplicação temperada da teoria finalista frente às<br />

pessoas jurídicas, num processo que a <strong>do</strong>utrina vem <strong>de</strong>nominan<strong>do</strong> ‘finalismo aprofunda<strong>do</strong>’. Assim, tem se admiti<strong>do</strong> que, em


<strong>de</strong>terminadas hipóteses, a pessoa jurídica adquirente <strong>de</strong> um produto ou serviço possa ser equiparada à condição <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>ra,<br />

por apresentar frente ao fornece<strong>do</strong>r alguma vulnerabilida<strong>de</strong>, que constitui o princípio-motor da política nacional das relações <strong>de</strong><br />

consumo, premissa expressamente fixada no art. 4º, I, <strong>do</strong> CDC, que legitima toda a proteção conferida ao consumi<strong>do</strong>r. A <strong>do</strong>utrina<br />

tradicionalmente aponta a existência <strong>de</strong> três modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong>: técnica (ausência <strong>de</strong> conhecimento específico acerca<br />

<strong>do</strong> produto ou serviço objeto <strong>de</strong> consumo), jurídica (falta <strong>de</strong> conhecimento jurídico, contábil ou econômico e <strong>de</strong> seus reflexos na<br />

relação <strong>de</strong> consumo) e fática (situações em que a insuficiência econômica, física ou até mesmo psicológica <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r o coloca<br />

em pé <strong>de</strong> <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> frente ao fornece<strong>do</strong>r). Mais recentemente, tem se incluí<strong>do</strong> também a vulnerabilida<strong>de</strong> informacional (da<strong>do</strong>s<br />

insuficientes sobre o produto ou serviço capazes <strong>de</strong> influenciar no processo <strong>de</strong>cisório <strong>de</strong> compra). Além disso, a casuística po<strong>de</strong>rá<br />

apresentar novas formas <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> aptas a atrair a incidência <strong>do</strong> CDC à relação <strong>de</strong> consumo. Numa relação<br />

interempresarial, para além das hipóteses <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> já consagradas pela <strong>do</strong>utrina e pela jurisprudência, a relação <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> uma das partes frente à outra po<strong>de</strong>, conforme o caso, caracterizar uma vulnerabilida<strong>de</strong> legitima<strong>do</strong>ra da aplicação <strong>do</strong><br />

CDC, mitigan<strong>do</strong> os rigores da teoria finalista e autorizan<strong>do</strong> a equiparação da pessoa jurídica compra<strong>do</strong>ra à condição <strong>de</strong><br />

consumi<strong>do</strong>ra” (STJ – REsp 1.195.642/RJ – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 13.11.2012).<br />

O julgamento é louvável, por também levar em conta a <strong>de</strong>pendência econômica nas relações interempresariais como um<br />

critério amplia<strong>do</strong>r das relações <strong>de</strong> consumo. Lamenta-se apenas a utilização <strong>do</strong> termo “vulnerabilida<strong>de</strong>”, pois, na opinio <strong>de</strong>ste<br />

autor, o que há <strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> é a hipossuficiência – conceito fático –, e não a vulnerabilida<strong>de</strong> – conceito jurídico <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong><br />

uma presunção absoluta da condição <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

d) Teoria minimalista<br />

A par das teorias relativas ao consumi<strong>do</strong>r, po<strong>de</strong> ser exposta uma corrente chamada <strong>de</strong> minimalista, que não vê a existência da<br />

relação <strong>de</strong> consumo em casos em que ela po<strong>de</strong> ser claramente percebida. Entre os a<strong>de</strong>ptos <strong>de</strong>ssa corrente, po<strong>de</strong>m ser cita<strong>do</strong>s<br />

aqueles que enten<strong>de</strong>m que não haveria uma relação <strong>de</strong> consumo entre banco e correntista, o que po<strong>de</strong> ser claramente percebi<strong>do</strong> da<br />

leitura <strong>do</strong> art. 3º, § 2º, da Lei 8.078/1990, segun<strong>do</strong> o qual o serviço <strong>de</strong> crédito é abrangi<strong>do</strong> pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>.<br />

Dessa forma se posicionavam os juristas Ives Gandra da Silva Martins e Arnol<strong>do</strong> Wald, signatários da petição inicial da ADIn<br />

2.591, que pretendia afastar a incidência das normas consumeristas para os contratos bancários.<br />

Para o bem, o Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral acabou por enten<strong>de</strong>r <strong>de</strong> forma contrária ao pedi<strong>do</strong>, confirman<strong>do</strong> o que já constava da<br />

Súmula 297 <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, in verbis: “O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é aplicável às instituições<br />

financeiras”. A corrente minimalista restou, assim, totalmente <strong>de</strong>rrotada no âmbito <strong>do</strong>s nossos Tribunais.<br />

De toda sorte, anote-se que alguns julga<strong>do</strong>s apontam ser a teoria minimalista sinônima da teoria finalista, em questões<br />

envolven<strong>do</strong> justamente os contratos bancários:<br />

“Contrato bancário. Relação <strong>de</strong> consumo. Destinatário final. Art. 2º <strong>do</strong> CDC. Não caracterização. Teoria minimalista ou finalista.<br />

Não caracterizada a condição <strong>de</strong> <strong>de</strong>stinatário final, não há que se falar em aplicação das regras contidas na Lei <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Negócios jurídicos bancários que tinham por finalida<strong>de</strong> fomentar as ativida<strong>de</strong>s empresariais <strong>de</strong>senvolvidas pela empresa coapelante.<br />

Inexistência <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo. Negócios bancários que não foram celebra<strong>do</strong>s por empresa na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>stinatária final.<br />

Juros remuneratórios. Não <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> efetiva contratação. Limitação <strong>do</strong>s juros remuneratórios à taxa média <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> à<br />

época da contratação. Prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> STJ. Comissão <strong>de</strong> permanência. Possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não cumulada com<br />

outros encargos. Renovação automática <strong>do</strong> contrato. Possibilida<strong>de</strong>. Autores que não <strong>de</strong>monstraram a intenção <strong>de</strong> impedir a<br />

renovação da avença. Sentença mantida. Recursos não provi<strong>do</strong>s” (TJSP – Apelação 0008514-82.2008.8.26.0576 – Acórdão<br />

4981658, São José <strong>do</strong> Rio Preto – Trigésima Sétima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Roberto Nussinkis Mac Cracken – j.<br />

10.02.2011 – DJESP 16.03.2011).<br />

“Cédula <strong>de</strong> credito bancário. Alegação <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> perícia. A matéria discutida em juízo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> interpretação <strong>de</strong> cláusula<br />

<strong>de</strong> negócio jurídico bancário. Desnecessária a produção <strong>de</strong> outras provas, além daquelas já existentes nos autos. Preliminar afastada.<br />

Cédula <strong>de</strong> crédito bancário. Relação <strong>de</strong> consumo. Destinatário final. Art. 2º <strong>do</strong> CDC. Não caracterização. Teoria minimalista ou<br />

finalista. Não caracterizada a condição <strong>de</strong> <strong>de</strong>stinatário final, não há que se falar em aplicação das regras contidas na Lei <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. Cédula <strong>de</strong> crédito bancário <strong>de</strong> capital <strong>de</strong> giro que tem por finalida<strong>de</strong> fomentar as ativida<strong>de</strong>s empresariais <strong>de</strong>senvolvidas<br />

pela empresa coapelante. Inexistência <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo. Negócio bancário que não foi celebra<strong>do</strong> por empresa na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>stinatária final. Se não impugna<strong>do</strong> ou discuti<strong>do</strong> no momento apropria<strong>do</strong> não autoriza ao julga<strong>do</strong>r seu conhecimento <strong>de</strong> ofício.<br />

Súmula 381 <strong>do</strong> STJ. Recurso não provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação Cível 990.10.164057-0 – Acórdão 4821431, Bragança Paulista –<br />

Trigésima Sétima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Roberto Nussinkis Mac Cracken – j. 11.11.2010 – DJESP 14.12.2010).<br />

A conclusão da comparação das teorias finalista e minimalista parece representar um engano. Além disso, diante <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s<br />

transcritos, <strong>de</strong>ve ser feita a ressalva <strong>de</strong> que algumas <strong>de</strong>cisões aplicam a teoria maximalista – ou a teoria finalista aprofundada – nas<br />

hipóteses em que pequenas empresas ou empresários individuais celebram contratos <strong>de</strong> empréstimos para obter capital para a sua<br />

ativida<strong>de</strong>. Vejamos:


“Contrato. CDC. Pessoa jurídica. Crédito rotativo (cheque especial). Aplicabilida<strong>de</strong>. Contrato. Abertura <strong>de</strong> crédito em conta<br />

corrente. Juros contratuais. Admissibilida<strong>de</strong>. Norma constitucional que os fixou em limite não superior a 12% ao ano não é regra<br />

autoaplicável. Tipo <strong>de</strong> operação bancária pactuada não segue a limitação <strong>do</strong> Decreto 22.626/1933. Anatocismo. Inadmissibilida<strong>de</strong>.<br />

Súmulas 121 <strong>do</strong> STF e 93 <strong>do</strong> STJ. A cobrança <strong>de</strong> juros capitaliza<strong>do</strong>s somente é viável quan<strong>do</strong> houver permissão legal, como é o<br />

caso das cédulas <strong>de</strong> crédito comercial, industrial e rural. Exclusão. Cabimento. Comissão <strong>de</strong> permanência, quan<strong>do</strong> pactuada, não<br />

po<strong>de</strong> ultrapassar o limite <strong>do</strong>s juros contratuais, <strong>de</strong> 6,50% ao mês, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> haver cobrança cumulativa das duas verbas.<br />

Honorários <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong>. Sucumbência. Reciprocida<strong>de</strong>. Ocorrência. Ação revisional parcialmente proce<strong>de</strong>nte. Recurso provi<strong>do</strong> em<br />

parte” (TJSP – Apelação Cível 1278319200, São Carlos – Vigésima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Álvaro Torres Júnior – j.<br />

11.08.2008 – Data <strong>de</strong> registro 20.08.2008).<br />

“Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Lei 8.078, <strong>de</strong> 11.09.1990. Empréstimo bancário. Aplicabilida<strong>de</strong>. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova<br />

<strong>de</strong>terminada, ex officio. Possibilida<strong>de</strong>. O toma<strong>do</strong>r <strong>de</strong> empréstimo é consumi<strong>do</strong>r para os efeitos <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Súmula 297 <strong>do</strong> Colen<strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça. Recurso parcialmente provi<strong>do</strong>. Monitória. Contrato. Abertura <strong>de</strong> crédito<br />

rotativo em conta corrente. Pessoa jurídica. Cheque empresa. Valor <strong>de</strong> R$ 13.000,00, firma<strong>do</strong> em 02.07.2003. A comissão <strong>de</strong><br />

permanência e a correção monetária não são cumuláveis (Súmula 30, <strong>do</strong> STJ). Pactuaram-se juros remuneratórios ou<br />

compensatórios à taxa <strong>de</strong> 8,95% ao mês ou <strong>de</strong> 111,71% ao ano no caso <strong>de</strong> impontualida<strong>de</strong>. Comissão <strong>de</strong> permanência à taxa vigente<br />

no merca<strong>do</strong> financeiro, juros <strong>de</strong> mora <strong>de</strong> 12% ao ano e multa <strong>de</strong> 2% (cláusula 6ª <strong>do</strong> contrato). Com a edição da MP 1.963-17, <strong>de</strong><br />

30.03.2000, atualmente reeditada sob o n. 2.170-26/2001, passou-se a admitir a capitalização mensal nos contratos firma<strong>do</strong>s<br />

posteriormente à sua entrada em vigor, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que houvesse previsão contratual. Vedada a comissão <strong>de</strong> permanência cumulada com<br />

os juros moratórios e com a multa contratual, a<strong>de</strong>mais <strong>de</strong> não permitir sua cumulação com a correção monetária e com os juros<br />

remuneratórios, a teor das Súmulas 30, 294 e 296, <strong>do</strong> Colen<strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça. A comissão <strong>de</strong> permanência é permitida<br />

à base da taxa média <strong>do</strong>s juros <strong>de</strong> merca<strong>do</strong> apurada pelo Banco Central <strong>do</strong> Brasil, mas não po<strong>de</strong> ultrapassar o que foi pactua<strong>do</strong><br />

(Súmula 296 <strong>do</strong> Colen<strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça). Recurso parcialmente provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação Cível 7193448-8 –<br />

Acórdão 2632182, Ourinhos – Décima Nona Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Paulo Hatanaka – j. 29.04.2008 – DJESP<br />

23.06.2008).<br />

Ato contínuo, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça já enten<strong>de</strong>u da mesma forma em hipótese <strong>de</strong> empréstimo <strong>de</strong> dinheiro, para a<br />

aquisição <strong>de</strong> máquina produtiva por uma pequena empresa:<br />

“Contratos bancários. Contrato <strong>de</strong> repasse <strong>de</strong> empréstimo externo para compra <strong>de</strong> colheita<strong>de</strong>ira. Agricultor. Destinatário final.<br />

Incidência. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Comprovação. Captação <strong>de</strong> recursos. Matéria <strong>de</strong> prova. Prequestionamento.<br />

Ausência. I. O agricultor que adquire bem móvel com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> utilizá-lo em sua ativida<strong>de</strong> produtiva <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>stinatário final, para os fins <strong>do</strong> art. 2º <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. II. Aplica-se o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r às<br />

relações jurídicas originadas <strong>do</strong>s pactos firma<strong>do</strong>s entre os agentes econômicos, as instituições financeiras e os usuários <strong>de</strong> seus<br />

produtos e serviços. III. Afirma<strong>do</strong> pelo acórdão recorri<strong>do</strong> que não ficou provada a captação <strong>de</strong> recursos externos, rever esse<br />

entendimento encontra óbice no enuncia<strong>do</strong> n. 7 da Súmula <strong>de</strong>sta Corte. IV. Ausente o prequestionamento da questão fe<strong>de</strong>ral<br />

suscitada, é inviável o recurso especial (Súmulas 282 e 356/STF). Recurso especial não conheci<strong>do</strong>, com ressalvas quanto à<br />

terminologia” (STJ – REsp 445.854/MS – Terceira Turma – Rel. Min. Castro Filho – j. 02.12.2003 – DJ 19.12.2003, p. 453).<br />

O raciocínio <strong>de</strong>ve ser o mesmo nos casos <strong>de</strong> contratos <strong>de</strong> “factoring” celebra<strong>do</strong>s por pequenas empresas, visan<strong>do</strong> o incremento<br />

<strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong> pelo crédito obti<strong>do</strong>. De qualquer forma, <strong>de</strong>staque-se acórdão <strong>do</strong> STJ, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2012, segun<strong>do</strong> o qual tal relação<br />

jurídica não se enquadraria, como regra, nos elementos da relação <strong>de</strong> consumo, salvo os casos <strong>de</strong> patente vulnerabilida<strong>de</strong> ou<br />

hipossuficiência: “A ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> factoring não se submete às regras <strong>do</strong> CDC quan<strong>do</strong> não for evi<strong>de</strong>nte a situação <strong>de</strong><br />

vulnerabilida<strong>de</strong> da pessoa jurídica contratante. Isso porque as empresas <strong>de</strong> factoring não são instituições financeiras nos termos <strong>do</strong><br />

art. 17 da Lei n. 4.595/1964, pois os recursos envolvi<strong>do</strong>s não foram capta<strong>do</strong>s <strong>de</strong> terceiros. Assim, ausente o trinômio inerente às<br />

ativida<strong>de</strong>s das instituições financeiras: coleta, intermediação e aplicação <strong>de</strong> recursos. Além disso, a empresa contratante não está<br />

em situação <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong>, o que afasta a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rá-la consumi<strong>do</strong>ra por equiparação (art. 29 <strong>do</strong> CDC). Por<br />

fim, conforme a jurisprudência <strong>do</strong> STJ, a obtenção <strong>de</strong> capital <strong>de</strong> giro não está submetida às regras <strong>do</strong> CDC. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s:<br />

REsp 836.823-PR, DJe 23.08.2010; AgRg no Ag 1.071.538-SP, DJe 18.02.2009; REsp 468.887-MG, DJe 17.05.2010; AgRg no<br />

Ag 1.316.667-RO, DJe 11.03.2011, e AgRg no REsp 956.201-SP, DJe 24.08.2011” (STJ – REsp 938.979-DF – Rel. Min. Luis<br />

Felipe Salomão – j. 19.06.2012, publicação no seu Informativo n. 500).<br />

A encerrar o presente tópico, cumpre analisar o conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> ou bystan<strong>de</strong>r, tão difundi<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>utrina<br />

e pela jurisprudência, retira<strong>do</strong> <strong>do</strong>s arts. 2º, parágrafo único, 17 e 29 da Lei 8.078/1990. Como se nota, três são as variantes legais da<br />

construção.<br />

Deve ficar claro que os requisitos até o presente momento aborda<strong>do</strong>s se referem ao consumi<strong>do</strong>r padrão (stan<strong>de</strong>r) ou em senti<strong>do</strong><br />

estrito (stricto sensu). Entretanto, há um senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> ampliação natural pela Lei Consumerista, ao consi<strong>de</strong>rar como consumi<strong>do</strong>r a<br />

coletivida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pessoas, ainda que in<strong>de</strong>termináveis, que haja intervin<strong>do</strong> nas relações <strong>de</strong> consumo. Esse é o primeiro conceito <strong>de</strong>


consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> ou por equiparação, retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 2º, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC. Como bem pon<strong>de</strong>ra José Geral<strong>do</strong> Brito<br />

Filomeno, “é a universalida<strong>de</strong>, conjunto <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos e serviços, ou mesmo grupo, classe ou categoria <strong>de</strong>les, e<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> que relaciona<strong>do</strong>s a um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> produto ou serviço, perspectiva essa extremamente relevante e realista, porquanto é<br />

natural que se previna, por exemplo, o consumo <strong>de</strong> produtos e serviços perigosos ou então nocivos, benefician<strong>do</strong>-se, assim,<br />

abstratamente as referidas universalida<strong>de</strong>s e categorias <strong>de</strong> potenciais consumi<strong>do</strong>res. Ou, então, se já provoca<strong>do</strong> o dano efetivo pelo<br />

consumo <strong>de</strong> tais produtos ou serviços, o que se preten<strong>de</strong> é conferir à universalida<strong>de</strong> ou grupo <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s<br />

instrumentos jurídico-processuais para que possa obter a justa e mais completa possível reparação <strong>do</strong>s responsáveis”.22<br />

Subsumin<strong>do</strong> a última i<strong>de</strong>ia, colaciona-se interessante julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal Fluminense, em situação envolven<strong>do</strong> a emissão <strong>de</strong><br />

poluentes acima <strong>do</strong> aceitável por uma empresa, a causar danos potenciais à coletivida<strong>de</strong>:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Dano moral. Vazamento <strong>de</strong> substância química (catalisa<strong>do</strong>r) <strong>de</strong> unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> refino <strong>de</strong> petróleo. Princípio da<br />

precaução. A Lei Consumerista i<strong>de</strong>ntifica, além <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r stricto sensu (standard), como <strong>de</strong>fini<strong>do</strong> no art. 2º <strong>do</strong> CDC, o terceiro<br />

que não participa diretamente da relação <strong>de</strong> consumo, ou seja, to<strong>do</strong> aquele que se encontre na condição <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>,<br />

ou, segun<strong>do</strong> a indicação alienígena, bystan<strong>de</strong>r. O Código passa a ter, assim, múltiplos conceitos <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r: um geral (art. 2º,<br />

caput) e três outros por equiparação (arts. 2º, parágrafo único, 17 e 29). São, pois, equipara<strong>do</strong>s ao consumi<strong>do</strong>r standard: a<br />

coletivida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pessoas, ainda que in<strong>de</strong>termináveis, que haja intervin<strong>do</strong> nas relações <strong>de</strong> consumo (parágrafo único <strong>do</strong> art. 2º), todas<br />

as vítimas <strong>do</strong> evento (art. 17) e todas as pessoas, <strong>de</strong>termináveis ou não, expostas às práticas nele previstas (art. 29). Portanto, a<br />

situação prevista em que a coletivida<strong>de</strong> se encontra, potencialmente, na iminência <strong>de</strong> sofrer dano não provoca<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ixa evi<strong>de</strong>nciada a<br />

incidência das normas protetivas <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Os diversos <strong>de</strong>sastres tecnológicos <strong>de</strong> que os homens são<br />

responsáveis, como a contaminação das águas, <strong>do</strong> ar e a ameaça à camada <strong>de</strong> ozônio, assim como os problemas ocorri<strong>do</strong>s no âmbito<br />

da saú<strong>de</strong> e segurança alimentar, têm chama<strong>do</strong> a atenção <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s acerca da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser a<strong>do</strong>tada uma atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> maior<br />

prudência no uso das tecnologias hoje disponibilizadas. Os sentimentos e frustrações experimenta<strong>do</strong>s pelo autor durante to<strong>do</strong> o<br />

perío<strong>do</strong> que se seguiu a divulgação <strong>de</strong> que tal nuvem não tinha qualquer toxida<strong>de</strong>, pelo menos é o que ainda se presume, foram, sem<br />

qualquer dúvida, a causa direta <strong>do</strong> dano moral reclama<strong>do</strong>. Viveu o autor dias muito angustiantes, amargan<strong>do</strong> sofrimentos e<br />

inquietações, que foram além <strong>do</strong> âmbito familiar. Evi<strong>de</strong>nte, portanto, que o dano moral injusto causa<strong>do</strong> ao autor, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente<br />

<strong>de</strong> qualquer lesão física, gerou a <strong>do</strong>r e o sofrimento, vinculan<strong>do</strong> o responsável ao <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Provimento <strong>do</strong> recurso” (TJRJ<br />

– Acórdão 2006.001.69259 – Primeira Câmara Cível – Rel. Des. Mal<strong>do</strong>na<strong>do</strong> <strong>de</strong> Carvalho – j. 13.03.2007).<br />

Como se extrai da ementa da <strong>de</strong>cisão, há ainda outros <strong>do</strong>is conceitos <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>. De início, para os fins <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> civil, o art. 17 <strong>do</strong> CDC consi<strong>de</strong>ra consumi<strong>do</strong>r qualquer vítima da relação <strong>de</strong> consumo. O tema ainda será<br />

aprofunda<strong>do</strong> no próximo capítulo da obra. Todavia, <strong>de</strong> imediato, interessante expor uma ilustração, envolven<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> STJ que<br />

<strong>de</strong>terminou ser consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> o proprietário <strong>de</strong> uma residência sobre a qual caiu um avião:<br />

“Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Aci<strong>de</strong>nte aéreo. Transporte <strong>de</strong> malotes. Relação <strong>de</strong> consumo. Caracterização. Responsabilida<strong>de</strong><br />

pelo fato <strong>do</strong> serviço. Vítima <strong>do</strong> evento. Equiparação a consumi<strong>do</strong>r. Art. 17 <strong>do</strong> CDC. I. Resta caracterizada relação <strong>de</strong> consumo se a<br />

aeronave que caiu sobre a casa das vítimas realizava serviço <strong>de</strong> transporte <strong>de</strong> malotes para um <strong>de</strong>stinatário final, ainda que pessoa<br />

jurídica, uma vez que o art. 2º <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r não faz tal distinção, <strong>de</strong>finin<strong>do</strong> como consumi<strong>do</strong>r, para os fins<br />

protetivos da lei, ‘… toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como <strong>de</strong>stinatário final’. Abrandamento<br />

<strong>do</strong> rigor técnico <strong>do</strong> critério finalista. II. Em <strong>de</strong>corrência, pela aplicação conjugada com o art. 17 <strong>do</strong> mesmo diploma legal, cabível,<br />

por equiparação, o enquadramento <strong>do</strong> autor, atingi<strong>do</strong> em terra, no conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r. Logo, em tese, admissível a inversão <strong>do</strong><br />

ônus da prova em seu favor. Recurso especial provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 540.235/TO – Terceira Turma – Rel. Min. Castro Filho – DJ<br />

06.03.2006).<br />

Do mesmo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, cite-se ementa <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2012, que concluiu ser consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> o sujeito que<br />

foi vítima <strong>de</strong> um anúncio sexual realiza<strong>do</strong> pela internet. Vejamos a publicação no Informativo n. 500 daquela Corte:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Prove<strong>do</strong>r <strong>de</strong> Internet. Anúncio erótico. O recorrente ajuizou ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais contra<br />

a primeira recorrida por ter-se utiliza<strong>do</strong> <strong>do</strong> seu sítio eletrônico, na re<strong>de</strong> mundial <strong>de</strong> computa<strong>do</strong>res, para veicular anúncio erótico no<br />

qual aquele ofereceria serviços sexuais, constan<strong>do</strong> para contato o seu nome e en<strong>de</strong>reço <strong>de</strong> trabalho. A primeira recorrida, em<br />

contestação, alegou que não disseminou o anúncio, pois assinara contrato <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> conteú<strong>do</strong> com a segunda recorrida,<br />

empresa <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong>, no qual ficou estipula<strong>do</strong> que aquela hospedaria, no seu sítio eletrônico, o site <strong>de</strong>sta, entabulan<strong>do</strong> cláusula<br />

<strong>de</strong> isenção <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> sobre todas as informações divulgadas. Para a Turma, o recorrente <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r por equiparação, art. 17 <strong>do</strong> CDC, ten<strong>do</strong> em vista se tratar <strong>de</strong> terceiro atingi<strong>do</strong> pela relação <strong>de</strong> consumo estabelecida<br />

entre o prove<strong>do</strong>r <strong>de</strong> internet e os seus usuários. Segun<strong>do</strong> o CDC, existe solidarieda<strong>de</strong> entre to<strong>do</strong>s os fornece<strong>do</strong>res que participaram<br />

da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> serviço, comprovan<strong>do</strong>-se a responsabilida<strong>de</strong> da segunda recorrida, que divulgou o anúncio <strong>de</strong> cunho<br />

erótico e homossexual, também está configurada a responsabilida<strong>de</strong> da primeira recorrida, site hospe<strong>de</strong>iro, por imputação legal<br />

<strong>de</strong>corrente da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> consumo ou pela culpa in eligen<strong>do</strong>, em razão da parceria comercial. A<strong>de</strong>mais, é inócua a limitação <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> civil prevista contratualmente, pois não possui força <strong>de</strong> revogar lei em senti<strong>do</strong> formal” (STJ – REsp 997.993/MG


– Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 21.06.2012).<br />

Nos termos <strong>de</strong> publicação constante da ferramenta Jurisprudência em Teses, <strong>do</strong> STJ e em 2015 (Edição n. 39), “consi<strong>de</strong>ra-se<br />

consumi<strong>do</strong>r por equiparação (bystan<strong>de</strong>r), nos termos <strong>do</strong> art. 17 <strong>do</strong> CDC, o terceiro estranho à relação consumerista que<br />

experimenta prejuízos <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> produto ou serviço vincula<strong>do</strong> à mencionada relação, bem como, a teor <strong>do</strong> art. 29, as pessoas<br />

<strong>de</strong>termináveis ou não expostas às práticas previstas nos arts. 30 a 54 <strong>do</strong> referi<strong>do</strong> Código” (premissa n. 12).<br />

Assim, como se conclui pela análise <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s expostos e da última ementa, o senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> ampliação <strong>de</strong> incidência da Lei<br />

Consumerista é bem consi<strong>de</strong>rável, <strong>de</strong>dução retirada também <strong>do</strong> art. 29 <strong>do</strong> CDC, segun<strong>do</strong> o qual se equiparam aos consumi<strong>do</strong>res<br />

todas as pessoas, <strong>de</strong>termináveis ou não, expostas às práticas comerciais e empresariais nele previstas. O último dispositivo, que<br />

consagra o último conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>, tem incidência para as relações contratuais, conforme <strong>de</strong>talhamentos<br />

constantes <strong>do</strong> Capítulo 5 <strong>de</strong>ste livro.<br />

Expostos os elementos subjetivos da relação <strong>de</strong> consumo, vejamos os seus elementos objetivos, que formam o seu conteú<strong>do</strong> ou<br />

a sua prestação.<br />

3.3.<br />

3.3.1.<br />

ELEMENTOS OBJETIVOS DA RELAÇÃO DE CONSUMO<br />

Produto<br />

Nos termos literais <strong>do</strong> art. 3º, § 1º, da Lei 8.078/1990, produto é qualquer bem móvel ou imóvel material ou imaterial coloca<strong>do</strong><br />

no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo (mass consumption society). Como bem <strong>de</strong>monstra Luiz Antonio Rizzatto Nunes, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r não a<strong>de</strong>ntrou na gran<strong>de</strong> divergência existente entre os civilistas, a respeito <strong>do</strong>s conceitos <strong>de</strong> bens e coisas, preferin<strong>do</strong><br />

utilizar o termo produto. São suas palavras:<br />

“Esse conceito <strong>de</strong> produto é universal nos dias atuais e está estreitamente liga<strong>do</strong> à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> bem, resulta<strong>do</strong> da produção no merca<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong> consumo das socieda<strong>de</strong>s capitalistas contemporâneas. É vantajoso o seu uso, pois o conceito passa a valer no meio jurídico e já<br />

era usa<strong>do</strong> por to<strong>do</strong>s os <strong>de</strong>mais agentes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> (econômico, financeiro, <strong>de</strong> comunicações etc.)”.23<br />

Apesar da pontuação <strong>do</strong> jurista, constata-se que a Lei 8.078/1990 utilizou o termo bem, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> ser uma coisa – algo que<br />

não é humano –, com interesse econômico e/ou jurídico, construção que é seguida por este autor. 24 De acor<strong>do</strong> com a Lei<br />

Consumerista, o produto po<strong>de</strong> ser um bem móvel ou imóvel, diferenciação clássica <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, que consta entre os arts. 79<br />

e 84 <strong>do</strong> Código Civil Brasileiro.<br />

O bem móvel é aquele que po<strong>de</strong> ser transporta<strong>do</strong> sem prejuízo <strong>de</strong> sua integrida<strong>de</strong>, caso <strong>de</strong> um automóvel, que po<strong>de</strong> ser o<br />

conteú<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma relação <strong>de</strong> consumo, como na aquisição <strong>de</strong> automóvel para uso próprio em uma concessionária <strong>de</strong> veículos, seja<br />

ele novo ou usa<strong>do</strong>. Por outra via, o bem imóvel é aquele cujo transporte ou remoção implica <strong>de</strong>struição ou <strong>de</strong>terioração<br />

consi<strong>de</strong>rável, hipótese <strong>de</strong> um apartamento, que, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, po<strong>de</strong> ser o objeto <strong>de</strong> uma relação <strong>de</strong> consumo, como presente em<br />

negócios <strong>de</strong> incorporação imobiliária (nesse senti<strong>do</strong>: STJ – REsp 334.829/DF – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j.<br />

06.11.2001 – DJ 04.02.2002, p. 354). E isso ocorre inclusive se a incorporação for realizada por cooperativas especializadas (por<br />

to<strong>do</strong>s: STJ – REsp 403.189/DF – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 26.05.2003 – DJ 01.09.2003, p. 291).<br />

O produto po<strong>de</strong> ser um bem material (corpóreo ou tangível) ou imaterial (incorpóreo ou intangível). Como ilustração <strong>do</strong><br />

primeiro, vejam-se as hipóteses agora há pouco mencionadas, <strong>de</strong> aquisição <strong>do</strong> veículo e <strong>do</strong> apartamento. Como bem imaterial,<br />

<strong>de</strong>staque-se o exemplo <strong>do</strong> lazer, que envolve uma plêia<strong>de</strong> <strong>de</strong> situações contemporâneas.<br />

De início, quanto ao lazer, consigne-se a ilustração <strong>de</strong> Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery a respeito <strong>do</strong> jogo <strong>de</strong><br />

futebol, com citação <strong>de</strong> julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal Paulista nesse senti<strong>do</strong>.25 Não se olvi<strong>de</strong> que o Estatuto <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Torce<strong>do</strong>r (Lei<br />

10.671/2003) segue a principiologia consumerista, enuncian<strong>do</strong> o seu art. 40 que “A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses e direitos <strong>do</strong>s torce<strong>do</strong>res<br />

em juízo observará, no que couber, a mesma disciplina da <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res em juízo <strong>de</strong> que trata o Título III da Lei 8.078,<br />

<strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1990”. Ainda a título exemplificativo, seguin<strong>do</strong> a sistemática <strong>de</strong> subsunção <strong>do</strong> CDC, em episódio bem<br />

conheci<strong>do</strong>:<br />

“Civil. Consumi<strong>do</strong>r. Aci<strong>de</strong>nte em estádio <strong>de</strong> futebol em jogo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão da Taça João Havelange com características <strong>de</strong> Campeonato<br />

Brasileiro da 1ª Divisão. Queda <strong>do</strong> alambra<strong>do</strong> com <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> torce<strong>do</strong>res feri<strong>do</strong>s no Estádio <strong>de</strong> S. Januário. Convincente a<br />

afirmação <strong>de</strong> que o autor foi aci<strong>de</strong>nta<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> ce<strong>de</strong>u o alambra<strong>do</strong> <strong>do</strong> estádio <strong>do</strong> Vasco da Gama, por sinal mal conserva<strong>do</strong> e<br />

quan<strong>do</strong> havia excesso <strong>de</strong> torce<strong>do</strong>res, certo <strong>de</strong> estar o autor na primeira relação <strong>de</strong> vítimas <strong>do</strong> B.O. Policial. Mas não provadas as suas<br />

lesões urge or<strong>de</strong>nar a sua in<strong>de</strong>nização por dano morais, mas em mo<strong>de</strong>rada estipulação. Prece<strong>de</strong>nte: Apelo 9.818/05, 14ª Cível”<br />

(TJRJ – Acórdão 2005.001.49550 – Décima Quarta Câmara Cível – Rel. Des. Rudi Loewenkron – j. 17.01.2006).<br />

Ainda a respeito <strong>do</strong> lazer, as casas noturnas e <strong>de</strong> espetáculos estão abrangidas pela Lei Consumerista, conforme julga<strong>do</strong>s a


seguir, relativos às conhecidas agressões praticadas nos seus interiores:<br />

“Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Agressão em casa noturna. Relação <strong>de</strong> consumo. Responsabilida<strong>de</strong> subjetiva. Julgamento extra petita.<br />

Honorários <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong>. 1. Há relação <strong>de</strong> consumo entre o cliente e a casa noturna. 2. Desnecessário enfrentar a questão da<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva prevista no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r quan<strong>do</strong> o pedi<strong>do</strong> veio também ampara<strong>do</strong> na<br />

responsabilida<strong>de</strong> subjetiva e as instâncias ordinárias i<strong>de</strong>ntificaram a negligência da casa noturna que ensejou o ato lesivo. 3. A<br />

valoração da prova diz com o erro <strong>de</strong> direito quanto ao valor <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada prova, abstratamente consi<strong>de</strong>rada, não sen<strong>do</strong> o caso <strong>do</strong>s<br />

autos em que houve exame <strong>de</strong>talha<strong>do</strong> <strong>de</strong> todas as provas produzidas, incluída a pericial, sen<strong>do</strong> certo que o fato <strong>de</strong> testemunhas terem<br />

amiza<strong>de</strong> com o autor por si só não as <strong>de</strong>squalifica quan<strong>do</strong> se sabe que também estavam no local em que ocorreu o evento danoso. 4.<br />

Não existe <strong>de</strong>cisão extra petita quan<strong>do</strong> o pedi<strong>do</strong>, embora sem a melhor técnica, menciona a perda da capacida<strong>de</strong> profissional da<br />

vítima, reconhecida nas instâncias ordinárias. 5. A exclusão <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> lucros cessantes justifica o reconhecimento da<br />

sucumbência recíproca, não se po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> falar em <strong>de</strong>caimento mínimo, aplican<strong>do</strong>-se o art. 21 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil com a<br />

redução <strong>do</strong> percentual sobre o valor da con<strong>de</strong>nação. 6. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>, em parte” (STJ – REsp 695.000/RJ –<br />

Terceira Turma – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes <strong>Direito</strong> – j. 03.04.2007 – DJU 21.05.2007, p. 571).<br />

“Apelação cível. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Agressões físicas sofridas em casa noturna. Dever <strong>de</strong> segurança. Falha <strong>do</strong> serviço.<br />

Stuttgart. Relação <strong>de</strong> consumo. Dano moral caracteriza<strong>do</strong>. Hipótese em que um cliente foi agredi<strong>do</strong> por um <strong>do</strong>s frequenta<strong>do</strong>res da<br />

danceteria, que a<strong>de</strong>ntrou arma<strong>do</strong> nas <strong>de</strong>pendências da casa noturna. A responsabilida<strong>de</strong> objetiva consagrada pelo Código <strong>de</strong> Defesa<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r somente po<strong>de</strong> ser elidida caso reste comprovada culpa exclusiva da vítima ou inexistência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito no serviço<br />

presta<strong>do</strong>. Na espécie, o <strong>de</strong>feito na prestação <strong>do</strong> serviço é evi<strong>de</strong>nte, haja vista que a revista realizada pela segurança da cervejaria foi<br />

falha, pois permitiu que um frequenta<strong>do</strong>r a<strong>de</strong>ntrasse arma<strong>do</strong> na casa noturna e agredisse involuntariamente o autor, causan<strong>do</strong> lesões<br />

corporais com estocadas <strong>de</strong> arma branca. Os estabelecimentos comerciais são responsáveis pela incolumida<strong>de</strong> física <strong>do</strong>s seus<br />

frequenta<strong>do</strong>res. Ten<strong>do</strong> em vista que a presta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> serviço atua no setor <strong>de</strong> entretenimento e diversão, ela tem a obrigação <strong>de</strong><br />

oferecer instalações a<strong>de</strong>quadas, bem como propiciar um ambiente seguro e saudável aos seus clientes, porque, haven<strong>do</strong> qualquer<br />

dano aos seus frequenta<strong>do</strong>res, <strong>de</strong>correntes da má conservação e manutenção das instalações e equipamento ou <strong>de</strong> falhas na prestação<br />

<strong>do</strong>s seus serviços, especialmente segurança, a casa noturna <strong>de</strong>verá respon<strong>de</strong>r pelo adimplemento <strong>do</strong>s prejuízos suporta<strong>do</strong>s. (…)”<br />

(TJRS – Acórdão 70035309707, Porto Alegre – Nona Câmara Cível – Rel. Des. Tasso Caubi Soares Delabary – j. 21.07.2010 –<br />

DJERS 06.08.2010).<br />

Festas populares, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, estão abrangidas pela Lei 8.078/1990, pela sistemática da questão <strong>do</strong> lazer. Assim, o caso<br />

<strong>do</strong>s ro<strong>de</strong>ios, festas típicas <strong>do</strong> interior <strong>do</strong> País (TJMT – Apelação 69.465/2009, Várzea Gran<strong>de</strong> – Terceira Câmara Cível – Rel. Des.<br />

Evandro Stábile – j. 14.12.2009 – DJMT 13.01.2010, p. 11). Citem-se, nesse contexto, as festas carnavalescas que são exploradas<br />

por profissionais da área, caso das micaretas, que são os carnavais fora <strong>de</strong> época e que reproduzem o carnaval <strong>de</strong> Salva<strong>do</strong>r, em que<br />

foliões acompanham os trios elétricos, <strong>de</strong>ntro das cordas, e pagan<strong>do</strong> pelos abadás. O emblemático acórdão a seguir, <strong>do</strong> Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 370, analisa muito bem a incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r em<br />

situações tais:<br />

“Dano moral. Morte. Micareta. Os recorri<strong>do</strong>s buscaram da socieda<strong>de</strong> promotora <strong>de</strong> eventos a in<strong>de</strong>nização por danos morais<br />

<strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> falecimento <strong>de</strong> seu filho, vítima <strong>de</strong> disparo <strong>de</strong> arma <strong>de</strong> fogo ocorri<strong>do</strong> no interior <strong>de</strong> bloco carnavalesco em que<br />

<strong>de</strong>sfilava durante uma micareta (réplica em escala menor <strong>do</strong> carnaval <strong>de</strong> Salva<strong>do</strong>r). Alegam que a morte <strong>do</strong> jovem estaria<br />

diretamente ligada à má prestação <strong>de</strong> serviços pela recorrente, visto que <strong>de</strong>ixara <strong>de</strong> fornecer a segurança a<strong>de</strong>quada ao evento,<br />

prometida quan<strong>do</strong> da comercialização <strong>do</strong>s abadás (camisolões folga<strong>do</strong>s que i<strong>de</strong>ntificam o integrante <strong>do</strong> bloco). Nesse contexto, ao<br />

sopesar as razões recursais, não há como afastar a relação <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> entre o falecimento e a má prestação <strong>do</strong> serviço. O<br />

principal serviço que faz o consumi<strong>do</strong>r pagar vultosa soma ao optar por um bloco e não a<strong>de</strong>rir à dita ‘pipoca’ (o cordão <strong>de</strong> populares<br />

que fica à margem <strong>do</strong>s blocos fecha<strong>do</strong>s) é justamente a segurança. Esse serviço, se não ofereci<strong>do</strong> da maneira esperada, tal como na<br />

hipótese <strong>do</strong>s autos, apresenta-se claramente <strong>de</strong>feituoso nos termos <strong>do</strong> art. 14, § 1º, <strong>do</strong> CDC. Diante da falha no serviço <strong>de</strong> segurança<br />

<strong>do</strong> bloco, enquanto não diligenciou impossibilitar o ingresso <strong>de</strong> pessoa porta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> arma <strong>de</strong> fogo na área <strong>de</strong>limitada por cordão <strong>de</strong><br />

isolamento aos integrantes <strong>do</strong> bloco, não há como constatar a alegada exclu<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> culpa exclusiva <strong>de</strong> terceiro (art. 14, § 3º, II, <strong>do</strong><br />

mesmo Código). Daí que se mantém incólume a con<strong>de</strong>nação imposta ao recorrente <strong>de</strong> reparar os danos morais no valor <strong>de</strong> sessenta<br />

mil reais” (STJ – REsp 878.265-PB – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 02.10.2008).<br />

A encerrar o presente tópico, atente-se ao fato <strong>de</strong> que os produtos digitais também po<strong>de</strong>m ser engloba<strong>do</strong>s pela Lei Protetiva <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, caso <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> computa<strong>do</strong>r ou softwares. Para concretizar, vejamos <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Minas Gerais, em<br />

que se discutiu a aplicação <strong>do</strong> CDC para a aquisição <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> computa<strong>do</strong>r por escritório <strong>de</strong> advocacia, prevalecen<strong>do</strong>, ao<br />

final, a teoria finalista aprofundada ou maximalista:<br />

“<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Programa <strong>de</strong> computa<strong>do</strong>r. Software. Consumi<strong>do</strong>r. Relação entre socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong>s e empresa <strong>de</strong><br />

software. Aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Teoria finalista mitigada. Da responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto e <strong>do</strong><br />

serviço. Inadimplemento total da obrigação. Prescrição quinquenal. Voto venci<strong>do</strong>. O consumi<strong>do</strong>r intermediário, por adquirir produto<br />

ou usufruir <strong>de</strong> serviço com o fim <strong>de</strong>, direta ou indiretamente, dinamizar ou instrumentalizar seu próprio negócio lucrativo, não se


enquadra na <strong>de</strong>finição constante no art. 2º <strong>do</strong> CDC, permitin<strong>do</strong>-se, entretanto, a mitigação à aplicação daquela teoria, na medida em<br />

que se admite, excepcionalmente, a aplicação das normas consumeristas a <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res profissionais, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

<strong>de</strong>monstrada, in concreto, a vulnerabilida<strong>de</strong> técnica, jurídica ou econômica. Nas hipóteses <strong>de</strong> inadimplemento absoluto, não se<br />

estaria no âmbito <strong>do</strong> art. 18 (e, consequentemente, <strong>do</strong> art. 26 <strong>do</strong> CDC), mas no âmbito <strong>do</strong> art. 14, que, quanto à prescrição, leva à<br />

aplicação <strong>do</strong> art. 27, com prazo <strong>de</strong> cinco anos para o exercício da pretensão <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Como a prescrição é a perda da<br />

pretensão por ausência <strong>de</strong> seu exercício pelo titular, em <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> lapso <strong>de</strong> tempo, para se verificar se houve ou não prescrição é<br />

necessário constatar se nasceu ou não a pretensão respectiva, porquanto o prazo prescricional só começa a fluir no momento em que<br />

nasce a pretensão, ou seja, quan<strong>do</strong> se constata <strong>de</strong> forma inequívoca o inadimplemento total da obrigação. Recurso provi<strong>do</strong>. Voto<br />

venci<strong>do</strong>: A norma consumerista somente tem aplicação quan<strong>do</strong> o contratante pu<strong>de</strong>r ser caracteriza<strong>do</strong> como <strong>de</strong>stinatário final.<br />

Quan<strong>do</strong> a aquisição <strong>de</strong> bens ou a utilização <strong>de</strong> serviços, por pessoa natural ou jurídica, possui o escopo <strong>de</strong> implementar ou<br />

incrementar a sua ativida<strong>de</strong>-fim não se reputa como relação <strong>de</strong> consumo e, sim, como uma ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo intermediária,<br />

razão pela qual não se submete às normas <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. A partir da vigência <strong>do</strong> novo Código Civil, o prazo<br />

prescricional das ações <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong> danos que não houver atingi<strong>do</strong> a meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> tempo previsto no Código Civil <strong>de</strong> 1916 fluirá<br />

por inteiro, nos termos da nova Lei (art. 206) (Des. Electra Benevi<strong>de</strong>s)” (TJMG – Apelação Cível 1.0024.06.207799-5/0011, Belo<br />

Horizonte – Décima Câmara Cível – Rel. Des. Cabral da Silva – j. 02.06.2009 – DJEMG 23.06.2009).<br />

3.3.2.<br />

Serviço<br />

Estabelece o art. 3º, § 2º, que o serviço é qualquer ativida<strong>de</strong> fornecida no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo, mediante remuneração,<br />

inclusive as <strong>de</strong> natureza bancária, financeira, <strong>de</strong> crédito e securitária, salvo as <strong>de</strong>correntes das relações <strong>de</strong> caráter trabalhista.<br />

De início, cumpre esclarecer que, apesar <strong>de</strong> a lei mencionar expressamente a remuneração, dan<strong>do</strong> um caráter oneroso ao<br />

negócio, admite-se que o presta<strong>do</strong>r tenha vantagens indiretas, sem que isso prejudique a qualificação da relação consumerista.<br />

Como primeiro exemplo, invoca-se o caso <strong>do</strong> estacionamento gratuito em lojas, shoppings centers, supermerca<strong>do</strong>s e afins,<br />

respon<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a empresa que é beneficiada pelo serviço, que serve como atrativo aos consumi<strong>do</strong>res. Dessa forma, concluin<strong>do</strong> pela<br />

presença <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>s, da jurisprudência:<br />

“In<strong>de</strong>nização por danos materiais. Furto em estacionamento. Legitimida<strong>de</strong> passiva <strong>do</strong> supermerca<strong>do</strong>. Terceirização <strong>do</strong><br />

estacionamento. Irrelevância. Exoneração <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>s estabelecida entre o supermerca<strong>do</strong> e a empresa terceirizada não po<strong>de</strong><br />

ser oposta ao consumi<strong>do</strong>r. Solidarieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> lei. Furto Comprova<strong>do</strong>. A disponibilização <strong>de</strong> estacionamento visa angariar a<br />

clientela, ensejan<strong>do</strong> a configuração <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito irregular e consequente <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> guarda e vigilância, pouco importan<strong>do</strong> tratar-se <strong>de</strong><br />

estacionamento gratuito. Lucros cessantes afasta<strong>do</strong>s. Dano material correspon<strong>de</strong>nte ao valor <strong>do</strong> veículo furta<strong>do</strong>. Sentença<br />

parcialmente proce<strong>de</strong>nte. Recurso não provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação 0097300-21.2007.8.26.0000 – Acórdão 4895504, São Paulo –<br />

Décima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Antonio Manssur – j. 18.11.2010 – DJESP 24.02.2011).<br />

“Civil. Apelação. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Furto <strong>de</strong> motocicleta em supermerca<strong>do</strong>. Responsabilida<strong>de</strong> civil da empresa configurada.<br />

Dever <strong>de</strong> guarda e vigilância. Dano material. Arts. 14 e 29 <strong>do</strong> CDC. Aplicação. In<strong>de</strong>nização cabível. Súmula 130 <strong>do</strong> STJ. Dever <strong>de</strong><br />

in<strong>de</strong>nizar. Responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. Não configuração. Recurso conheci<strong>do</strong> e não provi<strong>do</strong>. O estabelecimento que permite,<br />

mesmo a título gratuito, o estacionamento <strong>de</strong> veículo em seu pátio, tem responsabilida<strong>de</strong> pela guarda e vigilância <strong>do</strong> bem, e<br />

respon<strong>de</strong> por qualquer dano causa<strong>do</strong>. Nos termos <strong>do</strong> art. 14 <strong>do</strong> CDC, o fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços ou <strong>de</strong> produtos respon<strong>de</strong> para com o<br />

consumi<strong>do</strong>r em caso <strong>de</strong> dano, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> culpa. A teor <strong>do</strong> art. 29 <strong>do</strong> CDC, equiparam-se aos consumi<strong>do</strong>res todas as<br />

pessoas <strong>de</strong>termináveis ou não, expostas às práticas nele previstas. O furto <strong>de</strong> veículo em estacionamento privativo <strong>de</strong> empresa gera a<br />

obrigação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar conforme prevê a Súmula 130 <strong>do</strong> STJ. Não há como imputar ao Esta<strong>do</strong> a responsabilida<strong>de</strong> por prejuízo<br />

sofri<strong>do</strong> pelo furto ocorri<strong>do</strong> em estacionamento priva<strong>do</strong> <strong>de</strong> supermerca<strong>do</strong>. Recurso conheci<strong>do</strong> e não provi<strong>do</strong>” (TJMG – Apelação<br />

Cível 1.0702.06.285022-8/0011, Uberlândia – Décima Sétima Câmara Cível – Rel. Des. Márcia <strong>de</strong> Paoli Balbino – j. 24.04.2008 –<br />

DJEMG 09.05.2008).<br />

Como se retira da última ementa, o conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> po<strong>de</strong> ser utiliza<strong>do</strong> para se chegar à mesma <strong>de</strong>dução <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong>. A<strong>de</strong>mais, não faz a jurisprudência distinção a respeito <strong>de</strong> ter ou não o consumi<strong>do</strong>r efetua<strong>do</strong> compras no local,<br />

haven<strong>do</strong> sempre a responsabilida<strong>de</strong> da empresa, nos termos da Súmula 130 <strong>do</strong> STJ. Nesse senti<strong>do</strong>:<br />

“<strong>Direito</strong> civil. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Furto em estacionamento. Shopping center. Veículo pertencente a possível loca<strong>do</strong>r <strong>de</strong> unida<strong>de</strong><br />

comercial. Existência <strong>de</strong> vigilância no local. Obrigação <strong>de</strong> guarda. In<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>vida. Prece<strong>de</strong>ntes. Recurso provi<strong>do</strong>. I. Nos termos<br />

<strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong> n. 130/STJ, ‘a empresa respon<strong>de</strong>, perante o cliente, pela reparação <strong>de</strong> dano ou furto <strong>de</strong> veículo ocorri<strong>do</strong>s em seu<br />

estacionamento’. II. A jurisprudência <strong>de</strong>ste Tribunal não faz distinção entre o consumi<strong>do</strong>r que efetua compra e aquele que apenas vai<br />

ao local sem nada <strong>de</strong>spen<strong>de</strong>r. Em ambos os casos, enten<strong>de</strong>-se pelo cabimento da in<strong>de</strong>nização em <strong>de</strong>corrência <strong>do</strong> furto <strong>de</strong> veículo. A<br />

responsabilida<strong>de</strong> pela in<strong>de</strong>nização não <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito, mas da obrigação <strong>de</strong> zelar pela guarda e segurança <strong>do</strong>s<br />

veículos estaciona<strong>do</strong>s no local, presumivelmente seguro” (STJ – REsp 437.649/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Sálvio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong><br />

Teixeira – j. 06.02.2003 – DJ 24.02.2003, p. 242).<br />

Outro exemplo que envolve as vantagens indiretas ao presta<strong>do</strong>r é o sistema <strong>de</strong> milhagens ou <strong>de</strong> pontuação em companhias


áreas, que igualmente serve como um atrativo aos consumi<strong>do</strong>res, ou até mesmo como uma publicida<strong>de</strong> (nesse senti<strong>do</strong>: TJPE –<br />

Apelação 0188732-5, Recife – Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Eduar<strong>do</strong> Augusto Paura Peres – j. 11.03.2010 – DJEPE<br />

05.05.2010). Fornecen<strong>do</strong> amparo <strong>do</strong>utrinário a essa forma <strong>de</strong> pensar, na VI Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, em 2013, foi aprova<strong>do</strong> o<br />

Enuncia<strong>do</strong> n. 559 <strong>do</strong> CJF/STJ, segun<strong>do</strong> o qual “no transporte aéreo, nacional e internacional, a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> transporta<strong>do</strong>r<br />

em relação aos passageiros gratuitos, que viajarem por cortesia, é objetiva, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> aten<strong>de</strong>r à integral reparação <strong>de</strong> danos<br />

patrimoniais e extrapatrimoniais”. A menção à reparação integral segue a linha exposta neste livro, <strong>de</strong> afastar qualquer tarifação da<br />

in<strong>de</strong>nização nas relações <strong>de</strong> consumo.<br />

Voltan<strong>do</strong> à análise efetiva <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> serviço, a norma expressa que os serviços bancários, financeiros e <strong>de</strong> crédito são<br />

abrangi<strong>do</strong>s pela norma consumerista. Por isso, os contratos celebra<strong>do</strong>s entre bancos e correntistas para administração e transmissão<br />

<strong>de</strong> capitais financeiros são, em regra, <strong>de</strong> consumo, na esteira da Súmula 297 <strong>do</strong> STJ. Nessa mesma linha posicionou-se o Supremo<br />

Tribunal Fe<strong>de</strong>ral na Ação Declaratória <strong>de</strong> Inconstitucionalida<strong>de</strong> 2.591, conhecida como “ADIn <strong>do</strong>s Bancos”, cuja longa ementa<br />

merece transcrição:<br />

“Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Art. 5º, XXXII, da CF/1988. Art. 170, V, da CF/1988. Instituições financeiras. Sujeição <strong>de</strong>las ao<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, excluídas <strong>de</strong> sua abrangência a <strong>de</strong>finição <strong>do</strong> custo das operações ativas e a remuneração das<br />

operações passivas praticadas na exploração da intermediação <strong>de</strong> dinheiro na economia [art. 3º, § 2º, <strong>do</strong> CDC]. Moeda e taxa <strong>de</strong><br />

juros. Dever-po<strong>de</strong>r <strong>do</strong> Banco Central <strong>do</strong> Brasil. Sujeição ao Código Civil. 1. As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas<br />

pela incidência das normas veiculadas pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ‘Consumi<strong>do</strong>r’, para os efeitos <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como <strong>de</strong>stinatário final, ativida<strong>de</strong> bancária, financeira e <strong>de</strong> crédito. 3. O<br />

preceito veicula<strong>do</strong> pelo art. 3º, § 2º, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve ser interpreta<strong>do</strong> em coerência com a Constituição, o<br />

que importa em que o custo das operações ativas e a remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras na<br />

exploração da intermediação <strong>de</strong> dinheiro na economia estejam excluí<strong>do</strong>s da sua abrangência. 4. Ao Conselho Monetário Nacional<br />

incumbe a fixação, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a perspectiva macroeconômica, da taxa-base <strong>de</strong> juros praticável no merca<strong>do</strong> financeiro. 5. O Banco<br />

Central <strong>do</strong> Brasil está vincula<strong>do</strong> pelo <strong>de</strong>ver-po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> fiscalizar as instituições financeiras, em especial na estipulação contratual das<br />

taxas <strong>de</strong> juros por elas praticadas no <strong>de</strong>sempenho da intermediação <strong>de</strong> dinheiro na economia. 6. Ação direta julgada improce<strong>de</strong>nte,<br />

afastan<strong>do</strong>-se a exegese que submete às normas <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r [Lei 8.078/1990] a <strong>de</strong>finição <strong>do</strong> custo das<br />

operações ativas e da remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras no <strong>de</strong>sempenho da intermediação<br />

<strong>de</strong> dinheiro na economia, sem prejuízo <strong>do</strong> controle, pelo Banco Central <strong>do</strong> Brasil, e <strong>do</strong> controle e revisão, pelo Po<strong>de</strong>r Judiciário, nos<br />

termos <strong>do</strong> disposto no Código Civil, em cada caso, <strong>de</strong> eventual abusivida<strong>de</strong>, onerosida<strong>de</strong> excessiva ou outras distorções na<br />

composição contratual da taxa <strong>de</strong> juros. Art. 192 da CF/1988. Norma-objetivo. Exigência <strong>de</strong> lei complementar exclusivamente para<br />

a regulamentação <strong>do</strong> Sistema Financeiro. 7. O preceito veicula<strong>do</strong> pelo art. 192 da Constituição <strong>do</strong> Brasil consubstancia normaobjetivo<br />

que estabelece os fins a serem persegui<strong>do</strong>s pelo sistema financeiro nacional, a promoção <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento equilibra<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> País e a realização <strong>do</strong>s interesses da coletivida<strong>de</strong>. 8. A exigência <strong>de</strong> lei complementar veiculada pelo art. 192 da Constituição<br />

abrange exclusivamente a regulamentação da estrutura <strong>do</strong> sistema financeiro. Conselho Monetário Nacional. Art. 4º, VIII, da Lei<br />

4.595/1964. Capacida<strong>de</strong> normativa atinente à Constituição, funcionamento e fiscalização das instituições financeiras. Ilegalida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

resoluções que exce<strong>de</strong>m essa matéria. 9. O Conselho Monetário Nacional é titular <strong>de</strong> capacida<strong>de</strong> normativa – a chamada capacida<strong>de</strong><br />

normativa <strong>de</strong> conjuntura – no exercício da qual lhe incumbe regular, além da constituição e fiscalização, o funcionamento das<br />

instituições financeiras, isto é, o <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> suas ativida<strong>de</strong>s no plano <strong>do</strong> sistema financeiro. 10. Tu<strong>do</strong> o quanto exceda esse<br />

<strong>de</strong>sempenho não po<strong>de</strong> ser objeto <strong>de</strong> regulação por ato normativo produzi<strong>do</strong> pelo Conselho Monetário Nacional. 11. A produção <strong>de</strong><br />

atos normativos pelo Conselho Monetário Nacional, quan<strong>do</strong> não respeitem ao funcionamento das instituições financeiras, é abusiva,<br />

consubstancian<strong>do</strong> afronta à legalida<strong>de</strong>” (STF – ADI 2.591/DF – Tribunal Pleno – Rel. Min. Carlos Velloso – Rel. p/Acórdão Min.<br />

Eros Grau – j. 07.06.2006).<br />

Po<strong>de</strong>m ser cita<strong>do</strong>s, assim, os contratos <strong>de</strong> conta-corrente, conta poupança, <strong>de</strong>pósito bancário <strong>de</strong> quantias e bens, mútuo<br />

bancário e negócios <strong>de</strong> investimentos. A propósito, com precisão técnica, julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2014, <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania, aduz<br />

que “o CDC é aplicável aos contratos referentes a aplicações em fun<strong>do</strong>s <strong>de</strong> investimento firma<strong>do</strong>s entre as instituições financeiras e<br />

seus clientes, pessoas físicas e <strong>de</strong>stinatários finais, que contrataram o serviço da instituição financeira para investir economias<br />

amealhadas ao longo da vida” (STJ – REsp 656.932/SP – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – j. 24.04.2014 – publica<strong>do</strong> no seu<br />

Informativo n. 541).<br />

Deve ser feita a ressalva <strong>de</strong> que, se uma gran<strong>de</strong> empresa adquire valores para fomentar sua ativida<strong>de</strong> produtiva, não haveria, na<br />

esteira <strong>de</strong> julga<strong>do</strong>s já transcritos, uma relação <strong>de</strong> consumo. Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> uma pequena empresa ou <strong>de</strong> um empresário individual<br />

<strong>de</strong> pequeno ou médio porte, justifica-se a incidência <strong>do</strong> CDC pela patente vulnerabilida<strong>de</strong> ou hipossuficiência, incidin<strong>do</strong> a teoria<br />

finalista aprofundada ou a teoria maximalista. Decisões nessa linha <strong>de</strong> pensamento aqui já foram transcritas.<br />

Consigne-se, no contexto <strong>de</strong> negócios financeiros contemporâneos, que o contrato <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito também é abrangi<strong>do</strong><br />

pela Lei 8.078/1990, nas relações entre o titular <strong>do</strong> cartão e a empresa que explora o serviço, surgin<strong>do</strong> uma quantida<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rável<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>mandas relativas, principalmente, à responsabilida<strong>de</strong> civil, que ainda serão estudadas (ver, por exemplo: STJ – REsp<br />

1061500/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 04.11.2008 – DJe 20.11.2008; e STJ – REsp 81.269/SP – Segunda


Turma – Rel. Min. Castro Filho – j. 08.05.2001 – DJ 25.06.2001, p. 150). Nas relações entre comerciantes e empresas <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong><br />

crédito, em regra e pela teoria finalista, não há relação <strong>de</strong> consumo, uma vez que o serviço é contrata<strong>do</strong> com os fins <strong>de</strong> facilitação<br />

da atuação <strong>do</strong>s primeiros (STJ – REsp 910.799/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 24.08.2010 – DJe 12.11.2010).<br />

No caso <strong>de</strong> se tratar <strong>de</strong> comerciante <strong>de</strong> pequeno porte, po<strong>de</strong>-se sustentar perfeitamente a incidência da teoria finalista aprofundada<br />

ou da teoria maximalista, na esteira <strong>do</strong> que foi antes exposto.<br />

Cumpre <strong>de</strong>stacar que, também nos contratos com emissão <strong>de</strong> cédula <strong>de</strong> crédito rural, inci<strong>de</strong> a Lei 8.078/1990, com as mesmas<br />

ressalvas feitas por último (entre os mais recentes acórdãos: STJ – AgRg no Ag 1.064.081/SE – Quarta Turma – Rel. Min. Luis<br />

Felipe Salomão – j. 15.03.2011 – DJe 18.03.2011; e STJ – REsp 302.265/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j.<br />

18.03.2010 – DJe 12.04.2010).<br />

Os contratos para aquisição <strong>de</strong> bens <strong>de</strong> consumo por meio <strong>de</strong> arrendamento mercantil ou leasing igualmente são abrangi<strong>do</strong>s<br />

pelo Código Consumerista, conforme remansosa jurisprudência. Um <strong>do</strong>s principais prece<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong>ssa incidência é o Agravo<br />

Regimental no Recurso Especial 374.351/RS, da Terceira Turma <strong>do</strong> STJ, <strong>de</strong> relatoria da Ministra Nancy Andrighi, que <strong>de</strong>bateu a<br />

revisão <strong>de</strong>sses negócios diante da <strong>de</strong>svalorização <strong>do</strong> real perante o dólar (julga<strong>do</strong> em 30.04.2002). O tema ainda será aprofunda<strong>do</strong><br />

quan<strong>do</strong> da abordagem da revisão contratual consagrada pela Lei 8.078/1990.<br />

De toda sorte, em julga<strong>do</strong> publica<strong>do</strong> em 2015, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça concluiu que, em regra, o CDC não é aplica<strong>do</strong><br />

aos contratos <strong>de</strong> leasing ou <strong>de</strong> lease back, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se os casos <strong>de</strong> aquisição <strong>de</strong> insumos para a máquina produtiva da empresa:<br />

“Processual civil e civil. CDC e direito econômico. ‘Operação casada’. Arrendamento mercantil (lease back) e Certifica<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

Depósito Bancário (CDB). Nulida<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>de</strong>pósito em CDB. Incremento <strong>do</strong> capital <strong>de</strong> giro e da ativida<strong>de</strong> empresarial. Ausência <strong>de</strong><br />

relação <strong>de</strong> consumo e <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong>. Não incidência <strong>do</strong> CDC. Julgamento extra petita não caracteriza<strong>do</strong>. Manutenção <strong>do</strong><br />

acórdão recorri<strong>do</strong> por fundamento diverso. Possibilida<strong>de</strong>. Art. 257 <strong>do</strong> RISTJ. Vedação <strong>de</strong> ‘operação casada’ em leis econômicas.<br />

Recurso <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>. Diante da teoria finalista, acolhida na jurisprudência <strong>de</strong>ste Tribunal Superior, contratos celebra<strong>do</strong>s para a<br />

obtenção <strong>de</strong> financiamento mediante arrendamento mercantil, <strong>do</strong> tipo lease back, e para a aplicação financeira <strong>do</strong>s respectivos<br />

recursos em CDB com o propósito <strong>de</strong> ampliar o capital <strong>de</strong> giro e fomentar a ativida<strong>de</strong> empresarial não são regi<strong>do</strong>s pelo Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, ausente a figura <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>fini<strong>do</strong> no art. 2º <strong>do</strong> referi<strong>do</strong> diploma. O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça tem<br />

atenua<strong>do</strong> a aplicação da teoria finalista, admitin<strong>do</strong> a incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>de</strong> Consumi<strong>do</strong>r na relação jurídico-obrigacional<br />

entre comerciantes ou profissionais quan<strong>do</strong> estiver caracterizada situação <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> ou hipossuficiência. Ocorre que o<br />

acórdão recorri<strong>do</strong> não apreciou a questão da hipossuficiência ou da vulnerabilida<strong>de</strong> da autora, tema que, sem dúvida, <strong>de</strong>mandaria o<br />

exame das provas referidas, genericamente, pela recorrida. Incidência da mesma orientação contida na Súmula n. 7 <strong>do</strong> STJ. Cabe ao<br />

magistra<strong>do</strong> aplicar a norma legal que enten<strong>de</strong>r a<strong>de</strong>quada aos fatos da causa, não precisan<strong>do</strong> nem <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> se limitar aos dispositivos<br />

apresenta<strong>do</strong>s pelas partes para julgar o feito, vigoran<strong>do</strong> em nosso <strong>Direito</strong> os princípios inseri<strong>do</strong>s nos brocar<strong>do</strong>s da mihi factum, dabo<br />

tibi jus e jura novit curia. Nesta instância especial, permite-se a este Tribunal Superior, aplican<strong>do</strong> o direito à espécie na forma <strong>do</strong> art.<br />

257, parte final, <strong>do</strong> RISTJ, manter o acórdão recorri<strong>do</strong> mediante a a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> dispositivos legais e <strong>de</strong> argumentos jurídicos diversos<br />

<strong>do</strong>s apresenta<strong>do</strong>s pelas instâncias <strong>de</strong> origem e nas contrarrazões ao recurso especial. 6. Apesar <strong>de</strong> inexistir relação <strong>de</strong> consumo e <strong>de</strong><br />

não incidirem as regras <strong>do</strong> CDC no presente caso, a procedência da ação <strong>de</strong>ve ser mantida por fundamentos jurídicos diversos <strong>do</strong>s<br />

conti<strong>do</strong>s no acórdão recorri<strong>do</strong>, ten<strong>do</strong> em vista que a prática da ‘operação casada’ vem sen<strong>do</strong> proibida há muito tempo na legislação<br />

pátria infraconstitucional, inclusive na época da contratação (outubro <strong>de</strong> 1993), tipifican<strong>do</strong>-a ora como ‘crime contra a or<strong>de</strong>m<br />

econômica’, ora como mera ‘infração da or<strong>de</strong>m econômica’. De fato, o interesse jurídico protegi<strong>do</strong> extrapola o âmbito da relação<br />

contratual estabelecida entre particulares e nela interfere, sen<strong>do</strong> irrelevante, no caso concreto, incidir ou não o CDC (STJ – REsp<br />

746.885/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – j. 18.12.2014 – DJe 23.02.2015).<br />

Voltan<strong>do</strong> ao conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 3º, § 2º, <strong>do</strong> CDC, está expresso que os serviços securitários são abrangi<strong>do</strong>s pela Lei Protetiva,<br />

caso <strong>do</strong>s seguros em geral. Ilustran<strong>do</strong>, o seguro <strong>de</strong> automóvel, em regra, é um contrato <strong>de</strong> consumo, a não ser se contrata<strong>do</strong> no<br />

interesse patrimonial <strong>de</strong> alguém (por to<strong>do</strong>s: STJ – REsp 1097758/MG – Terceira Turma – Rel. Min. Massami Uyeda – j.<br />

10.02.2009 – DJe 27.02.2009). Do mesmo mo<strong>do</strong>, o contrato <strong>de</strong> seguro <strong>de</strong> vida, celebra<strong>do</strong> no interesse <strong>de</strong> uma pessoa ou <strong>de</strong> uma<br />

família (entre os julga<strong>do</strong>s mais recentes: REsp 1.077.342/MG – Terceira Turma – Rel. Min. Massami Uyeda – j. 22.06.2010 – DJe<br />

03.09.2010). No tocante ao contrato <strong>de</strong> seguro-saú<strong>de</strong>, é clara a Súmula 469 <strong>do</strong> STJ, inci<strong>de</strong>nte para tais negócios: “Aplica-se o<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r aos contratos <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>”. Na mesma linha e com tom <strong>de</strong> ampliação, a Súmula 100 <strong>do</strong><br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> São Paulo, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2013: “O contrato <strong>de</strong> plano/seguro saú<strong>de</strong> submete-se aos ditames <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e da Lei n. 9.656/1998 ainda que a avença tenha si<strong>do</strong> celebrada antes da vigência <strong>de</strong>sses diplomas legais”.<br />

Porém, ressalve-se que, para o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, não são abrangi<strong>do</strong>s pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r os<br />

contratos <strong>de</strong> autogestão <strong>do</strong>s serviços <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Conforme acórdão prolata<strong>do</strong> no ano <strong>de</strong> 2016, pela Segunda Seção da Corte, “a<br />

opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> planos priva<strong>do</strong>s <strong>de</strong> assistência à saú<strong>de</strong>, na modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> autogestão, é pessoa jurídica <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong> sem<br />

finalida<strong>de</strong>s lucrativas que, vinculada ou não à entida<strong>de</strong> pública ou privada, opera plano <strong>de</strong> assistência à saú<strong>de</strong> com exclusivida<strong>de</strong><br />

para um público <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> <strong>de</strong> beneficiários. A constituição <strong>do</strong>s planos sob a modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> autogestão diferencia,<br />

sensivelmente, essas pessoas jurídicas quanto à administração, forma <strong>de</strong> associação, obtenção e repartição <strong>de</strong> receitas, diverso <strong>do</strong>s


contratos firma<strong>do</strong>s com empresas que exploram essa ativida<strong>de</strong> no merca<strong>do</strong> e visam ao lucro. Não se aplica o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r ao contrato <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> administra<strong>do</strong> por entida<strong>de</strong> <strong>de</strong> autogestão, por inexistência <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo” (STJ<br />

– REsp 1.285.483/PB – Segunda Seção – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 22.06.2016 – DJe 16.08.2016). Nos termos <strong>do</strong> voto <strong>do</strong><br />

Ministro Relator, “a inegável diferença estrutural existente entre os planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> ofereci<strong>do</strong>s pelas entida<strong>de</strong>s constituídas sob<br />

aquele mo<strong>de</strong>lo, <strong>de</strong> acesso restrito a um grupo <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>, daqueles comercializa<strong>do</strong>s por opera<strong>do</strong>ras que oferecem seus produtos<br />

ao merca<strong>do</strong> geral e objetivam o lucro, ensejam a retomada <strong>do</strong> tema e encorajam submeter a questão ao criterioso exame <strong>de</strong>sta<br />

Seção”. Não se olvi<strong>de</strong> que, pelo Novo CPC, tal <strong>de</strong>cisão vincula os advoga<strong>do</strong>s (art. 332, inciso III) e os julga<strong>do</strong>res <strong>de</strong> primeira e<br />

segunda instâncias (art. 489, § 1º, inciso VI). Em suma, tal posição <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada majoritária e consolidada, para os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s<br />

fins práticos.<br />

Também o seguro empresarial po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve estar abrangi<strong>do</strong> pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Na esteira <strong>de</strong> correto<br />

julgamento <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2014, “há relação <strong>de</strong> consumo no seguro empresarial se a pessoa jurídica o firmar<br />

visan<strong>do</strong> à proteção <strong>do</strong> próprio patrimônio (<strong>de</strong>stinação pessoal), sem o integrar nos produtos ou serviços que oferece, mesmo que<br />

seja para resguardar insumos utiliza<strong>do</strong>s em sua ativida<strong>de</strong> comercial, pois será a <strong>de</strong>stinatária final <strong>do</strong>s serviços securitários. Situação<br />

diversa seria se o seguro empresarial fosse contrata<strong>do</strong> para cobrir riscos <strong>do</strong>s clientes, ocasião em que faria parte <strong>do</strong>s serviços<br />

presta<strong>do</strong>s pela pessoa jurídica, o que configuraria consumo intermediário, não protegi<strong>do</strong> pelo CDC. A cláusula securitária a qual<br />

garante a proteção <strong>do</strong> patrimônio <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> apenas contra o furto qualifica<strong>do</strong>, sem esclarecer o significa<strong>do</strong> e o alcance <strong>do</strong> termo<br />

‘qualifica<strong>do</strong>’, bem como a situação concernente ao furto simples, está eivada <strong>de</strong> abusivida<strong>de</strong> por falha no <strong>de</strong>ver geral <strong>de</strong><br />

informação da segura<strong>do</strong>ra e por sonegar ao consumi<strong>do</strong>r o conhecimento suficiente acerca <strong>do</strong> objeto contrata<strong>do</strong>. Não po<strong>de</strong> ser<br />

exigi<strong>do</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r o conhecimento <strong>de</strong> termos técnico-jurídicos específicos, ainda mais a diferença entre tipos penais <strong>de</strong> mesmo<br />

gênero” (STJ – REsp 1.352.419/SP – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – Terceira Turma – j. 19.08.2014, DJe 08.09.2014).<br />

Todavia, como se extrai da ementa, se o seguro é celebra<strong>do</strong> para a proteção da máquina produtiva da empresa, especialmente<br />

para cobrir danos sofri<strong>do</strong>s por terceiros, não há que falar em contrato <strong>de</strong> consumo. Em muitos casos, aliás, não haverá sequer um<br />

contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, pois o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> negócio é amplamente discuti<strong>do</strong> e negocia<strong>do</strong> por duas gran<strong>de</strong>s empresas, a segurada e a<br />

segura<strong>do</strong>ra. Nessa linha, <strong>do</strong> Tribunal Paulista:<br />

“Seguro empresarial. Ação <strong>de</strong>claratória <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusula cumulada com pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Cláusula exclu<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />

cobertura. Admissibilida<strong>de</strong>. Inaplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Relação com a segura<strong>do</strong>ra que se caracteriza<br />

como insumo, e não consumo. Ocorrência <strong>de</strong> furto <strong>de</strong> bens da empresa já parcialmente in<strong>de</strong>nizada. Equipamentos não in<strong>de</strong>niza<strong>do</strong>s<br />

cuja cobertura fora expressamente excluída, a teor das ‘condições gerais’ <strong>do</strong> contrato. Sentença reformada. Ação improce<strong>de</strong>nte.<br />

Recurso provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação 1017459-91.2014.8.26.0071 – Acórdão 9297989, Bauru – Sexta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> –<br />

Rel. Des. Vito Guglielmi – j. 18.03.2016 – DJESP 01.04.2016).<br />

Ou, ainda, contan<strong>do</strong> com o apoio <strong>de</strong>ste autor, igualmente tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> seguro entre empresas, relativo à proteção da máquina<br />

produtiva da segurada:<br />

“Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Seguro. CDC. Inaplicabilida<strong>de</strong>. Contrato <strong>de</strong> seguro <strong>de</strong> equipamentos <strong>de</strong> alto valor, <strong>de</strong>ntre eles o guindaste<br />

sinistra<strong>do</strong>, que constitui insumo da ativida<strong>de</strong> empresarial das Apelantes. Dimensão <strong>do</strong> negócio jurídico que é substrato suficiente<br />

para afastar a alegação <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> das Apelantes. Cerceamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa. Questão principal <strong>de</strong>volvida que diz respeito à<br />

valida<strong>de</strong> da cláusula <strong>de</strong> exclusão <strong>de</strong> risco da segura<strong>do</strong>ra. Prova estritamente <strong>do</strong>cumental no caso concreto. Desnecessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prova<br />

pericial ou <strong>de</strong> instrução probatória. Preliminar afastada. Mérito. Pretensão <strong>de</strong> recebimento <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização securitária da segura<strong>do</strong>ra<br />

Apelada. Pedi<strong>do</strong> corretamente julga<strong>do</strong> improce<strong>de</strong>nte. Documentos que provam o <strong>de</strong>scumprimento contratual pela Apelante, pois o<br />

guindaste sinistra<strong>do</strong> estava sen<strong>do</strong> opera<strong>do</strong> por funcionário sem a experiência mínima exigida na apólice <strong>de</strong> seguro. Imperícia<br />

configurada. Causa <strong>de</strong> exclusão <strong>de</strong> risco. Abusivida<strong>de</strong> da cláusula não configurada. Sentença mantida na íntegra, nos termos <strong>do</strong> art.<br />

252 <strong>do</strong> RITJSP. Recurso não provi<strong>do</strong>. Visualizar ementa completa” (TJSP – Apelação 1062283-82.2013.8.26.0100, São Paulo – 12ª<br />

Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Des. Tasso Duarte <strong>de</strong> Melo – j. 14.09.2016 – Registro em 20.09.2016).<br />

Continuan<strong>do</strong> no estu<strong>do</strong> da norma, estão excluídas as relações <strong>de</strong> caráter trabalhista, regidas pela legislação especial, no caso a<br />

Consolidação das Leis <strong>do</strong> Trabalho (CLT). Por tais relações são compreendidas as relações <strong>de</strong> emprego, com os elementos que lhe<br />

são peculiares, como a pessoalida<strong>de</strong>, a subordinação jurídica, a onerosida<strong>de</strong>, a habitualida<strong>de</strong> ou não eventualida<strong>de</strong>, a alienida<strong>de</strong> e<br />

a exclusivida<strong>de</strong>.26<br />

Sen<strong>do</strong> assim, imagine-se que um produto explo<strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma fábrica, vin<strong>do</strong> a atingir um <strong>de</strong> seus emprega<strong>do</strong>s.<br />

Logicamente, o emprega<strong>do</strong> <strong>de</strong>mandará o emprega<strong>do</strong>r, e não o fabricante <strong>do</strong> produto, com base no aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> trabalho e não no<br />

aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo. Em suma, inci<strong>de</strong> a CLT na situação <strong>de</strong>scrita e não o CDC. Em outras palavras, o protecionismo <strong>do</strong><br />

emprega<strong>do</strong> prevalece sobre o protecionismo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Entretanto, <strong>de</strong>ve ficar claro que o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r inci<strong>de</strong> sobre algumas relações <strong>de</strong> trabalho individual,


como na hipótese <strong>de</strong> um jardineiro, <strong>de</strong> um <strong>de</strong>ntista, <strong>de</strong> um advoga<strong>do</strong>, <strong>de</strong> um médico, <strong>de</strong> um empreiteiro, to<strong>do</strong>s prestan<strong>do</strong> serviços<br />

eventuais. Em situações tais, é bem possível estarmos diante <strong>de</strong> uma relação <strong>de</strong> consumo que também é uma relação <strong>de</strong> trabalho, e<br />

não necessariamente uma relação <strong>de</strong> emprego, diga-se <strong>de</strong> passagem. Imagine-se o singelo exemplo <strong>de</strong> um jardineiro individual que<br />

presta seu serviço para alguém. O jardineiro é um trabalha<strong>do</strong>r, sem ser um emprega<strong>do</strong>. Na outra ponta da relação há um<br />

consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>stinatário final <strong>de</strong> um produto ou serviço. Restam, então, duas dúvidas. Quem merecerá proteção nessa hipótese?<br />

Qual a justiça competente para apreciar eventual dilema contratual entre as partes: a Justiça <strong>do</strong> Trabalho ou a Justiça Comum<br />

Estadual?<br />

No caso <strong>de</strong>scrito, sabe-se que ambos os envolvi<strong>do</strong>s têm proteção constitucional. O consumi<strong>do</strong>r está protegi<strong>do</strong> no art. 5º, inc.<br />

XXXII, da Constituição Fe<strong>de</strong>ral, como antes exposto. Por outra via, o trabalha<strong>do</strong>r – e não mais emprega<strong>do</strong> – tem o amparo <strong>do</strong> art.<br />

7º da Constituição, altera<strong>do</strong> pela Emenda Constitucional 45/2004. Um consumerista diria que o direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r prevalece. Já<br />

um trabalhista afirmaria o contrário, como se ouve quan<strong>do</strong> a questão é levada a <strong>de</strong>bate em ambientes diferencia<strong>do</strong>s. Surge o gran<strong>de</strong><br />

dilema, eis que ambos os vulneráveis têm o seu próprio princípio <strong>do</strong> protecionismo. Na hipótese <strong>de</strong>scrita, acredita-se que a solução<br />

está na aplicação da técnica <strong>de</strong> pon<strong>de</strong>ração, fazen<strong>do</strong>-se um juízo <strong>de</strong> razoabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o caso concreto.27 Há, assim,<br />

uma espécie <strong>de</strong> pon<strong>de</strong>ração meritória, favorável à proteção que <strong>de</strong>ve prevalecer naquela situação concreta. Eis a solução para esse<br />

problema, que envolve um diálogo das fontes entre as normas consumeristas e trabalhistas, sob o prisma constitucional, eis que<br />

tanto os consumi<strong>do</strong>res quanto os trabalha<strong>do</strong>res estão protegi<strong>do</strong>s pelo Texto Maior.<br />

Outras normas po<strong>de</strong>m auxiliar na solução <strong>de</strong>sse problema. Imagine-se que a questão <strong>de</strong> conflito é o contrato escrito e<br />

celebra<strong>do</strong> entre as partes, que traz <strong>do</strong>is valores para o serviço presta<strong>do</strong> pelo jardineiro. A<strong>do</strong>tan<strong>do</strong>-se uma interpretação pro<br />

consumi<strong>do</strong>r, valeria o preço menor (art. 47 <strong>do</strong> CDC). Com uma interpretação pro trabalha<strong>do</strong>r, o preço maior <strong>de</strong>ve prevalecer. Ora,<br />

o Código Civil <strong>de</strong> 2002 po<strong>de</strong> auxiliar na <strong>de</strong>finição <strong>do</strong> direito tutela<strong>do</strong>. Se o contrato foi imposto pelo trabalha<strong>do</strong>r, o que geralmente<br />

ocorre, o consumi<strong>do</strong>r será a<strong>de</strong>rente, a<strong>do</strong>tan<strong>do</strong>-se uma interpretação que lhe seja mais favorável (art. 423 <strong>do</strong> CC). Na hipótese fática<br />

<strong>de</strong> ter o consumi<strong>do</strong>r estipula<strong>do</strong> o contrato, o a<strong>de</strong>rente será o trabalha<strong>do</strong>r.<br />

Enten<strong>de</strong>-se que tais soluções <strong>de</strong>vem ser a<strong>do</strong>tadas também para a fixação da Justiça competente para apreciar a questão, <strong>de</strong><br />

acor<strong>do</strong> com o pedi<strong>do</strong> e a causa <strong>de</strong> pedir (solução processual). Se quem merecer a proteção for o consumi<strong>do</strong>r, a competência será da<br />

Justiça Comum Estadual, melhor habituada com a principiologia consumerista. Caso contrário, a competência será da Justiça <strong>do</strong><br />

Trabalho, até porque o art. 114, inc. I, da Constituição Fe<strong>de</strong>ral, altera<strong>do</strong> pela EC 45/2004, fixa a competência <strong>de</strong>ssa justiça<br />

especializada para apreciar as ações oriundas da relação <strong>de</strong> trabalho. Houve clara ampliação da competência, uma vez que não se<br />

menciona mais a relação <strong>de</strong> emprego, com aqueles elementos fixos e tradicionais já conheci<strong>do</strong>s.<br />

O presente autor não se filia, portanto, a soluções simplistas que, cegamente e por preferências i<strong>de</strong>ológicas, conduzem a uma<br />

ou outra competência específica. De toda sorte, tem prevaleci<strong>do</strong> o entendimento <strong>de</strong> competência da Justiça Comum Estadual para<br />

os casos envolven<strong>do</strong> dilemas envolven<strong>do</strong> profissionais liberais, notadamente cobrança <strong>de</strong> valores. Nessa linha, a Súmula 363 <strong>do</strong><br />

STJ: “Compete à Justiça estadual processar e julgar a ação <strong>de</strong> cobrança ajuizada por profissional liberal contra cliente”. A<br />

controvérsia envolve também a competência para cobrança <strong>de</strong> honorários advocatícios, sen<strong>do</strong> majoritária a tese <strong>de</strong> competência,<br />

mais uma vez, da Justiça Comum. Por to<strong>do</strong>s os numerosos julga<strong>do</strong>s <strong>do</strong> TST, entre os mais recentes:<br />

“Recurso <strong>de</strong> revista. 1. Honorários advocatícios. Ação <strong>de</strong> cobrança. Ente público. Incompetência da Justiça <strong>do</strong> Trabalho.<br />

Prece<strong>de</strong>ntes. Esta colenda Corte Superior tem entendi<strong>do</strong> que a Justiça <strong>do</strong> Trabalho é incompetente para julgar ações <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong><br />

honorários <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong>, por se tratar <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo, hipótese que não se enquadra no art. 114 da Constituição Fe<strong>de</strong>ral,<br />

mesmo após a ampliação da competência <strong>de</strong>sta justiça especializada. Prece<strong>de</strong>ntes da SBDI-1. Na hipótese <strong>do</strong>s autos, a competência<br />

da Justiça Comum encontra-se reforçada pela presença <strong>do</strong> ente público no polo passivo da <strong>de</strong>manda, haja vista que o Supremo<br />

Tribunal Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong>cidiu, mediante reitera<strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s, ser a Justiça <strong>do</strong> Trabalho incompetente para processar e julgar causas que<br />

envolvam o po<strong>de</strong>r público e servi<strong>do</strong>res vincula<strong>do</strong>s a ele por relação jurídico-administrativa, uma vez que essas ações não se reputam<br />

oriundas da relação <strong>de</strong> trabalho referida no art. 114, I, da Constituição Fe<strong>de</strong>ral. Recurso <strong>de</strong> revista não conheci<strong>do</strong>” (TST – Recurso<br />

<strong>de</strong> Revista 907.800-78.2006.5.12.0036 – Segunda Turma – Rel. Min. Guilherme Augusto Caputo Bastos – DEJT 11.03.2011, p.<br />

357).<br />

“Recurso <strong>de</strong> revista. Ação <strong>de</strong> cobrança. Contrato <strong>de</strong> mandato <strong>de</strong> honorários advocatícios. Reclamação trabalhista. Advoga<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>stituí<strong>do</strong>. Relação cliente x advoga<strong>do</strong>. Incompetência da Justiça <strong>do</strong> Trabalho. Em razão <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> honorários advocatícios<br />

<strong>de</strong>correr <strong>do</strong> mandato, cujo objeto <strong>de</strong>corre exatamente <strong>de</strong> um contrato <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>, resta claro que a li<strong>de</strong> versa sobre relação <strong>de</strong><br />

consumo, a afastar a competência da Justiça <strong>do</strong> Trabalho. In casu, o trabalho não é o cerne <strong>do</strong> contrato, mas sim um bem <strong>de</strong><br />

consumo que se traduziu nele, que é o resulta<strong>do</strong> espera<strong>do</strong> diante <strong>de</strong> um contrato realiza<strong>do</strong> entre as partes, qual seja o provimento<br />

favorável na ação trabalhista ajuizada. Assim, a competência da Justiça <strong>do</strong> Trabalho estará assegurada apenas quan<strong>do</strong> não houver,<br />

pela natureza <strong>do</strong>s serviços realiza<strong>do</strong>s, relação contratual <strong>de</strong> consumo. A natureza da pretensão <strong>de</strong>duzida em juízo encontra-se fora <strong>do</strong><br />

âmbito das matérias a serem apreciadas na Justiça <strong>do</strong> Trabalho. Recurso <strong>de</strong> revista conheci<strong>do</strong> e <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TST – Recurso <strong>de</strong><br />

Revista 91.600-29.2008.5.15.0051 – Sexta Turma – Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga – DEJT 04.06.2010, p. 842).


De toda sorte, essa forma <strong>de</strong> pensar não é pacífica no próprio Tribunal Superior <strong>do</strong> Trabalho, pois existem outras ementas que<br />

concluem pela competência da Justiça <strong>do</strong> Trabalho para julgar <strong>de</strong>mandas relativas a profissionais liberais, com clara presença da<br />

relação <strong>de</strong> consumo. Vejamos uma <strong>de</strong>ssas <strong>de</strong>cisões:<br />

“Agravo <strong>de</strong> instrumento. Competência material. Justiça <strong>do</strong> Trabalho. Ação <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> honorários advocatícios. Constatada<br />

possível ofensa ao art. 114, I, da Constituição. Merece ser provi<strong>do</strong> o apelo para <strong>de</strong>terminar o processamento <strong>do</strong> recurso <strong>de</strong>nega<strong>do</strong>.<br />

Agravo <strong>de</strong> instrumento a que se dá provimento. II. Recurso <strong>de</strong> revista. Competência material. Justiça <strong>do</strong> Trabalho. Ação <strong>de</strong> cobrança<br />

<strong>de</strong> honorários advocatícios. Emenda Constitucional 45/2004. 1. A reforma <strong>do</strong> Judiciário, mediante a edição da Emenda<br />

Constitucional 45/2004, alargou a competência <strong>de</strong>sta justiça especializada, que <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> apreciar apenas os dissídios oriun<strong>do</strong>s das<br />

relações <strong>de</strong> emprego para passar a conciliar e julgar controvérsias provenientes <strong>de</strong> relações <strong>de</strong> trabalho. Nesta, encontram-se<br />

mitiga<strong>do</strong>s alguns <strong>do</strong>s elementos necessários para a caracterização daquela, mormente a subordinação. 2. Como consequência da<br />

alteração <strong>do</strong> texto constitucional, o Tribunal Superior <strong>do</strong> Trabalho cancelou a Orientação Jurispru<strong>de</strong>ncial 138 da SBDI-2, abrin<strong>do</strong><br />

espaço para que esta especializada processe e julgue as ações <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> honorários advocatícios ajuizadas pelos causídicos em<br />

face da prestação <strong>de</strong> serviços a particulares. Prece<strong>de</strong>nte. Recurso <strong>de</strong> revista conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (TST – RR 363/2007-771-04-40.7<br />

– Oitava Turma – Rel. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi – DEJT 26.06.2009, p. 1.746).<br />

Apesar <strong>de</strong> estar o primeiro entendimento quase que consolida<strong>do</strong>, propõe-se a análise <strong>do</strong>s problemas envolven<strong>do</strong> as relações <strong>de</strong><br />

trabalho versus relações <strong>de</strong> consumo caso a caso, na esteira da tese da pon<strong>de</strong>ração <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s vulneráveis envolvi<strong>do</strong>s, antes<br />

exposta (pon<strong>de</strong>ração meritória).<br />

A encerrar o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> serviço abrangi<strong>do</strong> pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, anote-se que os serviços ofereci<strong>do</strong>s pela<br />

internet também po<strong>de</strong>m (e <strong>de</strong>vem) ser objeto das relações <strong>de</strong> consumo. Aliás, há proposta <strong>de</strong> alteração da Lei 8.078/1990, em curso<br />

no Congresso Nacional, para inclusão <strong>de</strong> dispositivos expressos nesse senti<strong>do</strong>, o que vem em boa hora, para que não resista<br />

qualquer dúvida a respeito da questão (PLS 281/2012). O texto inicial <strong>do</strong> Projeto preten<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ntre outras alterações, introduzir os<br />

arts. 44-A a 44-E ao CDC, incluin<strong>do</strong> a Seção VII ao Capítulo V (“Das Práticas Comerciais”), para tratar <strong>do</strong> comércio eletrônico.<br />

Estabelece a primeira norma que “Esta seção dispõe sobre normas gerais <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r no comércio eletrônico,<br />

visan<strong>do</strong> a fortalecer a sua confiança e assegurar tutela efetiva, com a diminuição da assimetria <strong>de</strong> informações, a preservação da<br />

segurança nas transações, a proteção da auto<strong>de</strong>terminação e da privacida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s pessoais. Parágrafo único. As normas <strong>de</strong>sta<br />

Seção aplicam-se às ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>senvolvidas pelos fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos ou serviços por meio eletrônico ou similar”.<br />

Na mesma linha <strong>de</strong> incidência da Lei Consumerista para tais negócios, foi edita<strong>do</strong>, em março <strong>de</strong> 2013, o Decreto 7.962, que<br />

regulamenta a Lei 8.078/1990 para dispor sobre a contratação no comércio eletrônico. A norma trata das informações claras a<br />

respeito <strong>do</strong> produto, serviço e <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r; <strong>do</strong> atendimento facilita<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r e <strong>do</strong> respeito ao direito <strong>de</strong> arrependimento<br />

em tais negócios digitais.<br />

Estabelece o seu art. 2º, em prol da transparência <strong>de</strong>ssas relações contratuais, que os sítios eletrônicos ou <strong>de</strong>mais meios<br />

eletrônicos utiliza<strong>do</strong>s para oferta ou conclusão <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong>vem disponibilizar, em local <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque e <strong>de</strong> fácil<br />

visualização, as seguintes informações: a) nome empresarial e número <strong>de</strong> inscrição <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, quan<strong>do</strong> houver, no Cadastro<br />

Nacional <strong>de</strong> Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional <strong>de</strong> Pessoas Jurídicas <strong>do</strong> Ministério da Fazenda; b) en<strong>de</strong>reço físico e<br />

eletrônico, e <strong>de</strong>mais informações necessárias para sua localização e contato; c) características essenciais <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço,<br />

incluí<strong>do</strong>s os riscos à saú<strong>de</strong> e à segurança <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res; d) discriminação, no preço, <strong>de</strong> quaisquer <strong>de</strong>spesas adicionais ou<br />

acessórias, tais como as <strong>de</strong> entrega ou seguros; e) condições integrais da oferta, incluídas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> pagamento,<br />

disponibilida<strong>de</strong>, forma e prazo da execução <strong>do</strong> serviço ou da entrega ou disponibilização <strong>do</strong> produto; e f) informações claras e<br />

ostensivas a respeito <strong>de</strong> quaisquer restrições à fruição da oferta.<br />

Em complemento, os sítios eletrônicos ou <strong>de</strong>mais meios eletrônicos utiliza<strong>do</strong>s para ofertas <strong>de</strong> compras coletivas ou<br />

modalida<strong>de</strong>s análogas <strong>de</strong> contratação <strong>de</strong>verão conter, além <strong>de</strong>ssas informações, as seguintes: I – quantida<strong>de</strong> mínima <strong>de</strong><br />

consumi<strong>do</strong>res para a efetivação <strong>do</strong> contrato; II – prazo para utilização da oferta pelo consumi<strong>do</strong>r; e III – i<strong>de</strong>ntificação <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r responsável pelo sítio eletrônico e <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>do</strong> produto ou serviço oferta<strong>do</strong> (art. 3º <strong>do</strong> Decreto).<br />

Nos termos <strong>do</strong> seu art. 4º, para garantir o atendimento facilita<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r no comércio eletrônico, o fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong>verá<br />

apresentar sumário <strong>do</strong> contrato antes da contratação, com as informações necessárias ao pleno exercício <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> escolha <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, enfatizadas as cláusulas que limitem direitos. Deve, ainda, fornecer ferramentas eficazes ao consumi<strong>do</strong>r para<br />

i<strong>de</strong>ntificação e correção imediata <strong>de</strong> erros ocorri<strong>do</strong>s nas etapas anteriores à finalização da contratação. Há também o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong><br />

confirmar imediatamente o recebimento da aceitação da oferta, bem como <strong>de</strong> disponibilizar o contrato ao consumi<strong>do</strong>r em meio que<br />

permita sua conservação e reprodução, imediatamente após a contratação. Impõe-se, na sequência, o <strong>de</strong>ver <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r em<br />

manter serviço a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> e eficaz <strong>de</strong> atendimento em meio eletrônico, que possibilite ao consumi<strong>do</strong>r a resolução <strong>de</strong> <strong>de</strong>mandas<br />

referentes à informação, dúvida, reclamação, suspensão ou cancelamento <strong>do</strong> contrato. Em caso tais, <strong>de</strong>ve o fornece<strong>do</strong>r confirmar<br />

imediatamente o recebimento das <strong>de</strong>mandas <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, pelo mesmo meio emprega<strong>do</strong> pelo consumi<strong>do</strong>r e utilizar mecanismos


<strong>de</strong> segurança eficazes para pagamento e para tratamento <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Diante da boa-fé objetiva, o fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve informar, <strong>de</strong> forma clara e ostensiva, os meios a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s e eficazes para o<br />

exercício <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> arrependimento pelo consumi<strong>do</strong>r, o que po<strong>de</strong> ser efetiva<strong>do</strong> pela mesma ferramenta utilizada para a<br />

contratação, sem prejuízo <strong>de</strong> outros meios disponibiliza<strong>do</strong>s. O exercício <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> arrependimento implica a rescisão <strong>do</strong>s<br />

contratos acessórios, sem qualquer ônus para o consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser comunica<strong>do</strong> imediatamente pelo fornece<strong>do</strong>r à instituição<br />

financeira ou à administra<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> cartão <strong>de</strong> crédito ou similar, para que o negócio seja <strong>de</strong>sfeito e os valores sejam <strong>de</strong>volvi<strong>do</strong>s (art.<br />

5º <strong>do</strong> Decreto 7.962/2013).<br />

As contratações no comércio eletrônico <strong>de</strong>verão observar o cumprimento das condições da oferta, com a entrega <strong>do</strong>s produtos<br />

e serviços contrata<strong>do</strong>s, observa<strong>do</strong>s prazos, quantida<strong>de</strong>, qualida<strong>de</strong> e a<strong>de</strong>quação (art. 6º). O <strong>de</strong>srespeito a qualquer uma <strong>de</strong>ssas regras<br />

enseja o fornece<strong>do</strong>r a penalida<strong>de</strong>s administrativas tratadas pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r (art. 7º).<br />

Por <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iro, sem prejuízo <strong>de</strong> todas essas normas, a ilustrar a já subsunção da Lei Consumerista a serviços <strong>de</strong>ssa natureza,<br />

em <strong>de</strong>bate sobre a existência ou não <strong>de</strong> remuneração direta, da jurisprudência superior: “<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r e responsabilida<strong>de</strong><br />

civil. Recurso especial. In<strong>de</strong>nização. Art. 159 <strong>do</strong> CC/1916 e arts. 6º, VI, e 14, da Lei 8.078/1990. Deficiência na fundamentação.<br />

Súmula 284/STF. Prove<strong>do</strong>r da internet. Divulgação <strong>de</strong> matéria não autorizada. Responsabilida<strong>de</strong> da empresa presta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> serviço.<br />

Relação <strong>de</strong> consumo. Remuneração indireta. Danos morais. Quantum razoável. Valor manti<strong>do</strong>. 1. Não ten<strong>do</strong> a recorrente<br />

explicita<strong>do</strong> <strong>de</strong> que forma o v. acórdão recorri<strong>do</strong> teria viola<strong>do</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s dispositivos legais (art. 159 <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 1916 e<br />

arts. 6º, VI, e 14, ambos da Lei 8.078/1990), não se conhece <strong>do</strong> recurso especial, neste aspecto, porquanto <strong>de</strong>ficiente a sua<br />

fundamentação. Incidência da Súmula 284/STF. 2. Inexiste violação ao art. 3º, § 2º, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r,<br />

porquanto, para a caracterização da relação <strong>de</strong> consumo, o serviço po<strong>de</strong> ser presta<strong>do</strong> pelo fornece<strong>do</strong>r mediante remuneração obtida<br />

<strong>de</strong> forma indireta. 3. Quanto ao dissídio jurispru<strong>de</strong>ncial, consi<strong>de</strong>radas as peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> caso em questão, quais sejam,<br />

psicóloga, funcionária <strong>de</strong> empresa comercial <strong>de</strong> porte, inserida, equivocadamente e sem sua autorização, em site <strong>de</strong> encontros na<br />

internet, pertencente à empresa-recorrente, como ‘pessoa que se propõe a participar <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> caráter afetivo e sexual’,<br />

inclusive com indicação <strong>de</strong> seu nome completo e número <strong>de</strong> telefone <strong>do</strong> trabalho, o valor fixa<strong>do</strong> pelo Tribunal a quo a título <strong>de</strong><br />

danos morais mostra-se razoável, limitan<strong>do</strong>-se à compensação <strong>do</strong> sofrimento advin<strong>do</strong> <strong>do</strong> evento danoso. Valor in<strong>de</strong>nizatório<br />

manti<strong>do</strong> em 200 (duzentos) salários mínimos, passível <strong>de</strong> correção monetária a contar <strong>de</strong>sta data. 4. Recurso não conheci<strong>do</strong>” (STJ –<br />

REsp 566.468/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. Jorge Scartezzini – j. 23.11.2004 – DJ 17.12.2004, p. 561).<br />

3.4.<br />

EXEMPLOS DE OUTRAS RELAÇÕES JURÍDICAS CONTEMPORÂNEAS E O SEU<br />

ENQUADRAMENTO COMO RELAÇÕES DE CONSUMO<br />

Superada a análise <strong>do</strong>s elementos da relação <strong>de</strong> consumo, com a ilustração <strong>de</strong> várias situações concretas atuais, cumpre<br />

abordar outras relações jurídicas contemporâneas, a fim <strong>de</strong> esclarecer os limites concretos <strong>do</strong> campo <strong>de</strong> subsunção da Lei<br />

Consumerista. Vejamos, <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>talhada e pontual.<br />

3.4.1.<br />

O contrato <strong>de</strong> transporte e a incidência <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

O contrato <strong>de</strong> transporte é um <strong>do</strong>s negócios jurídicos com maior aplicação na realida<strong>de</strong>, diante <strong>do</strong> conheci<strong>do</strong> interesse <strong>do</strong> ser<br />

humano em se <strong>de</strong>slocar <strong>de</strong> um local para outro. A categoria é <strong>de</strong>finida pelo art. 730 <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002, in verbis: “Pelo<br />

contrato <strong>de</strong> transporte alguém se obriga, mediante retribuição, a transportar, <strong>de</strong> um lugar para outro, pessoas ou coisas”. Desse<br />

mo<strong>do</strong>, duas são as modalida<strong>de</strong>s básicas tratadas pela codificação privada: o transporte <strong>de</strong> pessoas e o transporte <strong>de</strong> coisas.<br />

Na gran<strong>de</strong> maioria das vezes, haverá relação <strong>de</strong> consumo no transporte <strong>de</strong> pessoas ou coisas. Cite-se, a propósito, o transporte<br />

coletivo por meio <strong>de</strong> ônibus, seja municipal, intermunicipal ou interestadual (veja-se <strong>de</strong>bate em: STJ – REsp 402.227/RJ – Quarta<br />

Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 07.12.2004 – DJ 11.04.2005, p. 305; e STJ – REsp 418.395/MA – Quarta Turma –<br />

Rel. Min. Barros Monteiro – j. 28.05.2002 – DJ 16.09.2002, p. 195). Do mesmo mo<strong>do</strong>, conforme visto no Capítulo 1 <strong>de</strong>sta obra, a<br />

jurisprudência superior tem entendi<strong>do</strong> que o transporte aéreo, seja nacional ou internacional, é abrangi<strong>do</strong> pela Lei 8.078/1990 (por<br />

to<strong>do</strong>s: STJ – AgRg no Ag 1.297.315/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 09.11.2010 – DJe 23.11.2010). E<br />

isso, inclusive nos casos <strong>de</strong> extravios <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>ria transportada (STJ – AgRg no Ag 1.035.077/SP – Terceira Turma – Rel. Min.<br />

Massami Uyeda – j. 22.06.2010 – DJe 01.07.2010).<br />

Seguin<strong>do</strong> nas ilustrações, enten<strong>de</strong> este autor pela incidência <strong>do</strong> CDC para o transporte feito pelo Uber e por outras empresas <strong>de</strong><br />

transporte compartilha<strong>do</strong>. Sen<strong>do</strong> assim, por tal subsunção haverá a responsabilida<strong>de</strong> solidária também da empresa que explora o<br />

aplicativo em casos <strong>de</strong> problemas no serviço <strong>de</strong> transporte. Nessa linha, vejamos conclusão <strong>de</strong> importante prece<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> Tribunal<br />

Paulista, com expressa menção à Lei Consumerista:


“Serviço <strong>de</strong> transporte individual <strong>de</strong> passageiro, com prévia contratação entre as partes, não passível <strong>de</strong> benefícios outorga<strong>do</strong>s aos<br />

permissionários <strong>de</strong> condução <strong>de</strong> táxis. Ativida<strong>de</strong> econômica <strong>de</strong>sempenhada pelo postulante que <strong>de</strong>ve observar o princípio da livre<br />

concorrência e a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, encontran<strong>do</strong> previsão nos artigos 3º e 4º da Lei Fe<strong>de</strong>ral nº 12.587/12 (Lei <strong>de</strong> Diretrizes <strong>de</strong><br />

Mobilida<strong>de</strong> Urbana), que admite a natureza <strong>de</strong> serviço <strong>de</strong> transporte individual priva<strong>do</strong>. Po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vigilância e fiscalização outorga<strong>do</strong><br />

aos entes públicos que <strong>de</strong>ve se restringir às condições <strong>de</strong> conservação e <strong>de</strong> segurança <strong>do</strong> veículo, sua regularida<strong>de</strong> <strong>do</strong>cumental,<br />

aplicação das Leis <strong>de</strong> trânsito, coibição <strong>de</strong> embriaguez ao volante etc., não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a Administração Municipal apreen<strong>de</strong>r veículos<br />

apenas porque o motorista não é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> oficialmente taxista. Inteligência <strong>do</strong>s artigos 1º e 22, §§ 1º e 2º, da Lei Municipal nº<br />

13.775/2010, 1º, IV, 30, V, 170, IV e V, parágrafo único, to<strong>do</strong>s da Constituição Fe<strong>de</strong>ral, e 3º, 4º e 12-A da Lei Fe<strong>de</strong>ral nº<br />

12.587/2012, com alterações da Lei nº 12.865/2013. Decisão reformada para conce<strong>de</strong>r a liminar pleiteada. Recurso provi<strong>do</strong>” (TJSP<br />

– Agravo <strong>de</strong> Instrumento 2110453-72.2016.8.26.0000, Campinas – Acórdão 9745297 – Décima Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Público<br />

– Rel. Des. Djalma Lofrano – j. 24.08.2016 – DJESP 29.09.2016).<br />

Deve ser esclareci<strong>do</strong> o teor <strong>do</strong> art. 732 <strong>do</strong> CC, segun<strong>do</strong> o qual “Aos contratos <strong>de</strong> transporte, em geral, são aplicáveis, quan<strong>do</strong><br />

couber, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não contrariem as disposições <strong>de</strong>ste Código, os preceitos constantes da legislação especial e <strong>de</strong> trata<strong>do</strong>s e<br />

convenções internacionais”. Compreen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o teor <strong>do</strong> coman<strong>do</strong>, não po<strong>de</strong> ele trazer a conclusão <strong>de</strong> que o Código Civil exclui a<br />

incidência <strong>do</strong> CDC, presentes no contrato <strong>de</strong> transporte os elementos da relação <strong>de</strong> consumo. Nesse senti<strong>do</strong>, vejamos o teor <strong>do</strong><br />

Enuncia<strong>do</strong> n. 369 <strong>do</strong> CJF/STJ, aprova<strong>do</strong> na IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil:<br />

“Diante <strong>do</strong> preceito constante no art. 732 <strong>do</strong> Código Civil, teleologicamente e em uma visão constitucional <strong>de</strong> unida<strong>de</strong> <strong>do</strong> sistema,<br />

quan<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> transporte constituir uma relação <strong>de</strong> consumo, aplicam-se as normas <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r que<br />

forem mais benéficas a este”.<br />

Sem prejuízo <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os casos aponta<strong>do</strong>s, nas hipóteses em que o transporte for utiliza<strong>do</strong> com intuito direto <strong>de</strong> lucro, <strong>de</strong>ntro<br />

da máquina produtiva <strong>de</strong> uma empresa, não haverá relação <strong>de</strong> consumo. Nessa linha, vejamos publicação constante <strong>do</strong> Informativo<br />

n. 442 <strong>do</strong> STJ:<br />

“A Turma negou provimento ao recurso especial, manten<strong>do</strong> a <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> tribunal a quo, que enten<strong>de</strong>u inexistir, na espécie, relação<br />

<strong>de</strong> consumo entre, <strong>de</strong> um la<strong>do</strong>, reven<strong>de</strong><strong>do</strong>ra <strong>de</strong> máquinas e equipamentos e, <strong>do</strong> outro, transporta<strong>do</strong>ra. Cui<strong>do</strong>u-se, na origem, <strong>de</strong> ação<br />

in<strong>de</strong>nizatória ajuizada pela ora recorrente sob a alegação <strong>de</strong> que um gera<strong>do</strong>r <strong>de</strong> energia, objeto <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> transporte firma<strong>do</strong><br />

com a empresa recorrida, teria sofri<strong>do</strong> avarias durante o trajeto. O STJ aplica ao caso a teoria finalista, segun<strong>do</strong> a qual se consi<strong>de</strong>ra<br />

consumi<strong>do</strong>r aquele que adquire ou utiliza produto ou serviço como <strong>de</strong>stinatário final. Na espécie, ressaltou-se que o produto não<br />

seria <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> à recorrida, mas a cliente da reven<strong>de</strong><strong>do</strong>ra, motivo pelo qual foi afastada a regra especial <strong>de</strong> competência <strong>do</strong> art. 101,<br />

I, <strong>do</strong> CDC para fazer incidir a <strong>do</strong> art. 100, IV, a, <strong>do</strong> CPC” (STJ – REsp 836.823/PR – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 12.08.2010).<br />

Mais recentemente, <strong>de</strong>cidiu a mesma Corte Superior que, “para efeito <strong>de</strong> fixação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos à merca<strong>do</strong>ria<br />

ocorri<strong>do</strong>s em transporte aéreo internacional, o CDC não prevalece sobre a Convenção <strong>de</strong> Varsóvia quan<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> transporte<br />

tiver por objeto equipamento adquiri<strong>do</strong> no exterior para incrementar a ativida<strong>de</strong> comercial <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> empresária que não se<br />

afigure vulnerável na relação jurídico-obrigacional. Na hipótese em foco, a merca<strong>do</strong>ria transportada <strong>de</strong>stinava-se a ampliar e a<br />

melhorar a prestação <strong>do</strong> serviço e, por conseguinte, aumentar os lucros. Sob esse enfoque, não se po<strong>de</strong> conceber o contrato <strong>de</strong><br />

transporte isoladamente. Na verda<strong>de</strong>, a importação da merca<strong>do</strong>ria tem natureza <strong>de</strong> ato complexo, envolven<strong>do</strong> (i) a compra e venda<br />

propriamente dita, (ii) o <strong>de</strong>sembaraço para retirar o bem <strong>do</strong> país <strong>de</strong> origem, (iii) o eventual seguro, (iv) o transporte e (v) o<br />

<strong>de</strong>sembaraço no país <strong>de</strong> <strong>de</strong>stino mediante o recolhimento <strong>de</strong> taxas, impostos etc. Essas etapas <strong>do</strong> ato complexo <strong>de</strong> importação,<br />

conforme o caso, po<strong>de</strong>m ser efetivadas diretamente por agentes da própria empresa adquirente ou envolver terceiros contrata<strong>do</strong>s<br />

para cada fim específico. Mas essa última possibilida<strong>de</strong> – contratação <strong>de</strong> terceiros –, por si, não permite que se aplique<br />

separadamente, a cada etapa, normas legais diversas da inci<strong>de</strong>nte sobre o ciclo completo da importação. Desse mo<strong>do</strong>, não há como<br />

consi<strong>de</strong>rar a importa<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>stinatária final <strong>do</strong> ato complexo <strong>de</strong> importação nem <strong>do</strong>s atos e contratos intermediários, entre eles o<br />

contrato <strong>de</strong> transporte, para o propósito da tutela protetiva da legislação consumerista, sobretu<strong>do</strong> porque a merca<strong>do</strong>ria importada irá<br />

integrar a ca<strong>de</strong>ia produtiva <strong>do</strong>s serviços presta<strong>do</strong>s pela empresa contratante <strong>do</strong> transporte. (…). A<strong>de</strong>mais, não se <strong>de</strong>sconhece que o<br />

STJ tem atenua<strong>do</strong> a incidência da teoria finalista, aplican<strong>do</strong> o CDC quan<strong>do</strong>, apesar <strong>de</strong> relação jurídico-obrigacional entre<br />

comerciantes ou profissionais, estiver caracterizada situação <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> ou hipossuficiência. Entretanto, a empresa<br />

importa<strong>do</strong>ra não apresenta vulnerabilida<strong>de</strong> ou hipossuficiência, o que afasta a incidência das normas <strong>do</strong> CDC. Dessa forma,<br />

inexistin<strong>do</strong> relação <strong>de</strong> consumo, circunstância que impe<strong>de</strong> a aplicação das regras específicas <strong>do</strong> CDC, há que ser observada a<br />

Convenção <strong>de</strong> Varsóvia, que regula especificamente o transporte aéreo internacional” (STJ – REsp 1.162.649/SP – Rel. originário<br />

Min. Luis Felipe Salomão – Rel. para acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira – j. 13.05.2014 – publica<strong>do</strong> no seu Informativo n.<br />

541).<br />

Como está claro da última <strong>de</strong>cisum, as <strong>de</strong>duções merecem ser ressalvadas para as hipóteses envolven<strong>do</strong> pessoas vulneráveis ou


hipossuficientes, situações em que o CDC po<strong>de</strong> se subsumir, diante da incidência da teoria finalista aprofundada ou maximalista,<br />

na esteira <strong>do</strong> antes exposto. Cite-se, a esse propósito e como consta da ementa <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>ira, uma pequena empresa que adquire uma<br />

máquina para a sua ativida<strong>de</strong> principal, e cujo transporte é contrata<strong>do</strong> em outro negócio <strong>de</strong> consumo.<br />

3.4.2.<br />

Os serviços públicos e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

O caput <strong>do</strong> art. 22 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é bem claro no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> abranger os serviços públicos, enuncian<strong>do</strong><br />

que “Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma <strong>de</strong><br />

empreendimento, são obriga<strong>do</strong>s a fornecer serviços a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos”. Como se<br />

<strong>de</strong>preen<strong>de</strong> da simples leitura <strong>do</strong> coman<strong>do</strong>, o CDC abrange to<strong>do</strong>s os serviços públicos, sejam eles presta<strong>do</strong>s diretamente pelo Esta<strong>do</strong><br />

ou por empresas privadas. Desse mo<strong>do</strong>, a título <strong>de</strong> exemplo, aplica-se a Lei 8.078/1990 nas seguintes situações concretas:<br />

–<br />

–<br />

–<br />

–<br />

–<br />

Serviços <strong>de</strong> transporte público para <strong>de</strong>stinatários finais: STJ – REsp 976.836/RS – Primeira Seção – Rel. Min. Luiz Fux<br />

– j. 25.08.2010 – DJe 05.10.2010.<br />

Prestação <strong>de</strong> serviços ro<strong>do</strong>viários, por meio <strong>de</strong> empresas concessionárias: STJ – AgRg no Ag 1067391/SP – Quarta<br />

Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 25.05.2010 – DJe 17.06.2010; e STJ – REsp 647.710/RJ – Terceira<br />

Turma – Rel. Min. Castro Filho – j. 20.06.2006 – DJ 30.06.2006, p. 216.<br />

Serviços públicos <strong>de</strong> educação: TJRS – Acórdão 70022516512, Encanta<strong>do</strong> – Nona Câmara Cível – Rel. Des. O<strong>do</strong>ne<br />

Sanguiné – j. 16.04.2008 – DOERS 23.09.2008, p. 27; e TJMT – Apelação 63396/2009, Capital – Terceira Câmara<br />

Cível – Rel. Des. José Ta<strong>de</strong>u Cury – j. 23.02.2010 – DJMT 03.03.2010, p. 26 (julga<strong>do</strong>s relaciona<strong>do</strong>s a agressões e<br />

aci<strong>de</strong>nte ocorri<strong>do</strong>s no interior <strong>de</strong> escolas públicas).<br />

Serviços <strong>de</strong> telefonia fixa ou móvel: STJ – AgRg no AgRg no REsp 1.032.454/RJ – Primeira Turma – Rel. Min. Luiz Fux<br />

– j. 06.10.2009 – DJe 16.10.2009.<br />

Serviços públicos <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> água e esgoto, luz (energia elétrica) e gás, respectivamente: STJ – AgRg no<br />

REsp 1.151.496/SP – Primeira Turma – Rel. Min. Arnal<strong>do</strong> Esteves Lima – j. 23.11.2010 – DJe 02.12.2010; STJ –<br />

AgRg no REsp 1.016.463/MA – Primeira Turma – Rel. Min. Arnal<strong>do</strong> Esteves Lima – j. 14.12.2010 – DJe 02.02.2011;<br />

STJ – REsp 661.145/ES – Quarta Turma – Rel. Min. Jorge Scartezzini – j. 22.02.2005 – DJ 28.03.2005, p. 286.<br />

Como bem observa Luiz Antonio Rizzatto Nunes, a existência <strong>do</strong> art. 22 <strong>do</strong> CDC, “por si só, é <strong>de</strong> fundamental importância<br />

para impedir que presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços públicos pu<strong>de</strong>ssem construir ‘teorias’, para tentar dizer que não estariam submeti<strong>do</strong>s às<br />

normas <strong>do</strong> CDC. Aliás, mesmo com a expressa redação <strong>do</strong> art. 22, ainda assim há presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços que lutam na Justiça<br />

‘fundamenta<strong>do</strong>s’ no argumento <strong>de</strong> que não estão submeti<strong>do</strong>s às regras da Lei 8.078/1990”.28 Feito tal esclarecimento contun<strong>de</strong>nte,<br />

ao qual o presente autor está filia<strong>do</strong>, ainda será exposto no presente trabalho o <strong>de</strong>bate acerca da interrupção <strong>de</strong> serviços públicos<br />

essenciais, o que envolve o cita<strong>do</strong> coman<strong>do</strong> consumerista.<br />

3.4.3.<br />

O con<strong>do</strong>mínio edilício e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

Questão que sempre surge resi<strong>de</strong> em saber se o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é aplica<strong>do</strong> às relações existentes entre<br />

condôminos e con<strong>do</strong>mínio edilício, tratadas pelo Código Civil <strong>de</strong> 2002 entre os seus arts. 1.331 e 1.358. De início, é preciso ter em<br />

mente que tal relação jurídica é, essencialmente, uma relação <strong>do</strong>minial, estabelecida substancialmente entre bens, e não entre<br />

pessoas. Por isso é que o con<strong>do</strong>mínio é estuda<strong>do</strong> no livro <strong>de</strong>dica<strong>do</strong> ao <strong>Direito</strong> das Coisas. Não haven<strong>do</strong> uma relação direta entre<br />

sujeitos, isso exclui por si só a incidência da Lei 8.078/1990, pois não se preenche os requisitos mínimos <strong>de</strong> alterida<strong>de</strong> previstos<br />

entre os seus arts. 2º e 3º. Nessa linha, já concluiu o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, em <strong>de</strong>cisão publicada no seu Informativo n. 297:<br />

“Segun<strong>do</strong> a jurisprudência, não há relação <strong>de</strong> consumo entre condômino e con<strong>do</strong>mínio para litígios envolven<strong>do</strong> cobrança <strong>de</strong> taxas,<br />

muito menos po<strong>de</strong>ríamos cogitar da existência <strong>de</strong> tal relação entre o profissional contrata<strong>do</strong> pelo con<strong>do</strong>mínio para controlar tais<br />

cobranças e um <strong>do</strong>s condôminos, tal como no caso. O réu, conta<strong>do</strong>r, foi contrata<strong>do</strong> pelo con<strong>do</strong>mínio, para prestar serviços, caben<strong>do</strong><br />

ao contratante a publicida<strong>de</strong> ou não <strong>do</strong> rol <strong>de</strong> inadimplentes fornecida por ele. Por simples análise <strong>do</strong> caso, conclui-se inexistir<br />

relação <strong>de</strong> consumo entre o condômino e o conta<strong>do</strong>r, há entre o con<strong>do</strong>mínio e seu contrata<strong>do</strong>, o conta<strong>do</strong>r. Apenas o con<strong>do</strong>mínio,<br />

nesta condição, po<strong>de</strong> ser caracteriza<strong>do</strong> como consumi<strong>do</strong>r, pois a prestação <strong>do</strong> serviço <strong>de</strong> conta<strong>do</strong>ria fora <strong>de</strong>stinada àquele como um<br />

fim em si mesmo, e não, individualmente, a cada um <strong>do</strong>s condôminos. Não há, portanto, como se vislumbrar qualquer relação <strong>de</strong><br />

consumo entre o conta<strong>do</strong>r e o condômino, ou qualquer responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> conta<strong>do</strong>r em relação direta ao condômino, pela<br />

publicida<strong>de</strong> <strong>do</strong> seu nome no rol <strong>do</strong>s inadimplentes, publicação que, segun<strong>do</strong> se afirma, sequer chegou a acontecer” (STJ – REsp<br />

441.873-DF – Rel. Min. Castro Filho – j. 19.09.2006).<br />

No Tribunal da Cidadania, tal forma <strong>de</strong> pensar se consoli<strong>do</strong>u <strong>de</strong> tal forma que passou a compor a ferramenta Jurisprudência


em Teses, da Corte. Conforme a premissa número 10, constante <strong>de</strong> sua Edição 68, <strong>de</strong>dicada ao con<strong>do</strong>mínio edilício e publicada em<br />

2016, “nas relações jurídicas estabelecidas entre con<strong>do</strong>mínio e condôminos não inci<strong>de</strong> o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r”. Sem<br />

prejuízo <strong>do</strong> último aresto, são cita<strong>do</strong>s como prece<strong>de</strong>ntes: AgRg no REsp 1.096.723/PR – Quarta Turma – Rel. Min. Marco Buzzi –<br />

j. 07.04.2015 – DJe 14.04.2015; AgRg no AREsp 506.687/DF – Quarta Turma – Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 05.02.2015 –<br />

DJe 20.02.2015; REsp 860.064/PR – Quarta Turma – Rel. Min. Raul Araújo – j. 27.03.2012 – DJe 02.08.2012; e AgRg no Ag<br />

1.122.191/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 22.06.2010 – DJe 01.07.2010).<br />

Na mesma forma <strong>de</strong> pensar, concluin<strong>do</strong> pela inexistência das figuras <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>r e consumi<strong>do</strong>r, <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Minas<br />

Gerais, em acórdão relaciona<strong>do</strong> à discussão das taxas con<strong>do</strong>miniais, para ilustrar:<br />

“Apelação cível. Cerceamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa. Decisão proferida em audiência. Preclusão. Discussão sobre questão já <strong>de</strong>cidida. Coisa<br />

julgada. Conhecer parcialmente <strong>do</strong> recurso. Ação <strong>de</strong> cobrança. Taxa <strong>de</strong> con<strong>do</strong>mínio. Inaplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> CDC. Revelia. Provimento<br />

da pretensão. Manutenção. 1. Contra as <strong>de</strong>cisões interlocutórias proferidas na audiência <strong>de</strong> instrução e julgamento caberá agravo na<br />

forma retida, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser interposto oral e imediatamente, conforme disposto no § 3º, <strong>do</strong> art. 522, <strong>do</strong> CPC; embora não se submetam<br />

as <strong>de</strong>cisões interlocutórias ao fenômeno da coisa julgada material, estão elas sujeitas ao fenômeno da preclusão. 2. As questões que<br />

já foram <strong>de</strong>cididas e transitaram em julga<strong>do</strong> através <strong>de</strong> acórdão proferi<strong>do</strong> não po<strong>de</strong>m ser novamente discutidas, sob pena <strong>de</strong> ser<br />

viola<strong>do</strong> o princípio da coisa julgada. 3. Em razão da ausência das figuras <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r e <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, não se aplicam as<br />

disposições <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r à relação entre condômino e con<strong>do</strong>mínio. 4. Sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>cretada a revelia, reputam-se<br />

verda<strong>de</strong>iros o valor e o perío<strong>do</strong> exigi<strong>do</strong>s pela parte autora na ação <strong>de</strong> cobrança” (TJMG – Apelação Cível 1.0687.08.062715-5/0021,<br />

Timóteo – Nona Câmara Cível – Rel. Des. Pedro Bernar<strong>de</strong>s – j. 10.11.2009 – DJEMG 01.03.2010).<br />

Por fim, quanto ao tema, pelo caminho da existência <strong>de</strong> uma obrigação própria da coisa ou ambulatória (propter rem), e não <strong>de</strong><br />

uma interação puramente pessoal, como ocorre nas relações <strong>de</strong> consumo, <strong>do</strong> Tribunal Paulista:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Ação <strong>de</strong> cobrança. Valor <strong>do</strong> débito. Incidência <strong>de</strong> juros <strong>de</strong> 1% a partir da citação. Multa <strong>de</strong> 2% a partir da vigência <strong>do</strong><br />

atual Código Civil, não haven<strong>do</strong> falar em vinculação ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Recurso <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>. 1. A relação<br />

jurídica estabelecida entre con<strong>do</strong>mínio e condômino não é regida pelas normas <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, pois se trata <strong>de</strong><br />

obrigação propter rem, regida pelas normas <strong>do</strong> Código Civil. 2. Em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> ilícito contratual. Não pagamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>spesas<br />

con<strong>do</strong>miniais. Os juros moratórios inci<strong>de</strong>m, a partir da vigência <strong>do</strong> Código Civil em vigor, no percentual <strong>de</strong> 1% ao mês, conta<strong>do</strong> da<br />

citação, nos termos <strong>do</strong> art. 406 <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002 cumula<strong>do</strong> com o art. 161, § 1º, <strong>do</strong> CTN” (TJSP – Apelação 992.08.068926-<br />

3 – Acórdão 4239916, São Paulo – Vigésima Nona Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Reinal<strong>do</strong> Caldas – j. 09.12.2009 – DJESP<br />

26.02.2010).<br />

A findar o tópico, cabe esclarecer que as conclusões supra valem para as relações con<strong>do</strong>miniais internas, mantidas entre<br />

condôminos e con<strong>do</strong>mínio. Eventualmente, como antes <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong>, po<strong>de</strong> o con<strong>do</strong>mínio edilício assumir a posição <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r<br />

em face <strong>de</strong> terceiro.<br />

3.4.4.<br />

A incidência <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r para os contratos <strong>de</strong> locação urbana<br />

Prevalece em se<strong>de</strong> <strong>do</strong>utrinária e jurispru<strong>de</strong>ncial, no Brasil, o afastamento da locação imobiliária como contrato <strong>de</strong> consumo.<br />

Como uma das principais justificativas, argumenta-se pela existência <strong>de</strong> um estatuto jurídico próprio a regulamentar a relação<br />

jurídica estabelecida entre loca<strong>do</strong>r e locatário, no caso a Lei <strong>de</strong> Locação (Lei 8.245/1991). A<strong>de</strong>mais, é sustenta<strong>do</strong> que o loca<strong>do</strong>r não<br />

po<strong>de</strong> ser ti<strong>do</strong> como fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r, pela ausência <strong>de</strong> uma ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>scrita no CDC e da profissionalida<strong>de</strong> própria <strong>de</strong>ssas<br />

qualificações. Nessa linha <strong>de</strong> conclusão, vejamos recente <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> STJ, relativa a cláusulas abusivas introduzidas por<br />

imobiliárias em contratos <strong>de</strong> locação:<br />

“Locação. Ação civil pública proposta em face <strong>de</strong> apenas uma administra<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> imóvel. Cláusula contratual abusiva. Ilegitimida<strong>de</strong><br />

ativa <strong>do</strong> Ministério Público Estadual. <strong>Direito</strong> individual priva<strong>do</strong>. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Inaplicabilida<strong>de</strong>. 1. Nos termos<br />

<strong>do</strong> art. 129, inc. III, da Constituição Fe<strong>de</strong>ral e <strong>do</strong> art. 25, inc. IV, letra a, da Lei 8.625/1993, possui o Ministério Público, como<br />

função institucional, a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos. 2. No caso <strong>do</strong>s autos, a<br />

falta <strong>de</strong> configuração <strong>de</strong> interesse coletivo afasta a legitimida<strong>de</strong> ativa ad causam <strong>do</strong> Ministério Público para ajuizar ação civil<br />

pública objetivan<strong>do</strong> a <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusulas abusivas constantes <strong>de</strong> contratos <strong>de</strong> locação realiza<strong>do</strong>s com apenas uma<br />

administra<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> ramo imobiliário. 3. É pacífica e remansosa a jurisprudência, nesta Corte, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que o Código <strong>de</strong> Defesa<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r não é aplicável aos contratos locatícios, que são reguladas por legislação própria. Prece<strong>de</strong>ntes. 4. Recurso especial<br />

<strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 605.295/MG – Quinta Turma – Rel. Min. Laurita Vaz – j. 20.10.2009 – DJe 02.08.2010).<br />

Do mesmo mo<strong>do</strong>, em outro <strong>de</strong>bate, daquela Superior Instância:<br />

“Administrativo. Agravo regimental no agravo <strong>de</strong> instrumento contra <strong>de</strong>cisão que in<strong>de</strong>feriu o processamento <strong>do</strong> recurso especial.<br />

Art. 535 <strong>do</strong> CPC. Omissão que não se verifica. Contrato <strong>de</strong> locação. Aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.


Impossibilida<strong>de</strong>. Incidência das Súmulas 5 e 7 <strong>do</strong> STJ. Agravo regimental <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>. 1. Não há falar em omissão quan<strong>do</strong> o<br />

Tribunal <strong>de</strong> origem se manifesta fundamentadamente a respeito <strong>de</strong> todas as questões postas à sua apreciação, <strong>de</strong>cidin<strong>do</strong>, entretanto,<br />

contrariamente aos interesses da agravante. A<strong>de</strong>mais, o magistra<strong>do</strong> não está obriga<strong>do</strong> a rebater, um a um, os argumentos<br />

apresenta<strong>do</strong>s pela parte. 2. A jurisprudência <strong>de</strong>sta Corte é firme quanto à impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r nas relações locatícias, regidas pela Lei 8.245/1991. Prece<strong>de</strong>ntes. 3. O reexame <strong>de</strong> provas e cláusulas contratuais,<br />

imprescindível para eventual alteração <strong>do</strong> exame <strong>do</strong> julga<strong>do</strong> a quo quanto à natureza <strong>do</strong> contrato firma<strong>do</strong> entre as partes, encontra<br />

óbice nas Súmulas 5 e 7 <strong>de</strong>sta Corte. 4. Agravo regimental <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg-Ag 1.089.413/SP – Quinta Turma – Rel. Min.<br />

Napoleão Nunes Maia Filho – j. 08.06.2010 – DJe 28.06.2010).<br />

Não tem si<strong>do</strong> outra a conclusão <strong>do</strong>s Tribunais Estaduais, sen<strong>do</strong> pertinente <strong>de</strong>stacar apenas algumas das numerosas ementas que<br />

afastam a subsunção <strong>do</strong> CDC às relações locatícias, na linha <strong>do</strong> exposto anteriormente:<br />

“Locação <strong>de</strong> imóveis. Ação <strong>de</strong> <strong>de</strong>spejo por falta <strong>de</strong> pagamento cumulada com rescisão contratual e cobrança. Débito confessa<strong>do</strong>.<br />

Recusa da loca<strong>do</strong>ra no recebimento <strong>do</strong>s aluguéis que <strong>de</strong>veria ensejar ação <strong>de</strong> consignação em pagamento, o que não ocorreu. Multa<br />

fixada no contrato. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Inaplicabilida<strong>de</strong>. Sentença mantida. Apelação improvida” (TJSP – Apelação<br />

0161257-53.2008.8.26.0002 – Acórdão 5009862, São Paulo – Trigésima Sexta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Jayme <strong>de</strong><br />

Queiroz Lopes – j. 17.03.2011 – DJESP 29.03.2011).<br />

“Embargos à execução. Locação predial urbana. Multa pactuada em 20% (vinte por cento), sobre o débito apura<strong>do</strong> (vencimento<br />

antecipa<strong>do</strong> <strong>de</strong> parcelas). Abusivida<strong>de</strong> inocorrente. Inaplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Relação <strong>de</strong> consumo.<br />

Inexistência. Exequente que <strong>de</strong>caiu <strong>de</strong> parte mínima <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>. Ausência <strong>de</strong> sucumbência recíproca. Impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> con<strong>de</strong>nação<br />

nos ônus sucumbenciais. Inteligência <strong>do</strong> art. 21, parágrafo único, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. Verba honorária. Majoração. Art. 20,<br />

§ 4º, <strong>do</strong> CPC” (TJMG – Apelação Cível 5009106-74.2009.8.13.0024, Belo Horizonte – Nona Câmara Cível – Rel. Des. Tarcisio<br />

Martins Costa – j. 14.12.2010 – DJEMG 24.01.2011).<br />

“Apelação cível. Locação. Ação <strong>de</strong> <strong>de</strong>spejo cumulada com cobrança. Purga da mora. Necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito <strong>do</strong> valor integral.<br />

Multa moratória. Inaplicabilida<strong>de</strong> das regras <strong>do</strong> CDC. ausência <strong>de</strong> abusivida<strong>de</strong> no contrato. Caso em que a autora comprova o fato<br />

constitutivo <strong>de</strong> seu direito e não ten<strong>do</strong> o réu <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> o cumprimento integral <strong>de</strong> sua obrigação ou comprova<strong>do</strong> fato impeditivo,<br />

a manutenção da sentença é medida que se impõe. Ausência <strong>de</strong> comprovação da integral quitação <strong>do</strong> débito, sen<strong>do</strong> que a purga da<br />

mora <strong>de</strong>ve aten<strong>de</strong>r aos requisitos dispostos no art. 62, inc. II, da Lei <strong>do</strong> Inquilinato. A multa moratória pactuada no contrato <strong>de</strong><br />

locação (20%) não é ilegal, pois o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r não inci<strong>de</strong> nos contratos <strong>de</strong> locação <strong>de</strong> imóvel por não se tratar<br />

<strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo e nem prestação <strong>de</strong> serviço, caracterizan<strong>do</strong>-se, objetivamente, como uma cessão <strong>de</strong> uso remunera<strong>do</strong>. Apelo<br />

<strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJRS – Apelação Cível 70033045204, São Leopol<strong>do</strong> – Décima Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Marco Aurélio <strong>do</strong>s<br />

Santos Caminha – j. 27.01.2011 – DJERS 09.02.2011).<br />

Ressalve-se a opinião pessoal <strong>do</strong> presente autor – a partir das lições expostas por Claudia Lima Marques quan<strong>do</strong> da IV<br />

Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil (2006) – no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> subsunção <strong>do</strong> CDC para as hipóteses em que o loca<strong>do</strong>r é um<br />

profissional na ativida<strong>de</strong> locatícia, sen<strong>do</strong> viável juridicamente qualificá-lo como presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> moradia. Anote-se que a<br />

tese da existência <strong>de</strong> um estatuto jurídico próprio a disciplinar a matéria não afasta totalmente a incidência possível da Lei<br />

Consumerista, servin<strong>do</strong> como substrato bastante para tanto a festejada tese <strong>do</strong> diálogo das fontes. Tal entendimento, por certo,<br />

ainda é minoritário na <strong>do</strong>utrina, não haven<strong>do</strong> ainda julga<strong>do</strong> conheci<strong>do</strong> a aplicá-lo. A propósito, vejamos as palavras <strong>de</strong> Sérgio<br />

Cavalieri Filho sobre essa problemática:<br />

“A Mestre Claudia Lima Marques mantém-se firme em seu entendimento <strong>de</strong> que a aplicação das normas protetivas <strong>do</strong> CDC <strong>de</strong>veria<br />

ser a regra na locação resi<strong>de</strong>ncial. Em que pese a autorida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s seus argumentos, a maioria da <strong>do</strong>utrina e da jurisprudência inclinase<br />

pela não incidência <strong>do</strong> CDC nas relações resi<strong>de</strong>nciais. De regra, o loca<strong>do</strong>r não faz da locação uma ativida<strong>de</strong> habitual, profissional,<br />

<strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a caracteriza-lo como fornece<strong>do</strong>r, salvo em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> empresa proprietária <strong>de</strong> muitos imóveis <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>s à locação”.29<br />

Como se po<strong>de</strong> notar, o próprio jurista abre margem para outra interpretação. Consigne-se que a questão foi recentemente<br />

<strong>de</strong>batida em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> acórdão prolata<strong>do</strong> pelo Tribunal Paulista. Vejamos:<br />

“Locação. Despejo por falta <strong>de</strong> pagamento cumula<strong>do</strong> com cobrança <strong>de</strong> alugueres e encargos. Ação julgada parcialmente proce<strong>de</strong>nte.<br />

Não incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Irrelevância <strong>de</strong> que loca<strong>do</strong>r não seja proprietário <strong>do</strong> imóvel. Vínculo <strong>de</strong><br />

natureza pessoal. Responsabilida<strong>de</strong> até a entrega das chaves ao loca<strong>do</strong>r e não da lavratura <strong>do</strong> auto <strong>de</strong> imissão na posse. Exclusão,<br />

a<strong>de</strong>mais, da multa compensatória e que não se confun<strong>de</strong> com aquela moratória. Recurso provi<strong>do</strong> em parte. Não há relação <strong>de</strong><br />

consumo entre <strong>do</strong>is particulares que <strong>de</strong>liberam contratar a locação <strong>de</strong> imóvel, nada existin<strong>do</strong> que possa enquadrar o autor como<br />

sen<strong>do</strong> ‘loca<strong>do</strong>r profissional’. (…)” (TJSP – Apelação 992.08.027721-6 – Acórdão 4340494, Avaré – Trigésima Segunda Câmara <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Kioitsi Chicuta – j. 25.02.2010 – DJESP 23.03.2010).<br />

A tendência <strong>de</strong> comunicação entre as normas parece indicar uma possível aplicação <strong>do</strong> CDC para os casos <strong>de</strong> loca<strong>do</strong>res


profissionais no futuro, o que viria em boa hora. Ato contínuo, já se aplica a Lei 8.078/1990 às relações jurídicas estabelecidas<br />

entre loca<strong>do</strong>res e locatários e imobiliárias que lhes prestam serviços. Nessa linha correta <strong>de</strong> raciocínio, <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça e <strong>do</strong> Tribunal <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral, em <strong>de</strong>mandas coletivas:<br />

“Processo civil. Ação civil pública. Locação. Cláusulas abusivas. Administra<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> imóveis. Legitimida<strong>de</strong> passiva ad causam.<br />

Interesses individuais homogêneos. As administra<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> imóveis são legitimadas para figurarem no polo passivo em ações civis<br />

coletivas propostas pelo Ministério Público com objetivo <strong>de</strong> <strong>de</strong>clarar nulida<strong>de</strong> e modificação <strong>de</strong> cláusulas abusivas, contidas em<br />

contratos <strong>de</strong> locação elaboradas por aquelas. (Prece<strong>de</strong>ntes). Recurso especial provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 614.981/MG – Quinta Turma –<br />

Rel. Min. Felix Fischer – j. 09.08.2005 – DJ 26.09.2005, p. 439).<br />

“Processo civil. Ação civil pública. Ministério Público. Legitimida<strong>de</strong>. 1. O Ministério Público Fe<strong>de</strong>ral está legitima<strong>do</strong> a recorrer à<br />

instância especial nas ações ajuizadas pelo Ministério Público Estadual. 2. O MP está legitima<strong>do</strong> a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r direitos individuais<br />

homogêneos, quan<strong>do</strong> tais direitos têm repercussão no interesse público. 3. Questão referente a contrato <strong>de</strong> locação, formula<strong>do</strong> como<br />

contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são pelas empresas loca<strong>do</strong>ras, com exigência da Taxa Imobiliária para inquilinos, é <strong>de</strong> interesse público pela<br />

repercussão das locações na socieda<strong>de</strong>. 4. Embargos <strong>de</strong> divergência conheci<strong>do</strong>s e recebi<strong>do</strong>s” (STJ – EREsp 114.908/SP – Corte<br />

Especial – Rel. Min. Eliana Calmon – j. 07.11.2001 – DJ 20.05.2002, p. 95).<br />

“Apelação cível. Ação civil pública. Cabimento. Locação. Contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. Cobrança <strong>de</strong> juros <strong>de</strong> mora abusivos. relação havida<br />

entre inquilinos e administra<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> imóveis. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Aplicabilida<strong>de</strong>. Interesses individuais homogêneos.<br />

Interesse público. Proprieda<strong>de</strong> da via eleita. Sentença cassada. I. Diferentemente da existente entre loca<strong>do</strong>r e locatário, a relação<br />

jurídica havida entre este e a imobiliária, presta<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> serviço <strong>de</strong> intermediação <strong>de</strong> locação <strong>de</strong> móveis, qualifica-se como <strong>de</strong><br />

consumo, nos estritos mol<strong>de</strong>s <strong>do</strong> art. 14 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. II. A questão referente a contrato <strong>de</strong> locação,<br />

formula<strong>do</strong> como <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são pelas empresas administra<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> imóveis, é <strong>de</strong> interesse público pela repercussão das locações na<br />

socieda<strong>de</strong>. Prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> egrégio Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça. III. A cobrança <strong>de</strong> encargos abusivos em contratos locatícios <strong>de</strong><br />

a<strong>de</strong>são, firma<strong>do</strong>s entre locatários e a imobiliária que administra os imóveis respectivos, perfaz-se liame hábil a caracterizar o<br />

interesse individual homogêneo que autoriza a <strong>de</strong>fesa por meio <strong>de</strong> ação coletiva. IV. Apelo provi<strong>do</strong> para cassar a sentença” (TJDF –<br />

Recurso 2009.04.1.012604-6 – Acórdão 481.411 – Primeira Turma Cível – Rel. Des. Nivio Geral<strong>do</strong> Gonçalves – DJDFTE<br />

23.02.2011, p. 114).<br />

Mais recentemente, <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, merece <strong>de</strong>staque outro julga<strong>do</strong> a respeito das imobiliárias, que traz<br />

corretas <strong>de</strong>duções a respeito da vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> a<strong>de</strong>rente: “<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Aplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> CDC aos contratos <strong>de</strong><br />

administração imobiliária. É possível a aplicação <strong>do</strong> CDC à relação entre proprietário <strong>de</strong> imóvel e a imobiliária contratada por ele<br />

para administrar o bem. Isso porque o proprietário <strong>do</strong> imóvel é, <strong>de</strong> fato, <strong>de</strong>stinatário final fático e também econômico <strong>do</strong> serviço<br />

presta<strong>do</strong>. Revela-se, ainda, a presunção da sua vulnerabilida<strong>de</strong>, seja porque o contrato firma<strong>do</strong> é <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, seja porque é uma<br />

ativida<strong>de</strong> complexa e especializada ou, ainda, porque os merca<strong>do</strong>s se comportam <strong>de</strong> forma diferenciada e específica em cada lugar<br />

e perío<strong>do</strong>. No cenário caracteriza<strong>do</strong> pela presença da administra<strong>do</strong>ra na ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> locação imobiliária sobressaem pelo menos<br />

duas relações jurídicas distintas: a <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> serviços, estabelecida entre o proprietário <strong>de</strong> um ou mais imóveis e a<br />

administra<strong>do</strong>ra; e a <strong>de</strong> locação propriamente dita, em que a imobiliária atua como intermediária <strong>de</strong> um contrato <strong>de</strong> locação. Nas<br />

duas situações, evi<strong>de</strong>ncia-se a <strong>de</strong>stinação final econômica <strong>do</strong> serviço presta<strong>do</strong> ao contratante, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> a relação jurídica<br />

estabelecida ser regida pelas disposições <strong>do</strong> diploma consumerista” (REsp 509.304/PR – Rel. Min. Villas Bôas Cueva – j.<br />

16.05.2013, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 523).<br />

Ainda a ilustrar, e com tom mais ampliativo, o Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral admitiu a figura <strong>do</strong> locatário<br />

consumi<strong>do</strong>r por equiparação ou bystan<strong>de</strong>r, incidin<strong>do</strong> os arts. 17 e 29 <strong>do</strong> CDC. Na hipótese, um falsário celebrou contrato <strong>de</strong><br />

locação em nome <strong>de</strong> outrem, que foi prejudica<strong>do</strong> pela relação jurídica estabelecida, diante da sua inscrição em cadastro <strong>de</strong><br />

inadimplentes. De toda sorte, o julga<strong>do</strong> afastou o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar <strong>do</strong> loca<strong>do</strong>r, pela presença da culpa exclusiva <strong>de</strong> terceiro, uma<br />

das exclu<strong>de</strong>ntes da responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. Vejamos a ementa da <strong>de</strong>cisão:<br />

“Civil e direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Contratos <strong>de</strong> locação. Celebração mediante frau<strong>de</strong>. Falsificação impassível <strong>de</strong> ser aferida. Cautelas<br />

observadas pela loca<strong>do</strong>ra. Exibição <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os <strong>do</strong>cumentos pessoais, comprovante <strong>de</strong> residência e <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> imóvel.<br />

Inserção <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r vitima<strong>do</strong> pela frau<strong>de</strong> em cadastro <strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>res inadimplentes. Fatos <strong>de</strong>correntes da culpa <strong>de</strong><br />

terceiro. Causa exclu<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> (CDC, art. 14, § 3º, II). Responsabilização da fornece<strong>do</strong>ra. Impossibilida<strong>de</strong>. 1 –<br />

Conquanto não tenha concerta<strong>do</strong> nenhum vínculo obrigacional nem manti<strong>do</strong> relacionamento comercial com a empresa especializada<br />

na locação e administração <strong>de</strong> imóveis, o autor, em ten<strong>do</strong> experimenta<strong>do</strong> as consequências <strong>de</strong>rivadas da celebração <strong>de</strong> contratos <strong>de</strong><br />

locação em seu nome pelo falsário que se passara por sua pessoa, equipara-se ao consumi<strong>do</strong>r ante o enquadramento <strong>do</strong> havi<strong>do</strong> na<br />

conceituação que está impregnada no artigo 17 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2 – Emoldura<strong>do</strong> o relacionamento havi<strong>do</strong><br />

como sen<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo, a responsabilida<strong>de</strong> da fornece<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> serviços é <strong>de</strong> natureza objetiva, prescindin<strong>do</strong> sua caracterização da<br />

comprovação <strong>de</strong> que tenha agi<strong>do</strong> com culpa, bastan<strong>do</strong> tão somente a comprovação <strong>de</strong> que ocorrera o ilícito e que <strong>de</strong>le tenha<br />

emergi<strong>do</strong> efeitos materiais afetan<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r para que sua obrigação emirja, sen<strong>do</strong>-lhe ressalva<strong>do</strong>, contu<strong>do</strong>, o direito <strong>de</strong> se


eximir da sua responsabilização se evi<strong>de</strong>nciar que o havi<strong>do</strong> <strong>de</strong>rivara da culpa exclusiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r ou <strong>de</strong> terceiro, qualifican<strong>do</strong>se<br />

essas ocorrências como causas exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> (CDC, art. 14, § 3º, II). 3 – Aferi<strong>do</strong> que as celebrações <strong>do</strong>s<br />

contratos que foram concerta<strong>do</strong>s <strong>de</strong> forma fraudulenta em nome <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r foram precedidas <strong>de</strong> todas as cautelas possíveis e<br />

passíveis <strong>de</strong> serem exigidas da fornece<strong>do</strong>ra, pois lhe foram exibi<strong>do</strong>s to<strong>do</strong>s os <strong>do</strong>cumentos pessoais daquele com quem contratara,<br />

comprovantes <strong>de</strong> residência e <strong>de</strong> que possuía imóvel e as assinaturas apostas nos instrumentos pelo falsário reconhecidas por notário<br />

público, não lhe po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>bitada nenhuma responsabilida<strong>de</strong> pelo havi<strong>do</strong> e pelas consequências que <strong>de</strong>le germinaram ante a<br />

circunstância <strong>de</strong> que <strong>de</strong>rivara <strong>de</strong> fato <strong>de</strong> terceiro, ensejan<strong>do</strong> a caracterização da exclu<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> apta a alforriá-la da<br />

responsabilização pelo ilícito e pelos efeitos que irradiaram, afetan<strong>do</strong> sua pessoa, e <strong>do</strong> alcança<strong>do</strong> diretamente pela frau<strong>de</strong>. 4 –<br />

Recurso conheci<strong>do</strong> e improvi<strong>do</strong>. Unânime” (TJDF – Apelação Cível 740007019988070001 – Rel. Des. Teófilo Caetano – j.<br />

01.08.2007 – 2ª Turma Cível – Data <strong>de</strong> Publicação: 11.09.2007).<br />

Apesar da conclusão final, a última <strong>de</strong>cisum representa um firme caminhar para a incidência <strong>do</strong> CDC às relações locatícias, o<br />

que parece ser tendência para o futuro. Em suma, os acórdãos transcritos <strong>de</strong>lineiam o <strong>de</strong>stino <strong>de</strong> ampliação da incidência da Lei<br />

8.078/1990, o que foi paulatinamente conquista<strong>do</strong> nos seus mais <strong>de</strong> vinte anos <strong>de</strong> vigência no Brasil. O que se preten<strong>de</strong>, agora, é<br />

alargar ainda mais a sua subsunção, por ser uma importante norma <strong>de</strong> interesse público e social.<br />

3.4.5.<br />

A Lei 8.078/1990 e a previdência privada complementar<br />

Diante <strong>de</strong> sérios problemas estruturais que acometem o sistema <strong>de</strong> previdência pública em nosso País, tornou-se comum no<br />

Brasil a celebração <strong>de</strong> contratos que têm por objeto planos <strong>de</strong> previdência privada complementar (fun<strong>do</strong>s <strong>de</strong> pensão), administra<strong>do</strong>s<br />

por empresas financeiras. Como se extrai <strong>do</strong> site <strong>do</strong> Banco Central <strong>do</strong> Brasil, tais entida<strong>de</strong>s são fiscalizadas pela Superintendência<br />

Nacional <strong>de</strong> Previdência Complementar (PREVIC), que é uma autarquia vinculada ao Ministério da Previdência Social: “A<br />

PREVIC atua como entida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fiscalização e <strong>de</strong> supervisão das ativida<strong>de</strong>s das entida<strong>de</strong>s fechadas <strong>de</strong> previdência complementar e<br />

<strong>de</strong> execução das políticas para o regime <strong>de</strong> previdência complementar opera<strong>do</strong> pelas entida<strong>de</strong>s fechadas <strong>de</strong> previdência<br />

complementar, observan<strong>do</strong>, inclusive, as diretrizes estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Conselho Nacional <strong>de</strong><br />

Previdência Complementar”.30<br />

Ora, não há dúvidas <strong>de</strong> que o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é plenamente aplicável a tais negócios <strong>de</strong> investimentos<br />

financeiros, visan<strong>do</strong> uma aposenta<strong>do</strong>ria posterior. Não <strong>de</strong>ixava dúvidas, nesse senti<strong>do</strong>, o teor originário da Súmula 321 <strong>do</strong> STJ, in<br />

verbis: “O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é aplicável à relação jurídica entre a entida<strong>de</strong> <strong>de</strong> previdência privada e seus<br />

participantes”. Consigne-se que, em hipóteses tais, a jurisprudência superior tem entendi<strong>do</strong> pela <strong>de</strong>volução <strong>do</strong>s valores pagos em<br />

casos <strong>de</strong> <strong>de</strong>sistência por parte <strong>do</strong> associa<strong>do</strong> <strong>do</strong> plano:<br />

“Previdência complementar. Restituição das contribuições pessoais. Integralida<strong>de</strong>. Correção monetária <strong>do</strong> sal<strong>do</strong> <strong>de</strong> poupança.<br />

Índices. Recomposição da real <strong>de</strong>svalorização da moeda. Súmula 289/STJ. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Aplicação a entida<strong>de</strong>s<br />

fechadas <strong>de</strong> previdência. Cabimento. 1. ‘Consoante entendimento pacifica<strong>do</strong> <strong>do</strong> STJ, é <strong>de</strong>vida a restituição integral das contribuições<br />

vertidas pelo ex-associa<strong>do</strong> à entida<strong>de</strong> <strong>de</strong> previdência complementar, por ocasião <strong>de</strong> seu <strong>de</strong>sligamento’. 2. ‘A restituição das parcelas<br />

pagas a plano <strong>de</strong> previdência privada <strong>de</strong>ve ser objeto <strong>de</strong> correção plena, por índice que recomponha a efetiva <strong>de</strong>svalorização da<br />

moeda (Súmula 289/STJ)’. 3. ‘O CDC é aplicável à relação jurídica entre a entida<strong>de</strong> <strong>de</strong> previdência privada e seus participantes’<br />

(Súmula 321/STJ). 4. Agravo regimental <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg no Ag 766.447/RN – Terceira Turma – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso<br />

Sanseverino – j. 28.09.2010 – DJe 06.10.2010).<br />

Destaque-se, a propósito, que, para o mesmo STJ, pelo teor <strong>de</strong> sua Súmula 291, “A ação <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> parcelas <strong>de</strong><br />

complementação <strong>de</strong> aposenta<strong>do</strong>ria pela previdência privada prescreve em cinco anos”. O exemplo típico <strong>de</strong> aplicação <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s<br />

esses entendimentos envolve a tão conhecida Caixa <strong>de</strong> Previdência <strong>do</strong>s Funcionários <strong>do</strong> Banco <strong>do</strong> Brasil – PREVI (ver: STJ –<br />

AgRg no REsp 734.136/DF – Quarta Turma – Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa – j. 18.09.2007 – DJ 08.10.2007, p. 290; e STJ,<br />

AgRg no REsp 801.588/DF – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 16.03.2006 – DJ 24.04.2006, p. 410).<br />

Todavia, atualizan<strong>do</strong> a obra, pontue-se que o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça acabou por rever o conteú<strong>do</strong> da sua Súmula 321, em<br />

fevereiro <strong>de</strong> 2016, sen<strong>do</strong> esta cancelada e substituída pela Súmula 563 da mesma Corte.<br />

Como já constava da ferramenta Jurisprudência em Teses, <strong>do</strong> próprio Tribunal da Cidadania (Edição n. 39 <strong>de</strong> 2015, tese n.<br />

13), “O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r se aplica indistintamente às entida<strong>de</strong>s abertas e fechadas <strong>de</strong> previdência complementar,<br />

consoante a Súmula 321/STJ”. Para tal verbete, eram cita<strong>do</strong>s os seguintes acórdãos <strong>do</strong> próprio STJ: AgRg no AREsp 667.721/MG<br />

– Rel. Min. Marco Buzzi – Quarta Turma – j. 09.06.2015 – DJe 15.06.2015; AgRg no AREsp 666.127/RJ – Rel. Min. Luis Felipe<br />

Salomão – Quarta Turma – j. 16.04.2015, DJe 27.04.2015 e AgRg no AREsp 288.165/DF – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira –<br />

Quarta Turma – j. 20.11.2014, DJe 28.11.2014).<br />

Todavia, conforme constava da mesma publicação, (tese n. 14) “o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r não é aplicável à relação<br />

jurídica existente entre o participante e a entida<strong>de</strong> fechada <strong>de</strong> previdência privada” (REsp 1.431.273/SE – Rel. Min. Moura Ribeiro


– Terceira Turma – j. 09.06.2015 – DJe 18.06.2015, EDcl no AREsp 530.138/SC – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – Terceira<br />

Turma – j. 02.06.2015 – DJe 09.06.2015 e REsp 1.443.304/SE – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – Terceira Turma – j.<br />

26.05.2015 – DJe 02.06.2015). Esclarecen<strong>do</strong> a situação fática, o que a jurisprudência superior conclui é que “nos termos da<br />

Súmula 321/STJ, o diploma consumerista é aplicável à relação jurídica entre a entida<strong>de</strong> <strong>de</strong> previdência privada e seus participantes.<br />

Exegese que alcança inclusive os vínculos jurídicos instaura<strong>do</strong>s com as entida<strong>de</strong>s fechadas (os <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong>s fun<strong>do</strong>s <strong>de</strong> pensão).<br />

Ressalva <strong>do</strong> entendimento <strong>de</strong> que a incidência <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada norma consumerista po<strong>de</strong> ser afastada quan<strong>do</strong> incompatível com<br />

norma específica inerente à relação contratual <strong>de</strong> previdência complementar (AgRg no AREsp 504.022/SC – Rel. Min. Luis Felipe<br />

Salomão – Segunda Seção – j. 10.09.2014, DJe 30.09.2014).<br />

Assim, com tom complementar, também se publicou na ferramenta Jurisprudência em Teses, em 2015, que “é <strong>de</strong>scabida a<br />

aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r alheia às normas específicas inerentes à relação contratual <strong>de</strong> previdência privada<br />

complementar e à modalida<strong>de</strong> contratual da transação, negócio jurídico disciplina<strong>do</strong> pelo Código Civil, inclusive no tocante à<br />

disciplina peculiar para o seu <strong>de</strong>sfazimento” (Edição n. 39, <strong>de</strong> 2015).<br />

Diante <strong>de</strong>ssas ressalvas, <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 2016, reafirme-se a edição da Súmula 563 <strong>do</strong> STJ, em substituição à antiga Súmula<br />

321, com a seguinte redação: “O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é aplicável às entida<strong>de</strong>s abertas <strong>de</strong> previdência complementar,<br />

não incidin<strong>do</strong> nos contratos previ<strong>de</strong>nciários celebra<strong>do</strong>s com entida<strong>de</strong>s fechadas”.<br />

Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, este autor não concorda com tais mitigações e com a nova sumular, pois o CDC <strong>de</strong>ve ser aplica<strong>do</strong> aos<br />

planos <strong>de</strong> previdência privada complementar em qualquer situação. Todavia, o teor da nova ementa é que <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong><br />

para os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s fins práticos.<br />

3.4.6.<br />

Prestação <strong>de</strong> serviços educacionais como serviço <strong>de</strong> consumo<br />

A prestação <strong>de</strong> serviços educacionais, obviamente, está submetida à incidência <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, notadamente nos<br />

casos envolven<strong>do</strong> escolas privadas, <strong>do</strong> ensino médio ao ensino superior, ou até mesmo na pós-graduação. A propósito <strong>de</strong>ssa<br />

incidência, a jurisprudência superior já enten<strong>de</strong>u pela subsunção da multa moratória <strong>de</strong> 2% sobre o valor da dívida para os casos <strong>de</strong><br />

inadimplência, nos termos <strong>do</strong> art. 52, § 1º, <strong>do</strong> CDC (STJ – AgRg no Ag 572.088/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Humberto<br />

Gomes <strong>de</strong> Barros – j. 09.05.2006 – DJ 29.05.2006, p. 230; e STJ – AgRg no Ag 460.768/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir<br />

Passarinho Junior – j. 06.03.2003 – DJ 19.05.2003, p. 237).<br />

Ainda no contexto <strong>de</strong> ilustração, diante <strong>do</strong> sistema consumerista, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça tem concluí<strong>do</strong> que a exigência<br />

antecipada <strong>de</strong> mensalida<strong>de</strong>s escolares referentes a um semestre inteiro <strong>do</strong> curso constitui prática ou cláusula abusiva que não po<strong>de</strong><br />

ser admitida: “É abusiva a cláusula contratual que prevê o pagamento integral da semestralida<strong>de</strong>, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> número <strong>de</strong><br />

disciplinas que o aluno irá cursar no perío<strong>do</strong>, pois consiste em contraprestação sem relação com os serviços educacionais<br />

efetivamente presta<strong>do</strong>s. (…)” (STJ – AgRg no Ag 774.257/MG – Terceira Turma – Rel. Min. Humberto Gomes <strong>de</strong> Barros – j.<br />

19.09.2006 – DJ 16.10.2006, p. 368).<br />

Em reforço <strong>de</strong> ilustração, conforme publica<strong>do</strong> pela ferramenta Jurisprudência em Teses, Edição n. 42, <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça, em setembro <strong>de</strong> 2015, “a instituição <strong>de</strong> ensino superior respon<strong>de</strong> objetivamente pelos danos causa<strong>do</strong>s ao aluno em<br />

<strong>de</strong>corrência da falta <strong>de</strong> reconhecimento <strong>do</strong> curso pelo MEC”. E, ainda: “instituição <strong>de</strong> ensino superior respon<strong>de</strong> objetivamente<br />

pelos danos causa<strong>do</strong>s ao aluno em <strong>de</strong>corrência da falta <strong>de</strong> reconhecimento <strong>do</strong> curso pelo MEC, quan<strong>do</strong> viola<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong><br />

informação ao consumi<strong>do</strong>r”.<br />

Não obstante, várias situações concretas po<strong>de</strong>m envolver atos pratica<strong>do</strong>s no interior <strong>de</strong> escolas, como é o caso <strong>de</strong> atos <strong>de</strong><br />

agressão continuada ou “bullying”, geran<strong>do</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva pela ótica consumerista. Exemplifican<strong>do</strong>, vejamos acórdãos<br />

<strong>do</strong> Tribunal <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral:<br />

“Civil. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Dano moral. Dano moral configura<strong>do</strong>. Fixação <strong>do</strong> quantum in<strong>de</strong>nizatório <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com os<br />

parâmetros da proporcionalida<strong>de</strong> e razoabilida<strong>de</strong>. Recurso improvi<strong>do</strong>. Sentença mantida pelos próprios fundamentos. 1. A empresa<br />

presta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> serviços educacionais respon<strong>de</strong> <strong>de</strong> forma objetiva pela incolumida<strong>de</strong> física e moral <strong>do</strong>s alunos, só se exoneran<strong>do</strong> nas<br />

hipóteses <strong>de</strong> inexistência <strong>do</strong> <strong>de</strong>feito na prestação <strong>do</strong> serviço, culpa exclusiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r ou <strong>de</strong> terceiro e caso fortuito e a força<br />

maior, eis que estes rompem o nexo causal, sem o qual não há se falar em responsabilida<strong>de</strong>. O nexo causal, in casu, se verifica<br />

porque a escola tem o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> guarda e vigilância <strong>do</strong>s seus alunos. Ao receber o aluno em seu estabelecimento, assume o<br />

compromisso <strong>de</strong> velar pela preservação <strong>de</strong> sua integrida<strong>de</strong> física e moral. Restan<strong>do</strong> comprovada a ocorrência <strong>de</strong> violência sexual <strong>de</strong><br />

aluna em um <strong>do</strong>s banheiros disponíveis aos alunos no mesmo andar das suas <strong>de</strong>pendências, <strong>de</strong>ve a instituição <strong>de</strong> ensino respon<strong>de</strong>r<br />

objetivamente, nos termos <strong>do</strong> art. 14 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. A circunstância <strong>de</strong> a lesão à integrida<strong>de</strong> moral da aluna<br />

ter ocorri<strong>do</strong> fora <strong>do</strong> horário das aulas não afasta o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar, porque o estabelecimento <strong>de</strong> ensino permite o acesso <strong>do</strong>s<br />

alunos antes <strong>do</strong> horário regulamentar. A prestação <strong>de</strong> segurança à integrida<strong>de</strong> física <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r é inerente à ativida<strong>de</strong> comercial<br />

<strong>de</strong>senvolvida pelo estabelecimento <strong>de</strong> ensino, principalmente quan<strong>do</strong> instala<strong>do</strong> em shopping center, porquanto a principal diferença


existente entre estes estabelecimentos e os centros tradicionais resi<strong>de</strong> justamente na criação <strong>de</strong> um ambiente seguro para a realização<br />

<strong>de</strong> compras e afins, capaz <strong>de</strong> atrair alunos a tais praças privilegiadas. O <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> segurança é extensivo aos banheiros existentes no<br />

andar on<strong>de</strong> a instituição <strong>de</strong> ensino está estabelecida, porque ali os alunos não comparecem como frequenta<strong>do</strong>res <strong>do</strong> shopping. Não<br />

há fato <strong>de</strong> terceiro se a empresa presta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> serviços educacionais tem o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> evitar o dano. É irrelevante o fato <strong>de</strong> o ofensor<br />

ter conheci<strong>do</strong> a vítima fora <strong>de</strong> suas <strong>de</strong>pendências, porque foi ali que encontrou ambiente propício para o seu <strong>de</strong>si<strong>de</strong>rato criminoso,<br />

por falta <strong>de</strong> vigilância da instituição <strong>de</strong> ensino. Por ser a prestação <strong>de</strong> segurança ínsita à ativida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s estabelecimentos <strong>de</strong> ensino, a<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>de</strong>sses por danos causa<strong>do</strong>s aos bens ou à integrida<strong>de</strong> física <strong>do</strong> aluno não admite a exclu<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> força maior<br />

<strong>de</strong>rivada <strong>de</strong> qualquer meio irresistível <strong>de</strong> violência. 2. O dano moral é inconteste e <strong>de</strong>corre da simples violência suportada pela aluna<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> qualquer outro efeito em relação à vítima. 3. O arbitramento <strong>do</strong> valor <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> a título <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por<br />

danos morais se sujeita à <strong>de</strong>cisão judicial, informada pelos critérios aponta<strong>do</strong>s pela <strong>do</strong>utrina e jurisprudência e con<strong>de</strong>nsa<strong>do</strong>s pelos<br />

princípios da proporcionalida<strong>de</strong>, razoabilida<strong>de</strong> e a<strong>de</strong>quação. Observa<strong>do</strong>s tais parâmetros, e consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a capacida<strong>de</strong> financeira da<br />

empresa requerida, o valor fixa<strong>do</strong> na sentença não merece reparo. (…)” (TJDF – Recurso 2008.03.1.010538-8 – Acórdão 346.402 –<br />

Primeira Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e Criminais – Rel. Juíza Maria <strong>de</strong> Fátima Rafael <strong>de</strong> Aguiar Ramos –<br />

DJDFTE 16.03.2009, p. 208).<br />

“<strong>Direito</strong> civil. In<strong>de</strong>nização. Danos morais. Abalos psicológicos <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> violência escolar. Bullying. Ofensa ao princípio da<br />

dignida<strong>de</strong> da pessoa. Sentença reformada. Con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> colégio. Valor módico, aten<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-se às peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> caso. 1. Cuidase<br />

<strong>de</strong> recurso <strong>de</strong> apelação interposto <strong>de</strong> sentença que julgou improce<strong>de</strong>nte pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais por enten<strong>de</strong>r que<br />

não restou configura<strong>do</strong> o nexo causal entre a conduta <strong>do</strong> colégio e eventual dano moral alega<strong>do</strong> pelo autor. Este preten<strong>de</strong> receber<br />

in<strong>de</strong>nização sob o argumento <strong>de</strong> haver estuda<strong>do</strong> no estabelecimento <strong>de</strong> ensino em 2005 e ali teria si<strong>do</strong> alvo <strong>de</strong> várias agressões<br />

físicas que o <strong>de</strong>ixaram com traumas que refletem em sua conduta e na dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> aprendiza<strong>do</strong>. 2. Na espécie, restou<br />

<strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> nos autos que o recorrente sofreu agressões físicas e verbais <strong>de</strong> alguns colegas <strong>de</strong> turma que iam muito além <strong>de</strong><br />

pequenos atritos entre crianças daquela ida<strong>de</strong>, no interior <strong>do</strong> estabelecimento réu, durante to<strong>do</strong> o ano letivo <strong>de</strong> 2005. É certo que tais<br />

agressões, por si só, configuram dano moral cuja responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização seria <strong>do</strong> Colégio em razão <strong>de</strong> sua responsabilida<strong>de</strong><br />

objetiva. Com efeito, o Colégio réu tomou algumas medidas na tentativa <strong>de</strong> contornar a situação, contu<strong>do</strong>, tais providências foram<br />

inócuas para solucionar o problema, ten<strong>do</strong> em vista que as agressões se perpetuaram pelo ano letivo. Talvez porque o<br />

estabelecimento <strong>de</strong> ensino apela<strong>do</strong> não atentou para o papel da escola como instrumento <strong>de</strong> inclusão social, sobretu<strong>do</strong> no caso <strong>de</strong><br />

crianças tidas como ‘diferentes’. Nesse ponto, vale registrar que o ingresso no mun<strong>do</strong> adulto requer a apropriação <strong>de</strong> conhecimentos<br />

socialmente produzi<strong>do</strong>s. A interiorização <strong>de</strong> tais conhecimentos e experiências vividas se processa, primeiro, no interior da família e<br />

<strong>do</strong> grupo em que este indivíduo se insere, e, <strong>de</strong>pois, em instituições como a escola. No dizer <strong>de</strong> Hel<strong>de</strong>r Baruffi, ‘Neste processo <strong>de</strong><br />

socialização ou <strong>de</strong> inserção <strong>do</strong> indivíduo na socieda<strong>de</strong>, a educação tem papel estratégico, principalmente na construção da<br />

cidadania’” (TJDF – Recurso 2006.03.1.008331-2 – Acórdão 317.276 – Segunda Turma Cível – Rel. Des. Waldir Leôncio Júnior –<br />

DJDFTE 25.08.2008, p. 70).<br />

Por certo, como há nesses ambientes, muitas vezes, uma troca <strong>de</strong> agressivida<strong>de</strong>s, a tendência é que se amplie a incidência <strong>do</strong><br />

CDC, o que vem em boa hora, a partir da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que a Lei Consumerista é importante norma <strong>de</strong> interesse público e social.<br />

3.4.7.<br />

As ativida<strong>de</strong>s notariais e registrais e a Lei 8.078/1990<br />

Debate-se nos meios jurídicos a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> incidência da Lei 8.078/1990 para as ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> notários e registra<strong>do</strong>res.<br />

Como é notório, tais ativida<strong>de</strong>s são exercidas por <strong>de</strong>legação <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Público, nos termos <strong>do</strong> art. 236 da Constituição Fe<strong>de</strong>ral, o<br />

que seria um suposto entrave para a subsunção da Norma Consumerista. Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, a tese não convence, eis que,<br />

como visto, os serviços públicos, diretos ou indiretos, po<strong>de</strong>m ser abrangi<strong>do</strong>s pelo art. 22 <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Também se argumenta pela existência <strong>de</strong> estatutos normativos próprios, a afastar a Lei Consumerista, caso da Lei 6.015/1973<br />

(Lei <strong>de</strong> Registros Públicos) e da Lei 8.935/1994 (Lei <strong>do</strong>s Serviços Notariais e <strong>de</strong> Registro). Mais uma vez, a premissa <strong>de</strong> interação<br />

legislativa apregoada pela festejada teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes afasta mansamente tal assertiva teórica. Todavia, conheci<strong>do</strong><br />

acórdão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, por maioria <strong>de</strong> votos, acabou afastan<strong>do</strong> a subsunção da Lei <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r às ativida<strong>de</strong>s<br />

notariais, pelos argumentos <strong>de</strong> <strong>de</strong>clinação acima expostos:<br />

“Processual. Administrativo. Constitucional. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Tabelionato <strong>de</strong> Notas. Foro competente. Serviços notariais. A<br />

ativida<strong>de</strong> notarial não é regida pelo CDC. (Venci<strong>do</strong>s a Ministra Nancy Andrighi e o Ministro Castro Filho.) O foro competente a ser<br />

aplica<strong>do</strong> em ação <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong> danos, em que figure no polo passivo da <strong>de</strong>manda pessoa jurídica que presta serviço notarial, é o<br />

<strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> autor. Tal conclusão é possível seja pelo art. 101, I, <strong>do</strong> CDC, ou pelo art. 100, parágrafo único <strong>do</strong> CPC, bem como<br />

segun<strong>do</strong> a regra geral <strong>de</strong> competência prevista no CPC. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 625.144/SP – Terceira<br />

Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 14.03.2006 – DJ 29.05.2006, p. 232).<br />

Cumpre ressalvar que a questão não é pacífica no próprio STJ, haven<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> posterior com o seguinte teor da ementa: “O<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r aplica-se à ativida<strong>de</strong> notarial” (STJ – REsp 1.163.652/PE – Segunda Turma – Rel. Min. Herman<br />

Benjamin – j. 01.06.2010 – DJe 01.07.2010). As mesmas premissas <strong>de</strong> <strong>de</strong>bate valem para o registro público <strong>de</strong>lega<strong>do</strong> pelo Esta<strong>do</strong>,


enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o presente autor que é perfeitamente possível enquadrar a ativida<strong>de</strong> como sen<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo.<br />

3.4.8.<br />

As relações entre advoga<strong>do</strong>s e clientes e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

Para finalizar o presente capítulo, vejamos o intrinca<strong>do</strong> e apaixona<strong>do</strong> <strong>de</strong>bate acerca da incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r às relações estabelecidas entre advoga<strong>do</strong>s e clientes. Como é notório, prevalece em larga escala, em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça, o entendimento <strong>de</strong> não aplicação da Lei 8.078/1990. Primeiro – e mais uma vez –, pela existência <strong>de</strong> uma lei<br />

especifica, no caso o Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994). Segun<strong>do</strong>, porque as ativida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> advoga<strong>do</strong> encontram fortes<br />

limitações éticas, não sen<strong>do</strong> possível enquadrá-las como ativida<strong>de</strong> fornecida no merca<strong>do</strong> <strong>do</strong> consumo, conforme consta <strong>do</strong> art. 3º, §<br />

2º, <strong>do</strong> CDC – tese <strong>de</strong>fendida pelo Conselho Fe<strong>de</strong>ral da OAB, conforme relata Claudia Lima Marques.31 Concluin<strong>do</strong> <strong>de</strong>sse mo<strong>do</strong>,<br />

por to<strong>do</strong>s, vejamos ementa <strong>de</strong> acórdão que menciona outras duas <strong>de</strong>cisões:<br />

“Civil e processual civil. Contrato <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> serviços advocatícios. Foro <strong>de</strong> eleição. Possibilida<strong>de</strong>. Prece<strong>de</strong>ntes. Exceção <strong>de</strong><br />

competência. Efeito suspensivo. Decisão <strong>de</strong>finitiva <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> origem. Prece<strong>de</strong>ntes. Recurso especial não conheci<strong>do</strong>. 1. As<br />

relações contratuais entre clientes e advoga<strong>do</strong>s são regidas pelo Estatuto da OAB, aprova<strong>do</strong> pela Lei 8.906/1994, a elas não se<br />

aplican<strong>do</strong> o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Prece<strong>de</strong>ntes (REsp 539077/MS – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior<br />

– j. 26.04.2005 – DJ 30.05.2005, p. 383; REsp 914105/GO – Quarta Turma – Rel. Min. Fernan<strong>do</strong> Gonçalves – j. 09.09.2008 – DJe<br />

22.09.2008). 2. O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça enten<strong>de</strong> que a exceção <strong>de</strong> competência suspen<strong>de</strong> o curso <strong>do</strong> processo até a <strong>de</strong>cisão<br />

<strong>de</strong>finitiva na origem, subsistin<strong>do</strong>, somente, o efeito <strong>de</strong>volutivo ao recurso especial. 3. Recurso especial não conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp<br />

1.134.889/PE – Quarta Turma – Rel. Min. Honil<strong>do</strong> Amaral <strong>de</strong> Mello Castro (Desembarga<strong>do</strong>r Convoca<strong>do</strong> <strong>do</strong> TJAP) – j. 23.03.2010 –<br />

DJe 08.04.2010).<br />

Por outra via, afastan<strong>do</strong> to<strong>do</strong> o raciocínio antes <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong>, há <strong>de</strong>cisões da mesma Corte Superior que concluem pela<br />

subsunção <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r às relações entre advoga<strong>do</strong>s e clientes:<br />

“Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Incidência na relação entre advoga<strong>do</strong> e cliente. Prece<strong>de</strong>ntes da Corte. 1. Ressalvada a posição <strong>do</strong><br />

Relator, a Turma já <strong>de</strong>cidiu pela incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r na relação entre advoga<strong>do</strong> e cliente. 2. Recurso<br />

especial conheci<strong>do</strong>, mas <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 651.278/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes <strong>Direito</strong> – j.<br />

28.10.2004 – DJ 17.12.2004, p. 544 – REPDJ 01.02.2005, p. 559).<br />

“Prestação <strong>de</strong> serviços advocatícios. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Aplicabilida<strong>de</strong>. I. Aplica-se o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r aos serviços presta<strong>do</strong>s por profissionais liberais, com as ressalvas nele contidas. II. Caracterizada a sucumbência<br />

recíproca <strong>de</strong>vem ser os ônus distribuí<strong>do</strong>s conforme <strong>de</strong>termina o art. 21 <strong>do</strong> CPC. III. Recursos especiais não conheci<strong>do</strong>s” (STJ –<br />

REsp 364.168/SE – Terceira Turma – Rel. Min. Antônio <strong>de</strong> Pádua Ribeiro – j. 20.04.2004 – DJ 21.06.2004, p. 215).<br />

Todavia, conforme publica<strong>do</strong> na ferramenta Jurisprudência em Teses, em sua Edição n. 39/2015 (premissa n. 10), <strong>do</strong> STJ,<br />

parece prevalecer naquela Corte, no momento, a posição <strong>de</strong> que “não se aplica o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r à relação<br />

contratual entre advoga<strong>do</strong>s e clientes, a qual é regida pelo Estatuto da Advocacia e da OAB – Lei n. 8.906/94” (AgRg nos EDcl no<br />

REsp 1.474.886/PB – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – Quarta Turma – j. 18.06.2015 – DJe 26.06.2015; REsp 1.134.709/MG –<br />

Rel. Min. Maria Isabel Gallotti – Quarta Turma – j. 19.05.2015 – DJe 03.06.2015; REsp 1.371.431/RJ – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Villas<br />

Bôas Cueva – Terceira Turma – j. 25.06.2013 – DJe 08.08.2013; REsp 1.150.711/MG – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – Quarta<br />

Turma – j. 06.12.2011 – DJe 15.03.2012 e REsp 1.123.422/PR – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – Quarta Turma – j.<br />

04.08.2011 – DJe 15.08.2011).<br />

De toda maneira, a polêmica, por óbvio, se repete em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> Tribunais Estaduais (constata-se a oscilação em: TJDF –<br />

Recurso 2010.00.2.006496-3 – Acórdão 431.834 – Primeira Turma Cível – Rel. Des. Lécio Resen<strong>de</strong> – DJDFTE 07.07.2010, p. 46;<br />

TJRS – Recurso Cível 71002742492, Triunfo – Primeira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Ricar<strong>do</strong> Torres Hermann – j.<br />

28.10.2010 – DJERS 05.11.2010; TJMG – Embargos Infringentes 1.0024.03.985985-5/0041, Belo Horizonte – Décima Primeira<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Duarte <strong>de</strong> Paula – j. 25.03.2009 – DJEMG 18.05.2009; TJPR – Apelação Cível 356945-9 – Acórdão n.<br />

6422, Curitiba – Sétima Câmara Cível – Rel. Des. José Mauricio Pinto <strong>de</strong> Almeida – j. 26.09.2006 – DJPR 20.10.2006; 2º TAC-SP<br />

– Agravo <strong>de</strong> Instrumento 873.636-00/4 – Sexta Câmara – Rel. Des. Andra<strong>de</strong> Neto – j. 23.02.2005).<br />

Na opinião <strong>do</strong> presente autor, a relação entre advoga<strong>do</strong> e cliente é, sim, uma relação <strong>de</strong> consumo, pela presença <strong>de</strong> uma<br />

prestação <strong>de</strong> serviços realizada a um <strong>de</strong>stinatário final fático e econômico, que é o cliente. A<strong>de</strong>mais, trata-se também <strong>de</strong> uma<br />

relação <strong>de</strong> trabalho, quan<strong>do</strong> presta<strong>do</strong> por pessoa individual, servin<strong>do</strong> como luva a tese antes exposta a respeito da pon<strong>de</strong>ração<br />

meritória – concluin<strong>do</strong>-se favoravelmente ao direito que merece proteção no caso concreto –, inclusive quanto à fixação da Justiça<br />

Competente.<br />

A tese <strong>de</strong> existência <strong>de</strong> uma lei específica é afastada pela teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes, na esteira <strong>do</strong>s argumentos também


utiliza<strong>do</strong>s para as relações locatícias e as ativida<strong>de</strong>s notariais e registrais. Repise-se que não se po<strong>de</strong> conceber o sistema jurídico<br />

como algo inerente e fecha<strong>do</strong>, mas em constante interação.<br />

Por fim, enquadrar a ativida<strong>de</strong> <strong>do</strong> advoga<strong>do</strong> como sen<strong>do</strong> oferecida no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo não a torna uma ativida<strong>de</strong><br />

mercantil, o que é veda<strong>do</strong> pelo Estatuto da Advocacia em vários <strong>de</strong> seus preceitos. O senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo é aquele da<br />

socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo em massa (mass consumption society), sem que haja efetivamente um fim comercial <strong>de</strong> lucro direto, na<br />

trilha <strong>de</strong> exemplos antes <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong>s. Ainda a título <strong>de</strong> argumentação, o Esta<strong>do</strong>, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, presta tais serviços, <strong>de</strong> forma<br />

direta ou indireta, sem que esteja presente o intuito <strong>de</strong> lucro. Isso também ocorre com pessoas jurídicas ou naturais presta<strong>do</strong>ras <strong>de</strong><br />

serviços públicos por concessão e <strong>de</strong>legação, na esteira <strong>de</strong> ilustrações antes expostas neste livro.<br />

Não se olvi<strong>de</strong> que a ativida<strong>de</strong> <strong>do</strong> advoga<strong>do</strong> é essencial e indispensável à administração da Justiça, como expressa o art. 133 da<br />

Constituição Fe<strong>de</strong>ral. Eventual enquadramento <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong> como <strong>de</strong> consumo não representa qualquer lesão quanto ao objeto<br />

<strong>do</strong> coman<strong>do</strong> superior. Na verda<strong>de</strong>, só há um reforço da norma, eis que as responsabilida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> advoga<strong>do</strong> são aumentadas, pela<br />

incidência <strong>do</strong>s justos preceitos consumeristas.<br />

1 DINIZ, Maria Helena. Compêndio <strong>de</strong> introdução à ciência <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 515.<br />

2<br />

3<br />

4<br />

5<br />

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19<br />

20<br />

21<br />

DINIZ, Maria Helena. Compêndio <strong>de</strong> introdução à ciência <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 516-517.<br />

DINIZ, Maria Helena. Compêndio <strong>de</strong> introdução à ciência <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 517.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 111.<br />

AZEVEDO, Antonio Junqueira <strong>de</strong>. (Parecer). Responsabilida<strong>de</strong> civil ambiental. Reestruturação societária <strong>do</strong> grupo integra<strong>do</strong> pela<br />

socieda<strong>de</strong> causa<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> dano. Obrigação solidária <strong>do</strong> causa<strong>do</strong>r indireto <strong>do</strong> prejuízo e <strong>do</strong> controla<strong>do</strong>r <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> anônima. Limites<br />

objetivos <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> garantia e <strong>de</strong> transação. Competência internacional e conflito <strong>de</strong> leis no espaço. Prescrição na<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil ambiental e nas ações <strong>de</strong> regresso. Novos pareceres e estu<strong>do</strong>s <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong>. São Paulo: Saraiva, 2009. p.<br />

400.<br />

SIMÃO, José Fernan<strong>do</strong>. Vícios <strong>do</strong> produto no novo Código Civil e no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Atlas, 2003. p. 38.<br />

FONSECA, Priscila M. P. Corrêa da; SZTAJN, Rachel. In: AZEVEDO, Álvaro Villaça (Coord.). Código Civil comenta<strong>do</strong>. São Paulo: Atlas, 2008. t.<br />

XI, p. 84.<br />

Por to<strong>do</strong>s a respeito <strong>de</strong>ssa conclusão: MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código<br />

<strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 156.<br />

BESSA, Leonar<strong>do</strong>. Fornece<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>. Revista <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, São Paulo: RT, v. 61, p. 127, jan.-mar. 2007.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 105.<br />

Sobre o tema: MORATO, Antonio Carlos. A pessoa jurídica como consumi<strong>do</strong>ra. São Paulo: RT, 2008.<br />

FILOMENO, José Geral<strong>do</strong> Brito. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro:<br />

Forense Universitária, 2004. p. 32.<br />

Por to<strong>do</strong>s, esse é o entendimento <strong>de</strong>: LIMA, Fre<strong>de</strong>rico Viegas <strong>de</strong>. Con<strong>do</strong>mínio em edificações. São Paulo: Saraiva, 2010. Trata-se <strong>de</strong> tese<br />

<strong>de</strong> pós-<strong>do</strong>utoramento <strong>de</strong>fendida na Suíça. A posição <strong>do</strong> presente autor po<strong>de</strong> ser encontrada em: TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. <strong>Direito</strong> Civil. Lei <strong>de</strong><br />

Introdução e Parte Geral. 7. ed. São Paulo: GEN/Méto<strong>do</strong>, 2011. vol. 1; TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil. Volume Único. São<br />

Paulo: GEN/Méto<strong>do</strong>, 2011.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 85.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 85.<br />

NOVAES, Alinne Arquette Leite. A teoria contratual e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: RT, 2001. p. 165.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 87.<br />

Enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> tratar-se a conclusão <strong>de</strong> incidência da teoria maximalista: CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

São Paulo: Atlas, 2008. p. 52-53; GARCIA, Leonar<strong>do</strong> Me<strong>de</strong>iros. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. Niterói: Impetus, 2007. p. 12-14.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 95-103. Esclareça-se<br />

que o presente autor foi aluno <strong>do</strong> Professor Rizzatto Nunes no curso <strong>de</strong> pós-graduação lato sensu em <strong>Direito</strong> Contratual <strong>do</strong> COGEAE-<br />

PUCSP, entre os anos <strong>de</strong> 1999 e 2001, passan<strong>do</strong> a utilizar as ilustrações <strong>do</strong> jurista, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 101-103.


22<br />

23<br />

24<br />

25<br />

26<br />

27<br />

28<br />

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30<br />

31<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 102.<br />

FILOMENO, José Geral<strong>do</strong> Brito. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 38.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 113.<br />

Tal conceito é utiliza<strong>do</strong> principalmente por Sílvio Rodrigues, e segui<strong>do</strong> pelo presente autor em suas obras <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil. Veja-se:<br />

TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. <strong>Direito</strong> Civil. Lei <strong>de</strong> Introdução e Parte Geral. 7. ed. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2011. vol. 1; TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. Manual <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Civil. Volume Único. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2011.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 909. O julga<strong>do</strong> cita<strong>do</strong> é: TJSP –<br />

Agravo 281.523-1/1-00 – Oitava Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. César Lacerda – j. 07.02.1996.<br />

Elementos retira<strong>do</strong>s da mais recente <strong>do</strong>utrina trabalhista <strong>de</strong>: CASSAR, Vólia Bomfim. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Trabalho. 3. ed. Niterói: Impetus, 2009. p.<br />

199-222.<br />

Sobre a técnica <strong>de</strong> pon<strong>de</strong>ração, por to<strong>do</strong>s: ALEXY, Robert. Teoria <strong>do</strong>s direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo:<br />

Malheiros, 2008.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 324.<br />

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Atlas, 2008. p. 233-234.<br />

Disponível em: . Acesso em: 30 mar. 2011.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 100-101.


RESPONSABILIDADE CIVIL PELO CÓDIGO DE<br />

DEFESA DO CONSUMIDOR<br />

Sumário: 4.1. A unificação da responsabilida<strong>de</strong> civil pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. A responsabilida<strong>de</strong><br />

civil objetiva e solidária como regra <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r (risco-proveito). A responsabilida<strong>de</strong> subjetiva <strong>do</strong>s<br />

profissionais liberais como exceção – 4.2. Análise <strong>do</strong>s casos específicos <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil pelo Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r: 4.2.1. As quatro hipóteses tratadas pela Lei 8.078/1990 em relação ao produto e ao<br />

serviço. Vício versus fato (<strong>de</strong>feito). Panorama geral e a questão da solidarieda<strong>de</strong>; 4.2.2. Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo<br />

vício <strong>do</strong> produto; 4.2.3. Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo fato <strong>do</strong> produto ou <strong>de</strong>feito; 4.2.4. Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo<br />

vício <strong>do</strong> serviço; 4.2.5. Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo fato <strong>do</strong> serviço ou <strong>de</strong>feito – 4.3. O consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> e a<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil. Aprofundamentos quanto ao tema e confrontações em relação ao art. 931 <strong>do</strong> Código Civil<br />

– 4.4. Exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r: 4.4.1. As exclu<strong>de</strong>ntes da não<br />

colocação <strong>do</strong> produto no merca<strong>do</strong> e da ausência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito; 4.4.2. A exclu<strong>de</strong>nte da culpa ou fato exclusivo <strong>de</strong><br />

terceiro; 4.4.3. A exclu<strong>de</strong>nte da culpa ou fato exclusivo <strong>do</strong> próprio consumi<strong>do</strong>r; 4.4.4. O enquadramento <strong>do</strong> caso<br />

fortuito e da força maior como exclu<strong>de</strong>ntes da responsabilida<strong>de</strong> civil consumerista; 4.4.5. Os riscos <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>senvolvimento como exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – 4.5. O fato<br />

concorrente <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r como atenuante da responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res – 4.6. A<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil pelo cigarro e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – 4.7. A responsabilida<strong>de</strong> civil pelo<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e o recall.<br />

4.1.<br />

A UNIFICAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL PELO CÓDIGO DE DEFESA DO<br />

CONSUMIDOR. A RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA E SOLIDÁRIA COMO<br />

REGRA DO CÓDIGO DO CONSUMIDOR (RISCO-PROVEITO). A<br />

RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DOS PROFISSIONAIS LIBERAIS COMO<br />

EXCEÇÃO<br />

Des<strong>de</strong> os primórdios <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Romano, convencionou-se classificar a responsabilida<strong>de</strong> civil, quanto à origem, em contratual<br />

ou negocial e extracontratual ou aquiliana, a última <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> à sua origem na Lex Aquilia <strong>de</strong> Damno. A própria etimologia da<br />

palavra “responsabilida<strong>de</strong>” <strong>de</strong>monstra tal divisão, eis que <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> verbo latino respon<strong>de</strong>re, <strong>de</strong> spon<strong>de</strong>o, que nasceu <strong>de</strong> uma<br />

obrigação primitiva e <strong>de</strong> natureza contratual, pela qual o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r se vinculava ao cre<strong>do</strong>r nos contratos verbais.1<br />

Essa divisão, consagra<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo dualista ou binário <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil, acabou por influenciar a elaboração<br />

das codificações privadas mo<strong>de</strong>rnas. O Código Civil Francês, por exemplo, traz a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>de</strong>litual ou extracontratual<br />

entre os seus arts. 1.382 e 1386, enquanto a responsabilida<strong>de</strong> contratual está nos arts. 1.146 a 1.155, no capítulo que trata <strong>do</strong>s danos<br />

e <strong>do</strong>s interesses <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> <strong>de</strong>scumprimento da obrigação.<br />

Entre as codificações mais atuais, o Código Civil Italiano, <strong>de</strong> 1942, também consagra a divisio, em seu Livro IV, que regula as<br />

obrigações. A responsabilida<strong>de</strong> civil extracontratual, por fatos ilícitos, está prevista entre os arts. 2.043 e 2.059. Por outra via, a


esponsabilida<strong>de</strong> contratual, <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> inadimplemento obrigacional, tem os efeitos <strong>de</strong>scritos nos arts. 1.218 a 1.229.<br />

De mo<strong>do</strong> semelhante fez o Código Civil Português, <strong>de</strong> 1966, eis que a responsabilida<strong>de</strong> por fatos ilícitos e pelo risco consta<br />

<strong>do</strong>s arts. 483º a 510º, ao passo que a <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> não cumprimento das obrigações está entre os arts. 790º e 836º. De qualquer<br />

forma, já há uma tentativa <strong>de</strong> unificação na legislação portuguesa, pela previsão da obrigação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>mnização, entre os arts. 562º<br />

e 572º. De acor<strong>do</strong> com as lições <strong>de</strong> Antunes Varela, os trabalhos preparatórios da então nova legislação civil portuguesa colocaram<br />

em relevo os pontos <strong>de</strong> congruência entre os <strong>do</strong>is tipos <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>, o que culminou com a elaboração <strong>do</strong>s cita<strong>do</strong>s<br />

dispositivos, em um tratamento legal em conjunto no tocante às consequências da responsabilida<strong>de</strong>. 2<br />

As codificações brasileiras foram pensadas na mesma esteira <strong>de</strong>ssa partilha meto<strong>do</strong>lógica, a<strong>do</strong>tan<strong>do</strong> o cita<strong>do</strong> sistema dualista.<br />

No Código Civil <strong>de</strong> 1916, a responsabilida<strong>de</strong> extracontratual, a obrigação por atos ilícitos, estava entre os arts. 1.518 e 1.553; a<br />

responsabilida<strong>de</strong> contratual, as consequências da inexecução das obrigações, nos arts. 1.056 a 1.058, completa<strong>do</strong>s pelos<br />

dispositivos relativos às perdas e danos (arts. 1.059 a 1.061) e aos juros legais (arts. 1.062 a 1.064). Isso sem falar no tratamento da<br />

cláusula penal, <strong>de</strong>corrência natural <strong>do</strong> inadimplemento, que era matéria <strong>do</strong>s coman<strong>do</strong>s anteriores (arts. 916 a 927). Além da<br />

divisão, o conceito estruturante <strong>de</strong> ato ilícito constava <strong>do</strong> art. 159 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> 1916.<br />

Na codificação brasileira <strong>de</strong> 2002, mais bem organizada, o Título IX <strong>do</strong> Livro das Obrigações recebeu o nome “Da<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil”, tratan<strong>do</strong>, a princípio, da responsabilida<strong>de</strong> extracontratual (arts. 927 a 954), uma vez que o seu dispositivo<br />

inaugural faz menção ao ato ilícito (art. 186) e ao abuso <strong>de</strong> direito (art. 187). De outro mo<strong>do</strong>, a responsabilida<strong>de</strong> contratual,<br />

<strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> inadimplemento das obrigações, consta <strong>do</strong>s arts. 389 a 420 <strong>do</strong> CC/2002. Na Parte Geral, assim como no Código<br />

Civil anterior, há o conceito <strong>de</strong> ato ilícito (art. 186), ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>de</strong> abuso <strong>de</strong> direito (art. 187), categorias básicas da<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil.<br />

Apesar da consolidação <strong>de</strong>ssa setorização, como bem afirma Fernan<strong>do</strong> Noronha, a divisão da responsabilida<strong>de</strong> civil em<br />

extracontratual e contratual reflete “um tempo <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>”, uma vez que os princípios e regramentos básicos que regem as duas<br />

supostas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil são idênticos.3 Em senti<strong>do</strong> muito próximo, leciona Judith Martins-Costa que há um<br />

gran<strong>de</strong> questionamento acerca <strong>de</strong>ssa distinção, “pois não resiste à constatação <strong>de</strong> que, na mo<strong>de</strong>rna socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> massas, ambas<br />

têm, a rigor, uma mesma fonte, o ‘contato social’, e obe<strong>de</strong>cem aos mesmos princípios, nascen<strong>do</strong> <strong>de</strong> um mesmo fato, qual seja, a<br />

violação <strong>de</strong> <strong>de</strong>ver jurídico preexistente”. 4<br />

O Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r representa uma superação <strong>de</strong>sse mo<strong>de</strong>lo dual anterior, unifican<strong>do</strong> a<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil. Na verda<strong>de</strong>, pela Lei Consumerista, pouco importa se a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> um contrato ou<br />

não, pois o tratamento diferencia<strong>do</strong> se refere apenas aos produtos e serviços, enquadran<strong>do</strong>-se nos últimos a veiculação <strong>de</strong><br />

informações pela oferta e publicida<strong>de</strong> (Capítulo 6 <strong>de</strong>sta obra). 5 Por oportuno, <strong>de</strong>staque-se que, sem qualquer distinção a respeito da<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil, a Lei 8.078/1990 aplica-se à atual problemática <strong>do</strong>s contratos coliga<strong>do</strong>s e <strong>do</strong>s <strong>de</strong>veres <strong>de</strong>les <strong>de</strong>correntes, tão<br />

comuns no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo. Tais negócios estão interliga<strong>do</strong>s por um ponto ou nexo <strong>de</strong> convergência, seja direto ou indireto,<br />

presentes, por exemplo, nos contratos <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, na incorporação imobiliária ou outros negócios imobiliários, bem como<br />

em contratos eletrônicos ou digitais.6 O tema será repisa<strong>do</strong> e aprofunda<strong>do</strong> no próximo capítulo <strong>de</strong>ste livro.<br />

Como <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> exaustivamente no presente estu<strong>do</strong>, o Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r consagra como regra a<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva e solidária <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos e presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços, frente aos consumi<strong>do</strong>res. Tal opção<br />

visa a facilitar a tutela <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, em prol da reparação integral <strong>do</strong>s danos, constituin<strong>do</strong> um aspecto material <strong>do</strong><br />

acesso à justiça. Desse mo<strong>do</strong>, não tem o consumi<strong>do</strong>r o ônus <strong>de</strong> comprovar a culpa <strong>do</strong>s réus nas hipóteses <strong>de</strong> vícios ou <strong>de</strong>feitos <strong>do</strong>s<br />

produtos ou serviços. Trata-se <strong>de</strong> hipótese <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> culpa, prevista expressamente em lei, nos mol<strong>de</strong>s<br />

<strong>do</strong> que preceitua a primeira parte <strong>do</strong> art. 927, parágrafo único, <strong>do</strong> Código Civil, in verbis:<br />

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obriga<strong>do</strong> a repará-lo.<br />

Parágrafo único. Haverá obrigação <strong>de</strong> reparar o dano, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> culpa, nos casos especifica<strong>do</strong>s em lei, ou quan<strong>do</strong> a<br />

ativida<strong>de</strong> normalmente <strong>de</strong>senvolvida pelo autor <strong>do</strong> dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos <strong>de</strong> outrem”.<br />

Deve ficar bem claro que, como a responsabilida<strong>de</strong> objetiva consumerista é especificada em lei, não se <strong>de</strong>bate a existência ou<br />

não <strong>de</strong> uma ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> risco, nos termos da segunda parte <strong>do</strong> coman<strong>do</strong>, que consagra a chamada cláusula geral <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva. Na verda<strong>de</strong>, o CDC a<strong>do</strong>tou expressamente a i<strong>de</strong>ia da teoria <strong>do</strong> risco-proveito, aquele que gera a<br />

responsabilida<strong>de</strong> sem culpa justamente por trazer benefícios, ganhos ou vantagens. Em outras palavras, aquele que expõe aos<br />

riscos outras pessoas, <strong>de</strong>terminadas ou não, por <strong>de</strong>le tirar um benefício, direto ou não, <strong>de</strong>ve arcar com as consequências da situação<br />

<strong>de</strong> agravamento. Uma <strong>de</strong>ssas <strong>de</strong>corrências é justamente a responsabilida<strong>de</strong> objetiva e solidária <strong>do</strong>s agentes envolvi<strong>do</strong>s com a<br />

prestação ou fornecimento.<br />

A par <strong>de</strong>ssa forma <strong>de</strong> pensar, José Geral<strong>do</strong> Brito Filomeno apresenta os seguintes pontos fundamentais para justificar a


esponsabilida<strong>de</strong> objetiva prevista na Lei 8.078/1990: a) a produção em massa; b) a vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r; c) a<br />

insuficiência da responsabilida<strong>de</strong> subjetiva; d) a existência <strong>de</strong> antece<strong>de</strong>ntes legislativos, ainda que limita<strong>do</strong>s a certas ativida<strong>de</strong>s; e)<br />

o fato <strong>de</strong> que o fornece<strong>do</strong>r tem <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r pelos riscos que seus produtos acarretam, já que lucra com a venda.7 Relativamente<br />

ao último fator, leciona o jurista, mencionan<strong>do</strong> a sua origem romana: “como já <strong>de</strong> resto diziam os romanos, ‘ubi emolumentum ibi<br />

onus, ubi commoda, ibi incommoda’; ou seja, quem lucra com <strong>de</strong>terminada ativida<strong>de</strong> que representa um risco a terceiro <strong>de</strong>ve<br />

também respon<strong>de</strong>r pelos danos que a mesma venha a acarretar”. 8<br />

Consigne-se que várias <strong>de</strong>cisões jurispru<strong>de</strong>nciais fazem menção a tal máxima e à concepção <strong>do</strong> risco-proveito (por to<strong>do</strong>s:<br />

TJDF – Recurso Inomina<strong>do</strong> 0731579-80.2015.8.07.0016 – Terceira Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais – Rel. Juiz Asiel<br />

Henrique <strong>de</strong> Sousa – j. 20.09.2016 – DJDFTE 27.09.2016; TJRS – Apelação Cível 0306485-11.2015.8.21.7000, Sananduva –<br />

Nona Câmara Cível – Rel. Des. Eugênio Facchini Neto – j. 25.11.2015; TJSP – Apelação 4002586-41.2013.8.26.0533 – Acórdão<br />

8959634, Santa Bárbara d’Oeste – Vigésima Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Ferreira da Cruz – j. 05.11.2015 –<br />

DJESP 17.11.2015; TJMG – Apelação Cível 5253483-86.2008.8.13.0702, Uberlândia – Décima Quarta Câmara Cível – Rel. Des.<br />

Rogério Me<strong>de</strong>iros – j. 03.02.2011 – DJEMG 15.03.2011; TJSP – Apelação com Revisão 554.789.4/0 – Acórdão 3578545, Santos<br />

– Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Egidio Giacóia – j. 07.04.2009 – DJESP 08.05.2009; e TJRJ – Apelação Cível<br />

2006.001.48011 – Quarta Câmara Cível – Rel. Des. Sidney Hartung – j. 13.03.2007).<br />

Essa responsabilida<strong>de</strong> objetiva gera uma inversão automática e legal <strong>do</strong> ônus da prova, não haven<strong>do</strong> necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o<br />

consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>monstrar o <strong>do</strong>lo ou a culpa <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r. Nesse senti<strong>do</strong>, aliás, ementa publicada pelo STJ por meio da<br />

ferramenta Jurisprudência em Teses (Edição n. 39), em 2015, segun<strong>do</strong> a qual “em <strong>de</strong>manda que trata da responsabilida<strong>de</strong> pelo fato<br />

<strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço (arts. 12 e 14 <strong>do</strong> CDC), a inversão <strong>do</strong> ônus da prova <strong>de</strong>corre da lei (ope legis), não se aplican<strong>do</strong> o art. 6º,<br />

inciso VIII, <strong>do</strong> CDC”.<br />

Pois bem, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, ao a<strong>do</strong>tar a premissa geral <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva, quebra a regra da<br />

responsabilida<strong>de</strong> subjetiva prevista pelo Código Civil <strong>de</strong> 2002, fundada na culpa lato sensu, que engloba o <strong>do</strong>lo (intenção <strong>de</strong> causar<br />

prejuízo por ação ou omissão voluntária) e a culpa stricto sensu (<strong>de</strong>srespeito a um <strong>de</strong>ver preexistente, seja ele legal, contratual ou<br />

social). Vejamos o quadro com essa confrontação:<br />

Código Civil <strong>de</strong> 2002<br />

Regra: Responsabilida<strong>de</strong> civil subjetiva, fundada na<br />

culpa lato sensu ou em senti<strong>do</strong> amplo (arts. 186 e 927,<br />

parágrafo único, <strong>do</strong> CC).<br />

Exceção: Responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva, nos casos<br />

especifica<strong>do</strong>s em lei ou presente a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> risco<br />

(art. 927, parágrafo único, <strong>do</strong> CC). O próprio Código Civil<br />

consagra várias hipóteses <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva,<br />

como nos casos <strong>de</strong> ato <strong>de</strong> terceiro (arts. 932 e 933), fato<br />

<strong>do</strong> animal (art. 936) e fato da coisa (arts. 937 e 938).<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

Regra: Responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res<br />

<strong>de</strong> produtos e presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços (arts. 12, 14, 18,<br />

19 e 20 <strong>do</strong> CDC).<br />

Exceção: Responsabilida<strong>de</strong> civil subjetiva <strong>do</strong>s<br />

profissionais liberais (art. 14, § 4º, <strong>do</strong> CDC).<br />

Conforme se retira da exposição acima, a regra da responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong> Código Consumerista é quebrada em relação<br />

aos profissionais liberais que prestam serviço, uma vez que somente respon<strong>de</strong>m mediante a prova <strong>de</strong> culpa (responsabilida<strong>de</strong><br />

subjetiva). Enuncia o art. 14, § 4º, da Lei 8.078/1990 que “A responsabilida<strong>de</strong> pessoal <strong>do</strong>s profissionais liberais será apurada<br />

mediante a verificação da culpa”. Para caracterização <strong>de</strong>sse profissional liberal, preciosas são as lições <strong>de</strong> Rizzatto Nunes, no<br />

senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que <strong>de</strong>vem estar presentes as seguintes características: a) autonomia profissional, sem subordinação; b) prestação<br />

pessoal <strong>do</strong>s serviços; c) elaboração <strong>de</strong> regras pessoais <strong>de</strong> atendimento; d) atuação lícita e eticamente admitida.9<br />

A norma é justificada, visto que os profissionais liberais individuais, assim como os consumi<strong>do</strong>res, estão muitas vezes em<br />

posição <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> ou hipossuficiência. Além disso, quan<strong>do</strong> o serviço é presta<strong>do</strong> por um profissional liberal, há um caráter<br />

personalíssimo ou intuitu personae na relação jurídica estabelecida, conforme bem expõe Zelmo Denari.10 Desse mo<strong>do</strong>, a título <strong>de</strong><br />

exemplo, a responsabilida<strong>de</strong> pessoal <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>ntistas e médicos somente existe no âmbito consumerista se provada a sua<br />

culpa, ou seja, o seu <strong>do</strong>lo – intenção <strong>de</strong> causar prejuízo – ou a sua culpa, por imprudência (falta <strong>de</strong> cuida<strong>do</strong> + ação), negligência<br />

(falta <strong>de</strong> cuida<strong>do</strong> + omissão) ou imperícia (falta <strong>de</strong> qualificação geral para <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> uma atribuição).<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>, é utilizada, também como justificativa para a responsabilida<strong>de</strong> subjetiva <strong>do</strong>s profissionais liberais, a<br />

premissa da assunção <strong>de</strong> uma obrigação <strong>de</strong> meio ou <strong>de</strong> diligência. Nas hipóteses envolven<strong>do</strong> os profissionais da área <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>,<br />

caso <strong>do</strong>s médicos, a responsabilida<strong>de</strong> subjetiva é expressa pelo art. 951 <strong>do</strong> Código Civil, in verbis: “O disposto nos arts. 948, 949 e


950 aplica-se ainda no caso <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>vida por aquele que, no exercício <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> profissional, por negligência,<br />

imprudência ou imperícia, causar a morte <strong>do</strong> paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho”.<br />

No entanto, há uma questão relevante, controvertida e profunda relativa à obrigação assumida pelos profissionais liberais,<br />

notadamente pelos médicos, o que tem relação com a classificação das obrigações quanto ao conteú<strong>do</strong>. Tal classificação, em<br />

obrigações <strong>de</strong> meio e <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>, é atribuída a Demogue, conforme aponta a <strong>do</strong>utrina civilista brasileira. 11 Assim, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com<br />

Washington <strong>de</strong> Barros Monteiro, na obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> “obriga-se o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r a realizar um fato <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>, adstringe-se a<br />

alcançar certo objetivo”. Já na obrigação <strong>de</strong> meio, “o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r obriga-se a empregar diligência, a conduzir-se com prudência, para<br />

atingir a meta colimada pelo ato”. 12 Muito próxima é a i<strong>de</strong>ia, entre os clássicos, <strong>de</strong> Rubens Limongi França, que afirma:<br />

“obrigações <strong>de</strong> meio são aquelas em que o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r se obriga a ‘diligenciar’ honestamente a realizar um fim, com os meios que<br />

dispõe; obrigações <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> são aquelas em que o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r se obriga a realizar <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> fim, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da<br />

cogitação <strong>do</strong>s meios”. 13<br />

Como <strong>de</strong>corrência lógica <strong>de</strong>ssa conclusão conceitual, afirma-se que a obrigação <strong>de</strong> meio gera responsabilida<strong>de</strong> subjetiva,<br />

enquanto a <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> ocasiona a responsabilida<strong>de</strong> objetiva ou a culpa presumida.14 Em certo senti<strong>do</strong>, a afirmação, no caso<br />

brasileiro, parece <strong>de</strong>correr da evolução a respeito <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> transporte, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o Decreto-lei 2.681, <strong>de</strong> 1912, que trata da<br />

responsabilida<strong>de</strong> das empresas <strong>de</strong> estradas <strong>de</strong> ferro e que passou a ser aplicada por analogia a to<strong>do</strong>s os tipos <strong>de</strong> transporte. A citada<br />

norma previa a culpa presumida das transporta<strong>do</strong>ras, haven<strong>do</strong> evolução para a responsabilida<strong>de</strong> sem culpa ou objetiva. Diante da<br />

cláusula <strong>de</strong> incolumida<strong>de</strong> presente no transporte, relativa a uma obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> <strong>de</strong> levar a pessoa ou a coisa até o <strong>de</strong>stino<br />

com segurança, a afirmação que relaciona a obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> à responsabilida<strong>de</strong> sem culpa ganhou força no cenário<br />

brasileiro.<br />

Do transporte, passou a premissa teórica relativa às obrigações <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> a atingir os médicos que assumem obrigação <strong>de</strong><br />

fim, mais especificamente os médicos-cirurgiões plásticos estéticos, no caso <strong>de</strong> cirurgia embeleza<strong>do</strong>ra, conforme várias <strong>de</strong>cisões<br />

<strong>de</strong> nossos Tribunais (por to<strong>do</strong>s: TJSP – Apelação com Revisão 238.350.4/2 – Acórdão 3423421, São Paulo – Décima Câmara <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Octavio Helena – j. 02.12.2008 – DJESP 19.02.2009; TJRS – Acórdão 70022772537, São Borja –<br />

Nona Câmara Cível – Rel. Des. Tasso Caubi Soares Delabary – j. 10.09.2008 – DOERS 16.09.2008, p. 42; TJMG – Apelação<br />

Cível 2.0000.00.495907-9/0001, Lavras – Décima Terceira Câmara Cível – Rel. Des. Fábio Maia Viani – j. 1º.11.2007 – DJEMG<br />

1º.12.2007; TJPR – Apelação Cível 0241611-3, Londrina – Quinta Câmara Cível – Rel. Juiz Convoca<strong>do</strong> Sérgio Luiz Patitucci –<br />

DJPR 07.12.2007, p. 124; TJRJ – Acórdão 2007.001.08531 – Décima Sétima Câmara Cível – Rel. Des. Maria Inês da Penha<br />

Gaspar – j. 21.03.2007; TJDF – Apelação Cível 19990110286579 – Acórdão 141243 – Quinta Turma Cível – Rel. Des.<br />

Hay<strong>de</strong>valda Sampaio – j. 11.06.2001 – DJU 15.08.2001, p. 70). Do Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>stacada a seguinte<br />

ementa:<br />

“Civil e processual. Cirurgia estética ou plástica. Obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> (responsabilida<strong>de</strong> contratual ou objetiva). In<strong>de</strong>nização.<br />

Inversão <strong>do</strong> ônus da prova. I. Contratada a realização da cirurgia estética embeleza<strong>do</strong>ra, o cirurgião assume obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong><br />

(responsabilida<strong>de</strong> contratual ou objetiva), <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> in<strong>de</strong>nizar pelo não cumprimento da mesma, <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> eventual <strong>de</strong>formida<strong>de</strong><br />

ou <strong>de</strong> alguma irregularida<strong>de</strong>. II. Cabível a inversão <strong>do</strong> ônus da prova. III. Recurso conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 81.101/PR –<br />

Terceira Turma – Rel. Min. Wal<strong>de</strong>mar Zveiter – j. 13.04.1999 – DJ 31.05.1999, p. 140).<br />

A<strong>de</strong>mais, cumpre anotar que existem <strong>de</strong>cisões que concluem que o médico tem culpa presumida ao assumir a obrigação <strong>de</strong><br />

resulta<strong>do</strong>, ou seja, posiciona-se na transição para a responsabilida<strong>de</strong> sem culpa. Nessa linha, sem prejuízo <strong>de</strong> julga<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s<br />

Tribunais Estaduais no mesmo senti<strong>do</strong>:<br />

“Cirurgia estética. Danos morais. Nos procedimentos cirúrgicos estéticos, a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> médico é subjetiva com presunção<br />

<strong>de</strong> culpa. Esse é o entendimento da Turma que, ao não conhecer <strong>do</strong> apelo especial, manteve a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> recorrente – médico –<br />

pelos danos morais causa<strong>do</strong>s ao paciente. Inicialmente, <strong>de</strong>stacou-se a vasta jurisprudência <strong>de</strong>sta Corte no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que é <strong>de</strong><br />

resulta<strong>do</strong> a obrigação nas cirurgias estéticas, comprometen<strong>do</strong>-se o profissional com o efeito embeleza<strong>do</strong>r prometi<strong>do</strong>. Em seguida,<br />

sustentou-se que, conquanto a obrigação seja <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>, a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> médico permanece subjetiva, com inversão <strong>do</strong><br />

ônus da prova, caben<strong>do</strong>-lhe comprovar que os danos suporta<strong>do</strong>s pelo paciente advieram <strong>de</strong> fatores externos e alheios a sua atuação<br />

profissional. Vale dizer, a presunção <strong>de</strong> culpa <strong>do</strong> cirurgião por insucesso na cirurgia plástica po<strong>de</strong> ser afastada mediante prova<br />

contun<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> ocorrência <strong>de</strong> fator impon<strong>de</strong>rável, apto a eximi-lo <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Consi<strong>de</strong>rou-se, ainda, que, apesar <strong>de</strong> não<br />

estarem expressamente previstos no CDC o caso fortuito e a força maior, eles po<strong>de</strong>m ser invoca<strong>do</strong>s como causas exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços. No caso, o tribunal a quo, ampara<strong>do</strong> nos elementos fático-probatórios conti<strong>do</strong>s nos<br />

autos, concluiu que o paciente não foi adverti<strong>do</strong> <strong>do</strong>s riscos da cirurgia e também o médico não logrou êxito em provar a ocorrência<br />

<strong>do</strong> fortuito. Assim, rever os fundamentos <strong>do</strong> acórdão recorri<strong>do</strong> importaria necessariamente no reexame <strong>de</strong> provas, o que é <strong>de</strong>feso<br />

nesta fase recursal ante a incidência da Súm. n. 7/STJ” (STJ – REsp 985.888/SP – Min. Luis Felipe Salomão – j. 16.02.2012 –<br />

publica<strong>do</strong> no Informativo n. 491 <strong>do</strong> STJ).


“Civil. Processual civil. Recurso especial. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Nulida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s acórdãos proferi<strong>do</strong>s em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> embargos <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>claração não configurada. Cirurgia plástica estética. Obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>. Dano comprova<strong>do</strong>. Presunção <strong>de</strong> culpa <strong>do</strong> médico<br />

não afastada. Prece<strong>de</strong>ntes. 1. Não há falar em nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acórdão exara<strong>do</strong> em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração que, nos estreitos<br />

limites em que proposta a controvérsia, assevera inexistente omissão <strong>do</strong> aresto embarga<strong>do</strong>, acerca da especificação da modalida<strong>de</strong><br />

culposa imputada ao <strong>de</strong>manda<strong>do</strong>, porquanto assenta<strong>do</strong> na tese <strong>de</strong> que presumida a culpa <strong>do</strong> cirurgião plástico em <strong>de</strong>corrência <strong>do</strong><br />

insucesso <strong>de</strong> cirurgia plástica meramente estética. 2. A obrigação assumida pelo médico, normalmente, é obrigação <strong>de</strong> meios, posto<br />

que objeto <strong>do</strong> contrato estabeleci<strong>do</strong> com o paciente não é a cura assegurada, mas sim o compromisso <strong>do</strong> profissional no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

um prestação <strong>de</strong> cuida<strong>do</strong>s precisos e em consonância com a ciência médica na busca pela cura. 3. Apesar <strong>de</strong> abalizada <strong>do</strong>utrina em<br />

senti<strong>do</strong> contrário, este Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça tem entendi<strong>do</strong> que a situação é distinta, todavia, quan<strong>do</strong> o médico se<br />

compromete com o paciente a alcançar um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> resulta<strong>do</strong>, o que ocorre no caso da cirurgia plástica meramente estética.<br />

Nesta hipótese, segun<strong>do</strong> o entendimento nesta Corte Superior, o que se tem é uma obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>s e não <strong>de</strong> meios. 4. No<br />

caso das obrigações <strong>de</strong> meio, à vítima incumbe, mais <strong>do</strong> que <strong>de</strong>monstrar o dano, provar que este <strong>de</strong>correu <strong>de</strong> culpa por parte <strong>do</strong><br />

médico. Já nas obrigações <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>, como a que serviu <strong>de</strong> origem à controvérsia, basta que a vítima <strong>de</strong>monstre, como fez, o dano<br />

(que o médico não alcançou o resulta<strong>do</strong> prometi<strong>do</strong> e contrata<strong>do</strong>) para que a culpa se presuma, haven<strong>do</strong>, <strong>de</strong>starte, a inversão <strong>do</strong> ônus<br />

da prova. 5. Não se priva, assim, o médico da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar, pelos meios <strong>de</strong> prova admissíveis, que o evento danoso<br />

tenha <strong>de</strong>corri<strong>do</strong>, por exemplo, <strong>de</strong> motivo <strong>de</strong> força maior, caso fortuito ou mesmo <strong>de</strong> culpa exclusiva da ‘vítima’ (paciente). 6.<br />

Recurso especial a que se nega provimento” (STJ – REsp 236.708/MG – Quarta Turma – Rel. Min. Carlos Fernan<strong>do</strong> Mathias (Juiz<br />

Fe<strong>de</strong>ral Convoca<strong>do</strong> <strong>do</strong> TRF 1ª Região) – j. 10.02.2009 – DJe 18.05.2009).<br />

De toda sorte, <strong>de</strong>ve-se fazer uma ressalva em relação ao médico-cirurgião plástico repara<strong>do</strong>r, que não assume obrigação <strong>de</strong><br />

resulta<strong>do</strong>, mas <strong>de</strong> meio, sujeitan<strong>do</strong>-se à responsabilida<strong>de</strong> subjetiva. A atuação <strong>de</strong> tais profissionais é comum nos casos <strong>de</strong><br />

aci<strong>de</strong>ntes, surgin<strong>do</strong> a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prova <strong>de</strong> culpa para a sua responsabilida<strong>de</strong>, conforme a melhor jurisprudência (a ilustrar:<br />

TJSP – Apelação com Revisão 317.053.4/2 – Acórdão 3248005, Campinas – Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Jesus<br />

<strong>de</strong> Nazareth Lofrano – j. 16.09.2008 – DJESP 10.10.2008; TJMG – Acórdão 1.0024.03.038091-9/001, Belo Horizonte – Décima<br />

Sétima Câmara Cível – Rel. Des. Eduar<strong>do</strong> Mariné da Cunha – j. 03.08.2006 – DJMG 31.08.2006). Na mesma linha, vejamos as<br />

palavras <strong>de</strong> Pablo Stolze Gagliano e Ro<strong>do</strong>lfo Pamplona Filho:<br />

“Em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> cirurgia plástica estética, haverá, segun<strong>do</strong> a melhor <strong>do</strong>utrina, obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>. Entretanto, se se tratar <strong>de</strong><br />

cirurgia plástica repara<strong>do</strong>ra (<strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> queimaduras, por exemplo), a obrigação <strong>do</strong> médico será reputada <strong>de</strong> meio, e a sua<br />

responsabilida<strong>de</strong> excluída, se não conseguir recompor integralmente o corpo <strong>do</strong> paciente, a <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> haver utiliza<strong>do</strong> as melhores<br />

técnicas disponíveis”.15<br />

Por fim, quanto às ilustrações, existem outras interpretações jurispru<strong>de</strong>nciais relativas à obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong>s <strong>de</strong>ntistas e<br />

<strong>de</strong> outros profissionais da área da saú<strong>de</strong> (quanto ao <strong>de</strong>ntista estético: TJRS – Acórdão 70006078000, São Leopol<strong>do</strong> – Nona<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Adão Sergio <strong>do</strong> Nascimento Cassiano – j. 17.11.2004). A jurisprudência superior já concluiu pela<br />

presença da obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> na atuação <strong>do</strong> médico responsável pela ultrassonografia, em <strong>de</strong>cisão que encerra polêmica<br />

quan<strong>do</strong> exposta:<br />

“Agravo regimental no agravo <strong>de</strong> instrumento. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Erro médico. Diagnóstico <strong>de</strong> gestação gemelar. Existência <strong>de</strong><br />

um único nascituro. Dano moral configura<strong>do</strong>. Exame. Obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>. Responsabilida<strong>de</strong> objetiva. Agravo regimental<br />

improvi<strong>do</strong>. I. O exame ultrassonográfico para controle <strong>de</strong> gravi<strong>de</strong>z implica em obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>, caracterizada pela<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva. II. O erro no diagnóstico <strong>de</strong> gestação gemelar, quan<strong>do</strong> existente um único nascituro, resulta em danos<br />

morais passíveis <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Agravo regimental improvi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg no Ag 744.181/RN – Terceira Turma – Rel. Min.<br />

Sidnei Beneti – j. 11.11.2008 – DJe 26.11.2008).<br />

Mas qual seria a diferença prática entre a culpa presumida e a responsabilida<strong>de</strong> objetiva, tema que sempre gerou dúvidas entre<br />

os aplica<strong>do</strong>res <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>? De comum, tanto na culpa presumida como na responsabilida<strong>de</strong> objetiva inverte-se o ônus da prova, ou<br />

seja, o autor da ação não necessita provar a culpa <strong>do</strong> réu. Todavia, como diferença fulcral entre as categorias, na culpa presumida,<br />

hipótese <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> subjetiva, se o réu provar que não teve culpa, não respon<strong>de</strong>rá. Por seu turno, na responsabilida<strong>de</strong><br />

objetiva, essa comprovação não basta para excluir o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar <strong>do</strong> agente, que somente é afasta<strong>do</strong> se comprovada uma das<br />

exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>, a seguir estudadas (culpa ou fato exclusivo da vítima, culpa ou fato exclusivo <strong>de</strong> terceiro, caso<br />

fortuito ou força maior).<br />

Feito tal esclarecimento, apesar <strong>de</strong> uma suposta consolidação <strong>de</strong> posicionamento na <strong>do</strong>utrina e na jurisprudência a respeito <strong>do</strong><br />

tema, há uma tendência a se reverter tal forma <strong>de</strong> pensar a respeito <strong>do</strong> dueto obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>-responsabilida<strong>de</strong> objetiva.<br />

Isso porque não há qualquer conclusão plausível ou lógico-intuitiva que chegue à <strong>de</strong>dução <strong>de</strong> que a obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<br />

gerar uma responsabilida<strong>de</strong> sem culpa. Ato contínuo, há quem entenda que não se po<strong>de</strong> presumir que o médico cirurgião estético<br />

oferece uma obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>. A propósito <strong>de</strong> uma revisão conceitual pelo último caminho, vejamos as palavras da


Professora Titular da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> da USP Giselda Maria Fernan<strong>de</strong>s Novaes Hironaka:<br />

“Cada um <strong>de</strong> nós sabe – sem sombra <strong>de</strong> dúvida – que o valor humano relativo ao padrão <strong>de</strong> beleza é um valor que gera uma<br />

expectativa, e até uma esperança, que não po<strong>de</strong> ser totalmente satisfeita. Dificilmente alguém se reconhece plenamente satisfeito<br />

acerca <strong>de</strong> seu próprio perfil estético; ora o tipo <strong>de</strong> cabelo, ora a cor <strong>do</strong>s olhos, ora o contorno da face… sempre há um certo aspecto<br />

que gostaríamos <strong>de</strong> alterar, se possível. E isto gera o sonho. E o sonho, a expectativa. E a expectativa, a <strong>de</strong>cisão pela cirurgia. E<br />

<strong>de</strong>la, em tantas vezes, a frustração em face <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> obti<strong>do</strong>, ainda que tu<strong>do</strong> tenha se da<strong>do</strong> <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong>s perfeitos parâmetros da<br />

eficiência técnica e da diligência médica. O que fazer, num caso assim, em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> cirurgião? Ele é<br />

responsável pela frustração <strong>do</strong> paciente, ainda quan<strong>do</strong> o tenha prepara<strong>do</strong> convenientemente e tenha, principalmente, <strong>de</strong>dica<strong>do</strong> sua<br />

maior e melhor atuação técnica.<br />

Nesse passo, já há uma parte da <strong>do</strong>utrina e jurisprudência posicionan<strong>do</strong>-se em senti<strong>do</strong> diverso, ou seja, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> configurar-se em<br />

obrigação <strong>de</strong> meio este tipo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> médica, a cirurgia estética.<br />

Caminhar-se-á, quiçá, por um mar <strong>de</strong> injustiças caso o comportamento da jurisprudência não se altere, permanecen<strong>do</strong> pre<strong>do</strong>minante<br />

a tese da responsabilida<strong>de</strong> (in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> culpa) <strong>do</strong> cirurgião plástico e <strong>do</strong> anestesista, pois cada caso é um caso, e cada paciente<br />

apresenta um histórico e um quadro clínico distinto <strong>de</strong> outro, o que inadmite, no meu sentir, a generalização <strong>do</strong> assunto pela<br />

objetivação da responsabilida<strong>de</strong>.”16<br />

Da mesma forma, propon<strong>do</strong> a revisão, alu<strong>de</strong> Paulo Lôbo que “é irrelevante que a obrigação profissional liberal classifique-se<br />

como <strong>de</strong> meio ou <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>. Preten<strong>de</strong>u-se que, na obrigação <strong>de</strong> meio, a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ria da <strong>de</strong>monstração antecipada<br />

da culpa; na obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>, a inversão <strong>do</strong> ônus da prova seria obrigatória. Não há qualquer fundamento para tal<br />

discriminação, além <strong>de</strong> prejudicar o contratante, que estaria com o ônus adicional <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar ser <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> a obrigação <strong>do</strong><br />

profissional”.17<br />

Ainda em se<strong>de</strong> <strong>do</strong>utrinária, <strong>de</strong>staque-se o excelente trabalho monográfico <strong>de</strong> Pablo Renteria, fruto <strong>de</strong> sua dissertação <strong>de</strong><br />

mestra<strong>do</strong> <strong>de</strong>fendida na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> da UERJ, propon<strong>do</strong> uma revisitação crítica <strong>do</strong>s conceitos expostos. 18<br />

Na jurisprudência po<strong>de</strong>m ser encontra<strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s que concluem que, mesmo haven<strong>do</strong> obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>, a<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> médico continua sen<strong>do</strong> subjetiva, por incidência <strong>do</strong>s termos expressos da norma jurídica. Do Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça, ementa recente:<br />

“Recurso especial. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Erro médico. Art. 14 <strong>do</strong> CDC. Cirurgia plástica. Obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>. Caso fortuito.<br />

Exclu<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>. 1. Os procedimentos cirúrgicos <strong>de</strong> fins meramente estéticos caracterizam verda<strong>de</strong>ira obrigação <strong>de</strong><br />

resulta<strong>do</strong>, pois neles o cirurgião assume verda<strong>de</strong>iro compromisso pelo efeito embeleza<strong>do</strong>r prometi<strong>do</strong>. 2. Nas obrigações <strong>de</strong><br />

resulta<strong>do</strong>, a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> profissional da medicina permanece subjetiva. Cumpre ao médico, contu<strong>do</strong>, <strong>de</strong>monstrar que os<br />

eventos danosos <strong>de</strong>correram <strong>de</strong> fatores externos e alheios à sua atuação durante a cirurgia. 3. Apesar <strong>de</strong> não prevista expressamente<br />

no CDC, a eximente <strong>de</strong> caso fortuito possui força liberatória e exclui a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> cirurgião plástico, pois rompe o nexo <strong>de</strong><br />

causalida<strong>de</strong> entre o dano aponta<strong>do</strong> pelo paciente e o serviço presta<strong>do</strong> pelo profissional. 4. Age com cautela e conforme os ditames<br />

da boa-fé objetiva o médico que colhe a assinatura <strong>do</strong> paciente em ‘termo <strong>de</strong> consentimento informa<strong>do</strong>’, <strong>de</strong> maneira a alertá-lo<br />

acerca <strong>de</strong> eventuais problemas que possam surgir durante o pós-operatório. Recurso especial a que se nega provimento” (STJ –<br />

REsp 1.180.815/MG – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 19.08.2010 – DJe 26.08.2010).<br />

De fato, em termos gerais, a responsabilida<strong>de</strong> objetiva somente po<strong>de</strong> <strong>de</strong>correr <strong>de</strong> lei ou <strong>de</strong> uma ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> risco<br />

<strong>de</strong>sempenhada pelo autor <strong>do</strong> dano, o que é retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 927, parágrafo único, <strong>do</strong> CC/2002, antes transcrito. Definitivamente, a<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong>s profissionais médicos e afins, pelos termos <strong>do</strong> CC/2002 e <strong>do</strong> CDC – em diálogo das fontes –, é<br />

subjetiva, e não objetiva. Assim, não há como enquadrá-los na primeira parte <strong>do</strong> art. 927, parágrafo único, <strong>do</strong> Código Civil. Nesse<br />

senti<strong>do</strong>, resta a dúvida se os profissionais que <strong>de</strong>senvolvem obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> po<strong>de</strong>m ser enquadra<strong>do</strong>s na segunda parte <strong>do</strong><br />

coman<strong>do</strong> legal, ou seja, na aclamada cláusula geral <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva, em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> uma ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> risco<br />

normalmente <strong>de</strong>sempenhada. Há quem entenda por tal subsunção, como é o caso <strong>de</strong> Claudio Luiz Bueno <strong>de</strong> Go<strong>do</strong>y.19<br />

Todavia, a construção jurídica merece ressalva, mormente nas situações em que há cirurgia plástica estética, uma vez que a<br />

iniciativa <strong>do</strong> risco não é <strong>do</strong> profissional, mas <strong>do</strong> paciente. Em outras palavras, é o último quem procura a situação arriscada,<br />

geralmente por uma questão <strong>de</strong> satisfação pessoal. Em reforço, a realização <strong>de</strong> uma intervenção médica não é um ato normal,<br />

po<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-se dizer que, em regra, o risco está na busca pela cirurgia plástica estética. A <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r das condições gerais da pessoa a<br />

ser operada, esse risco po<strong>de</strong> ser acentua<strong>do</strong>, fato que po<strong>de</strong> configurar o perigo. Em to<strong>do</strong>s os casos, repise-se, por iniciativa <strong>do</strong><br />

próprio paciente, consumi<strong>do</strong>r.<br />

De qualquer maneira, a persistir a conclusão da responsabilida<strong>de</strong> sem culpa, o novo enquadramento está na ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> risco,<br />

e não na obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> esse um caminho melhor a ser percorri<strong>do</strong> tecnicamente. Em suma, o médico cirurgião<br />

plástico estético irá respon<strong>de</strong>r pelo risco da ativida<strong>de</strong>, e não pelo risco profissional. A encerrar o presente tópico, aquelas antigas<br />

<strong>de</strong>duções antes fixadas a respeito das obrigações <strong>de</strong> meio e <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> merecem mesmo um novo dimensionamento, com novas


eflexões pela <strong>do</strong>utrina e pela jurisprudência.<br />

4.2.<br />

4.2.1.<br />

ANÁLISE DOS CASOS ESPECÍFICOS DE RESPONSABILIDADE CIVIL PELO<br />

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR<br />

As quatro hipóteses tratadas pela Lei 8.078/1990 em relação ao produto e ao serviço. Vício<br />

versus fato (<strong>de</strong>feito). Panorama geral e a questão da solidarieda<strong>de</strong><br />

Como antes exposto, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r concentra a abordagem da responsabilida<strong>de</strong> civil no produto e no<br />

serviço. Nesse contexto, surgem a responsabilida<strong>de</strong> pelo vício ou pelo fato, sen<strong>do</strong> o último também <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito. Desse<br />

mo<strong>do</strong>, quatro são as situações básicas <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil tratadas pela Lei Consumerista:<br />

–<br />

–<br />

–<br />

–<br />

Responsabilida<strong>de</strong> pelo vício <strong>do</strong> produto.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto (<strong>de</strong>feito).<br />

Responsabilida<strong>de</strong> pelo vício <strong>do</strong> serviço.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> serviço (<strong>de</strong>feito).<br />

Tal divisão é fundamental para compreen<strong>de</strong>r a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos e presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços,<br />

po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser encontrada nas páginas da melhor <strong>do</strong>utrina.20 Cumpre relevar, <strong>de</strong> imediato, que existem diferenças bem claras a<br />

respeito <strong>do</strong>s seus efeitos e das atribuições <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>s.<br />

Antes <strong>de</strong> se <strong>de</strong>monstrar tais <strong>de</strong>corrências, é preciso diferenciar o vício <strong>do</strong> fato ou <strong>de</strong>feito. No vício – seja <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong><br />

serviço –, o problema fica adstrito aos limites <strong>do</strong> bem <strong>de</strong> consumo, sem outras repercussões (prejuízos intrínsecos). Por outra via,<br />

no fato ou <strong>de</strong>feito – seja também <strong>do</strong> produto ou serviço –, há outras <strong>de</strong>corrências, como é o caso <strong>de</strong> outros danos materiais, <strong>de</strong><br />

danos morais e <strong>do</strong>s danos estéticos (prejuízos extrínsecos). Anote-se que as expressões <strong>de</strong>stacadas são utilizadas com tom didático<br />

interessante por Leonar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros Garcia. 21<br />

De outra forma, po<strong>de</strong>-se dizer que, quan<strong>do</strong> o dano permanece nos limites <strong>do</strong> produto ou serviço, está presente o vício. Se o<br />

problema extrapola os seus limites, há fato ou <strong>de</strong>feito, presente, no último caso, o aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo propriamente dito.<br />

Vejamos alguns exemplos concretos.<br />

De início, <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r compra um ferro <strong>de</strong> passar roupas. Certo dia, passan<strong>do</strong> uma camisa em sua casa, o<br />

aparelho explo<strong>de</strong>, não atingin<strong>do</strong> nada nem ninguém. Nesse caso, está presente o vício <strong>do</strong> produto. Por outra via, se o mesmo<br />

eletro<strong>do</strong>méstico explo<strong>de</strong>, causan<strong>do</strong> danos físicos no consumi<strong>do</strong>r, há fato <strong>do</strong> produto ou <strong>de</strong>feito.<br />

Como segunda ilustração, alguém para o seu veículo em uma la<strong>de</strong>ira. Porém, o sistema <strong>de</strong> frenagem <strong>do</strong> automóvel apresenta<br />

problemas e este <strong>de</strong>sce a la<strong>de</strong>ira, sem atingir nada ou ninguém (vício <strong>do</strong> produto). Se o veículo <strong>de</strong>scer a la<strong>de</strong>ira e atingir uma<br />

pessoa ao final da <strong>de</strong>scida, está presente o fato <strong>do</strong> produto ou <strong>de</strong>feito.<br />

Ainda, alguém contrata um jardineiro para cortar a grama <strong>de</strong> sua casa. Se o serviço não for presta<strong>do</strong> a contento, é evi<strong>de</strong>nte o<br />

vício <strong>do</strong> serviço. Se o jardineiro matar o cão <strong>de</strong> estimação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, flagrante o fato <strong>do</strong> serviço ou <strong>de</strong>feito.<br />

Como quarto exemplo, um consumi<strong>do</strong>r contrata um encana<strong>do</strong>r para um conserto em sua casa. Se o problema não é sana<strong>do</strong>, há<br />

vício <strong>do</strong> serviço. Se o encana<strong>do</strong>r falhar, causan<strong>do</strong> um grave dano na residência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, presente o fato <strong>do</strong> serviço ou<br />

<strong>de</strong>feito.<br />

Por fim, o caso concreto cria<strong>do</strong> por Rizzatto Nunes para a diferenciação das categorias po<strong>de</strong> até parecer surreal. Todavia, há<br />

uma forte carga didática na ilustração, tanto que o presente autor a utiliza há mais <strong>de</strong> uma década em sala <strong>de</strong> aula.22 Vejamos.<br />

Dois consumi<strong>do</strong>res adquirem <strong>do</strong>is liquidifica<strong>do</strong>res em uma loja <strong>de</strong> <strong>de</strong>partamentos e resolvem utilizar o produto para fazer um bolo.<br />

Quan<strong>do</strong> o primeiro liga o aparelho, o motor estoura, fazen<strong>do</strong> com que a pá <strong>de</strong> liquidificação fure o copo e atinja a barriga <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, que é hospitaliza<strong>do</strong>. Na situação, está presente o fato <strong>do</strong> produto ou <strong>de</strong>feito. A segunda consumi<strong>do</strong>ra liga o seu<br />

aparelho e os mesmos fatos acontecem. Porém, a pá <strong>do</strong> liquidifica<strong>do</strong>r fura o copo, mas não atinge o consumi<strong>do</strong>r, estan<strong>do</strong><br />

evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong> o vício <strong>do</strong> produto. Então, arremata o jurista: “No primeiro caso, ele sofreu aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo. É <strong>de</strong>feito. No<br />

segun<strong>do</strong>, ela nada sofreu. Apenas o liquidifica<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> funcionar. É vício”. 23 Como contribuição, repise-se que basta imaginar<br />

que a pá é o problema referente ao bem <strong>de</strong> consumo. Se o problema permanece nos limites <strong>do</strong> produto, há vício. Se romper as suas<br />

esferas, há fato ou <strong>de</strong>feito (aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo).<br />

Feitas tais elucidações por meio <strong>de</strong> concreções, a primeira diferença em relação ao vício e ao fato se refere às pessoas<br />

legitimadas a respon<strong>de</strong>r as situações correspon<strong>de</strong>ntes. Como já ficou claro, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r a<strong>do</strong>ta a regra geral<br />

da solidarieda<strong>de</strong> presumida entre os envolvi<strong>do</strong>s no fornecimento <strong>do</strong>s produtos e na prestação <strong>de</strong> serviços. De início, lembre-se que


essa solidarieda<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser retirada <strong>do</strong> art. 7º, parágrafo único, da Lei 8.078/1990, conforme expõe a melhor <strong>do</strong>utrina.24<br />

A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> é ainda abstraída <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> <strong>do</strong>s arts. 14, 18, 19 e 20 da Lei Consumerista, eis que o Código <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r Brasileiro representa uma das principais rupturas <strong>do</strong> mo<strong>de</strong>lo dual <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> – contratual e extracontratual.<br />

Sen<strong>do</strong> assim, a solidarieda<strong>de</strong> é a regra, no contrato ou fora <strong>de</strong>le, em caso <strong>de</strong> haver uma relação jurídica <strong>de</strong> consumo, conforme<br />

reconhecem várias <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça (para ilustrar, sem prejuízo <strong>de</strong> outros acórdãos: STJ – REsp<br />

547.794/PR – Quarta Turma – Rel. Min. Maria Isabel Gallotti – j. 15.02.2011 – DJe 22.02.2011; STJ – AgRg no REsp<br />

1.124.566/AL – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 23.11.2010 – DJe 06.12.2010; STJ – REsp 1.190.772/RJ –<br />

Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 19.10.2010 – DJe 26.10.2010).<br />

Fazen<strong>do</strong> a <strong>de</strong>vida comparação, no sistema civil puro, fora das relações consumeristas, o art. 265 <strong>do</strong> CC/2002 inci<strong>de</strong> na<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil contratual, enquanto o art. 942, na codificação para a responsabilida<strong>de</strong> civil extracontratual. O art. 265 <strong>do</strong><br />

Código dispõe que a solidarieda<strong>de</strong> não se presume, <strong>de</strong>corre da lei (solidarieda<strong>de</strong> legal) ou da vonta<strong>de</strong> das partes (solidarieda<strong>de</strong><br />

convencional). Por outra via, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o art. 942 da codificação, os bens <strong>do</strong> responsável pela ofensa ou violação <strong>do</strong> direito <strong>de</strong><br />

outrem ficam sujeitos à reparação <strong>do</strong> dano causa<strong>do</strong>. Se a ofensa tiver mais <strong>de</strong> um autor, to<strong>do</strong>s respon<strong>de</strong>rão solidariamente pela<br />

reparação. Em complemento, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o seu parágrafo, são solidariamente responsáveis com os autores os coautores <strong>do</strong> ato e<br />

as pessoas <strong>de</strong>signadas no art. 932 da mesma norma. Insta saber se a última regra traz uma presunção <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>, assim como<br />

o Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, e a resposta parece ser negativa. Isso porque, em regra, ao contrário <strong>do</strong> que ocorre com as relações<br />

consumeristas, não há na relação civil uma ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> partes hiperssuficientes, em <strong>de</strong>trimento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r vulnerável.<br />

Pois bem, como visto, quatro são as hipóteses <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil previstas pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r: a)<br />

responsabilida<strong>de</strong> pelo vício <strong>do</strong> produto; b) responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto ou <strong>de</strong>feito; c) responsabilida<strong>de</strong> pelo vício <strong>do</strong><br />

serviço; e d) responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> serviço ou <strong>de</strong>feito. Em três <strong>de</strong>las, há a solução da solidarieda<strong>de</strong>, respon<strong>de</strong>n<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os<br />

envolvi<strong>do</strong>s com o fornecimento ou a prestação. Em uma <strong>de</strong>las, a solidarieda<strong>de</strong> não se faz presente. A diferenciação não é<br />

claramente difundida perante o público jurídico nacional. Tanto isso é verda<strong>de</strong> que muitos erros são cometi<strong>do</strong>s na prática, sen<strong>do</strong><br />

ouvi<strong>do</strong>s com frequência nas salas <strong>de</strong> aula.<br />

A exceção à solidarieda<strong>de</strong> atinge o fato <strong>do</strong> produto ou <strong>de</strong>feito, pelo que consta <strong>do</strong>s arts. 12 e 13 da Lei 8.078/1990. Isso<br />

porque ambos os coman<strong>do</strong>s consagram a responsabilida<strong>de</strong> imediata <strong>do</strong> fabricante – ou <strong>de</strong> quem o substitua nesse papel – e a<br />

responsabilida<strong>de</strong> subsidiária <strong>do</strong> comerciante. É a redação <strong>do</strong> caput <strong>do</strong> primeiro coman<strong>do</strong> legal:<br />

“Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importa<strong>do</strong>r respon<strong>de</strong>m, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da<br />

existência <strong>de</strong> culpa, pela reparação <strong>do</strong>s danos causa<strong>do</strong>s aos consumi<strong>do</strong>res por <strong>de</strong>feitos <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> projeto, fabricação,<br />

construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento <strong>de</strong> seus produtos, bem como por informações<br />

insuficientes ou ina<strong>de</strong>quadas sobre sua utilização e riscos”.<br />

O comerciante tem responsabilida<strong>de</strong> mediata, somente respon<strong>de</strong>n<strong>do</strong> nas hipóteses previstas no art. 13 da Lei 8.078/1990, in<br />

verbis: “O comerciante é igualmente responsável, nos termos <strong>do</strong> artigo anterior, quan<strong>do</strong>: I – o fabricante, o construtor, o produtor<br />

ou o importa<strong>do</strong>r não pu<strong>de</strong>rem ser i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong>s; II – o produto for forneci<strong>do</strong> sem i<strong>de</strong>ntificação clara <strong>do</strong> seu fabricante, produtor,<br />

construtor ou importa<strong>do</strong>r; III – não conservar a<strong>de</strong>quadamente os produtos perecíveis”. Vejamos, sucessivamente.<br />

A primeira situação prevista refere-se ao fato <strong>de</strong> o fabricante ou o seu substituto não po<strong>de</strong>r ser i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong>, transferin<strong>do</strong>-se a<br />

responsabilida<strong>de</strong> ao comerciante. Como bem aponta Luiz Antonio Rizzatto Nunes, a norma tem incidência para as hipóteses em<br />

que há venda <strong>de</strong> produtos a granel, nas feiras e nos supermerca<strong>do</strong>s: “O feirante adquire no atacadista – que já é outro comerciante,<br />

distribui<strong>do</strong>r, vulgarmente chama<strong>do</strong> <strong>de</strong> atravessa<strong>do</strong>r –, quilos <strong>de</strong> batatas, <strong>de</strong> diversas origens e os coloca à venda. Elas po<strong>de</strong>m<br />

inclusive ser vendidas misturadas. O mesmo acontece com praticamente to<strong>do</strong>s os produtos hortifrutigranjeiros”.25<br />

A segunda hipótese trata da situação em que o produto é forneci<strong>do</strong> sem a i<strong>de</strong>ntificação clara <strong>de</strong> quem seja o fabricante ou o<br />

seu substituto. Aqui, a lesão ao <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar relaciona<strong>do</strong> à boa-fé objetiva transfere a responsabilida<strong>de</strong> ao comerciante, diante<br />

<strong>de</strong> uma relação <strong>de</strong> confiança estabelecida.<br />

Por fim, o terceiro caso é aquele em que o comerciante não conserva <strong>de</strong> forma a<strong>de</strong>quada os produtos perecíveis, clara situação<br />

<strong>de</strong> culpa, por <strong>de</strong>srespeito a um <strong>de</strong>ver legal ou contratual – ou seja, <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> subjetiva <strong>do</strong> comerciante, o que gera a<br />

transferência <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Ilustran<strong>do</strong>, imagine-se que um supermerca<strong>do</strong> tem o mau costume <strong>de</strong> <strong>de</strong>sligar as suas<br />

gela<strong>de</strong>iras para economizar energia, geran<strong>do</strong> estrago <strong>do</strong>s alimentos que serão consumi<strong>do</strong>s e, consequentemente, problemas <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> nos consumi<strong>do</strong>res. Na hipótese <strong>de</strong>scrita, a responsabilida<strong>de</strong>, sem dúvida, será <strong>do</strong> comerciante, <strong>do</strong> supermerca<strong>do</strong>.<br />

Cumpre <strong>de</strong>stacar que o entendimento majoritário da <strong>do</strong>utrina é no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> sustentar a responsabilida<strong>de</strong> subsidiária <strong>do</strong><br />

comerciante, assim posicionan<strong>do</strong>-se, por exemplo, Zelmo Denari, Leonar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros Garcia, Gustavo Tepedino, Maria Helena<br />

Diniz, Sérgio Cavalieri Filho, Roberto Senise Lisboa, Pablo Stolze Gagliano e Ro<strong>do</strong>lfo Pamplona Filho, Cristiano Heineck


Schmitt, Paulo Roque Khouri, Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino, Carlos Roberto Gonçalves e Sílvio <strong>de</strong> Salvo Venosa.26<br />

A jurisprudência nacional <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> tem aplica<strong>do</strong> esse senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma constante, em julga<strong>do</strong>s que reconhecem a<br />

ilegitimida<strong>de</strong> passiva <strong>do</strong> comerciante em ações contra ele propostas diretamente, em hipóteses <strong>de</strong> não enquadramento no art. 13 <strong>do</strong><br />

CDC. Para ilustrar, por to<strong>do</strong>s os inúmeros julga<strong>do</strong>s:<br />

“Apelação cível. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Explosão <strong>de</strong> bateria <strong>de</strong> celular. Aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo. Fato <strong>do</strong> produto. Ilegitimida<strong>de</strong><br />

passiva da ré comerciante. Reconhecimento. Em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo pelo fato <strong>do</strong> produto, o comerciante só po<strong>de</strong><br />

ser responsabiliza<strong>do</strong> diretamente em casos específicos, pois não se enquadra no conceito <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>r (art. 12 <strong>do</strong> CDC), para fins<br />

<strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> solidária. Como vem <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a esmaga<strong>do</strong>ra <strong>do</strong>utrina especializada, a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> comerciante é<br />

subsidiária, e não solidária, tal como estabeleci<strong>do</strong> na sentença. Ilegitimida<strong>de</strong> passiva <strong>do</strong> comerciante reconhecida, já que<br />

i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong> o fornece<strong>do</strong>r <strong>do</strong> produto <strong>de</strong>feituoso. Apelação provida” (TJRS – Acórdão 70026053116, Porto Alegre – Nona Câmara<br />

Cível – Rel. Des. Marilene Bonzanini Bernardi – j. 11.03.2009 – DOERS 19.03.2009, p. 43).<br />

“In<strong>de</strong>nizatória. Defeitos em veículo. Responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto. […] Ilegitimida<strong>de</strong> ad causam. In<strong>de</strong>nizatória. Defeitos<br />

em veículo. Ação ajuizada contra comerciante, ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r <strong>do</strong> automóvel com vício <strong>de</strong> fabricação. Responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong><br />

produto. Art. 13 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Inocorrência das hipóteses em que o comerciante respon<strong>de</strong> solidariamente.<br />

Ilegitimida<strong>de</strong> passiva reconhecida. Recurso provi<strong>do</strong> para tal fim” (1º TAC-SP – Recurso 1066838-7 – Décima Câmara – Rel. Juiz<br />

Ary Bauer – j. 26.03.2002).<br />

“Comerciante. Responsabilida<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Fato <strong>do</strong> produto. Diferenciação entre fato <strong>do</strong> produto e vício <strong>do</strong><br />

produto. Hipótese em que o fabricante está i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong> e em que não se alegou falha na conservação. Ilegitimida<strong>de</strong> passiva. Agravo<br />

provi<strong>do</strong> para extinguir o processo. Como nesta ação a autora, alegan<strong>do</strong> ter adquiri<strong>do</strong> e consumi<strong>do</strong> iogurtes impróprios para o<br />

consumo, pe<strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização pelos gastos médicos e danos morais sofri<strong>do</strong>s, é o fato <strong>do</strong> produto quem a fundamenta. Nela, portanto, o<br />

comerciante somente se responsabiliza se não i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong> o fabricante ou se suce<strong>de</strong>r falha na conservação <strong>do</strong> produto. Não<br />

sucedida a primeira hipótese e não alegada a segunda, não se verifica sequer em tese a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> agravante, impon<strong>do</strong>-se a<br />

extinção <strong>do</strong> processo em relação a ela sem julgamento <strong>do</strong> mérito” (TJSP – Agravo <strong>de</strong> Instrumento 190.164-4 – Osasco – Décima<br />

Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Mauricio Vidigal – j. 20.03.2001).<br />

Porém, a questão está longe <strong>de</strong> ser unânime, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> alguns <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res pela existência da solidarieda<strong>de</strong> também no fato<br />

<strong>do</strong> produto. Nesse senti<strong>do</strong>, opinam Claudia Lima Marques, Antonio Herman Benjamin e Bruno Miragem, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que,<br />

“Consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que o caput <strong>do</strong> art. 13 impõe a aplicação <strong>do</strong> art. 12 também para o comerciante, po<strong>de</strong>mos concluir que, nestes<br />

casos, a sua responsabilida<strong>de</strong> solidária é a mesma <strong>do</strong> fabricante, oriunda <strong>de</strong> uma imputação objetiva, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> somente <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>feito e <strong>do</strong> nexo causal entre <strong>de</strong>feito e dano”.27 Do mesmo mo<strong>do</strong> conclui Rizzatto Nunes. 28 Deve ficar claro, todavia, que esta<br />

última conclusão não é a majoritária no sistema nacional consumerista.<br />

Da nossa parte, ao analisar a realida<strong>de</strong> legal brasileira, não há dúvida <strong>de</strong> que foi a<strong>do</strong>tada a responsabilida<strong>de</strong> subsidiária em<br />

relação aos comerciantes no fato <strong>do</strong> produto. De toda sorte, mesmo concluin<strong>do</strong>-se que há lesão ao princípio <strong>do</strong> protecionismo <strong>do</strong>s<br />

consumi<strong>do</strong>res – retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 1º da Lei 8.078/1990 e <strong>do</strong> art. 5º, XXXII, da CF/1988 –, nota-se que foi uma opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r<br />

retirar a responsabilida<strong>de</strong> direta <strong>do</strong>s comerciantes, uma vez que, na maioria das vezes, os <strong>de</strong>feitos se referem à fabricação, e não à<br />

comercialização. Deve ficar consigna<strong>do</strong>, <strong>de</strong> lege ferenda, que essa não parece ser a solução mais justa em muitas hipóteses,<br />

mormente se houver dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> prova em relação ao fato danoso, o que po<strong>de</strong> representar uma prova maligna, diabólica.<br />

Para ilustrar tal dificulda<strong>de</strong>, pense-se na ilustração em que um consumi<strong>do</strong>r comprou um iogurte estraga<strong>do</strong> e, ao ingeri-lo, teve<br />

uma intoxicação, fican<strong>do</strong> interna<strong>do</strong> por vários dias. Está presente, no caso <strong>de</strong>scrito, o fato <strong>do</strong> produto ou <strong>de</strong>feito. Contra quem <strong>de</strong>ve<br />

ser proposta a <strong>de</strong>manda? Em um primeiro momento, contra o fabricante, nos termos <strong>do</strong> art. 12 <strong>do</strong> CDC. Entretanto, po<strong>de</strong> o<br />

fabricante provar que houve culpa exclusiva <strong>do</strong> comerciante – o supermerca<strong>do</strong> –, que não armazenou o iogurte <strong>de</strong> forma a<strong>de</strong>quada,<br />

excluin<strong>do</strong> a sua responsabilida<strong>de</strong> (art. 12, § 3º, III, da Lei 8.078/1990). Se a ação for proposta na Justiça Comum – não no Juiza<strong>do</strong><br />

Especial Cível –, a sentença <strong>de</strong> improcedência gerará a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r pelos ônus da sucumbência. O fim da história<br />

será semelhante na hipótese <strong>de</strong> propositura contra ambos – fabricante e comerciante –, sen<strong>do</strong> a ação julgada proce<strong>de</strong>nte apenas<br />

contra um <strong>de</strong>les.<br />

Observe-se, portanto, que, <strong>de</strong>ntro da técnica processual, o melhor caminho exposto ao consumi<strong>do</strong>r no caso <strong>de</strong> dúvida é<br />

ingressar com uma <strong>de</strong>manda para produção antecipada da prova, nos termos <strong>do</strong> art. 381 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil <strong>de</strong> 2015.29<br />

Isso dificulta em muito a sua vitória judicial, ferin<strong>do</strong> o próprio espírito da Lei Consumerista, que veio para facilitar o caminho<br />

processual <strong>do</strong>s vulneráveis negociais. Tanto isso é verda<strong>de</strong>, que a Lei Protetiva veda a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> nas hipóteses <strong>de</strong> fato <strong>do</strong><br />

produto, nos termos <strong>do</strong> seu art. 88, que assim <strong>de</strong>termina: “Na hipótese <strong>do</strong> art. 13, parágrafo único <strong>de</strong>ste código, a ação <strong>de</strong> regresso<br />

po<strong>de</strong>rá ser ajuizada em processo autônomo, facultada a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prosseguir-se nos mesmos autos, vedada a <strong>de</strong>nunciação da<br />

li<strong>de</strong>”.


Feito esse esclarecimento inicial, po<strong>de</strong> ser elabora<strong>do</strong> o seguinte quadro elucidativo a respeito da presença ou não da<br />

solidarieda<strong>de</strong>:<br />

Responsabilida<strong>de</strong> pelo vício <strong>do</strong> produto.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto ou<br />

<strong>de</strong>feito.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo vício <strong>do</strong> serviço.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo fato <strong>do</strong> serviço.<br />

Há solidarieda<strong>de</strong> entre fabricante e comerciante.<br />

Não há solidarieda<strong>de</strong> entre fabricante e comerciante.<br />

Presente uma reponsabilida<strong>de</strong> direta ou imediata <strong>do</strong> fabricante<br />

e uma responsabilida<strong>de</strong> subsidiária ou mediata <strong>do</strong><br />

comerciante.<br />

Há solidarieda<strong>de</strong> entre to<strong>do</strong>s os envolvi<strong>do</strong>s na prestação.<br />

Há solidarieda<strong>de</strong> entre to<strong>do</strong>s os envolvi<strong>do</strong>s na prestação.<br />

Supera<strong>do</strong> esse ponto, vejamos as consequências pontuais e efeitos presentes em cada uma das hipóteses <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong><br />

civil expostas no quadro acima, o que inclui os prazos correspon<strong>de</strong>ntes para se pleitear os direitos.<br />

4.2.2.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo vício <strong>do</strong> produto<br />

De início, há a responsabilida<strong>de</strong> por vício <strong>do</strong> produto (art. 18 da Lei 8.078/1990), presente quan<strong>do</strong> existe um problema oculto<br />

ou aparente no bem <strong>de</strong> consumo, que o torna impróprio para uso ou diminui o seu valor, ti<strong>do</strong> como um vício por ina<strong>de</strong>quação. Em<br />

casos tais, repise-se, não há repercussões fora <strong>do</strong> produto, não se po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> falar em responsabilização por outros danos materiais –<br />

além <strong>do</strong> valor da coisa –, morais ou estéticos. Em suma, lembre-se que no vício o problema permanece no produto, não rompen<strong>do</strong><br />

os seus limites. A título <strong>de</strong> ilustração, o § 6º <strong>do</strong> art. 18 <strong>do</strong> CDC lista algumas situações em que o vício <strong>do</strong> produto está presente, em<br />

rol exemplificativo, pois os bens são consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s impróprios para uso e consumo:<br />

I)<br />

II)<br />

III)<br />

Os produtos cujos prazos <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> estejam venci<strong>do</strong>s, o que atinge os produtos perecíveis adquiri<strong>do</strong>s em merca<strong>do</strong>s e lojas <strong>do</strong> gênero.<br />

Os produtos <strong>de</strong>teriora<strong>do</strong>s, altera<strong>do</strong>s, adultera<strong>do</strong>s, avaria<strong>do</strong>s, falsifica<strong>do</strong>s, corrompi<strong>do</strong>s, frauda<strong>do</strong>s, nocivos à vida ou à saú<strong>de</strong>, perigosos<br />

ou, ainda, aqueles em <strong>de</strong>sacor<strong>do</strong> com as normas regulamentares <strong>de</strong> fabricação, distribuição ou apresentação.<br />

Os produtos que, por qualquer motivo, se revelem ina<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s ao fim a que se <strong>de</strong>stinam. Como exemplo, cite-se um brinque<strong>do</strong> que<br />

po<strong>de</strong> causar danos às crianças.<br />

Deve ficar claro que o vício <strong>do</strong> produto não se confun<strong>de</strong> com as <strong>de</strong>teriorações normais <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> uso da coisa. Sen<strong>do</strong><br />

assim, para a caracterização ou não <strong>do</strong> vício <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada a vida útil <strong>do</strong> produto que está sen<strong>do</strong> adquiri<strong>do</strong>. Conforme se<br />

extrai <strong>de</strong> trecho <strong>de</strong> publicação constante <strong>do</strong> Informativo n. 506 <strong>do</strong> STJ, “O fornece<strong>do</strong>r respon<strong>de</strong> por vício oculto <strong>de</strong> produto durável<br />

<strong>de</strong>corrente da própria fabricação e não <strong>do</strong> <strong>de</strong>sgaste natural gera<strong>do</strong> pela fruição ordinária, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que haja reclamação <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong><br />

prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> noventa dias após evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong> o <strong>de</strong>feito, ainda que o vício se manifeste somente após o término <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong><br />

garantia contratual, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser observa<strong>do</strong> como limite temporal para o surgimento <strong>do</strong> <strong>de</strong>feito o critério <strong>de</strong> vida útil <strong>do</strong> bem. O<br />

fornece<strong>do</strong>r não é, ad aeternum, responsável pelos produtos coloca<strong>do</strong>s em circulação, mas sua responsabilida<strong>de</strong> não se limita, pura<br />

e simplesmente, ao prazo contratual <strong>de</strong> garantia, o qual é estipula<strong>do</strong> unilateralmente por ele próprio” (STJ – REsp 984.106/SC –<br />

Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 04.10.2012).<br />

No mesmo senti<strong>do</strong>, vale <strong>de</strong>stacar julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Norte, com tom didático e com citação a<br />

esta obra: “também a mo<strong>de</strong>rna <strong>do</strong>utrina consumerista (<strong>Flávio</strong> <strong>Tartuce</strong>, Bruno Miragem, Leonar<strong>do</strong> Roscoe Bessa, Antônio Herman<br />

<strong>de</strong> Vasconcellos e Benjamin e Cláudia Lima Marques) compreen<strong>de</strong> que para a caracterização ou não <strong>do</strong> vício <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada<br />

a vida útil <strong>do</strong> produto que está sen<strong>do</strong> adquiri<strong>do</strong>. Assim, o fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve ser responsabiliza<strong>do</strong> pelo vício por perío<strong>do</strong> além da<br />

garantia contratual, levan<strong>do</strong>-se em consi<strong>de</strong>ração critério da vida útil <strong>do</strong> bem. Logo, o fornece<strong>do</strong>r permanece responsável por<br />

garantir o <strong>de</strong>sempenho <strong>do</strong> produto ou bem durante to<strong>do</strong> o perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua vida útil estimada, segun<strong>do</strong> as regras <strong>de</strong> experiência e o<br />

caso concreto, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que se o vício oculto se manifestar nesse ínterim (vida útil <strong>do</strong> bem), mesmo após o término <strong>do</strong> prazo da<br />

garantia contratual, po<strong>de</strong>rá o consumi<strong>do</strong>r exigir, à sua escolha, uma das alternativas que lhe são postas à disposição pelo art. 18, §<br />

1º, <strong>do</strong> CDC – vi<strong>de</strong> TJSP, AC 0258813-21.2009.8.26.0002, Relator Desembarga<strong>do</strong>r Gomes Varjão, julga<strong>do</strong> em 24.03.2014” (TJRN<br />

– Apelação Cível 2016.005840-2 – Origem da 2ª Vara Cível da Comarca <strong>de</strong> Natal – Rel. Des. João Rebouças – j. 16.08.2016).<br />

A título <strong>de</strong> exemplo, não po<strong>de</strong> o compra<strong>do</strong>r <strong>de</strong> um veículo alegar que o pneu está careca após cinco anos <strong>de</strong> uso, não haven<strong>do</strong><br />

vício <strong>do</strong> produto em casos tais. Anote-se que o PL 283/2012, mais uma vez, preten<strong>de</strong> incluir norma a respeito da vida útil,<br />

acrescentan<strong>do</strong> novo parágrafo no art. 26, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> esse critério ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> para os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s fins <strong>de</strong> enquadramento <strong>do</strong>s


vícios <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço.<br />

Não se po<strong>de</strong> esquecer, a<strong>de</strong>mais, que, no vício <strong>do</strong> produto, há solidarieda<strong>de</strong> entre to<strong>do</strong>s os envolvi<strong>do</strong>s com o fornecimento,<br />

caso <strong>do</strong> fabricante, <strong>do</strong> produtor e <strong>do</strong> comerciante. Assim sen<strong>do</strong>, correto o entendimento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que<br />

responsabiliza a instituição financeira juntamente com a construtora, por vícios na construção <strong>do</strong> imóvel, cuja obra foi financiada<br />

com recursos <strong>do</strong> Sistema Financeiro <strong>de</strong> Habitação:<br />

“Recurso especial. Sistema financeiro da habitação. Vícios na construção <strong>de</strong> imóvel cuja obra foi financiada. Legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

agente financeiro. 1. Em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> empreendimento <strong>de</strong> natureza popular, <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> a mutuários <strong>de</strong> baixa renda, como na<br />

hipótese em julgamento, o agente financeiro é parte legítima para respon<strong>de</strong>r, solidariamente, por vícios na construção <strong>de</strong> imóvel<br />

cuja obra foi por ele financiada com recursos <strong>do</strong> Sistema Financeiro da Habitação. Prece<strong>de</strong>ntes. 2. Ressalva quanto à fundamentação<br />

<strong>do</strong> voto-vista, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a legitimida<strong>de</strong> passiva da instituição financeira não <strong>de</strong>correria da mera circunstância <strong>de</strong> haver<br />

financia<strong>do</strong> a obra e nem <strong>de</strong> se tratar <strong>de</strong> mútuo contraí<strong>do</strong> no âmbito <strong>do</strong> SFH, mas <strong>do</strong> fato <strong>de</strong> ter a CEF provi<strong>do</strong> o empreendimento,<br />

elabora<strong>do</strong> o projeto com todas as especificações, escolhi<strong>do</strong> a construtora e o negocia<strong>do</strong> diretamente, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> programa <strong>de</strong><br />

habitação popular. 3. Recurso especial improvi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 738.071/SC – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – Quarta Turma – j.<br />

09.08.2011 – DJe 09.12.2011).<br />

A conclusão <strong>de</strong>veria ser a mesma no tocante à instituição financeira que financia contrato para a aquisição <strong>de</strong> veículo por<br />

consumi<strong>do</strong>r. Porém, infelizmente, há julga<strong>do</strong> da mesma Corte que exclui a sua responsabilida<strong>de</strong> pelo vício <strong>do</strong> produto, na seguinte<br />

linha: “Por certo que o banco não está obriga<strong>do</strong> a respon<strong>de</strong>r por <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> produto que não forneceu tão somente porque o<br />

consumi<strong>do</strong>r adquiriu-o com valores obti<strong>do</strong>s por meio <strong>de</strong> financiamento bancário. Se o banco fornece dinheiro, o consumi<strong>do</strong>r é<br />

livre para escolher o produto que lhe aprouver. No caso <strong>de</strong> o bem apresentar <strong>de</strong>feito, o compra<strong>do</strong>r ainda continua <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r da<br />

instituição financeira. Não há relação <strong>de</strong> acessorieda<strong>de</strong> entre o contrato <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> bem <strong>de</strong> consumo e o <strong>de</strong><br />

financiamento que propicia numerário ao consumi<strong>do</strong>r para aquisição <strong>de</strong> bem que, pelo registro <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> alienação fiduciária,<br />

tem sua proprieda<strong>de</strong> transferida para o cre<strong>do</strong>r” (STJ – REsp 1.014.547/DF – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – Quarta Turma –<br />

j. 25.08.2009 – DJe 07.12.2009). Há uma clara contradição entre os arestos – este e o anterior –, sen<strong>do</strong> certo que o primeiro<br />

entendimento <strong>de</strong>ve prevalecer, como aplicação direta da solidarieda<strong>de</strong> consumerista. Quanto à falta <strong>de</strong> acessorieda<strong>de</strong> mencionada<br />

pelo último acórdão, parece tratar-se <strong>de</strong> um equívoco, eis que sem o financiamento, por certo, o negócio não se realizaria.<br />

De toda sorte, pontue-se que a questão não é pacífica naquela Corte Superior, pois alguns arestos, mais recentes, consi<strong>de</strong>ram a<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> “banco da monta<strong>do</strong>ra”, que financia a aquisição <strong>do</strong> veículo. Vejamos, nesse senti<strong>do</strong>, <strong>do</strong>is acórdãos <strong>do</strong> Tribunal<br />

da Cidadania, estes sim com o total apoio <strong>de</strong>ste autor:<br />

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Responsabilida<strong>de</strong> por vício <strong>do</strong> produto. Veículo novo <strong>de</strong>feituoso.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> solidária <strong>do</strong> ‘banco da monta<strong>do</strong>ra’ integrante da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> consumo. Legitimida<strong>de</strong> passiva <strong>do</strong> banco. 1. Demanda<br />

movida por consumi<strong>do</strong>r que visa a resolução <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> compra e venda e <strong>de</strong> financiamento <strong>do</strong> bem móvel <strong>de</strong>feituoso. 2.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> solidária da instituição financeira vinculada à concessionária <strong>do</strong> veículo (‘banco da monta<strong>do</strong>ra’), pois parte<br />

integrante da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> consumo. Legitimida<strong>de</strong> passiva <strong>do</strong> Banco da Monta<strong>do</strong>ra presente. 3. Agravo regimental a que se nega<br />

provimento” (STJ – AgRg no AREsp 712.368/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Moura Ribeiro – j. 23.02.2016 – DJe 04.03.2016).<br />

“Recurso especial. Consumi<strong>do</strong>r. Responsabilida<strong>de</strong> por vício <strong>do</strong> produto. Veículo novo <strong>de</strong>feituoso. Responsabilida<strong>de</strong> solidária <strong>do</strong><br />

‘banco da monta<strong>do</strong>ra’ integrante da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> consumo. Aplicação <strong>do</strong> art. 18 <strong>do</strong> CDC. Votos venci<strong>do</strong>s. 1. Demanda movida por<br />

consumi<strong>do</strong>r postulan<strong>do</strong> a rescisão <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> um automóvel (Golf) em razão <strong>de</strong> vício <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>, bem<br />

como <strong>de</strong> arrendamento mercantil firma<strong>do</strong> com o ‘banco da monta<strong>do</strong>ra’ para financiamento <strong>do</strong> veículo. 2. Responsabilida<strong>de</strong> solidária<br />

da instituição financeira vinculada à concessionária <strong>do</strong> veículo (‘banco da monta<strong>do</strong>ra’), pois parte integrante da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> consumo.<br />

3. Distinção em relação às instituições financeiras que atuam como ‘banco <strong>de</strong> varejo’, apenas conce<strong>de</strong>n<strong>do</strong> financiamento ao<br />

consumi<strong>do</strong>r para aquisição <strong>de</strong> um veículo novo ou usa<strong>do</strong> sem vinculação direta com o fabricante. 4. Aplicação <strong>do</strong> art. 18 <strong>do</strong> CDC. 5.<br />

Recurso especial a que se nega provimento por maioria, com <strong>do</strong>is votos venci<strong>do</strong>s” (STJ – REsp 1379839/SP – Terceira Turma –<br />

Rel. Min. Nancy Andrighi – Rel. p/Acórdão Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 11.11.2014 – DJe 15.12.2014).<br />

O último acórdão <strong>de</strong>monstra a divergência existente na Corte, que <strong>de</strong>ve pacificar o tema em breve, em sua Segunda Seção,<br />

dan<strong>do</strong> mais estabilida<strong>de</strong> ao direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r brasileiro. Ficamos com a última posição colacionada, substancialmente pela<br />

i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> risco-proveito. Ora, se as instituições bancárias, componentes <strong>do</strong> mesmo grupo econômico, têm bônus com a contratação<br />

da aquisição financiada <strong>do</strong> veículo, <strong>de</strong>vem também suportar os eventuais ônus e as responsabilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> negócio<br />

jurídico.<br />

Seguin<strong>do</strong> nos exemplos, o próprio STJ publicou ementa em setembro <strong>de</strong> 2015, por meio da ferramenta Jurisprudência em<br />

Teses, Edição n. 42, premissa n. 6, segun<strong>do</strong> a qual “a constatação <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito em veículo zero-quilômetro revela hipótese <strong>de</strong> vício<br />

<strong>do</strong> produto e impõe a responsabilização solidária da concessionária e <strong>do</strong> fabricante” (acórdãos: AgRg no AREsp 661.420/ES – Rel.


Min. Marco Aurélio Bellizze – Terceira Turma, j. 26.05.2015 – DJe 10.06.2015; EDcl no REsp 567.333/RN – Rel. Min. Raul<br />

Araújo – Quarta Turma – j. 20.06.2013 – DJe 28.06.2013; REsp 611.872/RJ – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – Quarta Turma<br />

– j. 02.10.2012 – DJe 23.10.2012 e REsp 547.794/PR – Rel. Min. Maria Isabel Gallotti – Quarta Turma – j. 15.02.2011 – DJe<br />

22.02.2011). Pontue-se que tais arestos não tratam da responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> agente que financia a compra, mas apenas da<br />

solidarieda<strong>de</strong> entre o fabricante e a concessionária que ven<strong>de</strong> o veículo, o que parece ser bem claro e cristalino.<br />

Vistas tais concretizações, ressalte-se que a lei estabelece duas exceções internas bem específicas a respeito da solidarieda<strong>de</strong><br />

no vício <strong>do</strong> produto.<br />

A primeira exceção tem relação com os produtos forneci<strong>do</strong>s in natura, respon<strong>de</strong>n<strong>do</strong> perante o consumi<strong>do</strong>r o fornece<strong>do</strong>r<br />

imediato, exceto quan<strong>do</strong> i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong> claramente seu produtor (art. 18, § 5º, <strong>do</strong> CDC). Para concretizar a norma, se alguém adquire<br />

uma maçã estragada em uma feira livre, a responsabilida<strong>de</strong>, em regra, será <strong>do</strong> feirante. Porém, se na maçã constar o selo <strong>do</strong><br />

produtor, o que é bem comum, o último respon<strong>de</strong>rá pelo vício.<br />

Como segunda exceção, <strong>de</strong>termina o § 2º <strong>do</strong> art. 19 que o fornece<strong>do</strong>r imediato – no caso, o comerciante – será responsável<br />

pelo vício <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> quan<strong>do</strong> fizer a pesagem ou a medição e o instrumento utiliza<strong>do</strong> não estiver aferi<strong>do</strong> segun<strong>do</strong> os padrões<br />

oficiais. O <strong>de</strong>srespeito à lealda<strong>de</strong> negocial, à boa-fé objetiva, acaba por gerar a sua responsabilida<strong>de</strong> pessoal, afastan<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong><br />

reparar o fabricante. A título <strong>de</strong> exemplo, se há um problema na balança <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, que está adulterada, a responsabilida<strong>de</strong> será<br />

<strong>do</strong> comerciante e não <strong>do</strong> produtor ou fabricante.<br />

Estabelece o art. 18, caput, <strong>do</strong> CDC que “Os fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> consumo duráveis ou não duráveis respon<strong>de</strong>m<br />

solidariamente pelos vícios <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> ou quantida<strong>de</strong> que os tornem impróprios ou ina<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s ao consumo a que se <strong>de</strong>stinam<br />

ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles <strong>de</strong>correntes da disparida<strong>de</strong>, com as indicações constantes <strong>do</strong> recipiente, da<br />

embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> sua natureza, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r<br />

exigir a substituição das partes viciadas” (com <strong>de</strong>staques <strong>do</strong> autor). Como se nota, tal coman<strong>do</strong> consagra e <strong>de</strong>screve os chama<strong>do</strong>s<br />

vícios <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produto. Ilustre-se com a hipótese <strong>de</strong> um veículo que não funciona <strong>de</strong> forma a<strong>de</strong>quada, como espera o<br />

consumi<strong>do</strong>r (STJ – REsp 991.985/PR – Segunda Turma – Rel. Min. Castro Meira – j. 18.12.2007 – DJ 11.02.2008, p. 84). Po<strong>de</strong><br />

ainda ser citada a situação <strong>do</strong> imóvel adquiri<strong>do</strong> <strong>de</strong> um profissional que apresente sério problema no encanamento, pois utiliza<strong>do</strong><br />

material diverso <strong>do</strong> espera<strong>do</strong> (TJRS – Recurso Cível 71001577337, Porto Alegre – Primeira Turma Recursal Cível – Rel. Des.<br />

Heleno Tregnago Saraiva – j. 17.07.2008 – DOERS 22.07.2008, p. 104).<br />

Mas não é só, uma vez que o art. 19 da Lei 8.078/1990 trata <strong>do</strong>s vícios <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong>, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> a gerar a<br />

solidarieda<strong>de</strong>, enuncian<strong>do</strong> que “Os fornece<strong>do</strong>res respon<strong>de</strong>m solidariamente pelos vícios <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produto sempre que,<br />

respeitadas as variações <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> sua natureza, seu conteú<strong>do</strong> líqui<strong>do</strong> for inferior às indicações constantes <strong>do</strong> recipiente, da<br />

embalagem, rotulagem ou <strong>de</strong> mensagem publicitária” (mais uma vez, o presente autor <strong>de</strong>stacou). A título <strong>de</strong> exemplos, cite-se a<br />

hipótese <strong>de</strong> uma goiabada que tem menos conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> que consta da embalagem; ou <strong>do</strong> pacote com rolos <strong>de</strong> papel higiênico com<br />

menor metragem <strong>do</strong> que o previsto. Ainda, a situação <strong>de</strong> uma máquina <strong>de</strong> lavar roupas que suporta menos <strong>do</strong> que os <strong>de</strong>z quilos<br />

acorda<strong>do</strong>s (TJRS – Recurso Cível 71002590800, Porto Alegre – Terceira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Jerson Moacir Gubert<br />

– j. 29.07.2010 – DJERS 06.08.2010).<br />

Pois bem, nos casos <strong>de</strong> vícios <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>, prevê o § 1 o <strong>do</strong> art. 18 <strong>do</strong> CDC que, não sen<strong>do</strong> o vício sana<strong>do</strong> no prazo máximo <strong>de</strong><br />

trinta dias pelo fornece<strong>do</strong>r, po<strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r ingressar em juízo para exercício das opções dadas pela norma, e que ainda serão<br />

estudadas. Observa-se que a própria lei conce<strong>de</strong> ao fornece<strong>do</strong>r o direito <strong>de</strong> sanar o problema em trinta dias da sua reclamação.<br />

Trata-se <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s poucos dispositivos no Código Consumerista que traz um direito fundamental <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos. O<br />

prazo previsto tem natureza <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial, caducan<strong>do</strong> o direito ao final <strong>do</strong> transcurso <strong>do</strong> tempo.<br />

Surge então a indagação: quais são as consequências caso o consumi<strong>do</strong>r não respeite tal direito <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r? Na <strong>do</strong>utrina,<br />

em profun<strong>do</strong> estu<strong>do</strong>, José Fernan<strong>do</strong> Simão aponta que a corrente majoritária, a qual estão filia<strong>do</strong>s O<strong>de</strong>te Novais Carneiro Queiroz,<br />

Alberto <strong>do</strong> Amaral Jr., Zelmo Denari, Jorge Alberto Quadros <strong>de</strong> Carvalho Silva e Luiz Antonio Rizzatto Nunes, reconhece que se<br />

o consumi<strong>do</strong>r não respeitar tal prazo <strong>de</strong> trinta dias, não po<strong>de</strong>rá fazer uso das medidas previstas nos incisos <strong>do</strong> coman<strong>do</strong> legal, caso<br />

da opção <strong>de</strong> resolução <strong>do</strong> contrato.30 Muito próximo, esclarece Leonar<strong>do</strong> Roscoe Bessa que o art. 18, § 1º, <strong>do</strong> Código<br />

Consumerista tem ampla aplicação nos casos em que se configura o abuso <strong>de</strong> direito por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 31 Nessa linha, tem<br />

aplicação em face <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r o art. 187 <strong>do</strong> CC/2002, segun<strong>do</strong> o qual também comete ato ilícito o titular <strong>de</strong> um direito que, ao<br />

exercê-lo, exce<strong>de</strong> manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico e social, pela boa-fé objetiva e pelos bons costumes.<br />

Em um sadio diálogo entre as normas, nota-se que o consumi<strong>do</strong>r que não respeita tal prazo não atenta para o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> colaboração<br />

negocial <strong>de</strong>corrente da boa-fé objetiva.<br />

Na jurisprudência, o prazo <strong>de</strong> trinta dias é também aponta<strong>do</strong> como um direito <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r (por to<strong>do</strong>s: TJSP – Agravo <strong>de</strong><br />

Instrumento 1102616000 – Rel. Rocha <strong>de</strong> Souza – j. 17.05.2007 – registro 17.05.2007). Existem julga<strong>do</strong>s concluin<strong>do</strong> pela carência


<strong>de</strong> ação, por falta <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação e interesse processual, em casos em que o consumi<strong>do</strong>r não respeita esse prazo <strong>de</strong> trinta dias para a<br />

solução <strong>do</strong> vício. Nesse senti<strong>do</strong>, parecen<strong>do</strong> ser a melhor solução a ser mantida na vigência <strong>do</strong> Novo CPC (art. 485, VI):<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Vício <strong>do</strong> produto. Faculda<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> sanar o vício no prazo <strong>de</strong> 30 dias. Impossibilida<strong>de</strong> no caso concreto <strong>do</strong><br />

uso imediato pelo consumi<strong>do</strong>r das alternativas postas à disposição pelo art. 18, § 1º, <strong>do</strong> CDC. Ausência <strong>de</strong> prova mínima quanto ao<br />

fato <strong>de</strong> ter si<strong>do</strong> oportuniza<strong>do</strong> o conserto. Sentença mantida. Carência <strong>de</strong> ação. Recurso improvi<strong>do</strong>” (TJRS – Recurso Cível<br />

71002384907, Rio Par<strong>do</strong> – Segunda Turma Recursal Cível – Rel. Des. Vivian Cristina Angonese Spengler – j. 14.07.2010 – DJERS<br />

22.07.2010).<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Vício <strong>do</strong> produto. Omissão <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> conserto na assistência técnica. Hipótese em que não foi conferida ao<br />

fornece<strong>do</strong>r a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sanar o vício. Carência <strong>de</strong> ação <strong>de</strong>cretada. Extinção <strong>do</strong> processo sem resolução <strong>do</strong> mérito. Recurso<br />

provi<strong>do</strong>” (TJRS – Recurso Cível 71001106194, Guaíba – Segunda Turma Recursal Cível – Rel. Mylene Maria Michel – j.<br />

24.01.2007).<br />

Consigne-se que a jurisprudência também reconhece ser o caso <strong>de</strong> improcedência, entran<strong>do</strong> no mérito da questão e afastan<strong>do</strong> o<br />

direito material à resolução contratual ou à troca <strong>do</strong> produto pelo vício:<br />

“In<strong>de</strong>nizatória c/c obrigação <strong>de</strong> fazer. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Vício <strong>do</strong> produto. Autora que preten<strong>de</strong> a troca por um produto <strong>de</strong><br />

outra marca. Concretamente, não se discutiu a veracida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s fatos narra<strong>do</strong>s ou mesmo a ocorrência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito no aparelho <strong>de</strong> DVD<br />

que foi adquiri<strong>do</strong> pela autora. Na verda<strong>de</strong>, o fundamento que embasou a sentença <strong>de</strong> improcedência, ora recorrida, foi a não<br />

concessão por parte da autora <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong> para que as rés sanassem o <strong>de</strong>feito. O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r estabelece<br />

alguns direitos aos fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> bens e serviços, suficientes e necessários a evitar um <strong>de</strong>sequilíbrio exagera<strong>do</strong> em <strong>de</strong>sfavor <strong>do</strong>s<br />

mesmos. O § 1º, <strong>do</strong> art. 18, <strong>do</strong> CODECON conce<strong>de</strong> um prazo <strong>de</strong> trinta dias para que o comerciante ou o fabricante sane o <strong>de</strong>feito<br />

apresenta<strong>do</strong> pelo bem coloca<strong>do</strong> no merca<strong>do</strong>, garantin<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> expira<strong>do</strong> o referi<strong>do</strong> prazo, a substituição <strong>do</strong><br />

produto ou a <strong>de</strong>volução <strong>do</strong> valor pago, entre outras medidas. Portanto, correto o fundamento a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pelo sentenciante monocrático,<br />

no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que os pedi<strong>do</strong>s formula<strong>do</strong>s pela autora somente seriam cabíveis <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> concedi<strong>do</strong> o prazo da Lei para a solução <strong>do</strong>s<br />

<strong>de</strong>feitos. Apelo improvi<strong>do</strong>” (TJRJ – Apelação 2009.001.05283 – Décima Quinta Câmara Cível – Rel. Des. Celso Ferreira Filho – j.<br />

14.04.2009 – DORJ 30.04.2009, p. 172).<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Pleito <strong>de</strong> restituição das quantias pagas. Alegada publicida<strong>de</strong> enganosa. Aquisição <strong>de</strong> máquina <strong>de</strong> fazer pão. Produto<br />

que não apresentou funcionamento <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com sua publicida<strong>de</strong>. O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, em seu art. 18, § 1º,<br />

estabelece o prazo máximo <strong>de</strong> 30 dias para que o comerciante/fornece<strong>do</strong>r possa sanar o vício existente no produto. Não ten<strong>do</strong> o<br />

consumi<strong>do</strong>r encaminha<strong>do</strong> o produto para a assistência técnica, a fim <strong>de</strong> verificar a real existência <strong>do</strong> <strong>de</strong>feito alega<strong>do</strong>, <strong>de</strong>scabe o<br />

pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> restituição <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> mesmo. Recurso <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJRS – Recurso Cível 71001132851, Porto Alegre – Terceira<br />

Turma Recursal Cível – Relator Eugênio Facchini Neto – j. 12.12.2006).<br />

Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, este autor não está filia<strong>do</strong> ao entendimento esposa<strong>do</strong> nas duas últimas ementas, pois elas afastam um<br />

direito material <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r ao ingressarem no mérito da questão. Na verda<strong>de</strong>, a melhor solução é mesma a carência <strong>de</strong> ação,<br />

dan<strong>do</strong>-se nova oportunida<strong>de</strong> para o consumi<strong>do</strong>r prejudica<strong>do</strong> <strong>de</strong>mandar em juízo. Reafirmamos que essa posição <strong>de</strong>ve ser mantida<br />

na vigência <strong>do</strong> Novo CPC, concluin<strong>do</strong>-se pela falta <strong>de</strong> interesse processual (art. 485, VI, <strong>do</strong> CPC/2015).<br />

Outro ponto relevante refere-se à <strong>de</strong>volução <strong>do</strong> produto pelo fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> trinta dias, mas sem a resolução <strong>do</strong><br />

problema. Ora, em situações tais, consi<strong>de</strong>ra-se o vício não sana<strong>do</strong> como um novo, não estan<strong>do</strong> prejudica<strong>do</strong> qualquer direito <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r.32 Destaque-se que a situação <strong>de</strong>scrita é muito comum em casos concretos relativos a automóveis, repetin<strong>do</strong>-se na<br />

prática a hipótese em que a concessionária entrega o veículo ainda com vício, ou com outro problema.<br />

Supera<strong>do</strong>s esses importantes aspectos, nos termos <strong>do</strong> § 2 o <strong>do</strong> art. 18 <strong>do</strong> CDC, po<strong>de</strong>m as partes convencionar a redução ou<br />

ampliação <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial previsto no parágrafo anterior, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser inferior a sete nem superior a cento e oitenta dias.<br />

Nos contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, aqueles com conteú<strong>do</strong> imposto por uma das partes, a cláusula <strong>de</strong> prazo <strong>de</strong>verá ser convencionada em<br />

separa<strong>do</strong>, por meio <strong>de</strong> manifestação expressa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Em algumas hipóteses, não há necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r respeitar o prazo <strong>de</strong> trinta dias, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> fazer uso imediato das<br />

opções dadas em lei. Vejamos essas três hipóteses:<br />

1ª)<br />

2ª)<br />

3ª)<br />

Quan<strong>do</strong>, em razão da extensão <strong>do</strong> vício, a substituição das partes viciadas pu<strong>de</strong>r comprometer a qualida<strong>de</strong> ou características <strong>do</strong><br />

produto. Exemplo: problema atinge um componente <strong>de</strong> um veículo que somente po<strong>de</strong> ser substituí<strong>do</strong> pelo fabricante.<br />

Diante da extensão <strong>do</strong> vício, a substituição das partes viciadas pu<strong>de</strong>r gerar a diminuição substancial <strong>do</strong> valor da coisa. Exemplo: um<br />

problema atingiu o veículo e ele não mais funciona, tornan<strong>do</strong>-se um bem <strong>de</strong> consumo imprestável.<br />

Quan<strong>do</strong> se tratar <strong>de</strong> produto essencial. Exemplo: o veículo é utiliza<strong>do</strong> como instrumento <strong>de</strong> trabalho por um taxista. Ainda para<br />

ilustrar, cite-se o caso <strong>do</strong> eletro<strong>do</strong>méstico compra<strong>do</strong> especialmente para ser utiliza<strong>do</strong> pelo consumi<strong>do</strong>r quan<strong>do</strong> <strong>de</strong> suas férias (TJRS<br />

– Recurso Cível 71002225001, Porto Alegre – Segunda Turma Recursal Cível – Rel. Des. Fernanda Carravetta Vilan<strong>de</strong> – j.


I)<br />

II)<br />

III)<br />

I)<br />

II)<br />

III)<br />

IV)<br />

21.10.2009 – DJERS 03.11.2009, p. 96). Ato contínuo <strong>de</strong> exposição, o Ministério Público Fe<strong>de</strong>ral enten<strong>de</strong> que o aparelho celular é<br />

um bem essencial, o que realmente parece ser o correto (Enuncia<strong>do</strong> n. 8 da 3ª Câmara <strong>de</strong> Coor<strong>de</strong>nação e Revisão <strong>do</strong> Ministério<br />

Público Fe<strong>de</strong>ral). Na opinião <strong>do</strong> presente autor, a expressão produto essencial merece interpretação extensiva, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a<br />

realida<strong>de</strong> social brasileira, sempre visan<strong>do</strong> à tutela efetiva <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

As opções judiciais a que tem direito o consumi<strong>do</strong>r nos casos <strong>de</strong> vícios <strong>do</strong> produto constam <strong>do</strong>s arts. 18 e 19 da Lei<br />

8.078/1990. O primeiro dispositivo consagra tais prerrogativas haven<strong>do</strong> vício <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r exigir,<br />

alternativamente, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a sua livre escolha:<br />

A substituição <strong>do</strong> produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições <strong>de</strong> uso. Ten<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r opta<strong>do</strong> por essa<br />

alternativa, e não sen<strong>do</strong> possível a substituição <strong>do</strong> bem, po<strong>de</strong>rá haver substituição por outro <strong>de</strong> espécie, marca ou mo<strong>de</strong>lo diversos,<br />

mediante complementação ou restituição <strong>de</strong> eventual diferença <strong>de</strong> preço (art. 18, § 4º, <strong>do</strong> CDC). Exemplo: o veículo apresenta vício<br />

no seu funcionamento. Po<strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r pleitear outro veículo da concessionária on<strong>de</strong> o adquiriu. Não haven<strong>do</strong> unida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

mesmo mo<strong>de</strong>lo, po<strong>de</strong>rá pleitear um equivalente, ten<strong>do</strong> direito a eventual diferença no preço.<br />

A restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo <strong>de</strong> eventuais perdas e danos. A solução é pela<br />

resolução <strong>do</strong> negócio celebra<strong>do</strong>, com a <strong>de</strong>volução <strong>do</strong> valor pago, o que compõe as perdas e danos, nos termos <strong>do</strong> art. 402 <strong>do</strong> CC<br />

(pela menção ao que efetivamente se per<strong>de</strong>u). Impropriamente, a norma faz menção às perdas e danos em separa<strong>do</strong>, o que <strong>de</strong>ve ser<br />

visto com ressalvas, pois, presentes outros prejuízos, haverá fato <strong>do</strong> produto e não vício.<br />

O abatimento proporcional <strong>do</strong> preço. Exemplo: se houve um problema estrutural no automóvel e o consumi<strong>do</strong>r fez a opção em<br />

consertá-lo por conta própria, terá direito ao valor que teve que <strong>de</strong>sembolsar pelo reparo. Cite-se, ainda, o abatimento pelo conserto<br />

<strong>do</strong> encanamento <strong>do</strong> apartamento adquiri<strong>do</strong> em negócio <strong>de</strong> consumo.<br />

Presente o vício <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong>, as alternativas judiciais <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r são muito próximas, nos termos <strong>do</strong> art. 19 <strong>do</strong> CDC,<br />

po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r exigir, mais uma vez, alternativamente e <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a sua livre escolha:<br />

O abatimento proporcional <strong>do</strong> preço.<br />

A complementação <strong>do</strong> peso ou medida.<br />

A substituição <strong>do</strong> produto por outro da mesma espécie, marca ou mo<strong>de</strong>lo, sem os aludi<strong>do</strong>s vícios. Mais uma vez, não sen<strong>do</strong> possível<br />

a substituição <strong>do</strong> bem, po<strong>de</strong>rá haver substituição por outro <strong>de</strong> espécie, marca ou mo<strong>de</strong>lo diversos, mediante complementação ou<br />

restituição <strong>de</strong> eventual diferença <strong>de</strong> preço (art. 19, § 1º que manda aplicar o art. 18, § 4º, <strong>do</strong> CDC).<br />

A restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo <strong>de</strong> eventuais perdas e danos. Novamente, a hipótese<br />

é <strong>de</strong> resolução <strong>do</strong> negócio com a <strong>de</strong>volução das quantias pagas, valores que compões as perdas e danos. Repise-se que a norma faz<br />

menção às perdas e danos em separa<strong>do</strong>, o que <strong>de</strong>ve ser visto com ressalvas, pois, presentes outros prejuízos, haverá fato <strong>do</strong> produto<br />

e não vício.<br />

A ilustrar a incidência <strong>do</strong> vício <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong>, enten<strong>de</strong>u o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que, “ainda que haja abatimento no<br />

preço <strong>do</strong> produto, o fornece<strong>do</strong>r respon<strong>de</strong>rá por vício <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> na hipótese em que reduzir o volume da merca<strong>do</strong>ria para<br />

quantida<strong>de</strong> diversa da que habitualmente fornecia no merca<strong>do</strong>, sem informar na embalagem, <strong>de</strong> forma clara, precisa e ostensiva, a<br />

diminuição <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1.364.915/MG – Rel. Min. Humberto Martins – j. 14.05.2013, publica<strong>do</strong> no seu Informativo<br />

n. 524). O acórdão conclui que a informação a<strong>de</strong>quada constitui um direito básico <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, conferin<strong>do</strong> a ele uma escolha<br />

consciente e permitin<strong>do</strong> que suas expectativas em relação ao produto ou serviço sejam <strong>de</strong> fato atingidas (consentimento informa<strong>do</strong><br />

ou vonta<strong>de</strong> qualificada).<br />

Os prazos para reclamar o vício <strong>do</strong> produto – seja ele <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> – são <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais, nos termos <strong>do</strong> art. 26<br />

<strong>do</strong> CDC, eis que as ações correspon<strong>de</strong>ntes são constitutivas negativas. Desse mo<strong>do</strong>, escoa<strong>do</strong>s os prazos, ocorrerá a extinção da<br />

ação proposta, com resolução <strong>do</strong> mérito, nos termos <strong>do</strong> art. 487, II, <strong>do</strong> CPC/2015, correspon<strong>de</strong>nte ao art. 269, IV, <strong>do</strong> CPC/1973<br />

(por to<strong>do</strong>s: STJ – AgRg no REsp 1.171.635/MT – Rel. Min. Vasco Della Giustina (Desembarga<strong>do</strong>r Convoca<strong>do</strong> <strong>do</strong> TJ/RS) –<br />

Terceira Turma – j. 23.11.2010 – DJe 03.12.2010). Os prazos, essenciais para o estu<strong>do</strong> e compreensão da matéria aqui tratada, são<br />

os seguintes:<br />

I)<br />

II)<br />

Prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> trinta dias, tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> produtos não duráveis, que são aqueles que<br />

<strong>de</strong>saparecem facilmente com o consumo (bens consumíveis faticamente, nos termos <strong>do</strong> art. 86, primeira parte, <strong>do</strong><br />

CC/2002). Exemplos: gêneros alimentícios.<br />

Prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> noventa dias, tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> fornecimento produtos duráveis, que são aqueles que não<br />

<strong>de</strong>saparecem facilmente com o consumo (bens inconsumíveis faticamente, nos termos <strong>do</strong> art. 86, primeira parte, <strong>do</strong><br />

CC/2002). Exemplos: automóveis, imóveis, aparelhos celulares e eletro<strong>do</strong>mésticos.


De imediato – o que servirá para outras situações <strong>de</strong> vícios expostas a seguir –, ressalte-se a louvável proposta <strong>de</strong> ampliação<br />

<strong>do</strong>s prazos <strong>do</strong> art. 26 <strong>do</strong> CDC, para 60 e 180 dias, nos casos <strong>de</strong> bens não duráveis e duráveis, respectivamente (PL 283/2012). A<br />

projeção, que conta com o total apoio <strong>do</strong> presente autor, representa mais uma feliz ampliação <strong>do</strong>s direitos consumeristas em nosso<br />

País, estan<strong>do</strong> mais bem adaptada à realida<strong>de</strong> social brasileira.<br />

Voltan<strong>do</strong> à legislação em vigor, em caso <strong>de</strong> dúvida, ou seja, se não restar claro se o produto é durável ou não, <strong>de</strong>ve-se<br />

enten<strong>de</strong>r pela aplicação <strong>do</strong> prazo maior <strong>de</strong> 90 dias, o que é incidência <strong>do</strong> princípio <strong>do</strong> protecionismo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, retira<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

art. 1º da Lei 8.078/1990 e <strong>do</strong> art. 5º, inc. XXXII, da CF/1988.<br />

A propósito <strong>de</strong>ssa diferenciação, recente aresto <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça traz elementos que po<strong>de</strong>m auxiliar o intérprete<br />

na correta conclusão quanto ao enquadramento <strong>do</strong>s bens duráveis e não duráveis. Pontue-se que o julga<strong>do</strong> diz respeito a um vesti<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong> noiva, trata<strong>do</strong> como bem durável e sujeito ao prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> 90 dias. Na linha <strong>do</strong> <strong>de</strong>cisum, “enten<strong>de</strong>-se por produto<br />

durável aquele que, como o próprio nome consigna, não se extingue pelo uso, levan<strong>do</strong> certo tempo para se <strong>de</strong>sgastar, que variará<br />

conforme a qualida<strong>de</strong> da merca<strong>do</strong>ria, os cuida<strong>do</strong>s que lhe são empresta<strong>do</strong>s pelo usuário, o grau <strong>de</strong> utilização e o meio ambiente no<br />

qual inseri<strong>do</strong>. Portanto, natural que um terno, um eletro<strong>do</strong>méstico, um automóvel ou até mesmo um livro, à evidência exemplos <strong>de</strong><br />

produtos duráveis, se <strong>de</strong>sgastem com o tempo, já que a finitu<strong>de</strong> é, <strong>de</strong> certo mo<strong>do</strong>, inerente a to<strong>do</strong> bem. Por outro la<strong>do</strong>, os produtos<br />

não duráveis, tais como alimentos, os remédios e combustíveis, em regra in natura, findam com o mero uso, extinguin<strong>do</strong>-se em um<br />

único ato <strong>de</strong> consumo. Assim, por consequência, nos produtos não duráveis o <strong>de</strong>sgaste é imediato. Diante disso, o vesti<strong>do</strong> <strong>de</strong> noiva<br />

<strong>de</strong>ve ser classifica<strong>do</strong> como um bem durável, pois não se extingue pelo mero uso, sen<strong>do</strong> notório que, por seu valor sentimental, há<br />

quem o guar<strong>de</strong> para a posterida<strong>de</strong>, muitas vezes com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vê-lo reutiliza<strong>do</strong> em cerimônias <strong>de</strong> casamento por familiares<br />

(filhas, netas e bisnetas) <strong>de</strong> uma mesma estirpe. Há pessoas, inclusive, que mantêm o vesti<strong>do</strong> <strong>de</strong> noiva como lembrança da escolha<br />

<strong>de</strong> vida e da emoção vivenciada no momento <strong>do</strong> enlace amoroso, enquanto há aquelas que o guardam para uma possível reforma,<br />

seja por meio <strong>de</strong> aproveitamento <strong>do</strong> material (normalmente valioso), <strong>do</strong> tingimento da roupa (cujo teci<strong>do</strong>, em regra, é <strong>de</strong> alta<br />

qualida<strong>de</strong>) ou, ainda, para extrair lucro econômico, por meio <strong>de</strong> aluguel (negócio rentável e comum atualmente)” (STJ – REsp<br />

1.161.941/DF – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – j. 05.11.2013, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 533).<br />

Feito tal fulcral esclarecimento, quanto ao início da contagem <strong>do</strong>s prazos, se o vício for aparente ou <strong>de</strong> fácil constatação, darse-á<br />

da entrega efetiva <strong>do</strong> produto ou tradição real (art. 26, § 1.º, <strong>do</strong> CDC). A ilustrar, a falta <strong>de</strong> peças <strong>de</strong> um faqueiro adquiri<strong>do</strong>,<br />

perceptível <strong>de</strong> imediato.<br />

Porém, no caso <strong>de</strong> vício oculto, o prazo inicia-se no momento em que ficar evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong> o problema (art. 26, § 3º, <strong>do</strong> CDC).<br />

Como ilustração da última hipótese, cite-se o caso em que o barulho <strong>do</strong> veículo somente po<strong>de</strong> ser percebi<strong>do</strong> após uma <strong>de</strong>terminada<br />

velocida<strong>de</strong> atingida. Nessa linha, <strong>do</strong> STJ, “conforme premissa <strong>de</strong> fato fixada pela corte <strong>de</strong> origem, o vício <strong>do</strong> produto era oculto.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, o dies a quo <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> que trata o art. 26, § 3º, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é a data em ficar<br />

evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong> o aludi<strong>do</strong> vício, ainda que haja uma garantia contratual, sem aban<strong>do</strong>nar, contu<strong>do</strong>, o critério da vida útil <strong>do</strong> bem<br />

durável, a fim <strong>de</strong> que o fornece<strong>do</strong>r não fique responsável por solucionar o vício eternamente” (STJ – REsp 1.123.004/DF –<br />

Segunda Turma – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – j. 01.12.2011 – DJe 09.12.2011).<br />

Nos termos literais <strong>do</strong> que consta <strong>do</strong> art. 26, § 2º, <strong>do</strong> CDC, tais prazos po<strong>de</strong>m ser obsta<strong>do</strong>s. Trata-se <strong>de</strong> uma exceção à regra<br />

segun<strong>do</strong> a qual o prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial não po<strong>de</strong> ser impedi<strong>do</strong>, suspenso ou interrompi<strong>do</strong>, como consta <strong>do</strong> art. 207 <strong>do</strong> CC/2002.<br />

Diverge a <strong>do</strong>utrina se tal obstação constituiria uma suspensão ou uma interrupção.33<br />

A questão é importante, pois, na suspensão, o prazo para e <strong>de</strong>pois continua <strong>de</strong> on<strong>de</strong> parou. Já na interrupção, o prazo para e<br />

volta ao seu início. A divergência é muito bem exposta por Leonar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros Garcia, que <strong>de</strong>monstra as duas correntes<br />

<strong>do</strong>utrinárias fundamentais existentes sobre o tema. Para a primeira corrente, à qual estão filia<strong>do</strong>s Zelmo Denari e Fabio Ulhôa<br />

Coelho, a hipótese é <strong>de</strong> suspensão <strong>do</strong> prazo. Para a segunda, li<strong>de</strong>rada por Claudia Lima Marques, Luiz Edson Fachin e O<strong>de</strong>te<br />

Novais Carneiro Queiroz, a hipótese é <strong>de</strong> interrupção, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> o <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>r cita<strong>do</strong>.34 Contribuin<strong>do</strong> para a<br />

pesquisa realizada, anote-se que Rizzatto Nunes <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> uma terceira conclusão, segun<strong>do</strong> a qual não se trata nem <strong>de</strong> suspensão<br />

nem <strong>de</strong> interrupção, mas da constituição <strong>de</strong> um direito a favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 35<br />

Na opinião <strong>do</strong> presente autor, a hipótese é <strong>de</strong> uma suspensão especial, que <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> uma atuação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Para a<br />

<strong>de</strong>vida argumentação técnica, fazemos nossas as palavras <strong>de</strong> José Fernan<strong>do</strong> Simão, professor da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> da USP:<br />

“Em que pese o Código Civil realmente incluir entre as causas <strong>de</strong> interrupção da prescrição atos <strong>do</strong> interessa<strong>do</strong>, em momento algum<br />

esse diploma fixa o término <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> ‘interrupção’, como faz o CDC. Por outro la<strong>do</strong>, ao tratar da causa <strong>de</strong> suspensão da<br />

prescrição, o Código Civil expressamente <strong>de</strong>termina o perío<strong>do</strong> durante o qual essa não correrá, utilizan<strong>do</strong> as expressões como ‘na<br />

constância <strong>do</strong> matrimônio’ (art. 197, I) e ‘durante o po<strong>de</strong>r familiar’ (art. 197, II).<br />

Ora, tais expressões têm significa<strong>do</strong> idêntico àquelas utilizadas pela legislação no art. 26 <strong>do</strong> CDC e levam-nos a concluir se tratar<br />

realmente <strong>de</strong> suspensão e não <strong>de</strong> interrupção da <strong>de</strong>cadência”. 36


A par <strong>de</strong>ssa forma <strong>de</strong> pensar, o prazo já conta<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua volta, premissa que é seguida por muitos<br />

julga<strong>do</strong>s (por to<strong>do</strong>s: TJSP – Apelação 9191745-04.2009.8.26.0000 – Acórdão 5021282, São Paulo – Vigésima Nona Câmara <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Pereira Calças – j. 23.03.2011 – DJESP 11.04.2011; TJMG – Apelação Cível 5688694-<br />

84.2009.8.13.0702, Uberlândia – Décima Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Guilherme Luciano Baeta Nunes – j. 01.02.2011 –<br />

DJEMG 18.02.2011; e TJDF – Recurso 2007.10.1.011291-4 – Acórdão 327.139 – Primeira Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s<br />

Especiais Cíveis e Criminais – Rel. Juiz Esdras <strong>Neves</strong> – DJDFTE 29.10.2008, p. 225).<br />

De qualquer mo<strong>do</strong>, cabe ressaltar que o PL 283/2012 preten<strong>de</strong> encerrar a polêmica, utilizan<strong>do</strong> a expressão “interrompem a<br />

<strong>de</strong>cadência” no art. 26 <strong>do</strong> CDC. A proposta está fundada na premissa <strong>de</strong> que a interrupção, como regra, é melhor para a tutela <strong>do</strong>s<br />

direitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Feita tal constatação, voltan<strong>do</strong> à legislação aplicável no momento, são hipóteses em que ocorre tal obstação, nos termos da<br />

norma consumerista vigente:<br />

1ª)<br />

2ª)<br />

A reclamação comprovadamente formulada pelo consumi<strong>do</strong>r ao fornece<strong>do</strong>r, até a respectiva resposta, o que <strong>de</strong>ve ocorrer <strong>de</strong> forma<br />

inequívoca. Deve ficar claro que tal norma prevalece sobre o art. 18, § 1º, <strong>do</strong> CDC, ou seja, se o fornece<strong>do</strong>r não respon<strong>de</strong> quanto à<br />

solução <strong>do</strong> problema, o prazo permanecerá obsta<strong>do</strong>. Enten<strong>de</strong>r que o prazo volta a correr após os trinta dias sem a resposta <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r coloca em <strong>de</strong>sprestígio to<strong>do</strong> o sistema consagra<strong>do</strong> para a proteção <strong>do</strong> vulnerável negocial.<br />

A instauração <strong>do</strong> inquérito civil pelo Ministério Público até o seu encerramento. Nos termos <strong>do</strong> art. 8º da Lei da Ação Civil Pública<br />

(Lei 7.437/1985), o inquérito civil é um procedimento administrativo que visa a investigar ou a dirimir situações <strong>de</strong> lesão a direitos<br />

coletivos, caso <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. Enuncia o coman<strong>do</strong> legal cita<strong>do</strong> que o Ministério Público po<strong>de</strong>rá instaurar, sob sua<br />

presidência, inquérito civil, ou requisitar, <strong>de</strong> qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias.<br />

Seguin<strong>do</strong> no estu<strong>do</strong> da matéria, não se olvi<strong>de</strong> da edição em 2012, pelo STJ, <strong>de</strong> Súmula estabelecen<strong>do</strong> que “A <strong>de</strong>cadência <strong>do</strong><br />

artigo 26 <strong>do</strong> CDC não é aplicável à prestação <strong>de</strong> contas para obter esclarecimentos sobre cobrança <strong>de</strong> taxas, tarifas e encargos<br />

bancários” (Súmula n. 477). Consultan<strong>do</strong>-se os prece<strong>de</strong>ntes que geraram ementa, constata-se que a Corte Superior enten<strong>de</strong> pela<br />

aplicação <strong>de</strong> prazo previsto no Código Civil para a hipótese da citada prestação <strong>de</strong> contas. Como no caso há geralmente uma ação<br />

<strong>de</strong> repetição <strong>de</strong> indébito, é forçoso <strong>de</strong>duzir pela aplicação <strong>do</strong> prazo geral <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos, estabeleci<strong>do</strong> pelo art. 205 da codificação<br />

civil privada.<br />

Vistos tais aspectos, não se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> fazer um paralelo entre os vícios <strong>do</strong> produto e os chama<strong>do</strong>s vícios redibitórios,<br />

previstos nos arts. 441 a 446 <strong>do</strong> CC/2002, uma vez que a presente obra preten<strong>de</strong> trazer uma visão dialogal entre as duas normas.<br />

Os vícios redibitórios, com gran<strong>de</strong> aplicação na esfera contratual, têm a mesma natureza <strong>do</strong>s vícios <strong>do</strong> produto quanto à origem,<br />

constituin<strong>do</strong> vícios que atingem o objetivo <strong>do</strong> negócio e não a vonta<strong>de</strong> da parte, como é comum nos vícios <strong>do</strong> consentimento. A<br />

respeito <strong>de</strong> tal diferenciação, no tocante ao erro, vejamos ementa <strong>do</strong> STJ, que serviria como luva também para a hipótese <strong>de</strong> vícios<br />

<strong>do</strong> produto:<br />

“<strong>Direito</strong> civil. Vício <strong>de</strong> consentimento (erro). Vício redibitório. Distinção. Venda conjunta <strong>de</strong> coisas. Art. 1.138 <strong>do</strong> CC/1916 (art.<br />

503 <strong>do</strong> CC/2002). Interpretação. Temperamento da regra. O equívoco inerente ao vício redibitório não se confun<strong>de</strong> com o erro<br />

substancial, vício <strong>de</strong> consentimento previsto na Parte Geral <strong>do</strong> Código Civil, ti<strong>do</strong> como <strong>de</strong>feito <strong>do</strong>s atos negociais. O legisla<strong>do</strong>r<br />

tratou o vício redibitório <strong>de</strong> forma especial, projetan<strong>do</strong> inclusive efeitos diferentes daqueles previstos para o erro substancial. O<br />

vício redibitório, da forma como sistematiza<strong>do</strong> pelo CC/1916, cujas regras foram mantidas pelo CC/2002, atinge a própria coisa,<br />

objetivamente consi<strong>de</strong>rada, e não a psique <strong>do</strong> agente. O erro substancial, por sua vez, alcança a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> contratante, operan<strong>do</strong><br />

subjetivamente em sua esfera mental. O art. 1.138 <strong>do</strong> CC/1916, cuja redação foi integralmente mantida pelo art. 503 <strong>do</strong> CC/2002,<br />

<strong>de</strong>ve ser interpreta<strong>do</strong> com temperamento, sempre ten<strong>do</strong> em vista a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se verificar o reflexo que o <strong>de</strong>feito verifica<strong>do</strong> em<br />

uma ou mais coisas singulares tem no negócio envolven<strong>do</strong> a venda <strong>de</strong> coisas compostas, coletivas ou <strong>de</strong> universalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> fato.<br />

Recurso especial a que se nega provimento” (STJ – REsp 991.317/MG – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j.<br />

03.12.2009 – DJe 18.12.2009).<br />

Todavia, existem algumas diferenciações fundamentais a respeito das categorias <strong>do</strong>s vícios <strong>do</strong> produto e <strong>do</strong>s vícios<br />

redibitórios, as quais se <strong>de</strong>ve atentar.<br />

Como primeira diferença, <strong>de</strong>staque-se que os vícios redibitórios, pela literalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> art. 441 <strong>do</strong> CC/2002, seriam apenas nos<br />

vícios ocultos que acometem o objeto <strong>do</strong> contrato. Por outra via, os vícios <strong>do</strong> produto po<strong>de</strong>m ser aparentes ou ocultos, como antes<br />

exposto. De toda sorte, <strong>de</strong>ve ficar claro que o presente autor enten<strong>de</strong> que os vícios redibitórios <strong>do</strong> mesmo po<strong>de</strong>m ser aparentes ou<br />

ocultos, pela diferenciação <strong>de</strong> prazos para reclamação que constam <strong>do</strong> art. 445 <strong>do</strong> CC/2002, conforme a seguir está<br />

<strong>de</strong>monstra<strong>do</strong>.37<br />

Constituin<strong>do</strong> uma segunda diferença, nos contratos <strong>de</strong> natureza civil, não se po<strong>de</strong> falar em solidarieda<strong>de</strong> entre fornece<strong>do</strong>res,<br />

não haven<strong>do</strong> responsabilida<strong>de</strong> além daquela pessoa que firmou o contrato, pela <strong>de</strong>corrência lógica <strong>do</strong> princípio da relativida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s


efeitos contratuais (res inter alios).<br />

A terceira diferença refere-se aos prazos <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais para reclamar os vícios. Os prazos previstos no CDC admitem<br />

obstação, ou seja, uma suspensão especial. Por outra via, os prazos <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais <strong>do</strong> CC/2002 não po<strong>de</strong>m ser suspensos ou<br />

interrompi<strong>do</strong>s, pela regra <strong>do</strong> seu art. 207. Assim, o sistema <strong>do</strong> CDC é muito mais vantajoso <strong>do</strong> que o sistema <strong>do</strong> CC/2002 em tal<br />

aspecto.<br />

Como quarta diferença, vejamos os prazos em si. Os prazos <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais para reclamar os vícios redibitórios estão<br />

estabeleci<strong>do</strong>s pelo art. 445 <strong>do</strong> CC/2002. O caput <strong>do</strong> coman<strong>do</strong> consagra prazos <strong>de</strong> trinta dias se a coisa for móvel e um ano para o<br />

imóvel, conta<strong>do</strong>s da entrega efetiva da coisa, em regra. Porém, se o vício, por sua natureza, somente po<strong>de</strong> ser percebi<strong>do</strong> mais tar<strong>de</strong>,<br />

os prazos são <strong>de</strong> cento e oitenta dias para móveis e um ano para imóveis, conta<strong>do</strong> <strong>do</strong> conhecimento <strong>do</strong> vício (art. 445, § 1º, <strong>do</strong><br />

CC/2002). Anote-se que, ao contrário <strong>do</strong> Código Consumerista, o Código Civil não a<strong>do</strong>ta como critério a durabilida<strong>de</strong> ou<br />

consuntibilida<strong>de</strong> física <strong>do</strong>s bens adquiri<strong>do</strong>s, mas sim a sua mobilida<strong>de</strong>.<br />

No presente momento, surge uma questão <strong>de</strong> controvérsia. Como os prazos <strong>do</strong> Código Civil são maiores <strong>do</strong> que os prazos <strong>de</strong><br />

trinta e noventa dias <strong>do</strong> art. 26 <strong>do</strong> CDC, po<strong>de</strong>ria o consumi<strong>do</strong>r utilizá-los, como aplicação da tese <strong>do</strong> diálogo das fontes? Como<br />

não po<strong>de</strong>ria ser diferente, Claudia Lima Marques, Herman Benjamin e Bruno Miragem respon<strong>de</strong>m que sim, sen<strong>do</strong> suas palavras:<br />

“A jurisprudência brasileira tem si<strong>do</strong> muito receptiva ao uso da teoria <strong>de</strong> Erik Jayme sobre o diálogo das fontes para aplicar o<br />

prazo mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r em matéria <strong>de</strong> <strong>de</strong>cadência e prescrição como autoriza o art. 7º <strong>do</strong> CDC”.38 Concluin<strong>do</strong> <strong>de</strong>sse<br />

mo<strong>do</strong>, subsumin<strong>do</strong> os prazos maiores <strong>do</strong> Código Civil, a ilustrar: TJPR – Apelação Cível 0497436-3, Mandaguari – Oitava<br />

Câmara Cível – Rel. Des. João Domingos Kuster Puppi – DJPR 01.08.2008, p. 95. O entendimento po<strong>de</strong> parecer justo, sem<br />

dúvidas, apesar <strong>de</strong> afastar-se da pura técnica. Todavia, não se po<strong>de</strong> esquecer que, quanto à possibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> prazo po<strong>de</strong>r ser<br />

suspenso, a proteção constante <strong>do</strong> CDC é muito mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r <strong>do</strong> que consta <strong>do</strong> CC/2002, uma vez que no sistema<br />

civil o prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cadência não po<strong>de</strong> ser suspenso. Então, a aplicação das normas relativas aos vícios redibitórios po<strong>de</strong> constituir<br />

uma armadilha contra o consumi<strong>do</strong>r.<br />

No que concerne ao eventual prazo <strong>de</strong> garantia contratual da<strong>do</strong> pelo fornece<strong>do</strong>r como uma <strong>de</strong>cadência convencional, o art. 50<br />

<strong>do</strong> CDC é muito claro, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> não prejudicar os prazos estabeleci<strong>do</strong>s em lei. O tema ainda será aprofunda<strong>do</strong> no próximo<br />

capítulo da obra.<br />

A garantia legal <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação <strong>do</strong> produto in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> termo escrito ou expresso, incidin<strong>do</strong> ex vi lege, sen<strong>do</strong> vedada a<br />

exoneração contratual <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r (art. 24 <strong>do</strong> CDC). Frise-se que há proposta <strong>de</strong> inclusão <strong>de</strong> preceito complementar à norma<br />

atual, por meio <strong>do</strong> Projeto <strong>de</strong> Lei 283/2012. A projeção visa ao art. 24-A, com a seguinte dicção: “o fornece<strong>do</strong>r é responsável<br />

perante o consumi<strong>do</strong>r por qualquer vício <strong>do</strong> produto ou serviço, durante o prazo mínimo <strong>de</strong> <strong>do</strong>is anos, a contar da data efetiva da<br />

entrega ou prestação. Parágrafo único. Presumem-se como vícios <strong>de</strong> fabricação, construção ou produção aqueles apresenta<strong>do</strong>s no<br />

prazo <strong>de</strong> seis meses a partir da entrega <strong>do</strong> produto ou realização <strong>do</strong> serviço, exceto se for apresentada prova em contrário ou da<br />

quebra <strong>do</strong> nexo causal for comprovada culpa exclusiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r ou <strong>de</strong> terceiro”. A proposição é louvável, amplian<strong>do</strong>, mais<br />

uma vez, a tutela <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. Desse mo<strong>do</strong>, como outras propostas, espera-se a sua aprovação.<br />

Voltan<strong>do</strong> ao sistema vigente, a citada cláusula <strong>de</strong> não in<strong>de</strong>nizar é ainda vedada pelo art. 25 <strong>do</strong> CDC, segun<strong>do</strong> o qual “É<br />

vedada a estipulação contratual <strong>de</strong> cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar prevista nesta e nas<br />

seções anteriores”. A solidarieda<strong>de</strong> entre fornece<strong>do</strong>res é reforçada pelo § 1º <strong>do</strong> dispositivo, pois, “Haven<strong>do</strong> mais <strong>de</strong> um<br />

responsável pela causação <strong>do</strong> dano, to<strong>do</strong>s respon<strong>de</strong>rão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas seções anteriores”. Além<br />

disso, prevê o § 2º <strong>do</strong> art. 25 que, sen<strong>do</strong> o dano causa<strong>do</strong> por componente ou peça incorporada ao produto ou serviço, são<br />

responsáveis solidários seu fabricante, construtor ou importa<strong>do</strong>r e o que realizou a incorporação.<br />

A encerrar o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> vício <strong>do</strong> produto, <strong>de</strong>ve ficar clara a intenção da norma, ao preceituar que a ignorância <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r<br />

sobre os vícios <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> por ina<strong>de</strong>quação <strong>do</strong>s produtos não o exime <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> (art. 23 <strong>do</strong> CDC). Dessa forma, há um<br />

<strong>de</strong>ver legal <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r em evitar o vício, sen<strong>do</strong> irrelevante o fator culposo ou subjetivo para que surja a correspon<strong>de</strong>nte<br />

responsabilida<strong>de</strong>, uma vez que o Código Consumerista a<strong>do</strong>ta um sistema objetivo <strong>de</strong> <strong>de</strong>veres negociais.39 Em outras palavras,<br />

pensar o contrário seria a volta ao um mo<strong>de</strong>lo clássico e supera<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, fundan<strong>do</strong> em boas ou más intenções.<br />

Fazen<strong>do</strong> incidir tal i<strong>de</strong>ia, vejamos exemplar julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal Paranaense: “Apelação cível. Ação <strong>de</strong>claratória <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

título <strong>de</strong> crédito e cautelar <strong>de</strong> sustação <strong>de</strong> protesto. Locação <strong>de</strong> automóvel. Relação <strong>de</strong> consumo. Dano no motor. Bem que teria<br />

si<strong>do</strong> entregue em perfeitas condições <strong>de</strong> uso. Argumento afasta<strong>do</strong>. Vício oculto que não exime a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r.<br />

Art. 23 <strong>do</strong> CDC. Nível <strong>de</strong> óleo e água no radia<strong>do</strong>r. Verificação que é ônus da apelante. Descumprimento <strong>de</strong> <strong>de</strong>ver inerente à sua<br />

função. Locatário que notificou a ocorrência. Inexistência <strong>de</strong> violação contratual pelo apela<strong>do</strong>. Sentença mantida. Recurso<br />

<strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJPR – Apelação Cível 0558126-6, Curitiba – Décima Primeira Câmara Cível – Rel. Des. Augusto Lopes Cortes –<br />

DJPR 06.04.2009, p. 193).


4.2.3. Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo fato <strong>do</strong> produto ou <strong>de</strong>feito<br />

Como dantes exposto, no fato <strong>do</strong> produto ou <strong>de</strong>feito estão presentes outras consequências além <strong>do</strong> próprio produto, outros<br />

danos suporta<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r, a gerar a responsabilida<strong>de</strong> objetiva direta e imediata <strong>do</strong> fabricante (art. 12 <strong>do</strong> CDC). Além<br />

disso, há a responsabilida<strong>de</strong> subsidiária ou mediata <strong>do</strong> comerciante ou <strong>de</strong> quem o substitua (art. 13 da Lei 8.078/1990).<br />

Presente o fato <strong>do</strong> produto, a Lei Consumerista assegura o direito <strong>de</strong> regresso daquele que ressarciu o dano contra o culpa<strong>do</strong>,<br />

ou <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com as participações para o evento danoso (art. 13, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC). Entretanto, como visto, nas ações<br />

propostas pelo consumi<strong>do</strong>r envolven<strong>do</strong> os arts. 12 e 13 da Lei 8.078/1990, é vedada a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> para exercício <strong>de</strong>sse<br />

direito <strong>de</strong> regresso (art. 88 <strong>do</strong> CDC). Nos termos da norma, o direito <strong>de</strong> regresso po<strong>de</strong> ser exerci<strong>do</strong> em processo autônomo, sen<strong>do</strong><br />

facultada ainda a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prosseguir-se nos mesmos autos da ação proposta pelo próprio consumi<strong>do</strong>r. Isso, em momento<br />

posterior ao recebimento pelo consumi<strong>do</strong>r <strong>do</strong> que lhe é <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>, em prol da economia processual. Tal dispositivo não foi atingi<strong>do</strong><br />

pelo Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil, merecen<strong>do</strong> plena subsunção na sua vigência.<br />

A respeito da vedação da <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, anotam com precisão Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery,<br />

esten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a conclusão para o chamamento ao processo, nas hipóteses <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>:<br />

“O sistema <strong>do</strong> CDC veda a utilização da <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> e <strong>do</strong> chamamento ao processo, ambas con<strong>de</strong>natórias, porque o direito<br />

<strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r é funda<strong>do</strong> na responsabilida<strong>de</strong> objetiva. Embora esteja mencionada como vedada a <strong>de</strong>nunciação da<br />

li<strong>de</strong> na hipótese <strong>do</strong> CDC 13, parágrafo único, na verda<strong>de</strong> o sistema <strong>do</strong> CDC não admite a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> nas ações versan<strong>do</strong><br />

li<strong>de</strong>s <strong>de</strong> consumo. Seria injusto discutir-se, por <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> ou chamamento ao processo, a conduta <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou <strong>de</strong><br />

terceiro (<strong>do</strong>lo ou culpa), que é elemento da responsabilida<strong>de</strong> subjetiva, em <strong>de</strong>trimento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r que tem o direito <strong>de</strong> ser<br />

ressarci<strong>do</strong> em face da responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, isto é, sem que se discuta <strong>do</strong>lo ou culpa”.40<br />

Apesar <strong>de</strong> ser esse o entendimento mais justo e correto, em prol da proteção <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, a jurisprudência superior vinha<br />

enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> que a vedação da <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> somente atingiria as hipóteses <strong>do</strong>s arts. 12 e 13 <strong>do</strong> CDC, e não outras situações,<br />

como aquelas relativas a problemas no serviço. Nessa linha <strong>de</strong> pensamento:<br />

“Civil e processual. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Danos morais. Inscrição em cadastros <strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>res. Cheques rouba<strong>do</strong>s da empresa<br />

responsável pela entrega <strong>do</strong>s talonários. Denunciação da li<strong>de</strong>. Rejeição com base no art. 88 <strong>do</strong> CDC. Vedação restrita à<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> comerciante (CDC, art. 13). Fato <strong>do</strong> serviço. Ausência <strong>de</strong> restrição com base na relação consumerista.<br />

Descabimento. Abertura <strong>de</strong> contencioso paralelo. I. A vedação à <strong>de</strong>nunciação à li<strong>de</strong> disposta no art. 88 da Lei 8.078/1990 restringese<br />

à responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> comerciante por fato <strong>do</strong> produto (art. 13), não alcançan<strong>do</strong> o <strong>de</strong>feito na prestação <strong>de</strong> serviços (art. 14). II.<br />

Prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> STJ. III. Impossibilida<strong>de</strong>, contu<strong>do</strong>, da <strong>de</strong>nunciação, por preten<strong>de</strong>r o réu inserir discussão jurídica alheia ao direito da<br />

autora, cuja relação contratual é direta e exclusiva com a instituição financeira, contratante da transporta<strong>do</strong>ra terceirizada,<br />

ressalva<strong>do</strong> o direito <strong>de</strong> regresso. IV. Recurso especial não conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1.024.791/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir<br />

Passarinho Junior – j. 05.02.2009 – DJe 09.03.2009).<br />

“Civil e processual. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Danos morais. Travamento <strong>de</strong> porta <strong>de</strong> agência bancária. Denunciação à li<strong>de</strong> da empresa<br />

<strong>de</strong> segurança. Rejeição com base no art. 88 <strong>do</strong> CDC. Vedação restrita à responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> comerciante (CDC, art. 13). Fato <strong>do</strong><br />

serviço. Ausência <strong>de</strong> restrição com base na relação consumerista. Hipótese, todavia, que <strong>de</strong>ve ser apreciada à luz da lei processual<br />

civil (art. 70, III). Anulação <strong>do</strong> acórdão. Multa. Afastamento. Súmula 98-STJ. I. A vedação à <strong>de</strong>nunciação à li<strong>de</strong> disposta no art. 88<br />

da Lei 8.078/1990 restringe-se à responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> comerciante por fato <strong>do</strong> produto (art. 13), não alcançan<strong>do</strong> o <strong>de</strong>feito na<br />

prestação <strong>de</strong> serviços (art. 14), situação, todavia, que não exclui o exame <strong>do</strong> caso concreto à luz da norma processual geral <strong>de</strong><br />

cabimento da <strong>de</strong>nunciação, prevista no art. 70, III, da lei adjetiva civil. II. Anulação <strong>do</strong> acórdão estadual, para que a Corte a quo se<br />

manifeste sobre o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciação à li<strong>de</strong>, nos termos acima. III. Prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> STJ. IV. ‘Embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração<br />

manifesta<strong>do</strong>s com notório propósito <strong>de</strong> prequestionamento não têm caráter protelatório’ (Súmula 98 <strong>do</strong> STJ). V. Recurso especial<br />

conheci<strong>do</strong> e parcialmente provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 439.233/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 04.10.2007 –<br />

DJ 22.10.2007, p. 277).<br />

Todavia, houve uma feliz mudança na posição <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, o que é salutar para a efetiva <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s<br />

direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. Conforme ementa publicada em setembro <strong>de</strong> 2015, por meio da ferramenta Jurisprudência em Teses<br />

(Edição 39), daquela Corte: “a vedação à <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> prevista no art. 88 <strong>do</strong> CDC não se restringe à responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

comerciante por fato <strong>do</strong> produto (art. 13 <strong>do</strong> CDC), sen<strong>do</strong> aplicável também nas <strong>de</strong>mais hipóteses <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil por<br />

aci<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> consumo (arts. 12 e 14 <strong>do</strong> CDC)”. Como prece<strong>de</strong>ntes para a nova tese foram cita<strong>do</strong>s os seguintes acórdãos, to<strong>do</strong>s bem<br />

recentes: AgRg no AREsp 619.161/PR – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – Quarta Turma – j. 07.04.2015 – DJe 13.04.2015; AgRg<br />

no AgRg no AREsp 546.629/SP – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – Quarta Turma – j. 03.03.2015 – DJe 11.03.2015; EDcl no<br />

Ag 1.249.523/RJ – Rel. Min. Raul Araújo – Quarta Turma – j. 05.06.2014 – DJe 20.06.2014; REsp 1.286.577/SP – Rel. Min.<br />

Nancy Andrighi – Terceira Turma – j. 17.09.2013 – DJe 23.09.2013; REsp 1.165.279/SP – Rel. Min. Paulo De Tarso Sanseverino


– Terceira Turma – j. 22.05.2012 – DJe 28.05.2012).<br />

Pelas mesmas premissas anteriores, o próprio STJ ainda admite o chamamento ao processo em li<strong>de</strong>s <strong>de</strong> consumo, na<br />

contramão <strong>do</strong> posicionamento <strong>do</strong>utrinário antes esposa<strong>do</strong> e da sua última tendência quanto à <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> <strong>do</strong> mesmo<br />

Tribunal da Cidadania. Por to<strong>do</strong>s:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Transporte coletivo. Seguro. Chamamento ao processo. Processo sumário.<br />

Consoante já <strong>de</strong>cidiu a Eg. Quarta Turma, ‘é possível o chamamento ao processo da segura<strong>do</strong>ra da ré (art. 101, II, <strong>do</strong> CDC),<br />

empresa <strong>de</strong> transporte coletivo, na ação <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> promovida pelo passageiro, vítima <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> trânsito causa<strong>do</strong> pelo<br />

motorista <strong>do</strong> coletivo, não se aplican<strong>do</strong> ao caso a vedação <strong>do</strong> art. 280, I, <strong>do</strong> CPC’ (REsps 178.839-RJ e 214.216-RJ). Achan<strong>do</strong>-se a<br />

causa, porém, em fase avançada (realização <strong>de</strong> perícia médico-legal), a anulação <strong>do</strong> feito, além <strong>de</strong> importar em sério tumulto<br />

processual, ainda acarretaria prejuízo ao consumi<strong>do</strong>r, autor da ação. Hipótese em que, a<strong>de</strong>mais, a ré não sofre a perda <strong>do</strong> seu direito<br />

<strong>de</strong> regresso contra a empresa segura<strong>do</strong>ra. Recurso especial não conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp 313.334/RJ – Quarta Turma – Rel. Min.<br />

Barros Monteiro – j. 05.04.2001 – DJ 25.06.2001, p. 197).<br />

Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, enten<strong>de</strong>mos que as modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> terceiros, em regra, tumultuam o processo,<br />

dificultan<strong>do</strong> o caminho judicial <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, já tormentosos, conclusão que gerou uma mudança na posição <strong>do</strong> STJ a respeito<br />

da <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>. Assim, o melhor caminho, sem dúvidas, é o seu afastamento, dan<strong>do</strong> primazia ao recebimento <strong>do</strong>s direitos<br />

<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r e asseguran<strong>do</strong>-se o direito <strong>de</strong> regresso em posterior momento. Por isso, o presente autor está filia<strong>do</strong> ao<br />

posicionamento <strong>de</strong> Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery, antes exposto.<br />

Supera<strong>do</strong> tal aspecto processual, o § 1° <strong>do</strong> art. 12 <strong>do</strong> CDC estabelece alguns parâmetros ilustrativos da caracterização <strong>do</strong><br />

produto <strong>de</strong>feituoso, preconizan<strong>do</strong> que haverá tal enquadramento quan<strong>do</strong> o bem <strong>de</strong> consumo não oferece a segurança que <strong>de</strong>le<br />

legitimamente se espera, levan<strong>do</strong>-se em consi<strong>de</strong>ração as circunstâncias relevantes, entre as quais: a) sua apresentação; b) o uso e os<br />

riscos que razoavelmente <strong>de</strong>le se esperam; c) a época em que foi coloca<strong>do</strong> em circulação. Como se extrai da obra solitária <strong>de</strong><br />

Bruno Miragem, três são as modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>feitos que po<strong>de</strong>m ser retiradas <strong>de</strong>sse coman<strong>do</strong> legal:41<br />

–<br />

–<br />

–<br />

Defeitos <strong>de</strong> projeto ou concepção – aqueles que atingem a própria apresentação ou essência <strong>do</strong> produto, que gera<br />

danos in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> qualquer fator externo. Exemplo cita<strong>do</strong> pelo jurista é o <strong>do</strong> remédio tali<strong>do</strong>mida, “cujo<br />

uso em pacientes grávidas, para minorar efeitos <strong>de</strong> indisposição, <strong>de</strong>u causa a <strong>de</strong>formações físicas da criança”. 42<br />

Como exemplo, po<strong>de</strong>m ser invoca<strong>do</strong>s os fogos <strong>de</strong> artifício e o caso <strong>do</strong> cigarro, tema que ainda será aprofunda<strong>do</strong> no<br />

presente capítulo.<br />

Defeitos <strong>de</strong> execução, produção ou fabricação – relativos a falhas <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> segurança quan<strong>do</strong> da colocação <strong>do</strong><br />

produto ou serviço no meio <strong>de</strong> consumo. A título <strong>de</strong> ilustração, cite-se a hipótese em o veículo é comercializa<strong>do</strong><br />

com um problema no seu cinto <strong>de</strong> segurança, sen<strong>do</strong> necessário convocar os consumi<strong>do</strong>res para o reparo (recall).<br />

Defeitos <strong>de</strong> informação ou comercialização – segun<strong>do</strong> Bruno Miragem, “aqueles <strong>de</strong>correntes da apresentação ou<br />

informações insuficientes ou ina<strong>de</strong>quadas sobre a sua fruição ou riscos”.43 Para concretizar, imagine-se a hipótese<br />

em que um brinque<strong>do</strong> foi comercializa<strong>do</strong> como dirigi<strong>do</strong> para uma margem <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> ina<strong>de</strong>quada, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> causar<br />

danos às crianças.<br />

Esclareça-se que tais modalida<strong>de</strong>s também servem para o fato ou <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> serviço, uma vez que os mesmos critérios para o<br />

fato ou <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> serviço constam <strong>do</strong> art. 14, § 1º, <strong>do</strong> Código Protetivo. O tema ainda será exposto em momento oportuno.<br />

Por outra via, o produto não é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> <strong>de</strong>feituoso pelo fato <strong>de</strong> outro <strong>de</strong> melhor qualida<strong>de</strong> ter si<strong>do</strong> coloca<strong>do</strong> no merca<strong>do</strong><br />

(art. 12, § 2º, <strong>do</strong> CDC). A ilustrar, o fato <strong>de</strong> se colocar no merca<strong>do</strong> um veículo com nova estrutura ou <strong>de</strong>sign não significa dizer<br />

que o mo<strong>de</strong>lo anterior tinha um <strong>de</strong>feito (TJPB – Apelação Cível 888.2004.010463-9/001, João Pessoa – Terceira Câmara Cível –<br />

Rel. Des. João Antônio <strong>de</strong> Moura – j. 15.03.2005 – DJPB 29.03.2005). Do mesmo mo<strong>do</strong>, se o sabor <strong>de</strong> uma bebida é aperfeiçoa<strong>do</strong><br />

pelo fabricante, levan<strong>do</strong> em conta o paladar <strong>do</strong> brasileiro.<br />

Evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong> o fato <strong>do</strong> produto ou <strong>de</strong>feito, o consumi<strong>do</strong>r prejudica<strong>do</strong> po<strong>de</strong> manejar uma ação <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong> danos contra o<br />

agente causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> prejuízo, o que é <strong>de</strong>corrência direta <strong>do</strong> princípio da reparação integral. Tal <strong>de</strong>manda con<strong>de</strong>natória está sujeita<br />

ao prazo prescricional <strong>de</strong> cinco anos, previsto pelo art. 27 da Lei 8.078/1990 para o aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo. O dispositivo estabelece,<br />

<strong>de</strong> forma justa e correta, que o prazo será conta<strong>do</strong> da ocorrência <strong>do</strong> evento danoso ou <strong>do</strong> conhecimento <strong>de</strong> sua autoria, o que por<br />

último ocorrer. A<strong>do</strong>ta-se, assim, a teoria da actio nata, em sua faceta subjetiva, segun<strong>do</strong> a qual o prazo <strong>de</strong>ve ter início não a partir<br />

da ocorrência <strong>do</strong> fato danoso, mas sim da ciência <strong>do</strong> prejuízo. Quebra-se então a regra geral <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Civil, <strong>do</strong> nascimento da<br />

pretensão no momento da violação <strong>do</strong> direito subjetivo, por interpretação <strong>do</strong> art. 189 <strong>do</strong> CC/2002.<br />

Além <strong>de</strong>sse claro benefício ao consumi<strong>do</strong>r, cumpre <strong>de</strong>stacar que o CDC consagra um prazo maior <strong>do</strong> que aquele previsto pelo<br />

Código Civil <strong>de</strong> 2002 para os casos <strong>de</strong> reparação civil <strong>de</strong> qualquer natureza, que é <strong>de</strong> três anos (art. 206, § 3º, V, <strong>do</strong> CC/2002). Por


oportuno, com to<strong>do</strong> o respeito em relação a eventual posicionamento em contrário, este autor enten<strong>de</strong> que po<strong>de</strong>rão ser aplicadas às<br />

situações <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo as regras relacionadas com a suspensão e interrupção da prescrição previstas no Código Civil<br />

Brasileiro (arts. 197 a 204), em diálogo das fontes.<br />

A fim <strong>de</strong> ilustrar e <strong>de</strong> fixar a aplicação <strong>do</strong> prazo, vejamos tu<strong>do</strong> o que aqui foi exposto, toman<strong>do</strong> como exemplo aquele caso <strong>do</strong><br />

ferro <strong>de</strong> passar roupas que explo<strong>de</strong> quan<strong>do</strong> maneja<strong>do</strong> pelo seu adquirente. Se o ferro explo<strong>de</strong>, mas não atinge nem fere ninguém,<br />

estará presente o vício <strong>do</strong> produto. Nessa hipótese, o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>rá pleitear <strong>do</strong> comerciante ou <strong>do</strong> fabricante (solidarieda<strong>de</strong>)<br />

um eletro<strong>do</strong>méstico novo. O prazo para tanto é <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> noventa dias, nos termos <strong>do</strong> art. 26 <strong>do</strong> CDC. Entretanto, se nessa<br />

mesma situação o eletro<strong>do</strong>méstico explo<strong>de</strong> e atinge o consumi<strong>do</strong>r, causan<strong>do</strong>-lhe danos morais e estéticos, estará presente o fato <strong>do</strong><br />

produto ou <strong>de</strong>feito. Na situação <strong>de</strong>scrita, a ação in<strong>de</strong>nizatória <strong>de</strong>verá ser proposta, em regra, em face <strong>do</strong> fabricante e no prazo<br />

prescricional <strong>de</strong> cinco anos a partir da ocorrência <strong>do</strong> fato ou da ciência <strong>de</strong> uma séria <strong>de</strong>formida<strong>de</strong> pelo consumi<strong>do</strong>r (art. 27 <strong>do</strong><br />

CDC).<br />

Para encerrar o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> fato <strong>do</strong> produto, po<strong>de</strong>m ser colaciona<strong>do</strong>s outros exemplos <strong>de</strong> incidência <strong>do</strong> prazo prescricional <strong>de</strong><br />

cinco anos pela melhor jurisprudência. De início, julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal Gaúcho relativo a uma faixa térmica que superaqueceu,<br />

causan<strong>do</strong> danos materiais e estéticos ao consumi<strong>do</strong>r:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Consumi<strong>do</strong>r. Fato <strong>do</strong> produto. Prescrição. Faixa térmica. Superaquecimento e combustão. Danos ao<br />

patrimônio e à saú<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova ope legis. Alegação <strong>de</strong> mau uso <strong>do</strong> produto. <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> informação.<br />

Juntada <strong>de</strong> <strong>do</strong>cumentos em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso, por alegação <strong>de</strong> fato novo. Conhecimento da matéria pela Turma. <strong>Direito</strong> à restituição<br />

<strong>do</strong> valor pago pelo produto. In<strong>de</strong>nização por danos morais. A autora adquiriu uma faixa térmica da ré, fato confirma<strong>do</strong> pela juntada<br />

da respectiva nota fiscal. A consumi<strong>do</strong>ra colocou o produto em uso sob cobertor, vin<strong>do</strong> a causar superaquecimento, o que acarretou<br />

danos a seu patrimônio (queima <strong>do</strong> colchão) e à sua saú<strong>de</strong> (queimaduras leves). Correta a <strong>de</strong>cisão que não acolheu a arguição <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>cadência, pois, a se tratar <strong>de</strong> fato <strong>do</strong> produto, o prazo prescricional é <strong>de</strong> cinco anos, ex vi <strong>do</strong> art. 27 <strong>do</strong> CDC. A ré alega que,<br />

diante <strong>do</strong> <strong>de</strong>poimento pessoal da autora, que admitiu ter usa<strong>do</strong> o produto sob cobertor, surgiu fato novo. Diante disso, juntou, em<br />

se<strong>de</strong> <strong>de</strong> razões recursais, o manual <strong>do</strong> usuário <strong>do</strong> produto, o qual adverte para que este não seja abafa<strong>do</strong>. Em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> Juiza<strong>do</strong>s<br />

Especiais, diante <strong>do</strong> princípio da informalida<strong>de</strong>, é possível conhecer <strong>de</strong> <strong>do</strong>cumento junta<strong>do</strong> em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso, excepcionalmente,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> que se possibilite o contraditório à parte contrária. A alegação <strong>de</strong> mau uso <strong>do</strong> produto não po<strong>de</strong> ser aceita, uma vez que o<br />

<strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informação ao consumi<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s riscos à sua saú<strong>de</strong>, mesmo que <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> manejo ina<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> <strong>do</strong> equipamento, não foi<br />

cumpri<strong>do</strong> (art. 12, § 1º, II, <strong>do</strong> CDC). Isso porque o manual <strong>do</strong> usuário refere apenas que o produto nunca <strong>de</strong>verá ser abafa<strong>do</strong>, por<br />

baixo <strong>de</strong> roupas <strong>de</strong> cama, pois po<strong>de</strong>rá ocasionar superaquecimento, danifican<strong>do</strong> o produto. Essa advertência não é suficiente para<br />

informar o consumi<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s riscos à sua saú<strong>de</strong>. Restaram prova<strong>do</strong>s a aquisição e os danos, daí porque, inverti<strong>do</strong> o ônus da prova em<br />

virtu<strong>de</strong> da Lei (art. 12, caput, <strong>do</strong> CDC), cumpria à ré <strong>de</strong>monstrar a culpa exclusiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r e que o <strong>de</strong>feito inexiste. Não se<br />

<strong>de</strong>sincumbiu <strong>de</strong> tal mister, pois, malferi<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informação, o produto é <strong>de</strong>feituoso, pois não se po<strong>de</strong>ria esperar risco à saú<strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> tal gravida<strong>de</strong> apenas em função <strong>do</strong> uso ina<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> <strong>do</strong> produto. Sentença mantida por seus próprios fundamentos.<br />

Recurso improvi<strong>do</strong>” (TJRS – Recurso Cível 71002419166, Porto Alegre – Primeira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Fábio Vieira<br />

Heerdt – j. 15.07.2010 – DJERS 23.07.2010).<br />

Do Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> São Paulo, acórdão que <strong>de</strong>terminou o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar da empresa fabricante pela explosão <strong>de</strong><br />

uma garrafa <strong>de</strong> refrigerante, aplican<strong>do</strong>-se o prazo prescricional <strong>do</strong> art. 27:<br />

“In<strong>de</strong>nização. Danos morais e materiais. Sentença que con<strong>de</strong>nou a empresa, uma vez comprovada a ocorrência <strong>do</strong> nexo <strong>de</strong><br />

causalida<strong>de</strong> entre o fato e dano <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> fato <strong>do</strong> produto. Explosão <strong>de</strong> garrafa <strong>de</strong> refrigerante. Hipótese, contu<strong>do</strong>, <strong>de</strong> prescrição<br />

da ação nos termos <strong>do</strong> art. 27 <strong>do</strong> CDC. Ausência <strong>de</strong> elementos para uma interpretação mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r. Dano <strong>de</strong><br />

caráter imediato cujo agravamento não transfere o termo inicial <strong>de</strong> contagem <strong>de</strong>sse prazo. Recurso, nesse senti<strong>do</strong>, acolhi<strong>do</strong>” (TJSP –<br />

Apelação Cível 297.806.4/6 – Acórdão 2638058, São Paulo – Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Teixeira Leite – j.<br />

29.05.2008 – DJESP 20.06.2008).<br />

Do Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, colaciona-se acórdão que aplicou o prazo em comento para <strong>de</strong>feito em herbicida, que<br />

prejudicou toda a safra <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Alegação <strong>de</strong> dano por fato <strong>do</strong> produto e não <strong>de</strong> vício <strong>do</strong> produto. Ineficácia <strong>de</strong> herbicida. Prejuízo à safra.<br />

Prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial. 5 anos. Art. 27 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Recurso provi<strong>do</strong> para afastar a <strong>de</strong>cadência prosseguin<strong>do</strong>-se<br />

no exame <strong>do</strong> mérito no tribunal <strong>de</strong> origem. 1. Diante <strong>do</strong> fundamento da inicial <strong>de</strong> ocorrência <strong>do</strong> fato <strong>do</strong> produto, e não vício, no mau<br />

funcionamento <strong>de</strong> herbicida que, por não combater as ervas daninhas, enseja prejuízo à safra, e consequentemente, ao patrimônio <strong>do</strong><br />

usuário, o prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial é <strong>de</strong> 5 (cinco) anos (CDC, art. 27). 2. Recurso especial provi<strong>do</strong> para afastar preliminar <strong>de</strong> <strong>de</strong>cadência,<br />

<strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o Tribunal <strong>de</strong> origem prosseguir no julgamento <strong>de</strong> mérito” (STJ – Terceira Turma – REsp 953.187/MT – Rel. Min. Sidnei<br />

Beneti – j. 23.06.2009 – DJe 29.06.2009).<br />

Do ano <strong>de</strong> 2015, concluiu o mesmo Tribunal da Cidadania, em aresto publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 557 e com clara


didática, que “o aparecimento <strong>de</strong> grave vício em revestimento (pisos e azulejos), quan<strong>do</strong> já se encontrava <strong>de</strong>vidamente instala<strong>do</strong> na<br />

residência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, configura fato <strong>do</strong> produto, sen<strong>do</strong>, portanto, <strong>de</strong> cinco anos o prazo prescricional da pretensão reparatória<br />

(art. 27 <strong>do</strong> CDC). Nas relações <strong>de</strong> consumo, consoante entendimento <strong>do</strong> STJ, os prazos <strong>de</strong> 30 dias e 90 dias estabeleci<strong>do</strong>s no art.<br />

26 referem-se a vícios <strong>do</strong> produto e são <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais, enquanto o quinquenal, previsto no art. 27, é prescricional e se relaciona à<br />

reparação <strong>de</strong> danos por fato <strong>do</strong> produto ou serviço (REsp 411.535/SP – Quarta Turma – DJ <strong>de</strong> 30.09.2002). O vício <strong>do</strong> produto,<br />

nos termos <strong>do</strong> art. 18 <strong>do</strong> CDC, é aquele correspon<strong>de</strong>nte ao não atendimento, em essência, das expectativas <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r no<br />

tocante à qualida<strong>de</strong> e à quantida<strong>de</strong>, que o torne impróprio ou ina<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> ao consumo ou lhe diminua o valor. Assim, o vício <strong>do</strong><br />

produto restringe-se ao próprio produto e não aos danos que ele po<strong>de</strong> gerar para o consumi<strong>do</strong>r, sujeitan<strong>do</strong>-se ao prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial<br />

<strong>do</strong> art. 26 <strong>do</strong> CDC. O fato <strong>do</strong> produto, por sua vez, sobressai quan<strong>do</strong> esse vício for grave a ponto <strong>de</strong> ocasionar dano in<strong>de</strong>nizável ao<br />

patrimônio material ou moral <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, por se tratar, na expressão utilizada pela lei, <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito. É o que se extrai <strong>do</strong> art. 12<br />

<strong>do</strong> CDC, que cuida da responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto e <strong>do</strong> serviço. Ressalte-se que, não obstante o § 1º <strong>do</strong> art. 12 <strong>do</strong> CDC<br />

preconizar que produto <strong>de</strong>feituoso é aquele <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança, <strong>do</strong>utrina e jurisprudência convergem quanto à compreensão<br />

<strong>de</strong> que o <strong>de</strong>feito é um vício grave e causa<strong>do</strong>r <strong>de</strong> danos ao patrimônio jurídico ou moral. Desse mo<strong>do</strong>, a eclosão tardia <strong>do</strong> vício <strong>do</strong><br />

revestimento, quan<strong>do</strong> já se encontrava <strong>de</strong>vidamente instala<strong>do</strong> na residência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>termina a existência <strong>de</strong> danos<br />

materiais in<strong>de</strong>nizáveis e relaciona<strong>do</strong>s com a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong>, no mínimo, contratar serviços <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>s à substituição <strong>do</strong> produto<br />

<strong>de</strong>feituoso, caracterizan<strong>do</strong> o fato <strong>do</strong> produto, sujeito ao prazo prescricional <strong>de</strong> 5 anos” (STJ – REsp 1.176.323/SP – Rel. Min.<br />

Villas Bôas Cueva – j. 03.03.2015 – DJe 16.03.2015).<br />

Por fim, cumpre <strong>de</strong>stacar que o mesmo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça tem subsumi<strong>do</strong> o prazo <strong>do</strong> art. 27 <strong>do</strong> CDC e a teoria da<br />

actio nata em sua faceta subjetiva, para as hipóteses <strong>do</strong>s males <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> tabagismo. Nessa linha, entre os julga<strong>do</strong>s mais<br />

recentes, citan<strong>do</strong> os prece<strong>de</strong>ntes anteriores:<br />

“Agravo regimental. Recurso especial. Negativa <strong>de</strong> prestação jurisdicional. Não ocorrência. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Relação <strong>de</strong><br />

consumo. Fato <strong>do</strong> produto. Tabagismo. Prescrição quinquenal. Início da contagem <strong>do</strong> prazo. Conhecimento <strong>do</strong> dano e <strong>de</strong> sua<br />

autoria. Prece<strong>de</strong>nte da E. Segunda Seção <strong>de</strong>sta A. Corte. Incidência <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> 83/STJ. Agravo regimental improvi<strong>do</strong>. I. A e.<br />

Segunda Seção <strong>de</strong>sta a. Corte, por ocasião <strong>do</strong> julgamento <strong>do</strong> Recurso Especial 489.895/SP, Rel. Min. Fernan<strong>do</strong> Gonçalves, DJe<br />

23.04.2010, reiteran<strong>do</strong> a jurisprudência <strong>de</strong>sta a. Corte, consi<strong>de</strong>rou que, em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> ação que objetiva a reparação <strong>do</strong>s danos<br />

causa<strong>do</strong>s pelo tabagismo, por se tratar <strong>de</strong> dano causa<strong>do</strong> por fato <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço presta<strong>do</strong>, a prescrição é quinquenal, regida<br />

pelo art. 27 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, norma especial que afasta a incidência da regra geral, contida no CC/1916. II.<br />

Agravo regimental improvi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg-REsp 1.081.784/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Massami Uyeda – j. 07.12.2010 –<br />

DJe 03.02.2011).<br />

De qualquer maneira, como se verá mais adiante, apesar <strong>de</strong> o STJ aplicar tal prazo e o próprio Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r para os<br />

danos <strong>do</strong> tabagismo, tem afasta<strong>do</strong> a responsabilida<strong>de</strong> das empresas que exploram o setor.<br />

Supera<strong>do</strong> o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s aspectos relativos ao produto, passa-se à abordagem <strong>do</strong> serviço, inician<strong>do</strong>-se pelo vício, <strong>de</strong> forma<br />

<strong>de</strong>talhada e pontual.<br />

4.2.4.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo vício <strong>do</strong> serviço<br />

Frise-se que, nas hipóteses envolven<strong>do</strong> o serviço, tem-se o mesmo tratamento legal, conforme aqui construí<strong>do</strong>, presente a<br />

mesma diferenciação concreta entre o chama<strong>do</strong> vício <strong>do</strong> serviço e o fato <strong>do</strong> serviço, sen<strong>do</strong> o último o <strong>de</strong>feito a gerar o aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />

consumo.<br />

Inician<strong>do</strong>-se pelo vício <strong>do</strong> serviço, aplica-se a regra <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>, entre to<strong>do</strong>s os envolvi<strong>do</strong>s com a prestação. Em outras<br />

palavras, se um serviço contrata<strong>do</strong> tiver si<strong>do</strong> mal presta<strong>do</strong>, respon<strong>de</strong>rão to<strong>do</strong>s os envolvi<strong>do</strong>s. Nos termos <strong>do</strong> § 2 o <strong>do</strong> art. 20 <strong>do</strong><br />

CDC, são consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s como impróprios os serviços que se mostrem ina<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s para os fins que razoavelmente <strong>de</strong>les se<br />

esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares <strong>de</strong> prestabilida<strong>de</strong>. Em casos tais, enuncia o caput <strong>do</strong><br />

mesmo preceito legal que o presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços respon<strong>de</strong> pelos vícios <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> que os tornem impróprios ao consumo ou<br />

lhes diminuam o valor, assim como por aqueles <strong>de</strong>correntes da disparida<strong>de</strong> com as indicações constantes da oferta ou mensagem<br />

publicitária. Como se po<strong>de</strong> notar, o vício <strong>do</strong> serviço acaba por englobar os problemas <strong>de</strong>correntes da oferta ou publicida<strong>de</strong>, tema<br />

que ainda será aprofunda<strong>do</strong> no Capítulo 6 <strong>de</strong>sta obra.<br />

Imaginem-se então as hipóteses em que os serviços presta<strong>do</strong>s por profissionais liberais, como médicos, <strong>de</strong>ntistas, jardineiros,<br />

mecânicos, encana<strong>do</strong>res e reforma<strong>do</strong>res em geral são mal presta<strong>do</strong>s, sem outras repercussões, além <strong>do</strong> próprio bem <strong>de</strong> consumo.<br />

Em situações tais, o consumi<strong>do</strong>r prejudica<strong>do</strong> po<strong>de</strong> exigir, alternativamente, e <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a sua livre escolha, nos termos <strong>do</strong> já<br />

cita<strong>do</strong> art. 20 <strong>do</strong> CDC:


I)<br />

II)<br />

III)<br />

A reexecução <strong>do</strong>s serviços, sem custo adicional e quan<strong>do</strong> cabível. A título <strong>de</strong> exemplo, se o conserto <strong>de</strong> um eletro<strong>do</strong>méstico foi mal<br />

feito, po<strong>de</strong>rá ser pleitea<strong>do</strong> que o serviço seja realiza<strong>do</strong> novamente. Nos termos <strong>do</strong> § 1° <strong>do</strong> art. 20 <strong>do</strong> CDC, a reexecução <strong>do</strong>s<br />

serviços po<strong>de</strong>rá ser confiada a terceiros <strong>de</strong>vidamente capacita<strong>do</strong>s, por conta e risco <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. Tal atribuição a terceiro po<strong>de</strong>rá<br />

ocorrer no plano judicial ou extrajudicial. Na última hipótese, o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> bom-senso, pagar o serviço a terceiro<br />

habilita<strong>do</strong> e cobrar <strong>do</strong> presta<strong>do</strong>r original.<br />

A restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo <strong>de</strong> eventuais perdas e danos. Trata-se da resolução<br />

<strong>do</strong> negócio, voltan<strong>do</strong>-se à situação anterior. Mais uma vez, a menção às perdas e danos <strong>de</strong>ve ser vista com ressalvas, eis que,<br />

haven<strong>do</strong> outros prejuízos além <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> bem, estará presente o fato <strong>do</strong> serviço ou <strong>de</strong>feito.<br />

O abatimento proporcional <strong>do</strong> preço, nos casos em que <strong>do</strong> serviço se tem menos <strong>do</strong> que se espera.<br />

Frise-se a premissa da solidarieda<strong>de</strong> passiva, no vício <strong>do</strong> serviço, respon<strong>de</strong>n<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os envolvi<strong>do</strong>s com a prestação. A título<br />

<strong>de</strong> exemplo, respon<strong>de</strong>m solidariamente o franquea<strong>do</strong> e o franquea<strong>do</strong>r pelo atraso na entrega <strong>de</strong> um colchão:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Compra e venda <strong>de</strong> colchão. Produto pago e não entregue. Inexecução contratual que ultrapassa o limite <strong>do</strong> razoável.<br />

Dano moral configura<strong>do</strong>. Quantum manti<strong>do</strong>. Afastada preliminar <strong>de</strong> ilegitimida<strong>de</strong> passiva. É legítima para figurar no polo passivo<br />

<strong>do</strong> feito a franqueada, em face da solidarieda<strong>de</strong> <strong>do</strong> fabricante por vício <strong>do</strong> serviço, porque parte integrante da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res<br />

(art. 3º c/c art. 7º, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC). Sentença mantida. Recurso <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJRS – Recurso Cível 71002428852, São<br />

Leopol<strong>do</strong> – Terceira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Carlos Eduar<strong>do</strong> Richinitti – j. 14.10.2010 – DJERS 21.10.2010).<br />

Na mesma linha, <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral, em hipótese <strong>de</strong> intermediação <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> seguro por uma<br />

fornece<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> produtos:<br />

“Civil. Processo civil. CDC. Legitimida<strong>de</strong> passiva. Empresa ven<strong>de</strong><strong>do</strong>ra <strong>do</strong> produto financia<strong>do</strong> interme<strong>de</strong>ia seguro das prestações.<br />

Omissão <strong>de</strong> informações na contratação <strong>do</strong> seguro. Solidarieda<strong>de</strong> passiva. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova. Sentença mantida. 1. Se a<br />

empresa ven<strong>de</strong><strong>do</strong>ra <strong>de</strong> produto – cujo preço é financia<strong>do</strong> – negocia, através <strong>de</strong> preposto seu, no interior <strong>de</strong> sua loja, a venda <strong>de</strong><br />

seguro prestação a ser garanti<strong>do</strong> por segura<strong>do</strong>ra com ela conveniada, é parte legítima passiva a respon<strong>de</strong>r por eventual vício <strong>do</strong><br />

serviço. 2. A<strong>de</strong>mais, se não presta as <strong>de</strong>vidas e indispensáveis informações sobre as cláusulas e condições securitárias à adquirente,<br />

pessoa inculta e leiga, <strong>de</strong>ve respon<strong>de</strong>r pela sua omissão, mormente quan<strong>do</strong> não apresenta prova suficiente a elidir a verossímil<br />

versão autoral da hipossuficiente consumi<strong>do</strong>ra (inc. VIII <strong>do</strong> art. 6º <strong>do</strong> CDC). 3. Recurso conheci<strong>do</strong> e improvi<strong>do</strong>” (TJDF – Recurso<br />

20020110519145 – Acórdão 167.467 – Segunda Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e Criminais – Rel. Des. Benito<br />

Augusto Tiezzi – j. 04.12.2002 – DJU 10.02.2003, p. 41).<br />

Por fim, a <strong>de</strong>monstrar a efetivação da solidarieda<strong>de</strong> no vício <strong>do</strong> serviço, <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal Fluminense que atribui a<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil à instituição financeira por problemas relativos a cartão <strong>de</strong> crédito:<br />

“Cartão <strong>de</strong> crédito bancário. Instituição financeira. Legitimida<strong>de</strong> passiva. Solidarieda<strong>de</strong>. Reconhecimento. Cartão <strong>de</strong> crédito.<br />

Parceria comercial com banco. Solidarieda<strong>de</strong>. Legitimação passiva ad causam <strong>do</strong> banco. A prática comercial evi<strong>de</strong>ncia uma<br />

indiscutível parceria entre empresas <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito e bancos, tanto assim que estes últimos, além <strong>de</strong> captarem seus clientes<br />

para serem usuários <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> cartão, emitem correspondência, <strong>de</strong>bitam fatura em conta corrente, suspen<strong>de</strong>m o uso <strong>do</strong> cartão,<br />

fazem cobrança etc. Ora, se prestam serviços conjuntamente, há entre eles solidarieda<strong>de</strong>, à luz <strong>do</strong>s arts. 7º, parágrafo único e 25, § 1º<br />

<strong>do</strong> CDC, fazen<strong>do</strong> <strong>do</strong> banco legitima<strong>do</strong> para figurar no polo passivo <strong>de</strong> ação <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> por dano causa<strong>do</strong> por fato ou vício<br />

<strong>do</strong> serviço. Provimento parcial <strong>do</strong> recurso” (TJRJ – Apelação Cível 19127/1999, Rio <strong>de</strong> Janeiro – Segunda Câmara Cível – Rel.<br />

Des. Sergio Cavalieri Filho – j. 29.02.2000).<br />

Nos casos <strong>de</strong> serviços que tenham por objetivo a reparação ou o conserto <strong>de</strong> qualquer produto, <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada implícita<br />

a obrigação <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> empregar componentes <strong>de</strong> reposição originais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s e novos, ou que mantenham as<br />

especificações técnicas <strong>do</strong> fabricante (art. 21 <strong>do</strong> CDC). Isso, salvo quanto aos últimos, autorização em contrário <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

A título <strong>de</strong> exemplo, se uma concessionária <strong>de</strong> veículo está incumbida <strong>de</strong> reparar um automóvel, <strong>de</strong>verá empregar as suas<br />

peças originais. Haven<strong>do</strong> <strong>de</strong>mora na obtenção <strong>de</strong>ssas peças, caberá à concessionária reembolsar o consumi<strong>do</strong>r por todas as<br />

<strong>de</strong>spesas. Nessa linha, <strong>do</strong> extinto Primeiro Tribunal <strong>de</strong> Alçada Civil <strong>de</strong> São Paulo:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Ação in<strong>de</strong>nizatória por danos materiais e morais <strong>de</strong>correntes da falta <strong>de</strong> peça para reposição <strong>de</strong> veículo<br />

importa<strong>do</strong>. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Responsabilida<strong>de</strong> da empresa concessionária e da importa<strong>do</strong>ra que <strong>de</strong>ve ser reconhecida quanto<br />

aos gastos ti<strong>do</strong>s pela <strong>de</strong>mandante com a compra <strong>de</strong> um pneu dianteiro, com o alinhamento e balanceamento <strong>do</strong>s pneus dianteiros,<br />

com o reparo realiza<strong>do</strong> em outra concessionária e com a locação <strong>de</strong> automóvel. Arts. 21, 32 e 18, § 1º, <strong>do</strong> CDC. Ocorrência <strong>de</strong> dano<br />

moral não configurada no caso. Ação que <strong>de</strong>ve ser julgada parcialmente proce<strong>de</strong>nte. Recurso provi<strong>do</strong> em parte para tanto” (1º TAC-<br />

SP – Agravo <strong>de</strong> Instrumento 824304-1 – Quinta Câmara – Rel. Juiz Sebastião Thiago <strong>de</strong> Siqueira – j. 08.08.2001).<br />

Mais uma vez, também no vício <strong>do</strong> serviço, a ignorância <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r quanto a tais problemas não o exime <strong>de</strong>


esponsabilida<strong>de</strong>, pelos mesmos fundamentos antes expostos (art. 23 <strong>do</strong> CDC). Ato contínuo, a garantia legal <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação <strong>do</strong><br />

serviço in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> termo expresso, sen<strong>do</strong> vedada a exoneração contratual <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou a cláusula que afaste a citada<br />

solidarieda<strong>de</strong> (art. 24 e 25 <strong>do</strong> CDC). Sen<strong>do</strong> convencionada a garantia contratual, essa é complementar à legal, na esteira <strong>do</strong> art. 50<br />

<strong>do</strong> CDC, dispositivo que será aprofunda<strong>do</strong> no próximo capítulo.<br />

Os prazos para reclamação <strong>do</strong>s vícios <strong>do</strong> serviço são aqueles <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais trata<strong>do</strong>s pelo art. 26 <strong>do</strong> CDC. Desse mo<strong>do</strong>, os<br />

prazos serão <strong>de</strong> trinta dias, no caso <strong>de</strong> serviços não duráveis, e <strong>de</strong> noventa dias para os serviços duráveis. Esses prazos serão<br />

conta<strong>do</strong>s da execução <strong>do</strong> serviço (vício aparente) ou <strong>do</strong> seu conhecimento (vício oculto). Concretizan<strong>do</strong> a norma, fazen<strong>do</strong> incidir<br />

tais prazos a problemas referentes à prestação <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> turismo ou lazer:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Turismo. A ação promovida pelos autores diz respeito a vícios <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviço, aparentes e <strong>de</strong> fácil<br />

constatação, e não a fato <strong>de</strong> serviços, envolven<strong>do</strong> aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo. Aplicação <strong>do</strong> prazo <strong>do</strong> art. 26, <strong>do</strong> CDC, para a <strong>de</strong>cadência.<br />

Ação foi proposta mais <strong>de</strong> três meses após o recebimento da resposta inequívoca negativa da requerida, e, portanto, em prazo<br />

superior àquele previsto no art. 26, I, e § 2º, I, <strong>do</strong> CDC, aplicável à espécie, por se tratar <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> funda<strong>do</strong> na responsabilida<strong>de</strong> por<br />

vício <strong>do</strong> serviço, aparente e <strong>de</strong> fácil constatação. Recurso <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação Cível 991.99.060357-2 – Acórdão<br />

4249458, São Paulo – Décima Segunda Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Rebello Pinheiro – j. 25.11.2009 – DJESP<br />

28.01.2010).<br />

Na prática, muitas vezes haverá certa dificulda<strong>de</strong> ao apontar se o serviço é durável ou não. Em casos tais, aplican<strong>do</strong>-se a<br />

interpretação mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r e o princípio <strong>do</strong> protecionismo, o prazo a ser computa<strong>do</strong> é <strong>de</strong> noventa dias (in dubio<br />

pro consumi<strong>do</strong>r). A ilustrar, o serviço <strong>de</strong> lavagem <strong>de</strong> carro é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> um serviço não durável, estan<strong>do</strong> submeti<strong>do</strong> ao prazo<br />

<strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> trinta dias. O conserto <strong>do</strong> carro é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> um serviço durável, estan<strong>do</strong> submeti<strong>do</strong> ao prazo <strong>de</strong> noventa dias. A<br />

respeito da perolização e cristalização da pintura <strong>do</strong> veículo, há gran<strong>de</strong> dúvida a respeito da natureza <strong>do</strong> serviço, subsumin<strong>do</strong>-se o<br />

prazo maior, que é <strong>de</strong> noventa dias.<br />

Para findar o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> vício <strong>do</strong> serviço, os cita<strong>do</strong>s prazos <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais po<strong>de</strong>m ser obsta<strong>do</strong>s – na esteira <strong>do</strong> que foi comenta<strong>do</strong><br />

quanto ao vício <strong>do</strong> produto – quan<strong>do</strong> houver reclamação comprovadamente formulada pelo consumi<strong>do</strong>r, até a respectiva resposta<br />

inequívoca <strong>do</strong> presta<strong>do</strong>r, bem como a instauração <strong>do</strong> inquérito civil pelo Ministério Público. Em outras palavras, inci<strong>de</strong><br />

plenamente o previsto no art. 26, § 2º, da Lei 8.078/1990. Subsumin<strong>do</strong> muito bem o texto legal, <strong>do</strong> avança<strong>do</strong> e técnico Tribunal<br />

Gaúcho, em hipótese em que o presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços não <strong>de</strong>u resposta quanto à solução <strong>do</strong> problema:<br />

“Relação <strong>de</strong> consumo. Ação <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong> danos. Prestação <strong>de</strong> serviço <strong>de</strong> mecânica. Conserto <strong>de</strong> motor. Vício <strong>do</strong> serviço. Dever<br />

<strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Dano moral inexistente. Decadência não implementada. 1. Não se verifica a <strong>de</strong>cadência, prevista no art. 26, inc. II, <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r se, alguns dias <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> conserto, já houve a reclamação, a qual, a teor <strong>do</strong> disposto no art. 26, §<br />

2º, inc. I, <strong>do</strong> CDC, obsta a fluência <strong>do</strong> prazo, não ten<strong>do</strong> recomeça<strong>do</strong> a fluir, pois a ré não recusou <strong>de</strong> forma inequívoca a reparação<br />

<strong>do</strong>s problemas verifica<strong>do</strong>s. 2. A prova <strong>do</strong>s autos <strong>de</strong>monstra ter havi<strong>do</strong> má prestação <strong>do</strong> serviço <strong>de</strong> conserto <strong>do</strong> motor da<br />

caminhonete <strong>do</strong> autor, surgin<strong>do</strong> para a ré o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Quantia esta arbitrada em consonância com o <strong>de</strong>poimento <strong>do</strong><br />

mecânico, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>sconta<strong>do</strong> o valor ainda <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> pelo autor. 3. Não haven<strong>do</strong> qualquer violação a atributo <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong>,<br />

inexistente o dano moral. Recurso parcialmente provi<strong>do</strong>” (TJRS – Recurso Cível 71001594662, São Leopol<strong>do</strong> – Primeira Turma<br />

Recursal Cível – Rel. Des. Ricar<strong>do</strong> Torres Hermann – j. 05.06.2008 – DOERS 10.06.2008, p. 114).<br />

Aborda<strong>do</strong> o vício <strong>do</strong> produto, vejamos a última hipótese <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil específica <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r, qual seja o fato <strong>do</strong> serviço ou <strong>de</strong>feito.<br />

4.2.5.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> civil pelo fato <strong>do</strong> serviço ou <strong>de</strong>feito<br />

O fato <strong>do</strong> serviço ou <strong>de</strong>feito está trata<strong>do</strong> pelo art. 14 <strong>do</strong> CDC, geran<strong>do</strong> a responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva e solidária entre to<strong>do</strong>s<br />

os envolvi<strong>do</strong>s com a prestação, pela presença <strong>de</strong> outros danos, além <strong>do</strong> próprio serviço como bem <strong>de</strong> consumo. Deve ficar claro<br />

que, no fato <strong>do</strong> serviço, a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong>s profissionais liberais somente existe se houver culpa <strong>de</strong> sua parte<br />

(responsabilida<strong>de</strong> subjetiva), conforme preconiza o art. 14, § 4º, da Lei 8.078/1990.<br />

Assim como ocorre com o produto, o serviço é <strong>de</strong>feituoso quan<strong>do</strong> não fornece a segurança que o consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>le po<strong>de</strong><br />

esperar, levan<strong>do</strong>-se em consi<strong>de</strong>ração as circunstâncias relevantes, entre as quais o mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> seu fornecimento; o resulta<strong>do</strong> e os<br />

riscos que razoavelmente <strong>de</strong>le se esperam e a época em que foi forneci<strong>do</strong> (art. 14, § 1º, da Lei 8.078/1990). Valem os mesmos<br />

comentários feitos em relação às modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>feitos no produto, na linha das lições <strong>de</strong> Bruno Miragem antes expostas (p.<br />

145).<br />

Por outra via, estabelece o § 2º <strong>do</strong> art. 14 <strong>do</strong> CDC que o serviço, assim como ocorre com o produto, não é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>feituoso pela a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> novas técnicas. Dessa forma, se uma empresa passa a utilizar uma nova técnica para <strong>de</strong>sentupimento,<br />

isso não quer dizer que há o reconhecimento <strong>de</strong> que as medidas anteriores eram ruins ou <strong>de</strong>feituosas.


Deve-se atentar que, no fato <strong>do</strong> serviço ou <strong>de</strong>feito, há evi<strong>de</strong>nte solidarieda<strong>de</strong> entre to<strong>do</strong>s os envolvi<strong>do</strong>s na prestação, não<br />

haven<strong>do</strong> a mesma diferenciação prevista para o fato <strong>do</strong> produto, na esteira <strong>do</strong> que consta <strong>do</strong>s arts. 12 e 13 <strong>do</strong> CDC. Isso porque é<br />

difícil diferenciar quem é o presta<strong>do</strong>r direto e o indireto na ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> prestação, dificulda<strong>de</strong> que não existe no fato <strong>do</strong> produto, em<br />

que a figura <strong>do</strong> fabricante é bem clara. Sobre tal <strong>de</strong>dução, vejamos as palavras conjuntas <strong>de</strong> Claudia Lima Marques, Antonio<br />

Herman Benjamin e Bruno Miragem:<br />

“A organização da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> serviços é responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r (<strong>de</strong>ver <strong>de</strong> escolha, <strong>de</strong> vigilância), aqui<br />

pouco importan<strong>do</strong> a participação eventual <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r na escolha <strong>de</strong> alguns <strong>do</strong>s muitos possíveis. No sistema <strong>do</strong> CDC é<br />

impossível transferir aos membros da ca<strong>de</strong>ia responsabilida<strong>de</strong> exclusiva, nem impedir que o consumi<strong>do</strong>r se retrate, em face da<br />

escolha posterior <strong>de</strong> um membro novo da ca<strong>de</strong>ia”.44<br />

Na verda<strong>de</strong>, a tarefa <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> quem seja o presta<strong>do</strong>r direto ou não po<strong>de</strong>ria trazer a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tutela<br />

jurisdicional da parte vulnerável. Aqui, é interessante transcrever as palavras <strong>de</strong> Roberto Senise Lisboa:<br />

“A responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços pelo aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo é objetiva, ou seja, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da existência <strong>de</strong> culpa, a<br />

menos que o agente causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> prejuízo moral puro ou cumula<strong>do</strong> com o patrimonial seja profissional liberal, caso em que a sua<br />

responsabilida<strong>de</strong> po<strong>de</strong>rá ser subjetiva (vi<strong>de</strong>, a respeito <strong>do</strong> tema, o art. 14, caput, e § 4º).<br />

Qualquer fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços, em princípio, respon<strong>de</strong> objetivamente pelos danos sofri<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r, salvo o profissional<br />

liberal. Assim, tanto a pessoa física como a pessoa jurídica <strong>de</strong> direito público ou priva<strong>do</strong> que atuam como fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços<br />

no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo po<strong>de</strong>m vir a respon<strong>de</strong>r sem culpa”. 45<br />

Tais conclusões, sem dúvida, ampliam muito a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s parceiros <strong>de</strong> prestação. Como primeira ilustração,<br />

vejamos <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, que responsabiliza uma instituição bancária pelo serviço mal presta<strong>do</strong> por<br />

empresa terceirizada, o que acabou por acarretar a inscrição <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> correntista em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes. Pela presença<br />

<strong>do</strong>s danos morais, o caso é exemplo típico <strong>de</strong> fato <strong>do</strong> serviço:<br />

“Recurso especial. Extravio <strong>de</strong> talões <strong>de</strong> cheque. Empresa terceirizada. Uso in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> <strong>do</strong>s títulos por terceiros. Inscrição in<strong>de</strong>vida em<br />

cadastro <strong>de</strong> proteção <strong>de</strong> crédito. Responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> banco. Dano moral. Presunção. Valor da in<strong>de</strong>nização excessivo – Redução.<br />

Recurso especial parcialmente provi<strong>do</strong>. 1. Em casos <strong>de</strong> inscrição in<strong>de</strong>vida em órgãos <strong>de</strong> proteção ao crédito, não se faz necessária a<br />

prova <strong>do</strong> prejuízo. 2. Restou caracterizada a legitimida<strong>de</strong> passiva <strong>do</strong> Banco recorrente, o qual é responsável pela entrega <strong>do</strong>s talões<br />

<strong>de</strong> cheque ao cliente, <strong>de</strong> forma segura, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que, optan<strong>do</strong> por terceirizar esse serviço, assume eventual <strong>de</strong>feito na sua prestação,<br />

mediante culpa in eligen<strong>do</strong>, por <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> serviço, nos termos <strong>do</strong> art. 14 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, que disciplina a<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva pela reparação <strong>do</strong>s danos (REsp 640.196, Terceira Turma, Rel. Min. Castro Filho, DJ 01.08.2005). 3.<br />

Firmou-se entendimento nesta Corte Superior que, sempre que <strong>de</strong>sarrazoa<strong>do</strong> o valor imposto na con<strong>de</strong>nação, impõe-se sua<br />

a<strong>de</strong>quação, evitan<strong>do</strong>-se assim o injustifica<strong>do</strong> locupletamento da parte vence<strong>do</strong>ra. 4. Recurso especial conheci<strong>do</strong> em parte e nela<br />

parcialmente provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 782.898/MT – Quarta Turma – Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa – j. 21.11.2006 – DJ<br />

04.12.2006, p. 328).<br />

Em caso próximo, essa forma <strong>de</strong> julgar foi confirmada em acórdão superior mais recente, publica<strong>do</strong> no Informativo n. 542 da<br />

Corte, segun<strong>do</strong> o qual “prescreve em cinco anos a pretensão <strong>de</strong> correntista <strong>de</strong> obter reparação <strong>do</strong>s danos causa<strong>do</strong>s por instituição<br />

financeira <strong>de</strong>correntes da entrega, sem autorização, <strong>de</strong> talonário <strong>de</strong> cheques a terceiro que, em nome <strong>do</strong> correntista, passa a emitir<br />

várias cártulas sem provisão <strong>de</strong> fun<strong>do</strong>s, geran<strong>do</strong> inscrição in<strong>de</strong>vida em órgãos <strong>de</strong> proteção ao crédito. Na hipótese, o serviço<br />

mostra-se <strong>de</strong>feituoso, na medida em que a instituição financeira não forneceu a segurança legitimamente esperada pelo correntista.<br />

Isso porque constitui fato notório que os talonários <strong>de</strong> cheques <strong>de</strong>posita<strong>do</strong>s em agência bancária somente po<strong>de</strong>m ser retira<strong>do</strong>s pelo<br />

próprio correntista, mediante assinatura <strong>de</strong> <strong>do</strong>cumento atestan<strong>do</strong> a sua entrega, para possibilitar o seu posterior uso. O banco tem a<br />

posse <strong>de</strong>sse <strong>do</strong>cumento, esperan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong>le um mínimo <strong>de</strong> diligência na sua guarda e entrega ao seu correntista. A Segunda Seção<br />

<strong>do</strong> STJ, a propósito, editou recentemente enuncia<strong>do</strong> sumular acerca da responsabilida<strong>de</strong> civil das instituições financeiras, segun<strong>do</strong><br />

o qual as ‘instituições financeiras respon<strong>de</strong>m objetivamente pelos danos gera<strong>do</strong>s por fortuito interno relativo a frau<strong>de</strong>s e <strong>de</strong>litos<br />

pratica<strong>do</strong>s por terceiros no âmbito <strong>de</strong> operações bancárias’ (Súmula 479). Sen<strong>do</strong> assim, em face da <strong>de</strong>feituosa prestação <strong>de</strong> serviço<br />

pela instituição bancária, não aten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> à segurança legitimamente esperada pelo consumi<strong>do</strong>r, tem-se a caracterização <strong>de</strong> fato <strong>do</strong><br />

serviço, disciplina<strong>do</strong> pelo art. 14 <strong>do</strong> CDC. O STJ, aliás, julgan<strong>do</strong> um caso semelhante – em que os talões <strong>de</strong> cheque foram<br />

rouba<strong>do</strong>s da empresa responsável pela entrega <strong>de</strong> talonários –, enten<strong>de</strong>u tratar-se <strong>de</strong> hipótese <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito na prestação <strong>do</strong> serviço,<br />

aplican<strong>do</strong> o art. 14 <strong>do</strong> CDC (REsp 1.024.791/SP, Quarta Turma, DJe 09.03.2009). A<strong>de</strong>mais, a <strong>do</strong>utrina, analisan<strong>do</strong> a falha no<br />

serviço <strong>de</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, tem interpreta<strong>do</strong> o CDC <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a enquadrá-la, também, como fato <strong>do</strong> serviço. Ante o exposto,<br />

incidin<strong>do</strong> o art. 14 <strong>do</strong> CDC, <strong>de</strong>ve ser aplica<strong>do</strong>, por consequência, o prazo prescricional previsto no art. 27 <strong>do</strong> mesmo estatuto legal,<br />

segun<strong>do</strong> o qual prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causa<strong>do</strong>s por fato <strong>do</strong> serviço, inician<strong>do</strong>-se a contagem


<strong>do</strong> prazo a partir <strong>do</strong> conhecimento <strong>do</strong> dano e <strong>de</strong> sua autoria” (STJ – REsp 1.254.883/PR – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino –<br />

j. 03.04.2014).<br />

Daquela mesma Corte Superior consigne-se aresto que aplicou o fato <strong>do</strong> serviço em hipótese <strong>de</strong> <strong>de</strong>volução <strong>de</strong> cheque por<br />

motivo diverso à realida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s fatos. Conforme consta da ementa <strong>de</strong> publicação no Informativo n. 507 <strong>do</strong> STJ, “é cabível a<br />

in<strong>de</strong>nização por danos morais pela instituição financeira quan<strong>do</strong> cheque apresenta<strong>do</strong> fora <strong>do</strong> prazo legal e já prescrito é <strong>de</strong>volvi<strong>do</strong><br />

sob o argumento <strong>de</strong> insuficiência <strong>de</strong> fun<strong>do</strong>s. Consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que a Lei n. 7.357/1985 diz que ‘a existência <strong>de</strong> fun<strong>do</strong>s disponíveis é<br />

verificada no momento da apresentação <strong>do</strong> cheque para pagamento’ (art. 4º, § 1º) e, paralelamente, afirma que o título <strong>de</strong>ve ser<br />

apresenta<strong>do</strong> para pagamento em <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> prazo (art. 33), impõe-se ao saca<strong>do</strong>r (emitente), <strong>de</strong> forma implícita, a obrigação <strong>de</strong><br />

manter provisão <strong>de</strong> fun<strong>do</strong>s somente durante o prazo <strong>de</strong> apresentação <strong>do</strong> cheque. Com isso, evita-se que o saca<strong>do</strong>r fique obriga<strong>do</strong><br />

em caráter perpétuo a manter dinheiro em conta para o seu pagamento. Por outro la<strong>do</strong>, a instituição financeira não está impedida <strong>de</strong><br />

proce<strong>de</strong>r à compensação <strong>do</strong> cheque após o prazo <strong>de</strong> apresentação se houver sal<strong>do</strong> em conta. Contu<strong>do</strong>, não po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>volvê-lo por<br />

insuficiência <strong>de</strong> fun<strong>do</strong>s se a apresentação tiver ocorri<strong>do</strong> após o prazo que a lei assinalou para a prática <strong>de</strong>sse ato. A<strong>de</strong>mais, <strong>de</strong><br />

acor<strong>do</strong> com o Manual Operacional da Compe (Centraliza<strong>do</strong>ra da Compensação <strong>de</strong> Cheques), o cheque <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>volvi<strong>do</strong> pelo<br />

‘motivo 11’ quan<strong>do</strong>, em primeira apresentação, não tiver fun<strong>do</strong>s e, pelo ‘motivo 12’, quan<strong>do</strong> não tiver fun<strong>do</strong>s em segunda<br />

apresentação. Dito isso, é preciso acrescentar que só será possível afirmar que o cheque foi <strong>de</strong>volvi<strong>do</strong> por falta <strong>de</strong> fun<strong>do</strong>s quan<strong>do</strong><br />

ele podia ser validamente apresenta<strong>do</strong>. No mesmo passo, vale <strong>de</strong>stacar que o referi<strong>do</strong> Manual estabelece que o cheque sem fun<strong>do</strong>s<br />

[motivos 11 e 12] somente po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>volvi<strong>do</strong> pelo motivo correspon<strong>de</strong>nte. Diante disso, se a instituição financeira fundamentou a<br />

<strong>de</strong>volução <strong>de</strong> cheque em insuficiência <strong>de</strong> fun<strong>do</strong>s, mas o motivo era outro, resta configurada uma clara hipótese <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito na<br />

prestação <strong>do</strong> serviço bancário, visto que o banco recorri<strong>do</strong> não aten<strong>de</strong>u a regramento administrativo baixa<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma cogente pelo<br />

órgão regula<strong>do</strong>r; configura-se, portanto, sua responsabilida<strong>de</strong> objetiva pelos danos <strong>de</strong>flagra<strong>do</strong>s ao consumi<strong>do</strong>r, nos termos <strong>do</strong> art.<br />

14 da Lei n. 8.078/1990. Tal conclusão é reforçada quan<strong>do</strong>, além <strong>de</strong> o cheque ter si<strong>do</strong> apresenta<strong>do</strong> fora <strong>do</strong> prazo, ainda se<br />

consumou a prescrição” (STJ – REsp 1.297.353/SP – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 16.10.2012).<br />

Seguin<strong>do</strong> nas ilustrações, <strong>de</strong>staque-se que algumas conclusões <strong>de</strong>sta obra foram a<strong>do</strong>tadas em recente julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça <strong>de</strong> São Paulo, aplican<strong>do</strong> a solidarieda<strong>de</strong> no fato <strong>do</strong> serviço:<br />

“Apelação. Extravio <strong>de</strong> talonários <strong>de</strong> cheques. Empresa <strong>de</strong> Correios. Responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> banco. Uso in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> <strong>de</strong> títulos por<br />

terceiros. Ajuizamento <strong>de</strong> ação executiva em face da autora. Inci<strong>de</strong>ntes que, por certo, infringiram a imagem e honra subjetiva da<br />

empresa autora. Dano moral caracteriza<strong>do</strong> e quantifica<strong>do</strong> respeitan<strong>do</strong> as peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> caso, bem como os princípios da<br />

razoabilida<strong>de</strong> e proporcionalida<strong>de</strong>” (TJSP – Apelação 000040055.2011.8.26.0575, da Comarca <strong>de</strong> São José <strong>do</strong> Rio Par<strong>do</strong> – 22ª<br />

Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> São Paulo – Rel. Des. Roberto Mac Cracken – j. 08.03.2012).<br />

Igualmente incidin<strong>do</strong> a solidarieda<strong>de</strong> em <strong>de</strong>corrência <strong>do</strong> serviço, acórdão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2012<br />

concluiu que a “opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> é solidariamente responsável pela sua re<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviços médico-hospitalar<br />

cre<strong>de</strong>nciada. Reconheceu-se sua legitimida<strong>de</strong> passiva para figurar na ação in<strong>de</strong>nizatória movida por segura<strong>do</strong>, em razão da má<br />

prestação <strong>de</strong> serviço por profissional convenia<strong>do</strong>. Assim, ao selecionar médicos para prestar assistência em seu nome, o plano <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> se compromete com o serviço, assumin<strong>do</strong> essa obrigação, e por isso tem responsabilida<strong>de</strong> objetiva perante os consumi<strong>do</strong>res,<br />

po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> em ação regressiva averiguar a culpa <strong>do</strong> médico ou <strong>do</strong> hospital. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: AgRg no REsp 1.037.348-SP, DJe<br />

17.08.2011; AgRg no REsp 1.029.043-SP, DJe 08.06.2009, e REsp 138.059-MG, DJ 11.06.2001” (STJ – REsp 966.371/RS – Rel.<br />

Min. Raul Araújo – j. 27.03.2012, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 494).<br />

Ou ainda, outra novel ementa, julgan<strong>do</strong> <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> no que concerne à responsabilização <strong>de</strong> segura<strong>do</strong>ra pelo mau serviço<br />

presta<strong>do</strong> por oficina mecânica por ela indicada: “A Turma, aplican<strong>do</strong> o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>cidiu que a segura<strong>do</strong>ra<br />

tem responsabilida<strong>de</strong> objetiva e solidária pela qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s serviços executa<strong>do</strong>s no automóvel <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r por oficina que<br />

indicou ou cre<strong>de</strong>nciou. Ao fazer tal indicação, a segura<strong>do</strong>ra, como fornece<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> serviços, amplia a sua responsabilida<strong>de</strong> aos<br />

consertos realiza<strong>do</strong>s pela oficina cre<strong>de</strong>nciada” (STJ – REsp 827.833/MG – Rel. Min. Raul Araújo – j. 24.04.2012, Informativo n.<br />

496 da Corte).<br />

Da criação <strong>do</strong>utrinária, cumpre <strong>de</strong>stacar enuncia<strong>do</strong> aprova<strong>do</strong> na V Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, evento <strong>de</strong> 2011, segun<strong>do</strong> o qual os<br />

profissionais liberais <strong>de</strong>vem respon<strong>de</strong>r objetiva e solidariamente pelos <strong>de</strong>feitos existentes em equipamentos utiliza<strong>do</strong>s em sua<br />

ativida<strong>de</strong>, presente um misto <strong>de</strong> fato <strong>do</strong> serviço e fato <strong>do</strong> produto. Vejamos o teor <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 460, proposto pelo jurista<br />

Adalberto Pasqualotto, e que contou com o apoio <strong>de</strong>ste autor: “A responsabilida<strong>de</strong> subjetiva <strong>do</strong> profissional da área da saú<strong>de</strong>, nos<br />

termos <strong>do</strong> art. 951 <strong>do</strong> Código Civil e <strong>do</strong> art. 14, § 4º, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, não afasta a sua responsabilida<strong>de</strong><br />

objetiva pelo fato da coisa da qual tem a guarda, em caso <strong>de</strong> uso <strong>de</strong> aparelhos ou instrumentos que, por eventual disfunção, venham<br />

a causar danos a pacientes, sem prejuízo <strong>do</strong> direito regressivo <strong>do</strong> profissional em relação ao fornece<strong>do</strong>r <strong>do</strong> aparelho e sem prejuízo<br />

da ação direta <strong>do</strong> paciente, na condição <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r, contra tal fornece<strong>do</strong>r”. Como se <strong>de</strong>bateu naquele evento, o fato <strong>do</strong> serviço


estaria configura<strong>do</strong> pela má escolha <strong>do</strong> equipamento utiliza<strong>do</strong>.<br />

De toda sorte, cabe esclarecer que o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r não se aplica na relação entre o médico e a empresa<br />

que ven<strong>de</strong>u o equipamento, pois, na espécie, o objeto adquiri<strong>do</strong> é utiliza<strong>do</strong> na principal ativida<strong>de</strong> <strong>do</strong> profissional liberal. Conforme<br />

se extrai <strong>de</strong> ementa publicada no Informativo n. 556 <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania, “não há relação <strong>de</strong> consumo entre o fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong><br />

equipamento médico-hospitatar e o médico que firmam contrato <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> equipamento <strong>de</strong> ultrassom com cláusula <strong>de</strong><br />

reserva <strong>de</strong> <strong>do</strong>mínio e <strong>de</strong> in<strong>de</strong>xação ao dólar americano, na hipótese em que o profissional <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> tenha adquiri<strong>do</strong> o objeto <strong>do</strong><br />

contrato para o <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong> econômica. Com efeito, consumi<strong>do</strong>r é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou<br />

utiliza, como <strong>de</strong>stinatário final, produto ou serviço oriun<strong>do</strong> <strong>de</strong> um fornece<strong>do</strong>r. Assim, segun<strong>do</strong> a teoria subjetiva ou finalista,<br />

a<strong>do</strong>tada pela Segunda Seção <strong>do</strong> STJ, <strong>de</strong>stinatário final é aquele que ultima a ativida<strong>de</strong> econômica, ou seja, que retira <strong>de</strong> circulação<br />

<strong>do</strong> merca<strong>do</strong> o bem ou o serviço para consumi-lo, suprin<strong>do</strong> uma necessida<strong>de</strong> ou satisfação própria. Por isso, fala-se em <strong>de</strong>stinatário<br />

final econômico (e não apenas fático) <strong>do</strong> bem ou serviço, haja vista que não basta ao consumi<strong>do</strong>r ser adquirente ou usuário, mas<br />

<strong>de</strong>ve haver o rompimento da ca<strong>de</strong>ia econômica com o uso pessoal a impedir, portanto, a reutilização <strong>de</strong>le no processo produtivo,<br />

seja na revenda, no uso profissional, na transformação por meio <strong>de</strong> beneficiamento ou montagem ou em outra forma indireta.<br />

Desse mo<strong>do</strong>, a relação <strong>de</strong> consumo (consumi<strong>do</strong>r final) não po<strong>de</strong> ser confundida com relação <strong>de</strong> insumo (consumi<strong>do</strong>r<br />

intermediário). Na hipótese em foco, não se po<strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r que a aquisição <strong>do</strong> equipamento <strong>de</strong> ultrassom, utiliza<strong>do</strong> na ativida<strong>de</strong><br />

profissional <strong>do</strong> médico, tenha ocorri<strong>do</strong> sob o amparo <strong>do</strong> CDC” (STJ – REsp 1.321.614/SP – Rel. originário Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso<br />

Sanseverino – Rel. para acórdão Min. Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – j. 16.12.2014 – DJe 03.03.2015).<br />

Feitas tais consi<strong>de</strong>rações, e partin<strong>do</strong> para outra situação fática, pela incidência das mesmas regras <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>, a<br />

jurisprudência superior responsabiliza a empresa <strong>de</strong> turismo pelo atraso <strong>do</strong> voo objeto <strong>do</strong> pacote vendi<strong>do</strong> e outros problemas<br />

enfrenta<strong>do</strong>s na viagem. Vejamos duas ementas:<br />

“Civil. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Agência <strong>de</strong> turismo. Se ven<strong>de</strong>u ‘pacote turístico’, nele incluin<strong>do</strong> transporte aéreo por meio <strong>de</strong> voo<br />

freta<strong>do</strong>, a agência <strong>de</strong> turismo respon<strong>de</strong> pela má prestação <strong>de</strong>sse serviço. Recurso especial não conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp 783.016/SC<br />

– Terceira Turma – Rel. Min. Ari Pargendler – j. 16.05.2006 – DJ 05.06.2006, p. 279).<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Agência <strong>de</strong> turismo. Pacote turístico. Serviço presta<strong>do</strong> com <strong>de</strong>ficiência. Dano moral. Cabimento. Prova.<br />

Quantum. Razoabilida<strong>de</strong>. Recurso provi<strong>do</strong>. I. A prova <strong>do</strong> dano moral se satisfaz, na espécie, com a <strong>de</strong>monstração <strong>do</strong> fato que o<br />

ensejou e pela experiência comum. Não há negar, no caso, o <strong>de</strong>sconforto, o aborrecimento, o incômo<strong>do</strong> e os transtornos causa<strong>do</strong>s<br />

pela <strong>de</strong>mora imprevista, pelo excessivo atraso na conclusão da viagem, pela substituição injustificada <strong>do</strong> transporte aéreo pelo<br />

terrestre e pela omissão da empresa <strong>de</strong> turismo nas providências, sequer diligencian<strong>do</strong> em avisar os parentes que haviam i<strong>do</strong> ao<br />

aeroporto para receber os ora recorrentes, segun<strong>do</strong> reconheci<strong>do</strong> nas instâncias ordinárias. II. A in<strong>de</strong>nização por danos morais, como<br />

se tem salienta<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ve ser fixada em termos razoáveis, não se justifican<strong>do</strong> que a reparação enseje enriquecimento in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>, com<br />

manifestos abusos e exageros. III. Certo é que o ocorri<strong>do</strong> não representou <strong>de</strong>sconforto ou perturbação <strong>de</strong> maior monta. E que não se<br />

<strong>de</strong>ve <strong>de</strong>ferir a in<strong>de</strong>nização por dano moral por qualquer contrarieda<strong>de</strong>. Todavia, não menos certo igualmente é que não se po<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> atribuir à empresa-ré o mau serviço presta<strong>do</strong>, o <strong>de</strong>scaso e a negligência com que se houve, em <strong>de</strong>srespeito ao direito <strong>do</strong>s<br />

que com ela contrataram” (STJ – REsp 304.738/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Sálvio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong> Teixeira – j. 08.05.2001 – DJ<br />

13.08.2001, p. 167).<br />

Do mesmo mo<strong>do</strong>, em julga<strong>do</strong> mais antigo, o mesmo Tribunal Superior responsabilizou a agência <strong>de</strong> viagens por um incêndio<br />

que atingiu a embarcação <strong>de</strong> transporte, objeto <strong>do</strong> serviço comercializa<strong>do</strong>:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Agência <strong>de</strong> viagens. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Incêndio em embarcação. A opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> viagens<br />

que organiza pacote turístico respon<strong>de</strong> pelo dano <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> incêndio que consumiu a embarcação por ela contratada.<br />

Passageiros que foram obriga<strong>do</strong>s a se lançar ao mar, sem proteção <strong>de</strong> coletes salva-vidas, inexistentes no barco. Prece<strong>de</strong>nte (REsp<br />

287.849/SP). Dano moral fixa<strong>do</strong> em valor equivalente a 400 salários mínimos. Recurso não conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp 291.384/RJ –<br />

Quarta Turma – Rel. Min Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar – j. 15.05.2001 – DJ 17.09.2001, p. 169).<br />

A questão se consoli<strong>do</strong>u <strong>de</strong> tal forma que, em setembro <strong>de</strong> 2015, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça publicou ementa por meio da<br />

ferramenta Jurisprudência em Teses (Edição 42 <strong>de</strong> 2015), segun<strong>do</strong> a qual “a agência <strong>de</strong> turismo que comercializa pacotes <strong>de</strong><br />

viagens respon<strong>de</strong> solidariamente, nos termos <strong>do</strong> art. 14 <strong>do</strong> CDC, pelos <strong>de</strong>feitos na prestação <strong>do</strong>s serviços que integram o pacote”.<br />

Alguns profissionais que atuam no setor <strong>de</strong> turismo veem exageros em tais conclusões, pleitean<strong>do</strong> o mesmo tratamento<br />

diferencia<strong>do</strong> existente para o produto, constante <strong>do</strong>s arts. 12 e 13 <strong>do</strong> CDC. Aliás, a questão não é pacífica no Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser encontra<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> que afasta a responsabilida<strong>de</strong> da agência <strong>de</strong> viagens por problemas encontra<strong>do</strong>s no trajeto<br />

objeto <strong>do</strong> pacote turístico (STJ – REsp 797.836/MG – Quarta Turma – Rel. Min. Jorge Scartezzini – j. 02.05.2006 – DJ<br />

29.05.2006, p. 263). Porém, tal diferenciação não existe no produto, estan<strong>do</strong> os acórdãos anteriormente transcritos <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a<br />

melhor técnica da Lei Consumerista.


Anote-se a existência <strong>de</strong> projeto <strong>de</strong> lei com o objetivo <strong>de</strong> trazer um tratamento diferencia<strong>do</strong> para as empresas que ven<strong>de</strong>m os<br />

pacotes, afastan<strong>do</strong> incidência da solidarieda<strong>de</strong> <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r (Projeto <strong>de</strong> Lei 5.120/2001). Estabelece o art. 12 da<br />

norma projetada que as agências <strong>de</strong> turismo respon<strong>de</strong>m objetivamente pelos danos causa<strong>do</strong>s por <strong>de</strong>feitos nos serviços presta<strong>do</strong>s<br />

diretamente ou contrata<strong>do</strong>s <strong>de</strong> terceiros e por estes presta<strong>do</strong>s ou executa<strong>do</strong>s. Porém, a agência <strong>de</strong> viagens que intermediar a<br />

contratação <strong>de</strong> serviços turísticos organiza<strong>do</strong>s e presta<strong>do</strong>s por terceiros, inclusive os ofereci<strong>do</strong>s por opera<strong>do</strong>ras turísticas, não<br />

respon<strong>de</strong> pela sua prestação ou execução, salvo nos casos <strong>de</strong> culpa (art. 13 <strong>do</strong> projeto).<br />

Além disso, nos termos <strong>do</strong> art. 14 <strong>do</strong> projeto <strong>de</strong> lei, ressalva<strong>do</strong>s os casos <strong>de</strong> comprovada força maior, razão técnica ou<br />

expressa responsabilida<strong>de</strong> legal <strong>de</strong> outras entida<strong>de</strong>s, a agência <strong>de</strong> viagens e turismo promotora e organiza<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> serviços turísticos<br />

será a responsável pela prestação efetiva <strong>do</strong>s menciona<strong>do</strong>s serviços e pelo reembolso <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> aos consumi<strong>do</strong>res por serviços não<br />

presta<strong>do</strong>s, conforme convenciona<strong>do</strong>. Por fim, estabelece-se que agências <strong>de</strong> viagens e turismo não respon<strong>de</strong>m diretamente por atos<br />

e fatos <strong>de</strong>correntes da participação <strong>de</strong> presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços específicos cujas ativida<strong>de</strong>s estejam sujeitas à legislação especial, ou<br />

trata<strong>do</strong>s internacionais <strong>de</strong> que o Brasil seja signatário, ou <strong>de</strong>pendam <strong>de</strong> autorização, permissão ou concessão (art. 15 <strong>do</strong> projeto).<br />

Superada essa intrincada questão, sabe-se que inci<strong>de</strong> o prazo prescrional <strong>de</strong> cinco anos para a ação <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong> danos<br />

<strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> fato <strong>do</strong> serviço ou <strong>de</strong>feito (aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo), inician<strong>do</strong>-se a sua contagem a partir <strong>do</strong> conhecimento <strong>do</strong> dano e<br />

<strong>de</strong> sua autoria (art. 27 <strong>do</strong> CDC).<br />

A ilustrar o fato <strong>do</strong> serviço, um consumi<strong>do</strong>r vai até um restaurante na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo em seu automóvel. O<br />

estabelecimento oferece serviço <strong>de</strong> estacionamento ou valet na porta. O <strong>do</strong>no <strong>do</strong> veículo entrega as chaves ao manobrista, que se<br />

<strong>de</strong>scuida, e o carro é furta<strong>do</strong>. No caso em questão, há fato <strong>do</strong> serviço diante <strong>do</strong> prejuízo <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> veículo, presente a<br />

responsabilida<strong>de</strong> solidária entre o restaurante, a empresa presta<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> serviço <strong>de</strong> estacionamento e o próprio manobrista. Os <strong>do</strong>is<br />

primeiros têm responsabilida<strong>de</strong> objetiva, enquanto o último tem responsabilida<strong>de</strong> subjetiva, porque se trata <strong>de</strong> profissional liberal<br />

(art. 14, § 4º, da Lei 8.078/1990). O prazo para a ação con<strong>de</strong>natória é <strong>de</strong> cinco anos, a contar <strong>do</strong> evento danoso, no caso.<br />

A verda<strong>de</strong> é que existem gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>bates jurispru<strong>de</strong>nciais a respeito <strong>do</strong> enquadramento <strong>do</strong> evento como vício ou fato <strong>do</strong><br />

serviço e <strong>do</strong> correspon<strong>de</strong>nte prazo para exercício <strong>do</strong> direito. Para a correta diferenciação, valem as lições inaugurais <strong>do</strong> presente<br />

capítulo. A título <strong>de</strong> exemplo, se estiverem presentes danos morais em <strong>de</strong>corrência <strong>do</strong> atraso no serviço <strong>de</strong> transporte, a hipótese é<br />

<strong>de</strong> fato <strong>do</strong> serviço, subsumin<strong>do</strong>-se o prazo prescricional <strong>de</strong> cinco anos:<br />

“Juiza<strong>do</strong>s especiais. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Vício na prestação <strong>de</strong> serviço <strong>de</strong> transporte terrestre que enseja fato <strong>do</strong> serviço.<br />

Prescrição. Dano moral. 1. Em caso <strong>de</strong> vício <strong>do</strong> produto ou serviço aplicável se mostra o art. 26, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r; no presente caso, o vício <strong>do</strong> serviço teve <strong>de</strong>s<strong>do</strong>bramentos, consistentes no atraso da viagem por mais <strong>de</strong> três horas, o<br />

que configura fato <strong>do</strong> serviço, sen<strong>do</strong> aplicável o disposto no art. 27, <strong>do</strong> mesmo Código, não ten<strong>do</strong> ainda transcorri<strong>do</strong> o prazo <strong>de</strong><br />

cinco anos legalmente previsto. 2. O atraso em viagem empreendida por empresa <strong>de</strong> transporte terrestre, superior a três horas,<br />

<strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> <strong>de</strong>feitos mecânicos apresenta<strong>do</strong>s pelo ônibus, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> os passageiros à míngua, ten<strong>do</strong> que suportar fome, calor, mal<br />

cheiro e <strong>de</strong>sconforto <strong>do</strong> veículo durante a noite, consubstancia dano moral, ultrapassan<strong>do</strong> os meros dissabores e aborrecimentos <strong>do</strong><br />

cotidiano e dan<strong>do</strong> ensejo à reparação pleiteada. 3. O valor fixa<strong>do</strong> a título <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais (R$ 3.000,00) guarda<br />

pertinência com o quadro fático evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong>, obe<strong>de</strong>cen<strong>do</strong> aos princípios da razoabilida<strong>de</strong> e da proporcionalida<strong>de</strong>, especialmente<br />

consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se a natureza, gravida<strong>de</strong> e extensão <strong>do</strong> dano. 4. Recorrente con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> ao pagamento <strong>de</strong> custas processuais e<br />

honorários advocatícios, fixa<strong>do</strong>s em 10% (<strong>de</strong>z por cento) sobre o valor da con<strong>de</strong>nação. 5. Recurso conheci<strong>do</strong> e improvi<strong>do</strong>. Sentença<br />

mantida por seus próprios fundamentos, nos termos <strong>do</strong> art. 46, da Lei 9.099/1995” (TJDF – Recurso 2009.07.1.035079-2 – Acórdão<br />

484.675 – Primeira Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e Criminais <strong>do</strong> DF – Rel. Juíza Rita <strong>de</strong> Cassia <strong>de</strong> Cerqueira Lima<br />

Rocha – DJDFTE 04.03.2011, p. 252).<br />

Por fim, a cobrança in<strong>de</strong>vida <strong>de</strong> um serviço que causa dano moral também se enquadra no fato <strong>do</strong> serviço, subsumin<strong>do</strong>-se<br />

mais uma vez o cita<strong>do</strong> prazo legal. Por to<strong>do</strong>s:<br />

“Apelação cível. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Contrato <strong>de</strong> telefonia. Decadência. Inocorrência. Cobrança in<strong>de</strong>vida <strong>de</strong> serviço não<br />

contrata<strong>do</strong>. Não comprovada a solicitação. Dano moral. Pessoa jurídica. Não <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong>. Repetição em <strong>do</strong>bro. Possibilida<strong>de</strong>.<br />

Ônus sucumbencial. 1. Não se aplica ao caso o prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>do</strong> art. 26, II, <strong>do</strong> CDC, uma vez que reclama a autora a<br />

inexigibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s débitos por serviço supostamente não contrata<strong>do</strong>; não se trata <strong>de</strong> vício <strong>de</strong> serviço, mas sim <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong><br />

danos por fato <strong>do</strong> serviço, que prevê prazo prescricional <strong>de</strong> cinco anos, nos termos <strong>do</strong> art. 27 da legislação consumerista. 2.<br />

Caracterizada a ilicitu<strong>de</strong> da parte ré, uma vez que inseriu serviços <strong>de</strong> telefonia na fatura mensal da autora sem que esta tivesse<br />

requisita<strong>do</strong>. Contu<strong>do</strong>, mesmo sen<strong>do</strong> possível a caracterização <strong>do</strong> dano moral para pessoa jurídica, este não restou <strong>de</strong>vidamente<br />

comprova<strong>do</strong>. Sequer <strong>de</strong>monstrou a autora o cadastro <strong>de</strong> seu nome nos órgãos <strong>de</strong> proteção ao crédito, sen<strong>do</strong> que os aborrecimentos,<br />

em razão das dificulda<strong>de</strong>s para solucionar o caso, não configuram, por si só, situação gera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> dano moral. 3. Nos termos <strong>do</strong><br />

parágrafo único <strong>do</strong> art. 42 <strong>do</strong> CDC, é <strong>de</strong>vida a repetição <strong>do</strong> indébito apenas da quantia efetivamente paga e comprovada. 4.<br />

Sucumbência redimensionada. Apelo parcialmente provi<strong>do</strong>. Unânime” (TJRS – Apelação Cível 70037229648, Santa Rosa – Nona<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Íris Helena Me<strong>de</strong>iros Nogueira – j. 15.09.2010 – DJERS 23.09.2010).


Finaliza<strong>do</strong> o estu<strong>do</strong> das quatro situações específicas <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> consumerista, parte-se à abordagem aprofundada <strong>do</strong><br />

conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r por equiparação, para os fins <strong>de</strong> responsabilização privada.<br />

4.3.<br />

O CONSUMIDOR EQUIPARADO E A RESPONSABILIDADE CIVIL.<br />

APROFUNDAMENTOS QUANTO AO TEMA E CONFRONTAÇÕES EM RELAÇÃO<br />

AO ART. 931 DO CÓDIGO CIVIL<br />

Como exaustivamente <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> no capítulo anterior, o CDC amplia substancialmente o conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r, ao<br />

consagrar o enquadramento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>, por equiparação ou bystan<strong>de</strong>r. Consagra o art. 17 da Lei 8.078/1990 que<br />

to<strong>do</strong>s os prejudica<strong>do</strong>s pelo evento <strong>de</strong> consumo, ou seja, todas as vítimas, mesmo não ten<strong>do</strong> relação direta <strong>de</strong> consumo com o<br />

presta<strong>do</strong>r ou fornece<strong>do</strong>r, po<strong>de</strong>m ingressar com ação fundada no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, visan<strong>do</strong> a responsabilização<br />

objetiva <strong>do</strong> agente causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano. Como bem aponta a <strong>do</strong>utrina mais apurada, “basta ser ‘vítima’ <strong>de</strong> um produto ou serviço para<br />

ser privilegia<strong>do</strong> com a posição <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r legalmente protegi<strong>do</strong> pelas normas sobre responsabilida<strong>de</strong> objetiva pelo fato <strong>do</strong><br />

produto presentes no CDC”.46<br />

A construção ampliativa merece louvor, diante <strong>do</strong>s riscos <strong>de</strong>correntes da prestação ou fornecimento na socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo<br />

<strong>de</strong> massa. Quebra-se, assim, a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> imediatismo da clássica responsabilida<strong>de</strong> civil, amplian<strong>do</strong>-se o nexo causal, pela relação <strong>de</strong><br />

solidarieda<strong>de</strong> em relação a terceiros prejudica<strong>do</strong>s. Comparativamente, o Código Civil <strong>de</strong> 2002 não tem regra semelhante,<br />

constituin<strong>do</strong> este conceito <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r uma ampliação interessante da teoria <strong>do</strong> risco.<br />

A título <strong>de</strong> ilustração, imagine-se o caso <strong>de</strong> compra <strong>de</strong> um eletro<strong>do</strong>méstico, <strong>de</strong> uma televisão. Várias pessoas estão na<br />

residência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r-compra<strong>do</strong>r assistin<strong>do</strong> a um filme, quan<strong>do</strong>, <strong>de</strong> repente, o aparelho explo<strong>de</strong>, atingin<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os que estão à<br />

sua volta. Pois bem, não só o compra<strong>do</strong>r <strong>do</strong> aparelho, que manteve a relação contratual direta com o fabricante, mas to<strong>do</strong>s aqueles<br />

prejudica<strong>do</strong>s pelo evento danoso po<strong>de</strong>rão pleitear in<strong>de</strong>nização daquele, eis que são consumi<strong>do</strong>res por equiparação ou bystan<strong>de</strong>rs<br />

(art. 17 da Lei 8.078/1990). O raciocínio jurídico é que se um produto inseguro foi coloca<strong>do</strong> no merca<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ve existir a<br />

responsabilida<strong>de</strong>, já que a empresa que o produziu <strong>de</strong>le retirou lucros e riqueza (risco-proveito). Se a sua colocação no merca<strong>do</strong><br />

gera riscos à coletivida<strong>de</strong>, a empresa fornece<strong>do</strong>ra ou presta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>verá assumir os ônus <strong>de</strong>les <strong>de</strong>correntes (risco cria<strong>do</strong>).<br />

Tratan<strong>do</strong> exatamente da ilustração anterior, que há muito tempo nos acompanha em aulas e exposições, <strong>de</strong>cidiu a 8ª Câmara<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> São Paulo, em julgamento <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2015 e <strong>de</strong> relatoria <strong>do</strong> Desembarga<strong>do</strong>r Luiz<br />

Ambra: “Responsabilida<strong>de</strong> civil. In<strong>de</strong>nização. Danos materiais e morais. Explosão <strong>de</strong> televisor em residência, adquiri<strong>do</strong> três dias<br />

antes. Ferimentos na mãe e filhos menores, a genitora vin<strong>do</strong> a falecer cerca <strong>de</strong> vinte dias <strong>de</strong>pois. Fatos bem <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong>s,<br />

presumin<strong>do</strong>-se a culpa <strong>do</strong> fabricante <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com norma expressa <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. In<strong>de</strong>nização corretamente<br />

estabelecida, improvi<strong>do</strong> o apelo da ré, provi<strong>do</strong> em parte o <strong>do</strong>s autores para majorar a in<strong>de</strong>nização, nos termos <strong>do</strong> acórdão”<br />

(Apelação n. 0004338-05.2010.8.26.0604, originária da Comarca <strong>de</strong> Sumaré).<br />

O acórdão bem aplica o conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>, lamentan<strong>do</strong>-se apenas a menção à culpa presumida e não à<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva. Quanto ao valor da in<strong>de</strong>nização extrapatrimonial, pontue-se que corretamente foi fixada em cerca <strong>de</strong> R$<br />

200.000,00 (duzentos mil reais).<br />

Partin<strong>do</strong> para outras ilustrações, retome-se o exemplo exposto no capítulo anterior <strong>do</strong> livro, <strong>de</strong> julgamento <strong>do</strong> Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> reconhecer como consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> o proprietário <strong>de</strong> um imóvel sobre o qual caiu um<br />

avião (STJ – REsp 540.235/TO – Terceira Turma – Rel. Min. Castro Filho – DJ 06.03.2006). Mais recentemente concluiu o<br />

Tribunal da Cidadania no mesmo senti<strong>do</strong>, em julga<strong>do</strong> similar, relativo ao aci<strong>de</strong>nte da TAM ocorri<strong>do</strong> no Aeroporto <strong>de</strong> Congonhas<br />

em 1996. O acórdão foi assim publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 525:<br />

“<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Prazo <strong>de</strong> prescrição da pretensão <strong>de</strong> ressarcimento por danos <strong>de</strong>correntes da queda <strong>de</strong> aeronave. É <strong>de</strong> cinco<br />

anos o prazo <strong>de</strong> prescrição da pretensão <strong>de</strong> ressarcimento <strong>de</strong> danos sofri<strong>do</strong>s pelos mora<strong>do</strong>res <strong>de</strong> casas atingidas pela queda, em<br />

1996, <strong>de</strong> aeronave pertencente a pessoa jurídica nacional e <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong> presta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> serviço <strong>de</strong> transporte aéreo. Isso porque,<br />

na hipótese, verifica-se a configuração <strong>de</strong> um fato <strong>do</strong> serviço, ocorri<strong>do</strong> no âmbito <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo, o que enseja a aplicação<br />

<strong>do</strong> prazo prescricional previsto no art. 27 <strong>do</strong> CDC. Com efeito, nesse contexto, enquadra-se a socieda<strong>de</strong> empresária no conceito <strong>de</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r estabeleci<strong>do</strong> no art. 3º <strong>do</strong> CDC, enquanto os mora<strong>do</strong>res das casas atingidas pela queda da aeronave, embora não tenham<br />

utiliza<strong>do</strong> o serviço como <strong>de</strong>stinatários finais, equiparam-se a consumi<strong>do</strong>res pelo simples fato <strong>de</strong> serem vítimas <strong>do</strong> evento<br />

(bystan<strong>de</strong>rs), <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o art. 17 <strong>do</strong> referi<strong>do</strong> diploma legal. A<strong>de</strong>mais, não há dúvida <strong>de</strong> que o evento em análise configura fato<br />

<strong>do</strong> serviço, pelo qual respon<strong>de</strong> o fornece<strong>do</strong>r, em consonância com o disposto <strong>do</strong> art. 14 <strong>do</strong> CDC. Importante esclarecer, ainda, que a<br />

aparente antinomia entre a Lei 7.565/1986 – Código Brasileiro <strong>de</strong> Aeronáutica –, o CDC e o CC/1916, no que tange ao prazo <strong>de</strong><br />

prescrição da pretensão <strong>de</strong> ressarcimento em caso <strong>de</strong> danos sofri<strong>do</strong>s por terceiros na superfície, causa<strong>do</strong>s por aci<strong>de</strong>nte aéreo, não<br />

po<strong>de</strong> ser resolvida pela simples aplicação das regras tradicionais da anteriorida<strong>de</strong>, da especialida<strong>de</strong> ou da hierarquia, que levam à


exclusão <strong>de</strong> uma norma pela outra, mas sim pela aplicação coor<strong>de</strong>nada das leis, pela interpretação integrativa, <strong>de</strong> forma a <strong>de</strong>finir o<br />

verda<strong>de</strong>iro alcance <strong>de</strong> cada uma <strong>de</strong>las à luz <strong>do</strong> caso concreto. Tem-se, portanto, uma norma geral anterior (CC/1916) – que, por<br />

sinal, sequer regulava <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> especial o contrato <strong>de</strong> transporte – e duas especiais que lhe são posteriores (CBA/1986 e<br />

CDC/1990). No entanto, nenhuma <strong>de</strong>las expressamente revoga a outra, é com ela incompatível ou regula inteiramente a mesma<br />

matéria, o que permite afirmar que essas normas se interpenetram, promoven<strong>do</strong> um verda<strong>de</strong>iro diálogo <strong>de</strong> fontes. A propósito, o<br />

CBA regula, nos arts. 268 a 272, a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> transporta<strong>do</strong>r aéreo perante terceiros na superfície e estabelece, no seu art.<br />

317, II, o prazo prescricional <strong>de</strong> <strong>do</strong>is anos da pretensão <strong>de</strong> ressarcimento <strong>do</strong>s danos a eles causa<strong>do</strong>s. Essa norma especial, no<br />

entanto, não foi revogada, como já afirma<strong>do</strong>, nem impe<strong>de</strong> a incidência <strong>do</strong> CDC quan<strong>do</strong> evi<strong>de</strong>nciada a relação <strong>de</strong> consumo entre as<br />

partes envolvidas. Destaque-se, por oportuno, que o CBA não se limita a regulamentar apenas o transporte aéreo regular <strong>de</strong><br />

passageiros, realiza<strong>do</strong> por quem <strong>de</strong>tenha a respectiva concessão, mas to<strong>do</strong> serviço <strong>de</strong> exploração <strong>de</strong> aeronave, opera<strong>do</strong> por pessoa<br />

física ou jurídica, proprietária ou não, com ou sem fins lucrativos. Assim, o CBA será plenamente aplica<strong>do</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que a relação<br />

jurídica não esteja regida pelo CDC, cuja força normativa é extraída diretamente da CF (art. 5º, XXXII). A<strong>de</strong>mais, não há falar em<br />

incidência <strong>do</strong> art. 177 <strong>do</strong> CC/1916, diploma legal reserva<strong>do</strong> ao tratamento das relações jurídicas entre pessoas que se encontrem em<br />

patamar <strong>de</strong> igualda<strong>de</strong>, o que não ocorre na hipótese” (STJ – REsp 1.202.013/SP – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 18.06.2013).<br />

Como se percebe, o aresto traz importante <strong>de</strong>bate sobre a incidência <strong>do</strong> prazo prescricional para a <strong>de</strong>manda <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> civil proposta pelos familiares das vítimas, concluin<strong>do</strong> pela incidência <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> cinco anos, trata<strong>do</strong> pelo art. 27<br />

<strong>do</strong> Código Consumerista. A tese <strong>do</strong> diálogo das fontes po<strong>de</strong> ser retirada da ementa, pelas menções ao Código Brasileiro da<br />

Aeronáutica e ao Código Civil <strong>de</strong> 1916; prevalecen<strong>do</strong> o CDC por ser mais favorável aos prejudica<strong>do</strong>s pelo evento danoso, no caso<br />

concreto.<br />

Seguin<strong>do</strong> nos exemplos, <strong>do</strong> mesmo Tribunal Superior, serve o exemplo das vítimas atingidas pela explosão <strong>de</strong> uma fábrica <strong>de</strong><br />

fogos <strong>de</strong> artifício, consi<strong>de</strong>radas consumi<strong>do</strong>ras equiparadas:<br />

“Processual civil. Ação civil pública. Explosão <strong>de</strong> loja <strong>de</strong> fogos <strong>de</strong> artifício. Interesses individuais homogêneos. Legitimida<strong>de</strong> ativa<br />

da Procura<strong>do</strong>ria <strong>de</strong> Assistência Judiciária. Responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto. Vítimas <strong>do</strong> evento. Equiparação a consumi<strong>do</strong>res.<br />

I. Procura<strong>do</strong>ria <strong>de</strong> assistência judiciária tem legitimida<strong>de</strong> ativa para propor ação civil pública objetivan<strong>do</strong> in<strong>de</strong>nização por danos<br />

materiais e morais <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> explosão <strong>de</strong> estabelecimento que explorava o comércio <strong>de</strong> fogos <strong>de</strong> artifício e congêneres,<br />

porquanto, no que se refere à <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r por meio <strong>de</strong> ações coletivas, a intenção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r pátrio foi<br />

ampliar o campo da legitimação ativa, conforme se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong> <strong>do</strong> art. 82 e incisos <strong>do</strong> CDC, bem assim <strong>do</strong> art. 5º, inc. XXXII, da<br />

Constituição Fe<strong>de</strong>ral, ao dispor expressamente que incumbe ao Esta<strong>do</strong> promover, na forma da lei, a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. I. Em<br />

consonância com o art. 17 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, equiparam-se aos consumi<strong>do</strong>res todas as pessoas que, embora não<br />

ten<strong>do</strong> participa<strong>do</strong> diretamente da relação <strong>de</strong> consumo, vêm a sofrer as consequências <strong>do</strong> evento danoso, dada a potencial gravida<strong>de</strong><br />

que po<strong>de</strong> atingir o fato <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço, na modalida<strong>de</strong> vício <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> por insegurança. Recurso especial não<br />

conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp 181.580/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Castro Filho – j. 09.12.2003 – DJ 22.03.2004, p. 292).<br />

Anote-se que o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça também concluiu serem consumi<strong>do</strong>res to<strong>do</strong>s os prejudica<strong>do</strong>s pela explosão <strong>de</strong><br />

uma barragem, conforme ementa a seguir transcrita:<br />

“Agravo regimental. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Rompimento <strong>de</strong> barragem. Equiparação ao consumi<strong>do</strong>r. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova.<br />

Matéria <strong>de</strong> prova. Reexame. Inviabilida<strong>de</strong>. Súmula 7/STJ. Decisão agravada mantida. Improvimento. 1. Consumi<strong>do</strong>r por<br />

equiparação, aplicação <strong>do</strong> art. 17 <strong>do</strong> CDC. 2. Houve o reconhecimento da hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, assim como da<br />

verossimilhança <strong>de</strong> suas alegações, julgan<strong>do</strong> atendidas as exigências encartadas no art. 6º, VIII, <strong>do</strong> CDC. A inversão <strong>do</strong> ônus da<br />

prova foi concedida após a apreciação <strong>de</strong> aspectos liga<strong>do</strong>s ao conjunto fático-probatório <strong>do</strong>s autos. O reexame <strong>de</strong> tais elementos,<br />

forma<strong>do</strong>res da convicção <strong>do</strong> juiz da causa, não é possível na via estreita <strong>do</strong> recurso especial por exigir a análise e matéria <strong>de</strong> prova.<br />

3. A pretensão recursal esbarra na Súmula 7/STJ. 4. Agravo improvi<strong>do</strong> com aplicação <strong>de</strong> multa” (STJ – AgRg-Ag 1.321.999/MG –<br />

Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 19.10.2010 – DJe 04.11.2010).<br />

Mais recentemente, em julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2011, aquela Corte consi<strong>de</strong>rou como consumi<strong>do</strong>res equipara<strong>do</strong>s os pais <strong>de</strong> uma<br />

criança que foi atacada por animais em um circo. Consi<strong>de</strong>rou-se ainda a solidarieda<strong>de</strong> entre to<strong>do</strong>s os envolvi<strong>do</strong>s com a prestação<br />

<strong>de</strong> serviço (fato <strong>do</strong> serviço ou <strong>de</strong>feito). Vejamos a publicação no Informativo n. 468 <strong>do</strong> STJ:<br />

“Danos morais. Responsabilida<strong>de</strong> solidária. CDC. Trata-se <strong>de</strong> ação in<strong>de</strong>nizatória por danos materiais e morais ajuizada pelos pais<br />

em <strong>de</strong>corrência da morte <strong>de</strong> filho (seis anos), ataca<strong>do</strong> e morto por leões durante espetáculo <strong>de</strong> circo instala<strong>do</strong> na área contígua a<br />

shopping center. O menor fora tirar fotos com cavalos acompanha<strong>do</strong> por prepostos <strong>do</strong> circo quan<strong>do</strong> os leões que aguardavam em<br />

jaula precária para participar <strong>do</strong> espetáculo o puxaram entre as gra<strong>de</strong>s. Para as instâncias ordinárias, a locação <strong>do</strong> espaço para a<br />

instalação <strong>do</strong> circo firmada pelas empresas loca<strong>do</strong>ras rés, ora recorrentes (integrantes <strong>do</strong> mesmo grupo societário <strong>do</strong> shopping), teve<br />

a motivação <strong>de</strong> atrair o público consumi<strong>do</strong>r e elevar os lucros, caracterizan<strong>do</strong> uma relação <strong>de</strong> consumo; daí se reconhecer a<br />

legitimida<strong>de</strong> das empresas loca<strong>do</strong>ras para respon<strong>de</strong>rem à ação solidariamente, visto que consentiram na instalação <strong>do</strong> circo com<br />

total falta <strong>de</strong> segurança, <strong>de</strong> recursos humanos e físicos (segun<strong>do</strong> apurou o lau<strong>do</strong> da Secretaria <strong>de</strong> Defesa Social). Isso porque o


contrato <strong>de</strong> locação foi firma<strong>do</strong> em papel timbra<strong>do</strong> com logotipo <strong>do</strong> shopping em que as empresas figuravam como loca<strong>do</strong>ras e o<br />

circo se obrigava, entre outras coisas, a fornecer 500 convites para os espetáculos e obe<strong>de</strong>cer às normas <strong>do</strong> shopping center; os<br />

aluguéis e encargos eram pagos na administração <strong>do</strong> con<strong>do</strong>mínio <strong>do</strong> shopping, tu<strong>do</strong> a indicar que havia ligação administrativa e<br />

financeira entre o shopping e as empresas loca<strong>do</strong>ras. Agora, no REsp, discute-se a extensão da responsabilida<strong>de</strong> das empresas<br />

loca<strong>do</strong>ras pelo evento danoso e o quantum da in<strong>de</strong>nização fixa<strong>do</strong> pelas instâncias ordinárias em R$ 1 milhão. Para o Min. Relator,<br />

diante das peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> caso concreto analisadas no tribunal a quo, não cabe falar em ilegitimida<strong>de</strong> ad causam das<br />

litisconsortes passivas (empresas loca<strong>do</strong>ras recorrentes). Assim, examinou as razões <strong>do</strong> TJ para con<strong>de</strong>ná-las por equiparação a<br />

consumi<strong>do</strong>r nos termos <strong>do</strong> art. 17 <strong>do</strong> CDC. Explicou o Min. Relator que o cita<strong>do</strong> artigo esten<strong>de</strong> o conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r àqueles<br />

que, mesmo não sen<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>res diretos, acabam sofren<strong>do</strong> as consequências <strong>do</strong> aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo, ou seja, as vítimas <strong>do</strong><br />

evento (bystan<strong>de</strong>rs). Na hipótese, as recorrentes não conseguiram provas <strong>de</strong> que a locação <strong>do</strong> circo não representava serviço que o<br />

con<strong>do</strong>mínio <strong>do</strong> shopping, sócio das empresas recorrentes, pôs à disposição <strong>do</strong>s frequenta<strong>do</strong>res. Dessa forma, nesse caso, o ônus da<br />

prova caberia ao fornece<strong>do</strong>r. Asseverou que o novo Código Civil, no art. 927, parágrafo único, admite a responsabilida<strong>de</strong> sem culpa<br />

pelo exercício <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> que, por sua natureza, representa risco ao direito <strong>de</strong> outrem. Observou, ainda, que a responsabilida<strong>de</strong><br />

indireta, no caso <strong>do</strong>s autos, vem <strong>do</strong> risco da própria ativida<strong>de</strong> (apresentação <strong>de</strong> animais selvagens), sen<strong>do</strong> inerente a obrigação <strong>de</strong><br />

zelar pela guarda <strong>do</strong>s frequenta<strong>do</strong>res e consumi<strong>do</strong>res, o que garante à vítima ser in<strong>de</strong>nizada (art. 93 <strong>do</strong> CC/2002 e Súm. 130-STJ).<br />

Já o quantum foi reduzi<strong>do</strong> a R$ 275 mil, com correção monetária a contar <strong>de</strong>sse julgamento e juros conta<strong>do</strong>s da data <strong>do</strong> evento<br />

danoso. Diante <strong>do</strong> exposto, a Turma, por maioria, <strong>de</strong>u parcial provimento ao recurso. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: REsp 476.428-SC, DJ<br />

09.05.2005; REsp 181.580-SP, DJ 22.03.2004; REsp 7.134-SP, DJ 08.04.1991; e REsp 437.649-SP, DJ 24.02.2003” (STJ – REsp<br />

1.100.571/PE – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 07.04.2011).<br />

Ainda a ilustrar, igualmente, a hipótese <strong>do</strong> pneu <strong>de</strong> um veículo que explo<strong>de</strong>, sen<strong>do</strong> consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r o prejudica<strong>do</strong><br />

correspon<strong>de</strong>nte (TJPR – Recurso 167271-7 – Acórdão 5298, Ponta Grossa – Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Rafael Augusto<br />

Cassetari – j. 11.08.2005). Em senti<strong>do</strong> semelhante, julga<strong>do</strong> paulista que consi<strong>de</strong>rou consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> a vítima atingida pelo<br />

botijão <strong>de</strong> gás que explodiu (TJSP – Apelação 9133219-54.2003.8.26.0000 – Acórdão 4866894, São Paulo – Nona Câmara <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Antonio Vilenilson – j. 28.09.2010 – DJESP 24.01.2011). Ou, ainda, o consumi<strong>do</strong>r que foi atingi<strong>do</strong> em<br />

um supermerca<strong>do</strong> por uma ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> bebê <strong>de</strong>feituosa (TJDF – Recurso 2007.01.1.137336-6 – Acórdão 490.960 – Primeira Turma<br />

Cível – Rel. Des. Flavio Rostirola – DJDFTE 30.03.2011, p. 147). Por fim, cite-se interessante <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal Fluminense,<br />

que consi<strong>de</strong>rou consumi<strong>do</strong>r por equiparação a pessoa que foi atingida por vigilantes da transporta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> valores em perseguição a<br />

criminosos na via pública (TJRJ – Apelação Cível 2009.001.70719 – Quinta Câmara Cível – Rel. Des. Katya Monnerat – j.<br />

08.07.2010 – DORJ 12.07.2010, p. 185).<br />

A construção bystan<strong>de</strong>r não é aplicada somente para os fins <strong>de</strong> uma responsabilização extracontratual, mas também em<br />

<strong>de</strong>corrência <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> consumo, eis que o CDC rompeu com o sistema dual <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil, como exposto ao início<br />

<strong>do</strong> presente capítulo. Dessa feita, é comum a incidência da i<strong>de</strong>ia para os casos <strong>de</strong> cliente bancário clona<strong>do</strong>.<br />

Imagine-se a hipótese <strong>de</strong> alguém que tem toda a <strong>do</strong>cumentação furtada ou roubada. O criminoso ou um terceiro, muni<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>sses <strong>do</strong>cumentos, vai até um banco e abre uma conta-corrente em nome da vítima, emitin<strong>do</strong> vários cheques sem fun<strong>do</strong>s, fazen<strong>do</strong><br />

com que o seu nome seja inscrito em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes. O clona<strong>do</strong>, na situação <strong>de</strong>scrita, po<strong>de</strong>rá ingressar com <strong>de</strong>manda<br />

em face da instituição bancária, subsumin<strong>do</strong>-se a responsabilida<strong>de</strong> objetiva com base no art. 17 <strong>do</strong> CDC (a título <strong>de</strong> exemplo:<br />

TJMG – Apelação Cível 0324980-05.2010.8.13.0145, Juiz <strong>de</strong> Fora – Décima Segunda Câmara Cível – Rel. Des. Domingos<br />

Coelho – j. 02.03.2011 – DJEMG 21.03.2011; TJDF – Recurso 2009.01.1.145985-8 – Acórdão 477.397 – Primeira Turma<br />

Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e Criminais <strong>do</strong> DF – Rel. Juíza Rita <strong>de</strong> Cassia <strong>de</strong> Cerqueira Lima Rocha – DJDFTE<br />

04.02.2011, p. 242; TJRS – Apelação Cível 70024134561, Getúlio Vargas – Nona Câmara Cível – Rel. Des. Íris Helena Me<strong>de</strong>iros<br />

Nogueira – j. 09.07.2008 – DOERS 17.07.2008, p. 28; e TJES – Apelação Cível 35020208357 – Primeira Câmara Cível – Rel.<br />

Des. Carlos Henrique Rios <strong>do</strong> Amaral – DJES 19.11.2009, p. 20).<br />

Na mesma linha, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, em julgamento <strong>de</strong> inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> recursos repetitivos, acabou por concluir pela<br />

responsabilização da instituição bancária nesses casos. Com tom elucidativo, vejamos a publicação no Informativo n. 481 daquele<br />

Tribunal Superior:<br />

“Repetitivo. Frau<strong>de</strong>. Terceiros. Abertura. Conta-corrente. Trata-se, na origem, <strong>de</strong> ação <strong>de</strong>claratória <strong>de</strong> inexistência <strong>de</strong> dívida<br />

cumulada com pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais ajuizada contra instituição financeira na qual o recorrente alega nunca ter<br />

ti<strong>do</strong> relação jurídica com ela, mas que, apesar disso, teve seu nome negativa<strong>do</strong> em cadastro <strong>de</strong> proteção ao crédito em razão <strong>de</strong><br />

dívida que jamais contraiu, situação que lhe causou sérios transtornos e manifesto abalo psicológico. Na espécie, o tribunal a quo<br />

afastou a responsabilida<strong>de</strong> da instituição financeira pela abertura <strong>de</strong> conta-corrente em nome <strong>do</strong> recorrente ao fundamento <strong>de</strong> que<br />

um terceiro a efetuou mediante a utilização <strong>de</strong> <strong>do</strong>cumentos originais. Assim, a Seção, ao julgar o recurso sob o regime <strong>do</strong> art. 543-C<br />

<strong>do</strong> CPC c/c a Res. n. 8/2008-STJ, enten<strong>de</strong>u que as instituições bancárias respon<strong>de</strong>m objetivamente pelos danos causa<strong>do</strong>s por frau<strong>de</strong>s<br />

ou <strong>de</strong>litos pratica<strong>do</strong>s por terceiros – por exemplo, a abertura <strong>de</strong> conta-corrente ou o recebimento <strong>de</strong> empréstimos mediante frau<strong>de</strong> ou<br />

utilização <strong>de</strong> <strong>do</strong>cumentos falsos –, uma vez que tal responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>corre <strong>do</strong> risco <strong>do</strong> empreendimento. Daí, a Seção <strong>de</strong>u


provimento ao recurso e fixou a in<strong>de</strong>nização por danos morais em R$ 15 mil com correção monetária a partir <strong>do</strong> julgamento <strong>de</strong>sse<br />

recurso (Súm. n. 362-STJ) e juros <strong>de</strong> mora a contar da data <strong>do</strong> evento danoso (Súm. n. 54-STJ), bem como <strong>de</strong>clarou inexistente a<br />

dívida e <strong>de</strong>terminou a imediata exclusão <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> recorrente <strong>do</strong>s cadastros <strong>de</strong> proteção ao crédito, sob pena <strong>de</strong> multa <strong>de</strong> R$<br />

100,00 por dia <strong>de</strong> <strong>de</strong>scumprimento” (STJ – REsp 1.197.929/PR – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 24.08.2011).<br />

A questão se consoli<strong>do</strong>u <strong>de</strong> tal forma que, no ano <strong>de</strong> 2012, foi editada a Súmula 479 daquela Corte Superior, com tom<br />

amplia<strong>do</strong>, abrangen<strong>do</strong> outras hipóteses <strong>de</strong> frau<strong>de</strong>s bancárias praticadas por terceiros: “As instituições financeiras respon<strong>de</strong>m<br />

objetivamente pelos danos gera<strong>do</strong>s por fortuito interno relativo a frau<strong>de</strong>s e <strong>de</strong>litos pratica<strong>do</strong>s por terceiros no âmbito <strong>de</strong> operações<br />

bancárias”. De toda sorte, a ementa mereceria um reparo, eis que, para este autor, todas as frau<strong>de</strong>s bancárias praticadas por<br />

terceiros configuram fortuitos internos. A súmula parece <strong>de</strong>monstrar que alguns eventos po<strong>de</strong>m ser ti<strong>do</strong>s como externos, o que é<br />

um equívoco pensar.<br />

Supera<strong>do</strong>s esses exemplos, <strong>de</strong>ve ficar claro que, segun<strong>do</strong> o entendimento majoritário, o conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong><br />

somente se refere às hipóteses <strong>de</strong> fato <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço, e não ao vício, o que visa a restringir a aplicação <strong>do</strong> conceito.<br />

Nessa linha <strong>de</strong> pensamento, colaciona-se <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> STJ:<br />

“Civil e processual civil. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Extravio <strong>de</strong> bagagens <strong>do</strong> preposto conten<strong>do</strong> partituras a serem executadas em<br />

espetáculo organiza<strong>do</strong> pela empresa autora. Legitimida<strong>de</strong> ativa ad causam. Equiparação ao consumi<strong>do</strong>r. Impossibilida<strong>de</strong>. Teoria da<br />

asserção. Empresa autora beneficiária <strong>do</strong> contrato havi<strong>do</strong> entre o maestro e a ré. Responsabilida<strong>de</strong> extracontratual. 1. Em caso <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>feito <strong>de</strong> conformida<strong>de</strong> ou vício <strong>do</strong> serviço, não cabe a aplicação <strong>do</strong> art. 17, CDC, pois a Lei somente equiparou as vítimas <strong>do</strong><br />

evento ao consumi<strong>do</strong>r nas hipóteses <strong>do</strong>s arts. 12 a 16 <strong>do</strong> CDC. 2. A teoria da asserção, a<strong>do</strong>tada pelo nosso sistema legal, permite a<br />

verificação das condições da ação com base nos fatos narra<strong>do</strong>s na petição inicial. 3. No caso em exame, como causa <strong>de</strong> pedir e<br />

fundamentação jurídica, a autora invocou, além <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, também o Código Civil e a teoria geral da<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil. 4. Destarte, como o acórdão apreciou a causa apenas aplican<strong>do</strong> o art. 17, CDC, malferin<strong>do</strong> o dispositivo<br />

legal, o que, como examina<strong>do</strong>, por si só, no caso concreto, não implica em ilegitimida<strong>de</strong> passiva da autora, a melhor solução para a<br />

hipótese é acolher em parte o recurso da ré, apenas para cassar o acórdão, permitin<strong>do</strong> que novo julgamento seja realiza<strong>do</strong>,<br />

aprecian<strong>do</strong>-se to<strong>do</strong>s os ângulos da questão, notadamente o pedi<strong>do</strong> com base na teoria geral da responsabilida<strong>de</strong> civil. 5. Recurso<br />

especial parcialmente conheci<strong>do</strong> e, na extensão, provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 753.512/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong><br />

Noronha – Rel. p/Acórdão Min. Luis Felipe Salomão – j. 16.03.2010 – DJe 10.08.2010).<br />

Particularmente quanto aos negócios jurídicos, o conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r bystan<strong>de</strong>r mantém relação com o princípio da<br />

função social <strong>do</strong>s contratos, constituin<strong>do</strong> exceção à relativida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s efeitos contratuais, nos termos <strong>do</strong> que consta <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n.<br />

21 <strong>do</strong> CJF/STJ, aprova<strong>do</strong> na I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, in verbis: “a função social <strong>do</strong> contrato, prevista no art. 421 <strong>do</strong> novo<br />

Código Civil, constitui cláusula geral, a impor a revisão <strong>do</strong> princípio da relativida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s efeitos <strong>do</strong> contrato em relação a terceiros,<br />

implican<strong>do</strong> a tutela externa <strong>do</strong> crédito”. Tal conclusão representa clara aplicação da eficácia externa da função social <strong>do</strong>s contratos,<br />

exposta no Capítulo 2 <strong>de</strong>sta obra.<br />

Pois bem, há uma forte interação entre o conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> e a regra <strong>do</strong> art. 931 <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002,<br />

dispositivo que merece transcrição para os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s aprofundamentos:<br />

“Art. 931. Ressalva<strong>do</strong>s outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas respon<strong>de</strong>m<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> culpa pelos danos causa<strong>do</strong>s pelos produtos postos em circulação”.<br />

Como se po<strong>de</strong> observar, o coman<strong>do</strong> em <strong>de</strong>staque consagra a responsabilida<strong>de</strong> objetiva das empresas que fornecem produtos ao<br />

merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo. O gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>bate que existe no campo <strong>do</strong>utrinário resi<strong>de</strong> em saber se a norma constitui ou não uma novida<strong>de</strong><br />

no sistema <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil.<br />

Na opinião <strong>de</strong>ste autor, a melhor conclusão é <strong>de</strong> que tal dispositivo priva<strong>do</strong> não revogou o que estabelece a Lei 8.078/1990 a<br />

respeito da responsabilida<strong>de</strong> civil pelo fato <strong>do</strong> produto, sen<strong>do</strong> certo que somente foi manti<strong>do</strong> esse coman<strong>do</strong> na nova codificação<br />

porque, quan<strong>do</strong> da sua elaboração, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r ainda não existia em nosso or<strong>de</strong>namento jurídico. Não se<br />

trata, assim, <strong>de</strong> uma novida<strong>de</strong> introduzida pelo CC/2002, pois o CDC já atingia os empresários individuais e empresas, nas<br />

relações que estes mantinham com os <strong>de</strong>stinatários finais – pelo que consta <strong>do</strong>s arts. 2º e 3º da Lei Consumerista –, bem como nas<br />

relações com outras empresas, como consumi<strong>do</strong>res equipara<strong>do</strong>s (arts. 17 e 29).<br />

De qualquer maneira, há corrente <strong>do</strong>utrinária respeitável que sustenta ser o dispositivo uma novida<strong>de</strong> no sistema, pois o seu<br />

conteú<strong>do</strong> não tinha tratamento no Código Protetivo. Essa é a opinião <strong>de</strong> Maria Helena Diniz, no seguinte senti<strong>do</strong>: “Logo, o artigo<br />

sub examine terá aplicação nas hipóteses que não configurarem relação <strong>de</strong> consumo, visto que esta recai sob a égi<strong>de</strong> da Lei<br />

8.078/1990, que continuará regen<strong>do</strong> os casos <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil pelo fato ou vício <strong>do</strong> produto. Assim, esse dispositivo<br />

consagra a responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva <strong>de</strong> empresa ou empresário pelo risco advin<strong>do</strong> da sua ativida<strong>de</strong> empresarial, provoca<strong>do</strong><br />

por produto, coloca<strong>do</strong> em circulação junto ao público, p. ex., a terceiro (monta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> veículo), lesa<strong>do</strong> pelo seu produto (peça <strong>de</strong>


automóvel conten<strong>do</strong> grave <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> fabricação) posto em circulação. O mesmo se diga <strong>de</strong> companhia distribui<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> gás, que<br />

respon<strong>de</strong>rá pelo dano causa<strong>do</strong> a terceiro (transeunte) pela explosão <strong>de</strong> botijão que transporta”.47 A opinio sustentada é que o<br />

coman<strong>do</strong> tem incidência na relação interna entre fornece<strong>do</strong>res, quan<strong>do</strong> o produto posto em circulação pelo primeiro causa dano a<br />

um segun<strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, o que é compartilha<strong>do</strong> por Gustavo Tepedino. 48 No mesmo senti<strong>do</strong>, dispõe o Enuncia<strong>do</strong> n. 42 <strong>do</strong><br />

Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral, aprova<strong>do</strong> na I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, que “o art. 931 amplia o conceito <strong>de</strong> fato <strong>do</strong> produto existente<br />

no art. 12 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, imputan<strong>do</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil à empresa e aos empresários individuais<br />

vincula<strong>do</strong>s à circulação <strong>do</strong>s produtos”. Na mesma linha, o Enuncia<strong>do</strong> n. 378 <strong>do</strong> CJF/STJ, da IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, pelo qual<br />

“Aplica-se o art. 931 <strong>do</strong> Código Civil, haja ou não relação <strong>de</strong> consumo”.<br />

Ora, com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, a lógica <strong>de</strong> extensão <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>s já po<strong>de</strong>ria ser retirada <strong>do</strong> art. 17 <strong>do</strong> CDC, o que afasta a<br />

tese da novida<strong>de</strong>. Aliás, para beneficiar o empresário consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>, po<strong>de</strong> ser perfeitamente utiliza<strong>do</strong> o sistema<br />

consumerista. Da mesma forma quanto ao consumi<strong>do</strong>r padrão, retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 2º da Lei 8.078/1990. Partilhan<strong>do</strong> <strong>de</strong>ssas i<strong>de</strong>ias, em<br />

contradição com o enuncia<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrinário anterior, o Enuncia<strong>do</strong> n. 190, da III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, com a seguinte redação: “A<br />

regra <strong>do</strong> art. 931 <strong>do</strong> CC não afasta as normas acerca da responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto previstas no art. 12 <strong>do</strong> CDC, que<br />

continuam mais favoráveis ao consumi<strong>do</strong>r lesa<strong>do</strong>”. Vejamos as justificativas <strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong> apresentadas naquele evento pelo atual<br />

Ministro <strong>do</strong> STJ Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino:<br />

“Na realida<strong>de</strong>, a norma <strong>do</strong> art. 931 não po<strong>de</strong> ser interpretada na sua literalida<strong>de</strong>, sob pena <strong>de</strong> inviabilização <strong>de</strong> diversos setores da<br />

ativida<strong>de</strong> empresarial (v.g., fabricantes <strong>de</strong> facas).<br />

A mais razoável é uma interpretação teleológica, conforme preconiza Sérgio Cavalieri Filho (Programa <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil,<br />

São Paulo: Malheiros, 2003, p. 187), conjugan<strong>do</strong> a norma <strong>do</strong> art. 931 <strong>do</strong> CC com a <strong>do</strong> § 1º <strong>do</strong> art. 12 <strong>do</strong> CDC e exigin<strong>do</strong>-se que o<br />

produto não apresente a segurança legitimamente esperada por seu usuário.<br />

Com essa interpretação <strong>do</strong> art. 931 <strong>do</strong> CC, que é necessária para se evitar a ocorrência <strong>de</strong> exageros, verifica-se que o sistema <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto (aci<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> consumo) constante <strong>do</strong> CDC continua mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r lesa<strong>do</strong>.<br />

Em primeiro lugar, o CDC acolhe o princípio da reparação integral <strong>do</strong> dano sofri<strong>do</strong> pelo consumi<strong>do</strong>r no seu art. 6º, VI, sem<br />

qualquer restrição. Isso impe<strong>de</strong> a aplicação <strong>do</strong> art. 944, parágrafo único, <strong>do</strong> CC, que permite a redução da in<strong>de</strong>nização na medida da<br />

culpabilida<strong>de</strong>.<br />

Em segun<strong>do</strong> lugar, o prazo <strong>de</strong> prescrição <strong>do</strong> CDC continua em cinco anos (art. 27), enquanto o <strong>do</strong> CC foi reduzi<strong>do</strong> para apenas três<br />

anos nas ações <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong> danos (art. 206, § 3º, V).<br />

Em terceiro lugar, o sistema <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> por aci<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> consumo <strong>do</strong> CDC (arts. 12 a 17), que inclui o fato <strong>do</strong> produto e o<br />

fato <strong>do</strong> serviço, apresenta-se mais completo na proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>do</strong> que aquele constante <strong>do</strong> CC, como fazem a limitação das<br />

hipóteses <strong>de</strong> exoneração da responsabilida<strong>de</strong> civil (§ 3º <strong>do</strong> art. 12) e ampliação <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r para abranger todas as<br />

vítimas <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> consumo (art. 17).<br />

Portanto, essas breves consi<strong>de</strong>rações <strong>de</strong>notam que o regime <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto <strong>do</strong> CDC continua mais<br />

vantajoso ao consumi<strong>do</strong>r <strong>do</strong> que o <strong>do</strong> CC”.<br />

Vislumbran<strong>do</strong> mais um exemplo prático, imagine-se uma farmácia <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> <strong>do</strong> interior que comercializa um lote <strong>de</strong><br />

remédios estraga<strong>do</strong>s, assim entregues por fato <strong>do</strong> fabricante. Os consumi<strong>do</strong>res ingressam com <strong>de</strong>mandas contra a farmácia com<br />

base no vício <strong>do</strong> produto. Porém, após a notícia, a farmácia fica com péssima imagem perante o merca<strong>do</strong> local, sofren<strong>do</strong> danos<br />

materiais e morais. Ingressará então a pessoa jurídica com <strong>de</strong>manda em face <strong>do</strong> fabricante <strong>do</strong>s medicamentos. Ora, é perfeitamente<br />

possível enquadrá-la como consumi<strong>do</strong>ra equiparada, nos termos <strong>do</strong> art. 17 <strong>do</strong> CDC, incidin<strong>do</strong> toda a proteção da norma<br />

consumerista. Com tom subsidiário, po<strong>de</strong> ser também utiliza<strong>do</strong> o art. 931 <strong>do</strong> CC/2002. Destaque-se que esse efeito subsidiário <strong>do</strong><br />

dispositivo priva<strong>do</strong> foi reconheci<strong>do</strong> por acórdão <strong>do</strong> Tribunal Mineiro, em <strong>de</strong>manda envolven<strong>do</strong> um consumi<strong>do</strong>r padrão:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos. Vícios <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>. Responsabilida<strong>de</strong> objetiva. Causa exclu<strong>de</strong>nte. Danos materiais e<br />

morais. 1. A responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos pelos <strong>de</strong>feitos <strong>de</strong>stes é objetiva, conforme previsto no art. 12 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, bem como na regra subsidiária contida no art. 931 <strong>do</strong> Código Civil. 2. Em casos <strong>de</strong> imputação objetiva <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar, compete à vítima provar a ocorrência <strong>do</strong> fato e que <strong>de</strong>le adveio um dano. Por outro la<strong>do</strong>, o agente po<strong>de</strong> se eximir<br />

da responsabilida<strong>de</strong> em algumas hipóteses, entre as quais se <strong>de</strong>stacam aquelas expressamente contempladas no art. 12, § 3º, <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. Não provada qualquer causa exclu<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar, impõe-se a responsabilização<br />

<strong>do</strong> agente. 4. Os danos materiais emergentes consistem naquilo que a vítima efetivamente per<strong>de</strong>u pelo inadimplemento <strong>de</strong> uma<br />

obrigação que incumbia ao agente. Demonstra<strong>do</strong>s os danos, é proce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong>. 5. Não se exige a comprovação efetiva <strong>do</strong> dano<br />

moral. No entanto, é necessário que a vítima <strong>de</strong>monstre a violação ao neminem lae<strong>de</strong>re e que a argumentação por ela trazida<br />

convença o julga<strong>do</strong>r <strong>de</strong> sua existência. Em regra, o <strong>de</strong>scumprimento contratual não enseja con<strong>de</strong>nação por danos morais. Meros<br />

dissabores, aborrecimentos, percalços <strong>do</strong> dia a dia, não são suficientes à caracterização <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Recurso provi<strong>do</strong> em<br />

parte” (TJMG – Apelação Cível 1.0471.05.045078-5/0011, Pará <strong>de</strong> Minas – Décima Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Wagner<br />

Wilson – j. 03.12.2008 – DJEMG 16.01.2009).


À luz da teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes, que procura uma interação <strong>de</strong> complementarida<strong>de</strong> entre os <strong>do</strong>is Códigos, essa parece ser<br />

a melhor conclusão, o que faz com que a discussão perca relevo. Isso é muito bem observa<strong>do</strong> por Bruno Miragem, a quem este<br />

autor está filia<strong>do</strong>, que ensina em precisas lições: “parece claro que o art. 931 <strong>do</strong> CC não po<strong>de</strong> afastar o regime legal <strong>do</strong> CDC. Mas<br />

po<strong>de</strong> somar-se a este. A presença <strong>do</strong> <strong>de</strong>feito e, <strong>de</strong> certo mo<strong>do</strong>, da presunção <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito, por ocasião <strong>do</strong> dano causa<strong>do</strong> por produtos<br />

ou serviços (cabe ao fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong>monstrar sua inexistência), é requisito necessário para fazer incidir a responsabilida<strong>de</strong> civil com<br />

fundamento no CDC. Isto não exclui que, por intermédio <strong>do</strong> diálogo das fontes, se encontre um efeito útil para a norma, sobretu<strong>do</strong><br />

em vista na finalida<strong>de</strong> da responsabilida<strong>de</strong> objetiva por danos causa<strong>do</strong>s por produtos, que em primeiro plano é a proteção <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo”.49<br />

A propósito, seguin<strong>do</strong> essa lógica <strong>de</strong> interação entre as duas leis mais importantes para o <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> Brasileiro, na VI<br />

Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, realizada em 2013, aprovou-se o Enuncia<strong>do</strong> n. 562 <strong>do</strong> CJF/STJ, segun<strong>do</strong> o qual “aos casos <strong>do</strong> art. 931 <strong>do</strong><br />

Código Civil aplicam-se as exclu<strong>de</strong>ntes da responsabilida<strong>de</strong> objetiva”. Em suma, o preceito civil <strong>de</strong>ve ser interpreta<strong>do</strong> <strong>de</strong> acor<strong>do</strong><br />

com as exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil tratadas pelo CDC, tema aborda<strong>do</strong> no tópico a seguir, que merecerá os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s<br />

aprofundamentos.<br />

4.4.<br />

EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL PELO CÓDIGO DE DEFESA DO<br />

CONSUMIDOR<br />

Como é notório, a Lei 8.078/1990 consagra exclu<strong>de</strong>ntes próprias <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil nos seus arts. 12, § 3º, e 14, § 3º,<br />

que, para afastar o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar, <strong>de</strong>vem ser provadas pelos fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res, ônus que sempre lhes cabe. O<br />

primeiro dispositivo é aplica<strong>do</strong> às hipóteses <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> pelo produto, estabelecen<strong>do</strong> o preceito que “O fabricante, o<br />

construtor, o produtor ou importa<strong>do</strong>r só não será responsabiliza<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> provar: I – que não colocou o produto no merca<strong>do</strong>; II –<br />

que, embora haja coloca<strong>do</strong> o produto no merca<strong>do</strong>, o <strong>de</strong>feito inexiste; III – a culpa exclusiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r ou <strong>de</strong> terceiro”. Ato<br />

contínuo, o último coman<strong>do</strong> trata das exclu<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar que <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> serviço, enuncian<strong>do</strong> que “O fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong><br />

serviços só não será responsabiliza<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> provar: I – que, ten<strong>do</strong> presta<strong>do</strong> o serviço, o <strong>de</strong>feito inexiste; II – a culpa exclusiva <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r ou <strong>de</strong> terceiro”. Vejamos tais exclu<strong>de</strong>ntes expostas <strong>de</strong> forma separada.<br />

4.4.1.<br />

As exclu<strong>de</strong>ntes da não colocação <strong>do</strong> produto no merca<strong>do</strong> e da ausência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito<br />

Como primeira exclu<strong>de</strong>nte, a lei menciona a não colocação <strong>do</strong> produto no merca<strong>do</strong> (art. 12, § 3º, I) e a ausência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito no<br />

produto ou no serviço (art. 12, § 3º, II e art. 14, § 3º, I). Em suma, não haverá <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar por parte <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res e<br />

presta<strong>do</strong>res se não houver dano reparável. Como é notório, ausente o dano, ausente a responsabilida<strong>de</strong> civil, <strong>de</strong>dução que po<strong>de</strong> ser<br />

retirada, entre outros, <strong>do</strong> art. 927, caput, <strong>do</strong> CC/2002. A verda<strong>de</strong> é que a ausência <strong>de</strong> dano não constitui exclu<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> civil, mas falta <strong>de</strong> um <strong>de</strong> seus pressupostos, pecan<strong>do</strong> o legisla<strong>do</strong>r consumerista por falta <strong>de</strong> melhor técnica nesse<br />

aspecto. De toda sorte, cabe alertar que cresce na <strong>do</strong>utrina e na jurisprudência nacionais a a<strong>do</strong>ção da teoria da responsabilida<strong>de</strong><br />

civil sem dano, conforme será aprofunda<strong>do</strong> mais à frente.<br />

A título <strong>de</strong> exemplificação, cumpre <strong>de</strong>stacar que muitos julga<strong>do</strong>s apontam a ausência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito como exclu<strong>de</strong>nte da<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil das empresas <strong>de</strong> cigarro, pois um produto perigoso não é <strong>de</strong>feituoso (por to<strong>do</strong>s: TJRJ – Apelação Cível<br />

3531/2002, Rio <strong>de</strong> Janeiro – Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Luiz Zveiter – j. 21.05.2002). O tema ainda será aprofunda<strong>do</strong> no<br />

presente capítulo. Todavia, já fica clara a opinião <strong>do</strong> presente autor, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que há, no cigarro, um <strong>de</strong>feito na sua própria<br />

concepção, surgin<strong>do</strong> daí o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar das empresas tabagistas.<br />

Também para ilustrar, concluiu o Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> Minas Gerais que “Não sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>monstrada a existência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito no<br />

princípio ativo <strong>do</strong> contraceptivo fabrica<strong>do</strong> pela ré e o nexo causal entre a gravi<strong>de</strong>z da autora e o uso <strong>do</strong> produto, não há se falar em<br />

<strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar” (TJMG – Apelação Cível 0901337-22.2003.8.13.0433, Montes Claros – Décima Sexta Câmara Cível – Rel.<br />

Des. Wagner Wilson – j. 20.10.2010 – DJEMG 19.11.2010).<br />

A alegação <strong>de</strong> ausência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito po<strong>de</strong>, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, ser utilizada em casos <strong>de</strong> serviços médicos presta<strong>do</strong>s a contento,<br />

não haven<strong>do</strong> qualquer equívoco na atuação <strong>do</strong> profissional, o que serve para afastar o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar <strong>do</strong> médico e <strong>do</strong> hospital<br />

(veja-se: TJPR – Apelação Cível 0698808-7, Curitiba – Décima Câmara Cível – Rel. Juiz Convoca<strong>do</strong> Albino Jacomel Guerios –<br />

DJPR 15.10.2010, p. 516; TJRS – Apelação Cível 70023295231, Santa Cruz <strong>do</strong> Sul – Décima Câmara Cível – Rel. Des. Paulo<br />

Roberto Lessa Franz – j. 09.10.2008 – DOERS 23.10.2008, p. 52; e TJRS – Apelação Cível 70013749148, Porto Alegre – Décima<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Paulo Roberto Lessa Franz – j. 26.01.2006).<br />

Sobre a ausência <strong>de</strong> dano, <strong>de</strong>ve ser feito um aparte, notadamente a respeito <strong>do</strong>s danos morais, os danos imateriais que atingem<br />

direitos da personalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Isso porque são comuns no Brasil as <strong>de</strong>mandas frívolas, em que se pleiteia a in<strong>de</strong>nização


imaterial sem qualquer fundamento para tanto.50 Como bem <strong>de</strong>cidi<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> da III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, “O dano moral,<br />

assim compreendi<strong>do</strong> to<strong>do</strong> o dano extrapatrimonial, não se caracteriza quan<strong>do</strong> há mero aborrecimento inerente a prejuízo material”<br />

(Enuncia<strong>do</strong> n. 159 <strong>do</strong> CJF/STJ).<br />

De início, vejamos acórdão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que afastou a in<strong>de</strong>nização pela aquisição <strong>de</strong> um pacote <strong>de</strong> bolachas<br />

com um objeto metálico, que não foi ingeri<strong>do</strong>:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Produto impróprio para o consumo. Objeto metálico crava<strong>do</strong> em bolacha <strong>do</strong> tipo ‘água e sal’. Objeto não<br />

ingeri<strong>do</strong>. Dano moral inexistente. 1. A simples aquisição <strong>de</strong> bolachas <strong>do</strong> tipo ‘água e sal’, em pacote no qual uma <strong>de</strong>las se<br />

encontrava com objeto metálico que a tornava imprópria para o consumo, sem que houvesse ingestão <strong>do</strong> produto, não acarreta dano<br />

moral apto a ensejar reparação. Prece<strong>de</strong>ntes. 2. Verifica-se, pela moldura fática apresentada no acórdão, que houve inequivocamente<br />

vício <strong>do</strong> produto que o tornou impróprio para o consumo, nos termos <strong>do</strong> art. 18, caput, <strong>do</strong> CDC. Porém, não se verificou o aci<strong>de</strong>nte<br />

<strong>de</strong> consumo, ou, consoante o art. 12 <strong>do</strong> CDC, o fato <strong>do</strong> produto, por isso <strong>de</strong>scabe a in<strong>de</strong>nização pretendida. 3. De ofício, a Turma<br />

<strong>de</strong>terminou a expedição <strong>de</strong> cópias à agência sanitária regula<strong>do</strong>ra para apurar eventual responsabilida<strong>de</strong> administrativa. 4. Recurso<br />

especial principal provi<strong>do</strong> e a<strong>de</strong>sivo prejudica<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1131139/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j.<br />

16.11.2010 – DJe 01.12.2010).<br />

De fato, aquele Tribunal Superior vinha enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> que, no caso <strong>de</strong> não ingestão <strong>do</strong> produto com problemas, não há que se<br />

falar em dano moral, conclusão a<strong>do</strong>tada para o caso <strong>de</strong> refrigerante com um inseto no seu interior (STJ – REsp 747.396/DF –<br />

Quarta Turma – Rel. Min. Fernan<strong>do</strong> Gonçalves – j. 09.03.2010 – DJe 22.03.2010). Por outra via, se o produto for ingeri<strong>do</strong>, caberia<br />

in<strong>de</strong>nização por dano moral, conforme se extrai <strong>do</strong> seguinte acórdão, publica<strong>do</strong> no recente Informativo n. 472 <strong>do</strong> STJ:<br />

“Dano moral. Consumi<strong>do</strong>r. Alimento. Ingestão. Inseto. Trata-se <strong>de</strong> REsp em que a controvérsia resi<strong>de</strong> em <strong>de</strong>terminar a<br />

responsabilida<strong>de</strong> da recorrente pelos danos morais alega<strong>do</strong>s pelo recorri<strong>do</strong>, que afirma ter encontra<strong>do</strong> uma barata no interior da lata<br />

<strong>de</strong> leite con<strong>de</strong>nsa<strong>do</strong> por ela fabrica<strong>do</strong>, bem como em verificar se tal fato é capaz <strong>de</strong> gerar abalo psicológico in<strong>de</strong>nizável. A Turma<br />

enten<strong>de</strong>u, entre outras questões, ser incontroverso, conforme os autos, que havia uma barata <strong>de</strong>ntro da lata <strong>de</strong> leite con<strong>de</strong>nsa<strong>do</strong><br />

adquirida pelo recorri<strong>do</strong>, já que o recipiente foi aberto na presença <strong>de</strong> testemunhas, funcionários <strong>do</strong> Procon, e o lau<strong>do</strong> pericial<br />

permite concluir que a barata não entrou espontaneamente pelos furos abertos na lata, tampouco foi através <strong>de</strong>les introduzida, não<br />

haven<strong>do</strong>, portanto, ofensa ao art. 12, § 3º, <strong>do</strong> CDC, notadamente porque não comprovada a existência <strong>de</strong> culpa exclusiva <strong>do</strong><br />

recorri<strong>do</strong>, permanecen<strong>do</strong> hígida a responsabilida<strong>de</strong> objetiva da socieda<strong>de</strong> empresária fornece<strong>do</strong>ra, ora recorrente. Por outro la<strong>do</strong>,<br />

consignou-se que a in<strong>de</strong>nização <strong>de</strong> R$ 15 mil fixada pelo tribunal a quo não se mostra exorbitante. Consi<strong>de</strong>rou-se a sensação <strong>de</strong><br />

náusea, asco e repugnância que acomete aquele que <strong>de</strong>scobre ter ingeri<strong>do</strong> alimento contamina<strong>do</strong> por um inseto morto, sobretu<strong>do</strong><br />

uma barata, artrópo<strong>de</strong> notadamente sujo, que vive nos esgotos e traz consigo o risco <strong>de</strong> inúmeras <strong>do</strong>enças. Note-se que, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong><br />

com a sentença, o recorrente já havia consumi<strong>do</strong> parte <strong>do</strong> leite con<strong>de</strong>nsa<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong>, por uma das pequenas aberturas feitas para<br />

sorver o produto chupan<strong>do</strong> da própria lata, observou algo estranho sain<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>las, ou seja, houve contato direto com o inseto,<br />

o que aumenta a sensação <strong>de</strong> mal-estar. Além disso, não há dúvida <strong>de</strong> que essa sensação se protrai no tempo, causan<strong>do</strong> incômo<strong>do</strong><br />

durante longo perío<strong>do</strong>, vin<strong>do</strong> à tona sempre que se alimenta, em especial <strong>do</strong> produto que originou o problema, interferin<strong>do</strong><br />

profundamente no cotidiano da pessoa” (STJ – REsp 1.239.060/MG – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 10.05.2011).<br />

Em 2014, surgiu outra tendência no Tribunal da Cidadania, que passou a consi<strong>de</strong>rar a reparação <strong>de</strong> danos imateriais mesmo<br />

nos casos em que o produto não é consumi<strong>do</strong>. Inaugurou-se, assim, uma forma <strong>de</strong> julgar que admite a reparação civil pelo perigo<br />

<strong>de</strong> dano, não mais tratada a hipótese como <strong>de</strong> mero aborrecimento ou transtorno cotidiano. Vejamos o teor da ementa, que foi<br />

publicada no Informativo n. 537 daquela Corte Superior:<br />

“Recurso especial. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Ação <strong>de</strong> compensação por dano moral. Aquisição <strong>de</strong> garrafa <strong>de</strong> refrigerante conten<strong>do</strong><br />

corpo estranho em seu conteú<strong>do</strong>. Não ingestão. Exposição <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r a risco concreto <strong>de</strong> lesão à sua saú<strong>de</strong> e segurança. Fato <strong>do</strong><br />

produto. Existência <strong>de</strong> dano moral. Violação <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> não acarretar riscos ao consumi<strong>do</strong>r. Ofensa ao direito fundamental à<br />

alimentação a<strong>de</strong>quada. Artigos analisa<strong>do</strong>s: 4º, 8º, 12 e 18, CDC, e 2º, Lei 11.346/2006. 1. Ação <strong>de</strong> compensação por dano moral,<br />

ajuizada em 20.04.2007, da qual foi extraí<strong>do</strong> o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 10.06.2013. 2. Discute-se a<br />

existência <strong>de</strong> dano moral na hipótese em que o consumi<strong>do</strong>r adquire garrafa <strong>de</strong> refrigerante com corpo estranho em seu conteú<strong>do</strong>,<br />

sem, contu<strong>do</strong>, ingeri-lo. 3. A aquisição <strong>de</strong> produto <strong>de</strong> gênero alimentício conten<strong>do</strong> em seu interior corpo estranho, expon<strong>do</strong> o<br />

consumi<strong>do</strong>r a risco concreto <strong>de</strong> lesão à sua saú<strong>de</strong> e segurança, ainda que não ocorra a ingestão <strong>de</strong> seu conteú<strong>do</strong>, dá direito à<br />

compensação por dano moral, dada a ofensa ao direito fundamental à alimentação a<strong>de</strong>quada, corolário <strong>do</strong> princípio da dignida<strong>de</strong> da<br />

pessoa humana. 4. Hipótese em que se caracteriza <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> produto (art. 12, CDC), o qual expõe o consumi<strong>do</strong>r a risco concreto <strong>de</strong><br />

dano à sua saú<strong>de</strong> e segurança, em clara infringência ao <strong>de</strong>ver legal dirigi<strong>do</strong> ao fornece<strong>do</strong>r, previsto no art. 8º <strong>do</strong> CDC. 5. Recurso<br />

especial não provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1.424.304/SP – Rel. Min. Nancy Andrighi – Terceira Turma – j. 11.03.2014 – DJe 19.05.2014).<br />

Na <strong>do</strong>utrina contemporânea, o tema é trata<strong>do</strong> por Pablo Malheiros da Cunha Frota, em sua tese <strong>de</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> <strong>de</strong>fendida na<br />

UFPR.51 Destaca o professor que os juristas presentes no encontro <strong>de</strong> 2013 <strong>do</strong>s Grupos <strong>de</strong> Pesquisa em <strong>Direito</strong> Civil<br />

Constitucional, li<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s pelos Professores Gustavo Tepedino (UERJ), Luiz Edson Fachin (UFPR) e Paulo Lôbo (UFPE), editaram


a Carta <strong>de</strong> Recife. Nas suas palavras, “um <strong>do</strong>s pontos <strong>de</strong>bati<strong>do</strong>s e que se encontra na Carta <strong>de</strong> Recife, <strong>do</strong>cumento hauri<strong>do</strong> das<br />

reflexões apresentadas pelos pesquisa<strong>do</strong>res no cita<strong>do</strong> encontro, foi justamente a preocupação com essa situação <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> com e sem dano, como consta <strong>do</strong> seguinte trecho da aludida Carta: ‘A análise crítica <strong>do</strong> dano na<br />

contemporaneida<strong>de</strong> impõe o caminho <strong>de</strong> reflexão sobre a eventual possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se cogitar da responsabilida<strong>de</strong> sem dano’”.52<br />

Sem dúvidas, essa reflexão é imperiosa e po<strong>de</strong>rá alterar todas as balizas teóricas da responsabilida<strong>de</strong> civil, especialmente no<br />

âmbito das relações <strong>de</strong> consumo. O gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>safio, entretanto, é saber <strong>de</strong>terminar os limites para a nova tese, que po<strong>de</strong> gerar<br />

situações <strong>de</strong> injustiça, mormente <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong>s totalmente imotiva<strong>do</strong>s, funda<strong>do</strong>s em meros aborrecimentos.<br />

A propósito <strong>de</strong>sse <strong>de</strong>bate, a respeito <strong>do</strong> fato <strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r ter encontra<strong>do</strong> um corpo estanho em um produto, mas sem<br />

consumi-lo, surgiram arestos posteriores, afastan<strong>do</strong> a posição inaugurada pela Ministra Nancy Andrighi no Recurso Especial n.<br />

1.424.304/SP. Assim julgan<strong>do</strong>: “No âmbito da jurisprudência <strong>do</strong> STJ, não se configura o dano moral quan<strong>do</strong> ausente a ingestão <strong>do</strong><br />

produto consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> impróprio para o consumo, em virtu<strong>de</strong> da presença <strong>de</strong> objeto estranho no seu interior, por não extrapolar o<br />

âmbito individual que justifique a litigiosida<strong>de</strong>, porquanto atendida a expectativa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em sua dimensão plural. A<br />

tecnologia utilizada nas embalagens <strong>do</strong>s refrigerantes é padronizada e guarda, na essência, os mesmos atributos e as mesmas<br />

qualida<strong>de</strong>s no mun<strong>do</strong> inteiro. Inexiste um sistemático <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> segurança capaz <strong>de</strong> colocar em risco a incolumida<strong>de</strong> da socieda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> consumo, a culminar no <strong>de</strong>srespeito à dignida<strong>de</strong> da pessoa humana, no <strong>de</strong>sprezo à saú<strong>de</strong> pública e no <strong>de</strong>scaso com a segurança<br />

alimentar” (STJ – 1.395.647/SC – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – Terceira Turma – j. 18.11.2014 – DJe 19.12.2014). E,<br />

ainda: “A jurisprudência <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça se consoli<strong>do</strong>u no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a ausência <strong>de</strong> ingestão <strong>de</strong> produto<br />

impróprio para o consumo configura, em regra, hipótese <strong>de</strong> mero dissabor vivencia<strong>do</strong> pelo consumi<strong>do</strong>r, o que afasta eventual<br />

pretensão in<strong>de</strong>nizatória <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> alega<strong>do</strong> dano moral. Prece<strong>de</strong>ntes” (STJ – AgRg no AREsp 489.030/SP – Rel. Min. Luis<br />

Felipe Salomão – Quarta Turma – j. 16.04.2015 – DJe 27.04.2015).<br />

A <strong>de</strong>monstrar toda essa divergência, pontue-se que na Edição n. 39 da ferramenta Jurisprudência em Teses, <strong>do</strong> próprio STJ e<br />

que trata <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, po<strong>de</strong>m ser encontradas premissas conflitantes sobre o tema. Conforme a tese número 2, “a<br />

simples aquisição <strong>do</strong> produto consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> impróprio para o consumo, em virtu<strong>de</strong> da presença <strong>de</strong> corpo estranho, sem que se tenha<br />

ingeri<strong>do</strong> o seu conteú<strong>do</strong>, não revela o sofrimento capaz <strong>de</strong> ensejar in<strong>de</strong>nização por danos morais”. Por outra via, nos termos da tese<br />

3, “a aquisição <strong>de</strong> produto <strong>de</strong> gênero alimentício conten<strong>do</strong> em seu interior corpo estranho, expon<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r a risco concreto<br />

<strong>de</strong> lesão à sua saú<strong>de</strong> e segurança, ainda que não ocorra a ingestão <strong>de</strong> seu conteú<strong>do</strong>, dá direito à compensação por dano moral, dada<br />

a ofensa ao direito fundamental à alimentação a<strong>de</strong>quada, corolário <strong>do</strong> princípio da dignida<strong>de</strong> da pessoa humana”. Em resumo, o<br />

tema ainda está aberto para ser discuti<strong>do</strong> nos meios jurídicos, teóricos e práticos, especialmente porque o STJ <strong>de</strong>ve manter a sua<br />

jurisprudência estável, íntegra e coerente, conforme consta <strong>do</strong> art. 926 <strong>do</strong> Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

Partin<strong>do</strong> para outro caso concreto, <strong>de</strong>duzia-se, em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, que a aquisição <strong>de</strong> um veículo novo<br />

com vício, por si só, não geraria danos morais in<strong>de</strong>nizáveis:<br />

“Recurso especial. Violação ao art. 535 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. Inocorrência. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Compra <strong>de</strong> veículo ‘zero’<br />

<strong>de</strong>feituoso. Danos morais. Inexistência. Mero dissabor. I. Não há falar em maltrato ao disposto no art. 535 da lei <strong>de</strong> ritos quan<strong>do</strong> a<br />

matéria enfocada é <strong>de</strong>vidamente abordada no âmbito <strong>do</strong> acórdão recorri<strong>do</strong>. II. Os danos morais surgem em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> uma<br />

conduta ilícita ou injusta, que venha a causar forte sentimento negativo em qualquer pessoa <strong>de</strong> senso comum, como vexame,<br />

constrangimento, humilhação, <strong>do</strong>r. Isso, entretanto, não se vislumbra no caso <strong>do</strong>s autos, uma vez que os aborrecimentos ficaram<br />

limita<strong>do</strong>s à indignação da pessoa, sem qualquer repercussão no mun<strong>do</strong> exterior. Recurso especial parcialmente provi<strong>do</strong>” (STJ –<br />

REsp 628.854/ES – Terceira Turma – Rel. Min. Castro Filho – j. 03.05.2007 – DJ 18.06.2007, p. 255).<br />

Porém, mais recentemente, o mesmo Tribunal <strong>de</strong> Cidadania concluiu que é cabível a reparação <strong>de</strong> danos morais quan<strong>do</strong> o<br />

consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> automóvel zero quilômetro necessita retornar à concessionária por diversas vezes para reparar <strong>de</strong>feitos apresenta<strong>do</strong>s<br />

no veículo adquiri<strong>do</strong> (STJ – REsp 1.443.268/DF – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 03.06.2014 – publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 544).<br />

Em 2015, a premissa foi confirmada por ementa publicada pelo STJ na ferramenta Jurisprudência em Teses, Edição n. 42, <strong>de</strong><br />

2015, com o seguinte teor: “é cabível in<strong>de</strong>nização por dano moral quan<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> veículo zero-quilômetro necessita<br />

retornar à concessionária por diversas vezes para reparo <strong>de</strong> <strong>de</strong>feitos apresenta<strong>do</strong>s no veículo”. Além <strong>do</strong> prece<strong>de</strong>nte anterior, são<br />

cita<strong>do</strong>s os seguintes acórdãos, no mesmo senti<strong>do</strong>: AgRg no AREsp 692.459/SC – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – Quarta Turma –<br />

j. 16.06.2015 – DJe 23.06.2015; AgRg no AREsp 453.644/PR – Rel. Min. Raul Araújo – Quarta Turma – j. 21.05.2015 – DJe<br />

22.06.2015; AgRg no AREsp 672.872/PR – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – Terceira Turma – j. 26.05.2015 – DJe 10.06.2015;<br />

AgRg no AREsp 533.916/RJ – Rel. Min. João Otávio De Noronha – Terceira Turma – j. 05.05.2015 – DJe 11.05.2015; AgRg no<br />

REsp 1.368.742/DF – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – Quarta Turma – j. 17.03.2015 – DJe 24.03.2015; AgRg no AREsp<br />

385.994/MS – Rel. Min. Maria Isabel Gallotti – Quarta Turma – j. 25.11.2014 – DJe 10.12.2014 e REsp 1.395.285/SP – Rel. Min.<br />

Nancy Andrighi – Terceira Turma – j. 03.12.2013 – DJe 12.12.2013). Como se verá a seguir, o novo entendimento parece ter


elação com a teoria da perda <strong>do</strong> tempo útil, analisada a seguir.<br />

Ainda para ilustrar a respeito <strong>do</strong>s transtornos, <strong>do</strong> Informativo n. 463 <strong>do</strong> STJ extrai-se ementa segun<strong>do</strong> a qual o envio ao<br />

consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> cartão pré-pago não gera dano moral, haven<strong>do</strong> apenas uma má-prestação <strong>de</strong> serviços, sem maiores repercussões no<br />

campo <strong>de</strong> prejuízos:<br />

“Dano moral. Cartão megabônus. O envio ao consumi<strong>do</strong>r <strong>do</strong> <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> cartão megabônus (cartão pré-pago vincula<strong>do</strong> a programa<br />

<strong>de</strong> recompensas) com informações que levariam a crer tratar-se <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>iro cartão <strong>de</strong> crédito não dá ensejo à reparação <strong>de</strong> dano<br />

moral, apesar <strong>de</strong> configurar, conforme as instâncias ordinárias, má prestação <strong>de</strong> serviço ao consumi<strong>do</strong>r. Mesmo constata<strong>do</strong> causar<br />

certo incômo<strong>do</strong> ao contratante, o envio não repercute <strong>de</strong> forma significativa na esfera subjetiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Também assim, a<br />

tentativa <strong>de</strong> utilizar o cartão como se fosse <strong>de</strong> crédito não vulnera a dignida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, mostran<strong>do</strong>-se apenas como mero<br />

dissabor. Anote-se haver multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ações que buscam essa reparação (mais <strong>de</strong> 60 mil) e que já foi editada a Súm. 149-TJRJ,<br />

<strong>do</strong> mesmo teor <strong>de</strong>ste julgamento. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: REsp 1.072.308-RS, DJe 10.06.2010; REsp 876.527-RJ, DJe 28.04.2008;<br />

REsp 338.162-MG, DJ 18.02.2002; REsp 590.512-MG, DJ 17.12.2004, e REsp 403.919-MG, DJ 04.08.2003” (STJ – REsp<br />

1.151.688-RJ – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 17.02.2011).<br />

Na mesma linha, tem-se entendi<strong>do</strong>, naquela Corte Superior, que o mero lançamento <strong>de</strong> valor incorreto na cobrança <strong>do</strong> cartão<br />

<strong>de</strong> crédito, por si só, não gera dano moral in<strong>de</strong>nizável. Nos termos <strong>de</strong> aresto publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 479, que elenca várias<br />

situações que servem <strong>de</strong> ilustração, “não há dano moral in re ipsa quan<strong>do</strong> a causa <strong>de</strong> pedir da ação se constitui unicamente na<br />

inclusão <strong>de</strong> valor in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> na fatura <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r. Assim como o saque in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>, também o simples<br />

recebimento <strong>de</strong> fatura <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito na qual incluída cobrança in<strong>de</strong>vida não constitui ofensa a direito da personalida<strong>de</strong><br />

(honra, imagem, privacida<strong>de</strong>, integrida<strong>de</strong> física); não causa, portanto, dano moral objetivo, in re ipsa. Aliás, o STJ já se<br />

pronunciou no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a cobrança in<strong>de</strong>vida <strong>de</strong> serviço não contrata<strong>do</strong>, da qual não resultara inscrição nos órgãos <strong>de</strong><br />

proteção ao crédito, ou até mesmo a simples prática <strong>de</strong> ato ilícito não têm por consequência a ocorrência <strong>de</strong> dano moral (AgRg no<br />

AREsp 316.452-RS, Quarta Turma, DJe 30/9/2013; e AgRg no REsp 1.346.581-SP, Terceira Turma, DJe 12/11/2012). Além<br />

disso, em outras oportunida<strong>de</strong>s, enten<strong>de</strong>u o STJ que certas falhas na prestação <strong>de</strong> serviço bancário, como a recusa na aprovação <strong>de</strong><br />

crédito e bloqueio <strong>de</strong> cartão, não geram dano moral in re ipsa (AgRg nos EDcl no AREsp 43.739-SP, Quarta Turma, DJe<br />

4/2/2013; e REsp 1.365.281-SP, Quarta Turma, DJe 23/8/2013). Portanto, o envio <strong>de</strong> cobrança in<strong>de</strong>vida não acarreta, por si só,<br />

dano moral objetivo, in re ipsa, na medida em que não ofen<strong>de</strong> direito da personalida<strong>de</strong>. A configuração <strong>do</strong> dano moral <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá<br />

da consi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> caso concreto, a serem alegadas e comprovadas nos autos. Com efeito, a jurisprudência tem<br />

entendi<strong>do</strong> caracteriza<strong>do</strong> dano moral quan<strong>do</strong> evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong> abuso na forma <strong>de</strong> cobrança, com publicida<strong>de</strong> negativa <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, reiteração da cobrança in<strong>de</strong>vida, inscrição em cadastros <strong>de</strong> inadimplentes, protesto, ameaças <strong>de</strong>scabidas, <strong>de</strong>scrédito,<br />

coação, constrangimento, ou interferência malsã na sua vida social, por exemplo (REsp 326.163-RJ, Quarta Turma, DJ<br />

13/11/2006; e REsp 1.102.787-PR, Terceira Turma, DJe 29/3/2010). Esse entendimento é mais compatível com a dinâmica atual<br />

<strong>do</strong>s meios <strong>de</strong> pagamento, por meio <strong>de</strong> cartões e internet, os quais facilitam a circulação <strong>de</strong> bens, mas, por outro la<strong>do</strong>, ensejam<br />

frau<strong>de</strong>s, as quais, quan<strong>do</strong> ocorrem, <strong>de</strong>vem ser coibidas, propician<strong>do</strong>-se o ressarcimento <strong>do</strong> lesa<strong>do</strong> na exata medida <strong>do</strong> prejuízo”<br />

(STJ – REsp 1.550.509/RJ – Rel. Min. Maria Isabel Gallotti – j. 03.03.2016 – DJe 14.03.2016).<br />

O que se concluiu, acertadamente, é que o mero <strong>de</strong>scumprimento <strong>do</strong> negócio <strong>de</strong> consumo ou a má-prestação <strong>do</strong> serviço, por si,<br />

não gera dano moral ao consumi<strong>do</strong>r. Pelo bom senso, pela equida<strong>de</strong> e pelas máximas <strong>de</strong> experiência, <strong>de</strong>ve estar evi<strong>de</strong>nciada a<br />

lesão aos direitos da personalida<strong>de</strong>, para que se possa falar em dano imaterial reparável. Isso, para que o nobre instituto <strong>do</strong> dano<br />

moral não caia em <strong>de</strong>sprestígio.<br />

Um caso em que a lesão a direito da personalida<strong>de</strong> parece estar presente diz respeito à situação concreta em que o consumi<strong>do</strong>r<br />

envia uma carta registrada que não atinge o seu <strong>de</strong>stinatário. Como bem pontuou a Segunda Seção <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça,<br />

em acórdão publica<strong>do</strong> no ano <strong>de</strong> 2015, “a contratação <strong>de</strong> serviços postais ofereci<strong>do</strong>s pelos Correios, por meio <strong>de</strong> tarifa especial,<br />

para envio <strong>de</strong> carta registrada, que permite o posterior rastreamento pelo próprio órgão <strong>de</strong> postagem revela a existência <strong>de</strong> contrato<br />

<strong>de</strong> consumo, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> a fornece<strong>do</strong>ra respon<strong>de</strong>r objetivamente ao cliente por danos morais advin<strong>do</strong>s da falha <strong>do</strong> serviço quan<strong>do</strong> não<br />

comprovada a efetiva entrega. É incontroverso que o embarga<strong>do</strong> sofreu danos morais <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> extravio <strong>de</strong> sua<br />

correspondência, motivo pelo qual o montante in<strong>de</strong>nizatório fixa<strong>do</strong> em R$ 1.000,00 (mil reais) pelas instâncias ordinárias foi<br />

manti<strong>do</strong> pelo acórdão proferi<strong>do</strong> pela Quarta Turma, porquanto razoável, sob pena <strong>de</strong> enriquecimento sem causa” (STJ – EREsp<br />

1.097.266/PB – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – Segunda Seção – j. 10.12.2014 – DJe 24.02.2015). Lamenta-se apenas o<br />

valor que foi fixa<strong>do</strong> a título <strong>de</strong> reparação imaterial, irrisório na opinião <strong>de</strong>ste autor.<br />

Assim, <strong>de</strong>ve-se atentar para louvável ampliação <strong>do</strong>s casos <strong>de</strong> dano moral, em que está presente um aborrecimento relevante,<br />

notadamente pela perda <strong>do</strong> tempo útil. Essa ampliação <strong>de</strong> situações danosas, inconcebíveis no passa<strong>do</strong>, representa um caminhar<br />

para a reflexão da responsabilida<strong>de</strong> civil sem dano, na nossa opinião. Como bem exposto por Vitor Guglinski, “a ocorrência


sucessiva e acintosa <strong>de</strong> mau atendimento ao consumi<strong>do</strong>r, geran<strong>do</strong> a perda <strong>de</strong> tempo útil, tem leva<strong>do</strong> a jurisprudência a dar seus<br />

primeiros passos para solucionar os dissabores experimenta<strong>do</strong>s por milhares <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res, passan<strong>do</strong> a admitir a reparação civil<br />

pela perda <strong>do</strong> tempo livre”.53<br />

A título <strong>de</strong> exemplo, fato corriqueiro que é, po<strong>de</strong>r-se-ia imaginar que uma espera exagerada em fila <strong>de</strong> banco constituiria um<br />

mero aborrecimento, não caracteriza<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano moral ao consumi<strong>do</strong>r. Todavia, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça tem entendi<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

forma contrária, con<strong>de</strong>nan<strong>do</strong> a instituição pelo excesso <strong>de</strong> tempo perdi<strong>do</strong> pelo usuário <strong>do</strong> serviço. O <strong>de</strong>cisum foi assim publicada<br />

no Informativo n. 504 daquela Corte Superior:<br />

“O dano moral <strong>de</strong>corrente da <strong>de</strong>mora no atendimento ao cliente não surge apenas da violação <strong>de</strong> legislação que estipula tempo<br />

máximo <strong>de</strong> espera, mas <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da verificação <strong>do</strong>s fatos que causaram sofrimento além <strong>do</strong> normal ao consumi<strong>do</strong>r. Isso porque a<br />

legislação que <strong>de</strong>termina o tempo máximo <strong>de</strong> espera tem cunho administrativo e trata da responsabilida<strong>de</strong> da instituição financeira<br />

perante a Administração Pública, a qual po<strong>de</strong>rá aplicar sanções às instituições que <strong>de</strong>scumprirem a norma. Assim, a extrapolação <strong>do</strong><br />

tempo <strong>de</strong> espera <strong>de</strong>verá ser consi<strong>de</strong>rada como um <strong>do</strong>s elementos analisa<strong>do</strong>s no momento da verificação da ocorrência <strong>do</strong> dano<br />

moral. No caso, além da <strong>de</strong>mora <strong>de</strong>sarrazoada no atendimento, a cliente encontrava-se com a saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>bilitada e permaneceu o<br />

tempo to<strong>do</strong> em pé, caracterizan<strong>do</strong> indiferença <strong>do</strong> banco quanto à situação. Para a Turma, o somatório <strong>de</strong>ssas circunstâncias<br />

caracterizou o dano moral. Por fim, o colegia<strong>do</strong> enten<strong>de</strong>u razoável o valor da in<strong>de</strong>nização em R$ 3 mil, ante o caráter pedagógico da<br />

con<strong>de</strong>nação. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: AgRg no Ag 1.331.848-SP, DJe 13.09.2011; REsp 1.234.549-SP, DJe 10.02.2012, e REsp<br />

598.183-DF, DJe 27.11.2006” (STJ – REsp 1.218.497/MT – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 11.09.2012).<br />

Sem dúvidas, trata-se <strong>de</strong> uma importante mudança no pensamento <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>res brasileiros, bem como <strong>de</strong> expressiva<br />

ampliação da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> dano moral.<br />

Cabe ressaltar que o tema foi objeto <strong>de</strong> proposta <strong>de</strong> enuncia<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> da VI Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, em 2013, formulada por<br />

Wladimir Alcebía<strong>de</strong>s Marinho Falcão Cunha e que contou com o forte apoio <strong>de</strong>ste autor. A proposição tinha o seguinte teor: “As<br />

microlesões <strong>do</strong> dia a dia, relacionadas à alteração da rotina e/ou <strong>do</strong> curso natural da vida <strong>do</strong> indivíduo em situações cotidianas <strong>do</strong><br />

tráfego jurídico-econômico comum (labor, consumo, lazer etc.), vin<strong>do</strong> a ocasionar aborrecimentos relevantes e não meros<br />

aborrecimentos, integram a acepção lata <strong>de</strong> dano, pois também significam lesão a interesses ou bens jurídicos liga<strong>do</strong>s à<br />

personalida<strong>de</strong> humana, ainda que em escala menos grave <strong>do</strong> que nos danos extrapatrimoniais. Como tal, tais lesões constituem<br />

danos extrapatrimoniais residuais e <strong>de</strong>vem também ser in<strong>de</strong>nizadas”. Infelizmente, por uma pequena margem <strong>de</strong> votos, a proposta<br />

não foi aprovada naquele evento, que se tornou o mais importante <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> Brasileiro.<br />

De toda sorte, a questão <strong>de</strong>ve ser refletida pela comunida<strong>de</strong> jurídica nacional, uma vez que o filtro relativo aos meros<br />

aborrecimentos muitas vezes tem afasta<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>s justos <strong>de</strong> reparação imaterial <strong>de</strong> direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

4.4.2.<br />

A exclu<strong>de</strong>nte da culpa ou fato exclusivo <strong>de</strong> terceiro<br />

A culpa ou fato exclusivo <strong>de</strong> terceiro é fator obstante <strong>do</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>, constituin<strong>do</strong> uma das exclu<strong>de</strong>ntes da<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil consumerista. Não se po<strong>de</strong> esquecer que o nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> constitui a relação <strong>de</strong> causa e efeito entre a<br />

conduta <strong>do</strong> agente e o dano causa<strong>do</strong>.54 Assim sen<strong>do</strong>, as exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> nexo servem para qualquer modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong>, seja ela subjetiva ou objetiva.<br />

Apesar <strong>de</strong> a lei mencionar a culpa exclusiva <strong>de</strong> terceiro, seria melhor utilizar o termo fato exclusivo <strong>de</strong> terceiro, uma vez que a<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil pelo CDC, em regra, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> culpa, o que po<strong>de</strong> gerar a confusão. Na verda<strong>de</strong>, a expressão fato<br />

exclusivo é concebida em senti<strong>do</strong> amplo, a englobar a culpa (<strong>de</strong>srespeito a um <strong>de</strong>ver preexistente) e o risco assumi<strong>do</strong> por outrem<br />

(conduta acima da situação <strong>de</strong> normalida<strong>de</strong>, uma iminência <strong>de</strong> perigo que po<strong>de</strong> causar dano). Muitos acórdãos, acertadamente,<br />

preferem a expressão ampla (por to<strong>do</strong>s: TJSP – Apelação 9059293-06.2004.8.26.0000 – Acórdão 4978699, Bauru – Vigésima<br />

Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Rômolo Russo – j. 24.02.2011 – DJESP 23.03.2011; TJRS – Recurso Cível<br />

71002709756, Porto Alegre – Primeira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Leandro Raul Klippel – j. 26.08.2010 – DJERS<br />

02.09.2010; TJRJ – Apelação 2009.001.05440 – Primeira Câmara Cível – Rel. Des. Camilo Ribeiro Ruliere – j. 27.05.2009 –<br />

DORJ 14.07.2009, p. 55; e TJPR – Apelação Cível 0473497-4, Foz <strong>do</strong> Iguaçu – Décima Câmara Cível – Rel. Des. Marcos <strong>de</strong> Luca<br />

Fanchin – DJPR 08.08.2008, p. 113).<br />

Deve ficar claro que esse terceiro <strong>de</strong>ve ser pessoa totalmente estranha à relação jurídica estabelecida. Se houver qualquer<br />

relação <strong>de</strong> confiança ou <strong>de</strong> pressuposição entre tal terceiro e o fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r, o último respon<strong>de</strong>rá. Anote-se que, nos<br />

casos envolven<strong>do</strong> a oferta ou publicida<strong>de</strong>, há norma específica a respeito da relação <strong>de</strong> pressuposição <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s com a<br />

publicida<strong>de</strong>, no art. 34 da Lei 8.078/1990.<br />

Como bem observa Sérgio Cavalieri Filho, “terceiro que integra a corrente produtiva, ainda que remotamente, não é terceiro; é<br />

fornece<strong>do</strong>r solidário. Assim, se a enfermeira, por <strong>de</strong>scui<strong>do</strong> ou intencionalmente, aplica medicamente erra<strong>do</strong> no paciente – ou em


<strong>do</strong>se excessiva – causan<strong>do</strong>-lhe a morte, não haverá nenhuma responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>do</strong> medicamento. O aci<strong>de</strong>nte não<br />

<strong>de</strong>correu <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> produto, mas da exclusiva conduta da enfermeira, caso em que <strong>de</strong>verá respon<strong>de</strong>r o hospital por <strong>de</strong>feito <strong>do</strong><br />

serviço”.55 Por razões óbvias, o comerciante não po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> um terceiro no caso <strong>de</strong> um <strong>de</strong>feito que atinge o produto.<br />

Por to<strong>do</strong>s os julga<strong>do</strong>s, colaciona-se:<br />

“<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Recurso especial. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais e materiais. Consumo <strong>de</strong> produto coloca<strong>do</strong> em<br />

circulação quan<strong>do</strong> seu prazo <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> já havia transcorri<strong>do</strong>. ‘Arrozina Tradicional’ vencida que foi consumida por bebês que<br />

tinham apenas três meses <strong>de</strong> vida, causan<strong>do</strong>-lhes gastroenterite aguda. Vício <strong>de</strong> segurança. Responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fabricante.<br />

Possibilida<strong>de</strong>. Comerciante que não po<strong>de</strong> ser ti<strong>do</strong> como terceiro estranho à relação <strong>de</strong> consumo. Não configuração <strong>de</strong> culpa<br />

exclusiva <strong>de</strong> terceiro. Produto alimentício <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> especificamente para bebês exposto em gôn<strong>do</strong>la <strong>de</strong> supermerca<strong>do</strong>, com o prazo<br />

<strong>de</strong> valida<strong>de</strong> venci<strong>do</strong>, que coloca em risco a saú<strong>de</strong> <strong>de</strong> bebês com apenas três meses <strong>de</strong> vida, causan<strong>do</strong>-lhe gastroenterite aguda, enseja<br />

a responsabilização por fato <strong>do</strong> produto, ante a existência <strong>de</strong> vício <strong>de</strong> segurança previsto no art. 12 <strong>do</strong> CDC. O comerciante e o<br />

fabricante estão inseri<strong>do</strong>s no âmbito da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> produção e distribuição, razão pela qual não po<strong>de</strong>m ser ti<strong>do</strong>s como terceiros<br />

estranhos à relação <strong>de</strong> consumo. A eventual configuração da culpa <strong>do</strong> comerciante que coloca à venda produto com prazo <strong>de</strong><br />

valida<strong>de</strong> venci<strong>do</strong> não tem o condão <strong>de</strong> afastar o direito <strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r propor ação <strong>de</strong> reparação pelos danos resultantes da<br />

ingestão da merca<strong>do</strong>ria estragada em face <strong>do</strong> fabricante. Recurso especial não provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 980.860/SP – Terceira Turma<br />

– Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 23.04.2009 – DJe 02.06.2009).<br />

Do mesmo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, repise-se o acórdão a respeito da morte ocorrida em micareta, o que ingressa no<br />

risco-proveito <strong>do</strong> serviço <strong>de</strong> lazer presta<strong>do</strong>, não caben<strong>do</strong> a exclu<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> fato <strong>de</strong> terceiro:<br />

“Processual civil e consumi<strong>do</strong>r. Recurso especial. Ação <strong>de</strong> compensação por danos morais. Falecimento <strong>de</strong> menor em bloco<br />

participante <strong>de</strong> micareta. Negativa <strong>de</strong> prestação jurisdicional. Inexistência. Atuação <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong> sem procuração nos autos em<br />

audiência <strong>de</strong> oitiva <strong>de</strong> testemunhas. Prequestionamento. Ausência. Existência <strong>de</strong> fundamento inataca<strong>do</strong>. Deficiência na prestação <strong>do</strong><br />

serviço <strong>de</strong> segurança ofereci<strong>do</strong> pelo bloco constatada. Não ocorrência da culpa exclusiva <strong>de</strong> terceiro. Não há violação ao art. 535 <strong>do</strong><br />

CPC quan<strong>do</strong> ausentes omissão, contradição ou obscurida<strong>de</strong> no acórdão recorri<strong>do</strong>. O prequestionamento <strong>do</strong>s dispositivos legais ti<strong>do</strong>s<br />

por viola<strong>do</strong>s constitui requisito específico <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> recurso especial. É inadmissível o recurso especial se existe<br />

fundamento inataca<strong>do</strong> suficiente para manter a conclusão <strong>do</strong> julga<strong>do</strong> recorri<strong>do</strong> quanto ao ponto. Súmula 283/STF. Nos termos <strong>do</strong><br />

art. 14, § 1º, CDC, consi<strong>de</strong>ra-se <strong>de</strong>feituoso o serviço que não fornece a segurança que o consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>le po<strong>de</strong> esperar. Nas<br />

micaretas, o principal serviço que faz o associa<strong>do</strong> optar pelo bloco é o <strong>de</strong> segurança, que, uma vez não ofereci<strong>do</strong> da maneira<br />

esperada, como ocorreu na hipótese <strong>do</strong>s autos, em que não foi impedi<strong>do</strong> o ingresso <strong>de</strong> pessoa portan<strong>do</strong> arma <strong>de</strong> fogo no interior <strong>do</strong><br />

bloco, apresenta-se inequivocamente <strong>de</strong>feituoso. Recurso especial não conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp 878.265/PB – Terceira Turma –<br />

Rel. Min. Fátima Nancy Andrighi – j. 02.10.2008 – DJe 10.12.2008).<br />

Nota-se, na prática e na gran<strong>de</strong> maioria das vezes, que o argumento da culpa ou fato exclusivo <strong>de</strong> terceiro não prospera,<br />

justamente pela existência da relação <strong>de</strong> pressuposição pelo produto ou serviço. Cite-se a comum situação em que a instituição<br />

bancária ou financeira alega que a frau<strong>de</strong> relativa ao cliente clona<strong>do</strong> foi causada por um terceiro totalmente estranho à relação,<br />

argumento que não acaba vingan<strong>do</strong> (por to<strong>do</strong>s: STJ – REsp 703.129/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes<br />

<strong>Direito</strong> – j. 21.08.2007 – DJ 06.11.2007, p. 169).<br />

Por fim, <strong>de</strong>ve ser feito o alerta <strong>de</strong> que, no transporte <strong>de</strong> pessoas – em regra, um negócio <strong>de</strong> consumo –, a exclu<strong>de</strong>nte da culpa<br />

ou fato exclusivo <strong>de</strong> terceiro não é cabível. Estabelece o art. 735 <strong>do</strong> Código Civil – que reproduz a antiga Súmula 187 <strong>do</strong> STF –<br />

que “A responsabilida<strong>de</strong> contratual <strong>do</strong> transporta<strong>do</strong>r por aci<strong>de</strong>nte com o passageiro não é elidida por culpa <strong>de</strong> terceiro, contra o<br />

qual tem ação regressiva”. Como se po<strong>de</strong> notar, a subsunção <strong>do</strong> Código Civil é melhor para os consumi<strong>do</strong>res <strong>do</strong> que a aplicação <strong>do</strong><br />

Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser buscada a primeira norma pela festejada tese <strong>do</strong> diálogo das fontes. Então, naquele famoso<br />

caso <strong>do</strong> avião que caiu na região Centro-Oeste <strong>do</strong> Brasil, por ter si<strong>do</strong> atingi<strong>do</strong> por um jatinho (culpa exclusiva <strong>de</strong> terceiro), a<br />

empresa aérea <strong>de</strong>ve in<strong>de</strong>nizar os familiares, consumi<strong>do</strong>res por equiparação, pela incidência da norma civil. Por incrível que pareça,<br />

se fosse inci<strong>de</strong>nte o Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, isoladamente, a empresa aérea não respon<strong>de</strong>ria.<br />

4.4.3.<br />

A exclu<strong>de</strong>nte da culpa ou fato exclusivo <strong>do</strong> próprio consumi<strong>do</strong>r<br />

A culpa exclusiva <strong>do</strong> próprio consumi<strong>do</strong>r representa a culpa exclusiva da vítima, outro fator obstativo <strong>do</strong> nexo causal, a<br />

excluir a responsabilida<strong>de</strong> civil, seja ela objetiva ou subjetiva. Tem-se, na espécie, a autoexposição da própria vítima ao risco ou ao<br />

dano, por ter ela, por conta própria, assumi<strong>do</strong> as consequências <strong>de</strong> sua conduta, <strong>de</strong> forma consciente ou inconsciente. Mais uma<br />

vez, por razões óbvias <strong>de</strong> ampliação, prefere-se o termo fato exclusivo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, a englobar a culpa e o risco, o que também é<br />

acompanha<strong>do</strong> pela melhor jurisprudência (veja-se: TJPR – Apelação Cível 0640090-8, Curitiba – Décima Câmara Cível – Rel.<br />

Juiz Convoca<strong>do</strong> Albino Jacomel Guerios – DJPR 16.04.2010, p. 270; TJRJ – Apelação 2009.001.16031 – Oitava Câmara Cível –<br />

Rel. Des. Gabriel Zéfiro – DORJ 15.06.2009, p. 151; e TJMG – Apelação Cível 1.0701.03.039127-3/001, Uberaba – Décima


Primeira Câmara Cível – Rel. Designa<strong>do</strong> Des. Maurício Barros – j. 22.05.2006 – DJMG 21.07.2006).<br />

Tem-se inicialmente a culpa ou o fato exclusivo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r quan<strong>do</strong> ele <strong>de</strong>srespeita as normas regulares <strong>de</strong> utilização <strong>do</strong><br />

produto constantes <strong>do</strong> seu manual <strong>de</strong> instruções, muitas vezes por sequer ter li<strong>do</strong> o seu conteú<strong>do</strong>.<br />

Outro caso típico em que há risco exclusivo assumi<strong>do</strong> pelo consumi<strong>do</strong>r ocorre no surfismo ferroviário, prática que foi muito<br />

comum em São Paulo e no Rio <strong>de</strong> Janeiro, presente quan<strong>do</strong> alguém, por ato <strong>de</strong> aventura ou <strong>de</strong>safio, viaja em cima <strong>do</strong> vagão <strong>do</strong><br />

trem, o que exclui a responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong> transporta<strong>do</strong>r, típica prestação <strong>de</strong> serviço (nesse senti<strong>do</strong>: STJ – REsp 160.051/RJ<br />

– Terceira Turma – Rel. Min. Antônio <strong>de</strong> Pádua Ribeiro – j. 05.12.2002 – DJ 17.02.2003, p. 268; e STJ – REsp 261.027/RJ –<br />

Quarta Turma – Rel. Min. Barros Monteiro – j. 19.04.2001 – DJ 13.08.2001, p. 164).<br />

A respeito da culpa exclusiva da vítima, por <strong>de</strong>srespeito a norma regulamentar contratual, é comum a sua a<strong>do</strong>ção para afastar a<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> médico, quan<strong>do</strong> o paciente não toma as <strong>de</strong>vidas medidas para a sua recuperação ou para o sucesso da<br />

intervenção. A título <strong>de</strong> exemplo, vejamos interessante julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal Gaúcho, que aplicou a premissa diante <strong>do</strong> uso <strong>do</strong><br />

tabaco por parte da paciente médica <strong>de</strong> cirurgia plástica estética ou embeleza<strong>do</strong>ra:<br />

“Apelação cível. Ação monitória. Realização <strong>de</strong> cirurgia plástica embeleza<strong>do</strong>ra. Obrigação <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>. Ausência <strong>de</strong> nexo causal.<br />

Culpa exclusiva da paciente. Uso indiscrimina<strong>do</strong> <strong>de</strong> tabaco. Não haven<strong>do</strong> o reconhecimento na ação in<strong>de</strong>nizatória (n. 1.06.0000582-<br />

0) proposta pela parte <strong>de</strong>mandada (paciente) <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito na prestação <strong>do</strong> serviço presta<strong>do</strong> por parte <strong>do</strong> autor (médico) e diante da<br />

prova inequívoca da realização <strong>de</strong> cirurgia e <strong>do</strong> acerto <strong>do</strong> valor da mesma entre as partes, justo se faz o pagamento da dívida<br />

existente por parte da ora apelante. Apelo <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>. Unânime” (TJRS – Apelação Cível 70036200970, Bagé – Quinta Câmara<br />

Cível – Rel. Des. Gelson Rolim Stockerm – j. 28.05.2010 – DJERS 09.06.2010).<br />

Pelo mesmo caminho, quan<strong>do</strong> um frequenta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> casa noturna causa exclusivamente a confusão que gera a agressão física,<br />

não há que se falar em responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> lazer. Vejamos, nesse diapasão, acórdão <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong><br />

Minas Gerais:<br />

“Apelação cível. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Danos morais. Tumulto em casa noturna. Retirada <strong>do</strong> autor. Agressão física. Legítima<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>de</strong>monstrada. Relação <strong>de</strong> consumo. Culpa exclusiva da vítima. Improcedência <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> que se impõe. A responsabilida<strong>de</strong><br />

civil <strong>do</strong>s presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços por falha na prestação <strong>de</strong> serviços se sujeita aos preceitos <strong>do</strong> art. 14, <strong>do</strong> CDC, sen<strong>do</strong> certo o <strong>de</strong>ver<br />

<strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar se ele não provar a ocorrência <strong>de</strong> alguma causa exclu<strong>de</strong>nte da responsabilida<strong>de</strong> objetiva, como a culpa exclusiva <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r ou <strong>de</strong> terceiro, ou que inexiste o <strong>de</strong>feito ou falha na prestação <strong>do</strong> serviço. Ten<strong>do</strong> em vista que o conjunto fáticoprobatório<br />

<strong>do</strong>s autos comprovou que a parte autora causou tumulto em casa noturna, e que, por isso, foi retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> local pelos<br />

seguranças, não há falar em conduta imotivada <strong>do</strong>s prepostos da ré. Se da prova testemunhal colhida <strong>de</strong>monstrou, também, que o<br />

autor investiu contra o chefe <strong>de</strong> segurança da ré, que, para se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r, <strong>de</strong>sferiu-lhe um golpe, a solução <strong>de</strong> rigor é a improcedência<br />

<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>, haja vista a <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> que os fatos se <strong>de</strong>ram por culpa exclusiva <strong>do</strong> requerente, e, sob a ótica <strong>do</strong> CDC, presente a<br />

exclu<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços” (TJMG – Apelação Cível 4997061-38.2009.8.13.0024, Belo Horizonte –<br />

Décima Sétima Câmara Cível – Rel. Des. Luciano Pinto – j. 13.01.2011 – DJEMG 01.02.2011).<br />

Do mesmo mo<strong>do</strong>, enten<strong>de</strong>-se que se o correntista bancário não guardar <strong>de</strong>vidamente o seu cartão magnético ficará evi<strong>de</strong>nte a<br />

sua culpa exclusiva, a excluir eventual responsabilida<strong>de</strong> por vício ou fato <strong>do</strong> serviço. Do Tribunal <strong>de</strong> São Paulo:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Danos morais e materiais. Saques em conta corrente. Cartão magnético e senha utiliza<strong>do</strong>s por terceiro.<br />

Furto ocorri<strong>do</strong> na residência <strong>do</strong>s autores. Culpa exclusiva da vítima. Em que pese, regra geral, a incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r sobre a relação jurídica travada entre instituição financeira e correntista, o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar é afasta<strong>do</strong> se o substrato<br />

probatório e fático <strong>do</strong>s autos comprovar que o correntista não zelou pela guarda segura <strong>de</strong> seu cartão e <strong>de</strong> sua senha pessoal,<br />

oportunizan<strong>do</strong>, com isto, a atuação <strong>de</strong> terceiro frauda<strong>do</strong>r. Ação improce<strong>de</strong>nte. Recurso não provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação<br />

990.10.263689-5 – Acórdão 4815381, Itápolis – Vigésima Primeira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Itamar Gaino – j.<br />

10.11.2010 – DJESP 07.12.2010).<br />

Igualmente a título <strong>de</strong> ilustração, se o próprio consumi<strong>do</strong>r fizer instalações irregulares e em <strong>de</strong>sacor<strong>do</strong> com a legislação<br />

vigente, a causar refluxo no esgoto e danifican<strong>do</strong> móveis e utensílios, presente está a culpa exclusiva da vítima, a afastar o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong><br />

in<strong>de</strong>nizar <strong>do</strong> presta<strong>do</strong>r <strong>do</strong> serviço correspon<strong>de</strong>nte (TJSP – Apelação 992.05.060392-1 – Acórdão 4355202, Bauru – Trigésima<br />

Segunda Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Walter Zeni – j. 04.03.2010 – DJESP 31.03.2010). A <strong>de</strong>dução <strong>de</strong>ve ser a mesma<br />

se o consumi<strong>do</strong>r fraudar o serviço público, caso da energia elétrica (popular gato). Todavia, <strong>de</strong>ve ficar claro que o ônus <strong>de</strong> tal<br />

comprovação cabe ao presta<strong>do</strong>r <strong>do</strong> serviço (por to<strong>do</strong>s: TJBA – Recurso Cível 0004662-71.2008.805.0079-1 – Terceira Turma<br />

Recursal – Rel. Juiz Baltazar Miranda Saraiva – DJBA 28.10.2010).<br />

Como último exemplo contemporâneo relativo à culpa ou fato exclusivo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, no caso <strong>de</strong> existência <strong>de</strong> dívida, é<br />

perfeitamente lícita a inscrição <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes, o que constitui exercício regular <strong>de</strong> direito por<br />

parte <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r. Como tal exclu<strong>de</strong>nte não consta expressamente <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, ao contrário <strong>do</strong> que ocorre


com o Código Civil (art. 188, II, <strong>do</strong> CC), o caminho <strong>de</strong> conclusão pela improcedência da <strong>de</strong>manda passa pela verificação da culpa<br />

exclusiva da própria vítima.<br />

Supera<strong>do</strong> o estu<strong>do</strong> das exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil previstas expressamente pelo CDC, cumpre analisar o<br />

enquadramento <strong>de</strong> outros fatores obstativos, caso <strong>do</strong>s eventos extraordinários. Parte-se então para o estu<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma das principais<br />

polêmicas <strong>do</strong> sistema <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> consumerista, pela falta <strong>de</strong> previsão expressa a respeito <strong>do</strong> caso fortuito e a força maior.<br />

4.4.4.<br />

O enquadramento <strong>do</strong> caso fortuito e da força maior como exclu<strong>de</strong>ntes da responsabilida<strong>de</strong> civil<br />

consumerista<br />

Questão das mais convertidas refere-se a saber se o caso fortuito e a força maior são exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil no<br />

sistema consumerista, uma vez que a lei não trouxe previsão expressa quanto a tais eventos. É forte a corrente <strong>do</strong>utrinária no<br />

senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que o rol <strong>de</strong> exclu<strong>de</strong>ntes é taxativo (numerus clausus), não se admitin<strong>do</strong> outros fatores obstativos <strong>do</strong> nexo <strong>de</strong><br />

causalida<strong>de</strong> ou da ilicitu<strong>de</strong>.56<br />

Porém, há ainda outra visão, qual seja a <strong>de</strong> que os eventos imprevisíveis e inevitáveis po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s exclu<strong>de</strong>ntes da<br />

responsabilida<strong>de</strong> no sistema <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumo, visto que constituem fatores obstativos gerais <strong>do</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>,<br />

aplicáveis tanto à responsabilida<strong>de</strong> subjetiva quanto à objetiva. Esse é o entendimento compartilha<strong>do</strong> pelo presente autor. Pela<br />

mesma trilha, essa é a opinião <strong>do</strong> atual Ministro <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, Paulo <strong>de</strong> Tarso Vieira Sanseverino, em sua<br />

dissertação <strong>de</strong> mestra<strong>do</strong> <strong>de</strong>fendida na Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul, nos seguintes termos: “O caso fortuito e a força<br />

maior enquadram-se, portanto, como causas <strong>de</strong> exclusão da responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, embora não previstas<br />

expressamente no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. O fundamental é que o acontecimento inevitável ocorra fora da esfera <strong>de</strong><br />

vigilância <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, via <strong>de</strong> regra, após a colocação <strong>do</strong> produto no merca<strong>do</strong>, ten<strong>do</strong> força suficiente para romper a relação <strong>de</strong><br />

causalida<strong>de</strong>”. 57<br />

Antes <strong>de</strong> se aprofundar o tema, insta anotar que se segue o entendimento <strong>de</strong> Orlan<strong>do</strong> Gomes, segun<strong>do</strong> qual o caso fortuito é o<br />

evento totalmente imprevisível, enquanto a força maior é o evento previsível, mas inevitável. 58 Entre os contemporâneos, Sérgio<br />

Cavalieri Filho, Pablo Stolze Gagliano e Ro<strong>do</strong>lfo Pamplona Filho, seguem a mesma divisão conceitual. 59 Concluin<strong>do</strong> <strong>de</strong>ssa forma,<br />

não há que se diferenciar a presença <strong>de</strong> uma conduta humana <strong>de</strong> um ato <strong>de</strong> terceiro, o que po<strong>de</strong> gerar choques <strong>de</strong> pensamento. O<br />

caso fortuito é mais <strong>do</strong> que a força maior, pois é um fato que não se espera, o que constitui algo raro na atualida<strong>de</strong>, uma vez que,<br />

no mun<strong>do</strong> pós-mo<strong>de</strong>rno, tu<strong>do</strong> po<strong>de</strong> acontecer.<br />

Voltan<strong>do</strong>-se à temática consumerista, Zelmo Denari, um <strong>do</strong>s autores <strong>do</strong> anteprojeto que gerou o Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, admite o caso fortuito e a força maior como exclu<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar na ótica <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, sen<strong>do</strong><br />

pertinente <strong>de</strong>stacar as suas lições:<br />

“As hipóteses <strong>de</strong> caso fortuito e força maior, <strong>de</strong>scritas no art. 393 <strong>do</strong> Código Civil como eximentes da responsabilida<strong>de</strong> na or<strong>de</strong>m<br />

civil, não estão elencadas entre as causas exclu<strong>de</strong>ntes da responsabilida<strong>de</strong> civil pelo fato <strong>do</strong> produto.<br />

Mas a <strong>do</strong>utrina mais atualizada já advertiu que esses acontecimentos – dita<strong>do</strong>s por forças físicas da natureza ou que, <strong>de</strong> qualquer<br />

forma, escapam ao controle <strong>do</strong> homem – tanto po<strong>de</strong>m ocorrer antes como <strong>de</strong>pois da introdução <strong>do</strong> produto no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo.<br />

Na primeira hipótese, instalan<strong>do</strong>-se na fase <strong>de</strong> concepção ou durante o processo produtivo, o fornece<strong>do</strong>r não po<strong>de</strong> invocá-la para se<br />

subtrair à responsabilida<strong>de</strong> por danos.<br />

[…]<br />

Por outro la<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> o caso fortuito ou força maior se manifesta após a introdução <strong>do</strong> produto no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo, ocorre a<br />

ruptura <strong>do</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> que liga o <strong>de</strong>feito ao evento danoso. Nem tem cabimento qualquer alusão ao <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> produto, uma<br />

vez que aqueles acontecimentos, na maior da parte imprevisíveis, criam obstáculos <strong>de</strong> tal monta que a boa vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r<br />

não po<strong>de</strong> suprir. Na verda<strong>de</strong>, diante <strong>do</strong> impacto <strong>do</strong> acontecimento, a vítima sequer po<strong>de</strong> alegar que o produto se ressentia <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito,<br />

vale dizer, fica afastada a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res pela inocorrência <strong>do</strong>s respectivos pressupostos”.60<br />

Mais à frente, o jurista chega à mesma conclusão em relação à prestação <strong>de</strong> serviços, ou seja, <strong>de</strong> que o caso fortuito e a força<br />

maior <strong>de</strong>vem ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s exclu<strong>de</strong>ntes da responsabilida<strong>de</strong> civil. 61 Em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> superior instância, já se concluiu <strong>de</strong>sse mo<strong>do</strong>,<br />

expressamente (entre os mais recentes: “Consumi<strong>do</strong>r. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Nas relações <strong>de</strong> consumo, a ocorrência <strong>de</strong> força<br />

maior ou <strong>de</strong> caso fortuito exclui a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp<br />

996.833/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Ari Pargendler – j. 04.12.2007 – DJ 1º.02.2008, p. 1).<br />

Mais remotamente, <strong>do</strong> mesmo Tribunal da Cidadania: “Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Estacionamento. Chuva <strong>de</strong> granizo. Vagas<br />

cobertas e <strong>de</strong>scobertas. Art. 1.277 <strong>do</strong> Código Civil. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Prece<strong>de</strong>nte da Corte. 1. Como assenta<strong>do</strong> em<br />

prece<strong>de</strong>nte da Corte, o ‘fato <strong>de</strong> o art. 14, § 3º, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r não se referir ao caso fortuito e à força maior,<br />

ao arrolar as causas <strong>de</strong> isenção <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços, não significa que, no sistema por ele instituí<strong>do</strong>, não


possam ser invocadas. Aplicação <strong>do</strong> art. 1.058 <strong>do</strong> Código Civil’ (REsp n. 120.647-SP, Relator o Senhor Ministro Eduar<strong>do</strong> Ribeiro,<br />

DJ 15.05.2000). 2. Haven<strong>do</strong> vagas cobertas e <strong>de</strong>scobertas é incabível a presunção <strong>de</strong> que o estacionamento seria feito em vaga<br />

coberta, ausente qualquer prova sobre o assunto. 3. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 330.523/SP – Terceira<br />

Turma – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes <strong>Direito</strong> – j. 11.12.2001 – DJ 25.03.2002, p. 278).<br />

A verda<strong>de</strong> é que a omissão legislativa gerou um gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>bate jurídico. Na jurisprudência prevalecem os julga<strong>do</strong>s que<br />

admitem a alegação <strong>do</strong> caso fortuito e da força maior como exclu<strong>de</strong>ntes da responsabilização <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos e<br />

presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços (por to<strong>do</strong>s os numerosos acórdãos: STJ – REsp 402.708/SP – Segunda Turma – Rel. Min. Eliana Calmon –<br />

j. 24.08.2004 – DJ 28.02.2005, p. 267; STJ – REsp 241.813/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Sálvio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong> Teixeira – j.<br />

23.10.2001 – DJU 04.02.2002, p. 372; TJDF – Recurso 2004.09.1.005206-5 – Acórdão 308.873 – Quinta Turma Cível – Rel. Des.<br />

Lecir Manoel da Luz – DJDFTE 19.06.2008, p. 183; TJSC – Acórdão 2007.041167-5, Xanxerê – Rel. Des. Nelson Juliano<br />

Schaefer Martins – DJSC 17.12.2007, p. 88; TJMG – Acórdão 1.0024.03.073463-6/001, Belo Horizonte – Décima Quarta Câmara<br />

Cível – Rel. Des. Renato Martins Jacob – j. 06.09.2006 – DJMG 23.10.2006; TJRJ – Acórdão 23301/2003, Rio <strong>de</strong> Janeiro –<br />

Quinta Câmara Cível – Rel. Des. Henrique <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Figueira – j. 21.10.2003; 1º TAC-SP – Agravo <strong>de</strong> Instrumento 834719-5 –<br />

Quarta Câmara – Rel. Juiz Paulo Roberto <strong>de</strong> Santana – j. 21.08.2002).<br />

Na opinião <strong>do</strong> presente autor, a conclusão <strong>de</strong>ve levar em conta a relação que o fato ti<strong>do</strong> como imprevisível ou inevitável tem<br />

com o fornecimento <strong>do</strong> produto ou a prestação <strong>de</strong> serviço, ou seja, com o chama<strong>do</strong> risco <strong>do</strong> empreendimento, tão caro aos<br />

italianos.62 O <strong>de</strong>bate traz à tona aquela antiga diferenciação entre fortuito interno e fortuito externo, bem <strong>de</strong>senvolvida, entre os<br />

clássicos, por Agostinho Alvim.63 O primeiro – fortuito interno – é aquele que tem relação com o negócio <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong>, não<br />

excluin<strong>do</strong> a responsabilização civil. O segun<strong>do</strong> – fortuito externo – é totalmente estranho ou alheio ao negócio, excluin<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ver<br />

<strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Conforme enuncia<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrinário aprova<strong>do</strong> na V Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, evento <strong>de</strong> 2011, “O caso fortuito e a força<br />

maior somente serão consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s como exclu<strong>de</strong>ntes da responsabilida<strong>de</strong> civil quan<strong>do</strong> o fato gera<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano não for conexo à<br />

ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvida” (Enuncia<strong>do</strong> n. 443).<br />

Em outras palavras, <strong>de</strong>ve-se atentar para os riscos que envolvem a ativida<strong>de</strong> a partir da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> proveito ao vulnerável da<br />

relação estabelecida. Como bem aponta An<strong>de</strong>rson Schreiber, “a conclusão acerca da incidência ou não da teoria <strong>do</strong> fortuito interno<br />

parece, antes, vinculada a um juízo valorativo acerca <strong>de</strong> quem <strong>de</strong>ve suportar o ônus representa<strong>do</strong> por certo dano. Reconhece-se<br />

certo fato como inevitável, mas se enten<strong>de</strong> que tal fatalida<strong>de</strong> não <strong>de</strong>ve ser suportada pela vítima. Daí a aplicação da teoria <strong>do</strong><br />

fortuito interno ser mais intensa no campo da responsabilida<strong>de</strong> objetiva, on<strong>de</strong> é <strong>de</strong> praxe atribuir ao responsável certos riscos que,<br />

embora não tenham si<strong>do</strong> causa<strong>do</strong>s pela sua ativida<strong>de</strong> em si, não <strong>de</strong>vem recair tampouco sobre a vítima”. 64<br />

Anote-se que é preciso adaptar as construções à diferenciação seguida por este autor, ou seja, também <strong>de</strong>vem ser consi<strong>de</strong>radas<br />

a força maior interna e a força maior externa. Isso porque estamos filia<strong>do</strong>s à construção <strong>de</strong> que o caso fortuito é o evento<br />

totalmente imprevisível, e a força maior, o evento previsível, mas inevitável, conforme outrora <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong>. Assim, ambas as<br />

categorias po<strong>de</strong>m ser internas ou externas, conforme reconhece a jurisprudência (TRF 2ª Região – Acórdão 2000.50.01.008713-4<br />

– Sétima Turma Especializada – Rel. Des. Fed. Reis Frie<strong>de</strong> – DJU 23.10.2007, p. 292).<br />

Pois bem, a diferenciação entre eventos internos e externos vem sen<strong>do</strong> seguida por parcela consi<strong>de</strong>rável da <strong>do</strong>utrina<br />

nacional. 65 Em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, tem-se aplica<strong>do</strong> essa categorização a casos que envolvem assalto à mão<br />

armada a ônibus, concluin<strong>do</strong> o Tribunal tratar-se <strong>de</strong> fortuito externo, pois não é essencial ao negócio a segurança ao passageiro, <strong>de</strong><br />

mo<strong>do</strong> a impedir o evento. Vejamos a ementa <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s:<br />

“Processo civil. Recurso especial. In<strong>de</strong>nização por danos morais, estéticos e materiais. Assalto à mão armada no interior <strong>de</strong> ônibus<br />

coletivo. Caso fortuito externo. Exclusão <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> da transporta<strong>do</strong>ra. 1. A Segunda Seção <strong>de</strong>sta Corte já proclamou o<br />

entendimento <strong>de</strong> que o fato inteiramente estranho ao transporte em si (assalto à mão armada no interior <strong>de</strong> ônibus coletivo) constitui<br />

caso fortuito, exclu<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> da empresa transporta<strong>do</strong>ra. 3. Recurso conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 726.371/RJ<br />

– Quarta Turma – Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa – j. 07.12.2006 – DJU 05.02.2007, p. 244).<br />

Do ano <strong>de</strong> 2012, acórdão <strong>do</strong> mesmo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça consi<strong>de</strong>rou que o roubo no caso <strong>do</strong> serviço presta<strong>do</strong> pelos<br />

correios constitui um evento externo, a excluir a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços. Conforme o julga<strong>do</strong>, “O roubo<br />

mediante uso <strong>de</strong> arma <strong>de</strong> fogo é fato <strong>de</strong> terceiro equiparável à força maior, que <strong>de</strong>ve excluir o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar, mesmo no<br />

sistema <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva, por se tratar <strong>de</strong> fato inevitável e irresistível que gera uma impossibilida<strong>de</strong> absoluta <strong>de</strong><br />

não ocorrência <strong>do</strong> dano. Não é razoável exigir que os presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviço <strong>de</strong> transporte <strong>de</strong> cargas alcancem absoluta segurança<br />

contra roubos, uma vez que a segurança pública é <strong>de</strong>ver <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, também não haven<strong>do</strong> imposição legal obrigan<strong>do</strong> as empresas<br />

transporta<strong>do</strong>ras a contratar escoltas ou rastreamento <strong>de</strong> caminhão e, sem parecer técnico especializa<strong>do</strong>, nem sequer é possível<br />

presumir se, por exemplo, a escolta armada seria eficaz para afastar o risco ou se o agravaria pelo caráter ostensivo <strong>do</strong> aparato”<br />

(STJ – REsp 976.564/SP – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 20.09.2012). A <strong>de</strong>cisão foi publicada no Informativo n. 505 daquela


Corte Superior, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser encontra<strong>do</strong> outro julgamento na mesma publicação, concluin<strong>do</strong> pela subsunção <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r ao serviço <strong>de</strong> correio (STJ – REsp 1.210.732/SC – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 02.10.2012).<br />

Todavia, a mesma Corte enten<strong>de</strong> que se o assalto ocorrer <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma agência <strong>do</strong>s correios que oferece o serviço <strong>de</strong> banco<br />

postal, estará presente um evento interno, a gerar a responsabilização civil <strong>do</strong> presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços. Nos termos da publicação<br />

constante <strong>do</strong> Informativo n. 559 <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania, “<strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> seu po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> livremente contratar e oferecer diversos tipos<br />

<strong>de</strong> serviços, ao agregar a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> correspon<strong>de</strong>nte bancário ao seu empreendimento, acaba-se por criar risco inerente à própria<br />

ativida<strong>de</strong> das instituições financeiras, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> por isso respon<strong>de</strong>r pelos danos que essa nova atribuição tenha gera<strong>do</strong> aos seus<br />

consumi<strong>do</strong>res, uma vez que atraiu para si o ônus <strong>de</strong> fornecer a segurança legitimamente esperada para esse tipo <strong>de</strong> negócio” (STJ –<br />

Esp 1.183.121/SC – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 24.02.2015, DJe 07.04.2015). Como se po<strong>de</strong> notar, os arestos trazem<br />

conclusões diferentes em casos concretos muito próximos, com o mesmo presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviço.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, enten<strong>de</strong>-se naquela superior instância que o assalto a um banco não constitui um evento externo, pois ingressa<br />

no risco <strong>do</strong> negócio, não afastan<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar da instituição respectiva, o que está em plena sintonia com a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> riscoproveito<br />

<strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Assim, com variações na argumentação <strong>de</strong>senvolvida: STJ – REsp 1093617/PE – Quarta<br />

Turma – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – j. 17.03.2009 – DJe 23.03.2009; STJ – REsp 787.124/RS – Primeira Turma – Rel.<br />

Min. José Delga<strong>do</strong> – j. 20.04.2006 – DJ 22.05.2006, p. 167; STJ – REsp 694.153/PE – Quarta Turma – Rel. Min. Cesar Asfor<br />

Rocha – j. 28.06.2005 – DJ 05.09.2005, p. 429; e STJ – REsp 613.036/RJ – Terceira Turma – Rel. Min. Castro Filho – j.<br />

14.06.2004 – DJ 01.07.2004, p. 194).<br />

Em outro julga<strong>do</strong>, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2012, a mesma Corte Superior concluiu que o banco respon<strong>de</strong> pelo assalto ocorri<strong>do</strong> até o seu<br />

estacionamento, convenia<strong>do</strong> ou não, não haven<strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar por eventos a partir <strong>de</strong>sse ambiente, em especial pelo fato<br />

social conheci<strong>do</strong> como “saidinha <strong>de</strong> banco”. Conforme consta <strong>de</strong> publicação no Informativo n. 512 <strong>do</strong> STJ:<br />

“A instituição financeira não po<strong>de</strong> ser responsabilizada por assalto sofri<strong>do</strong> por sua correntista em via pública, isto é, fora das<br />

<strong>de</strong>pendências <strong>de</strong> sua agência bancária, após a retirada, na agência, <strong>de</strong> valores em espécie, sem que tenha havi<strong>do</strong> qualquer falha<br />

<strong>de</strong>terminante para a ocorrência <strong>do</strong> sinistro no sistema <strong>de</strong> segurança da instituição. O STJ tem reconheci<strong>do</strong> amplamente a<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong>s bancos pelos assaltos ocorri<strong>do</strong>s no interior <strong>de</strong> suas agências, em razão <strong>do</strong> risco inerente à ativida<strong>de</strong><br />

bancária. Além disso, já se reconheceu, também, a responsabilida<strong>de</strong> da instituição financeira por assalto aconteci<strong>do</strong> nas<br />

<strong>de</strong>pendências <strong>de</strong> estacionamento ofereci<strong>do</strong> aos seus clientes exatamente com o escopo <strong>de</strong> mais segurança. Não há, contu<strong>do</strong>, como<br />

responsabilizar a instituição financeira na hipótese em que o assalto tenha ocorri<strong>do</strong> fora das <strong>de</strong>pendências da agência bancária, em<br />

via pública, sem que tenha havi<strong>do</strong> qualquer falha na segurança interna da agência bancária que propiciasse a atuação <strong>do</strong>s criminosos<br />

após a efetivação <strong>do</strong> saque, ten<strong>do</strong> em vista a inexistência <strong>de</strong> vício na prestação <strong>de</strong> serviços por parte da instituição financeira. Além<br />

<strong>do</strong> mais, se o ilícito ocorre em via pública, é <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, e não da instituição financeira, o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> garantir a segurança <strong>do</strong>s cidadãos<br />

e <strong>de</strong> evitar a atuação <strong>do</strong>s criminosos” (STJ – REsp 1.284.962/MG – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 11.12.2012).<br />

No que diz respeito ao estacionamento <strong>do</strong> banco, ressalte-se que essa forma <strong>de</strong> julgar foi confirmada pelo STJ em setembro <strong>de</strong><br />

2015 com a publicação <strong>de</strong> ementa por meio <strong>de</strong> sua ferramenta Jurisprudência em Teses (Edição 42), estabelecen<strong>do</strong> que “o roubo<br />

no interior <strong>de</strong> estacionamento <strong>de</strong> veículos, pelo qual seja direta ou indiretamente responsável a instituição financeira, não<br />

caracteriza caso fortuito ou motivo <strong>de</strong> força maior capaz <strong>de</strong> <strong>de</strong>sonerá-la da responsabilida<strong>de</strong> pelos danos suporta<strong>do</strong>s por seu cliente<br />

vitima<strong>do</strong>, existin<strong>do</strong> solidarieda<strong>de</strong> se o estacionamento for explora<strong>do</strong> por terceiro”.<br />

A propósito, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2013, cabe <strong>de</strong>stacar o julgamento superior no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que os estacionamentos em geral, excluí<strong>do</strong>s os<br />

relativos às instituições bancárias, não respon<strong>de</strong>m por assaltos à mão armada, mas apenas por furtos, pelo fato <strong>de</strong> serem os<br />

primeiros estranhos ao risco <strong>do</strong> negócio ou risco <strong>do</strong> empreendimento. Nos termos da publicação <strong>do</strong> aresto, <strong>de</strong> mesma relatoria,<br />

“não é possível atribuir responsabilida<strong>de</strong> civil a socieda<strong>de</strong> empresária responsável por estacionamento particular e autônomo –<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e <strong>de</strong>svincula<strong>do</strong> <strong>de</strong> agência bancária – em razão da ocorrência, nas <strong>de</strong>pendências daquele estacionamento, <strong>de</strong> roubo à<br />

mão armada <strong>de</strong> valores recentemente saca<strong>do</strong>s na referida agência e <strong>de</strong> outros pertences que o cliente carregava consigo no<br />

momento <strong>do</strong> crime. Nesses casos, o estacionamento em si consiste na própria ativida<strong>de</strong>-fim da socieda<strong>de</strong> empresária, e não num<br />

serviço assessório presta<strong>do</strong> apenas para cativar os clientes <strong>de</strong> instituição financeira. Consequentemente, não é razoável impor à<br />

socieda<strong>de</strong> responsável pelo estacionamento o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> garantir a segurança individual <strong>do</strong> usuário e a proteção <strong>do</strong>s bens porta<strong>do</strong>s<br />

por ele, sobretu<strong>do</strong> na hipótese em que ele realize operação sabidamente <strong>de</strong> risco consistente no saque <strong>de</strong> valores em agência<br />

bancária, uma vez que essas pretensas contraprestações não estariam compreendidas por contrato que abranja exclusivamente a<br />

guarda <strong>de</strong> veículo. Nesse contexto, ainda que o usuário, no seu subconsciente, possa imaginar que, paran<strong>do</strong> o seu veículo em<br />

estacionamento priva<strong>do</strong>, estará protegen<strong>do</strong>, além <strong>do</strong> seu veículo, também a si próprio, a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> estabelecimento não<br />

po<strong>de</strong> ultrapassar o <strong>de</strong>ver contratual <strong>de</strong> guarda <strong>do</strong> automóvel, sob pena <strong>de</strong> se extrair <strong>do</strong> instrumento consequências que vão além <strong>do</strong><br />

contrata<strong>do</strong>, com clara violação <strong>do</strong> pacta sunt servanda. Não se trata, portanto, <strong>de</strong> resguardar os interesses da parte hipossuficiente<br />

da relação <strong>de</strong> consumo, mas sim <strong>de</strong> assegurar ao consumi<strong>do</strong>r apenas aquilo que ele legitimamente po<strong>de</strong>ria esperar <strong>do</strong> serviço


contrata<strong>do</strong>. Além disso, <strong>de</strong>ve-se frisar que a imposição <strong>de</strong> tamanho ônus aos estacionamentos <strong>de</strong> veículos – <strong>de</strong> serem responsáveis<br />

pela integrida<strong>de</strong> física e patrimonial <strong>do</strong>s usuários – mostra-se temerária, inclusive na perspectiva <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, na medida em<br />

que a sua viabilização exigiria investimentos que certamente teriam reflexo direto no custo <strong>do</strong> serviço, que hoje já é eleva<strong>do</strong>” (STJ<br />

– REsp 1.232.795/SP – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 02.04.2013, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 521). Como se nota, é<br />

imperioso verificar on<strong>de</strong> se localiza o estacionamento para se concluir se o roubo é ou não um evento externo, que está fora <strong>do</strong><br />

risco <strong>do</strong> empreendimento, a caracterizar o caso fortuito e a força maior.<br />

Ainda sobre esse problema social, conclui-se em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> STJ que o assalto a shopping center e a supermerca<strong>do</strong> ingressa na<br />

proteção <strong>de</strong> riscos esperada pelos consumi<strong>do</strong>res, não sen<strong>do</strong> a hipótese <strong>de</strong> configuração <strong>do</strong> caso fortuito ou força maior. Na esfera<br />

<strong>do</strong> que aqui se discute, haveria, portanto, um fortuito interno. Vejamos a ementa <strong>de</strong> julga<strong>do</strong> recente:<br />

“Recurso especial. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais em razão <strong>de</strong> roubo sofri<strong>do</strong> em estacionamento <strong>de</strong> supermerca<strong>do</strong>.<br />

Procedência da pretensão. Força maior ou caso fortuito. Não reconhecimento. Conduta omissiva e negligente <strong>do</strong> estabelecimento<br />

comercial. Verificação. Dever <strong>de</strong> propiciar a seus clientes integral segurança em área <strong>de</strong> seu <strong>do</strong>mínio. Aplicação <strong>do</strong> direito à<br />

espécie. Possibilida<strong>de</strong>, in casu. Dano moral. Comprovação. Desnecessida<strong>de</strong>. Damnum in re ipsa, na espécie. Fixação <strong>do</strong> quantum.<br />

Observância <strong>do</strong>s parâmetros da razoabilida<strong>de</strong>. Recurso especial provi<strong>do</strong>. I. É <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> estabelecimentos como shopping centers e<br />

hipermerca<strong>do</strong>s zelar pela segurança <strong>de</strong> seu ambiente, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que não se há falar em força maior para eximi-los da<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> assaltos violentos aos consumi<strong>do</strong>res. II. Afasta<strong>do</strong> o fundamento jurídico <strong>do</strong> acórdão a quo,<br />

cumpre a esta Corte Superior julgar a causa, aplican<strong>do</strong>, se necessário, o direito à espécie. III. Por se estar diante da figura <strong>do</strong><br />

damnum in re ipsa, ou seja, a configuração <strong>do</strong> dano está ínsita à própria eclosão <strong>do</strong> fato pernicioso, <strong>de</strong>spicienda a comprovação <strong>do</strong><br />

dano. IV. A fixação da in<strong>de</strong>nização por dano moral <strong>de</strong>ve revestir-se <strong>de</strong> caráter in<strong>de</strong>nizatório e sancionatório, adstrito ao princípio da<br />

razoabilida<strong>de</strong> e, <strong>de</strong> outro la<strong>do</strong>, há <strong>de</strong> servir como meio propedêutico ao agente causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano. V. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e<br />

provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 582.047/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Massami Uyeda – j. 17.02.2009 – DJe 04.08.2009).<br />

A respeito <strong>do</strong>s estacionamentos localiza<strong>do</strong>s nos interiores <strong>do</strong>s shoppings, conforme se extrai <strong>de</strong> acórdão mais recente,<br />

publica<strong>do</strong> no Informativo n. 534 daquela Corte Superior, “o shopping center <strong>de</strong>ve reparar o cliente pelos danos morais <strong>de</strong>correntes<br />

<strong>de</strong> tentativa <strong>de</strong> roubo, não consuma<strong>do</strong> apenas em razão <strong>de</strong> comportamento <strong>do</strong> próprio cliente, ocorrida nas proximida<strong>de</strong>s da<br />

cancela <strong>de</strong> saída <strong>de</strong> seu estacionamento, mas ainda em seu interior. Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo, incumbe ao fornece<strong>do</strong>r <strong>do</strong><br />

serviço e <strong>do</strong> local <strong>do</strong> estacionamento o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> proteger a pessoa e os bens <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. A socieda<strong>de</strong> empresária que forneça<br />

serviço <strong>de</strong> estacionamento aos seus clientes <strong>de</strong>ve respon<strong>de</strong>r por furtos, roubos ou latrocínios ocorri<strong>do</strong>s no interior <strong>do</strong> seu<br />

estabelecimento; pois, em troca <strong>do</strong>s benefícios financeiros indiretos <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong>sse acréscimo <strong>de</strong> conforto aos consumi<strong>do</strong>res,<br />

assume-se o <strong>de</strong>ver – implícito na relação contratual – <strong>de</strong> lealda<strong>de</strong> e segurança, como aplicação concreta <strong>do</strong> princípio da confiança<br />

(…). Ressalte-se que o leitor ótico situa<strong>do</strong> na saída <strong>do</strong> estacionamento encontra-se ainda <strong>de</strong>ntro da área <strong>do</strong> shopping center, sen<strong>do</strong><br />

certo que tais cancelas – com controles eletrônicos que comprovam a entrada <strong>do</strong> veículo, o seu tempo <strong>de</strong> permanência e o<br />

pagamento <strong>do</strong> preço – são ali instaladas no exclusivo interesse da administra<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> estacionamento com o escopo precípuo <strong>de</strong><br />

evitar o inadimplemento pelo usuário <strong>do</strong> serviço” (STJ – REsp 1.269.691/PB – Rel. originária Min. Isabel Gallotti – Rel. para<br />

acórdão Min. Luis Felipe Salomão – j. 21.11.2013).<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>, a mesma Corte julgou que o ataque <strong>de</strong> psicopata no cinema <strong>do</strong> shopping, metralhan<strong>do</strong> as pessoas que<br />

ali se encontram, constitui um evento externo, a excluir a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços (caso Mateus da Costa Meira,<br />

ocorri<strong>do</strong> em 3 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1999). A conclusão foi assim publicada no Informativo n. 433 <strong>do</strong> STJ:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong>. Shopping center. Trata-se <strong>de</strong> REsp em que se discute a responsabilida<strong>de</strong> e, consequentemente, o <strong>de</strong>ver <strong>do</strong><br />

shopping ora recorrente <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> disparos <strong>de</strong> arma <strong>de</strong> fogo na sala <strong>de</strong> um cinema daquele shopping, fato que<br />

levou à morte várias pessoas, entre as quais, o filho <strong>do</strong> ora recorri<strong>do</strong>. A Turma enten<strong>de</strong>u que, para chegar à configuração <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver<br />

<strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar, não basta que o ofendi<strong>do</strong> <strong>de</strong>monstre sua <strong>do</strong>r, visto que somente ocorrerá a responsabilida<strong>de</strong> civil se reuni<strong>do</strong>s to<strong>do</strong>s os<br />

seus elementos essenciais, tais como dano, ilicitu<strong>de</strong> e nexo causal. Em sen<strong>do</strong> assim, não há como <strong>de</strong>ferir qualquer pretensão<br />

in<strong>de</strong>nizatória se não foi comprova<strong>do</strong>, ao curso da instrução, nas instâncias ordinárias, o nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> entre os tiros <strong>de</strong>sferi<strong>do</strong>s<br />

e a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> shopping on<strong>de</strong> se situava o cinema. Desse mo<strong>do</strong>, rompi<strong>do</strong> o nexo causal da obrigação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar, não há<br />

falar em direito à percepção <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais e materiais. Diante disso, <strong>de</strong>u-se provimento ao recurso” (STJ – REsp<br />

1.164.889-SP – Rel. Min. Honil<strong>do</strong> Amaral <strong>de</strong> Mello Castro (Desembarga<strong>do</strong>r Convoca<strong>do</strong> <strong>do</strong> TJAP) – j. 04.05.2010).<br />

Essa forma <strong>de</strong> julgar foi confirmada pelo STJ em aresto mais recente, segun<strong>do</strong> o qual “‘não se revela razoável exigir das<br />

equipes <strong>de</strong> segurança <strong>de</strong> um cinema ou <strong>de</strong> uma administra<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> shopping centers que previssem, evitassem ou estivessem<br />

antecipadamente preparadas para conter os danos resultantes <strong>de</strong> uma investida homicida promovida por terceiro usuário, mesmo<br />

porque tais medidas não estão compreendidas entre os <strong>de</strong>veres e cuida<strong>do</strong>s ordinariamente exigi<strong>do</strong>s <strong>de</strong> estabelecimentos comerciais<br />

<strong>de</strong> tais espécies’ (REsp 1.384.630/SP – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – Rel. p/Acórdão Min. Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva –<br />

Terceira Turma – j. 20.02.2014 – DJe 12.06.2014; grifou-se). Assim, se o shopping e o cinema não concorreram para a eclosão <strong>do</strong>


evento que ocasionou os alega<strong>do</strong>s danos morais, não há que se lhes imputar qualquer responsabilida<strong>de</strong>, sen<strong>do</strong> certo que esta <strong>de</strong>ve<br />

ser atribuída, com exclusivida<strong>de</strong>, em hipóteses tais, a quem praticou a conduta danosa, ensejan<strong>do</strong>, assim, o reconhecimento <strong>do</strong> fato<br />

<strong>de</strong> terceiro, exclu<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> e, em consequência, <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar (art. 14, § 3º, inc. II, CDC)” (STJ – REsp<br />

1.133.731/SP – Rel. Min. Marco Buzzi – Quarta Turma – j. 12.08.2014 – DJe 20.08.2014).<br />

Cumpre anotar que as <strong>de</strong>cisões superiores acabam por reformar entendimento <strong>do</strong> Tribunal Paulista, que, muitas vezes, julga<br />

pela responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> shopping center e da empresa <strong>de</strong> cinema: “In<strong>de</strong>nização por danos morais e materiais. Homicídio ocorri<strong>do</strong><br />

em cinema localiza<strong>do</strong> <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> shopping center. Responsabilida<strong>de</strong> solidária <strong>do</strong> empreen<strong>de</strong><strong>do</strong>r e <strong>do</strong> lojista <strong>de</strong>corrente da relação <strong>de</strong><br />

consumo estabelecida entre o consumi<strong>do</strong>r e aquelas pessoas. Estabelecimentos que angariam frequenta<strong>do</strong>res em razão da<br />

segurança que oferecem. Verba fixada, entretanto, que se mostra exagerada quanto a um aspecto. Recursos das rés e das autoras<br />

parcialmente provi<strong>do</strong>s” (TJSP – Apelação com revisão 3850464300 – Sétima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Arthur Del<br />

Guércio – j. 23.11.2006). Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, há uma ampliação exagerada da responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s entes priva<strong>do</strong>s quan<strong>do</strong>, na<br />

verda<strong>de</strong>, quem <strong>de</strong>veria respon<strong>de</strong>r seriam os entes públicos, pela flagrante falta <strong>de</strong> segurança. A questão passa por uma necessária<br />

revisão da responsabilida<strong>de</strong> civil estatal, diante da falsa premissa da responsabilida<strong>de</strong> subjetiva estatal, por omissão <strong>do</strong>s entes e<br />

agentes públicos.66<br />

Supera<strong>do</strong> esse interessante e atual <strong>de</strong>bate, ilustre-se que o conceito <strong>de</strong> fortuito externo é aplica<strong>do</strong> para afastar o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong><br />

reparar em casos <strong>de</strong> eventos da natureza sem relação com o objetivo <strong>do</strong> fornecimento ou prestação. Nessa linha, <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong><br />

Tribunal Paulista, em situação envolven<strong>do</strong> danos a consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> ou bystan<strong>de</strong>r:<br />

“Queda <strong>de</strong> painel publicitário diante <strong>de</strong> vendaval. O fortuito externo exclui a obrigação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar e, no caso, não se constatou que<br />

a queda <strong>do</strong> objeto se <strong>de</strong>u em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> falha <strong>de</strong> sustentação, mas, sim, <strong>de</strong> força anormal e inevitável <strong>de</strong> fenômeno da natureza.<br />

Vítimas que sofreram danos <strong>de</strong> natureza leve. Improcedência mantida. Não provimento, prejudica<strong>do</strong> o agravo reti<strong>do</strong>” (TJSP –<br />

Apelação 482.081.4/0 – Acórdão 3334021, Osasco – Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Ênio Santarelli Zuliani – j.<br />

16.10.2008 – DJESP 17.12.2008).<br />

Por outra via, a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fortuito interno vem sen<strong>do</strong> aplicada pela inteligência jurispru<strong>de</strong>ncial para não excluir a<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil, mormente em fatos concretos <strong>de</strong> negativação <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes:<br />

“Dano moral. Nítida a hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, que não tem como fazer a prova <strong>de</strong> que não contratou com a ré. In<strong>de</strong>vida<br />

negativação <strong>de</strong> nome <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r junto a banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>de</strong> proteção ao crédito. Ocorrência <strong>de</strong> fortuito interno, que se incorpora<br />

ao risco da ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> massa. Danos morais in re ipsa <strong>de</strong>correntes da negativação. Critérios para<br />

mensuração. Funções punitiva e ressarcitória. Montante fixa<strong>do</strong> em patamar razoável. Recurso provi<strong>do</strong> em parte, apenas para alterar<br />

o índice <strong>de</strong> correção monetária <strong>do</strong> valor in<strong>de</strong>nizatório” (TJSP – Apelação Cível 490.260.4/0 – Acórdão 3509627, São Paulo –<br />

Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Francisco Loureiro – j. 05.03.2009 – DJESP 30.03.2009).<br />

Do Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça po<strong>de</strong> ainda ser <strong>de</strong>staca<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> que concluiu pelo fortuito interno em caso <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>nte<br />

ocorri<strong>do</strong> em excursão <strong>do</strong> colégio. A ementa é interessante, por revelar uma hipótese que muito ocorre na prática. Vejamos:<br />

“Civil e processual civil. Aci<strong>de</strong>nte ocorri<strong>do</strong> com aluno durante excursão organizada pelo colégio. Existência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito. Fato <strong>do</strong><br />

serviço. Responsabilida<strong>de</strong> objetiva. Ausência <strong>de</strong> exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>. 1. É incontroverso no caso que o serviço presta<strong>do</strong><br />

pela instituição <strong>de</strong> ensino foi <strong>de</strong>feituoso, ten<strong>do</strong> em vista que o passeio ao parque, que se relacionava à ativida<strong>de</strong> acadêmica a cargo<br />

<strong>do</strong> colégio, foi realiza<strong>do</strong> sem a previsão <strong>de</strong> um corpo <strong>de</strong> funcionários compatível com o número <strong>de</strong> alunos que participava da<br />

ativida<strong>de</strong>. 2. O Tribunal <strong>de</strong> origem, a pretexto <strong>de</strong> justificar a aplicação <strong>do</strong> art. 14 <strong>do</strong> CDC, impôs a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comprovação <strong>de</strong><br />

culpa da escola, violan<strong>do</strong> o dispositivo ao qual pretendia dar vigência, que prevê a responsabilida<strong>de</strong> objetiva da escola. 3. Na<br />

relação <strong>de</strong> consumo, existin<strong>do</strong> caso fortuito interno, ocorri<strong>do</strong> no momento da realização <strong>do</strong> serviço, como na hipótese em apreço,<br />

permanece a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, pois, ten<strong>do</strong> o fato relação com os próprios riscos da ativida<strong>de</strong>, não ocorre o<br />

rompimento <strong>do</strong> nexo causal. 4. Os estabelecimentos <strong>de</strong> ensino têm <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> segurança em relação ao aluno no perío<strong>do</strong> em que<br />

estiverem sob sua vigilância e autorida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ver este <strong>do</strong> qual <strong>de</strong>riva a responsabilida<strong>de</strong> pelos danos ocorri<strong>do</strong>s. 5. Face as<br />

peculiarida<strong>de</strong> <strong>do</strong> caso concreto e os critérios <strong>de</strong> fixação <strong>do</strong>s danos morais a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong>s por esta Corte, tem-se por razoável a con<strong>de</strong>nação<br />

da recorrida ao pagamento <strong>de</strong> R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a título <strong>de</strong> danos morais. 6. A não realização <strong>do</strong> necessário cotejo<br />

analítico <strong>do</strong>s acórdãos, com indicação das circunstâncias que i<strong>de</strong>ntifiquem as semelhanças entre o aresto recorri<strong>do</strong> e os paradigmas,<br />

implica o <strong>de</strong>satendimento <strong>de</strong> requisitos indispensáveis à comprovação <strong>do</strong> dissídio jurispru<strong>de</strong>ncial. 7. Recursos especiais conheci<strong>do</strong>s<br />

em parte e, nesta parte, provi<strong>do</strong>s para con<strong>de</strong>nar o réu a in<strong>de</strong>nizar os danos morais e materiais suporta<strong>do</strong>s pelo autor” (STJ – REsp<br />

762.075/DF – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 16.06.2009 – DJe 29.06.2009).<br />

O fortuito interno ainda é aplica<strong>do</strong> em julga<strong>do</strong>s acerca <strong>do</strong> apagão aéreo, o qual atingiu o País em época recente, trazen<strong>do</strong> a<br />

conclusão <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> da empresa aérea, pois se ingressa nos riscos <strong>do</strong> empreendimento (veja-se: TJSP – Apelação<br />

991.09.028950-2 – Acórdão 4753638, São Paulo – Décima Oitava Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Rubens Cury – j.


28.09.2010 – DJESP 04.11.2010; TJSP – Apelação 7256443-5 – Acórdão 3462329, São Paulo – Vigésima Quarta Câmara <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Antônio Ribeiro Pinto – j. 22.01.2009 – DJESP 25.02.2009; e TJDF – Recurso 2007.09.1.014464-0 –<br />

Acórdão 317.416 – Segunda Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e Criminais – Rel. Designa<strong>do</strong> Juiz Alfeu Macha<strong>do</strong> –<br />

DJDFTE 22.08.2008, p. 106).<br />

Em suma, po<strong>de</strong>-se concluir que os mergulhos nos eventos internos e externos estão consolida<strong>do</strong>s na civilística nacional, seja<br />

no campo teórico ou prático. To<strong>do</strong>s os exemplos <strong>de</strong>monstram que, realmente, o rol <strong>do</strong>s arts. 12, § 3º e 14, § 3º da Lei 8.078/1990<br />

não é taxativo (numerus clausus), mas exemplificativo (numerus apertus), admitin<strong>do</strong>-se outras exclu<strong>de</strong>ntes, <strong>de</strong>ntro, por óbvio, <strong>do</strong><br />

bom senso. A questão envolve a equida<strong>de</strong>, a justiça <strong>do</strong> caso concreto, prevista expressamente como fonte consumerista pelo caput<br />

<strong>do</strong> art. 7º <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Resumin<strong>do</strong> a análise <strong>de</strong> tais eventos, po<strong>de</strong> ser elabora<strong>do</strong> o seguinte quadro comparativo,<br />

quanto aos eventos internos e externos.<br />

Caso fortuito externo e força maior externa<br />

Não têm relação com o fornecimento <strong>do</strong> produto ou a<br />

prestação <strong>de</strong> serviços.<br />

São exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>.<br />

Caso fortuito interno e força maior interna<br />

Têm relação com o fornecimento <strong>do</strong> produto e a<br />

prestação <strong>de</strong> serviços (ingressam no risco-proveito ou no<br />

risco <strong>do</strong> empreendimento).<br />

Não são exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>.<br />

Supera<strong>do</strong> esse ponto, vejamos o eventual enquadramento <strong>do</strong>s riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento como exclu<strong>de</strong>ntes da<br />

responsabilida<strong>de</strong> consumerista.<br />

4.4.5.<br />

Os riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento como exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r<br />

Outra questão que merece ser <strong>de</strong>batida nesta obra está relacionada aos riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento como exclu<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong><br />

sistema <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Trata-se <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s temas mais atuais da responsabilida<strong>de</strong> civil. Os riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento, segun<strong>do</strong><br />

Marcelo Junqueira Calixto, são aqueles que não são conheci<strong>do</strong>s pelas ciências quan<strong>do</strong> da colocação <strong>do</strong> produto no merca<strong>do</strong>, vin<strong>do</strong><br />

a ser <strong>de</strong>scobertos posteriormente, após a utilização <strong>do</strong> produto e diante <strong>do</strong>s avanços científicos.67<br />

Ilustran<strong>do</strong>, mencione-se o problema futuro que po<strong>de</strong> surgir a respeito <strong>do</strong>s alimentos transgênicos, <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> modificação<br />

genética. Imagine-se se, no futuro, for <strong>de</strong>scoberto e comprova<strong>do</strong> cientificamente que tais alimentos causam <strong>do</strong>enças, como o<br />

câncer. Consigne-se que a matéria foi regulada, no Brasil, timidamente e <strong>de</strong> forma insatisfatória, pela Lei 11.105, <strong>de</strong> 2005,<br />

<strong>de</strong>nominada Lei <strong>de</strong> Biossegurança. No tocante à responsabilida<strong>de</strong> civil, foi inserida norma preven<strong>do</strong> a responsabilida<strong>de</strong> objetiva<br />

das empresas que <strong>de</strong>senvolvem ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> transformação genética, em regime próximo à responsabilida<strong>de</strong> ambiental, que ainda<br />

será estudada (art. 20).<br />

O tema <strong>do</strong>s riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento é amplamente <strong>de</strong>bati<strong>do</strong> no Velho Continente, particularmente diante da Diretiva<br />

85/374/CEE, da Comunida<strong>de</strong> Europeia, <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1985, relativa “à aproximação das disposições legislativas,<br />

regulamentares e administrativas <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s-Membros em matéria <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong>s produtos <strong>de</strong>feituosos”. O<br />

art. 7º da referida Diretiva Internacional enuncia as hipóteses em que a empresa não respon<strong>de</strong> pelo produto coloca<strong>do</strong> no merca<strong>do</strong>.<br />

O primeiro caso <strong>de</strong> exclusão da responsabilida<strong>de</strong> diz respeito à hipótese <strong>de</strong> prova <strong>do</strong> produtor <strong>de</strong> que não colocou o produto<br />

em circulação, situação em que o dano não se faz presente. A<strong>de</strong>mais, po<strong>de</strong>-se falar em ausência <strong>de</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> em casos<br />

tais, não haven<strong>do</strong> a necessária relação <strong>de</strong> causa e efeito entre uma eventual conduta e o dano presente. A segunda hipótese <strong>de</strong><br />

exclusão da reparação refere-se ao caso <strong>de</strong> o produtor provar que, ten<strong>do</strong> em conta as circunstâncias, se po<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar que o<br />

<strong>de</strong>feito não existia no momento em que o produto foi coloca<strong>do</strong> em circulação ou que este <strong>de</strong>feito surgiu posteriormente. Tal<br />

<strong>de</strong>finição tem relação com os riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento. Igualmente, não haverá responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fabricante se ele provar que<br />

produto não foi fabrica<strong>do</strong> para venda ou para qualquer outra forma <strong>de</strong> distribuição com um fim econômico por parte <strong>do</strong> produtor,<br />

nem fabrica<strong>do</strong> ou distribuí<strong>do</strong> no âmbito da sua ativida<strong>de</strong> profissional. A quarta situação é se o <strong>de</strong>feito, bem como o consequente<br />

dano ao consumi<strong>do</strong>r, é <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> à conformida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produto com normas imperativas estabelecidas pelas autorida<strong>de</strong>s públicas. Como<br />

quinta previsão, o produtor não respon<strong>de</strong> se o esta<strong>do</strong> <strong>do</strong>s conhecimentos científicos e técnicos no momento da colocação em<br />

circulação <strong>do</strong> produto não lhe permitiu <strong>de</strong>tectar a existência <strong>do</strong> <strong>de</strong>feito, exclu<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> interativa aos riscos <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>senvolvimento. Por fim, o produtor não respon<strong>de</strong> pelo <strong>de</strong>feito imputável à concepção <strong>do</strong> produto no qual foi incorporada a parte<br />

componente ou às instruções dadas pelos fabricantes.<br />

No sistema português, a referida Diretiva foi recepcionada pelo Decreto-lei 383, <strong>de</strong> 6 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1989, altera<strong>do</strong>,


posteriormente, pelo Decreto-lei 131, <strong>de</strong> 24 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 2001. As previsões sobre os riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento recebem críticas<br />

contun<strong>de</strong>ntes da <strong>do</strong>utrina, eis que estariam mais próximas <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> subjetiva fundada na culpa. Leciona<br />

Menezes Leitão, professor catedrático da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Lisboa, que “Esta exoneração foi, porém, subordinada através <strong>do</strong> art. 15º<br />

da Directiva a um procedimento <strong>de</strong> stand-still comunitário para aumentar, se possível, o nível <strong>de</strong> proteção da Comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

mo<strong>do</strong> uniforme, ten<strong>do</strong>-se previsto expressamente uma eventual revisão da Directiva, neste ponto, após o estu<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua utilização<br />

pelos tribunais”.68<br />

De to<strong>do</strong> mo<strong>do</strong>, a questão não é pacífica entre os lusitanos, uma vez que a comissão elabora<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> anteprojeto <strong>do</strong> Código <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r Português preten<strong>de</strong> reproduzir a norma da Diretiva, com a menção <strong>do</strong>s riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento como exclu<strong>de</strong>nte da<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produtor. 69 Relembre-se que a comissão elabora<strong>do</strong>ra é presidida pelo professor catedrático da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Coimbra António Pinto Monteiro, contan<strong>do</strong> com vários acadêmicos em seus quadros. 70 Ainda em Portugal, to<strong>do</strong> o <strong>de</strong>bate relativo a<br />

essa Diretiva levou Carlos Ferreira <strong>de</strong> Almeida, professor da Universida<strong>de</strong> Nova <strong>de</strong> Lisboa, a afirmar que “o balanço acerca das<br />

virtualida<strong>de</strong>s da Directiva é muito <strong>de</strong>sequilibra<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> raras as vozes favoráveis ao seu conteú<strong>do</strong>. Nenhuma directiva<br />

comunitária é porventura tão criticada e tão mal-amada como esta”. 71<br />

O tema <strong>do</strong>s riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento é discuti<strong>do</strong> por igual na Itália, precisamente porque houve uma alteração legislativa no<br />

tocante à Diretiva Europeia. Conforme aponta Gui<strong>do</strong> Alpa, o risco <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento (rischio <strong>de</strong>llo sviluppo) exclui a<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produtor <strong>do</strong> sistema italiano. Porém, a empresa <strong>de</strong>verá respon<strong>de</strong>r se, <strong>de</strong>pois da sua colocação <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>,<br />

conhecia ou <strong>de</strong>veria conhecer a sua periculosida<strong>de</strong>, omitin<strong>do</strong>-se em a<strong>do</strong>tar as medidas idôneas para evitar o dano, principalmente<br />

aquelas relacionadas à informação <strong>do</strong> público. 72 As conclusões <strong>do</strong> jurista são <strong>de</strong> incidência da responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Código Civil<br />

Italiano em situações tais, nos termos <strong>do</strong> seu art. 2.050, da exposição ao perigo a gerar a responsabilida<strong>de</strong> por culpa presumida.<br />

No caso brasileiro, po<strong>de</strong>-se afirmar que o tema divi<strong>de</strong> a <strong>do</strong>utrina, haven<strong>do</strong> uma propensão a afirmar que os riscos <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>senvolvimento não excluem o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar, apesar <strong>de</strong> fortes resistências. Nessa linha <strong>de</strong> raciocínio foi a opinião <strong>do</strong>s<br />

juristas presentes na I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, com a aprovação <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 43, dispon<strong>do</strong> que “a responsabilida<strong>de</strong> civil pelo<br />

fato <strong>do</strong> produto, prevista no art. 931 <strong>do</strong> novo Código Civil, também inclui os riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento”. Em apura<strong>do</strong> estu<strong>do</strong>, ao<br />

expor toda a controvérsia <strong>do</strong>utrinária relativa ao assunto e filiar-se à corrente da responsabilização, lecionam Silmara Juny <strong>de</strong><br />

Abreu Chinelato e Antonio Carlos Morato, professores da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo:<br />

“Consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>, ainda, que o risco <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento relaciona-se com o fato <strong>do</strong> produto, com sua segurança, envolven<strong>do</strong> direito à<br />

via, à integrida<strong>de</strong> física e psíquica <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, direitos da personalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> relevância, somente po<strong>de</strong>ria ser admiti<strong>do</strong> no<br />

or<strong>de</strong>namento jurídico <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> expresso, como ocorre nos países europeus que a<strong>do</strong>taram a Diretiva 85/374, e jamais implícito.<br />

A opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r foi clara no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> não acolher tal exclu<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>, não haven<strong>do</strong> margem à dúvida quanto<br />

à interpretação taxativa <strong>do</strong> rol <strong>do</strong> § 3º <strong>do</strong> art. 12 <strong>do</strong> CDC, no qual o risco <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento não se inclui.”73<br />

De fato, seja no sistema civilista ou, principalmente, consumerista, a melhor conclusão é a <strong>de</strong> que o fornece<strong>do</strong>r respon<strong>de</strong> pelos<br />

riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento, servin<strong>do</strong> como alento as i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> risco-proveito e <strong>de</strong> risco <strong>do</strong> empreendimento. A<strong>de</strong>mais, a<br />

responsabilida<strong>de</strong>, na proporção <strong>do</strong> risco presente, po<strong>de</strong> ser retirada <strong>do</strong> art. 10 da Lei 8.078/1990, eis que o fornece<strong>do</strong>r não po<strong>de</strong>rá<br />

colocar no merca<strong>do</strong> produto que sabia ou <strong>de</strong>veria saber tratar-se <strong>de</strong> perigoso.<br />

Em reforço, subsume-se o imperativo <strong>do</strong> art. 8º <strong>do</strong> Código Consumerista, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que os produtos coloca<strong>do</strong>s no merca<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong> consumo não acarretarão riscos à saú<strong>de</strong> ou à segurança <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, exceto os consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s normais e previsíveis em<br />

<strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> sua natureza e fruição, obrigan<strong>do</strong>-se os fornece<strong>do</strong>res, em qualquer situação, a disponibilizarem as informações<br />

necessárias e a<strong>de</strong>quadas a seu respeito. Na mesma linha, opina Bruno Miragem que os riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento ingressam na<br />

garantia <strong>de</strong> efetivida<strong>de</strong> <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, ao a<strong>do</strong>tar um sistema <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva que engloba os riscos<br />

coloca<strong>do</strong>s no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo.74 Por bem, a jurisprudência nacional tem chega<strong>do</strong> à mesma conclusão, caben<strong>do</strong> <strong>de</strong>stacar:<br />

“Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Recusa da segura<strong>do</strong>ra em custear o tratamento <strong>de</strong> quimioterapia sob alegação <strong>de</strong> que se trata <strong>de</strong> medicamento<br />

experimental. Sentença proce<strong>de</strong>nte. Dano moral configura<strong>do</strong>. Preven<strong>do</strong> o contrato cobertura para a quimioterapia, não po<strong>de</strong>ria a<br />

primeira apelante negar o custeio para o tratamento correlato, através <strong>de</strong> nova técnica, mais eficaz e indicada para o paciente.<br />

A<strong>de</strong>mais, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> risco <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento, é <strong>de</strong> serem imputa<strong>do</strong>s aos fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviço não só as<br />

novas técnicas, mas também os efeitos colaterais que a ciência só veio a conhecer posteriormente, caso em que a nova <strong>de</strong>scoberta é<br />

incorporada aos serviços. Danos morais reduzi<strong>do</strong>s ao patamar <strong>de</strong> R$ 8.000,00, com juros moratórios a contar da citação. Quanto à<br />

restituição da quantia <strong>de</strong> R$ 4.120,81, <strong>de</strong>ve ser na forma simples e não em <strong>do</strong>bro, vez que além <strong>do</strong> pagamento não ter si<strong>do</strong> realiza<strong>do</strong><br />

diretamente em favor <strong>do</strong> réu (fls. 77), não houve cobrança in<strong>de</strong>vida, mas apenas a recusa da cobertura securitária, não sen<strong>do</strong>, assim,<br />

aplicável o art. 42 da Lei 8.078/1990. Provimento parcial <strong>de</strong> ambos os recursos” (TJRJ – Apelação 2009.001.19443 – Quarta<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Mônica Tolle<strong>do</strong> <strong>de</strong> Oliveira – j. 15.09.2009 – DORJ 21.09.2009, p. 137).<br />

Pelo mesmo caminho <strong>de</strong> inclusão <strong>do</strong>s riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento na responsabilida<strong>de</strong> civil, vejamos julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Superior


Tribunal <strong>de</strong> Justiça, que <strong>de</strong>terminou a responsabilida<strong>de</strong> da empresa <strong>de</strong> medicamento pelo produto que, posteriormente, <strong>de</strong>scobriuse<br />

ser <strong>de</strong> uso limita<strong>do</strong> ou restritivo:<br />

“<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Consumo <strong>de</strong> Survector, medicamento inicialmente vendi<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma livre em farmácias. Posterior<br />

alteração <strong>de</strong> sua prescrição e imposição <strong>de</strong> restrição à comercialização. Risco <strong>do</strong> produto avalia<strong>do</strong> posteriormente, culminan<strong>do</strong> com<br />

a sua proibição em diversos países. Recorrente que iniciou o consumo <strong>do</strong> medicamento à época em que sua venda era livre.<br />

Dependência contraída, com diversas restrições experimentadas pelo paciente. Dano moral reconheci<strong>do</strong>. É <strong>de</strong>ver <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r a<br />

ampla publicida<strong>de</strong> ao merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo a respeito <strong>do</strong>s riscos inerentes a seus produtos e serviços. A comercialização livre <strong>do</strong><br />

medicamento Survector, com indicação na bula <strong>de</strong> mero ativa<strong>do</strong>r <strong>de</strong> memória, sem efeitos colaterais, por ocasião <strong>de</strong> sua<br />

disponibilização ao merca<strong>do</strong>, gerou o risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência para usuários. A posterior alteração da bula <strong>do</strong> medicamento, que passou<br />

a ser indica<strong>do</strong> para o tratamento <strong>de</strong> transtornos <strong>de</strong>pressivos, com alto risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência, não é suficiente para retirar <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r a responsabilida<strong>de</strong> pelos danos causa<strong>do</strong>s aos consumi<strong>do</strong>res. O aumento da periculosida<strong>de</strong> <strong>do</strong> medicamento <strong>de</strong>veria ser<br />

amplamente divulga<strong>do</strong> nos meios <strong>de</strong> comunicação. A mera alteração da bula e <strong>do</strong> controle <strong>de</strong> receitas na sua comercialização não<br />

são suficientes para prestar a a<strong>de</strong>quada informação ao consumi<strong>do</strong>r. A circunstância <strong>de</strong> o paciente ter consumi<strong>do</strong> o produto sem<br />

prescrição médica não retira <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r a obrigação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Pelo sistema <strong>do</strong> CDC, o fornece<strong>do</strong>r somente se <strong>de</strong>sobriga nas<br />

hipóteses <strong>de</strong> culpa exclusiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (art. 12, § 3º, <strong>do</strong> CDC), o que não ocorre na hipótese, já que a própria bula <strong>do</strong><br />

medicamento não indicava os riscos associa<strong>do</strong>s à sua administração, caracterizan<strong>do</strong> culpa concorrente <strong>do</strong> laboratório. A<br />

caracterização da negligência <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r em colocar o medicamento no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo ganha relevo à medida que,<br />

conforme se nota pela manifestação <strong>de</strong> diversas autorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, inclusive a OMC, o cloridrato <strong>de</strong> amineptina, princípio ativo<br />

<strong>do</strong> Survector, foi consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> um produto com alto potencial <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência e baixa eficácia terapêutica em diversas partes <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong>, circunstâncias que inclusive levaram a seu banimento em muitos países. Deve ser mantida a in<strong>de</strong>nização fixada, a título <strong>de</strong><br />

dano moral, para o paciente que adquiriu <strong>de</strong>pendência da droga. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 971.845/DF –<br />

Rel. Min. Humberto Gomes <strong>de</strong> Barros – Terceira Turma – Rel. p/Acórdão Min. Nancy Andrighi – j. 21.08.2008 – DJe 01.12.2008).<br />

Sem dúvida, os riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento constituem um <strong>do</strong>s temas mais <strong>de</strong>lica<strong>do</strong>s na ótica consumerista, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser<br />

<strong>de</strong>bati<strong>do</strong>s com gran<strong>de</strong> profundida<strong>de</strong> pela <strong>do</strong>utrina e pela jurisprudência nacionais, no presente e no futuro.<br />

4.5.<br />

O FATO CONCORRENTE DO CONSUMIDOR COMO ATENUANTE DA<br />

RESPONSABILIDADE CIVIL DOS FORNECEDORES E PRESTADORES<br />

Supera<strong>do</strong> o estu<strong>do</strong> das exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> consumerista, cumpre expor o fato concorrente <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r como<br />

atenuante da responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos e presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços. O tema, como outros <strong>do</strong> presente<br />

capítulo, foram estuda<strong>do</strong>s pelo presente autor por ocasião da <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> sua tese <strong>de</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> da<br />

Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, publicada por esta mesma editora.75<br />

Como é notório, o Código Civil estabeleceu um sistema <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil basea<strong>do</strong> na extensão <strong>do</strong> dano e no grau <strong>de</strong><br />

culpa <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s com o evento (art. 944). Assim, haven<strong>do</strong> excessiva <strong>de</strong>sproporção entre o grau <strong>de</strong> culpa <strong>do</strong> agente e o dano,<br />

po<strong>de</strong>rá o juiz reduzir equitativamente a in<strong>de</strong>nização. Mais <strong>do</strong> que isso, consagra-se a culpa concorrente da vítima como atenuante<br />

da responsabilida<strong>de</strong> civil (art. 945 <strong>do</strong> CC). Questão importante resi<strong>de</strong> em saber se tais parâmetros têm incidência também para a<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva, notadamente para a responsabilida<strong>de</strong> civil prevista pela Lei 8.078/1990. A indagação foi<br />

inicialmente respondida quan<strong>do</strong> da I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil (2002), com a aprovação <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 46, cuja redação original<br />

era a seguinte: “A possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> redução <strong>do</strong> montante da in<strong>de</strong>nização em face <strong>do</strong> grau <strong>de</strong> culpa <strong>do</strong> agente, estabelecida no<br />

parágrafo único <strong>do</strong> art. 944 <strong>do</strong> novo Código Civil, <strong>de</strong>ve ser interpretada restritivamente, por representar uma exceção ao princípio<br />

da reparação integral <strong>do</strong> dano, não se aplican<strong>do</strong> às hipóteses <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva” (grifos <strong>de</strong>ste autor).<br />

Quan<strong>do</strong> da IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil (2006), por proposição <strong>do</strong> presente autor, a parte em <strong>de</strong>staque da ementa <strong>do</strong>utrinária<br />

foi excluída pelo Enuncia<strong>do</strong> n. 380 da IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil (“Atribui-se nova redação ao Enuncia<strong>do</strong> n. 46 da I Jornada <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Civil, com a supressão da parte final: não se aplican<strong>do</strong> às hipóteses <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva”). Na V Jornada <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Civil (2011), a questão se concretizou pela aprovação <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 459, também proposto por este autor: “A conduta da<br />

vítima po<strong>de</strong> ser fator atenuante <strong>do</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> na responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva”.<br />

Isso porque tem-se admiti<strong>do</strong> amplamente o fato concorrente da vítima como atenuante da responsabilida<strong>de</strong> objetiva. A<br />

expressão <strong>de</strong>ve ser entendida em senti<strong>do</strong> amplo, a englobar a culpa concorrente e o risco concorrente <strong>do</strong> próprio consumi<strong>do</strong>r. Na<br />

ótica <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, o problema é muito bem enfrenta<strong>do</strong> por Sérgio Cavalieri Filho:<br />

“Muitos autores não admitem a culpa concorrente nas relações <strong>de</strong> consumo por consi<strong>de</strong>rarem incompatível a concorrência <strong>de</strong> culpa<br />

na responsabilida<strong>de</strong> objetiva. Como falar em culpa concorrente on<strong>de</strong> não há culpa? Por esse fundamento, todavia, a tese é<br />

insustentável porque, na realida<strong>de</strong>, o problema é <strong>de</strong> concorrência <strong>de</strong> causas e não <strong>de</strong> culpa, e o nexo causal é pressuposto<br />

fundamental em qualquer espécie <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>. Enten<strong>de</strong>mos, assim, que mesmo em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva é


possível a participação da vítima (culpa concorrente) na produção <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong>, como, <strong>de</strong> resto, tem admiti<strong>do</strong> a jurisprudência em<br />

casos <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil no Esta<strong>do</strong>”.76<br />

Ora, na esteira das palavras transcritas, o fato concorrente da vítima constitui uma atenuante que diminui a calibração <strong>do</strong> nexo<br />

<strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>, diminuin<strong>do</strong> o quantum <strong>de</strong>beatur. Essa é a opinião <strong>de</strong> Caitlin Sampaio Mulholland que, em tese <strong>de</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>fendida na UERJ, resolve o problema a partir <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> da concausalida<strong>de</strong> (soma <strong>de</strong> causas), que po<strong>de</strong> estar presente em casos<br />

envolven<strong>do</strong> o produto ou o serviço. Vejamos suas palavras:<br />

“O segun<strong>do</strong> caso é a, contrario sensu, o <strong>de</strong> uma pessoa que assume o risco <strong>de</strong> sofrer um dano através <strong>de</strong> conduta perigosa, quan<strong>do</strong><br />

tinha capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> antever a realização <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong>. Aqui a vítima conhecia e previa a possibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> evento danoso e aceita o<br />

risco <strong>do</strong> dano, como se fosse um blefe (culpa consciente). Mesmo nessa hipótese não po<strong>de</strong> haver a exclusão da responsabilida<strong>de</strong> por<br />

parte <strong>do</strong> agente. Primeiramente, porque não é possível inferir-se a existência <strong>de</strong> um contrato tácito <strong>de</strong> assunção <strong>de</strong> riscos e exclusão<br />

da responsabilida<strong>de</strong>. E em segun<strong>do</strong> lugar, porque o dano ocasiona<strong>do</strong> teve como causa a conduta <strong>de</strong> um agente. Contu<strong>do</strong>, nesse caso,<br />

existe uma diminuição <strong>do</strong> quantum in<strong>de</strong>nizatório, na medida em que existe a concorrência <strong>de</strong> causas. Um exemplo <strong>de</strong>ste último caso<br />

é <strong>de</strong> uma pessoa que inva<strong>de</strong> um <strong>de</strong>pósito <strong>de</strong> produtos pirotécnicos e o da empresa que não utilizou os meios para promover a<br />

segurança <strong>do</strong> local. Outro exemplo é o da pessoa que atravessa a rua em local permiti<strong>do</strong>, com sinal aberto para ela, mas um carro,<br />

em alta velocida<strong>de</strong> e visivelmente mostran<strong>do</strong> sinais <strong>de</strong> que não vai parar a tempo <strong>de</strong> impedir o dano, a atropela. Há concorrência <strong>de</strong><br />

culpas, pois o pe<strong>de</strong>stre assumiu os riscos <strong>de</strong> sua atitu<strong>de</strong>, por mais que fosse lícita, <strong>de</strong> gerar o dano ocasiona<strong>do</strong>”. 77<br />

Trata-se <strong>de</strong> incidência da máxima da equida<strong>de</strong>, retirada da isonomia constitucional e <strong>do</strong> bom-senso (art. 5º, caput, da<br />

CF/1988). Deve ficar bem claro que o fato concorrente da vítima não é fator exclu<strong>de</strong>nte da responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, mas<br />

simplesmente um fator <strong>de</strong> diminuição <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar. Desse mo<strong>do</strong>, a in<strong>de</strong>nização será fixada com razoabilida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong><br />

com as contribuições <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s, seja por culpa, fato ou risco assumi<strong>do</strong>.<br />

Na mesma linha <strong>de</strong> análise da concausalida<strong>de</strong>, o próprio proponente <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 46 <strong>do</strong> Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral, da I<br />

Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino, mu<strong>do</strong>u seu entendimento em relação à redação original da proposta anterior.<br />

Em artigo que sintetiza a sua tese <strong>de</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong>, <strong>de</strong>fendida na Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul, o jurista expõe, ao<br />

comentar o enuncia<strong>do</strong>, que, “Voltan<strong>do</strong> a refletir, com maior profundida<strong>de</strong>, a respeito <strong>do</strong> tema por ocasião da elaboração da<br />

presente tese, convenci-me, após aprofundar a pesquisa, da possibilida<strong>de</strong> da incidência da cláusula geral <strong>de</strong> redução também na<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva, revisan<strong>do</strong> posição anteriormente sustentada”.78 O atual Ministro <strong>do</strong> STJ recomenda que a interpretação<br />

<strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a gravida<strong>de</strong> da culpa seja substituída pela interpretação segun<strong>do</strong> a relevância da causa. 79 Uma das causas<br />

relevantes que este estu<strong>do</strong> propõe é justamente a assunção <strong>do</strong> risco pelas partes envolvidas com o evento danoso.<br />

Destaque-se que, como argumento para as proposições quan<strong>do</strong> das IV e V Jornadas <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, aduzimos que, em casos<br />

<strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva fundada no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, po<strong>de</strong> o réu alegar a culpa exclusiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r ou<br />

<strong>de</strong> terceiro, visan<strong>do</strong> afastar totalmente a sua responsabilida<strong>de</strong>. Para tal fim, foram cita<strong>do</strong>s os arts. 12, § 3º, e 14, § 3º, ambos da Lei<br />

8.078/1990, que preveem tais exclu<strong>de</strong>ntes. Dessa forma, foi argumenta<strong>do</strong> que, se o suposto agente po<strong>de</strong> o mais, que é alegar a<br />

exclu<strong>de</strong>nte total <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> para afastar a in<strong>de</strong>nização, po<strong>de</strong>ria o menos, que é atestar a conduta concorrente, visan<strong>do</strong><br />

diminuir o quantum in<strong>de</strong>nizatório.<br />

Em reforço, juntou-se, nas ocasiões, notório julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, o qual admitiu a discussão <strong>de</strong> culpa<br />

concorrente em ação <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva fundada no Código Consumerista. Trata-se <strong>do</strong> famoso caso <strong>do</strong> escorrega<strong>do</strong>r,<br />

normalmente utiliza<strong>do</strong> como fundamento para a tese da concausalida<strong>de</strong> consumerista, diante <strong>do</strong>s riscos assumi<strong>do</strong>s pelo próprio<br />

consumi<strong>do</strong>r:<br />

“Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. Culpa concorrente da vítima. Hotel. Piscina. Agência <strong>de</strong><br />

viagens. Responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> hotel, que não sinaliza convenientemente a profundida<strong>de</strong> da piscina, <strong>de</strong> acesso livre aos hóspe<strong>de</strong>s.<br />

Art. 14 <strong>do</strong> CDC. A culpa concorrente da vítima permite a redução da con<strong>de</strong>nação imposta ao fornece<strong>do</strong>r. Art. 12, § 2º, III, <strong>do</strong> CDC.<br />

A agência <strong>de</strong> viagens respon<strong>de</strong> pelo dano pessoal que <strong>de</strong>correu <strong>do</strong> mau serviço <strong>do</strong> hotel contrata<strong>do</strong> por ela para a hospedagem<br />

durante o pacote <strong>de</strong> turismo. Recursos conheci<strong>do</strong>s e provi<strong>do</strong>s em parte” (STJ – REsp 287.849/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Ruy<br />

Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar – j. 17.04.2001 – DJ 13.08.2001, p. 165).<br />

Na verda<strong>de</strong>, julga<strong>do</strong>s mais recentes <strong>do</strong> STJ reconhecem o fato concorrente <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r como fator atenuante: “Agravo<br />

regimental no agravo <strong>de</strong> instrumento. Responsabilida<strong>de</strong> objetiva. Culpa concorrente. Agravo regimental improvi<strong>do</strong>. Na<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva é <strong>de</strong>snecessário discutir a culpa <strong>do</strong> agente, uma vez que sua responsabilida<strong>de</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> culpa;<br />

entretanto, po<strong>de</strong>-se discutir a culpa concorrente ou exclusiva da vítima. Agravo regimental improvi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg no Ag<br />

852.683/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 15.02.2011 – DJe 21.02.2011). Na mesma linha, em li<strong>de</strong> relativa<br />

à frau<strong>de</strong> bancária praticada por meio <strong>de</strong> cheque furta<strong>do</strong>, em que ficou <strong>de</strong>vidamente comprovada a falta <strong>de</strong> cuida<strong>do</strong> por parte <strong>do</strong>


consumi<strong>do</strong>r:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Recurso especial. Cheque furta<strong>do</strong>. Devolução por motivo <strong>de</strong> conta encerrada. Falta <strong>de</strong> conferência da autenticida<strong>de</strong><br />

da assinatura. Protesto in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>. Inscrição no cadastro <strong>de</strong> inadimplentes. Dano moral. Configuração. Culpa concorrente. A falta <strong>de</strong><br />

diligência da instituição financeira em conferir a autenticida<strong>de</strong> da assinatura <strong>do</strong> emitente <strong>do</strong> título, mesmo quan<strong>do</strong> já encerrada a<br />

conta e ainda que o banco não tenha recebi<strong>do</strong> aviso <strong>de</strong> furto <strong>do</strong> cheque, enseja a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar os danos morais<br />

<strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> protesto in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> e da inscrição <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r nos cadastros <strong>de</strong> inadimplentes. Prece<strong>de</strong>ntes. Consi<strong>de</strong>radas as<br />

peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> processo, caracteriza-se hipótese <strong>de</strong> culpa concorrente quan<strong>do</strong> a conduta da vítima contribui para a ocorrência <strong>do</strong><br />

ilícito, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong>, por certo, a in<strong>de</strong>nização aten<strong>de</strong>r ao critério da proporcionalida<strong>de</strong>. Recurso especial parcialmente conheci<strong>do</strong> e nessa<br />

parte provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 712.591/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 16.11.2006 – DJ 04.12.2006, p. 300).<br />

Em aresto <strong>de</strong> 2013, o mesmo Tribunal da Cidadania aplicou a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> risco concorrente em caso envolven<strong>do</strong> a<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva bancária, fundada no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Houve a redução <strong>do</strong> valor reparatório pela<br />

conduta da vítima, uma pessoa jurídica consumi<strong>do</strong>ra, que contribuiu para o próprio prejuízo pela falta <strong>de</strong> diligência na emissão <strong>de</strong><br />

títulos <strong>de</strong> crédito. Vejamos a publicação da ementa <strong>de</strong>sse instigante acórdão, que cita trechos <strong>de</strong>ste livro e toda a evolução aqui<br />

exposta, especialmente a percebida nas Jornadas <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil:<br />

“Recursos especiais. Consumi<strong>do</strong>r. Responsabilida<strong>de</strong> concorrente. 1) Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização movida por correntista contra o banco.<br />

Pagamento <strong>de</strong> cheques emiti<strong>do</strong>s mediante assinatura apenas <strong>de</strong> gerente, Quan<strong>do</strong> exigida a assinatura <strong>de</strong>ste e <strong>de</strong> mais um diretor.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong> banco. 2) Responsabilida<strong>de</strong> concorrente reconhecida. In<strong>de</strong>nização à meta<strong>de</strong>. 3) Correção monetária a<br />

partir da data <strong>de</strong> cada cheque in<strong>de</strong>vidamente pago. 4) Juros <strong>de</strong> mora conta<strong>do</strong>s a partir da citação e não <strong>de</strong> cada pagamento <strong>de</strong><br />

cheque. Inadimplemento contratual e não in<strong>de</strong>nização por ato ilícito. 5) Lucros cessantes <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s. Ativida<strong>de</strong> empresarial pressupõe<br />

uso produtivo <strong>do</strong> dinheiro e não permanência contemplativa em conta bancária. 6) Liquidação <strong>de</strong> lucros cessantes por arbitramento.<br />

7) Aplicação <strong>do</strong> direito à espécie impossível, pois pleiteada somente na peça extraprocessual informal <strong>do</strong> memorial, quan<strong>do</strong><br />

impossível observar o contraditório. 8) Nulida<strong>de</strong> inexistente na dispensa <strong>de</strong> prova oral, pois testemunhos jamais influiriam na<br />

conclusão <strong>do</strong> julgamento. 9) Recursos especiais improvi<strong>do</strong>s. 1. Há responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong> banco, que paga cheques assina<strong>do</strong>s<br />

apenas por gerente, quan<strong>do</strong> exigível dupla assinatura, também assinatura <strong>de</strong> um diretor. Aplicação <strong>do</strong> art. 24 <strong>do</strong> CDC. 2. A<br />

responsabilida<strong>de</strong> concorrente é admissível, ainda que no caso <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r, quan<strong>do</strong> há<br />

responsabilida<strong>de</strong> subjetiva patente e irrecusável também <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, não se exigin<strong>do</strong>, no caso, a exclusivida<strong>de</strong> da culpa. (…)”<br />

(STJ – REsp 1.349.894/SP – Rel. Min. Sidnei Beneti – Terceira Turma – j. 04.04.2013 – DJe 11.04.2013).<br />

Insta anotar que o próprio codifica<strong>do</strong>r civil brasileiro admitiu a discussão da culpa concorrente da vítima, ou melhor,<br />

tecnicamente, <strong>de</strong> fato concorrente da vítima, em um caso <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva, a saber, na responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

transporta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> pessoas. O dispositivo em questão, art. 738 <strong>do</strong> Código Civil, enuncia, em seu caput, que a pessoa transportada<br />

<strong>de</strong>ve sujeitar-se às normas estabelecidas pelo transporta<strong>do</strong>r, constantes no bilhete ou afixadas à vista <strong>do</strong>s usuários. Ato contínuo,<br />

<strong>de</strong>ve abster-se <strong>de</strong> quaisquer atos que causem incômo<strong>do</strong> ou prejuízo aos passageiros, danifiquem o veículo, dificultem ou impeçam<br />

a execução normal <strong>do</strong> serviço. A norma é completada pelo seu parágrafo único, segun<strong>do</strong> o qual, se o prejuízo sofri<strong>do</strong> pela pessoa<br />

transportada for atribuível à transgressão <strong>de</strong> normas e instruções regulamentares, o juiz reduzirá equitativamente a in<strong>de</strong>nização, na<br />

medida em que a vítima houver concorri<strong>do</strong> para a ocorrência <strong>do</strong> dano. Na jurisprudência, vários são os acórdãos que reconhecem o<br />

fato concorrente da vítima como atenuante da responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> transporta<strong>do</strong>r, que é submetida ao CDC.<br />

Cite-se o entendimento relativo ao pingente <strong>de</strong> trem, aquele passageiro que vai pendura<strong>do</strong> <strong>do</strong> la<strong>do</strong> <strong>de</strong> fora <strong>do</strong> vagão, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong><br />

ser geralmente nota<strong>do</strong> por quem opera a máquina. Por vezes, fica ele pendura<strong>do</strong> por pura diversão, mas, em algumas situações, o<br />

faz por necessida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> ao fato <strong>de</strong> o vagão estar lota<strong>do</strong>. Deve ficar claro que a sua atitu<strong>de</strong> não se confun<strong>de</strong> com a <strong>do</strong> surfista <strong>de</strong><br />

trem, o qual é aquele que viaja em cima <strong>do</strong> vagão. A respeito <strong>do</strong> pingente, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça tem entendi<strong>do</strong> pela<br />

presença da culpa concorrente da vítima, não se excluin<strong>do</strong> totalmente a responsabilida<strong>de</strong> da empresa férrea, mas atenuan<strong>do</strong>-a (STJ<br />

– REsp 226.348/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Castro Filho – j. 19.09.2006 – DJ 23.10.2006, p. 294; e STJ – REsp 324.166/SP<br />

– Quarta Turma – Rel. Min. Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar – j. 18.10.2001 – DJ 18.02.2002, p. 455). Existem <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> Tribunais<br />

Estaduais na mesma linha, julgan<strong>do</strong> pela contribuição das condutas (ilustran<strong>do</strong>: TJRJ – Acórdão 2006.001.54574 – Décima Sexta<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Conv. Pedro Freire Raguenet – j. 09.01.2007).<br />

Po<strong>de</strong> até parecer que a admissão <strong>do</strong> fato concorrente <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r constitui um argumento contrário à tutela <strong>de</strong> seus direitos,<br />

violan<strong>do</strong> a proteção constitucional constante <strong>do</strong> art. 5º, inc. XXXII, <strong>do</strong> Texto Maior. Trata-se <strong>de</strong> um engano, uma vez que, em<br />

algumas situações, o fato ou o risco concorrente constitui um argumento para proteção <strong>do</strong>s vulneráveis negociais, pela divisão<br />

justa <strong>do</strong>s custos sociais da responsabilida<strong>de</strong> civil. Isso po<strong>de</strong> ser percebi<strong>do</strong> pelo próximo tópico <strong>de</strong>ste capítulo, que enfrenta o<br />

problema da responsabilida<strong>de</strong> civil que surge <strong>do</strong> tabagismo.


4.6. A RESPONSABILIDADE CIVIL PELO CIGARRO E O CÓDIGO DE DEFESA DO<br />

CONSUMIDOR80<br />

Seguin<strong>do</strong> no estu<strong>do</strong> da responsabilida<strong>de</strong> consumerista, cumpre analisar um <strong>do</strong>s principais problemas da responsabilida<strong>de</strong> civil<br />

contemporânea, qual seja o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar das empresas tabagistas pelo uso <strong>do</strong> cigarro. O tema está no cerne das discussões<br />

sociais e jurídicas <strong>do</strong>s tempos atuais, caben<strong>do</strong> relevar as fortes restrições legislativas ao uso <strong>do</strong> cigarro, especialmente em locais<br />

fecha<strong>do</strong>s, por uma questão <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> pública e interesse social.<br />

Após a entrada em vigor, no Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> São Paulo, da Lei 13.541/2009, outras unida<strong>de</strong>s da fe<strong>de</strong>ração resolveram copiar a<br />

iniciativa <strong>de</strong>ssa proibição, como é o caso <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro (Lei 5.517/2009). O que se po<strong>de</strong> dizer, até o presente momento, é que a<br />

citada lei antifumo passou a ter ampla aplicação na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo. Muito mais <strong>do</strong> que a fiscalização por parte <strong>do</strong>s órgãos<br />

públicos, os cidadãos e as entida<strong>de</strong>s privadas têm colabora<strong>do</strong> para sua efetivação. Isso porque a proibição ou o não uso <strong>do</strong> cigarro<br />

parecem estar impregna<strong>do</strong>s no senso comum, não só no Brasil, mas em to<strong>do</strong> o Planeta.<br />

A <strong>de</strong>monstrar tal evidência, a revista Veja publicou notícia, em sua edição <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 2009, com o título “A morte<br />

lenta <strong>do</strong> cigarro”.81 A reportagem inicia-se com a seguinte constatação mundial, após tratar da realida<strong>de</strong> brasileira <strong>de</strong> restrições ao<br />

cigarro: “A constatação <strong>do</strong>s tempos atuais é inequívoca: a moda contra o cigarro, que agora se espalha pelo Brasil, pegou. Pegou<br />

nas <strong>de</strong>mocracias <strong>do</strong> Oci<strong>de</strong>nte e, em certos casos, até mesmo em países mais pobres. Em alguns, as restrições são ousadas (Irlanda,<br />

2004: o cigarro é bani<strong>do</strong> até <strong>do</strong> símbolo nacional, os pubs). E outros são proibições ainda tímidas (República Checa, 2006:<br />

começou o veto ao cigarro nas escolas). Há países on<strong>de</strong> a lei funciona perfeitamente bem (Suécia, 2005: o cigarro sumiu <strong>do</strong>s locais<br />

públicos). Há outros em que é ignorada (Paquistão, 2003: fuma-se até <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong>s órgãos públicos). Apesar das diferenças <strong>de</strong> ritmo<br />

e <strong>de</strong> intensida<strong>de</strong> o banimento <strong>do</strong> cigarro parece inexorável no Oci<strong>de</strong>nte. O melhor exemplo talvez seja a França, a Paris <strong>do</strong>s cafés,<br />

<strong>do</strong>s maços <strong>de</strong> Gauloises coloca<strong>do</strong>s com o elmo ala<strong>do</strong> <strong>do</strong>s gauleses outrora invencíveis. Em 1991, entrou em vigor uma lei que<br />

bania o cigarro <strong>do</strong>s locais públicos e exigia que os restaurantes criassem áreas para não fumantes. Foi francamente ignorada. No<br />

ano passa<strong>do</strong>, uma nova lei, mas rígida que a anterior, pegou. O cigarro é a droga mais popular <strong>do</strong> século XX. Teve a mais<br />

espetacular trajetória <strong>de</strong> um produto no surgimento da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> massas. No apogeu, era símbolo das mais instintivas ambições<br />

humanas: a riqueza, o po<strong>de</strong>r, a beleza. No ocaso, virou câncer, <strong>do</strong>r e morte”. 82<br />

Na verda<strong>de</strong>, parece-nos que a permissão para o uso totalmente livre e indiscrimina<strong>do</strong> <strong>do</strong> cigarro foi um erro histórico da<br />

humanida<strong>de</strong>, por óbvio influencia<strong>do</strong> por questões econômicas e pelo po<strong>de</strong>rio político latente das empresas <strong>de</strong> tabaco. Trata-se <strong>de</strong><br />

um erro que necessita ser corrigi<strong>do</strong>. A afirmação po<strong>de</strong> parecer forte, sobretu<strong>do</strong> para as pessoas que compõem as gerações<br />

anteriores. Entretanto, para as gerações sucessivas, o erro é perfeitamente perceptível, em especial se for consi<strong>de</strong>rada a cultura<br />

contemporânea da saú<strong>de</strong> e <strong>do</strong> bem-estar <strong>de</strong> vida (wellness life).<br />

Tal engano da humanida<strong>de</strong> foi constata<strong>do</strong> pelo sociólogo Sérgio Luís Boeira, em sua obra Atrás da cortina <strong>de</strong> fumaça.83 Ao<br />

analisar a questão histórica, o pesquisa<strong>do</strong>r aponta para o fato <strong>de</strong> que a “expansão da manufatura <strong>de</strong> tabaco acentua globalmente<br />

após a In<strong>de</strong>pendência <strong>do</strong>s EUA. Primeiro, porque mesmo durante a guerra <strong>de</strong> in<strong>de</strong>pendência os europeus incrementam a<br />

importação <strong>de</strong> fumo da América Latina e <strong>do</strong> Caribe e promovem o cultivo em outras regiões – como Áustria, Alemanha, Itália e<br />

In<strong>do</strong>nésia. Segun<strong>do</strong>, porque após a libertação estaduni<strong>de</strong>nse, a Inglaterra per<strong>de</strong> o monopólio da fabricação <strong>de</strong> pastilhas, rapé,<br />

cigarros e tabaco <strong>de</strong> pipa. Este fato provoca o surgimento <strong>de</strong> fábricas, ainda que rudimentares, baseadas na manufatura, e não em<br />

máquinas”. 84 Mais à frente, <strong>de</strong>monstra o sociólogo que o cigarro tornou-se substancialmente popular na segunda meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> século<br />

XIX, estimula<strong>do</strong> o seu uso pela urbanização e pelo ritmo <strong>de</strong> vida da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> e <strong>do</strong> capitalismo, fortemente influencia<strong>do</strong> pelo<br />

mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> vida norte-americano (American way of life). A respeito <strong>de</strong>sse perío<strong>do</strong>, expõe o sociólogo: “Fumar cigarros torna-se mais<br />

prático <strong>do</strong> que fumar charuto ou cachimbo, o que induz muitos à experimentação e possivelmente ao hábito ou vício”. 85 No século<br />

XX, incrementou-se o <strong>de</strong>senvolvimento concreto e efetivo das indústrias <strong>de</strong> tabaco, sobretu<strong>do</strong> americanas e britânicas, ocorren<strong>do</strong><br />

também, nesse perío<strong>do</strong>, o surgimento <strong>do</strong>s primeiros estu<strong>do</strong>s relativos aos seus males. 86<br />

O pesquisa<strong>do</strong>r <strong>de</strong>staca que os movimentos antitabagistas e antifumo cresceram significativamente na segunda meta<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

século, encontran<strong>do</strong> o seu apogeu na virada para o século XXI e no seu início, conforme já <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong>. Na década <strong>de</strong> 1990, as<br />

entida<strong>de</strong>s públicas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>scobriram que as próprias empresas <strong>de</strong> cigarro haviam <strong>do</strong>cumenta<strong>do</strong> os graves males <strong>do</strong> produto,<br />

não revelan<strong>do</strong> tais da<strong>do</strong>s, por óbvio, para a socieda<strong>de</strong>:<br />

“Em mea<strong>do</strong>s da década <strong>de</strong> 1990, os órgãos públicos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrem que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década <strong>de</strong> 1950 há, nos laboratórios das<br />

empresas fumageiras, pesquisa científica sigilosa e em profundida<strong>de</strong> sobre os efeitos <strong>do</strong> tabagismo. Obra capital neste senti<strong>do</strong> é The<br />

Cigarette Papers, que ten<strong>de</strong> a ser reconhecida como um marco na história da luta antitabagista – embora seja limitada teórica e<br />

meto<strong>do</strong>logicamente pelo paradigma disjuntor-redutor. O que Glanz e sua equipe chamam <strong>de</strong> irresponsabilida<strong>de</strong> e maneira enganosa<br />

é basicamente o fato <strong>de</strong> que a indústria mantém em segre<strong>do</strong> pesquisas científicas que contrariam frontalmente os seus próprios<br />

discursos públicos, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> comprovadas alterações e supressões <strong>de</strong> trechos consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s perigosos para a imagem pública das


empresas. Tais <strong>do</strong>cumentos da BAT e Brown & Williamson reconhecem que o tabagismo é causa <strong>de</strong>terminante <strong>de</strong> uma varieda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> <strong>do</strong>enças – e por isso mesmo, durante vários anos, os empresários investiram em pesquisas para i<strong>de</strong>ntificar e remover toxinas<br />

específicas encontradas na fumaça <strong>de</strong> cigarros”.87<br />

Não se olvi<strong>de</strong> que as <strong>de</strong>núncias relativas aos <strong>do</strong>cumentos da Brown & Williamson estão relatadas no filme <strong>de</strong> Michael Mann,<br />

O Informante (1999). É interessante pontuar que muitos julga<strong>do</strong>res utilizam a existência <strong>de</strong> tais <strong>do</strong>cumentos como argumento para<br />

as <strong>de</strong>cisões, apesar <strong>de</strong> os cultua<strong>do</strong>res <strong>do</strong> cigarro ignorarem ou negarem a existência <strong>de</strong>sses estu<strong>do</strong>s.<br />

Para <strong>de</strong>monstrar a magnitu<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse grave engano humano, Sérgio Boeira faz profunda análise <strong>do</strong>s efeitos biomédicos e<br />

epi<strong>de</strong>miológicos <strong>do</strong> consumo <strong>do</strong> cigarro, o que não <strong>de</strong>ixa qualquer dúvida a respeito <strong>do</strong>s males <strong>do</strong> produto, diante das inúmeras<br />

fontes interdisciplinares pesquisadas. 88 Assim, a partir das conclusões divulgadas pela Organização Mundial da Saú<strong>de</strong>, evi<strong>de</strong>nciase<br />

que o cigarro constitui um fator <strong>de</strong> risco <strong>de</strong> danos à saú<strong>de</strong>. 89 O entendimento das entida<strong>de</strong>s médicas é no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que não<br />

existe consumo regular <strong>de</strong> tabaco isento <strong>de</strong> risco à saú<strong>de</strong>. 90 Os estu<strong>do</strong>s <strong>de</strong>monstram que há 4.720 substâncias tóxicas na<br />

composição <strong>do</strong> cigarro, sen<strong>do</strong> 70 <strong>de</strong>las causa<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> câncer. E mais, a respeito <strong>de</strong>ssa <strong>do</strong>ença: “A participação <strong>do</strong> tabagismo como<br />

fator <strong>de</strong> risco é bastante elevada, em alguns casos, inclusive tornan<strong>do</strong> ineficaz a quase totalida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s tratamentos médicos que<br />

excluam a superação <strong>do</strong> vício”.91<br />

Há duas tabelas bem interessantes apresentadas por Sérgio Boeira em sua obra. A primeira <strong>de</strong>monstra os tipos <strong>de</strong> câncer mais<br />

comuns e o percentual <strong>de</strong> <strong>do</strong>entes que são fumantes. Vejamos: câncer <strong>de</strong> pulmão, 80% a 90% são fumantes; câncer nos lábios,<br />

90%; na bochecha, 87%; na língua, 95%; no estômago, 80%; nos rins, 90%; no tubo digestivo (da boca ao ânus), 80%. A segunda<br />

tabela expõe os principais tipos <strong>de</strong> câncer no mun<strong>do</strong>, <strong>de</strong>stacan<strong>do</strong>-se em negrito aqueles que têm relação com o tabagismo, a saber:<br />

1º) câncer <strong>de</strong> pulmão; 2º) câncer <strong>de</strong> estômago; 3º) intestino; 4º) fíga<strong>do</strong>; 5º) mama; 6º) esôfago; 7º) boca; 8º) colo <strong>do</strong> útero; 9º)<br />

próstata; 10º) bexiga. 92<br />

A tabela comparativa exposta tem condições técnicas <strong>de</strong> afastar a tese da impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prova <strong>do</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> nas<br />

ações <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil fundadas no câncer <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> tabagismo, conforme prega parte consi<strong>de</strong>rável da <strong>do</strong>utrina e da<br />

jurisprudência, e cujos argumentos serão <strong>de</strong>vidamente rebati<strong>do</strong>s. Nos casos <strong>do</strong>s males <strong>de</strong>staca<strong>do</strong>s, não há dúvida <strong>de</strong> que é possível<br />

estabelecer uma relação <strong>de</strong> causa e efeito entre a colocação <strong>de</strong> um produto tão arrisca<strong>do</strong> no merca<strong>do</strong> – no caso, o cigarro – e os<br />

danos causa<strong>do</strong>s aos seus consumi<strong>do</strong>res.<br />

Como forte e contun<strong>de</strong>nte tática ao consumo utilizada pelas empresas <strong>de</strong> tabaco, <strong>de</strong>staca-se sobremaneira o papel que a<br />

publicida<strong>de</strong> e os meios <strong>de</strong> marketing sempre exerceram para seduzir ao uso <strong>do</strong> produto, levan<strong>do</strong> as pessoas à experimentação e,<br />

consequentemente, ao vício. Para a <strong>de</strong>vida pesquisa, este autor compareceu à exposição Propagandas <strong>de</strong> cigarro – como a<br />

indústria <strong>do</strong> fumo enganou você, com mostra <strong>de</strong> cartazes e ví<strong>de</strong>os relativos à publicida<strong>de</strong> <strong>do</strong> cigarro nos séculos XIX e XX. A<br />

exposição foi realizada na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, na Livraria Cultura <strong>do</strong> Conjunto Nacional, entre os dias 15 e 26 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong><br />

2009. Entre as diversas peças das campanhas publicitárias da época, <strong>de</strong> início, cumpre <strong>de</strong>stacar aquelas que têm relações com os<br />

temas familiares e a criança. Não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> chocar o cartaz em que aparece um bebê <strong>de</strong> colo dizen<strong>do</strong> à mãe: “Nossa, mamãe, você<br />

certamente aprecia o seu Marlboro!”. 93 Na mostra, foram expostas também peças <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> em que crianças distribuem caixas<br />

<strong>de</strong> maços <strong>de</strong> cigarro aos pais. Ainda no que concerne a temas da família, produtos como o Lucky Strike, o Pall Mall e o Murad<br />

associavam as suas marcas à figura <strong>do</strong> Papai Noel, que aparecia fuman<strong>do</strong> em suas campanhas <strong>de</strong> vendas.<br />

Todas as campanhas publicitárias foram veiculadas em momentos históricos em que ainda não estavam amplamente<br />

difundi<strong>do</strong>s os terríveis males <strong>do</strong> cigarro. E as empresas <strong>de</strong> tabaco aproveitaram-se muito bem <strong>de</strong>sse fato, introduzin<strong>do</strong> o ato <strong>de</strong><br />

fumar no DNA social <strong>de</strong> algumas gerações. Atualmente, tais campanhas contrastam com a obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> propagação <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias<br />

antitabagistas, que constam <strong>do</strong>s maços, o que inclui o Brasil. Na contemporaneida<strong>de</strong>, po<strong>de</strong>m ser notadas nos maços fotos e<br />

imagens <strong>de</strong> <strong>do</strong>entes terminais <strong>de</strong> câncer, <strong>de</strong> fetos mortos, <strong>de</strong> pessoas com membros amputa<strong>do</strong>s, <strong>de</strong> mulheres com peles<br />

envelhecidas, <strong>de</strong> homens inconforma<strong>do</strong>s com a impotência sexual, entre outros – tu<strong>do</strong> em relação causal com o hábito <strong>de</strong> fumar. O<br />

Ministério da Saú<strong>de</strong> brasileiro há tempos adverte sobre os males <strong>do</strong> cigarro, conforme orientação <strong>do</strong> art. 220, § 4º, da Constituição<br />

Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988.<br />

Deve ficar claro que não há qualquer dúvida quanto à incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r ao cigarro, ti<strong>do</strong><br />

tipicamente como um produto coloca<strong>do</strong> no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo, nos termos <strong>do</strong>s arts. 2º e 3º da Lei 8.078/1990.<br />

No âmbito jurispru<strong>de</strong>ncial, as <strong>de</strong>cisões a respeito <strong>do</strong> tema no Brasil começaram a surgir na última década <strong>do</strong> século passa<strong>do</strong>,<br />

notadamente em ações propostas pelos próprios fumantes ou por seus familiares, em casos <strong>de</strong> morte. Esses julga<strong>do</strong>s anteriores – e<br />

que ainda pre<strong>do</strong>minam – são no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> se excluir a responsabilida<strong>de</strong> civil das empresas <strong>de</strong> cigarros pelos males causa<strong>do</strong>s aos<br />

fumantes, por meio <strong>de</strong> vários argumentos. Para ilustrar, <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 1999, ao aplicar a<br />

prescrição quinquenal <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, bem como a culpa exclusiva da vítima, a afastar o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar da<br />

empresa tabagista:


“Responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>de</strong> fabricante. Tabagismo. Doença incurável. Dano moral. Pedi<strong>do</strong> genérico. Prescrição quinquenal. Extinção<br />

da ação. In<strong>de</strong>nização. Dano moral e estético. Laringectomia <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> uso <strong>de</strong> cigarro. Agravo <strong>de</strong> instrumento contra <strong>de</strong>cisão,<br />

proferida em audiência, que rejeitou as preliminares <strong>de</strong> inépcia da inicial e <strong>de</strong> prescrição, como também in<strong>de</strong>feriu expedição <strong>de</strong><br />

ofícios aos hospitais e médicos que trataram <strong>do</strong> autor e <strong>de</strong>signou prova pericial médica. Provimento. Nas ações <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por<br />

dano moral, o pedi<strong>do</strong> há <strong>de</strong> ser certo e <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>, assim como o valor da causa <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>clara<strong>do</strong> pelo autor. Vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

princípio <strong>do</strong> contraditório pelo entendimento contrário. Hipótese que não encontra amparo para formulação <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> genérico.<br />

Inteligência <strong>do</strong> CPC, art. 286. Aplicação <strong>do</strong> CPC, art. 284. Prescrição. Pedi<strong>do</strong> basea<strong>do</strong> na Lei 8.078/1990. Prescrição quinquenal.<br />

Aplicação <strong>do</strong> art. 27, CDC. Dies a quo conta<strong>do</strong> <strong>do</strong> dano e <strong>do</strong> conhecimento <strong>do</strong> autor <strong>de</strong>le. Fato notório, há mais <strong>de</strong> 5 anos da<br />

propositura da ação, <strong>de</strong> que o tabagismo é um <strong>do</strong>s maiores responsáveis pelo câncer na laringe. Extinção <strong>do</strong> processo, com<br />

julgamento <strong>do</strong> mérito. Aplicação <strong>do</strong> CPC, art. 269, IV” (TJRJ – Agravo <strong>de</strong> Instrumento 3350/1999, Rio <strong>de</strong> Janeiro – Décima<br />

Terceira Câmara Cível – Rel. Des. Julio Cesar Paraguassu – j. 25.11.1999).<br />

Ou, ainda, <strong>do</strong> mesmo Tribunal, concluin<strong>do</strong> pela inexistência <strong>de</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>, diante da licitu<strong>de</strong> da ativida<strong>de</strong> da<br />

empresa que <strong>de</strong>senvolve a ativida<strong>de</strong>: TJRJ – Acórdão 58/1998, Rio <strong>de</strong> Janeiro – Décima Câmara Cível – Rel. Des. João Spyri<strong>de</strong>s –<br />

j. 23.03.1999.<br />

Os julga<strong>do</strong>s <strong>de</strong> improcedência reproduziram-se <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> significativo na entrada <strong>do</strong> século XXI, sen<strong>do</strong> pertinente <strong>de</strong>stacar<br />

alguns <strong>de</strong> seus argumentos para que sejam <strong>de</strong>vidamente rebati<strong>do</strong>s por este autor, que propõe a aplicação da concausalida<strong>de</strong> e da<br />

teoria <strong>do</strong> risco concorrente para a problemática <strong>do</strong> cigarro.<br />

Conforme já se <strong>de</strong>monstrou, há <strong>de</strong>cisões que expressam a inexistência <strong>de</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> entre o consumo <strong>do</strong> produto e<br />

os danos à saú<strong>de</strong> suporta<strong>do</strong>s, sen<strong>do</strong> esse o principal argumento acolhi<strong>do</strong> pelos julga<strong>do</strong>res (TJSC – Acórdão 2005.034931-6,<br />

Criciúma – Câmara Especial Temporária <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil – Rel. Des. Domingos Palu<strong>do</strong> – DJSC 18.12.2009, p. 453; TJMG –<br />

Apelação Cível 1.0596.04.019579-1/0011, Santa Rita <strong>do</strong> Sapucaí – Décima Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Unias Silva – j.<br />

16.09.2008 – DJEMG 07.10.2008; TJRJ – Acórdão 34198/2004, Rio <strong>de</strong> Janeiro – Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Helena Bekhor<br />

– j. 22.03.2005; TJSP – Acórdão com Revisão 268.911-4/8-00, Itápolis – Quinta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Maury<br />

Ângelo Bottesini – j. 28.11.2005; TJRS – Acórdão 70005752415, Porto Alegre – Quinta Câmara Cível (Reg. Exceção) – Rel. Des.<br />

Marta Borges Ortiz – j. 04.11.2004).<br />

Existem acórdãos <strong>de</strong> improcedência da <strong>de</strong>manda que apontam para a ausência <strong>de</strong> ilicitu<strong>de</strong> ao se comercializar o cigarro,<br />

haven<strong>do</strong> um exercício regular <strong>de</strong> direito por parte das empresas, o que não constitui ato ilícito, pelas dicções <strong>do</strong> art. 188, I, <strong>do</strong><br />

CC/2002 e <strong>do</strong> art. 160, I, <strong>do</strong> CC/1916 (TJDF – Recurso n. 2001.01.1.012900-6 – Acórdão 313.218 – Segunda Turma Cível – Rel.<br />

Des. Fábio Eduar<strong>do</strong> Marques – DJDFTE 14.07.2008, p. 87; e TJSP – Acórdão 283.965-4/3-00, São Paulo – Sexta Câmara <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Justino Magno Araújo – j. 15.12.2005).<br />

Po<strong>de</strong>m ser colaciona<strong>do</strong>s ainda os tão menciona<strong>do</strong>s julgamentos que atribuem culpa exclusiva à vítima, a excluir a<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r (TJRJ – Acórdão 2005.001.40350 – Quarta Câmara Cível – Rel. Des. Mario <strong>do</strong>s Santos Paulo – j.<br />

07.02.2006; TJPR – Apelação Cível 0569832-6, Curitiba – Nona Câmara Cível – Rel. Des. José Augusto Gomes Aniceto – DJPR<br />

25.09.2009, p. 369; e TJSC – Acórdão 2005.021210-5, Criciúma – Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil – Rel. Des. José Trinda<strong>de</strong> <strong>do</strong>s<br />

Santos – DJSC 02.06.2008, p. 109).<br />

Em complemento ao último argumento, há <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> rejeição <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> reparatório que se fundam no livre-arbítrio <strong>de</strong><br />

fumar ou <strong>de</strong> parar <strong>de</strong> fumar (TJSC – Acórdão 2005.029372-7, Criciúma – Segunda Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil – Rel. Des. Newton<br />

Janke – DJSC 27.11.2008, p. 72; TJSP – Apelação com Revisão 270.309.4/0 – Acórdão 4012392, Cotia – Sexta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong><br />

Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Sebastião Carlos Garcia – j. 20.08.2009 – DJESP 14.09.2009; e TJRS – Acórdão 70022248215, Porto Alegre<br />

– Décima Câmara Cível – Rel. Des. Paulo Antônio Kretzmann – j. 28.02.2008 – DOERS 27.05.2008, p. 30).<br />

Por óbvio, também existem julga<strong>do</strong>s <strong>de</strong> con<strong>de</strong>nação das empresas <strong>de</strong> cigarros, sen<strong>do</strong> certo que <strong>de</strong>cisões nesse senti<strong>do</strong> tiveram<br />

um crescimento neste século que se inicia em nosso país. Entre as <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> procedência, cumpre <strong>de</strong>stacar a notória e primeva<br />

<strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal Gaúcho, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2003, com ementa bastante elucidativa, inclusive a respeito <strong>de</strong> questões históricas relativas<br />

ao cigarro: “Apelação cível. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Danos materiais e morais. Tabagismo. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização ajuizada pela<br />

família. Resulta<strong>do</strong> danoso atribuí<strong>do</strong> a empresas fumageiras em virtu<strong>de</strong> da colocação no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> produto sabidamente nocivo,<br />

instigan<strong>do</strong> e propician<strong>do</strong> seu consumo, por meio <strong>de</strong> propaganda enganosa. Ilegitimida<strong>de</strong> passiva, no caso concreto, <strong>de</strong> uma das<br />

corrés. Caracterização <strong>do</strong> nexo causal quanto à outra co<strong>de</strong>mandada. Culpa. Responsabilida<strong>de</strong> civil subjetiva <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> omissão<br />

e negligência, caracterizan<strong>do</strong>-se a omissão na ação. Aplicação, também, <strong>do</strong> CDC, caracterizan<strong>do</strong>-se, ainda, a responsabilida<strong>de</strong><br />

objetiva. In<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>vida” (TJRS – Acórdão 70000144626, Santa Cruz <strong>do</strong> Sul – Nona Câmara Cível (Reg. Exceção) – Rel.<br />

Des. Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira – j. 29.10.2003). Como fortes e contun<strong>de</strong>ntes argumentos sociológicos e jurídicos, constam<br />

<strong>do</strong> corpo da <strong>de</strong>cisão:


“É fato notório, cientificamente <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong>, inclusive reconheci<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma oficial pelo próprio Governo Fe<strong>de</strong>ral, que o fumo traz<br />

inúmeros malefícios à saú<strong>de</strong>, tanto à <strong>do</strong> fumante como à <strong>do</strong> não fumante, sen<strong>do</strong>, por tais razões, <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m médico-científica,<br />

inegável que a nicotina vicia, por isso que gera <strong>de</strong>pendência química e psíquica, e causa câncer <strong>de</strong> pulmão, enfisema pulmonar,<br />

infarto <strong>do</strong> coração entre outras <strong>do</strong>enças igualmente graves e fatais. A indústria <strong>de</strong> tabaco, em to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década <strong>de</strong><br />

1950, já conhecia os males que o consumo <strong>do</strong> fumo causa aos seres humanos, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que, nessas circunstâncias, a conduta das<br />

empresas em omitir a informação é evi<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong>losa, como bem <strong>de</strong>monstram os arquivos secretos <strong>de</strong>ssas empresas, revela<strong>do</strong>s<br />

nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s em ação judicial movida por esta<strong>do</strong>s norte-americanos contra gran<strong>de</strong>s empresas transnacionais <strong>de</strong> tabaco,<br />

arquivos esses que se contrapõem e <strong>de</strong>smentem o posicionamento público das empresas, revelan<strong>do</strong>-o falso e <strong>do</strong>loso, pois divulga<strong>do</strong><br />

apenas para enganar o público, e <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> a real orientação das empresas, a<strong>do</strong>tada internamente, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que sempre<br />

tiveram pleno conhecimento e consciência <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os males causa<strong>do</strong>s pelo fumo. E tal posicionamento público, falso e <strong>do</strong>loso,<br />

sempre foi historicamente sustenta<strong>do</strong> por maciça propaganda enganosa, que reiteradamente associou o fumo a imagens <strong>de</strong> beleza,<br />

sucesso, liberda<strong>de</strong>, po<strong>de</strong>r, riqueza e inteligência, omitin<strong>do</strong>, reiteradamente, ciência aos usuários <strong>do</strong>s malefícios <strong>do</strong> uso, sem tomar<br />

qualquer atitu<strong>de</strong> para minimizar tais malefícios e, pelo contrário, trabalhan<strong>do</strong> no senti<strong>do</strong> da <strong>de</strong>sinformação, alician<strong>do</strong>, em particular<br />

os jovens, em estratégia <strong>do</strong>losa para com o público, consumi<strong>do</strong>r ou não.”<br />

Tal acórdão concluiu pelo nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> entre a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se colocar o produto no merca<strong>do</strong> e os danos sofri<strong>do</strong>s pela<br />

vítima e por seus familiares, “porquanto fato notório que a nicotina causa <strong>de</strong>pendência química e psicológica e que o hábito <strong>de</strong><br />

fumar provoca diversos danos à saú<strong>de</strong>, entre os quais o câncer e o enfisema pulmonar, males <strong>de</strong> que foi acometi<strong>do</strong> o faleci<strong>do</strong>, não<br />

comprovan<strong>do</strong>, a ré, qualquer fato impeditivo, modificativo ou extintivo <strong>do</strong> direito <strong>do</strong>s autores”. A <strong>de</strong>cisão atribui culpa à empresa<br />

pela omissão e negligência na informação, nos termos <strong>do</strong> art. 159 <strong>do</strong> CC/1916 (responsabilida<strong>de</strong> subjetiva). Ato contínuo, <strong>de</strong>duz<br />

ser a sua conduta viola<strong>do</strong>ra <strong>do</strong>s <strong>de</strong>veres consubstancia<strong>do</strong>s nas máximas latinas <strong>de</strong> neminem lae<strong>de</strong>r e suum cuique tribuere – “não<br />

lesar a ninguém” e “dar a cada um o que é seu” –, bem como no princípio da boa-fé objetiva.<br />

O <strong>de</strong>cisum consi<strong>de</strong>ra não relevante a tese <strong>de</strong> licitu<strong>de</strong> da ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comercialização <strong>do</strong> cigarro perante as leis <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>,<br />

sen<strong>do</strong> <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> impertinente para o mérito a <strong>de</strong>pendência ou voluntarieda<strong>de</strong> no uso ou consumo, com o intuito <strong>de</strong> afastar a<br />

responsabilida<strong>de</strong>. Em suma, a questão <strong>do</strong> livre-arbítrio foi <strong>de</strong>scartada pela <strong>de</strong>cisão.<br />

Por fim, no que tange aos argumentos jurídicos <strong>de</strong> procedência da <strong>de</strong>manda, foi aplicada a responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, sen<strong>do</strong> o cigarro consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> um produto <strong>de</strong>feituoso, não só em relação aos fumantes<br />

(consumi<strong>do</strong>res-padrão) como no tocante aos não fumantes ou fumantes passivos (consumi<strong>do</strong>res equipara<strong>do</strong>s), “uma vez que não<br />

oferece a segurança que <strong>de</strong>le se po<strong>de</strong> esperar, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se a apresentação, o uso e os riscos que razoavelmente <strong>de</strong>le se esperam<br />

(art. 12, § 1º, <strong>do</strong> CDC)”. A culpa exclusiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r foi tida como não caracterizada, uma vez que “o ato voluntário <strong>do</strong> uso<br />

ou consumo não induz culpa e, na verda<strong>de</strong>, no caso, sequer há opção livre <strong>de</strong> fumar ou não fumar, em <strong>de</strong>corrência da <strong>de</strong>pendência<br />

química e psíquica e diante da propaganda massiva e aliciante, que sempre cultuou os malefícios <strong>do</strong> cigarro, o que afasta em<br />

<strong>de</strong>finitivo qualquer alegação <strong>de</strong> culpa concorrente ou exclusiva da vítima”.<br />

Os valores in<strong>de</strong>nizatórios fixa<strong>do</strong>s foram bem eleva<strong>do</strong>s. A título <strong>de</strong> danos materiais, foram repara<strong>do</strong>s a venda <strong>de</strong> imóvel e <strong>de</strong><br />

bovinos (para tratar a vítima), as <strong>de</strong>spesas médicas e hospitalares comprovadas, a hospedagem <strong>de</strong> acompanhantes durante a<br />

internação, os gastos com o funeral e o luto da família (danos emergentes). Ainda foram ressarci<strong>do</strong>s os prejuízos <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong><br />

fechamento <strong>do</strong> minimerca<strong>do</strong> da vítima, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a época da constatação da <strong>do</strong>ença até a data em que o faleci<strong>do</strong> completaria setenta<br />

anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, conforme a expectativa <strong>de</strong> vida <strong>do</strong>s gaúchos (lucros cessantes). Como reparação pelos danos morais, foi fixada a<br />

quantia <strong>de</strong> seiscentos salários mínimos para a esposa, <strong>de</strong> quinhentos salários mínimos para cada um <strong>do</strong>s quatro filhos e <strong>de</strong> trezentos<br />

salários mínimos para cada um <strong>do</strong>s genros, totalizan<strong>do</strong> os danos imateriais três mil e duzentos salários mínimos.<br />

Além <strong>de</strong>ssa até então inédita e excelente <strong>de</strong>cisão, igualmente concluin<strong>do</strong> pela procedência <strong>de</strong> ação proposta por uso <strong>de</strong><br />

cigarros, há acórdão <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> São Paulo, que <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> enfrentou o problema sob a perspectiva da<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. A ação foi proposta pela própria fumante – que pleiteou danos materiais e<br />

morais pela perda <strong>de</strong> membros inferiores como consequência <strong>do</strong> tabagismo – e julgada proce<strong>de</strong>nte em primeira instância,<br />

con<strong>de</strong>nan<strong>do</strong>-se a empresa Souza Cruz S/A a in<strong>de</strong>nizá-la em R$ 600.000,00 (seiscentos mil reais). A ementa <strong>do</strong> julga<strong>do</strong> foi o<br />

seguinte:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. In<strong>de</strong>nização por danos morais e materiais. Tabagismo. Amputação <strong>do</strong>s membros inferiores. Vítima<br />

acometida <strong>de</strong> tromboangeíte aguda obliterante. Nexo causal configura<strong>do</strong>. incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>de</strong>corrente da teoria <strong>do</strong> risco assumida com a fabricação e comercialização <strong>do</strong> produto. Omissão <strong>do</strong>s<br />

resulta<strong>do</strong>s das pesquisas sobre o efeito viciante da nicotina. Dever <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Recurso improvi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação com<br />

Revisão 379.261.4/5 – Acórdão 3320623, São Paulo – Oitava Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Joaquim Garcia – j.<br />

08.10.2008 – DJESP 13.11.2008).<br />

Em sua relatoria, o Desembarga<strong>do</strong>r José Garcia concluiu pela incidência da responsabilida<strong>de</strong> sem culpa da Lei 8.078/1990,


aduzin<strong>do</strong> que “as indústrias <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong>riva<strong>do</strong>s <strong>do</strong> tabaco, apesar <strong>de</strong> atuarem <strong>de</strong>ntro da lei vigente, não se eximem da<br />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva, dada a teoria <strong>do</strong> risco, pelos efeitos nocivos causa<strong>do</strong>s aos indivíduos pelo uso ou consumo <strong>de</strong> seus<br />

produtos coloca<strong>do</strong>s à venda no merca<strong>do</strong> legitimamente, máxime à luz <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, cujas normas <strong>de</strong><br />

or<strong>de</strong>m pública atingem fatos ainda não consolida<strong>do</strong>s antes <strong>de</strong> sua vigência”. Em reforço, o julga<strong>do</strong>r menciona, assim como consta<br />

<strong>do</strong> inédito julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal Gaúcho, a existência <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>s secretos das próprias empresas <strong>de</strong> cigarro comprovan<strong>do</strong> os males<br />

<strong>do</strong> produto. O relator analisou ainda as questões relativas à exploração publicitária <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, bem como os baixos índices <strong>de</strong><br />

fumantes que conseguem se livrar <strong>do</strong> vício – cerca <strong>de</strong> 5% <strong>do</strong>s usuários, segun<strong>do</strong> os estu<strong>do</strong>s médicos que constam <strong>do</strong> acórdão. De<br />

forma interdisciplinar, o voto <strong>do</strong> relator enfrentou questões psicológicas e sociais, aduzin<strong>do</strong> que, “com o uso regular <strong>de</strong> cigarros,<br />

estabelece-se um condicionamento que faz com que a pessoa passe a ter o fumo integra<strong>do</strong> à sua rotina. Além disso, o cigarro é<br />

também utiliza<strong>do</strong> como um tipo <strong>de</strong> modula<strong>do</strong>r <strong>de</strong> emoções, o que faz com que seu uso se amplie significativamente e não esteja<br />

associa<strong>do</strong> apenas à necessida<strong>de</strong> fisiológica <strong>de</strong> reposição periódica da droga”.<br />

Analisan<strong>do</strong> a questão fática, o Desembarga<strong>do</strong>r Joaquim Garcia reconhece a existência <strong>de</strong> inúmeros julga<strong>do</strong>s <strong>de</strong> improcedência<br />

no País, por ausência <strong>de</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> entre o ato <strong>de</strong> fumar e os males existentes. Porém, <strong>de</strong> outra forma, concluiu o<br />

magistra<strong>do</strong> que a autora pa<strong>de</strong>cia <strong>de</strong> tromboangeíte obliterante (<strong>do</strong>ença <strong>de</strong> Buerger), “cuja literatura médica a respeito é<br />

praticamente unânime ao afirmar que a <strong>do</strong>ença manifesta-se somente em fumantes, ou seja, o tabagismo é condição sine qua non<br />

para o <strong>de</strong>senvolvimento da moléstia contraída”. Comprova<strong>do</strong> o nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>, e sen<strong>do</strong> reconhecida a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se<br />

respon<strong>de</strong>r também por atos lícitos, os danos materiais comprova<strong>do</strong>s foram in<strong>de</strong>niza<strong>do</strong>s. A respeito <strong>do</strong> sempre invoca<strong>do</strong> livrearbítrio,<br />

enten<strong>de</strong>u o relator que “não se revela hábil para afastar o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar <strong>de</strong>ssas companhias, pelas mesmas razões que<br />

não se presta a justificar a <strong>de</strong>scriminação das drogas”. Relativamente à questão da prova <strong>do</strong> uso <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada marca <strong>de</strong> cigarro,<br />

fez incidir na inversão <strong>do</strong> ônus da prova, <strong>de</strong> forma correta e esperada. Por fim, o magistra<strong>do</strong> enten<strong>de</strong>u pela presença <strong>de</strong> danos<br />

morais presumi<strong>do</strong>s (in re ipsa), diante da amputação <strong>do</strong>s membros inferiores da autora. Em suma, votou pela confirmação da<br />

sentença ora atacada, negan<strong>do</strong> provimento ao recurso <strong>de</strong> apelação.<br />

Pelo mesmo caminho <strong>de</strong> não provimento <strong>do</strong> recurso votou o Desembarga<strong>do</strong>r Caetano Lagrasta, cuja <strong>de</strong>cisão merece <strong>de</strong>staque<br />

especial. No início <strong>do</strong> seu voto, o magistra<strong>do</strong> já salienta que “Julgar-se questão <strong>de</strong> tamanha envergadura para a Saú<strong>de</strong> Pública e<br />

Defesa da Cidadania e <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, implica que se a<strong>de</strong>ntre a fatores sociais, e até, a vivência <strong>do</strong> próprio julga<strong>do</strong>r, inicia<strong>do</strong> na<br />

senda <strong>do</strong> consumo <strong>de</strong> cigarros, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os 14 anos, e <strong>de</strong>le afasta<strong>do</strong>, há aproximadamente onze anos”. Nas páginas seguintes <strong>do</strong> voto<br />

são expostos com <strong>de</strong>talhes os aprofundamentos espera<strong>do</strong>s, bem como um histórico a respeito da publicida<strong>de</strong>, comercialização e<br />

uso cultural <strong>do</strong> cigarro, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o final <strong>do</strong>s anos 20 <strong>do</strong> século XX. O seguinte trecho <strong>do</strong> seu voto merece ser transcrito:<br />

“A partir <strong>do</strong> final <strong>do</strong>s anos 20, dificilmente seria possível ingressar num cinema ou teatro on<strong>de</strong> público, personagens e atores não se<br />

apresentassem fuman<strong>do</strong>, numa atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> ‘glamour’ e <strong>de</strong> conduta social a<strong>de</strong>quada. Mesmo as fotografias <strong>de</strong> propaganda mostravam<br />

os astros e estrelas fazen<strong>do</strong> uso <strong>de</strong> cigarros, como condição <strong>de</strong> sucesso, segurança e integração social. Este comportamento restou<br />

generaliza<strong>do</strong>, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> país <strong>de</strong> origem <strong>do</strong>s espetáculos. Por outro la<strong>do</strong>, os jovens contavam com o cigarro como elemento <strong>de</strong><br />

ingresso no mun<strong>do</strong> adulto e fator <strong>de</strong> segurança para frequentar os ambientes sociais e mundanos. […] Des<strong>de</strong> logo, há que se<br />

concluir que o prolongamento <strong>de</strong>sta propaganda não se interrompe em 1950, ao contrário, prossegue nas programações, na projeção<br />

<strong>de</strong> filmes <strong>de</strong> época, reiteradamente repeti<strong>do</strong>s pelas empresas <strong>de</strong> televisão ‘abertas’ e ‘por assinatura’. E, somente após longa batalha<br />

é que vem sen<strong>do</strong> possível impedir a propaganda escancarada ou subliminar (out<strong>do</strong>ors, carros <strong>de</strong> corrida, revistas, jornais,<br />

fotonovelas, telenovelas etc.). Estas, além <strong>de</strong> outras circunstâncias, infernizaram a vida <strong>do</strong>s a<strong>do</strong>lescentes, pois <strong>de</strong>viam apresentar-se<br />

nos bailes e festas portan<strong>do</strong> cigarros, se possível <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> (na época o ‘Columbia’, muito mais caros <strong>do</strong> que os <strong>do</strong> tipo ‘Mistura<br />

Fina’ ou ‘Petit Londrinos’, que eram consumi<strong>do</strong>r por operários, encana<strong>do</strong>res, eletricistas, pedreiros etc.), ainda que não os<br />

fumassem, mas que se prestavam a causar impacto às mocinhas.<br />

(…).<br />

Assim, o prolata<strong>do</strong> arbítrio <strong>do</strong> jovem ou, mesmo, da criança, ou o <strong>do</strong> <strong>do</strong>ente-<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, por facilmente cooptáveis, não resistiria,<br />

como não resistiu, ao assédio massacrante da propaganda, ainda que lhes atribua, em eleva<strong>do</strong> grau, comportamento consciente, para<br />

que se sentissem partícipes <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong> vida em socieda<strong>de</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo empunhan<strong>do</strong> o cigarro como manifestação <strong>de</strong> ‘status’<br />

ou <strong>de</strong> segurança, ‘auxílio’ no enfrentamento <strong>do</strong>s <strong>de</strong>safios <strong>de</strong>ssa mesma socieda<strong>de</strong>, a partir da saída para o recreio, ao cinema ou às<br />

festas da vida escolar, e no ínvio caminho, em direção à morte”.<br />

Ao mergulhar nos fatos em espécie, o magistra<strong>do</strong> aponta para o fato <strong>de</strong> que a <strong>do</strong>ença que atingiu a autora da ação –<br />

tromboangeíte obliterante – é um mal exclusivo <strong>do</strong>s fumantes, a atestar a existência <strong>de</strong> nexo causal com os produtos coloca<strong>do</strong>s no<br />

merca<strong>do</strong>. Ato contínuo, <strong>de</strong> forma corajosa, o julga<strong>do</strong>r conclui que o Esta<strong>do</strong> tem papel <strong>de</strong> participação para os danos sociais<br />

<strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> tabagismo, por não elevar os preços <strong>do</strong>s produtos e não tomar medidas para impedir o contraban<strong>do</strong> e a falsificação<br />

<strong>do</strong>s cigarros. A<strong>de</strong>mais, o voto expõe a existência <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>s médicos mais recentes, os quais atestam que grupos internacionais <strong>de</strong><br />

cientistas i<strong>de</strong>ntificaram um conjunto <strong>de</strong> variações genéticas que aumentam o risco <strong>de</strong> câncer no pulmão <strong>do</strong>s fumantes. A questão<br />

da publicida<strong>de</strong> enganosa não passou <strong>de</strong>spercebida, diante <strong>de</strong> práticas sucessivas por meio <strong>do</strong>s anos <strong>de</strong> omissão <strong>de</strong> informações a


espeito <strong>do</strong>s males <strong>do</strong> cigarro.<br />

Sem prejuízo <strong>de</strong>ssas teses, o que mais se <strong>de</strong>staca no voto <strong>do</strong> Desembarga<strong>do</strong>r Caetano Lagrasta são as premissas para afastar a<br />

alegação <strong>de</strong> que a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comercialização <strong>do</strong> cigarro é plenamente lícita, in verbis: “Também é sofístico o argumento <strong>de</strong> que<br />

a empresa requerida planta, industrializa e comercializa objeto lícito. O problema não está no plantio, antes nos ingredientes<br />

agrega<strong>do</strong>s ao fumo na fase <strong>de</strong> industrialização e que vêm sen<strong>do</strong> regularmente combati<strong>do</strong>s mundialmente, em nome da Saú<strong>de</strong><br />

Pública. E este seria o limite para o exercício regular <strong>de</strong> um direito (fl. 1217), ante as circunstâncias que enfatizam os riscos da<br />

ativida<strong>de</strong>, salvo se a indústria <strong>do</strong> fumo se mostre infensa a estes, quan<strong>do</strong> da fabricação, e não aos da eclosão das <strong>do</strong>enças, quan<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>nunciadas”. Por fim, a respeito <strong>de</strong>sse instigante voto, chama a atenção a força das palavras que afastam o argumento <strong>do</strong> livrearbítrio,<br />

chegan<strong>do</strong> o juiz a insinuar a existência <strong>de</strong> um “<strong>do</strong>gma <strong>de</strong> alguma estranha e impossível religião <strong>do</strong> vício”.<br />

Encerran<strong>do</strong> o estu<strong>do</strong> <strong>de</strong>sse importante acórdão <strong>do</strong> Tribunal Paulista, <strong>de</strong>ve ser comenta<strong>do</strong> o voto venci<strong>do</strong> <strong>do</strong> Desembarga<strong>do</strong>r<br />

Sílvio Marques Neto, que <strong>de</strong>u provimento ao recurso, julgan<strong>do</strong> improce<strong>de</strong>nte a ação. O voto está ampara<strong>do</strong> nas conhecidas<br />

premissas outrora mencionadas, sobretu<strong>do</strong> em duas: a) ausência <strong>de</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> entre o fumo e os males da autora, por<br />

insuficiência <strong>de</strong> prova; e b) a autora não <strong>de</strong>sconhecia os males <strong>do</strong> cigarro – foi <strong>de</strong>vidamente informada pela cartela <strong>do</strong> produto – e<br />

fumou porque assim o quis (livre-arbítrio). O magistra<strong>do</strong> <strong>de</strong>monstra que o entendimento jurispru<strong>de</strong>ncial consolida<strong>do</strong> até aquele<br />

momento seria no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> improcedência das <strong>de</strong>mandas fundadas no tabagismo.<br />

De toda sorte, apesar <strong>de</strong>sses julga<strong>do</strong>s <strong>de</strong> procedência, insta <strong>de</strong>stacar que prevalecem na jurisprudência nacional as <strong>de</strong>cisões<br />

afastan<strong>do</strong> a con<strong>de</strong>nação das empresas <strong>de</strong> tabaco diante <strong>do</strong>s fumantes. No ano <strong>de</strong> 2010, surgiram <strong>de</strong>finitivas <strong>de</strong>cisões nesse senti<strong>do</strong><br />

no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, as quais <strong>de</strong>clinam o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar das empresas por vários e já conheci<strong>do</strong>s argumentos. Os<br />

resumos <strong>do</strong>s julgamentos encontram-se publica<strong>do</strong>s nos Informativos n. 432 e n. 436 daquele Tribunal. De início, colaciona-se a<br />

primeira <strong>de</strong>cisão:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Cigarro. O faleci<strong>do</strong>, tabagista <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a a<strong>do</strong>lescência (mea<strong>do</strong>s <strong>de</strong> 1950), foi diagnostica<strong>do</strong> como porta<strong>do</strong>r <strong>de</strong><br />

<strong>do</strong>ença broncopulmonar obstrutiva crônica e <strong>de</strong> enfisema pulmonar em 1998. Após anos <strong>de</strong> tratamento, faleceu em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong><br />

a<strong>de</strong>nocarcinoma pulmonar no ano <strong>de</strong> 2001. Então, seus familiares (a esposa, filhos e netos) ajuizaram ação <strong>de</strong> reparação <strong>do</strong>s danos<br />

morais contra o fabricante <strong>de</strong> cigarros, com lastro na suposta informação ina<strong>de</strong>quada prestada por ele durante décadas, que omitia os<br />

males possivelmente <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> fumo, e no incentivo a seu consumo mediante a prática <strong>de</strong> propaganda tida por enganosa, além<br />

<strong>de</strong> enxergar a existência <strong>de</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> entre a morte <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> câncer e os vícios <strong>do</strong> produto, que alegam ser <strong>de</strong><br />

conhecimento <strong>do</strong> fabricante <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muitas décadas. Nesse contexto, há que se esclarecer que a pretensão <strong>de</strong> ressarcimento <strong>do</strong>s<br />

autores da ação em razão <strong>do</strong>s danos morais, diferentemente da pretensão <strong>do</strong> próprio fumante, surgiu com a morte <strong>de</strong>le, momento a<br />

partir <strong>do</strong> qual eles tinham ação exercitável a ajuizar (actio nata) com o objetivo <strong>de</strong> compensar o dano que lhes é próprio, daí não se<br />

po<strong>de</strong>r falar em prescrição, porque foi respeita<strong>do</strong> o prazo prescricional <strong>de</strong> cinco anos <strong>do</strong> art. 27 <strong>do</strong> CDC. Note-se que o cigarro<br />

classifica-se como produto <strong>de</strong> periculosida<strong>de</strong> inerente (art. 9º <strong>do</strong> CDC) <strong>de</strong> ser, tal como o álcool, fator <strong>de</strong> risco <strong>de</strong> diversas<br />

enfermida<strong>de</strong>s. Não se revela como produto <strong>de</strong>feituoso (art. 12, § 1º, <strong>do</strong> mesmo Código) ou <strong>de</strong> alto grau <strong>de</strong> nocivida<strong>de</strong> ou<br />

periculosida<strong>de</strong> à saú<strong>de</strong> ou segurança, esse último <strong>de</strong> comercialização proibida (art. 10 <strong>do</strong> mesmo diploma). O art. 220, § 4º, da<br />

CF/1988 chancela a comercialização <strong>do</strong> cigarro, apenas lhe restringe a propaganda, ciente o legisla<strong>do</strong>r constituinte <strong>do</strong>s riscos <strong>de</strong> seu<br />

consumo. Já o CDC consi<strong>de</strong>ra <strong>de</strong>feito a falha que se <strong>de</strong>svia da normalida<strong>de</strong>, capaz <strong>de</strong> gerar frustração no consumi<strong>do</strong>r, que passa a<br />

não experimentar a segurança que se espera <strong>do</strong> produto ou serviço. Destarte, diz respeito a algo que escapa <strong>do</strong> razoável, que<br />

discrepa <strong>do</strong> padrão <strong>do</strong> produto ou <strong>de</strong> congêneres, e não à capacida<strong>de</strong> inerente a todas as unida<strong>de</strong>s produzidas <strong>de</strong> o produto gerar<br />

danos, tal como no caso <strong>do</strong> cigarro. Frise-se que, antes da CF/1988 (gênese das limitações impostas ao tabaco) e das legislações<br />

restritivas <strong>do</strong> consumo e publicida<strong>de</strong> que a seguiram (notadamente, o CDC e a Lei 9.294/1996), não existia o <strong>de</strong>ver jurídico <strong>de</strong><br />

informação que <strong>de</strong>terminasse à indústria <strong>do</strong> fumo conduta diversa daquela que, por décadas, praticou. Não há como aceitar a tese da<br />

existência <strong>de</strong> anterior <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informação, mesmo a partir <strong>de</strong> um ângulo principiológico, visto que a boa-fé (inerente à criação<br />

<strong>de</strong>sse <strong>de</strong>ver acessório) não possui conteú<strong>do</strong> per se, mas, necessariamente, insere-se em um conteú<strong>do</strong> contextual, afeito à carga<br />

histórico-social. Ao se consi<strong>de</strong>rarem os fatores legais, históricos e culturais vigentes nas décadas <strong>de</strong> cinquenta a oitenta <strong>do</strong> século<br />

anterior, não há como cogitar o princípio da boa-fé <strong>de</strong> forma fluida, sem conteú<strong>do</strong> substancial e contrário aos usos e costumes por<br />

séculos preexistentes, para concluir que era exigível, àquela época, o <strong>de</strong>ver jurídico <strong>de</strong> informação. De fato, não havia norma<br />

advinda <strong>de</strong> lei, princípio geral <strong>de</strong> direito ou costume que impusesse tal comportamento. Esses fundamentos, por si sós, seriam<br />

suficientes para negar a in<strong>de</strong>nização pleiteada, mas se soma a eles o fato <strong>de</strong> que, ao consi<strong>de</strong>rar a teoria <strong>do</strong> dano direto e imediato<br />

acolhida no direito civil brasileiro (art. 403 <strong>do</strong> CC/2002 e art. 1.060 <strong>do</strong> CC/1916), constata-se que ainda não está comprovada pela<br />

Medicina a causalida<strong>de</strong> necessária, direta e exclusiva entre o tabaco e câncer, pois ela se limita a afirmar a existência <strong>de</strong> fator <strong>de</strong><br />

risco entre eles, tal como outros fatores, como a alimentação, o álcool e o mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> vida se<strong>de</strong>ntário ou estressante. Se fosse possível,<br />

na hipótese, <strong>de</strong>terminar o quanto foi relevante o cigarro para o falecimento (a proporção causal existente entre eles), po<strong>de</strong>r-se-ia<br />

cogitar o nexo causal juridicamente satisfatório. Apesar <strong>de</strong> reconhecidamente robustas, somente as estatísticas não po<strong>de</strong>m dar lastro<br />

à responsabilida<strong>de</strong> civil em casos concretos <strong>de</strong> morte supostamente associada ao tabagismo, sem que se investigue, episodicamente,<br />

o preenchimento <strong>do</strong>s requisitos legais. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s <strong>do</strong> STF: RE 130.764-PR, DJ 19.05.1995; <strong>do</strong> STJ: REsp 489.895-SP, DJe<br />

23.04.2010; REsp 967.623-RJ, DJe 29.06.2009; REsp 1.112.796-PR, DJ 05.12.2007, e REsp 719.738-RS, DJe 22.09.2008” (STJ –<br />

REsp 1.113.804/RS – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 27.04.2010).


Ato contínuo, <strong>do</strong> Informativo n. 436 <strong>do</strong> STJ, igualmente afastan<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar da empresa <strong>de</strong> cigarro:<br />

“Dano moral. Fumante. Mostra-se incontroverso, nos autos, que o recorri<strong>do</strong>, autor da ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização ajuizada contra a<br />

fabricante <strong>de</strong> cigarros, começou a fumar no mesmo ano em que as advertências sobre os malefícios provoca<strong>do</strong>s pelo fumo passaram<br />

a ser estampadas, <strong>de</strong> forma explícita, nos maços <strong>de</strong> cigarro (1988). Isso, por si só, é suficiente para afastar suas alegações acerca <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>sconhecimento <strong>do</strong>s males atribuí<strong>do</strong>s ao fumo; pois, mesmo diante <strong>de</strong>ssas advertências, optou, ao valer-se <strong>de</strong> seu livre-arbítrio, por<br />

adquirir, espontaneamente, o hábito <strong>de</strong> fumar. Outrossim, nos autos, há lau<strong>do</strong> pericial conclusivo <strong>de</strong> que não se po<strong>de</strong>, no caso,<br />

comprovar a relação entre o tabagismo <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong> pelo recorri<strong>do</strong> e o surgimento <strong>de</strong> sua enfermida<strong>de</strong> (tromboangeíte obliterante –<br />

TAO ou <strong>do</strong>ença <strong>de</strong> Buerger). Assim, não há falar em direito à in<strong>de</strong>nização por danos morais, pois ausente o nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> da<br />

obrigação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: REsp 325.622-RJ, DJe 10.11.2008; REsp 719.738-RS, DJe 22.09.2008; e REsp<br />

737.797-RJ, DJ 28.08.2006” (STJ – REsp 886.347/RS – Rel. Min. Honil<strong>do</strong> Amaral <strong>de</strong> Mello Castro (Desembarga<strong>do</strong>r Convoca<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

TJAP) – j. 25.05.2010).<br />

Como antes exposto, a opinião <strong>do</strong> presente autor é no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> distribuição justa e equitativa <strong>do</strong>s riscos assumi<strong>do</strong>s pelas<br />

partes, a fixar o quantum in<strong>de</strong>nizatório <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a i<strong>de</strong>ia <strong>do</strong> risco concorrente. Assim, não se filia aos julga<strong>do</strong>s <strong>do</strong> STJ<br />

transcritos, muito menos aos entendimentos <strong>do</strong>utrinários que buscam afastar a in<strong>de</strong>nização contra as empresas que comercializam<br />

o cigarro.<br />

No campo da <strong>do</strong>utrina, <strong>de</strong>staque-se a obra coletiva intitulada Estu<strong>do</strong>s e pareceres sobre livre-arbítrio, responsabilida<strong>de</strong> e<br />

produto <strong>de</strong> risco inerente. O paradigma <strong>do</strong> tabaco. Aspectos civis e processuais (Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 2009). O livro é<br />

coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong> pela professora titular da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo Teresa Ancona Lopez, contan<strong>do</strong> com artigos e pareceres <strong>de</strong> Ada<br />

Pelegrini Grinover, Adroal<strong>do</strong> Furta<strong>do</strong> Fabrício, Álvaro Villaça Azeve<strong>do</strong>, Arruda Alvim, Cândi<strong>do</strong> Rangel Dinamarco, Eduar<strong>do</strong><br />

Ribeiro, Fábio Ulhoa Coelho, Galeno Lacerda, Gustavo Tepedino, José Carlos Moreira Alves, José Ignácio Botelho <strong>de</strong> Mesquita,<br />

Judith Martins-Costa, Maria Celina Bodin <strong>de</strong> Moraes, Nelson Nery Jr., René Ariel Dotti, Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar Júnior, além da<br />

própria coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>ra.94<br />

Seja por um caminho ou outro, os pareceres procuram afastar a responsabilida<strong>de</strong> da empresa tabagista, enfrentan<strong>do</strong> questões<br />

como nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>, a culpa exclusiva da vítima, a inexistência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito no produto fumígeno, o atendimento da boa-fé<br />

pela publicida<strong>de</strong> <strong>do</strong> cigarro, a incidência da prescrição, a questão da prova a ser construída na ação pelo fumante, entre outros.<br />

De início, a respeito da ausência <strong>do</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>, na maioria das vezes estará presente o elo entre os danos prova<strong>do</strong>s<br />

pelos consumi<strong>do</strong>res <strong>de</strong> cigarro e o uso <strong>do</strong> produto.95 Conforme outrora exposto, existem <strong>do</strong>enças exclusivas <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong><br />

tabagismo, por exemplo, a <strong>do</strong>ença <strong>de</strong> Buerger, e, nesses casos, o nexo causal é bem evi<strong>de</strong>nte e incontestável. 96 Cumpre relembrar<br />

que quadros comparativos, como o exposto por Sérgio Boeira, têm plenas condições <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar que as <strong>do</strong>enças cancerígenas<br />

são causadas pelo uso <strong>do</strong> cigarro. Além disso, provas médicas e testemunhais têm o condão <strong>de</strong> comprovar qual era a marca<br />

utilizada pela vítima. A título <strong>de</strong> exemplo, cite-se que, muitas vezes, consta das certidões <strong>de</strong> óbito elaboradas por médicos que a<br />

causa da morte foi o uso continua<strong>do</strong> <strong>do</strong> cigarro. Por fim, a estatística <strong>de</strong> merca<strong>do</strong> po<strong>de</strong> <strong>de</strong>terminar com grau razoável <strong>de</strong><br />

probabilida<strong>de</strong> qual era a marca utilizada pelo faleci<strong>do</strong> ou <strong>do</strong>ente.<br />

A respeito <strong>do</strong> nexo causal, insta <strong>de</strong>ixar bem claro que a responsabilida<strong>de</strong> civil das empresas <strong>de</strong> tabaco é objetiva, diante da<br />

comum aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. De maneira subsidiária, em diálogo das fontes, po<strong>de</strong> ainda ser utiliza<strong>do</strong> o<br />

art. 931 <strong>do</strong> Código Civil, que trata da responsabilida<strong>de</strong> objetiva referente aos produtos coloca<strong>do</strong>s em circulação. Desse mo<strong>do</strong>, não<br />

restam dúvidas <strong>de</strong> que o cigarro é um produto <strong>de</strong>feituoso, eis que não oferece segurança aos seus consumi<strong>do</strong>res, levan<strong>do</strong>-se em<br />

conta os perigos à saú<strong>de</strong> (art. 12, § 1º, da Lei 8.078/1990). Em reforço, po<strong>de</strong>m ainda ser subsumi<strong>do</strong>s os dispositivos consumeristas<br />

que tratam da proteção da saú<strong>de</strong> e da segurança <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res (arts. 8º a 10 da Lei 8.078/1990). Pela simples leitura atenta <strong>do</strong>s<br />

dispositivos aventa<strong>do</strong>s e pelo senso comum, nota-se que são totalmente inconsistentes os argumentos <strong>de</strong> inexistência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito no<br />

cigarro, como parte da <strong>do</strong>utrina consi<strong>de</strong>ra. 97 Talvez a questão até seja cultural, chocan<strong>do</strong>-se, nesse senti<strong>do</strong>, o mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> agir e o<br />

pensamento <strong>de</strong> gerações distintas.<br />

Nesse contexto <strong>de</strong> contraponto, não se po<strong>de</strong> negar que o produto perigoso é <strong>de</strong>feituoso quan<strong>do</strong> causa danos ao consumi<strong>do</strong>r.<br />

Essa é a essência contemporânea <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito: o dano causa<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r. Pensar ao contrário, ou seja, verificar o<br />

problema a partir da conduta, representa uma volta ao mo<strong>de</strong>lo subjetivo ou culposo no sistema consumerista. Em reforço, é<br />

imperioso relembrar que, nos casos <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva, o nexo causal po<strong>de</strong> ser forma<strong>do</strong> pela lei, que qualifica a conduta<br />

que causou o dano (imputação objetiva).<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> abordagem <strong>do</strong> tema, po<strong>de</strong>-se dizer que está presente no caso <strong>do</strong> cigarro um <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> criação, o qual afeta<br />

“as características gerais da produção em consequência <strong>de</strong> erro havi<strong>do</strong> no momento da elaboração <strong>de</strong> seu projeto ou <strong>de</strong> sua<br />

fórmula”.98 Em casos tais, “o fabricante respon<strong>de</strong> pela concepção ou i<strong>de</strong>alização <strong>de</strong> seu produto que não tenha a virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> evitar<br />

os riscos à saú<strong>de</strong> e segurança, não aceitáveis pelos consumi<strong>do</strong>res, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s ‘standards’”. 99 Isso parece claro e


evi<strong>de</strong>nte a este autor, em especial pela perda <strong>de</strong> pessoas próximas pelo uso <strong>do</strong> cigarro e pela farta bibliografia médica que con<strong>de</strong>na<br />

essa prática. Há gerações que não conseguiram vencer a luta pela vida contra o cigarro. Outras até hoje lutam contra os seus males,<br />

com algumas vitórias, dada a evolução da medicina. E para aqueles que pensam o contrário, seria interessante interrogarem-se se<br />

seria aceitável o incentivo <strong>do</strong> uso <strong>do</strong> tabaco aos próprios filhos.<br />

Conforme aponta a <strong>do</strong>utrina mais atenta, po<strong>de</strong>-se falar em <strong>de</strong>feitos ocultos, pelo problema quanto ao acesso à informação <strong>do</strong>s<br />

males <strong>do</strong> cigarro, principalmente se forem leva<strong>do</strong>s em conta aqueles que se iniciaram no fumo antes <strong>do</strong> início da veiculação <strong>de</strong><br />

informações sobre os males <strong>do</strong> produto. 100 Para que o argumento da ausência <strong>de</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> fique <strong>de</strong>vidamente afasta<strong>do</strong>,<br />

cite-se, ainda, a correta aplicação da teoria da presunção <strong>de</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>, utilizada em alguns julga<strong>do</strong>s, que tem relação<br />

direta com a pressuposição <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> pela colocação das pessoas em risco pelo produto. 101 Voltan<strong>do</strong> mais uma vez ao<br />

argumento <strong>do</strong> <strong>de</strong>feito, <strong>de</strong> fato, se o uso <strong>do</strong> cigarro não causar males à pessoa pelo seu uso continua<strong>do</strong>, o que até acontece, não há<br />

que se falar em <strong>de</strong>feito. Por outra via, presente o prejuízo, o produto perigoso é eleva<strong>do</strong> à condição <strong>de</strong> produto <strong>de</strong>feituoso,<br />

surgin<strong>do</strong>, então, a responsabilida<strong>de</strong> civil.<br />

Sobre a questão <strong>do</strong> exercício regular <strong>de</strong> direito e da licitu<strong>de</strong> da ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvida, cumpre <strong>de</strong>stacar que o <strong>Direito</strong> Civil<br />

Brasileiro admite a responsabilida<strong>de</strong> civil por atos lícitos.102 De início, cite-se a hipótese <strong>de</strong> legítima <strong>de</strong>fesa putativa, em que o<br />

agente pensa que está tutelan<strong>do</strong> imediatamente um direito seu, ou <strong>de</strong> terceiro, o que não é verda<strong>de</strong>. 103 Além da legítima <strong>de</strong>fesa<br />

putativa, admite-se a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong> agressivo. O art. 188, I, <strong>do</strong> Código Civil enuncia<br />

que não constitui ato ilícito a <strong>de</strong>terioração ou <strong>de</strong>struição da coisa alheia, ou a lesão à pessoa, a fim <strong>de</strong> remover perigo iminente<br />

(esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong>). Todavia, nos termos <strong>do</strong> art. 929 da atual codificação privada, se a pessoa lesada ou o <strong>do</strong>no da coisa, em<br />

casos tais, não for culpa<strong>do</strong> <strong>do</strong> perigo, assistir-lhe-á direito à in<strong>de</strong>nização <strong>do</strong> prejuízo que sofreram. O exemplo clássico é o <strong>de</strong> um<br />

pe<strong>de</strong>stre que vê uma criança gritan<strong>do</strong> em meio às chamas que atingem uma casa. O pe<strong>de</strong>stre arromba a porta da casa, apaga o<br />

incêndio e salva a criança. Nos termos <strong>do</strong>s dispositivos visualiza<strong>do</strong>s, se quem causou o incêndio não foi o <strong>do</strong>no da casa, o<br />

pe<strong>de</strong>stre-herói terá que in<strong>de</strong>nizá-lo, ressalva<strong>do</strong> o direito <strong>de</strong> regresso contra o real culpa<strong>do</strong> (art. 930 <strong>do</strong> Código Civil). Ora, seria<br />

irrazoável imaginar um sistema que or<strong>de</strong>na que uma pessoa em ato heroico tenha o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar, enquanto as empresas <strong>de</strong><br />

tabaco, em condutas nada heroicas, tão somente lucrativas, sejam excluídas <strong>de</strong> qualquer responsabilida<strong>de</strong> pelos produtos perigosos<br />

postos em circulação.<br />

Além <strong>de</strong>sses argumentos, insta verificar que, muitas vezes, principalmente para os fumantes das décadas mais remotas, a<br />

questão <strong>do</strong> cigarro po<strong>de</strong> ser resolvida pela figura <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito. Isso porque as empresas não informavam <strong>do</strong>s males causa<strong>do</strong>s<br />

pelo produto, enganan<strong>do</strong> os consumi<strong>do</strong>res. Assim, estaria configurada a publicida<strong>de</strong> enganosa, nos termos <strong>do</strong> art. 37, § 1º, da Lei<br />

8.078/1990, o que gera o seu <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Conforme dispõe o art. 187 <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002, po<strong>de</strong>-se falar ainda em<br />

quebra da boa-fé, pela falsida<strong>de</strong> da informação, o que é muito bem exposto por Claudia Lima Marques em excelente e corajoso<br />

parecer sobre a questão.104 Em suma, comercializar cigarros po<strong>de</strong> até ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> lícito, diante <strong>de</strong> um erro histórico cometi<strong>do</strong><br />

pela humanida<strong>de</strong>. Porém, comercializar o produto sem as corretas informações <strong>de</strong> seus males – já conheci<strong>do</strong>s pelas próprias<br />

empresas –, geran<strong>do</strong> danos, configura um ilícito por equiparação (art. 927, caput, <strong>do</strong> Código Civil), conforme bem aponta Lúcio<br />

Delfino. 105 Não nos fazem mudar <strong>de</strong> opinião os argumentos contrários, apesar <strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s esforços da <strong>do</strong>utrina <strong>de</strong> escol. 106<br />

No que concerne à questão da publicida<strong>de</strong>, o parecer <strong>de</strong> Judith Martins-Costa quase chega a convencer, em especial pelos<br />

argumentos realeanos. Aduz a jurista:<br />

“Traduzin<strong>do</strong> esses da<strong>do</strong>s para as categorias teóricas <strong>do</strong> tridimensionalismo <strong>de</strong> Miguel Reale, observaremos que o fato da<br />

consciência social acerca <strong>do</strong>s malefícios <strong>do</strong> cigarro tem permaneci<strong>do</strong>, através <strong>do</strong>s tempos, relativamente o mesmo; porém esse fato<br />

(a consciência social) recebe diferentes valorações sociais e jurídicas no curso <strong>do</strong>s tempos, resultan<strong>do</strong>, então, em diferentes<br />

recepções normativas por parte <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>. Quan<strong>do</strong> a consciência social <strong>do</strong>s males <strong>do</strong> fumo convivia com a sua ‘glamourização’<br />

sociocultural, havia uma ampla tolerância jurídica; porém passa-se, progressivamente, à ‘<strong>de</strong>sglamourização’ sociocultural <strong>do</strong> fumo,<br />

em virtu<strong>de</strong> da ascensão ao status <strong>de</strong> valor social <strong>do</strong> culto à saú<strong>de</strong>. Então, verifica-se uma relativa intolerância jurídica, expressa nas<br />

leis e medidas administrativas restritivas ao fumo e na regulação da propaganda <strong>de</strong> cigarros”. 107<br />

A conclusão a que chega mais à frente, quanto à oferta e à boa-fé, é a <strong>de</strong> que não é possível interpretar as situações jurídicas<br />

<strong>do</strong> passa<strong>do</strong> com a realida<strong>de</strong> social <strong>do</strong> presente e vice-versa. Assim, alega que houve equívoco <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Tribunal Gaúcho ao<br />

con<strong>de</strong>nar a empresa Souza Cruz, eis que agiu “trazen<strong>do</strong> a pré-compreensão e interpretação hoje <strong>de</strong>vidas ao princípio da boa-fé<br />

objetiva para selecionar, filtrar, apreciar e, finalmente, julgar, fatos ocorri<strong>do</strong>s nas longínquas décadas <strong>de</strong> 40 e 50 <strong>do</strong> século passa<strong>do</strong>,<br />

<strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> <strong>de</strong> la<strong>do</strong> os da<strong>do</strong>s contextuais e ignoran<strong>do</strong> a circunstancialida<strong>de</strong> em que o conhecimento das concretas situações <strong>de</strong> vida<br />

relativas ao tratamento jurídico <strong>do</strong>s riscos <strong>do</strong> tabagismo efetivamente se processa”.108 Anote-se que os fortes argumentos da<br />

jurista foram utiliza<strong>do</strong>s no julgamento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 432.<br />

As belas lições da <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>ra, na verda<strong>de</strong>, servem em parte para a premissa jurídica que aqui se propõe. A boa-fé objetiva, a


veiculação da oferta <strong>do</strong> cigarro e as experiências sociais <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> <strong>de</strong>vem ser levadas em conta para a fixação <strong>do</strong> quantum<br />

<strong>de</strong>beatur, por interação direta com a assunção <strong>do</strong>s riscos pelas empresas e fumantes. Todavia, não se po<strong>de</strong> dizer que tais <strong>de</strong>duções<br />

sociais servem para excluir totalmente a responsabilida<strong>de</strong> ou a ilicitu<strong>de</strong> das condutas das empresas <strong>de</strong> tabaco, inclusive na questão<br />

da publicida<strong>de</strong>, como quer a jurista gaúcha. Não se po<strong>de</strong> colocar totalmente o peso <strong>do</strong> risco em cima <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, como se<br />

preten<strong>de</strong>. Em verda<strong>de</strong>, a boa-fé objetiva e o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar servem para calibrar as condutas, influin<strong>do</strong> diretamente na<br />

pon<strong>de</strong>ração e na fixação das responsabilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cada uma das partes envolvidas.<br />

No que toca ao argumento <strong>do</strong> livre-arbítrio, esse já foi exaustivamente rebati<strong>do</strong>. Cumpre discorrer sobre ele um pouco mais,<br />

eis que farta <strong>do</strong>utrina partidária da conclusão da irreparabilida<strong>de</strong> o utiliza. 109 Em verda<strong>de</strong>, na realida<strong>de</strong> pós-mo<strong>de</strong>rna não há o<br />

cita<strong>do</strong> livre-arbítrio, conceito essencialmente liberal da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, mo<strong>de</strong>lo no qual algumas gerações <strong>de</strong> juristas se formou. O<br />

que existe na contemporaneida<strong>de</strong> é uma inafastável e irresistível tendência <strong>de</strong> intervenção estatal, <strong>de</strong> dirigismo negocial, a fim <strong>de</strong><br />

proteger partes vulneráveis (consumi<strong>do</strong>res, trabalha<strong>do</strong>res, a<strong>de</strong>rentes, mulheres sob violência, crianças e a<strong>do</strong>lescentes, além <strong>de</strong><br />

outras questões subjetivas) e valores fundamentais (moradia, saú<strong>de</strong>, segurança, função social, vedação <strong>do</strong> enriquecimento sem<br />

causa e da onerosida<strong>de</strong> excessiva, entre outros aspectos <strong>de</strong> valoração objetiva). Eis mais uma i<strong>de</strong>ia que conflita gerações no<br />

<strong>Direito</strong>. Em reforço, cumpre lembrar as palavras <strong>do</strong> Desembarga<strong>do</strong>r Caetano Lagrasta, em julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> São Paulo, no<br />

senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que o argumento <strong>do</strong> livre-arbítrio parece fundamentar uma pretensa religião que cultua o cigarro. Em reforço, fica a<br />

dúvida se realmente havia um livre e irrestrito arbítrio no que toca aos fumantes <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> remoto.<br />

Em relação a argumentos acessórios relativos à liberda<strong>de</strong> e à autonomia privada, caso da vedação <strong>do</strong> comportamento<br />

contraditório, insta <strong>de</strong>ixar claro que a máxima <strong>do</strong> venire contra factum proprium não consegue vencer valores fundamentais, caso<br />

da tutela da saú<strong>de</strong>, que está no art. 6º da Constituição Fe<strong>de</strong>ral (técnica <strong>de</strong> pon<strong>de</strong>ração, a<strong>do</strong>tada expressamente pelo art. 489, § 2º,<br />

<strong>do</strong> CPC/2015).110<br />

Por fim, o argumento principal a ser rebati<strong>do</strong> é o da culpa exclusiva da vítima. Esse parece ser o maior sofisma jurídico<br />

prega<strong>do</strong> por parte da <strong>do</strong>utrina e da jurisprudência, que concluem pela inexistência <strong>de</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar os fumantes ou seus<br />

familiares, ferin<strong>do</strong> a lógica <strong>do</strong> razoável. Não se po<strong>de</strong> admitir que a carga <strong>de</strong> culpa fique somente concentrada no consumi<strong>do</strong>r,<br />

sobretu<strong>do</strong> se as empresas <strong>de</strong> cigarro assumem um risco-proveito, altamente lucrativo. O argumento é por completo inócuo nos<br />

casos <strong>de</strong> fumantes passivos, caso, por exemplo, <strong>de</strong> trabalha<strong>do</strong>res <strong>de</strong> locais em que o fumo vem – ou vinha – a ser permiti<strong>do</strong> (v.g.,<br />

casas noturnas e restaurantes), que acabam se enquadran<strong>do</strong> no conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r por equiparação ou bystan<strong>de</strong>r (art. 17 <strong>do</strong><br />

CDC). Há até o cúmulo das vozes argumentativas que pregam que a pessoa fuma para <strong>de</strong>pois pleitear in<strong>de</strong>nização ou para que seus<br />

familiares o façam. Quem já vivenciou os últimos dias <strong>de</strong> um fumante sabe muito bem como o argumento é <strong>de</strong>scabi<strong>do</strong>, seja <strong>do</strong><br />

ponto <strong>de</strong> vista fático ou social.<br />

A conclusão <strong>de</strong>ste autor é a <strong>de</strong> que o problema <strong>do</strong> cigarro <strong>de</strong>ve ser resolvi<strong>do</strong> pela teoria <strong>do</strong> risco concorrente. Na linha das<br />

lições <strong>de</strong> Judith Martins-Costa antes esposadas, <strong>do</strong>is momentos distintos <strong>de</strong>vem ser imagina<strong>do</strong>s, para duas soluções <strong>do</strong> mesmo<br />

mo<strong>do</strong> discrepantes. Atente-se para o fato <strong>de</strong> que as soluções são <strong>de</strong> divisões diferentes das responsabilida<strong>de</strong>s, sem a atribuição <strong>do</strong><br />

ônus <strong>de</strong> forma exclusiva a apenas um <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s.<br />

De início, para aqueles que começaram a fumar antes da publicida<strong>de</strong> e da propaganda <strong>de</strong> alerta, o fator <strong>de</strong> assunção <strong>do</strong> risco<br />

<strong>de</strong>ve ser diminuí<strong>do</strong> ou até excluí<strong>do</strong>, eis que não tinham conhecimento – ou não <strong>de</strong>veriam ter – <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os males causa<strong>do</strong>s pelo<br />

fumo. Muitas <strong>de</strong>ssas pessoas foram enganadas anos a fio. Aqui se enquadram os que se iniciaram no fumo antes <strong>do</strong> início <strong>do</strong><br />

século XXI e que são justamente os personagens principais das <strong>de</strong>mandas em curso perante o Po<strong>de</strong>r Judiciário brasileiro. O maior<br />

índice <strong>de</strong> risco assumi<strong>do</strong>, por óbvio, está na conduta <strong>do</strong>s fabricantes e comerciantes <strong>de</strong> cigarros, até porque sabiam ou <strong>de</strong>veriam<br />

saber <strong>do</strong>s males <strong>do</strong> produto. É possível <strong>de</strong>duzir ainda que, diante <strong>do</strong> grau <strong>de</strong> instrução <strong>do</strong> brasileiro comum, não se po<strong>de</strong> atribuir<br />

qualquer índice <strong>de</strong> riscos aos consumi<strong>do</strong>res, aplican<strong>do</strong>-se a reparação integral <strong>do</strong>s danos. Entretanto, aumentan<strong>do</strong> o grau <strong>de</strong><br />

esclarecimento <strong>do</strong> fumante, a pon<strong>de</strong>ração <strong>de</strong>ve ser diversa.<br />

Para ilustrar, se uma pessoa altamente esclarecida começou a fumar nos anos 1980, sen<strong>do</strong> razoável que ela sabia <strong>do</strong>s males <strong>do</strong><br />

cigarro, o grau <strong>de</strong> risco assumi<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve ser em torno <strong>de</strong> 10% ou 20%, enquanto os outros 90% ou 80% correm por conta da<br />

empresa <strong>de</strong> tabaco. Na mesma hipótese, mas envolven<strong>do</strong> um analfabeto sem instrução cultural, o grau <strong>de</strong> risco será <strong>de</strong> 100% por<br />

parte da empresa.<br />

Por outra via, para aqueles que iniciaram o hábito mais recentemente – <strong>de</strong>vidamente informa<strong>do</strong>s, saben<strong>do</strong> e conhecen<strong>do</strong> os<br />

males <strong>do</strong> cigarro –, a situação é diferente. Inverte-se o raciocínio, uma vez que a maior carga <strong>de</strong> risco assumi<strong>do</strong> se dá por parte <strong>do</strong><br />

fumante. Nesse contexto, po<strong>de</strong>-se imaginar 90% <strong>de</strong> risco por parte <strong>do</strong> fumante e 10% pela empresa; 80% <strong>de</strong> risco pelo fumante e<br />

20% pela empresa, e assim sucessivamente, o que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da análise caso a caso pelo aplica<strong>do</strong>r <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>. Contu<strong>do</strong>, mesmo em<br />

casos tais não se po<strong>de</strong> admitir a culpa ou o fato exclusivo da vítima, haven<strong>do</strong>, na verda<strong>de</strong>, um risco concorrente. Eis mais um<br />

exemplo <strong>de</strong> que a resolução <strong>do</strong> problema pela concausalida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser favorável ao consumi<strong>do</strong>r, pois em circunstâncias normais


po<strong>de</strong>r-se-ia falar em culpa exclusiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, como faz parte da <strong>do</strong>utrina e da jurisprudência, muitas vezes amparada no<br />

livre-arbítrio.<br />

Concluin<strong>do</strong>, a in<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>ve ser fixada <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com os riscos assumi<strong>do</strong>s pelas partes, aplican<strong>do</strong>-se a equida<strong>de</strong> e<br />

buscan<strong>do</strong>-se o critério máximo <strong>de</strong> justiça. Um sistema justo, equânime e pon<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil é aquele que procura<br />

dividir os custos <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com os seus participantes e na medida <strong>do</strong>s riscos assumi<strong>do</strong>s por cada um <strong>de</strong>les.<br />

Para findar o presente capítulo, colaciona-se tabela com to<strong>do</strong>s os argumentos <strong>do</strong>utrinários aqui expostos, constantes na citada<br />

obra coletiva, com os correspon<strong>de</strong>ntes contra-argumentos ou rebates, para os fins <strong>de</strong> atribuição <strong>de</strong> uma responsabilida<strong>de</strong> civil<br />

concorrente entre fumantes e empresas tabagistas.<br />

Argumento Quem segue Contra-argumento<br />

Ausência <strong>de</strong> nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong><br />

entre o cigarro e o dano.<br />

Licitu<strong>de</strong> da ativida<strong>de</strong> e exercício<br />

regular <strong>de</strong> direito por parte da<br />

empresa.<br />

Não há problema na publicida<strong>de</strong>,<br />

pois as empresas não sabiam<br />

<strong>do</strong>s males <strong>do</strong> cigarro. Assim, não<br />

haveria publicida<strong>de</strong> enganosa. A<br />

boa-fé objetiva impõe que as<br />

condutas sejam analisadas <strong>de</strong><br />

acor<strong>do</strong> com a realida<strong>de</strong> da época<br />

(realida<strong>de</strong> cultural e social).<br />

Gustavo Tepedino.<br />

Moreira Alves.<br />

Galeno Lacerda.<br />

Nelson Nery Jr.<br />

Tereza Ancona Lopez.<br />

Gustavo Tepedino.<br />

Adroal<strong>do</strong> Furta<strong>do</strong> Fabrício.<br />

Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar.<br />

Judith Martins-Costa, utilizan<strong>do</strong> a<br />

teoria tridimensional <strong>de</strong> Miguel<br />

Reale.<br />

Quase convence.<br />

Informativo 432 <strong>do</strong> STJ.<br />

Há nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>, pela causalida<strong>de</strong><br />

a<strong>de</strong>quada, entre o risco <strong>do</strong> produto e os<br />

danos causa<strong>do</strong>s.<br />

Aplica-se a responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong><br />

CDC.<br />

Produto perigoso que causa dano é produto<br />

<strong>de</strong>feituoso.<br />

No cigarro há um <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> criação.<br />

As estatísticas e os cálculos po<strong>de</strong>m<br />

<strong>de</strong>monstrar que o prejuízo é causa<strong>do</strong> pelo<br />

cigarro.<br />

No caso da <strong>do</strong>ença <strong>de</strong> Buerguer, o mal é<br />

evi<strong>de</strong>ntemente causa<strong>do</strong> pelo cigarro.<br />

Provas médicas (lau<strong>do</strong>s) e testemunhais<br />

po<strong>de</strong>m provar a marca utilizada pela vítima.<br />

Vale também a estatística <strong>de</strong> merca<strong>do</strong> para<br />

apontar quais as marcas mais usadas.<br />

É possível a responsabilida<strong>de</strong> por atos<br />

lícitos, o que, aliás, po<strong>de</strong> ser retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> art.<br />

927, parágrafo único, <strong>do</strong> CC.<br />

O art. 929 <strong>do</strong> CC admite a responsabilida<strong>de</strong><br />

pelo esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong>. Admite-se a<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil por legítima <strong>de</strong>fesa<br />

putativa.<br />

O abuso <strong>de</strong> direito da informação po<strong>de</strong><br />

atribuir a responsabilida<strong>de</strong>, no caso das<br />

pessoas que passaram a fumar em tempos<br />

remotos.<br />

Será que as empresas não sabiam que fazia<br />

mal o cigarro, mesmo antes da década <strong>de</strong><br />

90?<br />

O argumento não tem o condão <strong>de</strong> excluir<br />

totalmente a responsabilida<strong>de</strong> das empresas,<br />

mas <strong>de</strong> atenuá-la, haven<strong>do</strong> uma<br />

concorrência <strong>de</strong> risco.<br />

De toda sorte, como o fumante não sabia<br />

<strong>do</strong>s males, não se po<strong>de</strong> atribuir-lhe o maior<br />

peso <strong>de</strong> risco, mas sim fazê-lo com relação


Livre-arbítrio.<br />

Vedação <strong>do</strong> comportamento<br />

contraditório (venire contra<br />

factum proprium).<br />

Teresa Ancona Lopez.<br />

Álvaro Villaça Azeve<strong>do</strong>.<br />

Galeno Lacerda.<br />

Gustavo Tepedino.<br />

Nelson Nery Jr.<br />

Maria Celina Bodin <strong>de</strong> Moraes.<br />

René Ariel Dotti.<br />

Teresa Ancona Lopez.<br />

Nelson Nery Jr.<br />

Gustavo Tepedino.<br />

às empresas, diante <strong>de</strong> um risco-proveito.<br />

A boa-fé objetiva e o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar<br />

servem para calibrar as condutas, fixan<strong>do</strong>-se<br />

a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com as<br />

contribuições causais.<br />

Na realida<strong>de</strong> pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> não há o<br />

cita<strong>do</strong> livre arbítrio, TOTAL E IRRESTRITO,<br />

mo<strong>de</strong>lo liberal da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. O que há no<br />

momento é uma tendência <strong>de</strong> intervenção<br />

estatal, <strong>de</strong> dirigismo, <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> mo<strong>de</strong>lo<br />

<strong>de</strong>mocrático.<br />

Essa intervenção ten<strong>de</strong> a proteger os<br />

vulneráveis e valores fundamentais.<br />

Pela técnica <strong>de</strong> pon<strong>de</strong>ração (art. 489 § 2º <strong>do</strong><br />

CPC/2015), a boa-fé objetiva não vence<br />

valores fundamentais, como a tutela da<br />

saú<strong>de</strong>, constante <strong>do</strong> art. 6º da CF/1988.<br />

Valores fundamentais são irrenunciáveis.<br />

Culpa exclusiva da vítima. Praticamente to<strong>do</strong>s os cita<strong>do</strong>s. A carga da culpa não po<strong>de</strong> ficar toda sobre o<br />

fumante. A empresa tabagista tem um riscoproveito.<br />

O consumi<strong>do</strong>r também assume<br />

risco, o que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> das circunstâncias<br />

fáticas. A in<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>ve ser fixada <strong>de</strong><br />

acor<strong>do</strong> com os riscos assumi<strong>do</strong>s, o que<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da ciência ou não e da assunção<br />

<strong>do</strong>s riscos, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a informação e a<br />

época vivida. O argumento é inócuo quanto<br />

aos fumantes passivos, que são<br />

consumi<strong>do</strong>res equipara<strong>do</strong>s (art. 17 <strong>do</strong> CDC).<br />

4.7.<br />

A RESPONSABILIDADE CIVIL PELO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O<br />

RECALL<br />

O recall, rechamada ou convocação tornou-se um acontecimento constante no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo. A palavra recall está<br />

assim traduzida no Dicionário Aulete, um <strong>do</strong>s poucos em que o verbete é encontra<strong>do</strong>: “Convocação. Em países <strong>de</strong> língua inglesa e<br />

no Brasil, nome <strong>do</strong> procedimento em que o fornece<strong>do</strong>r convoca, por meio <strong>de</strong> anúncios veicula<strong>do</strong>s na imprensa, os compra<strong>do</strong>res <strong>de</strong><br />

seu produto, quan<strong>do</strong> constata<strong>do</strong> um <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> fabricação, a fim <strong>de</strong> corrigi-lo antes que cause aci<strong>de</strong>nte, prejuízo, dano etc. ao<br />

consumi<strong>do</strong>r”.111 To<strong>do</strong>s os anos, milhares <strong>de</strong> empresas convocam os seus consumi<strong>do</strong>res para a troca <strong>de</strong> peças ou mesmo <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o<br />

produto, visan<strong>do</strong> afastar eventuais danos futuros. Na mass consumption society ou socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong> massa, as trocas mais<br />

comuns são <strong>de</strong> peças <strong>de</strong> veículos e <strong>de</strong> brinque<strong>do</strong>s infantis.<br />

Não se po<strong>de</strong> negar que o ato <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> convocar os consumi<strong>do</strong>res é uma ação movida pela boa-fé objetiva, em<br />

especial na fase pós-contratual ou pós-consumo. Agem assim os fabricantes movi<strong>do</strong>s pela orientação constante <strong>do</strong> art. 4º, III, e <strong>do</strong><br />

art. 6º, II, da Lei 8.078/1990. Não olvidam, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, as normas que vedam aos fornece<strong>do</strong>res manter no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

consumo produtos que saibam ser perigosos (arts. 8º e 10 da Lei Consumerista), bem como o coman<strong>do</strong> que enuncia o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong><br />

informar a respeito <strong>do</strong>s riscos e perigos relativos aos bens <strong>de</strong> consumo (art. 9º <strong>do</strong> CDC). Anote-se que o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> retirar <strong>do</strong><br />

merca<strong>do</strong> produto perigoso ou nocivo constava expressamente <strong>do</strong> art. 11 da Lei 8.078/1990, norma que foi vetada pelo então<br />

Presi<strong>de</strong>nte da República.<br />

Era a redação da norma vetada: “Art. 11. O produto ou serviço que, mesmo a<strong>de</strong>quadamente utiliza<strong>do</strong> ou fruí<strong>do</strong>, apresenta alto<br />

grau <strong>de</strong> nocivida<strong>de</strong> ou periculosida<strong>de</strong> será retira<strong>do</strong> imediatamente <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> pelo fornece<strong>do</strong>r, sempre às suas expensas, sem


prejuízo da responsabilida<strong>de</strong> pela reparação <strong>de</strong> eventuais danos”. Razões <strong>do</strong> veto: “O dispositivo é contrário ao interesse público,<br />

pois, ao <strong>de</strong>terminar a retirada <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> produtos e serviços que apresentem ‘alto grau <strong>de</strong> nocivida<strong>de</strong> ou periculosida<strong>de</strong>’,<br />

mesmo quan<strong>do</strong> ‘a<strong>de</strong>quadamente utiliza<strong>do</strong>s’, impossibilita a produção e o comércio <strong>de</strong> bens indispensáveis à vida mo<strong>de</strong>rna (e.g.<br />

materiais radioativos, produtos químicos e outros). Cabe, quanto a tais produtos e serviços, a a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> cuida<strong>do</strong>s especiais, a<br />

serem disciplina<strong>do</strong>s em legislação específica”. Todavia, <strong>de</strong>ve ficar claro que tal veto não prejudica o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> se fazer o recall,<br />

prática que se mostrou até mais efetiva <strong>do</strong> que a simples retirada <strong>do</strong> produto. O que se verifica no recall é um ato <strong>de</strong> convocação<br />

<strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res para que os consumi<strong>do</strong>res ajam em colaboração ou cooperação, um <strong>do</strong>s ditames da boa-fé objetiva.<br />

Não restam dúvidas <strong>de</strong> que há um paralelo entre a responsabilida<strong>de</strong> pós-contratual ou post pactum finitum e a prática <strong>do</strong><br />

recall, aplican<strong>do</strong>-se o princípio da boa-fé nessa fase negocial. Tal interação é muito bem <strong>de</strong>lineada por Rogério Ferraz Donnini,<br />

para quem “o recall evita que o fornece<strong>do</strong>r suporte uma gama enorme <strong>de</strong> ações <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização daqueles que eventualmente<br />

sofreriam prejuízos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que a substituição <strong>do</strong> produto nocivo ou perigoso seja realizada <strong>de</strong> maneira apropriada. O recall, assim,<br />

não caracteriza uma culpa <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r após a extinção <strong>do</strong> contrato firma<strong>do</strong> com o consumi<strong>do</strong>r. Ao contrário. Trata-se <strong>de</strong><br />

expediente preventivo. Há, em verda<strong>de</strong>, a antecipação <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r para que o fato que provavelmente suce<strong>de</strong>ria (dano) não se<br />

concretize. Embora essa substituição <strong>de</strong> produto ocorra normalmente após extinto o contrato, inexiste culpa <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. Não há,<br />

<strong>de</strong>starte, responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, haja vista que o prejuízo ainda não ocorreu. Des<strong>de</strong> que seja feita a troca da peça<br />

avariada <strong>de</strong> forma a<strong>de</strong>quada, foram os <strong>de</strong>veres acessórios cumpri<strong>do</strong>s”.112<br />

De fato, se há a troca, o dano não estará presente, não se cogitan<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. Nessa linha vem<br />

<strong>de</strong>cidin<strong>do</strong> a jurisprudência nacional. A título <strong>de</strong> exemplo, <strong>do</strong> Tribunal <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral: “Ação coletiva. CDC. Alegação <strong>de</strong><br />

riscos a consumi<strong>do</strong>res. Exposição a produtos vicia<strong>do</strong>s ou <strong>de</strong>feituosos que foram objeto <strong>de</strong> recall. Danos morais. Inocorrência. O<br />

recolhimento preventivo <strong>de</strong> brinque<strong>do</strong> (recall) em face <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito na concepção ou <strong>de</strong> componente nocivo à saú<strong>de</strong>, não gera, por si<br />

só, danos morais. Prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> STJ” (TJDF – Recurso 2007.01.1.110169-4 – Acórdão 329.335 – Segunda Turma Cível – Rel.<br />

Des. Carmelita Brasil – DJDFTE 12.11.2008, p. 77). Na mesma perspectiva:<br />

“In<strong>de</strong>nização. Danos morais e materiais. Convocação para troca <strong>de</strong> equipamentos através <strong>de</strong> recall. Impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong><br />

dano hipotético ou potencial. Não há se falar em dano moral ou material em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> convocação da autora para troca <strong>de</strong><br />

equipamentos em seu veículo através <strong>de</strong> recall pela simples preocupação advinda com a ciência <strong>do</strong> <strong>de</strong>feito ou pelo não abatimento<br />

<strong>do</strong> valor <strong>do</strong> carro no momento da compra. Não existe reparação <strong>de</strong> dano hipotético ou potencial. Além <strong>do</strong> mais, não há se falar em<br />

danos materiais se o preço <strong>de</strong> venda <strong>do</strong> veículo foi superior ao preço <strong>de</strong> compra. Não é qualquer dissabor, ou qualquer incômo<strong>do</strong>,<br />

que dá ensejo à in<strong>de</strong>nização por abalo moral. É preciso se ter em conta, sempre, que não se po<strong>de</strong> estimular a proliferação da<br />

chamada ‘indústria <strong>do</strong> dano moral’. Apelo improvi<strong>do</strong>” (TJRS – Acórdão 70004786117, Porto Alegre – Quinta Câmara Cível – Rel.<br />

Des. Marco Aurélio <strong>do</strong>s Santos Caminha – j. 25.09.2003).<br />

Por outra via, se o problema na coisa é anterior ao recall, a convocação posterior para a troca evi<strong>de</strong>ncia o vício, surgin<strong>do</strong> a<br />

obrigação <strong>de</strong> reparar <strong>do</strong> fabricante, com base no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, conforme reconheci<strong>do</strong> pelo Superior Tribunal<br />

<strong>de</strong> Justiça na ementa a seguir colacionada:<br />

“Civil. Processual civil. Recurso especial. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Veículo com <strong>de</strong>feito. Responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r.<br />

In<strong>de</strong>nização. Danos morais. Valor in<strong>de</strong>nizatório. Redução <strong>do</strong> quantum. Prece<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong>sta Corte. 1. Aplicável à hipótese a legislação<br />

consumerista. O fato <strong>de</strong> o recorri<strong>do</strong> adquirir o veículo para uso comercial – táxi – não afasta a sua condição <strong>de</strong> hipossuficiente na<br />

relação com a empresa-recorrente, ensejan<strong>do</strong> a aplicação das normas protetivas <strong>do</strong> CDC. 2. Verifica-se, in casu, que se trata <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>feito relativo à falha na segurança, <strong>de</strong> caso em que o produto traz um vício intrínseco que potencializa um aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo,<br />

sujeitan<strong>do</strong>-se o consumi<strong>do</strong>r a um perigo iminente (<strong>de</strong>feito na mangueira <strong>de</strong> alimentação <strong>de</strong> combustível <strong>do</strong> veículo, propician<strong>do</strong><br />

vazamento causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> incêndio). Aplicação da regra <strong>do</strong> art. 27 <strong>do</strong> CDC. 3. O Tribunal a quo, com base no conjunto fáticoprobatório<br />

trazi<strong>do</strong> aos autos, enten<strong>de</strong>u que o <strong>de</strong>feito fora publicamente reconheci<strong>do</strong> pela recorrente, ao proce<strong>de</strong>r ao recall com vistas<br />

à substituição da mangueira <strong>de</strong> alimentação <strong>do</strong> combustível. A pretendida reversão <strong>do</strong> <strong>de</strong>cisum recorri<strong>do</strong> <strong>de</strong>manda reexame <strong>de</strong><br />

provas analisadas nas instâncias ordinárias. Óbice da Súmula 7/STJ. 4. Esta Corte tem entendimento firma<strong>do</strong> no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que<br />

‘quanto ao dano moral, não há que se falar em prova, <strong>de</strong>ve-se, sim, comprovar o fato que gerou a <strong>do</strong>r, o sofrimento, sentimentos<br />

íntimos que o ensejam. Prova<strong>do</strong> o fato, impõe-se a con<strong>de</strong>nação’ (Cf. AGA 356.447-RJ, DJ 11.06.2001). 5. Consi<strong>de</strong>radas as<br />

peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> caso em questão e os princípios <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>ração e da razoabilida<strong>de</strong>, o valor fixa<strong>do</strong> pelo Tribunal a quo, a título <strong>de</strong><br />

danos morais, em 100 (cem) salários mínimos, mostra-se excessivo, não se limitan<strong>do</strong> à compensação <strong>do</strong>s prejuízos advin<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

evento danoso, pelo que se impõe a respectiva redução a quantia certa <strong>de</strong> R$ 5.000,00 (cinco mil reais). 6. Recurso conheci<strong>do</strong><br />

parcialmente e, nesta parte, provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 575.469/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. Jorge Scartezzini – j. 18.11.2004 – DJ<br />

06.12.2004, p. 325).<br />

Na mesma linha, colaciona-se ementa <strong>do</strong> Tribunal Paulista, seguin<strong>do</strong> as lições expostas nesta obra: “In<strong>de</strong>nização. Dano moral.<br />

Aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> veículo com evento morte. Cinto <strong>de</strong> segurança traseiro. Defeito <strong>de</strong> fabricação. Recall posterior ao evento. Ônus da


prova <strong>do</strong> fabricante. Consi<strong>de</strong>rações sobre a Teoria da carga dinâmica da prova. Dano moral configura<strong>do</strong>. Sentença reformada.<br />

Recurso provi<strong>do</strong>, por maioria” (TJSP, Apelação 0281461-98.2009.8.26.0000 – 8ª Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, Registro – Rel. Des.<br />

Caetano Lagrasta – j. 15.08.2012).<br />

Entretanto, situação mais intrincada se faz presente quan<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r – avisa<strong>do</strong> ou não – não troca o produto com <strong>de</strong>feito,<br />

vin<strong>do</strong> a ocorrer o evento danoso. A primeira questão a ser esclarecida é a <strong>de</strong> que, em casos tais, haverá responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r diante <strong>do</strong> produto nocivo ou que apresenta riscos. A questão da informação, aqui, é importante para se atenuar a<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste. Consigne-se que po<strong>de</strong> ser encontrada <strong>de</strong>cisão que responsabilizou exclusivamente componente da ca<strong>de</strong>ia<br />

<strong>de</strong> consumo – no caso, o comerciante – por não ter atendi<strong>do</strong> à clara convocação <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res para a troca <strong>de</strong> produtos:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Fato <strong>do</strong> produto. Ingestão <strong>de</strong> produto (toddynho) que resultou em problemas estomacais. Recall publica<strong>do</strong> para a<br />

substituição <strong>do</strong> produto, não atendi<strong>do</strong> pelo supermerca<strong>do</strong>, o qual possui responsabilida<strong>de</strong> objetiva. Nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> presente.<br />

Dano moral in re ipsa. Lesão à saú<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Dever <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Dano material representa<strong>do</strong> pelas <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> aquisição<br />

<strong>do</strong> produto e gastos com atendimento. Sentença <strong>de</strong> improcedência reformada. Deram provimento ao recurso” (TJRS – Recurso<br />

Cível 71001416346, Porto Alegre – Primeira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Heleno Tregnago Saraiva – j. 15.05.2008 – DOERS<br />

20.05.2008, p. 106).<br />

Ora, se o consumi<strong>do</strong>r não foi <strong>de</strong>vidamente informa<strong>do</strong> – pois os meios <strong>de</strong> comunicação da convocação foram insuficientes ou<br />

equivoca<strong>do</strong>s –, a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r será integral, pela soma da colocação <strong>de</strong> um produto perigoso no merca<strong>do</strong> com a<br />

falha na informação. Com base em norma que consta da Lei 8.078/1990, alerte-se que o ônus da prova a respeito da comunicação<br />

cabe ao fornece<strong>do</strong>r (art. 38).<br />

Temática ainda mais complicada está relacionada à hipótese em que o consumi<strong>do</strong>r é <strong>de</strong>vidamente comunica<strong>do</strong> <strong>do</strong> recall, o que<br />

é prova<strong>do</strong> pelo fornece<strong>do</strong>r ou <strong>de</strong>corre das circunstâncias e <strong>do</strong> bom-senso, mas não o aten<strong>de</strong>, vin<strong>do</strong> a ocorrer o infortúnio.<br />

A título <strong>de</strong> exemplo, uma monta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> veículos convoca os consumi<strong>do</strong>res <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> mo<strong>de</strong>lo popular a fazerem um<br />

reforço no engate <strong>do</strong> cinto <strong>de</strong> segurança que, segun<strong>do</strong> estu<strong>do</strong>s técnico-científicos, apresenta riscos <strong>de</strong> se soltar em casos <strong>de</strong> freadas<br />

bruscas. Diante da enorme quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> automóvel, o recall é anuncia<strong>do</strong> na TV aberta, em jornais, no rádio e na<br />

internet. Aten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ao seu <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar, a monta<strong>do</strong>ra envia cartas para to<strong>do</strong>s os seus consumi<strong>do</strong>res com aviso <strong>de</strong><br />

recebimento e mensagens eletrônicas com certificação <strong>de</strong> leitura pelos <strong>de</strong>stinatários. Determina<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, que foi<br />

<strong>de</strong>vidamente avisa<strong>do</strong> <strong>do</strong> recall, conforme prova que po<strong>de</strong> ser construída pelo fornece<strong>do</strong>r, resolve não aten<strong>de</strong>r à convocação,<br />

assumin<strong>do</strong> os riscos <strong>de</strong> utilizar o veículo problemático. Em certa ocasião, o consumi<strong>do</strong>r, ao dirigir o seu veículo, freia<br />

bruscamente, e o cinto <strong>de</strong> segurança não consegue segurar o impacto, vin<strong>do</strong> o motorista a chocar o seu rosto contra o para-brisa. A<br />

colisão lhe causa danos materiais, morais e estéticos, o que faz a vítima ingressar com ação in<strong>de</strong>nizatória em face <strong>do</strong> fabricante <strong>do</strong><br />

veículo, pela presença <strong>do</strong> fato <strong>do</strong> produto (art. 12 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r).<br />

In casu, não se po<strong>de</strong> afastar o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar <strong>do</strong> fabricante, presente o <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> produto coloca<strong>do</strong> em circulação.<br />

Entretanto, a vítima, ao não aten<strong>de</strong>r o recall, assumiu o risco, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> a in<strong>de</strong>nização ser reduzida razoavelmente, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com as<br />

circunstâncias. Inci<strong>de</strong>m, na espécie, as normas <strong>do</strong>s arts. 944 e 945 <strong>do</strong> Código Civil e a teoria <strong>do</strong> risco concorrente.<br />

Verifica-se, <strong>de</strong>sse mo<strong>do</strong>, que o risco assumi<strong>do</strong> é a construção mais a<strong>de</strong>quada, uma vez que não se po<strong>de</strong> atribuir culpa<br />

exclusiva ao consumi<strong>do</strong>r ao não aten<strong>de</strong>r a convocação. Isso porque não se po<strong>de</strong> falar em <strong>de</strong>srespeito a um <strong>de</strong>ver principal legal ou<br />

contratual. Em verda<strong>de</strong>, é até possível alegar violação <strong>de</strong> um <strong>de</strong>ver anexo por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, no caso, <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong><br />

colaboração ou cooperação. Porém, a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> risco concorrente tem melhor encaixe no tipo <strong>de</strong>scrito. Na concreção exposta,<br />

enten<strong>de</strong>-se que o percentual <strong>de</strong> risco é maior por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r e em menor montante por parte <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, que procurou<br />

minorar as consequências da exposição <strong>de</strong> outrem ao perigo. Po<strong>de</strong>-se ainda trabalhar com algumas variações, tais como 70% <strong>de</strong><br />

risco <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r e 30% <strong>de</strong> risco <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. Exemplifican<strong>do</strong>, se a vítima pleiteia no problema <strong>de</strong>scrito reparação integral <strong>de</strong><br />

R$ 10.000,00 (<strong>de</strong>z mil reais), esta será fixada em valor próximo a R$ 3.000,00 (três mil reais). Evi<strong>de</strong>ncie-se, mais uma vez, que<br />

não se po<strong>de</strong> afirmar que a conclusão pela teoria <strong>do</strong> risco concorrente é contrária aos interesses <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, pois alguns<br />

julga<strong>do</strong>res po<strong>de</strong>riam apontar que, na problematização ora <strong>de</strong>scrita, houve culpa exclusiva da vítima ou <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Como últimas reflexões <strong>de</strong>ste capítulo, nota-se que a tese da concausalida<strong>de</strong> pelos riscos <strong>de</strong>monstra ter efetiva aplicação<br />

prática. Mais <strong>do</strong> que isso, mostra ser razoável e equânime, na linha <strong>do</strong> preceito máximo <strong>de</strong> justiça <strong>de</strong> “dar a cada um o que é seu”.<br />

Valem as palavras no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que não se po<strong>de</strong> atribuir a uma das partes, em hipóteses tais, o papel isola<strong>do</strong> <strong>de</strong> único causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong><br />

evento danoso, o que acaba sen<strong>do</strong> uma visão maniqueísta e superada, a qual procura dividir a responsabilida<strong>de</strong> civil em heróis e<br />

vilões. Sintetizan<strong>do</strong>, no caso <strong>do</strong> recall, é possível dividir as responsabilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com as contribuições <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s no<br />

caso concreto, notadamente pelos riscos assumi<strong>do</strong>s.


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1 AZEVEDO, Álvaro Villaça. Teoria geral das obrigações. Responsabilida<strong>de</strong> civil. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 273. Expõe o professor<br />

Villaça que a palavra tem origem em um jogo <strong>de</strong> perguntas e respostas que eram feitas quan<strong>do</strong> da constituição <strong>do</strong>s negócios<br />

“spon<strong>de</strong>sne mihi dare centum? Spon<strong>de</strong>o” (Prometes me dar um cento? Prometo).<br />

ANTUNES VARELA, João <strong>de</strong> Matos. Das obrigações em geral. 10. ed. 3. reimpr. Coimbra: Coimbra Editora, 2005. v. I, p. 877.<br />

NORONHA, Fernan<strong>do</strong>. <strong>Direito</strong> das obrigações. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 1, p. 432-433.<br />

MARTINS-COSTA, Judith. Do inadimplemento das obrigações. In: TEIXEIRA, Sálvio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong> (Coord.). Comentários ao novo Código<br />

Civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2003. v. V, t. II, p. 97.<br />

A tentativa <strong>de</strong> unificação da responsabilida<strong>de</strong> civil pelo CDC é apresentada, entre outros, por: CALIXTO, Marcelo Junqueira. A culpa na<br />

responsabilida<strong>de</strong> civil. Estrutura e função. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 2008. p. 81; SANSEVERINO, Paulo <strong>de</strong> Tarso Vieira. Responsabilida<strong>de</strong><br />

civil no Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.<br />

Sobre o tema <strong>do</strong>s contratos coliga<strong>do</strong>s: HIRONAKA, Giselda Maria Fernan<strong>de</strong>s Novaes. Contratos atípicos e contratos coliga<strong>do</strong>s:<br />

características fundamentais e <strong>de</strong>ssemelhança. <strong>Direito</strong> civil: estu<strong>do</strong>s. Belo Horizonte: Del Rey, 2000. p. 135; LEONARDO, Rodrigo<br />

Xavier. Re<strong>de</strong>s contratuais no merca<strong>do</strong> habitacional. São Paulo: Saraiva, 2003; MARINO, Francisco Paulo <strong>de</strong> Crescenzo. Contratos<br />

coliga<strong>do</strong>s no direito brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2009.<br />

FILOMENO, José Geral<strong>do</strong> Brito. Manual <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 171.<br />

FILOMENO, José Geral<strong>do</strong> Brito. Manual <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 171.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 230-231.<br />

DENARI, Zelmo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária,<br />

2004. p. 196-197.<br />

MONTEIRO, Washington <strong>de</strong> Barros. Curso <strong>de</strong> direito civil. Atual. por Carlos Alberto Dabus Maluf. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 4:<br />

<strong>Direito</strong> das obrigações. 1ª parte, p. 56.<br />

MONTEIRO, Washington <strong>de</strong> Barros. Curso <strong>de</strong> direito civil. Atual. por Carlos Alberto Dabus Maluf. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 4:<br />

<strong>Direito</strong> das obrigações. 1ª parte, p. 56.<br />

LIMONGI FRANÇA, Rubens. Enciclopédia Saraiva <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>. São Paulo: Saraiva, 1977. t. 55, p. 291-292.<br />

Por to<strong>do</strong>s, entre os civilistas: DINIZ, Maria Helena. Curso <strong>de</strong> direito civil brasileiro. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. v. 2, p. 206-207;<br />

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Ro<strong>do</strong>lfo. Novo curso <strong>de</strong> direito civil. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. II: <strong>Direito</strong> das<br />

obrigações, p. 96-97. Os últimos autores falam em culpa presumida.<br />

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Ro<strong>do</strong>lfo. Novo Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. v. III: Responsabilida<strong>de</strong><br />

civil. p. 249.<br />

HIRONAKA, Giselda Maria Fernan<strong>de</strong>s Novaes. Cirurgia plástica e responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> médico: para uma análise jurídica da culpa <strong>do</strong><br />

cirurgião plástico. Disponível em: . Acesso em: 7 abr. 2009. Trata-se <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> <strong>de</strong> palestra proferida na<br />

VII Reunião Anual <strong>do</strong>s Dermatologistas <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> São Paulo, na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Santos (SP), em 30 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 2002, promovida<br />

pela Socieda<strong>de</strong> Brasileira <strong>de</strong> Dermatologia – Regional São Paulo.<br />

LÔBO, Paulo. Obrigações. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 39.<br />

RENTERIA, Pablo. Obrigações <strong>de</strong> meios e <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>. Análise crítica. São Paulo: GEN/Méto<strong>do</strong>, 2011.<br />

GODOY, Claudio Luiz Bueno <strong>de</strong>. Código Civil comenta<strong>do</strong>. Coord. Ministro Cesar Peluzo. São Paulo: Manole, 2007. p. 766-767.<br />

Veja-se, por to<strong>do</strong>s: RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r,. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.<br />

171-234; MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIM, Antônio Herman V.; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed.<br />

São Paulo: RT, 2010. p. 137-210; GARCIA, Leonar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Código Comenta<strong>do</strong> e Jurisprudência. 3. ed.<br />

Niterói: Impetus, 2007. p. 54-95; GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Ro<strong>do</strong>lfo. Novo Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil. Responsabilida<strong>de</strong><br />

civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 309-322. v. III.<br />

GARCIA, Leonar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Código comenta<strong>do</strong> e jurisprudência. 5. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Impetus, 2009. p.<br />

107-124.<br />

A criação <strong>do</strong> exemplo está em: RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

Saraiva, 2007. p. 238-239.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 239.<br />

A solidarieda<strong>de</strong> passiva legal como regra consumerista á observada por autores como Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery<br />

(Leis civis comentadas. São Paulo: RT, 2006. p. 193); Luiz Antonio Rizzatto Nunes (Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3.<br />

ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 159); Sérgio Cavalieri Filho (Programa <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 248);<br />

Leonar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros Garcia (<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Código Comenta<strong>do</strong> e Jurisprudência. 3. ed. Niterói: Impetus, 2007. p. 47-48);<br />

Claudia Lima Marques, Antonio Herman Benjamim e Bruno Miragem (Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, cit., p. 223).<br />

Os últimos foram cita<strong>do</strong>s no Capítulo 2 <strong>de</strong>ste livro.


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RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 199.<br />

Vejamos as fontes: DENARI, Zelmo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro:<br />

Forense Universitária, 2004. p. 192; GARCIA, Leonar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Código comenta<strong>do</strong> e jurisprudência. 3.<br />

ed. Niterói: Impetus, 2007. p. 47-48; TEPEDINO, Gustavo. A responsabilida<strong>de</strong> civil por aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> consumo na ótica civilconstitucional.<br />

Temas <strong>de</strong> direito civil. 3. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 2004. p. 275; DINIZ, Maria Helena. Curso <strong>de</strong> direito civil brasileiro.<br />

21. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 7: Responsabilida<strong>de</strong> Civil. p. 452); CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil. 7.<br />

ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 467; LISBOA, Roberto Senise. Responsabilida<strong>de</strong> civil nas relações <strong>de</strong> consumo. São Paulo: RT, 2001;<br />

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Ro<strong>do</strong>lfo. Novo curso <strong>de</strong> direito civil. Responsabilida<strong>de</strong> civil. vol. III, p. 310; SCHMITT,<br />

Cristiano Heineck. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2010. p. 149-151; KHOURI, Paulo R. Roque. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 161; SANSEVERINO, Paulo <strong>de</strong> Tarso Vieira. Responsabilida<strong>de</strong> civil no Código <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r e a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 176-177; GONÇALVES. Carlos Roberto. <strong>Direito</strong> civil brasileiro. 2.<br />

ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. IV: Responsabilida<strong>de</strong> civil. p. 262; VENOSA, Sílvio <strong>de</strong> Salvo. <strong>Direito</strong> Civil. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. v.<br />

IV: Responsabilida<strong>de</strong> civil. p. 219.<br />

MARQUES, Claudia; BENJAMIN, Antonio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 412. De toda sorte, insta verificar que Bruno Miragem, em obra solitária, sustenta ser a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> comerciante<br />

subsidiária ou supletiva no fato <strong>do</strong> produto (MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 395).<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 199.<br />

Essa já era a conclusão <strong>do</strong> coautor <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção <strong>Neves</strong>, ao discorrer, em sua tese <strong>de</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> <strong>de</strong>fendida na<br />

Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, sobre a possibilida<strong>de</strong> das ações probatórias autônomas (NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Ações<br />

probatórias autônomas. São Paulo: Saraiva, 2008. Coleção Theotônio Negrão).<br />

SIMÃO, José Fernan<strong>do</strong>. Vícios <strong>do</strong> produto no novo Código Civil e no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Atlas, 2003. p. 102.<br />

BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe; MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 183-184.<br />

Nessa linha, veja-se: BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe; MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 185.<br />

GARCIA, Leonar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Código Civil Comenta<strong>do</strong> e Jurisprudência. 3. ed. Niterói: Impetus, 2007. p. 100.<br />

GARCIA, Leonar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Código Civil Comenta<strong>do</strong> e Jurisprudência. 3. ed. Niterói: Impetus, 2007. p. 101.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 361.<br />

SIMÃO, José Fernan<strong>do</strong>. Vícios <strong>do</strong> produto. Questões controvertidas. In: MORATO, Antonio Carlos; NÉRI, Paulo <strong>de</strong> Tarso (orgs.). 20 anos<br />

<strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Estu<strong>do</strong>s em homenagem ao Professor José Geral<strong>do</strong> Brito Filomeno. São Paulo: Atlas, 2010. p.<br />

410.<br />

A questão está exposta em: TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. <strong>Direito</strong> Civil. 6. ed. São Paulo: GEN/Méto<strong>do</strong>, 2011. v. 3: Teoria geral <strong>do</strong>s contratos e<br />

contratos em espécie, e TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. <strong>Direito</strong> Civil. Volume Único. São Paulo: GEN/Méto<strong>do</strong>, 2011.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIM, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 594.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, por to<strong>do</strong>s: MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIM, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 570.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 981.<br />

MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 366-370.<br />

MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 367.<br />

MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 369.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 422.<br />

LISBOA, Roberto Senise. Responsabilida<strong>de</strong> civil nas relações <strong>de</strong> consumo. São Paulo: RT, 2001. p. 241.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 471.<br />

DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 630.<br />

TEPEDINO, Gustavo. Liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolha, <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar, <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> produto e boa-fé objetiva nas ações <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização contra os<br />

fabricantes <strong>de</strong> cigarros. In: LOPEZ, Teresa Ancona (Coord.). Estu<strong>do</strong>s e pareceres sobre livre-arbítrio, responsabilida<strong>de</strong> e produto <strong>de</strong> risco<br />

inerente. O paradigma <strong>do</strong> tabaco. Aspectos civis e processuais. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 2009. p. 237.<br />

MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 397.<br />

A expressão “<strong>de</strong>mandas frívolas” é <strong>de</strong> An<strong>de</strong>rson Schreiber, que abor<strong>do</strong>u muito bem o tema em sua notável obra, fruto <strong>de</strong> tese <strong>de</strong>


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<strong>do</strong>utoramento <strong>de</strong>fendida na Itália (SCHREIBER, An<strong>de</strong>rson. Novos paradigmas da responsabilida<strong>de</strong> civil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2011, p.<br />

187-215). Logo ao início <strong>do</strong> capítulo é citada expressão da obra <strong>de</strong> Tim Maia: “Não quero dinheiro”.<br />

FROTA, Pablo Malheiros da Cunha. Responsabilida<strong>de</strong> civil por danos. Imputação e nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>. Curitiba: Juruá, 2014.<br />

FROTA, Pablo Malheiros da Cunha. Responsabilida<strong>de</strong> civil por danos. Imputação e nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>. Curitiba: Juruá, 2014. p. 225.<br />

GUGLINSKI, Vitor Vilela. Danos morais pela perda <strong>do</strong> tempo útil: uma nova modalida<strong>de</strong>. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3237, 12<br />

maio 2012. Disponível em: . Acesso em: 21 set. 2013.<br />

A construção está baseada, entre outros, nas i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> Maria Helena Diniz, que assim conceitua a causalida<strong>de</strong>: “1. Filosofia <strong>do</strong> direito. a)<br />

Relação entre uma causa e um efeito; b) qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produzir efeito; c) princípio em razão <strong>do</strong> qual os efeitos se ligam às causas. 2.<br />

<strong>Direito</strong> civil e direito penal. Um <strong>do</strong>s elementos indispensáveis para a configuração <strong>do</strong> ilícito ou <strong>do</strong> <strong>de</strong>lito, pois as responsabilida<strong>de</strong>s<br />

civil e penal não po<strong>de</strong>rão existir sem a relação ou o nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> entre o dano ou resulta<strong>do</strong> e o comportamento <strong>do</strong> agente.<br />

Deveras, consi<strong>de</strong>ra-se causa a ação ou omissão sem a qual o resulta<strong>do</strong> não teria ocorri<strong>do</strong>” (DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. 2.<br />

ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. 1, p. 641).<br />

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Atlas, 2008. p. 255.<br />

Nessa linha <strong>de</strong> pensamento: Claudia Lima Marques, Antonio Herman V. Benjamim e Bruno Miragem (Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 383); Rizzatto Nunes (Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>. 3. ed. São Paulo:<br />

Saraiva, 2007. p. 195); Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery (Leis civis comentadas. São Paulo: RT, 2006. p. 195); e Roberto<br />

Senise Lisboa (Responsabilida<strong>de</strong> civil nas relações <strong>de</strong> consumo. São Paulo: RT, 2001. p. 270).<br />

SANSEVERINO, Paulo <strong>de</strong> Tarso Vieira. Responsabilida<strong>de</strong> civil no Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2007. p. 312.<br />

GOMES, Orlan<strong>do</strong>. Obrigações. Atual. Humberto Theo<strong>do</strong>ro Júnior. 11. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 1997. p. 148.<br />

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 65; GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA<br />

FILHO, Ro<strong>do</strong>lfo. Novo curso <strong>de</strong> direito civil. 9. ed. v. III. Responsabilida<strong>de</strong> civil. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 152-153.<br />

DENARI, Zelmo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto, cit., p. 190.<br />

DENARI, Zelmo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto, cit., p. 195.<br />

Sobre o tema, <strong>do</strong> risco <strong>do</strong> empreendimento, entre os italianos: ALPA, Gui<strong>do</strong>; BESSONE, Mario. La responsabilità civile. A cura di Pietro<br />

Maria Putti. 3. ed. Milano: Giuffrè, 2001; ALPA, Gui<strong>do</strong>; BESSONE, Mario. Trattato di diritto privato. Diretto da Pietro Rescigno. Torino:<br />

UTET, Ristampa, 1987. t. 6: Obbligazione e contratti.<br />

ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1980. p. 314-315.<br />

SCHREIBER, An<strong>de</strong>rson. Flexibilização <strong>do</strong> nexo causal em relações <strong>de</strong> consumo. In: MARTINS, Guilherme Magalhães (coord.). Temas <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 38-39.<br />

Da <strong>do</strong>utrina nacional, po<strong>de</strong>m ser cita<strong>do</strong>s como segui<strong>do</strong>res da divisão: CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil. 7.<br />

ed. São Paulo: Atlas, 2007. VENOSA, Sílvio <strong>de</strong> Salvo. <strong>Direito</strong> civil. Responsabilida<strong>de</strong> civil. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. IV, p. 272-273:<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. <strong>Direito</strong> civil brasileiro. Responsabilida<strong>de</strong> civil. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. v. IV, p. 287; GAGLIANO,<br />

Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Ro<strong>do</strong>lfo. Novo curso <strong>de</strong> direito civil. Responsabilida<strong>de</strong> civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. v. III, p.<br />

156-157; GARCIA, Leonar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. Niterói: Impetus, 2007. p. 57-58.<br />

Essa revisão conceitual da responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> consta <strong>de</strong> outra obra, fruto <strong>de</strong> tese <strong>de</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> <strong>de</strong>fendida na<br />

Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo: TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. Responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva e risco. A teoria <strong>do</strong> risco concorrente. São Paulo: Méto<strong>do</strong>,<br />

2011.<br />

CALIXTO, Marcelo Junqueira. A responsabilida<strong>de</strong> civil pelo fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos pelos riscos <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento. Rio <strong>de</strong> Janeiro:<br />

Renovar, 2004. p. 176.<br />

LEITÃO, Luís Manuel Teles <strong>de</strong> Menezes. <strong>Direito</strong> das obrigações. 5. ed. Coimbra: Almedina, 2006. v. I, p. 392.<br />

Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Anteprojecto. Comissão <strong>do</strong> Código Consumi<strong>do</strong>r. Ministério da Economia e da Inovação. Secretaria <strong>de</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

Comércio, Serviços e Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Lisboa: Instituto <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, 2006. p. 174.<br />

Além <strong>de</strong> Pinto Monteiro, são integrantes da Comissão: professor Doutor Carlos Ferreira <strong>de</strong> Almeida (Universida<strong>de</strong> Nova <strong>de</strong> Lisboa),<br />

professor Doutor Paulo Car<strong>do</strong>so Correia Mota Pinto (Juiz Conselheiro <strong>do</strong> Tribunal Constitucional e professor da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Coimbra), Dr. Manuel Tomé Soares Gomes (Desembarga<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Relação <strong>de</strong> Lisboa), Maria Manuela Flores Ferreira<br />

(Procura<strong>do</strong>ra-geral <strong>do</strong> Tribunal Central <strong>de</strong> Lisboa), Mestre Mário Paulo da Silva Tenreiro (Chefe da Unida<strong>de</strong> da Comissão Europeia,<br />

em Bruxelas, sobre política <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res), professor José Eduar<strong>do</strong> Tavares <strong>de</strong> Souza (Universida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Porto), professor Doutor<br />

Augusto Silva Dias (Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Lisboa e Universida<strong>de</strong> Lusíada) e professora Doutora Maria da Glória Ferreira Pinto Dias Garcia<br />

(Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Lisboa e Universida<strong>de</strong> Católica Portuguesa).<br />

ALMEIDA, Carlos Ferreira <strong>de</strong>. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumo. Coimbra: Almedina, 2005. p. 173.<br />

ALPA, Gui<strong>do</strong>. Il diritto <strong>de</strong>i consumatori. 3. ed. Roma: Laterza, 2002. p. 404.<br />

CHINELATO, Silmara Juny <strong>de</strong> Abreu; MORATO, Antonio Carlos. O risco <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento nas relações <strong>de</strong> consumo. In: NERY, Rosa


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Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>; DONNINI, Rogério. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Estu<strong>do</strong>s em homenagem ao professor Rui Geral<strong>do</strong> Camargo Viana. São<br />

Paulo: RT, 2009. p. 57-58.<br />

MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 392.<br />

TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. Responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva e risco. A teoria <strong>do</strong> risco concorrente. São Paulo: GEN/Méto<strong>do</strong>, 2011.<br />

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, São Paulo: Atlas, 2008. p. 254.<br />

MULHOLLAND, Caitlin Sampaio. A responsabilida<strong>de</strong> civil por presunção <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>. Rio <strong>de</strong> Janeiro: GZ, 2009. p. 24.<br />

SANSEVERINO, Paulo <strong>de</strong> Tarso Vieira. In<strong>de</strong>nização e equida<strong>de</strong> no Código Civil <strong>de</strong> 2002. In: CARVALHO NETO, Inácio <strong>de</strong> (Coord.). Novos<br />

direitos. Após seis anos <strong>de</strong> vigência <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002. Curitiba: Juruá, 2009. p. 103.<br />

SANSEVERINO, Paulo <strong>de</strong> Tarso Vieira. In<strong>de</strong>nização e equida<strong>de</strong> no Código Civil <strong>de</strong> 2002, cit., p. 103-104.<br />

Estu<strong>do</strong> retira<strong>do</strong> <strong>de</strong>: TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. Responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva e risco. A teoria <strong>do</strong> risco concorrente. São Paulo: GEN/Méto<strong>do</strong>, 2011.<br />

Resolveu-se repetir aqui a publicação <strong>do</strong> estu<strong>do</strong>, diante da amplitu<strong>de</strong> maior <strong>de</strong>sta obra quanto ao público jurídico, como um<br />

manual.<br />

REVISTA VEJA. São Paulo: Abril, Edição 2.140, ano 42, n. 47, 25 nov. 2009, p. 163-166. Reportagem assinada pelo jornalista André Petry,<br />

<strong>de</strong> Nova York, Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s da América.<br />

REVISTA VEJA. São Paulo: Abril, Edição 2.140, ano 42, n. 47, 25 nov. 2009, p. 163.<br />

BOEIRA, Sérgio Luís. Atrás da cortina <strong>de</strong> fumaça. Tabaco, tabagismo e meio ambiente. Estratégias da indústria e dilemas da crítica. Tese<br />

– (Doutora<strong>do</strong>) Itajaí: Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Santa Catarina, 2002. Trata-se <strong>de</strong> tese <strong>de</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> da área <strong>de</strong> ciências humanas,<br />

<strong>de</strong>fendida perante a Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Santa Catarina.<br />

BOEIRA, Sérgio Luís. Atrás da cortina <strong>de</strong> fumaça. Tabaco, tabagismo e meio ambiente. Estratégias da indústria e dilemas da crítica, cit.,<br />

p. 48.<br />

BOEIRA, Sérgio Luís. Atrás da cortina <strong>de</strong> fumaça. Tabaco, tabagismo e meio ambiente. Estratégias da indústria e dilemas da crítica, cit.,<br />

p. 51.<br />

BOEIRA, Sérgio Luís. Atrás da cortina <strong>de</strong> fumaça. Tabaco, tabagismo e meio ambiente. Estratégias da indústria e dilemas da crítica, cit.,<br />

p. 56.<br />

BOEIRA, Sérgio Luís. Atrás da cortina <strong>de</strong> fumaça. Tabaco, tabagismo e meio ambiente. Estratégias da indústria e dilemas da crítica, cit.,<br />

p. 426.<br />

BOEIRA, Sérgio Luís. Atrás da cortina <strong>de</strong> fumaça. Tabaco, tabagismo e meio ambiente. Estratégias da indústria e dilemas da crítica, cit.,<br />

p. 79-91.<br />

BOEIRA, Sérgio Luís. Atrás da cortina <strong>de</strong> fumaça. Tabaco, tabagismo e meio ambiente. Estratégias da indústria e dilemas da crítica, cit.,<br />

p. 80.<br />

BOEIRA, Sérgio Luís. Atrás da cortina <strong>de</strong> fumaça. Tabaco, tabagismo e meio ambiente. Estratégias da indústria e dilemas da crítica, cit.,<br />

p. 82.<br />

BOEIRA, Sérgio Luís. Atrás da cortina <strong>de</strong> fumaça. Tabaco, tabagismo e meio ambiente. Estratégias da indústria e dilemas da crítica, cit.,<br />

p. 86.<br />

BOEIRA, Sérgio Luís. Atrás da cortina <strong>de</strong> fumaça. Tabaco, tabagismo e meio ambiente. Estratégias da indústria e dilemas da crítica, cit.,<br />

p. 86.<br />

Imagem disponível em: . Acesso em: 18 <strong>de</strong>z. 2009.<br />

LOPEZ, Teresa Ancona. Estu<strong>do</strong>s e pareceres sobre livre-arbítrio, responsabilida<strong>de</strong> e produto <strong>de</strong> risco inerente. O paradigma <strong>do</strong> tabaco.<br />

Aspectos civis e processuais. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 2009.<br />

Enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> pela ausência <strong>de</strong> nexo causal na questão relativa aos danos <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> uso <strong>do</strong> cigarro, ver, naquela obra coletiva, as<br />

posições <strong>de</strong> Gustavo Tepedino, José Carlos Moreira Alves, Galeno Lacerda e Nelson Nery Jr. (LOPEZ, Teresa Ancona. Estu<strong>do</strong>s e<br />

pareceres sobre livre-arbítrio, responsabilida<strong>de</strong> e produto <strong>de</strong> risco inerente. O paradigma <strong>do</strong> tabaco. Aspectos civis e processuais. Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro: Renovar, 2009).<br />

Destaque-se que nenhum <strong>do</strong>s pareceres e estu<strong>do</strong>s constantes da obra coletiva que se analisa enfrentou a questão da <strong>do</strong>ença <strong>de</strong><br />

Buerger, sen<strong>do</strong> os artigos e pareceres direciona<strong>do</strong>s somente para os mais diversos tipos <strong>de</strong> câncer. Nota-se, contu<strong>do</strong>, que a <strong>de</strong>cisão<br />

<strong>de</strong> improcedência publicada no Informativo n. 436 <strong>do</strong> STJ menciona tal <strong>do</strong>ença.<br />

Consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> inexistente o <strong>de</strong>feito no cigarro, com o principal argumento <strong>de</strong> que o produto perigoso não é <strong>de</strong>feituoso, naquela obra<br />

coletiva; Adroal<strong>do</strong> Furta<strong>do</strong> Fabrício, Álvaro Villaça Azeve<strong>do</strong>, Galeno Lacerda, Nelson Nery Jr., Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar Jr. e Teresa<br />

Ancona Lopez.<br />

ALVIM, Arruda; ALVIM, Thereza; ALVIM, Eduar<strong>do</strong> Arruda; MARINS, James. Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong>. 2. ed., 2. tir. São Paulo: RT,<br />

1995. p. 103.<br />

ALVIM, Arruda; ALVIM, Thereza; ALVIM, Eduar<strong>do</strong> Arruda; MARINS, James. Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong>, cit., p. 103.


100<br />

101<br />

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109<br />

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111<br />

112<br />

MORAES, Carlos Alexandre. Responsabilida<strong>de</strong> civil das empresas tabagistas. Curitiba: Juruá, 2009. p. 165.<br />

Sobre essa presunção <strong>do</strong> nexo causal na questão <strong>do</strong> cigarro, com a citação <strong>de</strong> outras <strong>de</strong>cisões jurispru<strong>de</strong>nciais: MULHOLLAND, Caitlin<br />

Sampaio. A responsabilida<strong>de</strong> civil por presunção <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>, cit., p. 248-257.<br />

Argumentan<strong>do</strong> pela licitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> ato <strong>de</strong> ven<strong>de</strong>r <strong>de</strong> cigarros na obra coletiva abordada: Adroal<strong>do</strong> Furta<strong>do</strong> Fabrício, Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

Aguiar Jr. e Teresa Ancona Lopez.<br />

Conforme o art. 188, I, <strong>do</strong> Código Civil, a legítima <strong>de</strong>fesa não constitui ato ilícito. Concluin<strong>do</strong> pelo <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar, presente a<br />

legítima <strong>de</strong>fesa putativa: “Civil. Dano moral. Legítima <strong>de</strong>fesa putativa. A legítima <strong>de</strong>fesa putativa supõe negligência na apreciação<br />

<strong>do</strong>s fatos, e por isso não exclui a responsabilida<strong>de</strong> civil pelos danos que <strong>de</strong>la <strong>de</strong>corram. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (STJ –<br />

REsp 513.891/RJ – Terceira Turma – Rel. Min. Ari Pargendler – j. 20.03.2007 – DJ 16.04.2007, p. 181).<br />

MARQUES, Claudia Lima. Violação <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> boa-fé, corretamente, nos atos negociais omissivos afetan<strong>do</strong> o direito/liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

escolha. Nexo causal entre a falha/<strong>de</strong>feito <strong>de</strong> informação e <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> nos produtos <strong>de</strong> tabaco e o dano final morte.<br />

Responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fabricante <strong>do</strong> produto, direito a ressarcimento <strong>do</strong>s danos materiais e morais, sejam preventivos, reparatórios<br />

ou satisfatórios. Revista <strong>do</strong>s Tribunais, São Paulo: RT, n. 835, p. 74-133, 2005.<br />

DELFINO, Lúcio. Responsabilida<strong>de</strong> civil e tabagismo. Curitiba: Juruá, 2008. p. 265-325.<br />

Excluin<strong>do</strong> a responsabilida<strong>de</strong> das empresas pela questão da publicida<strong>de</strong> que não po<strong>de</strong> ser tida como enganosa ou abusiva, naquela<br />

obra coletiva: Fábio Ulhoa Coelho, Adroal<strong>do</strong> Furta<strong>do</strong> Fabrício e Gustavo Tepedino.<br />

MARTINS-COSTA, Judith. Ação in<strong>de</strong>nizatória. Dever <strong>de</strong> informar <strong>do</strong> fabricante sobre os riscos <strong>do</strong> tabagismo. In: LOPEZ, Teresa Ancona<br />

(Coord.). Estu<strong>do</strong>s e pareceres sobre livre-arbítrio, responsabilida<strong>de</strong> e produto <strong>de</strong> risco inerente. O paradigma <strong>do</strong> tabaco. Aspectos civis e<br />

processuais. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 2009. p. 284.<br />

MARTINS-COSTA, Judith. Ação in<strong>de</strong>nizatória. Dever <strong>de</strong> informar <strong>do</strong> fabricante sobre os riscos <strong>do</strong> tabagismo, cit., p. 289.<br />

Discorren<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma profunda sobre o livre-arbítrio e a liberda<strong>de</strong> <strong>do</strong> fumante, em uma visão liberal, naquela obra coletiva: Teresa<br />

Ancona Lopez, Álvaro Villaça Azeve<strong>do</strong>, Galeno Lacerda, Nelson Nery Jr., Maria Celina Bodin <strong>de</strong> Moraes e René Ariel Dotti.<br />

Na citada obra coletiva, enquadran<strong>do</strong> o fumante que pleiteia a in<strong>de</strong>nização na vedação <strong>do</strong> comportamento contraditório que <strong>de</strong>corre<br />

da boa-fé: Teresa Ancona Lopez, Nelson Nery Jr. e Gustavo Tepedino.<br />

Dicionário disponível para os assinantes <strong>do</strong> sítio Universo On-Line em: . Acesso em: 10 <strong>de</strong>z. 2009.<br />

DONNINI, Rogério Ferraz. Responsabilida<strong>de</strong> pós-contratual no Código Civil e no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva,<br />

2004. p. 125.


A PROTEÇÃO CONTRATUAL PELO CÓDIGO DE<br />

DEFESA DO CONSUMIDOR<br />

Sumário: 5.1. O conceito contemporâneo ou pós-mo<strong>de</strong>rno <strong>de</strong> contrato e o <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Os contratos<br />

coliga<strong>do</strong>s e os contratos cativos <strong>de</strong> longa duração – 5.2. A revisão contratual por fato superveniente no Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – 5.3. A função social <strong>do</strong> contrato e a não vinculação das cláusulas <strong>de</strong>sconhecidas e<br />

incompreensíveis (art. 46 <strong>do</strong> CDC). A interpretação mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r (art. 47 <strong>do</strong> CDC) – 5.4. A força<br />

vinculativa <strong>do</strong>s escritos e a boa-fé objetiva nos contratos <strong>de</strong> consumo (art. 48 da Lei 8.078/1990). A aplicação <strong>do</strong>s<br />

conceitos parcelares da boa-fé objetiva: 5.4.1. Supressio e surrectio; 5.4.2. Tu quoque; 5.4.3. Exceptio <strong>do</strong>li; 5.4.4. Venire<br />

contra factum proprium; 5.4.5. Duty to mitigate the loss – 5.5. O direito <strong>de</strong> arrependimento nos contratos <strong>de</strong><br />

consumo (art. 49 da Lei 8.078/1990) – 5.6. A garantia contratual <strong>do</strong> art. 50 da Lei 8.078/1990 – 5.7. As cláusulas<br />

abusivas no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Análise <strong>do</strong> rol exemplificativo <strong>do</strong> art. 51 da Lei 8.078/1990 e suas<br />

<strong>de</strong>corrências: 5.7.1. Cláusulas que impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r por<br />

vícios <strong>de</strong> qualquer natureza <strong>do</strong>s produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição <strong>de</strong> direitos (art. 51, inc. I,<br />

<strong>do</strong> CDC); 5.7.2. Cláusulas que subtraiam ao consumi<strong>do</strong>r a opção <strong>de</strong> reembolso da quantia já paga (art. 51, inc. II, <strong>do</strong><br />

CDC); 5.7.3. Cláusulas que transfiram responsabilida<strong>de</strong>s a terceiros (art. 51, inc. III, <strong>do</strong> CDC); 5.7.4. Cláusulas que<br />

estabeleçam obrigações consi<strong>de</strong>radas iníquas, abusivas, que coloquem o consumi<strong>do</strong>r em <strong>de</strong>svantagem exagerada,<br />

ou que sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equida<strong>de</strong> (art. 51, inc. IV, <strong>do</strong> CDC); 5.7.5. Cláusulas que estabeleçam<br />

inversão <strong>do</strong> ônus da prova em prejuízo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. VI, <strong>do</strong> CDC); 5.7.6. Cláusulas que <strong>de</strong>terminem a<br />

utilização compulsória <strong>de</strong> arbitragem (art. 51, inc. VII, <strong>do</strong> CDC); 5.7.7. Cláusulas que imponham representante para<br />

concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. VIII, <strong>do</strong> CDC); 5.7.8. Cláusulas que <strong>de</strong>ixem<br />

ao fornece<strong>do</strong>r a opção <strong>de</strong> concluir ou não o contrato, embora obrigan<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. IX, <strong>do</strong> CDC);<br />

5.7.9. Cláusulas que permitam ao fornece<strong>do</strong>r, direta ou indiretamente, variação <strong>do</strong> preço <strong>de</strong> maneira unilateral (art.<br />

51, inc. X, <strong>do</strong> CDC); 5.7.10. Cláusulas que autorizem o fornece<strong>do</strong>r a cancelar o contrato unilateralmente, sem que<br />

igual direito seja conferi<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. XI, <strong>do</strong> CDC); 5.7.11. Cláusulas que obriguem o consumi<strong>do</strong>r a<br />

ressarcir os custos <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferi<strong>do</strong> contra o fornece<strong>do</strong>r (art.<br />

51, inc. XII, <strong>do</strong> CDC); 5.7.12. Cláusulas que autorizem o fornece<strong>do</strong>r a modificar unilateralmente o conteú<strong>do</strong> ou a<br />

qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> contrato, após sua celebração (art. 51, inc. XIII, <strong>do</strong> CDC); 5.7.13. Cláusulas que infrinjam ou<br />

possibilitem a violação <strong>de</strong> normas ambientais (art. 51, inc. XIV, <strong>do</strong> CDC); 5.7.14. Cláusulas que estejam em<br />

<strong>de</strong>sacor<strong>do</strong> com o sistema <strong>de</strong> proteção ao consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. XV, <strong>do</strong> CDC); 5.7.15. Cláusulas que possibilitem a<br />

renúncia <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por benfeitorias necessárias (art. 51, inc. XVI, <strong>do</strong> CDC) – 5.8. Os contratos <strong>de</strong><br />

fornecimento <strong>de</strong> crédito na Lei 8.078/1990 (art. 52) e o problema <strong>do</strong> superendividamento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. A<br />

nulida<strong>de</strong> absoluta da cláusula <strong>de</strong> <strong>de</strong>caimento (art. 53) – 5.9. O tratamento <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são pelo art. 54 <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

5.1.<br />

O CONCEITO CONTEMPORÂNEO OU PÓS-MODERNO DE CONTRATO E O<br />

DIREITO DO CONSUMIDOR. OS CONTRATOS COLIGADOS E OS CONTRATOS


CATIVOS DE LONGA DURAÇÃO<br />

Não há exagero algum em se afirmar que o contrato é o instituto mais importante <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, diante <strong>de</strong> sua enorme<br />

interação com o meio social. O mun<strong>do</strong> se transforma e o contrato, como principal expressão negocial ou mais importante negócio<br />

jurídico, transforma-se com ele. Como bem aponta José <strong>de</strong> Oliveira Ascensão, “O contrato é, sem contestação, o mais importante<br />

negócio jurídico. Ao seu la<strong>do</strong>, os negócios jurídicos unilaterais representam uma faixa estreita”.1 Se há o incremento das relações<br />

humanas, também as relações contratuais vão se tornan<strong>do</strong> cada vez mais complexas. O ser humano evolui e se transforma sempre<br />

acompanha<strong>do</strong> pelas manifestações negociais.<br />

Como se extrai <strong>de</strong> uma das últimas obras <strong>de</strong> Caio Mário da Silva Pereira, “sobre o contrato atuam diversas forças convergentes,<br />

das quais cumpre <strong>de</strong>stacar a presença <strong>de</strong> duas, que não seriam as únicas, porém as mais convincentes: a força obrigatória e a<br />

influência <strong>de</strong> fatores <strong>de</strong>terminantes das injunções sociais”. 2 No tocante à influência social, é marcante que o contrato sempre<br />

reproduziu – e continua reproduzin<strong>do</strong> – a realida<strong>de</strong> fática, temporal e espacial, da socieda<strong>de</strong> em que está inseri<strong>do</strong>. E, na realida<strong>de</strong><br />

contemporânea, cumpre <strong>de</strong>stacar que a gran<strong>de</strong> maioria <strong>do</strong>s contratos enquadra-se como contratos <strong>de</strong> consumo.<br />

A interpretação <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a realida<strong>de</strong> social representa uma das manifestações da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> função social <strong>do</strong><br />

contrato, conforme exposto no Capítulo 2 <strong>de</strong>ste livro. Ao la<strong>do</strong> <strong>de</strong>ssa manifestação social principiológica, diante <strong>do</strong>s anseios da<br />

coletivida<strong>de</strong>, surge o fenômeno da complexida<strong>de</strong> contratual. Como três manifestações <strong>de</strong>sse incremento, po<strong>de</strong>m ser cita<strong>do</strong>s os<br />

fenômenos da conexão ou coligação contratual, da contratação eletrônica e <strong>do</strong>s contratos cativos <strong>de</strong> longa duração. Insta verificar,<br />

<strong>de</strong> antemão, que tais figuras, via <strong>de</strong> regra, assumem a configuração <strong>de</strong> contratos <strong>de</strong> consumo, estan<strong>do</strong> regi<strong>do</strong>s pela Lei 8.078/1990.<br />

A respeito <strong>do</strong>s primeiros – <strong>do</strong>s contratos conexos, coliga<strong>do</strong>s ou re<strong>de</strong>s contratuais –, trata-se <strong>de</strong> outra expressão da realida<strong>de</strong><br />

social <strong>do</strong> contrato, proveniente da própria i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> função social <strong>do</strong> contrato. Tais negócios estão interliga<strong>do</strong>s por um ponto ou nexo<br />

<strong>de</strong> convergência, seja direto ou indireto, presentes, por exemplo, nos negócios <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e em negócios imobiliários. O<br />

Projeto <strong>de</strong> Lei 283/2012 preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>fini-los da seguinte forma: “são conexos, coliga<strong>do</strong>s ou inter<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes, entre outros, o<br />

contrato principal <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> produtos e serviços e os acessórios <strong>de</strong> crédito que lhe garantam o financiamento, quan<strong>do</strong> o<br />

fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> crédito: I – recorre aos serviços <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produto ou serviço para a conclusão ou a preparação <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong><br />

crédito; II – oferece o crédito no local da ativida<strong>de</strong> empresarial <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>do</strong> produto ou serviço financia<strong>do</strong> ou on<strong>de</strong> o contrato<br />

principal foi celebra<strong>do</strong>; ou III – menciona no contrato <strong>de</strong> crédito especificamente o produto ou serviço financia<strong>do</strong>, a constituir uma<br />

unida<strong>de</strong> econômica, em especial quan<strong>do</strong> este lhe serve <strong>de</strong> garantia”. A conceituação é interessante, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser utilizada na<br />

atualida<strong>de</strong>.<br />

No que concerne à contratação eletrônica, consigne-se que muitas vezes ela se dá por forma <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s negociais e na maior re<strong>de</strong><br />

que o ser humano já criou, a re<strong>de</strong> mundial <strong>de</strong> computa<strong>do</strong>res, a internet. E não se olvi<strong>de</strong> que, preenchi<strong>do</strong>s os requisitos <strong>do</strong>s arts. 2º e<br />

3º da Lei 8.078/1990, aplica-se aos contratos digitais ou eletrônicos o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, conclusão muito comum<br />

na esfera jurispru<strong>de</strong>ncial, como outrora aponta<strong>do</strong>. Nesse senti<strong>do</strong>, a título <strong>de</strong> exemplo:<br />

“Mútuo. Contratação eletrônica. Prova. Restituição. Negativa <strong>de</strong> contratação <strong>de</strong> empréstimo por meio eletrônico. Incidência <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Responsabilida<strong>de</strong> por fato <strong>do</strong> serviço. Risco <strong>do</strong> empreen<strong>de</strong><strong>do</strong>r. Responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r <strong>do</strong> serviço. Ausência <strong>de</strong> prova da culpa exclusiva <strong>do</strong> titular. Ação proce<strong>de</strong>nte. Negaram provimento” (TJRS – Apelação<br />

Cível 70034623835, São Sebastião <strong>do</strong> Caí – Décima Nona Câmara Cível – Rel. Des. Carlos Rafael <strong>do</strong>s Santos Júnior – j. 16.03.2010<br />

– DJERS 23.03.2010).<br />

“Exibição <strong>de</strong> <strong>do</strong>cumentos. Medida cautelar. Contratos e extratos bancários. Interesse <strong>de</strong> agir. Exibição cabível por serem <strong>do</strong>cumentos<br />

comuns às partes. Não há custo pela exibição e localização <strong>de</strong> <strong>do</strong>cumentos. Alegação <strong>de</strong> impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> exibição, por se tratar <strong>de</strong><br />

contratação eletrônica. Irrelevância. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> ter acesso a todas as cláusulas <strong>do</strong> contrato. Recurso improvi<strong>do</strong>” (TJSP<br />

– Apelação 7258867-3 – Acórdão 3372493, São José <strong>do</strong>s Campos – Décima Sexta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Candi<strong>do</strong><br />

Pedro Alem Júnior – j. 18.11.2008 – DJESP 15.12.2008).<br />

A subsunção <strong>do</strong> CDC não afasta a aplicação <strong>do</strong> CC/2002, em diálogo das fontes, forma correta <strong>de</strong> se interpretar os contratos<br />

eletrônicos ou digitais no plano legislativo. Em relação ao Código Civil, não se po<strong>de</strong> esquecer a regra <strong>do</strong> seu art. 425, segun<strong>do</strong> o<br />

qual é lícita a estipulação <strong>de</strong> contratos atípicos, aqueles sem previsão legal específica, incidin<strong>do</strong> a teoria geral <strong>do</strong>s contratos<br />

consagrada pela codificação geral privada.<br />

Como outra ilustração <strong>de</strong> relevo a respeito da coligação contratual, recente aresto <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, publica<strong>do</strong> no<br />

seu Informativo n. 554, concluiu que “na hipótese <strong>de</strong> rescisão <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> automóvel firma<strong>do</strong> entre<br />

consumi<strong>do</strong>r e concessionária em razão <strong>de</strong> vício <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produto, <strong>de</strong>verá ser também rescindi<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> arrendamento<br />

mercantil <strong>do</strong> veículo <strong>de</strong>feituoso firma<strong>do</strong> com instituição financeira pertencente ao mesmo grupo econômico da monta<strong>do</strong>ra <strong>do</strong><br />

veículo (banco <strong>de</strong> monta<strong>do</strong>ra)”. Ainda nos termos da publicação, “esclareça-se que o microssistema normativo <strong>do</strong> CDC conferiu ao<br />

consumi<strong>do</strong>r o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>mandar contra quaisquer <strong>do</strong>s integrantes da ca<strong>de</strong>ia produtiva com o objetivo <strong>de</strong> alcançar a plena


eparação <strong>de</strong> prejuízos sofri<strong>do</strong>s no curso da relação <strong>de</strong> consumo. A<strong>de</strong>mais, a regra <strong>do</strong> art. 18 <strong>do</strong> CDC, ao regular a responsabilida<strong>de</strong><br />

por vício <strong>do</strong> produto, <strong>de</strong>ixa expressa a responsabilida<strong>de</strong> solidária entre to<strong>do</strong>s os fornece<strong>do</strong>res integrantes da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> consumo.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, observe-se que as regras <strong>do</strong> art. 7º, parágrafo único, e <strong>do</strong> art. 25, § 1º, <strong>do</strong> CDC, estatuem claramente que, ‘haven<strong>do</strong><br />

mais <strong>de</strong> um responsável pela causação <strong>do</strong> dano, to<strong>do</strong>s respon<strong>de</strong>rão pela reparação prevista nesta e nas Seções anteriores’. Ampliase,<br />

assim, o nexo <strong>de</strong> imputação para abranger pessoas que, no sistema tradicional <strong>do</strong> Código Civil, não seriam atingidas, como é o<br />

caso da instituição financeira integrante <strong>do</strong> mesmo grupo econômico da monta<strong>do</strong>ra. Na hipótese ora em análise, não se trata <strong>de</strong><br />

instituição financeira que atua como ‘banco <strong>de</strong> varejo’ – apenas conce<strong>de</strong>n<strong>do</strong> financiamento ao consumi<strong>do</strong>r para aquisição <strong>de</strong> um<br />

veículo novo ou usa<strong>do</strong> sem vinculação direta com o fabricante –, mas sim <strong>de</strong> instituição financeira que atua como ‘banco <strong>de</strong><br />

monta<strong>do</strong>ra’, isto é, que integra o mesmo grupo econômico da monta<strong>do</strong>ra que se beneficia com a venda <strong>de</strong> seus automóveis,<br />

inclusive estipulan<strong>do</strong> juros mais baixos que a média <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> para esse segmento para atrair o público consumi<strong>do</strong>r para os<br />

veículos da sua marca. É evi<strong>de</strong>nte, assim, que o banco da monta<strong>do</strong>ra faz parte da mesma ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> consumo, sen<strong>do</strong> também<br />

responsável pelos vícios ou <strong>de</strong>feitos <strong>do</strong> veículo objeto da negociação” (STJ – REsp 1.379.839/SP – Rel. originária Min. Nancy<br />

Andrighi, Rel. para Acórdão Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 11.11.2014, DJe 15.12.2014). Na opinião <strong>de</strong>ste autor, a<br />

conclusão <strong>do</strong> julgamento é precisa e correta, representante clara aplicação da teoria da aparência e da boa-fé objetiva, bem como da<br />

solidarieda<strong>de</strong> prevista pelo Código Consumerista.<br />

Seguin<strong>do</strong> nas concretizações <strong>do</strong>s contratos coliga<strong>do</strong>s, merece <strong>de</strong>staque a ementa publicada pelo STJ em 2015 pela ferramenta<br />

Jurisprudência em Teses (Edição n. 42), segun<strong>do</strong> a qual “as ban<strong>de</strong>iras ou marcas <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito respon<strong>de</strong>m solidariamente<br />

com os bancos e as administra<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito pelos danos <strong>de</strong>correntes da má prestação <strong>de</strong> serviços”. Com precisão,<br />

conforme se retira <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s arestos que gerou a ementa, “to<strong>do</strong>s os que integram a ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res <strong>do</strong> serviço <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong><br />

crédito respon<strong>de</strong>m solidariamente em caso <strong>de</strong> fato ou vício <strong>do</strong> serviço. Cabe às administra<strong>do</strong>ras <strong>do</strong> cartão, aos estabelecimentos<br />

comerciais, às instituições financeiras emitentes <strong>do</strong> cartão e até mesmo às proprietárias das ban<strong>de</strong>iras, verificar a i<strong>do</strong>neida<strong>de</strong> das<br />

compras realizadas com cartões magnéticos, utilizan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> meios que dificultem ou impossibilitem frau<strong>de</strong>s e transações<br />

realizadas por estranhos em nome <strong>de</strong> seus clientes” (STJ – PET no AgRg no REsp 1.391.029/SP – Terceira Turma – Rel. Ministro<br />

Sidnei Beneti – j. 04.02.2014 – DJe 17.02.2014).<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>, como importante fenômeno da atualida<strong>de</strong>, os contratos cativos <strong>de</strong> longa duração, na feliz expressão <strong>de</strong><br />

Claudia Lima Marques, são aqueles negócios que se consolidam <strong>de</strong> forma continuada no tempo, basea<strong>do</strong>s na estrita confiança<br />

<strong>de</strong>positada pelas partes por anos a fio. Vejamos as palavras da jurista a respeito da nova categoria:<br />

“Trata-se <strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> novos contratos ou relações contratuais que utilizam os méto<strong>do</strong>s <strong>de</strong> contratação <strong>de</strong> massa (por meio <strong>de</strong><br />

contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são ou <strong>de</strong> condições gerais <strong>do</strong>s contratos) para fornecer serviços especiais no merca<strong>do</strong>, crian<strong>do</strong> relações jurídicas<br />

complexas, envolven<strong>do</strong> uma ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res organiza<strong>do</strong>s entre si e com uma característica <strong>de</strong>terminante: a posição <strong>de</strong><br />

‘cativida<strong>de</strong>’ ou ‘<strong>de</strong>pendência’ <strong>do</strong>s clientes, consumi<strong>do</strong>res”.3<br />

A <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>ra aponta a existência <strong>de</strong> outras <strong>de</strong>nominações para o fenômeno, tais como contratos múltiplos, serviços<br />

contínuos, relações contratuais triangulares ou contratos <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> longa duração. Tais negócios são ainda <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong>s<br />

contratos relacionais, tema estuda<strong>do</strong> por Ronal<strong>do</strong> Porto Mace<strong>do</strong> Jr., em sua tese <strong>de</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong>. 4 Vejamos o conceito <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong><br />

pelo autor:<br />

“Contratos relacionais, numa brevíssima e provisória <strong>de</strong>finição (…), são contratos que se <strong>de</strong>senvolvem numa relação complexa, na<br />

qual elementos não promissórios <strong>do</strong> contrato, relaciona<strong>do</strong>s ao seu contexto, são leva<strong>do</strong>s em consi<strong>de</strong>ração significativamente<br />

frequente e clara. Esta natureza relacional da contratação é particularmente frequente e clara (porém não exclusiva) em contratos que<br />

se prolongam no tempo, isto é, em contratos <strong>de</strong> longa duração. Numa acepção ampla, contu<strong>do</strong>, to<strong>do</strong>s os contratos são mais ou menos<br />

e jamais não relacionais ou <strong>de</strong>scontínuos, como os <strong>de</strong>nomino neste trabalho. O conceito <strong>de</strong> contrato relacional é, em sua dimensão<br />

<strong>de</strong>scritiva, um tipo i<strong>de</strong>al que se contrapõe ao contrato <strong>de</strong>scontínuo. Este último caracteriza<strong>do</strong> pela pretensão <strong>de</strong> antecipação completa<br />

<strong>do</strong> futuro no presente, pela impessoalida<strong>de</strong>, por se constituir como unida<strong>de</strong> separada (ou <strong>de</strong>scontínua) e por se apoiar na<br />

pressuposição <strong>de</strong> uma barganha instrumental, isto é, nele o acor<strong>do</strong> <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>s <strong>de</strong>riva<strong>do</strong> da promessa é seu exclusivo núcleo <strong>de</strong> fonte<br />

obrigacional”. 5<br />

O que se percebe, portanto, é que nos contratos relacionais há um verda<strong>de</strong>iro casamento negocial entre as partes, uma relação<br />

<strong>de</strong> confiança construída e consolidada. A título <strong>de</strong> exemplo, po<strong>de</strong>m ser cita<strong>do</strong>s um contrato entre banco e correntista manti<strong>do</strong> há<br />

muito tempo, cumpri<strong>do</strong> rigorosamente <strong>de</strong>ntro daquilo que foi pactua<strong>do</strong> entre as partes; um contrato <strong>de</strong> seguro <strong>de</strong> vida celebra<strong>do</strong> e<br />

pago pontualmente pelo segura<strong>do</strong> há décadas; os contratos <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e <strong>de</strong> previdência privada. Em casos tais, <strong>de</strong>ve-se<br />

valorizar a conduta <strong>de</strong> confiança das partes, a boa-fé objetiva <strong>de</strong>positada pelos participantes negociais, conforme se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

seguinte julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> STJ, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 467:<br />

“Contrato. Seguro. Vida. Interrupção. Renovação. Trata-se, na origem, <strong>de</strong> ação para cumprimento <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> fazer proposta


contra empresa <strong>de</strong> seguro na qual o recorrente alega que, há mais <strong>de</strong> 30 anos, vem contratan<strong>do</strong>, continuamente, seguro <strong>de</strong> vida<br />

individual ofereci<strong>do</strong> pela recorrida, mediante renovação automática <strong>de</strong> apólice <strong>de</strong> seguro. Em 1999, continuou a manter vínculo com<br />

a segura<strong>do</strong>ra; porém, <strong>de</strong>ssa vez, a<strong>de</strong>rin<strong>do</strong> a uma apólice coletiva vigente a partir <strong>do</strong> ano 2000, que vinha sen<strong>do</strong> renovada ano a ano<br />

até que, em 2006, a recorrida enviou-lhe uma correspondência informan<strong>do</strong> que não mais teria intenção <strong>de</strong> renovar o seguro nos<br />

termos em que fora contrata<strong>do</strong>. Ofereceu-lhe, em substituição, três alternativas, que o recorrente reputou excessivamente<br />

<strong>de</strong>svantajosas, daí a propositura da ação. A Min. Relatora enten<strong>de</strong>u que a pretensão da segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> modificar abruptamente as<br />

condições <strong>do</strong> seguro, não renovan<strong>do</strong> o ajuste anterior, ofen<strong>de</strong> os princípios da boa-fé objetiva, da cooperação, da confiança e da<br />

lealda<strong>de</strong> que <strong>de</strong>vem orientar a interpretação <strong>do</strong>s contratos que regulam relações <strong>de</strong> consumo. Verifica<strong>do</strong> prejuízo da segura<strong>do</strong>ra e<br />

i<strong>de</strong>ntificada a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> correção da carteira <strong>de</strong> seguro em razão <strong>de</strong> novo cálculo atuarial, cabe a ela ver o consumi<strong>do</strong>r como um<br />

colabora<strong>do</strong>r, um parceiro que a tem acompanha<strong>do</strong> por anos a fio. Logo, os aumentos necessários para o reequilíbrio da carteira<br />

<strong>de</strong>vem ser estabeleci<strong>do</strong>s <strong>de</strong> maneira suave e gradual, por meio <strong>de</strong> um cronograma extenso, <strong>do</strong> qual o segura<strong>do</strong> tem <strong>de</strong> ser comunica<strong>do</strong><br />

previamente. Agin<strong>do</strong> assim, a segura<strong>do</strong>ra permite que o segura<strong>do</strong> se prepare para novos custos que onerarão, a longo prazo, o seguro<br />

<strong>de</strong> vida e colabore com a segura<strong>do</strong>ra, aumentan<strong>do</strong> sua participação e mitigan<strong>do</strong> os prejuízos. A intenção <strong>de</strong> modificar abruptamente a<br />

relação jurídica continuada com a simples notificação entregue com alguns meses <strong>de</strong> antecedência ofen<strong>de</strong> o sistema <strong>de</strong> proteção ao<br />

consumi<strong>do</strong>r e não po<strong>de</strong> prevalecer. Daí a Seção, ao prosseguir o julgamento, por maioria, conheceu <strong>do</strong> recurso e a ele <strong>de</strong>u<br />

provimento” (STJ – REsp 1.073.595/MG – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 23.03.2011).<br />

Aliás, na linha <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> <strong>de</strong>sse último e fundamental prece<strong>de</strong>nte, na VI Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, realizada em 2013, foram<br />

aprova<strong>do</strong>s <strong>do</strong>is enuncia<strong>do</strong>s <strong>do</strong>utrinários importantes para a i<strong>de</strong>ia contemporânea exposta neste tópico. O primeiro <strong>de</strong>les preceitua<br />

que “a recusa <strong>de</strong> renovação das apólices <strong>de</strong> seguro <strong>de</strong> vida pelas segura<strong>do</strong>ras em razão da ida<strong>de</strong> <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> é discriminatória e<br />

atenta contra a função social <strong>do</strong> contrato” (Enuncia<strong>do</strong> n. 542). O segun<strong>do</strong> expressa que “constitui abuso <strong>do</strong> direito a modificação<br />

acentuada das condições <strong>do</strong> seguro <strong>de</strong> vida e <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> pela segura<strong>do</strong>ra quan<strong>do</strong> da renovação <strong>do</strong> contrato” (Enuncia<strong>do</strong> n. 543).<br />

Em complemento, cite-se a notória e repetitiva negativa das empresas <strong>de</strong> planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> em cobrir tratamentos essenciais <strong>do</strong>s<br />

segura<strong>do</strong>s, especialmente naqueles casos envolven<strong>do</strong> i<strong>do</strong>sos, que são hipervulneráveis negociais. Por bem, a jurisprudência nacional<br />

tem imposto a cobertura por meio <strong>de</strong> tutela específica, com a fixação <strong>de</strong> multas diárias consi<strong>de</strong>ráveis, sem prejuízo da cabível<br />

reparação <strong>do</strong>s danos presentes nessas hipóteses.<br />

Pois bem, para o contexto <strong>do</strong> presente capítulo, é interessante verificar o conceito contemporâneo ou pós-mo<strong>de</strong>rno <strong>de</strong> contrato.<br />

Como é notório, o Código Civil brasileiro <strong>de</strong> 2002, a exemplo <strong>do</strong> seu antecessor, não tomou o cuida<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir o contrato como<br />

categoria jurídica. Em um primeiro momento, po<strong>de</strong>-se pensar que agiu bem o novel legisla<strong>do</strong>r, pois não cabe a ele, e sim à <strong>do</strong>utrina,<br />

a tarefa <strong>de</strong> conceituar as categorias jurídicas.6 Todavia, cumpre assinalar que a atual codificação brasileira está baseada, entre<br />

outros, no princípio da operabilida<strong>de</strong>, que tem um <strong>do</strong>s seus senti<strong>do</strong>s expressos na simplicida<strong>de</strong> ou facilitação <strong>do</strong>s institutos civis. 7<br />

Consigne-se que o Código Civil brasileiro conceitua algumas figuras contratuais típicas, caso da compra e venda (art. 481), mas não<br />

chegou a <strong>de</strong>finir o contrato, relegan<strong>do</strong>, mais uma vez, a tarefa à <strong>do</strong>utrina.<br />

Em uma visão clássica ou mo<strong>de</strong>rna, pois própria da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, tem-se nota<strong>do</strong> a prevalência <strong>do</strong> conceito <strong>do</strong> instituto que<br />

po<strong>de</strong> ser extraí<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 1.321 <strong>do</strong> Código Civil italiano, ou seja, <strong>de</strong> que o contrato é o acor<strong>do</strong> <strong>de</strong> duas ou mais partes para constituir,<br />

regular ou extinguir entre elas uma relação jurídica <strong>de</strong> caráter patrimonial. Muitos juristas brasileiros seguem essa conceituação,<br />

como, por exemplo, Orlan<strong>do</strong> Gomes 8 e Álvaro Villaça Azeve<strong>do</strong>. 9<br />

A partir da construção clássica nota-se que o contrato, <strong>de</strong> início, é espécie <strong>do</strong> gênero negócio jurídico. Assim, há uma<br />

composição <strong>de</strong> interesses das partes – pelo menos duas – com conteú<strong>do</strong> lícito e finalida<strong>de</strong> específica. Para a compreensão <strong>do</strong><br />

contrato é fundamental o estu<strong>do</strong> estrutural <strong>do</strong> negócio jurídico, mormente os planos da existência, da valida<strong>de</strong> e da eficácia. Serve<br />

como norte o art. 104 <strong>do</strong> Código Civil brasileiro, que aponta os requisitos <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> <strong>do</strong> negócio jurídico: a) agente capaz; b)<br />

objeto lícito, possível, <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> ou <strong>de</strong>terminável; c) forma prescrita ou não <strong>de</strong>fesa em lei.<br />

Cumpre anotar que tal feição clássica <strong>do</strong> contrato limita o seu conteú<strong>do</strong> às questões patrimoniais ou econômicas. Trata-se da<br />

patrimonialida<strong>de</strong>, tão cara aos italianos. Conforme comentam Cian e Trabucchi, o requisito da patrimonialida<strong>de</strong> serve para<br />

distinguir o contrato <strong>de</strong> outras figuras negociais, genericamente tidas como convenções, caso <strong>do</strong>s negócios <strong>de</strong> direito <strong>de</strong> família.10<br />

Nesse contexto <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição, o contrato não po<strong>de</strong> ter uma feição existencial ou extrapatrimonial. A título <strong>de</strong> exemplo, pela visão<br />

clássica, o contrato não po<strong>de</strong> ter como conteú<strong>do</strong> os direitos da personalida<strong>de</strong>, mesmo que indiretamente.<br />

Na <strong>do</strong>utrina mais recente, há interessantes tentativas <strong>de</strong> ampliação ou remo<strong>de</strong>lagem <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> contrato, o que sem dúvida<br />

alarga a margem <strong>de</strong> incidência <strong>de</strong> conceito, ou seja, a abrangência <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> contratual. Deve ficar claro que tal visão <strong>de</strong> maior<br />

abrangência serve perfeitamente para a <strong>de</strong>limitação <strong>do</strong> que seja o contrato <strong>de</strong> consumo. Releve-se a construção <strong>de</strong>nominada pósmo<strong>de</strong>rna<br />

<strong>de</strong> Paulo Nalin, da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>do</strong> Paraná. Para o jurista, o contrato constitui “a relação jurídica subjetiva,<br />

nucleada na solidarieda<strong>de</strong> constitucional, <strong>de</strong>stinada à produção <strong>de</strong> efeitos jurídicos existenciais e patrimoniais, não só entre os<br />

titulares subjetivos da relação, como também perante terceiros”. 11 Devem-se aprofundar as razões <strong>de</strong> pertinência da construção<br />

<strong>do</strong>utrinária.<br />

De início, constata-se que o contrato está ampara<strong>do</strong> em valores constitucionais. Não há dúvida <strong>de</strong> que questões que envolvem


direitos fundamentais, mormente aqueles com repercussões sociais, refletem na autonomia privada, caso <strong>do</strong> direito à saú<strong>de</strong>. 12 No<br />

Brasil po<strong>de</strong>m ser encontra<strong>do</strong>s vários julga<strong>do</strong>s que colocam em sopesamento a questão da saú<strong>de</strong> e a manutenção econômica,<br />

prevalecen<strong>do</strong>, muitas vezes, a primeira. Da recente jurisprudência <strong>do</strong> Tribunal Paulista, po<strong>de</strong> ser transcrita a seguinte ementa,<br />

tutelan<strong>do</strong> amplamente a vida e a saú<strong>de</strong>:<br />

“Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Paciente em tratamento <strong>de</strong> câncer. Cobertura para realização <strong>de</strong> sessões <strong>de</strong> radioterapia convencional. Recusa <strong>de</strong><br />

cobertura para nova espécie <strong>de</strong> radioterapia prescrita à autora, com a técnica IMRT, porque não incluída ainda no rol <strong>de</strong><br />

procedimentos divulga<strong>do</strong>s pela ANS. Inadmissibilida<strong>de</strong>. Não se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> procedimento experimental, <strong>de</strong>ve se consi<strong>de</strong>rar<br />

abrangi<strong>do</strong> pela proteção <strong>do</strong> contrato em vigor. Recurso <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJSP – Agravo <strong>de</strong> Instrumento 590.949.4/4 – Acórdão<br />

3309012, São Bernar<strong>do</strong> <strong>do</strong> Campo – Segunda Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Morato <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> – j. 21.10.2008 – DJESP<br />

14.11.2008).<br />

Como segun<strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa da construção <strong>de</strong> Paulo Nalin, muito pertinente para a concepção <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> consumo, é<br />

ela instigante e prática porque conclui que o contrato envolve situações existenciais das partes contratantes. Tem-se relaciona<strong>do</strong> a<br />

proteção individual da dignida<strong>de</strong> humana e <strong>do</strong>s interesses difusos e coletivos com o princípio da função social <strong>do</strong> contrato. Nesse<br />

senti<strong>do</strong>, na I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, evento promovi<strong>do</strong> em 2002 pelo Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral e pelo Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça, foi aprova<strong>do</strong> o Enuncia<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrinário n. 23, dispon<strong>do</strong> que “a função social <strong>do</strong> contrato, prevista no art. 421 <strong>do</strong> novo Código<br />

Civil, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance <strong>de</strong>sse princípio quan<strong>do</strong> presentes interesses<br />

metaindividuais ou interesse individual relativo à dignida<strong>de</strong> da pessoa humana”. Em atualização à obra <strong>de</strong> Orlan<strong>do</strong> Gomes, Antonio<br />

Junqueira <strong>de</strong> Azeve<strong>do</strong> e Francisco Paulo <strong>de</strong> Crescenzo Marino, da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, fazem a mesma correlação,<br />

afirman<strong>do</strong> que “Enten<strong>de</strong>mos que há pelo menos três casos nos quais a violação ao princípio da função social <strong>de</strong>ve levar à ineficácia<br />

superveniente <strong>do</strong> contrato. Juntamente com a ofensa a interesses coletivos (meio ambiente, concorrência etc.), <strong>de</strong>ve-se arrolar a<br />

lesão à dignida<strong>de</strong> da pessoa humana e a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> obtenção <strong>do</strong> fim último visa<strong>do</strong> pelo contrato”.13<br />

Terceiro e por fim, a construção <strong>de</strong> Paulo Nalin é interessante, pois traz a <strong>de</strong>dução <strong>de</strong> que o contrato po<strong>de</strong> gerar efeitos perante<br />

terceiros. Algumas <strong>de</strong>ssas externalida<strong>de</strong>s constam da própria legislação, como é o caso da estipulação em favor <strong>de</strong> terceiro –<br />

comum no seguro <strong>de</strong> vida – e da promessa <strong>de</strong> fato <strong>de</strong> terceiro – por exemplo, a hipótese <strong>de</strong> um promotor <strong>de</strong> eventos que é<br />

contrata<strong>do</strong> para agenciar uma apresentação <strong>de</strong> um cantor famoso, que não comparece, causan<strong>do</strong> danos a consumi<strong>do</strong>res. No entanto,<br />

além disso, reconhece-se a eficácia externa da função social <strong>do</strong>s contratos, a tutela externa <strong>do</strong> crédito, com efeitos contratuais<br />

atingin<strong>do</strong> terceiros. O tema já foi exposto no Capítulo 2 da presente obra.<br />

Essa visão ampliada <strong>do</strong> contrato, flagrante nos contratos <strong>de</strong> consumo, é uma marca da autonomia privada, princípio que<br />

superou a i<strong>de</strong>ia liberal <strong>de</strong> autonomia da vonta<strong>de</strong>. Parcela consi<strong>de</strong>rável da <strong>do</strong>utrina atual, nacional e estrangeira, propõe a<br />

substituição <strong>do</strong> antigo princípio da autonomia da vonta<strong>de</strong> pelo princípio da autonomia privada.14 A autonomia privada po<strong>de</strong> ser<br />

conceituada como um regramento básico, <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m particular – mas influencia<strong>do</strong> por normas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública –, pelo qual, na<br />

formação <strong>do</strong>s contratos, além da vonta<strong>de</strong> das partes, entram em cena outros fatores: psicológicos, políticos, econômicos e sociais.<br />

Trata-se <strong>do</strong> direito da parte <strong>de</strong> autorregulamentar os seus interesses, <strong>de</strong>corrente da sua própria dignida<strong>de</strong> humana, mas que encontra<br />

limitações em normas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, particularmente nos princípios sociais contratuais. 15<br />

A existência <strong>de</strong>ssa substituição é in<strong>de</strong>clinável, pois, como afirma Fernan<strong>do</strong> Noronha, “foi precisamente em consequência da<br />

revisão a que foram submeti<strong>do</strong>s o liberalismo econômico e, sobretu<strong>do</strong>, as concepções voluntaristas <strong>do</strong> negócio jurídico, que se<br />

passou a falar em autonomia privada, <strong>de</strong> preferência a mais antiga autonomia da vonta<strong>de</strong>. E, realmente, se a antiga autonomia da<br />

vonta<strong>de</strong>, com o conteú<strong>do</strong> que lhe era atribuí<strong>do</strong>, era passível <strong>de</strong> críticas, já a autonomia privada é noção não só com sóli<strong>do</strong>s<br />

fundamentos, como extremamente importante”.16 De acor<strong>do</strong> com a personalização <strong>do</strong> direito priva<strong>do</strong> e a valorização da pessoa<br />

como centro <strong>do</strong> direito priva<strong>do</strong>, o conceito <strong>de</strong> autonomia privada é <strong>de</strong> fato o mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>, pois a autonomia não é da vonta<strong>de</strong>,<br />

mas da pessoa.<br />

Ensinam os autores espanhóis Luiz Díez-Picazo e Antonio Gullón que “Conviene en este punto observar que cuan<strong>do</strong> se habla,<br />

como es usual entre nosotros, <strong>de</strong> ‘autonomía <strong>de</strong> la voluntad’, no <strong>de</strong>ja <strong>de</strong> incurrirse en algún equívoco. Porque el sujeto <strong>de</strong> la<br />

autonomía no es la voluntad, sino la persona con realidad unitaria. La autonomía no se ejercita querien<strong>do</strong> – función <strong>de</strong> la voluntad –<br />

sino establecien<strong>do</strong>, disponien<strong>do</strong>, gobernan<strong>do</strong>. La voluntad o el querer es un requisito indudable <strong>de</strong>l acto <strong>de</strong> autonomía (que hay <strong>de</strong><br />

ser siempre libre y voluntario), pero para ejercitar la autonomía es preciso el <strong>de</strong>spliegue <strong>de</strong> las <strong>de</strong>más potencias”. 17<br />

Em reforço, não há dúvida <strong>de</strong> que a vonta<strong>de</strong> – <strong>de</strong> per si – per<strong>de</strong>u o <strong>de</strong>staque que exercia no passa<strong>do</strong>, relativamente à formação<br />

<strong>do</strong>s contratos e <strong>do</strong>s negócios jurídicos. Vários são os fatores que entraram em cena para a concretização prática <strong>de</strong>ssa distinta visão.<br />

As relações pessoais estão em suposta crise, o que na verda<strong>de</strong> representa uma importante mudança estrutural nas relações negociais,<br />

sen<strong>do</strong> certo que tal espectro <strong>de</strong>ve ser analisa<strong>do</strong> sob o prisma da concretu<strong>de</strong> <strong>do</strong> instituto <strong>do</strong> contrato e <strong>do</strong> que este representa para o<br />

meio social. Pre<strong>do</strong>minam em larga escala os contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, com o conteú<strong>do</strong> imposto por uma das partes negociais, tida como


mais forte ou hiperssuficiente, muitas vezes por ter o <strong>do</strong>mínio das informações. Na gran<strong>de</strong> maioria das vezes, estar-se-á diante <strong>de</strong><br />

um contrato que é <strong>de</strong> consumo e <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, mesmo não haven<strong>do</strong> uma confusão absoluta entre as citadas categorias.<br />

Sem dúvida, no mun<strong>do</strong> contemporâneo, a autonomia privada faz com que o contrato ingresse em outros meios, como é o caso<br />

<strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> Família e <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> das Coisas, sem falar no <strong>do</strong>mínio natural <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Como afirma Luciano <strong>de</strong><br />

Camargo Pentea<strong>do</strong>, olhan<strong>do</strong> para o futuro, “to<strong>do</strong> contrato gera obrigação para, ao menos, um das partes contratantes. Entretanto,<br />

nem to<strong>do</strong> contrato rege-se, apenas, pelo direito das obrigações. Existem contratos <strong>de</strong> direito <strong>de</strong> empresa, contratos <strong>de</strong> direito<br />

obrigacional, contratos <strong>de</strong> direito das coisas, contratos <strong>de</strong> direito <strong>de</strong> família. No sistema brasileiro, não existem contratos <strong>de</strong> direito<br />

das sucessões, por conta da vedação <strong>do</strong> art. 426 <strong>do</strong> Código Civil, o que significa que, <strong>de</strong> lege ferenda, não se possa introduzir, no<br />

direito positivo, a figura, <strong>do</strong>utrinariamente admitida e utilizada na praxe <strong>de</strong> alguns países, como é o caso da Alemanha. Interessante<br />

proposição teórica seria, em acréscimo, postular a existência <strong>de</strong> contratos da parte geral, como parece ser o caso <strong>do</strong> ato que origina a<br />

associação, no atual sistema <strong>do</strong> Código Civil”.18 Amplia-se a seara contratual, por exemplo, com a forte tendência <strong>de</strong> aproximação<br />

<strong>do</strong>s direitos pessoais e <strong>do</strong>s direitos reais, <strong>de</strong>smontan<strong>do</strong> aquele antigo quadro comparativo exposto nas aulas inaugurais sobre <strong>Direito</strong><br />

das Coisas. 19<br />

A título <strong>de</strong> exemplo <strong>de</strong>ssa aproximação, cai aquela premissa <strong>de</strong> que os direitos pessoais teriam efeitos inter partes e os direitos<br />

reais efeitos erga omnes. Como antes se <strong>de</strong>monstrou neste livro, a função social <strong>do</strong> contrato – em sua eficácia externa – traz a<br />

conclusão <strong>de</strong> que o contrato gera efeitos perante terceiros. A respeito <strong>do</strong>s efeitos restritos <strong>do</strong>s direitos reais, a tendência po<strong>de</strong> ser<br />

percebida pela Súmula 308 <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, pela qual a boa-fé objetiva faz com que a hipoteca tenha seus efeitos<br />

limita<strong>do</strong>s aos celebrantes, não em relação a terceiros. Enuncia a citada ementa: “A hipoteca firmada entre a construtora e o agente<br />

financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa <strong>de</strong> compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes <strong>do</strong> imóvel”.<br />

A súmula surgiu <strong>do</strong>s casos <strong>de</strong> notória construtora que recebeu os pagamentos, mas não fez os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s repasses aos agentes<br />

financeiros. Foram protegi<strong>do</strong>s os consumi<strong>do</strong>res adquirentes e adimplentes, restringin<strong>do</strong>-se os efeitos da hipoteca entre tal<br />

construtora e o banco. Prestigiou-se a boa-fé objetiva como preceito <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública e a função social <strong>do</strong> contrato, pela proteção<br />

<strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res adquirentes <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> justiça contratual.<br />

Concluin<strong>do</strong> o tópico, a contemporaneida<strong>de</strong> <strong>de</strong>monstra que o futuro é <strong>de</strong> uma contratualização <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o direito, um<br />

neocontratualismo, tese <strong>de</strong>fendida há tempos por Norberto Bobbio. 20 Entre os portugueses, Rui Alarcão também <strong>de</strong>monstra a<br />

tendência, ao discorrer sobre a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> menos leis, melhores leis. 21 Para o jurista <strong>de</strong> Coimbra, “se está assistin<strong>do</strong> a um recuo<br />

<strong>do</strong> ‘direito estadual ou estatal’, e se fala mesmo em ‘direito negocia<strong>do</strong>’, embora se <strong>de</strong>va advertir que aquele recuo a esta negociação<br />

comporta perigos, relativamente aos quais importa estar preveni<strong>do</strong> e encontrar respostas, não avulsas mas institucionais. Como quer<br />

que seja, uma coisa se afigura certa: a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> novos mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> realização <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>, incluin<strong>do</strong> mo<strong>de</strong>los alternativos <strong>de</strong><br />

realização jurisdicional e on<strong>de</strong> haverá certamente lugar <strong>de</strong>staca<strong>do</strong> para paradigmas contratuais e para mecanismos <strong>de</strong> natureza ou <strong>de</strong><br />

recorte contratual, que têm, <strong>de</strong> resto, tradição jurídica-política, precursora <strong>de</strong> dimensões mo<strong>de</strong>rnas ou pós-mo<strong>de</strong>rnas”.22 E arremata,<br />

sustentan<strong>do</strong> que tem ganha<strong>do</strong> força a contratualização sociopolítica, para que exista uma socieda<strong>de</strong> mais consensual <strong>do</strong> que<br />

autoritária ou conflituosa. 23 Em suma, a construção <strong>de</strong> contrato serve não só para as partes envolvidas mas também para toda a<br />

socieda<strong>de</strong>.<br />

O contrato rompe suas barreiras iniciais, não ten<strong>do</strong> limites <strong>de</strong> incidência. Para tal rompimento, sem dúvidas, contribuem muito<br />

os contratos <strong>de</strong> consumo. Não se po<strong>de</strong> esquecer que, na gran<strong>de</strong> maioria das vezes e no mun<strong>do</strong> contemporâneo, vivencia-se a<br />

realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Superada essa visão inaugural, parte-se ao estu<strong>do</strong> da revisão contratual por fato superveniente no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r, assunto <strong>do</strong>s mais importantes, que serve para a concretização efetiva <strong>do</strong>s princípios sociais contratuais, caso da boa-fé<br />

objetiva e da função social.<br />

5.2.<br />

A REVISÃO CONTRATUAL POR FATO SUPERVENIENTE NO CÓDIGO DE DEFESA<br />

DO CONSUMIDOR<br />

Como aponta<strong>do</strong> no Capítulo 2 <strong>de</strong>sta obra, há uma forte relação entre o princípio da função social <strong>do</strong> contrato e a manutenção <strong>do</strong><br />

ponto <strong>de</strong> equilíbrio <strong>do</strong> negócio, o que alguns <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res preferem <strong>de</strong>nominar equivalência material.24 Na verda<strong>de</strong>, trata-se <strong>de</strong><br />

uma clara incidência da eficácia interna da função social <strong>do</strong> contrato, que veda a onerosida<strong>de</strong> excessiva e o enriquecimento sem<br />

causa. Como bem exposto pelo Professor Álvaro Villaça Azeve<strong>do</strong> em suas palestras, o contrato não po<strong>de</strong> gerar uma situação <strong>de</strong><br />

massacre <strong>de</strong> uma parte sobre a outra, sen<strong>do</strong> essa uma boa concepção a respeito da função social.25 Em outras palavras, um contrato<br />

que acarreta onerosida<strong>de</strong> excessiva a uma das partes, especialmente tida como vulnerável, não está cumprin<strong>do</strong> o seu papel<br />

sociológico, necessitan<strong>do</strong> <strong>de</strong> revisão pelo órgão judicante.<br />

O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r disciplina a revisão contratual por fato superveniente (fato novo) no seu art. 6º, inc. V.


Constata-se que a norma trata da alteração das circunstâncias iniciais <strong>do</strong> negócio celebra<strong>do</strong>, o que não se confun<strong>de</strong> com as hipóteses<br />

em que há um vício <strong>de</strong> formação no negócio. Enuncia o cita<strong>do</strong> dispositivo legal:<br />

“Art. 6º São direitos básicos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r:<br />

(…)<br />

V – a modificação das cláusulas contratuais que estabelecem prestações <strong>de</strong>sproporcionais ou sua revisão em razão <strong>de</strong> fatos<br />

supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.”<br />

Existem claras diferenças entre essa revisão contratual e a consagrada pelo Código Civil <strong>de</strong> 2002. Isso porque a codificação<br />

privada exige o fator imprevisibilida<strong>de</strong> para a revisão contratual por fato superveniente, ten<strong>do</strong> consagra<strong>do</strong>, segun<strong>do</strong> o entendimento<br />

majoritário, a teoria da imprevisão, com origem na antiga cláusula rebus sic stantibus. 26 Determina o art. 317 <strong>do</strong> CC/2002:<br />

“Quan<strong>do</strong>, por motivos imprevisíveis, sobrevier <strong>de</strong>sproporção manifesta entre o valor da prestação <strong>de</strong>vida e o <strong>do</strong> momento <strong>de</strong> sua<br />

execução, po<strong>de</strong>rá o juiz corrigi-lo, a pedi<strong>do</strong> da parte, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que assegure, quanto possível, o valor real da prestação”.<br />

Além <strong>de</strong>sse dispositivo, tem-se se sustenta<strong>do</strong> que a revisão contratual <strong>do</strong> contrato civil igualmente é possível pela subsunção <strong>do</strong><br />

art. 478 <strong>do</strong> CC, in verbis: “Nos contratos <strong>de</strong> execução continuada ou diferida, se a prestação <strong>de</strong> uma das partes se tornar<br />

excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, po<strong>de</strong>rá<br />

o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r pedir a resolução <strong>do</strong> contrato. Os efeitos da sentença que a <strong>de</strong>cretar retroagirão à data da citação”. Nessa linha <strong>de</strong><br />

conclusão está o Enuncia<strong>do</strong> n. 176 <strong>do</strong> CJF/STJ, da III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, segun<strong>do</strong> o qual, “Em atenção ao princípio da<br />

conservação <strong>do</strong>s negócios jurídicos, o art. 478 <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002 <strong>de</strong>verá conduzir, sempre que possível, à revisão judicial <strong>do</strong>s<br />

contratos e não à resolução contratual”. Reproduz-se o mo<strong>de</strong>lo italiano, eis que o art. 1.467 <strong>do</strong> Codice, que trata da resolução,<br />

também é utiliza<strong>do</strong> para a revisão <strong>do</strong> negócio diante <strong>de</strong> um fato superveniente.<br />

Não restam dúvidas <strong>de</strong> que a revisão contratual tratada pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é facilitada justamente por não<br />

exigir o fator imprevisibilida<strong>de</strong>, bastan<strong>do</strong> que o <strong>de</strong>sequilíbrio negocial ou a onerosida<strong>de</strong> excessiva <strong>de</strong>corra <strong>de</strong> um fato<br />

superveniente, ou seja, um fato novo não existente quan<strong>do</strong> da contratação original. Na realida<strong>de</strong> civilista, o gran<strong>de</strong> problema é o<br />

enquadramento <strong>de</strong>ssa imprevisibilida<strong>de</strong>, o que tem torna<strong>do</strong> a revisão judicial <strong>do</strong> contrato civil praticamente impossível no campo<br />

prático.27<br />

Trazen<strong>do</strong> claramente, e <strong>de</strong> forma didática, a diferenciação entre a revisão contratual tratada pelo CDC e pelo CC/2002, extraise<br />

<strong>de</strong> recente aresto <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que “a teoria da base objetiva, que teria si<strong>do</strong> introduzida em nosso or<strong>de</strong>namento<br />

pelo art. 6º, inciso V, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – CDC, difere da teoria da imprevisão por prescindir da previsibilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> fato que <strong>de</strong>termine oneração excessiva <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s contratantes. Tem por pressuposto a premissa <strong>de</strong> que a celebração <strong>de</strong> um<br />

contrato ocorre mediante consi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminadas circunstâncias, as quais, se modificadas no curso da relação contratual,<br />

<strong>de</strong>terminam, por sua vez, consequências diversas daquelas inicialmente estabelecidas, com repercussão direta no equilíbrio das<br />

obrigações pactuadas. Nesse contexto, a intervenção judicial se daria nos casos em que o contrato fosse atingi<strong>do</strong> por fatos que<br />

comprometessem as circunstâncias intrínsecas à formulação <strong>do</strong> vínculo contratual, ou seja, sua base objetiva. Em que pese sua<br />

relevante inovação, tal teoria, ao dispensar, em especial, o requisito <strong>de</strong> imprevisibilida<strong>de</strong>, foi acolhida em nosso or<strong>de</strong>namento<br />

apenas para as relações <strong>de</strong> consumo, que <strong>de</strong>mandam especial proteção” (STJ – REsp 1.321.614/SP– Terceira Turma – Rel. Ministro<br />

Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – Rel. P/Acórdão Ministro Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – j. 16.12.2014 – DJe 03.03.2015).<br />

Sen<strong>do</strong> assim, pela opção <strong>de</strong> facilitação, fica claro que o CDC não a<strong>do</strong>tou a teoria da imprevisão, ao contrário <strong>do</strong> que muitas<br />

vezes se tem afirma<strong>do</strong>. 28 Na mesma linha <strong>de</strong> pensamento, a não a<strong>do</strong>ção da teoria da imprevisão pela Lei 8.078/1990 po<strong>de</strong> ser<br />

retirada das lições <strong>de</strong> juristas como Rizzatto Nunes,29 Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery, 30 Paulo Roque Khouri, 31<br />

João Batista <strong>de</strong> Almeida, 32 Claudia Lima Marques, Antonio Herman Benjamin e Bruno Miragem, 33 o que é compartilha<strong>do</strong> por este<br />

autor. Afirma-se, com a <strong>de</strong>vida precisão teórica, que o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r a<strong>do</strong>tou a teoria da base objetiva <strong>do</strong><br />

negócio jurídico, <strong>de</strong> influência germânica, <strong>de</strong>senvolvida, entre outros, por Karl Larenz. 34 Nessa linha, vejamos as palavras <strong>de</strong><br />

Claudia Lima Marques:<br />

“A norma <strong>do</strong> art. 6º <strong>do</strong> CDC avança, em relação ao Código Civil (arts. 478-480 – Da resolução por onerosida<strong>de</strong> excessiva), ao não<br />

exigir que o fato superveniente seja imprevisível ou irresistível – apenas exibe a quebra da base objetiva <strong>do</strong> negócio, a quebra <strong>de</strong> seu<br />

equilíbrio intrínseco, a <strong>de</strong>struição da relação <strong>de</strong> equivalência entre as prestações, o <strong>de</strong>saparecimento <strong>do</strong> fim essencial <strong>do</strong> contrato. Em<br />

outras palavras, o elemento autoriza<strong>do</strong>r da ação modifica<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> Judiciário é o resulta<strong>do</strong> objetivo da engenharia contratual, que agora<br />

apresenta mencionada onerosida<strong>de</strong> excessiva para o consumi<strong>do</strong>r, resulta<strong>do</strong> <strong>de</strong> simples fato superveniente, fato que não necessita ser<br />

extraordinário, irresistível, fato que podia ser previsto e não foi”. 35<br />

Cumpre <strong>de</strong>stacar que na jurisprudência <strong>do</strong>s Tribunais Estaduais po<strong>de</strong>m ser encontradas várias <strong>de</strong>cisões que fazem menção à<br />

teoria da base objetiva e não à teoria da imprevisão (TJDF – Recurso 2013.03.1.010936-3 – Acórdão Ac. 918.430 – Terceira<br />

Turma Cível – Rel. Des. Gilberto Pereira <strong>de</strong> Oliveira – DJDFTE 16.02.2016, p. 359; TJSP – Apelação 0056866-08.2012.8.26.0002


– Acórdão 9545715, São Paulo – Décima Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Ana <strong>de</strong> Lour<strong>de</strong>s – j. 24.06.2016 – DJESP<br />

05.07.2016; TJMG – Apelação Cível 1.0520.09.024641-1/004 – Rel. Des. Cabral da Silva – j. 18.08.2015 – DJEMG 02.09.2015;<br />

TJBA – Recurso 0012491-64.2009.805.0113-1 – Terceira Turma Recursal – Rel. Juíza Josefa Cristina Tomaz Martins Kunrath –<br />

DJBA 17.02.2011; TJPE – Apelação Cível 0134498-7, Recife – Quarta Câmara Cível – Rel. Des. Jones Figueirê<strong>do</strong> – j. 24.09.2010 –<br />

DJEPE 21.10.2010; TJRS – Agravo <strong>de</strong> Instrumento 70007363195, Santa Vitória <strong>do</strong> Palmar – Décima Terceira Câmara Cível – Rel.<br />

Des. Marco Aurélio <strong>de</strong> Oliveira Canosa – j. 10.02.2004; TJSC – Apelação Cível 2003.010228-0, Blumenau – Primeira Câmara <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Comercial – Rel. Juiz Túlio José Moura Pinheiro – j. 09.10.2003).<br />

Na prática, os principais acórdãos relativos à revisão contratual por fato superveniente no Brasil referem-se aos negócios <strong>de</strong><br />

arrendamento mercantil (leasing) celebra<strong>do</strong>s na década <strong>de</strong> noventa para a aquisição <strong>de</strong> veículos. Tais contratos tinham a atualização<br />

<strong>de</strong> valores atrela<strong>do</strong>s à variação cambial, o que servia como um suposto atrativo aos consumi<strong>do</strong>res. Com a alta <strong>do</strong> dólar em relação<br />

ao real em janeiro <strong>de</strong> 1999, os contratos ficaram excessivamente onerosos aos consumi<strong>do</strong>res, o que motivou um enxame <strong>de</strong> ações<br />

judiciais <strong>de</strong> revisão. Após uma gran<strong>de</strong> variação na forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça chegou a concluir pela revisão,<br />

a<strong>do</strong>tan<strong>do</strong> a teoria da imprevisão:<br />

“Recurso especial. Leasing. Contrato <strong>de</strong> arrendamento mercantil expresso em dólar americano. Variação cambial. CDC. Teoria da<br />

imprevisão. Aplicabilida<strong>de</strong>. Alegação <strong>de</strong> ofensa aos arts. 115 e 145 <strong>do</strong> Código Civil. Ausência <strong>de</strong> prequestionamento (Súmulas<br />

282/STF e 211/STJ). Dissenso jurispru<strong>de</strong>ncial não caracteriza<strong>do</strong>. Acórdão local em consonância com recentes <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça. I. Aplica-se o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r aos contratos <strong>de</strong> arrendamento mercantil. II. A abrupta e forte<br />

<strong>de</strong>svalorização <strong>do</strong> real frente ao dólar americano constitui evento objetivo e inespera<strong>do</strong> apto a ensejar a revisão <strong>de</strong> cláusula<br />

contratual, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a evitar o enriquecimento sem causa <strong>de</strong> um contratante em <strong>de</strong>trimento <strong>do</strong> outro (art. 6º, V, <strong>do</strong> CDC). III. Agravo<br />

regimental <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (STJ – Ag. Rg. 430.393/RJ – Terceira Turma – Rel. Min. Antônio <strong>de</strong> Pádua Ribeiro – DJ 05.08.2002, p. 339.<br />

Veja: STJ, REsp 293.864/SE, REsp 361.694/RS e REsp 331.082/SC).<br />

O julga<strong>do</strong> chega ao <strong>de</strong>stino final da revisão a<strong>do</strong>tan<strong>do</strong> <strong>do</strong>is equívocos. O primeiro é a consubstancia<strong>do</strong> na afirmação <strong>de</strong> que o<br />

CDC consagrou a teoria da imprevisão. O segun<strong>do</strong> está relaciona<strong>do</strong> à <strong>de</strong>dução <strong>de</strong> que a alta <strong>do</strong> dólar seria um fator imprevisível. A<br />

conclusão final é correta, apesar <strong>de</strong> se percorrer um caminho erra<strong>do</strong>, <strong>de</strong> linhas tortas. Na verda<strong>de</strong>, os entendimentos precisos<br />

daquela Corte Superior são aqueles no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> dispensar a imprevisibilida<strong>de</strong> para a revisão contratual, bastan<strong>do</strong> o <strong>de</strong>sequilíbrio<br />

negocial em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> um fato novo. Por todas as <strong>de</strong>cisões, transcreve-se a seguinte, um <strong>do</strong>s principais prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça a respeito da matéria:<br />

“Processual civil e civil. Revisão <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> arrendamento mercantil (leasing). Recurso especial. Nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusula por ofensa<br />

ao direito <strong>de</strong> informação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Fundamento inataca<strong>do</strong>. In<strong>de</strong>xação em moeda estrangeira (dólar). Crise cambial <strong>de</strong> janeiro<br />

<strong>de</strong> 1999 – Plano Real. Aplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> art. 6º, inc. V, <strong>do</strong> CDC. Onerosida<strong>de</strong> excessiva caracterizada. Boa-fé objetiva <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r e direito <strong>de</strong> informação. Necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prova da captação <strong>de</strong> recurso financeiro proveniente <strong>do</strong> exterior. Recurso<br />

especial. Reexame <strong>de</strong> provas. Interpretação <strong>de</strong> cláusula contratual. Inadmitida a alegação <strong>de</strong> inaplicabilida<strong>de</strong> das disposições <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r aos contratos <strong>de</strong> arrendamento mercantil (leasing), e não impugna<strong>do</strong> especificamente, nas razões<br />

<strong>do</strong> recurso especial, o fundamento <strong>do</strong> v. acórdão recorri<strong>do</strong>, suficiente para manter a sua conclusão, <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> da cláusula que prevê<br />

a cobrança <strong>de</strong> taxa <strong>de</strong> juros por ofensa ao direito <strong>de</strong> informação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, nos termos <strong>do</strong> inc. XV <strong>do</strong> art. 51 <strong>do</strong> referi<strong>do</strong> diploma<br />

legal, impõe-se o juízo negativo <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> recurso especial quanto ao ponto. O preceito esculpi<strong>do</strong> no inc. V <strong>do</strong> art. 6º <strong>do</strong><br />

CDC dispensa a prova <strong>do</strong> caráter imprevisível <strong>do</strong> fato superveniente, bastan<strong>do</strong> a <strong>de</strong>monstração objetiva da excessiva onerosida<strong>de</strong><br />

advinda para o consumi<strong>do</strong>r. A <strong>de</strong>svalorização da moeda nacional frente à moeda estrangeira que serviu <strong>de</strong> parâmetro ao reajuste<br />

contratual, por ocasião da crise cambial <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1999, apresentou grau expressivo <strong>de</strong> oscilação, a ponto <strong>de</strong> caracterizar a<br />

onerosida<strong>de</strong> excessiva que impe<strong>de</strong> o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>de</strong> solver as obrigações pactuadas. A equação econômico-financeira <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser<br />

respeitada quan<strong>do</strong> o valor da parcela mensal sofre um reajuste que não é acompanha<strong>do</strong> pela correspon<strong>de</strong>nte valorização <strong>do</strong> bem da<br />

vida no merca<strong>do</strong>, haven<strong>do</strong> quebra da parida<strong>de</strong> contratual, à medida que apenas a instituição financeira está assegurada quanto aos<br />

riscos da variação cambial, pela prestação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r in<strong>de</strong>xada em dólar americano. É ilegal a transferência <strong>de</strong> risco da ativida<strong>de</strong><br />

financeira, no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> capitais, próprio das instituições <strong>de</strong> crédito, ao consumi<strong>do</strong>r, ainda mais que não observa<strong>do</strong> o seu direito <strong>de</strong><br />

informação (arts. 6°, III, 31, 51, XV, 52, 54, § 3º, <strong>do</strong> CDC). Incumbe à arrenda<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>sincumbir-se <strong>do</strong> ônus da prova <strong>de</strong> captação<br />

específica <strong>de</strong> recursos provenientes <strong>de</strong> empréstimo em moeda estrangeira, quan<strong>do</strong> impugnada a valida<strong>de</strong> da cláusula <strong>de</strong> correção pela<br />

variação cambial. Esta prova <strong>de</strong>ve acompanhar a contestação (art. 297 e 396 <strong>do</strong> CPC), uma vez que os negócios jurídicos entre a<br />

instituição financeira e o banco estrangeiro são alheios ao consumi<strong>do</strong>r, que não possui meios <strong>de</strong> averiguar as operações mercantis<br />

daquela, sob pena <strong>de</strong> violar o art. 6° da Lei 8.880/1994. Simples interpretação <strong>de</strong> cláusula contratual e reexame <strong>de</strong> prova não ensejam<br />

recurso especial” (STJ – Ag. Rg. no REsp 374.351/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – DJ 24.06.2002, p. 299).<br />

As ementas na linha exposta se suce<strong>de</strong>ram no STJ, afastan<strong>do</strong>-se da teoria da imprevisão (STJ – REsp 596.934/RJ – Terceira<br />

Turma – Rel. Min. Castro Filho – j. 14.06.2004 – DJ 01.07.2004, p. 193; STJ – AgRg no REsp 677.708/SP – Terceira Turma – Rel.<br />

Min. Ari Pargendler – j. 20.09.2005 – DJ 28.11.2005, p. 280; STJ – AgRg no REsp 586.314/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Barros<br />

Monteiro – j. 20.10.2005 – DJ 19.12.2005, p. 416; STJ – AgRg no REsp 437.317/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Paulo Furta<strong>do</strong>


(Desembarga<strong>do</strong>r Convoca<strong>do</strong> <strong>do</strong> TJBA) – j. 24.03.2009 – DJe 15.04.2009; e STJ – AgRg no REsp 976.578/SP – Terceira Turma –<br />

Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 06.08.2009 – DJe 19.08.2009). Curioso verificar que o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, nos acórdãos<br />

cita<strong>do</strong>s, tem dividi<strong>do</strong> a onerosida<strong>de</strong> excessiva <strong>de</strong> forma igualitária entre as partes – empresas <strong>de</strong> leasing e consumi<strong>do</strong>res –, tratan<strong>do</strong>as<br />

como iguais. Em outras palavras, o dólar é fixa<strong>do</strong> em um patamar médio. Nessa linha, cumpre transcrever ainda a seguinte<br />

ementa:<br />

“<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Leasing. Contrato com cláusula <strong>de</strong> correção atrelada à variação <strong>do</strong> dólar americano. Aplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Revisão da cláusula que prevê a variação cambial. Onerosida<strong>de</strong> excessiva. Distribuição <strong>do</strong>s ônus<br />

da valorização cambial entre arrendantes e arrendatários. Recurso parcialmente acolhi<strong>do</strong>. I. Segun<strong>do</strong> assentou a jurisprudência das<br />

Turmas que integram a Segunda Seção <strong>de</strong>sta Corte, os contratos <strong>de</strong> leasing submetem-se ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. II. A<br />

cláusula que atrela a correção das prestações à variação cambial não po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rada nula a priori, uma vez que a legislação<br />

específica permite que, nos casos em que a captação <strong>do</strong>s recursos da operação se dê no exterior, seja avença<strong>do</strong> o repasse <strong>de</strong>ssa<br />

variação ao toma<strong>do</strong>r <strong>do</strong> financiamento. III. Consoante o art. 6º, V, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, sobrevin<strong>do</strong>, na execução <strong>do</strong><br />

contrato, onerosida<strong>de</strong> excessiva para uma das partes, é possível a revisão da cláusula que gera o <strong>de</strong>sajuste, a fim <strong>de</strong> recompor o<br />

equilíbrio da equação contratual. IV. No caso <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> leasing atrela<strong>do</strong>s à variação cambial, os arrendatários, pela própria<br />

conveniência e a <strong>de</strong>speito <strong>do</strong> risco inerente, escolheram a forma contratual que no momento da realização <strong>do</strong> negócio lhes garantia<br />

prestações mais baixas, posto que o custo financeiro <strong>do</strong>s empréstimos em dólar era bem menor <strong>do</strong> que os custos em reais. A súbita<br />

alteração na política cambial, con<strong>de</strong>nsada na maxi<strong>de</strong>svalorização <strong>do</strong> real, ocorrida em janeiro <strong>de</strong> 1999, entretanto, criou a<br />

circunstância da onerosida<strong>de</strong> excessiva, a justificar a revisão judicial da cláusula que a instituiu. V. Conten<strong>do</strong> o contrato opção entre<br />

outro in<strong>de</strong>xa<strong>do</strong>r e a variação cambial e ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> consigna<strong>do</strong> que os recursos a serem utiliza<strong>do</strong>s tinham si<strong>do</strong> capta<strong>do</strong>s no exterior,<br />

geran<strong>do</strong> para a arrendante a obrigação <strong>de</strong> pagamento em dólar, enseja-se a revisão da cláusula <strong>de</strong> variação cambial com base no art.<br />

6º, V, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, para permitir a distribuição, entre arrendantes e arrendatários, <strong>do</strong>s ônus da modificação<br />

súbita da política cambial com a significativa valorização <strong>do</strong> dólar americano” (STJ – REsp 437.660/SP – Quarta Turma – Rel. Min.<br />

Sálvio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong> Teixeira – j. 08.04.2003 – DJ 05.05.2003, p. 306, RDDP, vol. 6, p. 111, RSTJ, vol. 168, p. 412).<br />

A encerrar o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> tema, esclareça-se que o presente autor não se filia a tais julgamentos, pois consumi<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>ras<br />

não estão em situação <strong>de</strong> igualda<strong>de</strong> para que o prejuízo seja distribuí<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma igualitária entre eles. Aplica-se a<br />

proporcionalida<strong>de</strong>, fundada em meros critérios objetivos, matemáticos. Porém, afasta-se da razoabilida<strong>de</strong>, baseada em critérios<br />

subjetivos, no bom-senso e na equida<strong>de</strong> <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>r. Em reforço, há violação da especialida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>corrência da máxima da isonomia,<br />

retirada <strong>do</strong> art. 5º, caput, da Constituição Fe<strong>de</strong>ral. Como se sabe, pelo preceito máximo <strong>de</strong> justiça, <strong>de</strong>ve-se tratar <strong>de</strong> maneira igual os<br />

iguais e <strong>de</strong> maneira <strong>de</strong>sigual os <strong>de</strong>siguais. Os julga<strong>do</strong>s <strong>de</strong>monstram como a incidência da pura proporcionalida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>sacompanhada<br />

da lógica <strong>do</strong> razoável, po<strong>de</strong> gerar <strong>de</strong>cisões injustas.<br />

5.3.<br />

A FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO E A NÃO VINCULAÇÃO DAS CLÁUSULAS<br />

DESCONHECIDAS E INCOMPREENSÍVEIS (ART. 46 DO CDC). A<br />

INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR (ART. 47 DO CDC)<br />

Não há dúvidas <strong>de</strong> que a função social <strong>do</strong>s contratos constitui uma festejada mudança que revolucionou o <strong>Direito</strong> Contratual<br />

Brasileiro, trazen<strong>do</strong> uma nova concepção <strong>do</strong> instituto, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com todas as tendências socializantes <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>. As mudanças<br />

trazidas pelo novo princípio são inafastáveis e in<strong>de</strong>clináveis, o que também atinge os contratos <strong>de</strong> consumo, como não po<strong>de</strong>ria ser<br />

diferente.<br />

Repise-se que, pelo princípio da função social <strong>do</strong> contrato, <strong>de</strong>ve-se interpretar e visualizar o contrato <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o meio que<br />

o cerca. O contrato não po<strong>de</strong> ser mais concebi<strong>do</strong> como uma bolha que envolve as partes, ou uma corrente que as aprisiona.<br />

Trazen<strong>do</strong> um senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> libertação negocial, a função social <strong>do</strong>s contratos funciona como uma agulha, forte e contun<strong>de</strong>nte, que fura<br />

a bolha; como uma chave que abre as correntes. Em senti<strong>do</strong> próximo, ensina Teresa Negreiros que “partimos da premissa <strong>de</strong> que a<br />

função social <strong>do</strong> contrato, quan<strong>do</strong> concebida como um princípio, antes <strong>de</strong> qualquer outro senti<strong>do</strong> e alcance que se lhe possa atribuir,<br />

significa muito simplesmente que o contrato não <strong>de</strong>ve ser concebi<strong>do</strong> como uma relação jurídica que só interessa às partes<br />

contratantes, impermeável às condicionantes sociais que o cercam e que são por ele próprio afetadas”.36<br />

Alguns <strong>do</strong>s coman<strong>do</strong>s relativos à proteção contratual <strong>do</strong> Código Consumerista trazem essa i<strong>de</strong>ia em mol<strong>de</strong>s perfeitos,<br />

mitigan<strong>do</strong> a força obrigatória da convenção, a antiga premissa liberal segun<strong>do</strong> o qual o contrato faz lei entre as partes (pacta sunt<br />

servanda). Não se po<strong>de</strong> aceitar o contrato da maneira como antes era consagra<strong>do</strong>; a socieda<strong>de</strong> mu<strong>do</strong>u, vivemos sob o <strong>do</strong>mínio <strong>do</strong><br />

capital, e com isso <strong>de</strong>ve mudar a maneira <strong>de</strong> ver e analisar os pactos, sobretu<strong>do</strong> os contratos <strong>de</strong> consumo.<br />

De início, o regramento em questão po<strong>de</strong> ser abstraí<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 46 da Lei 8.078/1990, segun<strong>do</strong> o qual “Os contratos que regulam<br />

as relações <strong>de</strong> consumo não obrigarão os consumi<strong>do</strong>res, se não lhes for dada a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tomar conhecimento prévio <strong>de</strong> seu<br />

conteú<strong>do</strong>, ou se os respectivos instrumentos forem redigi<strong>do</strong>s <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a dificultar a compreensão <strong>de</strong> seu senti<strong>do</strong> e alcance”.


A norma está a prever a não vinculação <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminadas cláusulas, que são consi<strong>de</strong>radas como não escritas ou inexistentes. Em<br />

um primeiro momento, resta claro que a opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r foi <strong>de</strong> tratar <strong>do</strong> plano da existência <strong>do</strong> negócio jurídico, pois o<br />

coman<strong>do</strong>, por si só, não estabelece a solução da invalida<strong>de</strong>. Todavia, po<strong>de</strong>-se interpretar pela nulida<strong>de</strong> das cláusulas <strong>de</strong> infringência<br />

ao preceito, conjugan<strong>do</strong>-se o art. 46 com o art. 51, inc. XV, da Lei 8.078/1990, que consagra como abusiva qualquer cláusula que<br />

esteja em <strong>de</strong>sacor<strong>do</strong> com o sistema <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Essa parece ser a melhor solução, pelos problemas que a<br />

inexistência po<strong>de</strong> gerar, já que a teoria da inexistência <strong>do</strong> negócio jurídico não foi a<strong>do</strong>tada expressamente pelo sistema civil<br />

brasileiro. Tal caminho, pela nulida<strong>de</strong> absoluta, por vezes é segui<strong>do</strong> pela jurisprudência nacional (nessa linha: TJMG – Apelação<br />

Cível 0770829-75.2008.8.13.0024, Belo Horizonte – Décima Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Sebastião Pereira <strong>de</strong> Souza – j.<br />

03.03.2011 – DJEMG 08.04.2011).<br />

Pois bem, aprofundan<strong>do</strong>-se na análise <strong>do</strong> art. 46 <strong>do</strong> CDC, para começar, são consi<strong>de</strong>radas como não vinculativas as cláusulas<br />

<strong>de</strong>sconhecidas, ou que o consumi<strong>do</strong>r não teve a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecer, haven<strong>do</strong> a chamada violação <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> oportunizar.37<br />

A origem da previsão está na vedação da chamada condição puramente potestativa, aquela que representa a vonta<strong>de</strong> ou o puro<br />

arbítrio <strong>de</strong> apenas uma das partes, consi<strong>de</strong>rada ilícita pelo art. 122 <strong>do</strong> CC/2002.<br />

Ilustran<strong>do</strong> a incidência <strong>de</strong>ssa primeira parte <strong>do</strong> art. 46 <strong>do</strong> CDC, o consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve ter o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> conhecimento prévio a respeito<br />

da taxa <strong>de</strong> juros estipulada no contrato bancário ou financeiro, sob pena <strong>de</strong> sua não incidência (com gran<strong>de</strong> repetição no Tribunal<br />

Paulista e mesmo relator, por to<strong>do</strong>s: TJSP – Apelação 9216881-08.2006.8.26.0000 – Acórdão 5042241, São Paulo – Vigésima<br />

Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Sérgio Shimura – j. 30.03.2011 – DJESP 14.04.2011; TJSP – Apelação 9182798-<br />

29.2007.8.26.0000 – Acórdão 5042265, São Paulo – Vigésima Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Sérgio Shimura – j.<br />

30.03.2011 – DJESP 14.04.2011). Na verda<strong>de</strong>, o que ocorre muitas vezes na prática com os negócios bancários é que o consumi<strong>do</strong>r<br />

sequer tem o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> conhecimento <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> contrato manti<strong>do</strong> com a instituição financeira, pois não lhe é dada a <strong>de</strong>vida<br />

oportunida<strong>de</strong> para tanto.<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> ilustração, no caso <strong>de</strong> um contrato <strong>de</strong> seguro <strong>de</strong> vida, a cláusula limitativa <strong>de</strong> direitos <strong>de</strong>ve ser comunicada<br />

previamente e em termos claros e ostensivos, sob pena <strong>de</strong> sua não vinculação. Nessa linha, <strong>do</strong> Tribunal Paulista:<br />

“Seguro <strong>de</strong> vida e aci<strong>de</strong>ntes pessoais. Ação <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Cláusula com exclusão <strong>de</strong> cobertura em caso <strong>de</strong> separação<br />

judicial ou divórcio <strong>do</strong> casal. Morte. Separação judicial anterior. Desconhecimento prévio <strong>de</strong> cláusula limitativa. CDC, art. 46. Boafé<br />

e <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informação (CDC, art. 30). In<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>vida. Recurso provi<strong>do</strong>. É <strong>de</strong>vida a in<strong>de</strong>nização pelo falecimento <strong>do</strong> excônjuge<br />

<strong>do</strong> segura<strong>do</strong>, ainda que o sinistro tenha ocorri<strong>do</strong> após a separação judicial <strong>do</strong> casal, se o segura<strong>do</strong> não tinha ciência <strong>de</strong><br />

cláusula limitativa da cobertura. Nos contratos <strong>de</strong> consumo, eventual limitação <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve constar <strong>de</strong> forma clara e<br />

com <strong>de</strong>staque e, obviamente, ser entregue ao consumi<strong>do</strong>r no ato da contratação, sob pena <strong>de</strong> não obrigar o contratante (CDC, art. 46).<br />

Cabe à segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>monstrar prévia disponibilização ao segura<strong>do</strong> da apólice e das condições gerais <strong>do</strong> seguro, nos termos <strong>do</strong> art. 6º,<br />

VIII <strong>do</strong> CDC” (TJSP – Apelação 9082668-60.2009.8.26.0000 – Acórdão 5010702, Araras – Trigésima Quinta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong><br />

Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Clóvis Castelo – j. 21.03.2011 – DJESP 31.03.2011).<br />

Pelo mesmo caminho, <strong>do</strong> STJ, tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> caso relativo à exclusão da garantia <strong>do</strong> seguro em caso <strong>de</strong> embriaguez <strong>do</strong> motorista:<br />

“Recurso especial. In<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> seguro <strong>de</strong> vida. Aci<strong>de</strong>nte automobilístico. Embriaguez. Cláusula limitativa <strong>de</strong> cobertura<br />

da qual não foi da<strong>do</strong> o perfeito conhecimento ao segura<strong>do</strong>. Abusivida<strong>de</strong>. Infringência ao art. 54, § 4º <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. Recurso especial provi<strong>do</strong>. 1. Por se tratar <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo, a eventual limitação <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<br />

constar, <strong>de</strong> forma clara e com <strong>de</strong>staque, nos mol<strong>de</strong>s <strong>do</strong> art. 54, § 4º <strong>do</strong> CODECON e, obviamente, ser entregue ao consumi<strong>do</strong>r no ato<br />

da contratação, não sen<strong>do</strong> admitida a entrega posterior. 2. No caso concreto, surge incontroverso que o <strong>do</strong>cumento que integra o<br />

contrato <strong>de</strong> seguro <strong>de</strong> vida não foi apresenta<strong>do</strong> por ocasião da contratação, além <strong>do</strong> que a cláusula restritiva constou tão somente <strong>do</strong><br />

‘manual <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>’, envia<strong>do</strong> após a assinatura da proposta. Portanto, configurada a violação ao art. 54, § 4º <strong>do</strong> CDC. 3. Nos termos<br />

<strong>do</strong> art. 46 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r: ‘Os contratos que regulam as relações <strong>de</strong> consumo não obrigarão os consumi<strong>do</strong>res,<br />

se não lhes for dada a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tomar conhecimento prévio <strong>de</strong> seu conteú<strong>do</strong>, ou se os respectivos instrumentos forem<br />

redigi<strong>do</strong>s <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a dificultar a compreensão <strong>de</strong> seu senti<strong>do</strong> e alcance’. 4. Deve ser afastada a multa aplicada com apoio no art. 538,<br />

parágrafo único <strong>do</strong> CPC, pois não são protelatórios os embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração opostos com fins <strong>de</strong> prequestionamento. 5. Recurso<br />

especial provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1.219.406/MG – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 15.02.2011 – DJe 18.02.2011).<br />

Seguin<strong>do</strong> no estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> tema, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> não vinculam o consumi<strong>do</strong>r as cláusulas incompreensíveis ou ininteligíveis,<br />

geralmente diante <strong>de</strong> um sério problema <strong>de</strong> redação, que visa a enganar o consumi<strong>do</strong>r. A não vinculação <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> um <strong>do</strong>lo<br />

contratual pratica<strong>do</strong> pelo fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r, via <strong>de</strong> regra com o claro intuito <strong>de</strong> induzir o consumi<strong>do</strong>r a erro e obter um<br />

enriquecimento sem causa. A título <strong>de</strong> exemplo, muitas vezes verifica-se em contratos <strong>de</strong> seguro cláusulas mal escritas ou mal<br />

elaboradas, <strong>de</strong> difícil entendimento até pelo mais experiente aplica<strong>do</strong>r <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>, por utilizar expressões técnicas da área jurídica ou<br />

<strong>de</strong> gerenciamento <strong>de</strong> riscos. Em casos tais, tem-se entendi<strong>do</strong> que, se o conjunto probatório da <strong>de</strong>manda evi<strong>de</strong>nciar a inexatidão das<br />

informações apresentadas, no ato da contratação, pois a proposta não traz informação precisa e clara a respeito das limitações <strong>de</strong>


cobertura, há violação <strong>do</strong> art. 46 <strong>do</strong> CDC (TJSP – Apelação 0001976-43.2005.8.26.0624 – Acórdão 4980354, Tatuí – Nona Câmara<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Grava Brasil – j. 01.03.2011 – DJESP 23.03.2011).<br />

As cláusulas contratuais <strong>de</strong>vem ser elaboradas para a <strong>de</strong>vida compreensão pelo brasileiro médio (pessoa natural comum).<br />

Assim sen<strong>do</strong>, diante da realida<strong>de</strong> cultural brasileira, os termos <strong>de</strong>vem ser simples, sem gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>safios em sua leitura e<br />

compreensão, sob pela <strong>de</strong> sua não vinculação ou a cabível solução <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> absoluta, conforme outrora se expôs. A concretizar<br />

tal importante premissa socializante, o Tribunal <strong>de</strong> Minas Gerais <strong>de</strong>duziu que “Aplica-se o art. 46 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r para afastar, em contrato <strong>de</strong> seguro, cláusula <strong>de</strong> exclusão <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> instalação elétrica que tenha<br />

provoca<strong>do</strong> sinistro, por se tratar <strong>de</strong> disposição capciosa, que dificulta a compreensão <strong>do</strong> seu senti<strong>do</strong> e alcance. A queima da central<br />

eletrônica <strong>de</strong> controle <strong>do</strong> sistema injetor <strong>de</strong> combustível (módulo) é um <strong>de</strong>feito, uma avaria em peça <strong>do</strong> veículo. O curto circuito até<br />

po<strong>de</strong> ser causa <strong>de</strong> um incêndio, mas se os seus efeitos ficarem limita<strong>do</strong>s à peça não se po<strong>de</strong> falar na ocorrência <strong>de</strong> um incêndio.<br />

(…)” (TJMG – Apelação Cível 1.0525.08.133576-8/0011, Pouso Alegre – Décima Terceira Câmara Cível – Rel. Des. Luiz Carlos<br />

Gomes da Mata – j. 16.04.2009 – DJEMG 11.05.2009).<br />

Existe no art. 46 <strong>do</strong> CDC um ponto <strong>de</strong> simbiose entre o princípio da boa-fé objetiva e a função social <strong>do</strong> contrato, a mitigar a<br />

força obrigatória da convenção. Isso porque o <strong>de</strong>srespeito ao <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar com clareza gera como consequência a interpretação<br />

<strong>do</strong> pacto <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a realida<strong>de</strong> social, afastan<strong>do</strong> aquilo que aparentemente foi convenciona<strong>do</strong> entre as partes. Em outras<br />

palavras, o concreto e o efetivo prevalecem sobre o meramente formal, tendência <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Civil Contemporâneo.<br />

Superada a análise <strong>de</strong>sse importante coman<strong>do</strong>, o art. 47 da Lei 8.078/1990 consagra a máxima in dubio pro consumi<strong>do</strong>r, ao<br />

preconizar que “As cláusulas contratuais serão interpretadas <strong>de</strong> maneira mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r”. Aqui, o princípio da<br />

função social <strong>do</strong> contrato, em sua eficácia interna, é flagrante pela preocupação em se proteger o consumi<strong>do</strong>r como parte vulnerável<br />

da relação negocial, o que repercute na hermenêutica <strong>do</strong> negócio jurídico. Nesse senti<strong>do</strong>, mencionan<strong>do</strong> a interação entre a regra e o<br />

princípio, da recente jurisprudência paulista:<br />

“Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Obrigação <strong>de</strong> fazer. Negativa <strong>de</strong> atendimento quanto à realização <strong>do</strong> tratamento <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> ‘oxigenoterapia em<br />

câmara hiperbárica’, sob alegação <strong>de</strong> se tratar <strong>de</strong> tratamento sem aprovação da ANS e estar excluí<strong>do</strong> <strong>do</strong> contrato. Abusivida<strong>de</strong>.<br />

Tratamento aprova<strong>do</strong> pela comunida<strong>de</strong> médica. Parte integrante <strong>do</strong> tratamento <strong>de</strong>manda<strong>do</strong> pelo autor. Incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e da Lei 9.656/1998. Presente o princípio da vulnerabilida<strong>de</strong> emergente <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

O contrato <strong>de</strong> consumo, como o <strong>de</strong> seguro individual <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, típicos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, <strong>de</strong>vem ser interpreta<strong>do</strong>s <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> favorável ao<br />

a<strong>de</strong>rente (CDC, art. 47) aten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> à função social <strong>do</strong> contrato. Reconhecida a abusivida<strong>de</strong> na exclusão <strong>do</strong> tratamento. Mantida a<br />

sentença <strong>de</strong> procedência. Recurso improvi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação 0003799-67.2009.8.26.0024 – Acórdão 4992907, Andradina –<br />

Quinta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. James Siano – j. 02.03.2011 – DJESP 20.04.2011).<br />

Atente-se ao fato <strong>de</strong> ter o Código Civil <strong>de</strong> 2002 a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> a mesma premissa para o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, dispon<strong>do</strong> o seu art. 423<br />

que “Quan<strong>do</strong> houver no contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são cláusulas ambíguas ou contraditórias, <strong>de</strong>ver-se-á a<strong>do</strong>tar a interpretação mais favorável<br />

ao a<strong>de</strong>rente”. Consubstancia a norma a regra in dubio pro a<strong>de</strong>rente, interpretan<strong>do</strong>-se o negócio jurídico em <strong>de</strong>sfavor <strong>do</strong> seu<br />

estipulante (interpretatio contra stipulatorem). Como bem aponta Ezequiel Morais, a tendência mundial, seja nos países que<br />

seguem o mo<strong>de</strong>lo romano-germânico ou naqueles <strong>do</strong> tronco anglo-saxão, é justamente a <strong>de</strong> interpretar os contratos em <strong>de</strong>sfavor da<br />

parte que tem o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> impor o seu conteú<strong>do</strong>. Cita o <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>r, por oportuno, que a mesma premissa hermenêutica po<strong>de</strong> ser<br />

encontrada no Código Italiano <strong>de</strong> Consumo (art. 35), no Código <strong>de</strong> Consumo Francês (art. L 133.2) e no Código Argentino <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r (art. 3º).38<br />

Pois bem, na realida<strong>de</strong> jurídica brasileira, pela teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes, sen<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> consumo e <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são ao mesmo<br />

tempo, subsumem-se os <strong>do</strong>is preceitos, conforme reconheci<strong>do</strong> pelos acórdãos a seguir:<br />

“Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Danos morais e materiais. Contrato <strong>de</strong> seguro. Pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> transporte aéreo nega<strong>do</strong>. Cobertura <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>nte<br />

pessoal. Cláusulas contraditórias. Interpretação mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r-a<strong>de</strong>rente. Aplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. Art. 47 <strong>do</strong> CDC e art. 423 <strong>do</strong> CC. Dano material <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>. Juros <strong>de</strong> mora, a partir da citação. Correção monetária, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />

efetivo <strong>de</strong>sembolso. Dano moral. Não configura<strong>do</strong>. Sentença parcialmente reformada. A interpretação dada às cláusulas <strong>de</strong> um<br />

contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, em caso <strong>de</strong> dúvida, <strong>de</strong>ve ocorrer <strong>de</strong> forma mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r-a<strong>de</strong>rente, parte mais fraca da relação,<br />

tentan<strong>do</strong>-se extrair <strong>de</strong>las a maior utilida<strong>de</strong> possível, à luz da norma prevista no art. 47 <strong>do</strong> CDC e no art. 423 <strong>do</strong> CC. O contrato <strong>de</strong><br />

seguro não po<strong>de</strong> ficar adstrito ao pagamento <strong>de</strong> uma in<strong>de</strong>nização, mas também, e primordialmente, em prestar uma garantia e<br />

segurança ao segura<strong>do</strong>. O termo a quo <strong>do</strong>s juros <strong>de</strong> mora e da correção monetária no valor <strong>do</strong> dano material <strong>de</strong>ve ocorrer,<br />

respectivamente, a partir da citação e <strong>do</strong> efetivo <strong>de</strong>sembolso. A situação apresentada nos autos cinge-se a um mero dissabor,<br />

aborrecimento, não sen<strong>do</strong> capaz <strong>de</strong> causar um <strong>de</strong>sequilíbrio psicológico <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>, razão pela qual não há que se falar no instituto<br />

<strong>do</strong> dano moral” (TJMG – Apelação Cível 1.0024.07.463173-0/0011, Belo Horizonte – Décima Sexta Câmara Cível – Rel. Des.<br />

Nicolau Masselli – j. 15.04.2009 – DJEMG 29.05.2009).<br />

“Apelação cível. Título <strong>de</strong> capitalização. Resgate antecipa<strong>do</strong>. Cláusulas ambíguas. I. Quan<strong>do</strong> ocorre o resgate antecipa<strong>do</strong> <strong>de</strong> título <strong>de</strong>


capitalização, <strong>de</strong>vem ser atendidas as disposições contratuais no senti<strong>do</strong> da aplicação <strong>de</strong> redutor previsto no contrato, quan<strong>do</strong> este se<br />

mostrar razoável e não atentar contra os princípios insculpi<strong>do</strong>s no Código Consumerista e no Código Civil. II. Constan<strong>do</strong> <strong>do</strong> contrato<br />

cláusulas ambíguas ou contraditórias, estas <strong>de</strong>vem ser interpretadas da forma mais favorável ao a<strong>de</strong>rente, nos termos <strong>do</strong> art. 47 <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e art. 423 <strong>do</strong> CC. III. Sen<strong>do</strong> atendi<strong>do</strong> em parte, embora mínima, o pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> autor, verificada está<br />

a parcial procedência da ação, permanecen<strong>do</strong> a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> <strong>de</strong>mandante ao pagamento da totalida<strong>de</strong> das custas e honorários<br />

advocatícios à parte contrária, em face da sucumbência mínima <strong>de</strong>sta. Apelo parcialmente provi<strong>do</strong>” (TJRS – Apelação Cível<br />

70006779292, Porto Alegre – Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Ney Wie<strong>de</strong>mann Neto – j. 30.06.2004).<br />

De toda sorte, como se verá mais à frente, o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são não necessariamente é um contrato <strong>de</strong> consumo, hipótese em<br />

que terá incidência apenas o coman<strong>do</strong> da codificação geral privada. Por outra via, o que é mais raro, nem sempre o contrato <strong>de</strong><br />

consumo é <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, aplican<strong>do</strong>-se apenas o CDC em hipóteses tais. Esse ponto <strong>de</strong> divergência entre os <strong>do</strong>is preceitos <strong>de</strong>ve ser<br />

observa<strong>do</strong>, em relação às suas abrangências.<br />

Voltan<strong>do</strong>-se ao art. 47 <strong>do</strong> CDC, imagine-se a contratação <strong>de</strong> um serviço <strong>de</strong> conserto <strong>de</strong> um encanamento, em que o contrato<br />

traz expressamente <strong>do</strong>is preços, um fixo e um <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a extensão <strong>do</strong> trabalho <strong>do</strong> encana<strong>do</strong>r. Diante da presunção absoluta <strong>de</strong><br />

vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, valerá a menor remuneração, o que não comporta qualquer <strong>de</strong>bate ou discussão para afastar a<br />

premissa.<br />

Em outro caso prático interessante, a jurisprudência paulista interpretou um compromisso <strong>de</strong> compra e venda da maneira mais<br />

favorável ao compromissário compra<strong>do</strong>r, a afastar o pagamento <strong>de</strong> valor residual calcula<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma unilateral pelo promitente<br />

ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r, pela não possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o presta<strong>do</strong>r surpreen<strong>de</strong>r o consumi<strong>do</strong>r com algo não espera<strong>do</strong> (vedação da surpresa). Vejamos<br />

a ementa da <strong>de</strong>cisão:<br />

“Ação <strong>de</strong> adjudicação compulsória. Promitente compra<strong>do</strong>r preten<strong>de</strong> adjudicação <strong>de</strong> imóvel após pagamento <strong>de</strong> número <strong>de</strong> prestações<br />

previsto contratualmente. Promitente ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r opõe resíduo <strong>de</strong> preço. Prestações calculadas pelo próprio promitente ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r.<br />

Recibos apontavam número da prestação e total <strong>de</strong> prestações por pagar. Comportamento <strong>do</strong> promitente ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r alimentou justa<br />

expectativa <strong>do</strong> promitente compra<strong>do</strong>r <strong>de</strong> que quitação adviria <strong>do</strong> pagamento <strong>do</strong> número <strong>de</strong> prestações. Dever <strong>de</strong> lealda<strong>de</strong> e não<br />

surpresa, <strong>de</strong>riva<strong>do</strong>s <strong>do</strong> princípio da boa- fé (art. 4º, inc. III <strong>do</strong> CDC). Contrato interpreta<strong>do</strong> mais favoravelmente ao promitente<br />

compra<strong>do</strong>r (art. 47 <strong>do</strong> CDC). Prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> TJSP. Adjudicação cabível. Recurso improvi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação 9214340-<br />

36.2005.8.26.0000 – Acórdão 5049061, Poá – Sétima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Luiz Antonio Costa – j. 06.04.2011 –<br />

DJESP 18.04.2011).<br />

Nos contratos <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, como outrora já se <strong>de</strong>monstrou, vários são os julga<strong>do</strong>s que aplicam a premissa in dubio pro<br />

consumi<strong>do</strong>r para abranger coberturas negadas injustificadamente pelas presta<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> serviço <strong>de</strong> seguro. A propósito, trazen<strong>do</strong> essa<br />

interpretação favorável ao consumi<strong>do</strong>r-segura<strong>do</strong>, na VII Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral em<br />

2015, aprovou-se enuncia<strong>do</strong> segun<strong>do</strong> o qual “impõe-se o pagamento <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização <strong>do</strong> seguro mesmo diante <strong>de</strong> condutas, omissões<br />

ou <strong>de</strong>clarações ambíguas <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> que não guar<strong>de</strong>m relação com o sinistro” (Enuncia<strong>do</strong> n. 585).<br />

Pois bem, um <strong>do</strong>s temas <strong>de</strong> maior discussão prática refere-se à cobertura relativa ao stent, aparelho utiliza<strong>do</strong> após as cirurgias<br />

<strong>do</strong> coração para garantir o seu pleno funcionamento, visan<strong>do</strong> a afastar o entupimento <strong>de</strong> suas veias. Por to<strong>do</strong>s os acórdãos, vejamos<br />

duas ementas, com menções expressas ao art. 47 <strong>do</strong> CDC e conteú<strong>do</strong> impecável:<br />

“Apelação. Incidência <strong>do</strong> CDC. Prótese necessária à cirurgia <strong>de</strong> angioplastia. Ilegalida<strong>de</strong> da exclusão <strong>de</strong> stents da cobertura<br />

securitária. Cláusula obscura. As disposições <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r são aplicadas nas relações contratuais mantidas<br />

junto a opera<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. De acor<strong>do</strong> com o art. 47 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r as cláusulas redigidas <strong>de</strong> forma<br />

a dificultar o entendimento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>vem ser interpretadas da maneira mais favorável a este. O stent não tem função <strong>de</strong><br />

substituir total ou parcialmente quaisquer órgãos, servin<strong>do</strong> apenas <strong>de</strong> reforço ao órgão afeta<strong>do</strong> que exija cirurgia, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong>,<br />

portanto, ser caracteriza<strong>do</strong> como uma prótese” (TJMG – Apelação Cível 2949590-11.2009.8.13.0105, Governa<strong>do</strong>r Valadares –<br />

Décima Quinta Câmara Cível – Rel. Des. Tibúrcio Marques – j. 14.01.2011 – DJEMG 02.02.2011).<br />

“Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Implantação <strong>de</strong> stent. Alegação da segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> que se trata <strong>de</strong> uma prótese, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> incidir a exclusão existente<br />

no contrato efetiva<strong>do</strong> pelas partes [art. 8º]. Inadmissibilida<strong>de</strong>. Exclusão que contraria a função social <strong>do</strong> contrato [art. 421 <strong>do</strong> CC],<br />

retiran<strong>do</strong> <strong>do</strong> paciente a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sobrevida com dignida<strong>de</strong>. Inexistência <strong>de</strong> comprovação pela segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> que ofertou<br />

condições acessíveis para que o autor migrasse ao novo plano [sem restrições <strong>de</strong> qualquer espécie], adapta<strong>do</strong> aos termos da Lei<br />

9.656/1998. Intervenção <strong>do</strong> Judiciário para <strong>de</strong>cidir em favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r i<strong>do</strong>so [art. 47, da Lei 8.078/1990], obrigan<strong>do</strong> a AMIL a<br />

reembolsar os custos <strong>do</strong> procedimento, sem cabimento, contu<strong>do</strong>, <strong>de</strong> danos morais na espécie. Não provimento <strong>do</strong>s recursos” (TJSP –<br />

Apelação 990.10.208879-0 – Acórdão 4590510, São Paulo – Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Ênio Santarelli Zuliani –<br />

j. 24.06.2010 – DJESP 22.07.2010).<br />

Não se po<strong>de</strong> negar que, presente tal negativa ao STENT, <strong>de</strong>ve o segura<strong>do</strong> ser in<strong>de</strong>niza<strong>do</strong> pelos danos morais sofri<strong>do</strong>s, diante da<br />

clara lesão ao direito fundamental à saú<strong>de</strong>. Por bem, tal solução vem sen<strong>do</strong> a<strong>do</strong>tada pela jurisprudência superior, em importante


conclusão sociológica (por to<strong>do</strong>s: STJ – AgRg no REsp 1.235.440/RS – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – Quarta Turma – j.<br />

05.09.2013 – DJe 16.09.2013; AgRg no AREsp 102.550/PE – Rel. Min. Maria Isabel Gallotti – Quarta Turma – j. 06.08.2013 –<br />

DJe 16.08.2013 e REsp 1.364.775/MG – Rel. Min. Nancy Andrighi – Terceira Turma – j. 20.06.2013 – DJe 28.06.2013).<br />

Seguin<strong>do</strong> nas ilustrações, ainda <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, na mesma linha <strong>de</strong> justa <strong>de</strong>cisão, conclui-se pela presença <strong>de</strong><br />

cobertura relativa ao marca-passo em instrumento com cláusula <strong>de</strong>masiadamente ampla, aplican<strong>do</strong>-se a justiça esperada:<br />

“Agravo regimental. Seguro. Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Negativa <strong>de</strong> prestação jurisdicional. Não ocorrência. Fornecimento <strong>de</strong> marca-passo.<br />

Cláusula ampla. Interpretação favorável ao consumi<strong>do</strong>r. Art. 47 <strong>do</strong> CDC. Fundamento inataca<strong>do</strong>. Súmula STF/283. I. Ten<strong>do</strong><br />

encontra<strong>do</strong> motivação suficiente para fundar a <strong>de</strong>cisão, não fica o Órgão julga<strong>do</strong>r obriga<strong>do</strong> a respon<strong>de</strong>r, um a um, os<br />

questionamentos suscita<strong>do</strong>s pelas partes, mormente se notório seu propósito <strong>de</strong> infringência <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>. II. Examinan<strong>do</strong> o contrato<br />

firma<strong>do</strong> entre as partes concluiu o Colegia<strong>do</strong> estadual que o fornecimento <strong>de</strong> marcapasso não estaria excluí<strong>do</strong> <strong>de</strong> cobertura. Isso<br />

porque, tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> cláusula <strong>de</strong>masiadamente ampla, inserida em contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, sua interpretação <strong>de</strong>veria ser feita da maneira<br />

mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r, em consonância com o art. 47 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. III. Esse fundamento, suficiente,<br />

por si só, para manter a conclusão <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>, não foi impugna<strong>do</strong> nas razões <strong>do</strong> especial, atrain<strong>do</strong>, à hipótese, a aplicação da Súmula<br />

283 <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral. Agravo improvi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg-Ag 1.002.040/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Sidnei Beneti –<br />

j. 19.06.2008 – DJe 01.07.2008).<br />

Na mesma esteira, <strong>de</strong>duz o Tribunal da Cidadania que é abusiva a negativa <strong>do</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> em cobrir as <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong><br />

intervenção cirúrgica <strong>de</strong> gastroplastia, necessária à garantia da sobrevivência <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> acometi<strong>do</strong> por obesida<strong>de</strong> mórbida.<br />

Conforme po<strong>de</strong> ser retira<strong>do</strong> <strong>de</strong> aresto publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 510, “a gastroplastia, indicada para o tratamento da obesida<strong>de</strong><br />

mórbida, bem como <strong>de</strong> outras <strong>do</strong>enças <strong>de</strong>la <strong>de</strong>rivadas, constitui cirurgia essencial à preservação da vida e da saú<strong>de</strong> <strong>do</strong> paciente<br />

segura<strong>do</strong>, não se confundin<strong>do</strong> com simples tratamento para emagrecimento. Os contratos <strong>de</strong> seguro-saú<strong>de</strong> são contratos <strong>de</strong> consumo<br />

submeti<strong>do</strong>s a cláusulas contratuais gerais, ocorren<strong>do</strong> a sua aceitação por simples a<strong>de</strong>são pelo segura<strong>do</strong>. Nesses contratos, as<br />

cláusulas seguem as regras <strong>de</strong> interpretação <strong>do</strong>s negócios jurídicos estandardiza<strong>do</strong>s, ou seja, existin<strong>do</strong> cláusulas ambíguas ou<br />

contraditórias, <strong>de</strong>ve ser aplicada a interpretação mais favorável ao a<strong>de</strong>rente, conforme o art. 47 <strong>do</strong> CDC. Assim, a cláusula<br />

contratual <strong>de</strong> exclusão da cobertura securitária para casos <strong>de</strong> tratamento estético <strong>de</strong> emagrecimento prevista no contrato <strong>de</strong> segurosaú<strong>de</strong><br />

não abrange a cirurgia para tratamento <strong>de</strong> obesida<strong>de</strong> mórbida. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: REsp 1.175.616/MT, DJe 4/3/2011; AgRg<br />

no AREsp 52.420/MG, DJe 12/12/2011; REsp 311.509/SP, DJ 25/6/2001, e REsp 735.750/SP, DJe 16/2/2012” (STJ – REsp<br />

1.249.701/SC – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 04.12.2012).<br />

Em senti<strong>do</strong> próximo, <strong>do</strong> mesmo Tribunal Superior, presentes divergências entre os <strong>do</strong>cumentos entregues ao segura<strong>do</strong>,<br />

enten<strong>de</strong>u-se pela prevalência da cobertura <strong>do</strong> seguro por invali<strong>de</strong>z em valor superior, por ser a interpretação mais benéfica ao<br />

segura<strong>do</strong>-consumi<strong>do</strong>r. Na espécie, aplicou-se ainda o art. 46 <strong>do</strong> CDC, por último estuda<strong>do</strong>, em interação efetiva com o art. 47 da<br />

mesma norma:<br />

“<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Contrato <strong>de</strong> seguro. Invali<strong>de</strong>z permanente. Valor da in<strong>de</strong>nização. Divergência entre os <strong>do</strong>cumentos<br />

entregues ao segura<strong>do</strong>. Prevalência <strong>do</strong> entregue quan<strong>do</strong> da contratação. Cláusula limitativa da cobertura. Não incidência. Arts. 46 e<br />

47 da Lei 8.078/1990. Doutrina. Prece<strong>de</strong>nte. Recurso provi<strong>do</strong>. I. Haven<strong>do</strong> divergência no valor in<strong>de</strong>nizatório a ser pago entre os<br />

<strong>do</strong>cumentos emiti<strong>do</strong>s pela segura<strong>do</strong>ra, <strong>de</strong>ve prevalecer aquele entregue ao consumi<strong>do</strong>r quan<strong>do</strong> da contratação (‘certifica<strong>do</strong><br />

individual’), e não o envia<strong>do</strong> posteriormente, em que consta cláusula restritiva (condições gerais). II. Nas relações <strong>de</strong> consumo, o<br />

consumi<strong>do</strong>r só se vincula às disposições contratuais em que, previamente, lhe é dada a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prévio conhecimento, nos<br />

termos <strong>do</strong> art. 46 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. III. As informações prestadas ao consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>vem ser claras e precisas, <strong>de</strong><br />

mo<strong>do</strong> a possibilitar a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolha na contratação <strong>de</strong> produtos e serviços. A<strong>de</strong>mais, na linha <strong>do</strong> art. 54, § 4º da Lei<br />

8.078/1990, <strong>de</strong>vem ser redigidas em <strong>de</strong>staque as cláusulas que importem em exclusão ou restrição <strong>de</strong> direitos” (STJ – REsp<br />

485760/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. Sálvio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong> Teixeira – j. 17.06.2003 – DJU 01.03.2004, p. 186).<br />

Merece <strong>de</strong>staque, igualmente, o julgamento superior que interpretou extensivamente cláusula <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, a<br />

fim <strong>de</strong> incluir filho da segurada <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, abarcan<strong>do</strong> também a tutela da família constante <strong>do</strong> art. 226 da Constituição Fe<strong>de</strong>ral.<br />

Nos termos da publicação constante <strong>do</strong> Informativo n. 520 <strong>do</strong> STJ, “no caso em que o contrato <strong>de</strong> seguro <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> preveja<br />

automática cobertura para <strong>de</strong>terminadas lesões que acometam o filho <strong>de</strong> ‘segurada’ nasci<strong>do</strong> durante a vigência <strong>do</strong> pacto, <strong>de</strong>ve ser<br />

garantida a referida cobertura, não apenas ao filho da ‘segurada titular’, mas também ao filho <strong>de</strong> ‘segurada <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte’. Tratan<strong>do</strong>se,<br />

nessa hipótese, <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo instrumentalizada por contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, as cláusulas contratuais, redigidas pela própria<br />

segura<strong>do</strong>ra, <strong>de</strong>vem ser interpretadas da forma mais favorável à outra parte, que figura como consumi<strong>do</strong>ra a<strong>de</strong>rente, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o<br />

que dispõe o art. 47 <strong>do</strong> CDC. Assim, <strong>de</strong>ve-se enten<strong>de</strong>r que a expressão ‘segurada’ abrange também a ‘segurada <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte’, não se<br />

restringin<strong>do</strong> à ‘segurada titular’. Com efeito, caso a segura<strong>do</strong>ra preten<strong>de</strong>sse restringir o campo <strong>de</strong> abrangência da cláusula<br />

contratual, haveria <strong>de</strong> especificar ser esta aplicável apenas à titular <strong>do</strong> seguro contrata<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1.133.338/SP – Rel. Min.<br />

Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 02.04.2013).


Também <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>stacada a conclusão <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> interpretar o contrato <strong>de</strong> seguro-saú<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

maneira mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> a cobertura por tratamentos experimentais existentes no País, especialmente<br />

quan<strong>do</strong> houver risco <strong>de</strong> vida ao segura<strong>do</strong>. Nos termos da publicação constante <strong>do</strong> Informativo n. 551 da Corte, “a segura<strong>do</strong>ra ou<br />

opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve custear tratamento experimental existente no País, em instituição <strong>de</strong> reputação científica<br />

reconhecida, <strong>de</strong> <strong>do</strong>ença listada na CID-OMS, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que haja indicação médica para tanto, e os médicos que acompanhem o quadro<br />

clínico <strong>do</strong> paciente atestem a ineficácia ou a insuficiência <strong>do</strong>s tratamentos indica<strong>do</strong>s convencionalmente para a cura ou controle<br />

eficaz da <strong>do</strong>ença. Cumpre esclarecer que o art. 12 da Lei 9.656/1998 estabelece as coberturas mínimas que <strong>de</strong>vem ser garantidas aos<br />

segura<strong>do</strong>s e beneficiários <strong>do</strong>s planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Nesse senti<strong>do</strong>, as opera<strong>do</strong>ras são obrigadas a cobrir os tratamentos e serviços<br />

necessários à busca da cura ou controle da <strong>do</strong>ença apresentada pelo paciente e listada na Classificação Estatística Internacional <strong>de</strong><br />

Doenças e Problemas Relaciona<strong>do</strong>s com a Saú<strong>de</strong>, da Organização Mundial <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> (CID-OMS). (…). Desse mo<strong>do</strong>, o tratamento<br />

experimental, por força <strong>de</strong> sua recomendada utilida<strong>de</strong>, embora eventual, transmuda-se em tratamento mínimo a ser garanti<strong>do</strong> ao<br />

paciente, escopo da Lei 9.656/1998, como se vê nos cita<strong>do</strong>s arts. 10 e 12. Isto é, nas situações em que os tratamentos convencionais<br />

não forem suficientes ou eficientes – fato atesta<strong>do</strong> pelos médicos que acompanham o quadro clínico <strong>do</strong> paciente –, existin<strong>do</strong> no País<br />

tratamento experimental, em instituição <strong>de</strong> reputação científica reconhecida, com indicação para a <strong>do</strong>ença, a segura<strong>do</strong>ra ou<br />

opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>ve arcar com os custos <strong>do</strong> tratamento, na medida em que passa a ser o único <strong>de</strong> real interesse para o contratante. Assim,<br />

a restrição contida no art. 10, I, da Lei 9.656/1998 somente <strong>de</strong>ve ter aplicação nas hipóteses em que os tratamentos convencionais<br />

mínimos garanti<strong>do</strong>s pelo art. 12 da mesma Lei sejam <strong>de</strong> fato úteis e eficazes para o contratante segura<strong>do</strong>. Ou seja, não po<strong>de</strong> o<br />

paciente, à custa da segura<strong>do</strong>ra ou opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, optar por tratamento experimental, por consi<strong>de</strong>rá-lo mais eficiente<br />

ou menos agressivo, pois lhe é disponibiliza<strong>do</strong> tratamento útil, suficiente para aten<strong>de</strong>r o mínimo garanti<strong>do</strong> pela Lei” (STJ – REsp<br />

1.279.241/SP – Rel. Min. Raul Araújo – j. 16.09.2014).<br />

Acrescente-se que, igualmente interpretan<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> seguro-saú<strong>de</strong> <strong>de</strong> maneira mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r, a mesma<br />

Corte Superior <strong>de</strong>duz a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se cobrir o tratamento <strong>do</strong>miciliar <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> (home care). Vejamos o principal aresto que<br />

trata <strong>do</strong> tema, com <strong>de</strong>staque:<br />

“RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. SERVIÇO DE HOME CARE. COBERTURA PELO PLANO DE SAÚDE. DANO<br />

MORAL. 1. Polêmica em torno da cobertura por plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>do</strong> serviço <strong>de</strong> home care para paciente porta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> <strong>do</strong>ença pulmonar<br />

obstrutiva crônica. 2. O serviço <strong>de</strong> ‘home care’ (tratamento <strong>do</strong>miciliar) constitui <strong>de</strong>s<strong>do</strong>bramento <strong>do</strong> tratamento hospitalar<br />

contratualmente previsto que não po<strong>de</strong> ser limita<strong>do</strong> pela opera<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. 3. Na dúvida, a interpretação das cláusulas <strong>do</strong>s<br />

contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são <strong>de</strong>ve ser feita da forma mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r. Inteligência <strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong> normativo <strong>do</strong> art. 47 <strong>do</strong> CDC.<br />

Doutrina e jurisprudência <strong>do</strong> STJ acerca <strong>do</strong> tema. 4. Ressalva no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que, nos contratos <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> sem contratação<br />

específica, o serviço <strong>de</strong> internação <strong>do</strong>miciliar (home care) po<strong>de</strong> ser utiliza<strong>do</strong> em substituição à internação hospitalar, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

observa<strong>do</strong>s certos requisitos como a indicação <strong>do</strong> médico assistente, a concordância <strong>do</strong> paciente e a não afetação <strong>do</strong> equilíbrio<br />

contratual nas hipóteses em que o custo <strong>do</strong> atendimento <strong>do</strong>miciliar por dia supera o custo diário em hospital. 5. Dano moral<br />

reconheci<strong>do</strong> pelas instâncias <strong>de</strong> origem. Súmula 07/STJ. 6. Recurso especial a que se nega provimento” (STJ – Resp. 1.378.707/RJ –<br />

Rel. Ministro Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – Terceira Turma – j. 26.05.2015 – DJe 15.06.2015).<br />

Expostas todas essas ilustrações, a encerrar o presente tópico, consigne-se a existência <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões jurispru<strong>de</strong>nciais<br />

<strong>de</strong> aplicação <strong>do</strong> art. 47 <strong>do</strong> CDC que, em prol da função social <strong>do</strong> contrato, têm consagra<strong>do</strong> uma nova visualização <strong>do</strong> contrato, da<br />

maneira a beneficiar com justiça a parte vulnerável da relação negocial. Do mesmo mo<strong>do</strong>, o princípio da boa-fé objetiva também<br />

tem realiza<strong>do</strong> milagres no mun<strong>do</strong> contratual, como se po<strong>de</strong> perceber <strong>do</strong> próximo tópico <strong>do</strong> presente capítulo.<br />

5.4.<br />

A FORÇA VINCULATIVA DOS ESCRITOS E A BOA-FÉ OBJETIVA NOS<br />

CONTRATOS DE CONSUMO (ART. 48 DA LEI 8.078/1990). A APLICAÇÃO DOS<br />

CONCEITOS PARCELARES DA BOA-FÉ OBJETIVA<br />

Além <strong>do</strong> princípio da função social <strong>do</strong> contrato, como antes se expôs nesta obra <strong>de</strong> forma exaustiva, a boa-fé objetiva constitui<br />

outro pilar fundamental <strong>do</strong> Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Sem prejuízo <strong>do</strong> art. 4º, inc. III, da Lei 8.078/1990, merece<br />

<strong>de</strong>staque, no capítulo referente à proteção contratual, o art. 48 <strong>do</strong> CDC, in verbis:<br />

“Art. 48. As <strong>de</strong>clarações <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> constantes <strong>de</strong> escritos particulares, recibos e pré-contratos relativos às relações <strong>de</strong> consumo<br />

vinculam o fornece<strong>do</strong>r, ensejan<strong>do</strong> inclusive execução específica, nos termos <strong>do</strong> art. 84 e parágrafos”.<br />

Pelo teor <strong>do</strong> preceito, fica evi<strong>de</strong>nciada a função <strong>de</strong> integração da boa-fé objetiva em todas as fases contratuais: fase précontratual,<br />

fase contratual e fase pós-contratual. Nessa linha, não se olvida o teor <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 26, aprova<strong>do</strong> na I Jornada <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Civil <strong>do</strong> Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral, segun<strong>do</strong> o qual “a cláusula geral contida no art. 422 <strong>do</strong> novo Código Civil impõe ao


juiz interpretar e, quan<strong>do</strong> necessário, suprir e corrigir o contrato segun<strong>do</strong> a boa-fé objetiva, entendida como a exigência <strong>de</strong><br />

comportamento leal <strong>do</strong>s contratantes”. Ora, se a premissa civil foi inspirada pelo Código Consumerista, a conclusão <strong>de</strong>ve ser<br />

necessariamente a mesma para os contratos <strong>de</strong> consumo.<br />

A respeito da abrangência das fases contratuais, na mesma I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil foi aprova<strong>do</strong> o Enuncia<strong>do</strong> n. 25,<br />

estabelecen<strong>do</strong> que “o art. 422 <strong>do</strong> Código Civil não inviabiliza a aplicação, pelo julga<strong>do</strong>r, <strong>do</strong> princípio da boa-fé nas fases pré e póscontratual”.<br />

Ato contínuo, da III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, o Enuncia<strong>do</strong> n. 170 CJF/STJ, in verbis: “A boa-fé objetiva <strong>de</strong>ve ser<br />

observada pelas partes na fase <strong>de</strong> negociações preliminares e após a execução <strong>do</strong> contrato, quan<strong>do</strong> tal exigência <strong>de</strong>correr da<br />

natureza <strong>do</strong> contrato”. Como se po<strong>de</strong> perceber, há uma diferença sutil entre os enuncia<strong>do</strong>s <strong>do</strong>utrinários, eis que o primeiro é dirigi<strong>do</strong><br />

ao juiz, enquanto o último é direciona<strong>do</strong> às partes. As menções constantes <strong>do</strong> art. 48 <strong>do</strong> CDC a qualquer escrito, pré-contrato ou<br />

recibo <strong>de</strong>ixa clara a total abrangência <strong>do</strong> regramento, visan<strong>do</strong> interpretar o negócio <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a lealda<strong>de</strong> e a confiança<br />

<strong>de</strong>positada.<br />

A força vinculativa da boa-fé é marcante, uma vez que não sen<strong>do</strong> respeita<strong>do</strong> o que se espera <strong>do</strong> negócio celebra<strong>do</strong>, caberão as<br />

medidas <strong>de</strong> tutela específica tratadas pelo art. 84 <strong>do</strong> CDC, inclusive com a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fixação <strong>de</strong> multa diária ou astreintes. No<br />

que concerne à proposta <strong>de</strong> contratar, há claro diálogo com o art. 427 <strong>do</strong> CC/2002, segun<strong>do</strong> o qual a proposta formalizada vincula o<br />

proponente, se contiver os elementos fundamentais <strong>do</strong> negócio a ser celebra<strong>do</strong>. Como bem pon<strong>de</strong>ra Nelson Nery Jr. a respeito <strong>do</strong><br />

art. 48 <strong>do</strong> CDC, “O juiz po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>terminar qualquer providência que o caso mereça, a fim <strong>de</strong> que seja assegura<strong>do</strong> o resulta<strong>do</strong><br />

prático equivalente ao adimplemento da obrigação <strong>de</strong> fazer. Não quer o Código a resolução em perdas e danos. Tais providências<br />

judiciais po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong> vária or<strong>de</strong>m, tais como a busca e apreensão, <strong>de</strong>sfazimento <strong>de</strong> obra, remoção <strong>de</strong> pessoas e coisas,<br />

impedimentos <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> nociva, além <strong>de</strong> requisição <strong>de</strong> força policial”.39<br />

Na esteira das palavras <strong>do</strong> jurista, consagra-se o princípio da conservação <strong>do</strong>s negócios jurídicos, sen<strong>do</strong> a solução <strong>de</strong> extinção<br />

<strong>do</strong> contrato a ultima ratio, o último caminho a ser percorri<strong>do</strong>. Não se po<strong>de</strong> esquecer <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> ligação entre tal princípio <strong>de</strong><br />

manutenção e a função social <strong>do</strong> contrato, conforme reconheci<strong>do</strong> pelo Enuncia<strong>do</strong> n. 22, da I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil: “a função<br />

social <strong>do</strong> contrato, prevista no art. 421 <strong>do</strong> novo Código Civil, constitui cláusula geral, que reforça o princípio <strong>de</strong> conservação <strong>do</strong><br />

contrato, asseguran<strong>do</strong> trocas úteis e justas”. Mais uma vez, notam-se os princípios da função social e da boa-fé em interessante<br />

interação simbiótica, como se espera.<br />

Deve ficar claro, todavia, que a incidência da força vinculativa <strong>do</strong>s instrumentos não afasta o direito à in<strong>de</strong>nização <strong>do</strong>s danos a<br />

que o consumi<strong>do</strong>r tem direito, <strong>de</strong>corrência natural <strong>do</strong> festeja<strong>do</strong> princípio da reparação integral <strong>do</strong>s danos (art. 6º, inc. V, da Lei<br />

8.078/1990). Algumas das <strong>de</strong>cisões a seguir expostas <strong>de</strong>ixam clara tal constatação.<br />

Partin<strong>do</strong>-se para os exemplos jurispru<strong>de</strong>nciais <strong>de</strong> incidência da norma em comento, interessante julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> São<br />

Paulo fez incidir a força vinculativa <strong>do</strong> art. 48 <strong>do</strong> CDC para reconhecer o direito à internação <strong>de</strong> segura<strong>do</strong> <strong>de</strong> seguro-saú<strong>de</strong><br />

internacional, sem prejuízo da responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>de</strong> todas as empresas envolvidas para com a prestação <strong>de</strong> serviços contratada.<br />

A ementa é bem interessante, por sintetizar algumas outras questões expostas nos capítulos anteriores <strong>de</strong>ste livro:<br />

“1. Ação in<strong>de</strong>nizatória <strong>de</strong> danos materiais e morais fundada no inadimplemento <strong>de</strong> seguro-viagem contrata<strong>do</strong> em pacote turístico<br />

internacional. Autor submeti<strong>do</strong> a cirurgia cardíaca, com implantação <strong>de</strong> <strong>de</strong>sfibrila<strong>do</strong>r ventricular, em hospital localiza<strong>do</strong> na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Livorno, Itália, sem a correspon<strong>de</strong>nte cobertura integral <strong>do</strong> débito hospitalar pela segura<strong>do</strong>ra anteriormente contratada. Relação <strong>de</strong><br />

consumo. Cerceamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa inocorrente. Legitimida<strong>de</strong> e solidarieda<strong>de</strong> passiva das corrés (agência <strong>de</strong> turismo, opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong><br />

turismo e segura<strong>do</strong>ra). Art. 275 <strong>do</strong> CC e art. 14 <strong>do</strong> CDC. 2. Responsabilida<strong>de</strong> solidária <strong>de</strong> todas as empresas integrantes da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

fornece<strong>do</strong>res <strong>do</strong>s serviços, que comercializam pacotes <strong>de</strong> viagens em parceria empresarial, pelos danos causa<strong>do</strong>s aos consumi<strong>do</strong>res<br />

por <strong>de</strong>feitos na prestação <strong>do</strong>s serviços contrata<strong>do</strong>s. Art. 25, § 1º <strong>do</strong> CDC. 3. Vedação legal à estipulação contratual <strong>de</strong> cláusula que<br />

impossibilite, exonere ou atenue a obrigação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. Art. 25, caput <strong>do</strong> CDC. 4. A <strong>de</strong>claração pré-contratual da segura<strong>do</strong>ra<br />

integra o contrato celebra<strong>do</strong> entre as partes, vinculan<strong>do</strong> a presta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> serviços. Art. 48 <strong>do</strong> CDC. Descumprimento injustifica<strong>do</strong>.<br />

Lesão à boa-fé objetiva. Art. 422 <strong>do</strong> CC. Ineficácia <strong>de</strong> cláusula contratual limitativa <strong>de</strong> cobertura para <strong>do</strong>enças preexistentes,<br />

exageradamente <strong>de</strong>svantajosa para o consumi<strong>do</strong>r e que <strong>de</strong>svirtuaria a própria essência protetiva plena da cobertura <strong>de</strong> assistência <strong>de</strong><br />

viagem internacional contratada. Art. 51, caput e IV <strong>do</strong> CDC. 5. Verbas in<strong>de</strong>nizatórias <strong>de</strong>vidas. Con<strong>de</strong>nação a ser apurada por<br />

liquidação em artigos mantida, a fim <strong>de</strong> se evitar a propositura <strong>de</strong> eventual ação autônoma, aproveitan<strong>do</strong>-se to<strong>do</strong> o exame fático até<br />

aqui ocorri<strong>do</strong>, preservada a ampla <strong>de</strong>fesa. Notícia <strong>de</strong> celebração <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> não cumpri<strong>do</strong> integralmente pela empresa contratada, sem<br />

qualquer justificativa plausível. Reparação material integral mantida. 6. Transtornos e abalos emocionais gravíssimos causa<strong>do</strong>s a<br />

indivíduo i<strong>do</strong>so, lança<strong>do</strong> ao <strong>de</strong>samparo após infarto, por empresa contratada para assisti-lo em viagem internacional. Danos morais<br />

mo<strong>de</strong>radamente fixa<strong>do</strong>s, em atenção à sua dúplice função punitiva ao ofensor e compensatória à vítima, à maneira <strong>do</strong>s punitive<br />

damages <strong>do</strong> direito norte-americano, origem remota <strong>do</strong> art. 5º, V e X da CF/1988. 7. Desobediência injustificada às or<strong>de</strong>ns judiciais e<br />

tentativa <strong>de</strong> induzimento <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>r em erro, sem qualquer temor institucional ao Po<strong>de</strong>r Judiciário. Fatos gravíssimos. Multa diária<br />

limitada, por ora, a R$ 500.000,00, ten<strong>do</strong> em vista princípios <strong>de</strong> razoabilida<strong>de</strong> e proporcionalida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que efetiva<strong>do</strong> o pagamento<br />

<strong>do</strong> débito ao órgão fazendário da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Livorno em até 15 dias após a prolação <strong>de</strong>ste acórdão. Persistin<strong>do</strong> a <strong>de</strong>sobediência após<br />

tal prazo, a multa diária voltará a fluir no montante <strong>de</strong> R$ 5.000,00, por inescusável recidiva. Possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> majoração das<br />

astreintes a qualquer tempo. (…)” (TJSP – Apelação 0047211-20.2008.8.26.0562 – Acórdão 4978866, Santos – Trigésima Quarta


Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Soares Levada – j. 28.02.2011 – DJESP 21.03.2011).<br />

São interessantes os julga<strong>do</strong>s estaduais relativos à negativa por parte <strong>de</strong> empresa que explora o serviço <strong>de</strong> telefonia em cumprir<br />

a promessa pública <strong>do</strong> plano <strong>de</strong> expansão feita anteriormente, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser responsabilizada por tal conduta <strong>de</strong> surpresa, nos termos<br />

<strong>do</strong> art. 48 <strong>do</strong> CDC e <strong>do</strong> respeito à promessa anterior. Por to<strong>do</strong>s, entre os mais recentes:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Desídia <strong>de</strong> opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> telefonia. Oferta pública, convocan<strong>do</strong> interessa<strong>do</strong>s em a<strong>de</strong>rir a plano <strong>de</strong><br />

expansão. Inscrição e sorteio, indican<strong>do</strong> a expectativa <strong>de</strong> instalação <strong>de</strong> linhas. Promessa <strong>de</strong> contratar, <strong>de</strong>scumprida, sem justa causa.<br />

Dever reparatório. Inteligência <strong>do</strong>s arts. 159 e 1.080, <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 1916; arts. 186, 187, 427 e 429, <strong>do</strong> Código Civil vigente;<br />

arts. 6º, IV e VI, 30, 35 e 48, da Lei 8.078/1990. Recurso <strong>do</strong> autor. Provimento” (TJSP – Apelação 9090199-71.2007.8.26.0000 –<br />

Acórdão 4859898, Santos – Trigésima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Carlos Russo – j. 17.11.2010 – DJESP 11.01.2011).<br />

Ainda <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> São Paulo, aplicou-se o art. 48 <strong>do</strong> CDC para se <strong>de</strong>terminar a força vinculativa <strong>de</strong> promessa <strong>de</strong> bolsa<br />

escolar, para to<strong>do</strong> o perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>s <strong>do</strong> curso, e não apenas para o primeiro semestre <strong>do</strong> curso (TJSP – Apelação 992.09.032175-<br />

7 – Acórdão 4614215, Santos – Trigésima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Orlan<strong>do</strong> Pistoresi – j. 28.07.2010 – DJESP<br />

18.08.2010). A <strong>de</strong>cisão comprova como as justas expectativas geradas na parte contratual <strong>de</strong>spertam uma nova ética negocial, eis<br />

que não cabe a alegação <strong>de</strong> que a bolsa foi dada como mero ato <strong>de</strong> liberalida<strong>de</strong>, que po<strong>de</strong> ser quebra<strong>do</strong> a qualquer tempo.<br />

No que concerne à fase pós-contratual, constata-se que o art. 48 <strong>do</strong> CDC faz menção expressa ao recibo, que tem notória força<br />

vinculativa. Sen<strong>do</strong> assim, em regra, não cabe ao presta<strong>do</strong>r fazer cobrança <strong>de</strong> valor a mais, alegan<strong>do</strong> que o montante pago pelo<br />

consumi<strong>do</strong>r não cobriu to<strong>do</strong>s os serviços presta<strong>do</strong>s. O que ser percebe é que o coman<strong>do</strong> em análise traz como conteú<strong>do</strong> a máxima<br />

da boa-fé objetiva que veda o comportamento contraditório, consubstanciada na expressão venire contra factum proprium non<br />

potest.<br />

Na verda<strong>de</strong>, não só esse, mas outros conceitos parcelares da boa-fé objetiva têm plena incidência para os contratos <strong>de</strong><br />

consumo. Tais construções, advindas <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Compara<strong>do</strong> e retiradas da obra <strong>do</strong> jurista lusitano António Manuel da Rocha e<br />

Menezes Cor<strong>de</strong>iro, têm si<strong>do</strong> amplamente <strong>de</strong>batidas no cenário jurídico brasileiro, caben<strong>do</strong> o seu estu<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma pontual.40 Como<br />

se reconheceu na V Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, evento <strong>de</strong> 2011, “As diversas hipóteses <strong>de</strong> exercício<br />

inadmissível <strong>de</strong> uma situação jurídica subjetiva, tais como supressio, tu quoque, surrectio e venire contra factum proprium, são<br />

concreções da boa-fé objetiva” (Enuncia<strong>do</strong> n. 412).<br />

5.4.1.<br />

Supressio e surrectio<br />

A supressio (Verwirkung) significa a supressão, por renúncia tácita, <strong>de</strong> um direito ou <strong>de</strong> uma posição jurídica, pelo seu não<br />

exercício com o passar <strong>do</strong>s tempos. No âmbito das relações civis, o seu senti<strong>do</strong> po<strong>de</strong> ser nota<strong>do</strong> pela leitura <strong>do</strong> art. 330 <strong>do</strong> CC, que<br />

a<strong>do</strong>ta o conceito, eis que “o pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r relativamente ao<br />

previsto no contrato”. A título <strong>de</strong> ilustração, caso tenha si<strong>do</strong> previsto no instrumento obrigacional o benefício da obrigação portável<br />

(cujo pagamento <strong>de</strong>ve ser efetua<strong>do</strong> no <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r), e ten<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r o costume <strong>de</strong> pagar no seu próprio <strong>do</strong>micílio <strong>de</strong><br />

forma reiterada, sem qualquer manifestação <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r, a obrigação passará a ser consi<strong>de</strong>rada quesível (aquela cujo pagamento <strong>de</strong>ve<br />

ocorrer no <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r).<br />

Ao mesmo tempo em que o cre<strong>do</strong>r per<strong>de</strong> um direito por essa supressão, surge um direito a favor <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, por meio da<br />

surrectio (Erwirkung), direito este que não existia juridicamente até então, mas que <strong>de</strong>corre da efetivida<strong>de</strong> social, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com os<br />

costumes. Em outras palavras, enquanto a supressio constitui a perda <strong>de</strong> um direito ou <strong>de</strong> uma posição jurídica pelo seu não<br />

exercício no tempo, a surrectio é o surgimento <strong>de</strong> um direito diante <strong>de</strong> práticas, usos e costumes. Ambos os conceitos po<strong>de</strong>m ser<br />

retira<strong>do</strong>s <strong>do</strong> cita<strong>do</strong> art. 330 <strong>do</strong> CC/2002, constituin<strong>do</strong> duas faces da mesma moeda, como bem afirma José Fernan<strong>do</strong> Simão.41<br />

No âmbito <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, o Tribunal da Justiça da Bahia incidiu as duas construções para afastar o direito da<br />

segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> rescindir unilateralmente um contrato se seguro-saú<strong>de</strong> empresarial pelo fato <strong>de</strong> ter si<strong>do</strong> o segura<strong>do</strong> <strong>de</strong>miti<strong>do</strong>:<br />

“Recurso. Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> empresarial. Demissão. Manutenção <strong>do</strong> plano. Exclusão <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>. Prática abusiva. Ofensa às regras <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, da Lei 9.656/1998 e ao princípio da boa-fé objetiva. Surrectio e supressio. Sentença confirmada.<br />

Recurso improvi<strong>do</strong>” (TJBA – Recurso 63252-0/2003-1 – Segunda Turma Recursal – Rel. Juiz Moacir Reis Fernan<strong>de</strong>s Filho – DJBA<br />

28.05.2009).<br />

Do Tribunal <strong>do</strong> Paraná, em senti<strong>do</strong> próximo, a supressio foi aplicada para afastar o direito <strong>de</strong> negativa <strong>de</strong> cobertura por parte <strong>de</strong><br />

empresa <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, por não ter si<strong>do</strong> exercida tal prerrogativa em momento contratual posterior:<br />

“Apelação cível. Ação cominatória <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> fazer c/c in<strong>de</strong>nização por danos morais. Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Negativa <strong>de</strong> cobertura <strong>de</strong><br />

exame prescrito por médico. Existência <strong>de</strong> trato sucessivo: incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, mas não da Lei<br />

9.656/1998. Interpretação contratual eivada <strong>de</strong> abusivida<strong>de</strong>. Violação aos arts. 47, 51, caput e IV e 54, §§ 3º e 4º, CDC. Valor


arbitra<strong>do</strong> a título <strong>de</strong> honorários advocatícios em conformida<strong>de</strong> ao que prescreve o art. 21, § 4º, CPC. Sentença mantida. 1. As<br />

disposições da Lei 9.656/1998 só se aplicam aos contratos celebra<strong>do</strong>s a partir <strong>de</strong> sua vigência, bem como para os contratos que,<br />

celebra<strong>do</strong>s anteriormente, foram adapta<strong>do</strong>s para seu regime. 2. A incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r ao presente caso<br />

veda que se interprete restritivamente o rol <strong>de</strong> procedimentos assegura<strong>do</strong>s pelo plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. 3. A tais circunstâncias revela-se<br />

aplicável a figura jurídica da supressio – bem <strong>de</strong>scrita nas palavras <strong>de</strong> Menezes Cor<strong>de</strong>iro: ‘A supressio caracteriza-se como a<br />

situação <strong>do</strong> direito que, não ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong>, em certas circunstâncias, exerci<strong>do</strong> durante um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> lapso <strong>de</strong> tempo, não possa mais<br />

sê-lo, por outra forma, se contrariar a boa-fé’. Recurso conheci<strong>do</strong> e não provi<strong>do</strong>” (TJPR – Apelação Cível 0567394-3, Curitiba –<br />

Nona Câmara Cível – Rel. Des. Rosana Amara Girardi Fachin – DJPR 17.07.2009, p. 344).<br />

Por fim, <strong>do</strong> Tribunal <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul, cite-se instigante <strong>de</strong>cisão que tem relação com o art. 48 <strong>do</strong> CDC, segun<strong>do</strong> a qual<br />

não tem a empresa <strong>de</strong> consórcio o direito <strong>de</strong> negar a emissão da certidão <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> veículo, alegan<strong>do</strong> a falta <strong>de</strong> pagamento<br />

<strong>de</strong> suposto valor residual, em <strong>de</strong>srespeito ao que foi previamente pactua<strong>do</strong>. Vejamos a ementa <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>, com menção expressa aos<br />

<strong>do</strong>is conceitos aqui estuda<strong>do</strong>s:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Consórcio <strong>de</strong> veículo. Equívoco na cobrança das parcelas mensais. Sal<strong>do</strong> a pagar no final <strong>do</strong> grupo. Inexigibilida<strong>de</strong>.<br />

Aplicação <strong>do</strong> princípio da boa-fé objetiva. Teorias da surrectio e supressio. Dever <strong>de</strong> concessão da liberação da alienação fiduciária<br />

pen<strong>de</strong>nte sobre o veículo. Danos materiais ocorrentes. Dano moral inocorrente. 1. Ten<strong>do</strong> o autor pago rigorosamente as parcelas <strong>do</strong><br />

consórcio durante os 36 meses <strong>do</strong> grupo, não po<strong>de</strong> a administra<strong>do</strong>ra, ao final, negar-lhe a liberação da alienação fiduciária que recaía<br />

sobre o veículo adquiri<strong>do</strong> com a carta <strong>de</strong> crédito. Isso porque, com os pagamentos realiza<strong>do</strong>s, criou-se ao autor a legítima expectativa<br />

<strong>de</strong> estar adquirin<strong>do</strong> parceladamente o veículo e quitan<strong>do</strong> sua obrigação com o pagamento da última parcela. Ao mesmo tempo, em<br />

contrapartida, a inércia da ré fez <strong>de</strong>saparecer seu direito <strong>de</strong> cobrar o valor pago a menor. Aplicação <strong>do</strong> Princípio da Boa-fé Objetiva e<br />

das teorias da surrectio e supressio. 2. Comprovan<strong>do</strong> o autor o gasto realiza<strong>do</strong> com a notificação extrajudicial da ré, <strong>de</strong>ve ser<br />

in<strong>de</strong>niza<strong>do</strong> em tal monta. 3. Embora a conduta ilícita por parte da ré, tem-se que não experimentou o autor aborrecimento que<br />

extrapole os meros dissabores da vida em socieda<strong>de</strong>, não haven<strong>do</strong> falar em dano moral in<strong>de</strong>nizável. Recurso parcialmente provi<strong>do</strong>”<br />

(TJRS – Recurso Cível 71001586668, Três Passos – Primeira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Ricar<strong>do</strong> Torres Hermann – j.<br />

15.05.2008 – DOERS 20.05.2008, p. 100).<br />

O aresto <strong>de</strong>monstra, na linha <strong>do</strong> que antes foi exposto, que a supressio e a surrectio são realmente duas faces da mesma moeda,<br />

inci<strong>de</strong>ntes ao mesmo tempo para as relações contratuais.<br />

5.4.2.<br />

Tu quoque<br />

O termo tu quoque significa que um contratante que violou uma norma jurídica não po<strong>de</strong>rá, sem a caracterização <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong><br />

direito por quebra da boa-fé, aproveitar-se <strong>de</strong>ssa situação anteriormente criada pelo <strong>de</strong>srespeito. Conforme lembra Ronnie Preuss<br />

Duarte, “a locução <strong>de</strong>signa a situação <strong>de</strong> abuso que se verifica quan<strong>do</strong> um sujeito viola uma norma jurídica e, posteriormente, tenta<br />

tirar proveito da situação em benefício próprio”.42<br />

Desse mo<strong>do</strong>, está veda<strong>do</strong> que alguém faça contra o outro o que não faria contra si mesmo (regra <strong>de</strong> ouro), conforme ensina<br />

Cláudio Luiz Bueno <strong>de</strong> Go<strong>do</strong>y. 43 Relata o professor da USP que “Pelo ‘tu quoque’, expressão cuja origem, como lembra Fernan<strong>do</strong><br />

Noronha, está no grito <strong>de</strong> <strong>do</strong>r <strong>de</strong> Júlio César, ao perceber que seu filho a<strong>do</strong>tivo Bruto estava entre os que atentavam contra sua vida<br />

(‘Tu quoque, fili’? Ou ‘Tu quoque, Brute, fili mi’?), evita-se que uma pessoa que viole uma norma jurídica possa exercer direito<br />

<strong>de</strong>ssa mesma norma inferi<strong>do</strong> ou, especialmente, que possa recorrer, em <strong>de</strong>fesa, a normas que ela própria violou. Trata-se da regra <strong>de</strong><br />

tradição ética que, verda<strong>de</strong>iramente, obsta que se faça com outrem o que não se quer seja feito consigo mesmo”. 44<br />

Incidin<strong>do</strong> a construção para o negócio jurídico <strong>de</strong> consumo, o Tribunal <strong>do</strong> Paraná já se pronunciou da seguinte forma,<br />

aplican<strong>do</strong> o preceito: “Responsabilida<strong>de</strong> civil. Relação <strong>de</strong> consumo. Compra <strong>de</strong> aparelho celular. Parcelamento <strong>do</strong> valor.<br />

Inadimplemento. Recusa <strong>de</strong> prestar assistência técnica. In<strong>de</strong>nização por danos materiais e morais in<strong>de</strong>vida. 1. Pelo princípio tu<br />

quoque, <strong>de</strong>corrente da boa-fé, não se justifica a cobrança <strong>de</strong> adimplemento <strong>do</strong> contrato se a própria parte que pleiteia o <strong>de</strong>scumpriu.<br />

2. Não há razão em in<strong>de</strong>nizar por danos materiais e morais o consumi<strong>do</strong>r que <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> pagar a maior parte das parcelas da compra<br />

<strong>de</strong> um produto. Apelação não provida” (TJPR – Apelação Cível 0722417-3, Ban<strong>de</strong>irantes – Décima Câmara Cível – Rel. Des.<br />

Nilson Mizuta – DJPR 01.03.2011, p. 307).<br />

Como se po<strong>de</strong> notar da ementa, a boa-fé objetiva exigida <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r também é premissa <strong>de</strong> conduta contra o<br />

consumi<strong>do</strong>r.<br />

Mais recentemente, <strong>do</strong> Tribunal Paulista, merece relevo o julga<strong>do</strong> que <strong>de</strong>terminou a manutenção das mesmas condições <strong>do</strong><br />

plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> para ex-emprega<strong>do</strong>, que fazia parte <strong>de</strong> contrato em grupo. Conforme o <strong>de</strong>cisum, “a partir <strong>do</strong>s princípios da boa-fé e<br />

da justiça contratual preten<strong>de</strong>-se evitar não só que o faltoso se beneficie da própria falta, mas, ainda, resguardar o equilíbrio entre as<br />

prestações contratuais. Além disso, o ‘tu quoque’ leva a que qualquer atenta<strong>do</strong> a uma das prestações ou <strong>de</strong>veres <strong>de</strong> prestar<br />

represente, em verda<strong>de</strong>, um atenta<strong>do</strong> ao próprio sinalagma. Assim, seria a cláusula <strong>de</strong> boa-fé contrariada, a se obrigar os ex-


funcionários a a<strong>de</strong>rir a novo contrato estipula<strong>do</strong> entre a ex-emprega<strong>do</strong>ra e a segura<strong>do</strong>ra” (TJSP – Apelação Cível 1004905-<br />

14.2014.8.26.0625 – Acórdão 9248343, Taubaté – Décima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. César Ciampolini – j. 23.02.2016<br />

– DJESP 01.07.2016).<br />

5.4.3.<br />

Exceptio <strong>do</strong>li<br />

A exceptio <strong>do</strong>li é conceituada como a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> réu contra ações <strong>do</strong>losas, contrárias à boa-fé. Aqui a boa-fé objetiva é utilizada<br />

como <strong>de</strong>fesa, ten<strong>do</strong> uma importante função reativa, conforme leciona José Fernan<strong>do</strong> Simão.45 A exceptio mais conhecida no<br />

<strong>Direito</strong> Civil brasileiro é aquela constante no art. 476 <strong>do</strong> Código Civil, a exceptio non adimpleti contractus, segun<strong>do</strong> a qual, nos<br />

contratos bilaterais, nenhuma das partes po<strong>de</strong> exigir que uma parte cumpra com a sua obrigação se primeiro não cumprir com a<br />

própria. 46 Vale lembrar que os contratos bilaterais ou sinalagmáticos são aqueles que envolvem direitos e <strong>de</strong>veres para ambas as<br />

partes, <strong>de</strong> forma proporcional, sen<strong>do</strong> exemplo típico a compra e venda.<br />

Não resta a menor dúvida <strong>de</strong> que a exceção <strong>de</strong> contrato não cumpri<strong>do</strong> não só po<strong>de</strong> como <strong>de</strong>ve ser aplicada em favor <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, como nas hipóteses <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> consumo. Como primeiro caminho para tal afirmação, po<strong>de</strong> ser citada a<br />

incidência da boa-fé objetiva constante <strong>do</strong> art. 4º, inc. III, da Lei 8.078/1990. Como segun<strong>do</strong> caminho, a teoria <strong>do</strong> diálogo das<br />

fontes permite a conexão pelo art. 476 <strong>do</strong> CC/2002 em benefício <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Não tem si<strong>do</strong> diferente a conclusão da<br />

jurisprudência nacional, nas hipóteses em que o produto ou o serviço não estão a contento ou <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o espera<strong>do</strong>,<br />

especialmente nas hipóteses <strong>de</strong> vício (por to<strong>do</strong>s: TJES – Apelação Cível 35060210016 – Primeira Câmara Cível – Rel. Des.<br />

Arnal<strong>do</strong> Santos Souza – j. 06.07.2010 – DJES 03.09.2010, p. 72; TJSC – Apelação Cível 2003.011376-2, Joinville – Segunda<br />

Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Comercial – Rel. Des. Jorge Luiz <strong>de</strong> Borba – DJSC 03.09.2009, p. 328; e TJSP – Apelação com Revisão<br />

207.759.4/7 – Acórdão 4134137, Barueri – Nona Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Viviani Nicolau – j. 13.10.2009 – DJESP<br />

12.11.2009).<br />

Anote-se, por fim, que a máxima da exceptio tem o condão <strong>de</strong> afastar o direito <strong>de</strong> eventual inclusão <strong>do</strong> nome <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res<br />

em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ainda configurá-la como in<strong>de</strong>vida ou abusiva, a gerar o direito à reparação <strong>de</strong> danos a favor<br />

<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (TJDF – Recurso 2009.01.1.116487-2 – Acórdão 481.366 – Segunda Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis<br />

e Criminais <strong>do</strong> DF – Rel. Juiz Asiel Henrique – DJDFTE 22.02.2011, p. 277; TJSP – Apelação 992.07.044110-2 – Acórdão<br />

4805183, São Carlos – Trigésima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Carlos Russo – j. 10.11.2010 – DJESP 09.12.2010; e<br />

TJMG – Apelação Cível 1.0024.07.485048-8/0011, Belo Horizonte – Décima Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Elpídio Donizetti –<br />

j. 17.06.2008 – DJEMG 28.06.2008).<br />

5.4.4.<br />

Venire contra factum proprium<br />

Como outrora exposto, pela máxima venire contra factum proprium non potest, <strong>de</strong>terminada pessoa não po<strong>de</strong> exercer um<br />

direito próprio contrarian<strong>do</strong> um comportamento anterior, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser mantida a confiança e o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> lealda<strong>de</strong>, <strong>de</strong>correntes da<br />

boa-fé objetiva. O conceito mantém relação com a teoria <strong>do</strong>s atos próprios, muito bem explorada no <strong>Direito</strong> Espanhol por Luís<br />

Díez-Picazo.47<br />

Para An<strong>de</strong>rson Schreiber, que <strong>de</strong>senvolveu excelente trabalho monográfico sobre o tema no Brasil, po<strong>de</strong>m ser aponta<strong>do</strong>s quatro<br />

pressupostos para aplicação da proibição <strong>do</strong> comportamento contraditório: 1º) um fato próprio, uma conduta inicial; 2º) a legítima<br />

confiança <strong>de</strong> outrem na conservação <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> objetivo <strong>de</strong>ssa conduta; 3º) um comportamento contraditório a este senti<strong>do</strong> objetivo;<br />

4º) um dano ou um potencial <strong>de</strong> dano <strong>de</strong>corrente da contradição.48 A relação com o respeito à confiança <strong>de</strong>positada, um <strong>do</strong>s<br />

<strong>de</strong>veres anexos à boa-fé objetiva, é muito clara, conforme consta <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 362 da IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil: “A vedação<br />

<strong>do</strong> comportamento contraditório (venire contra factum proprium) funda-se na proteção da confiança, como se extrai <strong>do</strong>s arts. 187 e<br />

422 <strong>do</strong> Código Civil”. A premissa é a mesma para os contratos <strong>de</strong> consumo, sem qualquer distinção, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> tal conclusão ser<br />

retirada, entre outros, <strong>do</strong> sempre invoca<strong>do</strong> art. 4º, inc. III, <strong>do</strong> CDC.<br />

Ilustran<strong>do</strong> para os contratos <strong>de</strong> consumo, <strong>de</strong>staque-se julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal Paulista que fez incidir o venire contra uma empresa<br />

administra<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito que mantinha a prática <strong>de</strong> aceitar o pagamento <strong>do</strong>s valores atrasa<strong>do</strong>s. No caso, a empresa,<br />

repentinamente, alegou a rescisão contratual, com base em cláusula contratual que previa a extinção <strong>do</strong> contrato haven<strong>do</strong><br />

inadimplemento. A Corte mitigou a força obrigatória <strong>de</strong>ssa cláusula, ao apontar que a extinção <strong>do</strong> negócio jurídico e a cobrança<br />

integral não seriam possíveis, diante <strong>do</strong>s comportamentos <strong>de</strong> recebimento parcial <strong>do</strong> crédito. O consumi<strong>do</strong>r foi in<strong>de</strong>niza<strong>do</strong> pela<br />

negativação <strong>de</strong> seu nome em cadastro pela cobrança <strong>do</strong> valor integral:<br />

“Dano moral. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Negativação no Serasa e constrangimento pela recusa <strong>do</strong> cartão <strong>de</strong> crédito, cancela<strong>do</strong> pela ré.<br />

Caracterização. Boa-fé objetiva. Venire contra factum proprium. Administra<strong>do</strong>ra que aceitava pagamento das faturas com atraso.<br />

Cobrança <strong>do</strong>s encargos da mora. Ocorrência. Repentinamente invoca cláusula contratual para consi<strong>de</strong>rar o contrato rescindi<strong>do</strong>, a


conta encerrada e o débito venci<strong>do</strong> antecipadamente. Simultaneamente provi<strong>de</strong>ncia a inclusão <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> titular no Serasa.<br />

Inadmissibilida<strong>de</strong>. Inversão <strong>do</strong> comportamento anteriormente a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> e exercício abusivo da posição jurídica. Recurso improvi<strong>do</strong>”<br />

(TJSP – Apelação Cível 174.305-4/2-00, São Paulo – Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>-A – Rel. Enéas Costa Garcia – j.<br />

16.12.2005, v.u., voto 309).<br />

Em julga<strong>do</strong> mais recente, por aplicar o venire contra factum proprium, o Tribunal Paulista afastou a extinção <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong><br />

seguro <strong>de</strong> forma automática, pois a segura<strong>do</strong>ra vinha aceitan<strong>do</strong> os pagamentos e emitin<strong>do</strong> faturas, mesmo com a presença da mora<br />

<strong>do</strong> segura<strong>do</strong>:<br />

“Seguro <strong>de</strong> vida e aci<strong>de</strong>ntes pessoais. Ação <strong>de</strong> cobrança. Atraso no pagamento <strong>de</strong> parcelas mensais <strong>do</strong> prêmio. Cancelamento<br />

automático <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> seguro. Inadmissibilida<strong>de</strong>. Se a lei prevê a purga da mora, é porque afastada está a hipótese <strong>de</strong> resolução<br />

automática da avença. Diante <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, é reputada nula a cláusula que autoriza o fornece<strong>do</strong>r (segura<strong>do</strong>ra)<br />

a resolver unilateralmente o contrato. Não po<strong>de</strong> o segura<strong>do</strong>r cobrar os prêmios em atraso e, ao mesmo tempo, em caso <strong>de</strong> sinistro,<br />

furtar-se ao pagamento <strong>do</strong> capital <strong>de</strong> cobertura. Conduta contraditória e incompatível com a boa-fé (venire contra factum proprium).<br />

A jurisprudência <strong>do</strong> E. STJ prevê a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interpelação <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> moroso para o <strong>de</strong>sfazimento <strong>do</strong> contrato, o que não<br />

ocorreu. A<strong>de</strong>mais, a mora <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> é <strong>de</strong> escassa importância, pois iniciada a partir <strong>do</strong> momento em que foi interna<strong>do</strong> em<br />

nosocômio para tratar da <strong>do</strong>ença letal. Recurso provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação 9147968-66.2009.8.26.0000 – Acórdão 4912959, São<br />

Paulo – Vigésima Quinta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Antônio Benedito Ribeiro Pinto – j. 20.01.2011 – DJESP<br />

16.02.2011).<br />

O venire tem si<strong>do</strong> aplica<strong>do</strong> em senti<strong>do</strong> muito próximo por outras Cortes Estaduais, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser transcrito o seguinte resumo <strong>de</strong><br />

acórdão <strong>do</strong> Tribunal Mineiro, relativo a contrato <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>:<br />

“Ação ordinária. Rescisão por atraso no pagamento <strong>de</strong> ‘contrato <strong>de</strong> seguro-saú<strong>de</strong>’ firma<strong>do</strong> em momento posterior ao advento da Lei<br />

9.656/1998. Requisitos. Notificação pessoal <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Inadimplência superior a 60 (sessenta) dias. Preenchimento. Ausência.<br />

Por força <strong>do</strong> art. 13, parágrafo único, II, da Lei 9.656/1998, a suspensão ou rescisão unilateral <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> seguro saú<strong>de</strong> por<br />

motivo <strong>de</strong> inadimplência nos últimos 12 (<strong>do</strong>ze) meses <strong>de</strong> vigência <strong>do</strong> contrato, durante mais <strong>de</strong> 60 (sessenta) dias, pressupõe a<br />

notificação pessoal <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. O cancelamento <strong>do</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> promovi<strong>do</strong> pela <strong>de</strong>mandada está em níti<strong>do</strong> <strong>de</strong>scompasso com<br />

a sua conduta anterior e caracteriza violação à <strong>do</strong>utrina <strong>do</strong>s atos próprios, venire contra factum proprium, mormente se<br />

consi<strong>de</strong>rarmos que a opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> aceitou receber, ainda que extemporaneamente, as mensalida<strong>de</strong>s que justificariam o<br />

cancelamento da avença. Como a <strong>de</strong>mandada <strong>de</strong>scumpriu a norma contida no parágrafo único, II, da Lei 9.656/1998, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

enviar notificação pessoal válida aos consumi<strong>do</strong>res, a fim <strong>de</strong> evitar a rescisão <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> seguro saú<strong>de</strong> por meio <strong>do</strong> pagamento<br />

das mensalida<strong>de</strong>s em atraso, mostra-se correta a sentença que julgou proce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong> inicial, <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> o restabelecimento <strong>do</strong><br />

contrato ilicitamente cancela<strong>do</strong>” (TJMG – Apelação Cível 0741246-16.2006.8.13.0024, Belo Horizonte – Décima Sétima Câmara<br />

Cível – Rel. Des. Lucas Pereira – j. 18.03.2010 – DJEMG 01.06.2010).<br />

A encerrar as concreções <strong>do</strong> venire contra factum proprium, julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul aplicou a máxima<br />

contra fabricante e comerciantes <strong>de</strong> aparelhos <strong>de</strong> ar condiciona<strong>do</strong>, que indicaram terceiro a prestar serviço <strong>de</strong> reparo <strong>de</strong> um produto,<br />

não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> quedar-se <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r pelo vício <strong>do</strong> produto já conheci<strong>do</strong>:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Aparelho <strong>de</strong> ar condiciona<strong>do</strong> split. Vício <strong>do</strong> produto. Encaminhamento à assistência técnica. Pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>volução <strong>do</strong><br />

preço e <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Dano moral configura<strong>do</strong> excepcionalmente. Valor da in<strong>de</strong>nização manti<strong>do</strong>. Inexistência <strong>de</strong> complexida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

feito. Legitimida<strong>de</strong> passiva das rés. 1. Absolutamente <strong>de</strong>snecessária a realização <strong>de</strong> perícia, mormente quan<strong>do</strong> a assistência técnica<br />

autorizada po<strong>de</strong>ria ter esclareci<strong>do</strong> o <strong>de</strong>feito apresenta<strong>do</strong> pelo aparelho. 2. Respon<strong>de</strong>m solidariamente a fabricante e a comerciante. 3.<br />

Trata-se <strong>de</strong> relação típica <strong>de</strong> consumo, portanto aplicáveis as disposições <strong>do</strong> art. 18 e § 1º <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Não<br />

sana<strong>do</strong> o vício no prazo <strong>de</strong> 30 dias, abre-se ao consumi<strong>do</strong>r a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> postular a restituição da quantia paga ou a substituição<br />

<strong>do</strong> produto <strong>de</strong>feituoso. 2. Incontroverso o encaminhamento <strong>do</strong> produto à assistência técnica, sem a resolução <strong>do</strong> problema até o<br />

ajuizamento da <strong>de</strong>manda, configura<strong>do</strong> está o direito da autora em ver resolvi<strong>do</strong> o contrato e <strong>de</strong>volvi<strong>do</strong> o preço pago, acresci<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

perdas e danos. 3. Ao contrário <strong>do</strong> sustenta<strong>do</strong> pelas rés, não se po<strong>de</strong> atribuir à consumi<strong>do</strong>ra o fato <strong>de</strong> o aparelho ter si<strong>do</strong> coloca<strong>do</strong> e<br />

retira<strong>do</strong> por empresa que não se constituía em uma assistência técnica autorizada. Consoante se vê da troca <strong>de</strong> e-mails <strong>de</strong> fls. 26, a<br />

‘empresa <strong>de</strong> referência’ foi indicada pelas próprias rés para a realização <strong>do</strong> trabalho, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> agora ser invoca<strong>do</strong> tal fato como<br />

causa enseja<strong>do</strong>ra da perda da garantia. Decorre <strong>do</strong> princípio da boa-fé objetiva o <strong>de</strong>ver anexo <strong>de</strong> transparência a repelir o non venire<br />

contra factum proprium 3. Configura-se, <strong>de</strong> forma excepcional, o dano moral em razão <strong>do</strong> <strong>de</strong>scaso das rés em relação à autora. 4.<br />

Impossível reduzir o valor da in<strong>de</strong>nização estabeleci<strong>do</strong> na sentença (R$ 3.500,00), pois a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> ao caso concreto e aos critérios <strong>de</strong><br />

proporcionalida<strong>de</strong> e razoabilida<strong>de</strong>. Sentença mantida por seus próprios fundamentos. Recursos improvi<strong>do</strong>s” (TJRS – Recurso Cível<br />

71002812733, Porto Alegre – Primeira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Ricar<strong>do</strong> Torres Hermann – j. 28.10.2010 – DJERS<br />

05.11.2010).<br />

5.4.5.<br />

Duty to mitigate the loss<br />

Em relação a esse último conceito parcelar, <strong>de</strong>ve ficar claro que não é ele retira<strong>do</strong> da obra <strong>de</strong> Menezes Cor<strong>de</strong>iro, mas <strong>de</strong> outra


fonte <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> Contemporâneo. Trata-se <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver imposto ao cre<strong>do</strong>r <strong>de</strong> mitigar suas perdas, ou seja, o próprio prejuízo.<br />

Sobre essa premissa foi aprova<strong>do</strong> o Enuncia<strong>do</strong> n. 169 <strong>do</strong> CJF/STJ na III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, pelo qual “O princípio da boa-fé<br />

objetiva <strong>de</strong>ve levar o cre<strong>do</strong>r a evitar o agravamento <strong>do</strong> próprio prejuízo”.<br />

A proposta <strong>do</strong>utrinária, elaborada por Vera Maria Jacob <strong>de</strong> Fra<strong>de</strong>ra, professora da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul,<br />

representa muito bem a natureza <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> colaboração, presente em todas as fases contratuais e que <strong>de</strong>corre <strong>do</strong> princípio da boafé<br />

objetiva, inci<strong>de</strong>nte para qualquer contrato.49 Anote-se que o Enuncia<strong>do</strong> n. 169 CJF/STJ está inspira<strong>do</strong> no art. 77 da Convenção<br />

<strong>de</strong> Viena <strong>de</strong> 1980, sobre a venda internacional <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>rias, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que “A parte que invoca a quebra <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong>ve<br />

tomar as medidas razoáveis, levan<strong>do</strong> em consi<strong>de</strong>ração as circunstâncias, para limitar a perda, nela compreendi<strong>do</strong> o prejuízo<br />

resultante da quebra. Se ela negligencia em tomar tais medidas, a parte faltosa po<strong>de</strong> pedir a redução das perdas e danos, em<br />

proporção igual ao montante da perda que po<strong>de</strong>ria ter si<strong>do</strong> diminuída”. Para a autora da proposta, há uma relação direta com o<br />

princípio da boa-fé objetiva, uma vez que a mitigação <strong>do</strong> próprio prejuízo constituiria um <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> natureza acessória, um <strong>de</strong>ver<br />

anexo, <strong>de</strong>riva<strong>do</strong> da boa conduta que <strong>de</strong>ve existir entre os negociantes.<br />

A título <strong>de</strong> exemplo para os contratos <strong>de</strong> consumo, imagine-se um contrato bancário ou financeiro em que há <strong>de</strong>scumprimento<br />

por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Segun<strong>do</strong> a interpretação <strong>de</strong>ste autor, já aplicada pela jurisprudência, não po<strong>de</strong> a instituição financeira<br />

permanecer inerte, aguardan<strong>do</strong> que, diante da alta taxa <strong>de</strong> juros prevista no instrumento contratual, a dívida atinja montantes<br />

astronômicos. Se assim agir, como consequência da violação da boa-fé, os juros <strong>de</strong>vem ser reduzi<strong>do</strong>s. Vejamos a ementa <strong>de</strong> julga<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> Mato Grosso <strong>do</strong> Sul que subsume tais premissas:<br />

“Apelação cível. Ação <strong>de</strong> cobrança. Aplicação <strong>do</strong> princípio duty to mitigate the loss. Contrato <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito. Contrato <strong>de</strong><br />

a<strong>de</strong>são. Aplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> CDC. Revisão das cláusulas abusivas. Possibilida<strong>de</strong>. Juros remuneratórios. Cópia <strong>do</strong> contrato. Ausência.<br />

Aplicação <strong>do</strong> art. 333 <strong>do</strong> CPC. Manutenção da limitação <strong>do</strong>s juros em 12% ao ano. Comissão <strong>de</strong> permanência. Impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

averiguação da sua cobrança cumulada com outros encargos. Inexistência <strong>de</strong> cópia <strong>do</strong> contrato. Manutenção da sentença que afastou<br />

a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> capitalização mensal <strong>de</strong> juros. Prática ilegal. Anatocismo. Súmula 121 <strong>do</strong> STF. Usura. Multa. 2%.<br />

Falta <strong>de</strong> interesse recursal. Recurso parcialmente conheci<strong>do</strong> e improvi<strong>do</strong>. Se a instituição financeira permanece inerte por longo<br />

perío<strong>do</strong>, aguardan<strong>do</strong> que a dívida atinja montantes astronômicos, impõe-se-lhe a aplicação <strong>do</strong> princípio <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> duty to mitigate<br />

the loss, que impõe, nestes casos, por penalida<strong>de</strong>, a redução <strong>do</strong> crédito <strong>do</strong> mutuário <strong>de</strong>veria, nos termos <strong>do</strong> princípio da boa-fé<br />

objetiva, evitar o agravamento <strong>do</strong> próprio prejuízo. Nos termos da Súmula 297 <strong>do</strong> STJ e prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, o<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é aplicável às instituições financeiras. O contrato <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, eis<br />

que resulta da padronização e uniformização das cláusulas contratuais realizadas pela instituição financeira, as quais o consumi<strong>do</strong>r é<br />

obriga<strong>do</strong> a aceitá-las em bloco, em seu prejuízo. Na esteira <strong>do</strong> entendimento atual <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, levan<strong>do</strong>-se em<br />

consi<strong>de</strong>ração a situação jurídica específica <strong>do</strong> contrato, é <strong>de</strong> se admitir a revisão das cláusulas consi<strong>de</strong>radas abusivas pelo Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Se os juros remuneratórios contrata<strong>do</strong>s exce<strong>de</strong>m a taxa média <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>, fixada pelo Banco Central <strong>do</strong><br />

Brasil, fica autorizada a revisão contratual, eis que caracterizada a abusivida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> os juros ser reduzi<strong>do</strong>s ao valor da taxa<br />

média <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>. Outrossim, quan<strong>do</strong> a instituição financeira não comprova os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos <strong>do</strong><br />

direito <strong>do</strong> autor, <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> que a taxa <strong>de</strong> juros por ele cobrada não é extorsiva, mantém-se a fixação <strong>do</strong>s juros em 12%, nos<br />

termos da sentença. Mantém-se a sentença recorrida que afastou a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cobrança da comissão <strong>de</strong> permanência se não<br />

houver nos autos cópia <strong>do</strong> contrato, permitin<strong>do</strong> aferir se a sua cobrança foi cumulada com outros encargos. A capitalização mensal <strong>de</strong><br />

juros, <strong>de</strong>nominada anatocismo, é prática vedada pelo nosso or<strong>de</strong>namento jurídico, a exemplo <strong>do</strong> que ocorre com o art. 13 <strong>do</strong> Decreto<br />

22.626/1933, tanto que o STF editou a Súmula 121, que estabelece ser vedada a capitalização <strong>de</strong> juros. Se a sentença apenas afasta a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cobrança da multa em percentual superior a 2%, nos termos contrata<strong>do</strong>s, carece o autor <strong>de</strong> interesse recursal” (TJMS<br />

– Apelação Cível 2009.022658-4/0000-00, Campo Gran<strong>de</strong> – Terceira Turma Cível – Rel. Des. Rubens Bergonzi Bossay – DJEMS<br />

24.09.2009, p. 12).<br />

Exatamente na mesma linha, <strong>de</strong>staque-se <strong>de</strong>cisão recente <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, que substituiu os vultosos<br />

juros contratuais pelos juros legais, incidin<strong>do</strong> o duty to mitigate the loss (TJRJ – Apelação Cível 0010623-64.2009.8.19.0209 – 9.ª<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Roberto <strong>de</strong> Abreu e Silva, j. 2011).<br />

Em senti<strong>do</strong> próximo, o Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> São Paulo fez incidir o duty to mitigate the loss em face <strong>de</strong> instituição bancária,<br />

que não apresentou o contrato que iniciou o relacionamento com o correntista. A<strong>de</strong>mais, o banco, durante a execução <strong>do</strong> contrato,<br />

manteve a incidência <strong>de</strong> taxas e <strong>de</strong> juros sobre essas em relação à conta inativa, não solicitan<strong>do</strong> o comparecimento <strong>do</strong> cliente na<br />

agência para o seu <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> encerramento. Além <strong>de</strong> reconhecer a impossibilida<strong>de</strong> da cobrança <strong>do</strong>s valores, o Tribunal Paulista<br />

concluiu pelo <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar <strong>do</strong> banco, diante da inscrição in<strong>de</strong>vida <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> correntista em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes (TJSP<br />

– Apelação n. 0003643-11.2012.8.26.0627 – 20ª Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Origem: Comarca <strong>de</strong> Teo<strong>do</strong>ro Sampaio – Relator<br />

Des. Correia Lima – j. 15.06.2015).<br />

Por fim quanto às ilustrações, a este autor parece que há uma relação direta entre o duty to mitigate the loss e a cláusula <strong>de</strong> stop<br />

loss, tema analisa<strong>do</strong> pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça no ano <strong>de</strong> 2014. Nos termos <strong>de</strong> julga<strong>do</strong> publica<strong>do</strong> no Informativo n. 541 da<br />

Corte Superior, “a instituição financeira que, <strong>de</strong>scumprin<strong>do</strong> o que foi ofereci<strong>do</strong> a seu cliente, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> acionar mecanismo


<strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> stop loss, pactua<strong>do</strong> em contrato <strong>de</strong> investimento, incorre em infração contratual passível <strong>de</strong> gerar a obrigação <strong>de</strong><br />

in<strong>de</strong>nizar o investi<strong>do</strong>r pelos prejuízos causa<strong>do</strong>s. Com efeito, o risco faz parte da aplicação em fun<strong>do</strong>s <strong>de</strong> investimento, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a<br />

instituição financeira criar mecanismos ou oferecer garantias próprias para reduzir ou afastar a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prejuízos<br />

<strong>de</strong>correntes das variações observadas no merca<strong>do</strong> financeiro interno e externo. Nessa linha intelectiva, ante a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

perdas no investimento, cabe à instituição presta<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> serviço informar claramente o grau <strong>de</strong> risco da respectiva aplicação e, se<br />

houver, as eventuais garantias concedidas contratualmente, sen<strong>do</strong> relevantes as propagandas efetuadas e os prospectos entregues ao<br />

público e ao contratante, os quais obrigam a contratada. Neste contexto, o mecanismo stop loss, como o próprio nome indica, fixa o<br />

ponto <strong>de</strong> encerramento <strong>de</strong> uma operação financeira com o propósito <strong>de</strong> ‘parar’ ou até <strong>de</strong> evitar <strong>de</strong>terminada ‘perda’. Assim, a falta<br />

<strong>de</strong> observância <strong>do</strong> referi<strong>do</strong> pacto permite a responsabilização da instituição financeira pelos prejuízos suporta<strong>do</strong>s pelo investi<strong>do</strong>r.<br />

Na hipótese em foco, ainda que se interprete o ajuste firma<strong>do</strong>, tão somente, como um regime <strong>de</strong> metas quanto ao limite <strong>de</strong> perdas,<br />

não há como afastar a responsabilida<strong>de</strong> da contratada, ten<strong>do</strong> em vista a ocorrência <strong>de</strong> grave <strong>de</strong>feito na publicida<strong>de</strong> e nas<br />

informações relacionadas aos riscos <strong>do</strong>s investimentos” (STJ – REsp 656.932/SP – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – j.<br />

24.04.2014).<br />

Com esse importante e instigante conceito parcelar, encerra-se o estu<strong>do</strong> das incidências concretas da boa-fé objetiva para os<br />

contratos <strong>de</strong> consumo. Parte-se então à abordagem <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> arrependimento, trata<strong>do</strong> pelo art. 49 da Lei 8.078/1990.<br />

5.5.<br />

O DIREITO DE ARREPENDIMENTO NOS CONTRATOS DE CONSUMO (ART. 49 DA<br />

LEI 8.078/1990)<br />

Tema <strong>do</strong>s mais relevantes na ótica consumerista é o relativo ao direito <strong>de</strong> arrependimento nos contratos <strong>de</strong> consumo, trata<strong>do</strong><br />

pelo art. 49 da Lei 8.078/1990. Em sua redação literal, enuncia o caput <strong>do</strong> coman<strong>do</strong> que “O consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> <strong>de</strong>sistir <strong>do</strong> contrato,<br />

no prazo <strong>de</strong> 7 dias a contar <strong>de</strong> sua assinatura ou <strong>do</strong> ato <strong>de</strong> recebimento <strong>do</strong> produto ou serviço, sempre que a contratação <strong>de</strong><br />

fornecimento <strong>de</strong> produtos e serviços ocorrer fora <strong>do</strong> estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a <strong>do</strong>micílio”. Ato<br />

contínuo, o parágrafo único da norma preceitua que, se o consumi<strong>do</strong>r exercitar tal direito, os valores eventualmente pagos, a<br />

qualquer título, durante o prazo <strong>de</strong> reflexão, serão <strong>de</strong>volvi<strong>do</strong>s <strong>de</strong> imediato, monetariamente atualiza<strong>do</strong>s, o que visa a afastar o<br />

enriquecimento sem causa ou in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>.<br />

Esse direito <strong>de</strong> arrependimento, relativo ao prazo <strong>de</strong> reflexão <strong>de</strong> sete dias, constitui um direito potestativo coloca<strong>do</strong> à<br />

disposição <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, contrapon<strong>do</strong>-se a um esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> sujeição existente contra o fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r. Como se trata <strong>do</strong><br />

exercício <strong>de</strong> um direito legítimo, não há a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquer justificativa, não surgin<strong>do</strong> da sua atuação regular qualquer<br />

direito <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por perdas e danos a favor da outra parte. Como <strong>de</strong>corrência lógica <strong>de</strong> tais constatações, não se po<strong>de</strong> falar<br />

também em incidência <strong>de</strong> multa pelo exercício, o que contraria a própria concepção <strong>do</strong> sistema <strong>de</strong> proteção ao consumi<strong>do</strong>r.<br />

A propósito da existência <strong>de</strong> um direito potestativo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, em notável julgamento <strong>do</strong><br />

ano <strong>de</strong> 2013, <strong>de</strong>duziu que “o Procon po<strong>de</strong> aplicar multa a fornece<strong>do</strong>r em razão <strong>do</strong> repasse aos consumi<strong>do</strong>res, efetiva<strong>do</strong> com base em<br />

cláusula contratual, <strong>do</strong> ônus <strong>de</strong> arcar com as <strong>de</strong>spesas postais <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> exercício <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> arrependimento previsto no art.<br />

49 <strong>do</strong> CDC. De acor<strong>do</strong> com o caput <strong>do</strong> referi<strong>do</strong> dispositivo legal, o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> <strong>de</strong>sistir <strong>do</strong> contrato, no prazo <strong>de</strong> sete dias a<br />

contar <strong>de</strong> sua assinatura ou <strong>do</strong> ato <strong>de</strong> recebimento <strong>do</strong> produto ou serviço, sempre que a contratação <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> produtos e<br />

serviços ocorrer fora <strong>do</strong> estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a <strong>do</strong>micílio. O parágrafo único <strong>do</strong> art. 49 <strong>do</strong><br />

CDC, por sua vez, especifica que o consumi<strong>do</strong>r, ao exercer o referi<strong>do</strong> direito <strong>de</strong> arrependimento, terá <strong>de</strong> volta, imediatamente e<br />

monetariamente atualiza<strong>do</strong>s, to<strong>do</strong>s os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo <strong>de</strong> reflexão – perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> sete<br />

dias conti<strong>do</strong> no caput <strong>do</strong> art. 49 <strong>do</strong> CDC –, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-se incluí<strong>do</strong>s nestes valores todas as <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong>correntes da utilização <strong>do</strong><br />

serviço postal para a <strong>de</strong>volução <strong>do</strong> produto, quantia esta que não po<strong>de</strong> ser repassada ao consumi<strong>do</strong>r. Aceitar o contrário significaria<br />

criar limitação ao direito <strong>de</strong> arrependimento legalmente não prevista, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a <strong>de</strong>sestimular o comércio fora <strong>do</strong> estabelecimento,<br />

tão comum nos dias atuais. Deve-se consi<strong>de</strong>rar, a<strong>de</strong>mais, o fato <strong>de</strong> que eventuais prejuízos enfrenta<strong>do</strong>s pelo fornece<strong>do</strong>r nesse tipo<br />

<strong>de</strong> contratação são inerentes à modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> venda agressiva fora <strong>do</strong> estabelecimento comercial (pela internet, por telefone ou a<br />

<strong>do</strong>micílio)” (STJ, REsp 1.340.604/RJ – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – j. 15.08.2013, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 528).<br />

Como bem pontuam Claudia Lima Marques, Herman Benjamin e Bruno Miragem, tal direito existe para proteger a <strong>de</strong>claração<br />

<strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, possibilitan<strong>do</strong> que ele reflita com calma nas agressivas situações <strong>de</strong> vendas a <strong>do</strong>micílio.50 De acor<strong>do</strong><br />

com os juristas, há um notável avanço confrontan<strong>do</strong>-se a previsão com o sistema civil, que não consagra qualquer regra geral <strong>de</strong><br />

arrependimento para os contratos regi<strong>do</strong>s unicamente pelo CC/2002. Deve ficar claro que não se trata <strong>de</strong> venda a contento ou ad<br />

gustum, tratada pelos arts. 509 a 512 <strong>do</strong> CC, pois nesse caso há necessida<strong>de</strong> <strong>do</strong> compra<strong>do</strong>r motivar as razões da sua não aprovação.<br />

No tipo <strong>do</strong> art. 49 <strong>do</strong> CDC, dispensa-se qualquer motivação para o exercício <strong>do</strong> arrependimento <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> reflexão.<br />

De qualquer maneira, apesar <strong>de</strong> sua indiscutível importância social, o dispositivo em análise é alvo <strong>de</strong> importantes alterações


estruturais por meio <strong>do</strong> Projeto <strong>de</strong> Lei 281/2012. A primeira <strong>de</strong>las diz respeito à ampliação <strong>do</strong> prazo para quatorze dias, assim como<br />

ocorre nos Países que compõem a Comunida<strong>de</strong> Europeia. Nessa linha, o caput <strong>do</strong> coman<strong>do</strong> passaria a ser assim redigi<strong>do</strong>: “O<br />

consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> <strong>de</strong>sistir da contratação a distância, no prazo <strong>de</strong> quatorze dias, a contar da aceitação da oferta ou <strong>do</strong> recebimento ou<br />

disponibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produto ou serviço, o que ocorrer por último”.<br />

Feita tal consi<strong>de</strong>ração, insta verificar os limites <strong>de</strong> aplicação <strong>do</strong> coman<strong>do</strong> na atualida<strong>de</strong>, bem como outras projeções visadas<br />

pelo PL 281/2012. Pela literalida<strong>de</strong> vigente, a sua incidência se restringe às vendas realizadas fora <strong>do</strong> estabelecimento empresarial,<br />

citan<strong>do</strong> a norma as vendas por telefone ou a <strong>do</strong>micílio (chamada a última <strong>de</strong> venda porta a porta). De toda maneira, quan<strong>do</strong> a lei foi<br />

elaborada, ainda não existia a atual evolução a respeito das vendas pela Internet ou outros meios <strong>de</strong> comunicação semelhantes ou<br />

próximos, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o referi<strong>do</strong> dispositivo ser estendi<strong>do</strong> para tais hipóteses, conforme reconhece a melhor <strong>do</strong>utrina. Nessa linha,<br />

posicionam-se, por to<strong>do</strong>s, Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery, afirman<strong>do</strong> que “O CDC enumerou, <strong>de</strong> maneira<br />

exemplificativa, as formas <strong>de</strong> contratação fora <strong>do</strong> estabelecimento comercial: por telefone e a <strong>do</strong>micílio. O caráter <strong>de</strong> numerus<br />

apertus <strong>de</strong>sse elenco é da<strong>do</strong> pelo advérbio ‘especialmente’ constante da norma. Assim, as contratações por telefone, fax, vi<strong>de</strong>otexto,<br />

mala direta, reembolso postal, catálogo, prospectos, lista <strong>de</strong> preços, a <strong>do</strong>micílio, via Internet etc.”.51<br />

Ainda no âmbito da <strong>do</strong>utrina, como bem aponta Alexandre Junqueira Gomi<strong>de</strong>, “o art. 49 <strong>do</strong> CDC também <strong>de</strong>ve ser aplica<strong>do</strong> às<br />

transações envolven<strong>do</strong> o comércio eletrônico via Internet. Nesse senti<strong>do</strong>, a <strong>do</strong>utrina é quase unânime. A <strong>do</strong>utrina apenas não po<strong>de</strong><br />

ser consi<strong>de</strong>rada unânime porque existe uma corrente minoritária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que a disposição <strong>do</strong> art. 49 <strong>do</strong> CDC não <strong>de</strong>ve ser<br />

aplicada quan<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r visita o estabelecimento virtual <strong>do</strong> comerciante. A justificativa <strong>de</strong>ssa <strong>do</strong>utrina é que, nesse caso, não<br />

estaria configurada a contratação à distância, uma vez que a iniciativa para aquisição <strong>do</strong> produto foi realizada pelo próprio<br />

consumi<strong>do</strong>r. O principal a<strong>de</strong>pto <strong>de</strong>sta corrente é Fábio Ulhôa Coelho”. 52<br />

No que concerne às vendas pela Internet, não tem si<strong>do</strong> diferente a conclusão da jurisprudência nacional, colacionan<strong>do</strong>-se as<br />

seguintes ementas, somente a título ilustrativo:<br />

“Compra e venda pela ‘internet’. Desistência manifestada no prazo <strong>do</strong> art. 49 <strong>do</strong> CDC. Cabimento da restituição <strong>do</strong> valor <strong>de</strong>bita<strong>do</strong><br />

pela opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito. Descabimento, porém, <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização pelo dano moral atribuí<strong>do</strong> a <strong>de</strong>sgastes e dissabores, já que<br />

pessoa jurídica não sofre tal sorte <strong>de</strong> repercussão psíquica, assim como <strong>de</strong> aluguéis pela sala na qual os bens ficaram guarda<strong>do</strong>s até<br />

retirada pelo ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r. Apelação parcialmente provida” (TJSP – Apelação 0117190-97.2008.8.26.0100 – Acórdão 4926888, São<br />

Paulo – Trigésima Sexta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Arantes Theo<strong>do</strong>ro – j. 03.02.2011 – DJESP 18.02.2011).<br />

“Reparação <strong>de</strong> danos. Consumi<strong>do</strong>r. Compra e venda <strong>de</strong> aparelho celular efetuada pela internet. <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> arrependimento exerci<strong>do</strong><br />

conforme art. 49 <strong>do</strong> CDC. Transtornos para confirmar o distrato. Má comunicação entre a loja e a opera<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> cartão <strong>de</strong> crédito.<br />

Cobrança das parcelas na fatura. <strong>Direito</strong> à restituição, em <strong>do</strong>bro, <strong>do</strong>s valores pagos. Inexistência <strong>de</strong> danos morais. Recurso<br />

parcialmente provi<strong>do</strong>” (TJRS – Recurso Cível 71002280618, Soleda<strong>de</strong> – Segunda Turma Recursal Cível – Rel. Des. Vivian Cristina<br />

Angonese Spengler – j. 21.10.2009 – DJERS 29.10.2009, p. 159).<br />

Destaque-se, mais uma vez, que o PL 281/2012 preten<strong>de</strong> incluir expressamente menção aos contratos celebra<strong>do</strong>s por meio<br />

eletrônico, não pairan<strong>do</strong> qualquer dúvida a respeito da questão. De acor<strong>do</strong> com a proposição, o art. 49 ganharia mais um parágrafo,<br />

estabelecen<strong>do</strong> que “por contratação a distância enten<strong>de</strong>-se aquela efetivada fora <strong>do</strong> estabelecimento, ou sem a presença física<br />

simultânea <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r e fornece<strong>do</strong>r, especialmente em <strong>do</strong>micílio, por telefone, reembolso postal, por meio eletrônico ou<br />

similar”.<br />

Nessa linha, há um <strong>de</strong>bate atual interessante no Brasil, a respeito da subsunção <strong>do</strong> art. 49 da Lei 8.078/1990 para as compras <strong>de</strong><br />

passagens aéreas pela internet ou outro meio <strong>de</strong> comunicação à distância. Algumas <strong>de</strong>cisões afastam a incidência da norma, uma<br />

vez que o consumi<strong>do</strong>r tem consciência <strong>do</strong> que está adquirin<strong>do</strong>, o que foge <strong>do</strong> fim social <strong>do</strong> artigo consumerista, <strong>de</strong> sua mens legis<br />

(por todas: TJDF – Recurso 2010.01.1.014473-2 – Acórdão 492.650 – Segunda Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e<br />

Criminais <strong>do</strong> DF – Rel. Juiz José Guilherme <strong>de</strong> Souza – DJDFTE 05.04.2011, p. 244). Essa é a opinião <strong>de</strong> Alexandre Gomi<strong>de</strong>, que<br />

<strong>de</strong>ssa forma se posiciona, a <strong>de</strong>speito da corrente minoritária antes citada: “ainda assim, admitimos a teoria <strong>de</strong> Fábio Ulhôa Coelho<br />

numa única hipótese: na contratação a distância <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> transportes aéreos”.53<br />

Porém, outras tantas ementas aplicam com justiça o art. 49 <strong>do</strong> CDC para as compras <strong>de</strong> passagens aéreas pela internet ou<br />

telefone, pois o fim social da norma é justamente <strong>de</strong> abranger a hipótese <strong>de</strong> compra e venda contemporânea (nessa linha: TJDF –<br />

Recurso 2008.01.1.125046-8 – Acórdão 398.269 – Primeira Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e Criminais – Rel. Juíza<br />

Wil<strong>de</strong> Maria Silva Justiniano Ribeiro – DJDFTE 13.01.2010, p. 151; TJBA – Recurso 124461-2/2007-1 – Terceira Turma Recursal<br />

– Rel. Juiz José Cícero Landin Neto – j. 28.05.2008 – DJBA 05.06.2008; e TJRS – Recurso inomina<strong>do</strong> 71000597799, Caxias <strong>do</strong> Sul<br />

– Primeira Turma Recursal Cível – Rel. Des. João Pedro Cavalli Júnior – j. 18.11.2004). De fato, não se po<strong>de</strong> buscar o fim social da<br />

lei em prejuízo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, o que viola a própria concepção da Lei 8.078/1990 como norma protecionista e com fundamento<br />

constitucional. Pelo último caminho, são ilegais e abusivas as multas cobradas pelas empresas aéreas <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong>


arrependimento, conta<strong>do</strong>, nessa hipótese, da celebração <strong>do</strong> contrato. Ato contínuo, merece aplicação integral o parágrafo único <strong>do</strong><br />

art. 49 <strong>do</strong> CDC, com a <strong>de</strong>volução integral <strong>do</strong> que foi pago pelo consumi<strong>do</strong>r, valor que <strong>de</strong>ve ser atualiza<strong>do</strong> integralmente.<br />

Para afastar qualquer dúvida a respeito da matéria, mais uma vez o PL 281/2012 ten<strong>de</strong> a incluir preceito específico sobre as<br />

compras <strong>de</strong> passagens áreas, com a seguinte dicção: “Sem prejuízo <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> rescisão <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> transporte aéreo antes <strong>de</strong><br />

iniciada a viagem (art. 740, § 3º, <strong>do</strong> Código Civil), o exercício <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> arrependimento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> passagens aéreas<br />

po<strong>de</strong>rá ter seu prazo diferencia<strong>do</strong>, em virtu<strong>de</strong> das peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> contrato, por norma fundamentada das agências regula<strong>do</strong>ras”<br />

(art. 49-A).<br />

A inovação vem em boa hora. Para este autor, contu<strong>do</strong>, é preciso mudar a proposição legal, não se atribuin<strong>do</strong> a regulamentação<br />

<strong>do</strong> prazo à agência regula<strong>do</strong>ra, o que abriria um prece<strong>de</strong>nte perigoso no âmbito das relações <strong>do</strong> consumo. Nesse contexto, melhor<br />

seria que a nova norma trouxesse um prazo <strong>de</strong> arrependimento <strong>de</strong> 72 horas antes <strong>do</strong> início da viagem, o que é mais bem adapta<strong>do</strong> à<br />

realida<strong>de</strong> das passagens aéreas.<br />

Ainda no que concerne à abrangência atual da norma, ela não tem subsunção para as situações <strong>de</strong> venda realizada no<br />

estabelecimento empresarial, com presença física e corpórea <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, o que é aclama<strong>do</strong> amplamente na prática. Nessa linha,<br />

“O arrependimento <strong>de</strong> que trata o art. 49 <strong>do</strong> CDC somente é possível nos casos ali elenca<strong>do</strong>s, ou seja, somente se a compra se <strong>de</strong>u<br />

por telefone ou internet. No caso aqui posto a venda se <strong>de</strong>u diretamente na loja da opera<strong>do</strong>ra, não incidin<strong>do</strong> a regra <strong>do</strong> art. 49, caput<br />

<strong>do</strong> CDC. Pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> cancelamento <strong>de</strong> linha que não veio comprova<strong>do</strong> nos autos. Preliminar rejeitada, apelação improvida” (TJRS –<br />

Apelação Cível 70029597242, Teutônia – Décima Nona Câmara Cível – Rel. Des. Guinther Spo<strong>de</strong> – j. 21.07.2009 – DOERS<br />

28.07.2009, p. 69). Em reforço, colaciona-se: “Autora que adquiriu os bens <strong>de</strong> livre e espontânea vonta<strong>de</strong> no estabelecimento<br />

comercial da ré. Posterior arrependimento. Impossibilida<strong>de</strong>. Relação <strong>de</strong> consumo que não se sujeita ao art. 49 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Solicitação <strong>de</strong> cancelamento <strong>do</strong>s negócios não <strong>de</strong>monstrada suficientemente. Anotação <strong>de</strong> inadimplência. Ilicitu<strong>de</strong>.<br />

Inexistência. Dano moral não patentea<strong>do</strong>. Apelo <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação 992.08.002923-9 – Acórdão 4727236, Osasco –<br />

Trigésima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Marcos Ramos – j. 22.09.2010 – DJESP 25.10.2010).<br />

Mais uma vez, cabe fazer pontuação a respeito <strong>do</strong> PL 281/2012, pois há proposta <strong>de</strong> inclusão <strong>de</strong> dispositivo relativo às vendas<br />

realizadas no estabelecimento empresarial, mas sem que o consumi<strong>do</strong>r tenha contato imediato com o que está sen<strong>do</strong> adquiri<strong>do</strong>.<br />

Nesse contexto, preten<strong>de</strong>-se a inclusão <strong>de</strong> norma preceituan<strong>do</strong> que se equipara à modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contratação à distância “aquela em<br />

que, embora realizada no estabelecimento, o consumi<strong>do</strong>r não teve a prévia oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecer o produto ou serviço, por não<br />

se encontrar em exposição ou pela impossibilida<strong>de</strong> ou dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso a seu conteú<strong>do</strong>”. Cite-se a compra realizada em<br />

estabelecimentos por meio <strong>de</strong> computa<strong>do</strong>res que estão <strong>de</strong>ntro da loja.<br />

Pois bem, na atual realida<strong>de</strong> legislativa, efetivamente, nas situações em que o produto ou o serviço é adquiri<strong>do</strong> no<br />

estabelecimento, não há o direito <strong>de</strong> arrependimento. Todavia, na prática, há um costume saudável <strong>de</strong> as empresas trocarem<br />

produtos, em especial quan<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r diz não estar satisfeito com eles; ou ainda porque o bem <strong>de</strong> consumo não lhe serviu. Os<br />

fornece<strong>do</strong>res assim o fazem para não per<strong>de</strong>rem a clientela, manten<strong>do</strong> um bom relacionamento com a coletivida<strong>de</strong> consumerista. A<br />

par da existência <strong>de</strong>sse costume reitera<strong>do</strong>, po<strong>de</strong>-se construir uma tese, a partir da boa-fé objetiva, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que já há um direito<br />

<strong>de</strong> troca a favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (surrectio), afastan<strong>do</strong> a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> troca pela outra parte (supressio). Deve ficar bem claro<br />

que se trata <strong>de</strong> uma tese, que ainda <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>vidamente <strong>de</strong>senvolvida no âmbito <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> Brasileiro. Ressalve-se que,<br />

em to<strong>do</strong>s os casos, há obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> troca <strong>de</strong> produtos quan<strong>do</strong> presentes vícios no produto ou <strong>do</strong> serviço, na esteira <strong>do</strong> exposto<br />

no capítulo anterior <strong>de</strong>sta obra.<br />

De qualquer mo<strong>do</strong>, filia-se aos julga<strong>do</strong>s que subsumem o art. 49 <strong>do</strong> CDC para as vendas realizadas no estabelecimento em que<br />

são utiliza<strong>do</strong>s meios agressivos <strong>de</strong> marketing para trazer o consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> fora para <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> estabelecimento. Nessa linha, com<br />

interessantes conclusões, vejamos ementa <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> São Paulo:<br />

“Negócio jurídico – Contrato – <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> arrependimento – Incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – Hipótese em que o<br />

contrato foi firma<strong>do</strong> <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> estabelecimento comercial – Art. 49 <strong>do</strong> CDC que não <strong>de</strong>ve ser interpreta<strong>do</strong> restritivamente – Méto<strong>do</strong><br />

agressivo <strong>de</strong> ‘marketing’ que permite o direito <strong>de</strong> arrependimento – Caso em que a consumi<strong>do</strong>ra foi premiada após participação <strong>de</strong><br />

jogo, ganhan<strong>do</strong> direito a conhecer hotel, on<strong>de</strong> foi convencida a contratar, em duna emocional – Vonta<strong>de</strong> maculada pelo entusiasmo<br />

temporário, causa<strong>do</strong> pelo estímulo repentino e <strong>de</strong> ansieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> contratação, <strong>de</strong>riva<strong>do</strong> <strong>do</strong> méto<strong>do</strong> <strong>de</strong> apresentação <strong>do</strong> produto ou<br />

serviço – <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> arrependimento que <strong>de</strong>ve ser garanti<strong>do</strong> em homenagem à boa-fé contratual, evitan<strong>do</strong>-se que a venda emocional<br />

possa legitimar contratações maculadas pela ausência <strong>de</strong> transparência e respeito aos interesses <strong>do</strong> contratante mais fraco – Recurso<br />

não provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação com Revisão 9134379-17.2003.8.26.0000 – Rel. Melo Colombi –14ª Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – j.<br />

09.05.2007 – Data <strong>de</strong> registro: 25.05.2007).<br />

Em reforço, da mesma Corte Estadual: “Na verda<strong>de</strong>, procura-se proteger o consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> uma manifestação <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong><br />

maculada pelo entusiasmo temporário, produzi<strong>do</strong> pelo estimulo repentino, pelo efeito <strong>de</strong> surpresa e <strong>de</strong> ansieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> contratação,<br />

causa<strong>do</strong>s pelo méto<strong>do</strong> <strong>de</strong> apresentação <strong>do</strong> produto. Nessa esteira, a contração em que se convida o consumi<strong>do</strong>r a ingressar no


estabelecimento comercial por meio <strong>de</strong> chamarizes como festas, coquetéis, sorteios, jogos em geral, num clima ‘emocional’ <strong>de</strong><br />

consumo, como diria Cláudia Lima Marques, <strong>de</strong>ve receber proteção <strong>do</strong> Código consumerista” (TJSP – Agravo <strong>de</strong> Instrumento<br />

0000882-84.2008.8.26.0000 – Rel. Felipe Ferreira – Comarca: Barretos – 26ª Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – j. 28.01.2008 – Data <strong>de</strong><br />

registro: 07.02.2008). Constata-se que tais situações fugiram da abrangência <strong>do</strong> PL 281/2012. Quem sabe não seria o caso <strong>de</strong> incluílas<br />

no CDC, na esteira <strong>do</strong>s acórdãos e <strong>do</strong>utrinas cita<strong>do</strong>s.<br />

Para findar o presente tópico, <strong>de</strong>ve ficar claro que a boa-fé objetiva <strong>de</strong>ve estar presente para o exercício <strong>de</strong>sse direito <strong>de</strong><br />

arrependimento por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Justamente para se evitar abusos é que o prazo <strong>de</strong> reflexão é exíguo, <strong>de</strong> apenas sete dias,<br />

conforme lecionam Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery.54<br />

Em outras palavras, não po<strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r agir no exercício <strong>de</strong>ste direito em abuso, <strong>de</strong>srespeitan<strong>do</strong> a boa-fé e a função social<br />

<strong>do</strong> negócio, servin<strong>do</strong> como parâmetro o art. 187 <strong>do</strong> CC/2002, mais uma vez em diálogo das fontes. Imagine-se, por exemplo, a<br />

hipótese <strong>de</strong> alguém que utiliza um serviço presta<strong>do</strong> pela internet e sempre se arrepen<strong>de</strong>, <strong>de</strong> forma continuada, para nunca pagar pelo<br />

consumo. Por óbvio que a norma está sen<strong>do</strong> aplicada em <strong>de</strong>srespeito ao seu escopo principal, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a conduta <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r<br />

ser premiada.<br />

Ainda ilustran<strong>do</strong>, não po<strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r “voltar atrás” em relação às informações prestadas pela internet, cain<strong>do</strong> em<br />

contradição, aplican<strong>do</strong>-se a máxima que veda o comportamento contraditório (venire contra factum proprium non potest). Nesse<br />

senti<strong>do</strong>, da jurisprudência gaúcha:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Contrato. Rastreamento veicular. Cientificação <strong>de</strong> cláusula <strong>de</strong> multa para rescisão antecipada. Pedi<strong>do</strong> contraposto.<br />

Limitação <strong>de</strong> reembolso <strong>de</strong> <strong>de</strong>spesas. I. Não prospera a pretensão à <strong>de</strong>sobrigação <strong>de</strong> cláusula contratual da qual a consumi<strong>do</strong>ra, em<br />

que pese tenha contrata<strong>do</strong> o serviço por telefone, foi efetivamente cientificada, não só ao receber uma via <strong>do</strong> contrato pelo correio e<br />

não exercer o direito <strong>de</strong> arrependimento no prazo <strong>do</strong> art. 49 <strong>do</strong> CDC, mas também ao aceitar expressamente as condições gerais <strong>do</strong><br />

contrato através da internet. II. Acolhimento da pretensão recursal atinente à limitação das <strong>de</strong>spesas reembolsáveis à parte contrária.<br />

Recurso provi<strong>do</strong> em parte. Unânime” (TJRS – Recurso Cível 71001678457, Porto Alegre – Primeira Turma Recursal Cível – Rel.<br />

Des. João Pedro Cavalli Júnior – j. 17.07.2008 – DOERS 22.07.2008, p. 102).<br />

Encerrada a abordagem <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> arrependimento a favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, parte-se ao estu<strong>do</strong> da garantia contratual<br />

consagrada pelo art. 50 da Lei 8.078/1990.<br />

5.6.<br />

A GARANTIA CONTRATUAL DO ART. 50 DA LEI 8.078/1990<br />

A garantia contratual constitui modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cadência convencional, sen<strong>do</strong> o prazo concedi<strong>do</strong> geralmente pelo ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r<br />

para ampliar o direito potestativo da<strong>do</strong> pela lei ao compra<strong>do</strong>r <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> bem <strong>de</strong> consumo. A título <strong>de</strong> ilustração, cite-se a<br />

comum garantia estendida, fornecida quan<strong>do</strong> da venda <strong>de</strong> eletro<strong>do</strong>mésticos ou da prestação <strong>de</strong> serviços cotidianos.<br />

A categoria está tratada pelo art. 50 da Lei 8.078/1990, consagran<strong>do</strong> o seu caput o caráter complementar da garantia contratual<br />

em relação à garantia legal. Como bem pontuam Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery, é inadmissível substituir a<br />

garantia legal pela contratual, pois a primeira é obrigatória e in<strong>de</strong>rrogável, enquanto a última é meramente complementar.55 Não se<br />

olvi<strong>de</strong> que os prazos <strong>de</strong> garantia legal são aqueles previstos no art. 26 <strong>do</strong> CDC, ou seja, trinta dias para os bens não duráveis e<br />

noventa dias para os bens duráveis.<br />

O caráter <strong>de</strong> complementarida<strong>de</strong> da garantia contratual em relação à legal é muito bem explora<strong>do</strong> por Rizzatto Nunes, que<br />

apresenta a sua correta interpretação, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que “complementar significa que se soma o prazo <strong>de</strong> garantia ao prazo<br />

contratual”. 56 Apresenta então o magistra<strong>do</strong> mais um didático exemplo, que auxilia em muito na compreensão da categoria<br />

consumerista:<br />

“Portanto, não se <strong>de</strong>ve confundir prazo <strong>de</strong> reclamação com garantia legal <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação.<br />

Se o fornece<strong>do</strong>r dá prazo <strong>de</strong> garantia contratual (até a Copa <strong>de</strong> 2002, um, <strong>do</strong>is anos etc.), <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> tempo garanti<strong>do</strong> até o fim<br />

(inclusive último dia), o produto não po<strong>de</strong> apresentar vício. Se apresentar, o consumi<strong>do</strong>r tem o direito <strong>de</strong> reclamar, que se esten<strong>de</strong> até<br />

30 ou 90 dias após o término da garantia.<br />

Se o fornece<strong>do</strong>r não dá prazo, então os 30 ou 90 dias correm <strong>do</strong> dia da aquisição ou término <strong>do</strong> serviço. Claro que sempre haverá,<br />

como vimos, a hipótese <strong>de</strong> vício oculto, que gera início <strong>do</strong> prazo para reclamar apenas quan<strong>do</strong> ocorre”. 57<br />

Fica claro, portanto, a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> soma <strong>do</strong>s prazos (garantia contratual + garantia legal), conforme igualmente <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m<br />

Claudia Lima Marques, Herman Benjamin e Bruno Miragem.58 Insta anotar que julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong>u outra<br />

interpretação para a hipótese, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> não se tratar <strong>de</strong> soma <strong>do</strong>s prazos, mas <strong>de</strong> aplicação analógica e em complemento <strong>do</strong> art.<br />

26 <strong>do</strong> CDC. Na verda<strong>de</strong>, a solução, ao final, foi exatamente a mesma. Vejamos a ementa, que reproduz um bom resumo a respeito<br />

<strong>do</strong>s problemas referentes às garantias no sistema consumerista:


“Consumi<strong>do</strong>r. Responsabilida<strong>de</strong> pelo fato ou vício <strong>do</strong> produto. Distinção. <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> reclamar. Prazos. Vício <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação. Prazo<br />

<strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial. Defeito <strong>de</strong> segurança. Prazo prescricional. Garantia legal e prazo <strong>de</strong> reclamação. Distinção. Garantia contratual.<br />

Aplicação, por analogia, <strong>do</strong>s prazos <strong>de</strong> reclamação atinentes à garantia legal. No sistema <strong>do</strong> CDC, a responsabilida<strong>de</strong> pela qualida<strong>de</strong><br />

biparte-se na exigência <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação e segurança, segun<strong>do</strong> o que razoavelmente se po<strong>de</strong> esperar <strong>do</strong>s produtos e serviços. Nesse<br />

contexto, fixa, <strong>de</strong> um la<strong>do</strong>, a responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço, que compreen<strong>de</strong> os <strong>de</strong>feitos <strong>de</strong> segurança; e <strong>de</strong><br />

outro, a responsabilida<strong>de</strong> por vício <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço, que abrange os vícios por ina<strong>de</strong>quação. Observada a classificação<br />

utilizada pelo CDC, um produto ou serviço apresentará vício <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação sempre que não correspon<strong>de</strong>r à legítima expectativa <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r quanto à sua utilização ou fruição, ou seja, quan<strong>do</strong> a <strong>de</strong>sconformida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço comprometer a sua<br />

prestabilida<strong>de</strong>. Outrossim, um produto ou serviço apresentará <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> segurança quan<strong>do</strong>, além <strong>de</strong> não correspon<strong>de</strong>r à expectativa<br />

<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, sua utilização ou fruição for capaz <strong>de</strong> adicionar riscos à sua incolumida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> terceiros. O CDC apresenta duas<br />

regras distintas para regular o direito <strong>de</strong> reclamar, conforme se trate <strong>de</strong> vício <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação ou <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> segurança. Na primeira<br />

hipótese, os prazos para reclamação são <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais, nos termos <strong>do</strong> art. 26 <strong>do</strong> CDC, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong> 30 (trinta) dias para produto ou<br />

serviço não durável e <strong>de</strong> 90 (noventa) dias para produto ou serviço durável. A pretensão à reparação pelos danos causa<strong>do</strong>s por fato <strong>do</strong><br />

produto ou serviço vem regulada no art. 27 <strong>do</strong> CDC, prescreven<strong>do</strong> em 5 (cinco) anos. A garantia legal é obrigatória, <strong>de</strong>la não<br />

po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> se esquivar o fornece<strong>do</strong>r. Paralelamente a ela, porém, po<strong>de</strong> o fornece<strong>do</strong>r oferecer uma garantia contratual, alargan<strong>do</strong> o prazo<br />

ou o alcance da garantia legal. A lei não fixa expressamente um prazo <strong>de</strong> garantia legal. O que há é prazo para reclamar contra o<br />

<strong>de</strong>scumprimento <strong>de</strong>ssa garantia, o qual, em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> vício <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação, está previsto no art. 26 <strong>do</strong> CDC, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong> 90 (noventa)<br />

ou 30 (trinta) dias, conforme seja produto ou serviço durável ou não. Diferentemente <strong>do</strong> que ocorre com a garantia legal contra vícios<br />

<strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação, cujos prazos <strong>de</strong> reclamação estão conti<strong>do</strong>s no art. 26 <strong>do</strong> CDC, a lei não estabelece prazo <strong>de</strong> reclamação para a garantia<br />

contratual. Nessas condições, uma interpretação teleológica e sistemática <strong>do</strong> CDC permite integrar analogicamente a regra relativa à<br />

garantia contratual, esten<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-lhe os prazos <strong>de</strong> reclamação atinentes à garantia legal, ou seja, a partir <strong>do</strong> término da garantia<br />

contratual, o consumi<strong>do</strong>r terá 30 (bens não duráveis) ou 90 (bens duráveis) dias para reclamar por vícios <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação surgi<strong>do</strong>s no<br />

<strong>de</strong>correr <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> <strong>de</strong>sta garantia. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 967.623/RJ – Terceira Turma – Rel. Min.<br />

Nancy Andrighi – j. 16.04.2009 – DJe 29.06.2009).<br />

Destaque-se a existência <strong>de</strong> um outro julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> STJ, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 463, que parece dar a correta<br />

interpretação da soma <strong>do</strong>s prazos, conforme se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong> da seguinte publicação: “Prazo. Decadência. Reclamação. Vícios.<br />

Produto. A Turma reiterou a jurisprudência <strong>de</strong>ste Superior Tribunal e enten<strong>de</strong>u que o termo a quo <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cadência para as<br />

reclamações <strong>de</strong> vícios no produto (art. 26 <strong>do</strong> CDC), no caso, um veículo automotor, dá-se após a garantia contratual. Isso acontece<br />

em razão <strong>de</strong> que o adiamento <strong>do</strong> início <strong>do</strong> referi<strong>do</strong> prazo, em tais casos, justifica-se pela possibilida<strong>de</strong> contratualmente estabelecida<br />

<strong>de</strong> que seja sana<strong>do</strong> o <strong>de</strong>feito apresenta<strong>do</strong> durante a garantia. Prece<strong>de</strong>nte cita<strong>do</strong>: REsp 1.021.261-RS, DJe 06.05.2010” (STJ – REsp<br />

547.794-PR – Rel. Min. Maria Isabel Gallotti – j. 15.02.2011).<br />

Em resumo, conforme se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong> <strong>de</strong> ementa publicada pelo próprio Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça pela ferramenta<br />

Jurisprudência em Teses, em setembro <strong>de</strong> 2015, “o início da contagem <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cadência para a reclamação <strong>de</strong> vícios <strong>do</strong><br />

produto (art. 26 <strong>do</strong> CDC) se dá após o encerramento da garantia contratual”. Em suma, <strong>de</strong> fato, os cita<strong>do</strong>s prazos <strong>de</strong>vem ser<br />

soma<strong>do</strong>s.<br />

Questão <strong>de</strong> <strong>de</strong>bate refere-se à possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se cobrar pela garantia contratual concedida, o que é usual na prática da garantia<br />

estendida. O que se enten<strong>de</strong> <strong>de</strong> forma majoritária é que tal garantia contratual somente po<strong>de</strong> ser cobrada se efetivamente contratada,<br />

o que não po<strong>de</strong> ser presumi<strong>do</strong> na espécie, sob pena <strong>de</strong> responsabilização civil <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. Nessa linha <strong>de</strong> <strong>de</strong>dução, vejamos duas<br />

recentes ementas <strong>de</strong> Tribunais Estaduais:<br />

“Recurso inomina<strong>do</strong>. Contrato <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> aparelho <strong>de</strong> ar condiciona<strong>do</strong>. Garantia estendida não contratada. Cobrança<br />

in<strong>de</strong>vida. Restituição em <strong>do</strong>bro. Inocorrência <strong>de</strong> danos morais. Procedência parcial <strong>do</strong>s pedi<strong>do</strong>s. Sentença mantida por seus próprios<br />

fundamentos. Improvimento <strong>do</strong> recurso” (TJBA – Recurso 0001911-05.2009.805.0103-1 – Terceira Turma Recursal – Rel. Juiz<br />

Marcelo Silva Britto – DJBA 14.02.2011).<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Aquisição <strong>de</strong> televisão. Cobrança <strong>de</strong> taxa <strong>de</strong> garantia estendida. Não contratação. Preliminar <strong>de</strong> ilegitimida<strong>de</strong> passiva<br />

afastada. Cobrança in<strong>de</strong>vida. Conduta abusiva. <strong>Direito</strong> à <strong>de</strong>sconstituição <strong>do</strong> débito e à <strong>de</strong>volução <strong>do</strong>s valores pagos in<strong>de</strong>vidamente. 1.<br />

Ilegitimida<strong>de</strong> passiva da recorrente afastada, vez que a cobrança in<strong>de</strong>vida foi incluída nas cobranças efetuadas pela ré, logo, figura<br />

como fornece<strong>do</strong>r responsável perante o consumi<strong>do</strong>r. Se não é a ré capaz <strong>de</strong> cancelar o serviço não solicita<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve abster-se <strong>de</strong> incluílo<br />

em suas faturas. 2. Ré não se <strong>de</strong>sincumbiu <strong>do</strong> ônus que lhe competia <strong>de</strong> comprovar a contratação da garantia estendida pela parte<br />

autora. Aliás, prova <strong>de</strong> fácil produção para a ré, visto que <strong>de</strong>tém gran<strong>de</strong> aporte técnico. 3. Restituição em <strong>do</strong>bro <strong>do</strong>s valores<br />

in<strong>de</strong>vidamente pagos, que se impõe, com base no art. 42, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC. Negaram provimento ao recurso” (TJRS –<br />

Recurso Cível 71002673820, Porto Alegre – Primeira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Heleno Tregnago Saraiva – j. 12.08.2010 –<br />

DJERS 19.08.2010).<br />

O caput <strong>do</strong> art. 50 <strong>do</strong> CDC ainda prenuncia que a garantia contratual <strong>de</strong>ve ser concebida por escrito pelo fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong><br />

produtos ou presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços, o que é <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> como termo <strong>de</strong> garantia. A norma está em sintonia com o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar<br />

próprio da boa-fé objetiva. Como bem pon<strong>de</strong>ra Ezequiel Morais, apesar da informalida<strong>de</strong> que rege os contratos civis ou <strong>de</strong> consumo


(art. 107 <strong>do</strong> CC), a garantia contratual exige forma escrita, o que é reconheci<strong>do</strong> também em outras fontes <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Compara<strong>do</strong>,<br />

caso das normas italianas.59 A norma visa a dar maior segurança aos consumi<strong>do</strong>res, para a tutela efetiva <strong>do</strong>s seus direitos.<br />

Em complemento, estipula o parágrafo único <strong>do</strong> art. 50 que o termo <strong>de</strong> garantia ou equivalente <strong>de</strong>ve ser padroniza<strong>do</strong> e<br />

esclarecer, <strong>de</strong> maneira a<strong>de</strong>quada, em que consiste a garantia, especialmente o seu lapso temporal. Além disso, <strong>de</strong>ve indicar a forma<br />

e o lugar em que po<strong>de</strong> ser exercitada e os ônus a cargo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Em suma, as informações constantes <strong>do</strong> termo <strong>de</strong>vem ser<br />

completas e precisas, para o seu <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> exercício por parte <strong>do</strong> vulnerável negocial.<br />

O art. 50, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC ainda preceitua que o termo <strong>de</strong> garantia <strong>de</strong>ve ser efetivamente entregue e preenchi<strong>do</strong> pelo<br />

fornece<strong>do</strong>r, no ato <strong>do</strong> fornecimento, acompanha<strong>do</strong> <strong>de</strong> manual <strong>de</strong> instruções, <strong>de</strong> instalação e uso <strong>do</strong> produto em linguagem didática,<br />

com ilustrações. O <strong>de</strong>srespeito a tais <strong>de</strong>veres inerentes à boa-fé objetiva po<strong>de</strong> gerar a responsabilização <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r,<br />

nas hipóteses <strong>de</strong> danos causa<strong>do</strong>s aos consumi<strong>do</strong>res.<br />

Para encerrar a análise <strong>do</strong> tema, cumpre trazer a lume mais um <strong>de</strong>bate envolven<strong>do</strong> os vícios redibitórios trata<strong>do</strong>s pelo Código<br />

Civil, em diálogo das fontes. Enuncia o art. 446 <strong>do</strong> CC/2002 que “Não correrão os prazos <strong>do</strong> artigo antece<strong>de</strong>nte na constância <strong>de</strong><br />

cláusula <strong>de</strong> garantia; mas o adquirente <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>nunciar o <strong>de</strong>feito ao alienante nos trinta dias seguintes ao seu <strong>de</strong>scobrimento, sob<br />

pena <strong>de</strong> <strong>de</strong>cadência”. O dispositivo sempre gerou dúvidas, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a entrada em vigor <strong>do</strong> Código Civil. Esclareça-se que os “prazos<br />

<strong>do</strong> artigo antece<strong>de</strong>nte” são os prazos <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais <strong>de</strong> trinta dias, cento e oito dias e um ano para a reclamação <strong>do</strong>s vícios<br />

redibitórios.<br />

Em verda<strong>de</strong>, trata o coman<strong>do</strong> legal <strong>de</strong> prazo <strong>de</strong> garantia convencional que in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>do</strong> legal e vice-versa, exatamente como<br />

consta <strong>do</strong> CDC. O art. 50 da Lei 8.078/1990 serve perfeitamente para a interpretação <strong>do</strong> preceito priva<strong>do</strong>, por meio <strong>de</strong> um diálogo<br />

<strong>de</strong> complementarida<strong>de</strong>. Assim, na vigência <strong>de</strong> prazo <strong>de</strong> garantia (<strong>de</strong>cadência convencional), não correrão os prazos legais<br />

(<strong>de</strong>cadência legal). Porém, diante <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver anexo <strong>de</strong> informação, inerente à boa-fé objetiva, o alienante <strong>de</strong>verá <strong>de</strong>nunciar o vício no<br />

prazo <strong>de</strong> trinta dias conta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> seu <strong>de</strong>scobrimento, sob pena <strong>de</strong> <strong>de</strong>cadência. A dúvida relativa ao dispositivo gira em torno da<br />

<strong>de</strong>cadência mencionada ao seu final. Essa <strong>de</strong>cadência se refere à perda da garantia convencional ou à perda <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> ingressar<br />

com as ações edilícias?<br />

Na opinião <strong>de</strong>ste autor, a <strong>de</strong>cadência referenciada no final <strong>do</strong> art. 446 <strong>do</strong> CC está ligada à perda <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> garantia e não ao<br />

direito <strong>de</strong> ingressar com as ações edilícias fundadas em vícios redibitórios. Sen<strong>do</strong> assim, fin<strong>do</strong> o prazo <strong>de</strong> garantia convencional, ou<br />

não exercen<strong>do</strong> o adquirente o direito no prazo <strong>de</strong> 30 dias fixa<strong>do</strong> no art. 446 <strong>do</strong> CC, iniciam-se os prazos legais previstos no art. 445<br />

<strong>do</strong> CC. Essa é a melhor interpretação, <strong>de</strong>ntro da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> justiça, pois, caso contrário, seria pior aceitar um prazo <strong>de</strong> garantia<br />

convencional, uma vez que o prazo <strong>de</strong> exercício <strong>do</strong> direito é reduzi<strong>do</strong> para trinta dias. Interpretan<strong>do</strong> <strong>de</strong>ssa forma, leciona Maria<br />

Helena Diniz que, “com o término <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> garantia ou não <strong>de</strong>nuncian<strong>do</strong> o adquirente o vício <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> trinta dias, os<br />

prazos legais <strong>do</strong> art. 445 iniciar-se-ão”.60 Anote-se, para encerrar a seção, que essa solução <strong>de</strong> complementarida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s prazos no<br />

sistema civil já é aplicada pela melhor jurisprudência nacional (TJRS – Recurso 34989-90.2010.8.21.9000, Três <strong>de</strong> Maio – Segunda<br />

Turma Recursal Cível – Rel. Des. Fernanda Carravetta Vilan<strong>de</strong> – j. 13.04.2011 – DJERS 19.04.2011).<br />

5.7.<br />

AS CLÁUSULAS ABUSIVAS NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ANÁLISE<br />

DO ROL EXEMPLIFICATIVO DO ART. 51 DA LEI 8.078/1990 E SUAS<br />

DECORRÊNCIAS<br />

Sintoniza<strong>do</strong> com os princípios da função social <strong>do</strong> contrato e da boa-fé objetiva, o art. 51 da Lei 8.078/1990 consagra um rol<br />

exemplificativo ou numerus apertus <strong>de</strong> cláusulas abusivas, consi<strong>de</strong>radas como nulas <strong>de</strong> pleno <strong>de</strong> direito nos contratos <strong>de</strong> consumo<br />

(nulida<strong>de</strong> absoluta ou tão somente nulida<strong>de</strong>). Esclareça-se que a expressão cláusulas abusivas é mais contemporânea, para substituir<br />

o antigo termo cláusulas leoninas, que remonta ao <strong>Direito</strong> Romano.<br />

A natureza meramente exemplificativa, tema praticamente pacífico em se<strong>de</strong> <strong>do</strong>utrinária e jurispru<strong>de</strong>ncial em nosso País, fica<br />

clara pela redação <strong>do</strong> caput <strong>do</strong> coman<strong>do</strong> em estu<strong>do</strong> (“São nulas <strong>de</strong> pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao<br />

fornecimento <strong>de</strong> produtos e serviços que…” – com <strong>de</strong>staque por este autor). Como bem aponta Cristiano Heineck Schmitt, em<br />

trabalho monográfico sobre a matéria, “Todas essas situações exprimem contrarieda<strong>de</strong> à boa-fé, mas o legisla<strong>do</strong>r preferiu ser<br />

meticuloso, explicitan<strong>do</strong> cada uma <strong>de</strong>las, as quais servem <strong>de</strong> auxílio ao juiz, sem limitar a sua ativida<strong>de</strong>, uma vez que esse rol é<br />

apenas exemplificativo. A não a<strong>de</strong>quação <strong>do</strong> caso concreto ao rol <strong>do</strong> art. 51 <strong>do</strong> CDC não impedirá a ativida<strong>de</strong> meticulosa <strong>do</strong><br />

magistra<strong>do</strong> na análise das cláusulas <strong>do</strong> instrumento, a fim <strong>de</strong> comprovar a abusivida<strong>de</strong> ou não <strong>de</strong> uma ou <strong>de</strong> todas elas”.61<br />

As cláusulas são consi<strong>de</strong>radas ilícitas pela presença <strong>de</strong> um abuso <strong>de</strong> direito contratual. Além da nulida<strong>de</strong> absoluta, é possível<br />

reconhecer que, presente o dano, as cláusulas abusivas po<strong>de</strong>m gerar o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar, ou seja, a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r.<br />

O art. 51 <strong>do</strong> CDC representa uma das mais importantes mitigações da força obrigatória da convenção (pacta sunt servanda) na


ealida<strong>de</strong> brasileira, o que reduz substancialmente o po<strong>de</strong>r das partes, em situação <strong>de</strong> profun<strong>do</strong> intervencionismo ou dirigismo<br />

contratual. Antes <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> das consequências concretas da nulida<strong>de</strong>, vejamos, pontualmente, as cláusulas que são <strong>de</strong>scritas como<br />

nulas pelo preceito legal.<br />

5.7.1.<br />

Cláusulas que impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r por vícios<br />

<strong>de</strong> qualquer natureza <strong>do</strong>s produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição <strong>de</strong> direitos<br />

(art. 51, inc. I, <strong>do</strong> CDC)<br />

A norma repete a vedação da cláusula <strong>de</strong> não in<strong>de</strong>nizar ou cláusula <strong>de</strong> irresponsabilida<strong>de</strong> para os contratos <strong>de</strong> consumo, já<br />

tratada pelo art. 25 da Lei 8.078/1990, consi<strong>de</strong>rada nula <strong>de</strong> pleno direito. Além da cláusula <strong>de</strong> exclusão total da responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r, não tem valida<strong>de</strong> a cláusula que atenua o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res ou presta<strong>do</strong>res em <strong>de</strong>trimento<br />

<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Na verda<strong>de</strong>, conforme exposto no capítulo anterior <strong>de</strong>sta obra, tal atenuação somente é admitida nos casos <strong>de</strong> fato<br />

ou culpa concorrente <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, o que <strong>de</strong>corre das circunstâncias fáticas e não <strong>do</strong> que foi pactua<strong>do</strong>. A título <strong>de</strong> exemplo, se um<br />

frequenta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> aca<strong>de</strong>mias assina um termo <strong>de</strong> autorresponsabilida<strong>de</strong>, não se po<strong>de</strong> afastar total ou parcialmente a responsabilida<strong>de</strong><br />

da presta<strong>do</strong>ra por força <strong>do</strong> contrato, o que somente é possível pelo fato ou risco assumi<strong>do</strong> pelo próprio consumi<strong>do</strong>r.<br />

Como ilustração concreta <strong>de</strong> falta <strong>de</strong> vinculação da cláusula <strong>de</strong> não in<strong>de</strong>nizar na realida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s contatos <strong>de</strong> consumo, cite-se a<br />

conhecida placa encontrada em estacionamentos, com dizeres próximos a “O estacionamento não se responsabiliza por objetos<br />

<strong>de</strong>ixa<strong>do</strong>s no interior <strong>do</strong> veículo”. Ora, o estacionamento <strong>de</strong>ve, sim, respon<strong>de</strong>r pela segurança no seu interior, o que é inerente à<br />

própria contratação, pois esse é o fator busca<strong>do</strong> pelos consumi<strong>do</strong>res (causa contratual). Nesse senti<strong>do</strong>, repise-se o teor da Súmula<br />

130 <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, segun<strong>do</strong> a qual “a empresa respon<strong>de</strong>, perante o cliente, pela reparação <strong>de</strong> dano ou furto <strong>de</strong><br />

veículo ocorri<strong>do</strong>s em seu estacionamento”. Apesar <strong>de</strong>ssa responsabilização pelo furto, não se po<strong>de</strong> esquecer que as empresas <strong>de</strong><br />

estacionamentos – excluí<strong>do</strong>s os relativos aos bancos – não respon<strong>de</strong>m pelo assalto à mão armada, pois tal fato escapa <strong>do</strong> risco <strong>do</strong><br />

empreendimento ou risco <strong>do</strong> negócio oferta<strong>do</strong> (ver, por to<strong>do</strong>s: STJ – REsp 1.232.795/SP – Rel. Min. Nancy Andrighi – j.<br />

02.04.2013, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 521).<br />

Destaque-se, ato contínuo <strong>de</strong> ilustração, a Súmula 302 <strong>do</strong> STJ, que <strong>de</strong>termina a nulida<strong>de</strong> por abusivida<strong>de</strong> da cláusula contratual<br />

<strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> que limita no tempo a internação hospitalar <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>. A cláusula é claramente antissocial, por mais uma vez<br />

violar a própria concepção <strong>do</strong> negócio jurídico celebra<strong>do</strong>. Cite-se, ainda, o teor da Súmula 112 <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro, segun<strong>do</strong> a qual é nula, por ser abusiva, a cláusula que exclui <strong>de</strong> cobertura <strong>de</strong> componente que integre, necessariamente,<br />

cirurgia ou procedimento coberto por plano ou seguro <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, tais como stent e marca-passo.<br />

Como uma última concreção <strong>do</strong> art. 51, I, <strong>do</strong> CDC, o Tribunal Paulista consi<strong>de</strong>rou nula a cláusula contratual que afasta a<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> empresa <strong>de</strong> loteamento pelo atraso na entrega da obra (TJSP – Apelação 994.09.288608-0 – Acórdão 4713819,<br />

São Paulo – Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Ênio Santarelli Zuliani – j. 09.09.2010 – DJESP 06.10.2010). Mais uma<br />

vez, na esteira das hipóteses acima, nota-se o afastamento <strong>de</strong> cláusula contratual, por entrar em conflito com a própria causa <strong>do</strong><br />

negócio jurídico celebra<strong>do</strong>.<br />

5.7.2.<br />

Cláusulas que subtraiam ao consumi<strong>do</strong>r a opção <strong>de</strong> reembolso da quantia já paga (art. 51, inc. II,<br />

<strong>do</strong> CDC)<br />

O fundamente da previsão é a antiga máxima <strong>de</strong> vedação <strong>do</strong> enriquecimento sem causa, retirada <strong>do</strong> atual Código Civil (arts.<br />

884 a 886). Especificamente, o art. 53 <strong>do</strong> mesmo CDC estabelece a nulida<strong>de</strong>, nos contratos <strong>de</strong> financiamento em geral, da cláusula<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>caimento ou perdimento, que encerra a perda <strong>de</strong> todas as parcelas pagas, mesmo nas hipóteses <strong>de</strong> inadimplemento. O tema<br />

será aprofunda<strong>do</strong> ainda no presente capítulo.<br />

A propósito <strong>de</strong> uma interessante incidência da previsão <strong>do</strong> art. 51 <strong>do</strong> CDC, concluiu o Tribunal Paulista pelo direito <strong>de</strong><br />

reembolso relativo a medicamento para tratamento hepático, o que estaria <strong>de</strong>ntro da cobertura <strong>do</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, reconhecen<strong>do</strong>-se a<br />

nulida<strong>de</strong> absoluta da cláusula em contrário (TJSP – Apelação 0477776-65.2010.8.26.0000 – Acórdão 4964682, São Paulo – Quinta<br />

Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Silvério Ribeiro – j. 09.02.2011 – DJESP 14.03.2011).<br />

Ainda no que diz respeito ao reembolso <strong>de</strong> <strong>de</strong>spesas, <strong>de</strong>staque-se importante <strong>de</strong>cisum <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania, que concluiu<br />

que “o plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve reembolsar o segura<strong>do</strong> pelas <strong>de</strong>spesas que pagou com tratamento médico realiza<strong>do</strong> em situação <strong>de</strong><br />

urgência ou emergência por hospital não cre<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong>, ainda que o referi<strong>do</strong> hospital integre expressamente tabela contratual que<br />

exclui da cobertura os hospitais <strong>de</strong> alto custo, limitan<strong>do</strong>-se o reembolso, no mínimo, ao valor da tabela <strong>de</strong> referência <strong>de</strong> preços <strong>de</strong><br />

serviços médicos e hospitalares pratica<strong>do</strong>s pelo plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>”. Ainda nos termos <strong>do</strong> julgamento, “o contrato <strong>de</strong> plano <strong>de</strong><br />

assistência à saú<strong>de</strong>, por <strong>de</strong>finição, tem por objeto propiciar, mediante o pagamento <strong>de</strong> um preço (consistente em prestações<br />

antecipadas e periódicas), a cobertura <strong>de</strong> custos <strong>de</strong> tratamento médico e atendimentos médico, hospitalar e laboratorial perante<br />

profissionais e re<strong>de</strong> <strong>de</strong> hospitais e laboratórios próprios ou cre<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong>s. Desse mo<strong>do</strong>, a estipulação contratual que vincula a


cobertura contratada aos médicos e hospitais <strong>de</strong> sua re<strong>de</strong> ou convenia<strong>do</strong>s é inerente a esta espécie contratual e, como tal, não<br />

encerra, em si, qualquer abusivida<strong>de</strong>”. Porém, <strong>de</strong> forma correta, julgou-se que, “excepcionalmente, nos casos <strong>de</strong> urgência e<br />

emergência, em que não se afigurar possível a utilização <strong>do</strong>s serviços médicos, próprios, cre<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong>s ou convenia<strong>do</strong>s, a empresa<br />

<strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, mediante reembolso, responsabiliza-se pelos custos e <strong>de</strong>spesas médicas expendi<strong>do</strong>s pelo contratante em tais<br />

condições, limitada, no mínimo, aos preços <strong>de</strong> serviços médicos e hospitalares pratica<strong>do</strong>s pelo respectivo produto” (STJ – REsp<br />

1.286.133/MG – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – j. 05.04.2016 – DJe 11.04.2016 – publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 580.<br />

Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: REsp 267.530/SP – Quarta Turma – DJ 12.03.2001; REsp 685.109/MG – Terceira Turma – DJ 09.10.2006;<br />

REsp 809.685/MA – Quarta Turma – DJe 17.12.2010; e REsp 1.437.877/RJ – Terceira Turma – DJe 02.06.2014).<br />

Eis mais um caso em que o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça aplicou corretamente o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> CDC em contrato <strong>de</strong> plano <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong>, o que tem si<strong>do</strong> uma tendência nos últimos anos.<br />

5.7.3.<br />

Cláusulas que transfiram responsabilida<strong>de</strong>s a terceiros (art. 51, inc. III, <strong>do</strong> CDC)<br />

A abusivida<strong>de</strong> é patente por afetar o sistema <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> e <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pelo Código<br />

Consumerista, haven<strong>do</strong> previsão no mesmo senti<strong>do</strong> no art. 25 da Lei 8.078/1990. A cláusula é nula, ainda, por se afastar da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

risco-proveito consagra<strong>do</strong> pelo CDC. Desse mo<strong>do</strong>, é nula a cláusula que transfere a responsabilida<strong>de</strong> para uma segura<strong>do</strong>ra, pois, na<br />

verda<strong>de</strong>, o consumi<strong>do</strong>r tem, em regra, a livre escolha em optar contra quem <strong>de</strong>mandar.<br />

Na mesma linha, o Tribunal <strong>do</strong> Paraná pronunciou que “Não po<strong>de</strong> a construtora preten<strong>de</strong>r responsabilizar o banco pelo atraso<br />

da entrega da obra, sob a rubrica da força maior, por este haver <strong>de</strong>scumpri<strong>do</strong> promessa <strong>de</strong> repasse <strong>de</strong> financiamento, vez que se trata<br />

<strong>de</strong> negócio inter alios acta, ou seja, relação jurídica alheia e que não tem o condão <strong>de</strong> interferir no direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em<br />

receber os imóveis já quita<strong>do</strong>s. III. Consoante a inteligência <strong>do</strong> art. 51, III, <strong>do</strong> CDC, é nula qualquer cláusula contratual em que se<br />

transfira a terceiro a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> negócio inadimpli<strong>do</strong>, significan<strong>do</strong> que à construtora não cabe transferir ao consumi<strong>do</strong>r os<br />

riscos assumi<strong>do</strong>s pelo financiamento mal sucedi<strong>do</strong>. (…)” (TJPR – Recurso 181115-6 – Acórdão 1582, Curitiba – Nona Câmara<br />

Cível – Rel. Des. Rubens Oliveira Fontoura – j. 07.11.2005).<br />

5.7.4.<br />

Cláusulas que estabeleçam obrigações consi<strong>de</strong>radas iníquas, abusivas, que coloquem o<br />

consumi<strong>do</strong>r em <strong>de</strong>svantagem exagerada, ou que sejam incompatíveis com a boa-fé ou a<br />

equida<strong>de</strong> (art. 51, inc. IV, <strong>do</strong> CDC)<br />

Eis o mais festeja<strong>do</strong> inciso <strong>do</strong> art. 51 <strong>do</strong> CDC, por trazer um sistema totalmente aberto, que po<strong>de</strong> englobar uma série <strong>de</strong><br />

situações, em especial pelas menções à boa-fé e à equida<strong>de</strong>. Da última, aliás, extrai-se a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> justiça contratual, inerente à<br />

eficácia interna da função social <strong>do</strong> contrato. Confirma-se, sem dúvidas, que o rol <strong>do</strong> art. 51 é totalmente ilustrativo. Como bem<br />

pon<strong>de</strong>ram Claudia Lima Marques, Herman Benjamin e Bruno Miragem, o preceito consagra uma cláusula geral sobre cláusulas<br />

abusivas no CDC, a incluir a lesão, instituto clássico <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>.62<br />

Aponta Paulo R. Roque Khouri, citan<strong>do</strong> Ruy Rosa<strong>do</strong>, que o inciso IV <strong>do</strong> art. 51 consagrou a cláusula geral da lesão enorme,<br />

eis que “o CDC recuperou o instituto da lesão, que havia si<strong>do</strong> aboli<strong>do</strong> pelo Código Civil brasileiro. Na lesão, como dito<br />

anteriormente, o <strong>de</strong>sequilíbrio se manifesta na cláusula-preço. O consumi<strong>do</strong>r estará pagan<strong>do</strong>, por um produto ou serviço, valor<br />

excessivamente oneroso. Evi<strong>de</strong>nte que, se o consumi<strong>do</strong>r paga por um bem ou serviço valor <strong>de</strong>sproporcional ao objeto contrata<strong>do</strong>,<br />

não se po<strong>de</strong> negar que este contrato nasceu <strong>de</strong>sequilibra<strong>do</strong>. E aqui o objetivo é prestar ao consumi<strong>do</strong>r a proteção em uma cláusula<br />

essencial <strong>de</strong> qualquer contrato oneroso, a cláusula-preço”. 63<br />

Cumpre anotar que o Código Civil <strong>de</strong> 2002 consagrou a lesão como vício <strong>do</strong> consentimento, a gerar a anulação <strong>do</strong> negócio<br />

jurídico correspon<strong>de</strong>nte (arts. 157 e 171 <strong>do</strong> CC). Todavia, a lesão civilista tem uma feição subjetiva, por exigir a premente<br />

necessida<strong>de</strong> ou inexperiência, ao la<strong>do</strong> da onerosida<strong>de</strong> excessiva. A lesão tratada pelo art. 51, inc. IV, é uma lesão objetivada, como<br />

o é to<strong>do</strong> o sistema consumerista; bastan<strong>do</strong> o mero <strong>de</strong>sequilíbrio pela quebra da boa-fé e da função social para a sua configuração.<br />

Ato contínuo, a lesão consumerista gera a nulida<strong>de</strong> absoluta e não relativa <strong>do</strong> contrato, trazen<strong>do</strong> uma consequência <strong>de</strong> maior<br />

gravida<strong>de</strong>. Eis mais uma importante confrontação entre o CDC e o CC/2002, na linha <strong>do</strong> diálogo das fontes que inspira o presente<br />

estu<strong>do</strong>.<br />

A respeito <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma cláusula tida como exagerada, a colocar o consumi<strong>do</strong>r em posição em <strong>de</strong>svantagem, o § 1º <strong>do</strong><br />

art. 51 traz alguns parâmetros exemplificativos. Nesse contexto, a norma presume como exagerada, entre outros casos, a vonta<strong>de</strong><br />

que: a) ofen<strong>de</strong> os princípios fundamentais <strong>do</strong> sistema jurídico a que pertence; b) restringe direitos ou obrigações fundamentais<br />

inerentes à natureza <strong>do</strong> contrato, <strong>de</strong> tal mo<strong>do</strong> a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual; c) se mostra excessivamente onerosa<br />

para o consumi<strong>do</strong>r, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se a natureza e conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao<br />

caso. Diante <strong>do</strong> sistema protecionista coloca<strong>do</strong> à disposição <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, este autor enten<strong>de</strong> que as presunções citadas são


absolutas ou iure et <strong>de</strong> iure, não admitin<strong>do</strong> <strong>de</strong>clinação ou previsão em contrário.<br />

Como primeiro exemplo <strong>de</strong> cláusula abusiva por representar lesão objetiva, anote-se o teor <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 432, da V Jornada<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil <strong>do</strong> Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral e <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça (2011): “Em contratos <strong>de</strong> financiamento bancário,<br />

são abusivas cláusulas contratuais <strong>de</strong> repasse <strong>de</strong> custos administrativos (como análise <strong>do</strong> crédito, abertura <strong>de</strong> cadastro, emissão <strong>de</strong><br />

fichas <strong>de</strong> compensação bancária etc.), seja por estarem intrinsecamente vinculadas ao exercício da ativida<strong>de</strong> econômica, seja por<br />

violarem o princípio da boa-fé objetiva”. De toda sorte, infelizmente, a jurisprudência superior enten<strong>de</strong> pela possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

cobrança <strong>de</strong> tais valores pelas entida<strong>de</strong>s bancárias, como fez o STJ, em relação à taxa <strong>de</strong> abertura <strong>de</strong> crédito (TAC) e à taxa <strong>de</strong><br />

emissão <strong>de</strong> carnê ou boleto (TEC). O tema ainda será retoma<strong>do</strong> no presente capítulo, com a análise das Súmulas 565 e 566 daquela<br />

Corte Superior, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2016.<br />

Outra interessante concretização <strong>de</strong> cláusula que representa a renúncia <strong>de</strong> um direito inerente ao contrato envolve a exceção <strong>de</strong><br />

contrato <strong>de</strong> não cumpri<strong>do</strong> e a cláusula solve et repete, exemplo retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> raciocínio <strong>de</strong> Nelson Nery Jr.64 Como é notório, para os<br />

contratos bilaterais – aqueles com direitos e <strong>de</strong>veres para ambas as partes –, vale a máxima da exceção <strong>de</strong> contrato não cumpri<strong>do</strong>,<br />

antes explicada (art. 476 <strong>do</strong> CC). Repisan<strong>do</strong>, em tais negócios, não po<strong>de</strong> uma parte contratual exigir que a outra cumpra com a sua<br />

obrigação, se não cumprir com a própria. Porém, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os primórdios jurídicos, admite-se a valida<strong>de</strong> e eficácia da cláusula solve et<br />

repete ou cláusula paga e <strong>de</strong>pois pe<strong>de</strong>, a afastar a invocação da exceção <strong>de</strong> contrato não cumpri<strong>do</strong>. Ora, como tal cláusula<br />

representa uma renúncia a um direito reconhecidamente inerente aos contratos bilaterais, sustenta-se a sua nulida<strong>de</strong> quan<strong>do</strong> inserida<br />

em contratos <strong>de</strong> consumo.65<br />

Pois bem, diante da existência <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> julga<strong>do</strong>s que fazem incidir a regra <strong>do</strong> inc. IV <strong>do</strong> art. 51, presumin<strong>do</strong> muitas vezes<br />

a <strong>de</strong>svantagem nos mol<strong>de</strong>s <strong>do</strong> exposto, vejamos apenas algumas <strong>de</strong>cisões ilustrativas <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, para que a<br />

efetivida<strong>de</strong> da citada cláusula geral fique bem <strong>de</strong>lineada. De início, pronuncia-se a respeito <strong>de</strong> dívida em contrato bancário que “A<br />

orientação <strong>de</strong>sta Corte é no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a cláusula contratual que permite a emissão da nota promissória em favor <strong>do</strong> banco<br />

caracteriza-se como abusiva, porque viola<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> princípio da boa-fé, consagra<strong>do</strong> no art. 51, inc. IV, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r” (STJ – AgRg no REsp 1.025.797/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 10.06.2008 – DJe 20.06.2008).<br />

Ato contínuo, já se enten<strong>de</strong>u na hipótese <strong>de</strong> o contrato bancário prever a incidência <strong>de</strong> juros remuneratórios, porém sem lhe<br />

precisar o montante, que está correta a <strong>de</strong>cisão que consi<strong>de</strong>ra nula tal cláusula, por <strong>de</strong>srespeito à boa-fé objetiva (STJ – REsp<br />

715.894/PR – Segunda Seção – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 26.04.2006 – DJ 19.03.2007, p. 284). Eis uma situação típica <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>svantagem ao consumi<strong>do</strong>r, em clara situação <strong>de</strong> onerosida<strong>de</strong> excessiva e <strong>de</strong>srespeito ao <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar <strong>de</strong>corrente da boa-fé<br />

objetiva.<br />

Além disso, o mesmo STJ conclui com justiça que “é abusiva a cláusula prevista em contrato <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> que suspen<strong>de</strong> o<br />

atendimento em razão <strong>do</strong> atraso <strong>de</strong> pagamento <strong>de</strong> uma única parcela. Prece<strong>de</strong>nte da Terceira Turma. Na hipótese, a própria empresa<br />

segura<strong>do</strong>ra contribuiu para a mora, pois, em razão <strong>de</strong> problemas internos, não enviou ao segura<strong>do</strong> o boleto para pagamento. II. É<br />

ilegal, também, a estipulação que prevê a submissão <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> a novo perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> carência, <strong>de</strong> duração equivalente ao prazo pelo<br />

qual perdurou a mora, após o adimplemento <strong>do</strong> débito em atraso. III. Recusa<strong>do</strong> atendimento pela segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> em<br />

<strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> cláusulas abusivas, quan<strong>do</strong> o segura<strong>do</strong> encontrava-se em situação <strong>de</strong> urgência e extrema necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cuida<strong>do</strong>s<br />

médicos, é nítida a caracterização <strong>do</strong> dano moral. Recurso provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 259.263/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Castro<br />

Filho – j. 02.08.2005 – DJ 20.02.2006, p. 330).<br />

Também sobre o contrato <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, <strong>de</strong>cisum <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2016, <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania, consi<strong>de</strong>rou que “é nula a<br />

cláusula inserta por opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> plano priva<strong>do</strong> <strong>de</strong> assistência à saú<strong>de</strong> em formulário <strong>de</strong> Declaração <strong>de</strong> Doenças ou Lesões<br />

Preexistentes (Declaração <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>) preven<strong>do</strong> a renúncia pelo consumi<strong>do</strong>r contratante à entrevista qualificada orientada por um<br />

médico, seguida apenas <strong>de</strong> espaço para aposição <strong>de</strong> assinatura, sem qualquer menção ao fato <strong>de</strong> tal entrevista se tratar <strong>de</strong> faculda<strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> beneficiário”. Segun<strong>do</strong> o Ministro Relator, em tais contratos, a segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>ve “a) esclarecer o pretenso segura<strong>do</strong> acerca <strong>do</strong> que<br />

consiste uma <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> <strong>do</strong>enças e lesões preexistentes e das consequências <strong>do</strong> incorreto preenchimento <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s ou <strong>de</strong><br />

eventuais equívocos nas respostas às indagações ali formuladas; e b) esclarecer que, no caso <strong>de</strong> o segura<strong>do</strong> ter dúvida acerca <strong>de</strong><br />

alguma questão, teria direito à orientação <strong>de</strong> um médico durante o preenchimento <strong>do</strong> <strong>do</strong>cumento, oportunida<strong>de</strong> em que o<br />

profissional <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> iria elucidar o que estava sen<strong>do</strong> indaga<strong>do</strong>, por exemplo, os termos técnicos para <strong>de</strong>finir eventuais <strong>do</strong>enças e/ou<br />

lesões que o segura<strong>do</strong> ou parente pu<strong>de</strong>ssem ter sofri<strong>do</strong> antes daquela data” (STJ – REsp 1.554.448/PE – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong><br />

Noronha – j. 18.02.2016 – DJe 26.02.2016 – publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 578).<br />

Ainda no que diz respeito às opera<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, outro aresto, ainda mais recente, consi<strong>de</strong>rou que, “em contrato <strong>de</strong><br />

plano <strong>de</strong> assistência à saú<strong>de</strong>, é abusiva a cláusula que preveja o in<strong>de</strong>ferimento <strong>de</strong> quaisquer procedimentos médico-hospitalares<br />

quan<strong>do</strong> solicita<strong>do</strong>s por médicos não coopera<strong>do</strong>s”. O Ministro Relator, com precisão, <strong>de</strong>staca o caráter existencial <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong><br />

plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, na linha <strong>do</strong> que está <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong>. Segun<strong>do</strong> suas palavras: “o contrato <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, além da nítida relação<br />

jurídica patrimonial que, por meio <strong>de</strong>le, se estabelece, reverbera também caráter existencial, intrinsecamente liga<strong>do</strong> à tutela <strong>do</strong>


direito fundamental à saú<strong>de</strong> <strong>do</strong> usuário, o que coloca tal espécie contratual em uma perspectiva <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> relevância no sistema<br />

jurídico pátrio. (…). Consoante <strong>do</strong>utrina a respeito <strong>do</strong> tema, conquanto a Carta da República se refira, por excelência, ao Po<strong>de</strong>r<br />

Público, sabe-se que a eficácia <strong>do</strong> direito fundamental à saú<strong>de</strong> ultrapassa o âmbito das relações travadas entre Esta<strong>do</strong> e cidadãos –<br />

eficácia vertical –, para abarcar as relações jurídicas firmadas entre os cidadãos, limitan<strong>do</strong> a autonomia das partes, com o intuito <strong>de</strong><br />

se obter a máxima concretização <strong>do</strong> aspecto existencial, sem, contu<strong>do</strong>, eliminar os interesses materiais. Suscita-se, pois, a eficácia<br />

horizontal <strong>do</strong> direito fundamental à saú<strong>de</strong>, visualizan<strong>do</strong> a incidência direta e imediata <strong>de</strong>sse direito nos contratos <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>.<br />

Todavia, o que se nota, muitas vezes, no âmbito priva<strong>do</strong>, é a colisão <strong>do</strong>s interesses das partes, fican<strong>do</strong>, <strong>de</strong> um la<strong>do</strong>, as opera<strong>do</strong>ras <strong>do</strong><br />

plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> – <strong>de</strong> caráter eminentemente patrimonial – e, <strong>de</strong> outro, os usuários – com olhar volta<strong>do</strong> para sua subsistência. Assim,<br />

para dirimir os conflitos existentes no <strong>de</strong>correr da execução contratual, há que se buscar, nesses casos, o diálogo das fontes, que<br />

permite a aplicação simultânea e complementar <strong>de</strong> normas distintas. Por isso, é salutar, nos contratos <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, con<strong>de</strong>nsar a<br />

legislação especial (Lei n. 9.656/1998), especialmente com o CDC, pois, segun<strong>do</strong> o entendimento <strong>do</strong>utrinário, esse contrato<br />

configura-se como um ‘contrato cativo e <strong>de</strong> longa duração, a envolver por muitos anos um fornece<strong>do</strong>r e um consumi<strong>do</strong>r, com uma<br />

finalida<strong>de</strong> em comum, que é assegurar para o usuário o tratamento e ajudá-lo a suportar os riscos futuros envolven<strong>do</strong> a sua saú<strong>de</strong>’.<br />

Assim, diante da concepção social <strong>do</strong> contrato, aquele que <strong>de</strong>clara algo referente ao negócio que está prestes a concluir <strong>de</strong>ve<br />

respon<strong>de</strong>r pela confiança que a outra parte nele <strong>de</strong>positou ao contratar. Isso porque o direito <strong>do</strong>s contratos assume a função <strong>de</strong><br />

realizar a equitativa distribuição <strong>de</strong> direitos e <strong>de</strong>veres entre os contratantes, buscan<strong>do</strong> atingir a justiça contratual, a qual se<br />

perfectibiliza, pois, na exata equivalência das prestações ou sacrifícios suporta<strong>do</strong>s pelas partes, bem como na proteção da confiança<br />

e da boa-fé <strong>de</strong> ambos os contratantes”.<br />

E arremata, com conclusão que tem o apoio <strong>de</strong>ste autor: “embora seja conduta embasada em cláusulas contratuais, nota-se que<br />

as práticas realizadas pela opera<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, sobretu<strong>do</strong> negar as solicitações feitas por médicos não coopera<strong>do</strong>s,<br />

mostram-se contrárias ao permiti<strong>do</strong> pela legislação consumerista. Naquela situação em que o usuário busca o médico <strong>de</strong> sua<br />

confiança, mas realiza os exames por ele solicita<strong>do</strong>s em instalações da re<strong>de</strong> cre<strong>de</strong>nciada, não há prejuízo nenhum para a<br />

cooperativa, haja vista que o valor da consulta foi arca<strong>do</strong> exclusivamente pelo usuário, sem pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> reembolso. In<strong>de</strong>ferir a<br />

solicitação <strong>de</strong> qualquer procedimento hospitalar requeri<strong>do</strong> por médico não coopera<strong>do</strong> estaria afetan<strong>do</strong> não mais o princípio <strong>do</strong><br />

equilíbrio contratual, mas o da boa-fé objetiva” (STJ – REsp 1.330.919/MT – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 02.08.2016 – DJe<br />

18.08.2016 – publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 588).<br />

Reafirme-se, mais uma vez, que o Tribunal da Cidadania tem si<strong>do</strong> implacável, nos últimos anos, em relação às abusivida<strong>de</strong>s<br />

praticadas pelas empresas <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, mormente pelo claro conteú<strong>do</strong> existencial em tais negócios.<br />

Seguin<strong>do</strong> nas concreções práticas, foram reconhecidas como nulas as cláusulas que permitiam às construtoras dispor <strong>do</strong> imóvel<br />

aliena<strong>do</strong> a terceiros, instituin<strong>do</strong> hipoteca em favor <strong>do</strong> banco, outra típica situação <strong>de</strong> onerosida<strong>de</strong> excessiva ou <strong>de</strong>sequilíbrio<br />

negocial em prejuízo ao consumi<strong>do</strong>r (STJ – REsp 410.306/DF – Quarta Turma – Rel. Min. Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar – j. 27.08.2002 –<br />

DJ 07.10.2002, p. 265). Além disso, para o mesmo Tribunal, no seguro <strong>de</strong> automóvel, em caso <strong>de</strong> perda total, a in<strong>de</strong>nização a ser<br />

paga pela segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>ve tomar como base a quantia ajustada na apólice. Sen<strong>do</strong> assim, é abusiva a cláusula que inclui na apólice<br />

um valor, sobre o qual o segura<strong>do</strong> paga o prêmio, e preten<strong>de</strong>r in<strong>de</strong>nizá-lo por valor menor, correspon<strong>de</strong>nte ao preço <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>,<br />

estipula<strong>do</strong> pela própria segura<strong>do</strong>ra (STJ – REsp 191.189/MG – Terceira Turma – Rel. Min. Nilson Naves – Rel. p/Acórdão Min.<br />

Wal<strong>de</strong>mar Zveiter – j. 05.12.2000 – DJ 05.03.2001, p. 154; e STJ – REsp 176.890/MG – Segunda Seção – Rel. Min. Wal<strong>de</strong>mar<br />

Zveiter – j. 22.09.1999 – DJ 19.02.2001, p. 130).<br />

Apesar <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s esses exemplos louváveis da Corte Superior, em alguns casos não se aplica bem o dispositivo consumerista em<br />

comento. Cite-se, a título <strong>de</strong> exemplo, o reconhecimento da cláusula <strong>de</strong> fi<strong>de</strong>lização consi<strong>de</strong>rada, “em regra, legítima em contrato <strong>de</strong><br />

telefonia. Isso porque o assinante recebe benefícios em contrapartida à a<strong>de</strong>são <strong>de</strong>ssa cláusula, haven<strong>do</strong>, além disso, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

garantir um retorno mínimo à empresa contratada pelas benesses conferidas. Prece<strong>de</strong>nte cita<strong>do</strong>: AgRg no REsp 1.204.952/DF, DJe<br />

<strong>de</strong> 20/8/2012” (STJ – AgRg no AREsp 253.609/RS – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – j. 18.12.2012. Ver, mais recentemente:<br />

STJ – REsp 1.097.582/MS – Quarta Turma – Rel. Min. Marco Buzzi – j. 19.03.2013, DJe 08.04.2013).<br />

Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, o presente autor está alinha<strong>do</strong> aos julga<strong>do</strong>s estaduais que concluem <strong>de</strong> maneira diversa, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

que “a cláusula <strong>de</strong> fi<strong>de</strong>lização é abusiva, na medida em que coloca o consumi<strong>do</strong>r em posição extremamente <strong>de</strong>svantajosa e <strong>de</strong>sigual,<br />

violan<strong>do</strong>, ainda, a livre concorrência e os princípios da confiança, da transparência, da informação, bem como da boa-fé objetiva.<br />

Demonstrada a nulida<strong>de</strong> da cláusula <strong>de</strong> fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong>, o reconhecimento <strong>do</strong> caráter in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> da cobrança efetuada a este título é mero<br />

corolário lógico. A existência <strong>do</strong>s danos morais no caso vertente é in re ipsa, ou seja, <strong>de</strong>corre automaticamente da negativação <strong>do</strong><br />

nome <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r no cadastro <strong>de</strong> inadimplentes, sen<strong>do</strong> prescindível a comprovação <strong>de</strong> efetivo prejuízo, na medida em que o<br />

mesmo é presumi<strong>do</strong>” (TJMG – Apelação Cível 1.0024.10.030764-4/001 – Rel. Des. Rogério Me<strong>de</strong>iros – j. 17.01.2013, DJEMG<br />

25.01.2013).<br />

Por fim, algumas palavras <strong>de</strong>vem ser ditas em relação à chamada cláusula-surpresa, que constava <strong>do</strong> art. 51, inc. V, da Lei


8.078/1990, dispositivo que foi veta<strong>do</strong> pelo então Presi<strong>de</strong>nte da República. O texto tinha a seguinte redação, ao reconhecer a<br />

nulida<strong>de</strong> das cláusulas contratuais que, “Segun<strong>do</strong> as circunstâncias e, em particular, segun<strong>do</strong> a aparência global <strong>do</strong> contrato,<br />

venham, após sua conclusão, a surpreen<strong>de</strong>r o consumi<strong>do</strong>r”. As razões <strong>do</strong> veto foram: “Reproduz, no essencial, o que já está<br />

explicita<strong>do</strong> no inciso IV. É, portanto, <strong>de</strong>snecessário”.<br />

Pelo conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> veto, como expõe a <strong>do</strong>utrina, a cláusula-surpresa é vedada pela previsão <strong>do</strong> coman<strong>do</strong> em análise, haven<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>srespeito à boa-fé objetiva pelo rompimento das justas expectativas <strong>de</strong>positadas pelo consumi<strong>do</strong>r.66 Aplican<strong>do</strong> tal premissa, <strong>do</strong><br />

Tribunal <strong>de</strong> Minas Gerais: “A cláusula constante <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, preven<strong>do</strong> a cobrança <strong>de</strong> comissão <strong>de</strong> permanência à taxa <strong>de</strong><br />

merca<strong>do</strong>, por ser incerta e causar surpresa ao mutuário, é ilegal e não po<strong>de</strong> produzir efeitos, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser substituída pelo INPC,<br />

índice justo e aceitável para recompor o valor <strong>do</strong> capital empresta<strong>do</strong>” (TJMG – Apelação Cível 1.0145.06.342112-0/0011, Juiz <strong>de</strong><br />

Fora – Décima Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Guilherme Luciano Baeta Nunes – j. 20.01.2009 – DJEMG 17.02.2009).<br />

5.7.5.<br />

Cláusulas que estabeleçam inversão <strong>do</strong> ônus da prova em prejuízo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. VI,<br />

<strong>do</strong> CDC)<br />

Conforme outrora foi exposto, a inversão <strong>do</strong> ônus da prova constitui um plus, uma arma diferenciada a favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r<br />

nas <strong>de</strong>mandas fundadas em produtos ou serviços. Diante <strong>de</strong>ssa sua natureza, obviamente, é nula por abusivida<strong>de</strong> a cláusula que<br />

estabeleça a citada arma em prejuízo ou contra o próprio consumi<strong>do</strong>r. Ora, por razões óbvias <strong>de</strong> tutela <strong>do</strong>s vulneráveis, não se po<strong>de</strong><br />

utilizar a arma legal criada em <strong>de</strong>sfavor daquele que justificou a sua criação.<br />

Em reforço, a consagração da responsabilida<strong>de</strong> objetiva como regra consumerista afasta a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r provar<br />

a culpa <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r, constituin<strong>do</strong> a cláusula que imponha o ônus da prova da culpa ao consumi<strong>do</strong>r algo<br />

manifestamente excessivo, em claro flagrante ao sistema <strong>de</strong> proteção consumerista. Como bem exemplifica Bruno Miragem, na<br />

hipótese da presença <strong>de</strong> um vício <strong>do</strong> produto, não é lícita a exigência ao consumi<strong>do</strong>r vulnerável da prova <strong>do</strong> mau funcionamento <strong>do</strong><br />

bem adquiri<strong>do</strong>, o que é flagrante afronta à proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r quanto aos vícios.67<br />

5.7.6.<br />

Cláusulas que <strong>de</strong>terminem a utilização compulsória <strong>de</strong> arbitragem (art. 51, inc. VII, <strong>do</strong> CDC)<br />

No plano contratual, o compromisso é o acor<strong>do</strong> <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>s por meio <strong>do</strong> qual as partes, preferin<strong>do</strong> não se submeter à <strong>de</strong>cisão<br />

judicial, confiam a árbitros a solução <strong>de</strong> seus conflitos <strong>de</strong> interesse, <strong>de</strong> cunho patrimonial. O compromisso, assim, é um <strong>do</strong>s meios<br />

jurídicos que po<strong>de</strong> conduzir à arbitragem, sen<strong>do</strong> trata<strong>do</strong> pelo CC/2002 na parte alusiva às várias espécies <strong>de</strong> contratos e<br />

regulamenta<strong>do</strong>, ainda, pela Lei 9.307/1996 (Lei <strong>de</strong> Arbitragem).<br />

Nos dizeres <strong>de</strong> Carlos Alberto Carmona, a arbitragem constitui um “meio alternativo <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> controvérsia através da<br />

intervenção <strong>de</strong> uma ou mais pessoas que recebem seus po<strong>de</strong>res <strong>de</strong> uma convenção privada, <strong>de</strong>cidin<strong>do</strong> com base nela, sem<br />

intervenção estatal, sen<strong>do</strong> a <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong>stinada a assumir a mesma eficácia da sentença judicial”.68 Para o jurista, portanto, a<br />

arbitragem é jurisdição, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> esta a opção da Lei 9.307/1996, o que é compartilha<strong>do</strong> pelo presente autor. A partir das lições<br />

transmitidas pelo <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>r cita<strong>do</strong>, em disciplina ministrada no curso <strong>de</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> da USP, po<strong>de</strong>-se dizer<br />

que o compromisso é contrato, a arbitragem é jurisdição; o compromisso é um contrato que gera efeitos processuais.<br />

Conforme estipula o art. 852 <strong>do</strong> CC, a arbitragem restringe-se somente a direitos patrimoniais disponíveis, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> atingir<br />

os direitos da personalida<strong>de</strong> ou inerentes à dignida<strong>de</strong> da pessoa humana, visualiza<strong>do</strong>s pelos arts. 11 a 21 <strong>do</strong> Código Civil em vigor.<br />

Isso acaba justifican<strong>do</strong> o teor <strong>do</strong> art. 51, VI, da Lei 8.078/1990, eis que a proteção <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, com status<br />

constitucional, está mais próxima <strong>de</strong>sses direitos existenciais relativos à proteção da pessoa. Há quem critique a vedação<br />

consumerista, caso <strong>de</strong> Carlos Alberto Carmona, que vê na arbitragem um importante mecanismo <strong>de</strong> exercício da autonomia privada<br />

e <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> disputas.<br />

Diante <strong>de</strong>ssas críticas, a reforma da Lei <strong>de</strong> Arbitragem pretendia trazer regra específica propician<strong>do</strong> que a arbitragem fosse<br />

utilizada para resolver as <strong>de</strong>mandas envolven<strong>do</strong> os consumi<strong>do</strong>res. Nesse contexto, seria incluí<strong>do</strong> no art. 4º da Lei 9.307/1996 um §<br />

3º, estabelecen<strong>do</strong> que “na relação <strong>de</strong> consumo estabelecida por meio <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, a cláusula compromissória só terá<br />

eficácia se o a<strong>de</strong>rente tomar a iniciativa <strong>de</strong> instituir a arbitragem ou concordar expressamente com a sua instituição”. Todavia,<br />

quan<strong>do</strong> <strong>do</strong> surgimento da Lei 13.129, <strong>de</strong> 26 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 2015, a proposta foi vetada pela Presidência da República, com os seguintes<br />

argumentos: “Da forma prevista, os dispositivos alterariam as regras para arbitragem em contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. Com isso,<br />

autorizariam, <strong>de</strong> forma ampla, a arbitragem nas relações <strong>de</strong> consumo, sem <strong>de</strong>ixar claro que a manifestação <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>va se dar também no momento posterior ao surgimento <strong>de</strong> eventual controvérsia e não apenas no momento inicial da<br />

assinatura <strong>do</strong> contrato. Em <strong>de</strong>corrência das garantias próprias <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, tal ampliação <strong>do</strong> espaço da arbitragem, sem<br />

os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s recortes, po<strong>de</strong>ria significar um retrocesso e ofensa ao princípio nortea<strong>do</strong>r <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r”.<br />

O presente autor está filia<strong>do</strong> ao veto, em parte, sen<strong>do</strong> certo que o tema ainda merece um melhor <strong>de</strong>bate pela socieda<strong>de</strong> e pela


comunida<strong>de</strong> jurídica. Da forma como estava no texto, <strong>de</strong> fato, a sua inserção representaria um retrocesso para a tutela <strong>do</strong>s<br />

consumi<strong>do</strong>res. De toda sorte, pensamos que seria até viável admitir a arbitragem em matéria <strong>de</strong> consumo tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> pessoa<br />

jurídica consumi<strong>do</strong>ra e sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>la a iniciativa <strong>de</strong> instauração da arbitragem.<br />

A propósito <strong>de</strong>sse tema, cumpre anotar que, não obstante o veto à proposta <strong>de</strong> alteração legislativa, julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2016, admitiu a instauração <strong>de</strong> arbitragem em conflito <strong>de</strong> consumo, sen<strong>do</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r a iniciativa<br />

<strong>de</strong> início <strong>do</strong> painel arbitral. Nos termos <strong>do</strong> aresto, “não há incompatibilida<strong>de</strong> entre os arts. 51, VII, <strong>do</strong> CDC e 4º, § 2º, da Lei n.<br />

9.307/96. Visan<strong>do</strong> conciliar os normativos e garantir a maior proteção ao consumi<strong>do</strong>r é que enten<strong>de</strong>-se que a cláusula<br />

compromissória só virá a ter eficácia caso este a<strong>de</strong>rente venha a tomar a iniciativa <strong>de</strong> instituir a arbitragem, ou concor<strong>de</strong>,<br />

expressamente, com a sua instituição, não haven<strong>do</strong>, por conseguinte, falar em compulsorieda<strong>de</strong>. A<strong>de</strong>mais, há situações em que,<br />

apesar <strong>de</strong> se tratar <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r, não há vulnerabilida<strong>de</strong> da parte a justificar sua proteção. (…). Assim, é possível a cláusula<br />

arbitral em contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são <strong>de</strong> consumo quan<strong>do</strong> não se verificar presente a sua imposição pelo fornece<strong>do</strong>r ou a vulnerabilida<strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, bem como quan<strong>do</strong> a iniciativa da instauração ocorrer pelo consumi<strong>do</strong>r ou, no caso <strong>de</strong> iniciativa <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r,<br />

venha a concordar ou ratificar expressamente com a instituição” (STJ – REsp 1.189.050/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe<br />

Salomão – j. 01.03.2016).<br />

Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, pensamos não ser possível juridicamente a cláusula compromissória prévia vinculativa ao consumi<strong>do</strong>r,<br />

o que entra em conflito com o dispositivo <strong>do</strong> CDC ora analisa<strong>do</strong>. Todavia, nos casos <strong>de</strong> ser o consumi<strong>do</strong>r uma pessoa jurídica,<br />

mitigada a sua hipossuficiência, não haveria óbice para que fosse firma<strong>do</strong> um compromisso arbitral posterior. Sem dúvidas, o tema<br />

é polêmico, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser aprofunda<strong>do</strong> o <strong>de</strong>bate nos meios jurídicos brasileiros nos próximos anos.<br />

Supera<strong>do</strong> esse tema, acrescente-se que não se po<strong>de</strong> confundir a arbitragem com a mediação. Na arbitragem, os árbitros<br />

nomea<strong>do</strong>s <strong>de</strong>ci<strong>de</strong>m questões relativas a uma obrigação <strong>de</strong> cunho patrimonial. Na mediação, os media<strong>do</strong>res buscam a facilitação <strong>do</strong><br />

diálogo entre as partes para que elas mesmas se componham, o que parece ter si<strong>do</strong> a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pelo Novo CPC, especialmente pela<br />

redação <strong>do</strong> seu art. 165. A mediação po<strong>de</strong> estar relacionada com direitos personalíssimos, não haven<strong>do</strong> qualquer óbice <strong>de</strong> sua<br />

utilização para as contendas relativas a consumi<strong>do</strong>res. Deve ficar claro que tanto a arbitragem quanto a mediação situam-se como<br />

mecanismos a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s e alternativos <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos, a par da tendência <strong>de</strong> <strong>de</strong>sjudicialização das contendas, ou seja, <strong>de</strong><br />

“fuga <strong>do</strong> Judiciário”.69<br />

O art. 853 <strong>do</strong> CC/2002 consagra a possibilida<strong>de</strong> da cláusula compromissória (pactum <strong>de</strong> compromitten<strong>do</strong>), para resolver<br />

divergências mediante juízo arbitral, na forma estabelecida pela Lei 9.307/1996. Nesse senti<strong>do</strong>, prevê o art. 4º da referida lei que “a<br />

cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os<br />

litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato”.<br />

A cláusula compromissória <strong>de</strong>ve ser estipulada por escrito, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> estar inserida no próprio contrato ou em <strong>do</strong>cumento<br />

aparta<strong>do</strong> que a ele se refira. Em regra, a referida cláusula vincula as partes, sen<strong>do</strong> obrigatória, diante <strong>do</strong> princípio da força<br />

obrigatória das convenções (pacta sunt servanda). No que se refere aos contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, a cláusula compromissória só terá<br />

eficácia se o a<strong>de</strong>rente tomar a iniciativa <strong>de</strong> instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que por<br />

escrito em <strong>do</strong>cumento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula (art. 4º, § 2º, da Lei<br />

9.307/1996). Porém, como restou claro, nos contratos <strong>de</strong> consumo, a cláusula <strong>de</strong> arbitragem compulsória é consi<strong>de</strong>rada nula, o que<br />

representa uma diferenciação importante entre os negócios <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são e <strong>de</strong> consumo.<br />

5.7.7.<br />

Cláusulas que imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo<br />

consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. VIII, <strong>do</strong> CDC)<br />

Conforme se extrai da melhor <strong>do</strong>utrina, o coman<strong>do</strong> em questão trata da chamada cláusula-mandato, pela nomeação <strong>de</strong> um<br />

mandatário impositivo pelo consumi<strong>do</strong>r.70 A cláusula é consi<strong>de</strong>rada abusiva pela presunção absoluta <strong>de</strong> um <strong>de</strong>sequilíbrio,<br />

afastan<strong>do</strong> <strong>do</strong> vulnerável negocial o exercício efetivo <strong>de</strong> seus direitos.<br />

Na jurisprudência po<strong>de</strong>m ser encontradas várias aplicações da norma, caso das <strong>de</strong>corrências da Súmula 60 <strong>do</strong> STJ, segun<strong>do</strong> a<br />

qual “é nula a obrigação cambial assumida por procura<strong>do</strong>r <strong>do</strong> mutuário vincula<strong>do</strong> ao mutuante, no exclusivo interesse <strong>de</strong>ste”. O teor<br />

da súmula tem relação com a vedação da autocontratação. Como exemplo <strong>de</strong> sua incidência nas relações <strong>de</strong> consumo, vejamos<br />

ementa daquele Tribunal Superior:<br />

“Processo civil. Recurso especial. Agravo regimental. Contrato bancário. Nota promissória. Cláusula mandato. Violação ao art. 51,<br />

IV, CDC. Súmula 60/STJ. Nulida<strong>de</strong>. Desprovimento. 1. É nula a cláusula contratual em que o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r autoriza o cre<strong>do</strong>r a sacar, para<br />

cobrança, título <strong>de</strong> crédito representativo <strong>de</strong> qualquer quantia em atraso. Isto porque tal cláusula não se coaduna com o contrato <strong>de</strong><br />

mandato, que pressupõe a inexistência <strong>de</strong> conflitos entre mandante e mandatário. Prece<strong>de</strong>ntes (REsp 504.036/RS e AgRgAg<br />

562.705/RS). 2. A<strong>de</strong>mais, a orientação <strong>de</strong>sta Corte é no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a cláusula contratual que permite a emissão da nota<br />

promissória em favor <strong>do</strong> banco/embarga<strong>do</strong>, caracteriza-se como abusiva, porque viola<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> princípio da boa-fé, consagra<strong>do</strong> no art.


51, inc. IV <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Prece<strong>de</strong>nte (REsp 511.450/RS). 3. Agravo regimental <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg no<br />

REsp 808.603/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Jorge Scartezzini – j. 04.05.2006 – DJ 29.05.2006, p. 264).<br />

No que concerne aos contratos celebra<strong>do</strong>s para a aquisição da casa própria, a jurisprudência tem concluí<strong>do</strong> que “É ilegal e<br />

abusiva a cláusula por meio da qual, em contratos <strong>do</strong> sistema financeiro da habitação, os mutuários conferem mandato à CEF para:<br />

assinar cédulas hipotecárias; assinar escritura <strong>de</strong> retificação, ratificação e aditamento <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> mútuo; receber in<strong>de</strong>nização da<br />

segura<strong>do</strong>ra; representá-los com po<strong>de</strong>res amplos em caso <strong>de</strong> <strong>de</strong>sapropriação <strong>do</strong> imóvel (TRF da 1ª Região – Apelação Cível<br />

199833000193031 – Quinta Turma – Juiz Fe<strong>de</strong>ral Marcelo Albernaz (convoca<strong>do</strong>) – j. 17.04.2009). O art. 51, inc. III, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, aplicável aos contratos bancários, veda expressamente a estipulação <strong>de</strong> cláusula contratual que imponha ao<br />

consumi<strong>do</strong>r a constituição <strong>de</strong> representante ou mandatário para concluir ou realizar outro negócio em seu nome. A<strong>de</strong>mais, há<br />

potencial conflito <strong>de</strong> interesses entre a cre<strong>do</strong>ra (CEF) e os <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>res (mutuários) no que tange à execução <strong>do</strong> contrato e aos seus<br />

efeitos, tornan<strong>do</strong> possível a utilização <strong>do</strong> mandato em <strong>de</strong>trimento <strong>do</strong> mandante, o que foge à sua natureza. (…)” (TRF da 1ª Região<br />

– Apelação Cível 2001.33.00.001074-0, Bahia – Quinta Turma – Rel. Des. Fed. Fagun<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Deus – j. 06.12.2010 – DJF1<br />

17.12.2010, p. 1.685).<br />

Por fim, em relação aos contratos <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito, tem-se entendi<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma correta que se afigura nula por abusivida<strong>de</strong> a<br />

cláusula contratual firmada no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> colocar o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r na condição <strong>de</strong> mandante, conce<strong>de</strong>n<strong>do</strong> po<strong>de</strong>res para a empresa<br />

presta<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> crédito contrair financiamento em instituições financeiras (TJMG – Apelação Cível 1.0024.04.257745-2/0011, Belo<br />

Horizonte – Décima Segunda Câmara Cível – Rel. Des. Alvimar <strong>de</strong> Ávila – j. 28.05.2008 – DJEMG 07.06.2008; TJSP – Apelação<br />

1140258-1 – Acórdão 2722617, São Paulo – Décima Nona Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Ricar<strong>do</strong> José Negrão Nogueira –<br />

j. 07.07.2008 – DJESP 12.08.2008; e TJMG – Apelação Cível 1.0024.03.038225-3/0011, Belo Horizonte – Décima Sexta Câmara<br />

Cível – Rel. Des. Sebastião Pereira <strong>de</strong> Souza – j. 31.10.2007 – DJEMG 29.02.2008). Essa posição acabou por ser sedimentada pela<br />

Segunda Seção <strong>do</strong> STJ em 2015, em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> julgamento <strong>de</strong> inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> recursos repetitivos, com a seguinte ementa: “nos contratos<br />

<strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito, é abusiva a previsão <strong>de</strong> cláusula-mandato que permita à opera<strong>do</strong>ra emitir título cambial contra o usuário <strong>do</strong><br />

cartão” (REsp 1.084.640/SP – Rel. Min. Marco Buzzi – j. 23.09.2015 – DJe 29.09.2015).<br />

5.7.8.<br />

Cláusulas que <strong>de</strong>ixem ao fornece<strong>do</strong>r a opção <strong>de</strong> concluir ou não o contrato, embora obrigan<strong>do</strong> o<br />

consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. IX, <strong>do</strong> CDC)<br />

Como bem pon<strong>de</strong>ra Bruno Miragem, trata-se <strong>de</strong> situação <strong>de</strong> cláusula puramente potestativa, pois <strong>de</strong>ixa o negócio ao livre<br />

arbítrio apenas <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r.71 No conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> inciso há uma clara vedação da falta <strong>de</strong> equivalência contratual, em<br />

que o fornece<strong>do</strong>r tem um direito sem a <strong>de</strong>vida correspondência jurídica em relação à outra parte. Deve ficar claro que o termo<br />

concluir quer dizer formar ou constituir o negócio jurídico, ten<strong>do</strong> o coman<strong>do</strong> incidência na fase pré-contratual ou <strong>de</strong> oferta. A título<br />

<strong>de</strong> exemplo, imagine-se uma hipótese <strong>de</strong> celebração <strong>de</strong> um orçamento, em que conste a opção <strong>do</strong> presta<strong>do</strong>r não celebrar o contrato<br />

<strong>de</strong>finitivo. A cláusula <strong>de</strong>ve ser tida como nula também por entrar em conflito com a força vinculativa <strong>do</strong> orçamento, retirada <strong>do</strong> art.<br />

40 <strong>do</strong> CDC.<br />

5.7.9.<br />

Cláusulas que permitam ao fornece<strong>do</strong>r, direta ou indiretamente, variação <strong>do</strong> preço <strong>de</strong> maneira<br />

unilateral (art. 51, inc. X, <strong>do</strong> CDC)<br />

O reconhecimento da abusivida<strong>de</strong> tem relação com a vedação <strong>do</strong> enriquecimento sem causa, ten<strong>do</strong> o preceito gran<strong>de</strong> aplicação<br />

no Brasil, diante <strong>de</strong> numerosos abusos cometi<strong>do</strong>s. Além disso, a <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> visa à manutenção <strong>do</strong> equilíbrio <strong>do</strong><br />

negócio, <strong>de</strong> sua base objetiva. Como leciona Rizzatto Nunes, “A regra, é verda<strong>de</strong>, dirige-se aos casos em que o negócio já foi<br />

firma<strong>do</strong>, uma vez que, no sistema <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> preços atualmente vigente no País, o valor inicialmente é fixa<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma livre<br />

pelo fornece<strong>do</strong>r. O que ele não po<strong>de</strong> é fazer modifica-lo para aumentá-lo após ter efetua<strong>do</strong> a transação”.72<br />

Para ilustrar, não po<strong>de</strong> uma escola valer-se <strong>de</strong> uma cláusula para aumentar sem qualquer justificativa a mensalida<strong>de</strong><br />

inicialmente contratada, com vistas ao locupletamento sem razão. Do mesmo mo<strong>do</strong>, o financiamento em crediário não po<strong>de</strong> trazer<br />

cláusulas que alteram substancialmente o preço no <strong>de</strong>correr <strong>do</strong> negócio <strong>de</strong> trato sucessivo, geran<strong>do</strong> onerosida<strong>de</strong> excessiva (TJRS –<br />

Apelação Cível 70025540824, Novo Hamburgo – Décima Segunda Câmara Cível – Rel. Des. Orlan<strong>do</strong> Heemann Junior – j.<br />

18.12.2008 – DOERS 12.01.2009, p. 72). A mesma premissa <strong>de</strong> vedação <strong>do</strong> <strong>de</strong>sequilíbrio vale para os contratos <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>,<br />

como se tem reconheci<strong>do</strong> na prática, em que as empresas impõem aumentos abusivos com fundamento em cláusulas <strong>de</strong> variação<br />

unilateral (por to<strong>do</strong>s: TJSP – Apelação APL 994.07.026282-4 – Acórdão 4668039, São Paulo – Primeira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong><br />

– Rel. Des. Paulo Eduar<strong>do</strong> Razuk – j. 10.08.2010 – DJESP 10.09.2010; TJPR – Apelação Cível 0396304-0, Curitiba – Oitava<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Carvilio da Silveira Filho – DJPR 04.05.2009, p. 142; TJRS – Apelação Cível 2006.001.13644 – Quinta<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Milton Fernan<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Souza – j. 25.04.2006; e TJRS – Apelação Cível 70006640445, Porto Alegre –


Quinta Câmara Cível – Rel. Des. Ana Maria Ne<strong>de</strong>l Scalzilli – j. 05.08.2004).<br />

5.7.10.<br />

Cláusulas que autorizem o fornece<strong>do</strong>r a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual<br />

direito seja conferi<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. XI, <strong>do</strong> CDC)<br />

O CDC encerra no inciso em comento um importante controle sobre o direito <strong>de</strong> resilição contratual, mais uma vez vedan<strong>do</strong><br />

uma cláusula puramente potestativa, <strong>de</strong>nominada cláusula <strong>de</strong> rescisão unilateral ou <strong>de</strong> cancelamento unilateral. Resi<strong>de</strong> por igual<br />

no conteú<strong>do</strong> da norma a máxima que veda o comportamento contraditório, relacionada à boa-fé objetiva e às justas expectativas<br />

<strong>de</strong>positadas no negócio jurídico (venire contra factum proprium non potest).<br />

A cláusula em questão merece um cuida<strong>do</strong> especial nos contratos cativos <strong>de</strong> longa duração, especialmente nos contratos <strong>de</strong><br />

plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, em que a finalida<strong>de</strong> tem relação com a tutela da vida e da integrida<strong>de</strong> físico-psíquica. Numerosos são os julga<strong>do</strong>s<br />

que reconhecem a nulida<strong>de</strong> da referida cláusula em casos tais. A título <strong>de</strong> exemplo, <strong>do</strong> STJ, colaciona-se: “Consumi<strong>do</strong>r. Plano <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong>. Cláusula abusiva. Nulida<strong>de</strong>. Rescisão unilateral <strong>do</strong> contrato pela segura<strong>do</strong>ra. Lei 9.656/1998. É nula, por expressa previsão<br />

legal, e em razão <strong>de</strong> sua abusivida<strong>de</strong>, a cláusula inserida em contrato <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> que permite a sua rescisão unilateral pela<br />

segura<strong>do</strong>ra, sob simples alegação <strong>de</strong> inviabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> manutenção da avença. Recurso provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 602.397/RS – Terceira<br />

Turma – Rel. Min. Castro Filho – j. 21.06.2005 – DJ 01.08.2005, p. 443).<br />

Ainda, <strong>de</strong> forma contun<strong>de</strong>nte, <strong>do</strong> Tribunal <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul: “O cancelamento unilateral da apólice é inadmissível, sen<strong>do</strong><br />

abusiva a cláusula que o prevê, nos termos <strong>do</strong> art. 51, IV e XI <strong>do</strong> CDC. A segura<strong>do</strong>ra não po<strong>de</strong> impor ao segura<strong>do</strong>, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tantos<br />

anos <strong>de</strong> contratação, o cancelamento unilateral da apólice, pena <strong>de</strong> quebra <strong>do</strong> contrato. Dano moral não configura<strong>do</strong>, uma vez que o<br />

mero <strong>de</strong>scumprimento contratual não dá ensejo a tal reparação” (TJRS – Apelação Cível 70030813992, Osório – Quinta Câmara<br />

Cível – Rel. Des. Romeu Marques Ribeiro Filho – j. 24.11.2010 – DJERS 02.12.2010).<br />

5.7.11.<br />

Cláusulas que obriguem o consumi<strong>do</strong>r a ressarcir os custos <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> sua obrigação, sem<br />

que igual direito lhe seja conferi<strong>do</strong> contra o fornece<strong>do</strong>r (art. 51, inc. XII, <strong>do</strong> CDC)<br />

Interpretan<strong>do</strong> o dispositivo, Ezequiel Morais <strong>de</strong>monstra que o CDC não veda a estipulação que impõe ao consumi<strong>do</strong>r o<br />

pagamento das <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> cobrança em <strong>de</strong>corrência <strong>do</strong> inadimplemento, mas apenas <strong>de</strong>termina que esse direito seja uma via <strong>de</strong><br />

mão dupla, ou seja, somente será válida a cláusula se constar <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> contra o fornece<strong>do</strong>r.73 Como ocorre com outras<br />

previsões já expostas, a norma visa a manter o equilíbrio contratual, a sua equivalência material e a boa-fé objetiva.<br />

De toda sorte, mesmo constan<strong>do</strong> o pagamento <strong>de</strong> tais <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> forma bilateral, a cláusula <strong>de</strong> imposição não po<strong>de</strong> trazer uma<br />

onerosida<strong>de</strong> excessiva, sob pena <strong>de</strong> se configurar a abusivida<strong>de</strong> por outro inciso <strong>do</strong> art. 51, caso <strong>do</strong> inc. IV, a gerar <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong><br />

a sua nulida<strong>de</strong> absoluta. A título <strong>de</strong> exemplo, po<strong>de</strong> ser cita<strong>do</strong> o entendimento <strong>de</strong> Tribunais Estaduais no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> ser nula a<br />

cláusula contratual que impõe ao consumi<strong>do</strong>r o pagamento <strong>de</strong> taxas que seriam da instituição financeira, caso da TEC ou tarifa <strong>de</strong><br />

emissão <strong>de</strong> carnê (por to<strong>do</strong>s: TJMG – Apelação Cível 2698226-67.2008.8.13.0024, Belo Horizonte – Décima Sexta Câmara Cível –<br />

Rel. Des. Sebastião Pereira <strong>de</strong> Souza – j. 04.02.2011 – DJEMG 25.03.2011; TJDF – Recurso 2009.07.1.010285-9 – Acórdão<br />

442.252 – Primeira Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e Criminais – Rel. Juíza Wil<strong>de</strong> Maria Silva Justiniano Ribeiro –<br />

DJDFTE 01.09.2010, p. 215; TJRS – Apelação Cível 70029096377, Novo Hamburgo – Segunda Câmara Especial Cível – Rel. Des.<br />

Lúcia <strong>de</strong> Fátima Cerveira – j. 29.09.2010 – DJERS 13.10.2010; e TJPR – Apelação Cível 0512247-4, Curitiba – Décima Sétima<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Vicente Del Prete Misurelli – DJPR 24.10.2008, p. 101).<br />

Porém, repise-se que, infelizmente, o STJ acabou por concluir pela possibilida<strong>de</strong> da cobrança da citada taxa bancária, além da<br />

tarifa <strong>de</strong> abertura <strong>de</strong> crédito (Cf. REsp 1.251.331/RS e REsp 1.255.573/RS, julga<strong>do</strong>s em setembro <strong>de</strong> 2013). A questão se<br />

consoli<strong>do</strong>u <strong>de</strong> tal forma que, em fevereiro <strong>de</strong> 2016, foram editadas duas súmulas admitin<strong>do</strong> parcialmente tais cobranças. De início,<br />

prevê a Súmula 565 da Corte Superior “a pactuação das tarifas <strong>de</strong> abertura <strong>de</strong> crédito (TAC) e <strong>de</strong> emissão <strong>de</strong> carnê (TEC), ou outra<br />

<strong>de</strong>nominação para o mesmo fato gera<strong>do</strong>r, é válida apenas nos contratos bancários anteriores ao início da vigência da Resolução-<br />

CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008”. E, ainda, a Súmula 566 <strong>do</strong> STJ: “nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da<br />

Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, po<strong>de</strong> ser cobrada a tarifa <strong>de</strong> cadastro no início <strong>do</strong> relacionamento entre o<br />

consumi<strong>do</strong>r e a instituição financeira”.<br />

Para o presente autor, trata-se <strong>de</strong> claros equívocos, que colocam o consumi<strong>do</strong>r em clara <strong>de</strong>svantagem, uma vez que os bancos já<br />

atingem lucros milionários em nosso País, por conta <strong>de</strong> outras taxas <strong>de</strong> serviços bancários que são cobradas e pelos altos juros<br />

<strong>de</strong>correntes <strong>do</strong>s fornecimentos <strong>de</strong> créditos. Assim, enten<strong>de</strong>mos que a cobrança <strong>de</strong> tais valores, em qualquer perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> tempo,<br />

representa evi<strong>de</strong>nte abusivida<strong>de</strong> contra os vulneráveis contratuais, nos termos da vedação constante <strong>do</strong> art. 51, inciso XII, da Lei<br />

8.078/1990.<br />

De toda sorte, ainda sobre o inciso em análise, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2013, cite-se aresto que <strong>de</strong>duziu pela abusivida<strong>de</strong> da cláusula


contratual que atribui exclusivamente ao consumi<strong>do</strong>r em mora a obrigação <strong>de</strong> arcar com os honorários advocatícios referentes à<br />

cobrança extrajudicial da dívida, sem exigir <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r a <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> que a contratação <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong> fora efetivamente<br />

necessária e <strong>de</strong> que os serviços presta<strong>do</strong>s pelo profissional contrata<strong>do</strong> sejam privativos da advocacia.<br />

Conforme consta da publicação no Informativo n. 524 daquela Corte Superior, “é certo que o art. 395 <strong>do</strong> CC autoriza o<br />

ressarcimento <strong>do</strong> valor <strong>de</strong> honorários <strong>de</strong>correntes da contratação <strong>de</strong> serviços advocatícios extrajudiciais. Todavia, não se po<strong>de</strong><br />

per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista que, nos contratos <strong>de</strong> consumo, além da existência <strong>de</strong> cláusula expressa para a responsabilização <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r,<br />

<strong>de</strong>ve haver reciprocida<strong>de</strong>, garantin<strong>do</strong>-se igual direito ao consumi<strong>do</strong>r na hipótese <strong>de</strong> inadimplemento <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. A<strong>de</strong>mais, <strong>de</strong>vese<br />

ressaltar que a liberda<strong>de</strong> contratual, integrada pela boa-fé objetiva, acrescenta ao contrato <strong>de</strong>veres anexos, entre os quais se<br />

<strong>de</strong>staca o ônus <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r <strong>de</strong> minorar seu prejuízo mediante soluções amigáveis antes da contratação <strong>de</strong> serviço especializa<strong>do</strong>.<br />

Assim, o exercício regular <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> ressarcimento aos honorários advocatícios <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> sua<br />

imprescindibilida<strong>de</strong> para a solução extrajudicial <strong>de</strong> impasse entre as partes contratantes ou para a a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> medidas preparatórias<br />

ao processo judicial, bem como da prestação efetiva <strong>de</strong> serviços privativos <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1.274.629/AP – Rel. Min.<br />

Nancy Andrighi – j. 16.05.2013). Por bem, esse último acórdão segue a linha <strong>de</strong>sejada, <strong>de</strong> tutela efetiva <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s<br />

consumi<strong>do</strong>res, na contramão das sumulares por último comentadas.<br />

5.7.12.<br />

Cláusulas que autorizem o fornece<strong>do</strong>r a modificar unilateralmente o conteú<strong>do</strong> ou a qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

contrato, após sua celebração (art. 51, inc. XIII, <strong>do</strong> CDC)<br />

Diante das justas expectativas <strong>de</strong>positadas no negócio, não po<strong>de</strong> o fornece<strong>do</strong>r modificar unilateralmente o contrato e sem<br />

qualquer motivo, sen<strong>do</strong> a sua cláusula autoriza<strong>do</strong>ra nula por abusivida<strong>de</strong>. Consigne-se que Claudia Lima Marques, Herman<br />

Benjamin e Bruno Miragem criticam o coman<strong>do</strong>, pela utilização da expressão qualida<strong>de</strong>, que acaba restringin<strong>do</strong> a sua<br />

concretização.74 Assim, a correta interpretação seria no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> se vedar qualquer alteração posterior <strong>do</strong> contrato, qualquer<br />

quebra das regras <strong>do</strong> jogo, a gerar um <strong>de</strong>sequilíbrio ou uma situação <strong>de</strong> injustiça contra o consumi<strong>do</strong>r. Cite-se, em conformida<strong>de</strong><br />

com previsão anterior, a cláusula que altera o preço ou os juros inicialmente contrata<strong>do</strong>s pelas partes.<br />

Em reforço, da realida<strong>de</strong> jurispru<strong>de</strong>ncial, é nula a cláusula que muda as regras <strong>do</strong> plano <strong>de</strong> telefonia, sem qualquer fundamento<br />

(TJBA – Recurso 81957-3/2006-1 – Segunda Turma Recursal – Rel. Juiz Aurelino Otacílio Pereira Neto – DJBA 13.07.2009). Ou,<br />

ainda, é nula a cláusula contratual que afasta a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>volução <strong>de</strong> valores pagos em contrato <strong>de</strong> serviços educacionais<br />

em caso <strong>de</strong> não reconhecimento <strong>do</strong> curso <strong>de</strong> mestra<strong>do</strong> pelos órgãos existentes, quebran<strong>do</strong> as expectativas <strong>de</strong>positadas quan<strong>do</strong> da<br />

contratação inicial (TJSP – Apelação 7159326-9 – Acórdão 3922190, Santos – Vigésima Segunda Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel.<br />

Des. Roberto Bedaque – j. 24.06.2009 – DJESP 20.07.2009). Por fim, “A cláusula contratual que possibilita ao cre<strong>do</strong>r modificar<br />

unilateralmente o contrato após a sua celebração, aumentan<strong>do</strong> o número <strong>de</strong> prestações <strong>de</strong>vidas pelo contratante, <strong>de</strong>ve ser reputada<br />

como nula, porquanto manifestamente abusiva, afrontan<strong>do</strong> o princípio da boa-fé objetiva (arts. 4º, III, e 51, XIII, <strong>do</strong> CDC e 422 <strong>do</strong><br />

Código Civil). Provimento parcial <strong>do</strong> recurso para manter as obrigações originalmente contratadas” (TJRJ – Apelação Cível<br />

2008.001.64668 – Décima Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Celia Meliga Pessoa – DORJ 13.08.2009, p. 200).<br />

5.7.13.<br />

Cláusulas que infrinjam ou possibilitem a violação <strong>de</strong> normas ambientais (art. 51, inc. XIV, <strong>do</strong><br />

CDC)<br />

A previsão estabelece interessante conexão dialogal <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r com o <strong>Direito</strong> Ambiental, mormente com a<br />

proteção <strong>do</strong> Bem Ambiental retirada <strong>do</strong> art. 225 da CF/1988. Enuncia o caput <strong>do</strong> dispositivo constitucional que “To<strong>do</strong>s têm direito<br />

ao meio ambiente ecologicamente equilibra<strong>do</strong>, bem <strong>de</strong> uso comum <strong>do</strong> povo e essencial à sadia qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida, impon<strong>do</strong>-se ao<br />

Po<strong>de</strong>r Público e à coletivida<strong>de</strong> o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> <strong>de</strong>fendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.<br />

Nesse contexto <strong>de</strong> proteção, o Bem Ambiental constitui um bem difuso, que supera a antiga dicotomia público x priva<strong>do</strong>,<br />

surgin<strong>do</strong> um novo conceito <strong>de</strong> interesse, maior <strong>do</strong> que essa simples contradição, qual seja a tripartição <strong>do</strong> interesse coletivo em<br />

direitos individuais homogêneos, direitos coletivos em senti<strong>do</strong> estrito e direitos difusos. Leciona Rui Carvalho Piva que o Bem<br />

Ambiental é “um valor difuso, imaterial ou material, que serve <strong>de</strong> objeto mediato a relações jurídicas <strong>de</strong> natureza ambiental”.75<br />

Sen<strong>do</strong> difuso, o meio ambiente envolve interesses que não po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s em um primeiro momento, ou seja, os<br />

interesses públicos e os priva<strong>do</strong>s ao mesmo tempo, o que justifica a responsabilização objetiva daqueles que lhe causam danos, nos<br />

termos <strong>do</strong> art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981.76 Preocupa-se com os interesses transgeracionais ou intergeracionais relativos a esse<br />

bem <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s, pela proteção das futuras gerações, aquelas que ainda virão (equida<strong>de</strong> intergeracional). 77 Como <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> tais<br />

premissas teóricas, o direito ao equilíbrio no Bem Ambiental é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>utrina como um direito fundamental. 78<br />

Diante <strong>de</strong> sua in<strong>de</strong>clinável abrangência difusa, a proteção <strong>do</strong> meio ambiente envolve igualmente os contratos. Nesse contexto,<br />

po<strong>de</strong>-se afirmar que o contrato que viola valores ambientais é nulo por <strong>de</strong>srespeito à função social <strong>do</strong> contrato (função


socioambiental). Utiliza-se a eficácia externa <strong>do</strong> princípio, pela proteção <strong>do</strong>s direitos difusos e coletivos, na esteira <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n.<br />

23 <strong>do</strong> CJF/STJ, da I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil. Não po<strong>de</strong>ria ser diferente com os contratos <strong>de</strong> consumo, em que a proteção coletiva é<br />

marcante.<br />

Para ilustrar, se, em <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> um produto, o consumi<strong>do</strong>r aceita contratualmente que o seu uso<br />

cause danos ao meio ambiente, a previsão é nula, por contrariar os cita<strong>do</strong>s valores <strong>de</strong> proteção. Além <strong>de</strong>ssa <strong>de</strong>cretação <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong>,<br />

é possível retirar o produto <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, diante <strong>de</strong> seu índice <strong>de</strong> periculosida<strong>de</strong> ao meio ambiente.<br />

5.7.14.<br />

Cláusulas que estejam em <strong>de</strong>sacor<strong>do</strong> com o sistema <strong>de</strong> proteção ao consumi<strong>do</strong>r (art. 51, inc. XV,<br />

<strong>do</strong> CDC)<br />

Mais uma vez, o inciso consagra um sistema aberto <strong>de</strong> proteção, ao preconizar a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquer cláusula que entre em<br />

conflito com o sistema <strong>de</strong> proteção consumerista. Sem prejuízo das ilustrações já expostas quan<strong>do</strong> <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> inc. IV, um bom<br />

exemplo envolve a cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro, quan<strong>do</strong> inserida em contratos <strong>de</strong> consumo. Como se sabe, trata-se da previsão que<br />

escolhe o juízo competente a apreciar o conflito contratual, cláusula essa que é válida, em regra, por força da antiga Súmula 335 <strong>do</strong><br />

Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral e <strong>do</strong> art. 63 <strong>do</strong> Novo CPC. De acor<strong>do</strong> com o último coman<strong>do</strong>, “as partes po<strong>de</strong>m modificar a competência<br />

em razão <strong>do</strong> valor e <strong>do</strong> território, elegen<strong>do</strong> foro on<strong>de</strong> será proposta ação oriunda <strong>de</strong> direitos e obrigações”.<br />

Pois bem, no que toca às ações <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil, a cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro é flagrantemente nula, por violar a regra<br />

<strong>do</strong> art. 101, inc. I, <strong>do</strong> CDC, que estabelece o foro privilegia<strong>do</strong> para os consumi<strong>do</strong>res em <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> tal natureza. Insta verificar se<br />

a premissa vale para qualquer <strong>de</strong>manda envolven<strong>do</strong> os consumi<strong>do</strong>res.<br />

Na esteira <strong>do</strong>s ensinamentos <strong>de</strong> Nelson Nery Jr., o presente autor respon<strong>de</strong> positivamente para a última indagação. Isso porque<br />

a cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro representa uma afronta ao direito fundamental <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> facilitação <strong>de</strong> sua <strong>de</strong>fesa, retira<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

art. 6º, inc. VIII, <strong>do</strong> CDC.79 Nessa linha, é totalmente <strong>de</strong>snecessário <strong>de</strong>bater se houve ou não prejuízo ao consumi<strong>do</strong>r, como muitas<br />

vezes insiste a jurisprudência (STJ – REsp 1.089.993/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Massami Uyeda – j. 18.02.2010 – DJe<br />

08.03.2010; STJ – REsp 1084291/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Massami Uyeda – j. 05.05.2009 – DJe 04.08.2009; STJ – REsp<br />

669.990/CE – Quarta Turma – Rel. Min. Jorge Scartezzini – j. 17.08.2006 – DJ 11.09.2006, p. 289; e TJSP – Agravo <strong>de</strong><br />

Instrumento 0567717-26.2010.8.26.0000 – Acórdão n. 5023138, São Paulo – Vigésima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des.<br />

Francisco Giaquinto – j. 14.02.2011 – DJESP 15.04.2011).<br />

Na verda<strong>de</strong>, é preciso concluir que o prejuízo <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> uma presunção absoluta <strong>de</strong> proteção, retirada <strong>do</strong> art. 1º da Lei<br />

8.078/1990 (princípio <strong>do</strong> protecionismo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r). 80 Julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> STJ concluiu indiretamente <strong>de</strong>ssa forma, ao reconhecer a<br />

nulida<strong>de</strong> absoluta da cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro em contrato <strong>de</strong> consumo, sem qualquer condição <strong>de</strong> exigência complementar (STJ<br />

– AgRg no Ag 1070671/SC – Quarta Turma – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – j. 27.04.2010 – DJe 10.05.2010).<br />

O último caminho parece ter si<strong>do</strong> o a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pelo art. 112, parágrafo único, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil <strong>de</strong> 1973, instituí<strong>do</strong> pela<br />

Lei 11.208/2006, segun<strong>do</strong> o qual “A nulida<strong>de</strong> da cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro, em contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>clarada <strong>de</strong> ofício<br />

pelo juiz, que <strong>de</strong>clinará <strong>de</strong> competência para o juízo <strong>de</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu”. Como se po<strong>de</strong> notar, o dispositivo legal não fazia<br />

qualquer menção da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prova <strong>do</strong> prejuízo ao vulnerável. Ressalte-se, porém, que a norma processual sempre teve<br />

incidência aos contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, que não necessariamente são <strong>de</strong> negócios <strong>de</strong> consumo, como ainda será <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> no<br />

presente capítulo.<br />

O Código <strong>de</strong> Processo Civil <strong>de</strong> 2015 traz mudanças importantes a respeito <strong>do</strong> tema. Reitere-se que, conforme o seu art. 63,<br />

caput, as partes po<strong>de</strong>m modificar a competência em razão <strong>do</strong> valor e <strong>do</strong> território, elegen<strong>do</strong> foro on<strong>de</strong> será proposta ação oriunda <strong>de</strong><br />

direitos e obrigações. Esse preceito equivale, em parte, ao art. 111, caput, <strong>do</strong> CPC/1973.<br />

A<strong>de</strong>mais, conforme o § 1.º <strong>do</strong> art. 63 <strong>do</strong> Novo CPC, a eleição <strong>de</strong> foro só produz efeito quan<strong>do</strong> constar <strong>de</strong> instrumento escrito e<br />

aludir expressamente a <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> negócio jurídico. Correspon<strong>de</strong> a regra ao antigo art. 111, § 1.º, <strong>do</strong> CPC revoga<strong>do</strong>.<br />

O foro contratual obriga os her<strong>de</strong>iros e sucessores das partes (art. 63, § 2.º, <strong>do</strong> CPC/2015, repetição <strong>do</strong> art. 111, § 2.º, <strong>do</strong><br />

CPC/1973. Além disso, antes da citação, a cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro, se abusiva, po<strong>de</strong> ser reputada ineficaz <strong>de</strong> ofício pelo juiz, que<br />

<strong>de</strong>terminará a remessa <strong>do</strong>s autos ao juízo <strong>do</strong> foro <strong>de</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu (art. 63, § 3.º, <strong>do</strong> CPC/2015).<br />

Para o presente autor, a última solução apresentada pelo Estatuto Processual emergente, quan<strong>do</strong> confrontada com o antigo art.<br />

112, parágrafo único, <strong>do</strong> CPC/1973, não é das melhores, haven<strong>do</strong> aqui um retrocesso. Isso porque a abusivida<strong>de</strong> da cláusula <strong>de</strong><br />

eleição <strong>de</strong> foro, por envolver or<strong>de</strong>m pública – a tutela <strong>do</strong> a<strong>de</strong>rente como vulnerável contratual –, não <strong>de</strong>veria gerar a mera ineficácia<br />

<strong>do</strong> ato, mas a sua nulida<strong>de</strong> absoluta. De toda a sorte, cabe ao legisla<strong>do</strong>r fazer tal opção, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> a norma ser respeitada.<br />

Por fim, pontue-se que, como novida<strong>de</strong> <strong>de</strong>corrente da última alteração, o Novo CPC passou a dispor que, cita<strong>do</strong> o réu, incumbe<br />

a ele alegar a abusivida<strong>de</strong> da cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro na contestação, sob pena <strong>de</strong> preclusão (art. 63, § 4.º).


5.7.15. Cláusulas que possibilitem a renúncia <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por benfeitorias necessárias<br />

(art. 51, inc. XVI, <strong>do</strong> CDC)<br />

Nos termos <strong>do</strong>s arts. 96 e 97 <strong>do</strong> Código Civil, as benfeitorias como bens acessórios são melhoramentos ou acresci<strong>do</strong>s<br />

introduzi<strong>do</strong>s em um bem principal, classificadas quanto à essencialida<strong>de</strong> em necessárias, úteis e voluptuárias. Nos termos da lei, são<br />

necessárias as benfeitorias que visam à conservação <strong>do</strong> bem principal, tidas como essenciais ao último. As benfeitorias úteis são<br />

aquelas que aumentam ou facilitam o uso <strong>do</strong> bem principal. Por fim, as voluptuárias são as <strong>de</strong> mero <strong>de</strong>leite ou recreio, que não<br />

aumentam o uso habitual <strong>do</strong> bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam <strong>de</strong> eleva<strong>do</strong> valor.<br />

Diante da relação <strong>de</strong> essencialida<strong>de</strong> com o bem principal, o Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>duz como abusiva a cláusula <strong>de</strong> renúncia<br />

às benfeitorias necessárias. Não se po<strong>de</strong> esquecer da presunção <strong>de</strong> boa-fé a favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, a gerar o direito <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização<br />

por tais benfeitorias, nos termos <strong>do</strong> art. 1.219 <strong>do</strong> Código Civil. A previsão consumerista em comento tem gran<strong>de</strong> concreção prática,<br />

em casos relativos a compromissos <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> imóveis celebra<strong>do</strong>s com incorpora<strong>do</strong>ras ou outros profissionais que são<br />

inadimpli<strong>do</strong>s pelos consumi<strong>do</strong>res, sen<strong>do</strong> forçoso reconhecer o direito a tais benfeitorias. Por to<strong>do</strong>s os inúmeros julga<strong>do</strong>s:<br />

“Ação <strong>de</strong> rescisão <strong>de</strong> compromisso <strong>de</strong> venda e compra cumulada com reintegração <strong>de</strong> posse. Descumprimento <strong>de</strong> cláusula contratual.<br />

Rescisão <strong>do</strong> contrato e reintegração <strong>de</strong> posse que se impõe, diante da inadimplência e não purgação da mora. Desnecessida<strong>de</strong> da<br />

reconvenção para análise <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>volução das parcelas pagas, já que a matéria constitui o próprio objeto <strong>do</strong> campo cognitivo<br />

da <strong>de</strong>manda principal. Incabível a perda integral das prestações pagas. Aplicação <strong>do</strong> disposto no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

<strong>Direito</strong> à <strong>de</strong>volução <strong>do</strong>s valores, com retenção <strong>de</strong> 50% das parcelas pagas. Nulida<strong>de</strong> da cláusula que nega o direito à in<strong>de</strong>nização<br />

pelas benfeitorias necessárias e úteis. Não cabimento <strong>de</strong> direito <strong>de</strong> retenção. Ausência <strong>de</strong> discriminação, na hipótese, das benfeitorias<br />

necessárias. Reforma parcial da R. Sentença. Dá-se parcial provimento ao recurso” (TJSP – Apelação Cível 9057567-<br />

26.2006.8.26.0000 – Acórdão 4988092, Araçatuba – Quinta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Christine Santini – j. 23.02.2011<br />

– DJESP 07.04.2011).<br />

“Compromisso <strong>de</strong> venda e compra. Inadimplemento <strong>do</strong> compromissário compra<strong>do</strong>r. Exceptio non adimpleti contractus. Perda das<br />

prestações pagas incabível. Incabível também <strong>de</strong>volução integral <strong>do</strong>s valores pagos pela ocupação <strong>do</strong> imóvel por mais <strong>de</strong> quatorze<br />

anos. Aplicação <strong>do</strong> disposto no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. <strong>Direito</strong> à <strong>de</strong>volução <strong>do</strong>s valores, com retenção <strong>de</strong> 70% das<br />

parcelas pagas. Nulida<strong>de</strong> da cláusula que nega direito à in<strong>de</strong>nização pelas benfeitorias necessárias e úteis. Não cabimento, na<br />

hipótese, <strong>de</strong> direito <strong>de</strong> retenção, por ausência <strong>de</strong> discriminação <strong>de</strong> forma completa das benfeitorias necessárias e úteis introduzidas no<br />

imóvel” (TJSP – Apelação com Revisão 414.447.4/8 – Acórdão 4140044, Suzano – Quinta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des.<br />

Christine Santini – j. 21.10.2009 – DJESP 11.11.2009).<br />

As <strong>de</strong>cisões transcritas são interessantes, pois vão além da previsão consumerista, estabelecen<strong>do</strong> também o direito <strong>de</strong><br />

in<strong>de</strong>nização por benfeitorias úteis ao possui<strong>do</strong>r <strong>de</strong> boa-fé, o que está em sintonia com o cita<strong>do</strong> art. 1.219 <strong>do</strong> CC/2002. Como não<br />

po<strong>de</strong>ria ser diferente, as conclusões constantes das ementas contam com o apoio <strong>do</strong> presente autor, pela opção <strong>do</strong> saudável caminho<br />

<strong>do</strong> diálogo das fontes.<br />

Realiza<strong>do</strong> o estu<strong>do</strong> das hipóteses <strong>de</strong>scritas pelo art. 51 da Lei 8.078/1990, é preciso fixar algumas <strong>de</strong> suas <strong>de</strong>corrências. Como<br />

as hipóteses <strong>de</strong>scritas são <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> absoluta, <strong>de</strong>ve-se reconhecer a imprescritibilida<strong>de</strong> da ação <strong>de</strong>claratória correspon<strong>de</strong>nte, o que<br />

é incidência da regra <strong>do</strong> art. 169 <strong>do</strong> Código Civil, segun<strong>do</strong> o qual a nulida<strong>de</strong> não convalesce pelo <strong>de</strong>curso <strong>do</strong> tempo (nesse senti<strong>do</strong>,<br />

quanto à <strong>de</strong>cretação da nulida<strong>de</strong>: TJSC – Apelação Cível 2007.014544-6, Araranguá – Rel. Juiz Paulo Roberto Camargo Costa – j.<br />

22.07.2010 – DJSC 29.07.2010, p. 261; e TJSC – Apelação Cível 2007.015529-6, Criciúma – Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong><br />

Comercial – Rel. Des. Marco Aurélio Gastaldi Buzzi – DJSC 12.05.2008, p. 156). Eis mais um caminho pelo diálogo das fontes que<br />

protege o consumi<strong>do</strong>r, diante da não submissão a qualquer prazo prescricional ou <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial. A<strong>de</strong>mais, a imprescritibilida<strong>de</strong> está<br />

fundada no argumento <strong>de</strong> que a nulida<strong>de</strong> absoluta envolve or<strong>de</strong>m pública.<br />

Como explica Cristiano Heineck Schmitt ao tratar <strong>do</strong> tema, “Entre as características das nulida<strong>de</strong>s (absolutas) que mais se<br />

<strong>de</strong>stacam, po<strong>de</strong>mos referir, em regra, a insanabilida<strong>de</strong>, a alegação por qualquer interessa<strong>do</strong>, a <strong>de</strong>cretação <strong>de</strong> ofício pelo juiz, com<br />

efeito ex tunc, a dispensa <strong>de</strong> ação específica para po<strong>de</strong>r ser reconhecida, a imprescritibilida<strong>de</strong> e a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produzir<br />

efeitos”.81 Vejamos tais corretas conclusões aplicadas na realida<strong>de</strong> consumerista nacional.<br />

De início, em <strong>de</strong>trimento da impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se sanar a nulida<strong>de</strong> absoluta – nos termos <strong>do</strong> que estabelece o cita<strong>do</strong> art. 169 <strong>do</strong><br />

CC/2002 –, o § 2º <strong>do</strong> art. 51 <strong>do</strong> CDC acaba por consagrar o princípio da conservação contratual, que visa à manutenção da<br />

autonomia privada. Determina o último coman<strong>do</strong> que a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, em<br />

regra, exceto quan<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua ausência, apesar <strong>do</strong>s esforços <strong>de</strong> integração, <strong>de</strong>correr ônus excessivo a qualquer das partes. Desse<br />

mo<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ve o juiz fazer uso das máximas <strong>de</strong> experiência e <strong>do</strong>s princípios gerais consumeristas para suprir e corrigir o contrato. Em<br />

verda<strong>de</strong>, a correção ou revisão <strong>do</strong> negócio e a sua imposição para a outra parte acabam por funcionar como uma punição contra o<br />

abusa<strong>do</strong>r contratual, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser tidas como regras no sistema consumerista.82<br />

Sen<strong>do</strong> assim, é cabível por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, diretamente, uma ação <strong>de</strong> revisão e não <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong>, o que representa o


exercício <strong>de</strong> um direito por parte <strong>do</strong> vulnerável negocial, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a sua conveniência. A premissa é admitida em numerosos<br />

julga<strong>do</strong>s, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>snecessário colacioná-los, diante <strong>de</strong> sua enorme quantida<strong>de</strong>. Por razões óbvias, a ação <strong>de</strong> revisão também não<br />

prescreve, por envolver a citada or<strong>de</strong>m pública.<br />

Consigne-se que, no sistema civil, <strong>do</strong>is dispositivos a<strong>do</strong>tam a mesma i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> preservação. O primeiro a ser evoca<strong>do</strong> é o art.<br />

170 <strong>do</strong> CC/2002, que admite a convalidação <strong>do</strong> negócio jurídico nulo, pela sua conversão indireta e substancial em outro negócio.<br />

Além <strong>de</strong>sse, o art. 184 da codificação consagra a redução <strong>do</strong> negócio jurídico, dispon<strong>do</strong> que a invalida<strong>de</strong> parcial <strong>de</strong> um negócio não<br />

o prejudica na parte válida, pois a parte inútil não po<strong>de</strong> viciar a parte útil <strong>do</strong> contrato (utile per inutile non vitiatur). To<strong>do</strong>s os<br />

preceitos, inclusive o <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, ao valorizarem a conservação <strong>do</strong> negócio jurídico, têm relação direta com o<br />

princípio da função social <strong>do</strong>s contratos em sua eficácia interna. Nesse senti<strong>do</strong>, repise-se o teor <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 22 <strong>do</strong> CJF/STJ, da I<br />

Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil: “A função social <strong>do</strong> contrato, prevista no art. 421 <strong>do</strong> NCC, constitui cláusula geral, que reforça o<br />

princípio da conservação <strong>do</strong> contrato, asseguran<strong>do</strong> trocas úteis e justas”.<br />

No que concerne à propositura da <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> da cláusula abusiva, não se olvi<strong>de</strong> a premissa fixada pelo art. 168,<br />

caput, <strong>do</strong> CC, segun<strong>do</strong> o qual as nulida<strong>de</strong>s absolutas po<strong>de</strong>m ser alegadas por qualquer interessa<strong>do</strong>, ou pelo Ministério Público,<br />

quan<strong>do</strong> lhe couber intervir. Em complemento, dispõe o art. 51, § 4º, <strong>do</strong> CDC que é faculta<strong>do</strong> a qualquer consumi<strong>do</strong>r ou a entida<strong>de</strong><br />

protetiva requerer ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para <strong>de</strong>clarar a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusula contratual que contrarie<br />

o disposto no CDC ou que, <strong>de</strong> qualquer forma, não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes. Resta claro,<br />

pela legitimida<strong>de</strong> reconhecida ao MP, que a matéria é <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, nos termos <strong>do</strong> sempre cita<strong>do</strong> art. 1º da Lei 8.078/1990.<br />

A encerrar o tópico, cumpre trazer à tona o polêmico tema relativo à revisão <strong>de</strong> ofício ou ex officio das cláusulas abusivas, o<br />

que constitui uma normal <strong>de</strong>corrência da nulida<strong>de</strong> absoluta. Como é notório, prescreve categoricamente o parágrafo único <strong>do</strong> art.<br />

168 <strong>do</strong> Código Civil que “As nulida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>vem ser pronunciadas pelo juiz, quan<strong>do</strong> conhecer <strong>do</strong> negócio jurídico ou <strong>do</strong>s seus efeitos<br />

e as encontrar provadas, não lhe sen<strong>do</strong> permiti<strong>do</strong> supri-las, ainda que a requerimento das partes”. O dispositivo transcrito confirma a<br />

premissa <strong>de</strong> que a nulida<strong>de</strong> absoluta é matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública também na esfera puramente civil.<br />

A polêmica a respeito da questão instaurou-se <strong>de</strong>finitivamente entre nós com a edição da infeliz Súmula 381 <strong>do</strong> Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça, publicada em 5 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 2009, com a seguinte redação: “Nos contratos bancários, é veda<strong>do</strong> ao julga<strong>do</strong>r<br />

conhecer, <strong>de</strong> ofício, da abusivida<strong>de</strong> das cláusulas”. Ora, tal ementa representa uma séria afronta à proteção <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s<br />

consumi<strong>do</strong>res e aos preceitos gerais <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser imediatamente cancelada por aquele Tribunal Superior.<br />

A necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cancelamento ou <strong>de</strong> sua revisão é aprofundada com a emergência <strong>do</strong> Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil, que, em<br />

vários <strong>de</strong> seus coman<strong>do</strong>s, traz a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que os juízes <strong>de</strong> primeira e segunda instâncias <strong>de</strong>vem seguir as <strong>de</strong>cisões superiores,<br />

especialmente aquelas constantes em súmulas. Entre vários dispositivos, <strong>de</strong>staque-se o art. 489, § 1.º, VI, <strong>do</strong> CPC/2015, segun<strong>do</strong> o<br />

qual não se consi<strong>de</strong>ra fundamentada qualquer <strong>de</strong>cisão judicial, sob pena <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong>, que <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> seguir enuncia<strong>do</strong> <strong>de</strong> súmula,<br />

jurisprudência ou prece<strong>de</strong>nte invoca<strong>do</strong> pela parte, sem <strong>de</strong>monstrar a existência <strong>de</strong> distinção no caso em julgamento ou a superação<br />

<strong>do</strong> entendimento.<br />

Pois bem, como primeiro argumento <strong>de</strong> crítica e pelo cancelamento, constata-se que a súmula representa um contrassenso<br />

jurídico, ten<strong>do</strong> em vista o art. 1º <strong>do</strong> CDC e a comum aplicação da Lei 8.078/1990 aos contratos bancários, conforme reconheci<strong>do</strong><br />

pela Súmula 297 <strong>do</strong> próprio STJ. Repise-se que o art. 1º <strong>do</strong> CDC é expresso ao prever que a lei consumerista é norma <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m<br />

pública e interesse social, nos termos da proteção que consta <strong>do</strong> Texto Maior. Como <strong>de</strong>corrência natural <strong>do</strong> preceito, <strong>de</strong>ve o juiz<br />

conhecer <strong>de</strong> ofício da proteção <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, pela previsão constitucional <strong>de</strong> sua tutela (art. 5º, inc. XXXV, da CF/1988).<br />

Releve-se, por oportuno, que o próprio STJ já havia se pronuncia<strong>do</strong>, em momento anterior, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que “Questões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m<br />

pública contempladas pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> sua natureza, po<strong>de</strong>m e <strong>de</strong>vem ser conhecidas,<br />

<strong>de</strong> ofício, pelo julga<strong>do</strong>r. Por serem <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, transcen<strong>de</strong>m o interesse e se sobrepõem até à vonta<strong>de</strong> das partes” (STJ –<br />

AgRg no REsp 703.558/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Castro Filho – j. 29.03.2005 – DJ 16.05.2005, p. 349). Percebe-se, em tal<br />

contexto, um retrocesso no entendimento anterior <strong>do</strong> próprio Tribunal Superior. A<strong>de</strong>mais, em outro julga<strong>do</strong> mais recente, o STJ<br />

a<strong>do</strong>tou entendimento contrário à sua própria Súmula 381:<br />

“Processual civil. Agravo regimental no recurso especial. Aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> revisão<br />

<strong>do</strong> contrato e <strong>de</strong>claração ex officio da nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusula nitidamente abusiva. Recurso a que se nega provimento. 1. O Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é norma <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, que autoriza a revisão contratual e a <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pleno direito <strong>de</strong><br />

cláusulas contratuais abusivas, o que po<strong>de</strong> ser feito até mesmo <strong>de</strong> ofício pelo Po<strong>de</strong>r Judiciário. Prece<strong>de</strong>nte (REsp 1.061.530/RS,<br />

afeta<strong>do</strong> à Segunda Seção). 2. Agravo regimental a que se nega provimento” (STJ – AgRg no REsp 334.991/RS – Quarta Turma –<br />

Rel. Min. Honil<strong>do</strong> Amaral <strong>de</strong> Mello Castro (Desembarga<strong>do</strong>r Convoca<strong>do</strong> <strong>do</strong> TJAP) – j. 10.11.2009 – DJe 23.11.2009).<br />

Como segun<strong>do</strong> aspecto, firme-se que o CC/2002, como norma geral privada, preconiza, no seu art. 168, parágrafo único, que as<br />

nulida<strong>de</strong>s absolutas <strong>de</strong>vem ser conhecidas <strong>de</strong> ofício pelo juiz. Trata-se <strong>de</strong> <strong>de</strong>corrência natural da antiga lição pela qual as matérias


<strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública <strong>de</strong>vem ser conhecidas ex officio pelo magistra<strong>do</strong>. Anote-se a costumeira aplicação <strong>de</strong> tal premissa em instâncias<br />

superiores, o que <strong>de</strong>monstra igualmente o conflito da comentada súmula em relação à posição daquela Corte (a título <strong>de</strong> exemplo,<br />

recente acórdão: STJ – REsp 730.129/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Paulo Furta<strong>do</strong> (Desembarga<strong>do</strong>r Convoca<strong>do</strong> <strong>do</strong> TJBA) – j.<br />

02.03.2010 – DJe 10.03.2010). Em um diálogo entre as fontes, a norma privada não só po<strong>de</strong> como <strong>de</strong>ve ser aplicada <strong>de</strong> forma<br />

subsidiária às relações <strong>de</strong> consumo (diálogo <strong>de</strong> complementarida<strong>de</strong>). Não se olvi<strong>de</strong>, por outra via <strong>de</strong> aplicação, que as cláusulas<br />

abusivas, <strong>de</strong>scritas no art. 51 <strong>do</strong> CDC, geram a nulida<strong>de</strong> absoluta da previsão contratual, mais uma vez com base na or<strong>de</strong>m pública.<br />

Como terceiro argumento, a principal tese jurídica que dá sustento à súmula não tem o condão <strong>de</strong> vencer a nulida<strong>de</strong> absoluta e<br />

as questões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública suscitadas. De um <strong>do</strong>s seus prece<strong>de</strong>ntes, retira-se que “A jurisprudência da Segunda Seção<br />

consoli<strong>do</strong>u-se no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que fere o princípio <strong>do</strong> tantum <strong>de</strong>volutum quantum appellatum a revisão, <strong>de</strong> ofício, pelo juiz, <strong>de</strong><br />

cláusulas contratuais que não foram objeto <strong>de</strong> recurso. (…)” (STJ – AgRg nos EREsp 801421/RS – Segunda Seção – Rel. Min. Ari<br />

Pargendler – j. 14.03.2007 – DJ 16.04.2007, p. 164). De acor<strong>do</strong> com o preceito cita<strong>do</strong> na ementa, em <strong>de</strong>corrência <strong>do</strong>s princípios<br />

dispositivo e da congruência, o reexame na instância superior pren<strong>de</strong>-se aos pontos objetos <strong>do</strong> recurso. Deve ficar bem claro que<br />

não se trata <strong>de</strong> um princípio absoluto, mas que encontra limitações em outros princípios e nas matérias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, como é o<br />

caso das nulida<strong>de</strong>s absolutas e da proteção <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. Pensar o contrário sobreporia o <strong>Direito</strong> Processual à<br />

tutela efetiva <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Material, quan<strong>do</strong> o inverso <strong>de</strong>ve prevalecer.<br />

Com quarto argumento pelo cancelamento da Súmula 381 <strong>do</strong> STJ, nota-se que tem a sua ementa o condão <strong>de</strong> engessar a<br />

atuação <strong>do</strong> magistra<strong>do</strong>, aprisionan<strong>do</strong>-o aos pedi<strong>do</strong>s formula<strong>do</strong>s pelas partes. Por isso, a súmula já foi criticada por alguns juízes,<br />

caso <strong>de</strong> Gerival<strong>do</strong> Neiva, Pablo Stolze Gagliano e Salomão Viana, em textos publica<strong>do</strong>s na internet.83 Como verda<strong>de</strong>iro absur<strong>do</strong>, a<br />

súmula veda ao juiz que conheça <strong>de</strong> abusivida<strong>de</strong> apenas nos contratos bancários. Simbolizan<strong>do</strong>, em tais contratos (e somente<br />

nesses), o magistra<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve se comportar como Pôncio Pilatos, lavan<strong>do</strong> as mãos e manten<strong>do</strong>-se distante <strong>do</strong> abuso ou <strong>do</strong> excesso<br />

cometi<strong>do</strong>. Em suma, somente atuará se houver pedi<strong>do</strong> em tal senti<strong>do</strong>. A súmula fere totalmente a lógica <strong>do</strong> razoável e a equida<strong>de</strong><br />

que se espera <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> como um to<strong>do</strong>. Há um quê <strong>de</strong> proteção ou <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s bancos em <strong>de</strong>trimento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, quan<strong>do</strong> o<br />

sistema consagra justamente o contrário, pela existência <strong>de</strong> lei específica e contun<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> tutela <strong>do</strong>s vulneráveis, o CDC.<br />

A encerrar, como quinto argumento, entra em cena a questão principiológica. Cláusulas abusivas, sejam em contratos bancários<br />

ou não, são consi<strong>de</strong>radas viola<strong>do</strong>ras <strong>do</strong>s princípios da função social <strong>do</strong>s contratos e da boa-fé objetiva. Ambos os princípios –<br />

função social <strong>do</strong> contrato e boa-fé objetiva – são preceitos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública pela civilística contemporânea. Quanto à função social<br />

<strong>do</strong> contrato, é claro o art. 2.035, parágrafo único, <strong>do</strong> CC/2002, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que nenhuma convenção prevalecerá se contrariar<br />

preceitos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, tais como aqueles que visam a assegurar a função social <strong>do</strong>s contratos e da proprieda<strong>de</strong>. A respeito da<br />

boa-fé objetiva, na IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil <strong>do</strong> Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral concluiu-se que “Os princípios da probida<strong>de</strong> e da<br />

confiança são <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, estan<strong>do</strong> a parte lesada somente obrigada a <strong>de</strong>monstrar a existência da violação” (Enuncia<strong>do</strong> n. 363<br />

<strong>do</strong> CJF/STJ).<br />

Em reforço <strong>de</strong> crítica, as palavras <strong>de</strong> Claudia Lima Marques, Herman Benjamin e Bruno Miragem, que sustentam a<br />

inconstitucionalida<strong>de</strong> da referida súmula, por <strong>de</strong>srespeito à proteção constante <strong>do</strong> art. 5º, inc. XXXII, da CF/1988, negan<strong>do</strong> vigência<br />

ao sistema <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong>s absolutas <strong>do</strong> Código Civil em diálogo com o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.84 Os juristas <strong>de</strong> escol<br />

esperam, portanto, que a Sessão Especial <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania e <strong>de</strong>fensor <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res cancele ou revise a súmula.<br />

A propósito, em texto mais recente, o último jurista reforça essa necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> revisão da sumular, questão que foi suscitada<br />

em 2015 no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça. Conforme expõe, “no ano passa<strong>do</strong>, o Ministro Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino afetou o<br />

julgamento <strong>do</strong> Recurso Especial Especial 1.465.832/RS, sugerin<strong>do</strong>, em face, especialmente <strong>do</strong> novo Código <strong>de</strong> Processo Civil a<br />

alteração <strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong> da Súmula 381, para o qual propôs a seguinte redação: ‘na <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusula abusiva,<br />

prevista no art. 51 <strong>do</strong> CDC, <strong>de</strong>verão ser respeita<strong>do</strong>s o contraditório e a ampla <strong>de</strong>fesa, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser reconhecida <strong>de</strong> ofício em<br />

segun<strong>do</strong> grau <strong>de</strong> jurisdição”. 85<br />

Cabe esclarecer que a menção ao Novo CPC diz respeito à vedação das <strong>de</strong>cisões-surpresa, retiradas <strong>do</strong> seu art. 10, uma das<br />

aplicações da boa-fé objetiva processual, in verbis: “O juiz não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir, em grau algum <strong>de</strong> jurisdição, com base em<br />

fundamento a respeito <strong>do</strong> qual não se tenha da<strong>do</strong> às partes oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se manifestar, ainda que se trate <strong>de</strong> matéria sobre a qual<br />

<strong>de</strong>va <strong>de</strong>cidir <strong>de</strong> ofício”. Assim, antes <strong>do</strong> conhecimento <strong>de</strong> ofício da nulida<strong>de</strong> da cláusula, por abusivida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ve o juiz ouvir as<br />

partes da <strong>de</strong>manda.<br />

A<strong>de</strong>mais, como se po<strong>de</strong> perceber, pelo novo texto, a vedação <strong>do</strong> conhecimento <strong>de</strong> ofício atingiria apenas a segunda instância.<br />

Pensamos que a redação sugerida para a sumular, em tal aspecto, não é o i<strong>de</strong>al, pois a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada em qualquer<br />

grau <strong>de</strong> jurisdição. Porém, perante o texto atual, trata-se <strong>de</strong> um passo importante para a proteção <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

Por fim, pela proposta, não há qualquer vinculação aos contratos bancários. O novo texto tem incidência para qualquer relação<br />

contratual, sem privilégios, o que parece salutar.<br />

Pois bem, voltan<strong>do</strong> ao recente texto <strong>de</strong> Bruno Miragem, <strong>de</strong>monstra o jurista as amplas críticas da <strong>do</strong>utrina, inclusive <strong>de</strong>ste


autor: “registram-se, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então, <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>s <strong>do</strong>utrinários <strong>de</strong>stacan<strong>do</strong>, em uníssono, o equívoco <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça na edição da súmula, <strong>de</strong> autoria, <strong>de</strong>ntre outros, <strong>de</strong> Claudia Lima Marques, Nelson Nery Junior, Fábio <strong>de</strong> Souza Trajano,<br />

<strong>Flávio</strong> Caetano <strong>de</strong> Paula, Rafael Calmon Rangel, Andressa Jarletti <strong>de</strong> Oliveira, Vitor Vilela Guglinski, Oscar Ivan Prux, Améllia<br />

Soares da Rocha, Gerson Amauri Calgaro, Pablo Stolze Gagliano e Salomão Viana, Fredie Didier Júnior, Antônio Carlos Efing,<br />

<strong>Flávio</strong> <strong>Tartuce</strong>, Alexandre Torres Petry, Gustavo Brum, Leonar<strong>do</strong> Mace<strong>do</strong> Poli Sérgio Augusto Pereira Lorentino, Gerival<strong>do</strong> Neiva<br />

e Hil<strong>de</strong>liza Lacerda Tinoco Boechat Cabral, Nayron Divino Tole<strong>do</strong> Malheiros, Ricar<strong>do</strong> Giuliani Neto e Ezequiel Morais”.86<br />

De fato, a Súmula 381 <strong>do</strong> STJ está muito longe <strong>de</strong> ser cidadã, por trazer clara i<strong>de</strong>ologia <strong>de</strong> cega proteção <strong>do</strong>s bancos. Como<br />

bem expõe Ezequiel Morais, com coragem, “é possível verificar que nos últimos anos (2008 e 2009) o consumi<strong>do</strong>r não mais tem<br />

encontra<strong>do</strong> no STJ a guarida <strong>de</strong> outrora”. 87 Em complemento, na linha das palavras <strong>de</strong> Bruno Miragem no último texto, vivemos<br />

uma oportunida<strong>de</strong> única para que os graves equívocos da citada sumular sejam afasta<strong>do</strong>s <strong>de</strong>finitivamente <strong>do</strong> or<strong>de</strong>namento jurídico<br />

brasileiro.<br />

Em suma, <strong>de</strong>duz-se juridicamente que, por contrariar a CF/1988, o CDC, o CC/2002 e seus princípios, bem como a lógica<br />

equânime <strong>do</strong> sistema, <strong>de</strong>ve a Súmula 381 <strong>do</strong> STJ ser imediatamente revista, a fim <strong>de</strong> não trazer ainda mais prejuízos aos<br />

consumi<strong>do</strong>res <strong>do</strong> que já vem causan<strong>do</strong>.<br />

5.8.<br />

OS CONTRATOS DE FORNECIMENTO DE CRÉDITO NA LEI 8.078/1990 (ART. 52) E<br />

O PROBLEMA DO SUPERENDIVIDAMENTO DO CONSUMIDOR. A NULIDADE<br />

ABSOLUTA DA CLÁUSULA DE DECAIMENTO (ART. 53)<br />

O art. 52 da Lei 8.078/1990, mais um coman<strong>do</strong> em sintonia como o <strong>de</strong>ver anexo <strong>de</strong> informar que <strong>de</strong>corre da boa-fé objetiva,<br />

estabelece os requisitos para os contratos <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong> crédito e financiamentos em geral, a saber:<br />

a)<br />

b)<br />

c)<br />

d)<br />

e)<br />

O preço <strong>do</strong> produto ou serviço em moeda corrente nacional, pelo valor nominal, o que está <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o princípio <strong>do</strong> nominalismo,<br />

retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 315 <strong>do</strong> Código Civil. Em complemento, em regra, são nulas as estipulações em moeda estrangeira, exceção que <strong>de</strong>ve<br />

ser feita para os contratos internacionais e para os contratos <strong>de</strong> arrendamento mercantil (leasing), em que há captação <strong>de</strong> recursos no<br />

exterior (art. 318 <strong>do</strong> CC e Decreto-lei 857/1969).<br />

O montante <strong>do</strong>s juros <strong>de</strong> mora, para as hipóteses <strong>de</strong> inadimplemento relativo, bem como da taxa efetiva anual <strong>de</strong> juros. Como se sabe,<br />

os juros são frutos civis ou rendimentos, constituin<strong>do</strong> valores <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s pela utilização <strong>de</strong> capital alheio.<br />

Os acréscimos legalmente previstos, caso da correção monetária e das penalida<strong>de</strong>s contratuais.<br />

O número e a periodicida<strong>de</strong> das prestações, o que é fundamental na caracterização <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> trato sucessivo, aqueles com<br />

cumprimento <strong>de</strong> forma periódica no tempo.<br />

A soma total a pagar, com e sem financiamento. Isso, para que o consumi<strong>do</strong>r tenha a exata medida <strong>do</strong> valor integral que está sen<strong>do</strong><br />

pago, preceito que muitas vezes é <strong>de</strong>srespeita<strong>do</strong> na prática.<br />

No que concerne aos juros estipula<strong>do</strong>s por força <strong>do</strong> contrato (juros convencionais), algumas palavras merecem ser ditas,<br />

especialmente no tocante ao seu limite, tema explosivo na realida<strong>de</strong> nacional. Na opinião <strong>de</strong>ste autor, é absolutamente lamentável o<br />

tratamento da<strong>do</strong> pela jurisprudência majoritária à questão, uma vez que é comum as instituições bancárias cobrarem juros<br />

excessivamente abusivos, tornan<strong>do</strong> caro o crédito em nosso País. Isso também ocorre com empresas financeiras, caso das que<br />

prestam o serviço <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito.<br />

Em suma, é lamentável o teor da Súmula 596 <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, segun<strong>do</strong> a qual as instituições bancárias, como<br />

integrantes <strong>do</strong> Sistema Financeiro Nacional, não estão sujeitas à Lei <strong>de</strong> Usura. Do mesmo mo<strong>do</strong>, não há como concordar com o teor<br />

da Súmula 283 <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, in verbis: “As empresas administra<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito são instituições<br />

financeiras e, por isso, os juros remuneratórios por elas cobra<strong>do</strong>s não sofrem as limitações da Lei <strong>de</strong> Usura”. Compreen<strong>de</strong>mos que a<br />

Lei <strong>de</strong> Usura está em total sintonia com a proteção <strong>do</strong>s vulneráveis (consumi<strong>do</strong>res e a<strong>de</strong>rentes contratuais), constante <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong>, pois, ser estabeleci<strong>do</strong> um limite para os juros convencionais.<br />

Como se sabe, a Lei <strong>de</strong> Usura estabelece em seu art. 1º que a taxa <strong>de</strong> juros não po<strong>de</strong> ser superior ao <strong>do</strong>bro da taxa legal. Ora, a<br />

taxa legal é aquela referenciada pelo art. 406 <strong>do</strong> CC/2002, ou seja, 1% ao mês ou 12% ao ano, o que é completa<strong>do</strong> pelo art. 161, §<br />

1º, <strong>do</strong> Código Tributário Nacional. Desse mo<strong>do</strong>, a máxima taxa a ser cobrada no País é <strong>de</strong> 2% ao mês ou 24% ao ano, o que<br />

constitui parâmetro perfeitamente razoável. Releve-se que, em relação ao mútuo oneroso ou feneratício, em que há empréstimo <strong>de</strong><br />

dinheiro a juros, enuncia o art. 591 <strong>do</strong> CC/2002 que a taxa <strong>de</strong> juros máxima a ser cobrada é prevista no art. 406, isto é, 12% ao ano.<br />

O que se tem entendi<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma reiterada no plano da jurisprudência superior é que os juros das instituições bancárias e<br />

financeiras po<strong>de</strong>m ser fixa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com as regras <strong>de</strong> merca<strong>do</strong> (Súmula 296 <strong>do</strong> STJ). Em paradigmática <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> ano <strong>de</strong><br />

2008, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça concluiu <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>finitiva:


“<strong>Direito</strong> processual civil e bancário. Recurso especial. Ação revisional <strong>de</strong> cláusulas <strong>de</strong> contrato bancário. Inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> processo<br />

repetitivo. Juros remuneratórios. Configuração da mora. Juros moratórios. Inscrição/manutenção em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes.<br />

Disposições <strong>de</strong> ofício. Delimitação <strong>do</strong> julgamento. I. Julgamento das questões idênticas que caracterizam a multiplicida<strong>de</strong>.<br />

Orientação 1 – Juros remuneratórios. a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação <strong>do</strong>s juros remuneratórios estipulada na<br />

Lei <strong>de</strong> Usura (Decreto 22.626/1933), Súmula 596/STF; b) A estipulação <strong>de</strong> juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só,<br />

não indica abusivida<strong>de</strong>; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> mútuo bancário as disposições <strong>do</strong> art. 591 c/c o<br />

art. 406 <strong>do</strong> CC/2002; d) É admitida a revisão das taxas <strong>de</strong> juros remuneratórios em situações excepcionais, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que caracterizada a<br />

relação <strong>de</strong> consumo e que a abusivida<strong>de</strong> (capaz <strong>de</strong> colocar o consumi<strong>do</strong>r em <strong>de</strong>svantagem exagerada – art. 51, § 1º, <strong>do</strong> CDC) fique<br />

cabalmente <strong>de</strong>monstrada, ante as peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> julgamento em concreto. (…) Os juros remuneratórios contrata<strong>do</strong>s encontram-se<br />

no limite que esta Corte tem consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> razoável e, sob a ótica <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, não merecem ser revistos, porquanto não<br />

<strong>de</strong>monstrada a onerosida<strong>de</strong> excessiva na hipótese. (…)” (STJ – REsp 1.061.530/RS – Segunda Seção – Rel. Min. Nancy Andrighi –<br />

j. 22.10.2008 – DJe 10.03.2009).<br />

Do mesmo mo<strong>do</strong>, mais recentemente, o STJ julgou que não sen<strong>do</strong> fixa<strong>do</strong>s os juros pelas partes em contrato bancário, inci<strong>de</strong>m<br />

as taxas <strong>de</strong> merca<strong>do</strong> e não o art. 406 <strong>do</strong> CC. Em suma, as regras merca<strong>do</strong>lógicas prevalecem sobre a lei, o que representa uma clara<br />

influência da escola <strong>do</strong> law and economics. O julga<strong>do</strong> foi assim publica<strong>do</strong> no Informativo n. 434 <strong>do</strong> STJ:<br />

“Repetitivo. Cheque especial. Juros remuneratórios. A Seção, ao julgar recurso representativo <strong>de</strong> controvérsia (art. 543-C e Res.<br />

8/2008-STJ) sobre a legalida<strong>de</strong> da cobrança <strong>de</strong> juros remuneratórios <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> contrato bancário, quan<strong>do</strong> não há prova da taxa<br />

pactuada ou quan<strong>do</strong> a cláusula ajustada entre as partes não tenha indica<strong>do</strong> o percentual a ser observa<strong>do</strong>, reafirmou a jurisprudência<br />

<strong>de</strong>ste Superior Tribunal <strong>de</strong> que, quan<strong>do</strong> não pactuada a taxa, o juiz <strong>de</strong>ve limitar os juros remuneratórios à taxa média <strong>de</strong> merca<strong>do</strong><br />

divulgada pelo Banco Central (Bacen), salvo se menor a taxa cobrada pelo próprio banco (mais vantajosa para o cliente). Anotou-se<br />

que o caso <strong>do</strong>s autos é uma ação <strong>de</strong> revisão <strong>de</strong> cláusula <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> cheque especial combinada com repetição <strong>de</strong> indébito em que<br />

o tribunal a quo constatou não haver, no contrato firma<strong>do</strong>, o percentual da taxa para a cobrança <strong>do</strong>s juros remuneratórios, apesar <strong>de</strong><br />

eles estarem previstos em uma das cláusulas <strong>do</strong> contrato. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: REsp 715.894-PR, DJ 19.03.2007; AgRg no REsp<br />

1.068.221-PR, DJe 24.11.2008; AgRg no REsp 1.003.938-RS, DJe 18.12.2008; AgRg no REsp 1.071.291-PR, DJe 23.03.2009;<br />

REsp 1.039.878-RS, DJe 20.06.2008; AgRg no REsp 1.050.605-RS, DJe 05.08.2008; AgRg no Ag 761.303-PR, DJe 04.08.2009;<br />

AgRg no REsp 1.015.238-PR, DJe 07.05.2008; EDcl no Ag 841.712-PR, DJe 28.08.2009, e AgRg no REsp 1.043.101-RS, DJe<br />

17.11.2008” (STJ – REsp 1.112.879-PR – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 12.05.2010).<br />

Infelizmente, a questão se estabilizou <strong>de</strong> tal forma no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que, em 2015, foi editada a sua Súmula n.<br />

530, segun<strong>do</strong> a qual “nos contratos bancários, na impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comprovar a taxa <strong>de</strong> juros efetivamente contratada – por<br />

ausência <strong>de</strong> pactuação ou pela falta <strong>de</strong> juntada <strong>do</strong> instrumento aos autos –, aplica-se a taxa média <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>, divulgada pelo<br />

Bacen, praticada nas operações da mesma espécie, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r”. Apesar <strong>de</strong> se<br />

mencionar a taxa mais vantajosa ao <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, a verda<strong>de</strong> é que têm prevaleci<strong>do</strong> as abusivas taxas <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>.<br />

Na linha da premissa antes esposada, já <strong>de</strong>fendida no ano <strong>de</strong> 2004, por ocasião <strong>de</strong> dissertação <strong>de</strong> mestra<strong>do</strong> na PUCSP, o<br />

presente autor não se filia ao entendimento transcrito nos julga<strong>do</strong>s.88 Em tom <strong>de</strong> crítica, fazemos nossas as palavras <strong>do</strong>s<br />

<strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res Pablo Stolze Gagliano e Ro<strong>do</strong>lfo Pamplona Filho:<br />

“Falar sobre a aplicação <strong>de</strong> juros na ativida<strong>de</strong> bancária é a<strong>de</strong>ntrar em um terreno explosivo.<br />

De fato, fizemos questão <strong>de</strong> mostrar como a disciplina genérica <strong>do</strong> instituto, bem como as peculiarida<strong>de</strong>s encontradas em uma<br />

relação jurídica especial, como a trabalhista, em que o próprio or<strong>de</strong>namento reconhece as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s sujeitos e busca tutelálos<br />

<strong>de</strong> forma mais efetiva, reconhecen<strong>do</strong> que, mesmo ali, ainda é observada, no final das contas, a regra geral.<br />

Isso tu<strong>do</strong> para mostrar que ‘há algo <strong>de</strong> erra<strong>do</strong> no reino da Dinamarca’ quan<strong>do</strong> se fala da disciplina <strong>do</strong>s juros bancários no Brasil.<br />

(…)<br />

Em nosso entendimento, sob o argumento <strong>de</strong> que a ativida<strong>de</strong> financeira é essencialmente instável, e que a imobilização da taxa <strong>de</strong><br />

juros prejudicaria o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>do</strong> País, inúmeros abusos são cometi<strong>do</strong>s, em <strong>de</strong>trimento sempre da parte mais fraca, o<br />

correntista, o <strong>de</strong>positante, o poupa<strong>do</strong>r.”89<br />

Em verda<strong>de</strong>, vive-se um total para<strong>do</strong>xo no Brasil, eis que os Tribunais Superiores concluíram pela incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r para os contratos bancários e financeiros (Súmula 297 <strong>do</strong> STJ e STF – ADI 2.591/DF – Tribunal Pleno –<br />

Rel. Min. Carlos Velloso – Rel. p/Acórdão Min. Eros Grau – j. 07.06.2006). Porém, não obstante o espírito da lei consumerista<br />

vedar a lesão, o abuso <strong>de</strong> direito e o enriquecimento sem causa, as instituições bancárias e financeiras po<strong>de</strong>m cobrar as excessivas<br />

taxas <strong>de</strong> juros <strong>de</strong> merca<strong>do</strong> que, aliás, elas mesmas fixam. Em suma, aplica-se o CDC <strong>de</strong> forma fatiada, muito distante <strong>de</strong> seu real<br />

potencial <strong>de</strong> mudança. Espera-se que essa infeliz realida<strong>de</strong> seja alterada nos próximos anos, quan<strong>do</strong> novas gerações <strong>de</strong> julga<strong>do</strong>res<br />

assumirem o papel direciona<strong>do</strong>r da jurisprudência no Brasil.<br />

Como bem <strong>de</strong>stacou a Ministra Nancy Andrighi em voto prolata<strong>do</strong> no ano <strong>de</strong> 2012, “Em matéria <strong>de</strong> contratos bancários, os<br />

juros remuneratórios são essenciais e prepon<strong>de</strong>rantes na <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> contratar. São justamente essas taxas <strong>de</strong> juros que viabilizam a


saudável concorrência e que levam o consumi<strong>do</strong>r a optar por uma ou outra instituição financeira. Entretanto, apesar <strong>de</strong> sua<br />

irrefutável importância, nota-se que a maioria da população brasileira ainda não compreen<strong>de</strong> o cálculo <strong>do</strong>s juros bancários. Vê-se<br />

que não há qualquer esclarecimento prévio, tampouco se concretizou o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> educação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, previsto no art. 4º, IV, <strong>do</strong><br />

CDC. Nesse contexto, a capitalização <strong>de</strong> juros está longe <strong>de</strong> ser um instituto conheci<strong>do</strong>, compreendi<strong>do</strong> e facilmente i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong><br />

pelo consumi<strong>do</strong>r médio comum. A realida<strong>de</strong> cotidiana é a <strong>de</strong> que os contratos bancários, muito embora estejam cada vez mais<br />

difundi<strong>do</strong>s na nossa socieda<strong>de</strong>, ainda são incompreensíveis à maioria <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, que são leva<strong>do</strong>s a contratar e aos poucos<br />

vão apren<strong>de</strong>n<strong>do</strong> empiricamente com suas próprias experiências. A partir <strong>de</strong>ssas premissas, obtém-se o padrão <strong>de</strong> comportamento a<br />

ser espera<strong>do</strong> <strong>do</strong> homem médio, que aceita a contratação <strong>do</strong> financiamento a partir <strong>do</strong> confronto entre taxas nominais ofertadas no<br />

merca<strong>do</strong>. Deve-se ainda ter em consi<strong>de</strong>ração, como medida da atitu<strong>de</strong> objetivamente esperada <strong>de</strong> cada contratante, o padrão <strong>de</strong><br />

conhecimento e comportamento <strong>do</strong> homem médio da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> massa brasileira. Isso porque vivemos numa socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

profundas disparida<strong>de</strong>s sociais, com relativamente baixo grau <strong>de</strong> instrução” (STJ – REsp 1.302.738/SC – Rel. Min. Nancy Andrighi<br />

– Terceira Turma – j. 03.05.2012 – DJe 10.05.2012 – publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 496). Espera-se que outras <strong>de</strong>cisões sigam a<br />

linha esposada no voto.<br />

Em verda<strong>de</strong>, percebeu-se a partir <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2012 que medidas <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Executivo acabaram por reduzir as taxas <strong>de</strong> juros<br />

bancários em nosso País. Entretanto, diante da mais recente e grave crise financeira que atingiu o País a partir <strong>de</strong> 2014, os juros<br />

voltaram a subir no País. E <strong>de</strong> forma explosiva.<br />

Esperava-se que tal tarefa fosse <strong>de</strong>sempenhada, antes <strong>do</strong> Executivo, pelo Po<strong>de</strong>r Judiciário, o que não acabou ocorren<strong>do</strong> nos<br />

últimos anos, o que po<strong>de</strong> ser percebi<strong>do</strong> pelos julga<strong>do</strong>s anteriormente transcritos. Infelizmente, as premissas constantes <strong>do</strong> voto da<br />

Ministra Nancy Andrighi acabaram não prevalecen<strong>do</strong> em nossas Cortes Superiores, que não cumpriram com sua função jurídica e<br />

social. Todavia, ainda é tempo para a mudança no âmbito <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário.<br />

Supera<strong>do</strong> esse ponto a respeito <strong>do</strong>s juros, em relação à cláusula penal ou multa moratória, importante <strong>de</strong>corrência <strong>do</strong><br />

inadimplemento, o art. 52, § 1º, <strong>do</strong> CDC enuncia que o seu montante não po<strong>de</strong> ser superior a 2% (<strong>do</strong>is por cento) sobre o valor da<br />

dívida. Não se po<strong>de</strong> esquecer que tal multa somente inci<strong>de</strong> se estiver prevista pelas partes.<br />

Conforme se retira <strong>de</strong> ementa publicada pelo STJ em 2015 pela ferramenta Jurisprudência em Teses (Edição n. 39), “a redução<br />

da multa moratória para 2% prevista no art. 52, § 1º, <strong>do</strong> CDC aplica-se às relações <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong> natureza contratual, não<br />

incidin<strong>do</strong> sobre as sanções tributárias, que estão sujeitas à legislação própria <strong>de</strong> direito público”. De acor<strong>do</strong> com um <strong>do</strong>s arestos que<br />

gerou a ementa, que trata <strong>de</strong> ICMS, “na seara tributária, não é possível reduzir a multa ao percentual <strong>de</strong> 2% (<strong>do</strong>is por cento),<br />

porquanto estabelecidas em legislação pertinente às relações <strong>de</strong> consumo – Lei 9.298/96. Prece<strong>de</strong>ntes” (STJ – REsp 1.164.662/SP –<br />

Segunda Turma – Rel. Min. Castro Meira – j. 24.08.2010 – DJe 08.09.2010).<br />

De toda sorte, não resta a menor dúvida <strong>de</strong> que a norma relativa à cláusula penal é <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, sen<strong>do</strong> nula por<br />

abusivida<strong>de</strong> a cláusula contratual que estabeleça limite maior para a multa moratória, nos termos <strong>do</strong> art. 51, incs. IV e XV, <strong>do</strong> CDC<br />

(por todas as centenas <strong>de</strong> julga<strong>do</strong>s encontra<strong>do</strong>s: TJSP – Apelação 9171524-39.2005.8.26.0000 – Acórdão 4995270, São Caetano <strong>do</strong><br />

Sul – Vigésima Sétima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Berenice Marcon<strong>de</strong>s César – j. 22.02.2011 – DJESP 22.03.2011;<br />

TJMG – Apelação Cível 1661480-65.2004.8.13.0702, Uberlândia – Décima Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Guilherme Luciano<br />

Baeta Nunes – j. 16.11.2010 – DJEMG 02.12.2010; TJPR – Apelação Cível 0491340-8, Curitiba – Sexta Câmara Cível – Rel. Des.<br />

Antônio Renato Strapasson – DJPR 20.03.2009, p. 259; TJRS – Apelação Cível 70015891914, Caxias <strong>do</strong> Sul – Décima Quarta<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Judith <strong>do</strong>s Santos Mottecy – j. 14.09.2006 – DOERS 01.10.2008, p. 82; TJDF – Apelação Cível<br />

2000.09.1.004710-8 – Acórdão 274732 – Quarta Turma Cível – Rel. Des. Lecir Manoel da Luz – DJU 21.06.2007, p. 106; e TJSC<br />

– Apelação Cível 1998.002252-5, Rio <strong>do</strong> Sul – Segunda Câmara Comercial – Rel. Des. Maria <strong>do</strong> Rocio Luz Santa Ritta – j.<br />

09.10.2003). Em caso <strong>de</strong> excesso, na esteira da melhor conclusão jurispru<strong>de</strong>ncial colacionada, <strong>de</strong>ve ocorrer a redução <strong>do</strong> negócio<br />

jurídico até o patamar consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> como váli<strong>do</strong> pela legislação consumerista.<br />

Nesse contexto, <strong>de</strong>ve ser vista com gran<strong>de</strong>s ressalvas a chamada cláusula <strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong>, que muitas vezes disfarça, em<br />

contratos <strong>de</strong> consumo, multas exageradas, acima <strong>do</strong> montante permiti<strong>do</strong> pela lei, o que <strong>de</strong>ve ser afasta<strong>do</strong> <strong>de</strong> plano. Sobre o tema,<br />

vejamos as precisas palavras <strong>de</strong> José Fernan<strong>do</strong> Simão, com citação <strong>de</strong> jurisprudência:<br />

“Um <strong>do</strong>s <strong>de</strong>bates mais intensos da <strong>do</strong>utrina e da jurisprudência diz respeito ao chama<strong>do</strong> abono <strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong>. Explica Christiano<br />

Cassettari que muitos con<strong>do</strong>mínios tentaram buscar uma alternativa para resolver o problema <strong>do</strong> aumento da inadimplência, que a<br />

redução <strong>do</strong> percentual da cláusula penal lhe causou. Uma saída muito utilizada por vários con<strong>do</strong>mínios foi a cláusula <strong>de</strong> bonificação<br />

ou abono <strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong>, que é uma sanção premial. O abono <strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong> é um <strong>de</strong>sconto, geralmente <strong>de</strong> 10% (<strong>de</strong>z por cento),<br />

para o condômino que pagar a taxa até o dia <strong>do</strong> vencimento. Esse instituto foi cria<strong>do</strong> com intuito <strong>de</strong> estimular os condôminos a<br />

pagarem em dia as <strong>de</strong>spesas mensais <strong>do</strong> con<strong>do</strong>mínio (Multa Contratual – Teoria e prática da cláusula penal. 1ª ed. 2009, Editora RT).<br />

A questão não se limita aos Con<strong>do</strong>mínios, pois vários presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços a incluem em seus contratos. Universida<strong>de</strong>s<br />

particulares, por exemplo, escalonam as datas <strong>de</strong> pagamentos e conce<strong>de</strong>m ‘<strong>de</strong>scontos’ para pagamentos antecipa<strong>do</strong>s. Qual a natureza<br />

<strong>de</strong>sses chama<strong>do</strong>s ‘<strong>de</strong>scontos’? Silvio <strong>de</strong> Salvo Venosa chama o abono pontualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ‘cláusula penal às avessas’. Concordamos


com Venosa e com Cassettari neste tocante. O referi<strong>do</strong> abono cumula<strong>do</strong> com cláusula penal é ilegal, pois reflete, na verda<strong>de</strong>, dupla<br />

multa e subverte a real data <strong>de</strong> pagamento da prestação. Um exemplo esclarece a questão.<br />

O contrato prevê que se a mensalida<strong>de</strong> escolar no importe <strong>de</strong> R$ 100,00 for paga até o dia 5 <strong>do</strong> mês, há um <strong>de</strong>sconto <strong>de</strong> 20%, se paga<br />

até o dia 10, o <strong>de</strong>sconto é <strong>de</strong> 10% e se paga na data <strong>do</strong> vencimento, dia 15, não há <strong>de</strong>sconto. Entretanto, se houver atraso a multa<br />

moratória é <strong>de</strong> 10%. Na realida<strong>de</strong>, o valor da prestação é <strong>de</strong> R$ 80,00, pois se <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>scontar o abono <strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> 20%, que é<br />

cláusula penal disfarçada. Então, temos no contrato duas cláusulas penais cumuladas: a primeira que transforma o valor da prestação<br />

<strong>de</strong> R$ 80,00 em R$ 100,00 e a segunda, aplicada após o vencimento, que transforma o valor <strong>de</strong> R$ 100,00 em R$ 110,00. E assim<br />

<strong>de</strong>cidiu o TJSP, no mês <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 2009: ‘Prestação <strong>de</strong> serviços educacionais. Cobrança. Desconto ou abatimento por<br />

pontualida<strong>de</strong>. Cláusula penal. Apuração <strong>do</strong>s valores <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s a título <strong>de</strong> mensalida<strong>de</strong>s não pagas, <strong>de</strong>verá ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> o valor<br />

líqui<strong>do</strong> da prestação, <strong>de</strong>sconta<strong>do</strong> o abatimento por pontualida<strong>de</strong>. Multa contratual. Redução para 2%. incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Recurso improvi<strong>do</strong>’ (Apelação sem revisão n. 987905004 – Trigésima Primeira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel.<br />

Des. Francisco Casconi – j. 11.08.2009).<br />

Essa interpretação <strong>do</strong> tema <strong>de</strong>corre <strong>do</strong> princípio que veda o enriquecimento sem causa, pois a existência <strong>de</strong> duas multas (uma<br />

<strong>de</strong>clarada e outra disfarçada) faz com que os prejuízos sejam presumi<strong>do</strong>s (<strong>de</strong> maneira absoluta) <strong>de</strong> forma <strong>do</strong>brada. A<strong>de</strong>mais, ofen<strong>de</strong> a<br />

função social <strong>do</strong> contrato em sua eficácia interna, pois gera uma obrigação por <strong>de</strong>mais pesada ao <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r”.90<br />

Como não po<strong>de</strong>ria ser diferente, o entendimento esposa<strong>do</strong> conta com o total apoio <strong>do</strong> presente autor, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> a cláusula <strong>de</strong><br />

pontualida<strong>de</strong> ser reprimida pelos órgãos e entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, bem como pelo Po<strong>de</strong>r Judiciário<br />

Nessa esteira, o presente autor não se filia a acórdão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2016, que consi<strong>de</strong>rou válida e eficaz<br />

a cláusula <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconto ou <strong>de</strong> abono por pontualida<strong>de</strong> inserida em contratos <strong>de</strong> serviços educacionais. Reitere-se que enten<strong>de</strong>mos ser<br />

tal <strong>de</strong>sconto nada mais <strong>do</strong> que uma multa disfarçada, superior aos limites legais. Vejamos a sua ementa:<br />

“Recurso especial. Ação civil pública <strong>de</strong>stinada ao reconhecimento <strong>de</strong> abusivida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prática comercial conhecida como ‘<strong>de</strong>sconto<br />

<strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong>’ inserida em contrato <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> serviços educacionais. Improcedência. Inexistência <strong>de</strong> multa camuflada.<br />

Legitimida<strong>de</strong> da contratação. Reconhecimento. Recurso especial provi<strong>do</strong>. 1. A par das medidas diretas que atuam imediatamente no<br />

comportamento <strong>do</strong> indivíduo (proibin<strong>do</strong> este, materialmente, <strong>de</strong> violar a norma ou compelin<strong>do</strong>-o a agir segun<strong>do</strong> a norma), ganham<br />

relevância as medidas indiretas que influenciam psicologicamente o indivíduo a atuar segun<strong>do</strong> a norma. Assim, o sistema jurídico<br />

promocional, para o propósito <strong>de</strong> impedir um comportamento social in<strong>de</strong>seja<strong>do</strong>, não se limita a tornar essa conduta mais difícil ou<br />

<strong>de</strong>svantajosa, impon<strong>do</strong> obstáculos e punições para o <strong>de</strong>scumprimento da norma (técnica <strong>do</strong> <strong>de</strong>sencorajamento, por meio <strong>de</strong> sanções<br />

negativas). O or<strong>de</strong>namento jurídico promocional vai além, vai ao encontro <strong>do</strong> comportamento social <strong>de</strong>seja<strong>do</strong>, estimulan<strong>do</strong> a<br />

observância da norma, seja por meio da facilitação <strong>de</strong> seu cumprimento, seja por meio da concessão <strong>de</strong> benefícios, vantagens e<br />

prêmios <strong>de</strong>correntes da efetivação da conduta socialmente a<strong>de</strong>quada prevista na norma (técnica <strong>do</strong> encorajamento, por meio <strong>de</strong><br />

sanções positivas). 1.1 As normas que disciplinam o contrato (seja o Código Civil, seja o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r)<br />

comportam, além das sanções legais <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> <strong>de</strong>scumprimento das obrigações ajustadas contratualmente (<strong>de</strong> caráter coercitivo<br />

e punitivo), as <strong>de</strong>nominadas sanções positivas, que, ao contrário, têm por propósito <strong>de</strong>finir consequências vantajosas em <strong>de</strong>corrência<br />

<strong>do</strong> correto cumprimento das obrigações contratuais. 2. Os serviços educacionais são contrata<strong>do</strong>s mediante o pagamento <strong>de</strong> um preço<br />

<strong>de</strong> anualida<strong>de</strong> certo, <strong>de</strong>fini<strong>do</strong> e aceito pelas partes (diluí<strong>do</strong> nos valores nominais constantes das mensalida<strong>de</strong>s e matrícula). Inexiste,<br />

no bojo da presente ação civil pública, qualquer discussão quanto à existência <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> informação ou <strong>de</strong> vício <strong>de</strong> consentimento,<br />

especificamente em relação ao preço estipula<strong>do</strong> da anuida<strong>de</strong> escolar à época da celebração <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> serviços<br />

educacionais. Em momento algum se cogita que o aluno/consumi<strong>do</strong>r teria si<strong>do</strong> leva<strong>do</strong>, erroneamente, a supor que o preço <strong>de</strong> sua<br />

mensalida<strong>de</strong> seria aquele já <strong>de</strong>duzi<strong>do</strong> <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> <strong>de</strong>sconto. Aliás, insinuações nesse senti<strong>do</strong> ce<strong>de</strong>riam à realida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s termos<br />

contrata<strong>do</strong>s, em especial, repisa-se, no tocante ao preço da anuida<strong>de</strong> efetivamente ajusta<strong>do</strong>. 2.2 Se o somatório <strong>do</strong>s valores nominais<br />

constantes das mensalida<strong>de</strong>s (incluí<strong>do</strong>s, aí, os valores <strong>de</strong> matrícula) equivale ao preço da anuida<strong>de</strong> contratada, ressai inquestionável<br />

que a concessão <strong>do</strong> <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> ‘<strong>de</strong>sconto por pontualida<strong>de</strong>’ consubstancia idônea medida <strong>de</strong> estímulo à consecução <strong>do</strong><br />

cumprimento <strong>do</strong> contrato, a premiar, legitimamente, o consumi<strong>do</strong>r que efetuar o pagamento <strong>de</strong> sua mensalida<strong>de</strong> na data avençada.<br />

2.3 A disposição contratual sob comento estimula o cumprimento da obrigação avençada, o que converge com os interesses <strong>de</strong> ambas<br />

as partes contratantes. De um la<strong>do</strong>, representa uma vantagem econômica ao consumi<strong>do</strong>r que efetiva o pagamento tempestivamente<br />

(colocan<strong>do</strong>-o em situação <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque em relação ao consumi<strong>do</strong>r que, ao contrario, proce<strong>de</strong> ao pagamento com atraso, promoven<strong>do</strong>,<br />

entre eles, isonomia material, e não apenas formal), e, em relação à instituição <strong>de</strong> ensino, não raras vezes, propicia até um<br />

adiantamento <strong>do</strong> valor a ser pago. 2.4 A proibição da estipulação <strong>de</strong> sanções premiais, como a tratada nos presentes autos, faria com<br />

que o redimensionamento <strong>do</strong>s custos <strong>do</strong> serviço pelo fornece<strong>do</strong>r (a quem cabe, exclusivamente, <strong>de</strong>finir o valor <strong>de</strong> seus serviços) fosse<br />

repassa<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r, indistintamente, tenha ele o mérito <strong>de</strong> ser adimplente ou não. Além <strong>de</strong> o <strong>de</strong>sconto <strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong><br />

significar indiscutível benefício ao consumi<strong>do</strong>r adimplente – que pagará por um valor efetivamente menor <strong>do</strong> preço da anualida<strong>de</strong><br />

ajusta<strong>do</strong> –, conferin<strong>do</strong>-lhe isonomia material, tal estipulação corrobora com a transparência sobre a que título os valores contrata<strong>do</strong>s<br />

são pagos, indiscutivelmente. 3. O <strong>de</strong>sconto <strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong> é caracteriza<strong>do</strong> justamente pela cobrança <strong>de</strong> um valor inferior ao<br />

efetivamente contrata<strong>do</strong> (que é o preço da anuida<strong>de</strong> diluí<strong>do</strong> nos valores das mensalida<strong>de</strong>s e matrícula). Não se po<strong>de</strong> confundir o<br />

preço efetivamente ajusta<strong>do</strong> pelas partes com aquele a que se chega pelo abatimento proporciona<strong>do</strong> pelo <strong>de</strong>sconto. O consumi<strong>do</strong>r que<br />

não efetiva a sua obrigação, no caso, até a data <strong>do</strong> vencimento, não faz jus ao <strong>de</strong>sconto. Não há qualquer incidência <strong>de</strong> dupla<br />

penalização ao consumi<strong>do</strong>r no fato <strong>de</strong> a multa moratória incidir sobre o valor efetivamente contrata<strong>do</strong>. Entendimento contrário, sim,<br />

ensejaria duplo benefício ao consumi<strong>do</strong>r, que, além <strong>de</strong> obter o <strong>de</strong>sconto para efetivar a sua obrigação nos exatos termos contrata<strong>do</strong>s,<br />

em caso <strong>de</strong> <strong>de</strong>scumprimento, teria, ainda a seu favor, a incidência da multa moratória sobre valor inferior ao que efetivamente


contratou. Sob esse prisma, o <strong>de</strong>sconto não po<strong>de</strong> servir para punir aquele que o conce<strong>de</strong>. 3.1 São distintas as hipóteses <strong>de</strong> incidência<br />

da multa, que tem por propósito punir o inadimplemento, e a <strong>do</strong> <strong>de</strong>sconto <strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong>, que, ao contrário, tem por finalida<strong>de</strong><br />

premiar o adimplemento, o que, por si só, afasta qualquer possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> bis in i<strong>de</strong>m, seja em relação à vantagem, seja em relação à<br />

punição daí advinda. 3.2 Entendimento que se aplica ainda que o <strong>de</strong>sconto seja da<strong>do</strong> até a data <strong>do</strong> vencimento. Primeiro, não se po<strong>de</strong><br />

olvidar que a estipulação contratual que conce<strong>de</strong> o <strong>de</strong>sconto por pontualida<strong>de</strong> até a data <strong>de</strong> vencimento é indiscutivelmente mais<br />

favorável ao consumi<strong>do</strong>r <strong>do</strong> que aquela que estipula a concessão <strong>do</strong> <strong>de</strong>sconto até a data imediatamente anterior ao vencimento. No<br />

tocante à materialização <strong>do</strong> preço ajusta<strong>do</strong>, tem-se inexistir qualquer óbice ao seu reconhecimento, pois o pagamento efetua<strong>do</strong> até a<br />

data <strong>do</strong> vencimento toma por base justamente o valor contrata<strong>do</strong>, sobre o qual incidirá o <strong>de</strong>sconto; já o pagamento feito após o<br />

vencimento, <strong>de</strong> igual mo<strong>do</strong>, toma também por base o valor contrata<strong>do</strong>, sobre o qual incidirá a multa contratual. Tem-se, nesse<br />

contexto, não ser possível maior materialização <strong>do</strong> preço ajusta<strong>do</strong> <strong>do</strong> que se dá em tal hipótese. 4. Recurso especial provi<strong>do</strong>” (STJ –<br />

REsp 1.424.814/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – j. 04.10.2016 – DJe 10.10.2016).<br />

Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, por representar clara lesão aos direitos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, esperamos que tal conclusão não se repita no<br />

Tribunal da Cidadania, surgin<strong>do</strong> posições em senti<strong>do</strong> contrário, na linha das palavras <strong>do</strong> Professor José Fernan<strong>do</strong> Simão, antes<br />

transcritas.<br />

Outra questão <strong>de</strong> <strong>de</strong>bate se refere ao limite da multa compensatória para os contratos <strong>de</strong> consumo, aquela relacionada ao<br />

inadimplemento absoluto <strong>do</strong> negócio. A problemática surge, pois o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r estabelece apenas o teto para<br />

a multa moratória, ou seja, para os casos <strong>de</strong> inadimplemento relativo ou mora. A partir da teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes, o presente<br />

autor enten<strong>de</strong> pela aplicação <strong>do</strong> art. 412 <strong>do</strong> CC/2002, sen<strong>do</strong> o limite da cláusula penal compensatória consumerista o valor da<br />

obrigação principal, o que confirma o caráter acessório da multa. Concluin<strong>do</strong> <strong>de</strong>ssa forma, <strong>do</strong> Tribunal <strong>do</strong> Paraná:<br />

“Civil, processual civil e direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Princípio da dialeticida<strong>de</strong>. Ausência <strong>de</strong> violação. Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Multa rescisória.<br />

Estipulação lícita. Abusivida<strong>de</strong>. Não ocorrência. Natureza compensatória. Apelo conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>. Recurso a<strong>de</strong>sivo prejudica<strong>do</strong>.<br />

As razões <strong>do</strong> apelo contêm suficiente impugnação ao teor da sentença, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que não houve violação ao princípio da dialeticida<strong>de</strong>.<br />

É lícita a estipulação <strong>de</strong> penalida<strong>de</strong> para o caso <strong>de</strong> <strong>de</strong>sistência imotivada <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> antes <strong>de</strong> seu termo. Essa multa<br />

tem natureza compensatória e, portanto, não se confun<strong>de</strong> com aquela <strong>do</strong> art. 52, § 1º <strong>do</strong> CDC, <strong>de</strong> ín<strong>do</strong>le moratória. O percentual<br />

previsto no ajuste não é abusivo, haja vista que bem inferior ao máximo legalmente permiti<strong>do</strong> (art. 412 <strong>do</strong> Código Civil)” (TJPR –<br />

Apelação Cível 0503513-4, Londrina – Décima Câmara Cível – Rel. Des. Ronald Schulman – DJPR 01.06.2009, p. 176).<br />

De toda sorte, se qualquer multa for exagerada em uma relação <strong>de</strong> consumo, seja ela moratória ou compensatória, é possível<br />

fazer incidir, pelo caminho dialogal, o art. 413 <strong>do</strong> CC/2002, in verbis: “A penalida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve ser reduzida equitativamente pelo juiz se<br />

a obrigação principal tiver si<strong>do</strong> cumprida em parte, ou se o montante da penalida<strong>de</strong> for manifestamente excessivo, ten<strong>do</strong>-se em vista<br />

a natureza e a finalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> negócio”. Trata-se <strong>de</strong> mais um dispositivo civil em relação direta com a eficácia interna da função<br />

social <strong>do</strong> contrato, por afastar a situação <strong>de</strong> injustiça que <strong>de</strong>corre da onerosida<strong>de</strong> excessiva.<br />

Deve-se concluir que se trata <strong>de</strong> norma <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, caben<strong>do</strong> a <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> redução ex officio pelo magistra<strong>do</strong>,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> arguição pela parte (Enuncia<strong>do</strong> n. 356 <strong>do</strong> CJF/STJ). Além disso, não cabe a sua exclusão por força <strong>de</strong> pacto<br />

ou contrato, uma vez que a autonomia privada encontra limitações nas normas cogentes <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública. Assim, vale a dicção <strong>do</strong><br />

Enuncia<strong>do</strong> n. 355 <strong>do</strong> CJF/STJ: “Não po<strong>de</strong>m as partes renunciar à possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> redução da cláusula penal se ocorrer qualquer das<br />

hipóteses previstas no art. 413 <strong>do</strong> Código Civil, por se tratar <strong>de</strong> preceito <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública”.91<br />

Deve ficar claro, ainda sobre o art. 413 <strong>do</strong> CC, o teor <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 359 <strong>do</strong> CJF/STJ, in verbis: “A redação <strong>do</strong> art. 413 <strong>do</strong><br />

Código Civil <strong>de</strong> 2002 não impõe que a redução da penalida<strong>de</strong> seja proporcionalmente idêntica ao percentual adimpli<strong>do</strong>”. Segun<strong>do</strong> o<br />

seu proponente, Jorge Cesa Ferreira da Silva:<br />

“A pena <strong>de</strong>ve ser reduzida equitativamente. Muito embora a ‘proporcionalida<strong>de</strong>’ faça parte <strong>do</strong> juízo <strong>de</strong> equida<strong>de</strong>, ela não foi referida<br />

no texto e tal circunstância não é isenta <strong>de</strong> conteú<strong>do</strong> normativo. Ocorre que o juízo <strong>de</strong> equida<strong>de</strong> é mais amplo <strong>do</strong> que o juízo <strong>de</strong><br />

proporcionalida<strong>de</strong>, entendida esta como ‘proporcionalida<strong>de</strong> direta’ ou ‘matemática’. Assim, por exemplo, se ocorreu adimplemento<br />

<strong>de</strong> meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>, isso não quer dizer que a pena prevista <strong>de</strong>ve ser reduzida em 50%. Serão as circunstâncias <strong>do</strong> caso que<br />

<strong>de</strong>terminarão. Entrarão em questão os interesses <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r, não só patrimoniais, na prestação, o grau <strong>de</strong> culpa <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, a situação<br />

econômica <strong>de</strong>ste, a importância <strong>do</strong> montante presta<strong>do</strong>, entre outros elementos <strong>de</strong> cunho valorativo.” 92<br />

O presente autor está filia<strong>do</strong> ao teor <strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrinário, pois o que fundamenta o art. 413 <strong>do</strong> CC é a razoabilida<strong>de</strong> e não a<br />

estrita proporcionalida<strong>de</strong> matemática. Tais premissas, repise-se, po<strong>de</strong>m ser inci<strong>de</strong>ntes a um contrato <strong>de</strong> consumo, por diálogo das<br />

fontes, notadamente no caso <strong>de</strong> uma multa compensatória sujeita ao limite <strong>do</strong> art. 412 da mesma codificação. Em relação à multa<br />

moratória, somente se duvida da aplicação prática da redução equitativa, uma vez que o montante previsto pela lei é <strong>de</strong> pequena<br />

monta (2%).<br />

Superada mais essa matéria, em to<strong>do</strong>s os casos <strong>de</strong> financiamentos ou cessão <strong>de</strong> crédito, o consumi<strong>do</strong>r tem o direito <strong>de</strong> liquidar<br />

antecipadamente o contrato <strong>de</strong> forma total ou parcial, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser reduzi<strong>do</strong>s os juros e os acréscimos proporcionalmente (art. 52, §


2º, <strong>do</strong> CDC). A redução por razoabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s juros e <strong>do</strong>s acréscimos afasta o enriquecimento sem causa por parte daquele que<br />

conce<strong>de</strong> o crédito.<br />

Além disso, como observam Claudia Lima Marques, Herman Benjamin e Bruno Miragem, a norma visa a afastar o<br />

superendividamento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, fenômeno muito comum na realida<strong>de</strong> brasileira, em especial pelas facilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong><br />

crédito, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que com altas taxas <strong>de</strong> juros. Como bem explicam, “O superendividamento po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>fini<strong>do</strong> como impossibilida<strong>de</strong><br />

global <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r-pessoa física, consumi<strong>do</strong>r, leigo e <strong>de</strong> boa-fé, <strong>de</strong> pagar todas as suas dívidas atuais e futuras <strong>de</strong> consumo<br />

(excluídas as dívidas com o Fisco, oriundas <strong>de</strong> <strong>de</strong>litos e alimentos) em um tempo razoável com sua capacida<strong>de</strong> atual <strong>de</strong> rendas e<br />

patrimônio”.93 Em complemento, ensina Heloísa Carpena que o superendivida<strong>do</strong> é a “pessoa física que contrata a concessão <strong>de</strong> um<br />

crédito, <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> à aquisição <strong>de</strong> produtos ou serviços que, por sua vez, visam aten<strong>de</strong>r a uma necessida<strong>de</strong> pessoal, nunca<br />

profissional <strong>do</strong> adquirente. A mais importante característica refere-se à condição pessoal <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, que <strong>de</strong>ve agir <strong>de</strong> boa-fé”. 94<br />

Na opinião <strong>de</strong>ste autor, o afastamento <strong>de</strong>ssa infeliz situação se dá pela necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> redução das taxas <strong>de</strong> juros convencionais no<br />

Brasil, na linha <strong>do</strong> outrora exposto. Também passa pela necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> efetivação <strong>de</strong> medidas educacionais para o brasileiro médio<br />

que, em regra, não sabe lidar com a concessão <strong>de</strong> crédito.<br />

O Projeto <strong>de</strong> Lei 283/2012, uma das propostas <strong>de</strong> alteração <strong>do</strong> CDC, preten<strong>de</strong> regulamentar a matéria <strong>do</strong> superendividamento.<br />

Inicialmente, há proposição <strong>de</strong> introduzir o inc. XI ao art. 6º <strong>do</strong> CDC, prescreven<strong>do</strong> como direito básico <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r “a garantia<br />

<strong>de</strong> práticas <strong>de</strong> crédito responsável, <strong>de</strong> educação financeira, <strong>de</strong> prevenção e tratamento das situações <strong>de</strong> superendividamento,<br />

preservan<strong>do</strong> o mínimo existencial, por meio da revisão e repactuação da dívida, entre outras medidas”. A menção ao mínimo<br />

existencial ou patrimônio mínimo é louvável, para a tutela da dignida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Além disso, são acrescenta<strong>do</strong>s os arts. 54-A a 54-G, com medidas concretas para evitar o superendividamento, o que tem apoio<br />

<strong>de</strong>ste autor. O primeiro coman<strong>do</strong> merece <strong>de</strong>staque por consagrar princípios aplicáveis a essas medidas: “Esta seção tem a finalida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> prevenir o superendividamento da pessoa física, promover o acesso ao crédito responsável e à educação financeira <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong> forma a evitar a sua exclusão social e o comprometimento <strong>de</strong> seu mínimo existencial, sempre com base nos<br />

princípios da boa-fé, da função social <strong>do</strong> crédito ao consumi<strong>do</strong>r e <strong>do</strong> respeito à dignida<strong>de</strong> da pessoa humana”.<br />

Dentro <strong>de</strong>sse capítulo da proposta, <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>stacada a vedação <strong>de</strong> utilização <strong>de</strong> termos como “sem juros”, “gratuito”, “sem<br />

acréscimo”, “com taxa zero”, com o fim <strong>de</strong> evitar o consumo impulsivo <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, muitas vezes induzi<strong>do</strong> a erro. A<strong>de</strong>mais,<br />

a norma passa a estabelecer, como feliz tentativa, que nos contratos em que o mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> pagamento da dívida envolva autorização<br />

prévia <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r pessoa física para consignação em folha <strong>de</strong> pagamento ou qualquer forma que implique cessão ou reserva <strong>de</strong><br />

parte <strong>de</strong> sua remuneração, a soma das parcelas reservadas para pagamento <strong>de</strong> dívidas não po<strong>de</strong>rá ser superior a trinta por cento da<br />

sua remuneração mensal líquida. A finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse art. 54-D projeta<strong>do</strong> é manter o mínimo existencial ou o patrimônio mínimo <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ntro da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> tutela da dignida<strong>de</strong> humana.<br />

Em 2016, importante aresto <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania aplicou o texto <strong>do</strong> projeto legislativo, limitan<strong>do</strong> o empréstimo obti<strong>do</strong> nos<br />

limites propostos. Nos termos da sua ementa, que conta com o total apoio <strong>de</strong>ste autor, “valida<strong>de</strong> da cláusula autoriza<strong>do</strong>ra <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sconto em conta-corrente para pagamento das prestações <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> empréstimo, ainda que se trate <strong>de</strong> conta utilizada para<br />

recebimento <strong>de</strong> salário. Os <strong>de</strong>scontos, todavia, não po<strong>de</strong>m ultrapassar 30% (trinta por cento) da remuneração líquida percebida pelo<br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, após <strong>de</strong>duzi<strong>do</strong>s os <strong>de</strong>scontos obrigatórios (Previdência e Imposto <strong>de</strong> Renda). Preservação <strong>do</strong> mínimo existencial, em<br />

consonância com o princípio da dignida<strong>de</strong> humana. Doutrina sobre o tema” (STJ – REsp 1.584.501/SP – Terceira Turma – Rel.<br />

Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 06.10.2016, DJe 13.10.2016).<br />

Por fim quanto à proposta, há também a louvável proposição <strong>de</strong> se incluir regulamentação a respeito da audiência <strong>de</strong><br />

conciliação no caso <strong>de</strong> superendividamento (art. 104-A). A regulamentação geral vem com o seguinte senti<strong>do</strong>: “A requerimento <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r superendivida<strong>do</strong> pessoa física, o juiz po<strong>de</strong>rá instaurar processo <strong>de</strong> repactuação <strong>de</strong> dívidas, visan<strong>do</strong> à realização <strong>de</strong><br />

audiência conciliatória, presidida por ele ou por concilia<strong>do</strong>r cre<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong> no juízo, com a presença <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os cre<strong>do</strong>res, em que o<br />

consumi<strong>do</strong>r apresentará proposta <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> pagamento com prazo máximo <strong>de</strong> cinco anos, preserva<strong>do</strong> o mínimo existencial”. Pelo<br />

seu importante impacto social, espera-se que as projeções obtenham êxito no Congresso Nacional.<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>, o art. 53 da Lei 8.078/1990 estabelece a nulida<strong>de</strong> específica, por abusivida<strong>de</strong>, da cláusula <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>caimento ou <strong>de</strong> perdimento, relativa à perda <strong>de</strong> todas as parcelas pagas em contratos <strong>de</strong> financiamento. Vejamos a redação <strong>de</strong>sse<br />

importante coman<strong>do</strong>:<br />

“Art. 53. Nos contratos <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações<br />

fiduciárias em garantia, consi<strong>de</strong>ram-se nulas <strong>de</strong> pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em<br />

benefício <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r que, em razão <strong>do</strong> inadimplemento, pleitear a resolução <strong>do</strong> contrato e a retomada <strong>do</strong> produto aliena<strong>do</strong>.<br />

§ 1º (Veta<strong>do</strong>).<br />

§ 2º Nos contratos <strong>do</strong> sistema <strong>de</strong> consórcio <strong>de</strong> produtos duráveis, a compensação ou a restituição das parcelas quitadas, na forma<br />

<strong>de</strong>ste artigo, terá <strong>de</strong>scontada, além da vantagem econômica auferida com a fruição, os prejuízos que o <strong>de</strong>sistente ou inadimplente


causar ao grupo.<br />

§ 3º Os contratos <strong>de</strong> que trata o caput <strong>de</strong>ste artigo serão expressos em moeda corrente nacional”.<br />

Várias são as aplicações concretas <strong>de</strong> afastamento da malfadada cláusula <strong>de</strong> <strong>de</strong>caimento. Vejamos três ementas <strong>do</strong> Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça, a título <strong>de</strong> ilustração, para casos envolven<strong>do</strong> o compromisso <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> imóvel registra<strong>do</strong> na<br />

matrícula, configura<strong>do</strong> como negócio <strong>de</strong> consumo:<br />

“<strong>Direito</strong> civil e processual civil. Embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração. Ausência <strong>de</strong> omissão, contradição ou obscurida<strong>de</strong>. Ação <strong>de</strong> rescisão <strong>de</strong><br />

compromisso <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> imóvel com pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>volução das parcelas pagas. Legitimida<strong>de</strong> ativa ad causam.<br />

Possibilida<strong>de</strong>. Fundamento. Favor <strong>de</strong>bitoris. Cláusula <strong>de</strong> <strong>de</strong>caimento. Enriquecimento sem causa das promitentes-ven<strong>de</strong><strong>do</strong>ras.<br />

Limitação. Os embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração são corretamente rejeita<strong>do</strong>s quan<strong>do</strong> ausente omissão, contradição ou obscurida<strong>de</strong> a ser sanada.<br />

O direito à <strong>de</strong>volução das prestações pagas <strong>de</strong>corre da força integrativa <strong>do</strong> princípio geral <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong> favor <strong>de</strong>bitoris<br />

(corolário, no <strong>Direito</strong> das Obrigações, <strong>do</strong> favor libertatis). O promissário-compra<strong>do</strong>r inadimplente que não usufrui <strong>do</strong> imóvel tem<br />

legitimida<strong>de</strong> ativa ad causam para postular nulida<strong>de</strong> da cláusula que estabelece o <strong>de</strong>caimento <strong>de</strong> meta<strong>de</strong> das prestações pagas. A<br />

<strong>de</strong>volução das prestações pagas, mediante retenção <strong>de</strong> 30% (trinta por cento) <strong>do</strong> valor pago pela promissária-compra<strong>do</strong>ra, objetiva<br />

evitar o enriquecimento sem causa <strong>do</strong> ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r, bem como o reembolso das <strong>de</strong>spesas <strong>do</strong> negócio e a in<strong>de</strong>nização pela rescisão<br />

contratual. Recurso especial a que se dá provimento” (STJ – REsp 345.725/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j.<br />

13.05.2003 – DJ 18.08.2003, p. 202).<br />

“Compromisso <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> imóvel. Perda das prestações pagas. Distrato pactua<strong>do</strong> na vigência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. Nulida<strong>de</strong> da cláusula. Recurso <strong>de</strong>sacolhi<strong>do</strong>. Nula é a cláusula que prevê a perda das prestações pagas, em distrato <strong>de</strong><br />

compromisso <strong>de</strong> compra-e-venda celebra<strong>do</strong> na vigência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a parte inadimplente requerer<br />

a restituição <strong>do</strong> quantum pago, com correção monetária <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cada <strong>de</strong>sembolso, autorizada a retenção <strong>de</strong> importância fixada pelas<br />

instâncias ordinárias em razão <strong>do</strong> <strong>de</strong>scumprimento <strong>do</strong> contrato” (STJ – REsp 241.636/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Sálvio <strong>de</strong><br />

Figueire<strong>do</strong> Teixeira – j. 17.02.2000 – DJ 03.04.2000, p. 157).<br />

“Promessa <strong>de</strong> compra e venda. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Cláusula <strong>de</strong> <strong>de</strong>caimento. Prece<strong>de</strong>ntes da Corte. 1. O Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r não autoriza a cláusula <strong>de</strong> <strong>de</strong>caimento estipulan<strong>do</strong> a perda integral ou quase integral das prestações pagas.<br />

Mas, a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tal cláusula não impe<strong>de</strong> o magistra<strong>do</strong> <strong>de</strong> aplicar a regra <strong>do</strong> art. 924 <strong>do</strong> Código Civil e autorizar, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com as<br />

circunstâncias <strong>do</strong> caso, uma retenção que, no caso, <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong> 10% (<strong>de</strong>z por cento)” (STJ – REsp 149.399/DF – Terceira Turma –<br />

Rel. Min. Carlos Alberto Menezes <strong>Direito</strong> – j. 04.02.1999 – DJ 29.03.1999, p. 164).<br />

Como se nota <strong>do</strong>s arestos colaciona<strong>do</strong>s, mesmo com a nulida<strong>de</strong> da cláusula <strong>de</strong> perda <strong>de</strong> todas as parcelas pagas, há divergência<br />

sobre o montante da dívida que po<strong>de</strong> ser reti<strong>do</strong> pelo promitente-ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r a título <strong>de</strong> multa pelo inadimplemento absoluto da outra<br />

parte, visan<strong>do</strong> a cobrir os prejuízos suporta<strong>do</strong>s. Na opinião <strong>do</strong> presente autor, <strong>de</strong>ve-se analisar casuisticamente, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com as<br />

circunstâncias <strong>do</strong> caso, servin<strong>do</strong> sempre o controle <strong>do</strong> art. 413 <strong>do</strong> Código Civil. A priori, um montante entre 10% e 30% sobre o<br />

valor da dívida não se mostra excessivamente oneroso. Acima disso, presume-se a presença da onerosida<strong>de</strong> excessiva.<br />

Em relação ao contrato <strong>de</strong> consórcio <strong>de</strong> produtos duráveis (v.g., veículos), valem as mesmas premissas ora fixadas. Nos termos<br />

<strong>do</strong> art. 2º da Lei 11.795/2008, anote-se que o “consórcio é a reunião <strong>de</strong> pessoas naturais e jurídicas em grupo, com prazo <strong>de</strong> duração<br />

e número <strong>de</strong> cotas previamente <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s, promovida por administra<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> consórcio, com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> propiciar a seus<br />

integrantes, <strong>de</strong> forma isonômica, a aquisição <strong>de</strong> bens ou serviços, por meio <strong>de</strong> autofinanciamento”. Nesse contrato, igualmente, é<br />

nula a cláusula <strong>de</strong> <strong>de</strong>caimento, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o valor a ser <strong>de</strong>volvi<strong>do</strong> ser atualiza<strong>do</strong> monetariamente (STJ – REsp 299.386/RJ – Quarta<br />

Turma – Rel. Min. Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar – j. 17.05.2001 – DJ 04.02.2002, p. 380).<br />

Entretanto, ressalve-se que, em haven<strong>do</strong> <strong>de</strong>sistência por parte <strong>do</strong> consorcia<strong>do</strong>, a compensação ou a restituição das parcelas<br />

quitadas terá <strong>de</strong>scontada, além da vantagem econômica auferida com a fruição, os prejuízos que o <strong>de</strong>sistente causar ao grupo.<br />

Conforme a jurisprudência, tais prejuízos <strong>de</strong>vem ser prova<strong>do</strong>s pela empresa que administra o consórcio, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser<br />

presumi<strong>do</strong>s (STJ – REsp 871.421/SC – Terceira Turma – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 11.03.2008 – DJe 01.04.2008). Tal linha <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>cisão representa clara proteção aos consumi<strong>do</strong>res.<br />

Como é notório, o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>sistência no consórcio é um direito potestativo <strong>do</strong> consorcia<strong>do</strong>. Nesse contexto, vários julga<strong>do</strong>s<br />

enten<strong>de</strong>m ser abusiva a cláusula que afasta <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>sistir <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> consórcio antes <strong>do</strong> encerramento <strong>do</strong><br />

grupo (por to<strong>do</strong>s: TJMG – Apelação Cível 5921251-43.2009.8.13.0702, Uberlândia – Décima Câmara Cível – Rel. Des. Pereira da<br />

Silva – j. 01.03.2011 – DJEMG 25.03.2011; TJDF – Recurso 2007.01.1.110618-5 – Acórdão 362.209 – Primeira Turma Recursal<br />

<strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e Criminais – Rel. Juíza Lucimeire Maria da Silva – DJDFTE 22.06.2009, p. 225; e TJDF – Recurso<br />

2008.01.1.001565-9 – Acórdão 359.946 – Primeira Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e Criminais – Rel. Des.<br />

Lucimeire Maria da Silva – DJDFTE 12.06.2009, p. 155).<br />

Em relação ao montante <strong>do</strong> valor pago pelo consorcia<strong>do</strong> que po<strong>de</strong> ser reti<strong>do</strong> pela empresa que administra o consórcio, esse<br />

também <strong>de</strong>ve abranger a chamada taxa <strong>de</strong> administração. Da jurisprudência superior, fazen<strong>do</strong> controle contra o abuso <strong>de</strong> direito em


elação a tal taxa: “Civil. Agravo no recurso especial. Consórcio. Embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração. Reforma em prejuízo da parte.<br />

Disposição <strong>de</strong> ofício. Não ocorrência. Devolução <strong>de</strong> parcelas. Desistência. Momento. Taxa <strong>de</strong> administração. Abusivida<strong>de</strong>.<br />

Limitação. (…) ‘Se houver cláusula contratual que fixe taxa <strong>de</strong> administração em valor que exceda o limite legal previsto no art. 42<br />

<strong>do</strong> Dec. 70.951/1972, estará caracterizada a prática abusiva da administra<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> consórcio, o que impõe a exclusão <strong>do</strong> percentual<br />

que sobejar ao estipula<strong>do</strong> na referida Lei’ (REsp 541.184/PB – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 25.04.2006). Agravo no recurso<br />

especial não provi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg no REsp 764.771/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 10.08.2006 – DJ<br />

28.08.2006, p. 287).<br />

Por <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iro, a <strong>de</strong>volução <strong>do</strong>s valores pagos <strong>de</strong>ve ocorrer imediatamente em uma única parcela, e não apenas com o<br />

encerramento <strong>do</strong> contrato coletivo – na hipótese <strong>do</strong> consórcio –, ou com o fim da obra – no compromisso <strong>de</strong> compra e venda.<br />

Conforme <strong>de</strong>cidiu recentemente o Tribunal da Cidadania, em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recursos repetitivos, “em contrato <strong>de</strong> promessa <strong>de</strong> compra e<br />

venda <strong>de</strong> imóvel submeti<strong>do</strong> ao CDC, é abusiva a cláusula contratual que <strong>de</strong>termine, no caso <strong>de</strong> resolução, a restituição <strong>do</strong>s valores<br />

<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s somente ao término da obra ou <strong>de</strong> forma parcelada, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> qual das partes tenha da<strong>do</strong> causa ao fim <strong>do</strong><br />

negócio. De fato, a <strong>de</strong>speito da inexistência literal <strong>de</strong> dispositivo que imponha a <strong>de</strong>volução imediata <strong>do</strong> que é <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> pelo<br />

promitente ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r <strong>de</strong> imóvel, inegável que o CDC optou por fórmulas abertas para a nunciação das chamadas ‘práticas abusivas’<br />

e ‘cláusulas abusivas’, lançan<strong>do</strong> mão <strong>de</strong> um rol meramente exemplificativo para <strong>de</strong>screvê-las (arts. 39 e 51). Nessa linha, a<br />

jurisprudência <strong>do</strong> STJ vem proclaman<strong>do</strong> serem abusivas situações como a ora em análise, por ofensa ao art. 51, II e IV, <strong>do</strong> CDC,<br />

haja vista que po<strong>de</strong>rá o promitente ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r, uma vez mais, reven<strong>de</strong>r o imóvel a terceiros e, a um só tempo, auferir vantagem com<br />

os valores reti<strong>do</strong>s, além da própria valorização <strong>do</strong> imóvel, como normalmente acontece. Se bem analisada, a referida cláusula<br />

parece abusiva mesmo no âmbito <strong>do</strong> direito comum, porquanto, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o CC/1916 – que foi reafirma<strong>do</strong> pelo CC/2002 –, são ilícitas<br />

as cláusulas puramente potestativas, assim entendidas aquelas que sujeitam a pactuação ‘ao puro arbítrio <strong>de</strong> uma das partes’ (art.<br />

115 <strong>do</strong> CC/1916 e art. 122 <strong>do</strong> CC/2002). A<strong>de</strong>mais, em hipóteses como esta, revela-se evi<strong>de</strong>nte potestativida<strong>de</strong>, o que é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong><br />

abusivo tanto pelo art. 51, IX, <strong>do</strong> CDC quanto pelo art. 122 <strong>do</strong> CC/2002’. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: AgRg no Ag 866.542/SC – Terceira<br />

Turma – DJe 11.12.2012; REsp 633.793/SC – Terceira Turma – DJ 27.06.2005; e AgRg no REsp 997.956/SC – Quarta Turma –<br />

DJe 02.08.2012” (STJ – REsp 1.300.418/SC – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 13.11.2013 – publica<strong>do</strong> no seu Informativo n.<br />

533).<br />

Pontue-se que a questão se estabilizou <strong>de</strong> tal forma que, em 2015, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça editou a Súmula n. 543, in<br />

verbis: “na hipótese <strong>de</strong> resolução <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> promessa <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> imóvel submeti<strong>do</strong> ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente-compra<strong>do</strong>r integralmente, em caso <strong>de</strong> culpa<br />

exclusiva <strong>do</strong> promitente ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r/construtor, ou parcialmente, caso tenha si<strong>do</strong> o compra<strong>do</strong>r quem <strong>de</strong>u causa ao <strong>de</strong>sfazimento”.<br />

5.9.<br />

O TRATAMENTO DOS CONTRATOS DE ADESÃO PELO ART. 54 DO CÓDIGO DE<br />

DEFESA DO CONSUMIDOR<br />

A findar o presente capítulo, cumpre estudar o preceito <strong>do</strong> art. 54 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, que cui<strong>do</strong>u <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir o<br />

contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. Prevê o caput <strong>do</strong> preceito consumerista que “Contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são é aquele cujas cláusulas tenham si<strong>do</strong> aprovadas<br />

pela autorida<strong>de</strong> competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos ou serviços, sem que o consumi<strong>do</strong>r possa<br />

discutir ou modificar substancialmente seu conteú<strong>do</strong>”. Como se po<strong>de</strong> perceber, o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são é aquele imposto pelo<br />

estipulante, seja ele um órgão público ou priva<strong>do</strong>, geralmente o <strong>de</strong>tentor <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio ou po<strong>de</strong>rio contratual. Restam ao a<strong>de</strong>rente duas<br />

opções, quais sejam aceitar ou não o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> negócio (take-it-or-leave-it). A situação oposta ao contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são se dá no<br />

chama<strong>do</strong> contrato paritário, em que há plena negociação <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> pelas partes.<br />

Na opinião <strong>de</strong>ste autor, o conceito acima não <strong>de</strong>veria estar reproduzi<strong>do</strong> no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, mas no Código<br />

Civil <strong>de</strong> 2002, norma que assume o papel central no <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, como um planeta, naquela simbologia <strong>do</strong> sistema solar <strong>de</strong><br />

Ricar<strong>do</strong> Lorenzetti. Em sua redação atual, o vigente Código Civil não <strong>de</strong>fine o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. Em prol da operabilida<strong>de</strong>, o<br />

Projeto <strong>de</strong> Lei 699/2011 preten<strong>de</strong> fazê-lo, conforme sugestão <strong>de</strong> Jones Figueirê<strong>do</strong> Alves, passan<strong>do</strong> o art. 423 <strong>do</strong> CC/2002 a ter a<br />

seguinte redação:<br />

“Art. 423. Contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são é aquele cujas cláusulas tenham si<strong>do</strong> aprovadas pela autorida<strong>de</strong> competente ou estabelecidas<br />

unilateralmente por um <strong>do</strong>s contratantes, sem que o a<strong>de</strong>rente possa discutir ou modificar substancialmente seu conteú<strong>do</strong>.<br />

§ 1º Os contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são escritos serão redigi<strong>do</strong>s em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a facilitar a sua<br />

compreensão pelo a<strong>de</strong>rente.<br />

§ 2º As cláusulas contratuais, nos contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, serão interpretadas <strong>de</strong> maneira mais favorável ao a<strong>de</strong>rente.”<br />

As justificativas apresentadas pelo Deputa<strong>do</strong> Ricar<strong>do</strong> Fiúza, autor <strong>do</strong> projeto original, são pertinentes, contan<strong>do</strong> com o nosso


apoio:<br />

“A proposta preten<strong>de</strong> dar redação mais completa ao dispositivo, acrescentan<strong>do</strong> a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são e compatibilizan<strong>do</strong><br />

o art. 423 com o que já dispõe o art. 54 <strong>do</strong> CDC. A sugestão, aqui, é <strong>do</strong> Desembarga<strong>do</strong>r Jones Figueirê<strong>do</strong> Alves, como aliás são todas<br />

as outras a seguir expostas, no que se refere à matéria contratual. Diz ele: ‘O princípio <strong>de</strong> interpretação contratual mais favorável ao<br />

a<strong>de</strong>rente <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong> isonômica estabelecen<strong>do</strong> em seus fins uma igualda<strong>de</strong> substancial real entre os contratantes’. É que,<br />

como lembra Georges Ripert, ‘o único ato <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> a<strong>de</strong>rente consiste em colocar-se em situação tal que a lei da outra parte é<br />

soberana. E, quan<strong>do</strong> pratica aquele ato <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>, o a<strong>de</strong>rente é leva<strong>do</strong> a isso pela imperiosa necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contratar’. O dispositivo,<br />

ao preceituar a sua aplicação, todavia, em casos <strong>de</strong> cláusulas obscuras ou ambíguas, vem limitá-lo a essas hipóteses, o que contraria o<br />

avanço trazi<strong>do</strong> pelo art. 47 <strong>do</strong> CDC, preven<strong>do</strong> o princípio aplica<strong>do</strong> a todas as cláusulas contratuais. O a<strong>de</strong>rente, como sujeito da<br />

relação contratual, <strong>de</strong>ve receber idêntico tratamento da<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r, diante <strong>do</strong> significa<strong>do</strong> da igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> fato que estimula o<br />

princípio, razão pela qual se impõe a alteração <strong>do</strong> dispositivo”.95<br />

A proposta é louvável, por afastar a confusão conceitual entre os conceitos <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> consumo e <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, muito comum<br />

na <strong>do</strong>utrina e na jurisprudência, como se verá a seguir.<br />

Como visto, não há como afastar o contrato da constante ingerência exercida pelo meio social. Nesse contexto se situa o<br />

contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, que constitui um fenômeno há muito tempo percebi<strong>do</strong> pela teoria contratual. Notório é que, com a evolução da<br />

socieda<strong>de</strong>, passou-se exigir uma maior celerida<strong>de</strong> e intensida<strong>de</strong> das relações negociais, surgin<strong>do</strong>, nesse contexto, a estandardização.<br />

Orlan<strong>do</strong> Gomes, em obra específica sobre o assunto, lembra que as exigências práticas da vida econômica, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

circulação intensa <strong>de</strong> bens e <strong>de</strong> capital, entre outros fatores, consolidaram <strong>de</strong> forma plena essa figura contratual. Anote-se que o<br />

notável jurista <strong>de</strong>fine contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são como “o negócio jurídico no qual a participação <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s sujeitos suce<strong>de</strong> pela aceitação<br />

em bloco <strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> cláusulas formuladas antecipadamente, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> geral e abstrato, pela outra parte, para constituir o<br />

conteú<strong>do</strong> normativo e obrigacional <strong>de</strong> futuras relações concretas”.96<br />

Maria Helena Diniz prefere utilizar a expressão contratos por a<strong>de</strong>são para <strong>de</strong>nominar o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, “verifican<strong>do</strong> que se<br />

constitui pela a<strong>de</strong>são da vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> um oblato in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong> à oferta permanente <strong>do</strong> proponente ostensivo”. Desse mo<strong>do</strong>, “os<br />

contratos por a<strong>de</strong>são constituem uma oposição à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> contrato paritário, por inexistir a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> convenção, visto que<br />

excluem a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquer <strong>de</strong>bate e transigência entre as partes, uma vez que um <strong>do</strong>s contratantes se limita a aceitar as<br />

cláusulas e condições previamente redigidas e impressas pelo outro (RT, 795:234, 519:163; JB, 158:263), a<strong>de</strong>rin<strong>do</strong> a uma situação<br />

contratual já <strong>de</strong>finida em to<strong>do</strong>s os seus termos”. 97<br />

Compreen<strong>de</strong>m-se perfeitamente as razões técnicas apontadas pela eminente civilista. Porém, pela terminologia utilizada tanto<br />

pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r (art. 54) quanto pelo Código Civil <strong>de</strong> 2002 (arts. 423 e 424), prefere-se a expressão<br />

contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. Na realida<strong>de</strong>, po<strong>de</strong>-se dizer que as expressões contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são e contratos por a<strong>de</strong>são são sinônimas,<br />

conclusão essa que tem a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inclusão da proteção <strong>do</strong> vulnerável contratual.<br />

Este autor não se filia, portanto, à clássica distinção <strong>de</strong> Orlan<strong>do</strong> Gomes, por não ser condizente com a pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong><br />

jurídica. Para ele, “o que caracteriza o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são propriamente dito é a circunstância <strong>de</strong> que aquela a quem é proposto não<br />

po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> contratar, porque tem necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> satisfazer a um interesse que, por outro mo<strong>do</strong>, não po<strong>de</strong> ser atendi<strong>do</strong>”. Há,<br />

portanto, no contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são um monopólio, não presente no contrato por a<strong>de</strong>são, presente a última figura nos <strong>de</strong>mais casos em<br />

que o conteú<strong>do</strong> é imposto por uma das partes, <strong>de</strong> forma total ou parcial. 98<br />

Ora, se fosse feita a diferenciação <strong>do</strong> clássico jurista, os dispositivos <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong> a<strong>de</strong>rente (arts. 423 e 424 <strong>do</strong> CC e art. 54 <strong>do</strong><br />

CDC) não se aplicariam aos contratos por a<strong>de</strong>são, mas somente aos contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, aqueles que apresentam um monopólio no<br />

conteú<strong>do</strong>. Isso contraria o princípio da função social <strong>do</strong>s contratos, eis que a intenção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r foi proteger to<strong>do</strong>s os a<strong>de</strong>rentes<br />

que tiveram contra si a imposição <strong>de</strong> cláusulas contratuais, <strong>de</strong> forma ampla ou restrita.<br />

Não se olvi<strong>de</strong> que os arts. 423 e 424 <strong>do</strong> CC/2002, ao protegerem o a<strong>de</strong>rente como vulnerável contratual, trazem como conteú<strong>do</strong><br />

a eficácia interna da função social <strong>do</strong> contrato. O primeiro dispositivo, como visto, consagra a interpretação pro a<strong>de</strong>rente. O último<br />

transpõe para os contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são a excelente experiência relativa às cláusulas abusivas nos contratos <strong>de</strong> consumo, estabelecen<strong>do</strong><br />

a nulida<strong>de</strong> absoluta das cláusulas <strong>de</strong> renúncia a um direito inerente ao negócio. É importante salientar, para essa conclusão, que os<br />

princípios têm uma notável função <strong>de</strong> integração, <strong>de</strong> interpretação e correção <strong>do</strong> sistema. Com a diferenciação <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong><br />

a<strong>de</strong>são e por a<strong>de</strong>são, portanto, po<strong>de</strong>ríamos chegar a situações injustas, em clara lesão ao princípio constitucional da isonomia.<br />

Em suma, po<strong>de</strong>-se dizer que o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são é aquele em que uma parte, o estipulante, impõe o conteú<strong>do</strong> negocial,<br />

restan<strong>do</strong> à outra parte, o a<strong>de</strong>rente, duas opções: aceitar ou não o conteú<strong>do</strong> <strong>de</strong>sse negócio. Esse conceito <strong>de</strong>ve ser visto em senti<strong>do</strong><br />

amplo, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a englobar todas as figuras negociais em que as cláusulas são preestabelecidas ou predispostas, caso <strong>do</strong> contratotipo<br />

e <strong>do</strong> contrato formulário, categorias em que as cláusulas são pre<strong>de</strong>terminadas até por um terceiro. Como se sabe, os últimos<br />

contratos até são comercializa<strong>do</strong>s, em alguns casos (v.g., mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> contratos vendi<strong>do</strong>s em papelarias ou pela internet).<br />

Os parágrafos <strong>do</strong> art. 54 <strong>do</strong> Código Consumerista completam essa categorização. Inicialmente, o seu § 1º preceitua que a


inserção <strong>de</strong> cláusulas eventualmente discutidas no formulário não afasta a natureza <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. Somente se houve uma<br />

mudança substancial da estrutura <strong>do</strong> negócio, po<strong>de</strong>rá ele ser ti<strong>do</strong> como um contrato paritário.<br />

De acor<strong>do</strong> com a previsão seguinte, o § 2º <strong>do</strong> art. 54 admite, na figura negocial, a cláusula resolutória, uma condição resolutiva<br />

expressa, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que esta não traga uma <strong>de</strong>svantagem excessiva ao consumi<strong>do</strong>r. Tal preceito po<strong>de</strong> abranger a alienação fiduciária em<br />

garantia <strong>de</strong> bem móvel, caso estejam presentes os elementos da relação <strong>de</strong> consumo. O tema merece uma abordagem à parte, diante<br />

da alteração <strong>do</strong> art. 3º, § 2º, <strong>do</strong> Decreto-lei 911/1969, pela Lei 10.931/2004, conforme tabela a seguir. Cabe anotar que <strong>do</strong> quadro<br />

comparativo consta o novo tratamento da<strong>do</strong> ao instituto, pela Lei 13.043, <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 2014, que modificou o caput <strong>do</strong><br />

coman<strong>do</strong>, sem qualquer relevância para o tema exposto:<br />

Redação anterior<br />

Art. 3º O proprietário fiduciário ou cre<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>rá<br />

requerer contra o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r ou terceiro a busca e<br />

apreensão <strong>do</strong> bem aliena<strong>do</strong> fiduciariamente, a qual<br />

será concedida liminarmente, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

comprovada a mora ou o inadimplemento <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r.<br />

§ 1º Despachada a inicial e executada a liminar, o<br />

réu será cita<strong>do</strong> para, em três dias, apresentar<br />

contestação ou, se já tiver pago 40% (quarenta<br />

por cento) <strong>do</strong> preço financia<strong>do</strong>, requerer a<br />

purgação <strong>de</strong> mora.<br />

§ 2º Na contestação, só se po<strong>de</strong>rá alegar o<br />

pagamento <strong>do</strong> débito venci<strong>do</strong> ou o cumprimento<br />

das obrigações contratuais.<br />

Nova redação, conforme a Lei 10.931/2004 e Lei<br />

13.043/2014<br />

Art. 3º O proprietário fiduciário ou cre<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>rá, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

comprovada a mora, na forma estabelecida pelo § 2º <strong>do</strong> art. 2º,<br />

ou o inadimplemento, requerer contra o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r ou terceiro a<br />

busca e apreensão <strong>do</strong> bem aliena<strong>do</strong> fiduciariamente, a qual<br />

será concedida liminarmente, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser apreciada em<br />

plantão judiciário.<br />

§ 1º Cinco dias após executada a liminar mencionada no caput,<br />

consolidar-se-ão a proprieda<strong>de</strong> e a posse plena e exclusiva <strong>do</strong><br />

bem no patrimônio <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r fiduciário, caben<strong>do</strong> às repartições<br />

competentes, quan<strong>do</strong> for o caso, expedir novo certifica<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

registro <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> em nome <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r, ou <strong>de</strong> terceiro por<br />

ele indica<strong>do</strong>, livre <strong>do</strong> ônus da proprieda<strong>de</strong> fiduciária.<br />

§ 2º No prazo <strong>do</strong> § 1º, o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r fiduciante po<strong>de</strong>rá pagar a<br />

integralida<strong>de</strong> da dívida pen<strong>de</strong>nte, segun<strong>do</strong> os valores<br />

apresenta<strong>do</strong>s pelo cre<strong>do</strong>r fiduciário na inicial, hipótese na<br />

qual o bem lhe será restituí<strong>do</strong> livre <strong>do</strong> ônus.<br />

Diante <strong>de</strong>ssa confrontação, surge o entendimento pelo qual a lei não mais <strong>de</strong>fere, na alienação fiduciária em garantia <strong>de</strong> bens<br />

móveis, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> purgação da mora nos casos em que houver o pagamento <strong>de</strong> 40% (quarenta por cento) <strong>do</strong> valor <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>.<br />

Pela nova redação <strong>do</strong> texto legal, o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r fiduciante teria que pagar integralmente a dívida, pois caso contrário ocorreria<br />

consolidação da proprieda<strong>de</strong> a favor <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r fiduciário. Acertadamente, o extinto Segun<strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Alçada Civil <strong>de</strong> São Paulo,<br />

logo após a entrada em vigor da alteração, assim não enten<strong>de</strong>u, concluin<strong>do</strong> que o direito <strong>de</strong> purgação da mora está manti<strong>do</strong>, pela<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> liquidação antecipada da dívida. Vejamos esse importante prece<strong>de</strong>nte:<br />

“Agravo <strong>de</strong> instrumento. Alienação fiduciária. Purgação da mora. Faculda<strong>de</strong> não excluída pelas inovações introduzidas no<br />

Decreto-lei 911, <strong>de</strong> 1.º.10.1969, pela Lei 10.931, <strong>de</strong> 02.08.2004. Normas que <strong>de</strong>vem ser interpretadas em conjunto com o art. 54, §<br />

2º, <strong>do</strong> CDC. Recurso improvi<strong>do</strong>” (2º TAC-SP – Agravo <strong>de</strong> Instrumento 869850-0/3, Carapicuíba – Oitava Câmara – Rel. Juiz<br />

Antonio Carlos Vilen – j. 18.11.2004 – Boletim da AASP 2.426, p. 3.513).<br />

Consta <strong>do</strong> julga<strong>do</strong> que o art. 54 <strong>do</strong> CDC admite que os contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são contenham cláusula resolutiva, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que a escolha<br />

caiba ao consumi<strong>do</strong>r. Ora, saben<strong>do</strong>-se que a resolução é forma <strong>de</strong> extinção <strong>do</strong>s contratos por inexecução, a “escolha a que se refere<br />

o dispositivo, em caso <strong>de</strong> existência <strong>de</strong> cláusula resolutória expressa, <strong>de</strong>ve ser interpretada como a possibilida<strong>de</strong> que o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r em<br />

mora tem <strong>de</strong> optar entre a purgação e a continuida<strong>de</strong> da relação contratual, <strong>de</strong> um la<strong>do</strong>, e a extinção por inadimplemento, <strong>de</strong> outro”.<br />

A conclusão é que a inovação introduzida pela Lei 10.931/2004 não é incompatível com essa interpretação, mas “simplesmente<br />

conferiu mais uma faculda<strong>de</strong> ao <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, qual seja a <strong>de</strong> obter a extinção <strong>do</strong> contrato, com a restituição <strong>do</strong> bem apreendi<strong>do</strong>, livre <strong>de</strong><br />

ônus, pela integral execução das obrigações pactuadas”. Em suma, permanece íntegro o direito <strong>de</strong> utilização da purgação da mora<br />

em favor <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

Este autor concorda integralmente com a conclusão <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>, pois está em sintonia com o princípio da conservação negocial,<br />

anexo à função social <strong>do</strong>s contratos. Em reforço, está mantida a proteção <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res vulneráveis, conforme a Lei<br />

8.078/1990, sen<strong>do</strong> certo que a alienação fiduciária <strong>de</strong> bens móveis quase sempre tem como parte <strong>de</strong>stinatários finais, fáticos e


econômicos, que preten<strong>de</strong>m adquirir um bem <strong>de</strong> consumo, geralmente veículos.<br />

Ainda no plano jurispru<strong>de</strong>ncial, outros acórdãos surgiram, sucessivamente, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> pela manutenção da Súmula 284 <strong>do</strong><br />

STJ. A título <strong>de</strong> ilustração, po<strong>de</strong>m ser cita<strong>do</strong>s: TJRS – Apelação Cível 256654-04.2009.8.21.7000, Viamão – 14.ª Câmara Cível –<br />

Rel. Des. Niwton Carpes da Silva – j. 31.03.2011 – DJERS 14.04.2011; TJSP – Apelação 9201022-44.2009.8.26.0000 – Acórdão<br />

5101330 – São José <strong>do</strong> Rio Preto – 35.ª Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Clóvis Castelo – j. 02.05.2011 – DJESP 17.05.2011;<br />

TJSP – Agravo <strong>de</strong> Instrumento 0466858-02.2010.8.26.0000 – Acórdão 5094151, Mirassol – 28.ª Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel.<br />

Des. Eduar<strong>do</strong> Sá Pinto San<strong>de</strong>ville – j. 26.04.2011 – DJESP 17.05.2011 e TJMG – Agravo <strong>de</strong> Instrumento 0197982-<br />

05.2011.8.13.0000, Uberaba – 12.ª Câmara Cível – Rel. Des. José <strong>Flávio</strong> <strong>de</strong> Almeida – j. 27.04.2011 – DJEMG 09.05.2011.<br />

Todavia, a questão nunca foi pacífica, sen<strong>do</strong> certo que <strong>do</strong> Segun<strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Alçada <strong>de</strong> São Paulo já existiam <strong>de</strong>cisões em<br />

senti<strong>do</strong> contrário, ou seja, pelo cancelamento da sumular. Por to<strong>do</strong>s: “Alienação fiduciária. Busca e apreensão. Purgação da mora.<br />

Faculda<strong>de</strong> excluída pelas inovações introduzidas no Decreto-lei 911/1969 pela Lei 10.931/2004. Inadmissibilida<strong>de</strong>. Não há se falar<br />

em purgação da mora nos contratos <strong>de</strong> alienação fiduciária em garantia, ante as modificações trazidas pela Lei 10.931/2004”<br />

(Segun<strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Alçada Civil <strong>de</strong> São Paulo – AI 873.712-00/6 – 8.ª Câmara – Rel. Juiz Orlan<strong>do</strong> Pistoresi – j. 02.12.2004). Na<br />

mesma linha, outros tantos arestos trazem a mesma conclusão, <strong>de</strong> superação da citada sumular (ver: TJDF – Recurso<br />

2010.00.2.006330-9 – Acórdão 430.572 – 3.ª Turma Cível – Rel. Des. Humberto Adjuto Ulhôa – DJDFTE 01.07.2010, p. 71 e<br />

TJMG – Agravo <strong>de</strong> Instrumento 0053691-09.2011.8.13.0000, Montes Claros – 17.ª Câmara Cível – Rel.ª Des.ª Márcia <strong>de</strong> Paoli<br />

Balbino – j. 03.03.2011 – DJEMG 05.04.2011).<br />

Do próprio Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, infelizmente, concluin<strong>do</strong> <strong>de</strong>ssa última maneira: “Agravo Regimental no Recurso<br />

Especial. Fundamentos insuficientes para reformar a <strong>de</strong>cisão agravada. Contrato garanti<strong>do</strong> com cláusula <strong>de</strong> alienação fiduciária.<br />

Ação <strong>de</strong> busca e apreensão. Purgação da mora após a vigência da Lei 10.931/04. Impossibilida<strong>de</strong>. Necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pagamento da<br />

integralida<strong>de</strong> da dívida. Súmula 83 <strong>do</strong> STJ. 1. O agravante não trouxe argumentos novos capazes <strong>de</strong> infirmar os fundamentos que<br />

alicerçaram a <strong>de</strong>cisão agravada, razão que enseja a negativa <strong>de</strong> provimento ao agravo regimental. 2. Com a nova redação <strong>do</strong> artigo<br />

3º <strong>do</strong> Decreto-Lei 911/69, dada pela Lei 10.931/04, não há mais se falar em purgação da mora nas ações <strong>de</strong> busca e apreensão <strong>de</strong><br />

bem aliena<strong>do</strong> fiduciariamente, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r pagar a integralida<strong>de</strong> da dívida, no prazo <strong>de</strong> 5 dias após a execução da liminar,<br />

hipótese na qual o bem lhe será restituí<strong>do</strong> livre <strong>de</strong> ônus. 3. A perfeita harmonia entre o acórdão recorri<strong>do</strong> e a jurisprudência<br />

<strong>do</strong>minante <strong>de</strong>sta Corte Superior impõe a aplicação, à hipótese <strong>do</strong>s autos, <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> 83 da Súmula <strong>do</strong> STJ. 4. Agravo regimental<br />

não provi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg no REsp 1.183.477/DF – Rel. Min. Vasco Della Giustina (Desembarga<strong>do</strong>r convoca<strong>do</strong> <strong>do</strong> TJ/RS) – 3.ª<br />

Turma – j. 03.05.2011 – DJe 10.05.2011).<br />

Em 2014, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça acabou consolidan<strong>do</strong> essa última forma <strong>de</strong> pensar, em julgamento da sua Segunda<br />

Seção relativo a recursos repetitivos, assim publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 540:<br />

“<strong>Direito</strong> civil. Impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> purgação da mora em contratos <strong>de</strong> alienação fiduciária firma<strong>do</strong>s após a vigência da Lei<br />

10.931/2004. Recurso repetitivo (art. 543-C <strong>do</strong> CPC e Res. 8/2008-STJ). Nos contratos firma<strong>do</strong>s na vigência da Lei 10.931/2004, que<br />

alterou o art. 3º, §§ 1º e 2º, <strong>do</strong> Decreto-lei 911/1969, compete ao <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, no prazo <strong>de</strong> cinco dias após a execução da liminar na ação<br />

<strong>de</strong> busca e apreensão, pagar a integralida<strong>de</strong> da dívida – entendida esta como os valores apresenta<strong>do</strong>s e comprova<strong>do</strong>s pelo cre<strong>do</strong>r na<br />

inicial –, sob pena <strong>de</strong> consolidação da proprieda<strong>de</strong> <strong>do</strong> bem móvel objeto <strong>de</strong> alienação fiduciária. De início, convém esclarecer que a<br />

Súmula 284 <strong>do</strong> STJ, anterior à Lei 10.931/2004, orienta que a purgação da mora, nos contratos <strong>de</strong> alienação fiduciária, só é permitida<br />

quan<strong>do</strong> já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) <strong>do</strong> valor financia<strong>do</strong>. A referida súmula espelha a redação primitiva <strong>do</strong> § 1º <strong>do</strong><br />

art. 3º <strong>do</strong> Decreto-lei 911/1969, que tinha a seguinte redação: ‘Despachada a inicial e executada a liminar, o réu será cita<strong>do</strong> para, em<br />

três dias, apresentar contestação ou, se já houver pago 40% (quarenta por cento) <strong>do</strong> preço financia<strong>do</strong>, requerer a purgação <strong>de</strong> mora’.<br />

Contu<strong>do</strong>, <strong>do</strong> cotejo entre a redação originária e a atual – conferida pela Lei 10.931/2004 –, fica límpi<strong>do</strong> que a lei não faculta mais ao<br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r a purgação da mora, expressão inclusive suprimida das disposições atuais, não se extrain<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto legal a interpretação <strong>de</strong><br />

que é possível o pagamento apenas da dívida vencida. A<strong>de</strong>mais, a redação vigente <strong>do</strong> art. 3º, §§ 1º e 2º, <strong>do</strong> Decreto-lei 911/1969<br />

estabelece que o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r fiduciante po<strong>de</strong>rá pagar a integralida<strong>de</strong> da dívida pen<strong>de</strong>nte e, se assim o fizer, o bem lhe será restituí<strong>do</strong> livre<br />

<strong>de</strong> ônus, não haven<strong>do</strong>, portanto, dúvida acerca <strong>de</strong> se tratar <strong>de</strong> pagamento <strong>de</strong> toda a dívida, isto é, <strong>de</strong> extinção da obrigação. (…).<br />

Portanto, sob pena <strong>de</strong> se gerar insegurança jurídica e violar o princípio da tripartição <strong>do</strong>s Po<strong>de</strong>res, não cabe ao Po<strong>de</strong>r Judiciário, a<br />

pretexto <strong>de</strong> interpretar a Lei 10.931/2004, criar hipótese <strong>de</strong> purgação da mora não contemplada pela lei. Com efeito, é regra basilar <strong>de</strong><br />

hermenêutica a prevalência da regra excepcional, quan<strong>do</strong> há confronto entre as regras específicas e as <strong>de</strong>mais <strong>do</strong> or<strong>de</strong>namento<br />

jurídico. Assim, como o CDC não regula contratos específicos, em casos <strong>de</strong> incompatibilida<strong>de</strong> entre a norma consumerista e a<br />

aludida norma específica, <strong>de</strong>ve prevalecer essa última, pois a lei especial traz novo regramento a par <strong>do</strong>s já existentes. (…). De mais<br />

a mais, o STJ, em diversos prece<strong>de</strong>ntes, já afirmou que, após o advento da Lei 10.931/2004, que <strong>de</strong>u nova redação ao art. 3º <strong>do</strong><br />

Decreto-lei 911/1969, não há falar em purgação da mora, haja vista que, sob a nova sistemática, após o <strong>de</strong>curso <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> 5 (cinco)<br />

dias conta<strong>do</strong>s da execução da liminar, a proprieda<strong>de</strong> <strong>do</strong> bem fica consolidada em favor <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r fiduciário, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r<br />

efetuar o pagamento da integralida<strong>de</strong> <strong>do</strong> débito remanescente a fim <strong>de</strong> obter a restituição <strong>do</strong> bem livre <strong>de</strong> ônus. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s:<br />

AgRg no REsp 1.398.434/MG – Quarta Turma – DJe 11.02.2014; e AgRg no REsp 1.151.061-MS – Terceira Turma – DJe<br />

12.04.2013” (STJ – REsp 1.418.593/MS – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 14.05.2014).


Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, lamenta-se essa tomada <strong>de</strong> curso pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, que parece <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar a correta<br />

efetivação <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r-fiduciante, na gran<strong>de</strong> maioria das vezes enquadra<strong>do</strong> como consumi<strong>do</strong>r. Em reforço, a<br />

impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> purgação da mora não está em sintonia com o princípio da conservação <strong>do</strong>s negócios jurídicos, segun<strong>do</strong> o qual a<br />

extinção <strong>do</strong>s pactos <strong>de</strong>ve ser a última medida a ser tomada, mormente diante <strong>de</strong> sua inegável função social, preservan<strong>do</strong>-se ao<br />

máximo a autonomia privada.<br />

Seguin<strong>do</strong> na abordagem <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, o § 3º <strong>do</strong> art. 54 <strong>do</strong> CDC <strong>de</strong>termina que os instrumentos respectivos serão<br />

redigi<strong>do</strong>s em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo <strong>do</strong>ze, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a<br />

facilitar sua compreensão pelo consumi<strong>do</strong>r. A menção ao tamanho da letra foi introduzida pela Lei 11.785/2008, diante <strong>de</strong> alguns<br />

abusos cometi<strong>do</strong>s na prática. Todavia, contata-se que, se a boa educação contratual existisse no Brasil, a norma seria até<br />

<strong>de</strong>snecessária.<br />

O preceito está sincroniza<strong>do</strong> com o outrora estuda<strong>do</strong> art. 46 da Lei Consumerista, que enuncia a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusulas<br />

ininteligíveis ou incompreensíveis. Ilustran<strong>do</strong>, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça enten<strong>de</strong>u que o contrato <strong>de</strong> seguro médico-hospitalar<br />

que assume a forma <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são <strong>de</strong>ve vir redigi<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma clara, a possibilitar o seu entendimento pelo a<strong>de</strong>rente leigo.<br />

Eventualmente, em caso <strong>de</strong> dúvidas, a interpretação <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong>ve ser feita da maneira mais propícia ao consumi<strong>do</strong>r (STJ – REsp<br />

311509/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Sálvio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong> Teixeira – j. 03.05.2001 – DJ 25.06.2001, p. 196).<br />

Sem prejuízo <strong>de</strong>sse preceito, preconiza o § 4º <strong>do</strong> art. 54 <strong>do</strong> CDC que as cláusulas que implicarem limitação <strong>de</strong> direito <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r inseridas em contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são <strong>de</strong>verão ser redigidas com <strong>de</strong>staque, permitin<strong>do</strong> sua imediata e fácil compreensão.<br />

Deve ficar claro que o preceito não afasta a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se reconhecer que a cláusula é nula por abusivida<strong>de</strong>, nos termos <strong>do</strong> art.<br />

51 da mesma norma. Fazen<strong>do</strong> incidir a primeira regra, sem prejuízo <strong>de</strong> outras <strong>de</strong>cisões, vejamos julga<strong>do</strong> publica<strong>do</strong> no recente<br />

Informativo n. 463 <strong>do</strong> STJ:<br />

“Cláusula limitativa. Cobertura. Seguro. Valida<strong>de</strong>. Foi celebra<strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> seguro <strong>de</strong> vida e, apenas quan<strong>do</strong> da entrega <strong>do</strong> manual,<br />

envia<strong>do</strong> após a assinatura da proposta, é que foi informada ao segura<strong>do</strong> a cláusula restritiva <strong>de</strong> direito. Assim, a Turma <strong>de</strong>u<br />

provimento ao recurso por enten<strong>de</strong>r afronta<strong>do</strong> o art. 54, § 4º, <strong>do</strong> CDC, uma vez que a cláusula restritiva <strong>de</strong> direitos <strong>de</strong>veria ter si<strong>do</strong><br />

informada <strong>de</strong> forma clara e precisa, no momento da contratação. É inegável que a conduta da recorrida malferiu o princípio da boa-fé<br />

contratual consigna<strong>do</strong> não apenas no CDC, mas também no CC/2002. Prece<strong>de</strong>nte cita<strong>do</strong>: REsp 485.760-RJ, DJ 1º.03.2004” (STJ –<br />

REsp 1.219.406-MG – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 15.02.2011).<br />

A findar este capítulo, cumpre refazer um esclarecimento categórico importante. Infelizmente, como outrora exposto, há certa<br />

confusão na <strong>do</strong>utrina e jurisprudência entre os conceitos <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> consumo e contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. De fato, tais categorias<br />

muitas vezes não se i<strong>de</strong>ntificam e não <strong>de</strong>vem ser confundidas. Isso porque o conceito <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> consumo é retira<strong>do</strong> da análise<br />

<strong>do</strong>s arts. 2º e 3º da Lei 8.078/1990, que apontam os elementos da relação jurídica <strong>de</strong> consumo (Capítulo 3 <strong>de</strong>sta obra). Por outra via,<br />

o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são é aquele em que as cláusulas contratuais são predispostas por uma das partes, <strong>de</strong> forma plena ou restrita,<br />

restan<strong>do</strong> à outra a opção <strong>de</strong> aceitá-las ou não.<br />

Vale lembrar: nem to<strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> consumo é <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são e nem to<strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são é <strong>de</strong> consumo. Nesse senti<strong>do</strong>, foi<br />

aprovada a nossa proposta <strong>de</strong> enuncia<strong>do</strong> na III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral em <strong>de</strong>zembro<br />

<strong>de</strong> 2004, segun<strong>do</strong> a qual “o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, menciona<strong>do</strong> nos arts. 423 e 424 <strong>do</strong> novo Código Civil, não se confun<strong>de</strong> com o<br />

contrato <strong>de</strong> consumo” (Enuncia<strong>do</strong> n. 171).<br />

Visualizan<strong>do</strong> em termos práticos, exemplifica-se com uma situação em que uma pessoa adquire um tapete. Ela vai até uma loja<br />

especializada e discute to<strong>do</strong>s os termos <strong>do</strong> contrato, barganhan<strong>do</strong> o preço e impon<strong>do</strong> até mesmo a data <strong>de</strong> entrega, celebran<strong>do</strong> para<br />

tanto um instrumento sob forma escrita. Essa pessoa é consumi<strong>do</strong>ra, pois é <strong>de</strong>stinatária fática e econômica <strong>do</strong> tapete, mas o contrato<br />

assumiu a forma paritária. Aplica-se to<strong>do</strong> o Código Consumerista, com exceção <strong>do</strong> que consta <strong>do</strong> seu art. 54.<br />

Repisan<strong>do</strong> outro exemplo, em situação oposta, vejamos o caso <strong>de</strong> um contrato <strong>de</strong> franchising, ou franquia. O franquea<strong>do</strong> recebe<br />

toda a estrutura <strong>do</strong> franquea<strong>do</strong>r, que ce<strong>de</strong> inclusive o direito <strong>de</strong> utilização da marca. Nesse contrato, observa-se que o franquea<strong>do</strong><br />

recebe to<strong>do</strong> o conteú<strong>do</strong> da avença não como <strong>de</strong>stinatário final – seja fático ou econômico –, mas como intermediário, para repassar<br />

aos consumi<strong>do</strong>res finais, que irão adquirir seus produtos ou serviços. Esse contrato, obviamente, não assume a forma <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong><br />

consumo, mas, na prática, é contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, eis que o franquea<strong>do</strong>r impõe to<strong>do</strong> o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> pacto. O franquea<strong>do</strong>, assim, não<br />

terá a seu favor a proteção <strong>do</strong> CDC, mas apenas a proteção prevista <strong>do</strong> CC/2002 em prol <strong>do</strong> a<strong>de</strong>rente (arts. 423 e 424).<br />

Aplican<strong>do</strong> essa diferenciação categórica, da jurisprudência superior, recente aresto <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong>bateu a<br />

valida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusula compromissória <strong>de</strong> arbitragem inserida em contrato <strong>de</strong> franquia. Nos termos <strong>do</strong> aresto, a nulida<strong>de</strong> não se daria<br />

pela incidência <strong>do</strong> CDC, mas por interpretação <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 4º da Lei <strong>de</strong> Arbitragem.<br />

Conforme o <strong>de</strong>cisum, “o contrato <strong>de</strong> franquia, por sua natureza, não está sujeito às regras protetivas previstas no CDC, pois não<br />

há relação <strong>de</strong> consumo, mas <strong>de</strong> fomento econômico. To<strong>do</strong>s os contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, mesmo aqueles que não consubstanciam


elações <strong>de</strong> consumo, como os contratos <strong>de</strong> franquia, <strong>de</strong>vem observar o disposto no art. 4º, § 2º, da Lei 9.307/96. O Po<strong>de</strong>r Judiciário<br />

po<strong>de</strong>, nos casos em que prima facie é i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong> um compromisso arbitral ‘patológico’, i.e., claramente ilegal, <strong>de</strong>clarar a nulida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ssa cláusula, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> em que se encontre o procedimento arbitral” (STJ – REsp 1.602.076/SP – Terceira<br />

Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 15.09.2016 – DJe 30.09.2016). Na opinio <strong>de</strong>ste autor, o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> acórdão é preciso e<br />

correto.<br />

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1 ASCENSÃO, José <strong>de</strong> Oliveira. <strong>Direito</strong> civil – teoria geral. 2. ed. Coimbra: Coimbra, 2003. v. II: Acções e factos jurídicos. p. 432.<br />

PEREIRA, Caio Mário da Silva. <strong>Direito</strong> civil: alguns aspectos da sua evolução. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2001. p. 225.<br />

MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 5. ed. São Paulo: RT, 2006. p. 92.<br />

MACEDO JR., Ronal<strong>do</strong>. Contratos relacionais. 2. ed. São Paulo: RT, 2006.<br />

MACEDO JR., Ronal<strong>do</strong>. Contratos relacionais. 2. ed. São Paulo: RT, 2006. p. 5.<br />

Como se extrai da clássica <strong>de</strong> obra <strong>de</strong> Washington <strong>de</strong> Barros Monteiro, que enten<strong>de</strong> que o Código Civil Brasileiro <strong>de</strong> 1916 fez bem ao não<br />

conceituar ao contrato (Curso <strong>de</strong> direito civil – 2ª parte. 34. ed. Atual. por Carlos Alberto Dabus Maluf e Regina Beatriz Tavares da Silva.<br />

São Paulo: Saraiva, 2004. v. 5: <strong>Direito</strong> das Obrigações. p. 4).<br />

Sobre os princípios <strong>do</strong> Código Civil brasileiro <strong>de</strong> 2002: REALE, Miguel. Estrutura e espírito <strong>do</strong> novo Código Civil Brasileiro. História <strong>do</strong> novo<br />

Código Civil. São Paulo: RT, 2005.<br />

GOMES, Orlan<strong>do</strong>. Contratos. 17. ed. Atual. e notas <strong>de</strong> Humberto Theo<strong>do</strong>ro Júnior. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 1996. p. 5.<br />

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Teoria geral <strong>do</strong>s contratos típicos e atípicos. São Paulo: Atlas, 2002. p. 21.<br />

CIAN, Giorgio; TRABUCCHI, Alberto. Commentario breve al Codice Civile. 4. ed. Pa<strong>do</strong>va: Cedam, 1992. p. 1.042.<br />

NALIN, Paulo. Do contrato: conceito pós-mo<strong>de</strong>rno. Curitiba: Juruá, 2005. p. 255.<br />

Sobre o tema <strong>de</strong> aplicação <strong>do</strong>s direitos fundamentais constitucionais nas relações privadas, valem como consulta as obras <strong>de</strong> <strong>Daniel</strong><br />

Sarmento (<strong>Direito</strong>s fundamentais e relações privadas. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2004) e <strong>de</strong> Ingo Wolfgang Sarlet (A influência <strong>do</strong>s<br />

direitos fundamentais no direito priva<strong>do</strong>: o caso brasileiro. Separata da obra <strong>Direito</strong>s fundamentais e direito priva<strong>do</strong> – uma perspectiva<br />

<strong>de</strong> direito compara<strong>do</strong>. Coimbra: Almedina, 2006).<br />

GOMES, Orlan<strong>do</strong>. Contratos. 26. ed. Atual. por Antonio Junqueira <strong>de</strong> Azeve<strong>do</strong> e Francisco Paulo <strong>de</strong> Crescenzo Marino. Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong><br />

Edval<strong>do</strong> Brito. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. p. 37.<br />

Sobre a supremacia da autonomia privada sobre a autonomia da vonta<strong>de</strong>, recomenda-se a leitura das obras <strong>de</strong> Francisco Amaral<br />

(<strong>Direito</strong> civil – introdução. 5. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 2003); Fernan<strong>do</strong> Noronha (O direito <strong>do</strong>s contratos e seus princípios<br />

fundamentais: autonomia privada, boa-fé, justiça contratual. São Paulo: Saraiva, 1994); Renan Lotufo (Código Civil comenta<strong>do</strong>. São<br />

Paulo: Saraiva, 2003. v. I e II); Luiz Díez-Picazo e Antonio Gullón (Sistema <strong>de</strong> <strong>de</strong>recho civil. 11. ed. Madrid: Tecnos, 2003. v. 1); Menezes<br />

Cor<strong>de</strong>iro (Trata<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito civil português – parte geral. 3. ed. Coimbra: Almedina, 2005. t. I); Enzo Roppo (O contrato. Coimbra:<br />

Almedina, 1988); Álvaro Villaça Azeve<strong>do</strong> (Contratos inomina<strong>do</strong>s ou atípicos e negócio fiduciário. 3. ed. Belém: CEJUP, 1988); e Giselda<br />

Maria Fernan<strong>de</strong>s Novaes Hironaka (Contratos atípicos e contratos coliga<strong>do</strong>s: características fundamentais e <strong>de</strong>ssemelhança. <strong>Direito</strong><br />

civil – estu<strong>do</strong>s. Belo Horizonte: Del Rey, 2000. p. 135-143).<br />

Conceito inspira<strong>do</strong> em Fernan<strong>do</strong> Noronha e <strong>Daniel</strong> Sarmento, constante em obra escrita em coautoria com Giselda Maria Fernan<strong>de</strong>s<br />

Novaes Hironaka (HIRONAKA, Giselda Maria Fernan<strong>de</strong>s Novaes; TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. O princípio da autonomia privada e o direito<br />

contratual brasileiro. In: HIRONAKA, Giselda Maria Fernan<strong>de</strong>s Novaes; TARTUCE, <strong>Flávio</strong> (Coord.). <strong>Direito</strong> contratual: temas atuais. São<br />

Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2008. p. 45-50).<br />

NORONHA, Fernan<strong>do</strong>. O direito <strong>do</strong>s contratos e seus princípios fundamentais: autonomia privada, boa-fé, justiça contratual, cit., p. 113.<br />

DÍEZ-PICAZO, Luiz; GULLÓN, Antonio Gullón. Sistema <strong>de</strong> <strong>de</strong>recho civil. 11. ed. Madrid: Tecnos, 2003. v. 1, p. 379.<br />

PENTEADO, Luciano <strong>de</strong> Camargo. Efeitos contratuais perante terceiros. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 89.<br />

Sobre o tema, ver: TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. <strong>Direito</strong> civil. Volume 4. <strong>Direito</strong> das Coisas. São Paulo: GEN/Méto<strong>do</strong>, 2014. Capítulo 1.<br />

BOBBIO, Norberto; PONTARA, Giulliano; VECA, Salvatore. Crise <strong>de</strong> la <strong>de</strong>mocrazia e neocontrattualismo. Roma: Editora Riuniti, 1984.<br />

ALARCÃO, Rui. Menos leis, melhores leis. Revista Brasileira <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Compara<strong>do</strong>, Rio <strong>de</strong> Janeiro: Instituto <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Compara<strong>do</strong> Lusobrasileiro,<br />

n. 31, p. 2, 2009.<br />

ALARCÃO, Rui. Menos leis, melhores leis. Revista Brasileira <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Compara<strong>do</strong>, Rio <strong>de</strong> Janeiro: Instituto <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Compara<strong>do</strong> Lusobrasileiro,<br />

n. 31, p. 4.<br />

ALARCÃO, Rui. Menos leis, melhores leis. Revista Brasileira <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Compara<strong>do</strong>, Rio <strong>de</strong> Janeiro: Instituto <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Compara<strong>do</strong> Lusobrasileiro,<br />

n. 31, p. 8.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, inspira<strong>do</strong> na <strong>do</strong>utrina <strong>de</strong> Paulo Lôbo, o trabalho <strong>de</strong> Rodrigo Toscano <strong>de</strong> Brito, fruto <strong>de</strong> sua tese <strong>de</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> <strong>de</strong>fendida<br />

na PUCSP (BRITO, Rodrigo Toscano <strong>de</strong>. Equivalência material <strong>do</strong>s contratos. Civil, empresariais e <strong>de</strong> consumo. São Paulo: Saraiva, 2007).


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Conforme exposição realizada no I Encontro Regional da Associação <strong>do</strong>s Advoga<strong>do</strong>s <strong>de</strong> São Paulo, em Campinas, no dia 12 <strong>de</strong> março <strong>de</strong><br />

2010, em painel sobre <strong>Direito</strong> Civil, que contou com a mediação <strong>do</strong> presente autor.<br />

Por to<strong>do</strong>s os civilistas, menciona<strong>do</strong> a teoria da imprevisão como fundamento: AZEVEDO, Álvaro Villaça. O novo Código Civil brasileiro:<br />

tramitação; função social <strong>do</strong> contrato; boa-fé objetiva; teoria da imprevisão e, em especial, onerosida<strong>de</strong> excessiva – “Laesio enormis”.<br />

In: DELGADO, Mário Luiz; ALVES, Jones Figueirê<strong>do</strong>. Questões controvertidas no novo Código Civil. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2004. vol. 2;<br />

DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 302-303; VENOSA, Silvio <strong>de</strong> Salvo. Código Civil<br />

Interpreta<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2011. p. 395.<br />

A respeito <strong>de</strong> tais dificulda<strong>de</strong>s, ver: TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. <strong>Direito</strong> Civil. 6. ed. São Paulo: GEN/Méto<strong>do</strong>, 2011. v. 3: Teoria geral <strong>do</strong>s contratos e<br />

contratos em espécie. Capítulo 4.<br />

A afirmação <strong>de</strong> ter si<strong>do</strong> a<strong>do</strong>tada a teoria da imprevisão pelo CDC po<strong>de</strong> ser encontrada em: FILOMENO, José Geral<strong>do</strong> Brito. 9. ed. Manual<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Atlas, 2007. p. 207-209.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 146-147.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 912-913.<br />

KHOURI, Paulo R. Roque. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 93-94.<br />

ALMEIDA, João Batista <strong>de</strong>. Resolução e revisão <strong>do</strong>s contratos. In: PFEIFFER, Roberto. A. C.; PASQUALOTTO, Adalberto (cords.). Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e o Código Civil <strong>de</strong> 2002. Convergências e assimetrias. São Paulo: RT, 2005. p. 242-243.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 279.<br />

LARENZ, Karl. Base <strong>de</strong>l negocio jurídico y cumplimiento <strong>de</strong> los contratos. Trad. Carlos Fernandéz Rodríguez. Granada: Comares, 2002.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 71.<br />

NEGREIROS, Teresa. Teoria <strong>do</strong> contrato. Novos paradigmas. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 2002. p. 206.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIM, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 866.<br />

MORAIS, Ezequiel; PODESTÁ, Fábio Henrique; e CARAZAI, Marcos Marins. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r Comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT,<br />

2010. p. 234-238.<br />

NERY JR., Nelson. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 548.<br />

MENEZES CORDEIRO, António Manuel da Rocha e. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2001. Trata-se da obra <strong>de</strong>finitiva a<br />

respeito <strong>do</strong> tema, uma tese <strong>de</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> <strong>de</strong>fendida na clássica Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Lisboa, com cerca <strong>de</strong> 1.300 páginas.<br />

SIMÃO, José Fernan<strong>do</strong>. <strong>Direito</strong> civil. Contratos. (Série Leituras Jurídicas). 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 38.<br />

DUARTE, Ronnie Preuss. A cláusula geral da boa-fé no novo Código Civil brasileiro. In: DELGADO, Mário Luiz; ALVES, Jones Figueirê<strong>do</strong>.<br />

Questões controvertidas no novo Código Civil. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2004. v. 2, p. 399.<br />

GODOY, Cláudio Luiz Bueno <strong>de</strong>. Função social <strong>do</strong> contrato. De acor<strong>do</strong> com o novo Código Civil. (Coleção Prof. Agostinho Alvim). São<br />

Paulo: Saraiva, 2004. p. 87-94.<br />

GODOY, Cláudio Luiz Bueno <strong>de</strong>. Função social <strong>do</strong> contrato. De acor<strong>do</strong> com o novo Código Civil. (Coleção Prof. Agostinho Alvim). São<br />

Paulo: Saraiva, 2004. p. 88.<br />

SIMÃO, José Fernan<strong>do</strong>. <strong>Direito</strong> civil. Contratos. (Série Leituras Jurídicas). 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>: ZANETTI, Cristiano <strong>de</strong> Souza. Responsabilida<strong>de</strong> pela ruptura das negociações. São Paulo: Juarez <strong>de</strong> Oliveira, 2005. p. 112-<br />

114.<br />

DÍEZ-PICAZO, Luis. La <strong>do</strong>ctrina <strong>de</strong> los propios actos. Barcelona: Editorial Bosch, 1963.<br />

SCHREIBER, An<strong>de</strong>rson. A proibição <strong>do</strong> comportamento contraditório. Tutela <strong>de</strong> confiança e venire contra factum proprium. Rio <strong>de</strong> Janeiro:<br />

Renovar, 2005. p. 124.<br />

Sobre o tema, da jurista: FRADERA, Vera Jacob. Po<strong>de</strong> o cre<strong>do</strong>r ser insta<strong>do</strong> a diminuir o próprio prejuízo? Revista Trimestral <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil,<br />

Rio <strong>de</strong> Janeiro: Padma, v. 19, 2004.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 911.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 944.<br />

GOMIDE, Alexandre Junqueira. <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> arrependimento nos contratos <strong>de</strong> consumo. São Paulo: Almedina, 2014. p. 146-147.<br />

GOMIDE, Alexandre Junqueira. <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> arrependimento nos contratos <strong>de</strong> consumo. São Paulo: Almedina, 2014. p. 148.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 944.<br />

NERY JR, Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil Comenta<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, p. 945.


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RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 574-575.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 574-575.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 930.<br />

MORAIS, Ezequiel; PODESTÁ, Fábio Henrique; e CARAZAI, Marcos Marins. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r Comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT,<br />

2010. p. 245.<br />

DINIZ, Maria Helena. Código Civil anota<strong>do</strong>. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 382.<br />

SCHMITT, Cristiano Heineck. Cláusulas abusivas nas relações <strong>de</strong> consumo. 2. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 142.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 944-949.<br />

KHOURI, Paulo R. Roque A. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 105.<br />

NERY JR., Nelson. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária,<br />

2004. p. 566-567.<br />

NERY JR., Nelson. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária,<br />

2004. p. 566-567.<br />

NERY JR., Nelson. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária,<br />

2004. p. 572-573; MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010, p. 256-257.<br />

MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 253.<br />

CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo. Um comentário à Lei 9.307/1996. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 51.<br />

Conclusões retiradas <strong>de</strong>: TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 949; MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 253-245.<br />

MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 255.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 596.<br />

MORAIS, Ezequiel; PODESTÁ, Fábio Henrique; e CARAZAI, Marcos Marins. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r Comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT,<br />

2010. p. 251.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 955.<br />

PIVA, Rui Carvalho. Bem ambiental. São Paulo: Max Limonad, 2000. p. 114.<br />

PIVA, Rui Carvalho. Bem ambiental, cit., p. 114.<br />

Ver: BARROSO, Lucas Abreu. Novas fronteiras da obrigação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar e da <strong>de</strong>terminação da responsabilida<strong>de</strong> civil. In: DELGADO,<br />

Mário Luiz; ALVES, Jones Figueirê<strong>do</strong> (Coord.). Questões controvertidas no novo Código Civil. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2006. v. 5:<br />

Responsabilida<strong>de</strong> civil, p. 365.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>: LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente e responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> proprietário: análise <strong>do</strong> nexo causal. São Paulo: RT,<br />

2008. p. 96.<br />

NERY JR., Nelson. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária,<br />

2004. p. 563.<br />

NERY JR., Nelson. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária,<br />

2004. p. 563.<br />

SCHMITT, Cristiano Heineck. Cláusulas abusivas nas relações <strong>de</strong> consumo. 2. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 145.<br />

Como enten<strong>de</strong>m, por to<strong>do</strong>s, Claudia Lima Marques, Herman Benjamin e Bruno Miragem (Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 958).<br />

Veja-se: NEIVA, Gerival<strong>do</strong>. A Súmula 381 <strong>do</strong> STJ. Um ato falho? Disponível em:<br />

. Acesso em: 1º maio 2011;<br />

GAGLIANO, Pablo Stolze; VIANA, Salomão. É sempre veda<strong>do</strong> ao julga<strong>do</strong>r conhecer, <strong>de</strong> ofício, da abusivida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusulas em contrato<br />

bancário? Reflexões sobre a Súmula 381 <strong>do</strong> STJ. Disponível em:<br />

. Acesso em: 1º maio 2011.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 941.<br />

MIRAGEM, Bruno. Pela autorida<strong>de</strong> e coerência <strong>do</strong> direito. Súmula 381 <strong>do</strong> STJ <strong>de</strong>ve ser revisada. Disponível em:<br />

. Acesso em:


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13 nov. 2016.<br />

MIRAGEM, Bruno. Pela autorida<strong>de</strong> e coerência <strong>do</strong> direito. Súmula 381 <strong>do</strong> STJ <strong>de</strong>ve ser revisada. Disponível em:<br />

. Acesso em:<br />

13 nov. 2016.<br />

MORAIS, Ezequiel; PODESTÁ, Fábio Henrique; e CARAZAI, Marcos Marins. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r Comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT,<br />

2010. p. 254.<br />

TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. A função social <strong>do</strong>s contratos. Do Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r ao Novo Código Civil. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2005;<br />

TARTUCE, <strong>Flávio</strong>. A função social <strong>do</strong>s contratos. Do Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r ao Código Civil <strong>de</strong> 2002. 2. ed. São Paulo:<br />

Méto<strong>do</strong>, 2007.<br />

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Ro<strong>do</strong>lfo. Novo curso <strong>de</strong> direito civil. Teoria geral das obrigações. 8. ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2007. v. II, p. 300.<br />

SIMÃO, José Fernan<strong>do</strong>. Cláusula Penal e Abono <strong>de</strong> Pontualida<strong>de</strong> ou Cláusula Penal e Cláusula Penal disfarçada. Disponível em:<br />

http://www.professorsimao.com.br/artigos_simao_cf1109.html>. Acesso em: 2 maio 2011.<br />

Os enuncia<strong>do</strong>s <strong>do</strong>utrinários aprova<strong>do</strong>s na IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil são <strong>de</strong> Christiano Cassettari (Multa contratual. Teoria e prática. São<br />

Paulo: RT, 2009). Com a mesma conclusão, ver: DINIZ, Maria Helena. Código Civil anota<strong>do</strong>. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 359;<br />

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Ro<strong>do</strong>lfo. Novo curso <strong>de</strong> direito civil. Teoria geral das obrigações. 8. ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2007. v. II, p. 324.<br />

SILVA, Jorge Cesa Ferreira da. Inadimplemento das obrigações São Paulo: RT, 2006. p. 273.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIM, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 1.051.<br />

CARPENA, Heloísa. Contornos atuais <strong>do</strong> superendividamento. Temas <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 233.<br />

FIUZA, Ricar<strong>do</strong>. O novo Código Civil e as propostas <strong>de</strong> aperfeiçoamento. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 77.<br />

GOMES, Orlan<strong>do</strong>. Contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são: condições gerais <strong>do</strong>s contratos, São Paulo: RT, 1972. p. 3.<br />

DINIZ, Maria Helena. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil Brasileiro. Teoria geral das obrigações contratuais e extracontratuais. 25. ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2009. p. 87.<br />

GOMES, Orlan<strong>do</strong>. Contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são: condições gerais <strong>do</strong>s contratos, São Paulo: RT, 1972. p. 120.


A PROTEÇÃO QUANTO À OFERTA E À<br />

PUBLICIDADE NO CÓDIGO DE DEFESA DO<br />

CONSUMIDOR<br />

Sumário: 6.1. Panorama geral sobre a tutela da informação e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – 6.2. A força<br />

vinculativa da oferta no art. 30 da Lei 8.078/1990 – 6.3. O conteú<strong>do</strong> da oferta e a manutenção <strong>de</strong> sua integralida<strong>de</strong><br />

– 6.4. A responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva e solidária <strong>de</strong>corrente da oferta – 6.5. A publicida<strong>de</strong> no Código <strong>de</strong> Defesa<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Princípios informa<strong>do</strong>res. publicida<strong>de</strong>s vedadas ou ilícitas: 6.5.1. A vedação da publicida<strong>de</strong><br />

mascarada, clan<strong>de</strong>stina, simulada ou dissimulada (art. 36 <strong>do</strong> CDC); 6.5.2. A vedação da publicida<strong>de</strong> enganosa (art.<br />

37, § 1º, <strong>do</strong> CDC); 6.5.3. A vedação da publicida<strong>de</strong> abusiva (art. 37, § 2º, <strong>do</strong> CDC) – 6.6. O ônus da prova da<br />

veracida<strong>de</strong> da informação publicitária.<br />

6.1.<br />

PANORAMA GERAL SOBRE A TUTELA DA INFORMAÇÃO E O CÓDIGO DE<br />

DEFESA DO CONSUMIDOR<br />

Como restou claro pela leitura <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os capítulos <strong>de</strong>ste livro até o momento, o Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

tem um cuida<strong>do</strong> especial em relação à valorização da boa-fé objetiva e da aparência, trazen<strong>do</strong> um <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> mais concreto e<br />

efetivo, e menos formaliza<strong>do</strong>. Tal caminho <strong>de</strong> escolha fica evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong>, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, pelo presente capítulo, pelo estu<strong>do</strong> da<br />

proteção relativa à oferta e à publicida<strong>de</strong>.<br />

Além da relação com o princípio da boa-fé objetiva, repise-se que o amplo amparo relativo à oferta interage com o princípio<br />

da transparência ou da confiança. Como consta <strong>do</strong> Capítulo 2 <strong>de</strong>sta obra, o mun<strong>do</strong> contemporâneo é caracteriza<strong>do</strong> pela enorme<br />

velocida<strong>de</strong> e volume crescente <strong>de</strong> informações, armas <strong>de</strong> sedução utilizadas pelos fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res para atraírem os<br />

consumi<strong>do</strong>res à aquisição <strong>de</strong> produtos e serviços. O tópico relativo ao tema no CDC (arts. 30 a 38) serve para proteger o<br />

vulnerável negocial, exposto a tais artifícios <strong>de</strong> atração. Lembre-se, igualmente, que, com o passar <strong>do</strong>s tempos, novas informações<br />

surgiram, o que não significa que houve a distribuição igualitária <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s entre as pessoas, eis que tais informações ficam<br />

inicialmente em po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> uma parcela <strong>de</strong> indivíduos, os hiperssuficientes da relação jurídica.<br />

Deve ser esclareci<strong>do</strong> que o termo oferta é genérico, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser visto em senti<strong>do</strong> amplo (lato sensu), a englobar qualquer<br />

forma <strong>de</strong> comunicação ou transmissão da vonta<strong>de</strong> que visa a seduzir ou a atrair o consumi<strong>do</strong>r para a aquisição <strong>de</strong> bens. A<br />

construção, portanto, inclui a publicida<strong>de</strong>, principal artifício utiliza<strong>do</strong> para fins <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> serviços ou fornecimento <strong>de</strong><br />

produtos. Nesse contexto <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição, vejamos as palavras ilustrativas <strong>de</strong> Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery:<br />

“Conceito <strong>de</strong> oferta. Denomina-se oferta qualquer informação ou publicida<strong>de</strong> sobre preços e condições <strong>de</strong> produtos ou serviços,<br />

suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma. Po<strong>de</strong> haver oferta por anúncio ou informação em vitrine, gôn<strong>do</strong>la <strong>de</strong><br />

supermerca<strong>do</strong>s, jornais, revistas, rádio, televisão, cinema, Internet, vi<strong>de</strong>otexto, fax, telex, catálogo, mala-direta, telemarketing,<br />

out<strong>do</strong>ors, cardápios <strong>de</strong> restaurantes, lista <strong>de</strong> preços, guias <strong>de</strong> compras, prospectos, folhetos, panfletos etc.”.1<br />

Do ponto <strong>de</strong> vista técnico-terminológico, não se po<strong>de</strong> confundir a publicida<strong>de</strong>, que tem fins <strong>de</strong> consumo e <strong>de</strong> circulação <strong>de</strong>


iquezas, com a propaganda, que tem finalida<strong>de</strong>s políticas, i<strong>de</strong>ológicas ou sociais. Isso, apesar da existência <strong>de</strong> alguns<br />

<strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res que enten<strong>de</strong>m que as expressões são sinônimas <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista jurídico, caso <strong>de</strong> Rizzatto Nunes. 2 Anote-se que<br />

também no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça po<strong>de</strong>m ser encontradas <strong>de</strong>cisões enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> pela sinonímia entre os termos (veja-se, sem<br />

prejuízo <strong>de</strong> outros acórdãos que ainda serão transcritos: REsp 1.151.688/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j.<br />

17.02.2011 – DJe 22.02.2011; e STJ – REsp 1057828/SP – Segunda Turma – Rel. Min. Eliana Calmon – j. 02.09.2010 – DJe<br />

27.09.2010).<br />

Para os corretos fins <strong>de</strong> distinção, como bem esclarece Antonio Herman Benjamim, “Os termos publicida<strong>de</strong> e propaganda são<br />

utiliza<strong>do</strong>s indistintamente no Brasil. Não foi esse, contu<strong>do</strong>, o caminho a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Não se<br />

confun<strong>de</strong>m publicida<strong>de</strong> e propaganda, embora, no dia a dia <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, os <strong>do</strong>is termos sejam utiliza<strong>do</strong>s um pelo outro. A<br />

publicida<strong>de</strong> tem um objetivo comercial, enquanto a propaganda visa a um fim i<strong>de</strong>ológico, religioso, filosófico, político, econômico<br />

ou social. Fora isso, a publicida<strong>de</strong>, além <strong>de</strong> paga, i<strong>de</strong>ntifica seu patrocina<strong>do</strong>r, o que nem sempre ocorre com a propaganda”.3 As<br />

diferenças apontadas constam <strong>do</strong> quadro a seguir:<br />

Publicida<strong>de</strong><br />

Tem fins comerciais, <strong>de</strong> consumo e circulação <strong>de</strong><br />

riquezas.<br />

Envolve uma remuneração direta, diante <strong>de</strong> seu intuito<br />

<strong>de</strong> lucro.<br />

Tem sempre um patrocina<strong>do</strong>r.<br />

Exemplo: anúncio publicitário <strong>de</strong> uma loja <strong>de</strong><br />

eletro<strong>do</strong>mésticos ou <strong>de</strong> uma monta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> veículos.<br />

Propaganda<br />

Tem fins políticos, sociais, culturais e i<strong>de</strong>ológicos.<br />

Não tem intuito <strong>de</strong> lucro.<br />

Nem sempre tem um patrocina<strong>do</strong>r.<br />

Exemplo: propaganda <strong>do</strong> governo para uso <strong>de</strong><br />

preservativo no carnaval.<br />

A partir <strong>do</strong> quadro exposto, constata-se, como outro exemplo prático, que, como não há propaganda para os fins <strong>de</strong> venda <strong>de</strong><br />

produtos ou serviços, não existe a figura <strong>do</strong> “garoto propaganda”, sen<strong>do</strong> o termo correto “garoto publicida<strong>de</strong>”.<br />

Feitos tais esclarecimentos, cumpre <strong>de</strong>stacar que a oferta e a publicida<strong>de</strong> envolvem a formação <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> consumo,<br />

notadamente a sua fase pré-contratual. Nesse contexto, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, ao contrário <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002<br />

(arts. 427 a 435 e 462 a 466), não especifica, com riqueza <strong>de</strong> <strong>de</strong>talhes, regras quanto à formação <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> consumo. Isso faz<br />

com que seja possível, eventualmente, buscar socorro nas regras comuns <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> houver dúvida quanto à<br />

constituição da obrigação <strong>de</strong> natureza consumerista, particularmente ten<strong>do</strong> em vista a festejada teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes,<br />

normalmente invocada (diálogo <strong>de</strong> complementarida<strong>de</strong>). Essa interação entre as leis serve também para resolver os problemas<br />

relativos à formação <strong>do</strong>s contratos digitais ou eletrônicos, celebra<strong>do</strong>s pela internet.<br />

Vejamos as regras relativas ao tema no Código Consumerista, entre os arts. 30 a 38 da Lei 8.078/1990, sem prejuízo <strong>de</strong> outros<br />

regramentos igualmente aplicáveis à fase pré-negocial, ou seja, às tratativas iniciais para a formação <strong>do</strong> pacto <strong>de</strong> consumo.<br />

6.2.<br />

A FORÇA VINCULATIVA DA OFERTA NO ART. 30 DA LEI 8.078/1990<br />

O art. 30 da Lei Consumerista traz em seu conteú<strong>do</strong> os princípios da boa-fé objetiva e da transparência, ao vincular o produto,<br />

o serviço e o contrato ao meio <strong>de</strong> proposta e à publicida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> que a conduta proba <strong>de</strong>ve estar presente na fase précontratual<br />

<strong>do</strong> negócio <strong>de</strong> consumo. Enuncia o caput <strong>do</strong> coman<strong>do</strong> que “Toda informação ou publicida<strong>de</strong>, suficientemente precisa,<br />

veiculada por qualquer forma ou meio <strong>de</strong> comunicação com relação a produtos e serviços ofereci<strong>do</strong>s ou apresenta<strong>do</strong>s, obriga o<br />

fornece<strong>do</strong>r que a fizer veicular ou <strong>de</strong>la se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebra<strong>do</strong>”.<br />

Nas palavras <strong>do</strong> Ministro Herman Benjamin, o dispositivo traz um novo princípio, qual seja o princípio da vinculação, uma<br />

vez que o art. 30 <strong>do</strong> CDC dá caráter vinculante à informação e à publicida<strong>de</strong>, atuan<strong>do</strong> <strong>de</strong> duas maneiras: “primeiro, obrigan<strong>do</strong> o<br />

fornece<strong>do</strong>r, mesmo que se negue a contratar; segun<strong>do</strong>, introduzin<strong>do</strong>-se (e prevalecen<strong>do</strong>) em contrato eventualmente celebra<strong>do</strong>,<br />

inclusive quan<strong>do</strong> seu texto o diga <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> diverso, preten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> afastar o caráter vinculativo”.4 Dessa forma, para se efetivar a<br />

vinculação, cabem as medidas <strong>de</strong> tutela específica previstas para as obrigações <strong>de</strong> fazer e não fazer, caso da busca e apreensão e da<br />

fixação <strong>de</strong> multa ou astreintes (art. 84 <strong>do</strong> CDC e CPC). Preceitua o importante art. 35 <strong>do</strong> Código Consumerista que, se o<br />

fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos ou serviços recusar o cumprimento à oferta, apresentação ou publicida<strong>de</strong>, o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>rá,<br />

alternativamente e à sua livre escolha: a) exigir o cumprimento força<strong>do</strong> da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou


publicida<strong>de</strong>; b) aceitar outro produto ou prestação <strong>de</strong> serviço equivalente; c) rescindir o contrato, com direito à restituição <strong>de</strong><br />

quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos (resolução <strong>do</strong> negócio com a consequente<br />

responsabilização civil). Em suma, efetiva-se sobremaneira a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r fazer respeitar a palavra dada pelo<br />

fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r quan<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua oferta prévia.<br />

Deve ficar claro que, por uma questão <strong>de</strong> escolha principiológica, este autor prefere associar o art. 30 <strong>do</strong> CDC aos princípios<br />

da boa-fé e da função social <strong>do</strong> contrato (eficácia interna), sen<strong>do</strong> certo que a norma em comento representa uma das mais fortes<br />

mitigações da força obrigatória da convenção (pacta sunt servanda) em to<strong>do</strong> o sistema jurídico nacional. Nesse contexto, não há a<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> mais um princípio jurídico para justificar a norma, como preferem alguns juristas <strong>de</strong> escol.<br />

Constata-se que o art. 30 <strong>do</strong> CDC tem o condão <strong>de</strong> fazer prevalecer a oferta em relação às cláusulas contratuais. Então,<br />

simbologicamente, é como se o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> contrato fosse rasga<strong>do</strong> ou inutiliza<strong>do</strong> e <strong>de</strong>pois substituí<strong>do</strong> pelo teor da informação<br />

prestada quan<strong>do</strong> <strong>do</strong> início da contratação. Em outras palavras, to<strong>do</strong>s os elementos que compõem a oferta passam a integrar<br />

automaticamente o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> negócio celebra<strong>do</strong>.<br />

Fazen<strong>do</strong>-se o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> diálogo com o CC/2002, a força vinculativa da proposta consta <strong>do</strong> seu art. 427, sen<strong>do</strong> pertinente lembrar<br />

que são suas partes integrantes o proponente ou policitante – aquele que faz a proposta –, e o oblato ou policita<strong>do</strong> – aquele que<br />

recebe a proposta. Porém, ressalte-se que o texto priva<strong>do</strong> não tem expressamente toda a força vinculante <strong>do</strong> texto consumerista.<br />

Além disso, insta verificar que o Código Civil também trata da oferta ao público, no seu art. 429, dispon<strong>do</strong> o seu caput que “A<br />

oferta ao público equivale a proposta quan<strong>do</strong> encerra os requisitos essenciais ao contrato, salvo se o contrário resultar das<br />

circunstâncias ou <strong>do</strong>s usos”. Não restam dúvidas <strong>de</strong> que o último coman<strong>do</strong> foi fortemente influencia<strong>do</strong> pelo CDC, sen<strong>do</strong> possível<br />

aplicar as duas leis em muitas situações, como naquelas envolven<strong>do</strong> os contratos eletrônicos, em que há oferta geral <strong>de</strong> produtos ou<br />

serviços na web.<br />

De toda sorte, ressalve-se que o Código Civil <strong>de</strong> 2002 estabelece em seu art. 428 algumas hipóteses em a proposta não é<br />

obrigatória, não ten<strong>do</strong> força vinculativa. Como primeira exceção, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser obrigatória a proposta se, feita sem prazo a pessoa<br />

presente, não foi imediatamente aceita, o que é <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> contrato com <strong>de</strong>claração consecutiva (art. 428, inc. I, <strong>do</strong> CC).5<br />

Igualmente, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser obrigatória a proposta originária se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver <strong>de</strong>corri<strong>do</strong> tempo suficiente<br />

para chegar a resposta ao conhecimento <strong>do</strong> proponente, chama<strong>do</strong> contrato com <strong>de</strong>clarações intervaladas (art. 428, inc. II, <strong>do</strong> CC). 6<br />

Ato contínuo, a proposta não será obrigatória se, feita a pessoa ausente, não tiver si<strong>do</strong> expedida a resposta <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> prazo da<strong>do</strong><br />

(art. 428, inc. III, <strong>do</strong> CC). Por fim, a obrigatorieda<strong>de</strong> da proposta é afastada se, antes <strong>de</strong>la, ou simultaneamente a ela, chegar ao<br />

conhecimento <strong>do</strong> oblato a retratação feita <strong>do</strong> proponente (art. 428, inc. IV, <strong>do</strong> CC).<br />

Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, na opinião <strong>do</strong> presente autor, tais previsões não se coadunam com o profun<strong>do</strong> sistema <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong><br />

CDC, não se aplican<strong>do</strong> aos contratos <strong>de</strong> consumo. A<strong>de</strong>mais, os preceitos expostos têm remota origem, estan<strong>do</strong> supera<strong>do</strong>s, pois<br />

cria<strong>do</strong>s para uma outra realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comunicação. Na verda<strong>de</strong>, a diferenciação entre contratos entre presentes e entre ausentes que<br />

consta <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002 ainda leva em conta o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> contrato epistolar (por cartas), no que concerne à comunicação à<br />

distância. Por fim, ficam as palavras <strong>de</strong> Bruno Miragem, com base em Claudia Lima Marques, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> ter a oferta tratada<br />

pelo Código Civil a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> a teoria da vonta<strong>de</strong>, enquanto a oferta <strong>do</strong> CDC a<strong>do</strong>tou a teoria da <strong>de</strong>claração, o que justifica as<br />

diferenças <strong>de</strong> tratamento.7<br />

Supera<strong>do</strong>s tais diálogos, como não po<strong>de</strong>ria ser diferente, várias são as <strong>de</strong>corrências práticas <strong>do</strong> art. 30 da Lei 8.078/1990 na<br />

jurisprudência nacional, inclusive com a a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> medidas para fazer cumprir os exatos termos da oferta preliminar. Um <strong>do</strong>s<br />

principais exemplos envolve a hipótese em que as empresas <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> são obrigadas a cumprir o informa<strong>do</strong> pela mídia ou<br />

por instrumentos publicitários quanto à ausência <strong>de</strong> prazo <strong>de</strong> carência para a prestação serviços (plano carência zero). Vejamos<br />

duas das ementas que concluem <strong>de</strong>sse mo<strong>do</strong>:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Injusta recusa <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> permitir a internação <strong>de</strong> emergência <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, sob a alegação <strong>de</strong> que não havia si<strong>do</strong> ainda cumpri<strong>do</strong> o prazo <strong>de</strong> carência. Ainda que esteja registra<strong>do</strong> no contrato <strong>de</strong><br />

a<strong>de</strong>são a previsão <strong>de</strong> prazo <strong>de</strong> carência, a oferta veiculada ao consumi<strong>do</strong>r prevalece sobre as limitações previstas no contrato <strong>de</strong><br />

a<strong>de</strong>são. Incidência <strong>do</strong> disposto no art. 30 <strong>do</strong> CDC. Além disso, não merece prosperar o argumento <strong>do</strong> recorrente no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que o<br />

consumi<strong>do</strong>r teria agi<strong>do</strong> <strong>de</strong> má-fé ao omitir o fato <strong>de</strong> ser porta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> <strong>do</strong>ença preexistente. Aplicação da teoria <strong>do</strong> risco <strong>do</strong><br />

empreendimento, segun<strong>do</strong> o qual aquele que aufere os bônus tem que suportar os ônus. Se não teve o apelante o cuida<strong>do</strong> <strong>de</strong> saber<br />

com quem estava a contratar, ainda mais se for consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> o fato <strong>de</strong> ser o segura<strong>do</strong> tetraplégico e porta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiência mental,<br />

não ten<strong>do</strong> o mesmo, por óbvio, condições <strong>de</strong> ocultar seu peculiar e frágil esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, há <strong>de</strong> ser rechaçada a alegação <strong>de</strong> ter o<br />

mesmo agi<strong>do</strong> <strong>de</strong> má-fé no momento da contratação. À míngua <strong>de</strong> recurso por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ve restar mantida na íntegra a<br />

sentença atacada. Recurso conheci<strong>do</strong> e <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJRJ – Apelação 2009.001.19028, São Gonçalo – Décima Sétima Câmara<br />

Cível – Rel. Des. Maria Ines da Penha Gaspar – j. 22.04.2009 – DORJ 14.05.2009, p. 179).<br />

“Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Contrato <strong>de</strong> seguro-saú<strong>de</strong>. Responsabilização por <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> internação e tratamento. Ausência <strong>de</strong> exame


pré-admissional para avaliação <strong>de</strong> <strong>do</strong>enças preexistentes. Carência ‘zero’ difundida através da mídia. Prestação <strong>de</strong> serviços<br />

subordinada ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Sistema priva<strong>do</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, que complementa o público e assume os riscos sociais<br />

<strong>de</strong> seu mister. <strong>Direito</strong> absoluto à vida e à saú<strong>de</strong> que se sobrepõe ao direito obrigacional. Recurso não provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação<br />

Cível 104.633-4/SP – Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> <strong>de</strong> Julho/2000 – Rel. Juiz Carlos Stroppa – j. 01.08.2000, v. u.).<br />

Do mesmo mo<strong>do</strong>, se uma instituição <strong>de</strong> ensino vincula previamente a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>scontos em caso <strong>de</strong> matrículas em<br />

<strong>de</strong>termina<strong>do</strong> perío<strong>do</strong>, tal <strong>de</strong>claração passa a compor o contrato, caben<strong>do</strong> medidas concretas para a efetivação da publicida<strong>de</strong> (TJDF<br />

– Recurso 2009.04.1.002085-9 – Acórdão 497.239 – Quinta Turma Cível – Rel. Des. Angelo Passareli – DJDFTE 20.04.2011, p.<br />

108; TJDF – Recurso 2009.04.1.002471-6 – Acórdão 497.367 – Quinta Turma Cível – Rel. Des. Angelo Passareli – DJDFTE<br />

20.04.2011, p. 108; e TJDF – Recurso 2005.01.1.101420-8 – Acórdão 452.239 – Primeira Turma Cível – Rel. Des. Lécio Resen<strong>de</strong><br />

– DJDFTE 08.10.2010, p. 83).<br />

Do Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, merece <strong>de</strong>staque o acórdão que concluiu pela responsabilida<strong>de</strong> solidária, por vício <strong>de</strong><br />

qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> automóvel adquiri<strong>do</strong>, <strong>do</strong> fabricante <strong>de</strong> veículos automotores que participa <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong>, garantin<strong>do</strong> com a sua<br />

marca a excelência <strong>do</strong>s produtos oferta<strong>do</strong>s por reven<strong>de</strong><strong>do</strong>r <strong>de</strong> veículos usa<strong>do</strong>s. Conforme consta <strong>do</strong> aresto, publica<strong>do</strong> no<br />

Informativo n. 562 <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania, “o princípio da vinculação da oferta reflete a imposição da transparência e da boa-fé<br />

nos méto<strong>do</strong>s comerciais, na publicida<strong>de</strong> e nos contratos, <strong>de</strong> forma que esta exsurge como princípio máximo orienta<strong>do</strong>r, nos termos<br />

<strong>do</strong> art. 30 <strong>do</strong> CDC. Realmente, é inequívoco o caráter vinculativo da oferta, integran<strong>do</strong> o contrato, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que o fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong><br />

produtos ou serviços se responsabiliza também pelas expectativas que a publicida<strong>de</strong> venha a <strong>de</strong>spertar no consumi<strong>do</strong>r, mormente<br />

quan<strong>do</strong> veicula informação <strong>de</strong> produto ou serviço com a chancela <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada marca. Trata-se <strong>de</strong> materialização <strong>do</strong> princípio<br />

da boa-fé objetiva, exigin<strong>do</strong> <strong>do</strong> anunciante os <strong>de</strong>veres anexos <strong>de</strong> lealda<strong>de</strong>, confiança, cooperação, proteção e informação, sob pena<br />

<strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>” (STJ – REsp. 1.365.609/SP – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 28.04.2015 – DJe 25.05.2015). A questão<br />

relativa à responsabilida<strong>de</strong> solidária que surge da vinculação da oferta ainda será aprofundada no presente capítulo.<br />

A obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> respeito à oferta <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconto igualmente é aplicada contra empresas <strong>de</strong> telefonia, caben<strong>do</strong> as medidas<br />

<strong>de</strong>scritas no art. 35 <strong>do</strong> CDC, conforme numerosos julga<strong>do</strong>s que po<strong>de</strong>m ser encontra<strong>do</strong>s. Por to<strong>do</strong>s:<br />

“Prestação <strong>de</strong> serviços. Ação <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> fazer cumulada com in<strong>de</strong>nizatória. Telefonia móvel. Plano pré-pago. Recarga <strong>de</strong><br />

celular com proposta promocional à consumi<strong>do</strong>ra. Descumprimento da oferta pela fornece<strong>do</strong>ra. Impossibilida<strong>de</strong>. Propaganda<br />

anunciada que vincula o contrato. Inteligência <strong>do</strong>s arts. 30 e 35 da Lei 8.078/1990. Danos morais. Inocorrência. Aborrecimento<br />

corriqueiro que não gerou prejuízo ou constrangimento passíveis <strong>de</strong> reparação. Sentença mantida. Recursos improvi<strong>do</strong>s” (TJSP –<br />

Apelação Cível 990.09.254046-7 – Acórdão 4204199, Franca – Vigésima Sexta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Andreatta<br />

Rizzo – j. 18.11.2009 – DJESP 08.01.2010).<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Telefonia móvel. Ação cominatória cumulada com reparação <strong>de</strong> danos. Promoções pula-pula e amigos toda hora da<br />

Brasil Telecom. Fornece<strong>do</strong>ra <strong>do</strong>s serviços que, unilateralmente, altera os termos iniciais das promoções, em <strong>de</strong>sfavor ao<br />

consumi<strong>do</strong>r. A<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ao regulamento ditan<strong>do</strong> a não cumulação das vantagens, antes cumuláveis. Em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> relação <strong>de</strong><br />

consumo, a oferta é vinculativa. Art. 30 <strong>do</strong> CDC. Necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> assegurar ao cliente a continuida<strong>de</strong> da promoção original. Danos<br />

morais configura<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>correntes da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração com a pessoa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Astreintes. Cabimento. Limitação <strong>do</strong> valor,<br />

aten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a critérios <strong>de</strong> razoabilida<strong>de</strong>” (TJRS – Recurso 71000931048 – Segunda Turma Recursal Cível – Juiz Relator Eduar<strong>do</strong><br />

Kraemer – Comarca <strong>de</strong> Porto Alegre – j. 17.05.2006).<br />

Outra interessante ilustração, <strong>de</strong> acórdão <strong>do</strong> Tribunal Paulista, é relativa à publicida<strong>de</strong> veiculada pelos órgãos <strong>de</strong> imprensa,<br />

envolven<strong>do</strong> um famoso cantor sertanejo, segun<strong>do</strong> a qual haveria o sorteio <strong>de</strong> <strong>do</strong>is carros. Como houve apenas o sorteio <strong>de</strong> um<br />

automóvel, a empresa veicula<strong>do</strong>ra foi obrigada a realizar o <strong>do</strong> outro, conforme a promessa anterior. Vejamos a curiosa ementa <strong>do</strong><br />

julga<strong>do</strong>:<br />

“Ação <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> fazer. Divulgação enganosa <strong>de</strong> promoções. Em uma, ‘Desculpe mas eu vou chorar’, seriam sortea<strong>do</strong>s 700<br />

ingressos <strong>do</strong> show <strong>de</strong> Leonar<strong>do</strong> e entre os ganha<strong>do</strong>res um carro; na outra, ‘Promoção <strong>do</strong> Dia das Mães e <strong>do</strong> Dia <strong>do</strong>s Namora<strong>do</strong>s’,<br />

seriam sortea<strong>do</strong>s 1.100 ingressos para assistir ao show <strong>de</strong> Leonar<strong>do</strong> e um carro. Sorteio <strong>de</strong> apenas um veículo, e não <strong>de</strong> <strong>do</strong>is carros<br />

como se extrai da divulgação das promoções. Propaganda que não aten<strong>de</strong> os requisitos <strong>do</strong>s arts. 30 e 31 <strong>do</strong> CDC, motivo pelo qual o<br />

fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve ser compeli<strong>do</strong> a cumprir a oferta. Recurso <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação 9130212-54.2003.8.26.0000 – Acórdão<br />

5019797, São Paulo – Sétima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Pedro Baccarat – j. 23.03.2011 – DJESP 13.04.2011).<br />

Da mesma Corte Estadual, seguin<strong>do</strong> nos exemplos, colaciona-se intrigante julga<strong>do</strong> que fez a oferta prevalecer nos mol<strong>de</strong>s da<br />

simbologia antes exposta, mitigan<strong>do</strong> fortemente a força obrigatória <strong>de</strong> uma convenção para a aquisição <strong>de</strong> um imóvel:<br />

“Compromisso <strong>de</strong> compra e venda. Ação <strong>de</strong> cobrança julgada improce<strong>de</strong>nte, dan<strong>do</strong>-se por proce<strong>de</strong>nte a reconvenção. Material<br />

publicitário que ofertava o imóvel pelo preço <strong>de</strong> R$ 36.500,00, a ser financia<strong>do</strong> com instituição financeira. Contrata<strong>do</strong> o


financiamento com o ente financeiro, a construtora outorgou ao adquirente a escritura <strong>do</strong> imóvel, mas passou a exigir fosse firmada<br />

segunda promessa <strong>de</strong> venda e compra, preven<strong>do</strong> financiamento suplementar, no valor <strong>de</strong> R$ 10.000,00. Impressos <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong><br />

que integram o contrato, geran<strong>do</strong> uma fonte <strong>de</strong> obrigação para o fornece<strong>do</strong>r (art. 30 <strong>do</strong> CDC). Abusivida<strong>de</strong> manifesta da exigência<br />

<strong>de</strong> financiamento suplementar, que não prevalece (art. 51, IV, <strong>do</strong> CDC). A<strong>de</strong>mais, uma vez transferida a proprieda<strong>de</strong> <strong>do</strong> imóvel aos<br />

compra<strong>do</strong>res, esvaziou-se <strong>de</strong> objeto o segun<strong>do</strong> compromisso. Ação improce<strong>de</strong>nte, proce<strong>de</strong>nte a reconvenção. Recurso improvi<strong>do</strong>”<br />

(TJSP – Apelação 9094745-43.2005.8.26.0000 – Acórdão 4884384, São Paulo – Primeira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des.<br />

Paulo Eduar<strong>do</strong> Razuk – j. 30.11.2010 – DJESP 14.03.2011).<br />

Com precisão teórica, Herman Benjamim <strong>de</strong>monstra que o art. 30 <strong>do</strong> CDC não merece incidência nas situações <strong>de</strong> simples<br />

exagero ou puffing, que não obriga o fornece<strong>do</strong>r. Cita o jurista expressões exageradas permitidas, como “o melhor sabor”, “o mais<br />

bonito”, “o maravilhoso”.8 Obviamente, tais exageros são utiliza<strong>do</strong>s em um senti<strong>do</strong> genérico para atrair o consumi<strong>do</strong>r, que não<br />

po<strong>de</strong> exigir que o produto seja o melhor <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, segun<strong>do</strong> o seu gosto pessoal.<br />

Para encerrar, algumas palavras <strong>de</strong>vem ser ditas a respeito <strong>do</strong> erro crasso ou patente na vinculação da notícia, como nas<br />

hipóteses em que um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> veículo é anuncia<strong>do</strong> em jornais por preço muito menor, correspon<strong>de</strong>nte a 10% <strong>do</strong> seu<br />

valor <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>. O tema é bem enfrenta<strong>do</strong> por Rizzatto Nunes, para quem, em regra, não po<strong>de</strong> a empresa veicula<strong>do</strong>ra da<br />

informação alegar o engano, a não ser “se a mensagem, ela própria, <strong>de</strong>ixar patente o erro, pois caso contrário o fornece<strong>do</strong>r sempre<br />

po<strong>de</strong>ria alegar que agiu em erro para negar-se a cumprir a oferta”.9 Como tem se entendi<strong>do</strong> no plano jurispru<strong>de</strong>ncial, o anúncio,<br />

para não vincular o <strong>de</strong>clarante, <strong>de</strong>ve trazer uma patente onerosida<strong>de</strong> excessiva, uma <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> valor irrisório em relação ao<br />

valor real <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>, perceptível <strong>de</strong> plano. Deduz-se, corretamente, que a boa-fé objetiva exigida <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r<br />

também vale para o consumi<strong>do</strong>r. Nessa linha:<br />

“Apelação cível. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Ação <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> fazer. Oferta veiculada em jornal. Pretendida aquisição <strong>de</strong> automóvel<br />

pelo preço anuncia<strong>do</strong>. R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais). Erro <strong>de</strong> digitação <strong>do</strong> periódico anunciante. Errata publicada<br />

prontamente. Valor anuncia<strong>do</strong> extremamente abaixo <strong>do</strong> preço <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>. R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais).<br />

Improcedência em primeiro grau. Inconformismo. Publicida<strong>de</strong> enganosa. Inocorrência. Enriquecimento ilícito flagrante. Pretensão<br />

contrária à boa-fé objetiva. Sentença mantida. Recurso conheci<strong>do</strong> e <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>. O Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r contém regras que <strong>de</strong>vem<br />

ser aplicadas com proporção e razoabilida<strong>de</strong>. A literalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> disposto nos arts. 30 e 35, I, da Lei 8.078/1990 não se presta ao<br />

locupletamento ilícito e esperteza <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, em ofensa a to<strong>do</strong> e qualquer referencial <strong>de</strong> boa-fé. ‘A boa-fé objetiva é elemento<br />

negocial que se exige <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r tanto quanto <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. Recurso provi<strong>do</strong>, para julgar improce<strong>de</strong>nte a ação’ (TJRS – Rel.<br />

Mylene Maria Michel, in Recurso Cível n. 71000727123, j. 24.08.2005)” (TJSC – Apelação Cível 2005.024478-6, Criciúma –<br />

Primeira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil – Rel. Des. Carlos Adilson Silva – DJSC 24.09.2009, p. 61).<br />

“Entrega <strong>de</strong> coisa certa. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Merca<strong>do</strong>ria com valor anuncia<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma errada. Fato que evi<strong>de</strong>ncia erro e não<br />

<strong>do</strong>lo <strong>do</strong> comerciante. Desproporção entre o preço real e o anuncia<strong>do</strong>. Enriquecimento ilícito. Não cabimento. O art. 30, <strong>do</strong> CDC,<br />

consagra o princípio da boa-fé, que <strong>de</strong>ve vigorar nas relações <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a fase pré-contratual, obrigan<strong>do</strong> o fornece<strong>do</strong>r a<br />

cumprir o prometi<strong>do</strong> em sua propaganda. No entanto, não se po<strong>de</strong> obrigar o fornece<strong>do</strong>r a ven<strong>de</strong>r merca<strong>do</strong>ria pelo preço anuncia<strong>do</strong>,<br />

se não se vislumbra a existência <strong>de</strong> <strong>do</strong>lo, mas sim <strong>de</strong> evi<strong>de</strong>nte erro na informação, <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> pela gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>sproporção entre o<br />

preço real <strong>do</strong> equipamento e o anuncia<strong>do</strong>. A boa-fé, que a Lei exige <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, também é exigida <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. ‘Assim, na<br />

hipótese <strong>de</strong> equívoco flagrante e disparata<strong>do</strong> presente em informação ou publicida<strong>de</strong>, não se po<strong>de</strong> consentir na vinculação<br />

obrigacional <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r almejada por consumi<strong>do</strong>r anima<strong>do</strong> pelo propósito <strong>do</strong> enriquecimento ilícito’ (OLIVEIRA, James<br />

Eduar<strong>do</strong>. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r Anota<strong>do</strong> e Comenta<strong>do</strong>, Ed. Atlas, p. 201)” (TJMG – Apelação Cível 1.0701.05.133023-<br />

4/001, Uberaba – Décima Quarta Câmara Cível – Rel. Des. Elias Camilo – j. 27.06.2007 – DJMG 23.07.2007).<br />

Deve ficar claro que o <strong>Direito</strong> Civil tem supera<strong>do</strong> a discussão a respeito da escusabilida<strong>de</strong> ou não <strong>do</strong> erro, ou seja, se o engano<br />

<strong>de</strong>ve ser justificável ou não. Procura-se, assim, resolver os casos concretos a partir <strong>do</strong> princípio da boa-fé, um <strong>do</strong>s baluartes <strong>do</strong><br />

sistema priva<strong>do</strong> nacional. Nessa linha <strong>de</strong> raciocínio, na I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, aprovou-se o Enuncia<strong>do</strong> n. 12 <strong>do</strong> Conselho da<br />

Justiça Fe<strong>de</strong>ral e Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, in verbis: “na sistemática <strong>do</strong> art. 138 <strong>do</strong> Código Civil, é irrelevante ser ou não<br />

escusável o erro, porque o dispositivo a<strong>do</strong>ta o princípio da confiança”.<br />

6.3.<br />

O CONTEÚDO DA OFERTA E A MANUTENÇÃO DE SUA INTEGRALIDADE<br />

A complementar o senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> seu dispositivo antece<strong>de</strong>nte, o art. 31 da Lei 8.078/1990 estabelece que a oferta e a apresentação<br />

<strong>de</strong> produtos ou serviços <strong>de</strong>vem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas<br />

características, qualida<strong>de</strong>s, quantida<strong>de</strong>, composição, preço, garantia, prazos <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> e origem, entre outros da<strong>do</strong>s, bem como<br />

sobre os riscos que apresentam à saú<strong>de</strong> e segurança <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

Como feliz proposta <strong>de</strong> inovação, frise-se que o PL 281/2012 preten<strong>de</strong> incluir menção aos riscos ao meio ambiente, em sadio<br />

diálogo com o art. 225 da CF/1988 e a legislação ambiental. Em complemento, o art. 31 <strong>do</strong> CDC ganharia mais um parágrafo, a


preceituar que as informações sobre qualida<strong>de</strong>s ambientais <strong>do</strong>s produtos ou serviços <strong>de</strong>vem aten<strong>de</strong>r aos seguintes princípios: a)<br />

veracida<strong>de</strong>, uma vez que as informações ambientais <strong>de</strong>vem ser verda<strong>de</strong>iras e sempre passíveis <strong>de</strong> verificação e comprovação; b)<br />

exatidão, pois as informações ambientais <strong>de</strong>vem ser exatas e precisas, não caben<strong>do</strong> informações genéricas e vagas; c) pertinência,<br />

eis que as informações ambientais <strong>de</strong>vem ter relação com os processos <strong>de</strong> produção e comercialização <strong>do</strong>s produtos e serviços<br />

anuncia<strong>do</strong>; e d) relevância, porque o benefício ambiental salienta<strong>do</strong> <strong>de</strong>verá ser significativo em termos <strong>do</strong> impacto <strong>do</strong> produto ou<br />

serviço sobre o meio ambiente, em to<strong>do</strong> o seu ciclo <strong>de</strong> vida, ou seja, na sua produção, uso e <strong>de</strong>scarte.<br />

Sem prejuízo <strong>de</strong>ssa projeção, na atual realida<strong>de</strong> legislativa, o quadro a seguir facilita a visualização da norma, sen<strong>do</strong> certo que<br />

os substantivos constituem os da<strong>do</strong>s mínimos relativos aos produtos e serviços, enquanto os adjetivos, as qualificações exigidas<br />

pela lei em relação à oferta:<br />

Substantivos – da<strong>do</strong>s mínimos <strong>do</strong>s produtos e<br />

serviços.<br />

Informações sobre suas características, qualida<strong>de</strong>s,<br />

quantida<strong>de</strong>, composição, preço, garantia, prazos <strong>de</strong><br />

valida<strong>de</strong> e origem, entre outros.<br />

Adjetivos – qualificações relativas a esses da<strong>do</strong>s.<br />

Devem ser corretas, claras, precisas, ostensivas e em<br />

língua portuguesa, tu<strong>do</strong> visan<strong>do</strong> à facilitação da<br />

compreensão pelos consumi<strong>do</strong>res.<br />

Em suma, o conteú<strong>do</strong> relativo à oferta <strong>de</strong>ve ser completo, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que o consumi<strong>do</strong>r seja <strong>de</strong>vidamente informa<strong>do</strong> a respeito<br />

daquilo que está sen<strong>do</strong> adquiri<strong>do</strong>. Em todas as situações, <strong>de</strong>ve-se levar em conta um nível <strong>de</strong> informações compatíveis com o<br />

brasileiro médio, ou seja, <strong>de</strong>ve-se facilitar ao máximo a compreensão <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong>. Tal <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar mantém interação<br />

in<strong>de</strong>clinável em relação à boa-fé objetiva e a transparência exigidas na fase pré-negocial.10<br />

Como to<strong>do</strong> o sistema consumerista, os elementos constantes na tabela são meramente exemplificativos (numerus apertus) e<br />

não exaustivos (numerus clausus), pois o que é valoriza<strong>do</strong> é o conhecimento <strong>do</strong> objeto da oferta pelo consumi<strong>do</strong>r. Tanto isso é<br />

verda<strong>de</strong> que o art. 33 <strong>do</strong> CDC, em um senti<strong>do</strong> suplementar, <strong>de</strong>termina que, em caso <strong>de</strong> oferta ou <strong>de</strong> venda por telefone ou<br />

reembolso postal, <strong>de</strong>ve constar o nome <strong>do</strong> fabricante e en<strong>de</strong>reço na embalagem, publicida<strong>de</strong> e em to<strong>do</strong>s os impressos utiliza<strong>do</strong>s na<br />

transação comercial. Como não po<strong>de</strong>ria ser diferente, a última norma tem incidência para a contratação eletrônica celebrada pela<br />

internet na socieda<strong>de</strong> da informação.<br />

Consigne-se que foi acresci<strong>do</strong> um parágrafo único no último preceito, pela Lei 11.800/2008, enuncian<strong>do</strong> expressamente que é<br />

proibida a publicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> bens e serviços por telefone, quan<strong>do</strong> a chamada for onerosa ao consumi<strong>do</strong>r que a origina. A última<br />

norma visou a afastar a atuação <strong>de</strong>senfreada das empresas <strong>de</strong> telemarketing, que muitas vezes atuam em abuso <strong>de</strong> direito, com os<br />

fins <strong>de</strong> benefícios diretos ou indiretos.<br />

Ainda no que concerne ao tema, <strong>de</strong>ve ser menciona<strong>do</strong> o teor da Lei 10.962/2004, que dispõe sobre a oferta e as formas <strong>de</strong><br />

afixação <strong>de</strong> preços <strong>de</strong> produtos e serviços para o consumi<strong>do</strong>r. Conforme o seu art. 2º, são admitidas as seguintes formas <strong>de</strong><br />

afixação <strong>de</strong> preços em vendas a varejo para o consumi<strong>do</strong>r: a) no comércio em geral, por meio <strong>de</strong> etiquetas ou similares afixa<strong>do</strong>s<br />

diretamente nos bens expostos à venda, e em vitrines, mediante divulgação <strong>do</strong> preço à vista em caracteres legíveis; b) em<br />

autosserviços, supermerca<strong>do</strong>s, hipermerca<strong>do</strong>s, mercearias ou estabelecimentos comerciais on<strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r tenha acesso direto<br />

ao produto, sem intervenção <strong>do</strong> comerciante, mediante a impressão ou afixação <strong>do</strong> preço <strong>do</strong> produto na embalagem, ou a afixação<br />

<strong>de</strong> código referencial, ou ainda, com a afixação <strong>de</strong> código <strong>de</strong> barras. Em complemento, prevê a mesma norma que nos casos <strong>de</strong><br />

utilização <strong>de</strong> código referencial ou <strong>de</strong> barras, o comerciante <strong>de</strong>verá expor, <strong>de</strong> forma clara e legível, junto aos itens expostos,<br />

informação relativa ao preço à vista <strong>do</strong> produto, suas características e código.<br />

Pontue-se que houve a inclusão <strong>de</strong> um art. 2º-A nesse diploma, por força da Lei 13.175/2015, prescreven<strong>do</strong> que na venda a<br />

varejo <strong>de</strong> produtos fraciona<strong>do</strong>s em pequenas quantida<strong>de</strong>s, o comerciante <strong>de</strong>verá informar, na etiqueta conten<strong>do</strong> o preço ou junto<br />

aos itens expostos, além <strong>do</strong> preço <strong>do</strong> produto à vista, o preço correspon<strong>de</strong>nte a uma das seguintes unida<strong>de</strong>s fundamentais <strong>de</strong><br />

medida: capacida<strong>de</strong>, massa, volume, comprimento ou área, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a forma habitual <strong>de</strong> comercialização <strong>de</strong> cada tipo <strong>de</strong><br />

produto. A<strong>de</strong>mais, o mesmo coman<strong>do</strong> enuncia que essas regras não se aplicam à comercialização <strong>de</strong> medicamentos.<br />

Deve ficar claro que o <strong>de</strong>srespeito a tal <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar, previsto em to<strong>do</strong>s esses dispositivos, gera amplas consequências em<br />

relação ao fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r, como a responsabilização civil e a imposição <strong>de</strong> sanções administrativas, tratadas a partir <strong>do</strong><br />

art. 55 da Lei 8.078/1990. A título ilustrativo, analisan<strong>do</strong> a estrutura e a função <strong>do</strong> art. 31 <strong>do</strong> CDC, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça,<br />

em acórdãos recentes, concluiu que as contas telefônicas que não trazem <strong>de</strong>talhadamente a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pulsos utiliza<strong>do</strong>s violam<br />

o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informação, sujeitan<strong>do</strong>-se as empresas correspon<strong>de</strong>ntes às penalida<strong>de</strong>s previstas em lei. Houve divergência apenas<br />

quanto à extensão temporal <strong>de</strong> tal exigência, conforme se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma das ementas, a seguir transcrita:


“Administrativo. Consumi<strong>do</strong>r. Telefonia fixa. Pulsos. Detalhamento. Ressalva <strong>do</strong> relator. 1. A Primeira Seção <strong>do</strong> Superior Tribunal<br />

<strong>de</strong> Justiça, ao apreciar <strong>de</strong>manda sob o rito <strong>do</strong>s recursos repetitivos (art. 543-C <strong>do</strong> CPC), <strong>de</strong>cidiu que: a) a discriminação <strong>de</strong> todas as<br />

ligações locais, <strong>de</strong>ntro ou fora da franquia, passou a ser exigi<strong>do</strong> a partir <strong>de</strong> 1º <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 2007; e b) o fornecimento da fatura<br />

<strong>de</strong>talhada é ônus da concessionária. 2. Ressalva <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista <strong>do</strong> Relator sobre o tema, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que, mesmo antes da<br />

edição <strong>do</strong> Decreto 4.733/2003 e da Resolução ANATEL 432/2006, a falta, na conta telefônica, das referidas exigências macula a<br />

prestação <strong>do</strong> serviço com o vício <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> por ina<strong>de</strong>quação, conforme os arts. 6º, III, 20, 22 e 31 <strong>do</strong> CDC. 3. Agravos<br />

Regimentais não provi<strong>do</strong>s” (STJ – AgRg-AgRg-Ag 1.337.817/PR – Segunda Turma – Rel. Min. Herman Benjamin – j. 15.03.2011<br />

– DJe 25.04.2011).<br />

O conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 31, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, foi analisa<strong>do</strong> por aquela Corte Superior no julgamento envolven<strong>do</strong> a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

informações nos alimentos relativas ao glúten, <strong>de</strong> mesma relatoria. A ementa <strong>de</strong> conclusão, com diversas menções ao dispositivo, é<br />

longa, <strong>de</strong>duzin<strong>do</strong> pela necessida<strong>de</strong> da prestação da informação, merecen<strong>do</strong> transcrição o seu trecho inicial e principal:<br />

“<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Administrativo. Normas <strong>de</strong> proteção e <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Or<strong>de</strong>m pública e interesse social. Princípio<br />

da vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Princípio da transparência. Princípio da boa-fé objetiva. Princípio da confiança. Obrigação <strong>de</strong><br />

segurança. <strong>Direito</strong> à informação. Dever positivo <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> informar, a<strong>de</strong>quada e claramente, sobre riscos <strong>de</strong> produtos e<br />

serviços. Distinção entre informação-conteú<strong>do</strong> e informação-advertência. Rotulagem. Proteção <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res hipervulneráveis.<br />

Campo <strong>de</strong> aplicação da Lei <strong>do</strong> Glúten (Lei 8.543/1992, ab-rogada pela Lei 10.674/2003) e eventual antinomia com o art. 31 <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança preventivo. Justo receio da impetrante <strong>de</strong> ofensa à sua livre iniciativa e à<br />

comercialização <strong>de</strong> seus produtos. Sanções administrativas por <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> advertir sobre os riscos <strong>do</strong> glúten aos <strong>do</strong>entes celíacos.<br />

Inexistência <strong>de</strong> direito líqui<strong>do</strong> e certo. Denegação da segurança. (…)” (STJ – REsp 586.316/MG – Segunda Turma – Rel. Min.<br />

Herman Benjamin – j. 17.04.2007 – DJe 19.03.2009).<br />

Do corpo <strong>do</strong> julga<strong>do</strong> extrai-se excelente <strong>do</strong>utrina a respeito das informações prestadas, nos seguintes termos: “A informação<br />

<strong>de</strong>ve ser correta (= verda<strong>de</strong>ira), clara (= <strong>de</strong> fácil entendimento), precisa (= não prolixa ou escassa), ostensiva (= <strong>de</strong> fácil<br />

constatação ou percepção) e, por óbvio, em língua portuguesa. 11. A obrigação <strong>de</strong> informação é <strong>de</strong>s<strong>do</strong>brada pelo art. 31 <strong>do</strong> CDC,<br />

em quatro categorias principais, imbricadas entre si: a) informação-conteú<strong>do</strong> (= características intrínsecas <strong>do</strong> produto e serviço), b)<br />

informação-utilização (= como se usa o produto ou serviço), c) informação-preço (= custo, formas e condições <strong>de</strong> pagamento), e d)<br />

informação-advertência (= riscos <strong>do</strong> produto ou serviço). 12. A obrigação <strong>de</strong> informação exige comportamento positivo, pois o<br />

CDC rejeita tanto a regra <strong>do</strong> caveat emptor como a subinformação, o que transmuda o silêncio total ou parcial <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r em<br />

patologia repreensível, relevante apenas em <strong>de</strong>sfavor <strong>do</strong> profissional, inclusive como oferta e publicida<strong>de</strong> enganosa por omissão.<br />

(…) O CDC estatui uma obrigação geral <strong>de</strong> informação (= comum, ordinária ou primária), enquanto outras Leis, específicas para<br />

Certos setores (como a Lei 10.674/2003), dispõem sobre obrigação especial <strong>de</strong> informação (= secundária, <strong>de</strong>rivada ou tópica).<br />

Esta, por ter um caráter mínimo, não isenta os profissionais <strong>de</strong> cumprirem aquela. (…). 17. No campo da saú<strong>de</strong> e da segurança <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r (e com maior razão quanto a alimentos e medicamentos), em que as normas <strong>de</strong> proteção <strong>de</strong>vem ser interpretadas com<br />

maior rigor, por conta <strong>do</strong>s bens jurídicos em questão, seria um <strong>de</strong>spropósito falar em <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar basea<strong>do</strong> no homo medius<br />

ou na generalida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, o que levaria a informação a não atingir quem mais <strong>de</strong>la precisa, pois os que pa<strong>de</strong>cem <strong>de</strong><br />

enfermida<strong>de</strong>s ou <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong>s especiais são frequentemente a minoria no amplo universo <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res” (STJ – REsp<br />

586.316/MG – Segunda Turma – Rel. Min. Herman Benjamin – j. 17.04.2007 – DJe 19.03.2009).<br />

Ainda para concretizar o coman<strong>do</strong> consumerista, <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça cabe também colacionar julga<strong>do</strong> publica<strong>do</strong><br />

no seu Informativo n. 468, que responsabilizou entida<strong>de</strong> bancária pelo <strong>de</strong>srespeito às informações previamente mal prestadas.<br />

Vejamos o teor da publicação:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong>. Redirecionamento. Aplicações financeiras. O recorrente fez aplicações em fun<strong>do</strong> geri<strong>do</strong> pela instituição<br />

financeira recorrida, <strong>do</strong> qual era correntista. Suce<strong>de</strong> que ela redirecionou suas aplicações para outro banco alheio à relação<br />

contratual que, após, sofreu intervenção <strong>do</strong> Bacen, o que ocasionou a indisponibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s valores aplica<strong>do</strong>s. Diante disso, o<br />

recorrente preten<strong>de</strong> a responsabilização da recorrida pelos danos materiais causa<strong>do</strong>s ao fundamento <strong>de</strong> violação <strong>do</strong> art. 31 <strong>do</strong> CDC.<br />

Mesmo ao se consi<strong>de</strong>rar que os fun<strong>do</strong>s <strong>de</strong> investimentos comportam contratos <strong>de</strong> risco, aleatórios e, geralmente, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong><br />

acaso, é certo que o investi<strong>do</strong>r (consumi<strong>do</strong>r) que se utiliza <strong>do</strong>s préstimos <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços bancários está alberga<strong>do</strong> pelas<br />

normas <strong>do</strong> CDC, além <strong>do</strong> princípio da boa-fé e seus <strong>de</strong>veres anexos, o que impõe ao banco a exigência <strong>de</strong> fornecer informações<br />

a<strong>de</strong>quadas, suficientes e específicas a respeito <strong>do</strong> serviço presta<strong>do</strong> ao investi<strong>do</strong>r. Assim, na hipótese, o redirecionamento das<br />

aplicações <strong>do</strong> recorrente configura operação realizada pela recorrida fora <strong>de</strong> seu compromisso contratual e legal, o que, sem dúvida,<br />

extrapola a alea inerente a esse contrato. Dessarte, não há que se comparar a hipótese aos casos referentes ao risco da<br />

<strong>de</strong>svalorização <strong>do</strong> real diante <strong>do</strong> dólar americano (em que há prece<strong>de</strong>nte da Terceira Turma pela não responsabilização <strong>do</strong> banco) ou<br />

mesmo aos <strong>de</strong> ações que per<strong>de</strong>m abruptamente seu valor na bolsa <strong>de</strong> valores, pois está presente na espécie o elemento volitivo (a<br />

escolha da própria recorrida), com o qual o conceito <strong>de</strong> risco que po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>sonerar a instituição bancária <strong>de</strong> sua responsabilida<strong>de</strong>,<br />

por revestir-se <strong>de</strong> incerteza, é incompatível. Assim, ausente a alea, a mera presunção <strong>de</strong> conhecimento ou a anuência quanto aos


iscos não são fundamentos a <strong>de</strong>sonerar a recorrida <strong>de</strong> ressarcir ao recorrente os valores aplica<strong>do</strong>s, pois aquela não se <strong>de</strong>sincumbiu<br />

<strong>de</strong> comprovar que o recorrente lhe conce<strong>de</strong>ra expressa autorização, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong>, assim, arcar com a má escolha operada supostamente<br />

em nome <strong>do</strong> cliente. Esse entendimento foi acolhi<strong>do</strong> pela maioria <strong>do</strong>s componentes da Turma no prosseguimento <strong>do</strong> julgamento.<br />

Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: REsp 1.003.893-RJ, DJe 08.09.2010, e REsp 747.149-RJ, DJ 05.12.2005” (STJ – REsp 1.131.073-MG – Rel.<br />

Min. Nancy Andrighi – j. 05.04.2011).<br />

Seguin<strong>do</strong> nas ilustrações, o Tribunal <strong>de</strong> São Paulo enten<strong>de</strong>u pelo <strong>de</strong>srespeito ao art. 31 <strong>do</strong> CDC pelo fato <strong>de</strong> o hipermerca<strong>do</strong><br />

ter coloca<strong>do</strong> pesca<strong>do</strong> à venda em momento próximo ao prazo <strong>de</strong> vencimento, sem que isso tivesse si<strong>do</strong> ostensivamente informa<strong>do</strong><br />

aos consumi<strong>do</strong>res. No caso em apreço, ficaram evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong>s os danos ao consumi<strong>do</strong>r, a justificar até a reparação imaterial:<br />

“Apelação. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais. Alimento <strong>de</strong>teriora<strong>do</strong>. Compra <strong>de</strong> pesca<strong>do</strong> exposto em bancada <strong>de</strong> gelo. Prazo<br />

<strong>de</strong> valida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um dia. Letra minúscula. Informação insuficiente. Falta <strong>de</strong> informação <strong>de</strong> que o alimento não po<strong>de</strong>ria ser congela<strong>do</strong>.<br />

Art. 31 <strong>do</strong> CDC. Dever <strong>de</strong> informação não observa<strong>do</strong> pelo hipermerca<strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. Risco à saú<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Configuração.<br />

Dano moral. Tipificação. Conduta ina<strong>de</strong>quada ou insuficiente <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r pon<strong>do</strong> em risco a saú<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, atributo da<br />

personalida<strong>de</strong>. Reparabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> dano moral. Sentença. Improcedência. Reforma parcial. In<strong>de</strong>nização fixada em R$ 10.000,00 (<strong>de</strong>z<br />

mil reais) para cada <strong>de</strong>mandante. Apelação provida parcialmente” (TJSP – Apelação 9157713-41.2007.8.26.0000 – Acórdão<br />

4798366, Santo André – Vigésima Quinta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. <strong>Amorim</strong> Cantuária – j. 09.11.2010 – DJESP<br />

11.01.2011).<br />

Seguin<strong>do</strong> no estu<strong>do</strong> da norma, o parágrafo único <strong>do</strong> art. 31 <strong>do</strong> CDC, incluí<strong>do</strong> pela Lei 11.989/2009, prescreve que “As<br />

informações <strong>de</strong> que trata este artigo, nos produtos refrigera<strong>do</strong>s ofereci<strong>do</strong>s ao consumi<strong>do</strong>r, serão gravadas <strong>de</strong> forma in<strong>de</strong>lével”. O<br />

dispositivo tem incidência, por exemplo, para carnes, massas e <strong>de</strong>riva<strong>do</strong>s <strong>do</strong> leite. A expressão in<strong>de</strong>lével quer dizer “in<strong>de</strong>strutível,<br />

inapagável, justamente para evitar o <strong>de</strong>saparecimento <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s essenciais sem os quais o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> estar sujeito a um<br />

consumo que o exponha a intoxicação”.11<br />

Em complemento ao preceito geral a respeito <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> das informações previamente prestadas, o art. 32 da Lei 8.078/1990<br />

preceitua que os fabricantes e importa<strong>do</strong>res <strong>de</strong>verão assegurar a oferta <strong>de</strong> componentes e peças <strong>de</strong> reposição enquanto não cessar a<br />

fabricação ou importação <strong>do</strong> produto. Se cessadas a produção ou importação, a oferta <strong>de</strong>verá ser mantida por perío<strong>do</strong> razoável <strong>de</strong><br />

tempo, na forma da lei. Esse tempo razoável, por óbvio, <strong>de</strong>ve levar em conta a vida útil média <strong>do</strong> produto, bem como a sua difusão<br />

no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo. A norma visa justamente a fazer cumprir a oferta anterior, quan<strong>do</strong> da aquisição originária <strong>do</strong> produto,<br />

manten<strong>do</strong> a sua integralida<strong>de</strong>. O <strong>de</strong>srespeito ao preceito faz com que esteja caracteriza<strong>do</strong> o vício <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> no produto, caben<strong>do</strong><br />

as opções previstas no art. 18 da Lei 8.078/1990.<br />

Como exemplo concreto <strong>de</strong> <strong>de</strong>srespeito ao preceito, po<strong>de</strong> ser cita<strong>do</strong> o caso da monta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> veículos russa Lada. Os veículos<br />

começaram a ser importa<strong>do</strong>s e vendi<strong>do</strong>s no Brasil no ano <strong>de</strong> 1991 e, sete anos <strong>de</strong>pois, diante da diminuição das vendas, a<br />

monta<strong>do</strong>ra parou <strong>de</strong> atuar no País. Como consequência, milhares <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res ficaram sem as peças <strong>de</strong> reposição <strong>do</strong>s veículos,<br />

o que gerou enormes prejuízos. A gran<strong>de</strong> maioria <strong>do</strong>s veículos está em ferros velhos ou para<strong>do</strong>s em casas e oficinas. Alguns ainda<br />

rodam, principalmente entre os jipeiros que conseguiram substituir as peças por outras <strong>de</strong> monta<strong>do</strong>ras diversas, fazen<strong>do</strong> adaptações<br />

no veículo.<br />

Em casos mais recentes, a jurisprudência tem entendi<strong>do</strong> pela possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> rescisão <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> aquisição <strong>do</strong> bem por<br />

<strong>de</strong>srespeito ao preceito <strong>do</strong> art. 32 <strong>do</strong> CDC. Como primeiro exemplo, vejamos <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal Gaúcho nesse senti<strong>do</strong>, relativa a<br />

problema em home theater:<br />

“Reparação <strong>de</strong> danos. Defeito no produto. Deceiver para home theater. Ausência <strong>de</strong> peça no merca<strong>do</strong> para efetuar o conserto <strong>do</strong><br />

bem. Carência <strong>do</strong> componente menos <strong>de</strong> quatro anos após a aquisição. Perío<strong>do</strong> que não po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> razoável diante da<br />

vida útil prevista para o <strong>de</strong>ceiver. Hipótese em que o produto adquiri<strong>do</strong> não satisfez a legítima expectativa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Desatendimento <strong>do</strong> art. 32 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Restituição <strong>do</strong> valor pago pelo produto. Sentença mantida.<br />

Recurso <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>. Unânime” (TJRS – Recurso 9525-30.2011.8.21. 9000, Teutônia – Terceira Turma Recursal Cível – Rel. Des.<br />

Elaine Maria Canto da Fonseca – j. 14.04.2011 – DJERS 26.04.2011).<br />

Com conclusão muito próxima, vejamos outra <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> mesmo Tribunal, referente a problema em peça <strong>de</strong> televisor, em que<br />

se fez uma correta interpretação <strong>do</strong> prazo razoável previsto no parágrafo único <strong>do</strong> art. 32, levan<strong>do</strong>-se em conta o tempo médio <strong>de</strong><br />

uso <strong>do</strong> eletro<strong>do</strong>méstico:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Aparelho televisor. Defeito. Ausência <strong>de</strong> peça <strong>de</strong> reposição para o conserto. Desatendimento <strong>do</strong> art. 32 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Inocorrência <strong>de</strong> dano moral. 1. Sen<strong>do</strong> a vida útil <strong>de</strong> um aparelho televisor entre 10 e 20 anos e ten<strong>do</strong> o<br />

mesmo apresenta<strong>do</strong> <strong>de</strong>feito com menos <strong>de</strong> três anos <strong>de</strong> uso, não ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> conserta<strong>do</strong> em virtu<strong>de</strong> da inexistência <strong>de</strong> peça no<br />

merca<strong>do</strong>, faz jus o autor à restituição <strong>do</strong> valor pago, pois presente a responsabilida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>mandada, nos termos <strong>do</strong> art. 32 <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. No caso, o perío<strong>do</strong> razoável <strong>de</strong> oferta <strong>de</strong> componentes e peças <strong>de</strong> reposição menciona<strong>do</strong> no


parágrafo único <strong>do</strong> art. 32 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r não se exauriu. Hipótese em que o produto adquiri<strong>do</strong> não satisfez a<br />

legítima expectativa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 3. Dano moral não configura<strong>do</strong> pelo simples <strong>de</strong>scumprimento contratual, sem estar agregada<br />

qualquer lesão a atributo <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Recurso parcialmente provi<strong>do</strong>” (TJRS – Recurso Cível 71002661379,<br />

Caxias <strong>do</strong> Sul – Terceira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Ricar<strong>do</strong> Torres Hermann – j. 09.11.2010 – DJERS 19.11.2010).<br />

Na mesma linha, em <strong>de</strong>cisão da mesma pioneira Corte Estadual, <strong>de</strong>duziu-se, a título ilustrativo, que o prazo <strong>de</strong> cinco anos é<br />

razoável para que o fabricante assegure a reposição <strong>de</strong> peças <strong>de</strong> um televisor <strong>de</strong> cinquenta e cinco polegadas e valor consi<strong>de</strong>rável<br />

(TJRS – Recurso Cível 71001812007, Lajea<strong>do</strong> – Terceira Turma Recursal Cível – Rel. Des. João Pedro Cavalli Júnior – j.<br />

28.05.2009 – DOERS 05.06.2009, p. 150).<br />

A encerrar o presente tópico, como exposto a respeito <strong>do</strong> caso Lada, é comum que o problema <strong>de</strong> reposição esteja relaciona<strong>do</strong><br />

a peças <strong>de</strong> automóveis, sen<strong>do</strong> necessária a sua importação. Em casos tais, além da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> resolução <strong>do</strong> negócio, é viável<br />

que o consumi<strong>do</strong>r permaneça com o veículo, sen<strong>do</strong> in<strong>de</strong>niza<strong>do</strong> por outros prejuízos, como os danos emergentes da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

locar um outro automóvel para uso próprio (TJRJ – Apelação Cível 8656/1997, Rio <strong>de</strong> Janeiro – Quarta Câmara Cível – Rel. Des.<br />

Semy Glanz – j. 17.03.1998).<br />

6.4.<br />

A RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA E SOLIDÁRIA DECORRENTE DA<br />

OFERTA<br />

Como não po<strong>de</strong>ria ser diferente, em sintonia com o sistema a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pelo CDC, a responsabilida<strong>de</strong> civil que <strong>de</strong>corre da<br />

vinculação da oferta e da publicida<strong>de</strong> é <strong>de</strong> natureza objetiva, em regra. Como ensina o Ministro Herman Benjamin, “Sem dúvida<br />

alguma, a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s arts. 30 e 35 é objetiva, pois seu texto em nada alu<strong>de</strong> à culpa <strong>do</strong> anunciante, razão pela qual não<br />

po<strong>de</strong> o intérprete agregá-la, muito menos num contexto em que, seja pela vulnerabilida<strong>de</strong> da parte protegida (o consumi<strong>do</strong>r), seja<br />

pelas características <strong>do</strong> fenômeno regra<strong>do</strong> (a publicida<strong>de</strong>), o direito, antes mesmo da interferência <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r, já se encaminhava<br />

na direção da objetivação da responsabilida<strong>de</strong> civil”.12<br />

Para o entendimento da responsabilida<strong>de</strong> objetiva como regra, contribui sobremaneira a parte final <strong>do</strong> art. 14 <strong>do</strong> CDC, que<br />

estabelece a responsabilida<strong>de</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> culpa nos casos <strong>de</strong> informações insuficientes ou ina<strong>de</strong>quadas sobre a fruição e<br />

riscos <strong>do</strong> serviço. Além disso, não se po<strong>de</strong> esquecer que a quebra da confiança e da boa-fé objetiva gera uma responsabilida<strong>de</strong> sem<br />

culpa (Enuncia<strong>do</strong> n. 363 <strong>do</strong> CJF/STJ), o que, via <strong>de</strong> regra, está presente em relação à oferta ou publicida<strong>de</strong>. No plano<br />

jurispru<strong>de</strong>ncial, várias são as ementas <strong>de</strong> julga<strong>do</strong>s que trazem tais conclusões <strong>de</strong> afastamento <strong>do</strong> mo<strong>de</strong>lo culposo ou subjetivo na<br />

oferta (TJBA – Recurso 0155094-84.2004.805.0001-1 – Quarta Turma Recursal – Rel. Juíza Eloisa Matta da Silveira Lopes –<br />

DJBA 24.11.2010; TJCE – Recurso Cível 2004.0004.3352-0/1 – Sexta Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais – Rel. Des.<br />

Heraclito Vieira <strong>de</strong> Sousa Neto – DJCE 19.02.2009, p. 184; TJDF – Recurso 2007.11.1.002268-6 – Acórdão 324.616 – Segunda<br />

Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e Criminais – Rel. Juiz Alfeu Macha<strong>do</strong> – DJDFTE 20.10.2008, p. 147; TJMG –<br />

Apelação Cível 1.0024.05.786808-5/0031, Belo Horizonte – Décima Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Batista <strong>de</strong> Abreu – j.<br />

26.03.2008 – DJEMG 26.04.2008; TJRJ – Apelação Cível 9348/2003, Rio <strong>de</strong> Janeiro – Nona Câmara Cível – Rel. Des. Laerson<br />

Mauro – j. 17.06.2003; e 1º TAC-SP – Recurso 952708-2 – Quarta Câmara – Rel. Juiz Luiz Antonio Rizzatto Nunes – j.<br />

29.11.2000).<br />

Imperioso verificar a natureza da responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> profissional liberal em relação à oferta e à publicida<strong>de</strong>, se objetiva<br />

ou subjetiva. Por incidência <strong>do</strong> § 4º <strong>do</strong> art. 14 <strong>do</strong> CDC – que, como visto, serve para completar o senti<strong>do</strong> da responsabilida<strong>de</strong> pela<br />

oferta –, a responsabilida<strong>de</strong> é subjetiva, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser provada a sua culpa. A título <strong>de</strong> exemplo, cite-se a hipótese envolven<strong>do</strong> o<br />

<strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar pessoal <strong>do</strong> publicitário responsável pelo conteú<strong>do</strong> das informações ou da celebrida<strong>de</strong> que relaciona o seu nome ao<br />

produto, como se verá.<br />

Além da responsabilida<strong>de</strong> objetiva como regra, a Lei 8.078/1990 estabelece a solidarieda<strong>de</strong> entre to<strong>do</strong>s os envolvi<strong>do</strong>s na<br />

veiculação da oferta. Preconiza o caput <strong>do</strong> seu art. 34 que “O fornece<strong>do</strong>r <strong>do</strong> produto ou serviço é solidariamente responsável pelos<br />

atos <strong>de</strong> seus prepostos ou representantes autônomos”. Trata-se <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>corrência normal <strong>do</strong> regime <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> retira<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

art. 7º, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC. A<strong>de</strong>mais, como bem expõe a <strong>do</strong>utrina consumerista, a<strong>do</strong>tou-se um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong><br />

solidária por relação <strong>de</strong> pressuposição, nos mol<strong>de</strong>s <strong>do</strong> que consta <strong>do</strong>s arts. 932, inc. III, e 942, parágrafo único, <strong>do</strong> Código Civil<br />

<strong>de</strong> 2002.13<br />

Compare-se que a responsabilida<strong>de</strong> pelo ato <strong>do</strong> preposto é objetiva, com a diferença substancial <strong>de</strong> que, no sistema<br />

consumerista, não há necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se provar a culpa <strong>do</strong> último, <strong>do</strong> preposto. Tal confrontação é importante, pois, no sistema<br />

civil, a <strong>do</strong>utrina majoritária enten<strong>de</strong> pela responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong> emprega<strong>do</strong>r ou comitente, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que provada a culpa <strong>do</strong><br />

emprega<strong>do</strong> ou preposto, o que é interpretação <strong>do</strong> art. 933 da codificação privada. 14 Trata-se daquilo que Álvaro Villaça Azeve<strong>do</strong>


<strong>de</strong>nomina uma responsabilida<strong>de</strong> objetiva impura, pela presença <strong>de</strong> culpa da outra parte.15 De toda sorte, como bem expõe Bruno<br />

Miragem, no sistema consumerista é possível que a empresa também responda por culpa <strong>de</strong> seu preposto, assegura<strong>do</strong> o direito <strong>de</strong><br />

regresso em face <strong>do</strong> culpa<strong>do</strong>, nos termos <strong>do</strong> art. 934 <strong>do</strong> CC/2002, após ter si<strong>do</strong> satisfeito o consumi<strong>do</strong>r nos seus direitos. 16<br />

De toda sorte, o teor <strong>de</strong> extensão <strong>do</strong> art. 34 <strong>do</strong> CDC é visto com reservas pela <strong>do</strong>utrina e pela jurisprudência. Como esclarece<br />

Herman Benjamin, pelo teor <strong>do</strong> dispositivo, o consumi<strong>do</strong>r somente po<strong>de</strong> <strong>de</strong>mandar o anunciante da oferta, em regra. Sen<strong>do</strong> assim,<br />

“tal limitação passiva <strong>do</strong> princípio traz, como consequência, a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r acionar, exceto em circunstâncias<br />

especiais, a agência e o veículo. Vale dizer, caso ao fornece<strong>do</strong>r fosse da<strong>do</strong> o direito <strong>de</strong> exigir sua responsabilida<strong>de</strong> a pretexto <strong>de</strong><br />

que o equívoco no anúncio foi causa<strong>do</strong> pela agência ou pelo veículo, o consumi<strong>do</strong>r, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> acionar nenhum <strong>do</strong>s sujeitos<br />

envolvi<strong>do</strong>s com o fenômeno publicitário, ficaria sem recurso jurídico disponível, ou seja, haveria <strong>de</strong> arcar sozinho com o seu<br />

prejuízo. Se a <strong>de</strong>sconformida<strong>de</strong> no anúncio <strong>de</strong>correr <strong>de</strong> falha da agência ou <strong>do</strong> veículo, só o anunciante, e não o consumi<strong>do</strong>r,<br />

dispõe <strong>do</strong>s recursos – inclusive contratuais –, para evitá-los, controlá-los e cobrá-los. A escolha e contratação da agência e <strong>do</strong><br />

veículo são efetua<strong>do</strong>s pelo próprio anunciante e só por ele. É ele quem os paga, os repreen<strong>de</strong> e, eventualmente, por rompimento<br />

contratual, os aciona”. 17 Essa impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>mandar a agência e o veículo <strong>de</strong> comunicação, como regra, tem<br />

si<strong>do</strong> a conclusão <strong>do</strong> STJ, conforme ementas a seguir:<br />

“Civil e processual. Ação <strong>de</strong> cobrança, cumulada com in<strong>de</strong>nização por danos morais. Contratação <strong>de</strong> empréstimo junto a instituição<br />

financeira. Depósito <strong>de</strong> importância a título <strong>de</strong> primeira prestação. Crédito mutua<strong>do</strong> não concedi<strong>do</strong>. Atribuição <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong><br />

civil ao presta<strong>do</strong>r <strong>do</strong> serviço e à re<strong>de</strong> <strong>de</strong> televisão que, em programa seu, apresentara propaganda <strong>do</strong> produto e serviço. ‘Publicida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> palco’. Características. Finalida<strong>de</strong>. Ausência <strong>de</strong> garantia, pela emissora, da qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> bem ou serviço anuncia<strong>do</strong>. Mera<br />

veiculação publicitária. Exclusão da li<strong>de</strong>. Multa procrastinatória aplicada pela instância ordinária. Propósito <strong>de</strong> prequestionamento.<br />

Exclusão. Súmula 98-STJ. CDC, arts. 3º, 12, 14, 18, 20, 36, parágrafo único, e 38; CPC, art. 267, VI. I. A responsabilida<strong>de</strong> pela<br />

qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produto ou serviço anuncia<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r é <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r respectivo, assim conceitua<strong>do</strong> nos termos <strong>do</strong> art. 3º da<br />

Lei 8.078/1990, não se esten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> à empresa <strong>de</strong> comunicação que veicula a propaganda por meio <strong>de</strong> apresenta<strong>do</strong>r durante programa<br />

<strong>de</strong> televisão, <strong>de</strong>nominada ‘publicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> palco’. II. Destarte, é <strong>de</strong> se excluir da li<strong>de</strong>, por ilegitimida<strong>de</strong> passiva ad causam, a<br />

emissora <strong>de</strong> televisão, por não se lhe po<strong>de</strong>r atribuir corresponsabilida<strong>de</strong> por apresentar publicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> empresa financeira, também<br />

ré na ação, que teria <strong>de</strong>ixa<strong>do</strong> <strong>de</strong> fornecer o empréstimo ao telespecta<strong>do</strong>r nas condições prometidas no anúncio. III. ‘Embargos <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>claração manifesta<strong>do</strong>s com notório propósito <strong>de</strong> prequestionamento não têm caráter protelatório’ (Súmula n. 98/STJ). IV. Recurso<br />

especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1157228/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 03.02.2011 – DJe<br />

27.04.2011).<br />

“Recurso especial. Prequestionamento. Inocorrência. Súmula 282/STF. Falta <strong>de</strong> combate aos fundamentos <strong>do</strong> acórdão. Aplicação<br />

analógica da Súmula 182. Princípio da dialeticida<strong>de</strong> recursal. Ação civil pública. Consumi<strong>do</strong>r. Veículos <strong>de</strong> comunicação. Eventual<br />

propaganda ou anúncio enganoso ou abusivo. Ausência <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>. CDC, art. 38. Fundamentos constitucionais. I. Falta<br />

prequestionamento quan<strong>do</strong> o dispositivo legal supostamente viola<strong>do</strong> não foi discuti<strong>do</strong> na formação <strong>do</strong> acórdão recorri<strong>do</strong>. II. É<br />

inviável o recurso especial que não ataca os fundamentos <strong>do</strong> acórdão recorri<strong>do</strong>. Inteligência da Súmula 182. III. As empresas <strong>de</strong><br />

comunicação não respon<strong>de</strong>m por publicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> propostas abusivas ou enganosas. Tal responsabilida<strong>de</strong> toca aos fornece<strong>do</strong>resanunciantes,<br />

que a patrocinaram (CDC, arts. 3º e 38). IV. O CDC, quan<strong>do</strong> trata <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong>, impõe <strong>de</strong>veres ao anunciante – não<br />

às empresas <strong>de</strong> comunicação (art. 3º, CDC). V. Fundamentação apoiada em dispositivo ou princípio constitucional é imune a<br />

recurso especial” (STJ – REsp 604.172/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Humberto Gomes <strong>de</strong> Barros – j. 27.03.2007 – DJ<br />

21.05.2007, p. 568).<br />

Nos Tribunais Estaduais po<strong>de</strong>m ser encontradas várias <strong>de</strong>cisões na mesma linha, colacionan<strong>do</strong>-se, por todas, a seguinte<br />

ementa, <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Minas Gerais, excluin<strong>do</strong> a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> veículo <strong>de</strong> comunicação: “Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Danos<br />

materiais e morais. Publicida<strong>de</strong> enganosa. Empresa <strong>de</strong> radiodifusão. Mera veicula<strong>do</strong>ra. Ausência <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>. A empresa<br />

<strong>de</strong> radiodifusão que veicula publicida<strong>de</strong> ou propaganda posteriormente verificada como enganosa ou abusiva não possui<br />

responsabilida<strong>de</strong> pelo seu conteú<strong>do</strong>. Cabe ao autor <strong>de</strong>monstrar que a empresa <strong>de</strong> comunicação extrapolou a sua função <strong>de</strong> veicular<br />

o conteú<strong>do</strong> apresenta<strong>do</strong> pelo fornece<strong>do</strong>r-anunciante, induzin<strong>do</strong> os consumi<strong>do</strong>res a erro, bem como o nexo causal com os danos<br />

sofri<strong>do</strong>s, sob pena <strong>de</strong> in<strong>de</strong>ferimento <strong>do</strong>s pedi<strong>do</strong>s <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização” (TJMG – Apelação Cível 1335800-81.2006.8.13.0056,<br />

Barbacena – Décima Segunda Câmara Cível – Rel. Des. Alvimar <strong>de</strong> Ávila – j. 30.03.2011 – DJEMG 02.05.2011).<br />

Como o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito ao próprio autor <strong>do</strong> dispositivo legal e à jurisprudência, essa não parece ser a melhor conclusão, por<br />

contrariar to<strong>do</strong> o sistema <strong>de</strong> proteção e <strong>de</strong> responsabilização objetiva <strong>do</strong> CDC. A atribuição <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> a apenas uma das<br />

pessoas da ca<strong>de</strong>ia publicitária afasta-se da presunção <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> a<strong>do</strong>tada pela Lei Consumerista, representan<strong>do</strong> uma volta ao<br />

sistema subjetivo <strong>de</strong> investigação <strong>de</strong> culpa. Além disso, há uma total <strong>de</strong>clinação da boa-fé objetiva e da teoria da aparência que<br />

também compõem a Lei 8.078/1990. Em reforço, para a responsabilização <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os envolvi<strong>do</strong>s, serve como luva o conceito <strong>de</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>, <strong>de</strong> Leonar<strong>do</strong> Bessa, exposto no Capítulo 3 da presente obra. A<strong>de</strong>mais, a publicida<strong>de</strong> parece entrar no<br />

risco-proveito ou no risco <strong>do</strong> empreendimento da agência e <strong>do</strong> veículo, que <strong>de</strong>vem respon<strong>de</strong>r solidariamente pela comunicação.


Por fim, <strong>de</strong>veria ser aplica<strong>do</strong>, por analogia, o entendimento constante da Súmula 221 <strong>do</strong> STJ, que trata da responsabilida<strong>de</strong> civil<br />

<strong>do</strong>s órgãos <strong>de</strong> imprensa, in verbis: “São civilmente responsáveis pelo ressarcimento <strong>de</strong> dano, <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> publicação pela<br />

imprensa, tanto o autor <strong>do</strong> escrito quanto o proprietário <strong>do</strong> veículo <strong>de</strong> divulgação”.<br />

Por tais argumentos, enten<strong>de</strong>mos que, haven<strong>do</strong> uma publicida<strong>de</strong> ou oferta que causou danos aos consumi<strong>do</strong>res, em regra e<br />

sem qualquer distinção, respon<strong>de</strong>m solidariamente o veículo <strong>de</strong> comunicação, a empresa que a patrocinou e to<strong>do</strong>s os responsáveis<br />

pelo seu conteú<strong>do</strong> (agência <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> e seus profissionais). Destaque-se que essa também e a posição <strong>de</strong> Luiz Antonio<br />

Rizzatto Nunes, citan<strong>do</strong> o art. 45 <strong>do</strong> Código Brasileiro <strong>de</strong> Autorregulamentação Publicitária.18 Transcreve-se o último dispositivo<br />

para as <strong>de</strong>vidas reflexões:<br />

“A responsabilida<strong>de</strong> pela observância das normas <strong>de</strong> conduta estabelecidas neste Código cabe ao anunciante e à sua agência, bem<br />

como ao veículo, ressalvadas no caso <strong>de</strong>ste último as circunstâncias específicas que serão abordadas mais adiante, neste artigo:<br />

a.<br />

b.<br />

c.<br />

d.<br />

o anunciante assumirá responsabilida<strong>de</strong> total por sua publicida<strong>de</strong>;<br />

a agência <strong>de</strong>ve ter o máximo cuida<strong>do</strong> na elaboração <strong>do</strong> anúncio, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a habilitar o cliente anunciante a cumprir sua<br />

responsabilida<strong>de</strong>, com ele respon<strong>de</strong>n<strong>do</strong> solidariamente pela obediência aos preceitos <strong>de</strong>ste Código;<br />

este Código recomenda aos veículos que, como medida preventiva, estabeleçam um sistema <strong>de</strong> controle na recepção <strong>de</strong><br />

anúncios.<br />

Po<strong>de</strong>rá o veículo:<br />

c.1) recusar o anúncio, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Conselho Nacional <strong>de</strong> Autorregulamentação Publicitária –<br />

CONAR, quan<strong>do</strong> enten<strong>de</strong>r que o seu conteú<strong>do</strong> fere, flagrantemente, princípios <strong>de</strong>ste Código, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong>, nesta<br />

hipótese, comunicar sua <strong>de</strong>cisão ao Conselho Superior <strong>do</strong> CONAR que, se for o caso, <strong>de</strong>terminará a instauração <strong>de</strong><br />

processo ético;<br />

c.2) recusar anúncio que fira a sua linha editorial, jornalística ou <strong>de</strong> programação;<br />

c.3) recusar anúncio sem i<strong>de</strong>ntificação <strong>do</strong> patrocina<strong>do</strong>r, salvo o caso <strong>de</strong> campanha que se enquadre no parágrafo único <strong>do</strong><br />

art. 9º (teaser);<br />

c.4) recusar anúncio <strong>de</strong> polêmica ou <strong>de</strong>núncia sem expressa autorização <strong>de</strong> fonte conhecida que responda pela autoria da<br />

peça;<br />

o controle na recepção <strong>de</strong> anúncios, preconiza<strong>do</strong> na letra c <strong>de</strong>ste artigo, <strong>de</strong>verá a<strong>do</strong>tar maiores precauções em relação à peça<br />

apresentada sem a intermediação <strong>de</strong> agência, que, por ignorância ou má-fé <strong>do</strong> anunciante, po<strong>de</strong>rá transgredir princípios<br />

<strong>de</strong>ste Código; e. a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> veículo será equiparada à <strong>do</strong> anunciante sempre que a veiculação <strong>do</strong> anúncio<br />

contrariar os termos <strong>de</strong> recomendação que lhe tenha si<strong>do</strong> comunicada oficialmente pelo Conselho Nacional <strong>de</strong><br />

Autorregulamentação Publicitária – CONAR”.<br />

Apesar <strong>de</strong> a norma ter um caráter administrativo, não nos parece que haja qualquer problema em se a<strong>do</strong>tar as mesmas<br />

premissas para a responsabilida<strong>de</strong> civil da agência <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> e <strong>do</strong> veículo <strong>de</strong> comunicação ante os consumi<strong>do</strong>res, o que é<br />

<strong>de</strong>dução direta da aplicação da teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes, em benefício <strong>do</strong> vulnerável negocial.<br />

Feita tal ressalva teórica e prática, partin<strong>do</strong>-se para a exposição <strong>de</strong> julga<strong>do</strong>s sobre a amplitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> art. 34 <strong>do</strong> CDC, os Tribunais<br />

Estaduais têm responsabiliza<strong>do</strong> empresas <strong>de</strong> capitalização por informações errôneas prestadas por seus propostos, que induzem os<br />

consumi<strong>do</strong>res a pensar que estão adquirin<strong>do</strong> veículos ou a casa própria. Por to<strong>do</strong>s, <strong>do</strong> Tribunal Paulista:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Danos morais e materiais. Título <strong>de</strong> capitalização. Publicida<strong>de</strong> enganosa que fez o consumi<strong>do</strong>r acreditar<br />

que se tratava <strong>de</strong> contrato para aquisição <strong>de</strong> veículo. art. 37, § 1º, <strong>do</strong> CDC. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r à informação clara e precisa<br />

viola<strong>do</strong>. Art. 6º, III e IV e 46 <strong>do</strong> CDC. Ré que respon<strong>de</strong> por atos <strong>do</strong>s corretores que oferecem seus produtos aos consumi<strong>do</strong>res.<br />

Devolução <strong>do</strong>s valores pagos <strong>de</strong>vida. Art. 34 <strong>do</strong> CDC. Ré que, ainda, não propiciou o pagamento das parcelas, frustran<strong>do</strong> as<br />

expectativas <strong>do</strong> autor. Danos morais caracteriza<strong>do</strong>s que <strong>de</strong>vem ser repara<strong>do</strong>s. Fixação em R$ 5.000,00 que aten<strong>de</strong> aos objetivos da<br />

reparação civil <strong>de</strong> danos. Pretensão <strong>do</strong> autor-apelante <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização em perdas e danos e aplicação <strong>de</strong> sanção contratual<br />

suplementar. Inadmissibilida<strong>de</strong>. Recurso <strong>do</strong> autor parcialmente provi<strong>do</strong> e da ré improvi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação 0061580-<br />

22.2009.8.26.0000 – Acórdão 4914902, Campinas – Vigésima Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. J. B. Franco <strong>de</strong><br />

Go<strong>do</strong>i – j. 15.12.2010 – DJESP 10.02.2011).<br />

“Apelação. Título <strong>de</strong> capitalização. Ausência <strong>de</strong> informações suficientes que possibilitassem o conhecimento prévio <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o<br />

conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> contrato. Ofensa ao princípio da transparência (art. 46 <strong>do</strong> CDC). Publicida<strong>de</strong> enganosa vinculava a contratação <strong>do</strong>s<br />

títulos a aquisição <strong>de</strong> imóvel, geran<strong>do</strong> expectativas que não correspon<strong>de</strong>m à realida<strong>de</strong> (art. 37, § 1º <strong>do</strong> CDC). Dano moral<br />

configura<strong>do</strong> diante <strong>do</strong> constrangimento e vergonha experimenta<strong>do</strong>s pelo apelante, que teve frustrada sua expectativa <strong>de</strong> aquisição <strong>de</strong><br />

casa própria. Responsabilida<strong>de</strong> solidária configurada (art. 34 <strong>do</strong> CDC). Sucumbência. Ônus <strong>de</strong>verá ser suporta<strong>do</strong> pelas apeladas<br />

diante <strong>do</strong> acolhimento <strong>do</strong> pleito recursal. Recurso provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação 991.09.004905-6 – Acórdão 4484395, Paraguaçu


Paulista – Trigésima Sétima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Tasso Duarte <strong>de</strong> Melo – j. 02.09.2009 – DJESP 18.06.2010).<br />

Do Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça colaciona-se importante <strong>de</strong>cisão que responsabilizou empresa nacional pelos vícios <strong>do</strong><br />

produto da empresa multinacional, adquiri<strong>do</strong> no exterior. Em vez <strong>do</strong> caminho da responsabilização solidária <strong>do</strong> art. 18 <strong>do</strong> CDC,<br />

percorreu-se a <strong>de</strong>dução pela teoria da aparência e pela responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>corrente da publicida<strong>de</strong> (no julga<strong>do</strong>, tratada como<br />

sinônimo <strong>de</strong> propaganda):<br />

“<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Filma<strong>do</strong>ra adquirida no exterior. Defeito da merca<strong>do</strong>ria. Responsabilida<strong>de</strong> da empresa nacional da mesma<br />

marca (‘Panasonic’). Economia globalizada. Propaganda. Proteção ao consumi<strong>do</strong>r. Peculiarida<strong>de</strong>s da espécie. Situações a pon<strong>de</strong>rar<br />

nos casos concretos. Nulida<strong>de</strong> <strong>do</strong> acórdão estadual rejeitada, porque suficientemente fundamenta<strong>do</strong>. Recurso conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong><br />

no mérito, por maioria. I. Se a economia globalizada não mais tem fronteiras rígidas e estimula e favorece a livre concorrência,<br />

imprescindível que as leis <strong>de</strong> proteção ao consumi<strong>do</strong>r ganhem maior expressão em sua exegese, na busca <strong>do</strong> equilíbrio que <strong>de</strong>ve<br />

reger as relações jurídicas, dimensionan<strong>do</strong>-se, inclusive, o fator risco, inerente à competitivida<strong>de</strong> <strong>do</strong> comércio e <strong>do</strong>s negócios<br />

mercantis, sobretu<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> em escala internacional, em que presentes empresas po<strong>de</strong>rosas, multinacionais, com filiais em vários<br />

países, sem falar nas vendas hoje efetuadas pelo processo tecnológico da informática e no forte merca<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r que representa<br />

o nosso País. II. O merca<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, não há como negar, vê-se hoje ‘bombar<strong>de</strong>a<strong>do</strong>’ diuturnamente por intensa e hábil<br />

propaganda, a induzir a aquisição <strong>de</strong> produtos, notadamente os sofistica<strong>do</strong>s <strong>de</strong> procedência estrangeira, levan<strong>do</strong> em linha <strong>de</strong> conta<br />

diversos fatores, <strong>de</strong>ntre os quais, e com relevo, a respeitabilida<strong>de</strong> da marca. III. Se empresas nacionais se beneficiam <strong>de</strong> marcas<br />

mundialmente conhecidas, incumbe-lhes respon<strong>de</strong>r também pelas <strong>de</strong>ficiências <strong>do</strong>s produtos que anunciam e comercializam, não<br />

sen<strong>do</strong> razoável <strong>de</strong>stinar-se ao consumi<strong>do</strong>r as consequências negativas <strong>do</strong>s negócios envolven<strong>do</strong> objetos <strong>de</strong>feituosos. IV. Impõe-se,<br />

no entanto, nos casos concretos, pon<strong>de</strong>rar as situações existentes. V. Rejeita-se a nulida<strong>de</strong> arguida quan<strong>do</strong> sem lastro na lei ou nos<br />

autos” (STJ – REsp 63.981/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – Rel. p/Acórdão Min. Sálvio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong><br />

Teixeira – j. 11.04.2000 – DJ 20.11.2000, p. 296).<br />

Ainda para exemplificar, confirman<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> aqui antes transcrito, tem-se responsabiliza<strong>do</strong> solidariamente a monta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong><br />

automóveis e a concessionária correspon<strong>de</strong>nte pelas informações mal prestadas quan<strong>do</strong> da veiculação das informações em veículo<br />

<strong>de</strong> comunicação. Assim <strong>de</strong>duzin<strong>do</strong>:<br />

“Processo civil. Propaganda enganosa. Concessionária (revenda). Monta<strong>do</strong>ra (fabricante). Responsabilida<strong>de</strong> solidária.<br />

Reconhecimento da legitimida<strong>de</strong> passiva. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Descumprimento da oferta veiculada em revista <strong>de</strong> âmbito<br />

nacional. Consequências estabelecidas no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Dano moral não configura<strong>do</strong>. Nos termos <strong>do</strong> art. 30,<br />

<strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, a concessionária <strong>de</strong> veículos é responsável solidária pela publicida<strong>de</strong> veiculada pela<br />

respectiva monta<strong>do</strong>ra em revista com circulação nacional, daí porque rejeita-se a alegação <strong>de</strong> ilegitimida<strong>de</strong> passiva. Ten<strong>do</strong> em vista<br />

que as partes <strong>de</strong>bateram sobre a questão <strong>de</strong> mérito e a prova resume-se a análise <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos junta<strong>do</strong>s pelas partes e sua<br />

subsunção às normas legais, rejeitada a alegação <strong>de</strong> ilegitimida<strong>de</strong> passiva, é possível avançar e <strong>de</strong>cidir o próprio mérito da <strong>de</strong>manda<br />

nos termos <strong>do</strong> § 3º, <strong>do</strong> art. 515, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. A publicida<strong>de</strong> enganosa, consistente em eventual discrepância entre as<br />

características <strong>do</strong> veículo anuncia<strong>do</strong> e aquele que foi adquiri<strong>do</strong>, não enseja a compensação por dano moral, a menos que se<br />

comprove a exposição a alguma situação capaz <strong>de</strong> atingir a integrida<strong>de</strong> física e psíquica <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, haja vista que o Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, em seu art. 35, estabelece as consequências próprias <strong>de</strong>sse inadimplemento, quais sejam o cumprimento<br />

força<strong>do</strong> da oferta, a entrega <strong>de</strong> outro produto equivalente, ou rescisão <strong>do</strong> contrato, com as consequências financeiras daí advindas, a<br />

critério <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Recurso conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong> para reconhecer a legitimida<strong>de</strong> passiva da ré, mas, no mérito, julgar<br />

improce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong> conti<strong>do</strong> na inicial” (TJDF – Recurso 2007.01.1.123989-4 – Acórdão 353.651 – Segunda Turma Recursal <strong>do</strong>s<br />

Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e Criminais – Rel. Juiz César Loyola – DJDFTE 05.05.2009).<br />

Amplian<strong>do</strong> sobremaneira o senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 34 <strong>do</strong> CDC, como <strong>de</strong>ve ser, e fazen<strong>do</strong> incidir a teoria da aparência, o Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul responsabilizou solidariamente o Po<strong>de</strong>r Público Municipal diante da frustração <strong>de</strong> curso <strong>de</strong><br />

informática, em hipótese <strong>de</strong> participação da administração na veiculação das notícias:<br />

“Administrativo. Ação coletiva. Frustração <strong>de</strong> curso <strong>de</strong> informática. Candidatos inscritos prejudica<strong>do</strong>s. Participação <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r<br />

Público Municipal e sua responsabilida<strong>de</strong>. Constatan<strong>do</strong>-se da prova <strong>do</strong>s autos que sem a participação <strong>do</strong> Município, inclusive com a<br />

utilização <strong>do</strong> nome da Secretaria <strong>de</strong> Educação, na propaganda veiculada, não teria ocorri<strong>do</strong> a confiança daqueles que se inscreveram<br />

em frustra<strong>do</strong> curso <strong>de</strong> informática, não há como afastar a responsabilida<strong>de</strong> solidária <strong>do</strong> ente público com os <strong>de</strong>mais agentes da<br />

malsinada arregimentação <strong>de</strong> candidatos que se viram financeiramente prejudica<strong>do</strong>s. Obrigação <strong>de</strong> fazer. Publicação <strong>do</strong> dispositivo<br />

sentencial. Razoabilida<strong>de</strong>. Multa e Po<strong>de</strong>r Público. A publicação <strong>do</strong> dispositivo sentencial, em duas edições semanais <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is<br />

jornais locais, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dar ciência aos interessa<strong>do</strong>s, afigura-se inteiramente razoável, assumin<strong>do</strong> seus custos<br />

os obriga<strong>do</strong>s solidários. A multa, como efetiva coerção patrimonial, apresenta-se como mecanismo inteiramente cabível à espécie,<br />

inclusive em face <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Público, não se apresentan<strong>do</strong> o valor <strong>de</strong>fini<strong>do</strong> em sentença – R$ 1.000,00 por dia <strong>de</strong> atraso – como<br />

<strong>de</strong>sproporcional, ante a facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atendimento da obrigação <strong>de</strong> fazer, representan<strong>do</strong> seu <strong>de</strong>scumprimento manifesta<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração com o interesse público” (TJRS – Apelação 70037103249, Jaguarão – Vigésima Primeira Câmara Cível – Rel.<br />

Des. Arminio José Abreu Lima da Rosa – j. 15.09.2010 – DJERS 01.10.2010).


Igualmente para elucidar o campo da norma, vejamos curiosa <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, que responsabilizou<br />

solidariamente empresa <strong>de</strong> aluguel <strong>de</strong> roupas e um motel pela publicida<strong>de</strong> enganosa veiculada, a gerar danos morais a um casal <strong>de</strong><br />

noivos:<br />

“<strong>Direito</strong> civil. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Descumprimento <strong>de</strong> cortesia oferecida por empresa <strong>de</strong> aluguel <strong>de</strong> roupas consistente em<br />

diária para os nubentes em suíte presi<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> motel. Responsabilida<strong>de</strong> solidária <strong>do</strong> motel e da loja <strong>de</strong> roupas. Comprovadas a<br />

propaganda enganosa e a situação vexatória a que foi submeti<strong>do</strong> o casal (arts. 14 e 37 <strong>do</strong> CDC). Recursos. Primeira apelação.<br />

Pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> reforma total da sentença. Descabimento. Provada nos autos a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> hotel. Segunda apelação.<br />

Preliminar <strong>de</strong> ilegitimida<strong>de</strong>. Pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> reforma da sentença. Descabimento. Demonstrada a cortesia oferecida pela loja, inclusive<br />

com fotos <strong>de</strong> out<strong>do</strong>ors mostran<strong>do</strong> a propaganda referente ao motel, juntadas aos autos pela própria empresa <strong>de</strong> aluguel <strong>de</strong> roupas.<br />

Recurso a<strong>de</strong>sivo. Pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> majoração da verba reparatória. Cabimento. Aplicação <strong>do</strong>s princípios da proporcionalida<strong>de</strong> e<br />

razoabilida<strong>de</strong>. Não resta dúvida <strong>de</strong> que os noivos passaram por situações constrange<strong>do</strong>ras e <strong>de</strong>gradantes, soman<strong>do</strong>-se ao fato <strong>de</strong> que<br />

tu<strong>do</strong> se suce<strong>de</strong>u num momento especial <strong>de</strong> suas vidas, e a noite que era para ser <strong>de</strong> intensa felicida<strong>de</strong> e amor tornou-se uma<br />

estressante aventura dantesca, entremeada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cepções e aborrecimentos. Desprovimento <strong>do</strong> primeiro e <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> apelo, e<br />

provimento <strong>do</strong> recurso a<strong>de</strong>sivo” (TJRJ – Apelação Cível 2005.001.41779 – Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Nagib Slaibi – j.<br />

07.02.2006).<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ve-se concluir – em relação ao prazo prescricional para se pleitear os danos em <strong>de</strong>corrência da<br />

oferta – pela incidência <strong>do</strong> art. 27 <strong>do</strong> CDC, diante <strong>de</strong> uma equiparação ao vício <strong>do</strong> serviço. Desse mo<strong>do</strong>, o prazo para a reparação<br />

<strong>de</strong> danos pelo consumi<strong>do</strong>r é <strong>de</strong> cinco anos, a contar da ocorrência <strong>do</strong> dano ou <strong>de</strong> sua autoria (actio nata, em sua faceta subjetiva).<br />

Encerran<strong>do</strong> o presente item, cumpre trazer a lume questão <strong>de</strong> <strong>de</strong>bate relativa à responsabilida<strong>de</strong> civil das celebrida<strong>de</strong>s, artistas,<br />

atletas e outras pessoas com notorieda<strong>de</strong> que atrelam o seu nome a <strong>de</strong> produtos e serviços no meio <strong>de</strong> oferta ou publicida<strong>de</strong>, os<br />

chama<strong>do</strong>s garotos propaganda, ou melhor, garotos publicida<strong>de</strong>.<br />

A tese <strong>de</strong> responsabilização <strong>de</strong> tais pessoas é <strong>de</strong>fendida pelo magistra<strong>do</strong> e professor Paulo Jorge Scartezzini Guimarães,<br />

contan<strong>do</strong> com o apoio <strong>de</strong> outros <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res, caso <strong>de</strong> Herman Benjamin e Fábio Henrique Po<strong>de</strong>stá, especialmente quan<strong>do</strong> tais<br />

celebrida<strong>de</strong>s recebem porcentagem pelas vendas realizadas.19 A premissa teórica igualmente conta com o apoio <strong>de</strong>ste autor, pois a<br />

tese representa outra importante aplicação da teoria da aparência, valorizan<strong>do</strong>-se mais uma vez a boa-fé objetiva nas relações <strong>de</strong><br />

consumo, em prol <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. Não se olvi<strong>de</strong> que, muitas vezes, os vulneráveis adquirem produtos e serviços diante da<br />

confiança <strong>de</strong>positada em tais artistas ou celebrida<strong>de</strong>s.<br />

6.5.<br />

A PUBLICIDADE NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRINCÍPIOS<br />

INFORMADORES. PUBLICIDADES VEDADAS OU ILÍCITAS<br />

A publicida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser conceituada como sen<strong>do</strong> qualquer forma <strong>de</strong> transmissão difusa <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e informações com o intuito<br />

<strong>de</strong> motivar a aquisição <strong>de</strong> produtos ou serviços no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo. Como bem expõe Gui<strong>do</strong> Alpa, nos últimos anos, a<br />

publicida<strong>de</strong> teve o seu papel altera<strong>do</strong>, <strong>de</strong> mecanismo <strong>de</strong> informação para mecanismo <strong>de</strong> persuasão <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.20<br />

Em termos gerais, a tutela da informação po<strong>de</strong> ser retirada <strong>do</strong> art. 6º, inc. III, da Lei 8.078/1990, que reconhece como direito<br />

básico <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r “a informação a<strong>de</strong>quada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta <strong>de</strong><br />

quantida<strong>de</strong>, características, composição, qualida<strong>de</strong> e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”. Ato contínuo, o inciso<br />

seguinte estabelece também como direito fundamental <strong>do</strong>s vulneráveis negociais “a proteção contra a publicida<strong>de</strong> enganosa e<br />

abusiva, méto<strong>do</strong>s comerciais coercitivos ou <strong>de</strong>sleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento<br />

<strong>de</strong> produtos e serviços” (art. 6º, inc. IV, <strong>do</strong> CDC).<br />

Os dispositivos consumeristas complementam o teor <strong>do</strong> art. 220 da Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988, segun<strong>do</strong> o qual a<br />

manifestação <strong>do</strong> pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão<br />

qualquer restrição, observa<strong>do</strong> o disposto no próprio Texto Maior. Em reforço, estabelece o § 4º que a propaganda comercial – leiase<br />

corretamente publicida<strong>de</strong> – <strong>de</strong> tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais,<br />

e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> seu uso. Como bem expõe A<strong>do</strong>lfo Mamoru<br />

Nishiyama, “a Constituição Fe<strong>de</strong>ral traça controle da publicida<strong>de</strong> no Brasil e o mesmo ocorre com o CDC. Mas esses controles,<br />

constitucional e legal, não visam eliminar a publicida<strong>de</strong>, pelo contrário, a finalida<strong>de</strong> é evitar abusos. O sistema <strong>de</strong> controle da<br />

publicida<strong>de</strong> a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> no Brasil é misto, conjugan<strong>do</strong> a autorregulamentação e a participação da administração e <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário<br />

(art. 5º, XXXV)”.21<br />

Pois bem, a respeito <strong>do</strong>s princípios informa<strong>do</strong>res da atuação publicitária, Antonio Herman V. Benjamin, autor <strong>do</strong> anteprojeto<br />

que gerou o CDC, enumera os seguintes: 22


a)<br />

b)<br />

c)<br />

d)<br />

e)<br />

f)<br />

g)<br />

h)<br />

i)<br />

Princípio da i<strong>de</strong>ntificação da publicida<strong>de</strong> – pois não se admite a publicida<strong>de</strong> clan<strong>de</strong>stina ou subliminar.<br />

Princípio da vinculação contratual da publicida<strong>de</strong> – diante da regra estampada no art. 30 <strong>do</strong> CDC, já estudada.<br />

Princípio da veracida<strong>de</strong> da publicida<strong>de</strong> – pela vedação da publicida<strong>de</strong> enganosa.<br />

Princípio da não abusivida<strong>de</strong> da publicida<strong>de</strong> – pela proibição da publicida<strong>de</strong> abusiva, tida também como ilícita.<br />

Princípio da inversão <strong>do</strong> ônus da prova – diante da regra <strong>do</strong> art. 38 <strong>do</strong> CDC, segun<strong>do</strong> a qual o conteú<strong>do</strong> da<br />

publicida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve ser prova<strong>do</strong> por quem a patrocina.<br />

Princípio da transparência da fundamentação da publicida<strong>de</strong> – a publicida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve estar sintonizada com a boa-fé<br />

objetiva e a lealda<strong>de</strong> negocial.<br />

Princípio da correção <strong>do</strong> <strong>de</strong>svio publicitário – além da reparação civil, presente o <strong>de</strong>svio, cabem medida<br />

administrativas e penais, bem como a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> veiculação <strong>de</strong> uma contrapropaganda (art. 56, inc. XII, <strong>do</strong><br />

CDC).<br />

Princípio da lealda<strong>de</strong> publicitária – retirada <strong>do</strong> art. 4º, inc. VI, <strong>do</strong> CDC que dispõe como fundamento da Política<br />

Nacional das Relações <strong>de</strong> Consumo a “coibição e repressão eficientes <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os abusos pratica<strong>do</strong>s no merca<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong> consumo, inclusive a concorrência <strong>de</strong>sleal e utilização in<strong>de</strong>vida <strong>de</strong> inventos e criações industriais das marcas e<br />

nomes comerciais e signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumi<strong>do</strong>res”.<br />

Princípio da i<strong>de</strong>ntificação publicitária – pela vedação da publicida<strong>de</strong> mascarada ou simulada/dissimulada.<br />

Anote-se que, em senti<strong>do</strong> próximo, e com maior simplicida<strong>de</strong>, Bruno Miragem apresenta três princípios fundamentais para a<br />

publicida<strong>de</strong>, a saber: a) princípio da i<strong>de</strong>ntificação; b) princípio da veracida<strong>de</strong> e; c) princípio da vinculação.23 Fixadas tais<br />

premissas básicas, vejamos os tipos <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong>s que são vedadas pelo Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, tidas como ilícitas,<br />

pontualmente.<br />

6.5.1.<br />

A vedação da publicida<strong>de</strong> mascarada, clan<strong>de</strong>stina, simulada ou dissimulada (art. 36 <strong>do</strong> CDC)<br />

Determina o caput <strong>do</strong> art. 36 da Lei 8.078/1990 que “A publicida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve ser veiculada <strong>de</strong> tal forma que o consumi<strong>do</strong>r, fácil e<br />

imediatamente, a i<strong>de</strong>ntifique como tal”. Trata-se da vedação, por ilicitu<strong>de</strong>, da publicida<strong>de</strong> mascarada, tida também com<br />

publicida<strong>de</strong> simulada ou dissimulada. É aquela transmissão <strong>de</strong> informações que parece que não é publicida<strong>de</strong>, mas é publicida<strong>de</strong>.<br />

Po<strong>de</strong> ser feito um paralelo com a simulação, vício social típico <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Civil (art. 167 <strong>do</strong> CC/2002), pois, nos <strong>do</strong>is casos, há uma<br />

discrepância entre a vonta<strong>de</strong> interna e a vonta<strong>de</strong> manifestada, isto é, entre aparência e essência.<br />

Em tom didático, leciona Fábio Ulhoa Coelho que “publicida<strong>de</strong> simulada é a que procura ocultar o seu caráter <strong>de</strong><br />

propaganda”. E ilustra: “São exemplos <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> simulada a inserção, em jornais e periódicos, <strong>de</strong> propaganda com aparência<br />

externa <strong>de</strong> reportagem, ou a subliminar, captável pelo inconsciente, mas imperceptível ao consciente”.24 Como se nota, o jurista<br />

segue a linha <strong>de</strong> sinonímia entre publicida<strong>de</strong> e propaganda.<br />

Consigne-se que Rizzatto Nunes prefere utilizar o termo publicida<strong>de</strong> clan<strong>de</strong>stina, o que está em sintonia com o art. 9º <strong>do</strong><br />

Código Brasileiro <strong>de</strong> Autorregulamentação Publicitária, o qual preceitua que toda publicida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve ser ostensiva: “Aqui no caput<br />

<strong>do</strong> art. 36 a lei <strong>de</strong>termina que além <strong>de</strong> ostensivo o anúncio publicitário <strong>de</strong>ve ser claro e passível <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação imediata pelo<br />

consumi<strong>do</strong>r. É a proibição da chamada publicida<strong>de</strong> clan<strong>de</strong>stina. A conhecida técnica <strong>de</strong> merchandising – que é especialmente<br />

praticada em programas e filmes transmiti<strong>do</strong>s pela televisão ou projeta<strong>do</strong>s em filmes no cinema – afronta diretamente essa norma.<br />

O merchandising é a técnica utilizada para veicular produtos e serviços <strong>de</strong> forma indireta por meio <strong>de</strong> inserções em produtos e<br />

filmes”. 25<br />

Deve ficar claro que esse tipo <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> ilícita não interessa tanto à responsabilida<strong>de</strong> civil consumerista, mas sim à<br />

imposição <strong>de</strong> multas administrativas pelos órgãos competentes. Em outras palavras, a categoria está mais próxima da tutela<br />

administrativa <strong>do</strong> que da tutela material <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Por fim, o parágrafo único <strong>do</strong> art. 36 estabelece que o fornece<strong>do</strong>r, na publicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seus produtos ou serviços, manterá, em<br />

seu po<strong>de</strong>r, para informação <strong>do</strong>s legítimos interessa<strong>do</strong>s, os da<strong>do</strong>s fáticos, técnicos e científicos que dão sustentação à mensagem. Na<br />

verda<strong>de</strong>, o dispositivo <strong>de</strong>veria completar não o art. 36, mas o art. 38 da Lei Consumerista, pois o seu teor tem mais relação com a<br />

prova da veracida<strong>de</strong> das informações publicitárias veiculadas que, <strong>de</strong> forma automática, cabe à empresa que as patrocina. O tema<br />

ainda será aborda<strong>do</strong>, fechan<strong>do</strong> o presente capítulo.<br />

6.5.2.<br />

A vedação da publicida<strong>de</strong> enganosa (art. 37, § 1º, <strong>do</strong> CDC)<br />

O caput <strong>do</strong> art. 37 da Lei 8.078/1990 proíbe expressamente a publicida<strong>de</strong> enganosa, aquela que induz o consumi<strong>do</strong>r ao<br />

engano. Em tom <strong>de</strong> conceituação, <strong>de</strong>fine o § 1º da norma que “É enganosa qualquer modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> informação ou comunicação <strong>de</strong>


caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro mo<strong>do</strong>, mesmo por omissão, capaz <strong>de</strong> induzir em erro o<br />

consumi<strong>do</strong>r a respeito da natureza, características, qualida<strong>de</strong>, quantida<strong>de</strong>, proprieda<strong>de</strong>s, origem, preço e quaisquer outros da<strong>do</strong>s<br />

sobre produtos e serviços”.<br />

Apesar da menção ao engano, ao erro, não se po<strong>de</strong> esquecer que o ato <strong>de</strong> indução representa <strong>do</strong>lo, ou seja, uma atuação<br />

maliciosa praticada com intuito <strong>de</strong> enganar outrem e ter benefício próprio. Então, o paralelo <strong>de</strong>ve ser feito, em diálogo das fontes,<br />

em relação ao tratamento <strong>de</strong>sse vício <strong>do</strong> consentimento, trata<strong>do</strong> entre os arts. 145 a 150 <strong>do</strong> CC/2002. Como se extrai <strong>do</strong> próprio<br />

coman<strong>do</strong> transcrito, a publicida<strong>de</strong> enganosa po<strong>de</strong> ser por ação ou por omissão.<br />

Na publicida<strong>de</strong> enganosa por ação, há um <strong>do</strong>lo positivo, uma atuação comissiva <strong>do</strong> agente. Cite-se como exemplo a<br />

campanha publicitária que afirma que <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> veículo tem um acessório, o que não é verda<strong>de</strong>. O mesmo po<strong>de</strong> ocorrer em<br />

relação a um eletro<strong>do</strong>méstico, como no seguinte caso: “Ten<strong>do</strong> em vista que o consumi<strong>do</strong>r foi induzi<strong>do</strong> em erro ao pensar que<br />

estava adquirin<strong>do</strong> uma câmera capaz <strong>de</strong> gravar ví<strong>de</strong>os com áudio, quan<strong>do</strong>, em realida<strong>de</strong>, o produto não possuía tal função, ficou<br />

comprovada a publicida<strong>de</strong> enganosa autoriza<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> rescisão contratual, com <strong>de</strong>volução <strong>do</strong> valor pago pelo bem” (TJRS – Recurso<br />

38878-52.2010.8.21.9000, Campo Bom – Primeira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Ricar<strong>do</strong> Torres Hermann – j. 14.04.2011 –<br />

DJERS 25.04.2011).<br />

Na publicida<strong>de</strong> enganosa por omissão há um <strong>do</strong>lo negativo, com atuação omissiva. Conforme o § 3º <strong>do</strong> art. 37 <strong>do</strong> CDC, a<br />

publicida<strong>de</strong> é enganosa por omissão quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> informar sobre da<strong>do</strong> essencial <strong>do</strong> produto ou serviço. Po<strong>de</strong> ser traça<strong>do</strong> um<br />

paralelo em relação ao art. 147 <strong>do</strong> CC, que trata <strong>do</strong> silêncio intencional como <strong>do</strong>lo negativo: “Nos negócios jurídicos bilaterais, o<br />

silêncio intencional <strong>de</strong> uma das partes a respeito <strong>de</strong> fato ou qualida<strong>de</strong> que a outra parte haja ignora<strong>do</strong>, constitui omissão <strong>do</strong>losa,<br />

provan<strong>do</strong>-se que sem ela o negócio não se teria celebra<strong>do</strong>”. A título <strong>de</strong> exemplo, cite-se a hipótese em que uma empresa <strong>de</strong><br />

refrigerantes lança uma campanha publicitária, mas <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> informar aos consumi<strong>do</strong>res que os prêmios constam das suas<br />

tampinhas (STJ – REsp 327.257/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 22.06.2004 – DJ 16.11.2004, p. 272).<br />

Além <strong>de</strong>ssas concretizações, vejamos como as Cortes Julga<strong>do</strong>ras têm aprecia<strong>do</strong> o problema da publicida<strong>de</strong> enganosa (tratada,<br />

muitas vezes, como sinônimo <strong>de</strong> propaganda enganosa), para os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s fins <strong>de</strong> ilustração. De início, colaciona-se ementa <strong>do</strong><br />

próprio STJ, que consagrou a responsabilida<strong>de</strong> objetiva diante da veiculação <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> enganosa relativa a celular:<br />

“Civil e processual. Agravo regimental. Responsabilida<strong>de</strong>. Relação <strong>de</strong> consumo. Propaganda enganosa. Consumi<strong>do</strong>ra atraída.<br />

Celular. Modificação contratual. Dano moral. Comprova<strong>do</strong>. Valor in<strong>de</strong>nizatório. Redução. Patamar razoável. Intervenção <strong>do</strong> STJ.<br />

Necessida<strong>de</strong>. Agravo regimental improvi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg no Ag 1045667/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior<br />

– j. 17.03.2009 – DJe 06.04.2009).<br />

Igualmente <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania, aresto <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2015, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 573, consi<strong>de</strong>rou que é<br />

“enganosa a publicida<strong>de</strong> televisiva que omite o preço e a forma <strong>de</strong> pagamento <strong>do</strong> produto, condicionan<strong>do</strong> a obtenção <strong>de</strong>ssas<br />

informações à realização <strong>de</strong> ligação telefônica tarifada”. Após citar toda a legislação consumerista, conclui o Ministro Relator: “a<br />

hipótese em análise é exemplo <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> enganosa por omissão, pois suprime algumas informações essenciais sobre o<br />

produto (preço e forma <strong>de</strong> pagamento), as quais somente po<strong>de</strong>m ser conhecidas pelo consumi<strong>do</strong>r mediante o ônus <strong>de</strong> uma ligação<br />

tarifada, mesmo que a compra não venha a ser concretizada. Além <strong>do</strong> mais, a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolha <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, direito básico<br />

previsto no inciso II <strong>do</strong> artigo 6º <strong>do</strong> CDC, está vinculada à correta, fi<strong>de</strong>digna e satisfatória informação sobre os produtos e os<br />

serviços postos no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo. De fato, a auto<strong>de</strong>terminação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> essencialmente da informação que<br />

lhe é transmitida, pois esta é um <strong>do</strong>s meios <strong>de</strong> formar a opinião e produzir a tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão daquele que consome. Logo, se a<br />

informação é a<strong>de</strong>quada, o consumi<strong>do</strong>r age com mais consciência; se a informação é falsa, inexistente ou omissa, retira-se-lhe a<br />

liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolha consciente. De mais a mais, o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informação <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r tem importância direta no surgimento e na<br />

manutenção da confiança por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Isso porque a informação <strong>de</strong>ficiente frustra as legítimas expectativas <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, maculan<strong>do</strong> sua confiança. Na hipótese aqui analisada, a falta <strong>de</strong> informação suprime a liberda<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>,<br />

previamente, recusar o produto e escolher outro, levan<strong>do</strong>-o, ainda que não venha a comprar, a fazer uma ligação tarifada para, só<br />

então, obter informações essenciais atinentes ao preço e à forma <strong>do</strong> pagamento, burlan<strong>do</strong>-lhe a confiança e oneran<strong>do</strong>-o” (STJ –<br />

REsp 1.428.801/RJ – Rel. Min. Humberto Martins – j. 27.10.2015 – DJe 13.11.2015).<br />

Retoman<strong>do</strong> o problema relativo ao serviço <strong>de</strong> celular, vejamos <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal Gaúcho, com conteú<strong>do</strong> atual e<br />

interessante:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Serviço <strong>de</strong> internet 3G. Falha na prestação <strong>do</strong> serviço. Publicida<strong>de</strong> enganosa. Cancelamento <strong>do</strong> contrato sem a<br />

incidência <strong>de</strong> multa. 1. Não ten<strong>do</strong> a ré comprova<strong>do</strong> efetivamente a utilização <strong>do</strong> serviço, bem como a disponibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> sinal na<br />

região on<strong>de</strong> resi<strong>de</strong> o autor, tem-se que houve falha na prestação <strong>do</strong> serviço em questão. Salienta-se, ainda, que, apesar <strong>de</strong> ser a<br />

mobilida<strong>de</strong> a principal característica <strong>do</strong> serviço <strong>de</strong> internet 3G, é obrigação da ré disponibilizar o produto na região on<strong>de</strong> é resi<strong>de</strong>nte<br />

o consumi<strong>do</strong>r, o que, no presente caso, não ocorreu. 2. Assim, haven<strong>do</strong> falha na prestação <strong>do</strong> serviço contrata<strong>do</strong>, impõe-se o


cancelamento <strong>do</strong> contrato sem qualquer ônus ao consumi<strong>do</strong>r. Sentença confirmada por seus próprios fundamentos. Recurso<br />

improvi<strong>do</strong>” (TJRS – Recurso 47266-41.2010.8.21.9000, Canela – Primeira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Ricar<strong>do</strong> Torres<br />

Hermann – j. 28.04.2011 – DJERS 04.05.2011).<br />

Seguin<strong>do</strong> nos exemplos, no âmbito <strong>do</strong> STJ enten<strong>de</strong>u-se flagrante a publicida<strong>de</strong> enganosa em caso envolven<strong>do</strong> o oferecimento<br />

<strong>de</strong> produto milagroso, que traria a cura <strong>do</strong> câncer, o cogumelo <strong>do</strong> sol. A presença <strong>de</strong> uma oferta ilícita foi dimensionada como ato<br />

grave pelo fato <strong>de</strong> o produto ser ofereci<strong>do</strong> a consumi<strong>do</strong>res i<strong>do</strong>sos, ti<strong>do</strong>s como hipervulneráveis, geran<strong>do</strong> a correspon<strong>de</strong>nte<br />

responsabilização civil por danos morais <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. Nos termos da ementa, “cuida-se <strong>de</strong> ação por danos morais proposta por<br />

consumi<strong>do</strong>r ludibria<strong>do</strong> por propaganda enganosa, em ofensa a direito subjetivo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> obter informações claras e<br />

precisas acerca <strong>de</strong> produto medicinal vendi<strong>do</strong> pela recorrida e <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> à cura <strong>de</strong> <strong>do</strong>enças malignas, <strong>de</strong>ntre outras funções. O<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r assegura que a oferta e apresentação <strong>de</strong> produtos ou serviços propiciem informações corretas,<br />

claras, precisas e ostensivas a respeito <strong>de</strong> características, qualida<strong>de</strong>s, garantia, composição, preço, garantia, prazos <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> e<br />

origem, além <strong>de</strong> vedar a publicida<strong>de</strong> enganosa e abusiva, que dispensa a <strong>de</strong>monstração <strong>do</strong> elemento subjetivo (<strong>do</strong>lo ou culpa) para<br />

sua configuração. A propaganda enganosa, como atesta<strong>do</strong> pelas instâncias ordinárias, tinha aptidão a induzir em erro o consumi<strong>do</strong>r<br />

fragiliza<strong>do</strong>, cuja conduta subsume-se à hipótese <strong>de</strong> esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> perigo (art. 156 <strong>do</strong> Código Civil). A vulnerabilida<strong>de</strong> informacional<br />

agravada ou potencializada, <strong>de</strong>nominada hipervulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, prevista no art. 39, IV, <strong>do</strong> CDC, <strong>de</strong>riva <strong>do</strong> manifesto<br />

<strong>de</strong>sequilíbrio entre as partes. O dano moral prescin<strong>de</strong> <strong>de</strong> prova e a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu causa<strong>do</strong>r opera-se in re ipsa em virtu<strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> <strong>de</strong>sconforto, da aflição e <strong>do</strong>s transtornos suporta<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r. Em virtu<strong>de</strong> das especificida<strong>de</strong>s fáticas da <strong>de</strong>manda,<br />

afigura-se razoável a fixação da verba in<strong>de</strong>nizatória por danos morais no valor <strong>de</strong> R$ 30.000,00 (trinta mil reais)” (STJ – REsp<br />

1.329.556/SP – Rel. Ministro Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – Terceira Turma – j. 25.11.2014 – DJe 09.12.2014).<br />

Do Tribunal <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong>staque-se brilhante acórdão que, em diálogo das fontes, aplica os conceitos da função social<br />

<strong>do</strong> contrato, da boa-fé objetiva e da dignida<strong>de</strong> humana, para concluir pela presença <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> enganosa na venda <strong>de</strong> produto<br />

para emagrecer pela internet:<br />

“Civil. CDC. Publicida<strong>de</strong> enganosa. Danos morais e materiais suporta<strong>do</strong>s. Produto oferta<strong>do</strong> como remédio para emagrecimento.<br />

Compra <strong>do</strong> produto. Ineficácia. Indução <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r a erro. Enganosida<strong>de</strong>. Quebra da boa-fé contratual. art. 422, <strong>do</strong> Código Civil<br />

Brasileiro <strong>de</strong> 2002. Abuso <strong>de</strong> direito. Caráter vinculativo da proposta. Arts. 30 e 37, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Lei<br />

8.078/1990. Proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva. Produto consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> como alimento com publicida<strong>de</strong><br />

suspensa pela ANVISA. Publicida<strong>de</strong> via internet. Nexo causal e dano configura<strong>do</strong>s. Oferta. Publicida<strong>de</strong>. Promessa <strong>de</strong> efeitos não<br />

evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong>s. Violação <strong>do</strong> art. 5º, incs. V e X, da CF/1988 c/c art. 12 c/c arts. 30, 35, III, 37 e 39, IV, 47, <strong>do</strong> CDC, Lei 8.078/1990.<br />

Inversão <strong>do</strong> ônus da prova. Art. 38 da Lei 8.078/1990, além <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar in casu a hipossuficiência técnica evi<strong>de</strong>nte.<br />

Vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r à luz <strong>do</strong> art. 6º, VIII, <strong>do</strong> CDC. Devolução <strong>do</strong> produto. Restituição <strong>do</strong> valor pago que se impõe.<br />

Dano moral caracteriza<strong>do</strong>. Constrangimento, abalo moral, frustração, angústia e indução a erro aproveitan<strong>do</strong>-se da fragilida<strong>de</strong> e da<br />

boa-fé <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>ra hipossuficiente. Princípio da dignida<strong>de</strong> da pessoa humana. Fixação <strong>do</strong> quantum em atenção aos critérios<br />

regula<strong>do</strong>res da matéria, sob o balizamento <strong>do</strong>s princípios da razoabilida<strong>de</strong> e proporcionabilida<strong>de</strong>. Prece<strong>de</strong>ntes das Turmas<br />

Recursais. Recurso conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>. Sentença reformada. Unânime. […]. Função social <strong>do</strong> contrato e interpretação <strong>do</strong> contrato<br />

<strong>de</strong> maneira mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r (art. 47, <strong>do</strong> CDC – Lei 8.078/1990). 5. Constitui publicida<strong>de</strong> enganosa (art. 37, § 1º, <strong>do</strong><br />

CDC) o anúncio <strong>de</strong> empresa que oferta produto para emagrecer na internet, <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> proibição da Agência Nacional <strong>de</strong><br />

Vigilância Sanitária (suspensão <strong>de</strong>terminada), fazen<strong>do</strong> promessas <strong>de</strong> perda <strong>de</strong> <strong>do</strong>is quilos por semana. Resulta<strong>do</strong> proclama<strong>do</strong> não<br />

obti<strong>do</strong> após cumprimento das orientações previstas. Angústia, constrangimento, frustração e indignação anormais, que exce<strong>de</strong>m o<br />

que se enten<strong>de</strong> como naturais, regulares por força da vida em coletivida<strong>de</strong>. Quebra da boa-fé. O art. 30, <strong>do</strong> CDC, consagra o<br />

princípio da boa-fé que <strong>de</strong>ve vigorar nas relações <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a fase pré-contratual, visan<strong>do</strong> tal norma coibir os abusos<br />

pratica<strong>do</strong>s por intermédio <strong>do</strong> chama<strong>do</strong> marketing, obrigan<strong>do</strong> o fornece<strong>do</strong>r a cumprir o prometi<strong>do</strong> em sua propaganda. […] Sentença<br />

reformada. Unânime” (TJDF – Acórdão 2007.07.1.003002-4 – Segunda Turma Recursal – Rel. Juiz Alfeu Macha<strong>do</strong> – DJU<br />

24.09.2007, p. 113).<br />

Retornan<strong>do</strong> novamente à jurisprudência <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, merece ser cita<strong>do</strong> aresto que diz respeito à venda <strong>de</strong><br />

um empreendimento divulga<strong>do</strong> e comercializa<strong>do</strong> como um hotel, mas que, na verda<strong>de</strong>, era um resi<strong>de</strong>ncial com serviços e que veio<br />

a ser interdita<strong>do</strong> pela municipalida<strong>de</strong>. De acor<strong>do</strong> com o julgamento, “o princípio da vinculação da publicida<strong>de</strong> reflete a imposição<br />

da transparência e da boa-fé nos méto<strong>do</strong>s comerciais, na publicida<strong>de</strong> e nos contratos, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que o fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos ou<br />

serviços obriga-se nos exatos termos da publicida<strong>de</strong> veiculada, sen<strong>do</strong> certo que essa vinculação esten<strong>de</strong>-se também às informações<br />

prestadas por funcionários ou representantes <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. Se a informação se refere a da<strong>do</strong> essencial capaz <strong>de</strong> onerar o<br />

consumi<strong>do</strong>r ou restringir seus direitos, <strong>de</strong>ve integrar o próprio anúncio, <strong>de</strong> forma precisa, clara e ostensiva, nos termos <strong>do</strong> art. 31<br />

<strong>do</strong> CDC, sob pena <strong>de</strong> configurar publicida<strong>de</strong> enganosa por omissão. No caso concreto, <strong>de</strong>sponta estreme <strong>de</strong> dúvida que o principal<br />

atrativo <strong>do</strong> projeto foi a sua divulgação como um empreendimento hoteleiro – o que se <strong>de</strong>ssume à toda vista da proeminente<br />

reputação que a Re<strong>de</strong> Meliá ostenta nesse ramo –, bem como foi omitida a falta <strong>de</strong> autorização <strong>do</strong> Município para que funcionasse


empresa <strong>de</strong>ssa envergadura na área, o que, a toda evidência, constitui publicida<strong>de</strong> enganosa, nos termos <strong>do</strong> art. 37, caput e § 3º, <strong>do</strong><br />

CDC, ren<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ensejo ao <strong>de</strong>sfazimento <strong>do</strong> negócio jurídico, à restituição <strong>do</strong>s valores pagos, bem como à percepção <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização<br />

por lucros cessantes e por dano moral” (STJ – REsp 1.188.442/RJ – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – Quarta Turma – j.<br />

06.11.2012 – DJe 05.02.2013).<br />

Do mesmo Tribunal da Cidadania, em 2014, enten<strong>de</strong>u-se pela presença <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> enganosa na veiculação da “Tele Sena<br />

Dia das Mães”. A autora da <strong>de</strong>manda alegou que seria impossível matematicamente atingir os pontos necessários para o ganho <strong>do</strong><br />

título <strong>de</strong> capitalização que havia adquiri<strong>do</strong>. Consta da ementa que “enganosa é a mensagem falsa ou que tenha aptidão a induzir a<br />

erro o consumi<strong>do</strong>r, que não conseguiria distinguir natureza, características, quantida<strong>de</strong>, qualida<strong>de</strong>, preço, origem e da<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

produto ou serviço contrata<strong>do</strong>. No caso concreto, extrai-se <strong>do</strong>s autos que da<strong>do</strong>s essenciais <strong>do</strong> produto ou serviço adquiri<strong>do</strong> foram<br />

omiti<strong>do</strong>s, geran<strong>do</strong> confusão para qualquer consumi<strong>do</strong>r médio, facilmente induzi<strong>do</strong> a erro” (STJ – REsp 1.344.967/SP – Terceira<br />

Turma – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – j. 26.08.2014 – DJe 15.09.2014).<br />

Seguin<strong>do</strong> nas elucidações práticas, em muitas situações a jurisprudência confirma que o simples fato <strong>do</strong> engano pela<br />

publicida<strong>de</strong>, por si só, não gera dano moral, que <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>correr das circunstâncias fáticas e das máximas <strong>de</strong> experiência. Por to<strong>do</strong>s:<br />

“Processual civil. Embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração recebi<strong>do</strong>s como agravo regimental. Propaganda promocional. A<strong>de</strong>são <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

Serviço não presta<strong>do</strong>. Frustração. Dano moral caracteriza<strong>do</strong>. Reexame <strong>do</strong> conjunto fático-probatório. Súmula 7 <strong>do</strong> STJ. Violação<br />

aos arts. 458 e 535 <strong>do</strong> CPC. Inexistência. Quantum in<strong>de</strong>nizatório. Razoável. Agravo improvi<strong>do</strong>. I. Não proce<strong>de</strong> a alegação <strong>de</strong><br />

ausência <strong>de</strong> fundamentação no acórdão recorri<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> está o mesmo completo, motiva<strong>do</strong> e com os requisitos necessários à<br />

formação <strong>de</strong> uma sentença. II. O STJ recebe o quadro probatório tal como <strong>de</strong>linea<strong>do</strong> pelo Tribunal estadual e o reexame <strong>de</strong> provas<br />

encontra o óbice da Súmula 7 <strong>de</strong>sta Corte. III. Agravo regimental improvi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg no Ag 796.675/RS – Quarta Turma –<br />

Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 13.11.2007 – DJ 17.12.2007, p. 185).<br />

Do Tribunal Paulista, é interessante o acórdão que aplicou o conceito <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> enganosa em face <strong>de</strong> instituição <strong>de</strong><br />

ensino superior, diante <strong>do</strong> engano causa<strong>do</strong> pelo não reconhecimento <strong>do</strong> curso, o que fez gerar danos morais pela frustração causada<br />

nos alunos:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Conduta imprópria <strong>de</strong> entida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino. Cooptação <strong>de</strong> alunos, expon<strong>do</strong>-lhes à formatura, sem a<br />

necessária regularização <strong>do</strong> curso. Publicida<strong>de</strong> enganosa, capaz <strong>de</strong> induzir em erro o consumi<strong>do</strong>r. Dano moral. Dever reparatório.<br />

Inteligência <strong>do</strong> art. 5º, V e X, da Constituição Fe<strong>de</strong>ral; art. 186, <strong>do</strong> Código Civil; arts. 6º, III e IV, 14, caput e § 1º, 31 e 37, § 1º, da<br />

Lei 8.078/1990. Apelo da autora. Provimento. Recurso da ré, a que se nega provimento” (TJSP – Apelação 9081234-<br />

70.2008.8.26.0000 – Acórdão 5069055, Votuporanga – Trigésima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Carlos Russo – j.<br />

13.04.2011 – DJESP 28.04.2011).<br />

Do mesmo mo<strong>do</strong>, enten<strong>de</strong>-se que há publicida<strong>de</strong> enganosa no caso <strong>de</strong> oferta <strong>de</strong> condições bem vantajosas para a compra <strong>de</strong><br />

veículo que entra em conflito com o teor <strong>do</strong> contrato, aplican<strong>do</strong>-se, em casos tais, os já estuda<strong>do</strong>s arts. 30 e 35 <strong>do</strong> CDC. Nesse<br />

contexto <strong>de</strong> <strong>de</strong>dução, “A publicida<strong>de</strong> exerce hodiernamente papel fundamental nas relações <strong>de</strong> consumo, influencian<strong>do</strong><br />

sobremaneira o comportamento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, quan<strong>do</strong> não o <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong>, <strong>de</strong> maneira que sua disciplina <strong>de</strong>ve ter equivalência<br />

contratual, com direcionamento pauta<strong>do</strong> na ética, boa-fé e dirigismo contratuais. Nesse contexto é que o legisla<strong>do</strong>r estatuiu como<br />

direito básico <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r a proteção contra a publicida<strong>de</strong> enganosa e abusiva, méto<strong>do</strong>s comerciais coercitivos ou <strong>de</strong>sleais, bem<br />

como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento <strong>de</strong> produtos e serviços (art. 6º, IV, CDC). É enganosa a<br />

publicida<strong>de</strong> se as condições <strong>de</strong> financiamento <strong>de</strong> veículo ofertadas em campanha publicitária feita através <strong>de</strong> impressos/encartes<br />

não são mantidas por ocasião <strong>do</strong> fechamento <strong>do</strong> negócio” (TJMG – Apelação Cível 0437539-56.2009.8.13.0106, Cambuí –<br />

Décima Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Sebastião Pereira <strong>de</strong> Souza – j. 06.10.2010 – DJEMG 29.11.2010).<br />

Seguin<strong>do</strong> o mesmo caminho, <strong>de</strong>duziu o Tribunal Fluminense que as <strong>de</strong>clarações constantes em folhetos publicitários, não<br />

cumpridas, po<strong>de</strong>m fazer caracterizar a publicida<strong>de</strong> como enganosa, notadamente se gerar no consumi<strong>do</strong>r justas expectativas que<br />

são frustradas posteriormente. Vejamos:<br />

“Na presente hipótese, a autora reclama <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> enganosa, na medida em que recebeu folheto <strong>de</strong> propaganda, prometen<strong>do</strong><br />

que, no dia <strong>do</strong> aniversário da autora, sua <strong>de</strong>spesa não seria cobrada, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que levasse um acompanhante pagante. Todavia, no<br />

referi<strong>do</strong> dia, o estabelecimento réu ignorou o panfleto promocional, cobran<strong>do</strong> também a <strong>de</strong>spesa da autora. A sentença rechaçou a<br />

pretensão autoral ao argumento <strong>de</strong> que, por se tratar <strong>de</strong> uma Feira, já havia uma promoção que vigorava para to<strong>do</strong>s, <strong>de</strong> 50% <strong>do</strong> valor<br />

<strong>do</strong> rodízio <strong>de</strong> carnes, e assim, não po<strong>de</strong>ria haver cumulação <strong>de</strong> promoções, o que teria si<strong>do</strong> veicula<strong>do</strong> em anúncios <strong>de</strong> jornal. Ocorre<br />

que, a meu ver, não era a autora obrigada a saber da existência <strong>de</strong> tal anúncio promocional para to<strong>do</strong>s. No panfleto dirigi<strong>do</strong><br />

exclusivamente a ela, autora, nenhuma ressalva havia. A seu turno, a ré não po<strong>de</strong> escudar-se em uma isenção promocional parcial<br />

dirigida a to<strong>do</strong>s os clientes, para negar uma isenção total <strong>de</strong> <strong>de</strong>spesa, prometida especificamente a ela, autora. O ato ilícito da ré,<br />

consubstancia<strong>do</strong> na publicida<strong>de</strong> enganosa, parece-me evi<strong>de</strong>nte, a merecer con<strong>de</strong>nação pelo Judiciário. O transtorno daí <strong>de</strong>corrente é


elevante, <strong>de</strong>sborda <strong>do</strong> comum <strong>do</strong> cotidiano, e o constrangimento <strong>de</strong>veras ocorreu, e em público, para quem pretendia usufruir <strong>do</strong><br />

benefício, e não conseguiu. Assim, enxergo dano moral in<strong>de</strong>nizável, que <strong>de</strong>ve ser compensa<strong>do</strong> também no seu viés punitivo e<br />

pedagógico. Razoável, na espécie, a fixação da reparação civil no patamar <strong>de</strong> R$ 1.000,00 (um mil reais). Por sua vez, a <strong>do</strong>bra na<br />

<strong>de</strong>volução <strong>do</strong> in<strong>de</strong>vidamente cobra<strong>do</strong> se impõe, na forma <strong>do</strong> art. 42, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC, o que importa na con<strong>de</strong>nação em R$<br />

105,40. Diante <strong>de</strong>sse quadro, sou pelo provimento <strong>do</strong> recurso para reformar a sentença e julgar parcialmente proce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong><br />

inicial, impon<strong>do</strong> à empresa ré in<strong>de</strong>nização por danos materiais no valor <strong>de</strong> R$ 105,40, e ainda, <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais em<br />

favor da autora no valor <strong>de</strong> R$ 1.000,00. Sem honorários” (TJRJ – Recurso 2007.700.0137943, Capital – Rel. Juiz Renato Lima<br />

Charnaux Sertã – j. 17.04.2007 – DORJ 28.11.2007, p. 344).<br />

Na prática, a publicida<strong>de</strong> não po<strong>de</strong> fazer promessas concretas mirabolantes, sob pena <strong>de</strong> caracterização <strong>do</strong> <strong>do</strong>lo publicitário<br />

enganoso. Nessa linha, vejamos interessante <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal Gaúcho, em situação que não po<strong>de</strong> ser tida como um exagero<br />

tolerável (puffing):<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Publicida<strong>de</strong> enganosa. Anúncio <strong>de</strong> curso <strong>de</strong> ‘leitura dinâmica’ garantin<strong>do</strong> resulta<strong>do</strong>s inatingíveis. <strong>Direito</strong> à restituição<br />

<strong>do</strong>s valores pagos pelo curso. Dano moral caracteriza<strong>do</strong>. Sen<strong>do</strong> legítima a expectativa <strong>do</strong> autor <strong>de</strong> que obtivesse, através <strong>de</strong><br />

programa integral <strong>de</strong> leitura ofereci<strong>do</strong> pelo réu, condições <strong>de</strong> ler 2.000 palavras por minuto, com 100% <strong>de</strong> retenção, e ven<strong>do</strong><br />

frustrada tal expectativa pela inatingibilida<strong>de</strong> da meta prometida, respon<strong>de</strong> o réu pelos prejuízos causa<strong>do</strong>s. Publicida<strong>de</strong> enganosa,<br />

prometen<strong>do</strong> a leitura <strong>de</strong> ‘200 páginas em 20 minutos com 100% <strong>de</strong> compreensão e retenção’. In<strong>de</strong>nização <strong>do</strong>s danos materiais<br />

equivalentes aos valores <strong>de</strong>spendi<strong>do</strong>s com o curso e fixação da in<strong>de</strong>nização <strong>do</strong>s danos morais em quantia módica (ementa extraída<br />

<strong>do</strong> Recurso Inomina<strong>do</strong> n. 71002666576, <strong>de</strong> relatoria <strong>do</strong> eminente Dr. Ricar<strong>do</strong> Torres Hermann). Recurso <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJRS –<br />

Recurso 32258-24.2010.8.21.9000, Porto Alegre – Terceira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Leandro Raul Klippel – j. 27.01.2011<br />

– DJERS 08.02.2011).<br />

Como bem esclarece Rizzatto Nunes, “se o puffing pu<strong>de</strong>r ser medi<strong>do</strong> objetivamente, e, <strong>de</strong> fato, não correspon<strong>de</strong>r à verda<strong>de</strong>,<br />

será, então, enganoso. Assim, por exemplo, se o anúncio diz que aquela pilha é ‘a pilha que mais dura’, tem <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r provar. Se é<br />

o ‘isqueiro’ que acen<strong>de</strong> mais vezes, também. Se é o ‘carro mais econômico da categoria’, da mesma forma etc.”.26 Todavia, vale a<br />

ressalva <strong>de</strong> Fábio Ulhoa Coelho, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que “o fantasioso (necessariamente falso) nem sempre induz ou é capaz <strong>de</strong> induzir o<br />

consumi<strong>do</strong>r em erro. A promoção, por exemplo, <strong>de</strong> drops, através da apresentação <strong>de</strong> filme com pessoas levitan<strong>do</strong> ao consumi-lo,<br />

implica veiculação <strong>de</strong> informações falsas (a guloseima não tem o efeito apresenta<strong>do</strong>), mas evi<strong>de</strong>ntemente insuscetível <strong>de</strong> enganar o<br />

consumi<strong>do</strong>r”. 27<br />

Sem prejuízo <strong>do</strong> puffing, cumpre tecer algumas palavras a respeito da prática <strong>do</strong> teaser, que vem a ser a utilização <strong>de</strong> artifícios<br />

<strong>de</strong> atração, para que o consumi<strong>do</strong>r tenha um primeiro contato com um produto ou serviço a ser adquiri<strong>do</strong>. Cite-se, a título <strong>de</strong><br />

exemplo, campanha publicitária <strong>do</strong> Limão, empresa <strong>do</strong> grupo Esta<strong>do</strong> (www.limao.com.br). Ou, ainda, publicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> veículo que<br />

utiliza a expressão “ele está chegan<strong>do</strong>”, sem apontar qual o mo<strong>de</strong>lo. Assim, como ocorre com os exageros publicitários, tais<br />

artifícios, em regra, são permiti<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não configure publicida<strong>de</strong> enganosa ou abusiva, servin<strong>do</strong> o Código Consumerista<br />

como mecanismo <strong>de</strong> controle.<br />

Por fim, na ótica <strong>do</strong> CDC, <strong>de</strong>ve ser visto com ressalvas o conceito <strong>de</strong> <strong>do</strong>lus bonus ou <strong>do</strong>lo bom, aquele que não prejudica a<br />

parte, ou até a beneficia. Como bem esclarece Carlos Ferreira <strong>de</strong> Almeida, jurista português, a construção <strong>do</strong> <strong>do</strong>lus bonus foi<br />

colocada em xeque no sistema lusitano, por contrariar o preceito máximo <strong>de</strong> lealda<strong>de</strong> na contratação e o direito à informação<br />

consagra<strong>do</strong>s pela norma consumerista. 28 A conclusão <strong>de</strong>ve ser a mesma no sistema brasileiro. Dessa forma, se a conduta<br />

publicitária for capaz <strong>de</strong> causar qualquer tipo <strong>de</strong> engano, mesmo que indireto, a gerar prejuízos mediatos ao consumi<strong>do</strong>r, ficará<br />

configurada a publicida<strong>de</strong> ilícita. Caso não haja prejuízo, não se po<strong>de</strong> falar em publicida<strong>de</strong> enganosa. Concluin<strong>do</strong> da última forma,<br />

<strong>do</strong> Tribunal <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul:<br />

“Apelação cível. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Propaganda enganosa. Danos morais. Não verificação. Improcedência <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>.<br />

Manutenção. Não configura propaganda enganosa a divulgação, por parte da financeira, <strong>de</strong> que opera com as melhores taxas <strong>do</strong><br />

merca<strong>do</strong>. Tal mensagem publicitária, para qualquer cidadão com o mínimo <strong>de</strong> discernimento, apenas exerce a força atrativa a que se<br />

propõe toda propaganda, jamais ten<strong>do</strong> o condão <strong>de</strong> ludibriar o consumi<strong>do</strong>r ou gerar vício no consentimento. Outrossim, o <strong>do</strong>lus<br />

bonus, evi<strong>de</strong>ntemente presente na hipótese, não vicia o negócio, sen<strong>do</strong> aceito socialmente. Trata-se <strong>de</strong> mecanismo muito utiliza<strong>do</strong><br />

como técnica <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong>, inexistin<strong>do</strong> qualquer ilicitu<strong>de</strong> no realce <strong>do</strong> produto, com finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atrair os clientes. Improcedência<br />

<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> mantida. Apelo <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJRS – Apelação Cível 500846-04.2010.8.21.7000, Igrejinha – Nona Câmara Cível – Rel.<br />

Des. Marilene Bonzanini Bernardi – j. 13.04.2011 – DJERS 20.04.2011).<br />

Mais uma vez, verifica-se uma interessante interação entre as normas <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e os conceitos<br />

clássicos <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Civil, na linha filosófica dialogal seguida pela presente obra.


6.5.3.<br />

A vedação da publicida<strong>de</strong> abusiva (art. 37, § 2º, <strong>do</strong> CDC)<br />

Diferentemente da publicida<strong>de</strong> enganosa, que induz o consumi<strong>do</strong>r a erro, a publicida<strong>de</strong> abusiva é aquela ilícita por trazer<br />

como conteú<strong>do</strong> o abuso <strong>de</strong> direito, tema que será aprofunda<strong>do</strong> no próximo capítulo. Dispõe o art. 37, § 2º, da Lei 8.078/1990, em<br />

tom mais uma vez exemplificativo, que são abusivas, <strong>de</strong>ntre outras, as seguintes práticas:<br />

a)<br />

b)<br />

c)<br />

d)<br />

e)<br />

f)<br />

A publicida<strong>de</strong> discriminatória <strong>de</strong> qualquer natureza.<br />

A publicida<strong>de</strong> que incita à violência.<br />

A publicida<strong>de</strong> que explora o me<strong>do</strong> ou a superstição.<br />

A publicida<strong>de</strong> que se aproveita da <strong>de</strong>ficiência <strong>de</strong> julgamento e experiência da criança.<br />

A publicida<strong>de</strong> que <strong>de</strong>srespeita valores ambientais.<br />

A publicida<strong>de</strong> que seja capaz <strong>de</strong> induzir o consumi<strong>do</strong>r a se comportar <strong>de</strong> forma prejudicial ou perigosa à sua saú<strong>de</strong> ou<br />

segurança.<br />

Como explica Fábio Ulhoa Coelho, a publicida<strong>de</strong> abusiva é aquela que agri<strong>de</strong> os valores sociais, presente uma conduta<br />

socialmente reprovável <strong>de</strong> abuso. E ilustra: “O fabricante <strong>de</strong> armas não po<strong>de</strong> promover o seu produto reforçan<strong>do</strong> a i<strong>de</strong>ologia da<br />

violência como meio <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos, ainda que esta solução resultasse suficiente, em termos merca<strong>do</strong>lógicos, junto a<br />

<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s segmentos da socieda<strong>de</strong>, inclusive os consumi<strong>do</strong>res <strong>de</strong> armamentos. Também é abusiva a publicida<strong>de</strong> racista,<br />

sexista, discriminatória e lesiva ao meio ambiente”.29 Deve ficar claro que, para a caracterização da publicida<strong>de</strong> abusiva, levam-se<br />

em conta os valores da comunida<strong>de</strong> e o senso geral comum.<br />

Diante <strong>do</strong> seu conteú<strong>do</strong>, muitas vezes agressivo, a publicida<strong>de</strong> abusiva po<strong>de</strong> gerar a responsabilida<strong>de</strong> civil das pessoas<br />

envolvidas, nos mol<strong>de</strong>s das premissas já expostas. Isso sem falar das penalida<strong>de</strong>s administrativas, como a imposição <strong>de</strong> pesadas<br />

multas pelos órgãos legitima<strong>do</strong>s ou a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a empresa fazer a contrapublicida<strong>de</strong>, tratada pela lei como<br />

contrapropaganda. Estipula o caput <strong>do</strong> art. 60 <strong>do</strong> CDC que a imposição <strong>de</strong> contrapropaganda será cominada quan<strong>do</strong> o fornece<strong>do</strong>r<br />

incorrer na prática <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> enganosa ou abusiva, sempre às expensas <strong>do</strong> infrator. Em complemento, prevê a mesma norma<br />

que a contrapropaganda será divulgada pelo responsável da mesma forma, frequência e dimensão e, preferencialmente no mesmo<br />

veículo, local, espaço e horário, <strong>de</strong> forma capaz <strong>de</strong> <strong>de</strong>sfazer o malefício da publicida<strong>de</strong> enganosa ou abusiva (art. 60, § 1º).<br />

A título <strong>de</strong> ilustração, cite-se julga<strong>do</strong> notório <strong>do</strong> Egrégio Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> São Paulo, o qual consi<strong>de</strong>rou ser<br />

abusiva uma publicida<strong>de</strong> que incitava as crianças à <strong>de</strong>struição <strong>de</strong> tênis velhos, os quais <strong>de</strong>veriam ser substituí<strong>do</strong>s por outros novos,<br />

situação tida como incentiva<strong>do</strong>ra da violência, abusan<strong>do</strong> da inocência das crianças:<br />

“Ação civil pública. Publicida<strong>de</strong> abusiva. Propaganda <strong>de</strong> tênis veiculada pela TV. Utilização da empatia da apresenta<strong>do</strong>ra.<br />

Induzimento das crianças a a<strong>do</strong>tarem o comportamento da apresenta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>struin<strong>do</strong> tênis usa<strong>do</strong>s para que seus pais comprassem<br />

novos, da marca sugerida. Ofensa ao art. 37, § 2º, <strong>do</strong> CDC. Sentença con<strong>de</strong>natória proibin<strong>do</strong> a veiculação e impon<strong>do</strong> encargo <strong>de</strong><br />

contrapropaganda e multa pelo <strong>de</strong>scumprimento da con<strong>de</strong>nação. Contrapropaganda que se tornou inócua ante o tempo já <strong>de</strong>corri<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a suspensão da mensagem. Recurso provi<strong>do</strong> parcialmente” (TJSP – Apelação Cível 241.337-1, São Paulo – Terceira Câmara<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Público – Rel. Ribeiro Macha<strong>do</strong> – j. 30.04.1996, v.u.).<br />

Pela ementa transcrita, nota-se que houve um enquadramento da prática como sen<strong>do</strong> um mau costume, conceito que mantém<br />

relação íntima com o texto encontra<strong>do</strong> no art. 187 <strong>do</strong> CC/2002, que traz os elementos configura<strong>do</strong>res o abuso <strong>de</strong> direito. Como se<br />

percebe, como a publicida<strong>de</strong> envolve valores coletivos em senti<strong>do</strong> amplo, cabe o manejo das medidas <strong>de</strong> tutela pela ação civil<br />

pública, inclusive com a atribuição <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais coletivos ou difusos, categorias já abordadas nesta obra.<br />

A propósito, em 2016, surgiu prece<strong>de</strong>nte importante sobre a publicida<strong>de</strong> infantil no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça. A Corte<br />

enten<strong>de</strong>u pela sua proibição, pelo fato <strong>de</strong> vincular a aquisição <strong>de</strong> brin<strong>de</strong>s ao consumo exagera<strong>do</strong> <strong>do</strong> produto. Nos termos <strong>do</strong> aresto,<br />

“a hipótese <strong>do</strong>s autos caracteriza publicida<strong>de</strong> duplamente abusiva. Primeiro, por se tratar <strong>de</strong> anúncio ou promoção <strong>de</strong> venda <strong>de</strong><br />

alimentos direcionada, direta ou indiretamente, às crianças. Segun<strong>do</strong>, pela evi<strong>de</strong>nte ‘venda casada’, ilícita em negócio jurídico<br />

entre adultos e, com maior razão, em contexto <strong>de</strong> marketing que utiliza ou manipula o universo lúdico infantil (art. 39, I, <strong>do</strong> CDC).<br />

In casu, está configurada a venda casada, uma vez que, para adquirir/comprar o relógio, seria necessário que o consumi<strong>do</strong>r<br />

comprasse também 5 (cinco) produtos da linha ‘Gulosos’” (STJ – REsp 1.558.086/SP – Segunda Turma – Rel. Min. Humberto<br />

Martins – j. 10.03.2016 – DJe 15.04.2016).<br />

Pensamos que tal posição <strong>de</strong>ve se repetir naquela Corte Superior, o que trará um novo tratamento para a publicida<strong>de</strong> e para a<br />

oferta dirigidas ao público infantil. Aplicada a mesma premissa, não serão mais possíveis os meios <strong>de</strong> oferta que atraem as crianças<br />

por meio <strong>de</strong> brin<strong>de</strong>s ou brinque<strong>do</strong>s, comuns em gran<strong>de</strong>s re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> lanchonetes e <strong>de</strong> restaurantes.


Deve ficar claro que, segun<strong>do</strong> o entendimento majoritário antes transcrito, ao qual o presente autor não se filia, enten<strong>de</strong>-se que<br />

o veículo <strong>de</strong> comunicação não respon<strong>de</strong> pela publicida<strong>de</strong> abusiva. Nesse senti<strong>do</strong>, vejamos recente <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> STJ, a respeito <strong>de</strong><br />

publicida<strong>de</strong> estelionatária:<br />

“Civil. Recurso especial. Ação <strong>de</strong> reparação por danos materiais. Publicação <strong>de</strong> anúncio em classifica<strong>do</strong>s <strong>de</strong> jornal. Ocorrência <strong>de</strong><br />

crime <strong>de</strong> estelionato pelo anunciante. Incidência <strong>do</strong> CDC. Responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> jornal. 1. O recorri<strong>do</strong> ajuizou ação <strong>de</strong> reparação por<br />

danos materiais, em face da recorrente (empresa jornalística), pois foi vítima <strong>de</strong> crime <strong>de</strong> estelionato pratica<strong>do</strong> por meio <strong>de</strong> anúncio<br />

em classifica<strong>do</strong>s <strong>de</strong> jornal. 2. Nos contratos <strong>de</strong> compra e venda firma<strong>do</strong>s entre consumi<strong>do</strong>res e anunciantes em jornal, as empresas<br />

jornalísticas não se enquadram no conceito <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>r, nos termos <strong>do</strong> art. 3º <strong>do</strong> CDC. 3. A responsabilida<strong>de</strong> pelo dano <strong>de</strong>corrente<br />

<strong>do</strong> crime <strong>de</strong> estelionato não po<strong>de</strong> ser imputada à empresa jornalística, visto que essa não participou da elaboração <strong>do</strong> anúncio,<br />

tampouco <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> compra e venda <strong>do</strong> veículo. 4. O dano sofri<strong>do</strong> pelo consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>u-se em razão <strong>do</strong> pagamento por um<br />

veículo que não foi entregue pelo anunciante, e não pela compra <strong>de</strong> um exemplar <strong>do</strong> jornal. Ou seja: o produto ofereci<strong>do</strong> no anúncio<br />

(veículo) não tem relação com o produto ofereci<strong>do</strong> pela recorrente (publicação <strong>de</strong> anúncios). 5. Assim, a empresa jornalística não<br />

po<strong>de</strong> ser responsabilizada pelos produtos ou serviços ofereci<strong>do</strong>s pelos seus anunciantes, sobretu<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> <strong>do</strong>s anúncios publica<strong>do</strong>s<br />

não se infere qualquer ilicitu<strong>de</strong>. 6. Destarte, inexiste nexo causal entre a conduta da empresa e o dano sofri<strong>do</strong> pela vítima <strong>do</strong><br />

estelionato. 7. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1046241/SC – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j.<br />

12.08.2010 – DJe 19.08.2010).<br />

Outro exemplo <strong>de</strong> abusivida<strong>de</strong> envolve a publicida<strong>de</strong> discriminatória, prevista expressamente no texto consumerista, o que<br />

gera muitas vezes discussões administrativas. Entre as <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> Conselho Nacional <strong>de</strong> Regulamentação Publicitária (CONAR),<br />

po<strong>de</strong> ser extraída ementa <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2009, que tratou <strong>de</strong> preconceito contra os portugueses. Transcreve-se a <strong>de</strong>cisão para as <strong>de</strong>vidas<br />

reflexões:<br />

“‘Arno Laveo’. Representação n. 441/08. Autor: CONAR, a partir <strong>de</strong> queixa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Anunciante: Arno. Relatora:<br />

Conselheira Cristina <strong>de</strong> Bonis. Segunda Câmara. Decisão: Arquivamento. Fundamento: art. 27, n. 1, letra a <strong>do</strong> Rice. Consumi<strong>do</strong>ra<br />

<strong>de</strong> Santo André, no ABC paulista, reclamou ao CONAR <strong>do</strong> comercial <strong>de</strong> TV veicula<strong>do</strong> pela Arno. De acor<strong>do</strong> com a queixa, no<br />

referi<strong>do</strong> anúncio há menção <strong>de</strong>smerece<strong>do</strong>ra e até mesmo discriminatória com relação a <strong>de</strong>terminada etnia, pelo uso <strong>de</strong> música típica<br />

portuguesa associada à conduta pouco inteligente. Além disso, a publicida<strong>de</strong>, segun<strong>do</strong> a <strong>de</strong>núncia, apresenta falta <strong>de</strong> cuida<strong>do</strong> <strong>do</strong>s<br />

protagonistas, que acabam provocan<strong>do</strong> a queda <strong>de</strong> objeto <strong>do</strong> alto <strong>do</strong> prédio. Para a consumi<strong>do</strong>ra, embora a situação tenha si<strong>do</strong><br />

utilizada como recurso humorístico, po<strong>de</strong> constituir-se exemplo ina<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> <strong>de</strong> comportamento perigoso. A <strong>de</strong>fesa alega que o<br />

comercial, entendi<strong>do</strong> em seu verda<strong>de</strong>iro senti<strong>do</strong>, nada tem que possa ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> um <strong>de</strong>srespeito aos portugueses, até porque<br />

não existe nenhuma menção à origem <strong>do</strong>s personagens. Segun<strong>do</strong> o anunciante, trata-se <strong>de</strong> uma mensagem lúdica e bem-humorada,<br />

na qual aparece uma cena caricata, fantasiosa, <strong>de</strong> um casal que tenta lavar um ventila<strong>do</strong>r com uma mangueira. O apelo, como<br />

argumenta a <strong>de</strong>fesa, apenas ajuda a <strong>de</strong>monstrar os benefícios <strong>do</strong> produto, o ventila<strong>do</strong>r Laveo, fácil <strong>de</strong> <strong>de</strong>smontar e lavar. O relator<br />

concor<strong>do</strong>u com esta linha <strong>de</strong> argumentação, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>, em seu parecer, que o comercial revela uma situação absurda e que não<br />

há como afirmar que se trata <strong>de</strong> uma melodia portuguesa, o que <strong>de</strong>scaracteriza a tese da discriminação. Os membros <strong>do</strong> Conselho <strong>de</strong><br />

Ética acolheram por unanimida<strong>de</strong> o voto pelo arquivamento da representação.”<br />

A <strong>de</strong>cisão administrativa parte da premissa <strong>de</strong> que a mera intenção <strong>de</strong> brincar (animus jocandi), sem maiores consequências <strong>de</strong><br />

lesão a valores coletivos, não configura a publicida<strong>de</strong> abusiva. Nessa mesma linha <strong>de</strong>cidiu o Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> São Paulo, em<br />

acórdão resumi<strong>do</strong> na seguinte ementa:<br />

“Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Propaganda abusiva. Multa. Proporcionalida<strong>de</strong>. Autuação e imposição <strong>de</strong> multa em razão <strong>de</strong><br />

propaganda consi<strong>de</strong>rada abusiva, que, nos termos <strong>do</strong> art. 37, § 2º <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, é ‘a que incite à violência,<br />

explore o me<strong>do</strong> ou a superstição, se aproveite da <strong>de</strong>ficiência <strong>de</strong> julgamento e experiência da criança, <strong>de</strong>srespeita valores ambientais,<br />

ou que seja capaz <strong>de</strong> induzir o consumi<strong>do</strong>r a se comportar <strong>de</strong> forma prejudicial ou perigosa à sua saú<strong>de</strong> ou segurança’.<br />

Descaracterização. Peça publicitária que procurou explorar <strong>de</strong> forma jocosa <strong>de</strong>terminada situação, não caben<strong>do</strong> subsunção ao cita<strong>do</strong><br />

disposto legal. Recurso provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação com Revisão 558.085.5/0 – Acórdão 2518907, São Paulo – Sétima Câmara <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Público – Rel. Des. Nogueira Diefenthaler – j. 10.03.2008, DJESP 19.06.2008).<br />

Igualmente, na linha <strong>de</strong> afastamento da publicida<strong>de</strong> abusiva, não há discriminação no caso <strong>de</strong> uma publicida<strong>de</strong> que limita a<br />

aquisição <strong>de</strong> um bem <strong>de</strong> consumo a um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> número <strong>de</strong> exemplares compatível ao uso familiar. Concluin<strong>do</strong> <strong>de</strong>sse mo<strong>do</strong>,<br />

<strong>do</strong> Tribunal <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro:<br />

“Compra e venda <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>ria. Propaganda comercial. Restrição ao direito. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Inocorrência. Apelação cível.<br />

Consumi<strong>do</strong>r. Publicida<strong>de</strong> que veicula vantagens na aquisição <strong>de</strong> produto a <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s setores <strong>do</strong> comércio, reservan<strong>do</strong>-os em<br />

estoque e limitan<strong>do</strong> a compra a um aparelho por cliente. Alegação <strong>de</strong> infringência a direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, por propaganda abusiva<br />

e discriminatória. Inocorrência. Critério <strong>de</strong> discrímen razoável e proporcional, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se o ramo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> comercial<br />

escolhi<strong>do</strong>. Publicida<strong>de</strong> lícita e regular nos mol<strong>de</strong>s <strong>do</strong> CDC. Manutenção da sentença. Improvimento <strong>do</strong> recurso” (TJRJ – Apelação


Cível 16259/2004, Rio <strong>de</strong> Janeiro – Décima Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Gerson Arraes – j. 13.07.2004).<br />

Como se po<strong>de</strong> notar pelas últimas <strong>de</strong>cisões transcritas, a verda<strong>de</strong> é que a configuração da publicida<strong>de</strong> abusiva dificilmente<br />

ocorre na prática, pois houve um aumento <strong>de</strong> conscientização das empresas patrocina<strong>do</strong>ras, nos últimos tempos, em relação à sua<br />

vedação. De toda sorte, se presente o abuso <strong>de</strong> direito, <strong>de</strong>vem ser impostas as amplas sanções estabelecidas pelo Código Brasileiro<br />

<strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

6.6.<br />

O ÔNUS DA PROVA DA VERACIDADE DA INFORMAÇÃO PUBLICITÁRIA<br />

A encerrar o presente capítulo, cabe tecer algumas palavras sobre a inversão <strong>do</strong> ônus da prova em relação à veracida<strong>de</strong> da<br />

informação publicitária, o que constitui um <strong>do</strong>s princípios fundamentais da regulamentação publicitária, conforme exposto.<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 38 da Lei 8.078/1990, o ônus da prova da veracida<strong>de</strong> e correção da informação ou comunicação<br />

publicitária cabe a quem as patrocina. Eluci<strong>de</strong>-se que essa inversão <strong>do</strong> ônus da prova é automática, não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> <strong>de</strong> qualquer<br />

pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (inversão ex lege ou ope legis).30 Tal entendimento é segui<strong>do</strong> pela melhor jurisprudência (ver: TJRS –<br />

Apelação Cível 70027908441, Bagé – Décima Sétima Câmara Cível – Rel. Des. Elaine Harzheim Mace<strong>do</strong> – j. 29.01.2009 –<br />

DOERS 05.02.2009, p. 85; e TJSP – Apelação com Revisão 328.507.4/0 – Acórdão 4129796, Taubaté – Oitava Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong><br />

Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Salles Rossi – j. 14.10.2009 – DJESP 28.10.2009).<br />

Dessa forma, a categoria não se confun<strong>de</strong> com a inversão <strong>do</strong> ônus da prova tratada pelo art. 6º, inc. VIII, <strong>do</strong> CDC, que traz<br />

requisitos bem <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>s para a sua concessão, quais sejam a verossimilhança das alegações ou a hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r<br />

no caso concreto. O tema é trata<strong>do</strong> no Capítulo 10 da presente obra.<br />

Na linha <strong>do</strong> que foi exaustivamente exposto, tem-se entendi<strong>do</strong>, <strong>de</strong> forma majoritária, que tal ônus não cabe ao veículo <strong>de</strong><br />

comunicação ou à agência, mas apenas à empresa patrocinante da oferta. A confirmar a tese, a qual, repise-se, não se filia, <strong>do</strong><br />

Tribunal <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro: “Veiculação <strong>de</strong> propaganda enganosa pelo primeiro apela<strong>do</strong>. Responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r<br />

anunciante pelos danos causa<strong>do</strong>s e não da empresa <strong>de</strong> comunicação. Inteligência <strong>do</strong> disposto nos arts. 3º e 38 <strong>do</strong> CDC. Instituição<br />

financeira que também não po<strong>de</strong> ser responsabilizada na hipótese vertente, por ser mera <strong>de</strong>positária da verba mantida na conta<br />

corrente <strong>de</strong> titularida<strong>de</strong> <strong>do</strong> primeiro réu. Desprovimento <strong>do</strong> recurso” (TJRJ – Apelação 2009.001.10250 – Décima Câmara Cível –<br />

Rel. Des. Celso Peres – DORJ 15.06.2009, p. 167). Ou ainda: “Hipótese em que não cabe à emissora <strong>de</strong> televisão realizar encargo<br />

<strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Público para verificação acerca <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> remédio ter comprovação científica referente a efeitos terapêuticos.<br />

Aplicação <strong>do</strong> art. 38 da Lei 8.078/1990” (TJSP – Apelação com Revisão 532.933.4/7 – Acórdão 3634068, São Paulo – Sexta<br />

Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Encinas Manfré – j. 23.04.2009 – DJESP 01.07.2009).<br />

Feitas tais elucidações, para ilustrar a aplicação concreta <strong>do</strong> art. 38 <strong>do</strong> CDC, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça enten<strong>de</strong>u que a<br />

veracida<strong>de</strong> da publicida<strong>de</strong> constante <strong>de</strong> tampinhas <strong>do</strong>s vasilhames <strong>do</strong> refrigerante cabe à empresa correspon<strong>de</strong>nte, sob as penas da<br />

lei (STJ – REsp 302.174/RJ – Terceira Turma – Rel. Min. Antônio <strong>de</strong> Pádua Ribeiro – j. 20.09.2001 – DJU 15.10.2001, p. 262).<br />

1 NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 932.<br />

2<br />

3<br />

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8<br />

9<br />

10<br />

11<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 418-419.<br />

BENJAMIN, Antonio Herman. V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 229.<br />

BENJAMIN, Antonio Herman. V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 215.<br />

Cf. DINIZ, Maria Helena. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil Brasileiro. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. v. 3: Teoria geral das obrigações contratuais e<br />

extracontratuais. p. 54.<br />

Cf. DINIZ, Maria Helena. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil Brasileiro. Teoria geral das obrigações contratuais e extracontratuais. 25. ed. São Paulo:<br />

Saraiva, 2009. v. 3, p. 54-55.<br />

MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 164.<br />

BENJAMIN, Antonio Herman. V; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 215.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 389-390.<br />

Conforme reconhece o próprio autor da norma: BENJAMIN, Antonio Herman. V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe.<br />

Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 221.


12<br />

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29<br />

30<br />

MORAIS, Ezequiel. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r Comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2010. p. 182.<br />

BENJAMIN, Antonio Herman V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 219.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 708; MORAIS, Ezequiel; CARAZAI, Marcos Marins; PODESTÁ, Fábio Henrique. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

Comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2010. p. 185.<br />

A título <strong>de</strong> exemplo, assim se posicionam: DINIZ, Maria Helena. Curso <strong>de</strong> direito civil brasileiro. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 7:<br />

Responsabilida<strong>de</strong> Civil, p. 519; TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloísa Helena; MORAES, Maria Celina Bodin <strong>de</strong>. Código Civil<br />

interpreta<strong>do</strong> conforme a Constituição da República, v. II. Renovar, 2006, p. 832; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong><br />

civil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 175; TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz (Coord.). Código Civil comenta<strong>do</strong>. 6. ed. São Paulo:<br />

Saraiva, 2008. p. 897; GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilida<strong>de</strong> civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 131.<br />

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Teoria geral das obrigações. Responsabilida<strong>de</strong> civil. São Paulo: Atlas, 2004. p. 284.<br />

MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 167.<br />

BENJAMIN, Antonio Herman V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 220.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 436-437.<br />

GUIMARÃES, Paulo Jorge Scartezzini. A publicida<strong>de</strong> ilícita e a responsabilida<strong>de</strong> civil das celebrida<strong>de</strong>s que <strong>de</strong>la participam. São Paulo: RT,<br />

2003; BENJAMIN, Antonio Herman V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 217; MORAIS, Ezequiel; PODESTÁ, Fábio Henrique; e CARAZAI, Marcos Marins. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

Comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2010. p. 187.<br />

ALPA, Gui<strong>do</strong>. Il diritto <strong>de</strong>i consumatori. 2. ed. Roma: Laterza, 2002. p. 114.<br />

NISHIYAMA, A<strong>do</strong>lfo Mamoru. A proteção constitucional <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 214-215.<br />

BENJAMIN, Antonio Herman V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 234-236.<br />

MIRAGEM, Bruno. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 172-176.<br />

COELHO, Fábio Ulhoa. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Comercial. <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> Empresa. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 103.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 453.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 464.<br />

COELHO, Fábio Ulhoa. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Comercial. <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> Empresa. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 104.<br />

ALMEIDA, Carlos Ferreira <strong>de</strong>. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumo. Coimbra: Almedina, 2005. p. 102.<br />

COELHO, Fábio Ulhoa. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Comercial. <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> Empresa. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 104.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, por to<strong>do</strong>s: NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 934;<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 754.


O ABUSO DE DIREITO CONSUMERISTA. AS<br />

PRÁTICAS ABUSIVAS VEDADAS PELA LEI<br />

8.078/1990 E SUAS CONSEQUÊNCIAS PRÁTICAS<br />

Sumário: 7.1. Algumas palavras sobre o abuso <strong>de</strong> direito – 7.2. Estu<strong>do</strong> das práticas abusivas enumeradas pelo art.<br />

39 <strong>do</strong> CDC: 7.2.1. Condicionar o fornecimento <strong>de</strong> produto ou <strong>de</strong> serviço ao fornecimento <strong>de</strong> outro produto ou<br />

serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos (art. 39, inc. I, <strong>do</strong> CDC); 7.2.2. Recusar atendimento às<br />

<strong>de</strong>mandas <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, na exata medida <strong>de</strong> suas disponibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> estoque, e, ainda, <strong>de</strong> conformida<strong>de</strong><br />

com os usos e costumes (art. 39, inc. II, <strong>do</strong> CDC); 7.2.3. Enviar ou entregar ao consumi<strong>do</strong>r, sem solicitação prévia,<br />

qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço (art. 39, inc. III, <strong>do</strong> CDC); 7.2.4. Prevalecer-se da fraqueza ou<br />

ignorância <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, ten<strong>do</strong> em vista a sua ida<strong>de</strong>, saú<strong>de</strong> e condição social, para ven<strong>de</strong>r-lhe produto ou<br />

serviço (art. 39, inc. IV, <strong>do</strong> CDC); 7.2.5. Exigir <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r vantagem manifestamente excessiva (art. 39, inc. V, <strong>do</strong><br />

CDC); 7.2.6. Executar serviços sem a prévia elaboração <strong>de</strong> orçamento e autorização expressa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r,<br />

ressalvadas as <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> práticas anteriores entre as partes (art. 39, inc. VI, <strong>do</strong> CDC); 7.2.7. Repassar<br />

informação <strong>de</strong>preciativa referente a ato pratica<strong>do</strong> pelo consumi<strong>do</strong>r no exercício <strong>de</strong> seus direitos (art. 39, inc. VII, <strong>do</strong><br />

CDC); 7.2.8. Colocar, no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo, qualquer produto ou serviço em <strong>de</strong>sacor<strong>do</strong> com as normas<br />

expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira <strong>de</strong><br />

Normas Técnicas (ABNT) ou outra entida<strong>de</strong> cre<strong>de</strong>nciada pelo Conselho Nacional <strong>de</strong> Metrologia, Normalização e<br />

Qualida<strong>de</strong> Industrial – CONMETRO (art. 39, inc. VIII, <strong>do</strong> CDC); 7.2.9. Recusar a venda <strong>de</strong> bens ou a prestação <strong>de</strong><br />

serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalva<strong>do</strong>s os casos <strong>de</strong><br />

intermediação regula<strong>do</strong>s em leis especiais (art. 39, inc. IX, <strong>do</strong> CDC); 7.2.10. Elevar sem justa causa o preço <strong>de</strong><br />

produtos ou serviços (art. 39, inc. X, <strong>do</strong> CDC); 7.2.11. Aplicar fórmula ou índice <strong>de</strong> reajuste diverso <strong>do</strong> legal ou<br />

contratualmente estabeleci<strong>do</strong> (art. 39, inc. XIII, <strong>do</strong> CDC); 7.2.12. Deixar <strong>de</strong> estipular prazo para o cumprimento <strong>de</strong><br />

sua obrigação ou <strong>de</strong>ixar a fixação <strong>de</strong> seu termo inicial a seu exclusivo critério (art. 39, inc. XII, <strong>do</strong> CDC) – 7.3. A<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> respeito ao tabelamento oficial, sob pena <strong>de</strong> caracterização <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito (art. 41 <strong>do</strong> CDC) –<br />

7.4. O abuso <strong>de</strong> direito na cobrança <strong>de</strong> dívidas (art. 42, caput, <strong>do</strong> CDC). O problema <strong>do</strong> corte <strong>de</strong> serviço essencial. A<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> informações na cobrança (art. 42-A <strong>do</strong> CDC) – 7.5. A repetição <strong>de</strong> indébito no caso <strong>de</strong><br />

cobrança abusiva (art. 42, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC).<br />

7.1.<br />

ALGUMAS PALAVRAS SOBRE O ABUSO DE DIREITO<br />

Uma das categorias mais importantes para o <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> Contemporâneo é o abuso <strong>de</strong> direito, conceito que consta tanto <strong>do</strong><br />

Código Civil <strong>de</strong> 2002 quanto <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, o que possibilita, mais uma vez, uma interessante interação<br />

entre as normas, em diálogo das fontes. Como lei central <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, o CC/2002 traz no seu art. 187 o conceito <strong>de</strong> abuso <strong>de</strong><br />

direito, que serve perfeitamente para o <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, in verbis e com <strong>de</strong>staque:<br />

“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular <strong>de</strong> um direito que, ao exercê-lo, exce<strong>de</strong> manifestamente os limites impostos pelo seu


fim econômico e social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.<br />

Tal dispositivo já revolucionou a visualização da responsabilida<strong>de</strong> civil, trazen<strong>do</strong> nova modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ilícito, também<br />

precursora <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar. O abuso <strong>de</strong> direito é trata<strong>do</strong> pelo Código Civil <strong>de</strong> 2002 como um ilícito equipara<strong>do</strong>, pelo que<br />

consta <strong>do</strong> art. 927, caput, da mesma codificação. De acor<strong>do</strong> com o último coman<strong>do</strong>, “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187),<br />

causar dano a outrem, fica obriga<strong>do</strong> a repará-lo”. Como se percebe, a norma compara o abuso <strong>de</strong> direito ao ilícito puro, ao colocar o<br />

art. 187 ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 186, dan<strong>do</strong> tratamento equivalente a ambos para os fins <strong>de</strong> gerar o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar. Além da consequente<br />

imputação para a reparação <strong>do</strong>s prejuízos suporta<strong>do</strong>s, o abuso <strong>de</strong> direito tem o condão <strong>de</strong> acarretar a nulida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s atos e negócios<br />

correspon<strong>de</strong>ntes. Esse, aliás, é o espírito <strong>do</strong> art. 51 <strong>do</strong> CDC, ao consagrar o rol <strong>de</strong> cláusulas nulas por abusivida<strong>de</strong>. A propósito,<br />

lembre-se que, nos termos <strong>do</strong> art. 166, inc. II, <strong>do</strong> Código Civil, é nulo o negócio jurídico quan<strong>do</strong> houver ilicitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> seu objeto.<br />

A respeito das raízes históricas <strong>do</strong> conceito, sinaliza Renan Lotufo que o abuso <strong>de</strong> direito <strong>de</strong>corre da aemulatio <strong>do</strong> <strong>Direito</strong><br />

Romano, ou seja, <strong>do</strong> “exercício <strong>de</strong> um direito, sem utilida<strong>de</strong> própria, com a intenção <strong>de</strong> prejudicar outrem”, cuja aplicação ampliada<br />

atingiu as relações <strong>de</strong> vizinhança.1 Na mesma linha, San Tiago Dantas <strong>de</strong>monstra que o abuso <strong>de</strong> direito encontra origens no<br />

<strong>Direito</strong> Romano, principalmente nos conceitos <strong>de</strong> aequitas e no ius honorarium.<br />

Porém, para o último jurista, é no <strong>Direito</strong> Medieval que o instituto encontra sua principal raiz, com o surgimento <strong>do</strong> problema<br />

<strong>do</strong> ato emulativo, <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong>s inúmeros conflitos que marcaram aquele perío<strong>do</strong> da história. Suas palavras, utilizadas em outras<br />

<strong>de</strong> nossas obras, mais uma vez merecem <strong>de</strong>staque:<br />

“Já se sabe o que foi a vida medieval, o ambiente <strong>de</strong> emulação por excelência. A rixa, a briga, a altercação, é a substância da vida<br />

medieval. Brigas <strong>de</strong> vizinhos, brigas <strong>de</strong> barões, brigas <strong>de</strong> corporações, no seio das socieda<strong>de</strong>s; brigas entre o po<strong>de</strong>r temporal e o<br />

po<strong>de</strong>r espiritual. Todas as formas <strong>de</strong> alterações a socieda<strong>de</strong> medieval conheceu, como não podia <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> acontecer numa época <strong>de</strong><br />

consi<strong>de</strong>rável atrofia <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. É aí que, pela primeira vez, os juristas têm conhecimento <strong>de</strong>ste problema: o exercício <strong>de</strong> um direito<br />

com o fim <strong>de</strong> prejudicar a outrem. O direito como elemento <strong>de</strong> emulação. Enten<strong>de</strong>-se, por emulação, o exercício <strong>de</strong> um direito com o<br />

fim <strong>de</strong> prejudicar outrem. Quer dizer que, em vez <strong>de</strong> ter o fim <strong>de</strong> tirar para si um benefício, o autor <strong>do</strong> ato tem em vista causar<br />

prejuízo a outrem”. 2<br />

Sílvio Rodrigues também <strong>de</strong>monstra a origem romana <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito. Entretanto, <strong>de</strong>nota que “a teoria <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito,<br />

na sua forma atual, é, como diz Josserand, <strong>de</strong> tessitura jurispru<strong>de</strong>ncial e surgiu na França na segunda meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> Século XIX”. 3 Do<br />

mesmo mo<strong>do</strong>, investigan<strong>do</strong> tal perío<strong>do</strong>, Caio Mário da Silva Pereira expõe que “os mo<strong>de</strong>rnos, encontran<strong>do</strong> várias hipóteses em que<br />

se configura o <strong>de</strong>svirtuamento <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> justo, na atitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> indivíduo que leva a fruição <strong>do</strong> seu direito a um grã <strong>de</strong> causar<br />

malefício a outro indivíduo, criam a figura teórica <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito, que ora encontra fundamento na regra da relativida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s<br />

direitos; ora assenta na <strong>do</strong>sagem <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> exercício, admitin<strong>do</strong> que se o titular exceda o limite <strong>do</strong> exercício regular <strong>de</strong> seu<br />

direito, age sem direito; ora baseia-se na configuração <strong>do</strong> animus nocendi, e estabelece que é <strong>de</strong> se reprimir o exercício <strong>do</strong> direito,<br />

quan<strong>do</strong> se inspira na intenção <strong>de</strong> causar mal a outrem”. 4<br />

O abuso <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 2002 segue um mo<strong>de</strong>lo aberto, pois relaciona<strong>do</strong> a três conceitos legais in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s,<br />

três cláusulas gerais que <strong>de</strong>vem ser preenchidas pelo aplica<strong>do</strong>r <strong>do</strong> direito caso a caso. Tais conceitos são a função social e<br />

econômica <strong>do</strong> instituto correspectivo, a boa-fé objetiva e os bons costumes. No tocante aos bons costumes, é interessante o teor <strong>do</strong><br />

Enuncia<strong>do</strong> n. 413, da V Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil <strong>do</strong> STJ, que propõe a sua análise <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a realida<strong>de</strong> social, como não<br />

po<strong>de</strong>ria ser diferente: “Os bons costumes previstos no art. 187 <strong>do</strong> CC possuem natureza subjetiva, <strong>de</strong>stinada ao controle da<br />

moralida<strong>de</strong> social <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada época, e objetiva, para permitir a sindicância da violação <strong>do</strong>s negócios jurídicos em questões não<br />

abrangidas pela função social e pela boa-fé objetiva”. No mesmo evento, aprovou-se o Enuncia<strong>do</strong> n. 414, que procura dar um<br />

fundamento constitucional ao abuso <strong>de</strong> direito, prescreven<strong>do</strong> que “A cláusula geral <strong>do</strong> art. 187 <strong>do</strong> Código Civil tem fundamento<br />

constitucional nos princípios da solidarieda<strong>de</strong>, <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> processo legal e proteção da confiança e aplica-se a to<strong>do</strong>s os ramos <strong>do</strong><br />

direito”.<br />

Em haven<strong>do</strong> um exercício irregular <strong>do</strong> direito em <strong>de</strong>srespeito a tais parâmetros, configura-se o abuso <strong>de</strong> direito ou ato<br />

emulativo civil. Nesse contexto, diante da existência <strong>de</strong> construções dinâmicas e valorativas, há uma relação direta entre o abuso <strong>de</strong><br />

direito e o princípio da socialida<strong>de</strong>, a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pela nova codificação. A responsabilida<strong>de</strong> civil sofre clara influência social, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong><br />

com o que está exposto no art. 5º da Lei <strong>de</strong> Introdução, segun<strong>do</strong> o qual, na aplicação da norma, <strong>de</strong>ve o aplica<strong>do</strong>r buscar os seus fins<br />

sociais e o bem comum. Existe também uma interação com o princípio da eticida<strong>de</strong>, uma vez que o Código Civil <strong>de</strong> 2002<br />

estabelece o ilícito contra a pessoa que age em <strong>de</strong>srespeito à boa-fé objetiva, relacionada com a conduta leal e proba que se espera<br />

<strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os que vivem perante a coletivida<strong>de</strong>, integra<strong>do</strong>ra, sobretu<strong>do</strong>, das relações negociais.<br />

Relativamente ao conceito <strong>de</strong> abuso <strong>de</strong> direito, é precisa a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> Rubens Limongi França, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que o abuso <strong>de</strong><br />

direito constitui uma categoria <strong>de</strong> conteú<strong>do</strong> próprio, entre o ato lícito e o ilícito, ou seja, o abuso <strong>de</strong> direito é lícito pelo conteú<strong>do</strong> e<br />

ilícito pelas consequências. Vejamos as palavras <strong>do</strong> clássico jurista:


“O ato ilícito (Manual, v. 1º, p. 211) é toda manifestação da vonta<strong>de</strong> que tenha por fim criar, modificar ou extinguir uma relação <strong>de</strong><br />

direito. O ato ilícito é uma ação ou omissão voluntária, ou que implique negligência ou imprudência, cujo resulta<strong>do</strong> acarrete violação<br />

<strong>de</strong> direito ou que ocasione prejuízo a outrem. Finalmente, o abuso <strong>de</strong> direito consiste em um ato jurídico <strong>de</strong> objeto lícito, mas cujo<br />

exercício, leva<strong>do</strong> a efeito sem a <strong>de</strong>vida regularida<strong>de</strong>, acarreta um resulta<strong>do</strong> que se consi<strong>de</strong>ra ilícito”.5<br />

Em suma, a ilicitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> ato, no abuso <strong>de</strong> direito, está na forma <strong>de</strong> sua execução, ou seja, na sua prática. Como consequência<br />

imediata, o abuso <strong>de</strong> direito gera a responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva <strong>do</strong> abusa<strong>do</strong>r in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> elemento culpa. Nesse senti<strong>do</strong>, o<br />

Enuncia<strong>do</strong> n. 37, aprova<strong>do</strong> na I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil <strong>do</strong> Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral: “Art. 187: a responsabilida<strong>de</strong> civil<br />

<strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> abuso <strong>do</strong> direito in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> culpa, e fundamenta-se somente no critério objetivo-finalístico”. Consigne-se, a título<br />

<strong>de</strong> ilustração, que, pelo mo<strong>de</strong>lo objetivo <strong>do</strong> mesmo, se posicionam Fernan<strong>do</strong> Noronha, Maria Helena Diniz, Nestor Duarte, Pablo<br />

Stolze Gagliano, Ro<strong>do</strong>lfo Pamplona Filho, Silvio <strong>de</strong> Salvo Venosa, Cristiano Chaves <strong>de</strong> Farias, Nelson Rosenvald, Sérgio Cavalieri<br />

Filho, <strong>Daniel</strong> Boulos, Eduar<strong>do</strong> Jordão, Gustavo Tepedino, Maria Celina Bodin <strong>de</strong> Moraes, Heloísa Helena Barboza, Jones<br />

Figueirê<strong>do</strong> Alves, Mário Luiz Delga<strong>do</strong>, Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery. 6<br />

Tal conclusão não é diferente no âmbito consumerista, eis que o CDC a<strong>do</strong>ta um mo<strong>de</strong>lo aberto e objetiva<strong>do</strong>. Como exemplo<br />

típico <strong>de</strong> abuso <strong>de</strong> direito consumerista, cite-se o tema da publicida<strong>de</strong> abusiva, consagra<strong>do</strong> pelo art. 37, § 2º, da Lei 8.078/1990 e<br />

estudada no Capítulo 6 <strong>de</strong>ste livro. Além <strong>de</strong>ssa hipótese, o art. 39 <strong>do</strong> Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r elenca situações típicas <strong>de</strong> abuso <strong>de</strong><br />

direito, tratadas como práticas abusivas. Vejamos o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> último coman<strong>do</strong> legal a partir <strong>do</strong> presente momento.<br />

7.2.<br />

ESTUDO DAS PRÁTICAS ABUSIVAS ENUMERADAS PELO ART. 39 DO CDC<br />

O art. 39 da Lei 8.078/1990 tipifica, mais uma vez em rol exemplificativo ou numerus apertus, uma série <strong>de</strong> situações tidas<br />

como enseja<strong>do</strong>ras <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito consumerista. Muitas das hipóteses ali <strong>de</strong>scritas são bem comuns na contemporaneida<strong>de</strong>, sem<br />

excluir outras que surgirem pela evolução das relações negociais. Deve-se enten<strong>de</strong>r que constitui prática abusiva qualquer conduta<br />

ou ato em contradição com o próprio espírito da lei consumerista. Como bem leciona Ezequiel Morais, “prática abusiva, em termos<br />

gerais, é aquela que <strong>de</strong>stoa <strong>do</strong>s padrões merca<strong>do</strong>lógicos, <strong>do</strong>s usos e costumes (incs. II e IV, segunda parte, <strong>do</strong> art. 39 e art. 113 <strong>do</strong><br />

CC/2002) e da razoável e boa conduta perante o consumi<strong>do</strong>r”.7<br />

Lembre-se <strong>de</strong> que, para a esfera consumerista, servem como parâmetros os conceitos que constam <strong>do</strong> art. 187 <strong>do</strong> CC/2002: o<br />

fim social e econômico, a boa-fé objetiva e os bons costumes, em diálogo das fontes. Há claro intuito <strong>de</strong> proibição, pelo que<br />

enuncia o caput <strong>do</strong> preceito <strong>do</strong> CDC, a saber: “É veda<strong>do</strong> ao fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos ou serviços, <strong>de</strong>ntre outras práticas abusivas”.<br />

Na esteira <strong>do</strong> tópico anterior, a primeira consequência a ser retirada da vedação é a responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong><br />

produtos ou presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços.<br />

Além disso, <strong>de</strong>ve-se compreen<strong>de</strong>r o art. 39 <strong>do</strong> CDC como em um diálogo <strong>de</strong> complementarida<strong>de</strong> em relação ao art. 51 da<br />

mesma norma. Deve haver, assim, um diálogo das fontes entre as normas da própria Lei Consumerista. Nesse contexto <strong>de</strong><br />

conclusão, se uma das situações <strong>de</strong>scritas pelo art. 51 como cláusulas abusivas ocorrer fora <strong>do</strong> âmbito contratual, presente estará<br />

uma prática abusiva. Por outra via, se uma das hipóteses <strong>de</strong>scritas pelo art. 39 <strong>do</strong> CDC constituir o conteú<strong>do</strong> <strong>de</strong> um contrato,<br />

presente uma cláusula abusiva. Em suma, as práticas abusivas também po<strong>de</strong>m gerar a nulida<strong>de</strong> absoluta <strong>do</strong> ato correspon<strong>de</strong>nte. 8<br />

Parte-se à abordagem <strong>do</strong> coman<strong>do</strong>, inciso por inciso, com as cabíveis ilustrações práticas.<br />

7.2.1.<br />

Condicionar o fornecimento <strong>de</strong> produto ou <strong>de</strong> serviço ao fornecimento <strong>de</strong> outro produto ou<br />

serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos (art. 39, inc. I, <strong>do</strong> CDC)<br />

Esse primeiro inciso <strong>do</strong> art. 39 proíbe a venda casada, <strong>de</strong>scrita e especificada pela norma. De início, veda-se que o fornece<strong>do</strong>r<br />

ou presta<strong>do</strong>r submeta um produto ou serviço a outro produto ou serviço, visan<strong>do</strong> um efeito caroneiro ou oportunista para venda <strong>de</strong><br />

novos bens. Ato contínuo, afasta-se a limitação <strong>de</strong> fornecimento sem que haja justa causa para tanto, o que <strong>de</strong>ve ser preenchi<strong>do</strong><br />

caso a caso. Amplian<strong>do</strong>-se o senti<strong>do</strong> da vedação, conclui-se que é venda casada a hipótese em que o fornece<strong>do</strong>r somente resolve um<br />

problema quanto a um produto ou serviço se um outro produto ou serviço for adquiri<strong>do</strong>.<br />

A respeito da limitação mínima <strong>de</strong> produtos, tema que tem relação com a venda casada, leciona Luiz Antonio Rizzatto Nunes<br />

que “há que se consi<strong>de</strong>rar os produtos industrializa<strong>do</strong>s que acompanham o padrão tradicional <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> e que são aceitos como<br />

váli<strong>do</strong>s. Por exemplo, o sal vendi<strong>do</strong> em pacotes <strong>de</strong> 500g, e da mesma forma a farinha, os cereais etc. (a venda a granel é cada vez<br />

mais exceção). Mas na quantida<strong>de</strong> haverá situações mais <strong>de</strong>licadas, que exigem atenta e acurada interpretação <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> justa<br />

causa. Por exemplo: o lojista faz promoções <strong>do</strong> tipo ‘compre 3, pague 2’. São válidas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o consumi<strong>do</strong>r possa também<br />

adquirir uma peça apenas, mesmo que tenha que pagar mais caro pelo produto único no cálculo da oferta composta (o que é natural,


já que a promoção barateia o preço individual)”.9<br />

Pois bem, partin<strong>do</strong>-se para os casos concretos, a jurisprudência superior conclui ser venda casada a imposição <strong>de</strong> seguro<br />

habitacional pelo agente financeiro na aquisição da casa própria pelo Sistema Financeiro da Habitação. Vejamos uma <strong>de</strong>ssas<br />

ementas:<br />

“Recurso especial repetitivo. Sistema Financeiro da Habitação. Taxa referencial (TR). Legalida<strong>de</strong>. Seguro habitacional. Contratação<br />

obrigatória com o agente financeiro ou por segura<strong>do</strong>ra por ele indicada. Venda casada configurada. 1. Para os efeitos <strong>do</strong> art. 543-C<br />

<strong>do</strong> CPC: 1.1. No âmbito <strong>do</strong> Sistema Financeiro da Habitação, a partir da Lei 8.177/1991, é permitida a utilização da Taxa<br />

Referencial (TR) como índice <strong>de</strong> correção monetária <strong>do</strong> sal<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r. Ainda que o contrato tenha si<strong>do</strong> firma<strong>do</strong> antes da Lei<br />

8.177/1991, também é cabível a aplicação da TR, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que haja previsão contratual <strong>de</strong> correção monetária pela taxa básica <strong>de</strong><br />

remuneração <strong>do</strong>s <strong>de</strong>pósitos em poupança, sem nenhum outro índice específico. 1.2. É necessária a contratação <strong>do</strong> seguro<br />

habitacional, no âmbito <strong>do</strong> SFH. Contu<strong>do</strong>, não há obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> que o mutuário contrate o referi<strong>do</strong> seguro diretamente com o<br />

agente financeiro, ou por segura<strong>do</strong>ra indicada por este, exigência esta que configura ‘venda casada’, vedada pelo art. 39, inciso I, <strong>do</strong><br />

CDC. 2. Recurso especial parcialmente conheci<strong>do</strong> e, na extensão, provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 969129/MG – Segunda Seção – Rel. Min.<br />

Luis Felipe Salomão – j. 09.12.2009 – DJe 15.12.2009).<br />

A questão concretizou-se <strong>de</strong> tal forma que no ano <strong>de</strong> 2012 foi editada a Súmula 473 <strong>do</strong> STJ, com o seguinte teor: “o mutuário<br />

<strong>do</strong> SFH não po<strong>de</strong> ser compeli<strong>do</strong> a contratar o seguro habitacional obrigatório com a instituição financeira mutuante ou com a<br />

segura<strong>do</strong>ra por ela indicada”.<br />

Em senti<strong>do</strong> próximo, a jurisprudência enten<strong>de</strong> haver venda casada no caso <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> seguro automático e compulsório em<br />

contrato <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito (TJRS – Recurso 42750-75.2010.8.21.9000, Porto Alegre – Terceira Turma Recursal Cível – Rel. Des.<br />

Eugênio Facchini Neto – j. 14.04.2011 – DJERS 25.04.2011; TJSP – Apelação 0005144-26.2009.8.26.0038 – Acórdão 4998802,<br />

Araras – Trigésima Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Eros Piceli – j. 14.03.2011 – DJESP 24.03.2011; e TJMG –<br />

Apelação 4279362-51.2004.8.13.0024, Belo Horizonte – Décima Câmara Cível – Rel. Des. Pereira da Silva – j. 13.07.2010 –<br />

DJEMG 23.07.2010).<br />

Ainda a título <strong>de</strong> exemplo, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça concluiu que constitui venda casada o fato <strong>de</strong> um comerciante<br />

condicionar a concessão <strong>de</strong> um benefício para a aquisição <strong>de</strong> combustível à aquisição <strong>de</strong> um refrigerante no posto reven<strong>de</strong><strong>do</strong>r,<br />

localiza<strong>do</strong> no mesmo ambiente:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Pagamento a prazo vincula<strong>do</strong> à aquisição <strong>de</strong> outro produto. ‘Venda casada’. Prática abusiva configurada. 1. O<br />

Tribunal a quo manteve a concessão <strong>de</strong> segurança para anular auto <strong>de</strong> infração consubstancia<strong>do</strong> no art. 39, I, <strong>do</strong> CDC, ao<br />

fundamento <strong>de</strong> que a impetrante apenas vinculou o pagamento a prazo da gasolina por ela comercializada à aquisição <strong>de</strong><br />

refrigerantes, o que não ocorreria se tivesse si<strong>do</strong> paga à vista. 2. O art. 39, I, <strong>do</strong> CDC, inclui no rol das práticas abusivas a<br />

popularmente <strong>de</strong>nominada ‘venda casada’, ao estabelecer que é veda<strong>do</strong> ao fornece<strong>do</strong>r ‘condicionar o fornecimento <strong>de</strong> produto ou <strong>de</strong><br />

serviço ao fornecimento <strong>de</strong> outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos’. 3. Na primeira situação<br />

<strong>de</strong>scrita nesse dispositivo, a ilegalida<strong>de</strong> se configura pela vinculação <strong>de</strong> produtos e serviços <strong>de</strong> natureza distinta e usualmente<br />

comercializa<strong>do</strong>s em separa<strong>do</strong>, tal como ocorri<strong>do</strong> na hipótese <strong>do</strong>s autos. 4. A dilação <strong>de</strong> prazo para pagamento, embora seja uma<br />

liberalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r – assim como o é a própria colocação no comércio <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> produto ou serviço –, não o exime <strong>de</strong><br />

observar normas legais que visam a coibir abusos que vieram a reboque da massificação <strong>do</strong>s contratos na socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo e da<br />

vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 5. Tais normas <strong>de</strong> controle e saneamento <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, ao contrário <strong>de</strong> restringirem o princípio da<br />

liberda<strong>de</strong> contratual, o aperfeiçoam, ten<strong>do</strong> em vista que buscam assegurar a vonta<strong>de</strong> real daquele que é estimula<strong>do</strong> a contratar. 6.<br />

Apenas na segunda hipótese <strong>do</strong> art. 39, I, <strong>do</strong> CDC, referente aos limites quantitativos, está ressalvada a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> exclusão da<br />

prática abusiva por justa causa, não se admitin<strong>do</strong> justificativa, portanto, para a imposição <strong>de</strong> produtos ou serviços que não os<br />

precisamente almeja<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r. 7. Recurso especial provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 384284/RS – Segunda Turma – Rel. Min.<br />

Herman Benjamin – j. 20.08.2009 – DJe 15.12.2009).<br />

Na mesma linha, <strong>de</strong>duziu a Corte Superior que os cinemas não po<strong>de</strong>m impedir a entrada <strong>de</strong> clientes em suas <strong>de</strong>pendências<br />

portan<strong>do</strong> alimentos e bebidas <strong>de</strong> outros fornece<strong>do</strong>res, obrigan<strong>do</strong> os consumi<strong>do</strong>res a adquirirem suas pipocas e refrigerantes.<br />

Conforme consta da ementa <strong>do</strong> acórdão, “ao fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produtos ou serviços, consectariamente, não é lícito, <strong>de</strong>ntre outras<br />

práticas abusivas, condicionar o fornecimento <strong>de</strong> produto ou <strong>de</strong> serviço ao fornecimento <strong>de</strong> outro produto ou serviço (art. 39, I, <strong>do</strong><br />

CDC). A prática abusiva revela-se patente se a empresa cinematográfica permite a entrada <strong>de</strong> produtos adquiri<strong>do</strong>s nas suas<br />

<strong>de</strong>pendências e interdita o adquiri<strong>do</strong> alhures, engendran<strong>do</strong> por via oblíqua a cognominada ‘venda casada’, interdição inextensível<br />

ao estabelecimento cuja venda <strong>de</strong> produtos alimentícios constituiu a essência da sua ativida<strong>de</strong> comercial como, verbi gratia, os<br />

bares e restaurantes. O juiz, na aplicação da lei, <strong>de</strong>ve aferir as finalida<strong>de</strong>s da norma, por isso que, in casu, revela-se manifesta a<br />

prática abusiva” (STJ – REsp 744.602/RJ – Rel. Min. Luiz Fux – Primeira Turma – j. 01.03.2007 – DJ 15.03.2007, p. 264 – REPDJ<br />

22.03.2007, p. 286).<br />

Da jurisprudência <strong>do</strong> Tribunal Gaúcho, com gran<strong>de</strong> aplicação prática, existe julga<strong>do</strong> que conclui pela existência <strong>de</strong> venda


casada no caso da empresa que presta serviços <strong>de</strong> TV por assinatura e exige a utilização <strong>de</strong> tecnologia somente por ela oferecida,<br />

sem qualquer outra possibilida<strong>de</strong>:<br />

“Reparação <strong>de</strong> danos. NET. Serviço <strong>de</strong> telefone e televisão por assinatura. Defeito na prestação <strong>de</strong> serviço. Troca <strong>de</strong> rotea<strong>do</strong>r. Falta<br />

<strong>de</strong> a<strong>de</strong>quada informação sobre o aparelho a ser usa<strong>do</strong> pela consumi<strong>do</strong>ra. Indução em erro. Ressarcimento pela <strong>de</strong>spesa na aquisição<br />

<strong>de</strong> aparelho exigi<strong>do</strong> pela ré, sob pena <strong>de</strong> caracterizar venda casada. Desnecessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> manter a tecnologia não homologada pela<br />

empresa. Solução <strong>de</strong> equida<strong>de</strong>. In<strong>de</strong>nização pelo tempo em que o sinal <strong>de</strong>notava má qualida<strong>de</strong>. Arbitramento. Quantum manti<strong>do</strong>, por<br />

falta <strong>de</strong> recurso da postulante. Cancelamento <strong>de</strong> serviço adicional (assistência <strong>de</strong> re<strong>de</strong>), como <strong>de</strong> entrega <strong>de</strong> revista, com restituição<br />

<strong>de</strong> valores, observa<strong>do</strong> o art. 290 <strong>do</strong> CPC. Efetivida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>cisão. Transtorno vivi<strong>do</strong> pela autora. Dissabor que po<strong>de</strong>ria ter si<strong>do</strong><br />

evita<strong>do</strong> pela ré, se tratasse o caso com a <strong>de</strong>vida atenção. Contribuição da autora, que po<strong>de</strong>ria ter busca<strong>do</strong>, antes, a proteção judicial.<br />

Dano moral mitiga<strong>do</strong>. Valor reduzi<strong>do</strong>. Recurso parcialmente provi<strong>do</strong>” (TJRS – Recurso 46934-74.2010.8.21.9000, Porto Alegre –<br />

Terceira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Jerson Moacir Gubert – j. 27.01.2011 – DJERS 08.02.2011).<br />

Do Tribunal <strong>de</strong> São Paulo, são pertinentes as ementas que concluem pela presença <strong>de</strong> venda casada quan<strong>do</strong> um curso<br />

condiciona a prestação <strong>de</strong> serviços à aquisição <strong>de</strong> apostilas com valores superfatura<strong>do</strong>s, presente ainda a lesão objetiva em casos<br />

tais:<br />

“Prestação <strong>de</strong> serviços educacionais. Curso <strong>de</strong> informática. Ação <strong>de</strong> rescisão <strong>de</strong> contrato cumulada com anulação <strong>de</strong> débito e<br />

in<strong>de</strong>nização. Reconvenção com pleito <strong>de</strong> recebimento <strong>de</strong> multa contratual. Parcial procedência da ação e improcedência da<br />

reconvenção na origem. Apelação da ré reconvinte e recurso a<strong>de</strong>sivo da autora. Caracterização <strong>de</strong> venda casada <strong>do</strong> curso com livros<br />

superfatura<strong>do</strong>s. Prática abusiva. Inteligência <strong>do</strong> art. 39, I, <strong>do</strong> CDC. Multa contratual afastada. Reconvenção improce<strong>de</strong>nte. Dano<br />

moral não caracteriza<strong>do</strong>. Apelo da ré improvi<strong>do</strong>. Recurso a<strong>de</strong>sivo da autora parcialmente provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação<br />

990.10.498356-8 – Acórdão 4847703, Araraquara – Trigésima Sexta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Dyrceu Cintra – j.<br />

02.12.2010 – DJESP 17.12.2010).<br />

“Em face da prática abusiva, a venda casada <strong>de</strong> livros a custo <strong>de</strong>sproposita<strong>do</strong> e curso <strong>de</strong> inglês, que engana o consumi<strong>do</strong>r, engana<strong>do</strong><br />

antes na promessa <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconto que não houve, <strong>de</strong>creta-se a rescisão <strong>do</strong> contrato, sem se cogitar <strong>de</strong> multa. A ação fica julgada<br />

proce<strong>de</strong>nte e a reconvenção, improce<strong>de</strong>nte” (TJSP – Apelação Cível 990.10.035677-1 – Acórdão 4613637, Araraquara – Vigésima<br />

Oitava Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Celso Pimentel – j. 27.07.2010 – DJESP 20.08.2010).<br />

Por fim, insta trazer a conclusão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça a respeito da cobrança <strong>de</strong> assinatura mínima nos serviços <strong>de</strong><br />

telefonia, tema que gerou uma quantida<strong>de</strong> enorme <strong>de</strong> <strong>de</strong>mandas judiciais, que alegavam a caracterização da venda casada. Em<br />

2008, foi editada a Súmula 356 por aquele Tribunal, preconizan<strong>do</strong> que “É legítima a cobrança da tarifa básica pelo uso <strong>do</strong>s serviços<br />

<strong>de</strong> telefonia fixa”. Cabe transcrever um <strong>do</strong>s prece<strong>de</strong>ntes que gerou a ementa, para os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s esclarecimentos a respeito <strong>do</strong> seu<br />

conteú<strong>do</strong>:<br />

“Repetição <strong>de</strong> indébito. Assinatura básica <strong>de</strong> telefonia fixa. Lei 9.472/1997. Resolução 85/1998 da ANATEL. Contrato <strong>de</strong><br />

concessão. Previsão. Violação ao CDC. Inexistência. Legalida<strong>de</strong> da tarifa. Devolução em <strong>do</strong>bro <strong>do</strong> quantum. Prejudicialida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

recurso da consumi<strong>do</strong>ra. I. A cobrança da tarifa básica <strong>de</strong> assinatura mensal, constante <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> concessão pública, constitui-se<br />

em contraprestação pela disponibilização <strong>do</strong> serviço <strong>de</strong> forma contínua e ininterrupta ao usuário, sen<strong>do</strong> amparada pela Lei 9.472, <strong>de</strong><br />

16.07.1997, bem como por Resolução da ANATEL, entida<strong>de</strong> responsável pela regulação, inspeção e fiscalização <strong>do</strong> setor <strong>de</strong><br />

telecomunicações no País. II. Em recente pronunciamento, a Colenda Primeira Seção, ao julgar o REsp 911.802/RS, Rel. Min. José<br />

Delga<strong>do</strong>, em 24.10.2007, enten<strong>de</strong>u que a referida cobrança não vulnera o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, ten<strong>do</strong> em vista a<br />

existência <strong>de</strong> previsão legal, além <strong>do</strong> que, por se tratar <strong>de</strong> serviço que é disponibiliza<strong>do</strong> <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> contínuo e ininterrupto, acarretan<strong>do</strong><br />

dispêndios financeiros para a concessionária, <strong>de</strong>ve ser afastada qualquer alegação <strong>de</strong> abusivida<strong>de</strong> ou vantagem <strong>de</strong>sproporcional. III.<br />

Prejudica<strong>do</strong> o recurso da consumi<strong>do</strong>ra, eis que, ao se enten<strong>de</strong>r pela legalida<strong>de</strong> da cobrança da assinatura básica <strong>de</strong> telefonia, não há<br />

<strong>de</strong> se falar em discussão acerca <strong>do</strong> direito à <strong>de</strong>volução <strong>do</strong> valor pago in<strong>de</strong>vidamente. IV. Recurso especial da concessionária provi<strong>do</strong><br />

e apelo nobre da consumi<strong>do</strong>ra prejudica<strong>do</strong>” (STJ – REsp 870.600/PB – Primeira Turma – Rel. Min. Francisco Falcão – j. 04.12.2007<br />

– DJe 27.03.2008).<br />

Deve ficar claro que o presente autor não concorda com tal entendimento, por pensar que existe, sim, venda casada, no caso da<br />

cobrança <strong>de</strong> assinatura básica, uma vez que o serviço <strong>de</strong> telefonia somente é presta<strong>do</strong> mediante o pagamento <strong>de</strong> tal valor. A<br />

realida<strong>de</strong> da telefonia celular pré-paga <strong>de</strong>monstra que é perfeitamente possível fazer o mesmo com a telefonia fixa, sem que isso<br />

torne o serviço inviável para as opera<strong>do</strong>ras.<br />

7.2.2.<br />

Recusar atendimento às <strong>de</strong>mandas <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, na exata medida <strong>de</strong> suas disponibilida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> estoque, e, ainda, <strong>de</strong> conformida<strong>de</strong> com os usos e costumes (art. 39, inc. II, <strong>do</strong> CDC)<br />

A previsão engloba a negação <strong>de</strong> venda por parte <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res ou presta<strong>do</strong>res, levan<strong>do</strong>-se em conta as suas


disponibilida<strong>de</strong>s e os costumes gerais. A menção aos costumes está <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o atual sistema geral civil, <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> a<br />

notória aproximação entre os diplomas, pois, entre outros, há menção a eles no art. 113 <strong>do</strong> CC/2002.10<br />

Os parâmetros <strong>de</strong>scritos na norma são leva<strong>do</strong>s em conta no problema relativo à limitação para aquisição <strong>de</strong> produtos,<br />

especialmente em supermerca<strong>do</strong>s em dias <strong>de</strong> promoção. Na opinião <strong>do</strong> presente autor, a restrição para a aquisição é possível <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

que haja comunicação prévia <strong>do</strong>s estoques, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um limite razoável, o que aten<strong>de</strong> ao <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar <strong>de</strong>corrente da boa-fé<br />

objetiva. Porém, mesmo não haven<strong>do</strong> tal comunicação, a jurisprudência superior posiciona-se no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que o consumi<strong>do</strong>r não<br />

tem o direito <strong>de</strong> exigir o produto que está em promoção em quantida<strong>de</strong> incompatível com o consumo pessoal ou familiar. Nesse<br />

senti<strong>do</strong>, colaciona-se notória ementa <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“Recurso especial. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Dano moral. Venda <strong>de</strong> produto a varejo. Restrição quantitativa. Falta <strong>de</strong><br />

indicação na oferta. Dano moral. Inocorrência. Quantida<strong>de</strong> exigida incompatível com o consumo pessoal e familiar. Aborrecimentos<br />

que não configuram ofensa à dignida<strong>de</strong> ou ao foro íntimo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 1. A falta <strong>de</strong> indicação <strong>de</strong> restrição quantitativa relativa à<br />

oferta <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> produto, pelo fornece<strong>do</strong>r, não autoriza o consumi<strong>do</strong>r a exigir quantida<strong>de</strong> incompatível com o consumo<br />

individual ou familiar, nem, tampouco, configura dano ao seu patrimônio extramaterial. 2. Os aborrecimentos vivencia<strong>do</strong>s pelo<br />

consumi<strong>do</strong>r, na hipótese, <strong>de</strong>vem ser interpreta<strong>do</strong>s como ‘fatos <strong>do</strong> cotidiano’, que não extrapolam as raias das relações comerciais, e,<br />

portanto, não po<strong>de</strong>m ser entendi<strong>do</strong>s como ofensivos ao foro íntimo ou à dignida<strong>de</strong> <strong>do</strong> cidadão. Recurso especial, ressalvada a<br />

terminologia, não conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp 595.734/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – Rel. p/Acórdão Min. Castro<br />

Filho – j. 02.08.2005 – DJ 28.11.2005, p. 275).<br />

Outra questão <strong>de</strong> <strong>de</strong>bate refere-se à viabilida<strong>de</strong> jurídica <strong>de</strong> os fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong>ixarem <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r às <strong>de</strong>mandas <strong>do</strong>s<br />

consumi<strong>do</strong>res, por não aceitarem <strong>de</strong>terminada forma <strong>de</strong> pagamento, caso <strong>do</strong> cheque. Em uma gran<strong>de</strong> re<strong>de</strong> <strong>de</strong> lanchonetes fast food<br />

é bem conhecida a placa com os dizeres: “Não aceitamos cheques. Art. 5º, inc. II, da CF/1988”. Como se nota, a informação<br />

menciona o princípio constitucional da legalida<strong>de</strong>, segun<strong>do</strong> o qual ninguém será obriga<strong>do</strong> a fazer ou <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> fazer alguma coisa<br />

senão em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> lei. A respeito da questão, o PROCONSP tem orientação no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a aceitação <strong>de</strong> cheque é opcional<br />

por parte <strong>do</strong> estabelecimento, conforme se observa da seguinte resposta, retirada <strong>do</strong> site da instituição:<br />

“O fornece<strong>do</strong>r é obriga<strong>do</strong> a aceitar cheque como forma <strong>de</strong> pagamento? Não. A aceitação <strong>de</strong> cheque é opcional. O meio <strong>de</strong><br />

pagamento obrigatório é a moeda corrente nacional (art. 315 <strong>do</strong> Código Civil). Se o fornece<strong>do</strong>r não quiser aceitar cheque como<br />

forma <strong>de</strong> pagamento <strong>de</strong>verá informar <strong>de</strong> maneira clara, precisa e principalmente ostensiva, com cartazes em local <strong>de</strong> fácil<br />

visualização, sobre a restrição (art. 6º, inc. III, e art. 31, ambos <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r)”.11<br />

A orientação parece correta, estan<strong>do</strong> <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> bom senso e <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a principiologia <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. O que parece estar equivoca<strong>do</strong> é a citação constante daquela famosa placa que, em vez <strong>de</strong> mencionar a legalida<strong>de</strong><br />

pura, po<strong>de</strong>ria fazer uso <strong>de</strong> dispositivos <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

7.2.3.<br />

Enviar ou entregar ao consumi<strong>do</strong>r, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer<br />

qualquer serviço (art. 39, inc. III, <strong>do</strong> CDC)<br />

O envio <strong>de</strong> produto sem solicitação é prática abusiva bem comum no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo. Em complemento à proibição,<br />

estabelece o parágrafo único <strong>do</strong> art. 39 <strong>do</strong> CDC que os serviços presta<strong>do</strong>s e os produtos remeti<strong>do</strong>s ou entregues ao consumi<strong>do</strong>r sem<br />

a <strong>de</strong>vida solicitação equiparam-se às amostras grátis, inexistin<strong>do</strong> obrigação <strong>de</strong> pagamento.<br />

A hipótese legal aqui abordada se faz presente em especial no envio <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito sem que haja qualquer pedi<strong>do</strong> por<br />

parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Presentes danos advin<strong>do</strong>s <strong>de</strong>ssa conduta ilícita, surge o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar por parte da empresa emitente. Nessa<br />

linha <strong>de</strong> conclusão, por to<strong>do</strong>s:<br />

“Recurso especial. Consumi<strong>do</strong>r. Ação civil pública. Envio <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito não solicita<strong>do</strong>. Prática comercial abusiva. Abuso <strong>de</strong><br />

direito configura<strong>do</strong>. 1. O envio <strong>do</strong> cartão <strong>de</strong> crédito, ainda que bloquea<strong>do</strong>, sem pedi<strong>do</strong> pretérito e expresso <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r,<br />

caracteriza prática comercial abusiva, violan<strong>do</strong> frontalmente o disposto no artigo 39, III, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2.<br />

Doutrina e jurisprudência acerca <strong>do</strong> tema. 3. Recurso especial provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1.199.117/SP – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso<br />

Sanseverino – Terceira Turma – j. 18.12.2012 – DJe 04.03.2013).<br />

“Recurso especial. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais. Envio <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito não solicita<strong>do</strong> e <strong>de</strong><br />

faturas cobran<strong>do</strong> anuida<strong>de</strong>. Dano moral configura<strong>do</strong>. I. Para se presumir o dano moral pela simples comprovação <strong>do</strong> ato ilícito, esse<br />

ato <strong>de</strong>ve ser objetivamente capaz <strong>de</strong> acarretar a <strong>do</strong>r, o sofrimento, a lesão aos sentimentos íntimos juridicamente protegi<strong>do</strong>s. II. O<br />

envio <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito não solicita<strong>do</strong>, conduta consi<strong>de</strong>rada pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r como prática abusiva (art. 39,<br />

III), adiciona<strong>do</strong> aos incômo<strong>do</strong>s <strong>de</strong>correntes das providências notoriamente dificultosas para o cancelamento <strong>do</strong> cartão, causam dano<br />

moral ao consumi<strong>do</strong>r, mormente em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> pessoa <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> avançada, próxima <strong>do</strong>s cem anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> à época <strong>do</strong>s fatos,<br />

circunstância que agrava o sofrimento moral. Recurso especial não conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1061500/RS – Terceira Turma – Rel.


Min. Sidnei Beneti – j. 04.11.2008 – DJe 20.11.2008).<br />

“In<strong>de</strong>nização. Danos morais. Cartão <strong>de</strong> crédito emiti<strong>do</strong> sem solicitação <strong>do</strong> cliente. Inscrição na SERASA. Quantum in<strong>de</strong>nizatório<br />

reputa<strong>do</strong> excessivo. ‘O valor da in<strong>de</strong>nização por dano moral sujeita-se ao controle <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, quan<strong>do</strong> a quantia<br />

arbitrada se mostra ínfima, <strong>de</strong> um la<strong>do</strong>, ou visivelmente exagerada, <strong>de</strong> outro. Hipótese <strong>de</strong> fixação excessiva, a gerar enriquecimento<br />

in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> <strong>do</strong> ofendi<strong>do</strong>’ (REsp 439.956-TO, por mim relata<strong>do</strong>). Recurso especial parcialmente conheci<strong>do</strong>, e, nessa parte, provi<strong>do</strong>”<br />

(STJ – REsp 596.438/AM – Quarta Turma – Rel. Min. Barros Monteiro – j. 04.05.2004 – DJ 24.05.2004, p. 283).<br />

Mais recentemente, pontue-se que a questão se consoli<strong>do</strong>u <strong>de</strong> tal forma naquela Corte que foi editada a sua Súmula n. 532, <strong>do</strong><br />

ano <strong>de</strong> 2015, segun<strong>do</strong> a qual “constitui prática comercial abusiva o envio <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito sem prévia e expressa solicitação <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, configuran<strong>do</strong>-se ato ilícito in<strong>de</strong>nizável e sujeito à aplicação <strong>de</strong> multa administrativa”. Aliás, em complemento, <strong>de</strong>ve-se<br />

enten<strong>de</strong>r que, no caso <strong>de</strong> envio <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito sem solicitação, caso o consumi<strong>do</strong>r queira com ele permanecer, não se po<strong>de</strong><br />

cobrar pela anuida<strong>de</strong>, pela presença da citada amostra grátis (art. 39, parágrafo único).<br />

Seguin<strong>do</strong> na análise <strong>de</strong> concretizações da norma, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong>duziu que a assinatura <strong>de</strong> revistas efetuada<br />

automaticamente pela empresa editorial representa afronta ao dispositivo ora estuda<strong>do</strong>, ensejan<strong>do</strong> a consequente responsabilização<br />

civil <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r em caso envolven<strong>do</strong> i<strong>do</strong>so (hipervulnerável):<br />

“Recurso especial. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos materiais e morais. Assinaturas <strong>de</strong> revistas não<br />

solicitadas. Reiteração. Débito lança<strong>do</strong> in<strong>de</strong>vidamente no cartão <strong>de</strong> crédito. Dano moral configura<strong>do</strong>. Arts. 3º e 267, VI, <strong>do</strong> CPC.<br />

Ausência <strong>de</strong> prequestionamento. Súmulas STF/282 e 356. Quantum in<strong>de</strong>nizatório – Revisão obstada em face da proporcionalida<strong>de</strong> e<br />

razoabilida<strong>de</strong>. I. Para se presumir o dano moral pela simples comprovação <strong>do</strong> ato ilícito, esse ato <strong>de</strong>ve ser objetivamente capaz <strong>de</strong><br />

acarretar a <strong>do</strong>r, o sofrimento, a lesão aos sentimentos íntimos juridicamente protegi<strong>do</strong>s. II. A reiteração <strong>de</strong> assinaturas <strong>de</strong> revistas não<br />

solicitadas é conduta consi<strong>de</strong>rada pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r como prática abusiva (art. 39, III). Esse fato e os<br />

incômo<strong>do</strong>s <strong>de</strong>correntes das providências notoriamente dificultosas para o cancelamento significam sofrimento moral <strong>de</strong> monta,<br />

mormente em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> pessoa <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> avançada, próxima <strong>do</strong>s 85 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> à época <strong>do</strong>s fatos, circunstância que agrava o<br />

sofrimento moral. III. O conteú<strong>do</strong> normativo <strong>do</strong>s arts. 3º e 267, VI, <strong>do</strong> CPC, não foi objeto <strong>de</strong> <strong>de</strong>bate no v. Acórdão recorri<strong>do</strong>,<br />

carecen<strong>do</strong>, portanto, <strong>do</strong> necessário prequestionamento viabiliza<strong>do</strong>r <strong>do</strong> recurso especial. Inci<strong>de</strong>m, na espécie, as Súmulas 282 e 356<br />

<strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral. IV. Só é possível a intervenção <strong>de</strong>sta Corte para reduzir ou aumentar o valor in<strong>de</strong>nizatório por dano<br />

moral nos casos em que o quantum arbitra<strong>do</strong> pelo Acórdão recorri<strong>do</strong> se mostrar irrisório ou exorbitante, situação que não se faz<br />

presente no caso em tela. Recurso especial improvi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1102787/PR – Terceira Turma – Rel. Min. Sidnei Beneti – j.<br />

16.03.2010 – DJe 29.03.2010).<br />

Outro exemplo envolven<strong>do</strong> o art. 39, inc. III, <strong>do</strong> CDC é relativo a serviços <strong>de</strong> telefonia ofereci<strong>do</strong>s sem solicitação. Entre tantos<br />

julga<strong>do</strong>s, cite-se o conheci<strong>do</strong> caso <strong>do</strong> tele-sexo, julga<strong>do</strong> pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça na década passada. Concluiu-se, com<br />

precisão, que tal serviço somente po<strong>de</strong>ria ser forneci<strong>do</strong> mediante prévia solicitação, não sen<strong>do</strong> o caso <strong>de</strong> cobrança se envia<strong>do</strong><br />

diretamente ao consumi<strong>do</strong>r. Como se nota da primeira ementa transcrita, cabe reparação <strong>de</strong> danos se prejuízos estiverem presentes<br />

ao consumi<strong>do</strong>r:<br />

“Civil e processual. Cobrança <strong>de</strong> ligações para ‘telessexo’. Oferecimento <strong>de</strong> serviço ou produto estranho ao contrato <strong>de</strong> telefonia sem<br />

anuência <strong>do</strong> usuário. Invalida<strong>de</strong>. Ônus da prova positiva <strong>do</strong> fato atribuível à empresa concessionária. Inscrição da titular da linha<br />

telefônica no CADIN. Danos morais. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, arts. 6º, VIII e 31, III. I. O ‘produto’ ou ‘serviço’ não<br />

inerente ao contrato <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> telefonia ou que não seja <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> pública, quan<strong>do</strong> posto à disposição <strong>do</strong> usuário pela<br />

concessionária – caso <strong>do</strong> ‘telessexo’ – carece <strong>de</strong> prévia autorização, inscrição ou cre<strong>de</strong>nciamento <strong>do</strong> titular da linha, em respeito à<br />

restrição prevista no art. 39, III, <strong>do</strong> CDC. II. Sustenta<strong>do</strong> pela autora não ter da<strong>do</strong> a aludida anuência, cabe à companhia telefônica o<br />

ônus <strong>de</strong> provar o fato positivo em contrário, nos termos <strong>do</strong> art. 6º, VIII, da mesma Lei 8.078/1990, o que inocorreu. III. Destarte, se<br />

afigura in<strong>de</strong>vida a cobrança <strong>de</strong> ligações nacionais ou internacionais a tal título, e, <strong>de</strong> igual mo<strong>do</strong>, ilícita a inscrição da titular da linha<br />

como <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>ra em cadastro negativo <strong>de</strong> crédito, geran<strong>do</strong>, em contrapartida, o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizá-la pelos danos morais causa<strong>do</strong>s, que<br />

hão <strong>de</strong> ser fixa<strong>do</strong>s com mo<strong>de</strong>ração, sob pena <strong>de</strong> causar enriquecimento sem causa. IV. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong> em<br />

parte” (STJ – REsp 265.121/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 04.04.2002 – DJ 17.06.2002, p. 267).<br />

“Telefone. Serviço ‘900’. ‘Disque prazer’. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. O serviço ‘900’ é oneroso e somente po<strong>de</strong> ser<br />

forneci<strong>do</strong> mediante prévia solicitação <strong>do</strong> titular da linha telefônica. Recurso conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 258156/SP – Quarta<br />

Turma – Rel. Min. Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar – j. 21.09.2000 – DJ 11.12.2000, p. 210).<br />

Po<strong>de</strong>-se traçar um paralelo entre a última hipótese e o SPAM, que constitui o envio <strong>de</strong> e-mail sem solicitação pelo usuário da<br />

internet. O termo SPAM tem origem no famoso enlata<strong>do</strong> <strong>de</strong> presunto comercializa<strong>do</strong> nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, causa<strong>do</strong>r <strong>de</strong> notória<br />

indigestão. O envio <strong>de</strong> SPAM representa clara quebra <strong>de</strong> boa-fé, exemplo típico <strong>de</strong> abuso <strong>de</strong> direito a enquadrar-se perfeitamente<br />

no art. 187 <strong>do</strong> CC/2002. Presentes os danos <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> envio <strong>do</strong> e-mail, caberá a correspon<strong>de</strong>nte ação <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil.<br />

Cite-se a hipótese em que um consumi<strong>do</strong>r recebe um SPAM <strong>de</strong> uma conhecida re<strong>de</strong> <strong>de</strong> lojas que trava o seu computa<strong>do</strong>r, fazen<strong>do</strong>


com que perca um trabalho intelectual. Ou, ainda, a situação em que o envio <strong>do</strong> SPAM causa danos materiais a uma pessoa jurídica<br />

(TJRO – Apelação Cível 100.007.2001.004353-1 – Segunda Câmara Cível – Rel. Des. Marcos Alaor Diniz Grangeia – j.<br />

29.03.2006). Ora, não há dúvidas <strong>de</strong> que, em casos tais, haverá <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar os prejuízos materiais e morais sofri<strong>do</strong>s.<br />

De toda sorte, esclareça-se que o mero envio <strong>do</strong> SPAM, por si só, não gera dano moral, conforme reconheceu o Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“Internet. Envio <strong>de</strong> mensagens eletrônicas. SPAM. Possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> recusa por simples <strong>de</strong>letação. Dano moral não configura<strong>do</strong>.<br />

Recurso especial não conheci<strong>do</strong>. 1. Segun<strong>do</strong> a <strong>do</strong>utrina pátria, ‘só <strong>de</strong>ve ser reputa<strong>do</strong> como dano moral a <strong>do</strong>r, vexame, sofrimento ou<br />

humilhação que, fugin<strong>do</strong> à normalida<strong>de</strong>, interfira intensamente no comportamento psicológico <strong>do</strong> indivíduo, causan<strong>do</strong>-lhe aflições,<br />

angústia e <strong>de</strong>sequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilida<strong>de</strong> exacerbada estão fora da<br />

órbita <strong>do</strong> dano moral, porquanto tais situações não são intensas e dura<strong>do</strong>uras, a ponto <strong>de</strong> romper o equilíbrio psicológico <strong>do</strong><br />

indivíduo’. 2. Não obstante o inegável incômo<strong>do</strong>, o envio <strong>de</strong> mensagens eletrônicas em massa – SPAM – por si só não consubstancia<br />

fundamento para justificar a ação <strong>de</strong> dano moral, notadamente em face da evolução tecnológica que permite o bloqueio, a <strong>de</strong>letação<br />

ou simplesmente a recusa <strong>de</strong> tais mensagens. 3. Inexistin<strong>do</strong> ataques à honra ou à dignida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem recebe as mensagens<br />

eletrônicas, não há que se falar em nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> a justificar uma con<strong>de</strong>nação por danos morais. 4. Recurso especial não<br />

conheci<strong>do</strong>” (STJ – REsp 844.736/DF – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – Rel. p/Acórdão Min. Honil<strong>do</strong> Amaral <strong>de</strong><br />

Mello Castro (Desembarga<strong>do</strong>r Convoca<strong>do</strong> <strong>do</strong> TJAP) – j. 27.10.2009 – DJe 02.09.2010).<br />

De fato, constata-se que também no abuso <strong>de</strong> direito o dano <strong>de</strong>ve estar presente, para que surja o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar <strong>do</strong><br />

abusa<strong>do</strong>r, nos termos <strong>do</strong> que consta expressamente <strong>do</strong> art. 927, caput, <strong>do</strong> CC/2002.<br />

Finalmente, cabe ressaltar que o Projeto <strong>de</strong> Lei 281/2012 – uma das projeções que visa à Reforma <strong>do</strong> CDC – preten<strong>de</strong> incluir<br />

vedação expressa ao SPAM, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que “é veda<strong>do</strong> ao fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> produto ou serviço enviar mensagem eletrônica não<br />

solicitada a <strong>de</strong>stinatário que: I – não possua relação <strong>de</strong> consumo anterior com o fornece<strong>do</strong>r e não tenha manifesta<strong>do</strong> consentimento<br />

prévio e expresso em recebê-la; II – esteja inscrito em cadastro <strong>de</strong> bloqueio <strong>de</strong> oferta; ou III – tenha manifesta<strong>do</strong> diretamente ao<br />

fornece<strong>do</strong>r a opção <strong>de</strong> não recebê-la” (atual art. 44-E da proposta). Espera-se a aprovação <strong>do</strong> cita<strong>do</strong> projeto legislativo, para que<br />

não pairem mais dúvidas a respeito da presença <strong>de</strong>sse abuso <strong>de</strong> direito.<br />

7.2.4.<br />

Prevalecer-se da fraqueza ou ignorância <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, ten<strong>do</strong> em vista a sua ida<strong>de</strong>, saú<strong>de</strong> e<br />

condição social, para ven<strong>de</strong>r-lhe produto ou serviço (art. 39, inc. IV, <strong>do</strong> CDC)<br />

O coman<strong>do</strong> visa a afastar o aproveitamento da condição <strong>de</strong> hipervulneráveis <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, caso <strong>do</strong>s i<strong>do</strong>sos<br />

(maiores <strong>de</strong> sessenta anos) e <strong>de</strong> pessoas com <strong>de</strong>ficiências intelectuais ou culturais. Mesmo com as mudanças engendradas no<br />

sistema jurídico pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, que procurou tratar as pessoas com <strong>de</strong>ficiência como iguais, a proteção<br />

<strong>de</strong> tais pessoas como vulneráveis <strong>de</strong>ve ser mantida nas relações <strong>de</strong> consumo.<br />

Como expõe a melhor <strong>do</strong>utrina, a norma coíbe a chamada venda por impulso ou venda automática, em relação a pessoas que<br />

po<strong>de</strong>m não ter total discernimento para compreensão <strong>do</strong> teor das informações que lhe são prestadas.12 Nesse contexto,<br />

“Efetivamente, e por diversas razões, há que se aceitar que o grupo <strong>do</strong>s i<strong>do</strong>sos possui uma vulnerabilida<strong>de</strong> especial, seja pela sua<br />

vulnerabilida<strong>de</strong> técnica exagerada em relação a novas tecnologias (home-banking, relações com máquina, uso necessário da internet<br />

etc.); sua vulnerabilida<strong>de</strong> fática quanto à rapi<strong>de</strong>z das contratações; sua saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>bilitada; a solidão <strong>do</strong> seu dia a dia, que transforma<br />

um ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r <strong>de</strong> porta em porta, um opera<strong>do</strong>r <strong>de</strong> telemarketing, talvez na única pessoa com a qual tenham contato e empatia<br />

naquele dia; sem falar em sua vulnerabilida<strong>de</strong> econômica e jurídica, hoje, quan<strong>do</strong> se pensa em um teto <strong>de</strong> aposenta<strong>do</strong>ria único no<br />

Brasil <strong>de</strong> míseros 400 dólares para o resto da vida”. 13 A título <strong>de</strong> exemplo <strong>de</strong>ssas dificulda<strong>de</strong>s, é comum a venda para i<strong>do</strong>sos <strong>de</strong><br />

planos <strong>de</strong> previdência privada que nunca po<strong>de</strong>rão ser usufruí<strong>do</strong>s, por razões óbvias. Muitos <strong>do</strong>s i<strong>do</strong>sos que celebram contratos<br />

como esses mal sabem o teor <strong>do</strong>s instrumentos que estão assinan<strong>do</strong>.<br />

Partin<strong>do</strong> para a análise <strong>de</strong> julga<strong>do</strong>s, recente <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal Catarinense concluiu que “faz jus à in<strong>de</strong>nização por danos<br />

materiais e morais consumi<strong>do</strong>r i<strong>do</strong>so com 81 anos que, sob promessa <strong>de</strong> dispensa <strong>de</strong> medicamentos, ludibria<strong>do</strong>, adquire almofada<br />

térmica vibratória. Em que pese a relativida<strong>de</strong> <strong>do</strong> efeito da revelia, tal só po<strong>de</strong> ser ilidi<strong>do</strong> por fortes elementos <strong>de</strong> convicção em<br />

senti<strong>do</strong> contrário <strong>do</strong> constante <strong>do</strong>s autos” (TJSC – Apelação Cível 2010.041310-5, São Miguel <strong>do</strong> Oeste – Rel. Des. Gilberto<br />

Gomes <strong>de</strong> Oliveira – j. 25.11.2010 – DJSC 09.03.2011, p. 287). No mesmo senti<strong>do</strong>, vejamos <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal Gaúcho em caso<br />

similar envolven<strong>do</strong> pessoa <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> avançada:<br />

“Anulação <strong>de</strong> contrato, por erro essencial. Aquisição <strong>de</strong> produto fisioterápico. Colchão magnetiza<strong>do</strong>. Venda efetivada fora <strong>do</strong><br />

estabelecimento – a <strong>do</strong>micílio. Preço incompatível com um produto similar comum. Valor das prestações <strong>de</strong>sconta<strong>do</strong> diretamente <strong>do</strong><br />

benefício previ<strong>de</strong>nciário <strong>do</strong> contratante. Prática comercial abusiva. Indução <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em erro. <strong>Direito</strong> ao <strong>de</strong>sfazimento <strong>do</strong><br />

contrato. Danos morais aplica<strong>do</strong>s com caráter dissuasório. Verossimilhança da alegação <strong>de</strong> promessa <strong>de</strong> substanciais vantagens para<br />

a saú<strong>de</strong> <strong>do</strong>s adquirentes. Vantagens inocorrentes. Prática comercial abusiva. Fornece<strong>do</strong>ra que se prevalece da fraqueza <strong>do</strong>


consumi<strong>do</strong>r, em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua ida<strong>de</strong> e condição social, para impingir-lhe produto. Art. 39, IV, <strong>do</strong> CDC. <strong>Direito</strong> ao <strong>de</strong>sfazimento <strong>do</strong><br />

contrato. Danos morais aplica<strong>do</strong>s com função punitiva. Para casos como o presente, a responsabilida<strong>de</strong> civil po<strong>de</strong> assumir um caráter<br />

dissuasório. Recurso da ré <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>. Recurso <strong>do</strong> autor a que se dá provimento” (TJRS – Recurso 43963-19.2010.8.21.9000,<br />

Igrejinha – Terceira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Eugênio Facchini Neto – j. 14.04.2011 – DJERS 25.04.2011).<br />

Ato contínuo, várias ementas julgam consistir prática comercial <strong>de</strong>sleal e abusiva a imposição <strong>de</strong> condições <strong>de</strong> renovação<br />

contratual que oneram excessivamente o consumi<strong>do</strong>r i<strong>do</strong>so, geralmente pela a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> critérios por faixa etária (a ilustrar: TJMG –<br />

Apelação Cível 4644882-65.2008.8.13.0145, Juiz <strong>de</strong> Fora – Décima Câmara Cível – Rel. Des. Alberto Aluízio Pacheco <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong><br />

– j. 25.05.2010 – DJEMG 15.06.2010; TJRS – Apelação Cível 70031897762, Tapejara – Quinta Câmara Cível – Rel. Des. Romeu<br />

Marques Ribeiro Filho – j. 18.08.2010 – DJERS 26.08.2010; TJPR – Apelação Cível 0594106-0, Londrina – Nona Câmara Cível –<br />

Rel. Des. Rosana Amara Girardi Fachin – DJPR 04.12.2009, p. 369; TJRS – Apelação Cível 70025160672, Porto Alegre – Quinta<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Romeu Marques Ribeiro Filho – j. 06.08.2008 – DOERS 13.08.2008, p. 30; e TJRJ – Apelação Cível<br />

2005.001.32472 – Nona Câmara Cível – Rel. Des. Roberto <strong>de</strong> Abreu e Silva – j. 14.02.2006).<br />

Do Tribunal Paulista, vejamos a hipótese fática referente a um serviço <strong>de</strong> conserto <strong>de</strong> caminhão que foi presta<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>snecessariamente, com claro intuito <strong>de</strong> prejudicar consumi<strong>do</strong>r, que não tinha conhecimento a respeito <strong>de</strong> sua extensão:<br />

“In<strong>de</strong>nização. Danos materiais. Restituição da quantia paga por um serviço ina<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>. Caminhão expelin<strong>do</strong> excesso <strong>de</strong> ‘fumaça<br />

preta’, motivan<strong>do</strong> o autor a procurar os serviços mecânicos da ré para o conserto <strong>do</strong> <strong>de</strong>feito. Reparo efetua<strong>do</strong> pela ré, que não<br />

alcançou o objetivo espera<strong>do</strong>. Ausência <strong>de</strong> comprovação da necessida<strong>de</strong> <strong>do</strong> serviço presta<strong>do</strong> pela ré, que <strong>de</strong>ve ser reputa<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>snecessário. Cabimento da restituição da quantia paga pela prestação <strong>de</strong> um serviço inútil. Se a ré reconhece que o serviço por ela<br />

presta<strong>do</strong> não solucionou o <strong>de</strong>feito no caminhão <strong>do</strong> autor, e nem comprovou que os reparos efetua<strong>do</strong>s eram realmente necessários,<br />

impõe-se a <strong>de</strong>volução <strong>do</strong> que este pagou àquela por um serviço inútil, uma vez que é veda<strong>do</strong> ao fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços impingir<br />

serviços ao consumi<strong>do</strong>r, prevalecen<strong>do</strong> da ignorância <strong>de</strong>ste, nos termos <strong>do</strong> art. 39, IV, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Recurso<br />

provi<strong>do</strong>, nessa parte. (…)” (TJSP – Apelação 0020763-87.2008.8.26.0019 – Acórdão 5041276, Americana – Décima Sétima Câmara<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Luiz Sabbatto – j. 02.03.2011 – DJESP 03.05.2011).<br />

Por fim, a respeito da incidência <strong>do</strong> art. 39, IV, <strong>do</strong> CDC, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça já julgou que “O repasse in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

PIS e da COFINS na fatura telefônica configura ‘prática abusiva’ das concessionárias, nos termos <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r, pois viola os princípios da boa-fé objetiva e da transparência, valen<strong>do</strong>-se da ‘fraqueza ou ignorância <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r’<br />

(art. 39, IV, <strong>do</strong> CDC)” (STJ – REsp 1.053.778/RS – Segunda Turma – Rel. Min. Herman Benjamin – j. 09.09.2008 – DJe<br />

30.09.2008).<br />

7.2.5.<br />

Exigir <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r vantagem manifestamente excessiva (art. 39, inc. V, <strong>do</strong> CDC)<br />

A exemplo da previsão <strong>do</strong> art. 51, inc. IV, <strong>do</strong> CDC, o presente dispositivo veda a lesão objetiva e a onerosida<strong>de</strong> excessiva,<br />

tidas como gera<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> práticas comerciais abusivas. Como razão importante <strong>do</strong> preceito, cite-se a clássica vedação <strong>do</strong><br />

enriquecimento sem causa, constante <strong>do</strong>s arts. 884 a 886 <strong>do</strong> CC/2002. Dessa forma, to<strong>do</strong>s os exemplos expostos no Capítulo 5<br />

<strong>de</strong>sta obra envolven<strong>do</strong> aquela norma servem para a configuração da prática abusiva fora <strong>do</strong> plano <strong>do</strong> contratual.<br />

Interessante trazer à tona a comum prática <strong>do</strong> cheque-caução, exigi<strong>do</strong> muitas vezes quan<strong>do</strong> da internação <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res em<br />

hospitais. Há quem entenda cuidar-se <strong>de</strong> hipótese típica <strong>de</strong> esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> perigo, tratada pelo art. 156 <strong>do</strong> Código Civil, mormente<br />

quan<strong>do</strong> o paciente médico já tem plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Enuncia tal coman<strong>do</strong> civil que “Configura-se o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> perigo quan<strong>do</strong> alguém,<br />

premi<strong>do</strong> da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> salvar-se, ou a pessoa <strong>de</strong> sua família, <strong>de</strong> grave dano conheci<strong>do</strong> pela outra parte, assume obrigação<br />

excessivamente onerosa. Parágrafo único. Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> pessoa não pertencente à família <strong>do</strong> <strong>de</strong>clarante, o juiz <strong>de</strong>cidirá segun<strong>do</strong> as<br />

circunstâncias”.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, leciona Carlos Roberto Gonçalves que “merece ser também cita<strong>do</strong> o exemplo <strong>de</strong> inegável atualida<strong>de</strong> e<br />

característico <strong>de</strong> esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> perigo, que é o da pessoa que se vê compelida a efetuar <strong>de</strong>pósito ou a prestar garantia sob a forma <strong>de</strong><br />

emissão <strong>de</strong> cambial ou <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> fiança, exigi<strong>do</strong>s por hospital para conseguir a internação ou atendimento <strong>de</strong> urgência <strong>de</strong><br />

cônjuge ou <strong>de</strong> parente em perigo <strong>de</strong> vida”.14 Não tem si<strong>do</strong> diferente a conclusão <strong>de</strong> parte da jurisprudência, também nessa linha,<br />

pelo reconhecimento <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> perigo em casos tais (por to<strong>do</strong>s: TJSP – Apelação 0109749-68.2008.8.26.0002 – Acórdão<br />

4885202, São Paulo – Décima Oitava Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Rubens Cury – j. 07.12.2010 – DJESP 24.01.2011;<br />

TJSC – Apelação Cível 2009.043712-5, Brusque – Rel. Des. Luiz Carlos Freyesleben – j. 29.06.2010 – DJSC 08.07.2010, p. 181;<br />

TJPR – Apelação Cível 0485768-9, Curitiba – Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Prestes Mattar – DJPR 17.10.2008, p. 59; e TJRJ –<br />

Apelação Cível 2006.001.49905 – Décima Sétima Câmara Cível – Rel. Des. Edson Aguiar <strong>de</strong> Vasconcelos – j. 10.01.2007).<br />

Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, esse não parece ser o melhor enquadramento, uma vez que o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> perigo gera a anulação <strong>do</strong> ato<br />

correspon<strong>de</strong>nte, sujeita a prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial (arts. 171 e 178 <strong>do</strong> CC/2002). Desse mo<strong>do</strong>, o ato po<strong>de</strong> ser convalida<strong>do</strong> pela cura pelo


tempo ou convalescimento temporal. Na verda<strong>de</strong>, é melhor concluir que a exigência <strong>de</strong> cheque-caução, mormente quan<strong>do</strong> o<br />

consumi<strong>do</strong>r já tem plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, nos casos <strong>de</strong> emergência médica ou quan<strong>do</strong> ausente justo motivo para a negativa <strong>de</strong> cobertura,<br />

configura uma prática ou cláusula abusiva que, por envolver matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, ocasiona a nulida<strong>de</strong> <strong>do</strong> ato correspon<strong>de</strong>nte,<br />

sem prejuízo <strong>de</strong> outras sanções caso da imputação civil <strong>do</strong>s danos suporta<strong>do</strong>s. Utiliza-se a teoria <strong>do</strong> diálogo das fontes, com solução<br />

mais satisfatória aos consumi<strong>do</strong>res. Concluin<strong>do</strong> corretamente <strong>de</strong>ssa maneira, colaciona-se, a título <strong>de</strong> exemplo:<br />

“Plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> corréu que se recusou a cobrir as <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> internação <strong>do</strong> autor, sob o fundamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>scre<strong>de</strong>nciamento <strong>do</strong><br />

plano. Falta <strong>de</strong> comunicação <strong>do</strong> associa<strong>do</strong> quanto ao <strong>de</strong>scre<strong>de</strong>nciamento. Recusa que causou danos morais ao autor, que era i<strong>do</strong>so e<br />

estava com a saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>bilitada. Fixação em R$ 9.000,00. Razoabilida<strong>de</strong>. Exigência <strong>de</strong> cheque-caução pela corré para prestar<br />

atendimento médico. Danos morais. Ocorrência. Fixação em R$ 2.000,00. Recurso <strong>do</strong> autor provi<strong>do</strong> em parte, improvi<strong>do</strong> o <strong>do</strong> réu. O<br />

corréu Centro Transmontano causou dano moral ao autor, pessoa <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> e que sofria <strong>de</strong> sérios problemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, ao negar-se a<br />

cobrir as <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> internação, pois não o informara <strong>do</strong> <strong>de</strong>scre<strong>de</strong>nciamento <strong>do</strong> hospital. Ao que tu<strong>do</strong> indica, o hospital condicionou<br />

a prestação <strong>de</strong> serviço médico à emissão <strong>de</strong> cheque caução, o que configura prática abusiva e, em face das circunstâncias,<br />

notadamente o fato <strong>de</strong> que paciente era i<strong>do</strong>so e sua internação era emergencial, acarretou danos morais” (TJSP – Apelação 0131319-<br />

87.2006.8.26.0000 – Acórdão 4931640, São Paulo – Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Jesus Lofrano – j. 08.02.2011 –<br />

DJESP 02.03.2011).<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Relação <strong>de</strong> consumo. Hospital. Situação <strong>de</strong> emergência. Cheque caução. Exigência para fins <strong>de</strong> internação.<br />

Prática abusiva. Aflição e angústia impostas ao consumi<strong>do</strong>r. Dano moral configura<strong>do</strong>. Violação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

e <strong>de</strong> lei estadual. Agravo reti<strong>do</strong>. Cerceamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa. Inocorrência. O juiz é o <strong>de</strong>stinatário da prova e está autoriza<strong>do</strong> a dispensar<br />

as <strong>de</strong>snecessárias ao <strong>de</strong>slin<strong>de</strong> da causa (CPC, art. 130). Não se configura cerceamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa o julgamento antecipa<strong>do</strong> da li<strong>de</strong>,<br />

presentes as condições previstas no art. 330, inc. I, <strong>do</strong> CPC. A exigência <strong>de</strong> cheque-caução para que ocorra a internação hospitalar <strong>de</strong><br />

paciente em esta<strong>do</strong> grave emergencial, configura prática abusiva, ferin<strong>do</strong> as disposições <strong>do</strong> CDC. Configura ainda afronta à Lei<br />

Estadual 3.426/2000, que proíbe a exigência <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito prévio <strong>de</strong> qualquer natureza, para possibilitar internação <strong>de</strong> <strong>do</strong>ente em<br />

situação <strong>de</strong> urgência e emergência. Dano moral configura<strong>do</strong>. Valor que aten<strong>de</strong> aos princípios reitores <strong>do</strong> instituto. Verba honorária<br />

bem fixada. Impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se aplicar a multa legal por ausência <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> inicial, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> inovar em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso.<br />

Manutenção da sentença. Conhecimento e <strong>de</strong>sprovimento <strong>de</strong> ambos os recursos” (TJRJ – Apelação 2008.001.57406 – Décima<br />

Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Rogério <strong>de</strong> Oliveira Souza – j. 07.04.2009 – DORJ 13.04.2009, p. 167).<br />

Em suma, não se po<strong>de</strong> mais insistir na premissa <strong>de</strong> que o Código Civil é a via <strong>de</strong> solução para to<strong>do</strong>s os problemas práticos,<br />

para a cura <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os males, como pensavam os antigos civilistas. Em muitos casos, a correta solução <strong>de</strong> enquadramento está no<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Como outro exemplo <strong>de</strong> situação <strong>de</strong> lesão objetiva ao consumi<strong>do</strong>r, cite-se a comum cobrança, nos contratos <strong>de</strong> aquisição <strong>de</strong><br />

imóveis a prazo, <strong>de</strong> juros no pé, ou seja, antes da entrega da obra. De qualquer maneira, infelizmente, o Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça passou a enten<strong>de</strong>r, no ano <strong>de</strong> 2012, que a sua cobrança é legítima. Vejamos a publicação <strong>de</strong> acórdão constante <strong>do</strong><br />

Informativo n. 499 da Corte:<br />

“Juros compensatórios (‘juros no pé’). Incidência anterior à entrega das chaves. Compromisso <strong>de</strong> compra e venda. A Seção, por<br />

maioria, <strong>de</strong>cidiu que não é abusiva a cláusula <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> juros compensatórios inci<strong>de</strong>ntes em perío<strong>do</strong> anterior à entrega das<br />

chaves nos contratos <strong>de</strong> compromisso <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> imóveis em construção sob o regime <strong>de</strong> incorporação imobiliária.<br />

Observou o Min. Antonio Carlos Ferreira que, a rigor, o pagamento pela compra <strong>de</strong> um imóvel em fase <strong>de</strong> produção <strong>de</strong>veria ser feito<br />

à vista. Não obstante, em favorecimento financeiro ao compra<strong>do</strong>r, o incorpora<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> estipular o adimplemento da obrigação<br />

mediante o parcelamento <strong>do</strong> preço, inclusive, em regra, a prazos que vão além <strong>do</strong> tempo previsto para o término da obra. Em tal<br />

hipótese, afigura-se legítima a cobrança <strong>do</strong>s juros compensatórios, pois o incorpora<strong>do</strong>r, além <strong>de</strong> assumir os riscos <strong>do</strong><br />

empreendimento, antecipa os recursos para o seu regular andamento. Destacou-se que seria injusto pagar na compra parcelada o<br />

mesmo valor correspon<strong>de</strong>nte da compra à vista. Acrescentou-se, ainda, que, sen<strong>do</strong> esses juros compensatórios um <strong>do</strong>s custos<br />

financeiros da incorporação imobiliária suporta<strong>do</strong>s pelo adquirente, <strong>de</strong>ve ser convenciona<strong>do</strong> expressamente no contrato ou incluí<strong>do</strong><br />

no preço final da obra. Concluiu-se que, para a segurança <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, em observância ao direito <strong>de</strong> informação insculpi<strong>do</strong> no art.<br />

6º, II, <strong>do</strong> CDC, é conveniente a previsão expressa <strong>do</strong>s juros compensatórios sobre to<strong>do</strong> o valor parcela<strong>do</strong> na aquisição <strong>do</strong> bem,<br />

permitin<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ssa forma, o controle pelo Judiciário. Além disso, afirmou o Min. Antonio Carlos Ferreira que se esses juros não<br />

pu<strong>de</strong>rem ser convenciona<strong>do</strong>s no contrato, serão incluí<strong>do</strong>s no preço final da obra e suporta<strong>do</strong>s pelo adquirente, sen<strong>do</strong> <strong>do</strong>sa<strong>do</strong>s, porém,<br />

<strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a boa ou má intenção <strong>do</strong> incorpora<strong>do</strong>r. Com base nesse entendimento, <strong>de</strong>u-se provimento aos embargos <strong>de</strong><br />

divergência para reconhecer a legalida<strong>de</strong> da cláusula contratual que previu a cobrança <strong>do</strong>s juros compensatórios <strong>de</strong> 1% a partir da<br />

assinatura <strong>do</strong> contrato” (STJ – EREsp 670.117-PB – Rel. originário Min. Sidnei Beneti – Rel. para acórdão Min. Antonio Carlos<br />

Ferreira – j. 13.06.2012).<br />

Trata-se <strong>de</strong> mais uma <strong>de</strong>cisão da Corte Superior à qual não se filia, por representar clara afronta ao dispositivo <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r em análise. A onerosida<strong>de</strong> excessiva da previsão contratual acima mencionada é clara e cristalina.<br />

Infelizmente, a questão se consoli<strong>do</strong>u <strong>de</strong> tal forma naquele Tribunal que, em 2015, publicou-se ementa por meio da ferramenta


Jurisprudência em Teses (Edição n. 39) preven<strong>do</strong> que “não é abusiva a cláusula <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> juros compensatórios inci<strong>de</strong>ntes em<br />

perío<strong>do</strong> anterior à entrega das chaves nos contratos <strong>de</strong> compromisso <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> imóveis em construção sob o regime <strong>de</strong><br />

incorporação imobiliária”.<br />

Por outra via e como outro exemplo, acertadamente, a Segunda Turma <strong>do</strong> STJ concluiu, em setembro <strong>de</strong> 2015, que é prática<br />

abusiva dar <strong>de</strong>sconto para pagamento em dinheiro ou cheque e cobrar preço diferencia<strong>do</strong> para pagamento com cartão <strong>de</strong> crédito,<br />

pelo mesmo produto ou serviço. De acor<strong>do</strong> com o relator da <strong>de</strong>cisão, Ministro Humberto Martins, o estabelecimento empresarial<br />

tem a garantia <strong>do</strong> pagamento efetua<strong>do</strong> pelo consumi<strong>do</strong>r com o cartão <strong>de</strong> crédito, pois a administra<strong>do</strong>ra assume inteiramente a<br />

responsabilida<strong>de</strong> pelos riscos da venda. Uma vez autorizada a transação, o consumi<strong>do</strong>r recebe quitação <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r e <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ter<br />

qualquer obrigação perante ele. Por tal razão, a compra com cartão é consi<strong>de</strong>rada modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pagamento à vista, constituin<strong>do</strong><br />

prática abusiva a cobrança <strong>de</strong> preço diferencia<strong>do</strong> (STJ, REsp 1.479.039/MG, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, j.<br />

06.10.2015, DJe 16.10.2015).<br />

Essa posição foi reafirmada pela Tribunal da Cidadania em outro aresto, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2016, segun<strong>do</strong> o qual “a diferenciação <strong>de</strong><br />

preço na merca<strong>do</strong>ria ou serviço para diferentes formas <strong>de</strong> pagamento à vista: dinheiro, cheque ou cartão <strong>de</strong> crédito caracteriza<br />

prática abusiva no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo, nociva ao equilíbrio contratual e ofen<strong>de</strong> o art. 39, V e X da Lei 8.078/90. Manutenção das<br />

autuações administrativas realizadas pelo PROCON Municipal <strong>de</strong> Vitória/ES em face da referida prática abusiva <strong>do</strong> comerciante<br />

Recorrente em seu estabelecimento. 3. Prece<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> outras Turmas <strong>de</strong>ste Tribunal Superior (REsp 1.479.039/MG, Rel. Min.<br />

Humberto Martins, DJe 16.10.2015 e REsp 1.133.410/RS, Rel. Min. Massami Uyeda, DJe 7.4.2010)” (STJ, REsp 1.610.813/ES,<br />

Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, j. 18.08.2016, DJe 26.08.2016).<br />

Entretanto, no final <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2016, o Governo Fe<strong>de</strong>ral editou a Medida Provisória n. 764, <strong>de</strong> 26 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro, que autoriza a<br />

cobrança <strong>de</strong> preços diferencia<strong>do</strong>s, a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r da forma <strong>de</strong> pagamento (dinheiro, cheque ou cartão). Conforme o seu art. 1º, “fica<br />

autorizada a diferenciação <strong>de</strong> preços <strong>de</strong> bens e serviços ofereci<strong>do</strong>s ao público, em função <strong>do</strong> prazo ou <strong>do</strong> instrumento <strong>de</strong> pagamento<br />

utiliza<strong>do</strong>. Parágrafo único. É nula a cláusula contratual, estabelecida no âmbito <strong>de</strong> arranjos <strong>de</strong> pagamento ou <strong>de</strong> outros acor<strong>do</strong>s para<br />

prestação <strong>de</strong> serviço <strong>de</strong> pagamento, que proíba ou restrinja a diferenciação <strong>de</strong> preços facultada no caput”.<br />

Na opinião <strong>de</strong>ste autor, a citada regra é ilegal, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> prosperar. De início, o seu conteú<strong>do</strong> não po<strong>de</strong>ria ser objeto <strong>de</strong><br />

medida provisória, mas apenas <strong>de</strong> lei, <strong>de</strong>vidamente <strong>de</strong>batida no Congresso Nacional.<br />

Em complemento, estamos totalmente alinha<strong>do</strong>s aos argumentos constantes <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s menciona<strong>do</strong>s, sen<strong>do</strong> a cobrança <strong>de</strong><br />

preços diferencia<strong>do</strong>s um <strong>do</strong>s exemplos atuais <strong>de</strong> aplicação <strong>do</strong> inciso V <strong>do</strong> art. 39 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, que elenca<br />

como prática abusiva a exigência <strong>de</strong> vantagem manifestamente excessiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Po<strong>de</strong>riam os comerciantes transferir os<br />

valores relativos às taxas <strong>de</strong> administração <strong>do</strong> cartão <strong>de</strong> crédito para os consumi<strong>do</strong>res? Pensamos que não, estan<strong>do</strong> aqui a vantagem<br />

manifestamente excessiva, a configurar a ilegalida<strong>de</strong> da Medida Provisória.<br />

Essa ilegalida<strong>de</strong>, em clara lesão aos direitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, torna também sem senti<strong>do</strong> jurídico o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> parágrafo único<br />

<strong>do</strong> art. 1º da MP que estabelece a nulida<strong>de</strong> absoluta da cláusula contratual que proíba ou restrinja a citada diferenciação <strong>de</strong> preços.<br />

Ora, cláusula abusiva haverá se existir previsão contratual <strong>de</strong>ssa diferenciação, o que tem enquadramento no art. 51 <strong>do</strong> CDC, na<br />

linha <strong>do</strong> que reconhece o primeiro aresto aponta<strong>do</strong>. Conforme <strong>de</strong>stacou o Ministro Humberto Martins em seu voto, “o art. 51 <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r traz rol meramente exemplificativo <strong>de</strong> cláusulas abusivas, num conceito aberto que permite o<br />

enquadramento <strong>de</strong> outras abusivida<strong>de</strong>s que atentem contra o equilíbrio entre as partes no contrato <strong>de</strong> consumo, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a preservar<br />

a boa-fé e a proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Como bem reconheceu o Tribunal <strong>de</strong> origem, o lojista que, para mesmo produto ou serviço,<br />

oferece <strong>de</strong>sconto ao consumi<strong>do</strong>r que paga em dinheiro ou cheque em <strong>de</strong>trimento daquele que paga em cartão <strong>de</strong> crédito estabelece<br />

cláusula abusiva apta a transferir os riscos da ativida<strong>de</strong> ao adquirente, lembran<strong>do</strong>-se que tal abusivida<strong>de</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da má-fé <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r” (STJ, REsp 1479039/MG, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, j. 06.10.2015, DJe 16.10.2015).<br />

Também é forte o argumento jurídico da existência <strong>de</strong> discriminação <strong>do</strong>s adquirentes, o que é veda<strong>do</strong> expressamente pela Lei<br />

12.529/2011. O seu art. 36 elenca atos que constituem infração da or<strong>de</strong>m econômica, geran<strong>do</strong> responsabilização in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente<br />

<strong>de</strong> culpa. Entre essas condutas, está previsto no § 3º, letra d, inciso X, <strong>do</strong> coman<strong>do</strong>: “discriminar adquirentes ou fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong><br />

bens ou serviços por meio da fixação diferenciada <strong>de</strong> preços, ou <strong>de</strong> condições operacionais <strong>de</strong> venda ou prestação <strong>de</strong> serviços”.<br />

Para que a analisada Medida Provisória tivesse aplicação no Brasil, seria necessário revogar este último diploma, o que não<br />

ocorreu. E não se olvi<strong>de</strong>, em complemento, <strong>de</strong> que a igualda<strong>de</strong> entre os consumi<strong>do</strong>res é um <strong>do</strong>s seus direitos básicos, expresso no<br />

inciso II <strong>do</strong> art. 6º <strong>do</strong> CDC, também atingi<strong>do</strong> pela malfadada MP 764.<br />

A<strong>de</strong>mais, será que, com a norma, os preços com pagamento em dinheiro vão diminuir ou os preços com pagamento via cartão<br />

<strong>de</strong> crédito irão aumentar? Acredito mais no segun<strong>do</strong> caminho, infelizmente, pela nossa realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>. Diante <strong>de</strong>sses<br />

argumentos, esperamos que o Congresso Nacional não converta a criticada Medida Provisória em lei.


7.2.6. Executar serviços sem a prévia elaboração <strong>de</strong> orçamento e autorização expressa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r,<br />

ressalvadas as <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> práticas anteriores entre as partes (art. 39, inc. VI, <strong>do</strong> CDC)<br />

A exigência <strong>de</strong> orçamento prévio para a prestação <strong>de</strong> um serviço é outro exemplo típico <strong>de</strong> aplicação da boa-fé objetiva à fase<br />

pré-contratual <strong>do</strong> negócio <strong>de</strong> consumo, por representar incidência <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver anexo <strong>de</strong> informação. A não ser nas hipóteses em que as<br />

partes já negociaram previamente sem a sua elaboração, o orçamento é obrigatório. No que tange a tal obrigatorieda<strong>de</strong>, vejamos o<br />

teor <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal Paulista em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> ação civil pública:<br />

“Ação civil pública. Prestação <strong>de</strong> serviços. Pedi<strong>do</strong> cominatório para compelir hospital a incluir cláusula contratual estipulan<strong>do</strong> a<br />

obrigação <strong>de</strong> apresentar orçamento prévio sobre os serviços contrata<strong>do</strong>s, bem como serviços presta<strong>do</strong>s apenas em momento<br />

superveniente. Inserção <strong>de</strong> outra cláusula contratual para que, nos casos <strong>de</strong> urgência e in<strong>de</strong>finição <strong>do</strong> tratamento, seja apresentada<br />

tabela <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong>s serviços disponíveis no nosocômio. <strong>Direito</strong> básico <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r à informação clara e a<strong>de</strong>quada sobre os<br />

serviços que lhe são presta<strong>do</strong>s, inclusive no que diz respeito ao preço. Art. 6º, III, <strong>do</strong> CDC. Dever <strong>de</strong> informação <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong><br />

princípio da boa-fé objetiva. Arts. 40, e 39, VI, <strong>do</strong> CDC. Dever <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res em geral <strong>de</strong> entrega <strong>de</strong> orçamento prévio <strong>do</strong>s<br />

serviços contrata<strong>do</strong>s. Recusa <strong>do</strong> hospital que configura prática abusiva. Prece<strong>de</strong>ntes jurispru<strong>de</strong>nciais que corroboram a sujeição <strong>do</strong>s<br />

hospitais ao <strong>de</strong>ver legal <strong>de</strong> apresentação <strong>de</strong> orçamento prévio. Confirmação da sentença <strong>de</strong> procedência da ação. Recurso<br />

<strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação 992.07.021649-4 – Acórdão 4768082, São Paulo – Trigésima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des.<br />

Edgard Rosa – j. 20.10.2010 – DJESP 06.12.2010).<br />

De acor<strong>do</strong> com o art. 40 da Lei 8.078/1990, o fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviço será obriga<strong>do</strong> a entregar ao consumi<strong>do</strong>r orçamento prévio<br />

discriminan<strong>do</strong> o valor da mão <strong>de</strong> obra, <strong>do</strong>s materiais e equipamentos a serem emprega<strong>do</strong>s, as condições <strong>de</strong> pagamento, bem como<br />

as datas <strong>de</strong> início e término <strong>do</strong>s serviços. Tal exigência ocorre mesmo em relação a concessionária que efetua reparos no veículo,<br />

“ainda que <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> garantia <strong>do</strong> bem e <strong>de</strong> forma graciosa, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> fornecer ao consumi<strong>do</strong>r, por escrito, orçamento e<br />

discriminação <strong>do</strong>s serviços” (TJSP – Apelação 992.05.102686-3 – Acórdão 4379504, Sorocaba – Vigésima Sexta Câmara <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Norival Oliva – j. 16.03.2010 – DJESP 13.04.2010). Além disso, a assinatura <strong>de</strong> “pré-or<strong>de</strong>m <strong>de</strong><br />

serviço” não autoriza o fornece<strong>do</strong>r a realizar os serviços sem a apresentação <strong>do</strong> orçamento e expressa autorização <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r<br />

(TJMG – Apelação Cível 1.0027.06.100307-8/0011, Betim – Décima Câmara Cível – Rel. Des. Cabral da Silva – j. 19.02.2008 –<br />

DJEMG 15.03.2008).<br />

Como se observa, as informações constantes <strong>do</strong> orçamento <strong>de</strong>vem ser completas, vinculan<strong>do</strong> a parte <strong>de</strong>clarante, nos termos <strong>do</strong>s<br />

já analisa<strong>do</strong>s arts. 30, 31 e 48 <strong>do</strong> CDC. Ato contínuo, como preceitua o § 2º <strong>do</strong> art. 40 da Lei Consumerista, uma vez aprova<strong>do</strong> pelo<br />

consumi<strong>do</strong>r, o orçamento obriga os contratantes e somente po<strong>de</strong> ser altera<strong>do</strong> mediante livre negociação das partes. Caso a parte se<br />

negue a cumprir o que foi orça<strong>do</strong>, cabem as medidas <strong>de</strong> tutela específica, caso da fixação <strong>de</strong> multa ou astreintes (art. 84 <strong>do</strong> CDC).<br />

Eventualmente, como bem conclui a jurisprudência, se os serviços forem presta<strong>do</strong>s sem o orçamento prévio, reputa-se que não<br />

possam ser cobra<strong>do</strong>s, sen<strong>do</strong> trata<strong>do</strong>s como amostras grátis. Aplica-se, por analogia, a regra <strong>do</strong> art. 39, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC,<br />

inicialmente prevista para o inciso III <strong>do</strong> preceito. Nessa linha, vejamos <strong>do</strong>is acórdãos:<br />

“Serviços <strong>de</strong> mecânica. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Arts. 6º, VI, e 39, VI. Prece<strong>de</strong>ntes. 1. A inversão <strong>do</strong> ônus da prova, como<br />

já <strong>de</strong>cidiu a Terceira Turma, está no contexto da facilitação da <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, fican<strong>do</strong> subordinada ao ‘critério <strong>do</strong><br />

juiz, quan<strong>do</strong> for verossímil a alegação ou quan<strong>do</strong> for ele hipossuficiente, segun<strong>do</strong> as regras ordinárias <strong>de</strong> experiências’ (art. 6º, VIII).<br />

Isso quer dizer que não é automática a inversão <strong>do</strong> ônus da prova. Ela <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> circunstâncias concretas que serão apuradas pelo<br />

juiz no contexto da ‘facilitação da <strong>de</strong>fesa’ <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r” (REsp 122.505-SP, da minha relatoria, DJ 24.08.1998). 2. O<br />

art. 39, VI, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>termina que o serviço somente po<strong>de</strong> ser realiza<strong>do</strong> com a expressa autorização <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r. Em consequência, não <strong>de</strong>monstrada a existência <strong>de</strong> tal autorização, é imprestável a cobrança, <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>, apenas, o valor<br />

autoriza<strong>do</strong> expressamente pelo consumi<strong>do</strong>r. 3. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>, em parte” (STJ – REsp 332869/RJ – Terceira<br />

Turma – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes <strong>Direito</strong> – j. 24.06.2002 – DJ 02.09.2002, p. 184).<br />

“Embargos à execução. Nota promissória. Prestação <strong>de</strong> serviços. Ausência <strong>de</strong> orçamento prévio e <strong>de</strong> autorização expressa <strong>do</strong>s<br />

reparos pelo consumi<strong>do</strong>r. Ofensa aos arts. 39, VI, e 40 da Lei 8.078/1990. inexigibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> título. A Lei 8.078/1990 estabelece que<br />

é veda<strong>do</strong> ao fornece<strong>do</strong>r executar serviços sem a prévia elaboração <strong>de</strong> orçamento e autorização expressa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser<br />

discrimina<strong>do</strong> o valor da mão <strong>de</strong> obra, <strong>do</strong>s materiais e equipamentos a serem emprega<strong>do</strong>s, as condições <strong>de</strong> pagamento, bem como as<br />

datas <strong>de</strong> início e término <strong>do</strong>s serviços. É inexigível o valor <strong>do</strong>s reparos efetua<strong>do</strong>s sem a observância <strong>do</strong> disposto nos arts. 39, VI, e<br />

40, ambos <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r” (TJMG – Apelação Cível 2000945-20.2009.8.13.0027, Beti – Décima Segunda<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Alvimar <strong>de</strong> Ávila – j. 23.02.2011 – DJEMG 21.03.2011).<br />

Em regra, salvo estipulação em contrário, o valor orça<strong>do</strong> tem valida<strong>de</strong> pelo prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> <strong>de</strong>z dias, conta<strong>do</strong> <strong>de</strong> seu<br />

recebimento pelo consumi<strong>do</strong>r (art. 40, § 1º, <strong>do</strong> CDC). Como a norma é <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública (art. 1º <strong>do</strong> CDC), compreen<strong>de</strong>-se que tal<br />

prazo somente po<strong>de</strong> ser aumenta<strong>do</strong> e nunca diminuí<strong>do</strong>. Não se po<strong>de</strong> esquecer que o prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial po<strong>de</strong> ser aumenta<strong>do</strong>, diante<br />

da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua origem convencional.


Por fim, estabelece a Lei 8.078/1990 o que consumi<strong>do</strong>r não respon<strong>de</strong> por quaisquer ônus ou acréscimos <strong>de</strong>correntes da<br />

contratação <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> terceiros não previstos no orçamento prévio, o que cabe ao presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços (art. 40, § 3º, <strong>do</strong> CDC).<br />

Desse mo<strong>do</strong>, cabe a prestação <strong>de</strong> serviços por terceiros à custa <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r originário que se comprometeu. Para as <strong>de</strong>vidas medidas<br />

judiciais, têm incidência os arts. 816 e 817 <strong>do</strong> CPC/2015 (equivalentes aos arts. 633 e 634 <strong>do</strong> CPC/1973). Pela via extrajudicial,<br />

po<strong>de</strong> ser o caso <strong>de</strong> subsunção <strong>do</strong> art. 249, parágrafo único, <strong>do</strong> CC/2002, in verbis: “Em caso <strong>de</strong> urgência, po<strong>de</strong> o cre<strong>do</strong>r,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> autorização judicial, executar ou mandar executar o fato, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>pois ressarci<strong>do</strong>”.<br />

7.2.7.<br />

Repassar informação <strong>de</strong>preciativa referente a ato pratica<strong>do</strong> pelo consumi<strong>do</strong>r no exercício <strong>de</strong><br />

seus direitos (art. 39, inc. VII, <strong>do</strong> CDC)<br />

O coman<strong>do</strong> veda as chamadas listas internas <strong>de</strong> maus consumi<strong>do</strong>res ou listas negras, em relação a consumi<strong>do</strong>res que buscam<br />

exercer os direitos que a lei lhes faculta. O dispositivo não se confun<strong>de</strong> com o art. 43 <strong>do</strong> CDC, que trata <strong>de</strong> bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e<br />

cadastros <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res, categorias que ainda serão vistas no próximo capítulo <strong>de</strong>ste livro.15 A respeito <strong>de</strong>ssa diferenciação,<br />

aliás, enten<strong>de</strong>u o Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> São Paulo: “Ação civil pública. Supressão <strong>do</strong> cadastro <strong>de</strong> passagens da Associação<br />

Comercial <strong>de</strong> São Paulo. Banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s em que são registra<strong>do</strong>s negócios realiza<strong>do</strong>s pelos consumi<strong>do</strong>res, sem comunicação da<br />

inclusão <strong>do</strong>s nomes <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. Manutenção <strong>do</strong> cadastro é útil à socieda<strong>de</strong>. Informações trazem mais segurança nas<br />

operações <strong>de</strong> crédito, com a diminuição da inadimplência e a redução da taxa <strong>de</strong> juros, o que beneficia os consumi<strong>do</strong>res em geral.<br />

Não se vislumbra ilicitu<strong>de</strong>, nem prática abusiva, por não haver repasse <strong>de</strong> informações <strong>de</strong>preciativas em relação ao consumi<strong>do</strong>r.<br />

Sentença mantida. Recurso improvi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação com Revisão 384.649.4/8 – Acórdão 4020149, São Paulo – Primeira<br />

Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Paulo Razuk – j. 11.08.2009 – DJESP 07.10.2009).<br />

O que se veda, a título <strong>de</strong> ilustração, é que empresas que exploram <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s setores troquem nomes <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res que<br />

ingressam em juízo para tutela <strong>de</strong> seus direitos, com o fim <strong>de</strong> dificultar novas aquisições <strong>de</strong> bens <strong>de</strong> consumo (consumi<strong>do</strong>res<br />

in<strong>de</strong>sejáveis). Não se admite, por razões óbvias, a mesma conduta <strong>de</strong> informação negativa em relação aos advoga<strong>do</strong>s <strong>de</strong>sses<br />

consumi<strong>do</strong>res, que agem em exercício regular das próprias funções. Deve ficar claro que tal prática existe entre gran<strong>de</strong>s empresas,<br />

conforme tem revela<strong>do</strong> a imprensa nacional televisiva.<br />

Eventualmente, os consumi<strong>do</strong>res e procura<strong>do</strong>res prejudica<strong>do</strong>s po<strong>de</strong>rão fazer uso da responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r para responsabilizar os fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res pela prática abusiva. E isso sem prejuízo <strong>de</strong> outras<br />

sanções a que possam estar sujeitos os agentes que atuam em abuso <strong>de</strong> direito, caso das penalida<strong>de</strong>s administrativas.<br />

7.2.8.<br />

Colocar, no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo, qualquer produto ou serviço em <strong>de</strong>sacor<strong>do</strong> com as normas<br />

expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela<br />

Associação Brasileira <strong>de</strong> Normas Técnicas (ABNT) ou outra entida<strong>de</strong> cre<strong>de</strong>nciada pelo<br />

Conselho Nacional <strong>de</strong> Metrologia, Normalização e Qualida<strong>de</strong> Industrial – CONMETRO (art. 39,<br />

inc. VIII, <strong>do</strong> CDC)<br />

Como se retira da obra <strong>de</strong> Rizzatto Nunes, quatro são os tipos <strong>de</strong> normas técnicas existentes no Brasil:<br />

–<br />

–<br />

–<br />

–<br />

NBR 1: normas compulsórias aprovadas pelo CONMETRO, com uso obrigatório em to<strong>do</strong> o País.<br />

NBR 2: normas <strong>de</strong> referência aprovadas pelo CONMETRO, <strong>de</strong> uso obrigatório pelo Po<strong>de</strong>r Público.<br />

NBR 3: normas registradas com caráter voluntário, com registro pelo INMETRO (Instituto Nacional <strong>de</strong> Metrologia,<br />

Normatização e Qualida<strong>de</strong> Industrial).<br />

NBR 4: normas probatórias, registra<strong>do</strong>s no INMETRO, ainda em fase <strong>de</strong> experimentos, com vigência limitada.16<br />

Na verda<strong>de</strong>, o dispositivo <strong>do</strong> CDC visa a uma padronização <strong>de</strong> condutas, para que os consumi<strong>do</strong>res não sejam expostos a<br />

situações <strong>de</strong> risco ou perigo pelos produtos postos em circulação no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo. Presente a prática abusiva, caberão as<br />

sanções administrativas <strong>do</strong> art. 56 da Lei 8.078/1990, com a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> apreensão <strong>de</strong> produtos, sem prejuízo da<br />

responsabilização civil correspon<strong>de</strong>nte.<br />

7.2.9.<br />

Recusar a venda <strong>de</strong> bens ou a prestação <strong>de</strong> serviços, diretamente a quem se disponha a adquirilos<br />

mediante pronto pagamento, ressalva<strong>do</strong>s os casos <strong>de</strong> intermediação regula<strong>do</strong>s em leis<br />

especiais (art. 39, inc. IX, <strong>do</strong> CDC)<br />

O preceito foi introduzi<strong>do</strong> pela Lei 8.884/1994, ten<strong>do</strong> um senti<strong>do</strong> mais amplo <strong>do</strong> que o inciso II, pois dirigida a qualquer<br />

situação <strong>de</strong> alienação <strong>de</strong> bens, sen<strong>do</strong> proibida a negação <strong>de</strong> venda a quem <strong>de</strong> imediato se apresenta à celebração <strong>do</strong> negócio.17 A


título <strong>de</strong> exemplo <strong>de</strong> subsunção <strong>do</strong> preceito, julga<strong>do</strong> publica<strong>do</strong> no Informativo n. 507 <strong>do</strong> STJ concluiu que “a negativa pura e<br />

simples <strong>de</strong> contratar seguro <strong>de</strong> vida é ilícita, violan<strong>do</strong> a regra <strong>do</strong> art. 39, IX, <strong>do</strong> CDC. Diversas opções po<strong>de</strong>riam substituir a simples<br />

negativa <strong>de</strong> contratar, como a formulação <strong>de</strong> prêmio mais alto ou, ainda, a redução <strong>de</strong> cobertura securitária, excluin<strong>do</strong>-se os<br />

sinistros relaciona<strong>do</strong>s à <strong>do</strong>ença preexistente, mas não po<strong>de</strong>ria negar ao consumi<strong>do</strong>r a prestação <strong>de</strong> serviços. As normas expedidas<br />

pela Susep para regulação <strong>de</strong> seguros <strong>de</strong>vem ser interpretadas em consonância com o menciona<strong>do</strong> dispositivo. Ainda que o ramo<br />

securitário consubstancie ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alta complexida<strong>de</strong> técnica, regulada por órgão específico, a contratação <strong>de</strong> seguros está<br />

inserida no âmbito das relações <strong>de</strong> consumo, portanto tem necessariamente <strong>de</strong> respeitar as disposições <strong>do</strong> CDC. A recusa da<br />

contratação é possível, como previsto na Circular Susep n. 251/2004, mas apenas em hipóteses realmente excepcionais” (STJ –<br />

REsp 1.300.116/SP – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 23.10.2012).<br />

Apesar da literalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> coman<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ve-se excetuar as hipóteses em que o bom senso não recomenda a venda <strong>do</strong> bem <strong>de</strong><br />

consumo. A título <strong>de</strong> exemplo, cite-se o caso <strong>do</strong> frequenta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> um bar que tem o costume <strong>de</strong> exagerar na bebida e <strong>de</strong>pois causar<br />

danos no estabelecimento. Em outras palavras, a razoabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve guiar o intérprete da norma.<br />

7.2.10. Elevar sem justa causa o preço <strong>de</strong> produtos ou serviços (art. 39, inc. X, <strong>do</strong> CDC)<br />

Trata-se <strong>de</strong> mais um dispositivo incluí<strong>do</strong> pela Lei 8.884/1994, manten<strong>do</strong> relação direta com o art. 51, inc. X, <strong>do</strong> próprio Código<br />

Consumerista, que consi<strong>de</strong>ra abusiva a cláusula <strong>de</strong> variação unilateral <strong>de</strong> preço. A expressão justa causa <strong>de</strong>ve ser interpretada <strong>de</strong><br />

acor<strong>do</strong> com a realida<strong>de</strong> social <strong>de</strong> ampla tutela <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res e, em casos <strong>de</strong> dúvidas, <strong>de</strong>ve prevalecer a sua proteção.<br />

A prática <strong>de</strong> alteração <strong>do</strong> preço sem motivo representa afronta à boa-fé objetiva e às justas expectativas <strong>de</strong>positadas no negócio<br />

<strong>de</strong> consumo. Como é notório, não se po<strong>de</strong> aceitar atos pratica<strong>do</strong>s pelos fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res com o intuito <strong>de</strong> surpreen<strong>de</strong>r os<br />

consumi<strong>do</strong>res em relação ao originalmente contrata<strong>do</strong>, situação típica <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito não tolera<strong>do</strong> pelo sistema consumerista.<br />

Com interessante interpretação <strong>do</strong> preceito, o Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro julgou que “Não po<strong>de</strong> a CEDAE<br />

multiplicar o consumo mínimo pela quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s imobiliárias existentes no prédio. Esse mínimo <strong>do</strong> consumo <strong>de</strong>ve ser<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> em relação a cada hidrômetro. Interpretar a norma <strong>de</strong> outra forma equivale a transformar o consumo medi<strong>do</strong> em<br />

consumo estima<strong>do</strong>, lesan<strong>do</strong> os direitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 3. Tarifa progressiva. Ilegalida<strong>de</strong>. Sem justa causa, não se permite ao<br />

fornece<strong>do</strong>r aumentar o preço (art. 39, inc. X, CDC)” (TJRJ – Apelação Cível 24349/2001, Rio <strong>de</strong> Janeiro – Décima Oitava Câmara<br />

Cível – Rel. Des. Nascimento Povoas Vaz – j. 25.04.2002).<br />

7.2.11.<br />

Aplicar fórmula ou índice <strong>de</strong> reajuste diverso <strong>do</strong> legal ou contratualmente estabeleci<strong>do</strong> (art. 39,<br />

inc. XIII, <strong>do</strong> CDC)<br />

Como bem leciona Herman Benjamin, “É comum no merca<strong>do</strong> a modificação unilateral <strong>do</strong>s índices ou fórmulas <strong>de</strong> reajuste nos<br />

negócios entre consumi<strong>do</strong>res e fornece<strong>do</strong>res (contratos imobiliários, <strong>de</strong> educação, <strong>de</strong> planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, por exemplo). O dispositivo<br />

veda tal comportamento, crian<strong>do</strong> um ilícito <strong>de</strong> consumo, que po<strong>de</strong> ser ataca<strong>do</strong> civil ou administrativamente”.18 Mais uma vez, não<br />

se admite a mudança das regras <strong>do</strong> jogo por parte <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res.<br />

Em outras palavras, a prática abusiva existe, pois não se po<strong>de</strong> admitir contrarieda<strong>de</strong> ao que foi firma<strong>do</strong> com os consumi<strong>do</strong>res<br />

ou à matéria regulada por norma <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública. Desse mo<strong>do</strong>, a lei está amparada na máxima que veda o comportamento<br />

contraditório, relativa à boa-fé objetiva, abordada no Capítulo 5 <strong>de</strong>ste estu<strong>do</strong> (venire contra factum proprium non potest). Apesar da<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se argumentar pela força obrigatória da convenção (pacta sunt servanda), o fundamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>srespeito ao prima<strong>do</strong><br />

relativo à boa-fé objetiva parece mais condizente com o sistema a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pela Lei 8.078/1990 e com os tempos contemporâneos.<br />

7.2.12.<br />

Deixar <strong>de</strong> estipular prazo para o cumprimento <strong>de</strong> sua obrigação ou <strong>de</strong>ixar a fixação <strong>de</strong> seu<br />

termo inicial a seu exclusivo critério (art. 39, inc. XII, <strong>do</strong> CDC)<br />

A inclusão da previsão se <strong>de</strong>u pela Lei 9.008/1995, pois o dispositivo havia si<strong>do</strong> revoga<strong>do</strong> pela Lei 8.884/1994. Veda-se a<br />

prática puramente potestativa, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte apenas <strong>do</strong> bel-prazer <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r. Diante da lealda<strong>de</strong> que se espera das<br />

relações negociais, os fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong>vem fixar prazo e termo para o adimplemento <strong>do</strong> afirma<strong>do</strong>, sob pena <strong>de</strong> total<br />

instabilida<strong>de</strong> das relações <strong>de</strong> consumo e <strong>de</strong>scrédito <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o sistema consumerista. A título <strong>de</strong> exemplo, o presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve fixar um<br />

prazo razoável para que o serviço seja presta<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r, em vista <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r aos seus anseios no caso concreto. Em outras<br />

palavras, a não fixação <strong>de</strong> prazo afasta-se da tutela da confiança preconizada pela Lei Consumerista.<br />

7.3.<br />

A NECESSIDADE DE RESPEITO AO TABELAMENTO OFICIAL, SOB PENA DE<br />

CARACTERIZAÇÃO DO ABUSO DE DIREITO (ART. 41 DO CDC)


O art. 41 da Lei 8.078/1990 regula o tabelamento oficial, prática utilizada pelo Esta<strong>do</strong> no Brasil nos anos próximos à entrada<br />

em vigor da Lei Consumerista, diante das altas taxas <strong>de</strong> inflação existentes no País. Deve ficar claro que tal prática não é a regra no<br />

momento, pois vige a fixação <strong>de</strong> preços pela prática merca<strong>do</strong>lógica. O tabelamento representa hipótese <strong>de</strong> dirigismo contratual, <strong>de</strong><br />

clara intervenção estatal nas relações negociais privadas. Consigne-se, na esteira da melhor jurisprudência, que o tabelamento<br />

oficial não fere o direito à livre iniciativa, consagra<strong>do</strong> pelo art. 170 <strong>do</strong> Texto Maior:<br />

“Ação anulatória. Estabelecimento autua<strong>do</strong> por infração aos arts. 31 e 41 <strong>do</strong> CDC. Pretensão <strong>de</strong> anulação <strong>do</strong> auto <strong>de</strong> infração e da<br />

multa <strong>de</strong>le <strong>de</strong>corrente. Existência <strong>de</strong> regime <strong>de</strong> controle ou <strong>de</strong> tabelamento <strong>de</strong> preços, que não fere o princípio da livre iniciativa<br />

previsto no art. 170 da CF. Princípio constitucional que não po<strong>de</strong> afastar regras <strong>de</strong> regulamentação <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> e <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r. Não essencialida<strong>de</strong> <strong>do</strong> produto que não afasta a intervenção estatal. Recurso provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação Cível<br />

527.256.5/9 – Acórdão 3942962, São Paulo – Décima Primeira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Público – Rel. Des. Oscild <strong>de</strong> Lima Júnior – j.<br />

22.06.2009 – DJESP 07.08.2009).<br />

De acor<strong>do</strong> com a norma em estu<strong>do</strong>, no caso <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> produtos ou <strong>de</strong> serviços sujeitos ao regime <strong>de</strong> controle ou <strong>de</strong><br />

tabelamento <strong>de</strong> preços, os fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong>verão respeitar os limites oficiais. Isso, sob pena <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>rem pela restituição da<br />

quantia recebida em excesso, monetariamente atualizada, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r exigir, à sua escolha, o <strong>de</strong>sfazimento <strong>do</strong> negócio,<br />

sem prejuízo <strong>de</strong> outras sanções cabíveis. Além disso, cabe o cumprimento força<strong>do</strong> <strong>do</strong> tabelamento oficial, por meio da tutela<br />

específica das obrigações <strong>de</strong> fazer e não fazer (art. 84 <strong>do</strong> CDC). Como se nota, o <strong>de</strong>srespeito ao tabelamento é trata<strong>do</strong> como<br />

hipótese <strong>de</strong> abuso <strong>de</strong> direito, ou seja, <strong>de</strong> ilícito consumerista pelo exercício irregular <strong>de</strong> um direito.<br />

Por <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iro, mais uma vez buscan<strong>do</strong> um diálogo com o Código Civil, consigne-se que a fixação <strong>do</strong> preço tabela<strong>do</strong> na<br />

compra e venda consta <strong>do</strong> art. 488 da codificação privada, in verbis: “Convencionada a venda sem fixação <strong>do</strong> preço ou <strong>de</strong> critérios<br />

para a sua <strong>de</strong>terminação, se não houver tabelamento oficial, enten<strong>de</strong>-se que as partes se sujeitaram ao preço corrente nas vendas<br />

habituais <strong>do</strong> ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r. Parágrafo único. Na falta <strong>de</strong> acor<strong>do</strong>, por ter havi<strong>do</strong> diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> preço, prevalecerá o termo médio”.<br />

Interpretan<strong>do</strong> corretamente a norma geral civil, leciona Paulo Luiz Netto Lôbo que “não há compra e venda sem preço, pois o<br />

coman<strong>do</strong> legal em questão menciona que, se não houver preço inicialmente fixa<strong>do</strong>, <strong>de</strong>verá ser aplica<strong>do</strong> o preço previsto em<br />

tabelamento oficial; ou, ausente este, o preço <strong>de</strong> costume a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pelo ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r. A<strong>de</strong>mais, na falta <strong>de</strong> acor<strong>do</strong>, <strong>de</strong>verá ser a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> o<br />

termo médio, a ser fixa<strong>do</strong> pelo juiz”.19 Em complemento, na linha <strong>do</strong> <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>r cita<strong>do</strong>, o preço <strong>de</strong> tabelamento envolve matéria<br />

<strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser sobreposto por outro preço fixa<strong>do</strong> pela autonomia privada, por aplicação <strong>do</strong> princípio da função<br />

social <strong>do</strong>s contratos (art. 421 <strong>do</strong> CC/2002), que, na sua eficácia interna, limita a liberda<strong>de</strong> das partes. 20<br />

7.4.<br />

O ABUSO DE DIREITO NA COBRANÇA DE DÍVIDAS (ART. 42, CAPUT, DO CDC). O<br />

PROBLEMA DO CORTE DE SERVIÇO ESSENCIAL. A NECESSIDADE DE<br />

PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES NA COBRANÇA (ART. 42-A DO CDC)<br />

O art. 42, caput, da Lei 8.078/1990, que trata <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito na cobrança <strong>de</strong> dívidas, tem gran<strong>de</strong> aplicação na prática<br />

consumerista. É a sua redação: “Na cobrança <strong>de</strong> débitos, o consumi<strong>do</strong>r inadimplente não será exposto a ridículo, nem será<br />

submeti<strong>do</strong> a qualquer tipo <strong>de</strong> constrangimento ou ameaça”. Fica clara a opção pela configuração <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito, ilícito<br />

equipara<strong>do</strong>, uma vez que a cobrança <strong>de</strong> dívidas, em regra, constitui um exercício regular <strong>de</strong> direito que afasta o ilícito civil (art.<br />

188, inc. II, <strong>do</strong> CC/2002). No âmbito penal, todavia, a solução é pela caracterização <strong>do</strong> ilícito puro, pelo que consta <strong>do</strong> art. 71 <strong>do</strong><br />

próprio CDC (“Utilizar, na cobrança <strong>de</strong> dívidas, <strong>de</strong> ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas<br />

ou enganosas ou <strong>de</strong> qualquer outro procedimento que exponha o consumi<strong>do</strong>r, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu<br />

trabalho, <strong>de</strong>scanso ou lazer: Pena – Detenção <strong>de</strong> três meses a um ano e multa”).<br />

Pelo texto, veda-se, <strong>de</strong> início, a exposição <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r ao ridículo na cobrança <strong>de</strong> dívidas, o que <strong>de</strong>ve ser analisa<strong>do</strong> caso a<br />

caso, ten<strong>do</strong> como parâmetro as máximas <strong>de</strong> experiências e os padrões <strong>de</strong> conduta perante a socieda<strong>de</strong>. Da jurisprudência superior,<br />

vejamos ementa <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, que <strong>de</strong>duziu pela cobrança vexatória em caso <strong>de</strong> cárcere priva<strong>do</strong> em loja, por<br />

suposto furto <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>ria, o que gerou o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar:<br />

“Civil e processual civil. Dano moral. Lojas <strong>de</strong> <strong>de</strong>partamentos. Constrangimento ilegal e cárcere priva<strong>do</strong>. In<strong>de</strong>nização. Quantum.<br />

Razoabilida<strong>de</strong>. Negativa <strong>de</strong> prestação jurisdicional. Ausência. Interesse recursal. Alteração <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>. Inocorrência. Recurso<br />

<strong>de</strong>sacolhi<strong>do</strong>. I. Inconcebível que empresas comerciais, na proteção aos seus interesses comerciais, violentem a or<strong>de</strong>m jurídica,<br />

inclusive encarceran<strong>do</strong> pessoas em suas <strong>de</strong>pendências sob a suspeita <strong>de</strong> furto <strong>de</strong> suas merca<strong>do</strong>rias. II. Diante <strong>do</strong>s fatos assenta<strong>do</strong>s<br />

pelas instâncias ordinárias, razoável a in<strong>de</strong>nização arbitrada pelo Tribunal <strong>de</strong> origem, levan<strong>do</strong>-se em consi<strong>de</strong>ração não só a<br />

<strong>de</strong>sproporcionalida<strong>de</strong> das agressões pelos seguranças como também a circunstância relevante <strong>de</strong> que as lojas <strong>de</strong> <strong>de</strong>partamentos são<br />

locais frequenta<strong>do</strong>s diariamente por milhares <strong>de</strong> pessoas e famílias. III. A in<strong>de</strong>nização por danos morais <strong>de</strong>ve ser fixada em termos<br />

razoáveis, não se justifican<strong>do</strong> que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento sem causa, com manifestos abusos e


exageros, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o arbitramento operar-se com mo<strong>de</strong>ração, proporcionalmente ao grau <strong>de</strong> culpa e ao porte econômico das partes,<br />

orientan<strong>do</strong>-se o juiz pelos critérios sugeri<strong>do</strong>s pela <strong>do</strong>utrina e pela jurisprudência, com razoabilida<strong>de</strong>, valen<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> sua experiência e<br />

<strong>do</strong> bom senso, atento à realida<strong>de</strong> da vida e às peculiarida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cada caso. A<strong>de</strong>mais, <strong>de</strong>ve ela contribuir para <strong>de</strong>sestimular o ofensor a<br />

repetir o ato, inibin<strong>do</strong> sua conduta antijurídica. IV. Em face <strong>do</strong>s manifestos e frequentes abusos na fixação <strong>do</strong> quantum in<strong>de</strong>nizatório,<br />

no campo da responsabilida<strong>de</strong> civil, com maior ênfase em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> danos morais, lícito é ao Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça<br />

exercer o respectivo controle. V. Não carece <strong>de</strong> interesse recursal a parte que, em ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais, <strong>de</strong>ixa a<br />

fixação <strong>do</strong> quantum ao pru<strong>de</strong>nte arbítrio <strong>do</strong> juiz, e posteriormente apresenta apelação discordan<strong>do</strong> <strong>do</strong> valor arbitra<strong>do</strong>. Nem há<br />

alteração <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> a parte, apenas em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> apelação, apresenta valor que, a seu ver, se mostra mais justo. VI. Inocorre<br />

negativa <strong>de</strong> prestação jurisdicional quan<strong>do</strong> os temas coloca<strong>do</strong>s pela parte são suficientemente analisa<strong>do</strong>s pela instância <strong>de</strong> origem”<br />

(STJ – REsp 265133/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. Sálvio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong> Teixeira – j. 19.09.2000 – DJ 23.10.2000, p. 145).<br />

Em situação próxima, constitui cobrança vexatória a prática <strong>de</strong> casas noturnas <strong>de</strong> impedir a saída <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r enquanto não<br />

for paga a dívida <strong>de</strong> consumação. Como bem ilustra<strong>do</strong> por João Paulo Rodrigues <strong>de</strong> Castro, “muitas boates utilizam artifícios<br />

criminosos para cobrar os clientes <strong>de</strong> seus estabelecimentos. O mais comum é simplesmente impedirem a saída <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r. Mas há<br />

atitu<strong>de</strong>s mais drásticas. Muitas boates, quan<strong>do</strong> informadas da impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pagamento, levam os inadimplentes para um<br />

cômo<strong>do</strong> reserva<strong>do</strong> no próprio local. Lá dão coronhadas e choques elétricos para forçar o cumprimento da obrigação. Caso não<br />

consigam receber o dinheiro <strong>de</strong>sse mo<strong>do</strong>, pegam <strong>do</strong>cumentos ou até mesmo bem em garantia da dívida. Em Belo Horizonte, um<br />

cliente foi obriga<strong>do</strong> a empenhar as próprias roupas, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> o estabelecimento apenas <strong>de</strong> cueca”.21 Obviamente, tais práticas<br />

abusivas ensejam a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reparação imaterial a favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> a in<strong>de</strong>nização ser fixada em parâmetros<br />

pedagógicos, para que as condutas antissociais não se repitam.<br />

Partin<strong>do</strong>-se para outros casos concretos, já se enten<strong>de</strong>u que a entrega <strong>de</strong> correspondência <strong>de</strong> cobrança aberta em portaria <strong>de</strong><br />

prédio constitui cobrança vexatória, a justificar in<strong>de</strong>nização por danos morais (TJSP – Apelação 1122435-0 – Acórdão 4136016,<br />

Bauru – Décima Quinta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Milton Paulo <strong>de</strong> Carvalho Filho – j. 20.10.2009 – DJESP<br />

03.11.2009). Com conteú<strong>do</strong> interessante, concluiu o Tribunal Gaúcho: “Não funcionamento <strong>do</strong> sistema <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> débito.<br />

Negativa, por parte <strong>do</strong> estabelecimento, <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar o consumi<strong>do</strong>r sair, acionan<strong>do</strong> a brigada militar. Ofensa ao art. 42 <strong>do</strong> CDC, que<br />

veda a exposição ao ridículo e o constrangimento ou ameaça. Dano moral caracteriza<strong>do</strong>” (TJRS – Recurso Cível 71001634062,<br />

Viamão – Segunda Turma Recursal Cível – Rel. Des. Vivian Cristina Angonese Spengler – j. 24.09.2008 – DOERS 30.09.2008, p.<br />

64).<br />

Por outra via, em algumas situações afasta-se o abuso na cobrança, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-se pela presença <strong>de</strong> exercício regular <strong>de</strong><br />

direitos por parte <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r. De início, vejamos <strong>de</strong>cisão a respeito <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> dívida realizada no ambiente <strong>de</strong> trabalho <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Cobrança <strong>de</strong> dívida no local <strong>de</strong> trabalho <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r. Ausência <strong>de</strong> abusivida<strong>de</strong> na conduta <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r. Danos<br />

morais não caracteriza<strong>do</strong>s. A simples presença <strong>de</strong> um representante da empresa cre<strong>do</strong>ra no local <strong>de</strong> trabalho <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r não<br />

caracteriza exposição ao ridículo, constrangimento ou ameaça, nos termos <strong>do</strong> art. 42 <strong>do</strong> CDC. Apelo improvi<strong>do</strong>” (TJRS – Apelação<br />

Cível 70022807408, Pelotas – Décima Câmara Cível – Rel. Des. Paulo Antônio Kretzmann – j. 24.07.2008 – DOERS 18.08.2008, p.<br />

42).<br />

Como se po<strong>de</strong> notar, há certa divergência entre o primeiro julga<strong>do</strong> cita<strong>do</strong>, <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> São Paulo, e o último. Seguin<strong>do</strong> a<br />

linha da ausência <strong>de</strong> cobrança vexatória, no que concerne a ligações telefônicas e envio <strong>de</strong> cartas <strong>de</strong> cobrança sigilosas, <strong>do</strong> mesmo<br />

Tribunal Rio Gran<strong>de</strong>nse:<br />

“Consumi<strong>do</strong>r. Alega<strong>do</strong> abuso no exercício <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> cobrança. Ligações telefônicas. Carta <strong>de</strong> cobrança. Débito supostamente<br />

pago. Procedimento <strong>de</strong> cobrança que não expõe ao ridículo, ou constrange, ou ameaça o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r. Art. 42 <strong>do</strong> CDC. Ilícito não<br />

reconheci<strong>do</strong>. Para se colorir a figura <strong>do</strong> constrangimento, exposição ao ridículo, ou mesmo da ameaça ao consumi<strong>do</strong>r, a que alu<strong>de</strong> o<br />

art. 42 <strong>do</strong> CDC, não basta a cobrança insistente <strong>do</strong> débito ou o aviso <strong>de</strong> que serão tomadas providências legais – ajuizamento <strong>de</strong><br />

ação, protesto <strong>de</strong> título, cadastramento negativo –, já que são medidas que <strong>de</strong>notam o exercício <strong>do</strong>s direitos previstos no<br />

or<strong>de</strong>namento jurídico. O ilícito só se colore se há ameaça da prática <strong>de</strong> ato em <strong>de</strong>sconformida<strong>de</strong> com o direito. Ainda que diversas<br />

tenham si<strong>do</strong> as ligações efetuadas ao apelante, a fim <strong>de</strong> realizar a cobrança <strong>de</strong> débitos, tais ligações foram efetuadas porque, <strong>de</strong> fato,<br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r era. Até aí, tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> débitos em atraso, age o réu no exercício regular <strong>de</strong> seu direito <strong>de</strong> cobrança. Envio <strong>de</strong> carta<br />

sigilosa <strong>de</strong> cobrança à residência <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r. Ausência <strong>de</strong> exposição ao ridículo, ou interferência no trabalho ou no lazer <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r. Resta patente a ausência <strong>de</strong> qualquer abuso, pelo réu, no exercício <strong>de</strong> seu direito <strong>de</strong> cobrança. Dano moral não<br />

configura<strong>do</strong>. Apelo <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (TJRS – Apelação Cível 70021918388, Porto Alegre – Décima Câmara Cível – Rel. Des. Paulo<br />

Antônio Kretzmann – j. 28.02.2008 – DOERS 10.04.2008, p. 31).<br />

De fato, o uso <strong>de</strong> ligações telefônicas e o envio <strong>de</strong> cartas <strong>de</strong> cobrança, por si sós e <strong>de</strong>ntro da razoabilida<strong>de</strong> que se espera, não<br />

parecem configurar o abuso <strong>de</strong> direito na cobrança, mas um exercício regular <strong>do</strong> direito por parte <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r. Todavia, em haven<strong>do</strong>


exageros sociais, com quebra da ética particular, presente estará o abuso <strong>de</strong> direito, com a consequente responsabilização civil <strong>do</strong><br />

abusa<strong>do</strong>r.<br />

No presente contexto, surge o tema relativo à cobrança <strong>de</strong> dívidas em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> con<strong>do</strong>mínio edilício. Como exposto no Capítulo<br />

3 <strong>de</strong>sta obra, não há relação <strong>de</strong> consumo entre o condômino e o con<strong>do</strong>mínio, pela falta <strong>de</strong> alterida<strong>de</strong>. Sen<strong>do</strong> assim, o art. 42 <strong>do</strong> CDC<br />

não se aplica às relações con<strong>do</strong>miniais. O controle das condutas está sujeito ao transcrito art. 187 <strong>do</strong> CC/2002, ten<strong>do</strong> como<br />

parâmetro a função social, a boa-fé objetiva ou os bons costumes. Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito ao posicionamento em contrário, enten<strong>de</strong>se<br />

que a mera exposição, na prestação <strong>de</strong> contas mensais <strong>do</strong> con<strong>do</strong>mínio, da relação das unida<strong>de</strong>s inadimplentes não constitui<br />

cobrança vexatória, mas sim um exercício regular <strong>de</strong> um direito. Na verda<strong>de</strong>, po<strong>de</strong>-se falar até em <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informação por parte <strong>do</strong><br />

síndico, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com as suas atribuições como administra<strong>do</strong>r-geral. Por esse caminho, colaciona-se:<br />

“Exercício regular <strong>do</strong> direito que não expôs o inadimplente a constrangimento. Cumprimento <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> prestar contas perante<br />

to<strong>do</strong>s os condôminos e justificar o aumento da quota con<strong>do</strong>minial mensal inclusive em razão <strong>do</strong>s débitos daquela unida<strong>de</strong>. Recurso<br />

da autora improvi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação 992.05.070861-8 – Acórdão 4635729, Ribeirão Preto – Vigésima Sétima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong><br />

Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Campos Petroni – j. 10.08.2010 – DJESP 27.08.2010).<br />

“In<strong>de</strong>nização por danos morais. Simples relação funcional <strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>do</strong> con<strong>do</strong>mínio em forma contábil não justifica pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

in<strong>de</strong>nização por dano moral. Recurso não provi<strong>do</strong>” (TJSP – Apelação 994.06.026808-0 – Acórdão 4587091, São Paulo – Sétima<br />

Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Gilberto <strong>de</strong> Souza Moreira – j. 30.06.2010 – DJESP 19.07.2010).<br />

O que não se po<strong>de</strong> admitir é que o con<strong>do</strong>mínio afixe em local visível o nome daqueles que são inadimplentes, o que, sem<br />

dúvidas, configura o abuso <strong>de</strong> direito civil, nos termos da lei geral privada. Nesse sentir:<br />

“Apelação cível. Danos morais. Con<strong>do</strong>mínio. Apresentação e afixação <strong>de</strong> lista com nome <strong>do</strong>s inadimplentes em quadro <strong>de</strong> avisos <strong>do</strong><br />

edifício. Abuso <strong>de</strong> direito. Exposição <strong>de</strong>snecessária. No exercício <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> exigir o pagamento, cabe ao cre<strong>do</strong>r escolher as vias<br />

a<strong>de</strong>quadas, ten<strong>do</strong> a cautela <strong>de</strong> não expor o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r ao ridículo ou a situações vexatórias, sen<strong>do</strong> que os meios utiliza<strong>do</strong>s <strong>de</strong>vem ser<br />

razoáveis, cumprin<strong>do</strong>-se evitar providências que excedam o necessário para a satisfação <strong>do</strong> crédito. A afixação na entrada <strong>de</strong> prédio<br />

em con<strong>do</strong>mínio <strong>de</strong> lista conten<strong>do</strong> o nome <strong>de</strong> condôminos inadimplentes, sem qualquer intuito <strong>de</strong> prestar contas ou <strong>de</strong> cientificar os<br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>res, caracteriza ato ilícito em razão <strong>do</strong> abuso <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> cobrança. Os danos experimenta<strong>do</strong>s pelos apelantes, consistente em<br />

saber que tiveram seus nomes expostos, são passíveis <strong>de</strong> ser in<strong>de</strong>niza<strong>do</strong>s por configurar ofensa à esfera íntima e à honra da pessoa”<br />

(TJMG – Apelação Cível 1.0720.02.006672-9/001, Viscon<strong>de</strong> <strong>do</strong> Rio Branco – Décima Quarta Câmara Cível – Rel. Des. Elias<br />

Camilo – j. 08.03.2007 – DJMG 30.03.2007).<br />

“In<strong>de</strong>nização por danos morais. Cobrança vexatória em con<strong>do</strong>mínio. Colocação <strong>de</strong> lista <strong>de</strong> inadimplentes em edital entre os<br />

eleva<strong>do</strong>res sociais. Exposição <strong>de</strong> situação particular a pessoas alheias a socieda<strong>de</strong> con<strong>do</strong>minial. Caracterização <strong>do</strong> dano moral.<br />

Sentença reformada. Recurso conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (TJPR – Recurso 230968-0 – Acórdão 1767, Curitiba – Décima Oitava Câmara<br />

Cível – Rel. Des. Sérgio Roberto N. Rolanski – j. 17.08.2005).<br />

De toda sorte, <strong>de</strong>ve ficar claro que o <strong>de</strong>bate relativo ao con<strong>do</strong>mínio edilício não envolve o art. 42 <strong>do</strong> CDC, pois não se situa a<br />

relação entre esse e os seus componentes na órbita da relação jurídica <strong>de</strong> consumo.<br />

Seguin<strong>do</strong> no estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> último coman<strong>do</strong> consumerista, não po<strong>de</strong> o vulnerável negocial ser submeti<strong>do</strong> a qualquer tipo <strong>de</strong> coação,<br />

pressão física que vicia a sua vonta<strong>de</strong>. Em diálogo das fontes, servem como parâmetros os dispositivos da lei geral privada que<br />

tratam <strong>de</strong>sse <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> negócio jurídico. Para começar, o conceito <strong>de</strong> coação po<strong>de</strong> ser retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 151 <strong>do</strong> CC/2002, a saber: “A<br />

coação, para viciar a <strong>de</strong>claração da vonta<strong>de</strong>, há <strong>de</strong> ser tal que incuta ao paciente funda<strong>do</strong> temor <strong>de</strong> dano iminente e consi<strong>de</strong>rável à<br />

sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens. Parágrafo único. Se disser respeito a pessoa não pertencente à família <strong>do</strong> paciente, o<br />

juiz, com base nas circunstâncias, <strong>de</strong>cidirá se houve coação”. No plano consumerista, em vez da anulabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> ato<br />

correspon<strong>de</strong>nte, <strong>de</strong>ve-se reconhecer o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar pela prática abusiva. Eventualmente, se a permissão da coação constar em<br />

um contrato, a cláusula correspon<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>ve ser reconhecida como nula, por abusivida<strong>de</strong>, por força <strong>do</strong> art. 51 da Lei 8.078/1990.<br />

Cabe a análise in concreto da coação na cobrança <strong>de</strong> dívidas, levan<strong>do</strong>-se em conta as características gerais <strong>do</strong> coagi<strong>do</strong>. Em<br />

outras palavras, nos termos <strong>do</strong> art. 152 <strong>do</strong> CC/2002, ao apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a ida<strong>de</strong>, a condição, a saú<strong>de</strong>, o<br />

temperamento <strong>do</strong> paciente (o consumi<strong>do</strong>r), e todas as <strong>de</strong>mais circunstâncias que possam influir na gravida<strong>de</strong> <strong>de</strong>la. Por razões<br />

óbvias, em haven<strong>do</strong> um consumi<strong>do</strong>r hipervulnerável (v.g., i<strong>do</strong>so) análise da coação <strong>de</strong>ve ser mais contun<strong>de</strong>nte.<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> diálogo, também na ótica consumerista não se consi<strong>de</strong>ram coação o mero temor reverencial (receio <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sapontar uma pessoa querida ou próxima) e o exercício normal <strong>de</strong> um direito (art. 153 <strong>do</strong> CC/2002). Como exercício regular <strong>de</strong><br />

direito, mencione-se a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inscrição em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes ou <strong>de</strong> protesto <strong>de</strong> dívida quan<strong>do</strong> a dívida realmente<br />

existe. Em casos tais, a comunicação prévia não constitui um abuso <strong>de</strong> direito, mas um verda<strong>de</strong>iro <strong>de</strong>ver <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r. A temática será<br />

abordada no próximo capítulo <strong>de</strong>ste livro.


Nos mesmos termos <strong>do</strong> que consta <strong>do</strong>s arts. 154 e 155 <strong>do</strong> CC/2002, admite-se a coação por terceiro na ótica da cobrança <strong>de</strong><br />

dívidas consumeristas. A título <strong>de</strong> exemplo, a cobrança com abuso po<strong>de</strong> ser exercida por uma empresa especializada em cobranças,<br />

respon<strong>de</strong>n<strong>do</strong> solidariamente o fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r que a contrata. A responsabilida<strong>de</strong> objetiva e solidária po<strong>de</strong> ainda ser<br />

retirada <strong>do</strong>s arts. 14 e 20 da Lei 8.078/1990, conforme reconhece a jurisprudência (TJRS – Apelação Cível 70005417647, Porto<br />

Alegre – Nona Câmara Cível – Rel. Des. Adão Sergio <strong>do</strong> Nascimento Cassiano – j. 29.09.2004).<br />

Superada tal visão dialogal, parte-se à abordagem <strong>de</strong> um assunto <strong>de</strong>lica<strong>do</strong>, qual seja o corte <strong>de</strong> serviço essencial por parte <strong>do</strong>s<br />

cre<strong>do</strong>res em relação a <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>res inadimplentes. A problemática envolve tanto a coação quanto a cobrança vexatória, que expõe o<br />

vulnerável ao ridículo. Vislumbram-se os casos <strong>de</strong> corte <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> água, luz e gás por parte das empresas concessionárias que<br />

prestam o serviço. Existem duas correntes bem <strong>de</strong>finidas a respeito da questão.<br />

De início, o primeiro entendimento prega a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interrupção <strong>do</strong> serviço público essencial em qualquer hipótese,<br />

categoria na qual se situam os serviços <strong>de</strong> água e luz. Tal corrente sustenta-se na subsunção <strong>do</strong> art. 22 da Lei 8.078/1990, segun<strong>do</strong> o<br />

qual: “Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma <strong>de</strong><br />

empreendimento, são obriga<strong>do</strong>s a fornecer serviços a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. Parágrafo<br />

único. Nos casos <strong>de</strong> <strong>de</strong>scumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a<br />

cumpri-las e a reparar os danos causa<strong>do</strong>s, na forma prevista neste Código”. Em complemento, o corte <strong>de</strong> serviço essencial<br />

constituiria uma prática abusiva na cobrança da dívida, nos termos <strong>do</strong> ora aborda<strong>do</strong> art. 42, caput, <strong>do</strong> CDC. Esse é o entendimento<br />

<strong>do</strong>utrinário <strong>de</strong> Luiz Antonio Rizzatto Nunes, para quem “Um bem maior como a vida, a saú<strong>de</strong> e a dignida<strong>de</strong> não po<strong>de</strong> ser<br />

sacrifica<strong>do</strong> em função <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> crédito (um bem menor)”.22 Da mesma maneira posicionam-se Claudia Lima Marques,<br />

Herman Benjamin e Bruno Miragem quanto às pessoas naturais, citan<strong>do</strong> a proteção da dignida<strong>de</strong> humana.23<br />

De fato, essa primeira corrente consubstancia o que se espera da justiça consumerista. Não se po<strong>de</strong> esquecer que o Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é norma principiológica, <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública e interesse social, haven<strong>do</strong> menção expressa no próprio Texto<br />

Maior quanto à proteção <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res (art. 5º, XXXII e art. 170, V). Repise-se que isso coloca a Lei 8.078/1990<br />

em posição hierarquicamente superior à regulamentação das concessões públicas, conforme as normas que serão a seguir transcritas<br />

(posição supralegal). A<strong>de</strong>mais, a dignida<strong>de</strong> humana entra em cena para afastar o corte em casos <strong>de</strong> inadimplemento por parte <strong>de</strong><br />

pessoas naturais. Anote-se que esse era o entendimento consolida<strong>do</strong> anterior <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser<br />

transcrito, por to<strong>do</strong>s:<br />

“Administrativo. Corte no fornecimento <strong>de</strong> energia elétrica. Impossibilida<strong>de</strong>. Prece<strong>de</strong>ntes jurispru<strong>de</strong>nciais. Agravo regimental.<br />

Ausência <strong>de</strong> fundamentos para infirmar a <strong>de</strong>cisão agravada. Desprovimento. 1. O corte no fornecimento <strong>de</strong> energia elétrica, como<br />

forma <strong>de</strong> compelir o usuário ao pagamento <strong>de</strong> tarifa ou multa, extrapola os limites da legalida<strong>de</strong> e malfere a cláusula pétrea que<br />

tutela a dignida<strong>de</strong> humana. Prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> STJ. 2. Ausência <strong>de</strong> motivos suficientes para a modificação <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>. Manutenção da<br />

<strong>de</strong>cisão agravada. 3. Agravo regimental <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg no Ag 478911/RJ – Primeira Turma – Rel. Min. Luiz Fux – j.<br />

06.05.2003 – DJ 19.05.2003, p. 144).<br />

Os fundamentos da <strong>de</strong>cisão são muito fortes. Como é notório, o art. 1º, inc. III, da Constituição Fe<strong>de</strong>ral reconhece a dignida<strong>de</strong><br />

da pessoa humana como um princípio estruturante, aplicável a qualquer tipo <strong>de</strong> relação jurídica, um <strong>do</strong>s fundamentos da República<br />

Brasileira. Apesar da falta <strong>de</strong> menção no julga<strong>do</strong>, enten<strong>de</strong>mos que um outro princípio constitucional po<strong>de</strong>ria ser cita<strong>do</strong>, o da<br />

solidarieda<strong>de</strong> social, pela busca <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> mais justa e solidária, pela ampliação das responsabilida<strong>de</strong>s nas relações<br />

negociais (art. 3º, inc. I, da CF/1988).<br />

Em suma, filia-se a esse entendimento anterior <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, ou seja, conclui-se que a empresa<br />

concessionária não po<strong>de</strong> interromper o serviço essencial mesmo nos casos <strong>de</strong> inadimplemento. Cabe apenas à presta<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> serviço<br />

procurar outros meios judiciais para cobrar o valor <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>, inclusive com a penhora <strong>de</strong> bens <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r que não honra com as<br />

suas obrigações.<br />

Não convencem este autor os argumentos estriba<strong>do</strong>s na teoria <strong>do</strong>s jogos, segun<strong>do</strong> os quais os consumi<strong>do</strong>res adimplentes<br />

acabam por pagar a parte <strong>do</strong>s inadimplentes. Primeiro, porque não há prova contun<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> que tais cálculos existem efetivamente<br />

no Brasil. Segun<strong>do</strong>, pois a inadimplência entra no risco <strong>do</strong> empreendimento das empresas, que cobram altas tarifas pelo serviço<br />

público. Terceiro, porque tais serviços <strong>de</strong>veriam ser subsidia<strong>do</strong>s no País, diante da realida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s altos impostos que são pagos pelos<br />

cidadãos.<br />

No que concerne às pessoas jurídicas, empresas, o presente autor não pensa <strong>de</strong> forma diferente, pelo argumento <strong>de</strong> prevalência<br />

da Norma Consumerista. Em reforço, não se po<strong>de</strong> per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista a função social que a empresa <strong>de</strong>sempenha perante a socieda<strong>de</strong>,<br />

po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o corte <strong>de</strong> serviço essencial trazer lesão a tal finalida<strong>de</strong>. A propósito <strong>de</strong>sse princípio, na I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil<br />

aprovou-se o Enuncia<strong>do</strong> n. 53 <strong>do</strong> CJF/STJ, preven<strong>do</strong> que “<strong>de</strong>ve-se levar em consi<strong>de</strong>ração o princípio da função social na<br />

interpretação das normas relativas à empresa, a <strong>de</strong>speito da falta <strong>de</strong> referência expressa”.


Pois bem, o segun<strong>do</strong> posicionamento a respeito <strong>do</strong> corte <strong>de</strong> serviço essencial, aquele que prevalece na jurisprudência <strong>do</strong><br />

Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, possibilita a interrupção <strong>do</strong> serviço nas hipóteses <strong>de</strong> inadimplemento <strong>do</strong> usuário-consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

que haja prévia comunicação por parte <strong>do</strong> presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviços. Conforme pontuam Theotonio Negrão, José Roberto F. Gouvêa e<br />

Luiz Guilherme Bondioli, “A 1ª Seção <strong>do</strong> STJ pacificou entendimento no senti<strong>do</strong> da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interrupção <strong>do</strong> fornecimento<br />

<strong>do</strong> serviço público essencial, ante o inadimplemento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r”.24 Para tanto, argumenta-se com base na legislação que trata<br />

das concessões <strong>do</strong>s serviços públicos no Brasil.<br />

De início, a Lei das Concessões Públicas (Lei 8.987/1995) estabelece em seu art. 6º que toda concessão ou permissão<br />

pressupõe a prestação <strong>de</strong> serviço a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> ao pleno atendimento <strong>do</strong>s usuários. É consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> como serviço a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> o que satisfaz<br />

as condições <strong>de</strong> regularida<strong>de</strong>, continuida<strong>de</strong>, eficiência, segurança, atualida<strong>de</strong>, generalida<strong>de</strong>, cortesia na sua prestação e modicida<strong>de</strong><br />

das tarifas (§ 1º). Como ressalva, não se caracteriza como <strong>de</strong>scontinuida<strong>de</strong> <strong>do</strong> serviço a sua interrupção em situação <strong>de</strong> emergência<br />

ou após prévio aviso, quan<strong>do</strong>: a) motivada por razões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m técnica ou <strong>de</strong> segurança das instalações; e b) por inadimplemento<br />

<strong>do</strong> usuário, consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> o interesse da coletivida<strong>de</strong> (§ 3º).<br />

Ato contínuo, em relação ao serviço <strong>de</strong> energia elétrica, o corte pelo inadimplemento tem fundamento no art. 17 da Lei<br />

9.427/1996, que disciplina a sua concessão, in verbis: “A suspensão, por falta <strong>de</strong> pagamento, <strong>do</strong> fornecimento <strong>de</strong> energia elétrica a<br />

consumi<strong>do</strong>r que presta serviço público ou essencial à população e cuja ativida<strong>de</strong> sofra prejuízo será comunicada com antecedência<br />

<strong>de</strong> quinze dias ao Po<strong>de</strong>r Público local ou ao Po<strong>de</strong>r Público Estadual. § 1º O Po<strong>de</strong>r Público que receber a comunicação a<strong>do</strong>tará as<br />

providências administrativas para preservar a população <strong>do</strong>s efeitos da suspensão <strong>do</strong> fornecimento <strong>de</strong> energia elétrica, inclusive<br />

dan<strong>do</strong> publicida<strong>de</strong> à contingência, sem prejuízo das ações <strong>de</strong> responsabilização pela falta <strong>de</strong> pagamento que motivou a medida”.<br />

Além <strong>de</strong>sses preceitos, o art. 40 da Lei 11.445/2007 trata <strong>do</strong> corte no serviço <strong>de</strong> água e esgoto (saneamento básico), a saber:<br />

“Os serviços po<strong>de</strong>rão ser interrompi<strong>do</strong>s pelo presta<strong>do</strong>r nas seguintes hipóteses: (…) V – inadimplemento <strong>do</strong> usuário <strong>do</strong> serviço <strong>de</strong><br />

abastecimento <strong>de</strong> água, <strong>do</strong> pagamento das tarifas, após ter si<strong>do</strong> formalmente notifica<strong>do</strong>. § 1º As interrupções programadas serão<br />

previamente comunicadas ao regula<strong>do</strong>r e aos usuários. § 2º A suspensão <strong>do</strong>s serviços prevista nos incisos III e V <strong>do</strong> caput <strong>de</strong>ste<br />

artigo será precedida <strong>de</strong> prévio aviso ao usuário, não inferior a 30 (trinta) dias da data prevista para a suspensão. § 3º A interrupção<br />

ou a restrição <strong>do</strong> fornecimento <strong>de</strong> água por inadimplência a estabelecimentos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, a instituições educacionais e <strong>de</strong> internação<br />

coletiva <strong>de</strong> pessoas e a usuário resi<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> baixa renda beneficiário <strong>de</strong> tarifa social <strong>de</strong>verá obe<strong>de</strong>cer a prazos e critérios que<br />

preservem condições mínimas <strong>de</strong> manutenção da saú<strong>de</strong> das pessoas atingidas”.<br />

Sustenta-se a prevalência das normas transcritas por serem mais especiais e posteriores ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

(critério da especialida<strong>de</strong> + critério cronológico). Para balizar essa segunda corrente, em reforço, tem-se utiliza<strong>do</strong> o fundamento<br />

constitucional <strong>de</strong> proteção da proprieda<strong>de</strong> e da sua função social (art. 5º, XXII e Q), bem como a manutenção da or<strong>de</strong>m econômica<br />

(art. 170 da CF/1988). A propósito <strong>de</strong> tal conclusão, vejamos duas das numerosas ementas, apenas para ilustrar:<br />

“Embargos <strong>de</strong> divergência. Administrativo. Fornecimento <strong>de</strong> energia elétrica. Constatada inadimplência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Suspensão<br />

<strong>do</strong> fornecimento. Possibilida<strong>de</strong>. Embargos conheci<strong>do</strong>s, mas improvi<strong>do</strong>s. A suposta necessida<strong>de</strong> da continuida<strong>de</strong> <strong>do</strong> serviço público,<br />

<strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, não se traduz em uma regra <strong>de</strong> conteú<strong>do</strong> absoluto, em vista das limitações<br />

previstas na Lei 8.987/1997. Aliás, nessa linha <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r, a colenda Primeira Turma, por meio <strong>de</strong> voto condutor da lavra <strong>do</strong> ilustre<br />

Ministro Teori Albino Zavascki, assentou que ‘tem-se, assim, que a continuida<strong>de</strong> <strong>do</strong> serviço público assegurada pelo art. 22 <strong>do</strong> CDC<br />

não constitui princípio absoluto, mas garantia limitada pelas disposições da Lei 8.987/1995, que, em nome justamente da<br />

preservação da continuida<strong>de</strong> e da qualida<strong>de</strong> da prestação <strong>do</strong>s serviços ao conjunto <strong>do</strong>s usuários, permite, em hipóteses entre as quais<br />

o inadimplemento, a suspensão no seu fornecimento’ (REsp 591.692-RJ, DJ 14.03.2005). Há expressa previsão normativa da<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> suspensão <strong>do</strong> fornecimento <strong>de</strong> energia elétrica ao usuário que <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> efetuar a contraprestação ajustada (art. 6º, §<br />

3º, inc. II da Lei 8.987/1995; art. 17 da Lei 9.427/1996; e art. 91, incs. I e II, da Resolução 456/2000 da ANEEL). Recebe o usuário,<br />

se admitida a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> suspensão <strong>do</strong> serviço, reprovável estímulo à inadimplência. Não será o Judiciário, entretanto,<br />

insensível relativamente às situações peculiares em que o usuário <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> honrar seus compromissos financeiros em razão <strong>de</strong> sua<br />

hipossuficiência, circunstância que não se amolda ao caso em exame. Embargos <strong>de</strong> divergência conheci<strong>do</strong>s e improvi<strong>do</strong>s” (STJ –<br />

EREsp 302.620/SP – Primeira Seção – Rel. Min. José Delga<strong>do</strong> – Rel. p/Acórdão Min. Franciulli Netto – j. 25.08.2004 – DJ<br />

03.04.2006, p. 207 – REPDJ 09.10.2006, p. 251).<br />

“Administrativo. Suspensão <strong>do</strong> fornecimento <strong>de</strong> energia elétrica. Inadimplemento. Possibilida<strong>de</strong>. 1. A Lei 8.987/1995, que dispõe<br />

sobre o regime <strong>de</strong> concessão e permissão da prestação <strong>de</strong> serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Fe<strong>de</strong>ral, prevê, nos<br />

incisos I e II <strong>do</strong> § 3º <strong>do</strong> art. 6º, duas hipóteses em que é legítima sua interrupção, em situação <strong>de</strong> emergência ou após prévio aviso:<br />

(a) por razões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m técnica ou <strong>de</strong> segurança das instalações; (b) por inadimplemento <strong>do</strong> usuário, consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> o interesse da<br />

coletivida<strong>de</strong>. 2. Tem-se, assim, que a continuida<strong>de</strong> <strong>do</strong> serviço público, assegurada pelo art. 22 <strong>do</strong> CDC, não constitui princípio<br />

absoluto, mas garantia limitada pelas disposições da Lei 8.987/1995, que, em nome justamente da preservação da continuida<strong>de</strong> e da<br />

qualida<strong>de</strong> da prestação <strong>do</strong>s serviços ao conjunto <strong>do</strong>s usuários, permite, em hipóteses entre as quais a <strong>de</strong> inadimplemento <strong>do</strong> usuário.<br />

Prece<strong>de</strong>ntes: REsp 363.943/MG, Primeira Seção, Min. Humberto Gomes <strong>de</strong> Barros, DJ 01.03.2004; e REsp 302.620/SP, Segunda<br />

Turma, Rel. p/o acórdão Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha, DJ 16.02.2004. 3. Embargos <strong>de</strong> divergência a que se nega provimento” (STJ


– EREsp 576242/MG – Primeira Seção – Rel. Min. Teori Albino Zavascki – j. 26.04.2006 – DJ 15.05.2006, p. 152).


BANCO DE DADOS E CADASTRO DE<br />

CONSUMIDORES<br />

Sumário: 8.1. A natureza jurídica <strong>do</strong>s bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e cadastros e sua importante aplicabilida<strong>de</strong> social.<br />

Diferenças entre as categorias – 8.2. O conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong>s arts. 43 e 44 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e seus<br />

efeitos. A interpretação jurispru<strong>de</strong>ncial: 8.2.1. A inscrição ou registro <strong>do</strong> nome <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res; 8.2.2. A<br />

retificação ou correção <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s; 8.2.3. O cancelamento da inscrição; 8.2.4. A reparação <strong>do</strong>s danos nos casos <strong>de</strong><br />

inscrição in<strong>de</strong>vida <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r. Crítica à Súmula 385 <strong>do</strong> STJ. Prazo para se pleitear a reparação; 8.2.5. O<br />

cadastro <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res e o alcance <strong>do</strong> art. 44 da Lei 8.078/1990 – 8.3. O cadastro positivo. Breve<br />

análise da Lei 12.414, <strong>de</strong> 9 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 2011.<br />

8.1.<br />

A NATUREZA JURÍDICA DOS BANCOS DE DADOS E CADASTROS E SUA<br />

IMPORTANTE APLICABILIDADE SOCIAL. DIFERENÇAS ENTRE AS<br />

CATEGORIAS<br />

Os bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e cadastros <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res assumem atualmente no Brasil um papel social indiscutível, sen<strong>do</strong> institutos<br />

<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> aplicabilida<strong>de</strong> no contexto nacional. Como é notório, o brasileiro médio <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser um poupa<strong>do</strong>r e passou a ser<br />

alguém <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> crédito no merca<strong>do</strong>, algo como um homo creditus.1 Essa tendência <strong>de</strong>senfreada é um <strong>do</strong>s fatores a gerar o<br />

superendividamento, outrora aponta<strong>do</strong> na presente obra. Na esteira da <strong>do</strong>utrina, utiliza-se o termo arquivos <strong>de</strong> consumo em senti<strong>do</strong><br />

amplo ou como gênero, <strong>do</strong> qual são espécies os bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e cadastros <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res.2<br />

Além das previsões constantes <strong>do</strong>s arts. 43 e 44 da Lei 8.078/1990, os cadastros e bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s ganharam incidência em<br />

outros campos, como é o caso <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> Família, surgin<strong>do</strong> julga<strong>do</strong>s anteriores admitin<strong>do</strong> a inscrição <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>de</strong><br />

alimentos nos cadastros negativos (ver: TJSP – Agravo 990.10.152783-9/50000 – Acórdão 4653433, São Paulo – Terceira Câmara<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Adilson <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> – j. 17.08.2010 – DJESP 09.09.2010; e TJSP – Agravo 990.10.088682-7/50000<br />

– Acórdão 4525237, São Paulo – Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Egidio Giacóia – j. 25.05.2010 – DJESP<br />

12.07.2010).<br />

Em 2016, tal possibilida<strong>de</strong> passou a constar da Edição n. 59 da ferramenta Jurisprudência em Teses, <strong>do</strong> STJ, que trata <strong>do</strong><br />

Cadastro <strong>de</strong> Inadimplentes. Conforme a premissa 2 ali publicada, “é possível que o magistra<strong>do</strong>, no âmbito da execução <strong>de</strong><br />

alimentos, a<strong>do</strong>te as medidas executivas <strong>do</strong> protesto e da inscrição <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r nos cadastros <strong>de</strong> restrição ao crédito, caso<br />

se revelem eficazes para o pagamento da dívida”. Como prece<strong>de</strong>ntes, são cita<strong>do</strong>s os seguintes acórdãos: REsp 1.469.102/SP –<br />

Terceira Turma – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – j. 08.03.2016 – DJe 15.03.2016; e REsp 1.533.206/MG – Quarta Turma<br />

– Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 17.11.2015 – DJe 01.02.2016).<br />

Como bem aponta o Desembarga<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Tribunal Paulista Caetano Lagrasta Neto, um <strong>do</strong>s precursores da tese: “A insatisfação<br />

<strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r, em geral filhos menores, ante a utilização <strong>de</strong> expedientes processuais coloca<strong>do</strong>s à disposição <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, com prejuízo<br />

aos princípios da rapi<strong>de</strong>z e economia processuais, impe<strong>de</strong>m o regular acesso a uma or<strong>de</strong>m jurídica justa, ante a reiteração <strong>do</strong>s<br />

recursos, ao <strong>de</strong>monstrar a inviabilida<strong>de</strong> da ameaça à prisão (art. 733 <strong>do</strong> CPC) e forrar-se o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r ao pagamento durante anos,


com prejuízo à subsistência da família. Ao cabo, enfatiza-se a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cadastrar e dificultar movimentação <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>de</strong><br />

alimentos, equiparan<strong>do</strong>-o a qualquer <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r da esfera cível”. 3 Para ele, o fundamento constitucional <strong>de</strong> tal possibilida<strong>de</strong> está no<br />

art. 6º da Constituição Fe<strong>de</strong>ral, que faz menção ao direito social e fundamental aos alimentos, por força da Emenda Constitucional<br />

64. O magistra<strong>do</strong> i<strong>de</strong>alizou projeto <strong>de</strong> lei sobre a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inscrição, em conjunto com Silvânio Covas, superinten<strong>de</strong>nte<br />

jurídico <strong>do</strong> SERASA. A proposição foi apresentada pelo Sena<strong>do</strong>r Eduar<strong>do</strong> Suplicy, por meio <strong>do</strong> Projeto <strong>de</strong> Lei 405/2008, no<br />

momento em trâmite no Congresso Nacional.<br />

De toda sorte, apesar <strong>de</strong>sse trâmite legislativo, cabe pontuar que o Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil passou a admitir<br />

expressamente o protesto judicial da dívida <strong>de</strong> alimentos, o que acarretará, como consequência, a inscrição <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r em<br />

cadastros negativos <strong>de</strong> créditos. Trata-se da primeira medida a ser tomada contra o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, antes <strong>de</strong> se <strong>de</strong>cretar a sua prisão civil.<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 528 <strong>do</strong> CPC/2015, no cumprimento <strong>de</strong> sentença que con<strong>de</strong>ne ao pagamento <strong>de</strong> prestação alimentícia ou <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>cisão interlocutória que fixe alimentos, o juiz, a requerimento <strong>do</strong> exequente, mandará intimar o executa<strong>do</strong> pessoalmente para, em<br />

três dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> efetuá-lo. Em complemento, estabelece o seu § 1º que<br />

caso o executa<strong>do</strong>, nesse prazo <strong>de</strong> três dias, não efetue o pagamento, não prove que o efetuou ou não apresente justificativa da<br />

impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> efetuá-lo, o juiz mandará protestar o pronunciamento judicial. Pontue-se que as <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> STJ por último<br />

colacionadas foram prolatadas sob a égi<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa nova legislação instrumental.<br />

Os bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e cadastros <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res lidam com um <strong>do</strong>s mais importantes direitos da personalida<strong>de</strong>, qual seja o<br />

nome, sinal que representa a pessoa perante o meio social. Na perspectiva <strong>de</strong> ampla proteção, o art. 16 <strong>do</strong> CC/2002 enuncia que<br />

toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendi<strong>do</strong>s o prenome e o sobrenome. Ato contínuo, <strong>de</strong>termina a lei civil que o nome da<br />

pessoa não po<strong>de</strong> ser emprega<strong>do</strong> por outrem em publicações ou representações que a exponham ao <strong>de</strong>sprezo público, ainda quan<strong>do</strong><br />

não haja intenção difamatória (art. 17 <strong>do</strong> CC/2002).<br />

Em casos <strong>de</strong> <strong>de</strong>srespeito a tal preceito, cabem os mecanismos trata<strong>do</strong>s pelo art. 12, caput, da norma geral civil, incidin<strong>do</strong> os<br />

princípios da prevenção e da reparação integral <strong>de</strong> danos. Conforme a norma, “po<strong>de</strong>-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a<br />

direito da personalida<strong>de</strong>, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo <strong>de</strong> outras sanções previstas em lei”.<br />

Para a prevenção, cabem as medidas <strong>de</strong> tutela específica consagradas pelo Estatuto Processual, e pelo próprio CDC (art. 84)<br />

caso da fixação da multa ou astreintes. Sobre a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fixação <strong>de</strong> astreintes em casos tais, cite-se a premissa 10,<br />

publicada na Edição n. 59 da ferramenta Jurisprudência em Teses, <strong>do</strong> STJ. Conforme o seu teor, “é cabível a aplicação <strong>de</strong> multa<br />

diária como meio coercitivo para o cumprimento <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão judicial que <strong>de</strong>termina a exclusão ou impe<strong>de</strong> a inscrição <strong>do</strong> nome <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r em cadastro <strong>de</strong> restrição <strong>de</strong> crédito”. A fixação <strong>de</strong>ssa multa in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da prova <strong>de</strong> culpa ou <strong>de</strong> dano, conforme está<br />

previsto no art. 497, parágrafo único, <strong>do</strong> CPC/2015.<br />

Para a ampla reparação, possível a ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por to<strong>do</strong>s os danos materiais e imateriais sofri<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r, o<br />

que inclui até os danos coletivos, <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s grupos <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res.<br />

O caminho, pela Lei Consumerista, é exatamente o mesmo, pela incidência <strong>do</strong>s seus arts. 84 – para a prevenção – e 6º, inc. VI<br />

– para a reparação integral.<br />

Na perspectiva civil-constitucional, não se olvi<strong>de</strong> a proteção constitucional da imagem, que tem relação direta com o amparo<br />

<strong>do</strong> nome, diante da construção jurídica da imagem-atributo. Como bem aponta Maria Helena Diniz, essa “é o conjunto <strong>de</strong><br />

caracteres ou qualida<strong>de</strong>s cultivadas pela pessoa reconheci<strong>do</strong>s socialmente (CF/88, art. 5º, V), como a habilida<strong>de</strong>, competência,<br />

lealda<strong>de</strong>, pontualida<strong>de</strong> etc. Abrange o direito: à própria imagem, ao uso ou à difusão da imagem; à imagem das coisas próprias e à<br />

imagem em coisas, palavras ou escritos em publicações; <strong>de</strong> obter imagem ou <strong>de</strong> consentir em sua captação por qualquer meio<br />

tecnológico”.4 Além <strong>do</strong> coman<strong>do</strong> cita<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>ra, a proteção <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> indivíduo esteia-se no preceito <strong>do</strong> art. 5º, inc.<br />

X, <strong>do</strong> Texto Maior, segun<strong>do</strong> o qual são invioláveis a intimida<strong>de</strong>, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegura<strong>do</strong> o<br />

direito à in<strong>de</strong>nização pelo dano material ou moral <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> sua violação. Por fim, não se po<strong>de</strong> esquecer da cláusula geral da<br />

tutela da pessoa humana, retirada <strong>do</strong> art. 1º, inc. III, da Constituição da República. Nos termos <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 274 <strong>do</strong> CJF/STJ,<br />

aprova<strong>do</strong> na IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, os direitos da personalida<strong>de</strong>, trata<strong>do</strong>s <strong>de</strong> maneira não exaustiva pelo Código Civil, são<br />

expressões <strong>de</strong>ssa ampla cláusula geral.<br />

Por outra via <strong>de</strong> conflito, <strong>de</strong>ve ficar claro que a divulgação das informações à coletivida<strong>de</strong>, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, está amparada<br />

em preceitos constitucionais, notadamente no direito à informação e à liberda<strong>de</strong> (art. 5º, inc. IV, IX e XIV). Diante <strong>de</strong>ssa realida<strong>de</strong>,<br />

muitos <strong>do</strong>s problemas relativos à divulgação <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res <strong>de</strong>vem ser resolvi<strong>do</strong>s sob a perspectiva da pon<strong>de</strong>ração <strong>de</strong><br />

direitos, valores e princípios, tema muito bem <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong> por Robert Alexy. 5 Oportuno reprisar que a técnica da pon<strong>de</strong>ração foi<br />

a<strong>do</strong>tada expressamente pelo art. 489, § 2º, <strong>do</strong> Novo CPC, segun<strong>do</strong> o qual “no caso <strong>de</strong> colisão entre normas, o juiz <strong>de</strong>ve justificar o<br />

objeto e os critérios gerais da pon<strong>de</strong>ração efetuada, enuncian<strong>do</strong> as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as<br />

premissas fáticas que fundamentam a conclusão”.


No que concerne à natureza jurídica <strong>do</strong>s cadastros e bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, é claro o art. 43, § 4º, da Norma Protetiva no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

que são consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> caráter público. Como se extrai da obra conjunta <strong>de</strong> Cláudia Lima Marques, Herman Benjamin<br />

e Bruno Miragem, apesar <strong>de</strong>ssa natureza pública, po<strong>de</strong>m os cadastros em senti<strong>do</strong> amplo ser manti<strong>do</strong>s por entida<strong>de</strong>s públicas<br />

(BACEN/CADIN) ou privadas (SPC), chamadas <strong>de</strong> arquivistas.6 Além <strong>de</strong> toda a exposição acima <strong>de</strong>monstrada, amparada na<br />

proteção da pessoa humana e das informações, a natureza pública está justificada pelo princípio <strong>do</strong> protecionismo, retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> art.<br />

1º da Lei 8.078/1990.<br />

Em reforço, como observa Renato Afonso Gonçalves, em sua dissertação <strong>de</strong> mestra<strong>do</strong> <strong>de</strong>fendida na PUCSP, “O ‘caráter<br />

público’ constitucional, cujo senti<strong>do</strong> acompanhou o CDC (§ 4º, art. 43), advém da gênese <strong>do</strong>s órgãos que manipulam as<br />

informações, <strong>de</strong> sua própria essência. Ora, a garantia constitucional <strong>do</strong> habeas data, como veremos em capítulo próprio, em<br />

perfeita consonância com o art. 1º, II e III, e art. 5º, X, da Constituição Fe<strong>de</strong>ral, tem o condão <strong>de</strong> salvaguardar para o cidadão suas<br />

informações pessoais, ou melhor, as informações relativas à sua pessoa (impetrante). Como as <strong>de</strong>mais garantias constitucionais,<br />

visa proteger o cidadão contra o Esta<strong>do</strong> atuan<strong>do</strong> na esfera das liberda<strong>de</strong>s públicas”. 7<br />

A enfatizar o interesse coletivo <strong>de</strong> tais cadastros, a recente Lei 13.146/2015, que instituiu o Estatuto da Pessoa com<br />

Deficiência, incluiu um § 6º no art. 43 <strong>do</strong> CDC, enuncian<strong>do</strong> que “todas as informações <strong>de</strong> que trata o caput <strong>de</strong>ste artigo <strong>de</strong>vem ser<br />

disponibilizadas em formatos acessíveis, inclusive para a pessoa com <strong>de</strong>ficiência, mediante solicitação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r”. O objetivo<br />

é a inclusão <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res com <strong>de</strong>ficiência, ti<strong>do</strong>s como hipervulneráveis, e que merecem uma especial e qualificada proteção <strong>do</strong><br />

Esta<strong>do</strong>.<br />

Em complemento, conforme se retira <strong>de</strong> recente aresto <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, julga<strong>do</strong> por sua Segunda Seção em<br />

inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> recursos repetitivos, tais cadastros gozam <strong>de</strong> presunção <strong>de</strong> veracida<strong>de</strong>, especialmente quan<strong>do</strong> reproduzem o que é<br />

informa<strong>do</strong> pelos Cartórios <strong>de</strong> Protestos. Conforme se retira <strong>de</strong> publicação constante <strong>do</strong> Informativo n. 554 <strong>do</strong> Tribunal da<br />

Cidadania, “diante da presunção legal <strong>de</strong> veracida<strong>de</strong> e publicida<strong>de</strong> inerente aos registros <strong>de</strong> cartório <strong>de</strong> protesto, a reprodução<br />

objetiva, fiel, atualizada e clara <strong>de</strong>sses da<strong>do</strong>s na base <strong>de</strong> órgão <strong>de</strong> proteção ao crédito – ainda que sem a ciência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r –<br />

não tem o condão <strong>de</strong> ensejar obrigação <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong> danos. Nos termos da CF, o direito <strong>de</strong> acesso à informação encontra-se<br />

consagra<strong>do</strong> no art. 5º, XXXIII, que preceitua que to<strong>do</strong>s têm direito a receber <strong>do</strong>s órgãos públicos informações <strong>de</strong> seu interesse<br />

particular, ou <strong>de</strong> interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>, ressalvadas aquelas<br />

cujo sigilo seja imprescindível à segurança da socieda<strong>de</strong> e <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. Além disso, o art. 37, caput, da CF estabelece ser a<br />

publicida<strong>de</strong> princípio que informa a administração pública, e o cartório <strong>de</strong> protesto exerce serviço público. Nesse passo, observa-se<br />

que o art. 43, § 4º, <strong>do</strong> CDC disciplina as ativida<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s cadastros <strong>de</strong> inadimplentes, estabelecen<strong>do</strong> que os bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e<br />

cadastros relativos a consumi<strong>do</strong>res, os serviços <strong>de</strong> proteção ao crédito e congêneres são consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> caráter público.<br />

Nessa linha <strong>de</strong> intelecção, consagran<strong>do</strong> o princípio da publicida<strong>de</strong> imanente, o art. 1º, c/c art. 5º, III, ambos da Lei 8.935/1994 (Lei<br />

<strong>do</strong>s Cartórios), estabelecem que os serviços <strong>de</strong> protesto são <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>s a assegurar a publicida<strong>de</strong>, autenticida<strong>de</strong> e eficácia <strong>do</strong>s atos<br />

jurídicos. A<strong>de</strong>mais, por um la<strong>do</strong>, a teor <strong>do</strong> art. 1º, caput, da Lei 9.492/1997 (Lei <strong>do</strong> Protesto) e das <strong>de</strong>mais disposições legais, o<br />

protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o <strong>de</strong>scumprimento <strong>de</strong> obrigação (ou a recusa <strong>do</strong> aceite)<br />

originada em títulos e outros <strong>do</strong>cumentos <strong>de</strong> dívida. Por outro la<strong>do</strong>, o art. 2º <strong>do</strong> mesmo diploma esclarece que os serviços<br />

concernentes ao protesto são garanti<strong>do</strong>res da autenticida<strong>de</strong>, publicida<strong>de</strong>, segurança e eficácia <strong>do</strong>s atos jurídicos. Com efeito, o<br />

registro <strong>do</strong> protesto <strong>de</strong> título <strong>de</strong> crédito ou outro <strong>do</strong>cumento <strong>de</strong> dívida é <strong>de</strong> <strong>do</strong>mínio público, geran<strong>do</strong> presunção <strong>de</strong> veracida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

ato jurídico, da<strong>do</strong> que <strong>de</strong>riva <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r certificante que é conferi<strong>do</strong> ao oficial registra<strong>do</strong>r e ao tabelião. A par disso, registre-se que<br />

não constitui ato ilícito o pratica<strong>do</strong> no exercício regular <strong>de</strong> um direito reconheci<strong>do</strong>, nos termos <strong>do</strong> art. 188, I, <strong>do</strong> CC. Dessa forma,<br />

como os órgãos <strong>de</strong> sistema <strong>de</strong> proteção ao crédito exercem ativida<strong>de</strong> lícita e relevante ao divulgar informação que goza <strong>de</strong> fé<br />

pública e <strong>do</strong>mínio público, não há falar em <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> reparar danos, tampouco em obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> prévia notificação ao<br />

consumi<strong>do</strong>r (art. 43, § 2º, <strong>do</strong> CDC), sob pena <strong>de</strong> violação ao princípio da publicida<strong>de</strong> e mitigação da eficácia <strong>do</strong> art. 1º da Lei<br />

8.935/1994, que estabelece que os cartórios extrajudiciais se <strong>de</strong>stinam a conferir publicida<strong>de</strong> aos atos jurídicos pratica<strong>do</strong>s por seus<br />

serviços” (STJ – REsp 1.444.469/DF – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – Segunda Seção – j. 12.11.2014 – DJe 16.12.2014).<br />

Mais recentemente, em 2016, essa presunção <strong>de</strong> veracida<strong>de</strong> foi igualmente reconhecida por afirmação constante da Edição 59<br />

da ferramenta Jurisprudência em Teses, <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania. Conforme a tese 11, “diante da presunção legal <strong>de</strong> veracida<strong>de</strong> e<br />

publicida<strong>de</strong> inerente aos registros <strong>do</strong> cartório <strong>de</strong> distribuição judicial e cartório <strong>de</strong> protesto, a reprodução objetiva, fiel, atualizada e<br />

clara <strong>de</strong>sses da<strong>do</strong>s na base <strong>de</strong> órgão <strong>de</strong> proteção ao crédito – ainda que sem a ciência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r –, não tem o condão <strong>de</strong><br />

ensejar obrigação <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong> danos”.<br />

Feitos tais esclarecimentos, é preciso traçar as diferenças existentes entre as construções jurídicas <strong>do</strong>s bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e<br />

cadastros <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res. Da tese <strong>de</strong> <strong>do</strong>utoramento <strong>de</strong> Antônio Carlos Efing, também <strong>de</strong>fendida na PUCSP, po<strong>de</strong>m ser retira<strong>do</strong>s<br />

sete critérios <strong>de</strong> distinção, expostos no quadro-resumo a seguir:8


I)<br />

a)<br />

b)<br />

II)<br />

a)<br />

b)<br />

III)<br />

a)<br />

b)<br />

IV)<br />

a)<br />

b)<br />

V)<br />

a)<br />

b)<br />

VI)<br />

a)<br />

b)<br />

Diferenciação quanto à forma <strong>de</strong> coleta <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s armazena<strong>do</strong>s:<br />

Banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s – têm caráter aleatório, sen<strong>do</strong> o seu objetivo propiciar a máxima quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> coletas <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s. Não há<br />

um interesse particulariza<strong>do</strong>.<br />

Cadastro <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res – o consumi<strong>do</strong>r tem necessariamente uma relação jurídica estabelecida com o arquivista<br />

(especificida<strong>de</strong> subjetiva). Assim sen<strong>do</strong>, não há um caráter aleatório na coleta das informações, mas sim um interesse<br />

particulariza<strong>do</strong>.<br />

Diferenciação quanto à organização <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s armazena<strong>do</strong>s:<br />

Bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s – as informações têm uma organização mediata, pois visam a uma utilização futura, ainda não<br />

concretizada.<br />

Cadastro <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res – as informações têm uma organização imediata, qual seja a relação jurídica estabelecida entre<br />

o arquivista <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s e o consumi<strong>do</strong>r.<br />

Diferenciação quanto à continuida<strong>de</strong> da coletiva e da divulgação:<br />

Bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s – como são aleatórios, há a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua conservação permanente, no máximo <strong>de</strong> tempo<br />

possível.<br />

Cadastro <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res – como não há interesse por parte <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r em manter o cadastro <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r que<br />

com ele não tem relação jurídica, o cadastro ten<strong>de</strong> a não ser contínuo.<br />

Diferenciação quanto à existência <strong>de</strong> requerimento <strong>do</strong> cadastramento:<br />

Banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s – não há consentimento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, que, muitas vezes, sequer tem conhecimento <strong>do</strong> registro.<br />

Cadastro <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res – há consentimento por parte <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res e, algumas situações, presente está o seu<br />

requerimento <strong>de</strong> abertura <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s ao arquivista.<br />

Diferenciação quanto à extensão <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s postos à disposição:<br />

Banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s – como há o objetivo <strong>de</strong> transmissão <strong>de</strong> informações a terceiros, é proibi<strong>do</strong> o juízo <strong>de</strong> valor em relação ao<br />

consumi<strong>do</strong>r. Existem apenas da<strong>do</strong>s objetivos e não valorativos.<br />

Cadastro <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res – é possível a presença <strong>de</strong> juízo <strong>de</strong> valor sobre o consumi<strong>do</strong>r, com informações internas para<br />

orientação exclusivamente <strong>do</strong>s negócios jurídicos <strong>do</strong> arquivista.<br />

Diferenciação quanto à função das informações obtidas:<br />

Banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s – não apresentam a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> utilização subsidiária. As informações constituem o conteú<strong>do</strong><br />

fundamental da existência <strong>do</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s.<br />

Cadastro <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res – os da<strong>do</strong>s são utiliza<strong>do</strong>s com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> controle interno sobre as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

realização <strong>de</strong> negócios jurídicos por parte <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r-arquivista (utilização subsidiária).<br />

VII) Diferenciação quanto ao alcance da divulgação das informações:<br />

a) Banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s – a divulgação é externa e continuada a terceiros, sen<strong>do</strong> essa a sua principal finalida<strong>de</strong> social.<br />

b) Cadastro <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res – a divulgação é apenas interna, no interesse subjetivo <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r-arquivista.<br />

A partir das sete diferenciações apontadas, é possível exemplificar, no plano concreto, quais são as situações envolven<strong>do</strong> as<br />

duas categorias. De início, há bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s nos cadastros negativos <strong>do</strong> SERASA – empresa privada originalmente ligada aos<br />

bancos – e <strong>do</strong> SPC – serviço <strong>de</strong> proteção ao crédito <strong>de</strong> associações <strong>de</strong> comerciantes. Tais cadastros são os que têm a maior<br />

efetivida<strong>de</strong> prática no Brasil, na linha <strong>do</strong> exposto no início <strong>de</strong>ste capítulo, almejan<strong>do</strong> a prestação <strong>de</strong> informações à coletivida<strong>de</strong>, ao<br />

merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo.<br />

Acrescente-se que, no ano <strong>de</strong> 2014 e com gran<strong>de</strong> divergência, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça concluiu que o Sistema <strong>de</strong><br />

Informações <strong>do</strong> Banco Central – SISBACEN tem essa mesma natureza, <strong>de</strong> bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s com intuito negativo ou restritivo<br />

(REsp 1.365.284/SC – Quarta Turma – julga<strong>do</strong> em setembro <strong>de</strong> 2014). Conforme o voto prevalecente, <strong>do</strong> Ministro Luis Felipe<br />

Salomão, “com a massificação <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, surgiu a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma maior organização <strong>de</strong> suas práticas, emergin<strong>do</strong> daí os<br />

bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>de</strong> proteção ao crédito. (…) O BACEN mantém bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s com informações positivas e negativas, o que o<br />

caracteriza como um ‘sistema múltiplo’, sen<strong>do</strong> que em seu viés negativo atua <strong>de</strong> forma similar a qualquer órgão restritivo. (…)<br />

Apesar da natureza <strong>de</strong> cadastro público, é legítimo arquivo <strong>de</strong> consumo para concessão <strong>de</strong> crédito”. Em 2016, tal afirmação<br />

também passou a compor a Edição n. 59 da ferramenta Jurisprudência em Teses, da Corte, a saber: “o Sistema <strong>de</strong> Informações <strong>de</strong><br />

Crédito <strong>do</strong> Banco Central – Sisbacen possui natureza semelhante aos cadastros <strong>de</strong> inadimplentes, ten<strong>do</strong> suas informações<br />

potencialida<strong>de</strong> <strong>de</strong> restringir a concessão <strong>de</strong> crédito ao consumi<strong>do</strong>r” (tese 16).<br />

Por outro la<strong>do</strong>, presentes estão os cadastros <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res na coleta <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s particulariza<strong>do</strong>s no interesse <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res


ou presta<strong>do</strong>res, como nos programas internos <strong>de</strong> pontuação das empresas em geral. Repise-se que tais cadastros não visam a<br />

negativação <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r com o fim <strong>de</strong> informação ao público, mas apenas o incremento das ativida<strong>de</strong>s e negócios das<br />

empresas.<br />

Feitos tais esclarecimentos iniciais, fundamentais para a compreensão da matéria, vejamos as consequências <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong>s<br />

arts. 43 e 44 da Lei 8.078/1990.<br />

8.2.<br />

O CONTEÚDO DOS ARTS. 43 E 44 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E<br />

SEUS EFEITOS. A INTERPRETAÇÃO JURISPRUDENCIAL<br />

Do art. 43 da Lei 8.078/1990 po<strong>de</strong>m ser extraídas três situações concretas relativas aos da<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res: a) a inscrição<br />

ou registro; b) a retificação ou correção das informações; c) o cancelamento da inscrição. Em todas as hipóteses citadas, diante <strong>do</strong>s<br />

princípios da transparência e da confiança, o consumi<strong>do</strong>r terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e<br />

da<strong>do</strong>s pessoais e <strong>de</strong> consumo arquiva<strong>do</strong>s sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes (art. 43, caput). A<strong>de</strong>mais, os<br />

cadastros e da<strong>do</strong>s <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res <strong>de</strong>vem ser objetivos, claros, verda<strong>de</strong>iros e em linguagem <strong>de</strong> fácil compreensão (art. 43, § 1º).<br />

Vejamos, pontualmente, as interpretações relativas às três situações <strong>de</strong>scritas, notadamente a que vem sen<strong>do</strong> dada pela<br />

jurisprudência <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, acompanhada das <strong>de</strong>vidas críticas.<br />

8.2.1.<br />

A inscrição ou registro <strong>do</strong> nome <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res<br />

Enuncia o § 2° <strong>do</strong> art. 43 <strong>do</strong> CDC que a abertura <strong>de</strong> cadastro, ficha, registro e da<strong>do</strong>s pessoais e <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong>verá ser<br />

comunicada por escrito ao consumi<strong>do</strong>r, quan<strong>do</strong> não solicitada por ele. A par <strong>de</strong>sse coman<strong>do</strong>, no que interessa aos cadastros<br />

negativos, Rizzatto Nunes <strong>de</strong>monstra os requisitos para a negativação <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, a saber: a) existência da dívida; b)<br />

vencimento da dívida; c) a dívida há <strong>de</strong> ser liquida (certa quanto à existência, <strong>de</strong>terminada quanto ao valor); d) não po<strong>de</strong> haver<br />

oposição por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em relação à dívida.9 Apesar da exposição <strong>do</strong> último elemento, como se verá, a jurisprudência<br />

superior tem entendi<strong>do</strong> que a simples oposição pelo consumi<strong>do</strong>r não é motivo para a não inscrição.<br />

A respeito da comunicação da inscrição, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça aprovou a Súmula 359, in verbis: “Cabe ao órgão que<br />

mantém o cadastro <strong>de</strong> proteção ao crédito a notificação <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r antes <strong>de</strong> proce<strong>de</strong>r à inscrição”. A ementa representa correta<br />

aplicação <strong>do</strong>s preceitos consumeristas, em prol da boa-fé objetiva. Como se extrai <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s prece<strong>de</strong>ntes que gerou a súmula, “A<br />

comunicação sobre a inscrição nos registros <strong>de</strong> proteção ao crédito é obrigação <strong>do</strong> órgão responsável pela manutenção <strong>do</strong> cadastro,<br />

e não <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r” (STJ – AgRg no REsp 617801/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Humberto Gomes <strong>de</strong> Barros – j. 09.05.2006 –<br />

DJ 29.05.2006, p. 231). Em outro prece<strong>de</strong>nte, constata-se que a falta <strong>de</strong>ssa comunicação po<strong>de</strong> gerar o direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r à<br />

in<strong>de</strong>nização pelos danos morais sofri<strong>do</strong>s (STJ – REsp 442.483/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Barros Monteiro – j. 05.09.2002 –<br />

DJ 12.05.2003, p. 306).<br />

Apesar da interessante amplitu<strong>de</strong> da ementa, perfeita <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista teórico e prático, outra súmula <strong>do</strong> STJ, mais recente,<br />

diminuiu o seu alcance, merecen<strong>do</strong> uma crítica contun<strong>de</strong>nte e cortante. Dispõe a Súmula 404 <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que é<br />

dispensável o Aviso <strong>de</strong> Recebimento (A.R.) na carta <strong>de</strong> comunicação ao consumi<strong>do</strong>r sobre a negativação. Desse mo<strong>do</strong>, basta ao<br />

órgão que mantém o cadastro comprovar que enviou a comunicação por carta ao en<strong>de</strong>reço <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r forneci<strong>do</strong>, não haven<strong>do</strong><br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong> que o último foi efetivamente comunica<strong>do</strong>. Nesse senti<strong>do</strong>, vejamos duas <strong>de</strong>cisões que geraram a<br />

citada súmula:<br />

“Processual civil. Agravo regimental no agravo <strong>de</strong> instrumento. Reexame <strong>de</strong> prova. Súmula 7/STJ. Notificação. Comprovação. Art.<br />

43, § 2º, CDC. 1. Aplica-se a Súmula 7 <strong>do</strong> STJ na hipótese em que a tese versada no recurso especial reclama a análise <strong>do</strong>s<br />

elementos probatórios produzi<strong>do</strong>s ao longo da <strong>de</strong>manda. 2. A responsabilida<strong>de</strong> pela comunicação ao <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>de</strong> que trata o art. 43,<br />

§ 2º, <strong>do</strong> CDC, objetivan<strong>do</strong> a inscrição no cadastro <strong>de</strong> inadimplentes, se consuma com a notificação enviada via postal. 3. Não há<br />

exigência legal <strong>de</strong> que a comunicação <strong>de</strong> que trata o art. 43, § 2º, <strong>do</strong> CDC <strong>de</strong>va ser feita com aviso <strong>de</strong> recebimento. 4. Agravo<br />

regimental <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg no Ag 1.036.919/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – j. 07.10.2008 –<br />

DJe 03.11.2008).<br />

“Inscrição. Cadastro <strong>de</strong> proteção ao crédito. Notificação. En<strong>de</strong>reço. 1. O órgão <strong>de</strong> proteção ao crédito tem o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> notificar<br />

previamente o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r a respeito da inscrição promovida pelo cre<strong>do</strong>r (art. 43, § 2º, CDC). 2. A notificação <strong>de</strong>ve ser enviada ao<br />

en<strong>de</strong>reço forneci<strong>do</strong> pelo cre<strong>do</strong>r. 3. Não comete ato ilícito o órgão <strong>de</strong> proteção ao crédito que envia a notificação ao <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r no<br />

en<strong>de</strong>reço forneci<strong>do</strong> pelo cre<strong>do</strong>r” (STJ – REsp 893.069/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Humberto Gomes <strong>de</strong> Barros – j. 23.10.2007<br />

– DJ 31.10.2007, p. 331).<br />

Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, trata-se <strong>de</strong> um verda<strong>de</strong>iro ultraje ao conceito <strong>de</strong> boa-fé objetiva, a tirar parte da eficácia da Súmula 359


<strong>do</strong> próprio Tribunal da Cidadania. Por óbvio, diante <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova, existente a favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r,<br />

no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>veria o órgão que mantém o cadastro provar que houve a cientificação concreta <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, o que não é acompanha<strong>do</strong> pela lamentável Súmula 404, que <strong>de</strong>veria ser cancelada. A boa-fé objetiva <strong>de</strong>ve ser tida<br />

como concreta e efetiva e não baseada em mera ficção ou suposição, como era no passa<strong>do</strong>, o que <strong>de</strong>monstra que um marco<br />

evolutivo <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> não foi acompanha<strong>do</strong> pela Súmula 404 <strong>do</strong> STJ.<br />

Em continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>, consigne-se que o Tribunal da Cidadania editou, em 2016, a Súmula 572, segun<strong>do</strong> a qual o Banco<br />

<strong>do</strong> Brasil, na condição <strong>de</strong> gestor <strong>do</strong> Cadastro <strong>de</strong> Emitentes <strong>de</strong> Cheques sem Fun<strong>do</strong>s, não tem a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> notificar<br />

previamente o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r acerca da sua inscrição no aludi<strong>do</strong> cadastro. Pela mesma sumular, o Banco também não tem também<br />

legitimida<strong>de</strong> passiva para as ações <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong> danos fundadas na ausência <strong>de</strong> prévia comunicação. Isso porque o cita<strong>do</strong> <strong>de</strong>ver<br />

e a consequente responsabilida<strong>de</strong> civil recaem sobre o órgão que mantém o cadastro, na linha da exposta Súmula 359, da mesma<br />

Corte Superior.<br />

Como palavras finais e em complemento à sumula, a mesma Corte enten<strong>de</strong> <strong>de</strong> forma consolidada que a legitimida<strong>de</strong> passiva<br />

para respon<strong>de</strong>r pela falta <strong>de</strong> comunicação da inscrição é sempre <strong>do</strong> órgão que mantém o cadastro. Nesse senti<strong>do</strong>, a afirmação 5,<br />

constante da Edição n. 59 da sua ferramenta Jurisprudência em Teses, in verbis: “os órgãos mantene<strong>do</strong>res <strong>de</strong> cadastros possuem<br />

legitimida<strong>de</strong> passiva para as ações que buscam a reparação <strong>do</strong>s danos morais e materiais <strong>de</strong>correntes da inscrição, sem prévia<br />

notificação, <strong>do</strong> nome <strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r em seus cadastros restritivos, inclusive quan<strong>do</strong> os da<strong>do</strong>s utiliza<strong>do</strong>s para a negativação são<br />

oriun<strong>do</strong>s <strong>do</strong> CCF <strong>do</strong> Banco Central ou <strong>de</strong> outros cadastros manti<strong>do</strong>s por entida<strong>de</strong>s diversas”. Como prece<strong>de</strong>ntes da tese, são<br />

cita<strong>do</strong>s os seguintes arestos: AgRg no REsp 1.526.114/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Moura Ribeiro, j. 18.08.2015 – DJe<br />

28.08.2015; AgRg no REsp 1.367.998/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Raul Araújo – j. 05/06/2014 – DJe 27.06.2014; AgRg no<br />

AREsp 502.716/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Maria Isabel Gallotti – j. 05.06.2014 – DJe 18.06.2014; EDcl no AREsp<br />

379.471/CE – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 19.09.2013 – DJe 24/09/2013; AgRg no REsp 628.205/RS –<br />

Terceira Turma – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – j. 04.10.2012 – DJe 09/10/2012; e AgRg no REsp 1.133.717/RS –<br />

Terceira Turma – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 28.09.2010 – DJe 21.10.2010).<br />

8.2.2.<br />

A retificação ou correção <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s<br />

No que concerne à retificação ou reparo, estatui o § 3º <strong>do</strong> art. 43 que o consumi<strong>do</strong>r, sempre que encontrar inexatidão nos seus<br />

da<strong>do</strong>s e cadastros, po<strong>de</strong>rá exigir sua imediata correção. Em casos tais, <strong>de</strong>ve o arquivista, no prazo <strong>de</strong> cinco dias úteis, comunicar a<br />

alteração aos eventuais <strong>de</strong>stinatários das informações incorretas, caso <strong>do</strong>s cre<strong>do</strong>res da dívida nas hipóteses <strong>de</strong> negativação. O prazo<br />

é exíguo para evitar maiores danos aos direitos da personalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Em acórdão <strong>de</strong> 2012, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça concluiu que esse prazo <strong>de</strong> cinco dias úteis <strong>de</strong>ve ser aplica<strong>do</strong> para o <strong>de</strong>ver<br />

<strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r <strong>de</strong> retirar o nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>de</strong> cadastro negativo. O prazo é conta<strong>do</strong> da quitação, representan<strong>do</strong> aplicação <strong>do</strong> princípio<br />

da boa-fé objetiva na fase pós-contratual. Vejamos a publicação <strong>de</strong>sse importante julga<strong>do</strong> no Informativo n. 501 da Corte Superior:<br />

“Cadastro <strong>de</strong> inadimplentes. Baixa da inscrição. Responsabilida<strong>de</strong>. Prazo. O cre<strong>do</strong>r é responsável pelo pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> baixa da inscrição<br />

<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes no prazo <strong>de</strong> cinco dias úteis, conta<strong>do</strong>s da efetiva quitação <strong>do</strong> débito, sob pena <strong>de</strong> incorrer<br />

em negligência e consequente responsabilização por danos morais. Isso porque o cre<strong>do</strong>r tem o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> manter os cadastros <strong>do</strong>s<br />

serviços <strong>de</strong> proteção ao crédito atualiza<strong>do</strong>s. Quanto ao prazo, a Min. Relatora <strong>de</strong>finiu-o pela aplicação analógica <strong>do</strong> art. 43, § 3º, <strong>do</strong><br />

CDC, segun<strong>do</strong> o qual o consumi<strong>do</strong>r, sempre que encontrar inexatidão nos seus da<strong>do</strong>s e cadastros, po<strong>de</strong>rá exigir sua imediata<br />

correção, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o arquivista, no prazo <strong>de</strong> cinco dias úteis, comunicar a alteração aos eventuais <strong>de</strong>stinatários das informações<br />

incorretas. O termo inicial para a contagem <strong>do</strong> prazo para baixa no registro <strong>de</strong>verá ser <strong>do</strong> efetivo pagamento da dívida. Assim, as<br />

quitações realizadas mediante cheque, boleto bancário, transferência interbancária, ou outro meio sujeito a confirmação, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rão<br />

<strong>do</strong> efetivo ingresso <strong>do</strong> numerário na esfera <strong>de</strong> disponibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r. A Min. Relatora ressalvou a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estipulação<br />

<strong>de</strong> outro prazo entre as partes, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não seja abusivo, especialmente por tratar-se <strong>de</strong> contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s:<br />

REsp 255.269-PR, DJ 16.04.2001; REsp 437.234-PB, DJ 29.09.2003; AgRg no Ag 1.094.459-SP, DJe 1º.06.2009, e AgRg no REsp<br />

957.880-SP, DJe 14.03.2012” (STJ – REsp 1.149.998/ES – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 07.08.2012).<br />

Essa forma <strong>de</strong> pensar foi confirmada em 2014, em julgamento <strong>de</strong> inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> recursos repetitivos pela Segunda Seção da<br />

mesma Corte Superior. Conforme publicação no Informativo n. 548 <strong>do</strong> STJ, “ciente das regras previstas no CDC, mesmo haven<strong>do</strong><br />

regular inscrição <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r em cadastro <strong>de</strong> órgão <strong>de</strong> proteção ao crédito, após o integral pagamento da dívida, incumbe<br />

ao cre<strong>do</strong>r requerer a exclusão <strong>do</strong> registro <strong>de</strong>sabona<strong>do</strong>r, no prazo <strong>de</strong> cinco dias úteis, a contar <strong>do</strong> primeiro dia útil subsequente à<br />

completa disponibilização <strong>do</strong> numerário necessário à quitação <strong>do</strong> débito venci<strong>do</strong>. A jurisprudência consolidada <strong>do</strong> STJ perfilha o<br />

entendimento <strong>de</strong> que, quan<strong>do</strong> se trata <strong>de</strong> inscrição em bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s restritivos <strong>de</strong> crédito (Serasa, SPC, entre outros), tem-se<br />

entendi<strong>do</strong> ser <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r, e não <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, o ônus da baixa da indicação <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, em virtu<strong>de</strong> <strong>do</strong> que dispõe o art.


43, § 3º, combina<strong>do</strong> com o art. 73, ambos <strong>do</strong> CDC. No caso, o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> ‘exigir’ a ‘imediata correção’ <strong>de</strong> informações<br />

inexatas – não caben<strong>do</strong> a ele, portanto, proce<strong>de</strong>r a tal correção (art. 43, § 3º) –, constituin<strong>do</strong> crime ‘<strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> corrigir<br />

imediatamente informação sobre consumi<strong>do</strong>r constante <strong>de</strong> cadastro, banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, fichas ou registros que sabe ou <strong>de</strong>veria saber<br />

ser inexata’ (art. 73). Quanto ao prazo, como não existe regramento legal específico e como os prazos abrangen<strong>do</strong> situações<br />

específicas não estão <strong>de</strong>vidamente amadureci<strong>do</strong>s na jurisprudência <strong>do</strong> STJ, faz-se necessário o estabelecimento <strong>de</strong> um norte<br />

objetivo, o qual se extrai <strong>do</strong> art. 43, § 3º, <strong>do</strong> CDC, segun<strong>do</strong> o qual o ‘consumi<strong>do</strong>r, sempre que encontrar inexatidão nos seus da<strong>do</strong>s<br />

e cadastros, po<strong>de</strong>rá exigir sua imediata correção, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o arquivista, no prazo <strong>de</strong> cinco dias úteis, comunicar a alteração aos<br />

eventuais <strong>de</strong>stinatários das informações incorretas’. Ora, para os órgãos <strong>de</strong> sistema <strong>de</strong> proteção ao crédito, que exercem a ativida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> arquivamento <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s profissionalmente, o CDC consi<strong>de</strong>ra razoável o prazo <strong>de</strong> cinco dias úteis para, após a investigação <strong>do</strong>s<br />

fatos referentes à impugnação apresentada pelo consumi<strong>do</strong>r, comunicar a retificação a terceiros que <strong>de</strong>les recebeu informações<br />

incorretas. Assim, evi<strong>de</strong>ntemente, esse mesmo prazo também será consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> razoável para que seja requerida a exclusão <strong>do</strong><br />

nome <strong>do</strong> outrora inadimplente <strong>do</strong> cadastro <strong>de</strong>sabona<strong>do</strong>r por aquele que promove, em exercício regular <strong>de</strong> direito, a verídica<br />

inclusão <strong>de</strong> da<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r em cadastro <strong>de</strong> órgão <strong>de</strong> proteção ao crédito” (REsp 1.424.792/BA – Rel. Min. Luis Felipe Salomão –<br />

j. 10.09.2014).<br />

Em outubro <strong>de</strong> 2015, essa maneira <strong>de</strong> julgar consoli<strong>do</strong>u-se <strong>de</strong> tal forma que se transformou na Súmula n. 548 <strong>do</strong> Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça, segun<strong>do</strong> a qual “Incumbe ao cre<strong>do</strong>r a exclusão <strong>do</strong> registro da dívida em nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r no cadastro <strong>de</strong><br />

inadimplentes no prazo <strong>de</strong> cinco dias úteis, a partir <strong>do</strong> integral e efetivo pagamento <strong>do</strong> débito”.<br />

Cabe aqui trazer algumas palavras a respeito da retirada <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>de</strong> cadastro <strong>de</strong> inadimplentes em casos <strong>de</strong> ação<br />

proposta pelo consumi<strong>do</strong>r-<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, para revisão ou discussão da dívida. Na linha das palavras <strong>de</strong> Rizzatto Nunes, acima<br />

transcritas, a jurisprudência superior entendia que a mera contestação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r-<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, por meio da propositura <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>manda, já era motivo para a medida <strong>de</strong> retificação temporária.<br />

Por todas as ementas anteriores, veja-se: “Processo civil. Recurso especial. Agravo regimental. Contrato bancário. Retirada <strong>do</strong><br />

nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s cadastros <strong>de</strong> restrição ao crédito. Obrigação <strong>de</strong> fazer. Descumprimento. Cominação <strong>de</strong> multa. Possibilida<strong>de</strong>.<br />

Valor da multa. Matéria fática. Súmula 7/STJ. Desprovimento. 1. A jurisprudência <strong>do</strong> STJ enten<strong>de</strong> que a fixação <strong>de</strong> multa para o<br />

caso <strong>de</strong> <strong>de</strong>scumprimento <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão judicial, expressa no <strong>de</strong>ver da instituição financeira <strong>de</strong> proce<strong>de</strong>r à retirada <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r<br />

<strong>de</strong> cadastros <strong>de</strong> proteção ao crédito, encontra previsão no art. 461, §§ 3° e 4°, <strong>do</strong> CPC, haja vista a <strong>de</strong>cisão se fundar em uma<br />

obrigação <strong>de</strong> fazer. Prece<strong>de</strong>ntes. 2. A discussão sobre o valor da multa implica reexame <strong>de</strong> matéria fático-probatória, hipótese que<br />

atrai a aplicação da Súmula 7/STJ. Prece<strong>de</strong>ntes. 3. Agravo regimental <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg no REsp 681.080/RS – Quarta<br />

Turma – Rel. Min. Jorge Scartezzini – j. 05.10.2006 – DJ 20.11.2006, p. 314).<br />

Entretanto, houve uma lamentável reviravolta na jurisprudência superior. Em notório julgamento <strong>de</strong> inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> recursos<br />

repetitivos, relativo à revisão <strong>de</strong> contratos bancários, consoli<strong>do</strong>u-se o entendimento no STJ no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que, para a retirada <strong>do</strong><br />

nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>do</strong> cadastro, é necessário o <strong>de</strong>pósito da parte incontroversa da obrigação, ou prestação <strong>de</strong> caução. Além disso, o<br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r necessita comprovar a verossimilhança <strong>de</strong> suas alegações com base na jurisprudência superior, a fim <strong>de</strong> obter a <strong>de</strong>cisão<br />

temporária <strong>de</strong> retirada <strong>do</strong> cadastro, por meio <strong>de</strong> tutela antecipada, ou liminar em cautelar. Transcreve-se a longa ementa na íntegra,<br />

para as <strong>de</strong>vidas reflexões:<br />

“<strong>Direito</strong> processual civil e bancário. Recurso especial. Ação revisional <strong>de</strong> cláusulas <strong>de</strong> contrato bancário. Inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> processo<br />

repetitivo. Juros remuneratórios. Configuração da mora. Juros moratórios. Inscrição/manutenção em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes.<br />

Disposições <strong>de</strong> ofício. Delimitação <strong>do</strong> julgamento. Constatada a multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> recursos com fundamento em idêntica questão <strong>de</strong><br />

direito, foi instaura<strong>do</strong> o inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> processo repetitivo referente aos contratos bancários subordina<strong>do</strong>s ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r, nos termos da ADI 2.591-1. Exceto: cédulas <strong>de</strong> crédito rural, industrial, bancária e comercial; contratos celebra<strong>do</strong>s por<br />

cooperativas <strong>de</strong> crédito; contratos regi<strong>do</strong>s pelo Sistema Financeiro <strong>de</strong> Habitação, bem como os <strong>de</strong> crédito consigna<strong>do</strong>. Para os<br />

efeitos <strong>do</strong> § 7º <strong>do</strong> art. 543-C <strong>do</strong> CPC, a questão <strong>de</strong> direito idêntica, além <strong>de</strong> estar selecionada na <strong>de</strong>cisão que instaurou o inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />

processo repetitivo, <strong>de</strong>ve ter si<strong>do</strong> expressamente <strong>de</strong>batida no acórdão recorri<strong>do</strong> e nas razões <strong>do</strong> recurso especial, preenchen<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s<br />

os requisitos <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong>. Neste julgamento, os requisitos específicos <strong>do</strong> inci<strong>de</strong>nte foram verifica<strong>do</strong>s quanto às seguintes<br />

questões: i) juros remuneratórios; ii) configuração da mora; iii) juros moratórios; iv) inscrição/manutenção em cadastro <strong>de</strong><br />

inadimplentes; e v) disposições <strong>de</strong> ofício. Preliminar: O Parecer <strong>do</strong> MPF opinou pela suspensão <strong>do</strong> recurso até o julgamento<br />

<strong>de</strong>finitivo da ADI 2.316/DF. Preliminar rejeitada ante a presunção <strong>de</strong> constitucionalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> art. 5º da MP 1.963-17/00, reeditada<br />

sob o nº 2.170-36/01. I. Julgamento das questões idênticas que caracterizam a multiplicida<strong>de</strong>. Orientação 1: Juros remuneratórios. a)<br />

As instituições financeiras não se sujeitam à limitação <strong>do</strong>s juros remuneratórios estipulada na Lei <strong>de</strong> Usura (Decreto 22.626/1933),<br />

Súmula 596/STF; b) A estipulação <strong>de</strong> juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusivida<strong>de</strong>; c) São<br />

inaplicáveis aos juros remuneratórios <strong>do</strong>s contratos <strong>de</strong> mútuo bancário as disposições <strong>do</strong> art. 591 c/c o art. 406 <strong>do</strong> CC/2002; d) É<br />

admitida a revisão das taxas <strong>de</strong> juros remuneratórios em situações excepcionais, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que caracterizada a relação <strong>de</strong> consumo e que<br />

a abusivida<strong>de</strong> (capaz <strong>de</strong> colocar o consumi<strong>do</strong>r em <strong>de</strong>svantagem exagerada – art. 51, § 1º, <strong>do</strong> CDC) fique cabalmente <strong>de</strong>monstrada,<br />

ante as peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> julgamento em concreto. Orientação 2: Configuração da mora. a) O reconhecimento da abusivida<strong>de</strong> nos


encargos exigi<strong>do</strong>s no perío<strong>do</strong> da normalida<strong>de</strong> contratual (juros remuneratórios e capitalização) <strong>de</strong>scaracteriza a mora; b) Não<br />

<strong>de</strong>scaracteriza a mora o ajuizamento isola<strong>do</strong> <strong>de</strong> ação revisional, nem mesmo quan<strong>do</strong> o reconhecimento <strong>de</strong> abusivida<strong>de</strong> incidir sobre<br />

os encargos inerentes ao perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> inadimplência contratual. Orientação 3: Juros moratórios. Nos contratos bancários, não regi<strong>do</strong>s<br />

por legislação específica, os juros moratórios po<strong>de</strong>rão ser convenciona<strong>do</strong>s até o limite <strong>de</strong> 1% ao mês. Orientação 4:<br />

Inscrição/manutenção em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes. a) A abstenção da inscrição/manutenção em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes,<br />

requerida em antecipação <strong>de</strong> tutela e/ou medida cautelar, somente será <strong>de</strong>ferida se, cumulativamente: i) a ação for fundada em<br />

questionamento integral ou parcial <strong>do</strong> débito; ii) houver <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> que a cobrança in<strong>de</strong>vida se funda na aparência <strong>do</strong> bom<br />

direito e em jurisprudência consolidada <strong>do</strong> STF ou STJ; iii) houver <strong>de</strong>pósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução<br />

fixada conforme o pru<strong>de</strong>nte arbítrio <strong>do</strong> juiz; b) A inscrição/manutenção <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes <strong>de</strong>cidida<br />

na sentença ou no acórdão observará o que for <strong>de</strong>cidi<strong>do</strong> no mérito <strong>do</strong> processo. Caracterizada a mora, correta a<br />

inscrição/manutenção. Orientação 5: Disposições <strong>de</strong> ofício. É veda<strong>do</strong> aos juízes <strong>de</strong> primeiro e segun<strong>do</strong> graus <strong>de</strong> jurisdição julgar,<br />

com fundamento no art. 51 <strong>do</strong> CDC, sem pedi<strong>do</strong> expresso, a abusivida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusulas nos contratos bancários. Venci<strong>do</strong>s quanto a<br />

esta matéria a Min. Relatora e o Min. Luis Felipe Salomão. II. Julgamento <strong>do</strong> recurso representativo (REsp 1.061.530/RS). A<br />

menção a artigo <strong>de</strong> lei, sem a <strong>de</strong>monstração das razões <strong>de</strong> inconformida<strong>de</strong>, impõe o não conhecimento <strong>do</strong> recurso especial, em razão<br />

da sua <strong>de</strong>ficiente fundamentação. Incidência da Súmula 284/STF. O recurso especial não constitui via a<strong>de</strong>quada para o exame <strong>de</strong><br />

temas constitucionais, sob pena <strong>de</strong> usurpação da competência <strong>do</strong> STF. Devem ser <strong>de</strong>cotadas as disposições <strong>de</strong> ofício realizadas pelo<br />

acórdão recorri<strong>do</strong>. Os juros remuneratórios contrata<strong>do</strong>s encontram-se no limite que esta Corte tem consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> razoável e, sob a<br />

ótica <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, não merecem ser revistos, porquanto não <strong>de</strong>monstrada a onerosida<strong>de</strong> excessiva na hipótese.<br />

Verificada a cobrança <strong>de</strong> encargo abusivo no perío<strong>do</strong> da normalida<strong>de</strong> contratual, resta <strong>de</strong>scaracterizada a mora <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r. Afastada<br />

a mora: i) é ilegal o envio <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r para quaisquer cadastros <strong>de</strong> inadimplência; ii) <strong>de</strong>ve o consumi<strong>do</strong>r permanecer na<br />

posse <strong>do</strong> bem aliena<strong>do</strong> fiduciariamente; e iii) não se admite o protesto <strong>do</strong> título representativo da dívida. Não há qualquer vedação<br />

legal à efetivação <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósitos parciais, segun<strong>do</strong> o que a parte enten<strong>de</strong> <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>. Não se conhece <strong>do</strong> recurso quanto à comissão <strong>de</strong><br />

permanência, pois <strong>de</strong>ficiente o fundamento no tocante à alínea “a” <strong>do</strong> permissivo constitucional e também pelo fato <strong>de</strong> o dissídio<br />

jurispru<strong>de</strong>ncial não ter si<strong>do</strong> comprova<strong>do</strong>, mediante a realização <strong>do</strong> cotejo entre os julga<strong>do</strong>s ti<strong>do</strong>s como divergentes. Venci<strong>do</strong>s quanto<br />

ao conhecimento <strong>do</strong> recurso a Min. Relatora e o Min. Carlos Fernan<strong>do</strong> Mathias. Recurso especial parcialmente conheci<strong>do</strong> e, nesta<br />

parte, provi<strong>do</strong>, para <strong>de</strong>clarar a legalida<strong>de</strong> da cobrança <strong>do</strong>s juros remuneratórios, como pactua<strong>do</strong>s, e ainda <strong>de</strong>cotar <strong>do</strong> julgamento as<br />

disposições <strong>de</strong> ofício. Ônus sucumbenciais redistribuí<strong>do</strong>s” (STJ – REsp 1061530/RS – Segunda Seção – Rel. Min. Nancy Andrighi<br />

– j. 22.10.2008 – DJe 10.03.2009).<br />

Cumpre <strong>de</strong>stacar que, <strong>do</strong> julgamento, surgiram quatro súmulas <strong>do</strong> STJ a respeito da matéria: “A estipulação <strong>de</strong> juros<br />

remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusivida<strong>de</strong>” (Súmula 382); “Nos contratos bancários, é veda<strong>do</strong> ao<br />

julga<strong>do</strong>r conhecer, <strong>de</strong> ofício, da abusivida<strong>de</strong> das cláusulas” (Súmula 381); “A simples propositura da ação <strong>de</strong> revisão <strong>de</strong> contrato<br />

não inibe a caracterização da mora <strong>do</strong> autor” (Súmula 380); “Nos contratos bancários não regi<strong>do</strong>s por legislação específica, os<br />

juros moratórios po<strong>de</strong>rão ser convenciona<strong>do</strong>s até o limite <strong>de</strong> 1% ao mês” (Súmula 379).<br />

Em complemento, nota-se que as exigências expostas passaram a compor a ferramenta Jurisprudência em Teses, <strong>do</strong> STJ, que<br />

em sua Edição n. 59 trata <strong>do</strong> Cadastro <strong>de</strong> Inadimplentes (publicada em 2016). Conforme a sua premissa 12, “a abstenção da<br />

inscrição/manutenção em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes, requerida em antecipação <strong>de</strong> tutela e/ou medida cautelar, somente será<br />

<strong>de</strong>ferida se, cumulativamente: a) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial <strong>do</strong> débito; b) houver <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong><br />

que a cobrança in<strong>de</strong>vida se funda na aparência <strong>do</strong> bom direito e em jurisprudência consolidada <strong>do</strong> STF ou STJ; c) houver <strong>de</strong>pósito<br />

da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o pru<strong>de</strong>nte arbítrio <strong>do</strong> juiz”.<br />

Sem prejuízo <strong>de</strong> outras críticas aqui antes <strong>de</strong>monstradas, as ementas transcritas representam um excesso <strong>de</strong> proteção das<br />

entida<strong>de</strong>s bancárias em <strong>de</strong>trimento <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> um retrocesso <strong>do</strong> Tribunal Superior a respeito <strong>de</strong>sses temas<br />

correlatos.<br />

Relativamente à retirada <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>do</strong> cadastro, o retrocesso, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, é flagrante. Pela leitura <strong>do</strong> resumo<br />

<strong>do</strong> julgamento, constata-se que a jurisprudência exige uma soma <strong>de</strong> elementos que, por muitas vezes, é inalcançável (ação judicial<br />

<strong>de</strong> questionamento <strong>do</strong> débito + <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> que a cobrança in<strong>de</strong>vida se funda na aparência <strong>do</strong> bom direito e em jurisprudência<br />

consolidada <strong>do</strong> STF ou STJ + <strong>de</strong>pósito da parcela incontroversa ou prestação <strong>de</strong> caução pelo juiz).<br />

No que tange ao <strong>de</strong>pósito da parte incontroversa, a questão passou a ser tratada pelo Código <strong>de</strong> Processo Civil <strong>de</strong> 1973, ten<strong>do</strong><br />

si<strong>do</strong> inseri<strong>do</strong> o art. 285-B no Estatuto Processual anterior, pela Lei 12.810/2013. De acor<strong>do</strong> com o dispositivo, nos litígios que<br />

tivessem por objeto obrigações <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> empréstimo, financiamento ou arrendamento mercantil, o autor <strong>de</strong>veria discriminar<br />

na petição inicial, <strong>de</strong>ntre as obrigações contratuais, aquelas que preten<strong>de</strong>sse controverter, quantifican<strong>do</strong> o valor incontroverso.<br />

A<strong>de</strong>mais, o valor incontroverso <strong>de</strong>veria continuar sen<strong>do</strong> pago no tempo e mo<strong>do</strong> contrata<strong>do</strong>s.<br />

O Novo CPC repetiu a regra e até a ampliou, impon<strong>do</strong> expressamente a pena <strong>de</strong> inépcia da petição inicial, no caso <strong>de</strong> seu<br />

<strong>de</strong>srespeito. Conforme o art. 330, § 2º, <strong>do</strong> CPC/2015, “nas ações que tenham por objeto a revisão <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong><br />

empréstimo, <strong>de</strong> financiamento ou <strong>de</strong> alienação <strong>de</strong> bens, o autor terá <strong>de</strong>, sob pena <strong>de</strong> inépcia, discriminar na petição inicial, <strong>de</strong>ntre<br />

as obrigações contratuais, aquelas que preten<strong>de</strong> controverter, além <strong>de</strong> quantificar o valor incontroverso <strong>do</strong> débito”. O § 3º <strong>do</strong>


coman<strong>do</strong> complementa esse tratamento, na linha <strong>do</strong> anterior, prescreven<strong>do</strong> que o valor incontroverso <strong>de</strong>verá continuar a ser pago<br />

no tempo e mo<strong>do</strong> contrata<strong>do</strong>s.<br />

A ilustrar a exigência <strong>de</strong> tais requisitos para a retirada <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r em cadastros negativos, o STJ <strong>de</strong>duziu que “é<br />

lícita a inscrição <strong>do</strong>s nomes <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res em cadastros <strong>de</strong> proteção ao crédito por conta da existência <strong>de</strong> débitos discuti<strong>do</strong>s<br />

judicialmente em processos <strong>de</strong> busca e apreensão, cobrança ordinária, concordata, <strong>de</strong>spejo por falta <strong>de</strong> pagamento, embargos,<br />

execução fiscal, falência ou execução comum na hipótese em que os da<strong>do</strong>s referentes às disputas judiciais sejam públicos e, além<br />

disso, tenham si<strong>do</strong> repassa<strong>do</strong>s pelos próprios cartórios <strong>de</strong> distribuição <strong>de</strong> processos judiciais às entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>tentoras <strong>do</strong>s cadastros<br />

por meio <strong>de</strong> convênios firma<strong>do</strong>s com o Po<strong>de</strong>r Judiciário <strong>de</strong> cada esta<strong>do</strong> da Fe<strong>de</strong>ração, sem qualquer intervenção <strong>do</strong>s cre<strong>do</strong>res<br />

litigantes ou <strong>de</strong> qualquer fonte privada. Os da<strong>do</strong>s referentes a processos judiciais que não corram em segre<strong>do</strong> <strong>de</strong> justiça são<br />

informações públicas nos termos <strong>do</strong>s art. 5º, XXXIII e LX, da CF, visto que publicadas na imprensa oficial, portanto <strong>de</strong> acesso a<br />

qualquer interessa<strong>do</strong>, mediante pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> certidão, conforme autoriza o parágrafo único <strong>do</strong> art. 155 <strong>do</strong> CPC. Sen<strong>do</strong>, portanto,<br />

da<strong>do</strong>s públicos, as entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>tentoras <strong>de</strong> cadastros <strong>de</strong> proteção ao crédito não po<strong>de</strong>m ser impedidas <strong>de</strong> fornecê-los aos seus<br />

associa<strong>do</strong>s, sob pena <strong>de</strong> grave afronta ao Esta<strong>do</strong> Democrático <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>, que prima, como regra, pela publicida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s atos<br />

processuais. Deve-se <strong>de</strong>stacar, nesse contexto, que o princípio da publicida<strong>de</strong> processual existe para permitir a to<strong>do</strong>s o acesso aos<br />

atos <strong>do</strong> processo, exatamente como meio <strong>de</strong> dar transparência à ativida<strong>de</strong> jurisdicional. Além disso, o fato <strong>de</strong> as entida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong>tentoras <strong>do</strong>s cadastros fornecerem aos seus associa<strong>do</strong>s informações processuais representa medida menos burocrática e mais<br />

econômica tanto para os associa<strong>do</strong>s, que não precisarão se dirigir, a cada novo negócio jurídico, ao distribui<strong>do</strong>r forense para pedir<br />

uma certidão em nome daquele com quem se negociará, quanto para o próprio Po<strong>de</strong>r Judiciário, que emitirá um número menor <strong>de</strong><br />

certidões <strong>de</strong> distribuição, o que implicará menor sobrecarga aos funcionários responsáveis pela tarefa. O STJ, a<strong>de</strong>mais, tem o<br />

entendimento pacifica<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a simples discussão judicial da dívida não é suficiente para obstaculizar ou remover a negativação<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r em banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s. Por fim, ressalve-se que, em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> inscrição <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s públicos, como os <strong>de</strong><br />

cartórios <strong>de</strong> protesto <strong>de</strong> títulos ou <strong>de</strong> distribuição <strong>de</strong> processos judiciais, sequer se exige a prévia comunicação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Consequentemente, a ausência <strong>de</strong> prece<strong>de</strong>nte comunicação nesses casos não enseja dano moral. Prece<strong>de</strong>nte cita<strong>do</strong>: REsp<br />

866.198/SP, Terceira Turma, DJe 5/2/2007” (STJ – REsp 1.148.179/MG – Rel. Min. Nancy Andrigui – j. 26.02.2013).<br />

Em suma, na opinião <strong>de</strong>ste autor, a soma <strong>de</strong> tais requisitos afasta-se da ampla tutela esperada em benefício <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r,<br />

tornan<strong>do</strong> praticamente impossível a revisão <strong>de</strong> negócios abusivos e a retirada <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>do</strong> cadastro negativo em muitos<br />

casos concretos.<br />

8.2.3.<br />

O cancelamento da inscrição<br />

Quanto ao cancelamento da inscrição no banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s ou cadastro, o § 1° <strong>do</strong> art. 43 <strong>do</strong> CDC <strong>de</strong>termina em sua parte final<br />

que não po<strong>de</strong>m os cadastros conter informações negativas referentes a perío<strong>do</strong> superior a cinco anos. Em outras palavras, após<br />

cinco anos da inscrição ocorrerá a sua caducida<strong>de</strong>, sen<strong>do</strong> o referi<strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> natureza <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>do</strong> direito potestativo <strong>de</strong><br />

inscrição. Em complemento ao dispositivo legal, o teor da Súmula 323 <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, <strong>de</strong> 2009, a saber: “A<br />

inscrição <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> ser mantida nos serviços <strong>de</strong> proteção ao crédito até o prazo máximo <strong>de</strong> cinco anos,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da prescrição da execução”.<br />

A menção à prescrição ao final da ementa sumular representa incidência <strong>do</strong> § 5° <strong>do</strong> art. 43, segun<strong>do</strong> o qual, consumada a<br />

prescrição relativa à cobrança <strong>de</strong> débitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, não serão fornecidas, pelos respectivos sistemas <strong>de</strong> proteção ao crédito,<br />

quaisquer informações que possam impedir ou dificultar novo acesso ao crédito junto aos fornece<strong>do</strong>res. Desse mo<strong>do</strong>, haven<strong>do</strong><br />

prescrição <strong>do</strong> débito correspon<strong>de</strong>nte, o nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve ser retira<strong>do</strong> imediatamente <strong>do</strong> cadastro, sob as penas da lei. Se o<br />

prazo prescricional <strong>do</strong> débito for maior <strong>do</strong> que os cinco anos, mesmo assim <strong>de</strong>ve ocorrer o cancelamento, pelo respeito ao teto<br />

temporal quinquenal estabeleci<strong>do</strong> na norma consumerista em prol <strong>do</strong>s vulneráveis negociais.<br />

Em complemento, conforme reconhece a jurisprudência superior nos prece<strong>de</strong>ntes que geraram a última súmula, “o prazo<br />

prescricional referi<strong>do</strong> no art. 43, § 5º, <strong>do</strong> CDC, é o da ação <strong>de</strong> cobrança, não o da ação executiva” (STJ – REsp 676.678/RS –<br />

Quarta Turma – Rel. Min. Jorge Scartezzini – j. 18.11.2004 – DJ 06.12.2004, p. 338; STJ – REsp 631.451/RS – Terceira Turma –<br />

Rel. Min. Carlos Alberto Menezes <strong>Direito</strong> – j. 26.08.2004 – DJ 16.11.2004, p. 278). A fim <strong>de</strong> esclarecer, a título ilustrativo, o<br />

prazo prescricional para a execução <strong>de</strong> um cheque é <strong>de</strong> seis meses após a sua apresentação (art. 59 da Lei <strong>do</strong> Cheque, Lei<br />

7.357/1985). Todavia, mesmo sen<strong>do</strong> um título <strong>de</strong> crédito abstrato, o cheque po<strong>de</strong> estar estriba<strong>do</strong> em um instrumento público ou<br />

particular <strong>de</strong> confissão <strong>de</strong> dívida que encerra uma obrigação líquida, sujeito a um prazo prescricional <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> cinco anos,<br />

que vale para fins <strong>de</strong> interpretação <strong>do</strong> coman<strong>do</strong> consumerista (art. 206, § 5º, inc. I, <strong>do</strong> CC/2002). Esclareça-se, para os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s<br />

fins, que o prazo prescricional <strong>de</strong> três anos, previsto na codificação privada para a cobrança <strong>de</strong> valores constantes em títulos <strong>de</strong><br />

crédito, somente tem incidência para os títulos atípicos, aqueles sem tratamento legal específico (arts. 206, § 3º, inc. VIII e 903 <strong>do</strong>


CC/2002). De toda sorte, há julga<strong>do</strong>s que aplicam o último prazo, por ser mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r:<br />

“Sistema <strong>de</strong> proteção ao crédito. Inscrição em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes. Cancelamento. Prazo. Exclusão <strong>do</strong> registro após cinco<br />

anos, já em fase recursal o processo. O prazo para cancelamento <strong>de</strong> registro em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes é <strong>de</strong> três anos a contar da<br />

inscrição, quan<strong>do</strong> a obrigação esteja representada por título cambial (CDC, art. 43, §§ 1º e 5º), prazo mais favorável que se presume<br />

em proveito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r na ausência <strong>de</strong> prova em contrário (CDC, art. 6º, inc. VIII). Inteligência da Súmula 13 <strong>do</strong> TJRS.<br />

Cheques. Prazo da ação executiva. Fluí<strong>do</strong>s mais <strong>de</strong> seis meses previstos legalmente, viável a ação que visa cancelamento <strong>do</strong><br />

registro. Não há falar-se em falta <strong>de</strong> interesse <strong>de</strong> recorrer se, após a sentença <strong>de</strong> improcedência, o autor recorre e, entrementes, há o<br />

cancelamento administrativo <strong>do</strong> registro, pelo <strong>de</strong>curso <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> cinco anos. Hipótese em que não se altera o interesse <strong>de</strong> agir,<br />

reconhecen<strong>do</strong>-se o direito busca<strong>do</strong> na inicial. Imposição à recorrida <strong>do</strong>s ônus da sucumbência. Apelação provida” (TJRS – Apelação<br />

Cível 70008066425, Porto Alegre – Décima Nona Câmara Cível – Rel. Des. Jorge A<strong>de</strong>lar Finatto – j. 18.05.2004).<br />

Outra questão <strong>de</strong> relevo diz respeito ao início <strong>de</strong>ssa contagem <strong>do</strong>s cinco anos. Conforme aresto publica<strong>do</strong> no Informativo n.<br />

588 <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania, em 2016, “o termo inicial <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> permanência <strong>de</strong> registro <strong>de</strong> nome <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r em cadastro<br />

<strong>de</strong> proteção ao crédito (art. 43, § 1º, <strong>do</strong> CDC) inicia-se no dia subsequente ao vencimento da obrigação não paga,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da data da inscrição no cadastro. Quanto ao início da contagem <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> 5 anos a que se refere o § 1º <strong>do</strong> art.<br />

43 <strong>do</strong> CDC, vale ressaltar que – não obstante mencionada, em alguns julga<strong>do</strong>s <strong>do</strong> STJ, a indicação <strong>de</strong> que esse prazo passaria a<br />

contar da ‘data da inclusão’ <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r (conforme constou, por exemplo, da <strong>de</strong>cisão monocrática proferida no REsp<br />

656.110-RS, DJ 19/8/2004) ou ‘após o quinto ano <strong>do</strong> registro’ (expressão que aparece no REsp 472.203-RS, Segunda Seção, DJ<br />

23/6/2004) – o termo inicial <strong>do</strong> prazo previsto no § 1º <strong>do</strong> art. 43 nunca foi o cerne da discussão <strong>de</strong>sses prece<strong>de</strong>ntes, merecen<strong>do</strong>,<br />

portanto, melhor reflexão. É verda<strong>de</strong> que não constou <strong>do</strong> § 1º <strong>do</strong> art. 43 <strong>do</strong> CDC regra expressa sobre o início da fluência <strong>do</strong> prazo<br />

relativo ao ‘perío<strong>do</strong> superior a cinco anos’. Entretanto, mesmo em uma exegese puramente literal da norma, é possível inferir que o<br />

legisla<strong>do</strong>r quis se referir, ao utilizar a expressão ‘informações negativas referentes a perío<strong>do</strong> superior a cinco anos’, a ‘informações<br />

relacionadas, relativas, referentes a fatos pertencentes a perío<strong>do</strong> superior a cinco anos’, conforme ressalta entendimento<br />

<strong>do</strong>utrinário. E, sen<strong>do</strong> assim, em linha <strong>do</strong>utrinária, conclui-se que ‘o termo inicial <strong>de</strong> contagem <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong>ve ser o da data <strong>do</strong> ato<br />

ou fato que está em registro e não a data <strong>do</strong> registro, eis que, se assim fosse, aí sim a lei estaria autorizan<strong>do</strong> que as anotações<br />

fossem perpétuas’, pois ‘bastaria que elas passassem <strong>de</strong> um banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s para outro ou para um banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s novo’”.<br />

Tal interpretação, segun<strong>do</strong> o Relator <strong>do</strong> voto vence<strong>do</strong>r, também <strong>de</strong>corre <strong>do</strong> fato <strong>de</strong> ser o CDC norma <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública que<br />

orienta uma interpretação mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r (STJ – REsp 1.316.117/SC – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha, Rel. para<br />

acórdão Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 26.04.2016, DJe 19.08.2016). Aqui acertou totalmente o Tribunal Superior,<br />

merecen<strong>do</strong> o julgamento da maioria o nosso apoio.<br />

Deve ficar claro que, se o nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r for manti<strong>do</strong> inscrito no cadastro após os prazos analisa<strong>do</strong>s, configura<strong>do</strong> está o<br />

ilícito consumerista, a gerar a responsabilização civil <strong>do</strong> órgão mantene<strong>do</strong>r por to<strong>do</strong>s os prejuízos suporta<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r,<br />

sejam eles materiais ou morais (manutenção in<strong>de</strong>vida). A responsabilida<strong>de</strong>, como não po<strong>de</strong>ria ser diferente, é objetiva ou<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> culpa, o que está em sintonia com o sistema a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pela Lei 8.078/1990 (como exemplos: TRF da 5ª<br />

Região – Apelação Cível 400813 – Processo 2003.82.00.009398-0, Paraíba – Primeira Turma – Rel. Des. Fed. Rogério Fialho<br />

Moreira – DJETRF5 18.05.2010; TJDF – Recurso 2010.09.1.011785-7 – Acórdão 458.307 – Primeira Turma Recursal <strong>do</strong>s<br />

Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis e Criminais – Rel. Juíza Sandra Reves Vasques Tonussi – DJDFTE 03.11.2010, p. 208).<br />

Encerran<strong>do</strong> o estu<strong>do</strong> da matéria <strong>do</strong> cancelamento <strong>do</strong>s registros, repise-se que, no caso <strong>de</strong> pagamento da dívida ou acor<strong>do</strong> entre<br />

as partes, cabe ao cre<strong>do</strong>r tomar as medidas para a retirada <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>de</strong> cadastro <strong>de</strong> inadimplentes, sob pena <strong>de</strong> sua<br />

responsabilização civil. A hipótese representa clara aplicação da boa-fé objetiva na fase pós-contratual, presente a violação<br />

positiva da obrigação, por quebra <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver anexo <strong>de</strong> colaboração, caso o cre<strong>do</strong>r não tome as medidas cabíveis (responsabilida<strong>de</strong><br />

post pactum finitum).10 Nesse contexto, da jurisprudência superior: “constitui obrigação <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r provi<strong>de</strong>nciar, junto ao órgão<br />

cadastral <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, a baixa <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r após a quitação da dívida que motivou a inscrição, sob pena <strong>de</strong>, assim não<br />

proce<strong>de</strong>n<strong>do</strong> em tempo razoável, respon<strong>de</strong>r pelo ato moralmente lesivo, in<strong>de</strong>nizan<strong>do</strong> o prejudica<strong>do</strong> pelos danos morais causa<strong>do</strong>s”<br />

(STJ – REsp 870.582/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 23.10.2007 – DJ 10.12.2007, p. 380).<br />

Na mesma linha, o Enuncia<strong>do</strong> n. 26 <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> São Paulo, que assim dispõe: “O<br />

cancelamento <strong>de</strong> inscrição em órgãos restritivos <strong>de</strong> crédito após o pagamento <strong>de</strong>ve ser procedi<strong>do</strong> pelo responsável pela inscrição,<br />

em prazo razoável, não superior a <strong>de</strong>z dias, sob pena <strong>de</strong> importar em in<strong>de</strong>nização por dano moral”. Como visto anteriormente, o<br />

STJ enten<strong>de</strong> que esse prazo é <strong>de</strong> cinco dias úteis, o que <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> para os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s fins práticos (REsp 1.149.998/ES e<br />

Súmula n. 548 da Corte).<br />

Analisa<strong>do</strong> o tema <strong>do</strong> cancelamento <strong>do</strong> registro, é preciso trazer à tona outras questões relativas à in<strong>de</strong>nização pela inscrição<br />

in<strong>de</strong>vida <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r nos cadastros negativos.


8.2.4. A reparação <strong>do</strong>s danos nos casos <strong>de</strong> inscrição in<strong>de</strong>vida <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r. Crítica à Súmula<br />

385 <strong>do</strong> STJ. Prazo para se pleitear a reparação<br />

Como ficou claro, matéria <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> relevância prática é a relativa à inscrição in<strong>de</strong>vida <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r nos cadastros<br />

negativos. Apesar <strong>de</strong> sua notória caracterização como ilícito puro, o presente autor enten<strong>de</strong> que o melhor enquadramento da<br />

hipótese é como abuso <strong>de</strong> direito, por quebra da boa-fé objetiva e da função social. Serve como luva, portanto, o art. 187 <strong>do</strong><br />

CC/2002, em diálogo das fontes (“Também comete ato ilícito o titular <strong>de</strong> um direito que, ao exercê-lo, exce<strong>de</strong> manifestamente os<br />

limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”).<br />

Como outrora exposto nesta obra, a inscrição <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r por parte <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r, quan<strong>do</strong> a dívida efetivamente existe,<br />

constitui exercício regular <strong>de</strong> direito, a afastar o ilícito civil (art. 188, inc. II, <strong>do</strong> CC/2002). Daí <strong>de</strong>corre a correta <strong>de</strong>dução <strong>de</strong> que,<br />

se a dívida inexiste e a inscrição é feita, presente está o exercício irregular <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> crédito. Consigne-se que várias <strong>de</strong>cisões<br />

jurispru<strong>de</strong>nciais aplicam corretamente o conceito <strong>de</strong> abuso <strong>de</strong> direito em casos tais (ver: TJMG – Apelação Cível 0189607-<br />

96.2009.8.13.0028, Andrelândia – Décima Oitava Câmara Cível – Rel. Desig. Des. Arnal<strong>do</strong> Maciel – j. 23.11.2010 – DJEMG<br />

13.12.2010; TJRS – Apelação Cível 70035809540, Porto Alegre – Décima Sexta Câmara Cível – Rel. Des. Paulo Sergio Scarparo<br />

– j. 24.06.2010 – DJERS 01.07.2010; TJBA – Recurso 59714-7/2002-1 – Segunda Turma Recursal – Rel. Juíza Sandra Inês<br />

Moraes Rusciolelli Azeve<strong>do</strong> – DJBA 09.10.2009; TJRJ – Apelação 2009.001.15841 – Décima Sétima Câmara Cível – Rel. Des.<br />

Raul Celso Lins e Silva – DORJ 29.04.2009, p. 204; TJDF – Apelação Cível 2007.06.1.002814-8 – Acórdão 281232 – Segunda<br />

Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais – Rel. Juiz Alfeu Macha<strong>do</strong> – DJU 18.09.2007, p. 150).<br />

A configuração da hipótese como abuso <strong>de</strong> direito serve para reforçar a responsabilida<strong>de</strong> objetiva ou sem culpa no caso <strong>de</strong><br />

inscrição in<strong>de</strong>vida, além da incidência <strong>de</strong> vários preceitos <strong>do</strong> CDC. A propósito da natureza <strong>de</strong>ssa responsabilização, na VI<br />

Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil (2013), aprovou-se o Enuncia<strong>do</strong> n. 553 <strong>do</strong> CJF/STJ, in verbis: “nas ações <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil por<br />

cadastramento in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> nos registros <strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>res inadimplentes realiza<strong>do</strong>s por instituições financeiras, a responsabilida<strong>de</strong> civil é<br />

objetiva”. Feita tal pontuação, na esteira <strong>do</strong>s acórdãos antes cita<strong>do</strong>s, vale dizer que a inscrição in<strong>de</strong>vida não está caracterizada<br />

somente nas hipóteses em que a dívida inexiste ou é inválida, mas também quan<strong>do</strong> não há a comunicação prévia por parte <strong>do</strong> órgão<br />

que mantém o cadastro, em <strong>de</strong>srespeito à citada Súmula 359 <strong>do</strong> STJ. Há que se falar igualmente em manutenção in<strong>de</strong>vida <strong>do</strong> nome<br />

em cadastro, quan<strong>do</strong> a dívida é paga ou quan<strong>do</strong> expira<strong>do</strong> o prazo máximo <strong>de</strong> conservação <strong>do</strong> nome por cinco anos, conforme antes<br />

estuda<strong>do</strong>. Em resumo, po<strong>de</strong>-se dizer que a inscrição in<strong>de</strong>vida está presente sempre que não houver um justo motivo ou fundamento<br />

como alicerce da atuação.<br />

Em to<strong>do</strong>s os casos, como os cadastros <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res lidam como o nome, direito da personalida<strong>de</strong> com proteção<br />

fundamental, é correto enten<strong>de</strong>r que os danos imateriais presentes são presumi<strong>do</strong>s ou in re ipsa. A presunção é relativa, caben<strong>do</strong><br />

prova em contrário, por parte <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r (inversão <strong>do</strong> ônus da prova automática). Em relação aos danos materiais<br />

sofri<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>vem eles ser prova<strong>do</strong>s, nos termos <strong>do</strong> art. 402 <strong>do</strong> CC/2002, salvo os casos em que há pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da<br />

prova por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, nos termos <strong>do</strong> art. 6º, inc. VIII, <strong>do</strong> CDC.<br />

No que concerne à presença <strong>de</strong> danos morais presumi<strong>do</strong>s no caso <strong>de</strong> inscrição in<strong>de</strong>vida, po<strong>de</strong>m ser encontra<strong>do</strong>s vários<br />

julga<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, inclusive recentes, que fazem incidir a presunção tanto a pessoas físicas quanto jurídicas.<br />

Por to<strong>do</strong>s, a fim <strong>de</strong> ilustrar:<br />

“Agravo regimental no agravo <strong>de</strong> instrumento. Fundamentos insuficientes para reformar a <strong>de</strong>cisão agravada. Danos morais.<br />

Inscrição in<strong>de</strong>vida em cadastros restritivos <strong>de</strong> crédito. Caracterização in re ipsa <strong>do</strong>s danos. Valor irrisório. Majoração. Possibilida<strong>de</strong>.<br />

1. A agravante não trouxe argumentos novos capazes <strong>de</strong> infirmar os fundamentos que alicerçaram a <strong>de</strong>cisão agravada, razão que<br />

enseja a negativa <strong>de</strong> provimento ao agravo regimental. 2. Consoante entendimento consolida<strong>do</strong> <strong>de</strong>sta Corte Superior, nos casos <strong>de</strong><br />

inscrição in<strong>de</strong>vida em cadastros <strong>de</strong> inadimplentes, os danos caracterizam-se in re ipsa, isto é, são presumi<strong>do</strong>s, prescin<strong>de</strong>m <strong>de</strong> prova<br />

(Prece<strong>de</strong>nte: REsp 1059663/MS – Rel. Min. Nancy Andrighi – DJe 17.12.2008). 3. Na via especial, somente se admite a revisão <strong>do</strong><br />

valor fixa<strong>do</strong> pelas instâncias <strong>de</strong> ampla cognição, a título <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais, quan<strong>do</strong> estes se revelem nitidamente<br />

ínfimos ou exacerba<strong>do</strong>s, extrapolan<strong>do</strong>, assim, os limites da razoabilida<strong>de</strong>. Na hipótese <strong>do</strong>s autos, o valor <strong>de</strong> R$ 1.000,00 (um mil<br />

reais), fixa<strong>do</strong> pelo Tribunal <strong>de</strong> origem, apresenta-se nitidamente irrisório, justifican<strong>do</strong> a excepcional intervenção <strong>de</strong>sta Corte<br />

Superior. Quantum majora<strong>do</strong> para R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais), montante que se mostra mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> para confortar<br />

moralmente a ofendida e <strong>de</strong>sestimular a empresa ofensora <strong>de</strong> práticas <strong>de</strong>sta natureza. 4. Agravo regimental a que se nega<br />

provimento” (STJ – AgRg no Ag 1.152.175/RJ – Terceira Turma – Rel. Des. Conv. Vasco Della Giustina – j. 03.05.2011 – DJe<br />

11.05.2011).<br />

“Agravo regimental no agravo <strong>de</strong> instrumento. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Inscrição in<strong>de</strong>vida em órgãos <strong>de</strong> proteção ao crédito. Dívida<br />

oriunda <strong>de</strong> lançamento <strong>de</strong> encargos em conta corrente inativa. Dano moral. Valor da con<strong>de</strong>nação. 1. Inviável rever a conclusão a<br />

que chegou o Tribunal a quo, a respeito da existência <strong>de</strong> dano moral in<strong>de</strong>nizável, em face <strong>do</strong> óbice da Súmula 7/STJ. 2. É<br />

consolida<strong>do</strong> nesta Corte Superior <strong>de</strong> Justiça o entendimento <strong>de</strong> que a inscrição ou a manutenção in<strong>de</strong>vida em cadastro <strong>de</strong>


inadimplentes gera, por si só, o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar e constitui dano moral in re ipsa, ou seja, dano vincula<strong>do</strong> à própria existência <strong>do</strong><br />

fato ilícito, cujos resulta<strong>do</strong>s são presumi<strong>do</strong>s. 3. A quantia fixada não se revela excessiva, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se os parâmetros a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong>s<br />

por este Tribunal Superior em casos <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> inscrição in<strong>de</strong>vida em órgãos <strong>de</strong> proteção ao crédito. Prece<strong>de</strong>ntes.<br />

4. Agravo regimental a que se nega provimento” (STJ – AgRg no Ag 1.379.761/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe<br />

Salomão – j. 26.04.2011 – DJe 02.05.2011).<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil. Inclusão in<strong>de</strong>vida <strong>do</strong> nome da cliente nos órgãos <strong>de</strong> proteção ao crédito. Dano moral presumi<strong>do</strong>. Valor da<br />

reparação. Critérios para fixação. Controle pelo STJ. Possibilida<strong>de</strong>. Redução <strong>do</strong> quantum. I. O dano moral <strong>de</strong>corrente da inscrição<br />

in<strong>de</strong>vida em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova <strong>do</strong> prejuízo, que é presumi<strong>do</strong> e<br />

<strong>de</strong>corre <strong>do</strong> próprio fato. (…). III. Inexistin<strong>do</strong> critérios <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s e fixos para a quantificação <strong>do</strong> dano moral, recomendável que o<br />

arbitramento seja feito com mo<strong>de</strong>ração, aten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> às peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> caso concreto, o que, na espécie, não ocorreu, distancian<strong>do</strong>se<br />

o quantum arbitra<strong>do</strong> da razoabilida<strong>de</strong>. Recurso especial provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1.105.974/BA – Terceira Turma – Rel. Min.<br />

Sidnei Beneti – j. 23.04.2009 – DJe 13.05.2009).<br />

A questão se consoli<strong>do</strong>u <strong>de</strong> tal forma que passou a compor a ferramenta Jurisprudência em Teses, <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania.<br />

Conforme a premissa 1, publicada na sua Edição n. 59, que trata <strong>do</strong> Cadastro <strong>de</strong> Inadimplentes, “a inscrição in<strong>de</strong>vida em cadastro<br />

<strong>de</strong> inadimplentes configura dano moral in re ipsa”. Porém, conforme a tese 19, publicada no mesmo canal e com importante<br />

ressalva, não existin<strong>do</strong> a anotação irregular nos órgãos <strong>de</strong> proteção ao crédito, a mera cobrança in<strong>de</strong>vida <strong>de</strong> serviços ao consumi<strong>do</strong>r<br />

não gera danos morais presumi<strong>do</strong>s ou in re ipsa.<br />

Pelo sistema <strong>de</strong> presunção existente, sempre causou gran<strong>de</strong> estranheza a Súmula 385 daquela Corte Superior, segun<strong>do</strong> a qual<br />

“Da anotação irregular em cadastro <strong>de</strong> proteção ao crédito, não cabe in<strong>de</strong>nização por dano moral, quan<strong>do</strong> preexistente legítima<br />

inscrição, ressalva<strong>do</strong> o direito ao cancelamento”. A súmula está estabelecen<strong>do</strong> que, se a pessoa, física ou jurídica, já tiver uma<br />

inscrição anterior, <strong>de</strong> valor <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>, não caberá in<strong>de</strong>nização imaterial pela inscrição in<strong>de</strong>vida, o que representa uma volta ao sistema<br />

<strong>de</strong> investigação da presença <strong>do</strong> dano imaterial.<br />

Como bem aponta Cláudia Lima Marques, que mais uma vez critica com razão entendimento sumula<strong>do</strong> <strong>do</strong> STJ, “a Súmula<br />

385 acabou por criar exclu<strong>de</strong>nte para o fornece<strong>do</strong>r que efetivamente erra e ainda uma escusa <strong>de</strong> antemão <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os erros <strong>do</strong>s<br />

fornece<strong>do</strong>res e da abertura <strong>de</strong> cadastros irregulares (que ficam sem qualquer punição), caso o consumi<strong>do</strong>r tenha um – e somente<br />

um – problema anterior, em que se consi<strong>de</strong>rou ‘legítima’ a inscrição ‘preexistente’”.11 Em complemento às suas palavras,<br />

imagina-se pela súmula que a pessoa que já teve o nome inscrito nunca mais terá direito à in<strong>de</strong>nização, pois, como <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r que foi,<br />

per<strong>de</strong>u a sua personalida<strong>de</strong> moral.<br />

A lamentável Súmula 385 <strong>do</strong> STJ acaba, assim, por incentivar a prática <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito pelos fornece<strong>do</strong>res, presta<strong>do</strong>res e<br />

órgãos que mantêm os bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s. Em reforço, como pontua Ezequiel Morais, “a Súmula 385 torna lícito um ato ilícito<br />

apenas porque já preexistia outro registro negativo <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r – e sem levar em consi<strong>de</strong>ração que o registro negativo<br />

preexistente po<strong>de</strong> ser irregular, in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>!”.12<br />

Como se nota, não há qualquer ressalva na ementa sumular, que tem grau altamente generalizante, o que po<strong>de</strong> trazer graves<br />

danos aos consumi<strong>do</strong>res, como vem ocorren<strong>do</strong> no campo prático. Imagine-se, por exemplo, que um consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>via um valor<br />

legítimo, ocorren<strong>do</strong> a inscrição <strong>do</strong> seu nome no cadastro negativo. Cinco anos após a inscrição, o seu nome não é retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> banco<br />

<strong>de</strong> da<strong>do</strong>s (manutenção in<strong>de</strong>vida), ocorren<strong>do</strong> inscrições ilegítimas posteriores. Pelo teor da súmula, não caberá a in<strong>de</strong>nização moral,<br />

pois a inscrição anterior foi legítima. O que não foi legítima foi a não retirada <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>do</strong> cadastro.<br />

Como outro exemplo, o consumi<strong>do</strong>r teve uma inscrição legítima. Porém, um banco, que com o vulnerável não teve qualquer<br />

relação jurídica, realiza centenas ou milhares <strong>de</strong> inscrições ilegítimas. Pela Súmula 385 <strong>do</strong> STJ, mais uma vez, não haverá direito a<br />

qualquer reparação por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, o que representa um absur<strong>do</strong> que <strong>de</strong>ve ser revisto.<br />

Sem falar, em continuida<strong>de</strong>, que a Súmula 385 entra em conflito com a Súmula 370 <strong>do</strong> mesmo STJ, segun<strong>do</strong> a qual cabe<br />

in<strong>de</strong>nização por dano moral no caso <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito antecipa<strong>do</strong> <strong>de</strong> cheque pré ou pós-data<strong>do</strong>. Imagine-se que o consumi<strong>do</strong>r já teve o<br />

nome inscrito por uma dívida regular, surgin<strong>do</strong> uma inscrição posterior in<strong>de</strong>vida em <strong>de</strong>corrência <strong>do</strong> cita<strong>do</strong> <strong>de</strong>pósito antecipa<strong>do</strong>.<br />

Pela Súmula 385, não caberá a in<strong>de</strong>nização moral; pela Súmula 370, a resposta é positiva, em contrarieda<strong>de</strong> à ementa anterior.<br />

Em suma, por todas essas razões, pelo bem <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r nacional, esperava-se que mais esse entendimento<br />

sumula<strong>do</strong> fosse cancela<strong>do</strong> ou revisto pelo Tribunal Superior responsável pelo julgamento das <strong>de</strong>mandas consumeristas em última<br />

instância no Brasil.<br />

Reafirme-se que com a emergência <strong>do</strong> Novo CPC, esta modificação torna-se ainda mais imperiosa, diante da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

os juízes <strong>de</strong> primeira e segunda instância seguirem as súmulas <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, o que é retira<strong>do</strong> <strong>de</strong> vários <strong>de</strong> seus<br />

dispositivos, sobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 489, § 1º, inciso VI (“Não se consi<strong>de</strong>ra fundamentada qualquer <strong>de</strong>cisão judicial, seja ela<br />

interlocutória, sentença ou acórdão, que: (…). <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> seguir enuncia<strong>do</strong> <strong>de</strong> súmula, jurisprudência ou prece<strong>de</strong>nte invoca<strong>do</strong> pela<br />

parte, sem <strong>de</strong>monstrar a existência <strong>de</strong> distinção no caso em julgamento ou a superação <strong>do</strong> entendimento”).


Pois bem, em 2016, a Segunda Seção <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania rediscutiu o teor da sumular, por iniciativa <strong>do</strong> Ministro Paulo<br />

<strong>de</strong> Tarso Sanseverino. Porém, lamentavelmente, não só confirmou o seu teor, como também ampliou a sua aplicação aos cre<strong>do</strong>res,<br />

sen<strong>do</strong> certo que os seus prece<strong>de</strong>ntes somente diziam respeito aos órgãos mantene<strong>do</strong>res <strong>de</strong> cadastros.<br />

Nos termos da publicação constante <strong>do</strong> Informativo n. 583 <strong>do</strong> STJ, “A inscrição in<strong>de</strong>vida comandada pelo cre<strong>do</strong>r em cadastro<br />

<strong>de</strong> proteção ao crédito, quan<strong>do</strong> preexistente legítima inscrição, não enseja in<strong>de</strong>nização por dano moral, ressalva<strong>do</strong> o direito ao<br />

cancelamento. A Súmula n. 385 <strong>do</strong> STJ prevê que ‘Da anotação irregular em cadastro <strong>de</strong> proteção ao crédito, não cabe in<strong>de</strong>nização<br />

por dano moral, quan<strong>do</strong> preexistente legítima inscrição, ressalva<strong>do</strong> o direito ao cancelamento’. O fundamento <strong>do</strong>s prece<strong>de</strong>ntes da<br />

referida súmula – ‘quem já é registra<strong>do</strong> como mau paga<strong>do</strong>r não po<strong>de</strong> se sentir moralmente ofendi<strong>do</strong> por mais uma inscrição <strong>do</strong><br />

nome como inadimplente em cadastros <strong>de</strong> proteção ao crédito’ (REsp 1.002.985/RS, Segunda Seção, DJe 27/8/2008) –, embora<br />

extraí<strong>do</strong>s <strong>de</strong> ações voltadas contra cadastros restritivos, aplica-se também às ações dirigidas contra supostos cre<strong>do</strong>res que<br />

efetivaram inscrições irregulares. Ressalte-se, todavia, que isso não quer dizer que o cre<strong>do</strong>r não possa respon<strong>de</strong>r por algum outro<br />

tipo <strong>de</strong> excesso. A anotação irregular, já haven<strong>do</strong> outras inscrições legítimas contemporâneas, não enseja, por si só, dano moral.<br />

Mas o dano moral po<strong>de</strong> ter por causa <strong>de</strong> pedir outras atitu<strong>de</strong>s <strong>do</strong> suposto cre<strong>do</strong>r, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da coexistência <strong>de</strong> anotações<br />

regulares, como a insistência em uma cobrança eventualmente vexatória e in<strong>de</strong>vida, ou o <strong>de</strong>sleixo <strong>de</strong> cancelar, assim que ciente <strong>do</strong><br />

erro, a anotação in<strong>de</strong>vida. Portanto, na linha <strong>do</strong> entendimento consagra<strong>do</strong> na Súmula n. 385, o mero equívoco em uma das diversas<br />

inscrições não gera dano moral in<strong>de</strong>nizável, mas apenas o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> suprimir a inscrição in<strong>de</strong>vida” (STJ – REsp 1.386.424/MG –<br />

Segunda Seção – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – Rel. para acórdão Min. Maria Isabel Gallotti – j. 27.04.2016 – DJe<br />

16.05.2016).<br />

Em suma, a ementa <strong>de</strong> resumo, além <strong>de</strong> ser confirmada, recebeu uma interpretação ampliativa, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> assim ser consi<strong>de</strong>rada<br />

para os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s fins práticos, infelizmente.<br />

A encerrar o presente tópico, é interessante verificar qual o prazo que tem o consumi<strong>do</strong>r para pleitear a reparação <strong>de</strong> danos<br />

pela inscrição in<strong>de</strong>vida em cadastro negativo. Prima facie, po<strong>de</strong>r-se-ia pensar na aplicação <strong>do</strong> prazo prescricional <strong>de</strong> cinco anos <strong>do</strong><br />

art. 27 <strong>do</strong> CDC, caracterizan<strong>do</strong>-se, em casos tais, um fato <strong>do</strong> serviço. Muitos arestos julgam <strong>de</strong>sse mo<strong>do</strong> (por to<strong>do</strong>s: TJRS –<br />

Apelação Cível 555907-44.2010.8.21.7000 – Canoas – Vigésima Terceira Câmara Cível – Rel. Des. Niwton Carpes da Silva – j.<br />

11.09.2012 – DJERS 24.09.2012; TJPE – Processo 0020495-37.2011.8.17.0000 – Quinta Câmara Cível – Rel. Des. Itabira <strong>de</strong> Brito<br />

Filho – j. 30.11.2011 – DJEPE 07.12.2011, p. 962; TJSP – Apelação 0148630-14.2008.8.26.0100 – Acórdão 4853747 – São Paulo<br />

– Vigésima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Rebello Pinheiro – j. 22.11.2010 – DJESP 13.01.2011; TJMG – Apelação Cível<br />

0510996-23.2009.8.13.0074 – Bom Despacho – Décima Sexta Câmara Cível – Rel. Desig. Des. José Marcos Vieira – j.<br />

20.10.2010 – DJEMG 03.12.2010).<br />

Não obstante tal visão, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça concluiu anteriormente pela aplicação <strong>do</strong> prazo geral <strong>de</strong> prescrição <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>z anos <strong>do</strong> Código Civil para a hipótese <strong>de</strong> inscrição in<strong>de</strong>vida, subsumin<strong>do</strong> o art. 205 da codificação privada:<br />

“<strong>Direito</strong> civil e <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Recurso especial. Relação entre banco e cliente. Consumo. Celebração <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> empréstimo<br />

extinguin<strong>do</strong> o débito anterior. Dívida <strong>de</strong>vidamente quitada pelo consumi<strong>do</strong>r. Inscrição posterior no SPC, dan<strong>do</strong> conta <strong>do</strong> débito que<br />

fora extinto por novação. Responsabilida<strong>de</strong> civil contratual. Inaplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> prazo prescricional previsto no artigo 206, § 3º, V,<br />

<strong>do</strong> Código Civil. 1. O <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> serviço que resultou na negativação in<strong>de</strong>vida <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> cliente da instituição bancária não se<br />

confun<strong>de</strong> com o fato <strong>do</strong> serviço, que pressupõe um risco à segurança <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, e cujo prazo prescricional é <strong>de</strong>fini<strong>do</strong> no art. 27<br />

<strong>do</strong> CDC. 2. É correto o entendimento <strong>de</strong> que o termo inicial <strong>do</strong> prazo prescricional para a propositura <strong>de</strong> ação in<strong>de</strong>nizatória é a data<br />

em que o consumi<strong>do</strong>r toma ciência <strong>do</strong> registro <strong>de</strong>sabona<strong>do</strong>r, pois, pelo princípio da ‘actio nata’, o direito <strong>de</strong> pleitear a in<strong>de</strong>nização<br />

surge quan<strong>do</strong> constatada a lesão e suas consequências. 3. A violação <strong>do</strong>s <strong>de</strong>veres anexos, também intitula<strong>do</strong>s instrumentais, laterais,<br />

ou acessórios <strong>do</strong> contrato – tais como a cláusula geral <strong>de</strong> boa-fé objetiva, <strong>de</strong>ver geral <strong>de</strong> lealda<strong>de</strong> e confiança recíproca entre as<br />

partes –, implica responsabilida<strong>de</strong> civil contratual, como leciona a abalizada <strong>do</strong>utrina com respal<strong>do</strong> em numerosos prece<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong>sta<br />

Corte, reconhecen<strong>do</strong> que, no caso, a negativação caracteriza ilícito contratual. 4. O caso não se amolda a nenhum <strong>do</strong>s prazos<br />

específicos <strong>do</strong> Código Civil, incidin<strong>do</strong> o prazo prescricional <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos previsto no artigo 205, <strong>do</strong> menciona<strong>do</strong> Diploma. 5.<br />

Recurso especial não provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1.276.311/RS – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – Quarta Turma – j. 20.09.2011 – DJe<br />

17.10.2011).<br />

Como se po<strong>de</strong> perceber, o aresto consi<strong>de</strong>ra a inscrição in<strong>de</strong>vida como <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> serviço e violação <strong>do</strong>s <strong>de</strong>veres anexos<br />

relativos à boa-fé objetiva, que não se enquadrariam no tipo <strong>de</strong>scrito pelo art. 27 <strong>do</strong> Código Consumerista. A<strong>de</strong>mais, consi<strong>de</strong>rou<br />

como termo inicial <strong>do</strong> prazo a data da ciência da informação <strong>de</strong>sabona<strong>do</strong>ra, o que é correta aplicação da teoria da actio nata, em<br />

sua faceta subjetiva.<br />

A busca <strong>de</strong> um prazo maior, previsto no Código Civil, para <strong>de</strong>manda proposta pelo consumi<strong>do</strong>r, constitui exemplo típico <strong>de</strong><br />

incidência <strong>do</strong> diálogo das fontes, inicialmente pela ausência <strong>de</strong> regulamentação no CDC. A<strong>de</strong>mais, segue-se a clara tendência <strong>de</strong> se<br />

tutelar o vulnerável negocial, dan<strong>do</strong>-lhe um prazo mais favorável.


Porém, em anos mais recentes o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça mu<strong>do</strong>u sua posição anterior, passan<strong>do</strong> a enten<strong>de</strong>r pela aplicação<br />

<strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> reparação civil <strong>de</strong> três anos, previsto no art. 206, § 3º, inc. V, <strong>do</strong> Código Civil. Nos termos da premissa 18 publicada<br />

na Edição n. 59 da ferramenta Jurisprudência em Teses da Corte, “a ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos morais <strong>de</strong>corrente da inscrição<br />

in<strong>de</strong>vida em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes não se sujeita ao prazo quinquenal <strong>do</strong> art. 27 <strong>do</strong> CDC, mas ao prazo <strong>de</strong> 3 (três) anos<br />

previsto no art. 206, § 3º, V, <strong>do</strong> CC/2002”. São cita<strong>do</strong>s como prece<strong>de</strong>ntes da tese os seguintes acórdãos: AgRg no REsp<br />

1.365.844/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – j. 03.12.2015 – DJe 14.12.2015; AgRg no REsp<br />

1.303.012/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Raul Araújo – j. 24.06.2014 – DJe 01.08.2014; e AgRg no AREsp 127.346/RS – Quarta<br />

Turma – Rel. Min. Maria Isabel Gallotti – j. 06.05.2014 – DJe 16.05.2014). Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, trata-se <strong>de</strong> mais um retrocesso<br />

percebi<strong>do</strong> no Tribunal da Cidadania sobre o tema.<br />

Louva-se, todavia, a manutenção da afirmação <strong>de</strong> que o prazo <strong>de</strong>ve ser conta<strong>do</strong> da ciência da inscrição in<strong>de</strong>vida, como consta<br />

da tese número 17, publicada na mesma ferramenta da Corte (“a data em que o consumi<strong>do</strong>r tem ciência <strong>do</strong> registro in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> <strong>de</strong> seu<br />

nome nos cadastros <strong>de</strong> inadimplentes é o termo inicial da prescrição para o ajuizamento da <strong>de</strong>manda in<strong>de</strong>nizatória”).<br />

8.2.5.<br />

O cadastro <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res e o alcance <strong>do</strong> art. 44 da Lei 8.078/1990<br />

Além <strong>do</strong>s cadastros e bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r trata também <strong>do</strong>s cadastros <strong>de</strong><br />

fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos e presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços. Como explica Rizzatto Nunes, trata-se <strong>do</strong> troco da lei aos serviços <strong>de</strong> proteção<br />

ao crédito. Em outras palavras, há uma revanche em benefício <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res pela existência <strong>do</strong>s cadastros negativos.13<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 44, caput, da Lei 8.078/1990, “os órgãos públicos <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r manterão cadastros atualiza<strong>do</strong>s<br />

<strong>de</strong> reclamações fundamentadas contra fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> produtos e serviços, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> divulgá-los pública e anualmente. A<br />

divulgação indicará se a reclamação foi atendida ou não pelo fornece<strong>do</strong>r”. Como exemplos mais notórios, po<strong>de</strong>m ser cita<strong>do</strong>s os<br />

cadastros manti<strong>do</strong>s pelos PROCONs estaduais, instituições que visam a tutelar os interesses <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, no contexto da<br />

Política Nacional das Relações <strong>de</strong> Consumo (art. 5º da Lei 8.078/1990).<br />

Com os fins <strong>de</strong> elucidação geral, a presente obra sempre trará, em cada edição, o ranking das <strong>de</strong>z empresas mais reclamadas<br />

da Fundação PROCONSP, levan<strong>do</strong>-se em conta a elaboração geográfica <strong>de</strong>ste livro, a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo. Transcreve-se a<br />

relação <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2015, a última publicada quan<strong>do</strong> da elaboração <strong>de</strong>sta sexta edição <strong>do</strong> livro:14<br />

1º<br />

2º<br />

3º<br />

4º<br />

5º<br />

6º<br />

7º<br />

8º<br />

9º<br />

10º<br />

Claro/NET/Embratel.<br />

UNIMED.<br />

Pão <strong>de</strong> Açúcar/EXTRA.<br />

TIM CELULAR.<br />

Vivo-Telefônica.<br />

ITAÚ-UNIBANCO.<br />

Caixa Econômica Fe<strong>de</strong>ral.<br />

ELETROPAULO METROPOLITANA.<br />

SKY BRASIL SERVIÇOS.<br />

SONY.<br />

As informações transcritas representam pleno exercício <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> informar e <strong>de</strong> ser informa<strong>do</strong>, nos termos da proteção<br />

superior (art. 5º, incs. IV, IX e XIV, da CF/1988), ampara<strong>do</strong> pela Lei Consumerista. Em verda<strong>de</strong>, muitas <strong>de</strong>ssas empresas preferem<br />

manter-se no rol das reclamadas <strong>do</strong> que mudar a sua conduta reiterada <strong>de</strong> <strong>de</strong>srespeito aos consumi<strong>do</strong>res. Em um nefasto jogo<br />

econômico, constatam que a mudança <strong>de</strong> postura lhes traria mais custos <strong>do</strong> que o pagamento <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizações ou <strong>de</strong> multas<br />

administrativas. Assim, preferem manter-se no topo da infeliz listagem <strong>de</strong> agressões aos consumi<strong>do</strong>res.<br />

A ampla tutela da informação <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res é confirmada pelo § 1° <strong>do</strong> art. 44, segun<strong>do</strong> o qual é faculta<strong>do</strong> o acesso às<br />

informações constantes <strong>do</strong>s cadastros para orientação e consulta por qualquer interessa<strong>do</strong>. O preceito confirma a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

se divulgar a lista anual da Fundação PROCONSP na presente obra.<br />

Por fim, consagra o art. 44, § 2 o , <strong>do</strong> CDC a subsunção, aos cadastros <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res, das mesmas regras<br />

previstas nos arts. 43 e 22, parágrafo único, <strong>do</strong> próprio CDC. Dessa forma, cabe a retificação <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s constantes das referidas<br />

listas, conforme reconhece a jurisprudência, para que não sofra a pessoa jurídica correspon<strong>de</strong>nte danos morais, nos termos da<br />

Súmula 227 <strong>do</strong> STJ. A exemplificar, colaciona-se:<br />

“Apelação cível e recurso a<strong>de</strong>sivo. Ação ordinária. Pretensão da autora <strong>de</strong> alterar os registros constantes <strong>do</strong> cadastro <strong>de</strong> reclamações<br />

fundamentadas <strong>do</strong> PROCON referente aos anos <strong>de</strong> 2001 e 2002, mantida nos termos <strong>do</strong> art. 44, <strong>do</strong> CDC. Sentença <strong>de</strong> parcial


procedência na origem, para <strong>de</strong>terminar a retificação <strong>do</strong>s registros quanto ao ano <strong>de</strong> 2001. Recurso <strong>de</strong> apelação da ré, pugnan<strong>do</strong> pela<br />

improcedência da ação. Inadmissibilida<strong>de</strong>. Acor<strong>do</strong> entre o consumi<strong>do</strong>r e a empresa reclamada entabula<strong>do</strong> após o encerramento <strong>do</strong><br />

processo administrativo que torna inadmissível a manutenção <strong>do</strong> cadastro como ‘reclamação não atendida’. Inteligência <strong>do</strong> art. 44,<br />

<strong>do</strong> CDC c.c. art. 84, da Lei Estadual 10.177/1998. Dever <strong>de</strong> atualização <strong>do</strong> cadastro, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a espelhar a realida<strong>de</strong> fática. Recurso<br />

a<strong>de</strong>sivo da empresa autora, pugnan<strong>do</strong> a procedência integral da ação. Administra<strong>do</strong>r que, por prestar serviços, encontra-se sujeito às<br />

regras atinentes a relação <strong>de</strong> consumo. Prova <strong>do</strong> <strong>de</strong>slin<strong>de</strong> da reclamação referente à inscrição <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2002 que não restou<br />

evi<strong>de</strong>nciada nos autos. Sentença mantida. Recursos não provi<strong>do</strong>s” (TJSP – Apelação 9123842-20.2007.8.26.0000 – Acórdão<br />

5128720, São Paulo – Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Público – Rel. Des. Rui Stoco – j. 09.05.2011 – DJESP 31.05.2011).<br />

Além disso, tais cadastros têm natureza <strong>de</strong> serviço público, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> as informações prestadas ser completas, precisas,<br />

eficientes e contínuas, diante <strong>de</strong> seu caráter fundamental.<br />

8.3.<br />

O CADASTRO POSITIVO. BREVE ANÁLISE DA LEI 12.414, DE 9 DE JUNHO DE<br />

2011<br />

Para encerrar este capítulo, cumpre trazer algumas anotações a respeito <strong>do</strong> chama<strong>do</strong> cadastro positivo <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res, cria<strong>do</strong><br />

pela recente Lei 12.414/2011, originário da Medida Provisória 783, <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2010, que “Disciplina a formação e<br />

consulta a bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s com informações <strong>de</strong> adimplemento, <strong>de</strong> pessoas naturais ou <strong>de</strong> pessoas jurídicas, para formação <strong>de</strong><br />

histórico <strong>de</strong> crédito”.<br />

Interessante pontuar que o art. 43 <strong>do</strong> CDC não faz referência expressa ao cadastro negativo, que <strong>de</strong>veria ter si<strong>do</strong> cria<strong>do</strong> apenas<br />

após o cadastro positivo. Ao revés <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, a norma sempre foi interpretada em <strong>de</strong>sfavor <strong>do</strong>s seus interesses, como é<br />

comum no Brasil. Consigne-se que o cadastro positivo tem a gran<strong>de</strong> vantagem <strong>de</strong> facilitar o crédito a favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r,<br />

po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> trazer a <strong>de</strong>sejada redução posterior <strong>do</strong>s juros em nosso País. Pelo menos é que se espera, como <strong>de</strong>corrência natural <strong>de</strong> sua<br />

efetivação…<br />

Cumpre <strong>de</strong>stacar que a citada Medida Provisória surgiu a partir <strong>de</strong> um veto <strong>do</strong> então Presi<strong>de</strong>nte Lula ao Projeto <strong>de</strong> Lei <strong>do</strong><br />

Sena<strong>do</strong> 263/2004, conforme a mensagem a seguir:<br />

“Senhor Presi<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> Sena<strong>do</strong> Fe<strong>de</strong>ral, Comunico a Vossa Excelência que, nos termos <strong>do</strong> § 1º <strong>do</strong> art. 66 da Constituição, <strong>de</strong>cidi<br />

vetar integralmente, por contrarieda<strong>de</strong> ao interesse público, o Projeto <strong>de</strong> Lei 263, <strong>de</strong> 2004 (nº 405/2007 na Câmara <strong>do</strong>s Deputa<strong>do</strong>s),<br />

que ‘Acrescenta § 6º ao art. 43 da Lei 8.078, <strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1990 (Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r), para dispor sobre a<br />

formação <strong>de</strong> cadastro positivo nos sistemas <strong>de</strong> proteção ao crédito’. Ouvi<strong>do</strong>, o Ministério da Justiça manifestou-se pelo veto ao<br />

projeto <strong>de</strong> lei, conforme a seguinte razão:<br />

‘O texto que trata <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> cadastro positivo, tal como apresenta<strong>do</strong>, po<strong>de</strong> redundar em prejuízos aos cidadãos, posto que traz<br />

conceitos que não parecem suficientemente claros, o que é indispensável à proteção e <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, ao incremento da<br />

oferta <strong>de</strong> crédito, à promoção <strong>de</strong> relações <strong>de</strong> consumo cada vez mais equilibradas e à proteção da intimida<strong>de</strong> e da privacida<strong>de</strong> das<br />

pessoas’”.<br />

Utilizou-se, portanto, o argumento <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, pois a referida proposição não era clara<br />

quanto às <strong>de</strong>finições das categorias básicas relacionadas ao novo instituto. A MP trouxe tentativas <strong>de</strong> suprimento <strong>de</strong>ssas<br />

<strong>de</strong>ficiências, conforme consta <strong>do</strong> art. 2º da Lei 12.414/2011, com as seguintes conceituações para os fins <strong>de</strong> criação <strong>do</strong> cadastro<br />

positivo:<br />

a)<br />

b)<br />

d)<br />

e)<br />

f)<br />

g)<br />

Banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s: conjunto <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s relativo a pessoa natural ou jurídica armazena<strong>do</strong>s com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> subsidiar a concessão <strong>de</strong><br />

crédito, a realização <strong>de</strong> venda a prazo ou <strong>de</strong> outras transações comerciais e empresarias que impliquem risco financeiro.<br />

Gestor: pessoa jurídica responsável pela administração <strong>de</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, bem como pela coleta, armazenamento, análise e acesso <strong>de</strong><br />

terceiros aos da<strong>do</strong>s armazena<strong>do</strong>s.<br />

c) Cadastra<strong>do</strong>: pessoa natural ou jurídica que tenha autoriza<strong>do</strong> inclusão <strong>de</strong> suas informações no banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s.<br />

Fonte: pessoa natural ou jurídica que conceda crédito ou realize venda a prazo ou outras transações comerciais e empresariais que lhe<br />

impliquem risco financeiro.<br />

Consulente: pessoa natural ou jurídica que acesse informações em bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s para fins <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong> crédito ou realização <strong>de</strong><br />

venda a prazo ou outras transações comerciais e empresariais que lhe impliquem risco financeiro.<br />

Anotação: ação ou efeito <strong>de</strong> anotar, assinalar, averbar, incluir, inscrever ou registrar informação relativa ao histórico <strong>de</strong> crédito em<br />

banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s.<br />

Histórico <strong>de</strong> crédito: conjunto <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s financeiros e <strong>de</strong> pagamentos relativos às operações <strong>de</strong> crédito e obrigações <strong>de</strong> pagamento<br />

adimplidas ou em andamento por pessoa natural ou jurídica.<br />

Ato contínuo <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>, o art. 1º da Lei 12.414/2011 estabelece que o seu regulamento não prejudica o tratamento constante


<strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r como realmente <strong>de</strong>ve ser, uma vez que a Lei 8.078/1990 é uma norma principiológica, com<br />

posição supralegal no or<strong>de</strong>namento jurídico nacional. No mesmo senti<strong>do</strong>, expressa o art. 17 da norma que, nas situações em que o<br />

cadastra<strong>do</strong> for consumi<strong>do</strong>r, o que é regra, aplicam-se as sanções e penas previstas pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, sejam<br />

elas civis, penais ou administrativas.<br />

A premissa fundamental <strong>do</strong> novo cadastro é que ele seja composto por informações prestadas pelos próprios consumi<strong>do</strong>res<br />

que tenham interesse na concessão <strong>de</strong> crédito. O cadastro é, assim, facultativo e não obrigatório, pois pessoas que têm o costume<br />

<strong>de</strong> adquirir bens <strong>de</strong> consumo à vista, sem concessão <strong>de</strong> crédito, não necessitam <strong>do</strong> cita<strong>do</strong> cadastro.<br />

No que concerne à formação <strong>de</strong>sse histórico, a nova norma estabelece que, para a formação <strong>do</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, somente serão<br />

armazenadas informações objetivas, claras, verda<strong>de</strong>iras e <strong>de</strong> fácil compreensão, que sejam necessárias para avaliar a situação<br />

econômica <strong>do</strong> cadastra<strong>do</strong> (art. 3º, § 1º). Como se observa, o coman<strong>do</strong> está harmoniza<strong>do</strong> com o art. 43 <strong>do</strong> CDC, na menção à<br />

realida<strong>de</strong> concreta <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s. Em complemento, a nova norma traz os requisitos das referidas informações, nos termos <strong>de</strong>scritos no<br />

§ 2º <strong>do</strong> art. 3º <strong>do</strong> preceito:<br />

–<br />

–<br />

–<br />

–<br />

Informações objetivas: aquelas <strong>de</strong>scritivas <strong>do</strong>s fatos e que não envolvam juízo <strong>de</strong> valor.<br />

Informações claras: aquelas que possibilitem o imediato entendimento <strong>do</strong> cadastra<strong>do</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> remissão<br />

a anexos, fórmulas, siglas, símbolos, termos técnicos ou nomenclatura específica.<br />

Informações verda<strong>de</strong>iras: aquelas exatas, completas e sujeitas à comprovação.<br />

Informações <strong>de</strong> fácil compreensão: aquelas em senti<strong>do</strong> comum que assegurem ao cadastra<strong>do</strong> o pleno conhecimento<br />

<strong>do</strong> conteú<strong>do</strong>, <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> e <strong>do</strong> alcance <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s sobre ele anota<strong>do</strong>s.<br />

Nesse ponto, o texto da nova norma é bem completo e didático, servin<strong>do</strong> até para preencher construções relativas à tutela da<br />

informação que estão no CDC, em mais um sadio diálogo das fontes. Por razões óbvias, são proibidas as anotações negativas, eis<br />

que o cadastro é positivo, relativo a um histórico <strong>de</strong> adimplemento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Isso fica claro pela leitura <strong>do</strong> art. 7º da Lei<br />

12.414/2011, segun<strong>do</strong> o qual as informações disponibilizadas nos bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s somente po<strong>de</strong>rão ser utilizadas para a realização<br />

<strong>de</strong> análise <strong>de</strong> risco <strong>de</strong> crédito <strong>do</strong> cadastra<strong>do</strong>, ou para subsidiar a concessão <strong>de</strong> crédito e a realização <strong>de</strong> venda a prazo ou outras<br />

transações comerciais e empresariais que impliquem risco financeiro ao consulente.<br />

Partin<strong>do</strong> para um exemplo concreto <strong>de</strong>sse cadastro positivo, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça julgou recentemente a questão<br />

relativa ao credit scoring, sistema <strong>de</strong> pontuação <strong>de</strong> crédito em benefício <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Nos termos <strong>de</strong> publicação constante <strong>do</strong><br />

seu Informativo n. 551, “No que diz respeito ao sistema credit scoring, <strong>de</strong>finiu-se que: a) é um méto<strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong> para<br />

avaliação <strong>do</strong> risco <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong> crédito, a partir <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los estatísticos, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> diversas variáveis, com atribuição <strong>de</strong><br />

uma pontuação ao consumi<strong>do</strong>r avalia<strong>do</strong> (nota <strong>do</strong> risco <strong>de</strong> crédito); b) essa prática comercial é lícita, estan<strong>do</strong> autorizada pelo art. 5º,<br />

IV, e pelo art. 7º, I, da Lei 12.414/2011 (Lei <strong>do</strong> Cadastro Positivo); c) na avaliação <strong>do</strong> risco <strong>de</strong> crédito, <strong>de</strong>vem ser respeita<strong>do</strong>s os<br />

limites estabeleci<strong>do</strong>s pelo sistema <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r no senti<strong>do</strong> da tutela da privacida<strong>de</strong> e da máxima transparência nas<br />

relações negociais, conforme previsão <strong>do</strong> CDC e da Lei 12.414/2011; d) apesar <strong>de</strong> <strong>de</strong>snecessário o consentimento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r<br />

consulta<strong>do</strong>, <strong>de</strong>vem ser a ele forneci<strong>do</strong>s esclarecimentos, caso solicita<strong>do</strong>s, acerca das fontes <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s (histórico <strong>de</strong><br />

crédito), bem como as informações pessoais valoradas; e) o <strong>de</strong>srespeito aos limites legais na utilização <strong>do</strong> sistema credit scoring,<br />

configuran<strong>do</strong> abuso no exercício <strong>de</strong>sse direito (art. 187 <strong>do</strong> CC), po<strong>de</strong> ensejar a responsabilida<strong>de</strong> objetiva e solidária <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r<br />

<strong>do</strong> serviço, <strong>do</strong> responsável pelo banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, da fonte e <strong>do</strong> consulente (art. 16 da Lei 12.414/2011) pela ocorrência <strong>de</strong> danos<br />

morais nas hipóteses <strong>de</strong> utilização <strong>de</strong> informações excessivas ou sensíveis (art. 3º, § 3º, I e II, da Lei 12.414/2011), bem como nos<br />

casos <strong>de</strong> comprovada recusa in<strong>de</strong>vida <strong>de</strong> crédito pelo uso <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s incorretos ou <strong>de</strong>satualiza<strong>do</strong>s” (STJ – REsp 1.419.697/RS – Rel.<br />

Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 12.11.2014).<br />

Ainda sobre o tema, consigne-se que a conclusão constante <strong>do</strong> julga<strong>do</strong> transformou-se em sumular em outubro <strong>de</strong> 2015.<br />

Assim, nos termos da Súmula n. 550 <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania, “a utilização <strong>de</strong> escore <strong>de</strong> crédito, méto<strong>do</strong> estatístico <strong>de</strong> avaliação<br />

<strong>de</strong> risco que não constitui banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, dispensa o consentimento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, que terá o direito <strong>de</strong> solicitar esclarecimentos<br />

sobre as informações pessoais valoradas e as fontes <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s no respectivo cálculo”.<br />

Exposta tal importante ilustração, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o que consta <strong>do</strong> art. 3º, § 3º, da nova norma, são proibidas anotações <strong>de</strong>:<br />

I)<br />

II)<br />

Informações excessivas, assim consi<strong>de</strong>radas aquelas <strong>de</strong>sproporcionais ou que não estiverem vinculadas à análise <strong>de</strong> risco <strong>de</strong> crédito ao<br />

consumi<strong>do</strong>r.<br />

Informações sensíveis, aquelas pertinentes à origem social e étnica, à saú<strong>de</strong>, à informação genética, à orientação sexual e às<br />

convicções políticas, religiosas, filosóficas e pessoais ou quaisquer outras que possam afetar os direitos <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s<br />

cadastra<strong>do</strong>s.


O tratamento relativo às informações sensíveis é elogiável, visan<strong>do</strong> à tutela <strong>do</strong>s direitos da personalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, um<br />

<strong>do</strong>s pontos cruciais e <strong>de</strong> crítica relativos ao cadastro positivo, que não po<strong>de</strong> representar uma afronta à intimida<strong>de</strong> e à tutela da<br />

privacida<strong>de</strong>, protegidas pelo art. 5º, inc. X, da CF/1988 e pelo art. 21 <strong>do</strong> CC/2002. Nessa linha <strong>de</strong> proteção, o Enuncia<strong>do</strong> n. 404, da<br />

V Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil <strong>do</strong> Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral e Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça (2011): “A tutela da privacida<strong>de</strong> da<br />

pessoa humana compreen<strong>de</strong> os controles espacial, contextual e temporal <strong>do</strong>s próprios da<strong>do</strong>s, sen<strong>do</strong> necessário seu expresso<br />

consentimento para tratamento <strong>de</strong> informações que versem especialmente o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, a condição sexual, a origem racial ou<br />

étnica, as convicções religiosas, filosóficas e políticas”.<br />

Cumpre <strong>de</strong>stacar que alguns juristas já veem no cadastro positivo uma possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atenta<strong>do</strong> à proteção <strong>de</strong><br />

individualida<strong>de</strong>s. Argumenta Leonar<strong>do</strong> Bessa que “o aumento <strong>de</strong> número <strong>de</strong> informações pessoais po<strong>de</strong> representar ofensa à<br />

dignida<strong>de</strong> da pessoa humana, aos direitos da personalida<strong>de</strong> (privacida<strong>de</strong> e honra). Atualmente, a maior preocupação em torno <strong>do</strong><br />

tema diz respeito justamente à existência <strong>de</strong> limites ao tratamento (coleta, armazenamento e difusão) <strong>de</strong> informações pessoais,<br />

consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a gran<strong>de</strong> facilida<strong>de</strong> que a evolução informática permite nesta área”.15 Na mesma linha, opina Fernan<strong>do</strong> Gaburri:<br />

“Esse tipo <strong>de</strong> anotação <strong>de</strong>vassa a intimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, e ofen<strong>de</strong> seus direitos <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong>. Se mal utiliza<strong>do</strong>, o cadastro<br />

positivo po<strong>de</strong>rá servir <strong>de</strong> importante ferramenta aos <strong>de</strong>partamentos <strong>de</strong> telemarketing, que diariamente atormentam e abusam da<br />

paciência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r”.16 Anote-se que ambos os juristas tecem seus comentários em relação à Medida Provisória originária<br />

que gerou a lei em comento.<br />

Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, este autor acredita que, em regra, o cadastro positivo não representa a citada afronta, até porque a sua<br />

abertura <strong>do</strong> cadastro <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> um ato <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Ingressa-se na parte disponível <strong>do</strong>s direitos da personalida<strong>de</strong>,<br />

para os <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s fins patrimoniais. Nessa linha, lembre-se o teor <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 4 <strong>do</strong> CJF/STJ, aprova<strong>do</strong> na I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong><br />

Civil, segun<strong>do</strong> o qual “o exercício <strong>do</strong>s direitos da personalida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> sofrer limitação voluntária, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não seja permanente<br />

nem geral”. De toda sorte, não se po<strong>de</strong> admitir abusos pratica<strong>do</strong>s por fornece<strong>do</strong>res e presta<strong>do</strong>res na utilização <strong>do</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s,<br />

sob pena <strong>de</strong> caracterização <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito, nos termos <strong>do</strong> outrora estuda<strong>do</strong> art. 39 da Lei 8.078/1990. Veja-se, ainda, o<br />

controle exerci<strong>do</strong> pelo art. 15 da nova lei, segun<strong>do</strong> o qual as informações sobre o cadastra<strong>do</strong>, constantes <strong>do</strong>s bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s,<br />

somente po<strong>de</strong>rão ser acessadas por consulentes que com ele mantiverem relação comercial ou creditícia.<br />

A necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> para abertura <strong>de</strong> cadastro consta <strong>do</strong> art. 4º da norma, que exige o consentimento informa<strong>do</strong>, por meio<br />

<strong>de</strong> assinatura em instrumento específico ou em cláusula apartada. A necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse <strong>do</strong>cumento está em sintonia com a boa-fé<br />

objetiva e a tutela da informação, vin<strong>do</strong> em boa hora. De acor<strong>do</strong> com o § 1º <strong>do</strong> art. 4º da Lei 12.414/2011, “Após a abertura <strong>do</strong><br />

cadastro, a anotação <strong>de</strong> informação em banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> autorização e <strong>de</strong> comunicação ao cadastra<strong>do</strong>”. A última<br />

norma merecia reparos, pois seria interessante a menção expressa à continua necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> informar o consumi<strong>do</strong>r sobre a<br />

inserção <strong>de</strong> novos da<strong>do</strong>s. Como se verá adiante, esse preceito entra em contradição com outra regra da própria norma, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong><br />

prevalecer a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prévia comunicação.<br />

A nova lei consagra a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> troca <strong>de</strong> informações entre as fontes <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s, visan<strong>do</strong> a formação <strong>do</strong> histórico<br />

positivo (art. 4º, § 2º). Conforme o seu art. 9º, o compartilhamento <strong>de</strong> informação <strong>de</strong> adimplemento só é permiti<strong>do</strong> se autoriza<strong>do</strong><br />

expressamente pelo cadastra<strong>do</strong>, por meio <strong>de</strong> assinatura em instrumento específico ou em cláusula apartada. O gestor que receber<br />

informações por meio <strong>de</strong> compartilhamento equipara-se ao gestor que anotou originariamente a informação, inclusive quanto à<br />

responsabilida<strong>de</strong> solidária por eventuais prejuízos causa<strong>do</strong>s, bem como em relação ao <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> receber e processar impugnação e<br />

realizar retificações (art. 9º, § 1º).<br />

Além disso, na troca das informações, o gestor originário é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> responsável por manter atualizadas as informações<br />

cadastrais nos <strong>de</strong>mais bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s com os quais compartilhou informações, bem como por informar a solicitação <strong>de</strong><br />

cancelamento <strong>do</strong> cadastro (art. 9º, § 2º). O cancelamento <strong>do</strong> cadastro pelo gestor originário implica o cancelamento <strong>do</strong> cadastro em<br />

to<strong>do</strong>s os bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s que compartilharam informações, que ficam obriga<strong>do</strong>s a proce<strong>de</strong>r, individualmente, ao respectivo<br />

cancelamento <strong>de</strong> cadastro (art. 9º, § 3º). O gestor <strong>de</strong>verá assegurar, sob pena <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil objetiva, a i<strong>de</strong>ntificação da<br />

pessoa que promover qualquer inscrição ou atualização <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s relaciona<strong>do</strong>s com o cadastra<strong>do</strong>, registran<strong>do</strong> a data <strong>de</strong>ssa<br />

ocorrência, bem como a i<strong>de</strong>ntificação exata da fonte, <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> agente que a efetuou e <strong>do</strong> equipamento ou terminal a partir <strong>do</strong><br />

qual foi processada tal ocorrência (art. 9º, § 4º). Sem prejuízo <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s esses preceitos, é proibi<strong>do</strong> ao gestor exigir exclusivida<strong>de</strong><br />

das fontes <strong>de</strong> informações, uma vez que a premissa fundamental <strong>do</strong> cadastro positivo é o compartilhamento das informações, em<br />

um regime <strong>de</strong> colaboração contínua (art. 10).<br />

O art. 5º <strong>do</strong> preceito preconiza quais são os direitos <strong>do</strong> cadastra<strong>do</strong>, a saber:<br />

a)<br />

Obter o cancelamento <strong>do</strong> cadastro quan<strong>do</strong> solicita<strong>do</strong>. Trata-se <strong>do</strong> reconhecimento <strong>de</strong> um direito potestativo em benefício <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r que se sentir prejudica<strong>do</strong> pelo cadastro positivo. Como há plena liberda<strong>de</strong> na abertura, essa também <strong>de</strong>ve existir no<br />

cancelamento <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s.


)<br />

c)<br />

d)<br />

e)<br />

f)<br />

g)<br />

Acessar gratuitamente, a qualquer tempo, as informações sobre ele existentes no banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, inclusive o seu histórico, caben<strong>do</strong> ao<br />

gestor manter sistemas seguros, por meio eletrônico ou telefone, <strong>de</strong> consulta para informar a existência ou não <strong>de</strong> cadastro <strong>de</strong><br />

informação <strong>de</strong> adimplemento <strong>de</strong> um cadastra<strong>do</strong> respectivo aos consulentes.<br />

Solicitar impugnação <strong>de</strong> qualquer informação sobre ele erroneamente anotada em banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e ter, em até sete dias, sua correção<br />

ou cancelamento e comunicação aos bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s com os quais aquele compartilhou a informação. Como se nota, o coman<strong>do</strong><br />

segue o espírito <strong>do</strong> art. 43 <strong>do</strong> CDC.<br />

Conhecer os principais elementos e critérios consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s para a análise <strong>de</strong> risco <strong>de</strong> negociação futura, resguarda<strong>do</strong> o segre<strong>do</strong><br />

empresarial.<br />

Ser informa<strong>do</strong> previamente sobre o armazenamento, a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>do</strong> gestor <strong>do</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, o objetivo <strong>do</strong> tratamento <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s<br />

pessoais e os <strong>de</strong>stinatários <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s em caso <strong>de</strong> compartilhamento. Constata-se que, aqui, há menção à comunicação prévia para o<br />

armazenamento das informações, o que entra em conflito com o preceito <strong>do</strong> art. 4º, § 1º, da própria norma. Diante da boa-fé<br />

objetiva que inspira o sistema <strong>de</strong> consumo nacional (art. 4º, inc. III, <strong>do</strong> CDC), a regra da informação prévia <strong>de</strong>ve prevalecer.<br />

Solicitar a revisão <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão realizada exclusivamente por meios automatiza<strong>do</strong>s. Em suma, é possível pedir a revisão <strong>de</strong> atos<br />

robóticos ou automáticos.<br />

Ter os seus da<strong>do</strong>s pessoais utiliza<strong>do</strong>s somente <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a finalida<strong>de</strong> para a qual eles foram coleta<strong>do</strong>s, o que, mais uma vez, visa<br />

a proteger a vida privada.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, o art. 8º da Lei 12.414/2011 expõe quais são os <strong>de</strong>veres das fontes diante <strong>do</strong>s cadastra<strong>do</strong>s, a saber:<br />

a)<br />

b)<br />

c)<br />

d)<br />

e)<br />

f)<br />

Manter os registros a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s para <strong>de</strong>monstrar que a pessoa natural ou jurídica autorizou o envio e a anotação <strong>de</strong> informações em<br />

bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s.<br />

Comunicar os gestores <strong>de</strong> bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s acerca <strong>de</strong> eventual exclusão ou revogação <strong>de</strong> autorização <strong>do</strong> cadastra<strong>do</strong>.<br />

Verificar e confirmar, ou corrigir, em prazo não superior a <strong>do</strong>is dias úteis, informação impugnada, sempre que solicita<strong>do</strong> por gestor <strong>de</strong><br />

banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s ou diretamente pelo cadastra<strong>do</strong>.<br />

Atualizar e corrigir informações enviadas aos gestores <strong>de</strong> bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, em prazo não superior a sete dias.<br />

Manter os registros a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s para verificar informações enviadas aos gestores <strong>de</strong> bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s.<br />

Fornecer informações sobre o cadastra<strong>do</strong>, em bases não discriminatórias, a to<strong>do</strong>s os gestores <strong>de</strong> bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s que as solicitarem, no<br />

mesmo formato e conten<strong>do</strong> as mesmas informações fornecidas a outros bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s.<br />

Por fim, é veda<strong>do</strong> às fontes estabelecer políticas ou realizar operações que impeçam, limitem ou dificultem a transmissão a<br />

banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>de</strong> informações <strong>de</strong> cadastra<strong>do</strong>s que tenham autoriza<strong>do</strong> a anotação <strong>de</strong> seus da<strong>do</strong>s em bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s (art. 8º,<br />

parágrafo único, da Lei 12.414/2011).<br />

O art. 6º da norma em estu<strong>do</strong> enumera as informações que <strong>de</strong>vem ser prestadas pelos gestores <strong>de</strong> bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s ao<br />

cadastra<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> houver solicitação <strong>do</strong> último. Essas informações são todas aquelas relativas ao cadastra<strong>do</strong>, bem como a<br />

indicação das fontes correspon<strong>de</strong>ntes e <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os consulentes posteriores. Veda-se aos bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s estabelecerem políticas<br />

ou realizar operações que impeçam, limitem ou dificultem o acesso <strong>do</strong> cadastra<strong>do</strong> às informações sobre ele registradas o que ten<strong>de</strong><br />

à proteção <strong>de</strong> direitos da personalida<strong>de</strong>, mais uma vez (art. 6º, § 1º). O prazo para atendimento da solicitação <strong>de</strong> tais informações é<br />

<strong>de</strong> sete dias (art. 6º, § 2º).<br />

Possibilita-se aos presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços continua<strong>do</strong>s <strong>de</strong> água, esgoto, eletricida<strong>de</strong>, gás e telecomunicações – <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

autoriza<strong>do</strong>s pelo cadastra<strong>do</strong> – o fornecimento aos bancos <strong>de</strong> informações sobre o cumprimento das obrigações financeiras <strong>do</strong><br />

cadastra<strong>do</strong> (art. 11, caput). Tal autorização existe <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> em relação às instituições bancárias e financeiras (art. 12).<br />

Diante <strong>de</strong> numerosos abusos cometi<strong>do</strong>s no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo, veda-se a anotação <strong>de</strong> informação sobre serviço <strong>de</strong> telefonia<br />

móvel na modalida<strong>de</strong> pós-paga (art. 11, parágrafo único, da Lei 12.4141/2011).<br />

Em relação ao prazo máximo para a manutenção das informações positivas, o art. 14 da Lei 12.414/2011 estabelece que ele é<br />

<strong>de</strong> quinze anos. O dispositivo é critica<strong>do</strong>, pois <strong>de</strong>veria estar harmoniza<strong>do</strong> com o prazo <strong>de</strong> cinco anos previsto pelo art. 43 <strong>do</strong> CDC,<br />

como bem observa Leonar<strong>do</strong> Roscoe Bessa:<br />

“A <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> limites temporais diferencia<strong>do</strong>s para informações positivas e negativas irá gerar, no mínimo, perplexida<strong>de</strong>. Afinal, o<br />

que fazer se, em meio ao registro <strong>de</strong> informações positivas, o consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> pagar algumas prestações antigas (vencidas há<br />

sete anos, por exemplo)? É possível manter o registro <strong>de</strong>sse inadimplemento (informação negativa)? Como fica o limite temporal <strong>de</strong><br />

cinco anos <strong>do</strong> CDC (art. 43, § 1º) para informações negativas? O i<strong>de</strong>al seria que fosse estabeleci<strong>do</strong> um limite temporal único para<br />

registro tanto <strong>de</strong> informações positivas como negativas, pois, invariavelmente, em meio a anotações <strong>de</strong> histórico <strong>de</strong> crédito<br />

(informação positiva), po<strong>de</strong>rá haver situações <strong>de</strong> atrasos ou até mesmo não pagamento <strong>de</strong> algumas parcelas (informações negativas).<br />

Se esses atrasos ou parcelas não pagas superarem o prazo <strong>de</strong> cinco anos, não po<strong>de</strong>rá haver o respectivo registro, mas a ausência <strong>de</strong><br />

informação <strong>de</strong> pagamento <strong>de</strong>ssas parcelas irá sugerir a existência <strong>de</strong> informação negativa”.17<br />

Some-se às palavras <strong>do</strong> jurista a constatação <strong>de</strong> que o prazo máximo previsto no sistema civil é <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos, para a prescrição


geral (art. 205 <strong>do</strong> CC/2002). Nota-se, assim, um exagero temporal, pois em tempos pós-mo<strong>de</strong>rnos a tendência é <strong>de</strong> redução <strong>do</strong>s<br />

prazos, pela possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> rápida tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões. Diante <strong>de</strong> seu caráter superior, acredita-se na prevalência <strong>do</strong>s cinco anos<br />

consagra<strong>do</strong>s pelo art. 43 da Lei 8.078/1990. Aguar<strong>de</strong>mos qual será o posicionamento jurispru<strong>de</strong>ncial quanto ao tema no futuro.<br />

A Lei 12.414/2011 consagra a responsabilida<strong>de</strong> objetiva e solidária <strong>do</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, da fonte e <strong>do</strong> consulente, pelos danos<br />

materiais e morais que causarem ao cadastra<strong>do</strong> (art. 16). Em harmonia com o sistema <strong>do</strong> CDC, <strong>de</strong> fato, não po<strong>de</strong>ria ser <strong>de</strong> outro<br />

mo<strong>do</strong>. Se a norma trouxesse a responsabilida<strong>de</strong> mediante culpa ou subjetiva, esta não po<strong>de</strong>ria prevalecer, pois estaria em conflito<br />

com o espírito consumerista <strong>de</strong> objetivação das responsabilida<strong>de</strong>s.<br />

A encerrar esta breve análise a respeito <strong>do</strong> cadastro positivo, <strong>de</strong>staque-se a emergência <strong>do</strong> Decreto 7.829, <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong><br />

2012, regulamentan<strong>do</strong> os principais aspectos da lei <strong>do</strong> cadastro positivo. Vejamos alguns <strong>de</strong> seus preceitos principais, em vigor a<br />

partir <strong>de</strong> 1º <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2013.<br />

O art. 1º da norma estabelece os requisitos mínimos para o funcionamento <strong>do</strong>s cita<strong>do</strong>s cadastros, nos aspectos econômicofinanceiro,<br />

técnico-operacionais, relaciona<strong>do</strong>s à governança e relacionais. Entre os últimos, <strong>de</strong>staque-se a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

manutenção <strong>de</strong> um canal <strong>de</strong> comunicação plena com os consumi<strong>do</strong>res e <strong>de</strong> uma ouvi<strong>do</strong>ria, o que auxilia na efetivação da<br />

transparência das relações jurídicas.<br />

O histórico <strong>de</strong> crédito <strong>do</strong> cadastra<strong>do</strong>, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a lei, é composto pelo conjunto <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s financeiros e <strong>de</strong> pagamentos<br />

relativos às operações <strong>de</strong> crédito e obrigações <strong>de</strong> pagamento, adimplidas ou em andamento, necessárias para avaliar o risco<br />

financeiro <strong>do</strong> cadastra<strong>do</strong> (art. 2º). Já o conjunto <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s financeiros e <strong>de</strong> pagamentos é composto pelos seguintes elementos: a)<br />

data da concessão <strong>do</strong> crédito ou da assunção da obrigação <strong>de</strong> pagamento; b) valor <strong>do</strong> crédito concedi<strong>do</strong> ou da obrigação <strong>de</strong><br />

pagamento assumida; c) valores <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s das prestações ou obrigações, indicadas as datas <strong>de</strong> vencimento e <strong>de</strong> pagamento; e d)<br />

valores pagos, mesmo que parciais, das prestações ou obrigações, indicadas as datas <strong>de</strong> pagamento (art. 3º <strong>do</strong> Decreto 7.829/2012).<br />

Com um intuito <strong>de</strong> efetivação <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> informar, prescreve o art. 4º <strong>do</strong> regulamento que as instituições financeiras e <strong>de</strong>mais<br />

instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central <strong>do</strong> Brasil prestarão informações <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com diretrizes aprovadas pelo<br />

Conselho Monetário Nacional. Também com relação clara com a boa-fé objetiva, e em harmonia com o CDC, o art. 6º <strong>do</strong> Decreto<br />

dispõe que os bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, para fins <strong>de</strong> composição <strong>do</strong> histórico <strong>de</strong> crédito, <strong>de</strong>verão apresentar informações objetivas, claras,<br />

verda<strong>de</strong>iras e <strong>de</strong> fácil compreensão, que sejam necessárias para avaliação da situação econômico-financeira <strong>do</strong> cadastra<strong>do</strong>.<br />

No que toca à autorização para abertura <strong>do</strong> cadastro positivo, po<strong>de</strong> ser concedida pelo cadastra<strong>do</strong> em forma física ou<br />

eletrônica, diretamente à fonte ou ao gestor <strong>de</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s (art. 7º). A verificação da valida<strong>de</strong> e autenticida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssas<br />

autorizações d caberá àquele que recepcionou diretamente a autorização concedida pelo cadastra<strong>do</strong>, o que representa uma clara<br />

inversão <strong>do</strong> ônus da prova (art. 8º).<br />

Quanto às consultas ao cadastro positivo, os da<strong>do</strong>s somente po<strong>de</strong>rão ser acessa<strong>do</strong>s por consulentes que com ele mantiverem ou<br />

preten<strong>de</strong>rem manter relação comercial ou creditícia. O consulente <strong>de</strong>verá <strong>de</strong>clarar ao gestor <strong>do</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s que mantém ou<br />

preten<strong>de</strong> manter relação comercial ou creditícia com o cadastra<strong>do</strong>. Além disso, o gestor <strong>do</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>de</strong>verá manter políticas<br />

e controles para garantir que as informações sobre o cadastra<strong>do</strong> somente serão acessadas por consulente que atenda a tais requisitos<br />

(art. 9º <strong>do</strong> Decreto).<br />

Os arts. 10 a 14 da regulamentação enunciam regras a respeito <strong>de</strong> <strong>de</strong>veres e responsabilida<strong>de</strong>s das empresas gestoras <strong>do</strong>s<br />

bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s. De acor<strong>do</strong> com o primeiro dispositivo, o gestor <strong>do</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>de</strong>verá: a) comunicar às fontes eventual<br />

exclusão ou revogação da autorização pelo cadastra<strong>do</strong>; b) indicar, em cada resposta a consulta, a data da última atualização das<br />

informações enviadas ao banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s; c) a<strong>do</strong>tar as cautelas necessárias à preservação <strong>do</strong> sigilo das informações que lhe forem<br />

enviadas, divulgan<strong>do</strong>-as apenas para as finalida<strong>de</strong>s previstas na Lei 12.414/2011; d) manter sistemas <strong>de</strong> guarda e acesso com<br />

requisitos <strong>de</strong> segurança que protejam as informações <strong>de</strong> acesso por terceiros não autoriza<strong>do</strong>s e <strong>de</strong> uso em <strong>de</strong>sacor<strong>do</strong> com as<br />

finalida<strong>de</strong>s previstas na referida lei; e) <strong>do</strong>tar os sistemas <strong>de</strong> guarda e acesso das informações <strong>de</strong> características <strong>de</strong> rastreabilida<strong>de</strong>,<br />

passíveis <strong>de</strong> serem auditadas; f) disponibilizar em seus sítios eletrônicos, ou por telefone e gratuitamente, para consulta <strong>do</strong><br />

cadastra<strong>do</strong>, com acesso formaliza<strong>do</strong>, <strong>de</strong> maneira segura e gratuita, as informações fundamentais a respeito <strong>do</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e <strong>do</strong><br />

próprio cadastra<strong>do</strong>; g) informar claramente, inclusive em seu sítio eletrônico, os direitos <strong>do</strong> cadastra<strong>do</strong> <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>s em lei e em<br />

normas infralegais pertinentes à sua relação com as fontes e os gestores <strong>de</strong> bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, e disponibilizar lista <strong>de</strong> órgãos<br />

governamentais aos quais po<strong>de</strong>rá recorrer em caso <strong>de</strong> violação. Tu<strong>do</strong> isso sob pena <strong>de</strong> uma responsabilização objetiva, nos termos<br />

<strong>do</strong> que consta <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e da própria Lei <strong>do</strong> Cadastro Positivo.<br />

Em reforço, o gestor <strong>do</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s não po<strong>de</strong>rá informar aos consulentes as fontes individuais das informações (art. 11). O<br />

cancelamento <strong>do</strong> cadastro po<strong>de</strong>rá ser realiza<strong>do</strong> perante qualquer gestor <strong>de</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s que mantenha cadastro ou perante a<br />

fonte que recebeu a autorização para abertura <strong>do</strong> cadastro, nos termos <strong>do</strong> que regulamenta o art. 12 <strong>do</strong> Decreto.<br />

Sem prejuízo <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> isso, o cadastra<strong>do</strong> po<strong>de</strong>rá requerer, visan<strong>do</strong> à tutela <strong>de</strong> sua personalida<strong>de</strong>, que suas informações não


sejam acessíveis por <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s consulentes ou em perío<strong>do</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> <strong>de</strong> tempo. Po<strong>de</strong>, também, pleitear o não<br />

compartilhamento <strong>de</strong> informações ou, ainda, a revogação <strong>de</strong> autorização para o compartilhamento <strong>de</strong> suas informações com um ou<br />

mais bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s. Consigne-se que o sigilo e a intimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> cadastra<strong>do</strong> estão protegi<strong>do</strong>s, em complemento, pelo art. 15 da<br />

nova norma, eis que o envio das informações pelas fontes aos gestores <strong>de</strong> bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>de</strong>verá ser realiza<strong>do</strong> por mecanismos<br />

que preservem a integrida<strong>de</strong> e o sigilo <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s envia<strong>do</strong>s.<br />

Para finalizar o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> diploma, estatui-se que as solicitações <strong>de</strong> cancelamento <strong>do</strong> cadastro, <strong>de</strong> vedação <strong>de</strong> acesso e <strong>de</strong> não<br />

compartilhamento <strong>de</strong>verão ser realizadas <strong>de</strong> forma expressa, e po<strong>de</strong>rão ser feitas por meio eletrônico, ou seja, pela internet (art.<br />

14).<br />

1 Sobre a busca da percepção <strong>do</strong> brasileiro médio, ver: ALMEIDA, Alberto. A cabeça <strong>do</strong> brasileiro. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Record, 2007.<br />

2<br />

3<br />

4<br />

5<br />

6<br />

7<br />

8<br />

9<br />

10<br />

11<br />

12<br />

13<br />

14<br />

15<br />

16<br />

17<br />

GARCIA, Leonar<strong>do</strong> Me<strong>de</strong>iros. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. Niterói: Impetus, 2007. p. 155.<br />

LAGRASTA NETO, Caetano. Inserção <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>de</strong> alimentos nos órgãos <strong>de</strong> proteção ao crédito. In: LAGRASTA NETO,<br />

Caetano; TARTUCE, <strong>Flávio</strong>; SIMÃO, José Fernan<strong>do</strong>. <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> Família. Novas tendências e julgamentos emblemáticos. São Paulo:<br />

Atlas, 2011. p. 311.<br />

DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anota<strong>do</strong>. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 67.<br />

ALEXY, Robert. Teoria <strong>do</strong>s direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008.<br />

MARQUES, Cláudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 831-832.<br />

GONÇALVES, Renato Afonso. Bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s nas relações <strong>de</strong> consumo. São Paulo: Max Limonad, 2002. p. 49-50.<br />

EFING, Antônio Carlos. Bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e cadastro <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res. São Paulo: RT, 2002. p. 30-36.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 527.<br />

Sobre o tema, por to<strong>do</strong>s: DONNINI, Rogério Ferraz. Responsabilida<strong>de</strong> civil pós-contratual. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.<br />

MARQUES, Cláudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São<br />

Paulo: RT, 2010. p. 833.<br />

MORAIS, Ezequiel; PODESTÁ, Fábio Henrique; e CARAZAI, Marcos Marins. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r Comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT,<br />

2011. p. 223.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 538.<br />

Disponível em: . Acesso em: 10 nov. 2016.<br />

BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Cadastro positivo. Disponível em: .<br />

Acesso em: 3 jun. 2011.<br />

GABURRI, Fernan<strong>do</strong>. Cadastro positivo <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res: uma história para contar. Disponível em:<br />

. Acesso em: 3 jun. 2011.<br />

BESSA, Leonar<strong>do</strong> Roscoe. Cadastro positivo. Disponível em: .<br />

Acesso em: 3 jun. 2011.


A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE<br />

JURÍDICA NO CÓDIGO DE DEFESA DO<br />

CONSUMIDOR (ART. 28 DA LEI 8.078/1990).<br />

ASPECTOS MATERIAIS<br />

Diante <strong>de</strong> sua concepção como realida<strong>de</strong> técnica e orgânica, a pessoa jurídica é capaz <strong>de</strong> direitos e <strong>de</strong>veres na or<strong>de</strong>m civil,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong>s membros que a compõem, com os quais não tem vínculo. Tal realida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser retirada <strong>do</strong> art. 45 <strong>do</strong><br />

Código Civil <strong>de</strong> 2002, ao dispor que começa a existência legal das pessoas jurídicas <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong> com a inscrição <strong>do</strong> ato<br />

constitutivo no respectivo registro. Fala-se em autonomia da pessoa jurídica quanto aos seus membros, o que constava<br />

expressamente no art. 20 <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 1916, dispositivo que não foi reproduzi<strong>do</strong> pela atual codificação material, sem que<br />

isso traga qualquer conclusão diferente.<br />

Como <strong>de</strong>corrência lógica <strong>de</strong>sse enquadramento, em regra, os componentes da pessoa jurídica somente respon<strong>de</strong>rão por débitos<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>do</strong>s limites <strong>do</strong> capital social, fican<strong>do</strong> a salvo o patrimônio individual <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> <strong>do</strong> tipo societário a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong><br />

(responsabilida<strong>de</strong> in vires). A regra é <strong>de</strong> que a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s sócios em relação às dívidas sociais seja sempre subsidiária, ou<br />

seja, primeiro exaure-se o patrimônio da pessoa jurídica, para <strong>de</strong>pois, e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o tipo societário a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> permita, os bens<br />

particulares <strong>do</strong>s sócios ou componentes da pessoa jurídica sejam executa<strong>do</strong>s.<br />

Devi<strong>do</strong> a essa possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> exclusão da responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s sócios ou administra<strong>do</strong>res, a pessoa jurídica, por vezes,<br />

<strong>de</strong>sviou-se <strong>de</strong> seus princípios e fins, cometen<strong>do</strong> frau<strong>de</strong>s e lesan<strong>do</strong> socieda<strong>de</strong> ou terceiros, provocan<strong>do</strong> reações na <strong>do</strong>utrina e na<br />

jurisprudência. Visan<strong>do</strong> a coibir tais abusos, surgiu no <strong>Direito</strong> Compara<strong>do</strong> a figura da teoria da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong><br />

jurídica, teoria <strong>do</strong> levantamento <strong>do</strong> véu ou teoria da penetração (disregard of the legal entity). Com isso, alcançam-se pessoas e<br />

bens que se escon<strong>de</strong>m <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma pessoa jurídica para fins ilícitos ou abuso, além <strong>do</strong>s limites <strong>do</strong> capital social (responsabilida<strong>de</strong><br />

ultra vires). Fábio Ulhoa Coelho <strong>de</strong>monstra as origens da teoria:<br />

“A teoria é uma elaboração <strong>do</strong>utrinária recente. Po<strong>de</strong>-se consi<strong>de</strong>rar Rolf Serick o seu principal sistematiza<strong>do</strong>r, na tese <strong>de</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>fendida perante a Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Tübigen, em 1953. É certo que, antes <strong>de</strong>le, alguns autores já haviam <strong>de</strong>dica<strong>do</strong> ao tema, como<br />

por exemplo, Maurice Wormser, nos danos 1910 e 1920. Mas não se encontra claramente nos estu<strong>do</strong>s precursores a motivação<br />

centra <strong>de</strong> Serick <strong>de</strong> buscar <strong>de</strong>finir, em especial a partir da jurisprudência norte-americana, os critérios gerais que autorizam o<br />

afastamento da autonomia das pessoas jurídicas (1950)”.1<br />

Como se extrai <strong>de</strong> obra <strong>do</strong> jurista, são aponta<strong>do</strong>s alguns julgamentos históricos como precursores da tese: caso Salomon vs.<br />

Salomon & Co., julga<strong>do</strong> na Inglaterra em 1897, e caso State vs. Standard Oil Co., julga<strong>do</strong> pela Corte Suprema <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> Ohio,<br />

Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, em 1892. 2 A verda<strong>de</strong> é que a partir das teses e <strong>do</strong>s julgamentos, as premissas <strong>de</strong> penetração na pessoa jurídica<br />

passaram a influenciar a elaboração <strong>de</strong> normas jurídicas visan<strong>do</strong> a sua regulamentação. Trata-se <strong>de</strong> mais uma festejada incidência<br />

da teoria da aparência e da vedação <strong>do</strong> abuso <strong>de</strong> direito, agora em se<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> Empresa, ramo <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>.<br />

O instituto em análise permite ao juiz não mais consi<strong>de</strong>rar os efeitos da personificação da socieda<strong>de</strong> para atingir e vincular<br />

responsabilida<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s sócios e administra<strong>do</strong>res, com intuito <strong>de</strong> impedir a consumação <strong>de</strong> frau<strong>de</strong>s e abusos por eles cometi<strong>do</strong>s,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> que causem prejuízos e danos a terceiros, principalmente a cre<strong>do</strong>res da empresa. Dessa forma, os bens particulares <strong>do</strong>s sócios


po<strong>de</strong>m respon<strong>de</strong>r pelos danos causa<strong>do</strong>s a terceiros. Em suma, o escu<strong>do</strong>, no caso da pessoa jurídica, é retira<strong>do</strong> para atingir quem<br />

está atrás <strong>de</strong>le, o sócio ou administra<strong>do</strong>r. Bens da empresa também po<strong>de</strong>rão respon<strong>de</strong>r por dívidas <strong>do</strong>s sócios, por meio <strong>do</strong> que se<br />

<strong>de</strong>nomina <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração inversa ou invertida, mais à frente estudada.<br />

Como é cediço, o atual Código Civil Brasileiro acolheu expressamente a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração. Prescreve o seu art. 50 que: “Em<br />

caso <strong>de</strong> abuso da personalida<strong>de</strong> jurídica caracteriza<strong>do</strong> pelo <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong>, ou pela confusão patrimonial, po<strong>de</strong> o Juiz <strong>de</strong>cidir,<br />

a requerimento da parte, ou <strong>do</strong> Ministério Público quan<strong>do</strong> lhe couber intervir no processo, que os efeitos <strong>de</strong> certas e <strong>de</strong>terminadas<br />

relações <strong>de</strong> obrigações sejam estendi<strong>do</strong>s aos bens particulares <strong>do</strong>s administra<strong>do</strong>res ou sócios da pessoa jurídica.” Como a<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica foi a<strong>do</strong>tada pelo legisla<strong>do</strong>r da nova codificação privada, não é recomendável mais<br />

utilizar a expressão teoria, que constitui trabalho <strong>do</strong>utrinário, ampara<strong>do</strong> pela jurisprudência. Tal constatação também é retirada da<br />

leitura <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

O art. 28, caput, da Lei 8.078/1990, enuncia que: “O Juiz po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar a personalida<strong>de</strong> jurídica da socieda<strong>de</strong> quan<strong>do</strong>,<br />

em <strong>de</strong>trimento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, houver abuso <strong>de</strong> direito, excesso <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação <strong>do</strong>s<br />

estatutos ou contrato social. A <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração também será efetivada quan<strong>do</strong> houver falência, esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> insolvência,<br />

encerramento ou inativida<strong>de</strong> da pessoa jurídica provoca<strong>do</strong>s por má administração”; (…) § 5º: “Também po<strong>de</strong>rá ser <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rada<br />

a pessoa jurídica sempre que sua personalida<strong>de</strong> for, <strong>de</strong> alguma forma, obstáculo ao ressarcimento <strong>de</strong> prejuízos causa<strong>do</strong>s aos<br />

consumi<strong>do</strong>res”. Faz o mesmo o art. 4º da Lei <strong>de</strong> Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998), ao prever que “po<strong>de</strong>rá ser <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rada a<br />

pessoa jurídica sempre que sua personalida<strong>de</strong> for obstáculo ao ressarcimento <strong>de</strong> prejuízos causa<strong>do</strong>s à qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> meio ambiente”.<br />

De qualquer forma, no tocante às duas normas, há uma diferença <strong>de</strong> tratamento, conforme será <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> a seguir.<br />

Tanto em relação à a<strong>do</strong>ção da teoria, quanto à manutenção das leis especiais anteriores, expressa o Enuncia<strong>do</strong> n. 51 <strong>do</strong><br />

CJF/STJ, da I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, que “a teoria da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica – disregard <strong>do</strong>ctrine – fica<br />

positivada no novo Código Civil, manti<strong>do</strong>s os parâmetros existentes nos microssistemas legais e na construção jurídica sobre o<br />

tema”. Eis o argumento pelo qual não se po<strong>de</strong> mais utilizar a expressão teoria, uma vez que a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração foi abraçada pela<br />

codificação privada.<br />

Aprofundan<strong>do</strong> o tema, a melhor <strong>do</strong>utrina aponta a existência <strong>de</strong> duas gran<strong>de</strong>s teorias fundamentais acerca da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração<br />

da personalida<strong>de</strong> jurídica:3<br />

a)<br />

b)<br />

Teoria maior ou subjetiva – a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, para ser <strong>de</strong>ferida, exige a presença <strong>de</strong> <strong>do</strong>is requisitos: o abuso da<br />

personalida<strong>de</strong> jurídica + o prejuízo ao cre<strong>do</strong>r. Essa teoria foi a<strong>do</strong>tada pelo art. 50 <strong>do</strong> CC/2002.<br />

Teoria menor ou objetiva – a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica exige um único elemento, qual seja o prejuízo<br />

ao cre<strong>do</strong>r. Essa teoria foi a<strong>do</strong>tada pela Lei 9.605/1998, para os danos ambientais, e supostamente pelo art. 28 <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Relativamente ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, diz-se supostamente pela redação <strong>do</strong> § 5º <strong>do</strong> seu art. 28, bastan<strong>do</strong> o mero<br />

prejuízo ao consumi<strong>do</strong>r, para que a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração seja <strong>de</strong>ferida, segun<strong>do</strong> a <strong>do</strong>utrina especializada. 4 Esse entendimento por vezes<br />

é a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pela jurisprudência, conforme se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong> <strong>de</strong> notória e explicativa ementa <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil e <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Recurso especial. Shopping Center <strong>de</strong> Osasco-SP. Explosão. Consumi<strong>do</strong>res.<br />

Danos materiais e morais. Ministério Público. Legitimida<strong>de</strong> ativa. Pessoa jurídica. Desconsi<strong>de</strong>ração. Teoria maior e teoria menor.<br />

Limite <strong>de</strong> responsabilização <strong>do</strong>s sócios. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Requisitos. Obstáculo ao ressarcimento <strong>de</strong> prejuízos<br />

causa<strong>do</strong>s aos consumi<strong>do</strong>res. Art. 28, § 5º – Consi<strong>de</strong>rada a proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r um <strong>do</strong>s pilares da or<strong>de</strong>m econômica, e<br />

incumbin<strong>do</strong> ao Ministério Público a <strong>de</strong>fesa da or<strong>de</strong>m jurídica, <strong>do</strong> regime <strong>de</strong>mocrático e <strong>do</strong>s interesses sociais e individuais<br />

indisponíveis, possui o Órgão Ministerial legitimida<strong>de</strong> para atuar em <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> interesses individuais homogêneos <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res,<br />

<strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> origem comum. A teoria maior da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, regra geral no sistema jurídico brasileiro, não po<strong>de</strong> ser aplicada<br />

com a mera <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> estar a pessoa jurídica insolvente para o cumprimento <strong>de</strong> suas obrigações. Exige-se, aqui, para além da<br />

prova <strong>de</strong> insolvência, ou a <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong> (teoria subjetiva da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração), ou a <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong><br />

confusão patrimonial (teoria objetiva da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração). A teoria menor da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, acolhida em nosso or<strong>de</strong>namento<br />

jurídico excepcionalmente no <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e no <strong>Direito</strong> Ambiental, inci<strong>de</strong> com a mera prova <strong>de</strong> insolvência da pessoa<br />

jurídica para o pagamento <strong>de</strong> suas obrigações, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da existência <strong>de</strong> <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> confusão patrimonial.<br />

– Para a teoria menor, o risco empresarial normal às ativida<strong>de</strong>s econômicas não po<strong>de</strong> ser suporta<strong>do</strong> pelo terceiro que contratou com<br />

a pessoa jurídica, mas pelos sócios e/ou administra<strong>do</strong>res <strong>de</strong>sta, ainda que estes <strong>de</strong>monstrem conduta administrativa proba, isto é,<br />

mesmo que não exista qualquer prova capaz <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificar conduta culposa ou <strong>do</strong>losa por parte <strong>do</strong>s sócios e/ou administra<strong>do</strong>res da<br />

pessoa jurídica. – A aplicação da teoria menor da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração às relações <strong>de</strong> consumo está calcada na exegese autônoma <strong>do</strong> § 5º<br />

<strong>do</strong> art. 28 <strong>do</strong> CDC, porquanto a incidência <strong>de</strong>sse dispositivo não se subordina à <strong>de</strong>monstração <strong>do</strong>s requisitos previstos no caput <strong>do</strong><br />

artigo indica<strong>do</strong>, mas apenas à prova <strong>de</strong> causar, a mera existência da pessoa jurídica, obstáculo ao ressarcimento <strong>de</strong> prejuízos<br />

causa<strong>do</strong>s aos consumi<strong>do</strong>res. Recursos especiais não conheci<strong>do</strong>s” (STJ, REsp 279.273/SP – Rel. Ministro Ari Pargendler – Rel.


p/Acórdão Ministra Nancy Andrighi – Terceira Turma – j. 04.12.2003 – DJ 29.03.2004, p. 230).<br />

Todavia, no que tange ao <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, como é notório, o art. 28, § 1º, <strong>do</strong> CDC foi veta<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> na verda<strong>de</strong> o veto<br />

<strong>de</strong>veria ter atingi<strong>do</strong> o § 5º. O dispositivo veta<strong>do</strong> teria a seguinte redação: “A pedi<strong>do</strong> da parte interessada, o juiz <strong>de</strong>terminará que a<br />

efetivação da responsabilida<strong>de</strong> da pessoa jurídica recaia sobre o acionista controla<strong>do</strong>r, o sócio majoritário, os sócios-gerentes, os<br />

administra<strong>do</strong>res societários e, no caso <strong>de</strong> grupo societário, as socieda<strong>de</strong>s que a integram” (art. 28, § 1º). As razões <strong>do</strong> veto, que não<br />

têm qualquer relação com a norma: “O caput <strong>do</strong> art. 28 já contém to<strong>do</strong>s os elementos necessários à aplicação da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração<br />

da personalida<strong>de</strong> jurídica, que constitui, conforme <strong>do</strong>utrina amplamente <strong>do</strong>minante no direito pátrio e alienígena, técnica<br />

excepcional <strong>de</strong> repressão a práticas abusivas”.<br />

Assim, fica em dúvida a verda<strong>de</strong>ira a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong>ssa teoria, apesar da previsão legal. Nesse senti<strong>do</strong>, comentan<strong>do</strong> o erro no veto,<br />

anota Gustavo Rene Nicolau que “com este equívoco manteve-se em vigor o terrível § 5º. Enten<strong>do</strong> que não se po<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar<br />

eficaz o referi<strong>do</strong> parágrafo, prestigian<strong>do</strong> um engano em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> toda uma construção <strong>do</strong>utrinária absolutamente solidificada<br />

e que visa – em última análise – proteger a coletivida<strong>de</strong>”.5 O que é importante dizer é que, apesar <strong>do</strong>s protestos <strong>do</strong> jovem civilista,<br />

o art. 28, § 5º, <strong>do</strong> CDC, vem sen<strong>do</strong> aplica<strong>do</strong> amplamente pela jurisprudência como precursor da teoria menor ou objetiva.<br />

Em suma, constata-se que a divisão entre a teoria maior e a menor consoli<strong>do</strong>u-se na civilística nacional. Isso, mesmo com<br />

críticas formuladas pelo próprio Fábio Ulhoa Coelho, um <strong>do</strong>s seus principais precursores. Conforme se retira <strong>de</strong> obra mais recente<br />

<strong>do</strong> jurista, “em 1999, quan<strong>do</strong> era significativa a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões judiciais <strong>de</strong>svirtuan<strong>do</strong> a teoria da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, cheguei<br />

a chamar sua aplicação incorreta <strong>de</strong> ‘teoria menor’, reservan<strong>do</strong> à correta a expressão ‘teoria maior’. Mas a evolução <strong>do</strong> tema na<br />

jurisprudência brasileira não permite mais falar-se em duas teorias distintas, razão pela qual esses conceitos <strong>de</strong> ‘maior’ e ‘menor’<br />

mostram-se, agora, felizmente, ultrapassa<strong>do</strong>s”.6 Com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, acredito que a aclamada divisão <strong>de</strong>ve ser mantida na teoria<br />

e prática <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, especialmente pelo seu claro intuito didático e meto<strong>do</strong>lógico. Em suplemento, a aplicação da teoria<br />

menor é mais eficiente para a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

Deve ficar claro que a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica não significa a sua extinção, mas apenas uma ampliação das<br />

responsabilida<strong>de</strong>s, quebran<strong>do</strong>-se com a sua autonomia. A<strong>de</strong>mais, a medida é tida como excepcional, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> <strong>de</strong> autorização<br />

judicial. Em suma, não se po<strong>de</strong> confundir a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração com a <strong>de</strong>spersonificação da pessoa jurídica. No primeiro instituto,<br />

apenas <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ra-se a regra pela qual a pessoa jurídica tem existência distinta <strong>de</strong> seus membros. Na <strong>de</strong>spersonificação, a pessoa<br />

jurídica é dissolvida ou extinta. Destaque-se que a <strong>de</strong>spersonificação da pessoa jurídica está tratada, em termos gerais, pelo art. 51<br />

<strong>do</strong> Código Civil, in verbis: “Nos casos <strong>de</strong> dissolução da pessoa jurídica ou cassada a autorização para seu funcionamento, ela<br />

subsistirá para os fins <strong>de</strong> liquidação, até que esta se conclua. § 1º Far-se-á, no registro on<strong>de</strong> a pessoa jurídica estiver inscrita, a<br />

averbação <strong>de</strong> sua dissolução. § 2º As disposições para a liquidação das socieda<strong>de</strong>s aplicam-se, no que couber, às <strong>de</strong>mais pessoas<br />

jurídicas <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong>. § 3º Encerrada a liquidação, promover-se-á o cancelamento da inscrição da pessoa jurídica”.<br />

Repisan<strong>do</strong>, é possível, no caso <strong>de</strong> confusão patrimonial, responsabilizar a empresa por dívidas <strong>do</strong>s sócios (<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração<br />

inversa ou invertida). O exemplo típico é a situação em que o sócio, ten<strong>do</strong> conhecimento <strong>de</strong> divórcio, compra bens com capital<br />

próprio em nome da empresa (confusão patrimonial). Pela <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, tais bens po<strong>de</strong>rão ser alcança<strong>do</strong>s pela ação <strong>de</strong> divórcio,<br />

fazen<strong>do</strong> com que o instituto seja aplica<strong>do</strong> no <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> Família. Sobre o tema, mencione-se o trabalho <strong>de</strong> Rolf Madaleno, que trata<br />

da teoria da disregard no <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> Família. Citan<strong>do</strong> farta jurisprudência <strong>do</strong> TJRS, o <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>r utiliza um exemplo muito<br />

próximo <strong>do</strong> que aqui foi aponta<strong>do</strong>: “Quan<strong>do</strong> o mari<strong>do</strong> transfere para sua empresa o rol mais significativo <strong>do</strong>s bens matrimoniais,<br />

sentença final <strong>de</strong> cunho <strong>de</strong>claratório haverá <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar este negócio específico, flagrada a frau<strong>de</strong> ou o abuso, haven<strong>do</strong>, em<br />

consequência, como matrimoniais esses bens, para or<strong>de</strong>nar sua partilha no ventre da separação judicial, na fase <strong>de</strong>stinada a sua<br />

divisão, já consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s comuns e comunicáveis”.7 Admitin<strong>do</strong> essa possibilida<strong>de</strong>, na IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil foi aprova<strong>do</strong> o<br />

Enuncia<strong>do</strong> n. 283 <strong>do</strong> CJF/STJ, preven<strong>do</strong> que “É cabível a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica <strong>de</strong>nominada ‘inversa’ para<br />

alcançar bens <strong>de</strong> sócio que se valeu da pessoa jurídica para ocultar ou <strong>de</strong>sviar bens pessoais, com prejuízo a terceiros”. Da<br />

jurisprudência, po<strong>de</strong> ser encontra<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> publica<strong>do</strong> no Informativo n. 444 <strong>do</strong> STJ, aplican<strong>do</strong> a categoria (STJ – REsp<br />

948.117/MS – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 22.06.2010).<br />

A <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração inversa, <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong>, é possível em <strong>de</strong>manda envolven<strong>do</strong> uma relação <strong>de</strong> consumo. Imagine-se o caso<br />

<strong>de</strong> um fornece<strong>do</strong>r ou presta<strong>do</strong>r que tem vários débitos em relação a consumi<strong>do</strong>res e que, para fraudá-los, passa a transmitir os seus<br />

bens para o seu nome próprio. Enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> <strong>de</strong>sse mo<strong>do</strong>, e fazen<strong>do</strong> menção ao art. 28 <strong>do</strong> CDC, <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> São Paulo:<br />

“Bem móvel. Ação <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> fazer C.C. Pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> aplicação da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração inversa da pessoa<br />

jurídica. Bloqueio ‘on-line’. Presentes os pressupostos legais (art. 28 <strong>do</strong> CDC e art. 50 <strong>do</strong> CC <strong>de</strong> 2002). Agravo improvi<strong>do</strong>.<br />

Presentes os elementos <strong>de</strong> convicção <strong>do</strong>s pressupostos <strong>do</strong> art. 28 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e <strong>do</strong> art. 50 <strong>do</strong> Código Civil<br />

<strong>de</strong> 2002, é aplicável a <strong>de</strong>spersonalização da pessoa jurídica inversa para alcançar os bens sociais ou particulares <strong>do</strong>s administra<strong>do</strong>res<br />

ou sócios que a integram” (TJSP – Agravo <strong>de</strong> instrumento n. 990.10.074924-2 – Acórdão n. 4630.973/SP – Vigésima Sexta Câmara


<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Norival Oliva – j. 10.08.2010 – DJESP 23.08.2010).<br />

Ainda sobre a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração inversa ou invertida, cabe pontuar que ela foi a<strong>do</strong>tada expressamente pelo Novo Código <strong>de</strong><br />

Processo Civil, estan<strong>do</strong> positivada no seu art. 133, § 2º. O tema será <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong> no capítulo 12 <strong>de</strong>sta obra, que procura analisar<br />

as questões processuais <strong>do</strong> Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil, estan<strong>do</strong> a cargo <strong>do</strong> coautor <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção <strong>Neves</strong>.<br />

Em to<strong>do</strong>s os casos, seja a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração direta ou inversa, dispõe o Enuncia<strong>do</strong> n. 281 <strong>do</strong> CJF/STJ, aprova<strong>do</strong> na IV Jornada<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, que a sua aplicação prescin<strong>de</strong> da <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> insolvência da pessoa jurídica. Em tom prático, não há<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> provar que a empresa está falida para que a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração seja <strong>de</strong>ferida.<br />

Por outra via, o Enuncia<strong>do</strong> n. 282 <strong>do</strong> CJF/STJ aduz que o encerramento irregular das ativida<strong>de</strong>s da pessoa jurídica, por si só,<br />

não basta para caracterizar abuso <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> jurídica. Imagine-se a hipótese em que a pessoa jurídica fechou o<br />

estabelecimento empresarial e não pagou cre<strong>do</strong>res, inclusive consumi<strong>do</strong>res. Mesmo com a incidência da teoria maior, não há como<br />

concordar com essa conclusão <strong>do</strong>utrinária, pois o encerramento irregular é exemplo típico <strong>de</strong> abuso da personalida<strong>de</strong> jurídica,<br />

particularmente <strong>de</strong> <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong> da empresa, conforme baliza<strong>do</strong> entendimento jurispru<strong>de</strong>ncial, apesar da matéria não ser<br />

pacífica (nesse senti<strong>do</strong>, ver: TJSP, Agravo <strong>de</strong> instrumento 990.09.250776-1, Acórdão 4301323, São Paulo, Vigésima Nona Câmara<br />

<strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, Rel. Des. Oscar Feltrin, j. 03.02.2010, DJESP 25.02.2010; TJMG, Agravo interno 1.0024.06.986632-5/0011,<br />

Belo Horizonte, Décima Primeira Câmara Cível, Rel. Des. Marcos Lincoln, j. 27.01.2010, DJEMG 22.02.2010; TJPR, Agravo <strong>de</strong><br />

instrumento 0572154-2, Guarapuava, Terceira Câmara Cível, Rel. Des. Paulo Habith, DJPR 17.12.2009, p. 32; TJRS, Agravo <strong>de</strong><br />

instrumento 70030801385, Lajea<strong>do</strong>, Décima Nona Câmara Cível, Rel. Des. Guinther Spo<strong>de</strong>, j. 24.11.2009, DJERS 01.12.2009, p.<br />

75; TJDF, Recurso 2009.00.2.005888-6, Acórdão 361.803, Sexta Turma Cível; Rel. Des. Jair Soares, DJDFTE 18.06.2009, p. 87).<br />

Em complemento, para confirmar a possibilida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração em casos tais, notadamente em <strong>de</strong>mandas envolven<strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>res, anote-se que, no âmbito da execução fiscal, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça enten<strong>de</strong> que se presume dissolvida<br />

irregularmente a empresa que <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> funcionar no seu <strong>do</strong>micílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitiman<strong>do</strong> o<br />

redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente (Súmula 435). Como se nota, o teor da súmula está na contramão <strong>do</strong><br />

entendimento que consta <strong>do</strong> critica<strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 282 <strong>do</strong> CJF/STJ. Também na contramão <strong>de</strong>sse enuncia<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrinário, <strong>do</strong><br />

mesmo STJ, cabe colacionar trechos <strong>de</strong> acórdãos recentes: “Do encerramento irregular da empresa presume-se o abuso da<br />

personalida<strong>de</strong> jurídica, seja pelo <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong>, seja pela confusão patrimonial, apto a embasar o <strong>de</strong>ferimento da<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica da empresa, para se buscar o patrimônio individual <strong>de</strong> seu sócio” (REsp 1.259.066/SP –<br />

Rel. Min. Nancy Andrighi – DJe 28.06.2012); “Reconhecen<strong>do</strong> o acórdão recorri<strong>do</strong> que a ex-sócia, ora recorrente, praticou atos que<br />

culminaram no encerramento irregular da empresa, com <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong> e no esvaziamento patrimonial, a revisão <strong>de</strong>ste<br />

entendimento <strong>de</strong>mandaria o reexame <strong>do</strong> contexto fático-probatório <strong>do</strong>s autos, o que é veda<strong>do</strong> em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso especial ante o<br />

óbice da Súmula 7/STJ” (STJ – REsp 1.312.591/RS – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – Quarta Turma – j. 11.06.2013 – DJe<br />

01.07.2013).<br />

Todavia, o tema nunca foi pacífico no Tribunal da Cidadania. A par <strong>de</strong>ssa realida<strong>de</strong>, em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2014, a Segunda Seção<br />

<strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça acabou por analisar a matéria em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> recursos repetitivos, concluin<strong>do</strong>, na mesma<br />

linha <strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrinário comenta<strong>do</strong>, que o mero encerramento irregular das ativida<strong>de</strong>s da empresa não tem o condão <strong>de</strong>, por<br />

si só, gerar a incidência da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, especialmente aquela tratada pelo Código Civil. De toda sorte, a este autor parece que<br />

a conclusão não se aplica à teoria menor a<strong>do</strong>tada pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Conforme a relatoria da Ministra Maria Isabel Gallotti, “a criação teórica da pessoa jurídica foi avanço que permitiu o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento da ativida<strong>de</strong> econômica, ensejan<strong>do</strong> a limitação <strong>do</strong>s riscos <strong>do</strong> empreen<strong>de</strong><strong>do</strong>r ao patrimônio <strong>de</strong>staca<strong>do</strong> para tal fim.<br />

Abusos no uso da personalida<strong>de</strong> jurídica justificaram, em lenta evolução jurispru<strong>de</strong>ncial, posteriormente incorporada ao direito<br />

positivo brasileiro, a tipificação <strong>de</strong> hipóteses em que se autoriza o levantamento <strong>do</strong> véu da personalida<strong>de</strong> jurídica para atingir o<br />

patrimônio <strong>de</strong> sócios que <strong>de</strong>la <strong>do</strong>losamente se prevaleceram para lesar cre<strong>do</strong>res. Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> regra <strong>de</strong> exceção, <strong>de</strong> restrição a<br />

princípio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, interpretação que melhor se coaduna com o art. 50 <strong>do</strong> Código Civil é a que<br />

rege sua aplicação a casos extremos, em que a pessoa jurídica tenha si<strong>do</strong> mero instrumento para fins fraudulentos por aqueles que a<br />

i<strong>de</strong>alizaram, valen<strong>do</strong>-se <strong>de</strong>la para encobrir os ilícitos que propugnam seus sócios ou administra<strong>do</strong>res. Entendimento diverso<br />

conduziria, no limite, em termos práticos, ao fim da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, ou seja, regresso histórico<br />

incompatível com a segurança jurídica e com o vigor da ativida<strong>de</strong> econômica. Com esses fundamentos, não estan<strong>do</strong> consigna<strong>do</strong> no<br />

acórdão estadual que a dissolução da socieda<strong>de</strong> tinha por fim fraudar cre<strong>do</strong>res ou ludibriar terceiros, não se configuran<strong>do</strong>, portanto,<br />

<strong>de</strong>svio da finalida<strong>de</strong> social ou confusão patrimonial entre socieda<strong>de</strong>, sócios ou administra<strong>do</strong>res, acolho os embargos <strong>de</strong> divergência<br />

para que prevaleça tese a<strong>do</strong>tada pelo acórdão paradigma e, por conseguinte, restabelecer o acórdão especialmente recorri<strong>do</strong>”<br />

(Embargos <strong>de</strong> Divergência no Agravo Regimental no Recurso Especial 1.306.553/SC).<br />

Em suma, passou-se a enten<strong>de</strong>r, naquela Corte e <strong>de</strong> forma consolidada, que a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, pela


teoria maior, exige <strong>do</strong>lo ou culpa <strong>do</strong> sócio ou administra<strong>do</strong>r. Essa posição, com o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> respeito, mesmo nos casos <strong>de</strong> aplicação<br />

da teoria maior, não conta com o apoio <strong>de</strong>ste autor, pois somos filia<strong>do</strong>s à incidência <strong>do</strong> art. 187 <strong>do</strong> Código Civil em casos tais, e da<br />

correspon<strong>de</strong>nte responsabilida<strong>de</strong> objetiva que <strong>de</strong>corre <strong>de</strong>ste dispositivo.<br />

Também da IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, preconiza o Enuncia<strong>do</strong> n. 284 <strong>do</strong> CJF/STJ que “As pessoas jurídicas <strong>de</strong> direito<br />

priva<strong>do</strong> sem fins lucrativos ou <strong>de</strong> fins não econômicos estão abrangidas no conceito <strong>de</strong> abuso da personalida<strong>de</strong> jurídica”. Ao<br />

contrário <strong>do</strong> anterior, esse enuncia<strong>do</strong> está <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o entendimento jurispru<strong>de</strong>ncial que, por exemplo, admite a<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica em face <strong>de</strong> uma associação (nesse senti<strong>do</strong>, ver: TJSP, Agravo <strong>de</strong> instrumento<br />

573.072.4/7, Acórdão 3123059, São Vicente, Oitava Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, Rel. Des. Caetano Lagrasta, j. 07.08.2008, DJESP<br />

22.08.2008; TJPR, Agravo <strong>de</strong> instrumento 0285267-3, Acórdão 238202, Curitiba, Desembarga<strong>do</strong>ra Anny Mary Kuss, 15ª Câmara<br />

Cível, j. 19.04.2005, publica<strong>do</strong> em 06.05.2005). Tal entendimento <strong>de</strong>ve ser aplica<strong>do</strong> em benefício <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

Ainda naquele evento, foi aprova<strong>do</strong> o Enuncia<strong>do</strong> n. 285 <strong>do</strong> CJF/STJ, estabelecen<strong>do</strong> que a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong><br />

jurídica po<strong>de</strong> ser invocada pela pessoa jurídica em seu favor. Como não po<strong>de</strong>ria ser diferente, po<strong>de</strong> uma empresa consumi<strong>do</strong>ra<br />

fazer uso <strong>do</strong> instituto contra uma empresa <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>ra. Pelo mesmo enuncia<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrinário, po<strong>de</strong> a própria pessoa jurídica pleitear a<br />

sua <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração.<br />

Na esteira da última conclusão, e como consequência natural <strong>de</strong>ssa ementa <strong>do</strong>utrinária, acórdão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça <strong>de</strong>duziu que “a pessoa jurídica tem legitimida<strong>de</strong> para impugnar <strong>de</strong>cisão interlocutória que <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ra sua personalida<strong>de</strong><br />

para alcançar o patrimônio <strong>de</strong> seus sócios ou administra<strong>do</strong>res, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o faça com o intuito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a sua regular<br />

administração e autonomia – isto é, a proteção da sua personalida<strong>de</strong> –, sem se imiscuir in<strong>de</strong>vidamente na esfera <strong>de</strong> direitos <strong>do</strong>s<br />

sócios ou administra<strong>do</strong>res incluí<strong>do</strong>s no polo passivo por força da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração. (…). Por isso, inclusive, segun<strong>do</strong> o Enuncia<strong>do</strong><br />

n. 285 da IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, ‘a teoria da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, prevista no art. 50 <strong>do</strong> Código Civil, po<strong>de</strong> ser invocada pela<br />

pessoa jurídica em seu favor’. Nesse compasso, tanto o interesse na <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração ou na manutenção <strong>do</strong> véu protetor, po<strong>de</strong>m<br />

partir da própria pessoa jurídica, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que, à luz <strong>do</strong>s requisitos autoriza<strong>do</strong>res da medida excepcional, esta seja capaz <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>monstrar a pertinência <strong>de</strong> seu intuito, o qual <strong>de</strong>ve sempre estar relaciona<strong>do</strong> à afirmação <strong>de</strong> sua autonomia, vale dizer, à proteção<br />

<strong>de</strong> sua personalida<strong>de</strong>” (STJ – REsp 1.421.464/SP – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 24.04.2014, publica<strong>do</strong> no seu Informativo n.<br />

544).<br />

Seguin<strong>do</strong> no estu<strong>do</strong> da categoria da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração consumerista, o § 2º, <strong>do</strong> art. 28, <strong>do</strong> CDC, enuncia que as socieda<strong>de</strong>s<br />

integrantes <strong>do</strong>s mesmos grupos societários e as socieda<strong>de</strong>s controladas, são subsidiariamente responsáveis para os fins <strong>de</strong><br />

incidência <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. As socieda<strong>de</strong>s coligadas, a<strong>de</strong>mais, só respon<strong>de</strong>rão por culpa, ten<strong>do</strong> uma<br />

responsabilida<strong>de</strong> subjetiva (art. 28, § 4º, <strong>do</strong> CDC). Como bem esclarece Zelmo Denari, apesar <strong>de</strong> os coman<strong>do</strong>s estarem inseri<strong>do</strong>s<br />

no artigo referente à <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, têm eles incidência para qualquer situação <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil encampada pelo Código<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, inclusive para os fins <strong>de</strong> temática <strong>do</strong> presente tópico.8<br />

Para esclarecer em relação às socieda<strong>de</strong>s coligadas, o seu conceito consta <strong>do</strong> art. 1.097 <strong>do</strong> CC/2002: “Consi<strong>de</strong>ram-se coligadas<br />

as socieda<strong>de</strong>s que, em suas relações <strong>de</strong> capital, são controladas, filiadas, ou <strong>de</strong> simples participação, na forma <strong>do</strong>s artigos<br />

seguintes”. É consi<strong>de</strong>rada controlada: a) a socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> cujo capital outra socieda<strong>de</strong> possua a maioria <strong>do</strong>s votos nas <strong>de</strong>liberações<br />

<strong>do</strong>s quotistas ou da assembleia geral e o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> eleger a maioria <strong>do</strong>s administra<strong>do</strong>res; b) a socieda<strong>de</strong> cujo controle, referi<strong>do</strong> no<br />

inciso antece<strong>de</strong>nte, esteja em po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> outra, mediante ações ou quotas possuídas por socieda<strong>de</strong>s ou socieda<strong>de</strong>s por esta já<br />

controladas (art. 1.098 <strong>do</strong> CC). Além disso, diz-se coligada ou filiada a socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> cujo capital outra socieda<strong>de</strong> participa com <strong>de</strong>z<br />

por cento ou mais <strong>do</strong> capital da outra, sem controlá-la (art. 1.099 <strong>do</strong> CC). Por fim, é <strong>de</strong> simples participação a socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> cujo<br />

capital outra socieda<strong>de</strong> possua menos <strong>de</strong> <strong>de</strong>z por cento <strong>do</strong> capital com direito <strong>de</strong> voto (art. 1.100 <strong>do</strong> CC).<br />

Em relação às socieda<strong>de</strong>s consorciadas, “são solidariamente responsáveis pelas obrigações <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong>ste código” (art. 28,<br />

§ 3º, <strong>do</strong> CDC). Mais uma vez, nota-se que a regra não serve apenas para os fins <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, mas para todas as <strong>de</strong>corrências<br />

<strong>de</strong> responsabilização civil, na linha da solidarieda<strong>de</strong> pregada pelo art. 7º, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC.<br />

As socieda<strong>de</strong>s consorciadas, nos termos <strong>do</strong> art. 278, caput, da Lei das Socieda<strong>de</strong>s Anônimas (Lei 6.404/1976), são aquelas que<br />

se constituem para executar <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> empreendimento, caso <strong>de</strong> uma complexa obra pública. Conforme o § 1º <strong>do</strong> último<br />

preceito, “o consórcio não tem personalida<strong>de</strong> jurídica e as consorciadas somente se obrigam nas condições previstas no respectivo<br />

contrato, respon<strong>de</strong>n<strong>do</strong> cada uma por suas obrigações, sem presunção <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>”. Como bem esclarece Zelmo Denari, “O §<br />

3º <strong>do</strong> art. 28 <strong>de</strong>rrogou expressamente essa disposição da lei comercial, crian<strong>do</strong>, nas relações <strong>de</strong> consumo, um vínculo <strong>de</strong><br />

solidarieda<strong>de</strong> entre as empresas consorciadas, em benefício <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r”.9<br />

Para encerrar o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> tema, cabe trazer a <strong>de</strong>bate a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica <strong>de</strong> ofício<br />

pelo juiz.<br />

Estabelece o art. 133, caput, <strong>do</strong> Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil que o inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica


será instaura<strong>do</strong> a pedi<strong>do</strong> da parte ou <strong>do</strong> Ministério Público, quan<strong>do</strong> lhe couber intervir no processo. Assim, pela literalida<strong>de</strong> da<br />

norma, ficaria afastada a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecimento <strong>de</strong> ofício, pelo juiz, da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica.<br />

Apesar <strong>de</strong>ssa previsão, o presente autor enten<strong>de</strong> que, em alguns casos, envolven<strong>do</strong> a or<strong>de</strong>m pública, a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da<br />

personalida<strong>de</strong> jurídica ex officio é possível. Citem-se justamente as hipóteses envolven<strong>do</strong> a tutela <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, eis que, nos<br />

termos <strong>do</strong> art. 1º da Lei 8.078/1990, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é norma <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública e interesse social, envolven<strong>do</strong><br />

direitos fundamentais protegi<strong>do</strong>s pelo art. 5º da Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988. A esse propósito, por to<strong>do</strong>s os <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res<br />

consumeristas, como pon<strong>de</strong>ra Claudia Lima Marques, “no Brasil, pois, a proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r é um valor constitucionalmente<br />

fundamental (Wertsystem) e é um direito subjetivo fundamental (art. 5º, XXXII), guian<strong>do</strong> – e impon<strong>do</strong> – a aplicação ex officio da<br />

norma protetiva <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, a qual realize o direito humano (efeito útil e pro homine <strong>do</strong> status constitucional); esteja esta<br />

norma no CDC ou em fonte outra (art. 7º <strong>do</strong> CDC)”. 10<br />

De to<strong>do</strong> mo<strong>do</strong>, pelo que consta <strong>do</strong> art. 10 <strong>do</strong> mesmo CPC/2015, antes <strong>de</strong>sse conhecimento <strong>de</strong> ofício, <strong>de</strong>ve o juiz ouvir as partes<br />

envolvidas, o que representa aplicação <strong>do</strong> princípio da boa-fé objetiva processual. Nos termos da norma, que veda as chamadas<br />

<strong>de</strong>cisões-surpresas, “o juiz não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir, em grau algum <strong>de</strong> jurisdição, com base em fundamento a respeito <strong>do</strong> qual não se<br />

tenha da<strong>do</strong> às partes oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se manifestar, ainda que se trate <strong>de</strong> matéria sobre a qual <strong>de</strong>va <strong>de</strong>cidir <strong>de</strong> ofício”.<br />

Como palavras finais sobre o tema, o presente autor tem ciência <strong>de</strong> que a conclusão pela <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> ofício é<br />

controversa, repelida por muitos processualistas, inclusive pelo coautor <strong>de</strong>sta obra. Todavia, reitere-se o fundamento da existência<br />

<strong>de</strong> norma <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública e interesse social para que a tese tenha forte amparo. Eis uma questão que, sem dúvida, será muito<br />

<strong>de</strong>batida nos próximos anos, sob a égi<strong>de</strong> <strong>do</strong> Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

1 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Comercial. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 2, p. 37.<br />

2<br />

3<br />

4<br />

5<br />

6<br />

7<br />

8<br />

9<br />

10<br />

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Comercial. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 2, p. 41.<br />

Por to<strong>do</strong>s, ver: COELHO, Fábio Ulhoa. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Comercial. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 2, p. 36-47.<br />

GARCIA, Leonar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. Niterói: Impetus, 2007. p. 114; PODESTÁ, Fábio Henrique. Código <strong>de</strong> Defesa<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2010. p. 177.<br />

NICOLAU, Gustavo René. Desconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica. In: CANEZIN, Clau<strong>de</strong>te Carvalho. Arte jurídica. Curitiba: Juruá, 2006.<br />

v. III, p. 236.<br />

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Comercial. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2011. v. 2, p. 66-67.<br />

MADALENO, Rolf. <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> família. Aspectos polêmicos. 2. ed. Porto Alegre: Livraria <strong>do</strong> Advoga<strong>do</strong>, 1999. p. 31.<br />

DENARI, Zelmo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária,<br />

2004. p. 238.<br />

DENARI, Zelmo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária,<br />

2004. p. 238.<br />

MARQUES, Claudia Lima. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 70. No mesmo senti<strong>do</strong>, ver:<br />

TARTUCE, <strong>Flávio</strong>; NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Manual <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Volume Único. 4. ed. São Paulo: Méto<strong>do</strong>,<br />

2015. Capítulos 1 e 2.


TUTELA INDIVIDUAL DO CONSUMIDOR EM JUÍZO<br />

Sumário: 10.1. Introdução – 10.2. Meios <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos: 10.2.1. Introdução; 10.2.2. Jurisdição; 10.2.3.<br />

Equivalentes jurisdicionais – 10.3. Tutela específica das obrigações <strong>de</strong> fazer e não fazer: 10.3.1. Introdução; 10.3.2.<br />

Tutela jurisdicional; 10.3.3. Procedimento previsto pelo art. 84 <strong>do</strong> CDC – 10.4. Competência: 10.4.1. Introdução;<br />

10.4.2. Competência da Justiça; 10.4.3. Competência territorial; 10.4.4. Competência <strong>do</strong> juízo – 10.5. Intervenções<br />

<strong>de</strong> terceiros: 10.5.1. Introdução; 10.5.2. Denunciação da li<strong>de</strong>; 10.5.3. Chamamento ao processo – 10.6.<br />

Litisconsórcio alternativo e o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – 10.7. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova: 10.7.1. Ônus da<br />

prova; 10.7.2. Regras <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong> ônus da prova; 10.7.3. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova; 10.7.4. Momento <strong>de</strong><br />

inversão <strong>do</strong> ônus da prova; 10.7.5. Inversão da prova e inversão <strong>do</strong> adiantamento <strong>de</strong> custas processuais.<br />

10.1.<br />

INTRODUÇÃO<br />

Conforme ficou claro na parte da presente obra que cuida <strong>do</strong>s aspectos materiais <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, existe uma nítida<br />

disparida<strong>de</strong> <strong>de</strong> condições entre ele e o fornece<strong>do</strong>r, sen<strong>do</strong> to<strong>do</strong> o arcabouço legislativo material cria<strong>do</strong> para equilibrar a relação<br />

entre eles. As normas são protetivas porque, invariavelmente, consi<strong>de</strong>ram a situação <strong>de</strong> <strong>de</strong>svantagem <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, não sen<strong>do</strong> o<br />

diploma legal chama<strong>do</strong> “Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r” sem razão.<br />

No plano <strong>do</strong> direito processual, era natural que se <strong>de</strong>sse o mesmo fenômeno, com a criação <strong>de</strong> normas procedimentais<br />

protetivas ao consumi<strong>do</strong>r, até porque, conforme ensina a melhor <strong>do</strong>utrina a respeito <strong>do</strong> tema, “sem essas garantias processuais, os<br />

direitos materiais tornam-se normas programáticas sem maior contato com a realida<strong>de</strong> e o cotidiano <strong>do</strong>s cidadãos. Não basta,<br />

portanto, garantir a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r no plano material; é preciso garanti-la também no plano processual”1.<br />

O tratamento diferencia<strong>do</strong> <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> no plano <strong>do</strong> direito material ao consumi<strong>do</strong>r é ainda mais justificável no plano <strong>do</strong> direito<br />

processual em razão da tradicional diferença entre as espécies <strong>de</strong> litigantes formadas por consumi<strong>do</strong>res e fornece<strong>do</strong>res. Enquanto<br />

os primeiros são chama<strong>do</strong>s <strong>de</strong> litigantes eventuais, porque não participam <strong>de</strong> processos judiciais com frequência 2 , os segun<strong>do</strong>s são<br />

chama<strong>do</strong>s <strong>de</strong> litigantes habituais (ou contumazes), porque são frequentes clientes <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário, invariavelmente no polo<br />

passivo das <strong>de</strong>mandas.<br />

Conforme da<strong>do</strong>s <strong>de</strong> pesquisa divulgada pelo Conselho Nacional <strong>de</strong> Justiça (CNJ) no mês <strong>de</strong> março <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2011, a respeito<br />

<strong>do</strong>s maiores litigantes no Po<strong>de</strong>r Judiciário brasileiro, se nota com clareza a presença <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res como litigantes habituais. Dos<br />

<strong>de</strong>z maiores litigantes da lista, cinco são instituições financeiras e um é empresa <strong>de</strong> telefonia. Os bancos respon<strong>de</strong>m por 38% das<br />

ações judiciais em trâmite e as empresas <strong>de</strong> telefonia por 6%, dan<strong>do</strong> uma exata dimensão da quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ações consumeristas e<br />

da presença constante <strong>de</strong>sses fornece<strong>do</strong>res em tais <strong>de</strong>mandas.<br />

A existência <strong>de</strong> um litigante habitual contra um litigante eventual já causa um <strong>de</strong>sequilíbrio entre as partes, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se<br />

que, no primeiro caso, existe uma organização montada para atuação nos litígios judiciais, além <strong>de</strong> serem acostuma<strong>do</strong>s aos seus<br />

meandros e à frequente <strong>de</strong>mora para a concessão <strong>de</strong> uma tutela jurisdicional <strong>de</strong>finitiva. O consumi<strong>do</strong>r, pouco afeito ao mun<strong>do</strong><br />

judicial, é invariavelmente alguém que não está acostuma<strong>do</strong> com o processo, e tampouco tem uma organização fixa para enfrentar<br />

as complexida<strong>de</strong>s, <strong>de</strong>mora e custos advin<strong>do</strong>s da batalha judicial.<br />

Some-se a isso a frequente disparida<strong>de</strong> econômica entre ambos, característica que permite ao fornece<strong>do</strong>r suportar o exorbitante


tempo que uma ação judicial po<strong>de</strong> tomar e os custos gera<strong>do</strong>s por ela <strong>de</strong> forma muito mais confortável que o consumi<strong>do</strong>r.<br />

Prepara<strong>do</strong>, acostuma<strong>do</strong> e com folga patrimonial para aguentar o processo, o fornece<strong>do</strong>r, como litigante contumaz, ou habitual,<br />

sempre estará em posição <strong>de</strong> vantagem sobre o consumi<strong>do</strong>r.<br />

A regra <strong>de</strong> que a lei <strong>de</strong>ve tratar to<strong>do</strong>s <strong>de</strong> forma igual (art. 5.º, caput e inciso I, da CF) aplica-se também ao processo, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong><br />

tanto a legislação como o juiz, no caso concreto, garantir às partes uma “parida<strong>de</strong> <strong>de</strong> armas” (art. 7.º <strong>do</strong> Novo CPC), como forma<br />

<strong>de</strong> manter equilibrada a disputa judicial entre elas. A isonomia no tratamento processual das partes é forma, inclusive, <strong>de</strong> o juiz<br />

<strong>de</strong>monstrar a sua imparcialida<strong>de</strong>, porque <strong>de</strong>monstra que não há favorecimento <strong>de</strong> qualquer uma <strong>de</strong>las.<br />

O princípio da isonomia, entretanto, não po<strong>de</strong> se esgotar num aspecto formal, pelo qual basta tratar to<strong>do</strong>s igualmente que<br />

estará garantida a igualda<strong>de</strong> das partes, porque essa forma <strong>de</strong> ver o fenômeno está fundada na incorreta premissa <strong>de</strong> que to<strong>do</strong>s<br />

sejam iguais. É natural que, haven<strong>do</strong> uma igualda<strong>de</strong> entre as partes, o tratamento também <strong>de</strong>va ser igual, mas a isonomia entre<br />

sujeitos <strong>de</strong>siguais só po<strong>de</strong> ser atingida por meio <strong>de</strong> um tratamento também <strong>de</strong>sigual, na medida <strong>de</strong>ssa <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>. O objetivo<br />

primordial na isonomia é permitir que concretamente as partes atuem no processo, <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> limite <strong>do</strong> possível, no mesmo<br />

patamar. Por isso, alguns sujeitos, seja pela sua qualida<strong>de</strong>, seja pela natureza <strong>do</strong> direito que discutem em juízo, têm algumas<br />

prerrogativas que diferenciam seu tratamento processual <strong>do</strong>s <strong>de</strong>mais sujeitos, como forma <strong>de</strong> equilibrar a disputa processual.<br />

No caso <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo, a efetivação <strong>do</strong> princípio da isonomia real <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> um tratamento diferencia<strong>do</strong>, com<br />

proteções maiores dispensadas a ele, <strong>de</strong> forma que tenha condições equânimes <strong>de</strong> enfrentar o fornece<strong>do</strong>r. Nada mais <strong>do</strong> que tratar<br />

os <strong>de</strong>siguais <strong>de</strong>sigualmente, na medida <strong>de</strong> suas <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s.<br />

A <strong>de</strong>fesa individual <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo não mereceu <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r o mesmo cuida<strong>do</strong> que este <strong>de</strong>spen<strong>de</strong>u para a <strong>de</strong>fesa<br />

coletiva. Ainda que existam dispositivos comuns a essas duas formas <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa, é inegável que a maior parte das normas<br />

processuais consumeristas diz respeito exclusivamente à tutela coletiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Tamanha a relevância <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r para a tutela coletiva que o diploma legal faz parte <strong>do</strong> núcleo duro <strong>do</strong> microssistema coletivo, sen<strong>do</strong>,<br />

inclusive, aplicável a direitos coletivos lato sensu <strong>de</strong> outras naturezas que não a consumerista3.<br />

De qualquer forma, a menor preocupação <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r quanto à tutela jurisdicional individual <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r já é o suficiente<br />

para o apontamento <strong>de</strong> alguns dispositivos <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r que criam algumas prerrogativas processuais,<br />

sempre com o objetivo <strong>de</strong> facilitar o exercício <strong>de</strong> sua ampla <strong>de</strong>fesa no caso concreto. Não há, entretanto, uma ação específica e<br />

exclusiva à disposição <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, como também não está previsto na Lei 8.078/1990 um procedimento especialmente cria<strong>do</strong><br />

para a sua tutela individual. O que se tem são algumas regras legais que tratam <strong>de</strong> forma diferenciada o consumi<strong>do</strong>r em sua atuação<br />

processual.<br />

A opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r por previsões esparsas, sem a criação <strong>de</strong> uma estrutura procedimental para a tutela individual <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, fica clara na redação <strong>do</strong> art. 83 <strong>do</strong> CDC, que garante, para a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r – individual e coletiva –,<br />

a utilização <strong>de</strong> todas as ações capazes <strong>de</strong> propiciar a a<strong>de</strong>quada e efetiva tutela <strong>do</strong>s interesses consagra<strong>do</strong>s no referi<strong>do</strong> diploma. Ou<br />

seja, o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> se valer <strong>de</strong> todas as ações, procedimentos e espécies <strong>de</strong> tutela jurisdicional presentes no sistema<br />

processual, não existin<strong>do</strong> especificamente na Lei 8.078/1990 qualquer criação nesse senti<strong>do</strong>.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, reconhecen<strong>do</strong>-se a criação <strong>de</strong> um microssistema pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, e não haven<strong>do</strong> a<br />

criação <strong>de</strong> ações ou procedimentos específicos para a tutela individual <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, é natural a constante aplicação das regras<br />

procedimentais constantes <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. O próprio art. 90 da Lei 8.078/1990 prevê essa aplicação naquilo que não<br />

contrariar as regras estabelecidas pelo Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

Como são poucas as regras procedimentais previstas na Lei 8.078/1990 que regulamentam a ativida<strong>de</strong> processual <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r individual em juízo, será natural uma frequente e constante utilização das normas consagradas no Código <strong>de</strong> Processo<br />

Civil, não sen<strong>do</strong> interessante nesta obra tratar <strong>de</strong> temas que não são <strong>de</strong> aplicação exclusiva à <strong>de</strong>fesa individual <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r em juízo. Dessa forma, o presente capítulo tem como pretensão abordar os aspectos diferenciais constantes na Lei<br />

8.078/1990.<br />

10.2.<br />

10.2.1.<br />

MEIOS DE SOLUÇÃO DOS CONFLITOS<br />

Introdução<br />

O sistema jurídico brasileiro disponibiliza às partes variadas formas <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos, sen<strong>do</strong> possível elencar a<br />

jurisdição, a autotutela, a autocomposição, a mediação e a arbitragem. A pretensão, no presente capítulo, é analisar como essas<br />

diferentes formas <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos aplicam-se ao direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

10.2.2.<br />

Jurisdição


A jurisdição po<strong>de</strong> ser entendida como a atuação estatal visan<strong>do</strong> à aplicação <strong>do</strong> direito objetivo ao caso concreto, resolven<strong>do</strong>-se<br />

com <strong>de</strong>finitivida<strong>de</strong> uma situação <strong>de</strong> crise jurídica e geran<strong>do</strong> com tal solução a pacificação social. Note-se que neste conceito não<br />

consta o tradicional entendimento <strong>de</strong> que a jurisdição se presta a resolver um conflito <strong>de</strong> interesses entre as partes, substituin<strong>do</strong><br />

suas vonta<strong>de</strong>s pela vonta<strong>de</strong> da lei. Primeiro, porque nem sempre haverá conflito <strong>de</strong> interesses a ser resolvi<strong>do</strong>, e segun<strong>do</strong>, porque<br />

nem sempre a ativida<strong>de</strong> jurisdicional substituirá a vonta<strong>de</strong> das partes, conforme será <strong>de</strong>vidamente analisa<strong>do</strong> em momento<br />

oportuno.<br />

Há <strong>do</strong>utrina que prefere analisar a jurisdição sob três aspectos distintos: po<strong>de</strong>r, função e ativida<strong>de</strong>4. O po<strong>de</strong>r jurisdicional é o<br />

que permite o exercício da função jurisdicional, que se materializa no caso concreto por meio da ativida<strong>de</strong> jurisdicional. Essa<br />

intersecção é natural e explicável por tratar-se <strong>de</strong> um mesmo fenômeno processual, mas, ainda assim, é interessante a análise<br />

conforme sugeri<strong>do</strong>, porque com isso tem-se uma apuração terminológica sempre bem-vinda. É importante não confundir as<br />

expressões “po<strong>de</strong>r jurisdicional”, “função jurisdicional” e “ativida<strong>de</strong> jurisdicional”.<br />

Entendida como po<strong>de</strong>r, a jurisdição representa o po<strong>de</strong>r estatal <strong>de</strong> interferir na esfera jurídica <strong>do</strong>s jurisdiciona<strong>do</strong>s, aplican<strong>do</strong> o<br />

direito objetivo ao caso concreto e resolven<strong>do</strong> a crise jurídica que os envolve. Há tempos se compreen<strong>de</strong> que o po<strong>de</strong>r jurisdicional<br />

não se limita a dizer o direito (juris-dicção), mas também <strong>de</strong> impor o direito (juris-satisfação). Realmente, <strong>de</strong> nada adiantaria a<br />

jurisdição dizer o direito, mas não reunir condições para fazer valer esse direito concretamente. Note-se que a jurisdição como<br />

po<strong>de</strong>r é algo que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> essencialmente <strong>de</strong> um Esta<strong>do</strong> organiza<strong>do</strong> e forte o suficiente para interferir concretamente na esfera<br />

jurídica <strong>de</strong> seus cidadãos.<br />

Tradicionalmente, a jurisdição (juris-dicção) era entendida como a atuação da vonta<strong>de</strong> concreta <strong>do</strong> direito objetivo<br />

(Chiovenda), sen<strong>do</strong> que a <strong>do</strong>utrina se dividia entre aqueles que entendiam que essa atuação <strong>de</strong>rivava <strong>de</strong> a sentença fazer concreta a<br />

norma geral (Carnelutti) ou criar uma norma individual com base na regra geral (Kelsen). Contemporaneamente, notou-se que tais<br />

formas <strong>de</strong> enxergar a jurisdição estavam fundadas em um positivismo acrítico e no princípio da supremacia da lei, o que não mais<br />

atendia às exigências <strong>de</strong> justiça <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> atual. Dessa forma, autorizada <strong>do</strong>utrina passa a afirmar que a jurisdição <strong>de</strong>veria se<br />

ocupar da criação, no caso concreto, da norma jurídica, resulta<strong>do</strong> da aplicação da norma legal à luz <strong>do</strong>s direitos fundamentais e <strong>do</strong>s<br />

princípios constitucionais <strong>de</strong> justiça. Reconhece ainda essa nova visão da jurisdição que não adianta somente a edição da norma<br />

jurídica (juris-dicção), sen<strong>do</strong> necessário tutelar concretamente o direito material, o que se fará pela execução (juris-satisfação)5.<br />

Como função, a jurisdição é o encargo atribuí<strong>do</strong> pela Constituição Fe<strong>de</strong>ral, em regra, ao Po<strong>de</strong>r Judiciário – função típica –, e,<br />

excepcionalmente, a outros Po<strong>de</strong>res – função atípica –, <strong>de</strong> exercer concretamente o po<strong>de</strong>r jurisdicional. A função jurisdicional não<br />

é privativa <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário, como se constata nos processos <strong>de</strong> impeachment <strong>do</strong> Presi<strong>de</strong>nte da República realiza<strong>do</strong>s pelo Po<strong>de</strong>r<br />

Legislativo (arts. 49, IX, e 52, I, da CF), ou nas sindicâncias e processos administrativos conduzi<strong>do</strong>s pelo Po<strong>de</strong>r Executivo (art. 41,<br />

§ 1.º, II, da CF), ainda que nesses casos não haja <strong>de</strong>finitivida<strong>de</strong>. Também o Po<strong>de</strong>r Judiciário não se limita ao exercício da função<br />

jurisdicional, exercen<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma atípica – e bem por isso excepcional – função administrativa (p. ex., organização <strong>de</strong> concursos<br />

públicos) e legislativa (p. ex., elaboração <strong>de</strong> Regimentos Internos <strong>de</strong> tribunais) 6 .<br />

Como ativida<strong>de</strong>, a jurisdição é o complexo <strong>de</strong> atos pratica<strong>do</strong>s pelo agente estatal investi<strong>do</strong> <strong>de</strong> jurisdição no processo. A função<br />

jurisdicional se concretiza por meio <strong>do</strong> processo, forma que a lei criou para que tal exercício se fizesse possível. Na condução <strong>do</strong><br />

processo, o Esta<strong>do</strong>, ser inanima<strong>do</strong> que é, investe <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s sujeitos <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r jurisdicional para que possa, por meio da prática<br />

<strong>de</strong> atos processuais, exercer concretamente tal po<strong>de</strong>r. Esses sujeitos são os juízes <strong>de</strong> direito, que, por representarem o Esta<strong>do</strong> no<br />

processo, são chama<strong>do</strong>s <strong>de</strong> “Esta<strong>do</strong>-juiz”.<br />

Como se verifica em praticamente todas as espécies <strong>de</strong> conflitos <strong>de</strong> interesses, aqueles que envolvem o consumi<strong>do</strong>r e o<br />

fornece<strong>do</strong>r são em sua maioria resolvi<strong>do</strong>s por meio da jurisdição. A cultura <strong>do</strong> processo (litigiosida<strong>de</strong>) existente entre os<br />

opera<strong>do</strong>res <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>, bem como na população em geral, leva à maioria das crises jurídicas consumeristas ao Po<strong>de</strong>r Judiciário, na<br />

busca <strong>de</strong> uma solução impositiva <strong>do</strong> juiz que resolva o conflito <strong>de</strong> interesses. O aspecto positivo para o consumi<strong>do</strong>r é que em sua<br />

tutela serão cabíveis quaisquer espécies <strong>de</strong> ação judicial, nos termos <strong>do</strong> art. 83 <strong>do</strong> CDC, bem como cabe ao juiz a facilitação da<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo, nos termos <strong>do</strong> art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> mesmo diploma legal.<br />

10.2.3.<br />

Equivalentes jurisdicionais<br />

O Esta<strong>do</strong> não tem, por meio da jurisdição, o monopólio da solução <strong>do</strong>s conflitos, sen<strong>do</strong> admitidas pelo <strong>Direito</strong> outras maneiras<br />

pelas quais as partes possam buscar uma solução <strong>do</strong> conflito em que estão envolvidas. São chamadas <strong>de</strong> equivalentes jurisdicionais<br />

ou <strong>de</strong> formas alternativas <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos. Há três espécies reconhecidas por nosso direito: autotutela, autocomposição,<br />

mediação e arbitragem.<br />

A valorização das formas alternativas <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos já é <strong>de</strong>monstrada no art. 3.º <strong>do</strong> Novo CPC. Nos termos <strong>do</strong> § 2.º,<br />

o Esta<strong>do</strong> promoverá, sempre que possível, a solução consensual <strong>do</strong>s conflitos, enquanto o § 3.º prevê que a conciliação, a


mediação e outros méto<strong>do</strong>s <strong>de</strong> solução consensual <strong>de</strong> conflitos <strong>de</strong>verão ser estimula<strong>do</strong>s por juízes, advoga<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>fensores públicos<br />

e membros <strong>do</strong> Ministério Público, inclusive no curso <strong>do</strong> processo judicial.<br />

O Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil, entretanto, não trouxe apenas disposições principiológicas no que se refere às formas<br />

consensuais <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos. Há uma seção inteira <strong>de</strong> um capítulo <strong>de</strong>stinada a regulamentar a ativida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s concilia<strong>do</strong>res e<br />

<strong>do</strong>s media<strong>do</strong>res judiciais (arts. 165-175), inclusive fazen<strong>do</strong> expressamente a distinção entre conciliação (melhor teria si<strong>do</strong> usar<br />

autocomposição) e mediação.<br />

Ainda que por razões óbvias tal capítulo se limite a regulamentar a mediação ou conciliação quan<strong>do</strong> já instaura<strong>do</strong> o processo,<br />

quan<strong>do</strong> o i<strong>de</strong>al seria que elas justamente evitassem sua existência, o diploma processual é inova<strong>do</strong>r e sai da abstração <strong>do</strong> “conciliar<br />

é legal” para a criação <strong>de</strong> uma estrutura e <strong>de</strong> um procedimento que realmente possam incrementar a conciliação e a mediação como<br />

forma <strong>de</strong> solução <strong>do</strong> conflito e, por consequência, a extinção <strong>do</strong> processo por sentença homologatória da autocomposição.<br />

Enten<strong>do</strong> extremamente positiva a iniciativa <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r, até porque, se há essas formas consensuais <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos,<br />

é melhor que exista uma estrutura organizada e um procedimento <strong>de</strong>fini<strong>do</strong> e inteligente para viabilizar sua realização da forma<br />

mais ampla possível.<br />

Registro, entretanto e uma vez mais, que não vejo a priorização da mediação e, em especial, da conciliação como a panaceia a<br />

to<strong>do</strong>s os problemas no campo <strong>do</strong>s conflitos <strong>de</strong> interesses. Admito a relevância indiscutível <strong>de</strong>ssas formas <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos<br />

em <strong>de</strong>terminadas espécies <strong>de</strong> crises jurídicas, em especial no direito <strong>de</strong> família e <strong>de</strong> vizinhança. Admiti<strong>do</strong> também que a<br />

pacificação social (solução da li<strong>de</strong> sociológica) po<strong>de</strong> ser mais facilmente obtida por uma solução <strong>do</strong> conflito <strong>de</strong>rivada da vonta<strong>de</strong><br />

das partes <strong>do</strong> que pela imposição <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>cisão judicial (ou arbitral). Admiti<strong>do</strong> até que, quanto mais conflitos forem resolvi<strong>do</strong>s<br />

fora da jurisdição, menos processos haverá, e, por consequência, o Po<strong>de</strong>r Judiciário po<strong>de</strong>rá funcionar <strong>de</strong> maneira mais célere e<br />

a<strong>de</strong>quada às aspirações <strong>do</strong> acesso à or<strong>de</strong>m jurídica justa.<br />

O que me causa extremo <strong>de</strong>sconforto é notar que a valorização da conciliação (a mediação é ainda embrionária entre nós)<br />

leva-nos a ver com naturalida<strong>de</strong> o famoso dita<strong>do</strong> <strong>de</strong> que vale mais um acor<strong>do</strong> ruim <strong>do</strong> que um processo bom. Ao se concretizar tal<br />

esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> coisas, estaremos <strong>de</strong>finitivamente renuncian<strong>do</strong> ao respeito <strong>do</strong> direito material e <strong>de</strong>cretan<strong>do</strong> a falência <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r<br />

Judiciário.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, em especial em <strong>de</strong>terminadas áreas <strong>do</strong> direito material, como o direito consumerista, a distância econômica<br />

entre o litigante contumaz (fornece<strong>do</strong>r) e o litigante eventual (consumi<strong>do</strong>r) gera transações – ou conciliações a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>do</strong> senti<strong>do</strong><br />

empresta<strong>do</strong> ao termo – absolutamente injustas e que passam longe da tão propalada pacificação social. Se parece interessante por<br />

variadas razões para o fornece<strong>do</strong>r, para o consumi<strong>do</strong>r a transação é muitas vezes um ato <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong>, e não <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>, <strong>de</strong><br />

forma que esperar que ele fique satisfeito pela solução <strong>do</strong> conflito é <strong>de</strong> uma ingenuida<strong>de</strong> e, pior, <strong>de</strong> uma ausência <strong>de</strong> análise<br />

empírica preocupantes.<br />

E há mais, porque, a se consolidar a política da conciliação em substituição à jurisdição, o <strong>de</strong>srespeito às normas <strong>de</strong> direito<br />

material po<strong>de</strong>rá se mostrar vantajoso economicamente para sujeitos que têm dinheiro e estrutura para aguentar as agruras <strong>do</strong><br />

processo e sabem que <strong>do</strong> outro la<strong>do</strong> haverá alguém lesa<strong>do</strong> que aceitará um acor<strong>do</strong>, ainda que <strong>de</strong>svantajoso, somente para se livrar<br />

<strong>do</strong>s tormentos <strong>de</strong> variadas naturezas que o processo atualmente gera. O <strong>de</strong>srespeito ao direito material passará a ser o resulta<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

um cálculo <strong>de</strong> risco-benefício realiza<strong>do</strong> pelos <strong>de</strong>tentores <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r econômico, em <strong>de</strong>sprestígio evi<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> Democrático <strong>do</strong><br />

<strong>Direito</strong>.<br />

10.2.3.1.<br />

Autotutela<br />

É a forma mais antiga <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos, constituin<strong>do</strong>-se fundamentalmente pelo sacrifício integral <strong>do</strong> interesse <strong>de</strong> uma<br />

das partes envolvidas no conflito em razão <strong>do</strong> exercício da força pela parte vence<strong>do</strong>ra. Por “força” <strong>de</strong>ve-se enten<strong>de</strong>r qualquer<br />

po<strong>de</strong>r que a parte vence<strong>do</strong>ra tenha condições <strong>de</strong> exercer sobre a parte <strong>de</strong>rrotada, resultan<strong>do</strong> na imposição <strong>de</strong> sua vonta<strong>de</strong>. O<br />

fundamento <strong>de</strong>ssa força não se limita ao aspecto físico, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-se verificar nos aspectos afetivo, econômico, religioso etc.<br />

É evi<strong>de</strong>nte que uma solução <strong>de</strong> conflitos resultante <strong>do</strong> exercício da força não é a forma que se procura prestigiar num Esta<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>mocrático <strong>de</strong> direito. Aliás, pelo contrário, a autotutela lembra as socieda<strong>de</strong>s mais rudimentares, nas quais a força era sempre<br />

<strong>de</strong>terminante para a solução <strong>do</strong>s conflitos, pouco importan<strong>do</strong> <strong>de</strong> quem era o direito objetivo no caso concreto. Como, então, a<br />

autotutela continua a <strong>de</strong>sempenhar papel <strong>de</strong> equivalente jurisdicional ainda nos tempos atuais?<br />

Primeiro, é preciso observar que a autotutela é consi<strong>de</strong>ravelmente excepcional, sen<strong>do</strong> raras as previsões legais que a admitem.<br />

Como exemplos, é possível lembrar a legítima <strong>de</strong>fesa (art. 188, I, <strong>do</strong> CC); apreensão <strong>do</strong> bem com penhor legal (art. 1.467, I, <strong>do</strong><br />

CC); <strong>de</strong>sforço imediato no esbulho (art. 1.210, § 1.º, <strong>do</strong> CC). A justificativa é <strong>de</strong> que o Esta<strong>do</strong> não é onipresente, sen<strong>do</strong> impossível<br />

estar em to<strong>do</strong> lugar e a to<strong>do</strong> momento para solucionar violações ou ameaças ao direito objetivo, <strong>de</strong> forma que em algumas<br />

situações excepcionais é mais interessante ao sistema jurídico, diante da ausência <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, a solução pelo exercício da força <strong>de</strong>


um <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s no conflito.<br />

Segun<strong>do</strong>, e mais importante, a autotutela é a única forma <strong>de</strong> solução alternativa <strong>de</strong> conflitos que po<strong>de</strong> ser amplamente revista<br />

pelo Po<strong>de</strong>r Judiciário, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que o <strong>de</strong>rrota<strong>do</strong> sempre po<strong>de</strong>rá judicialmente reverter eventuais prejuízos advin<strong>do</strong>s da solução <strong>do</strong><br />

conflito pelo exercício da força <strong>de</strong> seu adversário. Trata-se, portanto, <strong>de</strong> uma forma imediata <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos, mas que não<br />

recebe os atributos da <strong>de</strong>finitivida<strong>de</strong>, sempre po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser revista jurisdicionalmente.<br />

De qualquer forma, tem rara aplicação no campo consumerista, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser lembrada como exemplo o direito <strong>do</strong> hoteleiro em<br />

manter a bagagem <strong>do</strong> cliente que não quita sua conta no momento <strong>de</strong> sair <strong>do</strong> hotel. A rarida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua existência no sistema <strong>de</strong><br />

solução <strong>de</strong> conflitos é uma boa notícia para o consumi<strong>do</strong>r, porque, sen<strong>do</strong> uma forma <strong>de</strong> solução baseada na força <strong>de</strong> uma das<br />

partes, é presumível que o fornece<strong>do</strong>r seja sempre o vence<strong>do</strong>r da disputa, dada a reconhecida hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r nesta<br />

relação jurídica.<br />

10.2.3.2.<br />

Autocomposição<br />

A autocomposição é uma interessante e cada vez mais popular forma <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos sem a interferência da<br />

jurisdição, estan<strong>do</strong> fundada no sacrifício integral ou parcial <strong>do</strong> interesse das partes envolvidas no conflito, mediante a vonta<strong>de</strong><br />

unilateral ou bilateral <strong>de</strong> tais sujeitos. O que <strong>de</strong>termina a solução <strong>do</strong> conflito não é o exercício da força, como ocorre na autotutela,<br />

mas a vonta<strong>de</strong> das partes, o que é muito mais condizente com o Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong>mocrático <strong>de</strong> direito em que vivemos. Inclusive, é<br />

consi<strong>de</strong>rada atualmente um excelente meio <strong>de</strong> pacificação social, porque inexiste no caso concreto uma <strong>de</strong>cisão impositiva, como<br />

ocorre na jurisdição, valorizan<strong>do</strong>-se a autonomia da vonta<strong>de</strong> das partes na solução <strong>do</strong>s conflitos.<br />

A autocomposição é um gênero, <strong>do</strong> qual são espécies a transação – a mais comum –, a submissão e a renúncia. Na transação,<br />

há um sacrifício recíproco <strong>de</strong> interesses, sen<strong>do</strong> que cada parte abdica parcialmente <strong>de</strong> sua pretensão para que se atinja a solução <strong>do</strong><br />

conflito. Trata-se <strong>do</strong> exercício <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> bilateral das partes, visto que, quan<strong>do</strong> um não quer, <strong>do</strong>is não fazem a transação. Na<br />

renúncia e na submissão, o exercício <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> é unilateral, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> até mesmo ser consi<strong>de</strong>radas soluções altruístas <strong>do</strong> conflito,<br />

levan<strong>do</strong> em conta que a solução <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> ato da parte que abre mão <strong>do</strong> exercício <strong>de</strong> um direito que teoricamente seria legítimo.<br />

Na renúncia, o titular <strong>do</strong> pretenso direito simplesmente abdica <strong>de</strong> tal direito, fazen<strong>do</strong>-o <strong>de</strong>saparecer juntamente com o conflito<br />

gera<strong>do</strong> por sua ofensa, enquanto na submissão o sujeito se submete à pretensão contrária, ainda que fosse legítima sua resistência.<br />

Cumpre observar que, embora sejam espécies <strong>de</strong> autocomposição, e por tal razão formas <strong>de</strong> equivalentes jurisdicionais, a<br />

transação, a renúncia e a submissão po<strong>de</strong>m ocorrer também durante um processo judicial, sen<strong>do</strong> que a submissão, nesse caso, é<br />

chamada <strong>de</strong> reconhecimento jurídico <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>, enquanto a transação e a renúncia mantêm a mesma nomenclatura. Verifican<strong>do</strong>-se<br />

durante um processo judicial, o juiz homologará por sentença <strong>de</strong> mérito a autocomposição (art. 487, III <strong>do</strong> Novo CPC), com<br />

formação <strong>de</strong> coisa julgada material. Nesse caso, é importante perceber que a solução <strong>do</strong> conflito <strong>de</strong>u-se por autocomposição,<br />

<strong>de</strong>rivada da manifestação da vonta<strong>de</strong> das partes, e não da aplicação <strong>do</strong> direito objetivo ao caso concreto (ou ainda da criação da<br />

norma jurídica), ainda que a participação homologatória <strong>do</strong> juiz tenha produzi<strong>do</strong> uma <strong>de</strong>cisão apta a gerar a coisa julgada material.<br />

Dessa forma, tem-se certa hibri<strong>de</strong>z: substancialmente, o conflito foi resolvi<strong>do</strong> por autocomposição, mas formalmente, em razão da<br />

sentença judicial homologatória, há o exercício <strong>de</strong> jurisdição.<br />

Pela negociação, as partes chegam a uma transação sem a intervenção <strong>de</strong> um terceiro, enquanto na conciliação há a presença<br />

<strong>de</strong> um terceiro (concilia<strong>do</strong>r) que funcionará como intermediário entre as partes. O concilia<strong>do</strong>r não tem o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir o<br />

conflito, mas po<strong>de</strong> <strong>de</strong>sarmar os espíritos e levar as partes a exercer suas vonta<strong>de</strong>s no caso concreto para resolver o conflito <strong>de</strong><br />

interesse.<br />

A solução pela autocomposição, em especial a transação, po<strong>de</strong> não trazer a tão almejada pacificação social, propagan<strong>de</strong>ada<br />

aos quatro cantos como efeito natural da transação (também chamada rotineiramente <strong>de</strong> conciliação). As ostensivas campanhas<br />

capitaneadas pelo Conselho Nacional <strong>de</strong> Justiça (CNJ), como o prêmio “Conciliar é Legal”, <strong>de</strong>vem ser analisadas com cuida<strong>do</strong> no<br />

campo consumerista.<br />

A pacificação social tem como objetivo precípuo a solução da chamada “li<strong>de</strong> sociológica”7. De nada adianta resolver o<br />

conflito no aspecto jurídico se, no aspecto fático, persiste a insatisfação das partes, o que naturalmente contribui para a manutenção<br />

<strong>do</strong> esta<strong>do</strong> beligerante entre elas. A solução jurídica da <strong>de</strong>manda <strong>de</strong>ve necessariamente gerar a pacificação no plano fático, em que<br />

os efeitos da jurisdição são suporta<strong>do</strong>s pelos jurisdiciona<strong>do</strong>s. Daí a visão <strong>de</strong> que a transação é uma excelente forma <strong>de</strong> resolver a<br />

“li<strong>de</strong> sociológica”, porque o conflito se resolve sem a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão impositiva <strong>de</strong> um terceiro 8 . No direito consumerista,<br />

entretanto, alguns fatores <strong>de</strong>vem ser leva<strong>do</strong>s em consi<strong>de</strong>ração.<br />

É certo que, em toda transação, as partes envolvidas no conflito <strong>de</strong>vem sacrificar alguma parcela <strong>de</strong> seu interesse inicial, sem o<br />

que não se chega a qualquer solução consensual baseada em sucumbências recíprocas. O problema, em meu enten<strong>de</strong>r, é a enorme<br />

disparida<strong>de</strong> existente na maioria das vezes entre fornece<strong>do</strong>r e consumi<strong>do</strong>r, o que leva a distorções na transação e, por


consequência, apesar <strong>de</strong> resolver o conflito jurídico, fica longe da pacificação social.<br />

Deve-se consi<strong>de</strong>rar que o fornece<strong>do</strong>r não só tem o po<strong>de</strong>r econômico em seu favor, como, sen<strong>do</strong> um litigante contumaz, po<strong>de</strong><br />

aguentar a absurda <strong>de</strong>mora <strong>de</strong> um processo judicial. O consumi<strong>do</strong>r, por sua vez, é um litigante eventual, não estan<strong>do</strong> acostuma<strong>do</strong><br />

com as incertezas e <strong>de</strong>moras <strong>do</strong> processo. Além disso, invariavelmente, não tem condição econômica para suportar anos e anos à<br />

espera <strong>do</strong> reconhecimento e satisfação <strong>de</strong> seu direito em juízo. Não se discute que o aspecto econômico e a <strong>de</strong>mora no processo são<br />

integrantes <strong>de</strong> qualquer transação, entre quaisquer sujeitos, em qualquer lugar <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. Sujeitos em posição econômica<br />

assemelhada e que saibam que a solução judicial será fornecida em pouco tempo têm menor disposição para transacionar, mas<br />

ainda assim po<strong>de</strong>m preferir a transação. No Brasil, entretanto, as diferenças econômicas entre fornece<strong>do</strong>res e consumi<strong>do</strong>res é tão<br />

significativa e o processo <strong>de</strong>mora tanto para chegar a um <strong>de</strong>sfecho que, muitas vezes, o consumi<strong>do</strong>r é impeli<strong>do</strong> a fazer uma<br />

transação que não lhe agrada completamente, firme no princípio <strong>de</strong> que “é melhor um acor<strong>do</strong> ruim <strong>do</strong> que um processo bom”.<br />

Quero <strong>de</strong>ixar claro que não sou contra a transação como forma <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos nas relações consumeristas, mas que<br />

não me <strong>de</strong>ixo levar pela onda <strong>de</strong> entusiasmo <strong>de</strong>senfrea<strong>do</strong> pelas alegadas qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>ssa forma <strong>de</strong> resolução. Certamente, é uma<br />

visão romântica, até mesmo ingênua, mas prefiro enten<strong>de</strong>r que, se o processo funcionasse <strong>de</strong> maneira mais a<strong>de</strong>quada, e os<br />

consumi<strong>do</strong>res não se encontrassem em situação <strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong> financeira – quan<strong>do</strong> não <strong>de</strong> penúria –, as transações po<strong>de</strong>riam ser<br />

mais justas, obten<strong>do</strong>-se <strong>de</strong>ssa maneira a tão <strong>de</strong>sejada pacificação social.<br />

Não existe qualquer vedação à solução <strong>do</strong> conflito consumerista por meio da autocomposição, que, em regra, se dá por meio<br />

<strong>de</strong> transação. Ainda que se reconheça a natureza <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública e interesse social das normas previstas pelo Código <strong>de</strong> Defesa<br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, nos termos <strong>do</strong> art. 1.º da Lei 8.078/1990, não parece haver resistência <strong>do</strong>utrinária séria a respeito da<br />

disponibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r individualmente consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>. Dessa forma, qualquer solução <strong>de</strong> conflito que <strong>de</strong>penda da<br />

vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r é legítima.<br />

10.2.3.3.<br />

Mediação<br />

A mediação é forma alternativa <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos fundada no exercício da vonta<strong>de</strong> das partes, o que é o suficiente para<br />

ser consi<strong>de</strong>rada espécie <strong>de</strong> forma consensual <strong>do</strong> conflito, mas não <strong>de</strong>ve ser confundida com a autocomposição. Há ao menos três<br />

razões que indicam aconselhável distinguir essas duas espécies <strong>de</strong> solução consensual <strong>do</strong>s conflitos.<br />

Como primeira e principal diferença, tem-se a inexistência <strong>de</strong> sacrifício total ou parcial <strong>do</strong>s interesses das partes envolvidas na<br />

crise jurídica. É nesse senti<strong>do</strong> a previsão <strong>de</strong> solução com “benefícios mútuos” presente no § 3.º <strong>do</strong> art. 165 <strong>do</strong> Novo CPC. Para que<br />

seja possível uma solução consensual sem sacrifício <strong>de</strong> interesses, diferente <strong>do</strong> que ocorre na conciliação, a mediação não é<br />

centrada no conflito em si, mas sim em suas causas.<br />

A mera perspectiva <strong>de</strong> uma solução <strong>de</strong> conflitos sem qualquer <strong>de</strong>cisão impositiva e que preserve plenamente o interesse <strong>de</strong><br />

ambas as partes envolvidas no conflito torna a mediação ainda mais interessante que a autocomposição em termos <strong>de</strong> geração <strong>de</strong><br />

pacificação social.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, diferente <strong>do</strong> concilia<strong>do</strong>r, o media<strong>do</strong>r não propõe soluções <strong>do</strong> conflito às partes, mas as conduz a <strong>de</strong>scobrirem<br />

as suas causas, <strong>de</strong> forma a possibilitar sua remoção e assim chegar à solução <strong>do</strong> conflito. Portanto, as partes envolvidas chegam por<br />

si sós à solução consensual, ten<strong>do</strong> o media<strong>do</strong>r apenas a tarefa <strong>de</strong> induzi-las a tal ponto <strong>de</strong> chegada9. O sentimento <strong>de</strong> capacida<strong>de</strong><br />

que certamente será senti<strong>do</strong> pelas partes também é aspecto que torna a mediação uma forma alternativa <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos<br />

bastante atraente.<br />

A última diferença entre a mediação e a conciliação (autocomposição) está consagrada nos §§ 2.º e 3.º <strong>do</strong> art. 165 <strong>do</strong> Novo<br />

CPC e versa sobre as espécies <strong>de</strong> litígios mais a<strong>de</strong>quadas para a atuação <strong>do</strong> concilia<strong>do</strong>r e <strong>do</strong> media<strong>do</strong>r.<br />

O concilia<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve atuar preferencialmente nos casos em que não tiver havi<strong>do</strong> vínculo anterior entre as partes. Significa dizer<br />

que a conciliação é mais a<strong>de</strong>quada para conflitos <strong>de</strong> interesses que não envolvam relação continuada entre as partes envolvidas,<br />

que passaram a manter um vínculo justamente em razão da li<strong>de</strong> instaurada, como ocorre numa colisão <strong>de</strong> veículos. Ou ainda para<br />

aquelas partes que têm um vínculo anterior pontual, ten<strong>do</strong> a li<strong>de</strong> surgi<strong>do</strong> justamente <strong>de</strong>sse vínculo, como ocorre em um contrato<br />

celebra<strong>do</strong> para a compra <strong>de</strong> um produto ou para a prestação <strong>de</strong> um serviço.<br />

Já o media<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve atuar preferencialmente nos casos em que tiver havi<strong>do</strong> vínculo anterior entre as partes. São casos em que<br />

as partes já mantinham alguma espécie <strong>de</strong> vínculo continua<strong>do</strong> antes <strong>do</strong> surgimento da li<strong>de</strong>, o que caracteriza uma relação<br />

continuada e não apenas instantânea entre elas, como ocorre no direito <strong>de</strong> família, <strong>de</strong> vizinhança e societário.<br />

Embora seja possível a solução <strong>de</strong> conflito consumerista pela autocomposição e pela mediação, a forma preferível, ainda que<br />

nem sempre possível, é a mediação, porque nesse caso será possível a solução <strong>do</strong> conflito sem o sacrifício <strong>do</strong> interesse <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, o que, por si só, gera uma maior probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> resolver a chamada “li<strong>de</strong> sociológica”.


10.2.3.4.<br />

Conciliação e mediação no Novo CPC<br />

10.2.3.4.1.<br />

Introdução<br />

O Código <strong>de</strong> Processo Civil <strong>de</strong>dica uma Seção inteira às formas consensuais <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos, sob o título “Dos<br />

Concilia<strong>do</strong>res e Media<strong>do</strong>res Judiciais”. Ainda que nos parágrafos <strong>do</strong> art. 165 <strong>do</strong> Novo CPC haja a distinção entre a conciliação e a<br />

mediação, o diploma processual trata <strong>de</strong> ambas, ao menos em termos estruturais e procedimentais, da mesma forma, com previsões<br />

legais aplicáveis a ambas.<br />

10.2.3.4.2. Centros Judiciários <strong>de</strong> solução consensual <strong>de</strong> conflitos<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 165, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, <strong>de</strong>verão os tribunais criar centros judiciários <strong>de</strong> solução consensual <strong>de</strong> conflitos, que<br />

ficarão responsáveis pela realização <strong>de</strong> sessões e audiências <strong>de</strong> conciliação e mediação, bem como pelo <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong><br />

programas <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>s a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.<br />

A iniciativa é interessante por duas razões.<br />

Sob a perspectiva microscópica, retira <strong>do</strong> juiz da causa a tarefa <strong>de</strong> tentar junto às partes a conciliação e a mediação, ainda que<br />

residualmente possa continuar a exercer tal ativida<strong>de</strong> na constância <strong>do</strong> processo, caso seja frustrada a tentativa realizada no início<br />

<strong>do</strong> procedimento pelo centro judiciário <strong>de</strong> solução consensual <strong>de</strong> conflitos. Vejo como medida positiva porque o juiz nem sempre é<br />

a pessoa mais indicada para exercer tal ativida<strong>de</strong>, primeiro porque po<strong>de</strong> não ter a técnica necessária, e segun<strong>do</strong>, porque po<strong>de</strong> ser<br />

acusa<strong>do</strong> <strong>de</strong> prejulgamento na hipótese <strong>de</strong> uma participação mais ativa na tentativa <strong>de</strong> obter a conciliação ou a mediação. Ao criar<br />

um órgão que não po<strong>de</strong> prejulgar porque não tem competência para julgar e forma<strong>do</strong> por pessoas <strong>de</strong>vidamente capacitadas, tais<br />

problemas são supera<strong>do</strong>s.<br />

Sob a perspectiva macroscópica, a novida<strong>de</strong> é interessante porque, além da atuação pontual nos processos, o centro judiciário<br />

<strong>de</strong> solução consensual <strong>de</strong> conflitos ficará responsável pelo <strong>de</strong>senvolvimento, publicação e a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> políticas voltadas à<br />

conciliação e à mediação, em ativida<strong>de</strong> essencial para a mudança da mentalida<strong>de</strong> litigiosa das partes e <strong>de</strong> seus patronos.<br />

Os centros previstos pelo dispositivo ora comenta<strong>do</strong> serão vincula<strong>do</strong>s a tribunais <strong>de</strong> segun<strong>do</strong> grau na Justiça Estadual e<br />

Fe<strong>de</strong>ral, caben<strong>do</strong> a eles a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> sua composição e organização, nos termos <strong>do</strong> § 1.º <strong>do</strong> art. 165 <strong>do</strong> Novo CPC. Para evitar<br />

que as regionalida<strong>de</strong>s tornem tais centros excessivamente heterogêneos, o mesmo dispositivo condiciona a atuação <strong>do</strong>s tribunais<br />

locais às normas <strong>do</strong> Conselho Nacional <strong>de</strong> Justiça, que <strong>de</strong>ve regulamentar as diretrizes fundamentais <strong>de</strong> composição e organização,<br />

<strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> alguma margem para os tribunais locais aten<strong>de</strong>rem às especialida<strong>de</strong>s regionais. Já há, inclusive, normas nesse senti<strong>do</strong> na<br />

Resolução 125/2010 <strong>do</strong> CNJ, que dispõe sobre a Política Judiciária Nacional <strong>de</strong> tratamento a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> <strong>do</strong>s conflitos <strong>de</strong> interesses no<br />

âmbito <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário.<br />

Cabe o registro <strong>do</strong> Decreto 8.573/2015, que dispõe sobre o sistema alternativo <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos <strong>de</strong> consumo<br />

(www.consumi<strong>do</strong>r.gov.br), <strong>de</strong> natureza gratuita e alcance nacional, na forma <strong>de</strong> sítio na internet, com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estimular a<br />

autocomposição entre consumi<strong>do</strong>res e fornece<strong>do</strong>res para solução <strong>de</strong> <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> consumo.<br />

10.2.3.4.3.<br />

Local físico da conciliação e mediação<br />

Com a criação <strong>do</strong>s centros judiciários <strong>de</strong> solução consensual <strong>de</strong> conflitos, o i<strong>de</strong>al é que exista espaço físico exclusivo para o<br />

<strong>de</strong>sempenho das ativida<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s concilia<strong>do</strong>res e media<strong>do</strong>res, o que certamente otimizará a realização <strong>do</strong> trabalho. Além disso, ao<br />

não serem as sessões realizadas na se<strong>de</strong> <strong>do</strong> juízo, diminui-se o aspecto <strong>de</strong> litigiosida<strong>de</strong> e formalida<strong>de</strong> associa<strong>do</strong> ao Po<strong>de</strong>r<br />

Judiciário, o que po<strong>de</strong>rá psicologicamente <strong>de</strong>sarmar as partes e facilitar a solução consensual.<br />

Acredito que a curto ou médio prazo essa possa a vir a ser a realida<strong>de</strong> nas comarcas e seções judiciárias que são se<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

Tribunal, e até mesmo em foros mais movimenta<strong>do</strong>s que não sejam se<strong>de</strong> <strong>do</strong> Tribunal. Contu<strong>do</strong>, acreditar que essa será a realida<strong>de</strong>,<br />

e aí mesmo em longo prazo, para todas as comarcas, seções e subseções judiciárias <strong>do</strong> Brasil é irrazoável e discrepante <strong>de</strong> nossa<br />

realida<strong>de</strong>. Se, muitas vezes, até mesmo a se<strong>de</strong> <strong>do</strong> juízo é <strong>de</strong> uma precarieda<strong>de</strong> in<strong>de</strong>sejável, custa crer que sejam cria<strong>do</strong>s espaços<br />

físicos com o propósito exclusivo <strong>de</strong> abrigar os centros judiciários <strong>de</strong> solução consensual <strong>de</strong> conflitos.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, <strong>de</strong>veria ser interpretada a regra consagrada no projeto <strong>de</strong> lei aprova<strong>do</strong> na Câmara, ao prever que,<br />

excepcionalmente, as audiências ou sessões <strong>de</strong> conciliação e mediação po<strong>de</strong>riam realizar-se nos próprios juízos; exceção,<br />

inclusive, já consagrada no art. 8.º, § 1.º, da Resolução 125/2010 <strong>do</strong> CNJ. A interpretação, entretanto, não era a única possível e<br />

não excluía a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que, mesmo existin<strong>do</strong> no foro um local específico para a atuação <strong>do</strong>s centros ora analisa<strong>do</strong>s, a<br />

sessão ocorresse na se<strong>de</strong> <strong>do</strong> juízo sempre que tal local se mostrasse o mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> para a realização <strong>do</strong> ato.<br />

Seja qual for a razão, mesmo realizan<strong>do</strong>-se na se<strong>de</strong> <strong>do</strong> juízo, a sessão ou audiência <strong>de</strong> conciliação ou mediação seria


conduzida pelos concilia<strong>do</strong>res e media<strong>do</strong>res, com o que se manteria o afastamento <strong>do</strong> juiz <strong>de</strong>ssa ativida<strong>de</strong>, pelo menos no<br />

momento inicial <strong>do</strong> procedimento. Segun<strong>do</strong> o art. 8.º, § 1.º, da Resolução 125/2010 <strong>do</strong> CNJ, nesse caso caberá a supervisão <strong>do</strong>s<br />

trabalhos <strong>do</strong>s media<strong>do</strong>res e concilia<strong>do</strong>res ao Juiz Coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Centro Judiciário <strong>de</strong> Solução <strong>de</strong> Conflitos e Cidadania.<br />

Influencia<strong>do</strong> por notas técnicas da AGU e da AJUFE, o Sena<strong>do</strong> assim fundamentou a exclusão da regra <strong>do</strong> texto final <strong>do</strong> Novo<br />

CPC na Emenda 2.3.2.64: “O § 2.º <strong>do</strong> art. 166 <strong>do</strong> SCD estabelece uma regra <strong>de</strong>snecessária e inserta na alçada administrativa <strong>do</strong><br />

juízo <strong>de</strong> conveniência e oportunida<strong>de</strong> <strong>do</strong> próprio Po<strong>de</strong>r Judiciário, ao fixar que, excepcionalmente, as audiências e as sessões <strong>de</strong><br />

conciliação po<strong>de</strong>rão realizar-se nos próprios juízos sob a condução <strong>de</strong> concilia<strong>do</strong>res e media<strong>do</strong>res. Além disso, esse dispositivo<br />

termina por inutilizar o espaço <strong>de</strong>dica<strong>do</strong> à autocomposição, que são os centros judiciários, ao recomendarem indiretamente a<br />

usurpação <strong>do</strong> local <strong>de</strong> atuação típica <strong>do</strong> juiz, o juízo”.<br />

São insuficientes as razões apresentadas, e a supressão <strong>de</strong>ssa regra no texto final <strong>do</strong> Novo CPC aprova<strong>do</strong> pelo Sena<strong>do</strong> ten<strong>de</strong> a<br />

ser ineficaz diante <strong>do</strong> já previsto no art. 8.º, § 1.º, da Resolução 125/2010 <strong>do</strong> CNJ. Naturalmente, seria melhor ter essa regra<br />

consagrada em lei, e por isso criticável a postura <strong>do</strong> Sena<strong>do</strong> a respeito <strong>do</strong> tema.<br />

10.2.3.4.4.<br />

Concilia<strong>do</strong>r e media<strong>do</strong>r<br />

Apesar das diferenças em termos <strong>de</strong> atuação existentes e já <strong>de</strong>vidamente analisadas entre o concilia<strong>do</strong>r e o media<strong>do</strong>r, o Código<br />

<strong>de</strong> Processo Civil os equipara em outros aspectos.<br />

Nos termos <strong>do</strong> § 1.º <strong>do</strong> art. 167 <strong>do</strong> Novo CPC, é requisito mínimo para a capacitação <strong>do</strong>s media<strong>do</strong>res e concilia<strong>do</strong>res a<br />

aprovação em curso a ser realiza<strong>do</strong> por entida<strong>de</strong> cre<strong>de</strong>nciada, cujo parâmetro curricular será <strong>de</strong>fini<strong>do</strong> pelo Conselho Nacional <strong>de</strong><br />

Justiça em conjunto com o Ministério da Justiça. Enten<strong>do</strong> que, mesmo haven<strong>do</strong> convênio formal <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário com<br />

entida<strong>de</strong>s privadas, esse requisito <strong>de</strong>ve ser manti<strong>do</strong>, <strong>de</strong> forma que mesmo aqueles que não estejam vincula<strong>do</strong>s diretamente às<br />

câmaras <strong>de</strong> conciliação e mediação <strong>de</strong>vam ter certifica<strong>do</strong> <strong>do</strong> curso supracita<strong>do</strong> para po<strong>de</strong>rem atuar nas mediações e conciliações<br />

judiciais.<br />

Registre-se que o art. 11 da Lei 13.140/2015 cria um novo requisito, não previsto no Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil:<br />

graduação há pelo menos <strong>do</strong>is anos em curso <strong>de</strong> ensino superior <strong>de</strong> instituição reconhecida pelo Ministério da Educação.<br />

Não há necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> os concilia<strong>do</strong>res e media<strong>do</strong>res serem advoga<strong>do</strong>s, o que <strong>de</strong>ve ser sauda<strong>do</strong>. As técnicas <strong>de</strong> conciliação e<br />

mediação não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong> conhecimento jurídico, sen<strong>do</strong> imprescindível que, além <strong>de</strong> opera<strong>do</strong>res <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>, outros profissionais,<br />

em especial aqueles acostuma<strong>do</strong>s a lidar com pessoas e conflitos entre elas, possam atuar como media<strong>do</strong>res e concilia<strong>do</strong>res.<br />

Sen<strong>do</strong> advoga<strong>do</strong>, estará impedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> exercer a advocacia nos juízos em que exerça suas funções. O impedimento po<strong>de</strong>rá<br />

diminuir o interesse <strong>do</strong>s advoga<strong>do</strong>s naquelas comarcas menores, on<strong>de</strong> teriam que optar entre as ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> advocacia ou <strong>de</strong><br />

mediação e conciliação, sen<strong>do</strong> difícil crer que o advoga<strong>do</strong> abriria mão da advocacia para se limitar à ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> solução<br />

consensual <strong>de</strong> conflitos. Nesse caso, os profissionais <strong>de</strong> outras áreas serão imprescindíveis. E o art. 172 <strong>do</strong> Novo CPC prevê que o<br />

concilia<strong>do</strong>r e o media<strong>do</strong>r ficam impedi<strong>do</strong>s, pelo prazo <strong>de</strong> um ano, conta<strong>do</strong> <strong>do</strong> término da última audiência em que atuaram, <strong>de</strong><br />

assessorar, representar ou patrocinar qualquer das partes, o que é importante para evitar o aliciamento <strong>de</strong> clientes.<br />

Parece razoável que tais impedimentos, já que previstos em lei, sejam estendi<strong>do</strong>s à socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong>s a que pertença o<br />

concilia<strong>do</strong>r ou media<strong>do</strong>r, sob pena <strong>de</strong> se esvaziarem os objetivos pretendi<strong>do</strong>s pelo legisla<strong>do</strong>r10.<br />

Também existe a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o tribunal optar pela criação <strong>de</strong> quadro próprio <strong>de</strong> concilia<strong>do</strong>res e media<strong>do</strong>res, a ser<br />

preenchi<strong>do</strong> mediante concurso público <strong>de</strong> provas e títulos. Acredito que, nesse caso, a condição formal para a inscrição no<br />

concurso seja ser possui<strong>do</strong>r <strong>de</strong> certifica<strong>do</strong> emiti<strong>do</strong> por entida<strong>de</strong> responsável por ministrar o curso <strong>de</strong> capacitação.<br />

Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> formas consensuais <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos, é natural que a vonta<strong>de</strong> das partes já seja prestigiada <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />

momento da escolha <strong>do</strong> terceiro responsável pela intermediação entre elas. Feliz nesse senti<strong>do</strong> o art. 168 <strong>do</strong> Novo CPC, ao indicar<br />

que cabe às partes escolher o concilia<strong>do</strong>r ou o media<strong>do</strong>r, inclusive sujeitos não cadastra<strong>do</strong>s junto ao tribunal ou câmara privada,<br />

não sen<strong>do</strong> necessária a qualificação formal exigida para os media<strong>do</strong>res e concilia<strong>do</strong>res cadastra<strong>do</strong>s no Tribunal 11 . Nesse tocante,<br />

<strong>de</strong>ve ser registra<strong>do</strong> o previsto no art. 25 da Lei 13.140/2015, ao <strong>de</strong>terminar que os media<strong>do</strong>res não estão sujeitos à prévia aceitação<br />

das partes. Enten<strong>do</strong> que não haja aceitação prévia, o que não significa dizer que as partes estarão vinculadas a um concilia<strong>do</strong>r ou<br />

media<strong>do</strong>r contra a sua vonta<strong>de</strong>.<br />

O disposto no art. 168, § 3.º, <strong>do</strong> Novo CPC <strong>de</strong>ve ser aplica<strong>do</strong> com ressalvas. Segun<strong>do</strong> o dispositivo legal, sempre que<br />

recomendável, haverá a <strong>de</strong>signação <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> um media<strong>do</strong>r ou concilia<strong>do</strong>r. Essa pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intermediários <strong>de</strong>ve ser reservada<br />

para situações excepcionais, nas quais realmente seja imprescindível a presença <strong>de</strong> diferentes sujeitos com formações distintas.<br />

Além <strong>do</strong> encarecimento gera<strong>do</strong> pela presença <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> um media<strong>do</strong>r ou concilia<strong>do</strong>r, essa multiplicida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> tornar a mediação<br />

ou conciliação mais complexa <strong>do</strong> que seria necessário, <strong>de</strong>mandan<strong>do</strong> mais tempo para chegar a um resulta<strong>do</strong> positivo.


10.2.3.4.5.<br />

Princípios das formas consensuais <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos<br />

10.2.3.4.5.1.<br />

Introdução<br />

Ainda que notoriamente sejam formas consensuais <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos diferentes, a mediação e a conciliação são<br />

informadas pelos mesmos princípios, concentra<strong>do</strong>s no art. 166 <strong>do</strong> Novo CPC. O dispositivo é bastante próximo <strong>do</strong> art. 1.º <strong>do</strong><br />

Anexo III da Resolução 125/2010 <strong>do</strong> CNJ, ainda que não traga entre os princípios o da competência, respeito à or<strong>de</strong>m pública e às<br />

leis vigentes, empo<strong>de</strong>ramento e validação.<br />

10.2.3.4.5.2.<br />

In<strong>de</strong>pendência<br />

Os concilia<strong>do</strong>res e media<strong>do</strong>res <strong>de</strong>vem atuar <strong>de</strong> forma in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, sem sofrerem qualquer espécie <strong>de</strong> pressão interna ou<br />

externa. Nos termos <strong>do</strong> art. 1.º, V, <strong>do</strong> Anexo III da Resolução 125/2010 <strong>do</strong> CNJ, a in<strong>de</strong>pendência também permite ao concilia<strong>do</strong>r e<br />

ao media<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> redigir solução ilegal ou inexequível, em nítida prevalência da or<strong>de</strong>m jurídica e da eficácia da solução <strong>do</strong><br />

conflito em <strong>de</strong>trimento da vonta<strong>de</strong> das partes. Trata-se <strong>do</strong> princípio <strong>do</strong> respeito à or<strong>de</strong>m pública e às leis vigentes, constante<br />

expressamente da norma administrativa, mas não presente no art. 166, caput, <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

10.2.3.4.5.3.<br />

Imparcialida<strong>de</strong><br />

O media<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve ser imparcial, ou seja, não po<strong>de</strong>, com sua atuação, <strong>de</strong>liberadamente pen<strong>de</strong>r para uma das partes e, com isso,<br />

induzir a parte contrária a uma solução que não atenda às finalida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> conflito. Também o concilia<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve ser imparcial porque,<br />

quan<strong>do</strong> apresenta propostas <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos, <strong>de</strong>ve ter como propósito a forma mais a<strong>de</strong>quada à solução <strong>do</strong> conflito, e não a<br />

vantagem in<strong>de</strong>vida <strong>de</strong> uma parte sobre a outra.<br />

Ao tratar <strong>do</strong> tema da imparcialida<strong>de</strong> na conciliação e mediação, o inciso IV <strong>do</strong> art. 1.º <strong>do</strong> Anexo III da Resolução 125/2010 <strong>do</strong><br />

CNJ prevê o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> agirem com ausência <strong>de</strong> favoritismo, preferência ou preconceito, asseguran<strong>do</strong> que valores e conceitos<br />

pessoais não interfiram no resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> trabalho, compreen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a realida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s no conflito e jamais aceitan<strong>do</strong><br />

qualquer espécie <strong>de</strong> favor ou presente.<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 5.º, caput, da Lei 13.140/2015, aplicam-se ao media<strong>do</strong>r as mesmas hipóteses legais <strong>de</strong> impedimento e<br />

suspeição <strong>do</strong> juiz, o mesmo se po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> dizer <strong>do</strong> concilia<strong>do</strong>r Nos termos <strong>do</strong> art. 5.º, parágrafo único, da Lei 13.140/2015, a pessoa<br />

<strong>de</strong>signada para atuar como media<strong>do</strong>ra tem o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> revelar às partes, antes da aceitação da função, qualquer fato ou circunstância<br />

que possa suscitar dúvida justificada em relação à sua imparcialida<strong>de</strong> para mediar o conflito, oportunida<strong>de</strong> em que po<strong>de</strong>rá ser<br />

recusa<strong>do</strong> por qualquer <strong>de</strong>las.<br />

O § 3.º <strong>do</strong> art. 166 <strong>do</strong> Novo CPC consagra a importante distinção entre inércia e imparcialida<strong>de</strong> ao apontar que o emprego <strong>de</strong><br />

técnicas negociais com o objetivo <strong>de</strong> proporcionar ambiente favorável à autocomposição não ofen<strong>de</strong> o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> imparcialida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

concilia<strong>do</strong>r e <strong>do</strong> media<strong>do</strong>r. Significa que cabe ao terceiro imparcial atuar <strong>de</strong> forma intensa e presente, valen<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> todas as<br />

técnicas para as quais <strong>de</strong>ve estar capacita<strong>do</strong>, sem que se possa falar em perda da imparcialida<strong>de</strong> em sua atuação.<br />

10.2.3.4.5.4.<br />

Normalização <strong>do</strong> conflito<br />

Curiosamente, o princípio da normalização <strong>do</strong> conflito foi suprimi<strong>do</strong> pelo Sena<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto final <strong>do</strong> art. 166, caput, <strong>do</strong> Novo<br />

CPC. Mais uma opção incompreensível <strong>de</strong> corte ao texto aprova<strong>do</strong> pela Câmara, mas nesse caso ineficaz, já que os princípios que<br />

norteiam a conciliação e a mediação não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m da vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r.<br />

A normalização <strong>do</strong> conflito juridicamente <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> sua solução, mas sociologicamente o conflito só será “normaliza<strong>do</strong>” se<br />

as partes ficarem concretamente satisfeitas com a solução consensual <strong>do</strong> conflito a que chegaram. O apaziguamento <strong>do</strong>s ânimos<br />

normaliza o conflito no plano fático, resolven<strong>do</strong> a chamada li<strong>de</strong> sociológica. Já <strong>de</strong>monstrei minha preocupação com a falsa<br />

impressão <strong>de</strong> que o simples fato <strong>de</strong> a solução resultar da vonta<strong>de</strong> das partes é garantia <strong>de</strong> pacificação social, quan<strong>do</strong> a situação<br />

entre as partes praticamente impõe a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma sobre a outra, em especial quan<strong>do</strong> uma <strong>de</strong>las apresenta hipossuficiência<br />

técnica e/ou econômica.<br />

Apesar <strong>de</strong> não estarem expressamente previstos como princípios no caput <strong>do</strong> art. 166 <strong>do</strong> Novo CPC, enten<strong>do</strong> que os princípios<br />

<strong>do</strong> empo<strong>de</strong>ramento e da validação po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s como inseri<strong>do</strong>s no princípio da normalização <strong>do</strong> conflito. Nos termos<br />

<strong>do</strong>s incisos VII e VIII <strong>do</strong> art. 1.º <strong>do</strong> Anexo III da Resolução 125/2010 <strong>do</strong> CNJ, os concilia<strong>do</strong>res e media<strong>do</strong>res têm o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong><br />

estimular os interessa<strong>do</strong>s a apren<strong>de</strong>rem a melhor resolver seus conflitos futuros em função da experiência <strong>de</strong> justiça vivenciada na<br />

autocomposição (empo<strong>de</strong>ramento) e o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> estimular os interessa<strong>do</strong>s a se perceberem reciprocamente como seres humanos


merece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> atenção e respeito (validação).<br />

10.2.3.4.5.5.<br />

Autonomia da vonta<strong>de</strong><br />

Não há como falar em solução consensual <strong>do</strong> conflito sem autonomia <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> das partes. Se houve um consenso entre elas,<br />

ele só po<strong>de</strong> ter <strong>de</strong>corri<strong>do</strong> <strong>de</strong> um acor<strong>do</strong> <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>. E a vonta<strong>de</strong> não po<strong>de</strong> ser viciada sob pena <strong>de</strong> tornar a solução <strong>do</strong> conflito nula.<br />

A autonomia da vonta<strong>de</strong> não se limita ao conteú<strong>do</strong> da solução consensual <strong>do</strong> conflito, valen<strong>do</strong> também para o procedimento<br />

da conciliação e mediação, sen<strong>do</strong> justamente nesse senti<strong>do</strong> o § 4.º <strong>do</strong> art. 166 <strong>do</strong> Novo CPC. Esse po<strong>de</strong>r das partes também é<br />

chama<strong>do</strong> <strong>de</strong> princípio da liberda<strong>de</strong> ou da auto<strong>de</strong>terminação, abrangen<strong>do</strong> a forma e o conteú<strong>do</strong> da solução consensual.<br />

10.2.3.4.5.6.<br />

Confi<strong>de</strong>ncialida<strong>de</strong><br />

O princípio da confi<strong>de</strong>ncialida<strong>de</strong> se justifica como forma <strong>de</strong> otimizar a participação das partes e, com isso, aumentarem-se as<br />

chances <strong>de</strong> obtenção da solução consensual. Muitas vezes, durante a conciliação ou mediação, as partes ficam inibidas em fornecer<br />

da<strong>do</strong>s ou informações que possam posteriormente lhes prejudicar em uma eventual <strong>de</strong>cisão impositiva <strong>do</strong> conflito ou, ainda sobre<br />

questões <strong>de</strong> sua vida íntima12. Retraídas em suas manifestações e <strong>de</strong>sconfiadas <strong>de</strong> que aquilo que falarem po<strong>de</strong>rá ser usa<strong>do</strong> contra<br />

elas, preferem atuar <strong>de</strong> forma tímida, em prejuízo da solução consensual.<br />

Nos termos <strong>do</strong> § 1.º <strong>do</strong> art. 166, a confi<strong>de</strong>ncialida<strong>de</strong> esten<strong>de</strong>-se a todas as informações produzidas no curso <strong>do</strong> procedimento,<br />

cujo teor não po<strong>de</strong>rá ser utiliza<strong>do</strong> para fim diverso daquele previsto por expressa <strong>de</strong>liberação das partes. O dispositivo consagra a<br />

confi<strong>de</strong>ncialida<strong>de</strong> plena, atinente a tu<strong>do</strong> o que ocorreu e foi dito na sessão ou audiência <strong>de</strong> conciliação e mediação. As partes<br />

po<strong>de</strong>m <strong>de</strong>liberar, entretanto, que o teor da audiência ou sessão seja utiliza<strong>do</strong> para quaisquer fins, em prestígio ao princípio da<br />

autonomia da vonta<strong>de</strong>.<br />

Em regra, portanto, o concilia<strong>do</strong>r e o media<strong>do</strong>r, assim como os membros <strong>de</strong> suas equipes, não po<strong>de</strong>rão divulgar ou <strong>de</strong>por<br />

acerca <strong>de</strong> fatos ou elementos oriun<strong>do</strong>s da conciliação ou da mediação, o que cria uma singular hipótese <strong>de</strong> impedimento para<br />

funcionar como testemunha no processo em que foi frustrada a conciliação ou mediação ou mesmo em outros que envolvam os<br />

fatos trata<strong>do</strong>s na tentativa frustrada <strong>de</strong> solução consensual <strong>do</strong> conflito.<br />

Além <strong>de</strong> <strong>de</strong>liberação expressa das partes nesse senti<strong>do</strong>, a confi<strong>de</strong>ncialida<strong>de</strong> também <strong>de</strong>ve ser excepcionada, nos termos art. 1.º,<br />

I, Anexo III da Resolução 125/2010 <strong>do</strong> CNJ, na hipótese <strong>de</strong> violação à or<strong>de</strong>m pública ou às leis vigentes.<br />

A confi<strong>de</strong>ncialida<strong>de</strong> e suas exceções são reguladas pela Seção IV (arts. 30 e 31) da Lei 13.140/2015.<br />

10.2.3.4.5.7.<br />

Oralida<strong>de</strong><br />

Ao consagrar como princípio da conciliação e da mediação a oralida<strong>de</strong>, o art. 166, caput, <strong>do</strong> Novo CPC permite a conclusão<br />

<strong>de</strong> que as tratativas entre as partes e o terceiro imparcial serão orais, <strong>de</strong> forma que o essencial <strong>do</strong> conversa<strong>do</strong> entre as partes e o<br />

concilia<strong>do</strong>r ou media<strong>do</strong>r não conste <strong>do</strong> termo <strong>de</strong> audiência ou da sessão realizada. Nada impe<strong>de</strong> que o concilia<strong>do</strong>r e, em especial, o<br />

media<strong>do</strong>r, se valham, durante a sessão ou audiência <strong>de</strong> escritos resumi<strong>do</strong>s, das posições a<strong>do</strong>tadas pelas partes e <strong>do</strong>s avanços<br />

obti<strong>do</strong>s na negociação, mas estes servirão apenas durante as tratativas, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser <strong>de</strong>scarta<strong>do</strong>s após a conciliação e a mediação.<br />

A oralida<strong>de</strong> tem três objetivos: conferir celerida<strong>de</strong> ao procedimento, prestigiar a informalida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s atos e promover a<br />

confi<strong>de</strong>ncialida<strong>de</strong>, já que restará escrito o mínimo possível13.<br />

Naturalmente, a oralida<strong>de</strong> se limita às tratativas e conversas prévias envolven<strong>do</strong> as partes e o terceiro imparcial, porque a<br />

solução em si <strong>do</strong> conflito <strong>de</strong>ve ser sempre reduzida a termo, sen<strong>do</strong> indispensável a forma <strong>do</strong>cumental escrita da solução consensual<br />

<strong>do</strong> conflito. Registre-se corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a dispensa <strong>de</strong> tal acor<strong>do</strong> escrito na mediação porque sua necessida<strong>de</strong><br />

po<strong>de</strong>ria restaurar a <strong>de</strong>sconfiança entre as partes e prejudicar sua relação futura 14 . Acredito que a dispensa <strong>do</strong> ato escrito se justifica<br />

e po<strong>de</strong> ocorrer na mediação extrajudicial, mas, já haven<strong>do</strong> processo em trâmite, será preciso algum termo que <strong>de</strong>monstre terem as<br />

partes chega<strong>do</strong> ao acor<strong>do</strong> para que o juiz possa extinguir o processo por sentença homologatória da autocomposição. O espírito <strong>de</strong><br />

não restaurar <strong>de</strong>sconfianças entre as partes po<strong>de</strong> levar a um simples termo <strong>de</strong> acor<strong>do</strong>, sem precisar as obrigações das partes, mas<br />

nesse caso a sentença homologatória será inexequível diante <strong>do</strong> inadimplemento em razão da incerteza da obrigação.<br />

10.2.3.4.5.8.<br />

Informalida<strong>de</strong><br />

A informalida<strong>de</strong> incentiva o relaxamento e este leva a uma <strong>de</strong>scontração e tranquilida<strong>de</strong> natural das partes. To<strong>do</strong>s aqueles<br />

rituais processuais assustam as partes e geram natural apreensão, sen<strong>do</strong> nítida a tensão <strong>do</strong>s não habitua<strong>do</strong>s a entrar numa sala <strong>de</strong>


audiência na presença <strong>de</strong> um juiz. Se ele estiver <strong>de</strong> toga, então, tu<strong>do</strong> piora sensivelmente. Esse efeito po<strong>de</strong> ser confirma<strong>do</strong> com a<br />

experiência <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais, nos quais a informalida<strong>de</strong> é um <strong>do</strong>s traços mais elogia<strong>do</strong>s pelos jurisdiciona<strong>do</strong>s.<br />

Sen<strong>do</strong> o objetivo da conciliação ou mediação uma solução que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da vonta<strong>de</strong> das partes, nada mais natural que elas se<br />

sintam, tanto quanto possível, mais relaxadas e tranquilas, sentimentos que colaboram no <strong>de</strong>sarmamento <strong>do</strong>s espíritos e, por<br />

consequência, otimizam as chances <strong>de</strong> uma solução consensual <strong>do</strong> conflito.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, diante das varieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> situações em que são coloca<strong>do</strong>s os concilia<strong>do</strong>res e media<strong>do</strong>res a cada sessão ou<br />

audiência, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma flexibilização procedimental é a única maneira <strong>de</strong> otimizar os resulta<strong>do</strong>s <strong>de</strong>ssas formas <strong>de</strong> solução<br />

<strong>de</strong> conflitos15. Um procedimento rígi<strong>do</strong> engessaria o concilia<strong>do</strong>r e o media<strong>do</strong>r, prejudican<strong>do</strong> sensivelmente sua atuação e, com<br />

isso, diminuin<strong>do</strong> as chances <strong>de</strong> sucesso. Mesmo no processo, com a a<strong>do</strong>ção da tutela diferenciada, reconhece-se que o juiz <strong>de</strong>ve<br />

a<strong>de</strong>quar o procedimento às exigências <strong>do</strong> caso concreto para efetivamente tutelar o direito material. Na conciliação ou mediação,<br />

com maior razão – a <strong>de</strong>cisão é consensual – os concilia<strong>do</strong>res e media<strong>do</strong>res <strong>de</strong>vem adaptar o procedimento às exigências <strong>do</strong> caso<br />

concreto.<br />

10.2.3.4.5.9<br />

Decisão informada<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 1.º, II, <strong>do</strong> Anexo III da Resolução 125/2010 <strong>do</strong> CNJ, o princípio da <strong>de</strong>cisão informada cria o <strong>de</strong>ver ao<br />

concilia<strong>do</strong>r e ao media<strong>do</strong>r <strong>de</strong> manter o jurisdiciona<strong>do</strong> plenamente informa<strong>do</strong> quanto aos seus direitos e ao contexto fático no qual<br />

está inseri<strong>do</strong>. Ainda que as formas consensuais in<strong>de</strong>pendam <strong>do</strong> direito material real ou imagina<strong>do</strong> <strong>de</strong> cada parte envolvida, <strong>de</strong>vem<br />

elas ter a exata dimensão a respeito <strong>do</strong>s aspectos fáticos e jurídicos <strong>do</strong> conflito em que estão envolvidas. Esse <strong>de</strong>ver <strong>do</strong> concilia<strong>do</strong>r<br />

e media<strong>do</strong>r não se confun<strong>de</strong> com sua parcialida<strong>de</strong>, porque, ao prestar tais esclarecimentos fáticos e jurídicos às partes, <strong>de</strong>ve atuar<br />

com isenção e sem favorecimentos ou preconceitos.<br />

A a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong>sse princípio no art. 166, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, entretanto, sugere uma intrigante questão. Não há exigência <strong>de</strong> que<br />

o concilia<strong>do</strong>r e o media<strong>do</strong>r tenham formação jurídica, <strong>de</strong> forma que profissionais <strong>de</strong> qualquer área po<strong>de</strong>rão se capacitar para o<br />

exercício da função. E essa capacitação, naturalmente, não envolve conhecimentos jurídicos amplos, mas apenas aqueles<br />

associa<strong>do</strong>s à sua ativida<strong>de</strong>, além das técnicas necessárias para se chegar à solução consensual <strong>do</strong>s conflitos. Como exatamente<br />

exigir <strong>de</strong>ssas pessoas, sem qualificação jurídica, que mantenham o jurisdiciona<strong>do</strong> plenamente informa<strong>do</strong> quanto aos seus direitos?<br />

Consagra<strong>do</strong> também no art. 1.º, II, <strong>do</strong> Anexo III da Resolução 125/2010 <strong>do</strong> CNJ, o princípio da <strong>de</strong>cisão informada não<br />

passava por tal problema, já que o art. 7.º da referida resolução apontava apenas magistra<strong>do</strong>s da ativa ou aposenta<strong>do</strong>s e servi<strong>do</strong>res<br />

<strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário como aptos a compor os Núcleos Permanentes <strong>de</strong> Méto<strong>do</strong>s Consensuais <strong>de</strong> Solução <strong>de</strong> Conflitos.<br />

10.2.3.4.5.10.<br />

Isonomia entre as partes<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 2.º, II, da Lei 13.140/2015, a isonomia entre as partes é um <strong>do</strong>s princípios da mediação. In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente<br />

da compreensão <strong>de</strong> que espécie <strong>de</strong> isonomia trata o texto legal, o certo é que tal princípio é exclusivo da mediação, não se<br />

<strong>de</strong>ven<strong>do</strong>, portanto, aplicá-lo à conciliação.<br />

Caso se entenda que a isonomia exigida pelo art. 2.º, II, da Lei 13.140/2015 é a material, a mediação ficará restrita àquelas<br />

hipóteses em que não exista qualquer espécie <strong>de</strong> hipossuficiência ou vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma das partes. Não parece, entretanto, ser<br />

a solução mais consentânea com a amplitu<strong>de</strong> pretendida para a mediação <strong>de</strong>ntro das formas <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos.<br />

A outra forma <strong>de</strong> interpretar a isonomia exigida pelo dispositivo legal ora analisa<strong>do</strong> é a procedimental, ou seja, as partes,<br />

mesmo que não tenham a isonomia material, no procedimento <strong>de</strong> mediação <strong>de</strong>vem ser tratadas igualmente, ten<strong>do</strong> as mesmas<br />

oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> manifestação e com participação equânime durante o procedimento. Parece ser esse o melhor entendimento16.<br />

10.2.3.4.5.11.<br />

Busca <strong>do</strong> consenso<br />

Ainda que a mediação não tenha como objetivo único a obtenção <strong>de</strong> sua solução consensual <strong>do</strong> conflito, é inegável que chegar<br />

a tal resulta<strong>do</strong> tem extrema relevância no plano das soluções consensuais <strong>do</strong>s conflitos. Não à toa o art. 2.º, VI, da Lei 13.140/2015<br />

prevê a busca <strong>do</strong> consenso como um <strong>do</strong>s princípios da mediação.<br />

O media<strong>do</strong>r, portanto, <strong>de</strong>ve buscar <strong>de</strong> forma cooperativa com as partes a solução consensual <strong>do</strong> conflito. Como informa a<br />

melhor <strong>do</strong>utrina, <strong>de</strong>ve a<strong>do</strong>tar técnicas <strong>de</strong> negociação para que o consenso seja atingi<strong>do</strong>, como o mo<strong>de</strong>lo cria<strong>do</strong> pela Escola <strong>de</strong><br />

Harvard, orienta<strong>do</strong> por quatro diretrizes básicas: (a) separar as pessoas <strong>do</strong>s problemas; (b) focar em interesses e não em posições;<br />

(c) inventar opção <strong>de</strong> ganhos mútuos; (d) insistir em critérios objetivos para pon<strong>de</strong>ração das opções criadas17.


10.2.3.4.6.<br />

Cadastros<br />

Os habilita<strong>do</strong>s a realizar a mediação e conciliação constarão <strong>de</strong> <strong>do</strong>is diferentes cadastros: um nacional e outro regional a cargo<br />

<strong>do</strong>s tribunais <strong>de</strong> justiça e <strong>do</strong>s tribunais regionais fe<strong>de</strong>rais. Ainda que não haja expressa previsão nesse senti<strong>do</strong>, tu<strong>do</strong> leva a crer que<br />

o cadastro nacional ficará a cargo <strong>do</strong> Conselho Nacional <strong>de</strong> Justiça.<br />

Uma vez realiza<strong>do</strong> o registro <strong>do</strong>s concilia<strong>do</strong>res e media<strong>do</strong>res, o tribunal remeterá ao diretor <strong>do</strong> foro da comarca, seção ou<br />

subseção judiciária on<strong>de</strong> ele atuará os da<strong>do</strong>s necessários para que seu nome passe a constar da respectiva lista, para efeito <strong>de</strong><br />

distribuição alternada e aleatória, observa<strong>do</strong> o princípio da igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro da mesma área <strong>de</strong> atuação profissional.<br />

Essa exigência <strong>de</strong> distribuição aleatória e alternada <strong>de</strong> trabalho entre os media<strong>do</strong>res e concilia<strong>do</strong>res prestigia a imparcialida<strong>de</strong>,<br />

evitan<strong>do</strong>-se, <strong>de</strong>ssa forma, a escolha <strong>do</strong> media<strong>do</strong>r e concilia<strong>do</strong>r com objetivos escusos. Haven<strong>do</strong> acor<strong>do</strong> das partes a respeito <strong>do</strong><br />

responsável pela mediação ou conciliação, ainda que recain<strong>do</strong> sobre alguém não cadastra<strong>do</strong>, a vonta<strong>de</strong> das partes <strong>de</strong>ve se sobrepor<br />

à regra legal ora analisada, nos termos <strong>do</strong> § 1.º <strong>do</strong> art. 168 <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Além <strong>de</strong> prever os habilita<strong>do</strong>s para o exercício da mediação e da conciliação, os cadastros conterão outras importantes<br />

informações. Nos termos <strong>do</strong> § 3.º <strong>do</strong> art. 167 <strong>do</strong> Novo CPC, <strong>do</strong> cre<strong>de</strong>nciamento das câmaras e <strong>do</strong> cadastro <strong>de</strong> concilia<strong>do</strong>res e<br />

media<strong>do</strong>res constarão to<strong>do</strong>s os da<strong>do</strong>s relevantes para a sua atuação, tais como o número <strong>de</strong> causas <strong>de</strong> que participou, o sucesso ou<br />

insucesso da ativida<strong>de</strong>, a matéria sobre a qual versou a controvérsia, bem como outros da<strong>do</strong>s que o tribunal julgar relevantes.<br />

Nos termos <strong>do</strong> § 4.º <strong>do</strong> art. 167 <strong>do</strong> Novo CPC, to<strong>do</strong>s os da<strong>do</strong>s referentes à participação <strong>do</strong>s media<strong>do</strong>res e concilia<strong>do</strong>res, sua<br />

taxa <strong>de</strong> sucesso, as matérias objeto da tentativa <strong>de</strong> autocomposição e outras que o tribunal enten<strong>de</strong>r relevantes serão torna<strong>do</strong>s<br />

públicos, ao menos uma vez por ano. A compilação <strong>de</strong>sses da<strong>do</strong>s e sua divulgação têm <strong>do</strong>is propósitos: dar conhecimento <strong>do</strong><br />

andamento <strong>do</strong>s trabalhos à população em geral e permitir uma análise estatística <strong>do</strong> trabalho individual e coletivamente conduzi<strong>do</strong>.<br />

Tal forma <strong>de</strong> controle tem como mérito a avaliação das formas alternativas <strong>de</strong> solução consensual <strong>de</strong> conflitos, <strong>do</strong>s media<strong>do</strong>res e<br />

concilia<strong>do</strong>res e das câmaras que prestarão tal serviço.<br />

10.2.3.4.7.<br />

Remuneração <strong>do</strong> concilia<strong>do</strong>r e <strong>do</strong> media<strong>do</strong>r<br />

A ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conciliação e mediação será em regra remunerada, com pagamento <strong>de</strong> valores previstos em tabela fixada pelo<br />

tribunal, conforme parâmetros estabeleci<strong>do</strong>s pelo Conselho Nacional <strong>de</strong> Justiça. Tal remuneração não será <strong>de</strong>vida se os tribunais<br />

criarem quadros próprios mediante concurso público, e também não será <strong>de</strong>vida se o media<strong>do</strong>r ou concilia<strong>do</strong>r aceitar realizar o<br />

trabalho <strong>de</strong> forma voluntária, observadas a legislação pertinente e a regulamentação <strong>do</strong> tribunal.<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 13 da Lei 13.140/2015, os media<strong>do</strong>res judiciais serão remunera<strong>do</strong>s pelas partes em valores fixa<strong>do</strong>s pelos<br />

tribunais, sen<strong>do</strong> garanti<strong>do</strong> aos necessita<strong>do</strong>s a gratuida<strong>de</strong> (art. 4.º, § 2.º).<br />

Como o pagamento será realiza<strong>do</strong> pelas partes, surge interessante questão a respeito <strong>de</strong>ste quan<strong>do</strong> a parte for beneficiária da<br />

assistência judiciária. Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> serviço presta<strong>do</strong> pelo Po<strong>de</strong>r Judiciário, o próprio Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong>verá arcar com o pagamento, mas<br />

tal solução não po<strong>de</strong> ser aplicada na hipótese <strong>de</strong> o serviço ser presta<strong>do</strong> por câmara privada <strong>de</strong> conciliação e mediação. Nesse caso,<br />

como forma <strong>de</strong> contrapartida a seu cre<strong>de</strong>nciamento, os tribunais <strong>de</strong>terminarão o percentual <strong>de</strong> audiências não remuneradas que<br />

<strong>de</strong>verão ser suportadas por tais entida<strong>de</strong>s privadas. Na hipótese <strong>de</strong> serem necessárias mais audiências <strong>do</strong> que aquelas previstas<br />

originariamente, enten<strong>do</strong> que o Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve pagar às entida<strong>de</strong>s privadas pela realização da ativida<strong>de</strong>.<br />

10.2.3.4.8.<br />

Impedimento <strong>do</strong> concilia<strong>do</strong>r e <strong>do</strong> media<strong>do</strong>r<br />

Não há previsão expressa a respeito das causas que levam ao impedimento e à suspeição <strong>do</strong> concilia<strong>do</strong>r e media<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong>,<br />

nesse caso, ser aplicadas por analogia as causas <strong>de</strong> parcialida<strong>de</strong> previstas para o juiz. Apesar <strong>de</strong> o art. 170 <strong>do</strong> Novo CPC mencionar<br />

apenas o impedimento <strong>do</strong> media<strong>do</strong>r ou concilia<strong>do</strong>r, enten<strong>do</strong> o dispositivo aplicável também para a hipótese <strong>de</strong> sua suspeição.<br />

Haven<strong>do</strong> causa <strong>de</strong> parcialida<strong>de</strong> por impedimento ou suspeição, o media<strong>do</strong>r ou concilia<strong>do</strong>r comunicará imediatamente sua<br />

parcialida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> preferência por meio eletrônico, e <strong>de</strong>volverá os autos ao juiz da causa ou coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>r <strong>do</strong> centro judiciário, quan<strong>do</strong><br />

caberá uma nova distribuição. O mesmo procedimento <strong>de</strong>ve ser a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> a causa da parcialida<strong>de</strong> for apurada durante a<br />

conciliação e mediação, sen<strong>do</strong> que nesse caso será lavrada uma ata com relatório <strong>do</strong> ocorri<strong>do</strong> e solicitação para a nova distribuição.<br />

O art. 172 <strong>do</strong> Novo CPC consagra uma hipótese específica <strong>de</strong> impedimento <strong>do</strong> concilia<strong>do</strong>r e media<strong>do</strong>r: conta<strong>do</strong> <strong>do</strong> término da<br />

última audiência em que aturaram, ficam impedi<strong>do</strong>s <strong>de</strong> assessorar, representar ou patrocinar qualquer das partes pelo prazo <strong>de</strong> um<br />

ano. Essa causa <strong>de</strong> impedimento é interessante porque impe<strong>de</strong> que o concilia<strong>do</strong>r ou o media<strong>do</strong>r se valha <strong>de</strong> seu posto para<br />

prospectar clientes e, com isso, ser leva<strong>do</strong> a beneficiar uma das partes em <strong>de</strong>trimento da outra.<br />

Há outra hipótese <strong>de</strong> impedimento, prevista pelo art. 7.º da Lei 13.140/2015, que veda a participação <strong>do</strong> media<strong>do</strong>r como<br />

árbitro em processo arbitral pertinente a conflito em que tenha atua<strong>do</strong> como media<strong>do</strong>r.


Haven<strong>do</strong> qualquer causa <strong>de</strong> impossibilida<strong>de</strong> temporária <strong>do</strong> exercício da função, cabe ao media<strong>do</strong>r ou concilia<strong>do</strong>r informar tal<br />

situação ao centro, <strong>de</strong> preferência por meio eletrônico, solicitan<strong>do</strong> a retirada <strong>de</strong> seu nome da distribuição enquanto perdurar a<br />

impossibilida<strong>de</strong>.<br />

10.2.3.4.9.<br />

Causas <strong>de</strong> exclusão<br />

A exclusão <strong>do</strong> cadastro <strong>de</strong> concilia<strong>do</strong>res e media<strong>do</strong>res <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> processo administrativo, sen<strong>do</strong> duas as causas que a<br />

justificam: agir com <strong>do</strong>lo ou culpa na condução da conciliação ou da mediação sob sua responsabilida<strong>de</strong>, ou violar qualquer <strong>do</strong>s<br />

<strong>de</strong>veres <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> art. 166, §§ 1.º e 2.º, <strong>do</strong> Novo CPC, e atuar em procedimento <strong>de</strong> mediação ou conciliação apesar <strong>de</strong><br />

impedi<strong>do</strong> ou suspeito.<br />

Apesar da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> processo administrativo para a exclusão <strong>de</strong> media<strong>do</strong>r ou concilia<strong>do</strong>r <strong>do</strong> cadastro, pelas condutas<br />

previstas nos <strong>do</strong>is incisos <strong>do</strong> art. 173 <strong>do</strong> Novo CPC, é possível que o juiz da causa ou o juiz coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>r <strong>do</strong> centro <strong>de</strong> conciliação e<br />

mediação <strong>de</strong>termine a suspensão temporária <strong>do</strong> concilia<strong>do</strong>r ou media<strong>do</strong>r pelo prazo máximo <strong>de</strong> cento e oitenta dias caso verifique<br />

atuação ina<strong>de</strong>quada <strong>do</strong> media<strong>do</strong>r ou concilia<strong>do</strong>r. O afastamento temporário das ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da prolação <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão<br />

fundamentada, que será precedida <strong>de</strong> imediata comunicação ao tribunal para a instauração <strong>do</strong> processo administrativo.<br />

10.2.3.4.10. Solução consensual no âmbito administrativo<br />

O art. 174 <strong>do</strong> Novo CPC prevê a criação pela União, Esta<strong>do</strong>s, Distrito Fe<strong>de</strong>ral e Municípios <strong>de</strong> câmaras <strong>de</strong> mediação e<br />

conciliação voltadas à solução consensual <strong>de</strong> conflitos no ambiente administrativo. Tal câmara po<strong>de</strong>rá, entre outras ativida<strong>de</strong>s<br />

compatíveis com a sua finalida<strong>de</strong>, dirimir conflitos envolven<strong>do</strong> órgãos e entida<strong>de</strong>s da administração pública, avaliar a<br />

admissibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s pedi<strong>do</strong>s <strong>de</strong> resolução <strong>de</strong> conflitos, por meio <strong>de</strong> conciliação, no âmbito da administração pública, e promover,<br />

quan<strong>do</strong> couber, a celebração <strong>de</strong> termo <strong>de</strong> ajustamento <strong>de</strong> conduta.<br />

A possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> soluções consensuais para conflitos envolven<strong>do</strong> órgãos e entida<strong>de</strong>s da administração pública é irrefutável.<br />

E por duas razões: primeiro, porque nem to<strong>do</strong> direito <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong> pela Administração Pública é indisponível, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong>-se diferenciar<br />

as relações jurídicas <strong>de</strong> direito material <strong>de</strong> natureza administrativa e <strong>de</strong> natureza civil das quais participa a Administração Pública.<br />

Segun<strong>do</strong>, porque mesmo no direito indisponível é possível a transação a respeito das formas e prazos <strong>de</strong> cumprimento da<br />

obrigação, exatamente como ocorre no processo coletivo. Há, inclusive, no inciso III <strong>do</strong> art. 174 <strong>do</strong> Novo CPC a menção à<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> promoção <strong>de</strong> termo <strong>de</strong> ajustamento <strong>de</strong> conduta pelas câmaras criadas para a solução <strong>de</strong> conflitos no ambiente<br />

administrativo, que necessariamente compreen<strong>de</strong>rão conflitos coletivos envolven<strong>do</strong> a Fazenda Pública.<br />

10.2.3.4.11. Conciliação e mediação extrajudiciais<br />

O art. 175 <strong>do</strong> Novo CPC se preocupa em esclarecer que a seção <strong>do</strong> CPC <strong>de</strong>stinada à conciliação e à mediação judiciais não<br />

exclui outras formas <strong>de</strong> conciliação e mediação extrajudiciais vinculadas a órgãos institucionais ou realizadas por intermédio <strong>de</strong><br />

profissionais in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes. Essas formas extrajudiciais <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos são reguladas pela Lei 13.140/2015, sen<strong>do</strong> as<br />

regras consagradas no Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil a respeito <strong>do</strong> tema aplicadas apenas no que couber às câmaras privadas <strong>de</strong><br />

conciliação e medição.<br />

10.2.3.5.<br />

Arbitragem<br />

10.2.3.5.1.<br />

Generalida<strong>de</strong>s<br />

A arbitragem é antiga forma <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos fundada, no passa<strong>do</strong>, na vonta<strong>de</strong> das partes <strong>de</strong> submeterem a <strong>de</strong>cisão a um<br />

<strong>de</strong>termina<strong>do</strong> sujeito que, <strong>de</strong> algum mo<strong>do</strong>, exercia forte influência sobre elas, sen<strong>do</strong>, por isso, extremamente valorizadas suas<br />

<strong>de</strong>cisões. Assim, surge a arbitragem, figuran<strong>do</strong> como árbitro o ancião ou o lí<strong>de</strong>r religioso da comunida<strong>de</strong>, que intervinha no<br />

conflito para resolvê-lo imperativamente.<br />

Atualmente, a arbitragem mantém as principais características <strong>de</strong> seus primeiros tempos, sen<strong>do</strong> uma forma alternativa <strong>de</strong><br />

solução <strong>de</strong> conflitos fundada basicamente em <strong>do</strong>is elementos: (i) as partes escolhem um terceiro <strong>de</strong> sua confiança que será<br />

responsável pela solução <strong>do</strong> conflito <strong>de</strong> interesses; e (ii) a <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong>sse terceiro é impositiva, o que significa que resolve o conflito<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da vonta<strong>de</strong> das partes.<br />

A Lei <strong>de</strong> Arbitragem (Lei 9.307/1996) disciplina essa forma <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos, privativa <strong>do</strong>s direitos disponíveis.<br />

Registre-se posicionamento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que admite a arbitragem em contratos administrativos envolven<strong>do</strong> o<br />

Esta<strong>do</strong>, toman<strong>do</strong>-se por base a distinção entre direito público primário e secundário. Nesse entendimento, para a proteção <strong>do</strong>


interesse público primário (bem da coletivida<strong>de</strong>), o Esta<strong>do</strong> pratica atos patrimoniais, pragmáticos, cuja disponibilida<strong>de</strong> em prol da<br />

coletivida<strong>de</strong> admite a solução por arbitragem.18<br />

Após alguma vacilação na <strong>do</strong>utrina e jurisprudência, venceu a tese mais correta <strong>de</strong> que a arbitragem não afronta o princípio da<br />

inafastabilida<strong>de</strong> da jurisdição, previsto no art. 5.º, XXXV, da CF/1988. O Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral corretamente enten<strong>de</strong>u que a<br />

escolha entre a arbitragem e a jurisdição é absolutamente constitucional, afirman<strong>do</strong> que a aplicação da garantia constitucional da<br />

inafastabilida<strong>de</strong> é naturalmente condicionada à vonta<strong>de</strong> das partes 19 . Se o próprio direito <strong>de</strong> ação é disponível, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> da<br />

vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> interessa<strong>do</strong> para se concretizar por meio da propositura da <strong>de</strong>manda judicial, também o será o exercício da jurisdição<br />

na solução <strong>do</strong> conflito <strong>de</strong> interesse.<br />

Questão interessante a respeito da arbitragem diz respeito a sua genuína natureza <strong>de</strong> equivalente jurisdicional. Ainda que a<br />

<strong>do</strong>utrina majoritária <strong>de</strong>fenda tal entendimento 20 , é preciso lembrar que importante parcela <strong>do</strong>utrinária <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a natureza<br />

jurisdicional da arbitragem, afirman<strong>do</strong> que, atualmente, a jurisdição se divi<strong>de</strong> em jurisdição estatal, por meio da jurisdição, e<br />

jurisdição privada, por meio da arbitragem21. Para se ter uma i<strong>de</strong>ia da confusão nesse tocante, bem como da pouca importância<br />

prática, registre-se julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que ora trata a arbitragem como equivalente jurisdicional e ora como<br />

espécie <strong>de</strong> jurisdição privada 22 .<br />

Para a corrente <strong>do</strong>utrinária que enten<strong>de</strong> ser a arbitragem uma espécie <strong>de</strong> jurisdição privada, existem <strong>do</strong>is argumentos<br />

principais: (i) a <strong>de</strong>cisão que resolve a arbitragem é atualmente uma sentença arbitral, não mais necessitan<strong>do</strong> <strong>de</strong> homologação pelo<br />

juiz para ser um título executivo judicial (art. 515, VII, <strong>do</strong> Novo CPC), o que significa a sua equiparação com a sentença judicial;<br />

(ii) a sentença arbitral torna-se imutável e indiscutível, fazen<strong>do</strong> coisa julgada material, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o<br />

Po<strong>de</strong>r Judiciário reavaliar seu conteú<strong>do</strong>, fican<strong>do</strong> tal revisão jurisdicional limitada a vícios formais da arbitragem e/ou da sentença<br />

arbitral, por meio da ação anulatória prevista pelos arts. 32 e 33 da Lei 9.307/1996.<br />

Conforme já afirma<strong>do</strong>, o entendimento foi prestigia<strong>do</strong> em julgamento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça ao <strong>de</strong>cidir pela<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> existência <strong>de</strong> conflito <strong>de</strong> competência entre um órgão jurisdicional e uma câmara arbitral 23 .<br />

Não concor<strong>do</strong> com tal entendimento, a princípio porque nem toda imutabilida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong>riva da coisa julgada material,<br />

bastan<strong>do</strong> para confirmar a alegação a lembrança <strong>do</strong> art. 123 <strong>do</strong> Novo CPC, que prevê a imutabilida<strong>de</strong> da justiça da <strong>de</strong>cisão, ou<br />

seja, <strong>do</strong>s fundamentos da <strong>de</strong>cisão, para o assistente que efetivamente atua no processo. Depois, porque não há como confundir o<br />

juiz e o árbitro. O primeiro, agente estatal, concursa<strong>do</strong>, preocupa<strong>do</strong> com os diversos escopos <strong>do</strong> processo, enquanto o segun<strong>do</strong>,<br />

particular contrata<strong>do</strong> pelas partes, preocupa<strong>do</strong> exclusivamente em resolver o conflito que lhe foi leva<strong>do</strong>, por vezes até mesmo sem<br />

a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se ater à legalida<strong>de</strong>. Isso sem entrar na polêmica questão que envolve a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o árbitro resolver conflito<br />

funda<strong>do</strong> em ilegalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ambas as partes envolvidas, o que, naturalmente, não seria feito pelo juiz <strong>de</strong> direito.<br />

O já menciona<strong>do</strong> art. 3.º, § 1.º, <strong>do</strong> Novo CPC parece ter consagra<strong>do</strong> o entendimento <strong>de</strong> que a arbitragem não é jurisdição,<br />

porque, ao prever a inafastabilida<strong>de</strong> da jurisdição, salvo a arbitragem, fica claro que essa forma <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos não é<br />

jurisdicional. E no mesmo senti<strong>do</strong> vai o art. 42 <strong>do</strong> Novo CPC ao prever que as causas cíveis serão processadas e <strong>de</strong>cididas pelo juiz<br />

nos limites <strong>de</strong> sua competência, ressalva<strong>do</strong> às partes o direito <strong>de</strong> instituir juízo arbitral, na forma da lei.<br />

Insisto, entretanto, que a discussão é substancialmente <strong>do</strong>utrinária, sem reflexos práticos <strong>de</strong> maior repercussão. Se houve<br />

época em que a arbitragem precisava ser consi<strong>de</strong>rada espécie <strong>de</strong> jurisdição para aumentar sua relevância entre as outras formas <strong>de</strong><br />

solução <strong>do</strong>s conflitos, essa época ficou no passa<strong>do</strong>. Hoje a arbitragem é uma realida<strong>de</strong>, muito bem-vinda, <strong>de</strong> forma <strong>de</strong> solução <strong>de</strong><br />

conflito, não maculan<strong>do</strong> em nada sua relevância e nem limitan<strong>do</strong> seu alcance o fato <strong>de</strong> não ser consi<strong>de</strong>rada espécie <strong>de</strong> jurisdição. A<br />

verda<strong>de</strong> é que, jurisdição ou não, a arbitragem está consolidada.<br />

10.2.3.5.2.<br />

Arbitragem na relação consumerista<br />

O art. 51, VII, <strong>do</strong> CDC, prevê ser nula <strong>de</strong> pleno direito a cláusula contratual que <strong>de</strong>termine a utilização compulsória <strong>de</strong><br />

arbitragem. Por outro la<strong>do</strong>, o art. 4.º, § 2.º, da Lei 9.307/1996, que regula a arbitragem e é posterior ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r, prevê que, nos contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, a cláusula compromissória só terá eficácia se o a<strong>de</strong>rente tomar a iniciativa <strong>de</strong><br />

instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que por escrito em <strong>do</strong>cumento anexo ou em<br />

negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula.<br />

Aparentemente, os <strong>do</strong>is dispositivos, ainda que interpreta<strong>do</strong>s em sua literalida<strong>de</strong>, po<strong>de</strong>m conviver, até porque nem to<strong>do</strong><br />

contrato consumerista é <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são e vice-versa. Assim, to<strong>do</strong> contrato consumerista, <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são ou não, jamais po<strong>de</strong>ria conter uma<br />

cláusula compromissória, enquanto os contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são não consumeristas só po<strong>de</strong>riam conter tal espécie <strong>de</strong> cláusula com os<br />

cuida<strong>do</strong>s previstos no art. 4.º, § 2.º, da Lei 9.307/1996. A solução, entretanto, não é tão simples.<br />

Antes <strong>de</strong> se passar propriamente à análise <strong>de</strong> como combinar da melhor forma possível os <strong>do</strong>is dispositivos legais, é<br />

importante lembrar, como faz a maioria da <strong>do</strong>utrina, que a exigência legal contida no art. 4.º, § 2.º, da Lei <strong>de</strong> Arbitragem é uma


ilusão, porque, sen<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, as cláusulas serão todas impostas ao a<strong>de</strong>rente. Ainda que se <strong>de</strong>staque a cláusula, ou<br />

mesmo se estabeleça sua redação em separa<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, será difícil imaginar que a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> a<strong>de</strong>rente foi<br />

<strong>de</strong>terminante para sua formulação. Seriam, portanto, cuida<strong>do</strong>s ineptos a tutelar efetivamente o a<strong>de</strong>rente.<br />

Nesse senti<strong>do</strong> as lições <strong>de</strong> Alexandre Freitas Câmara:<br />

“Vale lembrar, porém, que no contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são o a<strong>de</strong>rente simplesmente se submete às cláusulas impostas pelo proponente, o que<br />

leva a crer que, em muitos casos, o contrato só será celebra<strong>do</strong> se o a<strong>de</strong>rente assinar também o <strong>do</strong>cumento anexo que institui a<br />

cláusula compromissória (ou dê sua assinatura ou visto especialmente para a cláusula compromissória constante, em negrito, <strong>do</strong><br />

instrumento <strong>de</strong> contrato)”24.<br />

Deve-se <strong>de</strong>scartar inicialmente a regra <strong>de</strong> hermenêutica que <strong>de</strong>termina a prevalência da norma mais nova sobre a mais antiga,<br />

até mesmo porque as normas <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r têm natureza <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, nos termos <strong>do</strong> art. 1.º da Lei<br />

8.078/1990. A<strong>de</strong>mais, conforme já exposto, não são normas que versam rigorosamente sobre o mesmo tema, haven<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong><br />

muito, pontos <strong>de</strong> contato entre ambas.<br />

Não é difícil imaginar a razão <strong>de</strong> ser da regra prevista no art. 51, VII, <strong>do</strong> CDC. Sen<strong>do</strong> o fornece<strong>do</strong>r aquele que tem mais força<br />

na relação contratual, é fácil presumir a imposição ao consumi<strong>do</strong>r não só da cláusula compromissória, como também a escolha <strong>do</strong><br />

árbitro e a forma <strong>de</strong> solução a ser dada ao conflito, que po<strong>de</strong>rá até mesmo seguir a regra da equida<strong>de</strong>, nos termos <strong>do</strong>s arts. 2.º e 11,<br />

II, da Lei 9.307/1996. A respeito <strong>do</strong> tema, vale a transcrição das lições <strong>de</strong> Joel Dias Figueira Jr.:<br />

“Havemos ainda <strong>de</strong> assinalar que o problema objeto <strong>de</strong>sta análise não resi<strong>de</strong> propriamente no instituto jurídico da arbitragem, mas<br />

sim na sua ina<strong>de</strong>quação, ou melhor, na pouca ou imperfeita compatibilida<strong>de</strong> para solucionar os conflitos <strong>de</strong> consumo, em face das<br />

regras e princípios orienta<strong>do</strong>res <strong>de</strong>ssas relações, notadamente o <strong>de</strong>sequilíbrio que se constata em quase a totalida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s contratos,<br />

em que o consumi<strong>do</strong>r aparece como parte <strong>de</strong>sproporcionalmente mais fraca em relação ao produtor ou fornece<strong>do</strong>r, por razões<br />

multifacetadas (…)” 25 .<br />

Ainda que se <strong>de</strong>svirtue parcialmente o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, há corrente <strong>do</strong>utrinária que enten<strong>de</strong> ser compatível a aplicação <strong>do</strong><br />

art. 4.º, § 2.º, da Lei <strong>de</strong> Arbitragem, ainda que excepcionalmente, a contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são consumeristas. A excepcional hipótese<br />

seria contemplada por se estabelecer uma arbitragem voluntária, o que seria suficiente para afastar a aplicação <strong>do</strong> art. 51, VII, <strong>do</strong><br />

CDC, que prevê ser nula <strong>de</strong> pleno direito apenas a cláusula que estabelece compulsoriamente a arbitragem no contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são.<br />

Para Luiz Antonio Rizzatto Nunes, quan<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r for pessoa jurídica <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> porte e negociar, por meio <strong>de</strong> seu<br />

corpo <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong>s ou assessoria jurídica as condições da cláusula compromissória, não se po<strong>de</strong>ria apontar qualquer nulida<strong>de</strong> na<br />

avença entre as partes. Para o jurista, “esse é o mínimo da equivalência necessária entre as partes para que se possa discutir <strong>de</strong><br />

forma equilibrada e consciente as cláusulas contratuais relativas à arbitragem”26.<br />

Não vejo como discordar <strong>de</strong> tais lições, embora seja necessário se consi<strong>de</strong>rar que a situação <strong>de</strong>scrita é <strong>de</strong> extrema rarida<strong>de</strong>. O<br />

mais comum é o consumi<strong>do</strong>r ser praticamente obriga<strong>do</strong> a assinar o contrato, sen<strong>do</strong> esse <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são ou não. E nesses casos, que são<br />

os mais comuns, <strong>de</strong>ve se consi<strong>de</strong>rar nula <strong>de</strong> pleno direito a cláusula compromissória?<br />

O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça vem enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> que, sen<strong>do</strong> a cláusula imposta ao consumi<strong>do</strong>r, o que ordinariamente se<br />

verifica nos contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, aplica-se o art. 51, VII, <strong>do</strong> CDC, admitin<strong>do</strong> a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pleno direito da cláusula<br />

compromissória 27 . No mesmo senti<strong>do</strong> existem lições <strong>do</strong>utrinárias, sempre preocupadas com a imposição <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> unilateral <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r, a afastar a jurisdição como forma <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos consumeristas 28 . Mas já há <strong>de</strong>cisão daquele tribunal que<br />

enten<strong>de</strong> ser inviável apenas a celebração <strong>de</strong> cláusula compromissória, <strong>de</strong> forma que o compromisso arbitral po<strong>de</strong> ser livremente<br />

celebra<strong>do</strong>. 29<br />

Por outro la<strong>do</strong>, existe corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a inaplicabilida<strong>de</strong> da regra prevista no art. 51, VII, <strong>do</strong> CDC, sempre<br />

que restar comprova<strong>do</strong> que a cláusula não foi imposta unilateralmente pelo fornece<strong>do</strong>r. Para Nelson Nery Jr., o art. 4.º, § 2.º, da<br />

Lei <strong>de</strong> Arbitragem “não é incompatível com o CDC, art. 51, VII, razão pela qual ambos os dispositivos legais permanecem<br />

vigoran<strong>do</strong> plenamente. Com isso queremos dizer que é possível, nos contratos <strong>de</strong> consumo, a instituição <strong>de</strong> cláusula <strong>de</strong> arbitragem,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> que obe<strong>de</strong>cida, efetivamente, a bilateralida<strong>de</strong> na contratação e a forma da manifestação da vonta<strong>de</strong>, ou seja, <strong>de</strong> comum<br />

acor<strong>do</strong> (gré à gré)”30.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, interessante <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“<strong>Direito</strong> processual civil e consumi<strong>do</strong>r. Contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. Convenção <strong>de</strong> arbitragem. Limites e exceções. Arbitragem em contratos<br />

<strong>de</strong> financiamento imobiliário. Cabimento. Limites.<br />

1. Com a promulgação da Lei <strong>de</strong> Arbitragem, passaram a conviver, em harmonia, três regramentos <strong>de</strong> diferentes graus <strong>de</strong><br />

especificida<strong>de</strong>: (i) a regra geral, que obriga a observância da arbitragem quan<strong>do</strong> pactuada pelas partes, com <strong>de</strong>rrogação da jurisdição


estatal; (ii) a regra específica, contida no art. 4º, § 2º, da Lei 9.307/1996 e aplicável a contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são genéricos, que restringe a<br />

eficácia da cláusula compromissória; e (iii) a regra ainda mais específica, contida no art. 51, VII, <strong>do</strong> CDC, inci<strong>de</strong>nte sobre contratos<br />

<strong>de</strong>riva<strong>do</strong>s <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo, sejam eles <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são ou não, impon<strong>do</strong> a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusula que <strong>de</strong>termine a utilização<br />

compulsória da arbitragem, ainda que satisfeitos os requisitos <strong>do</strong> art. 4º, § 2º, da Lei 9.307/1996.<br />

2. O art. 51, VII, <strong>do</strong> CDC se limita a vedar a a<strong>do</strong>ção prévia e compulsória da arbitragem, no momento da celebração <strong>do</strong> contrato,<br />

mas não impe<strong>de</strong> que, posteriormente, diante <strong>de</strong> eventual litígio, haven<strong>do</strong> consenso entre as partes (em especial a aquiescência <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r), seja instaura<strong>do</strong> o procedimento arbitral.<br />

3. As regras <strong>do</strong>s arts. 51, VIII, <strong>do</strong> CDC e 34 da Lei 9.514/1997 não são incompatíveis. Primeiro porque o art. 34 não se refere<br />

exclusivamente a financiamentos imobiliários sujeitos ao CDC e segun<strong>do</strong> porque, haven<strong>do</strong> relação <strong>de</strong> consumo, o dispositivo legal<br />

não fixa o momento em que <strong>de</strong>verá ser <strong>de</strong>finida a efetiva utilização da arbitragem.<br />

4. Recurso especial a que se nega provimento” 31 .<br />

Acredito que as lições só têm aplicação prática nos contratos consumeristas que não sejam <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, nos quais<br />

excepcionalmente a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r na formulação das cláusulas é respeitada. Não vejo praticamente como crível um<br />

contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são em que o fornece<strong>do</strong>r tenha da<strong>do</strong> liberda<strong>de</strong> contratual ao consumi<strong>do</strong>r-a<strong>de</strong>rente tão somente no tocante à cláusula<br />

arbitral. Insisto que, na praxe forense, os contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são consumeristas não <strong>de</strong>ixam qualquer brecha para criação por parte <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, que ou assina o contrato como lhe é apresenta<strong>do</strong> ou simplesmente <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> assinar.<br />

Por essa razão, prefiro a corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> afastamento <strong>do</strong> art. 51, VII, <strong>do</strong> CDC, a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r<br />

<strong>do</strong> caso concreto. Ainda que o consumi<strong>do</strong>r não tenha ti<strong>do</strong> qualquer participação na formulação da cláusula arbitral, caso tenha<br />

consciência <strong>do</strong> que representa a solução pela via arbitral e, no momento <strong>de</strong> solução <strong>do</strong> conflito, não se oponha à solução por esse<br />

meio alternativo, não vejo porque consi<strong>de</strong>rar nula <strong>de</strong> pleno direito a cláusula contratual.<br />

Nas felizes palavras <strong>de</strong> Joel Dias Figueira Jr., “em linha <strong>de</strong> princípio, a cláusula compromissória cheia ou vazia inserida em<br />

contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são ou padrão, com a observância <strong>do</strong>s parcos e insignificantes requisitos assinala<strong>do</strong>s no § 2.º <strong>do</strong> art. 4.º da LA, é<br />

válida e eficaz entre as partes contratantes se e quan<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r concordar, em tempo oportuno, isto é, quan<strong>do</strong> surgi<strong>do</strong> o<br />

conflito entre as partes e o objeto for o inadimplemento <strong>do</strong> mesmo contrato, em instituir o juízo arbitral, mediante <strong>de</strong>finição<br />

bilateral, voluntária e equitativa <strong>do</strong> termo <strong>de</strong> compromisso a ser firma<strong>do</strong>, conforme art. 10 da Lei 9.307/1996”32.<br />

Exatamente por essa razão, enten<strong>do</strong> não ser aplicável o art. 51, VII, <strong>do</strong> CDC ao compromisso arbitral, que, diferentemente da<br />

cláusula compromissória 33 , <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> ambas as partes, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> já instaura<strong>do</strong> o conflito entre elas. Nesse caso,<br />

mesmo <strong>de</strong>rivan<strong>do</strong> a crise jurídica <strong>de</strong> um contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são consumerista, o fornece<strong>do</strong>r não po<strong>de</strong>rá impor ao consumi<strong>do</strong>r a<br />

celebração <strong>do</strong> compromisso arbitral. Como o consumi<strong>do</strong>r é capaz, ainda que hipossuficiente, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> inclusive renunciar ao seu<br />

direito material, não vejo como impedir que opte livremente pela arbitragem na solução <strong>de</strong> seu conflito 34 .<br />

Em síntese conclusiva, enten<strong>do</strong> que a cláusula arbitral imposta pelo fornece<strong>do</strong>r no contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são não <strong>de</strong>ve ser<br />

consi<strong>de</strong>rada nula <strong>de</strong> pleno direito, mesmo diante da previsão <strong>do</strong> art. 51, VII, <strong>do</strong> CDC. Melhor será permitir ao consumi<strong>do</strong>r escolher<br />

entre seguir na arbitragem ou rumar para o processo jurisdicional, hipótese em que o juiz <strong>de</strong>cidirá pela nulida<strong>de</strong> da cláusula arbitral<br />

e julgará normalmente a <strong>de</strong>manda judicial. Esse entendimento, inclusive, preserva o consumi<strong>do</strong>r quan<strong>do</strong> o fornece<strong>do</strong>r alegar a<br />

nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pleno direito da cláusula para escapar da arbitragem, ainda que <strong>de</strong>sejada pelo consumi<strong>do</strong>r.<br />

10.3.<br />

10.3.1.<br />

TUTELA ESPECÍFICA DAS OBRIGAÇÕES DE FAZER E NÃO FAZER<br />

Introdução<br />

O título III, <strong>do</strong> CDC, intitula<strong>do</strong> “Da <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo”, trata <strong>de</strong> temas referentes tanto à <strong>de</strong>fesa individual como<br />

coletiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, haven<strong>do</strong> dispositivos que são volta<strong>do</strong>s exclusivamente à tutela coletiva, como é o caso <strong>do</strong>s arts. 81,<br />

parágrafo único, 82 e 87, e outros que po<strong>de</strong>m ser aplica<strong>do</strong>s tanto à tutela coletiva como à tutela individual, como é o caso <strong>do</strong> art.<br />

81, caput, 83, 84, 88 e 90. No presente capítulo se <strong>de</strong>senvolverá a análise <strong>do</strong> art. 84 <strong>do</strong> CDC, que, no ano <strong>de</strong> 1990, foi consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong><br />

uma interessante inovação no tocante à tutela inibitória no âmbito <strong>do</strong> direito consumerista.<br />

Ainda que exista norma específica a respeito <strong>do</strong> tema no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, também serão aplicadas à<br />

execução da obrigação <strong>de</strong> fazer e <strong>de</strong> não fazer as regras previstas no Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil naquilo que a complementar.<br />

10.3.2.<br />

Tutela jurisdicional<br />

Por tutela jurisdicional enten<strong>de</strong>-se a proteção prestada pelo Esta<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> provoca<strong>do</strong> por meio <strong>de</strong> um processo, gera<strong>do</strong> em<br />

razão da lesão ou ameaça <strong>de</strong> lesão a um direito material. Como se po<strong>de</strong> notar <strong>de</strong>sse singelo conceito, a tutela jurisdicional é voltada<br />

para o direito material, daí ser correta a expressão “tutela jurisdicional <strong>de</strong> direitos materiais”. Assim como a jurisdição, a tutela<br />

jurisdicional é una e indivisível, mas aca<strong>de</strong>micamente permite-se sua classificação em diversas espécies, bastan<strong>do</strong> para tanto a


a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> diferentes critérios, interessan<strong>do</strong> ao presente capítulo especificamente <strong>do</strong>is <strong>de</strong>les.<br />

10.3.2.1.<br />

Tutela jurisdicional específica<br />

Toman<strong>do</strong>-se por base o critério da coincidência <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>s gera<strong>do</strong>s pela prestação da tutela jurisdicional com os resulta<strong>do</strong>s<br />

que seriam gera<strong>do</strong>s pela satisfação voluntária da obrigação, a tutela jurisdicional po<strong>de</strong> ser classificada em tutela específica e tutela<br />

pelo equivalente em dinheiro. Na primeira, a satisfação gerada pela prestação jurisdicional é exatamente a mesma que seria gerada<br />

com o cumprimento voluntário da obrigação, enquanto na segunda a tutela jurisdicional prestada é diferente da natureza da<br />

obrigação e, por consequência, cria um resulta<strong>do</strong> distinto daquele que seria cria<strong>do</strong> com a sua satisfação voluntária.<br />

A tutela específica é preferível à tutela pelo equivalente em dinheiro, porque essa espécie <strong>de</strong> tutela é a única que entrega ao<br />

vitorioso exatamente aquilo que ele obteria se não precisasse <strong>do</strong> processo, em razão <strong>do</strong> cumprimento voluntário da obrigação pelo<br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r. É a consagração <strong>do</strong> antigo brocar<strong>do</strong> consagra<strong>do</strong> por Chiovenda, <strong>de</strong> que o processo será tanto melhor quanto mais<br />

aproximar seus resulta<strong>do</strong>s daqueles que seriam gera<strong>do</strong>s pelo cumprimento voluntário da obrigação (princípio da maior<br />

coincidência possível). Ocorre, entretanto, que a preferência da tutela específica sobre a tutela pelo equivalente em dinheiro está<br />

condicionada à vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>de</strong>mandante, que po<strong>de</strong>rá optar pela segunda espécie <strong>de</strong> tutela se assim <strong>de</strong>sejar, bem como diante da<br />

impossibilida<strong>de</strong> material <strong>de</strong> obtenção da tutela específica35. Para parcela da <strong>do</strong>utrina, ainda que possível, a tutela específica po<strong>de</strong><br />

ser excluída quan<strong>do</strong> não for justificável ou racional em razão <strong>de</strong> sua excessiva onerosida<strong>de</strong> 36 .<br />

O art. 84, <strong>do</strong> CDC, tanto em seu caput como no § 1.º, <strong>de</strong>monstra <strong>de</strong> forma clara a opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r pela tutela específica,<br />

reservan<strong>do</strong> à tutela reparatória uma posição secundária no âmbito da satisfação judicial <strong>de</strong> obrigações. O § 1.º, em especial, prevê<br />

que a conversão em perdas e danos somente será admissível se por elas optar o autor ou se impossível a tutela específica ou a<br />

obtenção <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> prático correspon<strong>de</strong>nte ao cumprimento voluntário da obrigação, sen<strong>do</strong> que o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça<br />

também permite a conversão quan<strong>do</strong> a obtenção da tutela específica for extremamente onerosa ao <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r.<br />

Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> obrigação inadimplida <strong>de</strong> fazer e <strong>de</strong> não fazer, espécies <strong>de</strong> obrigações tuteladas pelo dispositivo legal<br />

comenta<strong>do</strong>, é possível a tutela ser prestada tanto <strong>de</strong> forma específica como pelo equivalente em dinheiro, sen<strong>do</strong> essencial verificar<br />

a natureza <strong>do</strong> inadimplemento. Sen<strong>do</strong> o inadimplemento <strong>de</strong>finitivo, o que significa dizer que não existe mais a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

cumprimento da obrigação, a única tutela jurisdicional possível será a tutela pelo equivalente em dinheiro. Caso ainda exista a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cumprimento, quan<strong>do</strong> haverá somente um retardamento no cumprimento da prestação, a tutela po<strong>de</strong>rá ser prestada<br />

<strong>de</strong> forma específica, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que esse ainda seja o interesse <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r.<br />

Por fim, cabe um breve comentário a respeito <strong>do</strong> art. 497, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, que prevê nas obrigações <strong>de</strong> fazer e não fazer<br />

a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o juiz conce<strong>de</strong>r a tutela específica ou <strong>de</strong>terminar providências que assegurem o resulta<strong>do</strong> prático equivalente ao<br />

<strong>do</strong> adimplemento da obrigação. Como <strong>de</strong>monstra a melhor <strong>do</strong>utrina, o texto legal faz parecer que tutela específica e resulta<strong>do</strong><br />

equivalente são espécies diferentes <strong>de</strong> tutela jurisdicional, quan<strong>do</strong>, na realida<strong>de</strong>, a liberda<strong>de</strong> concedida ao juiz para a obtenção <strong>do</strong><br />

resulta<strong>do</strong> prático equivalente é voltada justamente para a obtenção da tutela específica <strong>do</strong>s direitos materiais37.<br />

10.3.2.2.<br />

Tutela inibitória<br />

A<strong>do</strong>tan<strong>do</strong>-se o critério da natureza jurídica <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s jurídico-materiais, a tutela jurisdicional é dividida em duas espécies:<br />

tutela preventiva (tradicionalmente chamada <strong>de</strong> inibitória) e tutela reparatória (ressarcitória), sen<strong>do</strong> a primeira uma tutela<br />

jurisdicional voltada para o futuro, visan<strong>do</strong> evitar a prática <strong>de</strong> ato ilícito, enquanto a segunda está voltada para o passa<strong>do</strong>, visan<strong>do</strong> o<br />

restabelecimento patrimonial <strong>do</strong> sujeito vitima<strong>do</strong> pela prática <strong>de</strong> um ato ilícito danoso.<br />

A tutela preventiva é sempre voltada para o futuro, com o porvir, ten<strong>do</strong> como objetivo impedir a prática <strong>de</strong> um ato ilícito, o<br />

que po<strong>de</strong> ocorrer <strong>de</strong> três formas:<br />

(a)<br />

(b)<br />

(c)<br />

evitar a prática originária <strong>do</strong> ato ilícito, ou seja, impedir em absoluto a ocorrência <strong>de</strong> tal ato, hipótese na qual a tutela reparatória será<br />

conhecida como tutela inibitória pura;<br />

impedir a continuação <strong>do</strong> ato ilícito, na hipótese <strong>de</strong> ato ilícito continua<strong>do</strong>;<br />

impedir a repetição <strong>de</strong> prática <strong>de</strong> ato ilícito.<br />

Importante notar que, mesmo que exista ato ilícito já pratica<strong>do</strong>, a tutela preventiva não é voltada para essa realida<strong>de</strong>, que já faz<br />

parte <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> e, portanto, será objeto da tutela reparatória. Sempre voltada para o futuro, a tutela preventiva não diz respeito e<br />

tampouco gera seus efeitos sobre aquilo que já ocorreu. A tutela preventiva, apesar <strong>de</strong> reconhecer o passa<strong>do</strong>, é sempre voltada para<br />

o futuro, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> o já ocorri<strong>do</strong> a cargo da tutela reparatória. É interessante anotar, inclusive, que a tutela preventiva e a tutela<br />

reparatória po<strong>de</strong>m ser objeto <strong>de</strong> pretensão <strong>de</strong> um mesmo <strong>de</strong>mandante num mesmo processo. O Ministério Público po<strong>de</strong> pedir a


con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> réu a parar com a poluição e a reparar o meio ambiente já lesa<strong>do</strong> pela prática <strong>do</strong> ato ilícito, enquanto uma empresa<br />

po<strong>de</strong> pedir a proibição <strong>de</strong> veiculação <strong>de</strong> propaganda ofensiva a seu nome, bem como a con<strong>de</strong>nação pelos danos já suporta<strong>do</strong>s pela<br />

propaganda já veiculada.<br />

A tese da tutela inibitória funda-se na exata <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> ato ilícito, cuja prática se preten<strong>de</strong> evitar. Durante muito tempo,<br />

condicionou-se a prestação <strong>de</strong> tutela jurisdicional à existência <strong>de</strong> um dano, o que até se justificava à época em que se imaginava ser<br />

a tutela reparatória a única existente. A dificulda<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser facilmente percebida pelo art. 186 <strong>do</strong> CC, que, ao conceituar o ato<br />

ilícito, indica a necessida<strong>de</strong> da presença <strong>de</strong> três elementos: contrarieda<strong>de</strong> ao direito, culpa ou <strong>do</strong>lo e dano. A imprecisão <strong>do</strong><br />

dispositivo é evi<strong>de</strong>nte, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que o ato ilícito é tão somente o ato contrário ao direito, sen<strong>do</strong> alheios ao seu conceito os<br />

elementos da culpa ou <strong>do</strong>lo e <strong>do</strong> dano. O art. 186 <strong>do</strong> CC não conceitua o ato ilícito, <strong>de</strong>screve os elementos necessários para a<br />

obtenção da tutela reparatória.<br />

Dessa forma, a tutela reparatória, sempre voltada para o passa<strong>do</strong>, buscan<strong>do</strong> a reparação <strong>do</strong> prejudica<strong>do</strong>, <strong>de</strong>manda ao menos<br />

<strong>do</strong>is elementos: ato contrário ao direito e dano, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que mesmo na tutela reparatória a culpa ou o <strong>do</strong>lo po<strong>de</strong>m ser<br />

dispensa<strong>do</strong>s na hipótese <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> objetiva. A tutela inibitória, sempre voltada para o futuro, buscan<strong>do</strong> evitar a prática <strong>do</strong><br />

ato ilícito, preocupa-se exclusivamente com o ato contrário ao direito, sen<strong>do</strong>-lhe irrelevante a culpa ou o <strong>do</strong>lo e o dano38.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ve ser sauda<strong>do</strong> o parágrafo único <strong>do</strong> art. 497 <strong>do</strong> Novo CPC ao prever que para a concessão da tutela<br />

específica que serve para inibir a prática, reiteração ou a continuação <strong>de</strong> um ilícito, é irrelevante a <strong>de</strong>monstração da ocorrência <strong>de</strong><br />

dano ou da existência <strong>de</strong> culpa ou <strong>do</strong>lo.<br />

Cumpre lembrar a tese inteligentemente <strong>de</strong>fendida por Marinoni, que diferencia a tutela inibitória da tutela <strong>de</strong> remoção <strong>do</strong><br />

ilícito, reconhecen<strong>do</strong> que ambas são tutelas preventivas, voltadas para o futuro. Para o processualista paranaense, existe uma<br />

diferença entre efeitos continua<strong>do</strong>s <strong>do</strong> ato ilícito e a prática continuada <strong>do</strong> ilícito. Na hipótese <strong>de</strong> o ato ser continua<strong>do</strong>, é possível<br />

imaginar uma tutela que impeça sua continuação, sen<strong>do</strong> o caso <strong>de</strong> tutela inibitória. Por outro la<strong>do</strong>, é possível que o ato ilícito faça<br />

parte <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, não mais existin<strong>do</strong>, o que não se po<strong>de</strong> afirmar quanto aos seus efeitos, que continuam a ser gera<strong>do</strong>s. Nessa<br />

hipótese, não se po<strong>de</strong> falar em evitar a continuação <strong>do</strong> ato, porque o ato ilícito já foi pratica<strong>do</strong> na sua totalida<strong>de</strong>, por exemplo, no<br />

caso <strong>de</strong> uma propaganda enganosa que já foi realizada e continua a gerar seus efeitos. Será o caso <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> remoção <strong>do</strong><br />

ilícito39.<br />

A exata <strong>de</strong>terminação <strong>do</strong> que seja tutela inibitória é <strong>de</strong> extrema importância para o art. 84 <strong>do</strong> CDC, porque existe uma<br />

indissolúvel relação entre a tutela específica, consagrada no dispositivo consumerista ora comenta<strong>do</strong>, e a tutela inibitória. Na<br />

realida<strong>de</strong>, a tutela inibitória é sempre tutela específica porque, ao evitar a prática <strong>do</strong> ato ilícito, mantém-se o status quo,<br />

conseguin<strong>do</strong> o <strong>de</strong>mandante a criação <strong>de</strong> uma situação que será exatamente a mesma que seria criada caso o <strong>de</strong>manda<strong>do</strong> tivesse<br />

voluntariamente <strong>de</strong>ixa<strong>do</strong> <strong>de</strong> praticar o ato ilícito. O resulta<strong>do</strong> da tutela inibitória sempre será idêntico àquele que seria cria<strong>do</strong> com o<br />

voluntário cumprimento da obrigação 40 .<br />

10.3.3.<br />

Procedimento previsto pelo art. 84 <strong>do</strong> CDC<br />

10.3.3.1.<br />

Introdução<br />

O art. 84 <strong>do</strong> CDC não cria um novo procedimento no sistema processual, apenas prevê algumas técnicas procedimentais para<br />

a efetiva tutela <strong>do</strong> titular <strong>de</strong> direito que tenha como objeto obrigações <strong>de</strong> fazer e não fazer. São, entretanto, regras <strong>de</strong> extrema<br />

relevância que merecem análise mais aprofundada. Em termos procedimentais, a efetivação da tutela segue as regras consagradas<br />

no Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

10.3.3.2.<br />

Obtenção <strong>de</strong> tutela específica ou <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> providências que assegurem o resulta<strong>do</strong> prático<br />

equivalente ao <strong>do</strong> adimplemento<br />

O art. 84, caput, prevê nas obrigações <strong>de</strong> fazer e não fazer a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o juiz conce<strong>de</strong>r a tutela específica ou <strong>de</strong>terminar<br />

providências que assegurem o resulta<strong>do</strong> prático equivalente ao <strong>do</strong> adimplemento da obrigação. Como <strong>de</strong>monstra a melhor<br />

<strong>do</strong>utrina, o texto legal faz parecer que tutela específica e resulta<strong>do</strong> equivalente são espécies diferentes <strong>de</strong> tutela jurisdicional,<br />

quan<strong>do</strong>, na realida<strong>de</strong>, a liberda<strong>de</strong> concedida ao juiz para a obtenção <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> prático equivalente é voltada justamente para a<br />

obtenção da tutela específica <strong>do</strong>s direitos materiais41.<br />

O dispositivo legal ora comenta<strong>do</strong>, portanto, não prevê duas espécies <strong>de</strong> tutela jurisdicional, mas apenas duas maneiras <strong>de</strong> se<br />

atingir a <strong>de</strong>sejada tutela específica da obrigação. Quan<strong>do</strong> menciona a tutela específica, quer dizer o acolhimento <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

autor, exatamente como formula<strong>do</strong> na petição inicial, e quan<strong>do</strong> menciona o resulta<strong>do</strong> prático equivalente ao adimplemento, apenas<br />

permite ao juiz que conceda algo que não foi expressamente pedi<strong>do</strong> pelo autor, mas que gerará no plano prático a mesma situação


que seria gerada com o acolhimento <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>.<br />

Como ensina a melhor <strong>do</strong>utrina, o dispositivo não prevê duas diferentes espécies <strong>de</strong> tutela, apenas excepciona o princípio da<br />

correlação consagra<strong>do</strong> no art. 492 <strong>do</strong> Novo CPC:<br />

“Outra importantíssima ressalva à limitação da tutela jurisdicional aos termos <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> está no art. 461, caput, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Processo Civil, que disciplina a tutela jurisdicional relativa às obrigações <strong>de</strong> fazer ou <strong>de</strong> não fazer (v. também art. 84, CDC). Esse é<br />

o significa<strong>do</strong> <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r-<strong>de</strong>ver, atribuí<strong>do</strong> ao juiz, <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminar providências que assegurem o resulta<strong>do</strong> prático equivalente ao <strong>do</strong><br />

adimplemento”42.<br />

10.3.3.3.<br />

Conversão em perdas e danos<br />

A conversão da obrigação em perdas e danos prevista no art. 84, § 1.º, CDC, nada mais é que a substituição da tutela<br />

específica pela tutela pelo equivalente em dinheiro. Segun<strong>do</strong> o dispositivo legal, existem duas causas <strong>de</strong>ssa conversão: a vonta<strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r e a impossibilida<strong>de</strong> material <strong>de</strong> satisfação da obrigação em sua forma específica.<br />

Quan<strong>do</strong> a causa <strong>de</strong> conversão da obrigação em perdas e danos for a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r, fica claro o princípio dispositivo que<br />

ainda é pre<strong>do</strong>minante no processo civil brasileiro, por mais po<strong>de</strong>res que venham sen<strong>do</strong> atribuí<strong>do</strong>s aos juízes no exercício <strong>de</strong> sua<br />

função jurisdicional. Compreen<strong>de</strong>-se que a melhor forma possível <strong>de</strong> tutela é a específica, mas essa circunstância não é o suficiente<br />

para impor ao titular <strong>do</strong> direito a obtenção <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> tutela, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong>, portanto, por qualquer razão, preferir receber o<br />

equivalente em dinheiro.<br />

Como bem lembra<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>utrina, “segun<strong>do</strong> o § 1.º <strong>do</strong> art. 461, o autor po<strong>de</strong> pleitear <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo as perdas e danos. A<br />

hipótese salvaguarda a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> autor e indica que a obtenção da tutela específica ou <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> prático equivalente (mesmo<br />

quan<strong>do</strong> possível) nem sempre é impositiva para o Magistra<strong>do</strong>”43.<br />

Apesar <strong>de</strong> o art. 84, § 1.º, <strong>do</strong> CDC expressamente mencionar o autor como titular da vonta<strong>de</strong> da conversão em perdas e danos,<br />

que só existirá quan<strong>do</strong> já houver processo em trâmite, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça já teve oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> admitir a conversão<br />

mesmo antes da propositura da ação:<br />

“Processo civil. Dação <strong>de</strong> imóveis em pagamento <strong>de</strong> dívida contraída. Obrigação <strong>de</strong> fazer, e não <strong>de</strong> dar coisa certa. Conversão, por<br />

opção <strong>do</strong> autor, em perdas e danos. Possibilida<strong>de</strong>. Inteligência <strong>do</strong> arts. 880 e 881 <strong>do</strong> CC/1916, e 461, § 1.º, <strong>do</strong> CPC. A obrigação,<br />

assumida pela construtora <strong>de</strong> um empreendimento imobiliário, <strong>de</strong> remunerar a proprietária <strong>do</strong> terreno mediante a dação em<br />

pagamento <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s i<strong>de</strong>ais com área correspon<strong>de</strong>nte a 25% <strong>do</strong> total construí<strong>do</strong> qualifica-se como obrigação <strong>de</strong> fazer, e não como<br />

obrigação <strong>de</strong> dar coisa certa. Como consequência, o inadimplemento <strong>de</strong>ssa obrigação, representa<strong>do</strong> pelo acréscimo <strong>de</strong> área ao<br />

imóvel sem o conhecimento da proprietária e, consequentemente, sem que lhe tenha si<strong>do</strong> feito o correspon<strong>de</strong>nte pagamento, dá<br />

lugar à incidência <strong>do</strong>s arts. 461, § 1.º, <strong>do</strong> CPC, e 880 e 881, <strong>do</strong> CC/1916, possibilitan<strong>do</strong> a escolha, pelo cre<strong>do</strong>r, entre requerer o<br />

adimplemento específico da obrigação ou a respectiva conversão em perdas e danos. A quitação, dada pelo cre<strong>do</strong>r mediante<br />

escritura pública, da obrigação <strong>de</strong> dação em pagamento <strong>de</strong> 25% da área construída no imóvel, não po<strong>de</strong> abranger os acréscimos <strong>de</strong><br />

áreas feitos posteriormente sem o conhecimento <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r. A interpretação da quitação, dada pelo Tribunal <strong>de</strong> origem, não po<strong>de</strong> ser<br />

revista nesta se<strong>de</strong> em função <strong>do</strong> que <strong>de</strong>termina a Súmula 5/STJ. O pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> ‘<strong>de</strong>claração da reformulação <strong>do</strong> projeto inicial’ <strong>de</strong> um<br />

edifício é <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> fato, e não <strong>de</strong> relação jurídica, <strong>de</strong> forma que o seu não acolhimento encontra-se em consonância com a regra<br />

<strong>do</strong> art. 4.º <strong>do</strong> CPC. A formulação <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> sucessivo <strong>de</strong>ve ser levada em consi<strong>de</strong>ração no momento da fixação <strong>do</strong>s honorários<br />

advocatícios. Recurso especial da ré não conheci<strong>do</strong>, e recurso especial <strong>do</strong> autor provi<strong>do</strong> para o fim <strong>de</strong> restabelecer a sentença no que<br />

diz respeito aos honorários advocatícios” (STJ – REsp 598.233/RS – Terceira Turma – Rel. Min. Antônio <strong>de</strong> Pádua Ribeiro – Rel.<br />

para o acórdão Min. Nancy Andrighi – j. 02.08.2005 – DJ 29.08.2005, p. 332).<br />

Já haven<strong>do</strong> processo em trâmite, a preferência <strong>do</strong> autor pela obtenção <strong>de</strong> tutela pelo equivalente em dinheiro po<strong>de</strong> se expressar<br />

tanto durante a fase <strong>de</strong> conhecimento como na fase/processo <strong>de</strong> execução. No primeiro caso, será admitida a eventual adaptação da<br />

causa <strong>de</strong> pedir, excepcionan<strong>do</strong>-se até mesmo o rigor da regra prevista no art. 329 <strong>do</strong> Novo CPC. No segun<strong>do</strong> caso, bastará a<br />

realização <strong>de</strong> uma liquidação inci<strong>de</strong>ntal para a <strong>de</strong>terminação <strong>do</strong> valor <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>, seguin<strong>do</strong>-se a partir <strong>de</strong>sse momento o procedimento<br />

da execução por quantia certa44.<br />

Como segunda causa para a conversão da obrigação em perdas e danos, o art. 84, § 1.º <strong>do</strong> CDC, prevê a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

cumprimento da obrigação. Nas obrigações <strong>de</strong> fazer e <strong>de</strong> não fazer, o essencial é verificar a natureza <strong>do</strong> inadimplemento. Sen<strong>do</strong> o<br />

inadimplemento <strong>de</strong>finitivo, o que significa dizer que não existe mais a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cumprimento da obrigação, a única tutela<br />

jurisdicional possível será a tutela pelo equivalente em dinheiro. Caso ainda exista a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cumprimento, quan<strong>do</strong> haverá<br />

somente um retardamento no cumprimento da prestação, a tutela po<strong>de</strong>rá ser prestada <strong>de</strong> forma específica, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que esse ainda seja<br />

o interesse <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r.<br />

Em caso <strong>de</strong> inviabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> cumprimento específico da obrigação, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça corretamente enten<strong>de</strong> que<br />

restam prejudicadas as astreintes fixadas para pressionar psicologicamente a parte a cumprir a obrigação 45 . Afinal, se o


cumprimento não é possível, a multa <strong>de</strong>ixaria <strong>de</strong> ser cominatória e passaria a ser sancionatória, em modificação <strong>de</strong> natureza não<br />

albergada pelo sistema processual pátrio.<br />

A impossibilida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> surgir antes da propositura da ação, <strong>de</strong> forma que o cre<strong>do</strong>r já ingresse com processo que tenha como<br />

objeto uma obrigação <strong>de</strong> pagar quantia certa, inclusive execução com base em título executivo que tenha como objeto obrigação <strong>de</strong><br />

fazer ou <strong>de</strong> não fazer 46 . A impossibilida<strong>de</strong> também po<strong>de</strong>rá ser consequência <strong>de</strong> fato ou ato ocorri<strong>do</strong> durante o trâmite<br />

procedimental, tanto na fase <strong>de</strong> conhecimento como na <strong>de</strong> execução. A respeito <strong>do</strong> tema, as corretas lições <strong>de</strong> Cássio Scarpinella<br />

Bueno, que, apesar <strong>de</strong> terem como objeto o art. 461 <strong>do</strong> CPC/1973, em tema trata<strong>do</strong> no art. 497 <strong>do</strong> Novo CPC, são totalmente<br />

aplicáveis ao art. 84 <strong>do</strong> CDC:<br />

“É possível ao autor pedir as perdas e danos no lugar da tutela específica da obrigação <strong>de</strong> fazer ou não fazer ou cumular os pedi<strong>do</strong>s<br />

nos mol<strong>de</strong>s <strong>do</strong> art. 289 (cumulação eventual) no caso <strong>de</strong>, supervenientemente à propositura da ação, o específico comportamento já<br />

não ser mais passível <strong>de</strong> obtenção. Mesmo sem pedi<strong>do</strong> na inicial, a con<strong>de</strong>nação em perdas e danos não é extra petita se, durante a<br />

ação, tornar-se impossível a obrigação pleiteada. Prevalecem, para a hipótese, as regras <strong>do</strong>s arts. 633 e 643, parágrafo único, bem<br />

assim o art. 462”47.<br />

Registre-se, por fim, a existência <strong>de</strong> corrente <strong>do</strong>utrinária que aponta para uma terceira causa para a conversão em perdas e<br />

danos, além das duas consagradas no texto legal. Para essa parcela da <strong>do</strong>utrina, ainda que possível, a tutela específica po<strong>de</strong> ser<br />

excluída quan<strong>do</strong> não for justificável ou racional em razão <strong>de</strong> sua excessiva onerosida<strong>de</strong> 48 . Nesse caso, ainda que a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> autor<br />

seja a obtenção da tutela específica, o juiz po<strong>de</strong>rá converter a obrigação em perdas e danos. Há <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça nesse senti<strong>do</strong>:<br />

Recurso especial. Contrato <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> revistas. Obrigação <strong>de</strong> fazer. Comprovação, pela editora-ré, da inviabilida<strong>de</strong><br />

econômica <strong>do</strong> cumprimento da obrigação, em razão <strong>de</strong> onerosida<strong>de</strong> excessiva. Art. 333, inciso II, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

Necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> incursão no conjunto fático-probatório. Impossibilida<strong>de</strong>, na presente via recursal. Óbice <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 7 da<br />

Súmula/STJ. Impossibilida<strong>de</strong> da concessão <strong>de</strong> tutela específica e da obtenção <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> prático equivalente. Conversão da<br />

obrigação em perdas e danos. Possibilida<strong>de</strong>, inclusive <strong>de</strong> ofício. Aplicação <strong>do</strong> direito à espécie. Possibilida<strong>de</strong>, in casu. Recurso<br />

especial parcialmente provi<strong>do</strong>.<br />

I – A alteração das conclusões <strong>do</strong> acórdão recorri<strong>do</strong> no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a Editora recorrida teria comprova<strong>do</strong> suficientemente<br />

nos autos a impossibilida<strong>de</strong> econômica <strong>de</strong> continuar a cumprir a obrigação <strong>de</strong> fazer, implicaria o reexame <strong>do</strong> conjunto fáticoprobatório<br />

(Súmula 7/STJ);<br />

II – In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> a impossibilida<strong>de</strong> ser jurídica ou econômica, o cumprimento específico da obrigação pela<br />

recorrida, no caso concreto, <strong>de</strong>mandaria uma onerosida<strong>de</strong> excessiva e <strong>de</strong>sproporcional, razão pela qual não se po<strong>de</strong> impor o<br />

comportamento que exige o ressarcimento na forma específica quan<strong>do</strong> o seu custo não justifica a opção por esta modalida<strong>de</strong><br />

ressarcimento;<br />

III – É lícito ao julga<strong>do</strong>r valer-se das disposições da segunda parte <strong>do</strong> § 1.º <strong>do</strong> art. 461 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil para<br />

<strong>de</strong>terminar, inclusive <strong>de</strong> ofício, a conversão da obrigação <strong>de</strong> dar, fazer ou não fazer, em obrigação pecuniária (o que inclui o<br />

pagamento <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por perdas e danos) na parte em que aquela não possa ser executada;<br />

IV – Na espécie, a aplicação <strong>do</strong> direito à espécie por esta Corte Superior, nos termos <strong>do</strong> art. 257 <strong>do</strong> Regimento Interno <strong>do</strong><br />

Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, afigura-se possível, ten<strong>do</strong> em conta os princípios da celerida<strong>de</strong> processual e da efetivida<strong>de</strong> da<br />

jurisdição;<br />

V – Recurso especial parcialmente provi<strong>do</strong> (STJ – REsp 1.055.822/RJ – Terceira Turma – Rel. Min. Massami Uyeda – j.<br />

24.05.2011 – DJe 26.10.2010).<br />

10.3.3.4.<br />

Tutela <strong>de</strong> urgência<br />

A <strong>do</strong>utrina majoritária divi<strong>de</strong> a tutela <strong>de</strong> urgência em duas espécies: tutela cautelar e tutela antecipada, sen<strong>do</strong> também essa a<br />

opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r. Na realida<strong>de</strong>, no âmbito da tutela <strong>de</strong> urgência, também é necessário <strong>de</strong>stacar a importância da liminar, termo<br />

equivoca<strong>do</strong> que po<strong>de</strong> ser utiliza<strong>do</strong> como espécie <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> urgência satisfativa ou para <strong>de</strong>signar o momento <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong> uma<br />

espécie <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> urgência.<br />

Valen<strong>do</strong>-se da origem no latim (liminaris, <strong>de</strong> limen), o termo “liminar” po<strong>de</strong> ser utiliza<strong>do</strong> para <strong>de</strong>signar algo que se faça<br />

inicialmente, logo no início. O termo liminar, nesse senti<strong>do</strong>, significa limiar, soleira, entrada, sen<strong>do</strong> aplica<strong>do</strong> a atos pratica<strong>do</strong>s<br />

inaudita altera parte, ou seja, antes da citação <strong>do</strong> <strong>de</strong>manda<strong>do</strong>. Aplica<strong>do</strong> às espécies <strong>de</strong> tutelas <strong>de</strong> urgência, a liminar, nesse senti<strong>do</strong>,<br />

significa a concessão <strong>de</strong> uma tutela antecipada ou <strong>de</strong> uma tutela cautelar antes da citação <strong>do</strong> <strong>de</strong>manda<strong>do</strong>. A liminar assumiria,<br />

portanto, uma característica meramente topológica, levan<strong>do</strong>-se em conta somente o momento <strong>de</strong> prolação da tutela <strong>de</strong> urgência, e


não o seu conteú<strong>do</strong>, função ou natureza49.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, é preciso reconhecer que, no momento anterior à a<strong>do</strong>ção da tutela antecipada pelo nosso sistema processual, as<br />

liminares eram consi<strong>de</strong>radas uma espécie <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> urgência, sen<strong>do</strong> a única forma prevista em lei para a obtenção <strong>de</strong> uma tutela<br />

<strong>de</strong> urgência satisfativa. Nesses termos, sempre que prevista expressamente em um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> procedimento, o termo “liminar”<br />

assume a condição <strong>de</strong> espécie <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> urgência satisfativa específica50. Seriam, assim, três as espécies <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> urgência:<br />

(a)<br />

(b)<br />

(c)<br />

tutela cautelar, genérica para assegurar a utilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> final;<br />

tutela antecipada, genérica para satisfazer faticamente o direito;<br />

tutela liminar, específica para satisfazer faticamente o direito.<br />

Em feliz expressão <strong>do</strong>utrinária, a tutela antecipada é a generalização das liminares 51 . Preten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a parte obter uma tutela <strong>de</strong><br />

urgência satisfativa e haven<strong>do</strong> uma expressa previsão <strong>de</strong> liminar no procedimento a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong>, o correto é requerer a concessão <strong>de</strong>ssa<br />

liminar, inclusive <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> os requisitos específicos para a sua concessão; não haven<strong>do</strong> tal previsão, a parte valer-se-á da<br />

tutela antecipada, que em razão <strong>de</strong> sua generalida<strong>de</strong> e amplitu<strong>de</strong> não fica condicionada a <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s procedimentos. Em resumo:<br />

caberá tutela antecipada quan<strong>do</strong> não houver previsão <strong>de</strong> liminar.<br />

Como afirma<strong>do</strong>, sempre que exista a expressa previsão <strong>de</strong> liminar num <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> procedimento, estar-se-á diante <strong>de</strong> uma<br />

espécie <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> urgência satisfativa. Parece ser exatamente o que ocorre no art. 84, § 3.º, <strong>do</strong> CDC, que ao prever a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> concessão da tutela liminarmente ou após a realização <strong>de</strong> audiência <strong>de</strong> justificação prévia, dá a enten<strong>de</strong>r tratar-se<br />

<strong>de</strong> espécie <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> urgência específica das obrigações <strong>de</strong> fazer e não fazer no âmbito <strong>do</strong> direito consumerista.<br />

A <strong>de</strong>finição a respeito da natureza jurídica da liminar prevista no art. 84, § 3.º <strong>do</strong> CDC tinha gran<strong>de</strong> relevância à luz <strong>do</strong><br />

revoga<strong>do</strong> Código <strong>de</strong> processo Civil, porque enquanto o dispositivo consumerista exigia a relevância <strong>do</strong> fundamento da <strong>de</strong>manda<br />

para a concessão da tutela <strong>de</strong> urgência satisfativa, o art. 273, caput, <strong>do</strong> CPC/1973 exigia a prova inequívoca da verossimilhança da<br />

alegação.<br />

Significava dizer que, para a concessão <strong>de</strong> tutela antecipada no sistema processual anterior, além <strong>de</strong> a alegação parecer<br />

verda<strong>de</strong>ira, <strong>de</strong>veria existir uma prova forte suficiente para confirmar, ao menos na cognição sumária a ser realizada pelo juiz, que<br />

aquela alegação fática parecesse ser realmente verda<strong>de</strong>ira52. É evi<strong>de</strong>nte que aquilo que parece ser verda<strong>de</strong>iro, mesmo que<br />

corrobora<strong>do</strong> por uma prova, po<strong>de</strong>rá se mostrar falso conforme a cognição <strong>do</strong> juiz se aprofundar no caso concreto. De qualquer<br />

forma, a existência <strong>de</strong> prova a corroborar a alegação <strong>de</strong> fato que por si só já parece ser verda<strong>de</strong>ira gera uma gran<strong>de</strong> probabilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> a alegação realmente ser verda<strong>de</strong>ira, o que já era suficiente para a concessão da tutela antecipada.<br />

A relevância da fundamentação da <strong>de</strong>manda prevista no art. 84, § 3.º <strong>do</strong> CDC não <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> nenhuma prova formalmente<br />

perfeita que corrobore a alegação <strong>do</strong> autor, bastan<strong>do</strong> que suas alegações, ainda que <strong>de</strong>sprovidas <strong>de</strong> provas, convençam o juiz da<br />

probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua vitória judicial. Essa tendência parece ter inspira<strong>do</strong> o legisla<strong>do</strong>r no tocante aos requisitos para a concessão da<br />

tutela <strong>de</strong> urgência no Novo CPC.<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 300, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, tanto para a tutela cautelar como para a tutela antecipada exige-se o convencimento<br />

<strong>do</strong> juiz da existência <strong>de</strong> elementos que evi<strong>de</strong>nciem a probabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> direito. A norma encerra qualquer dúvida a respeito <strong>do</strong> tema,<br />

sen<strong>do</strong> a mesma probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o direito existir suficiente para a concessão <strong>de</strong> tutela cautelar e <strong>de</strong> tutela antecipada.<br />

O legisla<strong>do</strong>r não especificou que elementos são esses capazes <strong>de</strong> convencer o juiz, ainda que mediante uma cognição sumária,<br />

a conce<strong>de</strong>r a tutela <strong>de</strong> urgência pretendida. É natural que o convencimento <strong>do</strong> juiz para a concessão da tutela <strong>de</strong> urgência passa<br />

pela parte fática da <strong>de</strong>manda, já que o juiz só aplicará o direito ao caso concreto em favor da parte se estiver convenci<strong>do</strong>, ainda que<br />

em um juízo <strong>de</strong> probabilida<strong>de</strong>, da veracida<strong>de</strong> das alegações <strong>de</strong> fato da parte. E nesse ponto questiona-se: esse convencimento<br />

sumário <strong>do</strong> juiz da parte fática da pretensão é <strong>de</strong>riva<strong>do</strong> apenas <strong>de</strong> alegação verossímil da parte, ou cabe a ela a produção <strong>de</strong> alguma<br />

espécie <strong>de</strong> prova para corroborar sua alegação?<br />

A redação <strong>do</strong> art. 300, caput, <strong>do</strong> Novo CPC aparentemente dá gran<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r ao juiz para <strong>de</strong>cidir a respeito <strong>do</strong> convencimento<br />

ora analisa<strong>do</strong>. Ao não exigir nada além <strong>de</strong> elementos que evi<strong>de</strong>nciem a probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o direito existir, o legisla<strong>do</strong>r permite que<br />

o juiz <strong>de</strong>cida, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o faça justificadamente, que se convenceu em razão <strong>de</strong> elementos meramente argumentativos da parte,<br />

sem a necessida<strong>de</strong>, portanto, <strong>de</strong> provas que corroborem tais alegações53. É natural que, nesse caso, as alegações <strong>de</strong> fato sejam<br />

verossímeis, ou seja, que sejam aparentemente verda<strong>de</strong>iras em razão das máximas <strong>de</strong> experiência (o que costuma ocorrer em<br />

situações similares).<br />

Quanto aos requisitos que na vigência <strong>do</strong> CPC/1973 eram para a tutela antecipada o funda<strong>do</strong> receio <strong>de</strong> dano irreparável ou <strong>de</strong><br />

difícil reparação e para a tutela cautelar o periculum in mora, sempre se enten<strong>de</strong>u que, apesar das diferenças nas nomenclaturas,<br />

periculum in mora e funda<strong>do</strong> receio <strong>de</strong> dano representavam exatamente o mesmo fenômeno: o tempo necessário para a concessão<br />

da tutela <strong>de</strong>finitiva funcionan<strong>do</strong> como inimigo da efetivida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa tutela.


No art. 300, caput, <strong>do</strong> Novo CPC é confirma<strong>do</strong> esse entendimento com a unificação <strong>do</strong> requisito como perigo <strong>de</strong> dano ou o<br />

risco ao resulta<strong>do</strong> útil <strong>do</strong> processo.<br />

Numa primeira leitura, po<strong>de</strong>-se concluir que o perigo <strong>de</strong> dano se mostraria mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> à tutela antecipada, enquanto o<br />

risco ao resulta<strong>do</strong> útil <strong>do</strong> processo, à tutela cautelar. A distinção, entretanto, não <strong>de</strong>ve ser prestigiada, porque nos <strong>do</strong>is casos o<br />

fundamento será o mesmo: a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> espera da concessão da tutela <strong>de</strong>finitiva sob pena <strong>de</strong> grave prejuízo ao direito a ser<br />

tutela<strong>do</strong> e <strong>de</strong> tornar-se o resulta<strong>do</strong> final inútil em razão <strong>do</strong> tempo.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, o Enuncia<strong>do</strong> 143 <strong>do</strong> Fórum Permanente <strong>de</strong> Processualistas Civis (FPPC): “A redação <strong>do</strong> art. 300, caput,<br />

superou a distinção entre os requisitos da concessão para a tutela cautelar e para a tutela satisfativa <strong>de</strong> urgência, erigin<strong>do</strong> a<br />

probabilida<strong>de</strong> e o perigo na <strong>de</strong>mora a requisitos comuns para a prestação <strong>de</strong> ambas as tutelas <strong>de</strong> forma antecipada”.<br />

Em outras palavras, tanto na tutela cautelar quanto na tutela antecipada <strong>de</strong> urgência, caberá à parte convencer o juiz <strong>de</strong> que,<br />

não sen<strong>do</strong> protegida imediatamente, <strong>de</strong> nada adiantará uma proteção futura, em razão <strong>do</strong> perecimento <strong>de</strong> seu direito 54 .<br />

10.3.3.5.<br />

Tutela da evidência<br />

10.3.3.5.1.<br />

Introdução<br />

A tutela da evidência, como espécie <strong>de</strong> tutela provisória diferente da tutela <strong>de</strong> urgência, recebeu um capítulo próprio no Novo<br />

Código <strong>de</strong> Processo Civil, ainda que conten<strong>do</strong> apenas um artigo, diferente da realida<strong>de</strong> presente no CPC/1973, em que essa espécie<br />

<strong>de</strong> tutela estava espalhada pelo diploma legal. A iniciativa <strong>de</strong>ve ser elogiada, principalmente por afastar expressamente a tutela da<br />

evidência da tutela <strong>de</strong> urgência, mas sua concretização <strong>de</strong>ve ser, ainda que parcialmente, criticada.<br />

O art. 311, caput, <strong>do</strong> Novo CPC consagra expressamente o entendimento <strong>de</strong> que tutela <strong>de</strong> evidência in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da<br />

<strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> perigo da <strong>de</strong>mora da prestação da tutela jurisdicional, em diferenciação clara e indiscutível com a tutela <strong>de</strong><br />

urgência.<br />

Já que o legisla<strong>do</strong>r criou um artigo para prever as hipóteses <strong>de</strong> tutela da evidência, <strong>de</strong>veria ter ti<strong>do</strong> o cuida<strong>do</strong> <strong>de</strong> fazer uma<br />

enumeração mais ampla, ainda que limitada a situações previstas no Código <strong>de</strong> Processo Civil. Afinal, a liminar da ação<br />

possessória, mantida no Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil, continua a ser espécie <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> evidência, bem como a concessão <strong>do</strong><br />

manda<strong>do</strong> monitório e da liminar nos embargos <strong>de</strong> terceiro, e nenhuma <strong>de</strong>las está prevista no art. 311 <strong>do</strong> Novo CPC. A única<br />

conclusão possível é que o rol <strong>de</strong> tal dispositivo legal é exemplificativo.<br />

Apesar <strong>do</strong> eloquente silêncio <strong>do</strong> diploma consumerista a respeito da tutela da evidência, não resta qualquer dúvida <strong>de</strong> sua<br />

aplicação nos processos que tenham como objeto relação jurídica <strong>de</strong> consumo. Trata-se, inclusive, <strong>de</strong> importante mecanismo <strong>de</strong><br />

tutela <strong>de</strong> urgência satisfativa à disposição <strong>do</strong> autor <strong>de</strong> tais <strong>de</strong>mandas.<br />

10.3.3.5.2.<br />

Hipóteses <strong>de</strong> cabimento<br />

10.3.3.5.2.1.<br />

Abuso <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa ou manifesto propósito protelatório <strong>do</strong> réu<br />

Aparentemente, o inciso I <strong>do</strong> art. 311, Novo CPC, apenas realocou uma hipótese <strong>de</strong> tutela da evidência que, no CPC/1973,<br />

estava prevista como tutela antecipada (<strong>de</strong> urgência, portanto). Contu<strong>do</strong>, não foi bem isso que ocorreu, ao menos não <strong>de</strong> forma<br />

expressa. A tutela prevista equivocadamente no art. 273, § 6.º, <strong>do</strong> CPC/1973 resultava da combinação <strong>do</strong>s requisitos previstos no<br />

caput e inciso II <strong>do</strong> dispositivo, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que não bastava que ficasse caracteriza<strong>do</strong> o abuso <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa ou o manifesto<br />

propósito protelatório da parte, sen<strong>do</strong> também exigida a prova inequívoca da verossimilhança da alegação. Era, portanto, a<br />

probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o autor ter o direito alega<strong>do</strong> somada à resistência injustificada <strong>do</strong> réu que justificava a concessão <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong><br />

tutela provisória.<br />

Da forma como ficou redigi<strong>do</strong> o art. 311, I, <strong>do</strong> Novo CPC, restou como requisito para a concessão da tutela da evidência<br />

somente o abuso <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa ou o manifesto propósito protelatório da parte, o que parece contrariar até mesmo o espírito<br />

<strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> tutela. Difícil acreditar que o autor tenha direito a uma tutela, ainda que provisória, somente porque o réu se<br />

comporta in<strong>de</strong>vidamente no processo, sem que o juiz tenha qualquer grau <strong>de</strong> convencimento da existência <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> autor.<br />

Parece-me extremamente temerário, como simples forma <strong>de</strong> sanção processual, conce<strong>de</strong>r a tutela da evidência sem que haja<br />

probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o autor ter o direito que alega.<br />

Enten<strong>do</strong> que, nesse caso, a probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o direito existir é necessária55, mas não está tipificada na lei, como ocorre com as<br />

outras três hipóteses <strong>de</strong> cabimento da tutela da evidência, previstas no art. 311 <strong>do</strong> Novo CPC. Significa dizer que nessa hipótese <strong>de</strong><br />

cabimento da tutela da evidência o juiz <strong>de</strong>ve se valer, por analogia, <strong>do</strong> art. 300, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, conce<strong>de</strong>n<strong>do</strong> tal espécie <strong>de</strong><br />

tutela apenas se houver nos autos elementos que evi<strong>de</strong>nciem a probabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> direito e serem preenchi<strong>do</strong>s os requisitos previstos


em lei.<br />

Partin<strong>do</strong>-se <strong>do</strong> pressuposto <strong>de</strong> que a lei não contém palavras inúteis, é preciso distinguir as duas expressões contidas no art.<br />

311, I, <strong>do</strong> Novo CPC, que apesar <strong>de</strong> próximas <strong>de</strong>signam fenômenos processuais distintos.<br />

Para parcela <strong>do</strong>utrinária, o manifesto propósito protelatório é mais amplo que o abuso <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa 56 , mas<br />

aparentemente não se trata propriamente <strong>de</strong> diferença resultante da extensão das condutas. A forma mais a<strong>de</strong>quada <strong>de</strong> interpretar o<br />

dispositivo legal é consi<strong>de</strong>rar que o abuso <strong>de</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa representa atos protelatórios pratica<strong>do</strong>s no processo, enquanto no<br />

manifesto propósito protelatório <strong>do</strong> réu há um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> comportamento – atos ou omissões – fora <strong>do</strong> processo, com ele<br />

relaciona<strong>do</strong>s57.<br />

Há pelo menos duas interpretações possíveis ao termo “<strong>de</strong>fesa” utiliza<strong>do</strong> no art. 311, I, <strong>do</strong> Novo CPC. Numa interpretação<br />

ampliativa, po<strong>de</strong>-se enten<strong>de</strong>r qualquer ato que busque a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses da parte; e, numa interpretação mais restritiva, o<br />

termo po<strong>de</strong> ser entendi<strong>do</strong> exclusivamente como contestação 58 .<br />

Não parece legítimo o entendimento restritivo, evi<strong>de</strong>ncian<strong>do</strong>-se que o abuso <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa po<strong>de</strong>rá se manifestar em<br />

outros atos processuais que não a contestação, o que inclusive po<strong>de</strong>rá se notar em outras espécies <strong>de</strong> resposta <strong>do</strong> réu, como as<br />

exceções rituais, que, por gerarem a suspensão <strong>do</strong> procedimento principal, po<strong>de</strong>rão ser utilizadas <strong>de</strong> forma abusiva. Mas nem só<br />

nesse momento inicial <strong>do</strong> processo será possível <strong>de</strong>tectar o abuso <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa, até porque o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa não é algo que<br />

se exaure após a apresentação <strong>de</strong> resposta <strong>do</strong> réu. Como o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa existe durante to<strong>do</strong> o processo, é evi<strong>de</strong>nte que o abuso<br />

em seu exercício possa ocorrer durante to<strong>do</strong> o trâmite procedimental.<br />

A maioria <strong>do</strong>s atos tipifica<strong>do</strong>s como <strong>de</strong> litigância <strong>de</strong> má-fé pelo art. 80 <strong>do</strong> Novo CPC também po<strong>de</strong>rão configurar o abuso <strong>do</strong><br />

direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa exigi<strong>do</strong> pela tutela antecipada sancionatória. Nesses casos, inclusive, é ainda mais fácil a tipificação <strong>do</strong> ato<br />

pratica<strong>do</strong> pela parte, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se sua expressa previsão legal. Ocorre, entretanto, que seria empobrecer em <strong>de</strong>masia o alcance<br />

da norma legal a vinculação <strong>do</strong> instituto <strong>de</strong> forma absoluta aos atos <strong>de</strong> litigância <strong>de</strong> má-fé 59 .<br />

O que se preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar é que existem atos que não são tipifica<strong>do</strong>s como <strong>de</strong> litigância <strong>de</strong> má-fé, mas ainda assim<br />

po<strong>de</strong>rão se enquadrar no abuso <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa, como também o contrário será possível 60 .<br />

Costuma-se dizer que a mente criminosa ou <strong>de</strong> má-fé é muito criativa, <strong>de</strong> forma que seria impossível indicar todas as<br />

manobras realizáveis durante o procedimento em níti<strong>do</strong> abuso <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa da parte. Além <strong>de</strong> sempre existir uma manobra<br />

nova a se verificar no caso concreto, melhor nem <strong>de</strong>screver as já conhecidas para que algum patrono não se entusiasme com suas<br />

novas <strong>de</strong>scobertas.<br />

Seguin<strong>do</strong> a concepção a<strong>do</strong>tada, com o objetivo <strong>de</strong> diferenciar o ato pratica<strong>do</strong> em abuso <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> ato pratica<strong>do</strong><br />

com manifesto propósito protelatório, é correto afirmar que, nessa segunda hipótese, os atos são pratica<strong>do</strong>s fora <strong>do</strong> processo,<br />

evi<strong>de</strong>ntemente geran<strong>do</strong> consequências processuais. A redação <strong>do</strong> dispositivo legal nesse tocante não foi feliz, porque o mero<br />

propósito não é suficiente para ensejar a antecipação <strong>de</strong> tutela, sen<strong>do</strong> necessário que o ato pratica<strong>do</strong> efetivamente tenha protela<strong>do</strong> a<br />

entrega da prestação jurisdicional. Ainda que o objetivo <strong>do</strong> réu tenha si<strong>do</strong> tornar mais moroso o trâmite processual, se não<br />

conseguiu, no caso concreto, atingir efetivamente tal objetivo, não haverá nenhum prejuízo ao andamento <strong>do</strong> processo. Po<strong>de</strong>rá até<br />

mesmo ser puni<strong>do</strong> por ato <strong>de</strong> litigância <strong>de</strong> má-fé (art. 80 <strong>do</strong> Novo CPC), atentatório à dignida<strong>de</strong> da justiça (arts. 77, IV e VI, e<br />

774, ambos <strong>do</strong> Novo CPC), mas não haverá razão para antecipar a tutela como forma <strong>de</strong> sancionar o réu61.<br />

Mais uma vez, é gran<strong>de</strong> o número <strong>de</strong> atos pratica<strong>do</strong>s fora <strong>do</strong> processo que têm como objetivo atrasar o andamento<br />

procedimental, e, mais uma vez, <strong>de</strong>ixa-se <strong>de</strong> indicar uma relação <strong>de</strong> tais atos por duas razões já expostas: ser sempre meramente<br />

exemplificativa qualquer relação que se imagine a respeito <strong>de</strong> tais atos e <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> trazer ao conhecimento <strong>de</strong> patronos e partes<br />

menos preocupadas com a boa-fé e a lealda<strong>de</strong> processual práticas escusas até então <strong>de</strong>sconhecidas.<br />

Ainda que tenhamos opinião <strong>do</strong>utrinária no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que esses atos protelatórios possam ocorrer até mesmo antes da<br />

propositura da ação 62 , o parágrafo único <strong>do</strong> art. 311 <strong>do</strong> Novo CPC é expresso ao excluir tal hipótese <strong>de</strong> tutela da evidência da<br />

concessão liminar, <strong>de</strong> forma a ser impossível sua concessão antes da citação <strong>do</strong> réu e, por consequência óbvia, é impossível a<br />

configuração <strong>do</strong>s requisitos legais antes <strong>do</strong> processo.<br />

10.3.3.5.2.2.<br />

Fato provável e tese jurídica pacificada nos tribunais superiores<br />

O inciso II <strong>do</strong> art. 311 <strong>do</strong> Novo CPC, cria uma nova hipótese <strong>de</strong> tutela da evidência, inexistente no sistema <strong>do</strong> CPC/1973: “as<br />

alegações <strong>de</strong> fato pu<strong>de</strong>rem ser comprovadas apenas <strong>do</strong>cumentalmente e houver tese firmada em julgamento <strong>de</strong> casos repetitivos<br />

[sem a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trânsito em julga<strong>do</strong>63] ou em súmula vinculante”. Fica nessa segunda hipótese evi<strong>de</strong>nciada a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> existência <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> autor, elemento essencial da tutela <strong>de</strong> evidência. O legisla<strong>do</strong>r tomou o cuida<strong>do</strong> <strong>de</strong> exigir<br />

essa probabilida<strong>de</strong> tanto no aspecto fático como no jurídico, <strong>de</strong>mandan<strong>do</strong> prova <strong>do</strong>cumental para comprovar os fatos alega<strong>do</strong>s e


tese jurídica já firmada em julgamento <strong>de</strong> casos repetitivos ou em súmula vinculante.<br />

A prova <strong>do</strong>cumental – ou <strong>do</strong>cumentada – exigida pelo dispositivo legal ora analisa<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve ser idônea, ou seja, <strong>de</strong>ve ser<br />

formalmente confiável e ter conteú<strong>do</strong> que corrobore as alegações <strong>do</strong> autor, sen<strong>do</strong> apta, prima facie, a atestar a viabilida<strong>de</strong> da<br />

pretensão 64 .<br />

É verda<strong>de</strong> que o legisla<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>ria ter si<strong>do</strong> mais incisivo na abrangência <strong>do</strong> dispositivo, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> também as súmulas<br />

persuasivas e a jurisprudência <strong>do</strong>minante, ainda que somente <strong>do</strong>s tribunais superiores, como ocorre no julgamento liminar <strong>de</strong><br />

improcedência (art. 332, I, <strong>do</strong> Novo CPC). Já há, inclusive, entendimento que amplia a aplicação <strong>do</strong> dispositivo para súmulas sem<br />

caráter vinculante 65 . Ou ainda se valen<strong>do</strong> da mesma técnica utilizada para prever outra hipótese <strong>de</strong> julgamento liminar <strong>de</strong><br />

improcedência, com fundamento em súmula <strong>de</strong> tribunal <strong>de</strong> justiça sobre direito local (art. 332, IV, Novo CPC). Afinal, se para<br />

conce<strong>de</strong>r tutela <strong>de</strong>finitiva liminarmente, basta súmula persuasiva <strong>de</strong> tribunal superior, é contraditório exigir para a concessão <strong>de</strong><br />

tutela provisória uma tese consagrada em súmula vinculante.<br />

Já se propõe uma interpretação extensiva <strong>do</strong> dispositivo legal para permitir a concessão <strong>de</strong> tutela da evidência sempre que a<br />

fundamentação jurídica <strong>do</strong> autor estiver fundada em prece<strong>de</strong>nte vinculante, ainda que não previsto expressamente no art. 311, II,<br />

<strong>do</strong> Novo CPC66.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> os fatos alega<strong>do</strong>s pelo autor prova<strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentalmente, salvo na hipótese <strong>de</strong> o réu alegar <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong><br />

mérito indireta, com fato modificativo, extintivo ou impeditivo <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> autor, que <strong>de</strong>man<strong>de</strong> produção <strong>de</strong> prova oral ou<br />

pericial, essa hipótese <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> evidência só terá senti<strong>do</strong> se for concedida liminarmente, porque após a citação e <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> réu<br />

será caso <strong>de</strong> julgamento antecipa<strong>do</strong> da li<strong>de</strong>.<br />

A hipótese prevista no dispositivo legal ora comenta<strong>do</strong> não é suficiente para a concessão <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong>finitiva, porque as<br />

alegações <strong>de</strong> fato po<strong>de</strong>m se mostrar falsas no encerramento da instrução probatória e o réu po<strong>de</strong>rá se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r juridicamente<br />

alegan<strong>do</strong> a distinção <strong>do</strong> caso em análise da tese jurídica já firmada em julgamento <strong>de</strong> casos repetitivos ou em súmula vinculante<br />

(distinguish).<br />

10.3.3.5.2.3<br />

Prova <strong>do</strong>cumental em ação reipersecutória<br />

A terceira hipótese <strong>de</strong> tutela da evidência vem prevista no inciso III <strong>do</strong> art. 311 <strong>do</strong> Novo CPC: quan<strong>do</strong> “se tratar <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong><br />

reipersecutório funda<strong>do</strong> em prova <strong>do</strong>cumental a<strong>de</strong>quada <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito, caso em que será <strong>de</strong>cretada a or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> entrega<br />

<strong>do</strong> objeto custodia<strong>do</strong>, sob cominação <strong>de</strong> multa”.<br />

A probabilida<strong>de</strong> da existência <strong>do</strong> direito, mais uma vez, <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> prova <strong>do</strong>cumental produzida pelo autor, nesse caso, <strong>de</strong><br />

forma mais específica à espécie <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> (reipersecutório) e ao tipo <strong>de</strong> <strong>do</strong>cumento (contrato <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito). Enten<strong>do</strong> que essa prova<br />

<strong>do</strong>cumental exigida pelo art. 311, III, <strong>do</strong> Novo CPC, não precisa ser necessariamente o contrato <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito, bastan<strong>do</strong> que seja<br />

uma prova escrita que <strong>de</strong>monstra a relação jurídica material <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito 67 .<br />

A expressa previsão <strong>de</strong> multa para pressionar psicologicamente o réu a entregar o bem é <strong>de</strong>snecessária, porque em toda e<br />

qualquer obrigação <strong>de</strong> fazer, não fazer e entregar coisa é cabível a aplicação da multa cominatória (astreintes).<br />

10.3.3.5.2.4.<br />

Prova <strong>do</strong>cumental sem prova <strong>do</strong> réu capaz <strong>de</strong> gerar dúvida razoável ao juiz<br />

O inciso IV <strong>do</strong> art. 311 <strong>do</strong> Novo CPC prevê a última hipótese <strong>de</strong> tutela da evidência. Se a petição inicial for instruída com<br />

prova <strong>do</strong>cumental suficiente <strong>do</strong>s fatos constitutivos <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> autor, a que o réu não oponha prova capaz <strong>de</strong> gerar dúvida<br />

razoável, ao juiz caberá a concessão da tutela provisória da evidência. A prova po<strong>de</strong> ser <strong>do</strong>cumentada, ou seja, o autor po<strong>de</strong> se<br />

valer <strong>de</strong> prova emprestada oral ou pericial68.<br />

Essa hipótese <strong>de</strong> cabimento está condicionada à inexistência <strong>de</strong> cognição exauriente diante da situação <strong>de</strong>scrita no dispositivo<br />

legal, porque, sen<strong>do</strong> possível ao juiz, nesse momento <strong>do</strong> procedimento, formar juízo <strong>de</strong> certeza, será caso <strong>de</strong> julgamento<br />

antecipa<strong>do</strong> <strong>do</strong> mérito, ainda que parcial, a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>do</strong> caso concreto. Dessa forma, mesmo que o réu não consiga produzir prova<br />

<strong>do</strong>cumental capaz <strong>de</strong> gerar dúvida razoável, <strong>de</strong>ve haver no caso concreto outros meios <strong>de</strong> prova a produzir (oral, pericial) a<br />

impedirem o referi<strong>do</strong> julgamento antecipa<strong>do</strong> 69 .<br />

Embora o dispositivo legal aponte para a concessão <strong>de</strong> tutela da evidência após a contestação <strong>do</strong> réu, enten<strong>do</strong> que seu<br />

cabimento não se exaure a esse momento procedimental. Seguin<strong>do</strong> o processo e sen<strong>do</strong> produzida prova <strong>de</strong> outra natureza que não a<br />

<strong>do</strong>cumental, caso a parte adversa não consiga produzir prova que gere dúvida razoável, o juiz <strong>de</strong>verá conce<strong>de</strong>r a tutela da<br />

evidência 70 .


10.3.3.6. Atipicida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s meios executivos<br />

Segun<strong>do</strong> a melhor <strong>do</strong>utrina, tutela específica “é aquela que confere ao autor o cumprimento da obrigação inadimplida, seja a<br />

obrigação <strong>de</strong> entregar coisa, pagar soma em dinheiro, fazer ou não fazer”71. Já tive a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> afirmar que, “se toman<strong>do</strong><br />

por base o critério da coincidência <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>s gera<strong>do</strong>s pela prestação da tutela jurisdicional com os resulta<strong>do</strong>s que seriam<br />

gera<strong>do</strong>s pela satisfação voluntária da obrigação, a tutela jurisdicional po<strong>de</strong> ser classificada em tutela específica e tutela pelo<br />

equivalente em dinheiro. Na primeira, a satisfação gerada pela prestação jurisdicional é exatamente a mesma que seria gerada<br />

com o cumprimento voluntário da obrigação, enquanto na segunda, a tutela jurisdicional prestada é diferente da natureza da<br />

obrigação e, por consequência, cria um resulta<strong>do</strong> distinto daquele que seria cria<strong>do</strong> com a sua satisfação voluntária”72.<br />

O princípio da atipicida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s meios executivos permite que o juiz utilize meios executivos mesmo quan<strong>do</strong> não exista<br />

expressa previsão legal a seu respeito. Nas palavras da <strong>do</strong>utrina, “tal princípio é consagra<strong>do</strong> na regra legal <strong>de</strong> que o juiz po<strong>de</strong>rá,<br />

em cada caso concreto, utilizar o meio executivo que lhe parecer mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> para dar, <strong>de</strong> forma justa e efetiva, a tutela<br />

jurisdicional executiva. Por isso, não estará adstrito ao juiz seguir o itinerário <strong>de</strong> meios executivos previstos pelo legisla<strong>do</strong>r,<br />

senão porque po<strong>de</strong>rá lançar mão <strong>de</strong> medidas necessárias – e nada além disso – para realizar a norma concreta.” 73<br />

O princípio da atipicida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s meios executivos está consagra<strong>do</strong> nos arts. 84, § 5.º, <strong>do</strong> CDC. Como se po<strong>de</strong> constar da redação<br />

<strong>do</strong> dispositivo legal, o legisla<strong>do</strong>r, ao <strong>de</strong>screver medidas necessárias à obtenção da tutela específica, indica um rol meramente<br />

exemplificativo, o que é incontestável diante da expressão “tais como”, utilizada antes da indicação da “multa por atraso, busca e<br />

apreensão, remoção <strong>de</strong> pessoas e coisas, <strong>de</strong>sfazimento <strong>de</strong> obras e impedimento <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> nociva”.<br />

No senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> ser meramente exemplificativo o rol <strong>de</strong> meios executivos previstos em lei, o entendimento <strong>do</strong> Superior Tribunal<br />

<strong>de</strong> Justiça:<br />

“Processual civil. Administrativo. Recurso especial. Tratamento <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e fornecimento <strong>de</strong> medicamentos a necessita<strong>do</strong>.<br />

Obrigação <strong>de</strong> fazer. Fazenda Pública. Inadimplemento. Cominação <strong>de</strong> multa diária. Astreintes. Incidência <strong>do</strong> meio <strong>de</strong> coerção.<br />

Bloqueio <strong>de</strong> verbas públicas. Medida executiva. Possibilida<strong>de</strong>, in casu. Pequeno valor. Art. 461, § 5.º, <strong>do</strong> CPC. Rol exemplificativo<br />

<strong>de</strong> medidas. Proteção constitucional à saú<strong>de</strong>, à vida e à dignida<strong>de</strong> da pessoa humana. Primazia sobre princípios <strong>de</strong> direito financeiro<br />

e administrativo. Novel entendimento da E. Primeira Turma. 1. Ação Ordinária c/c pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> tutela antecipada ajuizada em face <strong>do</strong><br />

Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> Sul, objetivan<strong>do</strong> o fornecimento <strong>de</strong> medicamento <strong>de</strong> uso contínuo e urgente a paciente sem condição <strong>de</strong><br />

adquiri-lo. 2. A função das astreintes é vencer a obstinação <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r ao cumprimento da obrigação e inci<strong>de</strong> a partir da ciência <strong>do</strong><br />

obriga<strong>do</strong> e da sua recalcitrância. 3. In casu, consoante se infere <strong>do</strong>s autos, trata-se obrigação <strong>de</strong> fazer, consubstanciada no<br />

fornecimento <strong>de</strong> medicamento a pessoa necessitada, cuja imposição das astreintes objetiva assegurar o cumprimento da <strong>de</strong>cisão<br />

judicial e consequentemente resguardar o direito à saú<strong>de</strong>. 4. ‘Consoante entendimento consolida<strong>do</strong> neste Tribunal, em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

obrigação <strong>de</strong> fazer, é permiti<strong>do</strong> ao juízo da execução, <strong>de</strong> ofício ou a requerimento da parte, a imposição <strong>de</strong> multa cominatória ao<br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, mesmo que seja contra a Fazenda Pública’ (AgRgREsp 189.108/SP – Rel. Min. Gilson Dipp – DJ 02.04.2001). 5.<br />

Prece<strong>de</strong>ntes jurispru<strong>de</strong>nciais <strong>do</strong> STJ: REsp 490.228/RS – DJ 31.05.2004; AgRgREsp 440.686/RS – DJ 16.12.2002; AGREsp<br />

554.776/SP – DJ 06.10.2003; AgRgREsp 189.108/SP – DJ 02.04.2001; e AgRgAg 334.301/SP – DJ 05.02.2001. 6. Depreen<strong>de</strong>-se<br />

<strong>do</strong> art. 461, § 5.º, <strong>do</strong> CPC, que o legisla<strong>do</strong>r, ao possibilitar ao juiz, <strong>de</strong> ofício ou a requerimento, <strong>de</strong>terminar as medidas<br />

assecuratórias como a ‘imposição <strong>de</strong> multa por tempo <strong>de</strong> atraso, busca e apreensão, remoção <strong>de</strong> pessoas e coisas, <strong>de</strong>sfazimento <strong>de</strong><br />

obras e impedimento <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> nociva, se necessário com requisição <strong>de</strong> força policial’, não o fez <strong>de</strong> forma taxativa, mas sim<br />

exemplificativa, pelo que, in casu, o sequestro ou bloqueio da verba necessária à aquisição <strong>de</strong> medicamento objeto da tutela<br />

in<strong>de</strong>ferida, providência excepcional a<strong>do</strong>tada em face da urgência e imprescindibilida<strong>de</strong> da prestação <strong>do</strong>s mesmos, revela-se medida<br />

legítima, válida e razoável. 7. Deveras, é lícito ao julga<strong>do</strong>r, à vista das circunstâncias <strong>do</strong> caso concreto, aferir o mo<strong>do</strong> mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong><br />

para tornar efetiva a tutela, ten<strong>do</strong> em vista o fim da norma e a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> previsão legal <strong>de</strong> todas as hipóteses fáticas.<br />

Máxime diante <strong>de</strong> situação fática, na qual a <strong>de</strong>sídia <strong>do</strong> ente estatal, frente ao coman<strong>do</strong> judicial emiti<strong>do</strong>, po<strong>de</strong> resultar em grave lesão<br />

à saú<strong>de</strong> ou mesmo pôr em risco a vida <strong>do</strong> <strong>de</strong>mandante. 8. Os direitos fundamentais à vida e à saú<strong>de</strong> são direitos subjetivos<br />

inalienáveis, constitucionalmente consagra<strong>do</strong>s, cujo prima<strong>do</strong>, em um Esta<strong>do</strong> Democrático <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> como o nosso, que reserva<br />

especial proteção à dignida<strong>de</strong> da pessoa humana, há <strong>de</strong> superar quaisquer espécies <strong>de</strong> restrições legais. Não obstante o fundamento<br />

constitucional, in casu, merece <strong>de</strong>staque a Lei Estadual 9.908/1993, <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul, que assim dispõe em seu art.<br />

1.º: ‘Art. 1.º O Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve fornecer, <strong>de</strong> forma gratuita, medicamentos excepcionais para pessoas que não pu<strong>de</strong>rem prover as<br />

<strong>de</strong>spesas com os referi<strong>do</strong>s medicamentos, sem privarem-se <strong>do</strong>s recursos indispensáveis ao próprio sustento e <strong>de</strong> sua família.<br />

Parágrafo único. Consi<strong>de</strong>ram-se medicamentos excepcionais aqueles que <strong>de</strong>vem ser usa<strong>do</strong>s com frequência e <strong>de</strong> forma permanente,<br />

sen<strong>do</strong> indispensáveis à vida <strong>do</strong> paciente’. 9. A Constituição não é ornamental, não se resume a um museu <strong>de</strong> princípios, não é<br />

meramente um i<strong>de</strong>ário; reclama efetivida<strong>de</strong> real <strong>de</strong> suas normas. Destarte, na aplicação das normas constitucionais, a exegese <strong>de</strong>ve<br />

partir <strong>do</strong>s princípios fundamentais, para os princípios setoriais. E, sob esse ângulo, merece <strong>de</strong>staque o princípio fundante da<br />

República que <strong>de</strong>stina especial proteção à dignida<strong>de</strong> da pessoa humana. 10. Outrossim, a tutela jurisdicional para ser efetiva <strong>de</strong>ve<br />

dar ao lesa<strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> prático equivalente ao que obteria se a prestação fosse cumprida voluntariamente. O meio <strong>de</strong> coerção tem<br />

valida<strong>de</strong> quan<strong>do</strong> capaz <strong>de</strong> subjugar a recalcitrância <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r. O Po<strong>de</strong>r Judiciário não <strong>de</strong>ve compactuar com o proce<strong>de</strong>r <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>,<br />

que, con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> pela urgência da situação a entregar medicamentos imprescindíveis à proteção da saú<strong>de</strong> e da vida <strong>de</strong> cidadão<br />

necessita<strong>do</strong>, revela-se indiferente à tutela judicial <strong>de</strong>ferida e aos valores fundamentais por ele eclipsa<strong>do</strong>s. 11. In casu, a <strong>de</strong>cisão ora


hostilizada pelo recorrente importa na negativa <strong>de</strong> fixação das astreintes ou bloqueio <strong>de</strong> valor suficiente à aquisição <strong>do</strong>s<br />

medicamentos necessários à sobrevivência <strong>de</strong> pessoa carente, revela-se indispensável à proteção da saú<strong>de</strong> <strong>do</strong> autor da <strong>de</strong>manda que<br />

originou a presente controvérsia, mercê <strong>de</strong> consistir em medida <strong>de</strong> apoio da <strong>de</strong>cisão judicial em caráter <strong>de</strong> sub-rogação. 12. Por fim,<br />

sob o ângulo analógico, as quantias <strong>de</strong> pequeno valor po<strong>de</strong>m ser pagas in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> precatório e a fortiori serem, também,<br />

entregues, por ato <strong>de</strong> império <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário. 13. Recurso especial provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 836.913/RS – Primeira Turma – Rel.<br />

Min. Luiz Fux – j. 08.05.2007 – DJ 31.05.2007).<br />

No Projeto <strong>de</strong> Lei <strong>do</strong> Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil, aprova<strong>do</strong> pela Câmara, incluía-se <strong>de</strong> forma expressa entre os meios<br />

executivos a intervenção judicial em ativida<strong>de</strong> empresarial para a obtenção da tutela específica, regra já existente para a hipótese<br />

<strong>de</strong> concorrência <strong>de</strong>sleal. No texto final aprova<strong>do</strong> pelo Sena<strong>do</strong>, entretanto, essa novida<strong>de</strong> foi suprimida. Trata-se, à evidência, <strong>de</strong><br />

supressão inútil, porque pela aplicação <strong>do</strong> princípio da atipicida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s meios executivos a medida é plenamente aplicável, ainda<br />

que não existe regra expressa que a consagre no novo diploma processual74.<br />

Há, entretanto, uma novida<strong>de</strong> significativa quanto ao princípio ora analisa<strong>do</strong> no Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Tanto o<br />

revoga<strong>do</strong> art. 461, § 5.º <strong>do</strong> CPC/1973 como o art. 536, § 1.º, <strong>do</strong> Novo CPC são dispositivos que tratam da execução da obrigação<br />

<strong>de</strong> fazer, não fazer e <strong>de</strong> entregar coisa. Essa previsão limitada a <strong>de</strong>terminadas espécies <strong>de</strong> obrigação sempre foi utilizada pelos<br />

refratários a utilização em sua plenitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> princípio da atipicida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s meios executivos à execução <strong>de</strong> pagar quantia certa.<br />

O art. 139 <strong>do</strong> Novo CPC trata <strong>do</strong>s po<strong>de</strong>res <strong>do</strong> juiz, preven<strong>do</strong> em seu inciso IV ser um <strong>de</strong>les a <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> todas as<br />

medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m judicial,<br />

inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.<br />

Enten<strong>do</strong> que esse dispositivo claramente permite a aplicação ampla e irrestrita <strong>do</strong> princípio ora analisa<strong>do</strong> a qualquer espécie <strong>de</strong><br />

execução, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da natureza da obrigação. E também que supera o entendimento <strong>de</strong> que as astreintes não sejam<br />

cabíveis nas execuções <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> pagar quantia certa75.<br />

Seriam assim admitidas medidas executivas que nunca foram aplicadas na vigência <strong>do</strong> CPC/1973 e que não estão previstas<br />

expressamente no novo diploma legal. Interessantes exemplos são da<strong>do</strong>s pela melhor <strong>do</strong>utrina 76 : suspensão <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r<br />

<strong>de</strong> conduzir veículo automotor, inclusive com a apreensão física da CNH, em caso <strong>de</strong> não pagamento <strong>de</strong> dívida oriunda <strong>de</strong> multas<br />

<strong>de</strong> trânsito (incluo as in<strong>de</strong>nizações por aci<strong>de</strong>ntes ocorri<strong>do</strong>s no trânsito); vedação <strong>de</strong> contratação <strong>de</strong> novos funcionários por empresa<br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> verbas salariais; proibição <strong>de</strong> empréstimo ou <strong>de</strong> participação em licitações a <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r que não paga o débito relativo a<br />

financiamento bancário.<br />

Essa liberda<strong>de</strong> concedida ao juiz naturalmente aumenta sua responsabilida<strong>de</strong>, não sen<strong>do</strong> admissível que a utilize para<br />

contrariar a lei ou mesmo princípios <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>. Não po<strong>de</strong>, por exemplo, <strong>de</strong>terminar a prisão civil fora da hipótese <strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r<br />

inescusável <strong>de</strong> alimentos, nos termos <strong>do</strong> art. 5.º, LXVII, da CF. Tampouco po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>terminar que banda <strong>de</strong> música com camisetas<br />

com a foto <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r o persiga cantarolan<strong>do</strong> cantigas relacionan<strong>do</strong>-o à obrigação inadimplida ou outras formas vexatórias <strong>de</strong><br />

pressão psicológica.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, não será cabível a a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> tais medidas se elas não tiverem concreta capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cumprir sua função, qual<br />

seja, a <strong>de</strong> pressionar psicologicamente o executa<strong>do</strong> a cumprir sua obrigação. Conforme entendimento consolida<strong>do</strong> no Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça, não cabe aplicação <strong>de</strong> astreintes para forçar o executa<strong>do</strong> a cumprir obrigação <strong>de</strong> impossível cumprimento,<br />

porque nesse caso estar-se-á diante <strong>de</strong> sanção, e não <strong>de</strong> medida executiva77. O mesmo raciocínio <strong>de</strong>ve ser utiliza<strong>do</strong> para a<br />

aplicação das medidas executivas atípicas, <strong>de</strong> forma a ter seu cabimento condiciona<strong>do</strong> a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a obrigação <strong>de</strong> pagar<br />

quantia ser cumprida. Em outras palavras, é medida para ser aplicada no <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r que não paga porque não quer e que por ter<br />

blinda<strong>do</strong> seu patrimônio torna ineficaz a forma típica <strong>de</strong> execução (penhora-expropriação). Não é, portanto, medida a ser aplicável<br />

ao <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r que não paga porque não tem meios para tanto.<br />

E mesmo nos exemplos da<strong>do</strong>s <strong>de</strong> meios executivos atípicos em parágrafo anterior, <strong>de</strong>ve o juiz atuar com imparcialida<strong>de</strong> e<br />

razoabilida<strong>de</strong>. Não po<strong>de</strong>, por exemplo, <strong>de</strong>terminar a suspensão da habilitação <strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r que tem a condução <strong>de</strong> automóveis sua<br />

fonte <strong>de</strong> subsistência (taxista, motorista <strong>do</strong> UBER, motorista <strong>de</strong> ônibus). Tampouco parece correto proibir a contratação <strong>de</strong> novos<br />

funcionários <strong>de</strong> empresa que <strong>de</strong>ve verbas salariais quan<strong>do</strong> a contratação for indispensável ao próprio funcionamento da empresa.<br />

Será ônus <strong>do</strong> executa<strong>do</strong> <strong>de</strong>monstrar no caso concreto essas particularida<strong>de</strong>s para que a medida executiva não seja aplicada.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, tais medidas atípicas <strong>de</strong>vem ser aplicadas somente quan<strong>do</strong> as medidas típicas tiverem se mostra<strong>do</strong> incapazes<br />

<strong>de</strong> satisfazer o direito <strong>do</strong> exequente 78 .<br />

Enten<strong>do</strong> que em respeito ao princípio <strong>do</strong> contraditório o juiz <strong>de</strong>ve intimar o executa<strong>do</strong> antes <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir o requerimento <strong>do</strong><br />

exequente para a a<strong>do</strong>ção das medidas executivas atípicas. Somente em situações excepcionais, <strong>de</strong> extrema urgência, será<br />

admissível a a<strong>do</strong>ção <strong>do</strong> contraditório diferi<strong>do</strong>, nos termos <strong>do</strong> art. 9.º, parágrafo único, I, <strong>do</strong> Novo CPC. A <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> juiz <strong>de</strong>ve ser<br />

<strong>de</strong>vidamente fundamentada, nos termos <strong>do</strong> art. 489, § 1.º, <strong>do</strong> Novo CPC, sen<strong>do</strong> recorrível por agravo <strong>de</strong> instrumento (art. 1.015,


parágrafo único, <strong>do</strong> Novo CPC).<br />

10.3.3.7.<br />

Multa<br />

10.3.3.7.1.<br />

Introdução<br />

Apesar <strong>de</strong> não existir uma gradação entre as medidas executivas à disposição <strong>do</strong> juízo para efetivar a tutela das obrigações <strong>de</strong><br />

fazer e não fazer, a multa como forma <strong>de</strong> pressionar o executa<strong>do</strong> a cumprir sua obrigação parece ter mereci<strong>do</strong> posição <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque,<br />

sen<strong>do</strong> também medida <strong>de</strong> extrema frequência na praxe forense. A valorização da multa po<strong>de</strong> ser percebida pela expressa menção a<br />

ela feita pela lei nos §§ 4.º e 5.º <strong>do</strong> art. 84 <strong>do</strong> CDC.<br />

Aduz o art. 84, § 4.º, <strong>do</strong> CDC que o juiz po<strong>de</strong>rá, inclusive <strong>de</strong> ofício, impor multa diária ao réu, enquanto o art. 84, § 5.º, <strong>do</strong><br />

CDC prevê a aplicação da multa por tempo <strong>de</strong> atraso, sem nenhuma indicação da periodicida<strong>de</strong>. O art. 537, § 1.º, <strong>do</strong> Novo CPC<br />

menciona a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alteração <strong>do</strong> valor e/ou da periodicida<strong>de</strong>. Apesar <strong>de</strong> ser a periodicida<strong>de</strong> diária a mais frequente na<br />

aplicação da multa coercitiva, o juiz po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>terminar outra periodicida<strong>de</strong> – minuto, hora, semana, quinzena, mês –, bem como<br />

<strong>de</strong>terminar que a multa seja fixa, única forma logicamente aceitável <strong>de</strong>ssa medida <strong>de</strong> execução indireta nas violações <strong>de</strong> natureza<br />

instantânea. Apesar da omissão no art. 84 <strong>do</strong> CDC a respeito <strong>de</strong>sse parágrafo, é indubitável sua aplicação às ações consumeristas.<br />

A multa coercitiva passou a ser conhecida pelos opera<strong>do</strong>res <strong>de</strong> direito como astreintes, em razão <strong>de</strong> sua proximida<strong>de</strong> com<br />

instituto processual <strong>do</strong> direito francês <strong>de</strong> mesmo nome. Não cumpre, neste momento, fazer a análise comparativa entre a multa <strong>do</strong><br />

direito brasileiro e as astreintes <strong>do</strong> direito francês, que resultaria na constatação <strong>de</strong> que, apesar <strong>de</strong> próximas, têm diferenças<br />

importantes. A constatação empírica é que a utilização <strong>do</strong> termo astreintes se presta a <strong>de</strong>signar a multa, cujas características<br />

principais serão neste capítulo analisadas.<br />

10.3.3.7.2.<br />

Valor da multa<br />

Não existe nenhuma previsão legal referente ao valor da multa coercitiva, apenas mencionan<strong>do</strong> o art. 84, § 4.º, <strong>do</strong> CDC a<br />

exigência <strong>de</strong> que seja suficiente ou compatível com a obrigação, e é melhor que assim seja. Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> medida <strong>de</strong> pressão<br />

psicológica, caberá ao juiz analisar as particularida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> caso concreto para <strong>de</strong>terminar um valor que seja apto a efetivamente<br />

exercer tal influência no <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, para que seja convenci<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a melhor alternativa é o cumprimento da obrigação.<br />

A tarefa <strong>do</strong> juiz no caso concreto não é das mais fáceis. Se o valor não po<strong>de</strong> ser irrisório, porque, assim sen<strong>do</strong>, não haverá<br />

nenhuma pressão efetivamente gerada, também não po<strong>de</strong> ser exorbitante, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que um valor muito eleva<strong>do</strong> também<br />

<strong>de</strong>sestimula o cumprimento da obrigação. Valen<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> uma expressão poética revolucionária, tem-se que endurecer sem per<strong>de</strong>r<br />

a ternura.<br />

Essa responsável liberda<strong>de</strong> concedida ao juiz na <strong>de</strong>terminação <strong>do</strong> valor da multa faz com que não exista nenhuma vinculação<br />

entre o seu valor e o valor da obrigação <strong>de</strong>scumprida79. Se tivesse natureza sancionatória ou compensatória, como ocorre com a<br />

cláusula penal, seria o valor limita<strong>do</strong> ao da obrigação principal, por expressa previsão <strong>do</strong> art. 412 <strong>do</strong> CC. Inclusive, nos Juiza<strong>do</strong>s<br />

Especiais Estaduais existe entendimento consolida<strong>do</strong> no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que as astreintes não se limitam ao valor-teto <strong>de</strong> 40 salários<br />

mínimos, que se refere somente à pretensão principal <strong>do</strong> autor 80 .<br />

10.3.3.7.3.<br />

Beneficia<strong>do</strong> pela multa<br />

Ten<strong>do</strong> natureza coercitiva, as astreintes sempre beneficiarão a parte que preten<strong>de</strong> o cumprimento da obrigação. É evi<strong>de</strong>nte<br />

que, na hipótese <strong>de</strong> a multa funcionar em sua tarefa <strong>de</strong> pressionar o obriga<strong>do</strong>, a parte contrária será beneficiada por sua aplicação,<br />

porque conseguirá a satisfação <strong>de</strong> seu direito em razão <strong>do</strong> convencimento gera<strong>do</strong> no <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r em razão da aplicação da multa.<br />

Ocorre, entretanto, que nem sempre a multa surte os efeitos pretendi<strong>do</strong>s, e sempre que isso ocorre será cria<strong>do</strong> um direito <strong>de</strong> crédito<br />

no valor da multa fixada. Nesse caso, não parece correto falar em quem será o beneficia<strong>do</strong> pela multa para aferir quem é o cre<strong>do</strong>r<br />

<strong>de</strong>sse valor; melhor será falar em beneficia<strong>do</strong> pela frustração da multa e a consequente criação <strong>de</strong> um crédito.<br />

Apesar da crítica <strong>de</strong> parcela da <strong>do</strong>utrina 81 , o legisla<strong>do</strong>r nacional enten<strong>de</strong> que o cre<strong>do</strong>r <strong>do</strong> valor gera<strong>do</strong> pela frustração da multa<br />

será a parte contrária, conforme expressa previsão <strong>do</strong> § 2.º <strong>do</strong> art. 537. Esse também é o entendimento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça 82 . Costuma-se afirmar que o beneficia<strong>do</strong>, nesse caso, é o <strong>de</strong>mandante, mas não se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>scartar a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o<br />

<strong>de</strong>manda<strong>do</strong> ser cre<strong>do</strong>r, o que ocorrerá sempre que o autor <strong>de</strong>scumprir uma <strong>de</strong>terminação para o cumprimento <strong>de</strong> uma obrigação <strong>de</strong><br />

fazer ou não fazer com aplicação <strong>de</strong> multa83. De qualquer forma, a multa não é revertida para o Esta<strong>do</strong>, mas para uma das partes,<br />

geralmente o <strong>de</strong>mandante.<br />

Realmente, a opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r não <strong>de</strong>ve ser elogiada, em especial quan<strong>do</strong> consi<strong>de</strong>rada a previsão <strong>do</strong> art. 84, § 2.º, <strong>do</strong> CDC,


que <strong>de</strong>termina que a multa não impe<strong>de</strong> a in<strong>de</strong>nização por perdas e danos. Nota-se que, na ocorrência <strong>de</strong> um efetivo dano em razão<br />

<strong>do</strong> <strong>de</strong>scumprimento da obrigação, caberá à parte pedir a <strong>de</strong>vida in<strong>de</strong>nização, ten<strong>do</strong> que provar a existência <strong>do</strong> dano. Tornan<strong>do</strong>-se<br />

cre<strong>do</strong>r <strong>do</strong> valor da multa frustrada, a parte tem um ganho patrimonial em <strong>de</strong>trimento <strong>do</strong> patrimônio da parte contrária, sem nenhum<br />

respal<strong>do</strong> jurídico para legitimar tal locupletamento.<br />

10.3.3.7.4.<br />

Fazenda Pública em juízo<br />

Há <strong>do</strong>utrina minoritária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a inaplicabilida<strong>de</strong> das astreintes perante a Fazenda Pública, com o argumento principal<br />

<strong>de</strong> que o agente público, não ten<strong>do</strong> interesse direto na <strong>de</strong>manda, e saben<strong>do</strong> que uma eventual aplicação <strong>de</strong> multa não atingirá seu<br />

patrimônio, não sofre pressão psicológica alguma diante da aplicação <strong>de</strong> uma astreinte. Sen<strong>do</strong> a função da multa coagir o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r<br />

a cumprir a obrigação, essa corrente <strong>do</strong>utrinária enten<strong>de</strong> que a sua aplicação é injustificável diante da Fazenda Pública 84 .<br />

A sugerida inaplicabilida<strong>de</strong> encontra-se superada, sen<strong>do</strong> entendimento pacifica<strong>do</strong> no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça a<br />

aplicabilida<strong>de</strong> das astreintes quan<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r da obrigação <strong>de</strong> fazer ou não fazer é a Fazenda Pública 85 , mesmo posicionamento<br />

da <strong>do</strong>utrina amplamente majoritária 86 . Concor<strong>do</strong> com a maioria, mas não <strong>de</strong>ixo <strong>de</strong> me preocupar com as consequências da<br />

aplicação das astreintes à Fazenda Pública, porque, uma vez cobra<strong>do</strong> o valor da multa frustrada, o único contribuinte feliz com tal<br />

situação será o cre<strong>do</strong>r <strong>de</strong>sse valor. As dívidas da Fazenda Pública são todas quitadas pelos contribuintes, sen<strong>do</strong> extremamente<br />

injusto que to<strong>do</strong>s nós paguemos pelo ato <strong>de</strong> <strong>de</strong>scumprimento pelo agente público <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão judicial87. É claro que, se nossos<br />

agentes públicos atuassem em conformida<strong>de</strong> com os princípios da legalida<strong>de</strong> e da moralida<strong>de</strong> administrativa, consagra<strong>do</strong>s no art.<br />

37, caput, da CF/1988, a discussão nem seria posta, mas, pela crise ética que passa não só o Po<strong>de</strong>r Público, como também a<br />

socieda<strong>de</strong> em geral, é mera utopia acreditar na <strong>de</strong>snecessida<strong>de</strong> da aplicação da multa.<br />

Essa preocupação que tenho, entretanto, não é suficiente para legitimar a aplicação das astreintes ao próprio agente público.<br />

Parcela da <strong>do</strong>utrina enten<strong>de</strong> que, nesse caso, a pressão psicológica aumentaria significativamente, porque o agente público passaria<br />

a temer pela perda <strong>de</strong> seu patrimônio particular 88 . Não se duvida <strong>de</strong> que a pressão aumentaria, mas as astreintes só po<strong>de</strong>m ser<br />

dirigidas ao obriga<strong>do</strong>, reconheci<strong>do</strong> como tal na <strong>de</strong>cisão que se executa. O agente público não é parte no processo, e dirigir as<br />

astreintes a ele caracteriza afronta aos princípios da ampla <strong>de</strong>fesa e <strong>do</strong> contraditório, o que o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça não<br />

admite, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o agente público, entretanto, ser sanciona<strong>do</strong> com a multa prevista no art. 77, § 2.º <strong>do</strong> Novo CPC por ato<br />

atentatório à dignida<strong>de</strong> da jurisdição 89 .<br />

10.3.3.7.5.<br />

Alteração <strong>do</strong> valor e periodicida<strong>de</strong> da multa<br />

O art. 537, § 1.º, <strong>do</strong> Novo CPC menciona a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alteração <strong>do</strong> valor e/ou da periodicida<strong>de</strong> das astreintes preven<strong>do</strong><br />

as causas que justifiquem tal alteração.<br />

A causa prevista no inciso I <strong>do</strong> dispositivo legal não traz maiores complicações, sen<strong>do</strong> a hipótese clássica <strong>de</strong> alteração <strong>do</strong><br />

valor da multa a percepção pelo juiz <strong>de</strong> que se tornou insuficiente ou excessiva. A fixação <strong>do</strong> valor a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> não é tarefa simples,<br />

<strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o juiz se afastar <strong>do</strong>s extremos, já que um valor ínfimo não permite que a multa cumpra sua função (<strong>de</strong> pressão psicológica<br />

<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r) e um valor exorbitante <strong>de</strong>sestimula o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r no cumprimento da obrigação. Dessa forma, caso o juiz note que o valor<br />

fixa<strong>do</strong> originariamente se mostrou insuficiente para pressionar efetivamente o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r a cumprir a obrigação, ou excessivo a ponto<br />

<strong>de</strong> não estimular o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r a tal cumprimento, <strong>de</strong>ve, inclusive <strong>de</strong> ofício, modificar o valor da multa.<br />

O inciso II justifica a alteração ora analisada no cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o<br />

<strong>de</strong>scumprimento. Acredito que na hipótese <strong>de</strong> cumprimento parcial superveniente a multa <strong>de</strong>va ser rea<strong>de</strong>quada em termos <strong>de</strong> valor,<br />

porque a inadimplência terá objetivamente diminuí<strong>do</strong>. Já no caso <strong>de</strong> justa causa para o <strong>de</strong>scumprimento, vejo com dificulda<strong>de</strong><br />

diminuir o valor da multa, porque não sen<strong>do</strong> materialmente possível cumprir a obrigação, a multa simplesmente não po<strong>de</strong> ser<br />

aplicada.<br />

Enten<strong>do</strong> que a previsão <strong>do</strong> dispositivo ora analisa<strong>do</strong> seja dirigida ao próprio juiz que fixou originariamente o valor e a<br />

periodicida<strong>de</strong> da multa, com o que se afasta <strong>do</strong> caso concreto a preclusão judicial, in<strong>de</strong>vidamente chamada <strong>de</strong> preclusão pro<br />

iudicato. Alguma segurança jurídica, entretanto, <strong>de</strong>ve-se exigir, <strong>de</strong> forma que a modificação <strong>do</strong> valor e/ou da periodicida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<br />

ser justificada por circunstâncias supervenientes, sen<strong>do</strong> o reitera<strong>do</strong> <strong>de</strong>scumprimento da obrigação robusto indicativo <strong>de</strong> que a multa<br />

não está cumprin<strong>do</strong> com a sua função90. Os incisos <strong>do</strong> art. 537, § 1.º <strong>do</strong> Novo CPC são nesse senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que mudança sem<br />

circunstâncias supervenientes que a justifique não <strong>de</strong>ve ser admitida.<br />

Apesar <strong>de</strong> não haver preclusão nesse caso, a parte terá o direito <strong>de</strong> recorrer contra a <strong>de</strong>cisão que fixa a multa, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a<br />

revisão <strong>do</strong> valor ser realizada pelo tribunal em grau recursal. Inclusive, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso especial,<br />

vem alteran<strong>do</strong> o valor da multa quan<strong>do</strong> o enten<strong>de</strong> irrisório ou exorbitante 91 .


Haven<strong>do</strong> valor da multa fixa<strong>do</strong> no título executivo extrajudicial, o juiz só po<strong>de</strong>rá diminuí-lo se tal valor se mostrar excessivo,<br />

nos termos <strong>do</strong> art. 814, parágrafo único, <strong>do</strong> Novo CPC 92 . Dessa forma, mesmo que a multa não se mostre efetiva no caso concreto,<br />

não po<strong>de</strong>rá o juiz aumentar seu valor. Realida<strong>de</strong> diferente se verifica com a multa fixada em sentença (título executivo judicial),<br />

mesmo que transitada em julga<strong>do</strong>, já que o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça pacificou o entendimento <strong>de</strong> que as astreintes não<br />

produzem coisa julgada material por serem apenas meio <strong>de</strong> coerção indireta, <strong>de</strong> forma que po<strong>de</strong>m ter seu valor modifica<strong>do</strong> e até<br />

mesmo ser suprimidas no momento executivo93.<br />

Questão interessante diz respeito à modificação <strong>do</strong> valor e/ou periodicida<strong>de</strong> da multa fixada em sentença transitada em<br />

julga<strong>do</strong>. Uma falsa compreensão da natureza e da função das astreintes po<strong>de</strong> levar o intérprete a acreditar que nessa hipótese<br />

haverá uma vinculação <strong>do</strong> juiz que conduz o cumprimento <strong>de</strong> sentença ao estabeleci<strong>do</strong> em sentença em virtu<strong>de</strong> <strong>do</strong> fenômeno da<br />

coisa julgada material. O equívoco <strong>de</strong> tal percepção é manifesto, porque a multa é apenas uma forma executiva <strong>de</strong> cumprir a<br />

obrigação reconhecida em sentença, naturalmente não fazen<strong>do</strong> parte <strong>do</strong> objeto que se tornará imutável e indiscutível em razão da<br />

coisa julgada material 94 .<br />

Outro tema <strong>de</strong> extrema relevância diz respeito à possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mudança <strong>do</strong> valor final da multa, no momento em que a<br />

tutela específica ou a obtenção <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> prático equivalente tornarem-se impossíveis ou a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r for a conversão<br />

em perdas e danos. Po<strong>de</strong> o juiz reduzir o valor que será executa<strong>do</strong> pela parte? Seria possível aplicar o art. 537, § 1º, <strong>do</strong> Novo CPC<br />

a essa situação, ou o dispositivo legal limita-se a tutelar as situações em que a multa ainda está sen<strong>do</strong> aplicada?<br />

Há <strong>de</strong>fensores da impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o juiz diminuir o valor final gera<strong>do</strong> pela frustração da multa. Alguns <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res<br />

simplesmente afirmam que não há base legal para o juiz retroativamente eximir parcial ou totalmente o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r 95 , enquanto outros<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o juiz fazer tal revisão com fundamento no direito adquiri<strong>do</strong> da parte beneficiada com o direito <strong>de</strong><br />

crédito advin<strong>do</strong> da frustração da multa 96 . O entendimento é interessante, mas não <strong>de</strong>ve ser admiti<strong>do</strong>, ao menos não em sua<br />

integralida<strong>de</strong>.<br />

Em meu entendimento, enquanto a multa mostrou concreta utilida<strong>de</strong> em pressionar o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, o valor obti<strong>do</strong> é realmente um<br />

direito adquiri<strong>do</strong> da parte, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o juiz reduzi-lo, ainda que insta<strong>do</strong> a tanto pela parte contrária. Mas isso não significa que o<br />

valor calcula<strong>do</strong> durante to<strong>do</strong> o tempo <strong>de</strong> vigência da multa seja efetivamente <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>, porque a partir <strong>do</strong> momento em que a multa<br />

teve o seu objetivo frustra<strong>do</strong>, per<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a sua função, a sua manutenção passaria a ter caráter puramente sancionatório, com níti<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>svirtuamento <strong>de</strong> sua natureza. O mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> é o juiz <strong>de</strong>terminar, com eficácia ex tunc, a partir <strong>de</strong> quan<strong>do</strong> a multa já não tinha<br />

mais utilida<strong>de</strong>, revogan<strong>do</strong>-a a partir <strong>de</strong>sse momento e calculan<strong>do</strong> o valor somente relativamente ao perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> tempo em que a<br />

multa se mostrou útil. Reconheço que a <strong>de</strong>terminação exata <strong>do</strong> momento a partir <strong>de</strong> quan<strong>do</strong> a multa passou a ser inútil po<strong>de</strong> ser<br />

extremamente difícil, mas caberá ao juiz <strong>de</strong>terminá-lo valen<strong>do</strong>-se <strong>do</strong> princípio da razoabilida<strong>de</strong>.<br />

Fernanda ingressou com <strong>de</strong>manda judicial contra a corretora Esquilo da Fontana, <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> o juiz o cumprimento <strong>de</strong> uma<br />

obrigação <strong>de</strong> fazer com a imposição <strong>de</strong> multa diária <strong>de</strong> R$ 100,00. A obrigação é <strong>de</strong>scumprida e Fernanda, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> longo lapso<br />

temporal, informa o juízo que diante da recusa da corretora preten<strong>de</strong> converter em perdas e danos a obrigação. Ao calcular o valor<br />

da multa, chega ao valor <strong>de</strong> R$ 1.000.000,00. Caberá ao juiz notar que o exagero <strong>do</strong> valor final <strong>de</strong>corre <strong>do</strong> longo perío<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

inativida<strong>de</strong> das partes, o que é o suficiente para enten<strong>de</strong>r que a partir <strong>de</strong> algum momento em passa<strong>do</strong> distante a multa per<strong>de</strong>u a sua<br />

função coercitiva, sen<strong>do</strong> mantida como mera sanção. A diminuição significativa <strong>do</strong> valor pretendi<strong>do</strong> por Fernanda se impõe, sob<br />

pena <strong>de</strong> <strong>de</strong>svirtuamento da natureza das astreintes.<br />

O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça tem entendimento <strong>de</strong> que o valor final da multa frustrada po<strong>de</strong> ser reduzi<strong>do</strong> pelo juiz para<br />

evitar o enriquecimento sem causa da parte97, mas esse entendimento não é correto porque o enriquecimento sem causa não<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>do</strong> valor da multa, verifican<strong>do</strong>-se pela simples posição <strong>de</strong> cre<strong>do</strong>r da parte, como já afirma<strong>do</strong>. Há parcela <strong>do</strong>utrinária que<br />

enten<strong>de</strong> que a diminuição <strong>de</strong> valor final exorbitante, <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> longo lapso temporal <strong>de</strong> vigência da multa, justifica-se no<br />

princípio da boa-fé e da lealda<strong>de</strong> processual, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> haver abuso <strong>de</strong> direito na atitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r que <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> requerer a<br />

conversão da obrigação <strong>de</strong> fazer e/ou não fazer em perdas e danos em tempo razoável, quan<strong>do</strong> notar que a multa não está<br />

funcionan<strong>do</strong>98.<br />

O tema, entretanto, passa longe <strong>de</strong> ser tranquilo, existin<strong>do</strong> tanto <strong>do</strong>utrina 99 quanto <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> próprio Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça 100 enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> que se o não cumprimento da <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> juiz <strong>de</strong>u-se por resistência injustificada da parte, não há senti<strong>do</strong> em<br />

se minorar o valor final da multa. Nesse entendimento, se o valor é alto, isso <strong>de</strong>corre da postura <strong>de</strong> afronta ou <strong>de</strong>sleixo a<strong>do</strong>tada<br />

pela parte, e em razão disso diminuir o valor da multa é contrariar a própria natureza da multa cominatória.<br />

E, ainda, uma terceira corrente jurispru<strong>de</strong>ncial que, apesar <strong>de</strong> admitir a redução <strong>do</strong> valor da multa, enten<strong>de</strong> que o valor total<br />

fixa<strong>do</strong> a título <strong>de</strong> astreintes somente po<strong>de</strong>rá ser objeto <strong>de</strong> redução se fixada a multa diária em valor <strong>de</strong>sproporcional e não razoável<br />

à própria prestação que ela objetiva compelir o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r a cumprir, nunca em razão <strong>do</strong> simples valor total da dívida, mera<br />

<strong>de</strong>corrência da <strong>de</strong>mora e inércia <strong>do</strong> próprio <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r 101 .


A modificação <strong>do</strong> valor consolida<strong>do</strong> da multa po<strong>de</strong> ser feita <strong>de</strong> ofício ou mediante pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> executa<strong>do</strong>. O mais comum é que<br />

tal alegação seja veiculada por meio da <strong>de</strong>fesa típica <strong>do</strong> executa<strong>do</strong>, ou seja, a impugnação, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que a execução da multa<br />

dar-se-á por meio <strong>de</strong> cumprimento <strong>de</strong> sentença. O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, entretanto, já teve oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> admitir tal<br />

alegação em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> exceção <strong>de</strong> pré-executivida<strong>de</strong>, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> tratar-se <strong>de</strong> matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública que dispensa a instrução<br />

probatória 102 .<br />

10.3.3.7.6.<br />

Exigibilida<strong>de</strong> da multa<br />

A multa coercitiva po<strong>de</strong> ser aplicada tanto para pressionar o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r a cumprir uma <strong>de</strong>cisão interlocutória que conce<strong>de</strong> tutela<br />

<strong>de</strong> urgência quanto para cumprir uma sentença que julga proce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> autor. Questão que causa séria divergência na<br />

<strong>do</strong>utrina pátria refere-se ao momento a partir <strong>do</strong> qual a multa torna-se exigível. Em outras palavras, a partir <strong>de</strong> qual momento a<br />

parte beneficiada com o crédito gera<strong>do</strong> pela frustração da multa po<strong>de</strong>rá executá-lo?<br />

Para parcela da <strong>do</strong>utrina, a multa é exigível a partir <strong>do</strong> momento em que a <strong>de</strong>cisão que a fixa torna-se eficaz, ou porque não foi<br />

recorrida ou porque foi impugnada por recurso sem efeito suspensivo103. Essa exigibilida<strong>de</strong> permitiria a execução imediata <strong>de</strong><br />

crédito <strong>de</strong>corrente da multa frustrada fixada em <strong>de</strong>cisão ainda não <strong>de</strong>finitiva, inclusive a <strong>de</strong>cisão interlocutória que conce<strong>de</strong> a tutela<br />

antecipada, o que só po<strong>de</strong> ser compreendi<strong>do</strong> com a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> execução provisória <strong>do</strong> crédito 104 .<br />

Para essa corrente <strong>do</strong>utrinária, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> exigibilida<strong>de</strong> imediata resulta da própria função coercitiva da multa, porque a<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aguardar a <strong>de</strong>finitivida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>cisão, que só ocorrerá com o advento da coisa julgada material, seria extremamente<br />

contrária à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pressionar efetivamente o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r a cumprir a obrigação. Uma perspectiva <strong>de</strong> remota execução não<br />

seria suficiente para exercer a pressão psicológica esperada das astreintes 105 .<br />

Para outra corrente <strong>do</strong>utrinária, <strong>de</strong>ve-se aguardar o trânsito em julga<strong>do</strong> para que se possa exigir o crédito gera<strong>do</strong> pela<br />

frustração da multa. Essa corrente <strong>do</strong>utrinária enten<strong>de</strong> que a mera ameaça <strong>de</strong> aplicação da multa, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> momento<br />

em que o crédito gera<strong>do</strong> por sua frustração passará a ser exigível, já é suficiente para configurar a pressão psicológica pretendida<br />

pelo legisla<strong>do</strong>r 106 . Por outro la<strong>do</strong>, como só <strong>de</strong>ve pagar a multa a parte <strong>de</strong>finitivamente <strong>de</strong>rrotada na <strong>de</strong>manda judicial – o que só<br />

será conheci<strong>do</strong> com o trânsito em julga<strong>do</strong> –, cabe aguardar esse momento procedimental para admitir a execução da multa107.<br />

Numa tentativa <strong>de</strong> se alcançar um meio termo entre a executabilida<strong>de</strong> imediata, fundada na maior eficácia da multa, e a<br />

executabilida<strong>de</strong> condicionada ao trânsito em julga<strong>do</strong>, em prestígio à segurança jurídica, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça passou a<br />

enten<strong>de</strong>r que a multa fixada em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> tutela antecipada só po<strong>de</strong>ria ser executada após a confirmação da tutela antecipada em<br />

sentença, e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o recurso contra essa <strong>de</strong>cisão não tivesse efeito suspensivo 108 . Registre-se que a ausência <strong>do</strong> efeito<br />

suspensivo não chegava a ser um problema, porque ele só po<strong>de</strong>ria ser obti<strong>do</strong> excepcionalmente no caso concreto (efeito suspensivo<br />

ope iudicis). O equilíbrio busca<strong>do</strong> entre a eficácia da multa e a segurança jurídica foi alcança<strong>do</strong> <strong>de</strong> outra forma pelo art. 537, § 3.º,<br />

<strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Inicialmente, a previsão <strong>do</strong> dispositivo legal <strong>de</strong>ve ser saudada por duas razões. Primeiro, porque consagra expressamente a<br />

eficácia imediata da multa, em níti<strong>do</strong> prestígio da efetivida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse meio executivo 109 . Segun<strong>do</strong>, porque <strong>de</strong>ixa claro que a execução<br />

<strong>de</strong>finitiva <strong>de</strong>ssa multa <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong> da sentença, afastan<strong>do</strong> in<strong>de</strong>vida confusão entre executabilida<strong>de</strong> e<br />

provisorieda<strong>de</strong> sentida em algumas <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça. 110<br />

Apesar <strong>de</strong> consagrar a eficácia imediata da multa, o dispositivo legal ora analisa<strong>do</strong> consagra um cumprimento <strong>de</strong> sentença<br />

incompleto, já que exige para o levantamento <strong>do</strong>s <strong>de</strong>pósitos realiza<strong>do</strong>s em juízo o trânsito em julga<strong>do</strong> <strong>de</strong> sentença favorável à<br />

parte.<br />

O legisla<strong>do</strong>r aparentemente encontrou uma solução que prestigia a efetivida<strong>de</strong> e a segurança jurídica. A executabilida<strong>de</strong><br />

imediata reforça o caráter <strong>de</strong> pressão psicológica da multa porque o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r sabe que, <strong>de</strong>scumprida a <strong>de</strong>cisão em tempo breve,<br />

po<strong>de</strong>rá sofrer <strong>de</strong>sfalque patrimonial. Por outro la<strong>do</strong>, ao exigir para o levantamento <strong>de</strong> valores em favor <strong>do</strong> exequente o trânsito em<br />

julga<strong>do</strong> ou a pendência <strong>de</strong> recurso que dificilmente reverterá o resulta<strong>do</strong>, o legisla<strong>do</strong>r prestigia a segurança jurídica.<br />

Tenho sérias dúvidas a respeito da aplicabilida<strong>de</strong> da norma legal ora comentada no processo coletivo, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que o<br />

microssistema coletivo tem regra a respeito <strong>do</strong> tema em outro senti<strong>do</strong>, exigin<strong>do</strong> o trânsito em julga<strong>do</strong> para que a multa fixada<br />

durante o processo possa ser executada. Dessa forma, na ação civil pública (art. 12, § 2.º, da Lei 7.347/1985), nas <strong>de</strong>mandas<br />

regidas pelo Estatuto da Criança e <strong>do</strong> A<strong>do</strong>lescente – ECA (art. 213, § 3.º, da Lei 8.069/1990) e nas <strong>de</strong>mandas reguladas pelo<br />

Estatuto <strong>do</strong> I<strong>do</strong>so (art. 83, § 3.º, da Lei 10.741/2003), a multa só será exigível após o trânsito em julga<strong>do</strong> da <strong>de</strong>cisão.<br />

Não posso <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> registar minha profunda lamentação por tal solução, porque no processo coletivo, no qual se tutelam<br />

direitos indisponíveis e disponíveis com repercussão social, a eficácia da multa é ainda mais relevante. Condicionar sua<br />

executabilida<strong>de</strong> ao trânsito em julga<strong>do</strong> é, em gran<strong>de</strong> medida, frustrar a expectativa <strong>de</strong> que a multa cumpra sua função <strong>de</strong> pressionar<br />

psicologicamente o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r a cumprir a obrigação. As regras presentes no microssistema coletivo, entretanto, não <strong>de</strong>ixam margem


a outra interpretação.<br />

Conforme consta <strong>do</strong> dispositivo ora analisa<strong>do</strong>, é possível o levantamento <strong>do</strong> dinheiro antes <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong>, bastan<strong>do</strong><br />

para isso estar pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> julgamento o agravo contra recurso especial e recurso extraordinário. A permissão legal dá-se em razão<br />

das chances mínimas <strong>de</strong> sucesso <strong>de</strong> tal recurso, assumin<strong>do</strong> o legisla<strong>do</strong>r, nesse caso, o risco por um levantamento antes <strong>do</strong> trânsito<br />

em julga<strong>do</strong>.<br />

Apesar <strong>de</strong> raro, é possível que tal recurso seja provi<strong>do</strong> e tal situação <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada. Sen<strong>do</strong> por meio <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão<br />

<strong>de</strong>finitiva <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> não assistir razão à parte que teria si<strong>do</strong> beneficiada pela multa, na hipótese <strong>de</strong> a multa ainda não ter si<strong>do</strong><br />

cobrada, esta per<strong>de</strong>rá seu objeto. Já ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> executada, com a satisfação <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r, caberá a repetição <strong>de</strong> indébito. Ainda que<br />

existisse uma <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> juiz à época da fixação da multa que <strong>de</strong>veria ter si<strong>do</strong> cumprida, se posteriormente essa <strong>de</strong>cisão mostrou-se<br />

contrária ao direito, não há mais nenhuma justificativa para a manutenção das consequências <strong>do</strong> inadimplemento da obrigação111.<br />

10.3.3.7.7.<br />

Termo inicial da multa e intimação <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r<br />

Na vigência <strong>do</strong> CPC/1973, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça vinha tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> diferente a forma <strong>de</strong> intimação no<br />

cumprimento <strong>de</strong> sentença a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r da espécie <strong>de</strong> obrigação exequenda. Sen<strong>do</strong> <strong>de</strong> pagar quantia certa, a intimação se dava, em<br />

regra, na pessoa <strong>do</strong> advoga<strong>do</strong>, mas no caso <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> fazer, não fazer e entregar coisa, a intimação <strong>de</strong>veria ser<br />

necessariamente pessoal112.<br />

Esse tratamento diferencia<strong>do</strong> parece não se sustentar mais diante <strong>do</strong> art. 513, § 2.º <strong>do</strong> Novo CPC, que ao prever as diferentes<br />

formas <strong>de</strong> intimação <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, não discrimina a espécie <strong>de</strong> obrigação exequenda, permitin<strong>do</strong> a conclusão <strong>de</strong> que em qualquer<br />

<strong>de</strong>las <strong>de</strong>ve ser aplica<strong>do</strong> o dispositivo legal ora comenta<strong>do</strong> 113 .<br />

10.4.<br />

10.4.1.<br />

COMPETÊNCIA<br />

Introdução<br />

As únicas regras previstas na Lei 8.078/1990 a respeito da competência das ações judiciais que tenham como objeto a relação<br />

consumerista estão consagradas nos arts. 93 e 101, I <strong>do</strong> diploma legal. A primeira diz respeito às ações coletivas e a segunda, às<br />

ações individuais, mas ambas têm um ponto em comum: são regras <strong>de</strong> competência <strong>de</strong> foro, territoriais, portanto, ainda que a<br />

primeira seja <strong>de</strong> natureza absoluta e a segunda, <strong>de</strong> natureza relativa.<br />

Significa dizer que não existe qualquer norma legal que preveja a competência <strong>de</strong> Justiça e tampouco <strong>de</strong> juízo, sen<strong>do</strong> por essa<br />

razão necessária a busca, em outros diplomas legais, <strong>de</strong> regras que sejam capazes <strong>de</strong> regular essas espécies <strong>de</strong> competência nas<br />

relações consumeristas. A competência <strong>de</strong> Justiça é prevista na Constituição Fe<strong>de</strong>ral, enquanto a competência <strong>de</strong> juízo é<br />

<strong>de</strong>terminada por leis <strong>de</strong> organização judiciária, em ambos os casos se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> competência absoluta pela matéria ou pela<br />

pessoa.<br />

10.4.2.<br />

Competência da Justiça<br />

A primeira tarefa a ser examinada no tocante à competência para as ações <strong>de</strong> natureza consumerista é fixar a competência da<br />

Justiça.<br />

Em primeiro lugar, excluem-se as chamadas justiças especializadas, que têm sua competência sempre <strong>de</strong>terminada pela<br />

matéria. A Justiça Trabalhista, com competência prevista no art. 114 da CF/1988, a Justiça Eleitoral, com competência prevista no<br />

art. 121 da CF/1988, e a Justiça Militar, com competência fixada no art. 125 da CF/1988, jamais serão competentes para causas<br />

que envolvem relação <strong>de</strong> consumo, justamente porque as matérias que <strong>de</strong>terminam sua competência são <strong>de</strong> outra natureza.<br />

Não sen<strong>do</strong> a causa <strong>de</strong> competência <strong>de</strong> alguma das justiças especializadas, a competência será da justiça comum, dividida em<br />

Justiça Fe<strong>de</strong>ral e Justiça Estadual. Parece não haver maiores questionamentos sobre o fato <strong>de</strong> que o gran<strong>de</strong> palco <strong>de</strong> atuação das<br />

causas consumeristas é a Justiça Estadual, na qual se concentra a maioria das <strong>de</strong>mandas judiciais <strong>de</strong>ssa natureza. A Justiça Fe<strong>de</strong>ral,<br />

entretanto, não po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>scartada como competente para o julgamento <strong>de</strong> ações envolven<strong>do</strong> conflitos <strong>de</strong> interesses entre<br />

consumi<strong>do</strong>res e fornece<strong>do</strong>res.<br />

A competência da Justiça Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> primeiro grau é prevista pelo art. 109 da CF/1988, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>terminada tanto pela matéria<br />

(ratione materiae) como pela pessoa (ratione personae).<br />

É natural que se imagine que, nas hipóteses <strong>de</strong> competência fixada pela matéria, não haja relação <strong>de</strong> consumo, até porque<br />

seriam outras as matérias que <strong>de</strong>terminariam a competência da Justiça Fe<strong>de</strong>ral. O pensamento é correto nas hipóteses previstas nos<br />

incisos V-A (“causas relativas a direitos humanos”), X (“execução da carta rogatória, após o exequatur, e da sentença estrangeira,


após a homologação, as causas referentes à nacionalida<strong>de</strong>, inclusive a respectiva opção, e à naturalização”) e XI (“a disputa sobre<br />

direitos indígenas”).<br />

Mas na hipótese prevista pelo inciso III <strong>do</strong> art. 109 da CF/1988 o tema não será resolvi<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma tão tranquila. Serão <strong>de</strong><br />

competência da Justiça Fe<strong>de</strong>ral as causas fundadas em trata<strong>do</strong> ou contrato da União com Esta<strong>do</strong> estrangeiro ou organismo<br />

internacional, sen<strong>do</strong> possível, ainda que raro, que o contrato menciona<strong>do</strong> pelo dispositivo constitucional tenha natureza<br />

consumerista. Como bem lembra a <strong>do</strong>utrina, são variadas as espécies <strong>de</strong> contratos internacionais:<br />

“Os contratos internacionais, igualmente expressan<strong>do</strong> convergência <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>s, po<strong>de</strong>m tratar <strong>do</strong>s mais varia<strong>do</strong>s assuntos (sociais,<br />

econômicos, tecnológicos, entre outros), <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> sempre objetivar a concreção <strong>do</strong> interesse público, a efetivação <strong>do</strong>s princípios<br />

constitucionais e o cumprimento das avenças internacionais. Po<strong>de</strong>m ser cita<strong>do</strong>s os contratos <strong>de</strong> transporte marítimo, <strong>de</strong> tarifas<br />

aplicáveis às operações entre países signatários <strong>de</strong> acor<strong>do</strong>s a elas relativos, <strong>de</strong> importação e trânsito <strong>de</strong> merca<strong>do</strong>rias estrangeiras, <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> por danos ecológicos, entre outros”114.<br />

Seria mais fácil imaginar tal situação num contrato celebra<strong>do</strong> entre a União e uma empresa estrangeira, mas, como já restou<br />

<strong>de</strong>cidi<strong>do</strong> pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, não se po<strong>de</strong> confundir empresa estrangeira com organismo internacional 115 . De<br />

qualquer forma, mesmo tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> contrato firma<strong>do</strong> com organismo internacional, é possível, ainda que rara, a existência <strong>de</strong><br />

relação <strong>de</strong> consumo, conforme exposto anteriormente.<br />

Sen<strong>do</strong> a competência da Justiça Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong>terminada pela pessoa, a matéria passa a ser irrelevante, sen<strong>do</strong> naturalmente<br />

possível que envolva matéria consumerista. Em especial na hipótese <strong>de</strong> competência prevista no art. 109, I, da CF/1988, que<br />

justifica a maior parte das ações em trâmite perante a Justiça Fe<strong>de</strong>ral.<br />

O dispositivo legal se refere à União, entida<strong>de</strong> autárquica e empresa pública fe<strong>de</strong>ral. A jurisprudência, entretanto, se<br />

consoli<strong>do</strong>u no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> também incluir as fundações fe<strong>de</strong>rais como entes aptos a exigir a competência da Justiça Fe<strong>de</strong>ral. As<br />

pessoas jurídicas <strong>de</strong> direito público da administração indireta mencionadas já seriam o suficiente para compreen<strong>de</strong>r a possibilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> relações <strong>de</strong> consumo serem objeto <strong>de</strong> processos <strong>de</strong> competência da Justiça Fe<strong>de</strong>ral. A pesquisa <strong>de</strong> 2011 realizada pelo CNJ a<br />

respeito <strong>do</strong>s 100 maiores litigantes da Justiça Brasileira aponta os bancos com 18% <strong>do</strong>s processos em trâmite perante a Justiça<br />

Fe<strong>de</strong>ral, em sua absoluta maioria em <strong>de</strong>corrência da participação da Caixa Econômica Fe<strong>de</strong>ral, que é o segun<strong>do</strong> maior litigante<br />

nacional, envolvida em 8,50% das ações em trâmite.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, apesar <strong>de</strong> não existir expressa previsão no art. 109, I, da CF/1988 a esse respeito, é tranquilo o entendimento<br />

<strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça pela inclusão em tal dispositivo legal <strong>do</strong>s conselhos <strong>de</strong> fiscalização profissional116 e das agências<br />

regula<strong>do</strong>ras fe<strong>de</strong>rais 117 . Nesses casos, entretanto, como bem <strong>de</strong>monstra a <strong>do</strong>utrina, é mais comum a existência <strong>de</strong> ações coletivas na<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r:<br />

“De fato, hoje é possível colecionar diversas ações civis públicas promovidas pelos entes legitima<strong>do</strong>s em face da Anatel, Aneel,<br />

ANP, ANS, e mesmo a Superintendência <strong>de</strong> Seguros Priva<strong>do</strong>s (Susep) e Banco Central <strong>do</strong> Brasil (Bacen), autarquias fe<strong>de</strong>rais <strong>de</strong><br />

outrora. O objeto litigioso <strong>do</strong> processo é, via <strong>de</strong> regra, a regulamentação fruto <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r regulatório que fere o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r” 118 .<br />

O mesmo ocorre com a presença na <strong>de</strong>manda <strong>do</strong> Ministério Público Fe<strong>de</strong>ral. Mantenho o entendimento <strong>de</strong> que a simples<br />

presença <strong>do</strong> Ministério Público Fe<strong>de</strong>ral seja suficiente para <strong>de</strong>terminar a competência da Justiça Fe<strong>de</strong>ral, mas é preciso reconhecer<br />

o entendimento contrário consolida<strong>do</strong> no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, com fundamento na ausência <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> jurídica <strong>do</strong><br />

Ministério Público. Afirma-se que o Ministério Público Fe<strong>de</strong>ral é um órgão da União e, como tal, está incluí<strong>do</strong> no termo “União”<br />

expressamente previsto pelo art. 109, I, da CF/1988. Dessa forma, ainda que se admita um litisconsórcio entre o Ministério Público<br />

Estadual e o Ministério Público Fe<strong>de</strong>ral, a <strong>de</strong>manda <strong>de</strong>verá tramitar perante a Justiça Fe<strong>de</strong>ral, por <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> interpretação<br />

extensiva <strong>do</strong> rol <strong>de</strong> sujeitos previstos no art. 109, I, da CF 119 . De qualquer forma, a exemplo das <strong>de</strong>mandas que envolvem as<br />

agências regula<strong>do</strong>ras, a presença <strong>do</strong> Ministério Público Fe<strong>de</strong>ral interessa às ações coletivas consumeristas.<br />

Não se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> competência da Justiça Fe<strong>de</strong>ral, a competência da Justiça Estadual será residual. A competência da justiça<br />

comum é residual, <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> pelo que não for <strong>de</strong> competência das justiças especializadas. Na justiça comum, a competência da<br />

Justiça Estadual é residual, <strong>de</strong>terminada pelo que não for <strong>de</strong> competência da Justiça Fe<strong>de</strong>ral. Ainda que residual, a maior parte das<br />

<strong>de</strong>mandas que têm como objeto uma relação consumerista são <strong>de</strong> competência da Justiça Estadual.<br />

10.4.3.<br />

Competência territorial<br />

A competência territorial é aquela que <strong>de</strong>termina o foro competente, ou seja, a circunscrição territorial competente para o<br />

julgamento da <strong>de</strong>manda: na Justiça Estadual é a Comarca e na Justiça Fe<strong>de</strong>ral a Seção Judiciária.


O foro comum previsto pelo or<strong>de</strong>namento brasileiro, em tradição seguida universalmente,120 é o <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu.<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 46, <strong>do</strong> Novo CPC, essa regra somente se aplica aos processos funda<strong>do</strong>s em direito pessoal e direito real sobre bens<br />

móveis, afastan<strong>do</strong> a aplicação quan<strong>do</strong> se tratar <strong>de</strong> imóveis, caso em que o foro competente é o da situação da coisa, conforme<br />

estabelece o art. 47 <strong>do</strong> Novo CPC. Dessa forma, as <strong>de</strong>mandas fundadas em direito pessoal sobre móvel, direito pessoal sobre<br />

imóvel e direito real sobre móvel têm como regra <strong>de</strong> foro comum o <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu.<br />

Apesar <strong>de</strong> a<strong>do</strong>tar como regra o foro <strong>do</strong> local <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu, partin<strong>do</strong> da premissa <strong>de</strong> que, sen<strong>do</strong> esse sujeito “ataca<strong>do</strong>”<br />

pelo autor, é preciso permitir que litigue no local presumidamente mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> ao exercício <strong>de</strong> sua <strong>de</strong>fesa, o legisla<strong>do</strong>r cria uma<br />

série <strong>de</strong> foros especiais. Tais regras continuam a indicar a competência territorial, e por consequência são <strong>de</strong> natureza relativa,<br />

crian<strong>do</strong> “foros especiais” tão somente por indicar um foro distinto daquele estabeleci<strong>do</strong> pelo art. 46 <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Nas corretas lições <strong>de</strong> Candi<strong>do</strong> Rangel Dinamarco:<br />

“As normas que <strong>de</strong>finem a competência <strong>do</strong>s foros especiais constituem leges specialies em relação à que institui o foro comum<br />

(CPC, art. 94), ten<strong>do</strong> aplicação a conhecida máxima <strong>de</strong> hermenêutica, segun<strong>do</strong> a qual a norma geral <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> aplicar-se quan<strong>do</strong> tem<br />

incidência uma especial e nos limites <strong>de</strong>ssa incidência (lex specialis <strong>de</strong>rogat lege generale). O foro comum só prevalece, portanto,<br />

nos casos em que não haja incidência <strong>de</strong> norma alguma ditan<strong>do</strong> a competência <strong>de</strong> um foro especial”.<br />

Há regras <strong>de</strong> competência territorial <strong>de</strong>terminadas pelo local da coisa, como ocorre no art. 58, II, da Lei 8.245/1991 (Lei <strong>de</strong><br />

Locações); outras são <strong>de</strong>terminadas pelo local <strong>do</strong> cumprimento da obrigação, como ocorre no art. 53, III, d, <strong>do</strong> Novo CPC; outras<br />

são <strong>de</strong>terminadas pelo local <strong>do</strong> ato ou fato, como ocorre no art. 53, IV, <strong>do</strong> Novo CPC. Além <strong>de</strong>sses critérios <strong>de</strong>terminantes da<br />

competência relativa, existem regras que preveem o foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> autor como competente, inverten<strong>do</strong> a regra <strong>do</strong> art. 46 <strong>do</strong><br />

Novo CPC. Assim ocorre com o art. 53, II, <strong>do</strong> Novo CPC e o art. 101, I, CDC.<br />

O ponto comum que serve como justificativa para a inversão da regra consagrada no art. 46 <strong>do</strong> Novo CPC (foro comum), em<br />

níti<strong>do</strong> benefício <strong>do</strong> autor, é sua hipossuficiência diante <strong>do</strong> réu. Assim, é competente o foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio ou residência <strong>do</strong><br />

alimentan<strong>do</strong>, para a ação em que se pe<strong>de</strong>m os alimentos. Na hipótese <strong>do</strong> art. 101, I, <strong>do</strong> CDC, é a hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r<br />

diante <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r que justifica o tratamento diferencia<strong>do</strong>.<br />

Segun<strong>do</strong> o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, a prerrogativa <strong>de</strong> propor a ação no foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r é estendida ao<br />

chama<strong>do</strong> “consumi<strong>do</strong>r por equiparação”121, figura ainda não muito tratada pelo direito pátrio, e raramente presente em <strong>de</strong>cisões<br />

judiciais. De acor<strong>do</strong> com a melhor <strong>do</strong>utrina, com a a<strong>de</strong>quada interpretação <strong>do</strong> art. 29 <strong>do</strong> CDC, “uma nova série <strong>de</strong> hipóteses<br />

passará a se incluir no campo <strong>de</strong> aplicação das normas <strong>do</strong>s Capítulos V e VI <strong>do</strong> CDC, permitin<strong>do</strong> uma tutela protetiva daquele<br />

profissional, consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong>, justamente no âmbito contratual, <strong>de</strong> forma a reequilibrar a relação e reprimir o uso abusivo<br />

<strong>do</strong> po<strong>de</strong>r econômico” 122 .<br />

É importante ressaltar que, mesmo sen<strong>do</strong> um foro especial que visa à proteção em abstrato <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, essa regra <strong>de</strong><br />

competência continua a ser <strong>de</strong> natureza relativa, sujeita, portanto, a todas as espécies <strong>de</strong> prorrogação em direito admiti<strong>do</strong>. As<br />

normas que tratam da competência relativa são <strong>de</strong> natureza dispositiva, uma vez que, precipuamente, buscam proteger o interesse<br />

das partes, que po<strong>de</strong>rão abrir mão <strong>de</strong> tal proteção legal no caso concreto. Além disso, por não terem natureza cogente, a própria lei<br />

po<strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r interessante, em <strong>de</strong>terminadas situações, afastar a sua aplicação. Percebe-se, portanto, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> certa<br />

flexibilização <strong>de</strong> tais normas, o que po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>correr da vonta<strong>de</strong> das partes ou da própria lei.<br />

Nas corretas palavras <strong>de</strong> Kazuo Watanabe, “o foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> autor é uma regra que beneficia o consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ntro da<br />

orientação fixada no inc. VII <strong>do</strong> art. 6.º <strong>do</strong> Código, <strong>de</strong> facilitar o acesso aos órgãos judiciários. Cuidase, porém, <strong>de</strong> opção dada ao<br />

consumi<strong>do</strong>r, que <strong>de</strong>la po<strong>de</strong>rá abrir mão para, em benefício <strong>do</strong> réu, eleger a regra geral, que é a <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> <strong>de</strong>manda<strong>do</strong> (art. 46<br />

<strong>do</strong> Novo CPC)”123.<br />

Dessa forma, é plenamente possível que o consumi<strong>do</strong>r se veja obriga<strong>do</strong> a litigar fora <strong>de</strong> seu <strong>do</strong>micílio, inclusive contra sua<br />

vonta<strong>de</strong>, na hipótese <strong>de</strong> reunião <strong>de</strong> processos conexos diante <strong>do</strong> juízo prevento, que não será necessariamente o juízo <strong>do</strong> foro <strong>de</strong><br />

seu <strong>do</strong>micílio. Apesar <strong>de</strong> versar sobre a competência relativa, a conexão é consi<strong>de</strong>rada matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, impon<strong>do</strong>-se à<br />

vonta<strong>de</strong> das partes, inclusive <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, a vonta<strong>de</strong> livre e externada sem qualquer espécie <strong>de</strong> vício <strong>de</strong> consentimento pelo consumi<strong>do</strong>r prevalece sobre a<br />

regra legal <strong>de</strong> competência, lembran<strong>do</strong>-se sempre que o consumi<strong>do</strong>r é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> apenas hipossuficiente, nunca um incapaz <strong>de</strong><br />

tomar <strong>de</strong>cisões que signifiquem a renúncia a proteções previstas em lei. Assim, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça já <strong>de</strong>cidiu<br />

corretamente que, sen<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r capaz, é, a priori, válida cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro existente em contrato por ele firma<strong>do</strong>,<br />

ainda que <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não se <strong>de</strong>monstre sua abusivida<strong>de</strong> no caso concreto:<br />

“Recurso especial. Cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro, inserida em contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, subjacente à relação <strong>de</strong> consumo. Competência<br />

absoluta <strong>do</strong> foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, na hipótese <strong>de</strong> abusivida<strong>de</strong> da cláusula. Prece<strong>de</strong>ntes. Aferição, no caso concreto, que


o foro eleito encerre especial dificulda<strong>de</strong> ao acesso ao Po<strong>de</strong>r Judiciário pela parte hipossuficiente. Necessida<strong>de</strong>. Recurso especial<br />

parcialmente provi<strong>do</strong>. I. O legisla<strong>do</strong>r pátrio conferiu ao magistra<strong>do</strong> o po<strong>de</strong>r-<strong>de</strong>ver <strong>de</strong> anular, <strong>de</strong> ofício, a cláusula contratual <strong>de</strong><br />

eleição <strong>de</strong> foro, inserida em contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, quan<strong>do</strong> esta revelar-se abusiva, vale dizer, dificulte a parte a<strong>de</strong>rente em empreen<strong>de</strong>r<br />

sua <strong>de</strong>fesa em juízo, seja a relação jurídica subjacente <strong>de</strong> consumo, ou não; II. Levan<strong>do</strong>-se em conta o caráter impositivo das leis <strong>de</strong><br />

or<strong>de</strong>m pública, prepon<strong>de</strong>rante, inclusive, no âmbito das relações privadas, tem-se que, na hipótese <strong>de</strong> relação jurídica regida pela<br />

Lei consumerista, o magistra<strong>do</strong>, ao se <strong>de</strong>parar com a abusivida<strong>de</strong> da cláusula contratual <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro, esta subentendida como<br />

aquela que efetivamente inviabilize ou dificulte a <strong>de</strong>fesa judicial da parte hipossuficiente, <strong>de</strong>ve necessariamente <strong>de</strong>clará-la nula, por<br />

se tratar, nessa hipótese, <strong>de</strong> competência absoluta <strong>do</strong> Juízo em que resi<strong>de</strong> o consumi<strong>do</strong>r; III. A contrario sensu, não restan<strong>do</strong> patente<br />

a abusivida<strong>de</strong> da cláusula contratual que prevê o foro para as futuras e eventuais <strong>de</strong>mandas entre as partes, é certo que a<br />

competência territorial (no caso, <strong>do</strong> foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r) po<strong>de</strong>rá, sim, ser <strong>de</strong>rrogada pela vonta<strong>de</strong> das partes, ainda que<br />

expressada em contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são (ut art. 114, <strong>do</strong> CPC). Hipótese em que a competência territorial assumirá, inequivocamente, a<br />

natureza relativa (regra, aliás, <strong>de</strong>ste critério <strong>de</strong> competência); IV. Tem-se, assim, que os arts. 112, parágrafo único, e 114 <strong>do</strong> CPC,<br />

na verda<strong>de</strong>, encerram critério <strong>de</strong> competência <strong>de</strong> natureza híbrida (ora absoluta, quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>tectada a abusivida<strong>de</strong> da cláusula <strong>de</strong><br />

eleição <strong>de</strong> foro, ora relativa, quan<strong>do</strong> ausente a abusivida<strong>de</strong> e, portanto, <strong>de</strong>rrogável pela vonta<strong>de</strong> das partes); V. O fato isoladamente<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a relação entabulada entre as partes é <strong>de</strong> consumo não conduz à imediata conclusão <strong>de</strong> que a cláusula <strong>de</strong> eleição<br />

<strong>de</strong> foro inserida em contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são é abusiva, sen<strong>do</strong> necessário para tanto, nos termos propostos, perscrutar, no caso concreto, se<br />

o foro eleito pelas partes inviabiliza ou mesmo dificulta, <strong>de</strong> alguma forma, o acesso ao Po<strong>de</strong>r Judiciário; VI. Recurso Especial<br />

parcialmente provi<strong>do</strong>” (REsp 1.089.993/SP – Recurso Especial 2008/0197493-1 – Rel. Min. Massami Uyeda (1129) – Terceira<br />

Turma – j. 18.02.2010 – DJe 08.03.2010).<br />

O entendimento, entretanto, não é tranquilo nem mesmo no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, que por vezes faz crer que, somente<br />

por se tratar <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são consumerista, a cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro é abusiva e <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada nula:<br />

“Processual civil. Contrato <strong>de</strong> consórcio. Cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro. Nulida<strong>de</strong>. Domicílio <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Parte hipossuficiente da<br />

relação. Foro eleito. 1. A jurisprudência <strong>do</strong> STJ firmou-se, seguin<strong>do</strong> os ditames <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

que a cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro estipulada em contrato <strong>de</strong> consórcio há que ser tida como nula, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser eleito o foro <strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r a fim <strong>de</strong> facilitar a <strong>de</strong>fesa da parte hipossuficiente da relação. 2. Agravo regimental <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>” (STJ –<br />

AgRg no Ag 1070671/SC – Quarta Turma – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – j. 27.04.2010 – DJ 10.05.2010).<br />

Prefiro o entendimento exposto no primeiro julgamento, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> sempre que, sem a efetiva abusivida<strong>de</strong> da cláusula <strong>de</strong><br />

eleição <strong>de</strong> foro, não há qualquer razão para entendê-la como nula. Insisto que a proteção concedida pelo art. 101, I, <strong>do</strong> CDC, não<br />

po<strong>de</strong> se sobrepor à vonta<strong>de</strong> livremente manifestada pelo consumi<strong>do</strong>r ao a<strong>de</strong>rir ao contrato, se a indicação <strong>de</strong> foro diverso <strong>de</strong> seu<br />

<strong>do</strong>micílio não lhe traz qualquer sério empecilho ao exercício da ampla <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> seu direito. Enten<strong>de</strong>r o contrário seria impedir a<br />

valida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquer cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro, circunstância típica da competência absoluta, estranha à espécie <strong>de</strong> competência<br />

ora analisada.<br />

Outra forma <strong>de</strong> prorrogação <strong>de</strong> competência tradicional <strong>do</strong> sistema processual, <strong>de</strong>corrente da ausência <strong>de</strong> interposição <strong>de</strong><br />

exceção <strong>de</strong> incompetência, também é plenamente aplicável ao consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong> forma que, sen<strong>do</strong> proposta a <strong>de</strong>manda em foro<br />

diverso daquele previsto pelo art. 101, I, <strong>do</strong> CDC, e não haven<strong>do</strong> o reconhecimento da incompetência relativa <strong>de</strong> ofício nos termos<br />

<strong>do</strong> art. 63, § 3.º <strong>do</strong> Novo CPC, ou a oposição <strong>de</strong> exceção <strong>de</strong> incompetência, se verificará a prorrogação, tornan<strong>do</strong>-se concretamente<br />

competente o foro que era abstratamente incompetente.<br />

Por fim, mas não menos interessante, há uma quarta forma <strong>de</strong> prorrogação <strong>de</strong> competência aplicável ao consumi<strong>do</strong>r no tocante<br />

à não aplicação <strong>do</strong> art. 101, I, <strong>do</strong> CDC no caso concreto. Essa hipótese <strong>de</strong> prorrogação <strong>de</strong> competência não se encontra<br />

expressamente prevista em lei, mas resulta <strong>de</strong> uma análise sistemática das regras legais a respeito da matéria. Haverá tal espécie <strong>de</strong><br />

prorrogação sempre que a <strong>de</strong>manda for proposta respeitan<strong>do</strong>-se a regra <strong>de</strong> foro geral, que para o Código <strong>de</strong> Processo Civil é a <strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu. Sempre que existir uma regra especial <strong>de</strong> foro, a proteger o autor, em <strong>de</strong>trimento da regra geral, po<strong>de</strong>rá essa parte<br />

optar por afastar a norma que teria si<strong>do</strong> feita em seu favor e litigar no <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu.<br />

A justificativa para tal escolha <strong>do</strong> foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu como competente – ainda que aplicável à espécie regra <strong>de</strong> foro<br />

especial – liga-se à inexistência <strong>de</strong> interesse jurídico <strong>do</strong> réu em excepcionar justamente o juízo <strong>do</strong> foro que lhe acarretará as<br />

maiores vantagens possíveis. Evi<strong>de</strong>ntemente, essas vantagens são presumidas, parecen<strong>do</strong> à parcela da <strong>do</strong>utrina que tal presunção é<br />

relativa, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a ser possível, no caso concreto, provar o réu algum prejuízo nesse <strong>de</strong>srespeito <strong>do</strong> autor à norma <strong>de</strong> foro especial.<br />

A prorrogação, portanto, ficaria condicionada à ausência <strong>de</strong> um efetivo prejuízo <strong>do</strong> réu no caso concreto, que <strong>de</strong>verá ser prova<strong>do</strong><br />

na exceção <strong>de</strong> incompetência.<br />

Já havia se manifesta<strong>do</strong> Antônio Carlos Marcato sobre o assunto (eleição <strong>de</strong> foro), mas em lição totalmente aplicável às outras<br />

hipóteses <strong>de</strong>scritas:<br />

“Também suscita interessante questão pertinente ao ajuizamento da ação no foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu, diverso <strong>do</strong> eleito. Nesse caso


só terá senti<strong>do</strong> o acolhimento da exceção <strong>de</strong>clinatória se e quan<strong>do</strong> o excipiente <strong>de</strong>monstrar, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> inequívoco, que o ajuizamento<br />

da ação em foro diverso <strong>do</strong> eleito acarretou-lhe ou po<strong>de</strong>rá acarretar-lhe prejuízo. É que a regra <strong>do</strong> art. 94, instituin<strong>do</strong> o foro comum<br />

em benefício <strong>do</strong> réu, <strong>de</strong>verá prevalecer se o autor, ignoran<strong>do</strong> a cláusula eletiva, optar por atendê-la; e isso <strong>de</strong>corre da singela<br />

circunstância <strong>de</strong> que, inexistin<strong>do</strong> prejuízo <strong>de</strong>riva<strong>do</strong> <strong>de</strong>ssa opção, não teria o réu, em tese, nem mesmo interesse processual em opor a<br />

exceção”124.<br />

Em especial na hipótese <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, entretanto, não se <strong>de</strong>ve acolher tal entendimento. Enten<strong>do</strong> que, optan<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r<br />

por propor a <strong>de</strong>manda judicial no foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, não será cabível a exceção <strong>de</strong> incompetência, sen<strong>do</strong> a mera<br />

propositura da ação, nessas circunstâncias, suficiente para a prorrogação da competência. A inadmissibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> exceção <strong>de</strong><br />

incompetência <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, nesse caso, se dá justamente para prestigiar a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, porque, mesmo que ele prove<br />

que prefere litigar no foro previsto no art. 101, I, <strong>do</strong> CDC, se o consumi<strong>do</strong>r enten<strong>de</strong>r mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> litigar no foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r, essa vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve prevalecer.<br />

No correto entendimento <strong>de</strong> Leonar<strong>do</strong> Greco, a escolha <strong>do</strong> foro “fica a critério <strong>do</strong> autor. Se esse preferir o foro da se<strong>de</strong> <strong>do</strong> réu<br />

ou o foro <strong>de</strong> on<strong>de</strong> está localizada a sua agência, ele está abrin<strong>do</strong> mão <strong>do</strong> privilégio <strong>do</strong> foro, mas ele tem o direito <strong>de</strong> promover a<br />

ação no seu próprio <strong>do</strong>micílio, por força <strong>do</strong> cita<strong>do</strong> art. 101” 125 .<br />

10.4.3.1.<br />

Cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro<br />

10.4.3.1.1.<br />

Introdução<br />

A Lei 11.280/2006, ao somar ao art. 112, <strong>do</strong> CPC/1973, um parágrafo único, trouxe significativa novida<strong>de</strong> no trato judicial da<br />

incompetência relativa, permitin<strong>do</strong> ao juiz, na hipótese <strong>de</strong> haver, no caso concreto, uma nulida<strong>de</strong> em cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro<br />

em contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, <strong>de</strong>clarar <strong>de</strong> ofício tal nulida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>clinan<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua competência para o “juízo <strong>de</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu”.<br />

O dispositivo legal, apesar <strong>de</strong> levar uma novida<strong>de</strong> ao Código <strong>de</strong> Processo Civil revoga<strong>do</strong>, simplesmente consagrava<br />

entendimento jurispru<strong>de</strong>ncial pacífico em nossos Tribunais, sen<strong>do</strong> necessária uma breve análise <strong>do</strong>s prece<strong>de</strong>ntes que levaram o<br />

legisla<strong>do</strong>r à previsão a ser comentada.<br />

No Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil, o legisla<strong>do</strong>r consagrou, no art. 63, § 3.º, uma exceção até mais ampla <strong>do</strong> que aquela<br />

consagrada constitucionalmente. Haven<strong>do</strong> cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro abusiva em qualquer contrato (não precisa mais <strong>de</strong> ser<br />

a<strong>de</strong>são como previsto no revoga<strong>do</strong> art. 112, parágrafo único <strong>do</strong> CPC/1973), o juiz, antes da citação, <strong>de</strong>clarará ineficaz a cláusula <strong>de</strong><br />

eleição <strong>de</strong> foro, <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> a remessa <strong>do</strong> processo ao foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu.<br />

Percebe-se, pela literalida<strong>de</strong> da norma invocada, que o objetivo <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r foi criar uma exceção à regra geral <strong>de</strong> que não<br />

cabe ao juiz reconhecer <strong>de</strong> ofício a sua própria incompetência, sen<strong>do</strong> essa missão exclusiva <strong>do</strong> réu e, em <strong>de</strong>terminadas hipóteses,<br />

<strong>do</strong> assistente126. A regra, portanto, continua sen<strong>do</strong> que, não haven<strong>do</strong> ingresso <strong>de</strong> exceção <strong>de</strong> incompetência, prorroga-se a<br />

competência <strong>do</strong> juízo, ou seja, torna-se competente o juízo que originariamente não o era. O art. 63, §§ 3.º e 4.º, <strong>do</strong> Novo CPC,<br />

cria, tão somente, uma exceção à regra geral.<br />

10.4.3.1.2.<br />

Súmula 33 <strong>do</strong> STJ – vedação ao reconhecimento <strong>de</strong> ofício <strong>de</strong> incompetência relativa<br />

O tema <strong>do</strong> reconhecimento <strong>de</strong> ofício da incompetência relativa encontrava-se pacifica<strong>do</strong> com a Súmula 33 <strong>do</strong> STJ: “A<br />

incompetência relativa não po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>clarada <strong>de</strong> ofício”. O entendimento expresso na súmula se justificava pela própria natureza<br />

da norma, valoriza<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> interesse das partes, que po<strong>de</strong>m, no caso concreto, abrir mão da proteção legal, excluin<strong>do</strong> qualquer<br />

intervenção <strong>do</strong> juiz, como bem aponta<strong>do</strong> por José Carlos Barbosa Moreira:<br />

“Em tais hipóteses, também por questão <strong>de</strong> coerência, cumpre que se assegure àquele cujo interesse se reputa prepon<strong>de</strong>rante a<br />

possibilida<strong>de</strong> efetiva <strong>de</strong> fazer valer sua preferência. Se é <strong>do</strong> réu que se cuida, como nos exemplos acima figura<strong>do</strong>s, e o autor intentou<br />

a ação em foro diverso <strong>do</strong> aponta<strong>do</strong> na lei, uma <strong>de</strong> duas: ou o réu, juiz <strong>de</strong> seu próprio interesse, enten<strong>de</strong> que a opção o contraria, e<br />

em tal caso oferece a exceção, ou enten<strong>de</strong> que ela não o contraria, e abstém-se <strong>de</strong> excepcionar, dan<strong>do</strong> ensejo à prorrogação (Código<br />

<strong>de</strong> Processo Civil, art. 114). Conferir aqui ao órgão judicial a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> antepor-se ou sobrepor-se à manifestação (tácita que<br />

seja) <strong>do</strong> réu é introduzir nesse esquema lógico um fator <strong>de</strong> perturbação que nenhuma vantagem vem compensar” 127 .<br />

O reconhecimento <strong>de</strong> ofício da incompetência ficava restrito às hipóteses <strong>de</strong> incompetência absoluta, o que era justifica<strong>do</strong> –<br />

como ainda é – pela natureza das normas que tratam <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> competência. Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> normas <strong>de</strong> competência que<br />

têm como fundamento razões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, basicamente as <strong>de</strong> melhorar o serviço jurisdicional e proporcionar uma tutela<br />

jurisdicional <strong>de</strong> melhor qualida<strong>de</strong>, é natural que o juiz possa conhecê-las <strong>de</strong> ofício, <strong>de</strong>claran<strong>do</strong>-se absolutamente incompetente<br />

mesmo sem a manifestação da parte interessada.


10.4.3.1.3.<br />

Flexibilização jurispru<strong>de</strong>ncial à Súmula 33 <strong>do</strong> STJ<br />

O entendimento proibitivo quanto ao reconhecimento <strong>de</strong> ofício da incompetência relativa <strong>do</strong> juízo, apesar <strong>de</strong> sumula<strong>do</strong>,<br />

passou a ser sistematicamente flexibiliza<strong>do</strong> por nossos Tribunais, com amplo amparo <strong>do</strong>utrinário, na hipótese <strong>de</strong> o processo<br />

envolver relação <strong>de</strong> consumo em que houvesse cláusula abusiva <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro. Tornou-se frequente em contratos <strong>de</strong> consumo<br />

– em especial nos contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são – o fornece<strong>do</strong>r indicar o foro competente para julgar eventuais <strong>de</strong>mandas geradas na<br />

interpretação ou cumprimento <strong>do</strong> negócio jurídico que traz dificulda<strong>de</strong>s excessivas para o exercício <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa por parte<br />

<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, com a nítida intenção <strong>de</strong> prejudicá-lo processualmente.<br />

É óbvio que nem toda cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro envolven<strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> consumo é abusiva, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o juiz analisar a<br />

abusivida<strong>de</strong> no caso concreto, até mesmo porque os contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são não são repeli<strong>do</strong>s por nosso or<strong>de</strong>namento jurídico; aliás,<br />

pelo contrário, são importantes mecanismos <strong>de</strong> regulação <strong>de</strong> relações jurídicas nos dias atuais128. O que evi<strong>de</strong>nciará o vício no<br />

caso concreto é a <strong>de</strong>terminação como foro competente <strong>de</strong> um local distante <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, sem qualquer justificativa<br />

séria para tal escolha, <strong>de</strong> forma a ocasionar um sério obstáculo ao exercício da ampla <strong>de</strong>fesa. Nesses casos específicos, a aplicação<br />

da Súmula 33 <strong>do</strong> STJ vem sen<strong>do</strong> afastada, permitin<strong>do</strong>-se ao juiz conhecer sua incompetência relativa <strong>de</strong> ofício.<br />

O raciocínio utiliza<strong>do</strong>, mesmo antes da novida<strong>de</strong> legislativa, envolvia basicamente três artigos <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r:<br />

–<br />

–<br />

–<br />

art. 1.º: <strong>de</strong>termina que todas as normas previstas pelo CDC são <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, parecen<strong>do</strong> incluir tanto as normas <strong>de</strong> direito material<br />

como as <strong>de</strong> direito processual;<br />

art. 51: indica os vícios que <strong>de</strong>terminam a abusivida<strong>de</strong> <strong>do</strong> contrato;<br />

art. 6.º, VIII: exige <strong>do</strong> juiz a facilitação <strong>do</strong> exercício <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r no processo.<br />

Estan<strong>do</strong> as normas consumeristas no âmbito das normas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, o juiz não precisaria aguardar a manifestação da<br />

parte interessada, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> <strong>de</strong>clarar a nulida<strong>de</strong> da cláusula contratual <strong>de</strong> ofício (insista-se, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que presente um <strong>do</strong>s vícios<br />

indica<strong>do</strong>s pelo art. 51, CDC). A partir <strong>do</strong> momento em que anula <strong>de</strong> ofício a eleição <strong>de</strong> foro, nada haverá para justificar a escolha<br />

feita pelo autor-fornece<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o juiz remeter os autos para o foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu-consumi<strong>do</strong>r.<br />

Registre-se que, no tocante ao tema, <strong>de</strong>terminada corrente passou a enten<strong>de</strong>r que a regra <strong>de</strong> competência, tão somente por se<br />

tratar <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> consumo, se tornaria absoluta, o que permitiria ao juiz <strong>de</strong> ofício o reconhecimento <strong>de</strong> afronta a tal norma, sem<br />

qualquer ofensa à Súmula 33 <strong>do</strong> STJ. Esse era o entendimento <strong>do</strong> Ministro <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça Sálvio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong><br />

Teixeira, segun<strong>do</strong> o qual, “tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, a <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusula eletiva <strong>de</strong> foro, ao fundamento<br />

<strong>de</strong> que estaria ela a dificultar o acesso <strong>do</strong> réu ao Judiciário, com prejuízo para a sua ampla <strong>de</strong>fesa, torna absoluta a competência <strong>do</strong><br />

foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu, afastan<strong>do</strong> a incidência <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> 33 da Súmula/STJ”.129 Ainda hoje encontram-se equivocadas<br />

<strong>de</strong>cisões que apontam para a natureza absoluta da competência <strong>do</strong> foro em relação <strong>de</strong> consumo, por se admitir o reconhecimento<br />

<strong>de</strong> incompetência <strong>de</strong> ofício 130 .<br />

Não parece correto tal entendimento, que, inclusive, mostra-se absolutamente contrário à novida<strong>de</strong> legislativa, que, ao tratar<br />

<strong>do</strong> reconhecimento <strong>de</strong> ofício pelo juiz da incompetência nos casos previstos na norma legal, criou um parágrafo em artigo cujo<br />

caput trata da incompetência relativa. Correto o legisla<strong>do</strong>r nesse tocante, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que a competência continua a ser<br />

relativa, já que territorial, mas, em virtu<strong>de</strong> das previsões contidas no diploma consumerista, e agora também no art. 63, § 3.º <strong>do</strong><br />

Novo CPC, é legítima a exceção da regra <strong>de</strong> que a incompetência relativa não po<strong>de</strong> ser conhecida pelo juiz <strong>de</strong> ofício.131<br />

Para outra parcela da <strong>do</strong>utrina, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da discussão acerca da natureza absoluta ou relativa da competência, o que<br />

importa é a garantia <strong>do</strong> efetivo direito à ampla <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> réu, garanti<strong>do</strong> constitucionalmente. Nesse senti<strong>do</strong> as lições <strong>de</strong> Antônio<br />

Carlos Marcato, tratan<strong>do</strong> das dificulda<strong>de</strong>s que po<strong>de</strong>m ser geradas ao consumi<strong>do</strong>r-réu:<br />

“Esses óbices, ainda que eventualmente impostos <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> não intencional, autorizam e justificam a <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> remessa <strong>do</strong>s<br />

autos <strong>do</strong> processo ao foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu; e isto porque a questão em <strong>de</strong>bate envolve, à evidência, tema muito mais sério e<br />

grave que a simples possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser reconhecida <strong>de</strong> ofício a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusula abusiva ou a incompetência relativa ou, ainda,<br />

<strong>de</strong> se tratar <strong>de</strong> incompetência absoluta: cuida-se, em verda<strong>de</strong>, da necessida<strong>de</strong> (e não simples faculda<strong>de</strong>) <strong>de</strong> atendimento das<br />

exigências <strong>do</strong> <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> processo legal, mister <strong>do</strong> qual to<strong>do</strong>s os integrantes <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário <strong>de</strong>vem, permanentemente e<br />

intransigentemente, se <strong>de</strong>sincumbir”. 132<br />

Nota-se que os fundamentos po<strong>de</strong>riam até variar, mas a conclusão era sempre a mesma: abrin<strong>do</strong>-se a possibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> juiz<br />

anular <strong>de</strong> ofício cláusula abusiva <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro em contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, <strong>de</strong>claran<strong>do</strong>-se incompetente, também <strong>de</strong> ofício, e<br />

<strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> a remessa para o foro <strong>do</strong> local <strong>de</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r-réu.


10.4.3.1.4.<br />

O in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> condicionamento da <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro e o<br />

reconhecimento <strong>de</strong> ofício da incompetência relativa<br />

O <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> se proteger o consumi<strong>do</strong>r numa <strong>de</strong>manda em que o fornece<strong>do</strong>r busque se valer <strong>de</strong> sua posição <strong>de</strong> superiorida<strong>de</strong><br />

para prejudicar a parte mais fraca da relação não justifica os principais entendimentos a respeito da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o juiz<br />

reconhecer a incompetência relativa <strong>de</strong> ofício. Não que o resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> raciocínio esteja equivoca<strong>do</strong>, mas os fundamentos<br />

certamente não se mostram corretos. O pior é que o legisla<strong>do</strong>r, influencia<strong>do</strong> pelo equivoca<strong>do</strong> entendimento da <strong>do</strong>utrina, o<br />

consagrou na nova norma legal, ora comentada.<br />

É equivoca<strong>do</strong> acreditar ser a <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusula abusiva <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro o suficiente para, automaticamente,<br />

permitir que o juízo <strong>de</strong>clare sua incompetência relativa <strong>de</strong> ofício, <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> o cumprimento no disposto no art. 101, I, CDC,<br />

com a consequente remessa <strong>do</strong> processo ao foro <strong>do</strong> local <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r-réu. Mesmo na hipótese <strong>de</strong> anulação <strong>de</strong><br />

ofício da cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro, o que legitima a atuação <strong>do</strong> juiz em remeter os autos ao juízo competente continua a ser o<br />

afastamento da Súmula 33 <strong>do</strong> STJ, porque, mesmo sem a cláusula contratual, a incompetência continua a ser territorial e, portanto,<br />

relativa. A justificativa para a atuação oficiosa <strong>do</strong> juiz estaria prevista no art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC.<br />

Na realida<strong>de</strong>, a situação acima <strong>de</strong>scrita <strong>de</strong>monstra que essa questão vem sen<strong>do</strong> tratada <strong>de</strong> maneira equivocada. Que o juiz po<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>clarar nula <strong>de</strong> ofício a cláusula abusiva <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro não resta qualquer dúvida, quer seja pela redação <strong>do</strong> art. 1°, CDC,<br />

quer seja por aplicação <strong>do</strong> art. 63, § 3.º, <strong>do</strong> Novo CPC, mas isso nada tem a ver com a remessa <strong>do</strong> processo para o foro <strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu. Pergunta-se: se caso não existisse a cláusula contratual estipulan<strong>do</strong> o foro competente, e se mesmo assim o<br />

fornece<strong>do</strong>r ingressasse com a <strong>de</strong>manda em outro foro que não o <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, não seria possível o reconhecimento<br />

da incompetência relativa com a consequente remessa <strong>do</strong> processo ao foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu? Parece que a resposta <strong>de</strong>va ser no<br />

senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da existência <strong>de</strong> cláusula contratual eletiva <strong>de</strong> foro, a incompetência <strong>de</strong>ve ser reconhecida, o<br />

que torna a <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tal cláusula absolutamente <strong>de</strong>snecessária para o reconhecimento <strong>de</strong> ofício da incompetência.<br />

O que se preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar é que, com ou sem a existência da cláusula contratual <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro, as normas <strong>de</strong> proteção<br />

ao consumi<strong>do</strong>r já indicadas anteriormente darão o substrato jurídico suficiente para o juiz <strong>de</strong>clarar sua incompetência <strong>de</strong> ofício,<br />

ainda que relativa. A in<strong>de</strong>vida ligação entre a <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusula abusiva <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro e o reconhecimento <strong>de</strong><br />

ofício <strong>de</strong> incompetência relativa, apesar <strong>de</strong> absolutamente dispensável, encontrava-se tão arraigada na <strong>do</strong>utrina que o legisla<strong>do</strong>r –<br />

influencia<strong>do</strong> por tais lições – consagrou o equívoco na redação <strong>do</strong> novo dispositivo legal ora comenta<strong>do</strong>.<br />

10.4.3.1.5. Ineficácia da cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro<br />

O juiz, ao reconhecer a abusivida<strong>de</strong> da cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro, a reputará ineficaz e enviará os autos ao juízo <strong>do</strong> foro <strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu. Enten<strong>do</strong> que essa <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> ineficácia não vincula o réu, que no momento da prolação da <strong>de</strong>cisão ainda será<br />

um terceiro no processo. Essa consi<strong>de</strong>ração é importante porque, sen<strong>do</strong> cita<strong>do</strong> já no foro <strong>de</strong> seu <strong>do</strong>micílio em <strong>de</strong>corrência da<br />

aplicação <strong>do</strong> art. 63, § 3.º, <strong>do</strong> Novo CPC, o réu po<strong>de</strong>rá excepcionar o juízo (como preliminar <strong>de</strong> contestação) pleitean<strong>do</strong> a<br />

aplicação da cláusula <strong>de</strong> eleição ao caso concreto, com o que os autos <strong>de</strong>verão ser reencaminha<strong>do</strong>s ao juiz <strong>de</strong> origem.<br />

É preciso compreen<strong>de</strong>r que o dispositivo ora analisa<strong>do</strong> se presta a tutelar os interesses <strong>do</strong> réu, permitin<strong>do</strong> que ele se <strong>de</strong>fenda<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início <strong>do</strong> processo no foro <strong>de</strong> seu <strong>do</strong>micílio. Essa proteção, entretanto, parte <strong>de</strong> uma presunção relativa, <strong>de</strong> que o melhor<br />

local para o réu litigar é o foro <strong>de</strong> seu <strong>do</strong>micílio. No caso concreto, entretanto, é possível que o réu prefira o foro indica<strong>do</strong> pela<br />

cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro e essa vonta<strong>de</strong> concreta <strong>de</strong>le <strong>de</strong>ve prevalecer sobre uma proteção legal abstrata133.<br />

Tomo como exemplo as cida<strong>de</strong>s-satélite que circundam o Distrito Fe<strong>de</strong>ral. Essas cida<strong>de</strong>s, conhecidas como “cida<strong>de</strong>s<strong>do</strong>rmitório”,<br />

são o <strong>do</strong>micílio da maioria das pessoas que trabalham no Distrito Fe<strong>de</strong>ral, e que voltam às suas casas apenas para<br />

<strong>do</strong>rmir e passar os finais <strong>de</strong> semana. Diante <strong>de</strong>ssas condições, não é absur<strong>do</strong> imaginar que a pessoa prefira litigar no Distrito<br />

Fe<strong>de</strong>ral, on<strong>de</strong> passa a maior parte <strong>de</strong> seu tempo, <strong>do</strong> que no foro <strong>de</strong> seu <strong>do</strong>micílio. Nesse caso, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>clarada ineficaz a cláusula<br />

<strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro que indica o Distrito Fe<strong>de</strong>ral e envia<strong>do</strong> o processo para a cida<strong>de</strong>-satélite, é natural que o réu possa pedir o<br />

retorno <strong>do</strong> processo ao juízo <strong>de</strong> origem – que <strong>de</strong>ve ser feito por meio <strong>de</strong> preliminar na contestação pedin<strong>do</strong> a aplicação da cláusula<br />

<strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro.<br />

Registre-se que, sen<strong>do</strong> a <strong>de</strong>cisão que <strong>de</strong>creta e ineficácia da cláusula abusiva da cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro e <strong>de</strong>termina a<br />

remessa <strong>do</strong> processo ao foro <strong>de</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu prejudicial ao autor, em respeito ao art. 9.º, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, cabe ao juiz<br />

intimá-lo para manifestação antes da prolação da <strong>de</strong>cisão 134 .<br />

10.4.3.1.6.<br />

A curiosa criação <strong>de</strong> uma preclusão judicial temporal<br />

O art. 63, § 3.º <strong>do</strong> Novo CPC prevê expressamente que o reconhecimento <strong>de</strong> ofício da incompetência relativa em razão <strong>de</strong>


cláusula abusiva <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro só po<strong>de</strong> ocorrer até a citação <strong>do</strong> réu, com o que se cria uma excepcional preclusão temporal<br />

para o juiz, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a existência <strong>de</strong> um prazo ao juiz para que reconheça <strong>de</strong> ofício a incompetência relativa135. Sen<strong>do</strong> cita<strong>do</strong><br />

o réu, não po<strong>de</strong>rá mais o juiz reconhecer <strong>de</strong> ofício a incompetência, o que, inclusive, <strong>de</strong>monstra <strong>de</strong> forma bastante clara a natureza<br />

relativa da competência, caben<strong>do</strong> exclusivamente ao réu em sua contestação tal alegação para evitar a prorrogação <strong>de</strong> competência.<br />

O legisla<strong>do</strong>r se preocupou com o problema que po<strong>de</strong>ria ser gera<strong>do</strong> com o não reconhecimento <strong>de</strong> ofício da incompetência<br />

relativa, em hipóteses em que o réu não excepcionou o juízo. Procurou <strong>de</strong>ixar bem claro que, apesar <strong>de</strong> ser matéria que po<strong>de</strong>rá<br />

conhecer <strong>de</strong> ofício, não transforma o caso concreto numa espécie <strong>de</strong> incompetência absoluta, porque nesse caso o vício não se<br />

convalidaria, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser alega<strong>do</strong> a qualquer momento e até mesmo após o trânsito em julga<strong>do</strong>, por meio <strong>de</strong> ação rescisória. O<br />

objetivo <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r foi apontar para a convalidação <strong>do</strong> vício após o transcurso <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> resposta <strong>do</strong> réu, ainda que seja<br />

possível ao juiz reconhecer sua incompetência relativa <strong>de</strong> ofício.<br />

Não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser curiosa a opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r, embora totalmente justificável à luz da prática forense. É criada uma matéria<br />

<strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública com menor força <strong>do</strong> que uma verda<strong>de</strong>ira matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que o juiz somente<br />

reconhecerá a matéria <strong>de</strong> ofício até o transcurso <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> resposta. Depois disso, não po<strong>de</strong>rá mais se manifestar sobre a matéria,<br />

contrarian<strong>do</strong> regra básica das matérias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública: elas po<strong>de</strong>m ser conhecidas <strong>de</strong> ofício a qualquer momento <strong>do</strong> processo.<br />

Quem sabe o legisla<strong>do</strong>r entenda que a proteção ao réu não tenha o condão <strong>de</strong> transformar a matéria em questão <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública,<br />

o que não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser discutível em virtu<strong>de</strong> da possibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> reconhecimento da matéria <strong>de</strong> ofício, atuação <strong>do</strong> juiz concernente<br />

às matérias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública.<br />

Não é a primeira vez que o legisla<strong>do</strong>r confun<strong>de</strong> a natureza da matéria e a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu reconhecimento <strong>de</strong> ofício para<br />

resolver problemas práticos. No art. 526, parágrafo único, criou-se uma interessante hipótese <strong>de</strong> requisito <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong><br />

recursal que somente po<strong>de</strong>rá ser conheci<strong>do</strong> pelo juiz se alega<strong>do</strong> pela parte interessada. É <strong>de</strong> fato curioso, já que os requisitos <strong>de</strong><br />

admissibilida<strong>de</strong> são matérias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o juiz conhecê-las <strong>de</strong> ofício, o que não ocorre na hipótese prevista pelo<br />

dispositivo comenta<strong>do</strong>136. Não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser, no mínimo, uma confusão entre natureza <strong>de</strong> matéria e condições para seu<br />

reconhecimento em juízo.<br />

A nova norma criou uma hipótese <strong>de</strong> preclusão temporal para o juiz, fenômeno que parecia não existir no or<strong>de</strong>namento<br />

processual brasileiro, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que os prazos para o juiz são prazos impróprios, pois, uma vez <strong>de</strong>scumpri<strong>do</strong>s, nenhum efeito<br />

processual se verificará. Os efeitos gera<strong>do</strong>s por <strong>de</strong>scumprimento <strong>de</strong> prazo impróprio pelo juiz serão, quan<strong>do</strong> muito, <strong>de</strong> natureza<br />

disciplinar 137 . Não haven<strong>do</strong> consequência processual <strong>de</strong>ssa omissão, não se po<strong>de</strong> falar em preclusão temporal para o juiz, pois<br />

mesmo <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> transcorri<strong>do</strong> o prazo para a realização ao ato, será totalmente lícita a sua realização. 138<br />

Nas palavras <strong>de</strong> Cândi<strong>do</strong> Rangel Dinamarco, “é natural que sejam impróprios os prazos fixa<strong>do</strong>s para o juiz porque ele não<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong> interesses pessoais no processo, mas cumpre <strong>de</strong>veres. Seria contrário à ética e ao senso comum a <strong>de</strong>finitiva dispensa <strong>de</strong><br />

cumprimento <strong>de</strong> um <strong>de</strong>ver, em razão <strong>do</strong> seu não cumprimento no prazo. Para alguns, talvez isso fosse até um prêmio… O juiz que<br />

exce<strong>de</strong> prazos sem motivo justo é um mau paga<strong>do</strong>r das promessas constitucionais <strong>de</strong> tutela jurisdicional e <strong>de</strong>ve suportar sanções<br />

administrativas ou mesmo pecuniárias, mas inexiste a sanção processual das preclusões.”139<br />

Após o regramento <strong>do</strong> art. 63, § 3.º, <strong>do</strong> Novo CPC, não mais será possível se afirmar que a preclusão temporal não atinge o<br />

juiz, ao menos na hipótese prevista em lei.<br />

10.4.4.<br />

Competência <strong>do</strong> juízo<br />

Após a <strong>de</strong>terminação da competência <strong>do</strong> foro, ainda se exigirá, a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>do</strong> caso concreto, a <strong>de</strong>terminação da competência<br />

<strong>do</strong> juízo. Nesse caso será indispensável a utilização da competência em razão da pessoa e da matéria, ambas espécies <strong>de</strong><br />

competência absoluta.<br />

A competência em razão da pessoa não vem regulada expressamente pelo Código <strong>de</strong> Processo Civil, mas nem por isso <strong>de</strong>ixa<br />

<strong>de</strong> ser lembrada pela melhor <strong>do</strong>utrina, ten<strong>do</strong> importante aplicação prática. Registre-se mais uma vez que as regras <strong>de</strong> competência<br />

em razão da pessoa são <strong>de</strong> natureza absoluta, não admitin<strong>do</strong> prorrogação. Uma vez fixadas em norma <strong>de</strong> organização judiciária,<br />

<strong>de</strong>terminarão a competência <strong>do</strong> juízo em interesse geral da administração da Justiça.<br />

A importância <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> competência na <strong>de</strong>terminação <strong>do</strong> juízo competente no âmbito <strong>do</strong> direito consumerista é<br />

secundária, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que é o objeto da <strong>de</strong>manda que a caracteriza como sen<strong>do</strong> consumerista, e não os sujeitos que<br />

participam <strong>do</strong> processo. Ainda assim, é possível se verificar a exigência <strong>de</strong> uma vara especializada pela pessoa em causas que<br />

tenham como objeto o direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Tradicional exemplo <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> vara especializada é a Vara da Fazenda Pública –<br />

com competência para julgamento das causas envolven<strong>do</strong> o Esta<strong>do</strong> e o Município –, que po<strong>de</strong> naturalmente ter processos que<br />

tratem <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

De maior relevância é a competência em razão da matéria, também composta por regras <strong>de</strong> competência absoluta,


inadmissível, portanto, a prorrogação. Sempre que estiverem fixadas em norma <strong>de</strong> organização judiciária, <strong>de</strong>terminarão a<br />

competência <strong>do</strong> juízo, em interesse geral da administração da Justiça. As normas <strong>de</strong> organização judiciária criam varas<br />

especializadas, que concentram todas as <strong>de</strong>mandas pertencentes a um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> foro – geralmente da Capital ou <strong>de</strong> cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

gran<strong>de</strong> porte –, toman<strong>do</strong>-se por base matéria específica. O objetivo é bastante claro: especializar os servi<strong>do</strong>res da justiça, inclusive<br />

e principalmente o juiz, em uma <strong>de</strong>terminada matéria, dispensan<strong>do</strong> estu<strong>do</strong>s mais aprofunda<strong>do</strong>s <strong>de</strong> tantas outras, o que teoricamente<br />

ensejará uma prestação jurisdicional <strong>de</strong> melhor qualida<strong>de</strong>. Vivemos, afinal, em tempos <strong>de</strong> especialização.<br />

No tocante à existência <strong>de</strong>ssas varas especializadas, por encontrar sua maior aplicação em previsões constantes <strong>de</strong> leis <strong>de</strong><br />

organização judiciária, tu<strong>do</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá da vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r local, que, perceben<strong>do</strong> a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> varas especializadas, as<br />

criará, atribuin<strong>do</strong>-lhes competência <strong>de</strong> natureza absoluta. Assim, é possível que em qualquer comarca seja criada vara<br />

especializada <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, e, sempre que isso ocorrer, será a vara competente para julgar todas as <strong>de</strong>mandas<br />

envolven<strong>do</strong> o direito consumerista.<br />

Registre-se, por fim, que, por se tratar da fixação <strong>de</strong> competência <strong>de</strong> juízo, somente após a fixação da competência <strong>do</strong> foro terá<br />

alguma relevância a existência ou não <strong>de</strong> vara especializada em razão da matéria ou da pessoa. Essas varas especializadas não<br />

modificam a regra <strong>de</strong> competência <strong>de</strong> foro, só passan<strong>do</strong> a ter importância após tal <strong>de</strong>terminação. Nesse senti<strong>do</strong>, há inclusive<br />

entendimento consolida<strong>do</strong> pela Súmula 206 <strong>do</strong> STJ: “A existência <strong>de</strong> vara privativa, instituída por lei estadual, não altera a<br />

competência territorial resultante das leis <strong>de</strong> processo”, que também po<strong>de</strong> ser aplicada para as varas especializadas em razão da<br />

matéria.<br />

10.5.<br />

10.5.1.<br />

INTERVENÇÕES DE TERCEIROS<br />

Introdução<br />

Por intervenção <strong>de</strong> terceiros enten<strong>de</strong>-se a permissão legal para que um sujeito alheio à relação jurídica processual originária<br />

ingresse em processo já em andamento. Apesar das diferentes justificativas que permitem esse ingresso, as intervenções <strong>de</strong><br />

terceiros <strong>de</strong>vem ser expressamente previstas em lei, ten<strong>do</strong> fundamentalmente como propósitos a economia processual (evitar a<br />

repetição <strong>de</strong> atos processuais) e a harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s (evitar <strong>de</strong>cisões contraditórias). É natural que, uma vez admiti<strong>do</strong> no<br />

processo, o sujeito <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser terceiro e passa a ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> parte; em alguns casos, “parte na <strong>de</strong>manda”, e noutros, “parte no<br />

processo”140.<br />

O Título III <strong>do</strong> Livro III <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil tem como título “Da intervenção <strong>de</strong> terceiros”, compreen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a<br />

assistência, a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, o chamamento ao processo, o amicus curiae e a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica.<br />

Essas cinco espécies <strong>de</strong> intervenção são consi<strong>de</strong>radas as intervenções <strong>de</strong> terceiros típicas <strong>de</strong> nosso or<strong>de</strong>namento processual.<br />

Ocorre, entretanto, que nem todas as intervenções encontram sua justificação nessas cinco modalida<strong>de</strong>s típicas <strong>de</strong> intervenção<br />

<strong>de</strong> terceiro, o que <strong>de</strong>monstra que o rol legal é meramente exemplificativo. Previsões legais esparsas que permitem a intervenção <strong>de</strong><br />

um terceiro em processo já em andamento e que não são tipificáveis em nenhuma <strong>de</strong>ssas cinco modalida<strong>de</strong>s, constituem as<br />

chamadas intervenções <strong>de</strong> terceiros atípicas. A <strong>de</strong>finição <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá da amplitu<strong>de</strong> que se pretenda dar<br />

à atipicida<strong>de</strong>, não existin<strong>do</strong> unanimida<strong>de</strong> na <strong>do</strong>utrina a respeito <strong>de</strong> quais efetivamente sejam essas intervenções atípicas.<br />

O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r tem apenas <strong>do</strong>is dispositivos legais que tratam expressamente <strong>de</strong>sse tema: (i) o art. 88,<br />

que expressamente proíbe a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> na hipótese <strong>do</strong> art. 13, parágrafo único; e (ii) o art. 101, II, que permite ao réu<br />

chamar ao processo o segura<strong>do</strong>r. Dessa forma, a análise se concentrará nesses <strong>do</strong>is dispositivos legais e nas duas espécies <strong>de</strong><br />

intervenção <strong>de</strong> terceiro tratadas por eles.<br />

10.5.2.<br />

Denunciação da li<strong>de</strong><br />

10.5.2.1.<br />

Vedação legal<br />

O art. 12 da Lei 8.078/1990 prevê uma responsabilida<strong>de</strong> solidária entre o fabricante, o produtor, o construtor e o importa<strong>do</strong>r<br />

pela reparação <strong>de</strong> danos suporta<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r pelos <strong>de</strong>feitos <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> projeto, fabricação, construção, montagem,<br />

fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento <strong>de</strong> seus produtos, bem como por informações insuficientes ou<br />

ina<strong>de</strong>quadas sobre sua utilização e riscos. O comerciante, entretanto, só respon<strong>de</strong> solidariamente com esses sujeitos nas hipóteses<br />

previstas pelo art. 13 <strong>do</strong> mesmo diploma legal.<br />

Interessa à presente análise o disposto no parágrafo único <strong>do</strong> art. 13 <strong>do</strong> menciona<strong>do</strong> diploma legal, ao prever o direito<br />

regressivo daquele que respon<strong>de</strong>r perante o consumi<strong>do</strong>r contra os <strong>de</strong>mais responsáveis, norma que envolve tanto os sujeitos<br />

indica<strong>do</strong>s no art. 12 como o comerciante. A expressa previsão <strong>de</strong> direito regressivo traz imediatamente à tona a <strong>de</strong>nunciação da


li<strong>de</strong>. Serve essa espécie <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> terceiro para que uma das partes traga ao processo um terceiro que tem responsabilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> ressarci-la pelos eventuais danos advin<strong>do</strong>s <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> <strong>de</strong>sse processo.<br />

Segun<strong>do</strong> autorizada <strong>do</strong>utrina, a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> é uma <strong>de</strong>manda inci<strong>de</strong>nte, regressiva, eventual e antecipada: (a) inci<strong>de</strong>nte<br />

porque será instaurada em processo já existente; (b) regressiva porque fundada no direito <strong>de</strong> regresso da parte contra o terceiro; (c)<br />

eventual porque guarda uma evi<strong>de</strong>nte relação <strong>de</strong> prejudicialida<strong>de</strong> com a <strong>de</strong>manda originária, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que, se o <strong>de</strong>nunciante<br />

não suportar dano algum em razão <strong>de</strong> seu resulta<strong>do</strong>, a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> per<strong>de</strong>rá seu objeto141; (d) antecipada porque, no<br />

confronto entre o interesse <strong>de</strong> agir e a economia processual, o legisla<strong>do</strong>r prestigiou a primeira; afinal, não haven<strong>do</strong> ainda nenhum<br />

dano a ser ressarci<strong>do</strong> no momento em que a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> ocorre, em tese não há interesse <strong>de</strong> agir <strong>do</strong> <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> em pedir o<br />

ressarcimento. Razões <strong>de</strong> economia processual, entretanto, permitem excepcionalmente uma <strong>de</strong>manda sem interesse <strong>de</strong> agir 142 .<br />

Seria natural se imaginar, em <strong>de</strong>corrência da expressa previsão <strong>de</strong> direito regressivo, que o sujeito escolhi<strong>do</strong> pelo autorconsumi<strong>do</strong>r<br />

para figurar no polo passivo da <strong>de</strong>manda possa <strong>de</strong>nunciar à li<strong>de</strong> os <strong>de</strong>mais sujeitos indica<strong>do</strong>s pelos dispositivos<br />

consumeristas menciona<strong>do</strong>s, nos termos <strong>do</strong> art. 125, II, <strong>do</strong> Novo CPC. Ocorre, entretanto, que existe uma vedação expressa no art.<br />

88 da Lei 8.078/1990 a essa espécie <strong>de</strong> intervenção, ao menos nas hipóteses <strong>do</strong> art. 13 <strong>do</strong> mesmo diploma legal.<br />

Existem <strong>do</strong>is fundamentos essenciais para justificar a vedação à <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, sucintamente explicita<strong>do</strong>s por Kazuo<br />

Watanabe:<br />

“A <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, todavia, foi vedada para o direito <strong>de</strong> regresso <strong>de</strong> que trata o art. 13, parágrafo único, <strong>do</strong> Código, para evitar<br />

que a tutela jurídica processual <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res pu<strong>de</strong>sse ser retardada e também porque, em regra, a <strong>de</strong>dução <strong>de</strong>ssa li<strong>de</strong> inci<strong>de</strong>ntal<br />

será feita com a invocação <strong>de</strong> uma causa <strong>de</strong> pedir distinta” 143 .<br />

10.5.2.2.<br />

Fundamentos da vedação legal<br />

10.5.2.2.1.<br />

Dilação <strong>do</strong> tempo <strong>de</strong> duração <strong>do</strong> processo em prejuízo ao consumi<strong>do</strong>r<br />

O primeiro fundamento para justificar a vedação é não prejudicar o autor-consumi<strong>do</strong>r no tocante ao andamento <strong>do</strong> processo,<br />

consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que a intervenção <strong>de</strong> mais um (ou alguns) sujeito no polo passivo junto ao réu originário tornaria a relação<br />

jurídica processual mais complexa e, consequentemente, o andamento procedimental mais vagaroso. Na visão <strong>de</strong> prestigia<strong>do</strong><br />

civilista, “a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> não oferece os benefícios proclama<strong>do</strong>s pelos processualistas. Se, por um la<strong>do</strong>, oferece economia<br />

processual para o <strong>de</strong>nunciante, ao pegar uma carona no processo <strong>do</strong> autor, para este produz efeito contrário, pois retarda<br />

significativamente o andamento <strong>do</strong> seu processo, aumenta a complexida<strong>de</strong> probatória, além <strong>de</strong> outros inconvenientes”144.<br />

Essa visão, entretanto, leva em consi<strong>de</strong>ração apenas um aspecto <strong>do</strong> princípio da economia processual. Numa perspectiva mais<br />

ampla <strong>de</strong>sse princípio, têm-se alguns institutos processuais que evitam a repetição <strong>de</strong> atos processuais, o que, numa análise<br />

macroscópica <strong>do</strong> princípio, são extremamente importantes, tais como as intervenções <strong>de</strong> terceiros, a reconvenção e a ação<br />

<strong>de</strong>claratória 145 . É evi<strong>de</strong>nte que, pensa<strong>do</strong> o princípio equivocadamente <strong>de</strong> forma microscópica, voltada somente para o caso<br />

concreto, uma intervenção <strong>de</strong> terceiro como a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, ao tornar a relação jurídica processual mais complexa, atrasa a<br />

entrega da prestação jurisdicional naquela <strong>de</strong>manda. O ganho para o sistema como um to<strong>do</strong>, entretanto, justifica tal sacrifício <strong>do</strong><br />

processo individualmente consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>.<br />

O que se preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar é que justificar a vedação <strong>do</strong> art. 88 <strong>do</strong> CDC com uma crítica ao instituto da <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong><br />

não é a melhor forma <strong>de</strong> lidar com o tema. Simplesmente <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar o aspecto macroscópico <strong>do</strong> princípio da economia<br />

processual é se posicionar contra toda a estrutura <strong>de</strong> nosso processo civil, que, em diversos institutos, sacrifica o processo<br />

individualmente consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> para aten<strong>de</strong>r ao sistema como um to<strong>do</strong>.<br />

No caso específico <strong>do</strong> art. 88 <strong>do</strong> CDC, seria mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> justificar a vedação legal toman<strong>do</strong>-se por base um conflito <strong>de</strong><br />

interesses no caso concreto: o interesse <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em obter um resulta<strong>do</strong> mais rápi<strong>do</strong> e <strong>de</strong> forma facilitada e o interesse<br />

público <strong>de</strong> se evitar a repetição <strong>de</strong> atos processuais e/ou a criação <strong>de</strong> novos processos. O legisla<strong>do</strong>r fez uma escolha em favor <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, que po<strong>de</strong> até não ser consi<strong>de</strong>rada acertada, preferin<strong>do</strong> prestigiar um interesse priva<strong>do</strong> a um interesse público, mas, <strong>de</strong><br />

qualquer forma, é uma escolha clara e que não po<strong>de</strong> ser simplesmente <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rada.<br />

Há, entretanto, <strong>do</strong>utrina crítica à opção legislativa:<br />

“A ratio <strong>de</strong>sse dispositivo é a <strong>de</strong> não prejudicar o andamento da ação proposta pelo consumi<strong>do</strong>r, mas, como já <strong>de</strong>staquei alhures,<br />

essa limitação po<strong>de</strong> violar o direito <strong>de</strong> acesso à justiça <strong>do</strong> réu, que seria facilita<strong>do</strong> pela via da ação regressiva”146.<br />

Compreen<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-se a ratio da norma, fica mais fácil <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r uma visão intermediária entre a vedação expressa prevista no<br />

art. 88 <strong>do</strong> CDC e a admissão aparentemente genérica <strong>do</strong> art. 125, II, <strong>do</strong> Novo CPC. Se o objetivo da vedação é proteger o<br />

consumi<strong>do</strong>r, evitan<strong>do</strong> uma <strong>de</strong>mora maior no tempo <strong>de</strong> duração <strong>de</strong> seu processo, parece ser viável que o consumi<strong>do</strong>r no caso


concreto renuncie a essa proteção legal, admitin<strong>do</strong> expressamente a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> realizada pelo réu.<br />

É preciso lembrar que, ainda que <strong>de</strong>va arcar com os ônus <strong>de</strong> um tempo maior <strong>de</strong> duração <strong>do</strong> processo, o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>rá<br />

ser beneficia<strong>do</strong> pela existência <strong>de</strong> varia<strong>do</strong>s réus con<strong>de</strong>na<strong>do</strong>s no momento em que o processo chegar à fase <strong>de</strong> cumprimento <strong>de</strong><br />

sentença. O raciocínio é simples: quanto mais réus tiverem si<strong>do</strong> con<strong>de</strong>na<strong>do</strong>s a ressarcir o dano suporta<strong>do</strong> pelo consumi<strong>do</strong>r, mais<br />

extenso será o patrimônio disponível para garantir a satisfação <strong>de</strong> seu direito.<br />

É possível que o autor-consumi<strong>do</strong>r, por ignorância ou <strong>de</strong>sconhecimento, ajuíze a <strong>de</strong>manda reparatória contra réu que não<br />

tenha condição patrimonial confortável, existin<strong>do</strong> outros responsáveis solidários com condições muito mais a<strong>de</strong>quada a garantir a<br />

futura satisfação <strong>de</strong> seu direito. Uma vez sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> à li<strong>de</strong> um <strong>de</strong>sses sujeitos, enten<strong>do</strong> ser possível que o autor autorize a<br />

<strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, já pensan<strong>do</strong> na melhor condição <strong>de</strong> satisfação <strong>de</strong> seu direito no momento da execução.<br />

Po<strong>de</strong>r-se-ia, inclusive, a<strong>do</strong>tar por analogia o procedimento da nomeação à autoria, espécie <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> terceiro que<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> anuência <strong>do</strong> autor. Dessa forma, uma vez <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> à li<strong>de</strong> um terceiro no processo consumerista, <strong>de</strong>veria ser o autor<br />

intima<strong>do</strong> para se manifestar no prazo <strong>de</strong> cinco dias. Aceitan<strong>do</strong> expressamente ou silencian<strong>do</strong>, o que seria compreendi<strong>do</strong> como<br />

aceitação tácita, a <strong>de</strong>nunciação será admitida e o terceiro cita<strong>do</strong> para integrar o polo passivo da <strong>de</strong>manda; rejeitan<strong>do</strong>, o prazo <strong>de</strong><br />

resposta seria <strong>de</strong>volvi<strong>do</strong> na íntegra para o réu, que continuaria a compor sozinho o polo passivo.<br />

Note-se, entretanto, que, para que tenha algum senti<strong>do</strong> o entendimento ora <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong>, é imprescindível se apontar o equívoco<br />

<strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r no tocante à intervenção <strong>de</strong> terceiro nas situações <strong>de</strong>scritas pelos dispositivos analisa<strong>do</strong>s. Como já menciona<strong>do</strong>, a<br />

<strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> tem com fundamento a existência <strong>de</strong> um direito regressivo da parte contra um terceiro, que é responsável por<br />

ressarcir seus eventuais danos advin<strong>do</strong>s <strong>do</strong> processo judicial. Nessa espécie <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> terceiro não existe relação jurídica<br />

<strong>de</strong> direito material entre o terceiro e a parte contrária, <strong>de</strong> forma que não se po<strong>de</strong> admitir uma con<strong>de</strong>nação direta <strong>do</strong> <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> em<br />

favor da parte contrária. A <strong>do</strong>utrina majoritária, justamente com fundamento na inexistência <strong>de</strong> relação jurídica <strong>de</strong> direito material<br />

entre a parte contrária e o <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong>, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> con<strong>de</strong>nação direta <strong>do</strong> <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> à li<strong>de</strong>, afirman<strong>do</strong> que as<br />

duas <strong>de</strong>mandas existentes (autor-réu e <strong>de</strong>nunciante-<strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong>) são <strong>de</strong>cididas <strong>de</strong> forma autônoma, em diferentes capítulos, o que<br />

inviabiliza essa con<strong>de</strong>nação direta147. Mesmo <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> litisconsorte <strong>do</strong> <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> afirmam<br />

que essa qualida<strong>de</strong> jurídica processual não é suficiente para a con<strong>de</strong>nação direta 148 .<br />

Dessa forma, se realmente se tratasse <strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> a intervenção prevista pela combinação <strong>do</strong>s arts. 13 e 88 <strong>do</strong><br />

CDC, nenhuma vantagem possível haveria para o autor-consumi<strong>do</strong>r, que teria to<strong>do</strong> o ônus <strong>de</strong> arcar com a presença <strong>do</strong> terceiro em<br />

seu processo sem po<strong>de</strong>r executá-lo diretamente. Ocorre, entretanto, que, sen<strong>do</strong> os sujeitos <strong>de</strong>scritos no art. 13 <strong>do</strong> CDC<br />

responsáveis solidários, a intervenção <strong>de</strong> qualquer um <strong>de</strong>les por iniciativa <strong>do</strong> réu é na realida<strong>de</strong> um chamamento ao processo.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, a melhor <strong>do</strong>utrina:<br />

“Em primeiro lugar, cumpre observar se a situação prevista no art. 88 <strong>do</strong> CDC enseja realmente <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>. É que, por<br />

força <strong>do</strong> parágrafo único <strong>do</strong> art. 7.º <strong>do</strong> CDC, há responsabilida<strong>de</strong> solidária <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s aqueles que tenham participa<strong>do</strong> da ca<strong>de</strong>ia<br />

produtiva (produtor, importa<strong>do</strong>r, distribui<strong>do</strong>r etc.). Ora, como hipótese <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> solidária, a modalida<strong>de</strong> interventiva<br />

cabível é o chamamento ao processo. Na verda<strong>de</strong>, não obstante a letra da lei, a proibição não diz respeito à <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>,<br />

mas, sim, ao chamamento ao processo” 149 .<br />

Por outro la<strong>do</strong>, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça vem admitin<strong>do</strong> a con<strong>de</strong>nação direta <strong>do</strong> <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> à li<strong>de</strong>, <strong>de</strong> forma a habilitar o<br />

autor a executar tanto o réu originário como também o <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> à li<strong>de</strong>150. Dessa forma, mesmo que se admita haver uma<br />

<strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> na hipótese ora analisada, po<strong>de</strong>rá tal forma <strong>de</strong> intervenção ser vantajosa ao consumi<strong>do</strong>r no momento<br />

executivo.<br />

Conclusivamente, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, conforme previsto em lei, ou chamamento ao processo, como <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong><br />

corretamente pela <strong>do</strong>utrina, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o autor-consumi<strong>do</strong>r concordar ou não com a intervenção provocada pelo réufornece<strong>do</strong>r<br />

seria saudável medida visan<strong>do</strong> à criação <strong>de</strong> melhores condições à satisfação <strong>do</strong> direito.<br />

10.5.2.2.2.<br />

Nova causa <strong>de</strong> pedir em razão da <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong><br />

O segun<strong>do</strong> argumento para justificar a vedação contida no art. 88 <strong>do</strong> CDC é o <strong>de</strong> que, com a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>,<br />

invariavelmente se verifica uma ampliação objetiva da <strong>de</strong>manda, já que essa forma <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> terceiro em regra leva ao<br />

processo uma nova causa <strong>de</strong> pedir, estranha ao objeto <strong>do</strong> processo principal 151 . Existe um interessante <strong>de</strong>bate <strong>do</strong>utrinário a respeito<br />

da real amplitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> art. 125, II, <strong>do</strong> Novo CPC, envolven<strong>do</strong> a questão relativa à garantia própria (referente à transmissão <strong>de</strong><br />

direito) e imprópria (referente à responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>de</strong> ressarcimento <strong>de</strong> dano).<br />

Para parcela da <strong>do</strong>utrina, não po<strong>de</strong> a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> levar ao processo um fundamento jurídico novo, que não estivesse<br />

presente na <strong>de</strong>manda originária, salvo a responsabilida<strong>de</strong> direta <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> lei ou contrato. Reconhecen<strong>do</strong> que sempre haverá


uma ampliação objetiva da <strong>de</strong>manda em razão da <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, essa parcela da <strong>do</strong>utrina enten<strong>de</strong> que tal ampliação <strong>de</strong>ve ser<br />

mínima, não se admitin<strong>do</strong> que se exija <strong>do</strong> juiz o enfrentamento da questão referente ao direito regressivo. Quan<strong>do</strong> menciona a<br />

responsabilida<strong>de</strong> direta, quer essa <strong>do</strong>utrina dizer que o direito regressivo tem que ser natural e indiscutível diante <strong>do</strong> dano<br />

suporta<strong>do</strong> pela parte <strong>de</strong>nunciante, o que não exigirá <strong>do</strong> juiz o enfrentamento <strong>de</strong> novas questões relativas a esse direito, limitan<strong>do</strong>-se<br />

o julga<strong>do</strong>r a, uma vez con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> o <strong>de</strong>nunciante, automaticamente con<strong>de</strong>nar o <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> ao ressarcimento152.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, em teoria que merece ser acolhida, parcela da <strong>do</strong>utrina <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> um entendimento significativamente amplo<br />

para o art. 125, II, <strong>do</strong> Novo CPC, afirman<strong>do</strong> basicamente que as diferenças entre a garantia própria e imprópria e correspon<strong>de</strong>ntes<br />

institutos jurídicos a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s para sua discussão em termos <strong>de</strong> direito regressivo, teoricamente existentes na Itália, não po<strong>de</strong>m<br />

contaminar o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>do</strong> tema no Brasil. Nosso direito não prevê diferença entre a garantia própria e a imprópria, <strong>de</strong><br />

forma que não será legítimo o intérprete criar essa diferença não prevista em lei para limitar a abrangência <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciar<br />

da li<strong>de</strong> o responsável regressivo 153 .<br />

Dessa forma, ainda que a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> leve ao processo um fundamento jurídico novo, funda<strong>do</strong> na existência ou não <strong>do</strong><br />

direito <strong>de</strong> regresso no caso concreto, esta <strong>de</strong>ve ser admitida. Dentro da concepção <strong>de</strong> efetivida<strong>de</strong> <strong>do</strong> processo, da celerida<strong>de</strong><br />

processual e da harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s <strong>de</strong>riva<strong>do</strong>s da <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, não se admite que tais princípios sejam sacrifica<strong>do</strong>s<br />

pela interpretação restritiva <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> terceiro, até mesmo porque tal entendimento impediria a situação mais<br />

frequente <strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, que envolve segura<strong>do</strong> e segura<strong>do</strong>ra, na qual evi<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong>verá ser enfrentada e <strong>de</strong>cidida no<br />

processo não só a existência <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> regresso alega<strong>do</strong> pelo <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong>, como também a sua extensão 154 .<br />

Como a<strong>do</strong>to a teoria que admite a ampliação da causa <strong>de</strong> pedir por meio da <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, não concor<strong>do</strong> com essa<br />

segunda justificativa para a vedação contida no art. 88 <strong>do</strong> CDC. A vinda <strong>de</strong> nova causa <strong>de</strong> pedir parece ser natural ao instituto em<br />

comento, em especial nas relações consumeristas. Na realida<strong>de</strong>, a preocupação com o aumento <strong>de</strong> causas <strong>de</strong> pedir na <strong>de</strong>manda<br />

reflete na preocupação exposta no item anterior, <strong>de</strong> que o processo passe a <strong>de</strong>morar mais <strong>do</strong> que <strong>de</strong>moraria sem a <strong>de</strong>nunciação da<br />

li<strong>de</strong>. Mais uma vez, portanto, lembro que a economia macroscópica <strong>de</strong>ve prevalecer diante da economia microscópica, mas se a<br />

opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r foi afastar essa forma mais ampla <strong>de</strong> economia processual para a proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r no caso concreto,<br />

cabe ao opera<strong>do</strong>r <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> respeitá-la.<br />

10.5.2.2.3.<br />

Abrangência da vedação legal<br />

O art. 88 <strong>do</strong> CDC, ao impedir a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, prevê que a vedação <strong>de</strong>ssa forma <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> terceiro se dê<br />

somente na hipótese <strong>do</strong> art. 13, parágrafo único <strong>do</strong> mesmo diploma legal. Como esse dispositivo está conti<strong>do</strong> no capítulo da<br />

“responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto e <strong>do</strong> serviço”, há certa divergência <strong>do</strong>utrinária a respeito <strong>do</strong> âmbito <strong>de</strong> aplicação da<br />

vedação legal.<br />

Para parcela da <strong>do</strong>utrina, embora numa interpretação literal possa se dizer que a vedação não alcança outras <strong>de</strong>mandas<br />

consumeristas que versem sobre outro objeto que não a responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço, é preferível se valer<br />

da vedação para qualquer hipótese que envolva o consumi<strong>do</strong>r no polo ativo e o fornece<strong>do</strong>r no polo passivo. Para essa corrente<br />

<strong>do</strong>utrinária, “a remissão apenas aos casos <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> por fato <strong>do</strong> produto, e não aos <strong>de</strong>mais, contu<strong>do</strong>, não se justifica. É<br />

que também nas outras hipóteses <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> po<strong>de</strong>m existir vários responsáveis – fornece<strong>do</strong>res que compõem a ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

consumo –, cuja permissão <strong>de</strong> ingresso em juízo, contra a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r-autor (que não os escolheu como réus, embora<br />

pu<strong>de</strong>sse fazê-lo, repita-se, em razão da solidarieda<strong>de</strong>), po<strong>de</strong>ria ser-lhe bastante prejudicial. A analogia, aqui, se impõe”155.<br />

O entendimento é lógico, funda<strong>do</strong> nos objetivos pretendi<strong>do</strong>s pelo legisla<strong>do</strong>r. Se a premissa da vedação é proteger o<br />

consumi<strong>do</strong>r, evitan<strong>do</strong> que seja obriga<strong>do</strong> a litigar contra quem não escolheu para compor o polo passivo, não há razão para uma<br />

interpretação restritiva. O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, entretanto, vinha enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> limitar a vedação legal nos<br />

termos da lei, admitin<strong>do</strong> a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> nas hipóteses <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> por vício <strong>do</strong> produto e <strong>do</strong> serviço:<br />

“Recurso especial. Ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização. Relação consumerista. Defeito no serviço. Decadência (art. 26 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r). Inaplicabilida<strong>de</strong>. Denunciação da li<strong>de</strong>. Impossibilida<strong>de</strong>, in casu. Petição inicial. Documentos indispensáveis à<br />

propositura da ação. Acórdão recorri<strong>do</strong> em harmonia com o entendimento <strong>de</strong>sta corte. Litigância <strong>de</strong> má-fé. Não ocorrência. Recurso<br />

improvi<strong>do</strong>. 1. Na discussão acerca <strong>do</strong> <strong>de</strong>feito no serviço, previsto na Seção II <strong>do</strong> Capítulo IV <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r,<br />

aplica-se o art. 27 <strong>do</strong> referi<strong>do</strong> diploma legal, segun<strong>do</strong> o qual o prazo é prescricional, <strong>de</strong> 5 (cinco) anos, a partir <strong>do</strong> conhecimento <strong>do</strong><br />

dano e da sua autoria. 2. Nas relações <strong>de</strong> consumo, a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> é vedada apenas na responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto<br />

(art. 13 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r), admitin<strong>do</strong>-o nos casos <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito no serviço (art. 14 <strong>do</strong> CDC), <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que preenchi<strong>do</strong>s<br />

os requisitos <strong>do</strong> art. 70 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil, inocorrente, na espécie. 3. Está em harmonia com entendimento <strong>de</strong>sta Corte<br />

Superior <strong>de</strong> Justiça o julgamento proferi<strong>do</strong> pelo Tribunal <strong>de</strong> origem no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que os <strong>do</strong>cumentos indispensáveis à propositura<br />

da ação são os aptos a comprovar a presença das condições da ação. 4. A aplicação <strong>de</strong> penalida<strong>de</strong>s por litigância <strong>de</strong> má-fé exige<br />

<strong>do</strong>lo específico. 5. Recurso improvi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1.123.195/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Massami Uyeda – j. 16.12.2011 –


DJe 03.02.2011)156.<br />

Mais uma vez <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> que a segurança jurídica não vem sen<strong>do</strong> a tônica na atuação <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça,<br />

também há <strong>de</strong>cisão no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong> no texto, publicada no Informativo 498, em entendimento que restou consagra<strong>do</strong> naquele<br />

tribunal 157 :<br />

“Denunciação da li<strong>de</strong>. CDC. Defeito na prestação <strong>de</strong> serviço.<br />

A Turma, ao rever orientação <strong>do</strong>minante <strong>de</strong>sta Corte, assentou que é incabível a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> nas ações in<strong>de</strong>nizatórias<br />

<strong>de</strong>correntes da relação <strong>de</strong> consumo seja no caso <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto, seja no caso <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> pelo fato<br />

<strong>do</strong> serviço (arts. 12 a 17 <strong>do</strong> CDC). Asseverou o Min. Relator que, segun<strong>do</strong> melhor exegese <strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong> normativo <strong>do</strong> art. 88 <strong>do</strong><br />

CDC, a vedação ao direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> não se restringiria exclusivamente à responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> comerciante pelo fato <strong>do</strong><br />

produto (art. 13 <strong>do</strong> CDC), mas a to<strong>do</strong> e qualquer responsável (real, aparente ou presumi<strong>do</strong>) que in<strong>de</strong>nize os prejuízos sofri<strong>do</strong>s pelo<br />

consumi<strong>do</strong>r. Segun<strong>do</strong> afirmou, a proibição <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> regresso na mesma ação objetiva evitar a procrastinação <strong>do</strong> feito, ten<strong>do</strong> em<br />

vista a <strong>de</strong>dução no processo <strong>de</strong> uma nova causa <strong>de</strong> pedir, com fundamento distinto da formulada pelo consumi<strong>do</strong>r, qual seja, a<br />

discussão da responsabilida<strong>de</strong> subjetiva. Destacou-se, ainda, que a única hipótese na qual se admite a intervenção <strong>de</strong> terceiro nas<br />

ações que versem sobre relação <strong>de</strong> consumo é o caso <strong>de</strong> chamamento ao processo <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>r – nos contratos <strong>de</strong> seguro celebra<strong>do</strong><br />

pelos fornece<strong>do</strong>res para garantir a sua responsabilida<strong>de</strong> pelo fato <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço (art. 101, II, <strong>do</strong> CDC). Com base nesse<br />

entendimento, a Turma negou provimento ao recurso especial para manter a exclusão <strong>de</strong> empresa presta<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> serviço da ação em<br />

que se pleiteia compensação por danos morais em razão <strong>de</strong> instalação in<strong>de</strong>vida <strong>de</strong> linhas telefônicas em nome <strong>do</strong> autor e posterior<br />

inscrição <strong>de</strong> seu nome em cadastro <strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>res <strong>de</strong> inadimplentes. REsp 1.165.279-SP, Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino, j.<br />

22.05.2012”.<br />

De qualquer maneira, mesmo nas hipóteses <strong>de</strong> vedação, uma vez ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> realizada a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> e o processo se<br />

<strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong> com o terceiro atuan<strong>do</strong> no processo, não há razoabilida<strong>de</strong> para a anulação <strong>do</strong> processo. Nesse senti<strong>do</strong>, corretamente<br />

já <strong>de</strong>cidiu o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“Processo civil. Denunciação da li<strong>de</strong>. Ainda que a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> tenha si<strong>do</strong> mal in<strong>de</strong>ferida, não se justifica, na instância<br />

especial, já adianta<strong>do</strong> o esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo, restabelecer o procedimento legal, porque a finalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> instituto (economia<br />

processual) seria, nesse caso, contrariada. Civil. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Nada importa que, no processo criminal, o réu tenha si<strong>do</strong><br />

absolvi<strong>do</strong> por falta <strong>de</strong> provas; a instância cível é autônoma. Recursos especiais não conheci<strong>do</strong>s” (STJ – REsp 170.681/RJ – Terceira<br />

Turma – Rel. Min. Ari Pargendler – j. 01.04.2008 – DJe 15.04.2008).<br />

10.5.3.<br />

Chamamento ao processo<br />

10.5.3.1.<br />

Introdução<br />

Da leitura das três hipóteses <strong>de</strong> cabimento <strong>do</strong> chamamento ao processo previstas pelo art. 130 <strong>do</strong> Novo CPC, conclui-se que<br />

essa espécie <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> terceiro tem forte ligação com as situações <strong>de</strong> garantia simples, nas quais se verifique uma<br />

coobrigação gerada pela existência <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> um responsável pelo cumprimento da obrigação perante o cre<strong>do</strong>r. O art. 130, I, <strong>do</strong><br />

Novo CPC trata da relação entre <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r principal e fia<strong>do</strong>r, o art. 130, II, <strong>do</strong> Novo CPC, da relação entre fia<strong>do</strong>res, e o art. 130, III,<br />

<strong>do</strong> Novo CPC, <strong>do</strong>s <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>res solidários. Trata-se <strong>de</strong> espécie coercitiva <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> terceiro158, pela qual o terceiro será<br />

integra<strong>do</strong> à relação jurídica processual em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> réu e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da sua concordância.<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 101, II, <strong>do</strong> CDC, o réu que tiver um contrato <strong>de</strong> seguro po<strong>de</strong>rá chamar ao processo o segura<strong>do</strong>r, sen<strong>do</strong> veda<strong>do</strong> o<br />

ingresso na <strong>de</strong>manda <strong>do</strong> Instituto <strong>de</strong> Resseguros <strong>do</strong> Brasil. Essa parte inicial <strong>do</strong> dispositivo legal <strong>de</strong>ve ser analisada em duas etapas<br />

distintas.<br />

10.5.3.2.<br />

Espécie atípica <strong>de</strong> chamamento ao processo<br />

O dispositivo legal <strong>de</strong>monstra <strong>de</strong> maneira <strong>de</strong>finitiva que a Lei 8.078/1990 não respeitou o conceito das intervenções <strong>de</strong><br />

terceiro típicas previstas pelo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Como já afirma<strong>do</strong>, no art. 88 <strong>do</strong> CDC há menção à <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong><br />

quan<strong>do</strong> na realida<strong>de</strong> o correto seria a previsão <strong>de</strong> chamamento ao processo, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a responsabilida<strong>de</strong> solidária pelo<br />

ressarcimento <strong>de</strong> danos suporta<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s que participaram da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> serviços ou alienação <strong>de</strong><br />

produtos. No art. 101, II, <strong>do</strong> CDC, há previsão <strong>de</strong> chamamento ao processo quan<strong>do</strong> o correto seria a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>,<br />

consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a natureza <strong>de</strong> direito regressivo existente entre segura<strong>do</strong> e segura<strong>do</strong>ra.<br />

Ocorre, entretanto, que se o art. 88 <strong>do</strong> CDC não tem muita justificativa para o equívoco quanto à espécie <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong><br />

terceiro cabível, o mesmo não se po<strong>de</strong> dizer <strong>do</strong> art. 101, II, <strong>do</strong> CDC, que, ao prever o chamamento ao processo <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>r, foi


ainda mais longe para <strong>de</strong>terminar expressamente a aplicação <strong>do</strong> art. 132 <strong>do</strong> Novo CPC à sentença que julgar proce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong>,<br />

con<strong>de</strong>nan<strong>do</strong>-se solidariamente o segura<strong>do</strong> e o segura<strong>do</strong>r.<br />

A proposital confusão foi bem notada pela melhor <strong>do</strong>utrina:<br />

“Interessante pôr em <strong>de</strong>staque que, fosse a matéria regulada pelo Código <strong>de</strong> Processo Civil, a hipótese <strong>de</strong> chamamento ao processo<br />

que se acabou <strong>de</strong> ver seria <strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciação a li<strong>de</strong>. Entretanto, na <strong>de</strong>nunciação nunca o <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> pelo réu po<strong>de</strong>ria ficar diretamente<br />

responsável perante o autor. Assim, o instituto <strong>do</strong> chamamento ao processo foi usa<strong>do</strong> pelo Código <strong>de</strong> Proteção e Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r, mas com contornos diversos <strong>do</strong>s traça<strong>do</strong>s pelo Código <strong>de</strong> Processo Civil, visan<strong>do</strong>, com tal atitu<strong>de</strong>, a uma maior<br />

garantia <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (vítima ou sucessores)”159.<br />

O legisla<strong>do</strong>r consumerista criou uma nova forma <strong>de</strong> chamamento ao processo, crian<strong>do</strong> uma verda<strong>de</strong>ira responsabilida<strong>de</strong><br />

solidária entre segura<strong>do</strong> e segura<strong>do</strong>ra pelo ressarcimento <strong>do</strong>s prejuízos suporta<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r. É curioso que, para essa forma<br />

<strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> terceiro, o legisla<strong>do</strong>r não tenha se preocupa<strong>do</strong> com a <strong>de</strong>mora procedimental que naturalmente o chamamento ao<br />

processo <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> acarretará. Pensou antes na expressa permissão <strong>de</strong> con<strong>de</strong>nação direta <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>r em benefício <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, no tocante à condição patrimonial para futura satisfação <strong>de</strong> seu direito. Criou uma con<strong>de</strong>nação direta que no sistema<br />

<strong>de</strong> intervenções <strong>de</strong> terceiro não existia e, mesmo permitin<strong>do</strong> que a intervenção regulada pelo art. 101, II, <strong>do</strong> CDC, postergue a<br />

entrega da prestação jurisdicional ao consumi<strong>do</strong>r, a mera responsabilização direta <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> é o suficiente para esse inevitável<br />

retardamento.<br />

A engenhosa criação legislativa, amplamente favorável ao consumi<strong>do</strong>r, no tocante às condições <strong>de</strong> efetivamente satisfazer<br />

uma eventual sentença con<strong>de</strong>natória, certamente foi saudada como inova<strong>do</strong>ra nos primeiros anos <strong>de</strong> aplicação <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Afinal, como lembra a melhor <strong>do</strong>utrina, o tipo <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> trata<strong>do</strong> pelo dispositivo legal “seria<br />

típico <strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> e não <strong>de</strong> chamamento ao processo, já que esta última modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> terceiro<br />

pressupõe solidarieda<strong>de</strong> passiva entre os responsáveis pela reparação, o que, evi<strong>de</strong>ntemente, não há entre segura<strong>do</strong>r e segura<strong>do</strong>, em<br />

face <strong>do</strong> autor da ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização” 160 .<br />

Atualmente, entretanto, a previsão parece não ser mais tão relevante quanto outrora se mostrou, em especial quan<strong>do</strong> se<br />

consi<strong>de</strong>ra o entendimento consagra<strong>do</strong> no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça a respeito da <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> da segura<strong>do</strong>ra.<br />

O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, nas <strong>de</strong>mandas envolven<strong>do</strong> <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> <strong>de</strong> segura<strong>do</strong>ra, vem enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> que, por haver<br />

entre <strong>de</strong>nunciante e <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> uma relação litisconsorcial, nos termos <strong>do</strong> art. 128, I, <strong>do</strong> Novo CPC, a con<strong>de</strong>nação da <strong>de</strong>manda<br />

originária cria uma responsabilida<strong>de</strong> solidária <strong>de</strong> ambos perante a parte contrária, admitin<strong>do</strong>-se que a execução seja movida<br />

diretamente contra o <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong>. A tese vem, inclusive, sen<strong>do</strong> ampliada para se permitir a execução direta <strong>do</strong> <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> para<br />

qualquer hipótese <strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>161.<br />

É interessante notar que muitas <strong>de</strong>ssas <strong>de</strong>cisões fundamentam-se em questões pragmáticas, na busca <strong>de</strong> uma maior efetivida<strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> processo. Afirma-se que diversas vezes o causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano, con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> na <strong>de</strong>manda em que figurou como réu, não tem<br />

condições <strong>de</strong> ressarcir a vítima <strong>do</strong> ato danoso, <strong>de</strong> forma que não sofre real prejuízo econômico, o que inviabiliza a cobrança <strong>de</strong>sse<br />

valor da segura<strong>do</strong>ra. O processo, portanto, fica trava<strong>do</strong>; a vítima tem <strong>de</strong>cisão a seu favor e merece receber, bem como o causa<strong>do</strong>r<br />

<strong>do</strong> dano tem <strong>de</strong>cisão contra a segura<strong>do</strong>ra, mas, por ausência <strong>de</strong> condições financeiras <strong>do</strong> causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano em satisfazer a vítima, o<br />

cre<strong>do</strong>r originário – vítima – não recebe, e com isso o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r final – segura<strong>do</strong>ra – não precisa pagar nada. Para evitar tal situação<br />

<strong>de</strong> impasse e frustração <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> processo, aplica-se a literalida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s arts. 127 e 128, I, <strong>do</strong> Novo CPC, admitin<strong>do</strong>-se o<br />

litisconsórcio entre <strong>de</strong>nunciante e <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong>, o que permitirá a con<strong>de</strong>nação e execução direta <strong>de</strong>sse último.<br />

Há, entretanto, justificativas mais técnicas, ora pela aplicação <strong>do</strong>s arts. 787 e 788 <strong>do</strong> CC, ora pela aplicação <strong>do</strong> art. 436 <strong>do</strong> CC,<br />

ao interpretar o contrato <strong>de</strong> seguro como <strong>de</strong> estipulação em favor <strong>de</strong> terceiro 162 . A função social <strong>do</strong> contrato justificaria a proteção<br />

<strong>de</strong> vítima <strong>de</strong> ato ilícito pratica<strong>do</strong> por um <strong>do</strong>s contratantes (segura<strong>do</strong>) que tenha suporta<strong>do</strong> algum dano, ainda que não faça parte da<br />

relação jurídica contratual.<br />

Seja como for, com argumentos mais pragmáticos ou mais técnicos, a realida<strong>de</strong> é que o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça já vinha<br />

admitin<strong>do</strong> a con<strong>de</strong>nação direta da segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>nunciada à li<strong>de</strong> pelo réu, o que tornava a previsão <strong>do</strong> art. 101, II, <strong>do</strong> CDC<br />

<strong>de</strong>snecessária. A posição jurispru<strong>de</strong>ncial se consoli<strong>do</strong>u em lei, conforme se constata <strong>do</strong> parágrafo único <strong>do</strong> art. 128 <strong>do</strong> Novo CPC,<br />

que expressamente permite o cumprimento da sentença também contra o <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong>, nos limites da con<strong>de</strong>nação <strong>de</strong>ste na ação<br />

regressiva.<br />

10.5.3.3.<br />

Ação diretamente proposta contra a segura<strong>do</strong>ra<br />

O art. 101, II, <strong>do</strong> CDC cria, pela aplicação <strong>do</strong> instituto <strong>do</strong> chamamento ao processo, uma responsabilida<strong>de</strong> solidária entre<br />

fornece<strong>do</strong>r e segura<strong>do</strong>r para o ressarcimento <strong>do</strong>s danos suporta<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r. O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, por


fundamentos varia<strong>do</strong>s, permite a con<strong>de</strong>nação direta da segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>nunciada à li<strong>de</strong>, ainda que não exista na <strong>de</strong>manda relação <strong>de</strong><br />

consumo, crian<strong>do</strong>, jurispru<strong>de</strong>ncialmente, uma responsabilida<strong>de</strong> solidária <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> e segura<strong>do</strong>ra perante a vítima <strong>do</strong> ato<br />

ilícito163.<br />

Não <strong>de</strong>morou muito para surgirem <strong>de</strong>cisões que, para manter a coerência <strong>do</strong> raciocínio, permitem o ingresso da <strong>de</strong>manda<br />

diretamente contra a segura<strong>do</strong>ra, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong>-se fora <strong>de</strong>la o causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano, ou mesmo a formação <strong>de</strong> litisconsórcio passivo inicial<br />

entre eles, justamente em razão da solidarieda<strong>de</strong> existente entre ambos:<br />

“Civil. Seguro. Ação in<strong>de</strong>nizatória. Denunciação. Acolhimento. Segura<strong>do</strong>ra. Responsabilida<strong>de</strong> solidária. Decorrência. Título<br />

judicial. Cláusula contratual. Sistema <strong>de</strong> reembolso. Aplicação restrita ao âmbito administrativo. I – O entendimento <strong>de</strong>sta Corte é<br />

assente no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que, em razão da estipulação contratual em favor <strong>de</strong> terceiro existente na apólice, a segura<strong>do</strong>ra po<strong>de</strong> ser<br />

<strong>de</strong>mandada diretamente para pagar a in<strong>de</strong>nização. II – Se a segura<strong>do</strong>ra po<strong>de</strong>ria ter si<strong>do</strong> <strong>de</strong>mandada diretamente, não resta dúvida <strong>de</strong><br />

que, ao ingressar no feito por <strong>de</strong>nunciação, assumiu a condição <strong>de</strong> litisconsorte. Nessa situação, submete-se à coisa julgada e, no<br />

caso <strong>de</strong> con<strong>de</strong>nação, é legitimada para figurar no polo passivo da execução, caben<strong>do</strong>-lhe o adimplemento <strong>do</strong> débito nos limites da<br />

sua responsabilida<strong>de</strong>. III – Julga<strong>do</strong> proce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong> in<strong>de</strong>nizatório e a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong>, a responsabilida<strong>de</strong> solidária da<br />

segura<strong>do</strong>ra passa a ser fundada no título judicial e não no contrato. Assim, sem perquirir acerca da nulida<strong>de</strong> ou abusivida<strong>de</strong> da<br />

cláusula preven<strong>do</strong> que a segura<strong>do</strong>ra será responsabilizada apenas pelo reembolso ao segura<strong>do</strong>, conclui-se ficar restrita sua aplicação<br />

aos pagamentos efetua<strong>do</strong>s administrativamente. No que sobejar, a execução po<strong>de</strong>rá ser intentada contra segura<strong>do</strong>ra. Recurso<br />

provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 713115/MG – Terceira Turma – Rel. Min. Castro Filho – j. 21.11.2006 – DJ 04.12.2006). 164<br />

Em clara <strong>de</strong>monstração da insegurança jurídica gerada por <strong>de</strong>cisões contraditórias <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, a 2.ª Seção,<br />

em julgamento publica<strong>do</strong> no Informativo 490, <strong>de</strong>cidiu que a legitimida<strong>de</strong> passiva da segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da presença <strong>do</strong> segura<strong>do</strong><br />

no polo passivo da <strong>de</strong>manda:<br />

“Recurso repetitivo. Seguro <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil. Ajuizamento direto exclusivamente contra a segura<strong>do</strong>ra.<br />

A Seção firmou o entendimento <strong>de</strong> que <strong>de</strong>scabe ação <strong>do</strong> terceiro prejudica<strong>do</strong> ajuizada, direta e exclusivamente, em face da<br />

segura<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> aponta<strong>do</strong> causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano, porque, no seguro <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil facultativo, a obrigação da segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong><br />

ressarcir os danos sofri<strong>do</strong>s por terceiros pressupõe a responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>, a qual, <strong>de</strong> regra, não po<strong>de</strong>rá ser reconhecida<br />

em <strong>de</strong>manda na qual este não interveio, sob pena <strong>de</strong> vulneração <strong>do</strong> <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> processo legal e da ampla <strong>de</strong>fesa. Esse posicionamento<br />

fundamenta-se no fato <strong>de</strong> o seguro <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil facultativa ter por finalida<strong>de</strong> neutralizar a obrigação <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> em<br />

in<strong>de</strong>nizar danos causa<strong>do</strong>s a terceiros nos limites <strong>do</strong>s valores contrata<strong>do</strong>s, após a obrigatória verificação da responsabilida<strong>de</strong> civil <strong>do</strong><br />

segura<strong>do</strong> no sinistro. Em outras palavras, a obrigação da segura<strong>do</strong>ra está sujeita à condição suspensiva que não se implementa pelo<br />

simples fato <strong>de</strong> ter ocorri<strong>do</strong> o sinistro, mas somente pela verificação da eventual obrigação civil <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>. Isso porque o seguro<br />

<strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> civil facultativo não é espécie <strong>de</strong> estipulação a favor <strong>de</strong> terceiro alheio ao negócio, ou seja, quem sofre o<br />

prejuízo não é beneficiário <strong>do</strong> negócio, mas sim o causa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> dano. Acrescente-se, ainda, que o ajuizamento direto exclusivamente<br />

contra a segura<strong>do</strong>ra ofen<strong>de</strong> os princípios <strong>do</strong> contraditório e da ampla <strong>de</strong>fesa, pois a ré não teria como <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r-se <strong>do</strong>s fatos expostos<br />

na inicial, especialmente da <strong>de</strong>scrição <strong>do</strong> sinistro. Essa situação inviabiliza, também, a verificação <strong>de</strong> fato extintivo da cobertura<br />

securitária; pois, a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r das circunstâncias em que o segura<strong>do</strong> se envolveu no sinistro (embriaguez voluntária ou prática <strong>de</strong> ato<br />

<strong>do</strong>loso pelo segura<strong>do</strong>, por exemplo), po<strong>de</strong>ria a segura<strong>do</strong>ra eximir-se da obrigação contratualmente assumida. REsp 962.230-RS,<br />

Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julga<strong>do</strong> em 08.02.2012”.<br />

Prefiro o segun<strong>do</strong> entendimento, que cria uma especial situação <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> passiva concorrente e conjunta <strong>de</strong> segura<strong>do</strong>ra<br />

e segura<strong>do</strong>, porque não há como se discordar <strong>do</strong> fundamento utiliza<strong>do</strong> no julgamento supracita<strong>do</strong> <strong>de</strong> violação aos princípios <strong>do</strong><br />

contraditório e ampla <strong>de</strong>fesa na hipótese <strong>de</strong> a segura<strong>do</strong>ra ser <strong>de</strong>mandada sozinha. Como po<strong>de</strong>rá impugnar os fatos constitutivos <strong>do</strong><br />

direito <strong>do</strong> autor se não teve qualquer participação na situação fática <strong>de</strong>scrita na petição inicial?<br />

Seja como for, isoladamente ou em conjunto com o segura<strong>do</strong>, a legitimida<strong>de</strong> da segura<strong>do</strong>ra afasta a aplicabilida<strong>de</strong> da parte<br />

final <strong>do</strong> art. 101, II, <strong>do</strong> CDC, que prevê que somente na hipótese <strong>de</strong> o réu ser <strong>de</strong>clara<strong>do</strong> fali<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>ria ingressar com<br />

a ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização diretamente contra o segura<strong>do</strong>r. Na realida<strong>de</strong>, não há qualquer necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> falência <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>, caben<strong>do</strong><br />

o ingresso <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r diretamente contra a segura<strong>do</strong>ra em qualquer hipótese, tu<strong>do</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua vonta<strong>de</strong> na composição<br />

<strong>do</strong> polo passivo, que inclusive po<strong>de</strong>rá contar com um litisconsórcio forma<strong>do</strong> pelo segura<strong>do</strong> e segura<strong>do</strong>ra.<br />

10.5.3.4.<br />

Vedação <strong>de</strong> integração <strong>do</strong> Instituto <strong>de</strong> Resseguros <strong>do</strong> Brasil<br />

O art. 101, II, <strong>do</strong> CDC, prevê que tanto na ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização promovida contra o fornece<strong>do</strong>r em que se dê o chamamento ao<br />

processo <strong>do</strong> segura<strong>do</strong>r, como na ação promovida diretamente contra o segura<strong>do</strong>r, é vedada a integração <strong>do</strong> contraditório pelo<br />

Instituto <strong>de</strong> Resseguros <strong>do</strong> Brasil. A vedação é <strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse sujeito, e aten<strong>de</strong> aos propósitos já expostos quanto à<br />

vedação constante no art. 88 <strong>do</strong> CDC. Nesse senti<strong>do</strong> ensina Kazuo Watanabe:


“A vedação <strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> ao Instituto <strong>de</strong> Resseguros <strong>do</strong> Brasil e a dispensa <strong>de</strong> sua convocação para a ação, na condição <strong>de</strong><br />

litisconsorte necessário, aten<strong>de</strong>m ao objetivo <strong>de</strong> possibilitar aos consumi<strong>do</strong>res e às vítimas <strong>de</strong> danos uma solução da li<strong>de</strong> mais rápida<br />

e sem os complica<strong>do</strong>res que, necessariamente, a intromissão na causa pelo Instituto <strong>de</strong> Resseguros <strong>do</strong> Brasil <strong>de</strong>terminará, conforme<br />

a experiência ordinária indica”165.<br />

10.6.<br />

LITISCONSÓRCIO ALTERNATIVO E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR<br />

O litisconsórcio alternativo é tema enfrenta<strong>do</strong> com extrema rarida<strong>de</strong>, encontran<strong>do</strong>-se na <strong>do</strong>utrina nacional <strong>de</strong> forma mais<br />

aprofundada apenas as lições <strong>de</strong> Candi<strong>do</strong> Rangel Dinamarco166.<br />

O instituto <strong>do</strong> litisconsórcio alternativo representa a possibilida<strong>de</strong> aberta ao autor para <strong>de</strong>mandar duas ou mais pessoas quan<strong>do</strong><br />

tenha dúvidas fundadas a respeito <strong>de</strong> qual <strong>de</strong>las, efetivamente, <strong>de</strong>veria participar no polo passivo da <strong>de</strong>manda. Ou ainda, quan<strong>do</strong><br />

exista dúvida fundada a respeito <strong>de</strong> quem seja o titular <strong>do</strong> direito a ser discuti<strong>do</strong> no processo, possa mais <strong>de</strong> um sujeito litigar em<br />

conjunto para, somente ao final <strong>do</strong> processo, se <strong>de</strong>terminar a quem o direito pertence. O que caracteriza, fundamentalmente, o<br />

litisconsórcio alternativo é a in<strong>de</strong>finição a respeito <strong>do</strong> sujeito legitima<strong>do</strong> a litigar, seja no polo ativo, seja no polo passivo da<br />

<strong>de</strong>manda.<br />

Observe-se que o litisconsórcio alternativo não se confun<strong>de</strong> com o litisconsórcio eventual ou sucessivo. Nestes, a parte sabe,<br />

com precisão, quem são os sujeitos que <strong>de</strong>vem participar da relação jurídica processual, e o fator que caracteriza essa espécie <strong>de</strong><br />

litisconsórcio é a cumulação <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong>s dirigi<strong>do</strong>s contra ou por sujeitos distintos, que formarão o litisconsórcio; somente é<br />

possível o acolhimento <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> se for acolhi<strong>do</strong> o primeiro ou ainda que o segun<strong>do</strong> seja acolhi<strong>do</strong> não o sen<strong>do</strong> o<br />

primeiro. São exemplos <strong>de</strong> litisconsórcio sucessivo as hipóteses previstas nos arts. 1.698 e 928, parágrafo único, <strong>do</strong> CC.<br />

Nas hipóteses <strong>de</strong> litisconsórcio sucessivo, não existe dúvida quanto à legitimida<strong>de</strong>; essa diferença é essencial para conceituar<br />

tal litisconsórcio <strong>de</strong> maneira diversa <strong>do</strong> alternativo, ora analisa<strong>do</strong>. Nas corretas lições <strong>de</strong> Rodrigo Reis Mazzei:<br />

“A seguir os caminhos que estamos traçan<strong>do</strong> no texto, como ponto <strong>de</strong> partida para a configuração <strong>do</strong> litisconsórcio sucessivo, na<br />

ação <strong>de</strong>verá constar – pelo menos – <strong>do</strong>is pedi<strong>do</strong>s não idênticos, sen<strong>do</strong> que o segun<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> (secundário) somente será analisa<strong>do</strong> se<br />

ultrapassa<strong>do</strong> o primeiro pleito – com <strong>de</strong>cisão positiva. Contu<strong>do</strong>, essa situação, por si só, não gerará o litisconsórcio sucessivo, sen<strong>do</strong><br />

necessário a<strong>de</strong>quar a situação para o embate pedi<strong>do</strong> e formação <strong>de</strong> polo plúrimo. O pormenor que gera o litisconsórcio sucessivo<br />

está no fato <strong>de</strong> que – quan<strong>do</strong> se passa para o segun<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> – há a análise subjetiva diferenciada <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> antecessor, ou, com<br />

outras palavras, somente se avançará para o patrimônio jurídico <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> litigante após a análise positiva (<strong>de</strong> resulta<strong>do</strong>) em<br />

relação ao primeiro. Mister se fará que conste, primeiramente, coman<strong>do</strong> <strong>de</strong>cisório (aqui, capítulo <strong>de</strong> sentença) quanto ao primeiro<br />

litisconsorte, para, após, a<strong>de</strong>ntrar no segun<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>, que é concernente ao litigante que está em litisconsórcio sucessivo”167.<br />

A distinção, inclusive, afasta o instituto <strong>do</strong> objeto <strong>do</strong> presente estu<strong>do</strong>, apesar <strong>de</strong> sua inegável complexida<strong>de</strong> e importância<br />

prática.<br />

Alguns exemplos para justificar a existência <strong>de</strong> litisconsórcio sucessivo são da<strong>do</strong>s por Dinamarco, em sua maioria retira<strong>do</strong>s<br />

das lições a respeito <strong>do</strong> tema <strong>do</strong>s italianos Giuseppe Tarzia e Lu<strong>do</strong>vico Mortara, com as <strong>de</strong>vidas citações. Aponta, primeiramente,<br />

para a hipótese <strong>de</strong> duas ou mais pessoas jurídicas, componentes <strong>do</strong> mesmo grupo econômico, realizarem diversos negócios<br />

jurídicos com terceiro <strong>de</strong> forma que não se saiba, com exatidão, qual <strong>de</strong>las é a efetivamente legitimada a propor a <strong>de</strong>manda, o que<br />

somente restará <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> com a análise <strong>de</strong> <strong>do</strong>cumentos em po<strong>de</strong>r da parte contrária. Afirma que, nesse caso, será possível uma<br />

cumulação subjetiva eventual no polo ativo, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> até mesmo a evitar a propositura <strong>de</strong> ações conexas – mesma causa <strong>de</strong> pedir –<br />

propostas em separa<strong>do</strong> por tais pessoas jurídicas, a fundamentar o litisconsórcio no art. 113, II, <strong>do</strong> Novo CPC168.<br />

Esse é um bom exemplo também para o polo passivo da <strong>de</strong>manda, em situações nas quais o autor não tem a exata concepção<br />

<strong>de</strong> quem realmente <strong>de</strong>verá compor tal polo processual. Atualmente, são tantas as empresas criadas por um mesmo grupo<br />

econômico, por exemplo, que, muitas vezes, existe a real dificulda<strong>de</strong> em individualizá-las no tocante a quem, efetivamente,<br />

participou da relação jurídica <strong>de</strong> direito material e que, por essa razão, <strong>de</strong>verá figurar no polo passivo da <strong>de</strong>manda. Um mesmo<br />

conglomera<strong>do</strong> financeiro exerce ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> banco, financia<strong>do</strong>ra, segura<strong>do</strong>ra, administra<strong>do</strong>ra etc., exercidas por pessoas jurídicas<br />

diferentes, o que nem sempre fica muito claro para aqueles que com esse conglomera<strong>do</strong> fazem negócios.<br />

Nesse tocante, é importante ressaltar algumas particularida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> direito consumerista, em que a figura <strong>do</strong> litisconsórcio<br />

alternativo <strong>de</strong>ve ser tratada <strong>de</strong> forma diferenciada. Para análise, <strong>de</strong>manda-se o enfrentamento <strong>de</strong> duas situações distintas em<br />

<strong>de</strong>corrência da aplicação <strong>do</strong>s arts. 7.º, parágrafo único, 12 e 13, <strong>do</strong> CDC.<br />

O art. 7.º, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC, vem assim redigi<strong>do</strong>: “Ten<strong>do</strong> mais <strong>de</strong> um autor a ofensa, to<strong>do</strong>s respon<strong>de</strong>rão solidariamente<br />

pela reparação <strong>do</strong>s danos previstos nas normas <strong>de</strong> consumo”. Esse dispositivo constitui a regra geral <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> solidária<br />

entre to<strong>do</strong>s os fornece<strong>do</strong>res que participaram da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fornecimento <strong>do</strong> serviço ou produto perante o consumi<strong>do</strong>r. A regra<br />

justifica-se pela responsabilida<strong>de</strong> objetiva a<strong>do</strong>tada pelo CDC, que dispensa a culpa como elemento da responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s


fornece<strong>do</strong>res169. Dessa maneira, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> a culpa não ser <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong>manda<strong>do</strong>, ou não ser <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os fornece<strong>do</strong>res<br />

<strong>de</strong>manda<strong>do</strong>s, haverá a con<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> quem estiver no polo passivo a in<strong>de</strong>nizar o consumi<strong>do</strong>r; assim, é inviável imaginar, em uma<br />

situação tratada à luz <strong>do</strong> dispositivo legal comenta<strong>do</strong>, uma sentença terminativa por ilegitimida<strong>de</strong> <strong>de</strong> parte se for comprova<strong>do</strong> que a<br />

culpa não foi daquele fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong>manda<strong>do</strong>.<br />

Em razão da solidarieda<strong>de</strong> entre to<strong>do</strong>s os fornece<strong>do</strong>res e <strong>de</strong> sua responsabilida<strong>de</strong> objetiva, o consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>rá optar contra<br />

quem preten<strong>de</strong> litigar. Po<strong>de</strong>rá propor a <strong>de</strong>manda para buscar o ressarcimento <strong>de</strong> seu dano somente contra um <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res,<br />

alguns, ou to<strong>do</strong>s eles. A <strong>do</strong>utrina que já enfrentou o tema aponta, acertadamente, para a hipótese <strong>de</strong> litisconsórcio facultativo,<br />

consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> ser a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r que <strong>de</strong>finirá a formação ou não da pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sujeitos no polo passivo e mesmo,<br />

quan<strong>do</strong> se formar o litisconsórcio, qual a extensão subjetiva da pluralida<strong>de</strong> 170 .<br />

Nesse caso, portanto, <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> solidária e objetiva <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res, não será aplicável o instituto <strong>do</strong> litisconsórcio<br />

alternativo, pois, ainda que exista uma dúvida fundada por parte <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r sobre quem foi o causa<strong>do</strong>r direto <strong>de</strong> seu dano, a<br />

legislação consumerista, expressamente, atribui a responsabilida<strong>de</strong> a qualquer <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res que tenha participa<strong>do</strong> da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

produção <strong>do</strong> produto ou da prestação <strong>do</strong> serviço. Por ser inviável antever a ilegitimida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquer <strong>de</strong>les, ainda que nenhuma<br />

culpa tenha no evento danoso, pouco importa, para os fins <strong>do</strong> processo, a individualização <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r que tenha si<strong>do</strong> o<br />

responsável direto pelo dano, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que é inconcebível, nesse caso, falar em litisconsórcio alternativo.<br />

Essa disposição <strong>do</strong> CDC, repetida em outras normas <strong>do</strong> diploma consumerista – como os arts. 18, caput, 19, caput, 25, §§ 1.º e<br />

2.º, art. 28, § 3.º, e art. 34 –, é <strong>de</strong>monstração clara <strong>de</strong> proteção ao consumi<strong>do</strong>r, que não po<strong>de</strong>ria ser afeta<strong>do</strong> por incertezas a respeito<br />

<strong>de</strong> qual <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res foi o responsável direto pela ofensa aos seus direitos. A i<strong>de</strong>ia é que os fornece<strong>do</strong>res, solidariamente,<br />

respondam perante o consumi<strong>do</strong>r in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> sua culpa no caso concreto; assim, é lícito àquele que pagou e que não teve<br />

culpa ingressar com ação <strong>de</strong> repetição <strong>de</strong> indébito contra o fornece<strong>do</strong>r causa<strong>do</strong>r direto <strong>do</strong> dano. A proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, ao criar<br />

um litisconsórcio facultativo entre os fornece<strong>do</strong>res, afasta, por completo, a necessida<strong>de</strong> <strong>do</strong> litisconsórcio alternativo.<br />

Registre-se que a melhor <strong>do</strong>utrina aponta para a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o fornece<strong>do</strong>r con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> a satisfazer o consumi<strong>do</strong>r, caso não<br />

tenha ti<strong>do</strong> culpa no evento danoso, ou ainda que a culpa não tenha si<strong>do</strong> exclusivamente sua, ingressar com outro processo perante o<br />

fornece<strong>do</strong>r culpa<strong>do</strong> pelo dano para receber aquilo que pagou ao consumi<strong>do</strong>r171. O direito <strong>de</strong> regresso, entretanto, não po<strong>de</strong>rá ser<br />

exerci<strong>do</strong> no próprio processo, em virtu<strong>de</strong> da proibição explícita <strong>do</strong> art. 88 <strong>do</strong> CDC, que impe<strong>de</strong> a <strong>de</strong>nunciação da li<strong>de</strong> nas<br />

<strong>de</strong>mandas consumeristas. A disposição tem o fim <strong>de</strong> evitar complicações procedimentais naturais da ampliação subjetiva da<br />

relação jurídica processual, o que po<strong>de</strong>ria trazer <strong>de</strong>svantagens ao consumi<strong>do</strong>r 172 .<br />

Questão mais interessante vem da aplicação conjunta <strong>do</strong>s arts. 12 e 13 <strong>do</strong> CDC; indica o primeiro a responsabilida<strong>de</strong> solidária<br />

<strong>do</strong> fabricante, produtor, construtor e importa<strong>do</strong>r pela reparação <strong>de</strong> danos causa<strong>do</strong>s aos consumi<strong>do</strong>res por <strong>de</strong>feito no produto; já o<br />

segun<strong>do</strong> dispositivo prevê uma responsabilida<strong>de</strong> subsidiária <strong>do</strong> comerciante, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que: “I – o fabricante, o construtor, o produtor<br />

ou o importa<strong>do</strong>r não pu<strong>de</strong>rem ser i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong>s; II – o produto for forneci<strong>do</strong> sem i<strong>de</strong>ntificação clara <strong>do</strong> seu fabricante, produtor,<br />

construtor ou importa<strong>do</strong>r; III – não conservar a<strong>de</strong>quadamente os produtos perecíveis”.<br />

Apesar <strong>de</strong> forte corrente <strong>do</strong>utrinária enten<strong>de</strong>r que, nesse caso, o comerciante também terá responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ressarcir o<br />

consumi<strong>do</strong>r, ainda que possa, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> satisfazê-lo, pleitear o ressarcimento perante o fabricante, produtor, construtor e<br />

importa<strong>do</strong>r 173 , a leitura conjunta <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is dispositivos legais anteriormente referi<strong>do</strong>s <strong>de</strong>monstra que, ao ser verificada uma das<br />

hipóteses previstas pelo art. 13 <strong>do</strong> código consumerista, o comerciante não respon<strong>de</strong>rá perante o consumi<strong>do</strong>r, por ser parte<br />

ilegítima para figurar no polo passivo <strong>do</strong> processo, em razão <strong>de</strong> sua responsabilida<strong>de</strong> somente subsidiária, não solidária174. A<br />

hipótese que mais interesse traz ao presente trabalho é certamente aquela prevista pelo referi<strong>do</strong> art. 13, III, <strong>do</strong> CDC, que trata da<br />

causa exclu<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> comerciante nos casos em que tenha conserva<strong>do</strong> a<strong>de</strong>quadamente produtos perecíveis.<br />

Nessa hipótese, estar-se-á diante <strong>de</strong> típica situação em que o instituto <strong>do</strong> litisconsórcio alternativo po<strong>de</strong>rá ser aplica<strong>do</strong>. É<br />

evi<strong>de</strong>nte que, em relação ao consumi<strong>do</strong>r, existirão situações em que dificilmente conseguirá <strong>de</strong>terminar, com exatidão, o<br />

responsável pelos <strong>de</strong>feitos <strong>do</strong> produto, saben<strong>do</strong> somente que adquiriu <strong>de</strong> um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> comerciante um produto perecível, o<br />

qual, por não estar no esta<strong>do</strong> espera<strong>do</strong>, causou-lhe um dano. Ao dar o exemplo <strong>de</strong> um iogurte estraga<strong>do</strong> ingeri<strong>do</strong> pelo filho <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, Luiz Antonio Rizzatto Nunes 175 afirma que, em casos como esse, “não é tão simples <strong>de</strong>terminar quan<strong>do</strong> e on<strong>de</strong><br />

ocorreu a <strong>de</strong>terioração <strong>do</strong> produto perecível”.<br />

Resta evi<strong>de</strong>nte que essa seria uma hipótese em que a fixação da legitimida<strong>de</strong> passiva somente po<strong>de</strong>rá ser clarificada com a<br />

produção da prova pericial, pela qual se <strong>de</strong>scobrirá, afinal, se o comerciante teve os cuida<strong>do</strong>s necessários na conservação <strong>do</strong>s<br />

produtos perecíveis. Caso a prova técnica a ser produzida indique que o <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> produto nada teve a ver com a conservação<br />

<strong>de</strong>ste pelo comerciante, não haverá qualquer responsabilida<strong>de</strong> em ressarcir o consumi<strong>do</strong>r, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> até mesmo sua<br />

ilegitimida<strong>de</strong> passiva para figurar na <strong>de</strong>manda judicial. O consumi<strong>do</strong>r, nesse caso, ingressaria com o processo contra os sujeitos<br />

que participaram da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> produção <strong>do</strong> produto, forman<strong>do</strong> um litisconsórcio alternativo em razão da dificulda<strong>de</strong> em aferir, no


início da <strong>de</strong>manda, a responsabilida<strong>de</strong> ou não <strong>do</strong> comerciante – e, consequentemente, sua legitimida<strong>de</strong>.<br />

Outro exemplo, da<strong>do</strong> por Cândi<strong>do</strong> Rangel Dinamarco 176 , refere-se à pessoa que<br />

“haja participa<strong>do</strong> <strong>de</strong> negócio, sem ficar claro a ela própria se o fez em nome próprio, ou como representante <strong>de</strong> outrem. Se for o<br />

caso <strong>de</strong> vir a juízo po<strong>de</strong>rá ela comparecer em litisconsórcio com o possível representa<strong>do</strong>, postulan<strong>do</strong> um provimento <strong>de</strong> mérito a<br />

favor <strong>de</strong> um ou <strong>de</strong> outro <strong>de</strong>les; se for o caso <strong>de</strong> mover-lhe ação, po<strong>de</strong>rá o adversário <strong>de</strong>mandar a quem negociou e ao seu possível<br />

representa<strong>do</strong>, para que um <strong>de</strong>les seja atingi<strong>do</strong> pelo julgamento <strong>do</strong> mérito e o outro, consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> parte ilegítima (litisconsórcio<br />

alternativo passivo)”.<br />

Aos exemplos da<strong>do</strong>s pelo processualista paulista po<strong>de</strong>riam ser acresci<strong>do</strong>s outros, o que, entretanto, não se faz necessário, por<br />

serem suficientes os apresenta<strong>do</strong>s para a visualização <strong>de</strong> algumas hipóteses em que teria cabimento o litisconsórcio alternativo. O<br />

fenômeno processual sugeri<strong>do</strong> somente passa a fazer senti<strong>do</strong> no momento em que se percebe nem sempre ser a questão da<br />

legitimida<strong>de</strong> – ativa ou passiva –facilmente resolvida antes da propositura da <strong>de</strong>manda judicial, o que resta claro somente após a<br />

produção <strong>de</strong> provas. Nesses casos, em que exista uma dúvida fundada a respeito da legitimida<strong>de</strong>, permitir-se-ia à parte a formação<br />

<strong>de</strong> um litisconsórcio mesmo que se saiba que nem to<strong>do</strong>s os sujeitos participantes <strong>do</strong> processo <strong>de</strong>veriam estar ali; o problema seria,<br />

justamente, <strong>de</strong>terminar quem <strong>de</strong>veria e quem não <strong>de</strong>veria participar da relação jurídica processual.<br />

Existirá, claro, problema a ser resolvi<strong>do</strong> no tocante à con<strong>de</strong>nação nas verbas <strong>de</strong> sucumbência com relação à parte tida por<br />

ilegítima ao final <strong>do</strong> processo. Quem <strong>de</strong>verá arcar com tais verbas? O sujeito que não <strong>de</strong>veria ter si<strong>do</strong> parte no processo ou aquele<br />

que inclui o sujeito que não tinha legitimida<strong>de</strong>? Parece ser mais correto aplicar-se ao caso a regra da causalida<strong>de</strong>, pela qual <strong>de</strong>verá<br />

respon<strong>de</strong>r pelas verbas <strong>de</strong> sucumbência aquele que <strong>de</strong>u causa à <strong>de</strong>manda177.<br />

Ao ser <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> que a dúvida surgida quanto à legitimida<strong>de</strong> não é <strong>de</strong> nenhuma responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> sujeito que venha a ser<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> parte ilegítima, não haverá qualquer razão para arcar com as verbas <strong>de</strong> sucumbência. Esse seria mais um problema a<br />

ser enfrenta<strong>do</strong> pelo <strong>de</strong>mandante.<br />

In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong>ssa questão, o instituto <strong>do</strong> litisconsórcio alternativo gera uma nova e clara utilida<strong>de</strong> para a ação<br />

probatória autônoma com a função <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar, mais explicitamente, qual sujeito tem legitimida<strong>de</strong> para participar da relação<br />

jurídica processual. Ainda que o problema <strong>de</strong> in<strong>de</strong>finição quanto à legitimida<strong>de</strong> repita-se na ação probatória autônoma, é inegável<br />

que os transtornos cria<strong>do</strong>s por tal instituto serão <strong>de</strong> menor monta em um processo que tenha como único e exclusivo objetivo a<br />

produção <strong>de</strong> prova que indique a legitimida<strong>de</strong>. Ao invés <strong>de</strong> forçar uma parte ilegítima a participar <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o processo <strong>de</strong><br />

conhecimento, com a <strong>de</strong>mora e os custos típicos <strong>de</strong> tal espécie <strong>de</strong> processo, a participação <strong>de</strong>sse sujeito ficaria limitada a um<br />

processo judicial bem mais simples, rápi<strong>do</strong> e barato, em manifesto benefício ao sistema processual.<br />

Cumpre registrar que, nos países em que se a<strong>do</strong>ta o instituto das diligências preliminares, como Espanha, Argentina, Uruguai,<br />

Chile e Bolívia, existe uma hipótese <strong>de</strong> cabimento específica concernente à fixação da legitimação <strong>do</strong> polo ativo e passivo – cada<br />

qual com suas particularida<strong>de</strong>s –, como forma <strong>de</strong> permitir ao autor o ingresso <strong>do</strong> “processo principal” somente contra sujeitos<br />

legitima<strong>do</strong>s.<br />

Em trabalho <strong>de</strong> maior fôlego178, procurei <strong>de</strong>monstrar a importância para o direito brasileiro da a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> uma ação probatória<br />

autônoma, <strong>de</strong>svinculada <strong>do</strong>s tradicionais requisitos cautelares. Dentre as várias utilida<strong>de</strong>s práticas imaginadas com a a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong>ssa<br />

espécie <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda judicial, que teria como objeto exclusivamente a produção probatória, visualiza-se a preparação <strong>de</strong> outras<br />

<strong>de</strong>mandas, no caso, da <strong>de</strong>scoberta <strong>do</strong> polo passivo, como ocorre com as diligências preliminares analisadas.<br />

Apesar <strong>de</strong> não se tratar <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> plena <strong>do</strong> instituto das diligências preliminares com a ação probatória autônoma sugerida,<br />

fica evi<strong>de</strong>nte que, nos países indica<strong>do</strong>s, também existe a dificulda<strong>de</strong>, em certas circunstâncias, <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminar-se a legitimação <strong>do</strong>s<br />

sujeitos que <strong>de</strong>verão compor os polos da relação jurídica <strong>do</strong> “processo principal”. Nesses países, a própria legislação resolve o<br />

problema a prever um processo prévio para que as dúvidas sejam afastadas e proponha-se o processo regular <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista<br />

subjetivo.<br />

Em conclusão, apesar da sugerida ação probatória autônoma não afastar por completo a existência <strong>do</strong> litisconsórcio<br />

alternativo, é bastante claro ser mais benéfico ao <strong>de</strong>manda<strong>do</strong> que não é parte legítima e, por consequência, também ao próprio<br />

sistema processual, participar <strong>de</strong> um processo bem mais simples, barato e rápi<strong>do</strong> que tenha como objeto exclusivo a prova <strong>de</strong> fatos<br />

que esclareçam a dúvida a respeito da legitimida<strong>de</strong>. Manter-se-ia a figura <strong>do</strong> litisconsórcio alternativo na ação probatória<br />

autônoma, mas o fenômeno se tornaria totalmente dispensável no processo principal.<br />

10.7.<br />

10.7.1.<br />

INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA<br />

Ônus da prova


A <strong>do</strong>utrina comumente divi<strong>de</strong> o ônus da prova em <strong>do</strong>is aspectos: o primeiro, chama<strong>do</strong> <strong>de</strong> ônus subjetivo da prova, e o<br />

segun<strong>do</strong>, chama<strong>do</strong> <strong>de</strong> ônus objetivo179. No tocante ao ônus subjetivo da prova, analisa-se o instituto sob a perspectiva <strong>de</strong> quem é o<br />

responsável pela produção <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada prova (“quem <strong>de</strong>ve provar o que”), enquanto no ônus objetivo da prova o instituto é<br />

visto como uma regra <strong>de</strong> julgamento a ser aplicada pelo juiz no momento <strong>de</strong> proferir a sentença no caso <strong>de</strong> a prova se mostrar<br />

inexistente ou insuficiente. No aspecto objetivo, o ônus da prova afasta a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o juiz <strong>de</strong>clarar o non liquet diante <strong>de</strong><br />

dúvidas a respeito das alegações <strong>de</strong> fato em razão da insuficiência ou inexistência <strong>de</strong> provas. Sen<strong>do</strong> obriga<strong>do</strong> a julgar e não estan<strong>do</strong><br />

convenci<strong>do</strong> das alegações <strong>de</strong> fato, aplica a regra <strong>do</strong> ônus da prova.<br />

Nesse senti<strong>do</strong> as lições <strong>de</strong> Leonar<strong>do</strong> Greco:<br />

“As regras <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong> ônus da prova têm duplo objetivo: primeiramente, <strong>de</strong>finir a qual das partes compete provar<br />

<strong>de</strong>termina<strong>do</strong> fato, o chama<strong>do</strong> ônus subjetivo; em seguida, no momento da sentença, servir <strong>de</strong> diretriz no enca<strong>de</strong>amento lógico <strong>do</strong><br />

julgamento das questões <strong>de</strong> fato, fazen<strong>do</strong> o juízo pen<strong>de</strong>r em favor <strong>de</strong> uma ou <strong>de</strong> outra parte conforme tenham ou não resulta<strong>do</strong><br />

prova<strong>do</strong>s os fatos que a cada uma <strong>de</strong>las interessam, o chama<strong>do</strong> ônus objetivo” 180 .<br />

O ônus da prova é, portanto, regra <strong>de</strong> julgamento, aplican<strong>do</strong>-se para as situações em que, ao final da <strong>de</strong>manda, persistam fatos<br />

controverti<strong>do</strong>s não <strong>de</strong>vidamente comprova<strong>do</strong>s durante a instrução probatória. Trata-se <strong>de</strong> ônus imperfeito, porque nem sempre a<br />

parte que tinha o ônus <strong>de</strong> prova e não a produziu será colocada num esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>svantagem processual, bastan<strong>do</strong> imaginar a<br />

hipótese <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> prova <strong>de</strong> ofício ou, ainda, <strong>de</strong> a prova ser produzida pela parte contrária. Mas também é regra <strong>de</strong> conduta<br />

das partes, porque indica a elas quem potencialmente será prejudica<strong>do</strong> diante da ausência ou insuficiência da prova.<br />

Como já afirma<strong>do</strong>, o ônus da prova, em seu aspecto objetivo, é uma regra <strong>de</strong> julgamento, aplican<strong>do</strong>-se somente no momento<br />

final da <strong>de</strong>manda, quan<strong>do</strong> o juiz estiver pronto para proferir sentença. É regra aplicável apenas no caso <strong>de</strong> inexistência ou<br />

insuficiência da prova, uma vez que, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> a prova produzida, não interessan<strong>do</strong> por quem, o juiz julgará com base na prova e<br />

não haverá necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aplicação da regra ora analisada. Trata-se <strong>do</strong> princípio da comunhão da prova (ou aquisição da prova),<br />

que <strong>de</strong>termina que, uma vez produzida a prova, ela passará a ser <strong>do</strong> processo, e não <strong>de</strong> quem a produziu181. Dessa forma, o<br />

aspecto subjetivo só passa a ter relevância para a <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> juiz se ele for obriga<strong>do</strong> a aplicar o ônus da prova em seu aspecto<br />

objetivo: diante <strong>de</strong> ausência ou insuficiência <strong>de</strong> provas, <strong>de</strong>ve indicar qual das partes tinha o ônus <strong>de</strong> provar e colocá-la numa<br />

situação <strong>de</strong> <strong>de</strong>svantagem processual.<br />

10.7.2.<br />

Regras <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong> ônus da prova<br />

Segun<strong>do</strong> a regra geral estabelecida pelo art. 373, I e II, <strong>do</strong> Novo CPC, cabe ao autor o ônus <strong>de</strong> provar os fatos constitutivos <strong>de</strong><br />

seu direito, ou seja, <strong>de</strong>ve provar a matéria fática que traz em sua petição inicial e que serve como origem da relação jurídica<br />

<strong>de</strong>duzida em juízo. Em relação ao réu, também o or<strong>de</strong>namento processual dispõe sobre ônus probatórios, mas não concernentes aos<br />

fatos constitutivos <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> autor. Naturalmente, se <strong>de</strong>sejar, po<strong>de</strong>rá tentar <strong>de</strong>monstrar a inverda<strong>de</strong> das alegações <strong>de</strong> fato feitas<br />

pelo autor por meio <strong>de</strong> produção probatória, mas, caso não o faça, não será coloca<strong>do</strong> em situação <strong>de</strong> <strong>de</strong>svantagem, a não ser que o<br />

autor comprove a veracida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tais fatos. Nesse caso, entretanto, a situação prejudicial não se dará em consequência da ausência<br />

<strong>de</strong> produção <strong>de</strong> prova pelo réu, mas sim pela produção <strong>de</strong> prova pelo autor.<br />

Caso o réu alegue, por meio <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> mérito indireta, um fato novo, impeditivo, modificativo ou extintivo <strong>do</strong> direito <strong>do</strong><br />

autor, terá o ônus <strong>de</strong> comprová-lo. Por fato impeditivo enten<strong>de</strong>-se aquele <strong>de</strong> conteú<strong>do</strong> negativo, <strong>de</strong>monstrativo da ausência <strong>de</strong><br />

algum <strong>do</strong>s requisitos genéricos <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> <strong>do</strong> ato jurídico, como, por exemplo, a alegação <strong>de</strong> que o contratante era absolutamente<br />

incapaz quan<strong>do</strong> celebrou o contrato. Fato modificativo é aquele que altera apenas parcialmente o fato constitutivo, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser tal<br />

alteração subjetiva, ou seja, referente aos sujeitos da relação jurídica (como ocorre, por exemplo, na cessão <strong>de</strong> crédito) ou objetiva,<br />

ou seja, referente ao conteú<strong>do</strong> da relação jurídica (como ocorre, por exemplo, na compensação parcial). Fato extintivo é o que faz<br />

cessar a relação jurídica original, como a compensação numa ação <strong>de</strong> cobrança. A simples negação <strong>do</strong> fato alega<strong>do</strong> pelo autor não<br />

acarreta ao réu o ônus da prova.<br />

O ônus da prova carrea<strong>do</strong> ao réu pelo art. 373, II, <strong>do</strong> Novo CPC só passa a ser exigi<strong>do</strong> no caso concreto na hipótese <strong>de</strong> o autor<br />

ter se <strong>de</strong>sincumbi<strong>do</strong> <strong>de</strong> seu ônus probatório, porque só passa a ter interesse na <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> juiz a existência ou não <strong>de</strong> um fato<br />

impeditivo, modificativo ou extintivo <strong>do</strong> autor, após se convencer da existência <strong>do</strong> fato constitutivo <strong>do</strong> autor. Significa dizer que,<br />

se nenhuma das partes se <strong>de</strong>sincumbir <strong>de</strong> seus ônus no caso concreto e o juiz tiver que <strong>de</strong>cidir com fundamento na regra <strong>do</strong> ônus<br />

da prova, o pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> autor será julga<strong>do</strong> improce<strong>de</strong>nte.<br />

O Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil inova quanto ao sistema <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong>s ônus probatórios, aten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> corrente<br />

<strong>do</strong>utrinária que já vinha <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a chamada “distribuição dinâmica <strong>do</strong> ônus da prova”. Na realida<strong>de</strong>, criou-se um sistema<br />

misto: existe abstratamente prevista em lei uma forma <strong>de</strong> distribuição, que po<strong>de</strong>rá ser, no caso concreto, modificada pelo juiz.


Diante da inércia <strong>do</strong> juiz, portanto, as regras <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong> ônus da prova no Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil continuarão a ser<br />

as mesmas <strong>do</strong> diploma processual revoga<strong>do</strong>.<br />

Mesmo antes da consagração legislativa, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong>u início à aplicação <strong>de</strong>ssa forma dinâmica <strong>de</strong><br />

distribuição <strong>do</strong> ônus da prova em ações civis por danos ambientais182, e também na tutela <strong>do</strong> i<strong>do</strong>so, em respeito aos arts. 2.º, 3.º e<br />

71 da Lei 10.741/2003 (Estatuto <strong>do</strong> I<strong>do</strong>so), no que asseguram aos litigantes maiores <strong>de</strong> 60 anos facilida<strong>de</strong> na produção <strong>de</strong> provas e<br />

a efetivação concreta <strong>de</strong>sse direito 183 . No entanto, já existem <strong>de</strong>cisões recentes que a<strong>do</strong>tam a tese <strong>de</strong> forma mais ampla, ora<br />

valen<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> interpretação sistemática da nossa legislação processual, inclusive em bases constitucionais 184 , ora admitin<strong>do</strong> a<br />

flexibilização <strong>do</strong> sistema rígi<strong>do</strong> <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong> ônus probatório diante da insuficiência da regra geral 185 .<br />

O Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil a<strong>do</strong>ta essa forma dinâmica <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong> ônus da prova. Conforme já menciona<strong>do</strong>,<br />

apesar <strong>de</strong> o art. 373, em seus <strong>do</strong>is incisos, repetir as regras contidas no art. 333 <strong>do</strong> CPC/1973, em seu § 1.º permite que o juiz, nos<br />

casos previstos em lei ou diante <strong>de</strong> peculiarida<strong>de</strong>s da causa, relacionadas à impossibilida<strong>de</strong> ou à excessiva dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> cumprir o<br />

encargo ou à maior facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> obtenção da prova <strong>do</strong> fato contrário, atribua, em <strong>de</strong>cisão fundamentada e com respeito ao<br />

princípio <strong>do</strong> contraditório, o ônus da prova <strong>de</strong> forma diversa.<br />

Consagra-se legislativamente a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que <strong>de</strong>ve ter o ônus da prova a parte que apresentar maior facilida<strong>de</strong> em produzir a<br />

prova e se livrar <strong>do</strong> encargo. Como essa maior facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá <strong>do</strong> caso concreto, cabe ao juiz fazer a análise e <strong>de</strong>terminar<br />

qual o ônus <strong>de</strong> cada parte no processo. Registre-se que, diante da omissão <strong>do</strong> juiz, as regras continuaram a ser aplicadas como<br />

sempre foram sob a égi<strong>de</strong> <strong>do</strong> CPC/1973, ou seja, caberá ao autor o ônus <strong>de</strong> provar os fatos constitutivos <strong>de</strong> seu direito e ao réu, os<br />

fatos impeditivos, modificativos e extintivos.<br />

Como se po<strong>de</strong> notar, o sistema brasileiro passou a ser misto, sen<strong>do</strong> possível aplicar ao caso concreto tanto o sistema flexível<br />

da distribuição dinâmica <strong>do</strong> ônus da prova como o sistema rígi<strong>do</strong> da distribuição legal. Tu<strong>do</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá da iniciativa <strong>do</strong> juiz, que<br />

não estará obriga<strong>do</strong> a fazer distribuição <strong>do</strong> ônus probatório <strong>de</strong> forma diferente daquela prevista na lei.<br />

Interessante e elogiável a vedação a essa inversão contida no § 2.º <strong>do</strong> dispositivo ora comenta<strong>do</strong>, proibin<strong>do</strong>-a sempre que<br />

possa gerar situação em que a <strong>de</strong>sincumbência <strong>do</strong> encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil. A norma é<br />

elogiável porque a técnica <strong>de</strong> distribuição dinâmica da prova não se presta a tornar uma das partes vitoriosa por onerar a parte<br />

contrária com encargo <strong>do</strong> qual ela não terá como se <strong>de</strong>sincumbir. A nova sistemática <strong>de</strong> distribuição <strong>do</strong> ônus da prova serve para<br />

facilitar a produção da prova, e não para fixar a priori vence<strong>do</strong>res e venci<strong>do</strong>s. Nesse senti<strong>do</strong>, interessante <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça quanto à inversão prevista no art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC186.<br />

Apesar <strong>de</strong> o art. 373, § 1.º, <strong>do</strong> Novo CPC prever a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o juiz atribuir o ônus da prova “<strong>de</strong> mo<strong>do</strong> diverso”,<br />

naturalmente a regra trata da inversão <strong>do</strong> ônus da prova, até porque, sen<strong>do</strong> este distribuí<strong>do</strong> entre autor e réu, o mo<strong>do</strong> diverso só<br />

po<strong>de</strong> significar a inversão da regra legal. Tanto assim que o dispositivo expressamente se refere aos casos previstos em lei como<br />

umas das hipóteses da fixação “<strong>de</strong> mo<strong>do</strong> diverso”, e esses casos são justamente os <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova.<br />

10.7.3.<br />

Inversão <strong>do</strong> ônus da prova<br />

Existem três espécies <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova: (a) convencional; (b) legal; (c) judicial.<br />

10.7.3.1.<br />

Inversão convencional<br />

A inversão convencional <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> um acor<strong>do</strong> <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>s entre as partes, que po<strong>de</strong>rá ocorrer antes ou durante o processo.<br />

Essa forma <strong>de</strong> inversão tem duas limitações previstas pelo art. 373, § 3.º <strong>do</strong> Novo CPC, que prevê a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong><br />

inversão quan<strong>do</strong>: (i) recair sobre direito indisponível da parte; (ii) tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício <strong>do</strong> direito.<br />

Essa segunda limitação legal é aplicável nas hipóteses <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus probatório diante da alegação <strong>de</strong> fato negativo<br />

in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>, cuja prova é chamada pela <strong>do</strong>utrina <strong>de</strong> “prova diabólica”187.<br />

Note-se que não é difícil a prova <strong>de</strong> um fato negativo <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>, bastan<strong>do</strong>, para tanto, a produção <strong>de</strong> prova <strong>de</strong> um fato<br />

positivo <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> incompatível logicamente com o fato negativo. O problema é o fato negativo in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong> (fatos<br />

absolutamente negativos), porque nesse caso é até possível a prova <strong>de</strong> que a alegação <strong>de</strong>sse fato é falsa, mas é impossível a<br />

produção <strong>de</strong> prova <strong>de</strong> que ela seja verda<strong>de</strong>ira 188 .<br />

Essa forma <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova tem interessante particularida<strong>de</strong> no tocante ao direito consumerista em razão <strong>do</strong> art.<br />

51, VI, da Lei 8.078/1990, que prevê como sen<strong>do</strong> nula <strong>de</strong> pleno direito a cláusula contratual que estabeleça inversão <strong>do</strong> ônus da<br />

prova em prejuízo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Para parcela da <strong>do</strong>utrina, “o dispositivo <strong>do</strong> CDC ora analisa<strong>do</strong> não proíbe a convenção sobre o ônus da prova, mas, sim, tacha<br />

<strong>de</strong> nula a convenção se trouxer prejuízo ao consumi<strong>do</strong>r. Trata-se <strong>de</strong> norma salutar, a<strong>do</strong>tada pelos mais mo<strong>de</strong>rnos sistemas jurídicos<br />

189


que regulam as relações <strong>de</strong> consumo” .<br />

A lição <strong>do</strong>utrinária é correta, porque nem sempre o ônus da prova será <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r e, nesses casos, uma eventual inversão<br />

contratual <strong>do</strong> ônus da prova viria a favorecer o consumi<strong>do</strong>r. Qualquer cláusula contratual, entretanto, que atribua ao consumi<strong>do</strong>r<br />

um ônus probatório que seria legalmente <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r será consi<strong>de</strong>rada nula <strong>de</strong> pleno direito.<br />

O Código <strong>de</strong> Processo Civil, aplicável subsidiariamente aos processos consumeristas, exige que uma cláusula contratual que<br />

atribua ao fornece<strong>do</strong>r o ônus probatório <strong>de</strong> uma prova diabólica também seja consi<strong>de</strong>rada nula, nos termos <strong>do</strong> art. 373, <strong>do</strong> Novo<br />

CPC. Mesmo se consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a superiorida<strong>de</strong> técnica <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r diante <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, como ocorre num contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são<br />

imposto por ele, aceitar um ônus em tal circunstância não <strong>de</strong>ve ser admiti<strong>do</strong>, sob pena <strong>de</strong> frustração a priori da obtenção <strong>de</strong> tutela<br />

jurisdicional <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>. Aplicam-se ao caso as lições <strong>de</strong> melhor <strong>do</strong>utrina a respeito <strong>do</strong> tema:<br />

“A assunção <strong>de</strong> encargo <strong>de</strong> uma probatio diabolica, ainda quan<strong>do</strong> resultante da vonta<strong>de</strong> da própria parte, significaria fadar a<br />

insucesso muito provável a pretensão que no processo ela alimenta e <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>; a parte tem até mesmo o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> transigir ou mesmo<br />

renunciar aos direitos disponíveis, mas não o <strong>de</strong> envolver em suas ativida<strong>de</strong>s suicidas o juiz, que está no exercício <strong>de</strong> uma função<br />

pública (o processo não é um negócio <strong>de</strong> família)”190.<br />

10.7.3.2.<br />

Inversão legal<br />

A inversão legal vem prevista expressamente em lei, não exigin<strong>do</strong> o preenchimento <strong>de</strong> requisitos legais no caso concreto.<br />

Significa dizer que para sua aplicação <strong>do</strong> caso concreto basta a tipificação legal, não sen<strong>do</strong>, portanto, exigível qualquer <strong>de</strong>cisão<br />

judicial <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> tal inversão. Na realida<strong>de</strong>, a <strong>de</strong>cisão judicial nesse senti<strong>do</strong> é <strong>de</strong>snecessária, porque a inversão não <strong>de</strong>corre <strong>de</strong><br />

análise a ser realizada pelo juiz no caso concreto, mas da própria previsão legal.<br />

Para parcela da <strong>do</strong>utrina, essa forma <strong>de</strong> inversão nem po<strong>de</strong>ria tecnicamente ser chamada <strong>de</strong>ssa forma, sen<strong>do</strong> uma mera<br />

exceção legal à regra prevista no art. 373 <strong>do</strong> Novo CPC. Assim, “a inversão ope legis é <strong>de</strong>terminada pela lei, aprioristicamente,<br />

isto é, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> caso concreto e da atuação <strong>do</strong> juiz. A lei <strong>de</strong>termina que, numa dada situação, haverá uma distribuição<br />

<strong>do</strong> ônus da prova diferente <strong>do</strong> regramento comum previsto no art. 373 <strong>do</strong> Novo CPC”191.<br />

Os exemplos <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus probatório são encontra<strong>do</strong>s no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, em três<br />

passagens <strong>do</strong> diploma legal.<br />

A primeira previsão cuida <strong>do</strong> ônus <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> provar que não colocou o produto no merca<strong>do</strong>, que ele não é <strong>de</strong>feituoso<br />

ou que houve culpa exclusiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r ou <strong>de</strong> terceiros pelos danos gera<strong>do</strong>s (art. 12, § 3.º, <strong>do</strong> CDC). Significa dizer que,<br />

haven<strong>do</strong> um consumi<strong>do</strong>r no polo ativo da <strong>de</strong>manda, e sen<strong>do</strong> sua pretensão fundamentada na alegação <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> produto, caberá<br />

ao fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong>monstrar em juízo uma das causas exclu<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> previstas pelo dispositivo legal menciona<strong>do</strong>,<br />

sob pena <strong>de</strong> o pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> autor ser julga<strong>do</strong> totalmente proce<strong>de</strong>nte, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da prova produzida.<br />

A segunda previsão cuida <strong>do</strong> ônus <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> provar que o serviço não é <strong>de</strong>feituoso ou que há culpa exclusiva <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r ou <strong>de</strong> terceiro nos danos gera<strong>do</strong>s (art. 14, § 3.º, <strong>do</strong> CDC). As mesmas consi<strong>de</strong>rações feitas à alegação consumerista <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>feito <strong>do</strong> produto são aplicáveis ao <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> serviço.<br />

Essas duas hipóteses <strong>de</strong> inversão legal <strong>do</strong> ônus da prova nem sempre são bem compreendidas pela <strong>do</strong>utrina que as enfrenta,<br />

que insiste em associar os arts. 12, § 3.º, e 14, § 3.º, ao art. 6.º, VIII, to<strong>do</strong>s <strong>do</strong> CDC 192 . E o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça parece<br />

referendar esse entendimento, ao exigir a hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r ou a verossimilhança <strong>de</strong> sua alegação para justificar a<br />

inversão <strong>do</strong> ônus da prova, mesmo quan<strong>do</strong> a pretensão consumerista é fundada em <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço 193 . Na praxe<br />

forense também se nota uma associação quase imediata <strong>do</strong>s dispositivos legais menciona<strong>do</strong>s, recorren<strong>do</strong> os próprios consumi<strong>do</strong>res<br />

ao art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC.<br />

A realida<strong>de</strong> <strong>do</strong>utrinária, jurispru<strong>de</strong>ncial e prática é funesta para o consumi<strong>do</strong>r. Sempre que se exige o preenchimento <strong>de</strong><br />

requisitos para a inversão da prova, naturalmente se dificulta o acesso <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r a esse direito garanti<strong>do</strong> pela legislação<br />

consumerista. E tecnicamente a realida<strong>de</strong> é criticável, por confundir diferentes espécies <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova, como se não<br />

houvesse diferença entre a inversão legal e a judicial.<br />

Mas há <strong>do</strong>utrina que bem compreen<strong>de</strong> as normas legais, facilitan<strong>do</strong> sobremaneira a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em<br />

juízo, como Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, que, ao comentar os dispositivos legais menciona<strong>do</strong>s, afirmam que<br />

“tais normas afirmam expressamente que o consumi<strong>do</strong>r não precisa provar o <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> produto ou <strong>do</strong> serviço, incumbin<strong>do</strong> ao réu<br />

o ônus <strong>de</strong> provar que esses <strong>de</strong>feitos não existem”194.<br />

Por fim, a terceira previsão consumerista que versa sobre inversão legal <strong>do</strong> ônus da prova cuida da inversão <strong>do</strong> ônus <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r provar a veracida<strong>de</strong> e correção da informação ou comunicação publicitária que patrocina (art. 38 <strong>do</strong> CDC). Conforme<br />

ensina a melhor <strong>do</strong>utrina, “a inversão aqui prevista, ao contrário daquela fixada no art. 6.º, VIII, não está na esfera <strong>de</strong><br />

195


discricionarieda<strong>de</strong> <strong>do</strong> juiz. É obrigatória” . E além <strong>de</strong> obrigatória, por ser ope legis, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> “<strong>de</strong> qualquer ato <strong>do</strong> juiz. Logo,<br />

não lhe cabe sobre ele se manifestar, seja no sanea<strong>do</strong>r ou no momento posterior” 196 .<br />

Essa terceira hipótese <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova não é associada ao art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC, muito em razão da literalida<strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> art. 38 <strong>do</strong> mesmo diploma legal, que, ao prever ser o ônus da prova da veracida<strong>de</strong> e correção da informação ou comunicação<br />

publicitária <strong>de</strong> quem as patrocina, não haverá mesmo como se confundir os <strong>do</strong>is dispositivos legais e as diferentes espécies <strong>de</strong><br />

inversão <strong>do</strong> ônus probatório consagradas em cada um <strong>de</strong>les.<br />

Registre-se, finalmente, que a inversão <strong>do</strong> ônus da prova nesse caso <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá <strong>do</strong> polo da <strong>de</strong>manda a ser ocupa<strong>do</strong> pelo<br />

consumi<strong>do</strong>r. Como bem observa<strong>do</strong> por Kazuo Watanabe, “se é o patrocina<strong>do</strong>r da publicida<strong>de</strong> quem, com a afirmativa <strong>de</strong><br />

veracida<strong>de</strong> e correção da informação ou comunicação publicitária, postula uma tutela jurisdicional, não haverá inversão <strong>do</strong> encargo<br />

<strong>de</strong> provar, pois, nos termos <strong>do</strong> art. 373, I, <strong>do</strong> Novo CPC, é seu o ônus da prova. Haverá inversão <strong>do</strong> ônus da prova se a posição<br />

processual <strong>de</strong>le for <strong>de</strong> quem assume uma atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong>fensiva diante da afirmativa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> inveracida<strong>de</strong> ou incorreção da<br />

informação ou comunicação publicitária, pois, nesta hipótese, pelas regras <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Processual comum, o ônus da prova seria <strong>do</strong><br />

autor, na hipótese, o consumi<strong>do</strong>r”197.<br />

10.7.3.3.<br />

Inversão judicial<br />

Na inversão judicial caberá ao juiz analisar, no caso concreto, o preenchimento <strong>do</strong>s requisitos legais, como ocorre no art. 6.º,<br />

VIII, <strong>do</strong> CDC, que prevê a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o juiz inverter o ônus da prova em favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r sempre que este for<br />

hipossuficiente ou suas alegações forem verossímeis, sen<strong>do</strong> aplicável, inclusive, nas ações coletivas consumeristas198.<br />

Trata-se, portanto, <strong>de</strong> inversão ope iudicis e não ope legis 199 . É evi<strong>de</strong>nte que não basta, nesse caso, a relação consumerista,<br />

caben<strong>do</strong> ao juiz analisar no caso concreto o preenchimento <strong>do</strong>s requisitos exigi<strong>do</strong>s por lei. O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça tem<br />

entendimento consolida<strong>do</strong> no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> não ser automática a inversão nesse caso, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> sempre <strong>do</strong> preenchimento <strong>do</strong>s<br />

requisitos legais:<br />

“Agravo regimental no agravo <strong>de</strong> instrumento. Tutela antecipada. Verificação da presença <strong>do</strong>s requisitos. Art. 273 <strong>do</strong> CPC.<br />

Reexame <strong>de</strong> provas. Impossibilida<strong>de</strong>. Súmula 7/STJ. Inversão <strong>do</strong> ônus probatório. Acórdão recorri<strong>do</strong> em consonância com a<br />

jurisprudência <strong>do</strong> STJ. Divergência jurispru<strong>de</strong>ncial. Ausência <strong>de</strong> similitu<strong>de</strong> fática. 1. É veda<strong>do</strong>, em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso especial, o<br />

exame da presença <strong>do</strong>s pressupostos para a concessão da antecipação <strong>do</strong>s efeitos da tutela previstos no art. 273 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong><br />

Processo Civil, porquanto tal <strong>de</strong>mandaria a incursão nos elementos fático-probatórios <strong>do</strong>s autos. Incidência da Súmula 7 <strong>do</strong> STJ. 2.<br />

O tema relativo à inversão <strong>do</strong> ônus da prova foi <strong>de</strong>cidi<strong>do</strong> pelo acórdão recorri<strong>do</strong> em conformida<strong>de</strong> com a jurisprudência <strong>do</strong> STJ<br />

sobre o tema, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a referida inversão não <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> automático, <strong>de</strong>mandan<strong>do</strong> a verificação, em cada caso, da<br />

presença <strong>do</strong>s requisitos autoriza<strong>do</strong>res, a saber: verossimilhança das alegações ou hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 3. O<br />

conhecimento <strong>do</strong> recurso especial pela alínea c <strong>do</strong> permissivo constitucional exige a semelhança entre as circunstâncias fáticas<br />

<strong>de</strong>lineadas no acórdão recorri<strong>do</strong> e as previstas no aresto paradigma, situação inexistente no presente caso. 4. Agravo regimental a<br />

que se nega provimento” (STJ – AgRg no Ag 1300186/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Raul Araújo – j. 26.04.2011 – DJe<br />

10.05.2011).200<br />

Registre-se que o preenchimento <strong>de</strong>sses requisitos será feito, no máximo, no segun<strong>do</strong> grau <strong>de</strong> jurisdição, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> o<br />

entendimento consolida<strong>do</strong> <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça no senti<strong>do</strong> que analisá-los em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso especial violaria o<br />

entendimento consagra<strong>do</strong> na Súmula 7 daquele tribunal:<br />

“Agravo regimental no agravo <strong>de</strong> instrumento. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova. Art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC. Requisitos. Hipossuficiência <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r ou verossimilhança das alegações. Análise em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso especial. Impossibilida<strong>de</strong>. Súmula 7/STJ. 1. A inversão<br />

<strong>do</strong> ônus da prova <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da aferição, pelo julga<strong>do</strong>r, da presença da verossimilhança das alegações ou da hipossuficiência <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, a teor <strong>do</strong> art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 2. É vedada, em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso especial, a análise da<br />

presença <strong>do</strong>s requisitos autoriza<strong>do</strong>res da inversão <strong>do</strong> ônus da prova previstos no inciso VIII <strong>do</strong> art. 6.º <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r, porquanto tal providência <strong>de</strong>mandaria o reexame <strong>do</strong> conjunto fático-probatório <strong>do</strong>s autos, o que se sabe veda<strong>do</strong> pelo<br />

Enuncia<strong>do</strong> 7 da Súmula <strong>do</strong> C. STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento” (STJ – AgRg no Ag 1247651/SP – Quarta<br />

Turma – Rel. Min. Raul Araújo – j. 28.09.2010 – DJe 20.10.2010).<br />

A <strong>do</strong>utrina majoritária enten<strong>de</strong> que o dispositivo legal <strong>de</strong>ve ser interpreta<strong>do</strong> literalmente, <strong>de</strong> forma que a hipossuficiência e a<br />

verossimilhança sejam consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s elementos alternativos, bastan<strong>do</strong> a presença <strong>de</strong> um <strong>de</strong>les para que se legitime a inversão <strong>do</strong><br />

ônus probatório 201 .<br />

Nesse senti<strong>do</strong> as lições <strong>de</strong> Sergio Cavalieri Filho:<br />

“Muito já se discutiu se esses pressupostos são cumulativos ou alternativos, mas hoje a questão está pacificada no senti<strong>do</strong> da


alternativida<strong>de</strong>. A própria conjunção alternativa empregada pelo legisla<strong>do</strong>r no texto está a apontar nesse senti<strong>do</strong>”202.<br />

Apesar <strong>de</strong>ssa pacificação mencionada pelo jurista carioca, continuo a ter dificulda<strong>de</strong> em aceitar a alternativida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s requisitos<br />

exigi<strong>do</strong>s para a inversão judicial <strong>do</strong> ônus da prova, ainda que reconheça que a opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r tenha si<strong>do</strong> realmente nesse<br />

senti<strong>do</strong>. Reconheço ser essa corrente manifestamente minoritária 203 , mas ainda assim me arrisco a <strong>de</strong>fendê-la.<br />

Na realida<strong>de</strong>, custo a crer que uma alegação absolutamente inverossímil, ainda que presente a hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r,<br />

seja apta por si só à inversão <strong>do</strong> ônus da prova, sob pena <strong>de</strong> termos <strong>de</strong> admitir a presunção <strong>de</strong> veracida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fatos absurdamente<br />

inverossímeis. Alguma plausibilida<strong>de</strong> a alegação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve conter, até mesmo porque a eventual falha probatória <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r não <strong>de</strong>ve ser suficiente para exigir <strong>do</strong> juiz a admissão <strong>de</strong> fatos que muito dificilmente ocorreram.<br />

Imagine-se que um consumi<strong>do</strong>r alegue que, realizan<strong>do</strong> compras num shopping center da cida<strong>de</strong>, foi abduzi<strong>do</strong> por<br />

extraterrestres, que com ele fizeram experiências terríveis, o que lhe teria gera<strong>do</strong> graves danos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m moral e material. A<br />

alegação, naturalmente, é inverossímil, mas claramente haverá uma hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, que terá extrema dificulda<strong>de</strong><br />

em provar o que alega. O fornece<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>ria até provar que nada daquilo ocorreu porque o autor da ação nunca esteve nas<br />

<strong>de</strong>pendências <strong>do</strong> shopping center, por meio da exibição <strong>do</strong>s ví<strong>de</strong>os capta<strong>do</strong>s pelas câmaras <strong>de</strong> segurança. Uma prova trabalhosa,<br />

mas não impossível, já que o autor teria menciona<strong>do</strong> o dia em que teria si<strong>do</strong> abduzi<strong>do</strong>.<br />

Na esdrúxula situação <strong>de</strong>scrita, imagine-se que, por alguma falha processual, ou mesmo <strong>do</strong> sistema <strong>de</strong> segurança <strong>do</strong> shopping<br />

center no dia narra<strong>do</strong> pelo autor, o fornece<strong>do</strong>r não consiga provar que naquele exato dia nenhum <strong>do</strong>s fatos po<strong>de</strong>ria materialmente<br />

ter ocorri<strong>do</strong>, porque o consumi<strong>do</strong>r não estava em suas <strong>de</strong>pendências na data narrada, ou, ainda, que lá esteve, mas foi filma<strong>do</strong><br />

durante to<strong>do</strong> o tempo <strong>de</strong> sua presença.<br />

A situação é teratológica propositalmente, somente para <strong>de</strong>monstrar o absur<strong>do</strong> que po<strong>de</strong> ser gera<strong>do</strong> pela visão simplista<br />

<strong>de</strong>rivada da interpretação literal <strong>do</strong> art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC, no tocante aos requisitos exigi<strong>do</strong>s para a inversão judicial <strong>do</strong> ônus da<br />

prova em favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. A preocupação não é nova, sen<strong>do</strong> encontrada em lições <strong>de</strong> <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res afligi<strong>do</strong>s com o exagero<br />

que uma visão protetiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> gerar no caso concreto204.<br />

Mesmo a <strong>do</strong>utrina que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a alternativida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s requisitos previstos no art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC, <strong>de</strong>monstra tal preocupação:<br />

“No caso da verossimilhança, não há dúvida quanto à dispensabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquer outro requisito. O mesmo já não ocorre,<br />

entretanto, com a hipossuficiência. Em nosso enten<strong>de</strong>r, não bastará que alguém alegue a ocorrência <strong>de</strong> um fato inverossímil, sem<br />

nenhuma probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser verda<strong>de</strong>iro, e mesmo assim tenha o ônus da prova inverti<strong>do</strong> em seu favor por ser hipossuficiente” 205 .<br />

Com o advento <strong>do</strong> art. 373, § 1.º <strong>do</strong> Novo CPC, que permite a distribuição dinâmica <strong>do</strong> ônus da prova como regra geral, po<strong>de</strong>se<br />

questionar se o art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC, continua a ter alguma utilida<strong>de</strong> prática.<br />

Nas relações consumeristas, entretanto, é preciso lembrar que existem <strong>do</strong>is requisitos para a inversão <strong>do</strong> ônus da prova que,<br />

segun<strong>do</strong> a <strong>do</strong>utrina majoritária, são alternativos, bastan<strong>do</strong> a presença <strong>de</strong> um <strong>de</strong>les para que se legitime a inversão <strong>do</strong> ônus<br />

probatório 206 . Dessa forma, ainda que não presentes as condições <strong>de</strong> hipossuficiência técnica, que legitimariam a aplicação da<br />

distribuição dinâmica <strong>do</strong> ônus da prova ao caso concreto, mas sen<strong>do</strong> verossímeis as alegações <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, a inversão será<br />

justificável. O art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC, portanto, sobrevive, ainda que parcialmente, diante <strong>do</strong> Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

10.7.3.3.1.<br />

Requisitos para a inversão judicial<br />

10.7.3.3.1.1.<br />

Verossimilhança da alegação<br />

O primeiro requisito para a inversão <strong>do</strong> ônus da prova previsto no art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC, é a verossimilhança da alegação <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, exigin<strong>do</strong>-se que suas alegações <strong>de</strong> fato sejam aparentemente verda<strong>de</strong>iras, toman<strong>do</strong>-se por base para essa análise as<br />

máximas <strong>de</strong> experiência, ou seja, aquilo que costuma ocorrer em situações similares à narrada na <strong>de</strong>manda judicial. Conforme já<br />

tive a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r, a verossimilhança é uma aparência da verda<strong>de</strong> pela mera alegação <strong>de</strong> um fato que costuma<br />

ordinariamente ocorrer, não se exigin<strong>do</strong> para sua constituição qualquer espécie <strong>de</strong> prova207, <strong>de</strong> forma que a prova final será<br />

exigida somente para o convencimento <strong>do</strong> juiz para a prolação <strong>de</strong> sua <strong>de</strong>cisão, nunca para permitir a inversão judicial <strong>do</strong> ônus <strong>de</strong><br />

provar.<br />

Registre-se corrente <strong>do</strong>utrinária contrária ao afirma<strong>do</strong>, que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> ser a verossimilhança fruto <strong>de</strong> um “juízo <strong>de</strong> probabilida<strong>de</strong><br />

extraída <strong>de</strong> material probatório <strong>de</strong> feitio indiciário, <strong>do</strong> qual se consegue formar a opinião <strong>de</strong> ser provavelmente verda<strong>de</strong>ira a versão<br />

<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r” 208 .<br />

Para Kazuo Watanabe, “na verda<strong>de</strong> não há uma verda<strong>de</strong>ira inversão <strong>do</strong> ônus da prova. O que ocorre, como bem observa Leo<br />

Rosenberg, é que o magistra<strong>do</strong>, com a ajuda das máximas <strong>de</strong> experiência e das regras <strong>de</strong> vida, consi<strong>de</strong>ra produzida a prova que


incumbe a uma das partes. Examinan<strong>do</strong> as condições <strong>de</strong> fato com base em máximas <strong>de</strong> experiência, o magistra<strong>do</strong> parte <strong>do</strong> curso<br />

normal <strong>do</strong>s acontecimentos, e, porque o fato é ordinariamente a consequência ou o pressuposto <strong>de</strong> um outro fato, em caso <strong>de</strong><br />

existência <strong>de</strong>ste, admite também aquele como existente, a menos que a outra parte <strong>de</strong>monstre o contrário. Assim, não se trata <strong>de</strong><br />

uma autêntica hipótese <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova” 209 .<br />

10.7.3.3.1.2.<br />

Hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r<br />

O segun<strong>do</strong> requisito para a inversão <strong>do</strong> ônus da prova previsto no art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC, é a hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Trata-se <strong>de</strong> requisito bem mais polêmico na <strong>do</strong>utrina que o primeiro, embora seja possível se verificar uma tendência <strong>do</strong>utrinária<br />

majoritária no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r que a hipossuficiência exigida pela lei é a técnica.<br />

A condição econômica <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, portanto, é irrelevante, porque mesmo consumi<strong>do</strong>res abasta<strong>do</strong>s, eventualmente em<br />

situação econômica até mais confortável que a <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, po<strong>de</strong>m ter dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> acesso às informações e meios necessários<br />

à produção da prova. Nas corretas palavras <strong>de</strong> Kazuo Watanabe, “ocorren<strong>do</strong>, assim, situação <strong>de</strong> manifesta posição <strong>de</strong> superiorida<strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r em relação ao consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong> que <strong>de</strong>corra a conclusão <strong>de</strong> que é muito mais fácil ao fornece<strong>do</strong>r provar a sua<br />

alegação, po<strong>de</strong>rá o juiz proce<strong>de</strong>r à inversão <strong>do</strong> ônus da prova”210.<br />

Deve-se, entretanto, ter muito cuida<strong>do</strong> no caso concreto com essa inversão <strong>do</strong> ônus da prova, porque não parece razoável que<br />

com a inversão no caso concreto ao fornece<strong>do</strong>r seja imposto um ônus <strong>do</strong> qual será extremamente difícil, ou até mesmo impossível,<br />

se <strong>de</strong>sincumbir. A superiorida<strong>de</strong> técnica <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve se manifestar no caso concreto <strong>de</strong> forma que a ele seja viável ou mais<br />

fácil a produção da prova, e quan<strong>do</strong> isso não ocorre é difícil sustentar a hipossuficiência <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Vale consi<strong>de</strong>rar a respeito <strong>do</strong> tema as lições <strong>de</strong> Cândi<strong>do</strong> Rangel Dinamarco:<br />

“O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r não impõe expressamente qualquer limitação aos efeitos da inversão judicial <strong>do</strong> ônus da<br />

prova, ou seja, nele não se vê qualquer veto explícito às inversões que ponham o fornece<strong>do</strong>r diante da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma probatio<br />

diabolica. Mas, se é ineficaz a inversão exagerada mesmo quan<strong>do</strong> resultante <strong>de</strong> ato voluntário <strong>de</strong> pessoas maiores e capazes (CPC,<br />

art. 333, II), com mais fortes razões sua imposição por <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> juiz não po<strong>de</strong>rá ser eficaz quan<strong>do</strong> for além <strong>do</strong> razoável e chegar<br />

ao ponto <strong>de</strong> tornar excessivamente difícil ao fornece<strong>do</strong>r o exercício <strong>de</strong> sua <strong>de</strong>fesa. Eventuais exageros <strong>de</strong>ssa or<strong>de</strong>m transgrediriam a<br />

garantia constitucional da ampla <strong>de</strong>fesa e consequentemente comprometeriam a superior promessa <strong>de</strong> dar tutela jurisdicional a quem<br />

tiver razão (acesso à justiça)” 211 .<br />

No mesmo senti<strong>do</strong> se manifestou o Ministro <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça Luiz Felipe Salomão, ao afirmar em voto que,<br />

“ainda que se trate <strong>de</strong> relação regida pelo CDC, não se concebe inverter-se o ônus da prova para, retiran<strong>do</strong> tal incumbência <strong>de</strong><br />

quem po<strong>de</strong>ria fazê-lo mais facilmente, atribuí-la a quem, por impossibilida<strong>de</strong> lógica e natural, não o conseguiria” 212 .<br />

Realmente essa é uma situação que não po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rada. Quan<strong>do</strong> a inversão <strong>do</strong> ônus <strong>de</strong> uma prova gerar ao<br />

fornece<strong>do</strong>r dificulda<strong>de</strong> extrema ou até mesmo <strong>de</strong> impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produzir a prova, não será caso <strong>de</strong> inversão se o consumi<strong>do</strong>r<br />

pu<strong>de</strong>r se <strong>de</strong>sincumbir <strong>do</strong> ônus <strong>de</strong>ssa prova. Deve se levar a sério a espécie <strong>de</strong> hipossuficiência exigida pelo art. 6.º, VIII, <strong>do</strong> CDC,<br />

que não tem vinculação à notória vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r diante o fornece<strong>do</strong>r, mas sim a maior facilida<strong>de</strong> na produção da<br />

prova. Ora, se a maior facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produzir a prova é <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, o hipossuficiente nesse caso é o fornece<strong>do</strong>r! E assim sen<strong>do</strong>,<br />

insista-se, não é caso <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova.<br />

Deve-se levar em consi<strong>de</strong>ração interessante apontamento <strong>do</strong> Ministro <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça em voto já menciona<strong>do</strong>:<br />

“a facilitação da <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>finitivamente, não significa facilitar a procedência <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> por ele<br />

<strong>de</strong>duzi<strong>do</strong>, ten<strong>do</strong> em vista – no que concerne à inversão <strong>do</strong> ônus da prova – tratar-se <strong>de</strong> dispositivo vocaciona<strong>do</strong> à elucidação <strong>do</strong>s<br />

fatos narra<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r, transferin<strong>do</strong> tal incumbência a quem, em tese, possua melhores condições <strong>de</strong> fazê-lo.”213<br />

A lição é interessante porque corretamente aponta para a finalida<strong>de</strong> da inversão <strong>do</strong> ônus da prova: proporcionar uma maior<br />

facilida<strong>de</strong> na produção da prova, com o que o juiz se aproximará mais da verda<strong>de</strong> e proferirá uma <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> melhor qualida<strong>de</strong>.<br />

Em nenhum momento a inversão <strong>de</strong>ve ser regra voltada à vitória <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo, porque o que se objetiva é a busca da<br />

verda<strong>de</strong> que, naturalmente, nem sempre está ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Não tenho dúvida a respeito da aplicação <strong>do</strong> art. 373, § 2.º, <strong>do</strong> Novo CPC à inversão ora analisada na seara consumerista. Se o<br />

motivo da inversão em ambos os casos é a hipossuficiência técnica da parte, é consequência natural que, em ambas, a inversão não<br />

acarrete dificulda<strong>de</strong> insuperável para a parte contrária. Nos termos <strong>do</strong> dispositivo ora analisa<strong>do</strong>, a redistribuição <strong>do</strong> ônus da prova<br />

não po<strong>de</strong> gerar situação em que a <strong>de</strong>sincumbência <strong>do</strong> encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil.<br />

A situação é bem mais complexa se a hipótese enseja uma extrema dificulda<strong>de</strong> ou impossibilida<strong>de</strong> recíproca na produção da<br />

prova, que atinge tanto o consumi<strong>do</strong>r como o fornece<strong>do</strong>r. O que fazer se o fato dificilmente po<strong>de</strong>rá ser prova<strong>do</strong> por ambas as<br />

partes que participaram da relação <strong>de</strong> direito material consumerista? Inverter o ônus é sacrificar sem chance <strong>de</strong> reação o


fornece<strong>do</strong>r, mas não fazê-lo é sacrificar a pretensão <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r…<br />

Nesse caso, não vejo alternativa que não seja levar em consi<strong>de</strong>ração os indícios colhi<strong>do</strong>s no processo, que <strong>de</strong>verão ser<br />

excepcionalmente admiti<strong>do</strong>s para se <strong>de</strong>terminar ou não a inversão <strong>do</strong> ônus da prova. Se os indícios apontarem no senti<strong>do</strong> das<br />

alegações <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, po<strong>de</strong>rá inverter o ônus da prova e julgar em seu favor; por outro la<strong>do</strong>, se os indícios apontam para uma<br />

provável inverda<strong>de</strong> das alegações, <strong>de</strong>ve ser mantida a regra <strong>do</strong> art. 373 <strong>do</strong> Novo CPC e ser rejeitada a pretensão <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Trago um exemplo para ilustrar meu posicionamento. Um consumi<strong>do</strong>r recebe a notícia <strong>de</strong> que seu nome foi incluí<strong>do</strong> no<br />

SERASA por instituição financeira, em razão <strong>de</strong> débito em sua conta-corrente. O consumi<strong>do</strong>r alega que aquela conta foi encerrada<br />

há alguns anos atrás, e que a instituição financeira in<strong>de</strong>vidamente a manteve aberta, <strong>de</strong>bitan<strong>do</strong> valores mensalmente. A instituição<br />

financeira, por sua vez, afirma que a conta nunca foi encerrada, justifican<strong>do</strong> sua cobrança.<br />

Por um la<strong>do</strong>, será impossível à instituição financeira provar que a conta-corrente não foi encerrada, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se tratar-se<br />

<strong>de</strong> prova diabólica (fato negativo in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>). Por outro la<strong>do</strong>, entretanto, parece no mínimo exagera<strong>do</strong> exigir que o consumi<strong>do</strong>r<br />

guar<strong>de</strong> consigo a <strong>do</strong>cumentação <strong>do</strong> referi<strong>do</strong> encerramento realiza<strong>do</strong> cinco, seis anos atrás. Sob pena <strong>de</strong> se tornar um “acumula<strong>do</strong>r”,<br />

qualquer pessoa normal não tem essa disposição em guardar papéis, ainda que relevantes como o <strong>de</strong> encerramento <strong>de</strong> uma contacorrente.<br />

Numa situação como essa, caberá ao juiz analisar os indícios presentes nos autos. Caso haja prova <strong>de</strong> que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a época em<br />

que o consumi<strong>do</strong>r afirma ter encerra<strong>do</strong> a conta-corrente, não houve qualquer movimentação bancária, é um bom indício <strong>de</strong> que<br />

esteja dizen<strong>do</strong> a verda<strong>de</strong>. Se restar prova<strong>do</strong> que à época <strong>do</strong> suposto encerramento o consumi<strong>do</strong>r fez uma retirada <strong>de</strong> quase to<strong>do</strong> o<br />

valor conti<strong>do</strong> na conta-corrente, procedimento comum que antece<strong>de</strong> seu encerramento, mais um forte indício <strong>de</strong> que esteja dizen<strong>do</strong><br />

a verda<strong>de</strong>. A ausência <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração da referida conta no imposto <strong>de</strong> renda <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r é mais um indício que <strong>de</strong>ve ser leva<strong>do</strong><br />

em consi<strong>de</strong>ração.<br />

Nesse caso, mesmo sem uma prova cabal no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a conta-corrente foi encerrada, como alega o consumi<strong>do</strong>r, ou <strong>de</strong><br />

que ela foi mantida, como alega o fornece<strong>do</strong>r, os indícios presentes possibilitam a conclusão em favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. O juiz,<br />

portanto, <strong>de</strong>verá presumir em favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, afirman<strong>do</strong> que a ausência <strong>de</strong> prova <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r <strong>de</strong> que a conta não tenha<br />

si<strong>do</strong> encerrada permita que ele se convença <strong>do</strong> contrário, mesmo que inexistentes nos autos os <strong>do</strong>cumentos comprobatórios <strong>de</strong> tal<br />

encerramento.<br />

A solução, portanto, passa por um juízo <strong>de</strong> probabilida<strong>de</strong> colhi<strong>do</strong> com os indícios existentes no processo, porque, sen<strong>do</strong><br />

impossível ou extremamente difícil a produção da prova para ambas as partes, não será justo nem a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> a inversão <strong>do</strong> ônus da<br />

prova automaticamente, como também não será justo em todas as hipóteses carrear tal ônus ao consumi<strong>do</strong>r.<br />

Outra solução, entretanto, <strong>de</strong>ve ser dada na hipótese <strong>de</strong> o fundamento da inversão <strong>do</strong> ônus da prova ser a verossimilhança das<br />

alegações <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r no processo. Partin<strong>do</strong>-se da premissa já analisada <strong>de</strong> que a hipossuficiência técnica e a verossimilhança<br />

da alegação são requisitos alternativos para a inversão <strong>do</strong> ônus probatório em favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, é importante observar que o<br />

segun<strong>do</strong> requisito não tem como fundamento a distribuição dinâmica <strong>do</strong> ônus da prova, e sim uma opção <strong>de</strong> política legislativa <strong>de</strong><br />

proteção ao consumi<strong>do</strong>r.<br />

Significa que nesse caso a inversão <strong>do</strong> ônus da prova não tem como fundamento a menor ou maior facilida<strong>de</strong> das partes na<br />

produção da prova, mas numa hipossuficiência presumida <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Não ten<strong>do</strong> como fundamento a maior facilida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r em produzir a prova, à inversão nesse caso não se aplica a restrição prevista no art. 373, § 2.º, <strong>do</strong> Novo CPC por<br />

<strong>de</strong>corrência lógica da não aplicação <strong>do</strong> parágrafo anterior à relação jurídica consumerista.<br />

Dessa forma, torna-se irrelevante no caso concreto a dificulda<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r produzir a prova <strong>do</strong> fato constitutivo <strong>de</strong> seu<br />

direito ou a facilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r produzir a prova <strong>de</strong> que tal alegação <strong>de</strong> fato é falsa, bastan<strong>do</strong> que haja verossimilhança na<br />

alegação para se justificar a inversão <strong>do</strong> ônus da prova.<br />

10.7.4.<br />

Momento <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova<br />

Na inversão convencional e legal, não surge problema quanto ao momento <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova; na primeira, estará<br />

inverti<strong>do</strong> o ônus a partir <strong>do</strong> acor<strong>do</strong> entre as partes, e, na segunda, a inversão ocorre <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início da <strong>de</strong>manda. Na hipótese<br />

judicial, entretanto, a inversão <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>cisão judicial fundada no preenchimento <strong>do</strong>s requisitos legais, e o momento da<br />

prolação <strong>de</strong>ssa <strong>de</strong>cisão não é tema pacífico na <strong>do</strong>utrina, existin<strong>do</strong> ao menos três correntes.<br />

Para parcela <strong>do</strong>utrinária, o momento a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> para o juiz inverter a regra <strong>do</strong> ônus da prova é o momento <strong>de</strong> sua aplicação,<br />

qual seja o julgamento <strong>do</strong> processo. Por esse entendimento, por se tratar o ônus da prova uma regra <strong>de</strong> julgamento, não teria<br />

senti<strong>do</strong> tratá-la antes <strong>de</strong>sse momento procedimental, inclusive quanto à sua inversão. Sérgio Cruz Arenhart afirma que “parece<br />

mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> enten<strong>de</strong>r que o sistema processual brasileiro vê na regra sobre o ônus da prova uma regra <strong>de</strong> julgamento, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong><br />

que a modificação <strong>do</strong> onus probandi realmente só po<strong>de</strong> dar-se por ocasião da prolação <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões judiciais. De fato, se é certo que


a regra em questão informa ao magistra<strong>do</strong> como <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>cidir em caso <strong>de</strong> dúvida, somente na oportunida<strong>de</strong> em que proferirá<br />

<strong>de</strong>cisão proce<strong>de</strong>rá ele a avaliação <strong>de</strong> seu convencimento”214.<br />

Existem <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça nesse senti<strong>do</strong>, inclusive permitin<strong>do</strong> a inversão <strong>do</strong> ônus da prova em grau<br />

recursal, sob o argumento <strong>de</strong> que, por se tratar <strong>de</strong> regra <strong>de</strong> julgamento, é esse o momento a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> <strong>de</strong> aplicá-la, inclusive <strong>de</strong> forma<br />

invertida:<br />

“Agravo regimental. Agravo <strong>de</strong> instrumento. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova em 2.º grau <strong>de</strong> jurisdição. Possibilida<strong>de</strong>. Regra <strong>de</strong><br />

julgamento. 1. Essa Corte firmou o entendimento <strong>de</strong> que é plenamente possível a inversão <strong>do</strong> ônus da prova em 2.º grau <strong>de</strong><br />

jurisdição, pois cuida-se <strong>de</strong> uma regra <strong>de</strong> julgamento, que não implica em cerceamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa para nenhuma das partes. 2.<br />

Agravo regimental não provi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg no Ag 1.028.085/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Vasco Della Giustina, Des.<br />

convoca<strong>do</strong> – j. 04.02.2010 – DJe 16.04.2010).<br />

O gran<strong>de</strong> problema <strong>de</strong>ssa corrente <strong>do</strong>utrinária é consi<strong>de</strong>rar o ônus da prova somente em seu aspecto objetivo, como regra <strong>de</strong><br />

julgamento, <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> seu aspecto subjetivo, pelo qual o ônus da prova funciona como uma regra <strong>de</strong> conduta das partes<br />

durante a instrução probatória. Enten<strong>do</strong> que uma inversão <strong>do</strong> ônus da prova somente no momento <strong>do</strong> julgamento surpreen<strong>de</strong> a<br />

parte que até então não tinha tal ônus, em nítida afronta ao princípio <strong>do</strong> contraditório. Inverter o ônus da prova e não conce<strong>de</strong>r<br />

oportunida<strong>de</strong> para que a parte produza a prova representa claro e manifesto cerceamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa.<br />

Esse, entretanto, não é um entendimento pacifica<strong>do</strong> na <strong>do</strong>utrina. Para Nelson Nery Jr. e Maria Rosa Andra<strong>de</strong> Nery, a parte que<br />

teve o ônus da prova inverti<strong>do</strong> na sentença, “momento a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> para o juiz assim proce<strong>de</strong>r, não po<strong>de</strong>rá alegar cerceamento <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>fesa porque, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início da <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> consumo, já sabia quais eram as regras <strong>do</strong> jogo e que, haven<strong>do</strong> o non liquet quanto à<br />

prova, po<strong>de</strong>ria ter contra ela inverti<strong>do</strong> o ônus da prova. Em suma, o fornece<strong>do</strong>r (CDC 3.º) já sabe, <strong>de</strong> antemão, que tem <strong>de</strong> provar<br />

tu<strong>do</strong> o que estiver a seu alcance e for <strong>de</strong> seu interesse nas li<strong>de</strong>s <strong>de</strong> consumo. Não é pego <strong>de</strong> surpresa com a inversão na<br />

sentença”215.<br />

Data maxima venia, o entendimento é ingênuo e <strong>de</strong>sconecta<strong>do</strong> da realida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> por completo a vida real na<br />

praxe forense. Afirmo que o advoga<strong>do</strong> tem como principal função a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses <strong>de</strong> seu cliente, sen<strong>do</strong> que a justiça da<br />

<strong>de</strong>cisão <strong>de</strong>ve ser preocupação <strong>do</strong> juiz. Dentro da boa-fé e lealda<strong>de</strong> processual, a missão constitucionalmente atribuída ao advoga<strong>do</strong><br />

é <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r os interesses <strong>de</strong> seu patrocina<strong>do</strong> para que ganhe a <strong>de</strong>manda. Para o advoga<strong>do</strong> – e, por consequência, para as partes –, o<br />

justo é a vitória. Como já dizia com primazia Calamandrei, o advoga<strong>do</strong> que muito se preocupa com a justiça preten<strong>de</strong> tomar o<br />

lugar <strong>do</strong> juiz, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> <strong>de</strong>sassisti<strong>do</strong> seu cliente, o que é mortal para a dialeticida<strong>de</strong> necessária no processo.<br />

O que preten<strong>do</strong> dizer é que a parte que não tem o ônus da prova naturalmente terá uma atuação probatória menos intensa,<br />

porque sabe que, não haven<strong>do</strong> prova alguma, se sagrará vitoriosa na <strong>de</strong>manda. O resulta<strong>do</strong> da prova é imprevisível, e não é crível<br />

acreditar que um advoga<strong>do</strong>, mesmo saben<strong>do</strong> que seu cliente ganhará a <strong>de</strong>manda sem a prova, tenha interesse em produzi-la ainda<br />

assim. É no mínimo ingênuo pensar que as partes <strong>de</strong>vem fazer todas as provas possíveis in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> quem tenha o ônus<br />

probatório. Insisto: vencer a <strong>de</strong>manda é o objetivo <strong>de</strong> qualquer parte, e vencê-la pela aplicação <strong>do</strong> ônus da prova ou da certeza<br />

formada pela prova produzida não tem qualquer diferença. Por que exigir que o advoga<strong>do</strong> da parte que não tem o ônus da prova se<br />

arrisque a per<strong>de</strong>r uma <strong>de</strong>manda ganha, produzin<strong>do</strong> uma prova que para ele não trará qualquer melhora em termos <strong>de</strong> resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

processo?<br />

Não são poucos os <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m haver uma clara violação ao princípio <strong>do</strong> contraditório com a inversão <strong>do</strong><br />

ônus da prova, ocorren<strong>do</strong> somente no momento <strong>de</strong> prolação da <strong>de</strong>cisão216. Precisas são as palavras <strong>de</strong> Humberto Theo<strong>do</strong>ro Jr. a<br />

esse respeito:<br />

“É certo que a boa <strong>do</strong>utrina enten<strong>de</strong> que as regras sobre ônus da prova se impõem para solucionar questões examináveis no<br />

momento <strong>de</strong> sentenciar. Mas, pela garantia <strong>do</strong> contraditório e ampla <strong>de</strong>fesa, as partes, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início da fase instrutória, têm <strong>de</strong><br />

conhecer quais são as regras que irão prevalecer na apuração da verda<strong>de</strong> real sobre a qual se assentará, no fim <strong>do</strong> processo, a<br />

solução da li<strong>de</strong>. (…) A não ser assim, ter-se-ia uma surpresa intolerável e irremediável, em franca oposição aos princípios da<br />

segurança jurídica e lealda<strong>de</strong> imprescindíveis à cooperação <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os sujeitos <strong>do</strong> processo na busca e construção da justa solução<br />

<strong>do</strong> litígio. Somente asseguran<strong>do</strong> a cada litigante o conhecimento prévio <strong>de</strong> qual será o objeto da prova e a quem incumbirá o ônus <strong>de</strong><br />

produzi-la é que se preservará a garantia constitucional da ampla <strong>de</strong>fesa” 217 .<br />

Partin<strong>do</strong>-se da premissa que a inversão no momento <strong>do</strong> julgamento, sem dar chances à parte que até então não tinha tal ônus<br />

<strong>de</strong> produzir a prova, viola o princípio <strong>do</strong> contraditório, geran<strong>do</strong> cerceamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa, a <strong>do</strong>utrina divi<strong>de</strong>-se em duas correntes a<br />

respeito <strong>do</strong> momento a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> à inversão.<br />

Parcela significativa da <strong>do</strong>utrina enten<strong>de</strong> que a inversão <strong>de</strong>ve ocorrer no saneamento <strong>do</strong> processo, ou seja, antes <strong>do</strong> início da<br />

instrução probatória. Nesse senti<strong>do</strong>, Alexandre Freitas Câmara afirma que “cabe ao juiz, pois, no momento em que organizar a


instrução probatória (o que, no procedimento ordinário, ocorre na audiência preliminar, prevista no art. 331 <strong>do</strong> CPC, quan<strong>do</strong> o<br />

magistra<strong>do</strong> fixa os pontos controverti<strong>do</strong>s e <strong>de</strong>termina as provas que serão produzidas), inverte-se, se for o caso, o ônus da<br />

prova”. 218<br />

O entendimento consagra<strong>do</strong> no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça é nesse senti<strong>do</strong>, lembran<strong>do</strong> que, além <strong>de</strong> regra <strong>de</strong> julgamento, o<br />

ônus da prova também é uma regra <strong>de</strong> conduta (ou <strong>de</strong> instrução):<br />

“Inversão. Ônus. Prova. CDC. Trata-se <strong>de</strong> REsp em que a controvérsia consiste em <strong>de</strong>finir qual o momento processual a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong><br />

para que o juiz, na responsabilida<strong>de</strong> por vício <strong>do</strong> produto (art. 18 <strong>do</strong> CDC), <strong>de</strong>termine a inversão <strong>do</strong> ônus da prova prevista no art.<br />

6.º, VIII, <strong>do</strong> mesmo co<strong>de</strong>x. No julgamento <strong>do</strong> especial, entre outras consi<strong>de</strong>rações, observou o Min. Relator que a distribuição <strong>do</strong><br />

ônus da prova apresenta extrema relevância <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m prática, nortean<strong>do</strong>, como uma bússola, o comportamento processual das<br />

partes. Naturalmente, participará da instrução probatória com maior vigor, intensida<strong>de</strong> e interesse a parte sobre a qual recai o<br />

encargo probatório <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> fato controverti<strong>do</strong> no processo. Dessarte, consignou que, influin<strong>do</strong> a distribuição <strong>do</strong> encargo<br />

probatório <strong>de</strong>cisivamente na conduta processual das partes, <strong>de</strong>vem elas possuir a exata ciência <strong>do</strong> ônus atribuí<strong>do</strong> a cada uma <strong>de</strong>las<br />

para que possam produzir oportunamente as provas que enten<strong>de</strong>rem necessárias. Ao contrário, permitida a distribuição ou a inversão<br />

<strong>do</strong> ônus probatório na sentença e inexistin<strong>do</strong>, com isso, a necessária certeza processual, haverá o risco <strong>de</strong> o julgamento ser proferi<strong>do</strong><br />

sob uma <strong>de</strong>ficiente e <strong>de</strong>sinteressada instrução probatória, na qual ambas as partes tenham atua<strong>do</strong> com base na confiança <strong>de</strong> que<br />

sobre elas não recairia o encargo da prova <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> fato. Assim, enten<strong>de</strong>u que a inversão ope judicis <strong>do</strong> ônus da prova <strong>de</strong>ve<br />

ocorrer preferencialmente no <strong>de</strong>spacho sanea<strong>do</strong>r, ocasião em que o juiz <strong>de</strong>cidirá as questões processuais pen<strong>de</strong>ntes e <strong>de</strong>terminará as<br />

provas a serem produzidas, <strong>de</strong>signan<strong>do</strong> audiência <strong>de</strong> instrução e julgamento (art. 331, §§ 2.º e 3.º, <strong>do</strong> CPC). Desse mo<strong>do</strong>, confere-se<br />

maior certeza às partes referente aos seus encargos processuais, evitan<strong>do</strong> a insegurança. Com esse entendimento, a Seção, ao<br />

prosseguir o julgamento, por maioria, negou provimento ao recurso, manten<strong>do</strong> o acórdão que <strong>de</strong>sconstituiu a sentença, a qual<br />

<strong>de</strong>terminara, nela própria, a inversão <strong>do</strong> ônus da prova. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: REsp 720.930/RS – DJe 09.11.2009, e REsp<br />

881.651/BA, DJ 21.05.2007” (REsp 802.832/MG – Segunda Seção – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 13.04.2011 –<br />

Informativo STJ 469).219<br />

Não concor<strong>do</strong> plenamente com esse entendimento porque, sen<strong>do</strong> realmente uma regra <strong>de</strong> julgamento, não teria senti<strong>do</strong><br />

invertê-la no saneamento <strong>do</strong> processo. Por ser uma regra <strong>de</strong> julgamento, só se aplican<strong>do</strong> ao final <strong>do</strong> processo, e isso somente no<br />

caso <strong>de</strong> inexistência ou insuficiência <strong>de</strong> prova, cabe sua aplicação, <strong>de</strong> forma invertida ou não, somente no momento <strong>do</strong> julgamento.<br />

Não é porque se <strong>de</strong>ve consi<strong>de</strong>rar o aspecto subjetivo <strong>do</strong> ônus da prova que se po<strong>de</strong> abdicar <strong>de</strong> seu aspecto objetivo.<br />

Dessa forma, em respeito ao princípio <strong>do</strong> contraditório, o juiz <strong>de</strong>ve, já no saneamento <strong>do</strong> processo, se manifestar sobre<br />

eventual inversão da regra geral contida no art. 373 <strong>do</strong> Novo CPC220. Perceba-se que o juiz não estaria nesse momento inverten<strong>do</strong><br />

o ônus da prova, regra que até mesmo po<strong>de</strong> nem ser utilizada caso a instrução probatória seja suficiente à formação <strong>do</strong><br />

convencimento judicial. O que o juiz fará é apenas sinalizar às partes que, no caso <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aplicação da regra, o fará <strong>de</strong><br />

forma invertida, e não conforme previsto como regra geral em nosso estatuto processual.<br />

Para que o réu não seja surpreendi<strong>do</strong> com a inversão quan<strong>do</strong> já finalizada a instrução probatória, enten<strong>do</strong> que, em respeito ao<br />

princípio <strong>do</strong> contraditório, a sinalização <strong>de</strong> possível inversão – se necessário for – <strong>de</strong>ve ser feita expressamente já na <strong>de</strong>cisão<br />

sanea<strong>do</strong>ra.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, as lições <strong>de</strong> Cândi<strong>do</strong> Rangel Dinamarco:<br />

“Se o juiz preten<strong>de</strong>r inverter o ônus da prova, como em certa medida lhe permite o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r em relação às<br />

causas que disciplina (art. 6.º, VIII – supra, n. 799), <strong>de</strong>ssa possibilida<strong>de</strong> advertirá as partes na audiência preliminar. Mas a efetiva<br />

inversão só acontecerá no momento <strong>de</strong> julgar a causa, pois antes ainda não se conhecem os resulta<strong>do</strong>s mais conclusivos ou menos<br />

conclusivos a que a instrução probatória conduzirá; a própria verossimilhança das alegações <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, eventualmente sentida<br />

pelo juiz em algum momento inicial <strong>do</strong> procedimento, po<strong>de</strong>rá ficar prejudicada em face das provas que vierem a ser produzidas e<br />

alegações levantadas pelo adversário” 221 .<br />

Mesmo <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m a inversão somente na sentença, como Kazuo Watanabe, afirmam ser “medida <strong>de</strong> boa<br />

política judiciária, na linha evolutiva <strong>do</strong> processo civil mo<strong>de</strong>rno, que confere ao juiz até mesmo atribuições assistenciais, e na<br />

conformida<strong>de</strong> da sugestão <strong>de</strong> Cecília Matos, que, no <strong>de</strong>spacho sanea<strong>do</strong>r ou em outro momento que prece<strong>de</strong> a fase instrutória da<br />

causa, o magistra<strong>do</strong> <strong>de</strong>ixe adverti<strong>do</strong> às partes que a regra <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova po<strong>de</strong>rá, eventualmente, ser aplicada no<br />

momento <strong>do</strong> julgamento final da ação. Com semelhante providência ficará <strong>de</strong>finitivamente afastada a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alegação <strong>de</strong><br />

cerceamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa”222.<br />

A divergência ten<strong>de</strong> a diminuir significativamente em razão <strong>do</strong> novo diploma processual que prevê em seu art. 357, III, <strong>de</strong>ntre<br />

os <strong>de</strong>veres <strong>do</strong> juiz no saneamento e organização <strong>do</strong> processo, a eventual redistribuição <strong>do</strong> ônus da prova. Trata-se <strong>do</strong> momento<br />

mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> para a inversão nos termos da lei, mas não se po<strong>de</strong> afirmar que exista preclusão da matéria, <strong>de</strong> forma que nada<br />

impe<strong>de</strong> que o juiz inverta o ônus da prova após esse momento procedimental. E, assim o fazen<strong>do</strong>, <strong>de</strong>verá respeitar o princípio <strong>do</strong>


contraditório, nos termos <strong>do</strong> art. 373, § 1.º, <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Dois pontos finais merecem <strong>de</strong>staque.<br />

Naturalmente se opera a preclusão sobre a <strong>de</strong>cisão que informa as partes a respeito da forma como será aplicada a regra <strong>do</strong><br />

ônus da prova na hipótese <strong>de</strong> ser necessária essa técnica <strong>de</strong> julgamento. A partir <strong>do</strong> momento em que o juiz sinaliza <strong>de</strong> quem será o<br />

ônus probatório, caso seja necessária a aplicação <strong>de</strong>ssa regra, a conduta probatória das partes estará <strong>de</strong>terminada, e o consumi<strong>do</strong>r<br />

não terá interesse em produzir uma prova quan<strong>do</strong> souber que sua ausência não lhe traz qualquer prejuízo. Trata-se <strong>do</strong> aspecto<br />

subjetivo <strong>do</strong> ônus da prova, já analisa<strong>do</strong>.<br />

Não po<strong>de</strong> o juiz, no momento <strong>de</strong> sentenciar, e sen<strong>do</strong> necessária a aplicação da regra <strong>do</strong> ônus da prova, <strong>de</strong>scumprir sua<br />

sinalização e <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> proce<strong>de</strong>r à inversão. Nesse caso, surpreen<strong>de</strong>ria o consumi<strong>do</strong>r, que, com a sinalização <strong>do</strong> juiz <strong>de</strong> que o ônus<br />

não seria seu, passou a uma atuação mais relaxada na instrução probatória. Uma <strong>de</strong>cisão nesses termos seria viola<strong>do</strong>ra <strong>do</strong><br />

contraditório, cercean<strong>do</strong> insuportavelmente a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Além disso, seria uma afronta clara ao princípio <strong>de</strong><br />

cooperação entre os sujeitos processuais, com uma quebra inadmissível <strong>de</strong> confiança na atuação judicial.<br />

Justamente por enten<strong>de</strong>r existir preclusão pro iudicato na <strong>de</strong>cisão que sinaliza a aplicação invertida da regra <strong>do</strong> ônus da prova,<br />

no caso <strong>de</strong> não haver prova suficiente para formar o convencimento <strong>do</strong> juiz, <strong>de</strong>fen<strong>do</strong> o cabimento <strong>de</strong> agravo <strong>de</strong> instrumento contra<br />

essa <strong>de</strong>cisão. Apesar <strong>de</strong> não ter ocorri<strong>do</strong> ainda a inversão <strong>do</strong> ônus probatório, como o juiz não po<strong>de</strong> voltar atrás em seu<br />

entendimento, é natural que haja interesse recursal <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r em impugnar tal pronunciamento judicial. A sucumbência<br />

suportada pelo fornece<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>rá ser até eventual, já que a regra <strong>do</strong> ônus da prova po<strong>de</strong> nem vir a ser aplicada, mas, como a<br />

<strong>de</strong>cisão não po<strong>de</strong>rá ser alterada, e <strong>de</strong>terminará a conduta das partes durante a instrução probatória, enten<strong>do</strong> ser cabível o agravo <strong>de</strong><br />

instrumento.<br />

Por fim, registre-se que a inversão <strong>do</strong> ônus da prova no momento da sentença, sem que tenha havi<strong>do</strong> indicação prévia às partes<br />

nesse senti<strong>do</strong>, somente violará o princípio <strong>do</strong> contraditório se não for concedi<strong>do</strong> prazo para a parte que recebe o ônus produzir a<br />

prova necessária para vencer a <strong>de</strong>manda. O problema, na realida<strong>de</strong>, não é a inversão no momento <strong>do</strong> julgamento, mas o julgamento<br />

sem antes ter se da<strong>do</strong> aviso às partes a respeito da forma <strong>de</strong> aplicação da regra <strong>do</strong> ônus da prova.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, corretas as lições <strong>de</strong> Humberto Theo<strong>do</strong>ro Jr., ao afirmar que, “se o juiz convencer-se da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inverter<br />

o ônus da prova <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> já encerrada a instrução da causa, terá <strong>de</strong> reabrir a fase probatória, a fim <strong>de</strong> que o fornece<strong>do</strong>r tenha<br />

oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produzir a prova que julgar conveniente para liberar-se <strong>do</strong> novo onus probandi”223.<br />

A observação é importante em razão <strong>de</strong> procedimentos que não têm um momento sanea<strong>do</strong>r, como ocorre no procedimento<br />

ordinário 224 . Penso no procedimento <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais, em que não há propriamente uma fase <strong>de</strong> saneamento, sen<strong>do</strong> que a<br />

sessão <strong>de</strong> conciliação (chamada em muitos lugares <strong>de</strong> audiência) é invariavelmente conduzida por um concilia<strong>do</strong>r, sem po<strong>de</strong>res<br />

para <strong>de</strong>terminar a inversão ou informar as partes a respeito <strong>de</strong>ssa possível inversão.<br />

Concor<strong>do</strong> com a <strong>do</strong>utrina que enten<strong>de</strong> que a inversão já no momento inicial da <strong>de</strong>manda é prematura, porque, além <strong>de</strong> ser<br />

ce<strong>do</strong> <strong>de</strong>mais para o juiz analisar os requisitos legais para a inversão, antes da citação <strong>do</strong> réu tratar-se-ia <strong>de</strong> uma inversão inaudita<br />

altera parte, sem a garantia <strong>do</strong> princípio <strong>do</strong> contraditório. Para Alexandre Freitas Câmara, “não se po<strong>de</strong>, registre-se, aceitar que a<br />

inversão se dê logo no <strong>de</strong>spacho inicial <strong>do</strong> processo, já que nesse momento ainda não é sequer possível <strong>de</strong>terminar qual será o<br />

objeto da prova (afinal, ainda não se sabe que fatos se tornarão controverti<strong>do</strong>s)” 225 .<br />

Dessa forma, enten<strong>do</strong> que caberá ao juiz, na audiência <strong>de</strong> instrução e julgamento, <strong>de</strong>terminar a inversão <strong>do</strong> ônus da prova,<br />

inquirin<strong>do</strong> diretamente o fornece<strong>do</strong>r se ele tem alguma prova a produzir. Sen<strong>do</strong> afirmativa a resposta, e não sen<strong>do</strong> possível<br />

produzi-la na própria audiência, cabe ao juiz re<strong>de</strong>signar a audiência, dan<strong>do</strong> ao fornece<strong>do</strong>r a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se <strong>de</strong>sincumbir <strong>do</strong><br />

ônus que recebeu. Caso o fornece<strong>do</strong>r não tenha provas a produzir, o juiz prossegue normalmente com o procedimento,<br />

consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que o contraditório, nesse caso, não será viola<strong>do</strong> com a inversão seguida imediatamente da prolação <strong>de</strong> sentença.<br />

É nesse senti<strong>do</strong> o Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil, mais precisamente em seu art. 373, § 1.º, que exige <strong>do</strong> juiz, sempre que<br />

inverter o ônus da prova, que dê oportunida<strong>de</strong> à parte para se <strong>de</strong>sincumbir <strong>do</strong> ônus que lhe tenha si<strong>do</strong> atribuí<strong>do</strong>. Significa que, em<br />

respeito ao contraditório, a parte terá amplo direito à produção da prova, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que não parece interessante que essa inversão<br />

ocorra somente no momento <strong>de</strong> prolação <strong>de</strong> sentença, sob pena <strong>de</strong> ofensa ao princípio da economia processual. Parece ser mais<br />

vantajoso que, no momento <strong>de</strong> saneamento <strong>do</strong> processo, o juiz já sinalize a forma <strong>de</strong> aplicação da regra <strong>do</strong> ônus da prova, caso<br />

essa aplicação realmente se faça necessária no caso concreto.<br />

10.7.5.<br />

Inversão da prova e inversão <strong>do</strong> adiantamento <strong>de</strong> custas processuais<br />

A inversão <strong>do</strong> ônus da prova traz outra interessante questão: a inversão <strong>do</strong> adiantamento <strong>do</strong> pagamento das <strong>de</strong>spesas<br />

necessárias para a produção probatória, em especial a pericial. Nesse ponto, há séria divergência, tanto na <strong>do</strong>utrina como na<br />

jurisprudência.


Por um la<strong>do</strong>, existe expressiva parcela <strong>do</strong>utrinária que enten<strong>de</strong> que a inversão da prova acarreta inexoravelmente a inversão <strong>do</strong><br />

pagamento das <strong>de</strong>spesas que <strong>de</strong>rivam da produção <strong>de</strong> tal prova226. Defensor <strong>de</strong>sse entendimento, Luiz Antonio Rizzatto Nunes<br />

afirma que, “uma vez <strong>de</strong>terminada a inversão, o ônus econômico da produção da prova tem <strong>de</strong> ser da parte sobre a qual recai o<br />

ônus processual. Caso contrário, estar-se-ia dan<strong>do</strong> com uma mão e tiran<strong>do</strong> com a outra. Se a norma prevê que o ônus da prova<br />

po<strong>de</strong> ser inverti<strong>do</strong>, então automaticamente vai junto para a outra parte a obrigação <strong>de</strong> proporcionar os meios para sua produção,<br />

sob pena <strong>de</strong> – obviamente – arcar com o ônus <strong>de</strong> sua não produção” 227 .<br />

Outra parcela <strong>do</strong>utrinária afirma que a antecipação <strong>de</strong> pagamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>spesas relacionadas com a produção <strong>de</strong> prova encontrase<br />

regida pelo art. 95 <strong>do</strong> Novo CPC, não sofren<strong>do</strong> qualquer influência <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> eventual inversão <strong>do</strong> ônus da prova228, sen<strong>do</strong><br />

esse o entendimento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“Processual civil. Consumi<strong>do</strong>r. Inversão <strong>do</strong> ônus da prova. Honorários <strong>do</strong> perito. Responsabilida<strong>de</strong>. Hipossuficiência. 1. A simples<br />

inversão <strong>do</strong> ônus da prova, no sistema <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, não gera a obrigação <strong>de</strong> custear as <strong>de</strong>spesas com a<br />

perícia, embora sofra a parte ré as consequências <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> sua não produção. (REsp 639.534/MT – Rel. Min. Carlos Alberto<br />

Menezes <strong>Direito</strong> – DJU 13.02.2006). Prece<strong>de</strong>ntes. 2. Recurso especial provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 1063639/MS – Segunda Turma – Rel.<br />

Min. Castro Meira – j. 01.10.2009 – DJe 04.11.2009) 229 .<br />

A razão está com a segunda corrente, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se principalmente a natureza <strong>do</strong> ônus da prova e o que a sua inversão<br />

significa. Sen<strong>do</strong> o ônus da prova uma regra <strong>de</strong> julgamento, estan<strong>do</strong> liga<strong>do</strong> à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o juiz <strong>de</strong>cidir, diante da ausência das<br />

provas para convencê-lo das alegações <strong>de</strong> fato narradas no processo, não guarda o instituto qualquer relação com a antecipação <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>spesas.<br />

É natural, entretanto, que, no caso <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova, a parte que não requereu a produção da prova passe a ter<br />

interesse em sua produção, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que, se aquele que requereu sua produção não adiantar as <strong>de</strong>spesas, a prova não será<br />

produzida, com consequências danosas à parte contrária. Nesse caso, ainda que a prova tenha si<strong>do</strong> requerida pelo consumi<strong>do</strong>r, o<br />

fornece<strong>do</strong>r, em razão da inversão <strong>do</strong> ônus da prova, terá interesse em realizá-la, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> assim assumir o adiantamento <strong>do</strong>s valores<br />

nesse senti<strong>do</strong>.<br />

Nesse senti<strong>do</strong> as corretas consi<strong>de</strong>rações <strong>de</strong> Sergio Cavalieri:<br />

“Em termos práticos: a partir <strong>do</strong> momento em que se <strong>de</strong>r a inversão <strong>do</strong> ônus da prova, caberá à outra parte (o fornece<strong>do</strong>r) produzir<br />

prova capaz <strong>de</strong> elidir a presunção <strong>de</strong> veracida<strong>de</strong> que milita em favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em face da plausibilida<strong>de</strong> da sua pretensão. Não<br />

se trata <strong>de</strong> impor ao fornece<strong>do</strong>r o custeio da prova (honorários periciais), mas <strong>de</strong> transferir-lhe o onus probandi em senti<strong>do</strong><br />

contrário. Se não quiser arcar com esse ônus, bastará <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> realizar a prova. Nesse caso, entretanto, terá contra si a presunção <strong>de</strong><br />

veracida<strong>de</strong> que milita em favor <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. A prova passou a ser <strong>do</strong> interesse <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, pois é a oportunida<strong>de</strong> que tem <strong>de</strong><br />

provar que os fatos alega<strong>do</strong>s pelo consumi<strong>do</strong>r não são verda<strong>de</strong>iros. A questão pertinente à <strong>de</strong>spesa processual é meramente<br />

acessória, seguin<strong>do</strong> a regra <strong>de</strong> que <strong>de</strong>ve ser custeada pela parte a quem aproveitará”230.<br />

É um tanto quanto simples: a ausência <strong>de</strong> adiantamento das custas da prova gera sua preclusão, e a sua ausência prejudica a<br />

parte que tem o ônus probatório. Como <strong>de</strong>fen<strong>do</strong> que o juiz <strong>de</strong>ve alertar as partes, no saneamento, a respeito da aplicação invertida<br />

da regra <strong>do</strong> ônus da prova, na hipótese <strong>de</strong> prova inexistente ou insuficiente, o único interessa<strong>do</strong> na produção da prova será o<br />

fornece<strong>do</strong>r. Não parece ser lógico que o consumi<strong>do</strong>r adiante uma <strong>de</strong>spesa que só interessa ao fornece<strong>do</strong>r, por ser sua única forma<br />

<strong>de</strong> evitar uma <strong>de</strong>rrota na <strong>de</strong>cisão judicial.<br />

Acompanho com tristeza, no dia a dia forense, a <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> juízes, com esteio no entendimento consagra<strong>do</strong> no Superior<br />

Tribunal <strong>de</strong> Justiça, <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> a inversão <strong>do</strong> ônus da prova e ao mesmo tempo <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r que adiante os<br />

honorários periciais. O mais surpreen<strong>de</strong>nte, entretanto, não é a postura <strong>do</strong>s juízes, mas <strong>do</strong>s advoga<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, que<br />

candidamente se submetem à <strong>de</strong>terminação judicial e, muitas vezes com extremo sacrifício, realizam o <strong>de</strong>pósito judicial.<br />

Teriam, em algum momento, para<strong>do</strong> esses patronos para pensar quais seriam as consequências <strong>do</strong> não atendimento da <strong>de</strong>cisão,<br />

<strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> passar o prazo para o <strong>de</strong>pósito sem praticar qualquer ato? Certamente, quan<strong>do</strong> pensam mais <strong>de</strong>tidamente a respeito <strong>do</strong><br />

assunto, percebem que o interesse <strong>de</strong> produzir a prova não é mais <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, ainda que tenha ele pedi<strong>do</strong> sua produção. Se o<br />

ônus da prova passa a ser <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r, a preclusão da prova pericial em razão <strong>do</strong> não adiantamento <strong>do</strong>s honorários periciais terá<br />

somente um prejudica<strong>do</strong>: o fornece<strong>do</strong>r.<br />

Ada Pellegrini Grinover parece ter nota<strong>do</strong> tal circunstância, ao afirmar que “na práxis forense, o juiz costuma <strong>de</strong>terminar a<br />

inversão <strong>do</strong> ônus da prova antes <strong>de</strong> sua produção. Nesse caso, não há como negar uma indiscutível relação entre inversão <strong>do</strong> ônus<br />

da prova e inversão <strong>do</strong> ônus <strong>do</strong> adiantamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>spesas. Isto porque, inverti<strong>do</strong> o ônus da prova, po<strong>de</strong> acontecer que a prova, que<br />

era <strong>de</strong> interesse <strong>do</strong> autor, passe a ser <strong>do</strong> interesse <strong>do</strong> <strong>de</strong>manda<strong>do</strong>; e, sen<strong>do</strong> assim, o <strong>de</strong>manda<strong>do</strong>, a quem interessa provar, adiantará<br />

espontaneamente as <strong>de</strong>spesas. Desse mo<strong>do</strong>, a inversão <strong>do</strong> ônus da prova po<strong>de</strong>rá repercutir na assunção da responsabilida<strong>de</strong> pelo


seu custeio”231.<br />

Por isso, comemorou a correta visão <strong>do</strong> problema que vem sen<strong>do</strong> feita pela 4ª Turma <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“Agravo regimental. Ônus da prova. Inversão. Perícia. Preclusão. não ocorrência. Requisitos. Súmula 7/STJ. Recurso especial.<br />

Retenção.<br />

1. A inversão <strong>do</strong> ônus da prova não implica a obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> a parte contrária arcar com as custas da prova requerida pelo<br />

adversário; sujeita-se ela, contu<strong>do</strong>, às eventuais consequências <strong>de</strong> sua não realização, a serem aferidas quan<strong>do</strong> <strong>do</strong> julgamento da<br />

causa, em face <strong>do</strong> conjunto probatório trazi<strong>do</strong> aos autos.<br />

2. A análise da presença <strong>do</strong>s requisitos para a inversão <strong>do</strong> ônus da prova <strong>de</strong>manda o reexame <strong>do</strong> contexto <strong>de</strong> fato, inviável no âmbito<br />

<strong>do</strong> recurso especial (Súmula 7/STJ).<br />

3. O recurso especial interposto contra <strong>de</strong>cisão proferida em agravo <strong>de</strong> instrumento relativa à inversão <strong>do</strong> ônus da prova <strong>de</strong>ve ficar<br />

reti<strong>do</strong> nos autos (CPC, art. 542, § 3º). Prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> Tribunal.<br />

4. Agravo regimental a que se nega provimento” 232 .<br />

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CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. n. 173, p. 315.<br />

TJMG – APCV 5434155-52.2009.8.13.0024 – Belo Horizonte – Décima Câmara Cível – Rel. Des. Cabral da Silva – j. 18.01.2011 – DJEMG<br />

04.02.2011.<br />

STJ – REsp 1.101.057/MT – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 07.04.2011 – Informativo 468.<br />

CINTRA, Antonio Carlos <strong>de</strong> Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Teoria geral <strong>do</strong> processo. 24. ed. São Paulo:<br />

Malheiros, 2008.<br />

Na <strong>do</strong>utrina nacional, confira-se a exposição <strong>do</strong> tema <strong>de</strong> forma consi<strong>de</strong>ravelmente aprofundada em MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria<br />

geral <strong>do</strong> processo. São Paulo: RT, 2006. p. 21-139.<br />

BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematiza<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 1, p. 241-243.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas <strong>do</strong> processo civil. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 189-190.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001. v. 1, p. 128.<br />

NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Ações probatórias autônomas. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 426.<br />

Enuncia<strong>do</strong> 60/ENFAM: “À socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong>s a que pertença o concilia<strong>do</strong>r ou media<strong>do</strong>r aplicam-se os impedimentos <strong>de</strong> que<br />

tratam os arts. 167, § 5.º, e 172 <strong>do</strong> CPC/2015”.<br />

MAIA, Andrea; HILL, Flávia Pereira. Do cadastro e da remuneração <strong>do</strong>s media<strong>do</strong>res. In: ALMEIDA, Diogo Assumpção Rezen<strong>de</strong> <strong>de</strong>;<br />

PANTOJA, Fernanda Medina e PELEJO, Samantha (Coords.) A mediação no Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense,<br />

2015. p. 160. Contra: Enuncia<strong>do</strong> 59 da ENFAM: “O concilia<strong>do</strong>r ou media<strong>do</strong>r não cadastra<strong>do</strong> no tribunal, escolhi<strong>do</strong> na forma <strong>do</strong> § 1.º<br />

<strong>do</strong> art. 168 <strong>do</strong> CPC/2015, <strong>de</strong>verá preencher o requisito <strong>de</strong> capacitação mínima previsto no § 1.º <strong>do</strong> art. 167”.<br />

NETTO, Fernan<strong>do</strong> Gama <strong>de</strong> Miranda; SOARES, Irineu Carvalho <strong>de</strong> Oliveira. Princípios procedimentais da mediação no Novo Código <strong>de</strong><br />

Processo Civil. In: ALMEIDA, Diogo Assumpção Rezen<strong>de</strong> <strong>de</strong>; PANTOJA, Fernanda Medina e PELEJO, Samantha (Coords.) A mediação<br />

no Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2015. p. 112.<br />

NETTO, Fernan<strong>do</strong> Gama <strong>de</strong> Miranda; SOARES, Irineu Carvalho <strong>de</strong> Oliveira. Princípios procedimentais da mediação no Novo Código <strong>de</strong><br />

Processo Civil. In: ALMEIDA, Diogo Assumpção Rezen<strong>de</strong> <strong>de</strong>; PANTOJA, Fernanda Medina e PELEJO, Samantha (Coords.) A mediação<br />

no Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2015. p. 113.<br />

TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. p. 216.<br />

TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. p. 196-197.<br />

TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. n. 5.4.7, p. 212.<br />

TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. n. 5.4.3., p. 206.<br />

STJ – MS 11.308/DF – Primeira Seção – Rel. Min. Luiz Fux – j. 09.04.2008 – DJe 19.05.2008.<br />

Houve <strong>de</strong>claração inci<strong>de</strong>ntal <strong>do</strong> STF no julgamento da homologação <strong>de</strong> sentença estrangeira SE 5.206-7, em 12.12.2001.<br />

THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. v. 1, p. 45; GRECO FILHO, Vicente.<br />

<strong>Direito</strong> processual civil brasileiro. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 1, p. 178; MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria geral <strong>do</strong> processo. São<br />

Paulo: RT, 2006. p. 148-153; BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematiza<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 1, p.<br />

12-13.<br />

CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 69; FIGUEIRA JR., Joel Dias. Arbitragem, jurisdição e<br />

execução. 2. ed. São Paulo: RT, 1999. p. 151-158.<br />

STJ – MS 11.308/DF – Primeira Seção – Rel. Min. Luiz Fux – j. 09.04.2008 – DJe 19.05.2008.


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Informativo 522/STJ – 2.ª Seção – CC 111.230-DF – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 08.05.2013.<br />

Cfr. CÂMARA, Alexandre Freitas. Arbitragem. 5. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 25.<br />

Cfr. FIGUEIRA JR., Joel Dias. Acesso à jurisdição arbitral e os conflitos <strong>de</strong>correntes das relações <strong>de</strong> consumo. Revista <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r, n. 37, jan.-mar. 2001, p. 111.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 585.<br />

STJ – REsp 819.519/PE – Terceira Turma – Rel. Min. Humberto Gomes <strong>de</strong> Barros – j. 09.10.2007 – DJ 05.11.2007, p. 264.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo:<br />

RT, 2004. p. 634-635; ROCHA, Sílvio Luis Ferreira da. A cláusula compromissória prevista na Lei 9.307, <strong>de</strong> 23.09.1996 e as relações <strong>de</strong><br />

consumo. Revista <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, n. 21, jan.-mar 1997, p. 36-37; FILOMENO, José Geral<strong>do</strong> Brito. Conflitos <strong>de</strong> consumo e<br />

juízo arbitral. Revista <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, n. 21, jan.-mar 1997, p. 47-49.<br />

REsp 1.169.841/RJ – Recurso Especial 2009/0239399-0 – Rel. Min. Nancy Andrighi (1118) – Terceira Turma – j. 06.11.2012 – DJe<br />

14.11.2012 – RDDP vol. 119, p. 171 – RIOBDCPC vol. 80, p. 154.<br />

NERY JR., Nelson. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense,<br />

2011. v. I, p. 591.<br />

STJ – 3ª Turma – REsp 1.169.841/RJ – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 06.11.2012 – DJe 14.11.2012.<br />

Cfr. FIGUEIRA JR., Joel Dias. Acesso à jurisdição arbitral e os conflitos <strong>de</strong>correntes das relações <strong>de</strong> consumo. Revista <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r, n. 37, jan.-mar. 2001, p. 118.<br />

SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Manual <strong>de</strong> arbitragem. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 30-31.<br />

PAULA, Adriano Perácio <strong>de</strong>. Da arbitragem nas relações <strong>de</strong> consumo. Revista <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, n. 32, out.-<strong>de</strong>z 1999, p. 69.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. 10. ed. São Paulo: RT, 2008. notas 7, 9 e 10 <strong>do</strong> art.<br />

461, p. 672.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela <strong>do</strong>s direitos. São Paulo: RT, 2004. p. 423.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, <strong>Daniel</strong> Francisco. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2010. p. 427.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória: individual e coletiva. 4. ed. São Paulo: RT, 2006. 3.2-3.4, p. 40-50.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória: individual e coletiva. 4. ed. São Paulo: RT, 2006. 3.21, p. 152-155.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela <strong>do</strong>s direitos. São Paulo: RT, 2004. p. 153.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, <strong>Daniel</strong> Francisco. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2008. p. 427.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2003. vol. 3, n. 945, p. 284. No mesmo senti<strong>do</strong><br />

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 413-414.<br />

BUENO, Cassio Scarpinella. Código <strong>de</strong> Processo Civil anota<strong>do</strong>. In: MARCATO, Antonio Carlos (Coord.). São Paulo: Atlas, 2006. p. 1.471.<br />

STJ – REsp 885.988/ES – Quarta Turma – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – j. 09.03.2010 – DJe 22.03.2010.<br />

STJ – 3ª Turma – AgRg no REsp 1.351.033/RS – rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 20.03.2014 – DJe 26.03.2014.<br />

STJ – REsp 992.028/RJ – Quinta Turma – Rel. Min. Napoleão Maia Filho – j. 14.12.2010 – DJe 14.02.2011.<br />

MARCATO, Antonio Carlos (Coord.). Código <strong>de</strong> Processo Civil interpreta<strong>do</strong>. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 1.471.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela <strong>do</strong>s direitos. São Paulo: RT, 2004. p. 423.<br />

FABRÍCIO, Adroal<strong>do</strong> Furta<strong>do</strong>. Ensaios <strong>de</strong> direito processual. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2003. p. 195-196; CALMON DE PASSOS, José<br />

Joaquim. Comentários ao Código <strong>de</strong> Processo Civil. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2000. v. 3, n. 6.13, p. 73; THEODORO JR., Humberto.<br />

Tutela jurisdicional <strong>de</strong> urgência. Rio <strong>de</strong> Janeiro: América Jurídica, 2001. p. 5-6.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Fundamentos <strong>do</strong> processo civil mo<strong>de</strong>rno. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 623; GUERRA, Marcelo<br />

Lima. As liminares na reforma <strong>do</strong> CPC. In: WAMBIER, Tereza Arruda Alvim (Coord.). Liminares. São Paulo: RT, 1995. p. 190; SILVA, Ovídio<br />

Baptista da. A “antecipação” da tutela na recente reforma processual. In: TEIXEIRA (org.). Reforma <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. São<br />

Paulo: Saraiva, 1996. p. 130.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Fundamentos <strong>do</strong> processo civil mo<strong>de</strong>rno. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 623.<br />

BEDAQUE, José Roberto <strong>do</strong>s Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas <strong>de</strong> urgência (tentativa <strong>de</strong> sistematização). 2. ed. São<br />

Paulo: Malheiros, 2001. n. 20, p. 334; DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. A reforma <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. 4. ed. São Paulo: Malheiros,<br />

1998. n. 106, p. 145; THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. v. 1. p. 572-573;<br />

ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 77; CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições <strong>de</strong> direito<br />

processual civil. 17. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. v. 1, p. 441.<br />

AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações <strong>do</strong> Novo CPC. São Paulo: RT, 2015. p. 400.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. A nova era <strong>do</strong> processo civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. n. 29, p. 65; NERY JR., Nelson; NERY, Rosa


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Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 529; CARNEIRO, Athos Gusmão. Da antecipação <strong>de</strong> tutela. 6. ed.<br />

Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2006. n. 26, p. 32-33; ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 78;<br />

COSTA MACHADO, Antônio Cláudio da. Tutela antecipada. 3. ed. São Paulo: Juarez <strong>de</strong> Oliveira, 1999.n. 3.1.2, p. 446-449. Contra, com<br />

entendimento isola<strong>do</strong>: CALMON DE PASSOS, José Joaquim. Comentários ao Código <strong>de</strong> Processo Civil. 8. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense,<br />

2000. n. 6.2, p. 43-44.<br />

PINHO, Humberto Dalla Bernardina. <strong>Direito</strong> Processual Civil Contemporâneo, vol. 1, 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 529; BUENO, Cássio<br />

Scarpinella. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 238.<br />

SILVA, Ovídio Baptista da. A “antecipação” da tutela na recente reforma processual. In: TEIXEIRA (org.). Reforma <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo<br />

Civil. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 139; ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 153; COSTA<br />

MACHADO, Antônio Cláudio da. Tutela antecipada. 3. ed. São Paulo: Juarez <strong>de</strong> Oliveira, 1999. p. 422.<br />

ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 153-154; Augusto <strong>de</strong> Assis, A antecipação, p. 176;<br />

Theo<strong>do</strong>ro Jr., Curso, p. 572.<br />

Nesse senti<strong>do</strong> as lições <strong>de</strong> COSTA MACHADO, Antônio Cláudio da. Tutela antecipada. 3. ed. São Paulo: Juarez <strong>de</strong> Oliveira, 1999. p. 422-<br />

423.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. A reforma <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 148; BUENO, Cassio<br />

Scarpinella. Tutela antecipada. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 40.<br />

Indican<strong>do</strong> essa diferença, MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação <strong>de</strong> tutela. 10. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 332; ASSIS, Carlos Augusto<br />

<strong>de</strong>. A antecipação da tutela. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 176.<br />

ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 154; BEDAQUE, José Roberto <strong>do</strong>s Santos. Tutela<br />

cautelar e tutela antecipada: tutelas <strong>de</strong> urgência (tentativa <strong>de</strong> sistematização). 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 330.<br />

THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. p. 567. Contra: DIDIER JR., Fredie;<br />

BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. Salva<strong>do</strong>r, Jus Podivm, 2007. p. 636.<br />

Enuncia<strong>do</strong> 31/ENFAM: “A concessão da tutela <strong>de</strong> evidência prevista no art. 311, II, <strong>do</strong> CPC/2015 in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong> da<br />

<strong>de</strong>cisão paradigma”.<br />

THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. v. 1. n. 500, p. 681.<br />

Enuncia<strong>do</strong> 30/ENFAM: “É possível a concessão da tutela <strong>de</strong> evidência prevista no art. 311, II, <strong>do</strong> CPC/2015 quan<strong>do</strong> a pretensão autoral<br />

estiver <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com orientação firmada pelo Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> controle abstrato <strong>de</strong> constitucionalida<strong>de</strong> ou<br />

com tese prevista em súmula <strong>do</strong>s tribunais, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> caráter vinculante”.<br />

DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. Salva<strong>do</strong>r, JusPodivm, 2007. v. 2, p. 625.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, <strong>Daniel</strong> Francisco. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2010. p. 824; SANTOS,<br />

Ernane Fidélis <strong>do</strong>s. Dos procedimentos especiais <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. 3. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 1999. v. VI. n. 45, p. 47.<br />

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonar<strong>do</strong> Ferres da Silva; MELO, Rogério Licastro Torres <strong>de</strong>.<br />

Primeiros comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015, p. 525.<br />

DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonar<strong>do</strong> José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. Salva<strong>do</strong>r:<br />

JusPodivm, 2009. vol. 2, p. 629.<br />

AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações <strong>do</strong> Novo CPC. São Paulo: RT, 2015, p. 419.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 434.<br />

Manual <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. n. 1.8.3, p. 35.<br />

RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual <strong>de</strong> execução civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 54.<br />

BUENO, Cássio Scarpinella. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 425.<br />

Enuncia<strong>do</strong> 12 <strong>do</strong> Fórum Permanente <strong>de</strong> Processualistas Civis (FPPC) “A aplicação das medidas atípicas sub-rogatórias e coercitivas é<br />

cabível em qualquer obrigação no cumprimento <strong>de</strong> sentença ou execução <strong>de</strong> título executivo extrajudicial. Essas medidas, contu<strong>do</strong>,<br />

serão aplicadas <strong>de</strong> forma subsidiária às medidas tipificadas, com observação <strong>do</strong> contraditório, ainda que diferi<strong>do</strong>, e por meio <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>cisão à luz <strong>do</strong> art. 489, § 1.º, I e II”; Enuncia<strong>do</strong> 48/ENFAM: “O art. 139, IV, <strong>do</strong> CPC/2015 traduz um po<strong>de</strong>r geral <strong>de</strong> efetivação,<br />

permitin<strong>do</strong> a aplicação <strong>de</strong> medidas atípicas para garantir o cumprimento <strong>de</strong> qualquer or<strong>de</strong>m judicial, inclusive no âmbito <strong>do</strong><br />

cumprimento <strong>de</strong> sentença e no processo <strong>de</strong> execução basea<strong>do</strong> em títulos extrajudiciais”.<br />

GAJARDONI, Fernan<strong>do</strong> da Fonseca. A revolução silenciosa da execução por quantia. Disponível em: .<br />

Acesso em: 04.10.2015.<br />

STJ – 4ª Turma – REsp 1.186.960/MG – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 15.03.2016 – DJe 05.04.2016; STJ – 3.ª Turma – AgRg no REsp<br />

1.351.033/RS – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 20.03.2014 – DJe 26.03.2014; STJ – 3.ª Turma – REsp 1.230.174/PR – Rel. Min.<br />

Nancy Andrighi – j. 04.12.2012 – DJe 13.12.2012; STJ – 4.ª Turma – REsp 949.509/RS – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 08.05.2012 –<br />

DJe 16.04.2013.


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Enuncia<strong>do</strong> 12 <strong>do</strong> FPPC: “A aplicação das medidas atípicas sub-rogatórias e coercitivas é cabível em qualquer obrigação no<br />

cumprimento <strong>de</strong> sentença ou execução <strong>de</strong> título executivo extrajudicial. Essas medidas, contu<strong>do</strong>, serão aplicadas <strong>de</strong> forma<br />

subsidiária às medidas tipificadas, com observação <strong>do</strong> contraditório, ainda que diferi<strong>do</strong>, e por meio <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão à luz <strong>do</strong> art. 489, §<br />

1.º, I e II”.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória: individual e coletiva. 4. ed. São Paulo: RT, 2006. n. 3. 27.1.4, p. 216; CÂMARA, Alexandre<br />

Freitas. Lições <strong>de</strong> direito processual civil. 7. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2003. v. 2, p. 239.<br />

Enuncia<strong>do</strong> 25 <strong>do</strong> Fonaje: “A multa cominatória não fica limitada ao valor <strong>de</strong> 40 salários mínimos, embora razoavelmente fixada pelo<br />

juiz, obe<strong>de</strong>cen<strong>do</strong> ao valor da obrigação principal, mais perdas e danos, atendidas as condições econômicas <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r”.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória: individual e coletiva. 4. ed. São Paulo: RT, 2006. n. 3.27.1.5, p. 218-221.<br />

Informativo 497/STJ – 4.ª Turma – REsp 949.509-RS – Rel. originário Min. Luis Felipe Salomão – Rel. para o acórdão Min. Marco Buzzi – j.<br />

08.05.2012.<br />

DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonar<strong>do</strong> José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. Salva<strong>do</strong>r:<br />

JusPodivm, 2009. p. 446-447.<br />

GRECO FILHO, Vicente. <strong>Direito</strong> processual civil brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. n. 11.7, v. 2, p. 75.<br />

STJ – AgRg no Ag 1.040.411/RS – Segunda Turma – Rel. Min. Herman Benjamin – j. 02.10.2008 – DJe 19.12.2008; REsp 1.063.902/SC –<br />

Primeira Turma – Rel. Min. Francisco Falcão – j. 19.08.2008 – DJe 1.º.09.2008.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2004. v. 4, n. 1.630, p. 468.<br />

Em senti<strong>do</strong> próximo: ASSIS, Araken <strong>de</strong>. Manual <strong>do</strong>s recursos. 2. ed. São Paulo: RT, 2008. n. 208, p. 564.<br />

DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonar<strong>do</strong> José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. Salva<strong>do</strong>r:<br />

JusPodivm, 2009. v. 5, p. 449.<br />

STJ – REsp 679.048/RJ – Primeira Turma – Rel. Min. Luiz Fux – j. 03.11.2005 – DJ 28.11.2005, p. 204; REsp 666.008/RJ – Primeira Turma –<br />

rel. José Delga<strong>do</strong> – j. 17.02.2005 – DJ 28.03.2005; Araken <strong>de</strong> Assis, Manual, n. 208, p. 564.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2004. v. 4. n. 1.636, p. 473; NERY JR., Nelson;<br />

NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 672; CÂMARA, Alexandre Freitas. Redução <strong>do</strong> valor<br />

da astreinte e efetivida<strong>de</strong> <strong>do</strong> processo. <strong>Direito</strong> civil e processo. Estu<strong>do</strong>s em homenagem ao Professor Arruda Alvim. In: ASSIS, Araken<br />

<strong>de</strong>; ARRUDA ALVIM, Eduar<strong>do</strong> Pellegrini; NERY JR., Nelson; MAZZEI, Rodrigo Reis; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; ARRUDA ALVIM,<br />

Thereza Celina Diniz <strong>de</strong> (Coords.). São Paulo: RT, 2007, p. 1.564. Contra, pela mudança sem necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um fato novo: BARBOSA<br />

MOREIRA, José Carlos. O novo processo civil brasileiro. 22. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2004. p. 194.<br />

STJ – 3.ª Turma – AgRg no AG 836.875/RS – rel. Min. Sidnei Beneti – j. 04.11.2008 – DJe 26.11.2008.<br />

Informativo 505/STJ – 3.ª Turma – REsp 1.198.880/MT – rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 20.09.2012.<br />

Informativo 539/STJ – 2.ª Seção – REsp 1.333.988/SP – rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 09.04.2014.<br />

STJ – 3.ª Turma – REsp 681.294/PR – rel. Min. Carlos Alberto Menezes <strong>Direito</strong> – rel. p/acórdão Min. Nancy Andrighi – j. 18.12.2008 – DJe<br />

18.02.2009; THEODORO JR., Humberto. Processo <strong>de</strong> execução e cumprimento <strong>de</strong> sentença. 25. ed. São Paulo: Leud, 2008. n. 472, p. 553;<br />

GRECO, Leonar<strong>do</strong>. O processo <strong>de</strong> execução. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 1999. n. 10.7, p. 504.<br />

TALAMINI, Eduar<strong>do</strong>. Tutela relativa aos <strong>de</strong>veres <strong>de</strong> fazer e não fazer. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. n. 9.6.2, p. 249.<br />

CÂMARA, Alexandre Freitas. Redução <strong>do</strong> valor da astreinte e efetivida<strong>de</strong> <strong>do</strong> processo. <strong>Direito</strong> civil e processo. Estu<strong>do</strong>s em homenagem ao<br />

Professor Arruda Alvim. In: ASSIS, Araken <strong>de</strong>; ARRUDA ALVIM, Eduar<strong>do</strong> Pellegrini; NERY JR., Nelson; MAZZEI, Rodrigo Reis; WAMBIER,<br />

Teresa Arruda Alvim; ARRUDA ALVIM, Thereza Celina Diniz <strong>de</strong> (Coords.). São Paulo: RT, 2007. p. 1.565-1.566.<br />

STJ – 1.ª Turma – AgRg no AREsp 42.278/GO – rel. Min. Arnal<strong>do</strong> Esteves Lima – j. 28.05.2013 – DJe 04.06.2013; STJ – 2.ª Turma – AgRg<br />

no REsp 1.318.332/PB – rel. Min. Herman Benjamin – j. 26.06.2012 – DJe 01.08.2012; STJ – 4.ª Turma – RCDESP no AREsp 94.599/DF –<br />

rel. Min. Maria Isabel Gallotti – j. 27.11.2012 – DJe 11.12.2012.<br />

DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonar<strong>do</strong> José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. Salva<strong>do</strong>r:<br />

JusPodivm, 2009. p. 460.<br />

CÂMARA, Alexandre Freitas. Redução <strong>do</strong> valor da astreinte e efetivida<strong>de</strong> <strong>do</strong> processo. <strong>Direito</strong> civil e processo. Estu<strong>do</strong>s em homenagem ao<br />

Professor Arruda Alvim. In: ASSIS, Araken <strong>de</strong>; ARRUDA ALVIM, Eduar<strong>do</strong> Pellegrini; NERY JR., Nelson; MAZZEI, Rodrigo Reis; WAMBIER,<br />

Teresa Arruda Alvim; ARRUDA ALVIM, Thereza Celina Diniz <strong>de</strong> (Coords.). São Paulo: RT, 2007. p. 1.565-1.566.<br />

Informativo 495/STJ – 3.ª Turma – REsp 1.229.335-SP – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 17.04.2012; Informativo 490/STJ – 3.ª Turma – REsp<br />

1.192.197-SC – Rel. originário Min. Massami Uyeda – Rel. para acórdão Min. Nancy Andrighi – j. 07.02.2012; Informativo 448/STJ – 3.ª<br />

Turma – REsp 1.135.824-MG – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 21.09.2010; Informativo 414/STJ – 3.ª Turma – AgRg no REsp 1.026.191-RS<br />

– Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 03.11.2009; Informativo 408/STJ – 3.ª Turma – REsp 1.022.033-RJ – Rel. Min. Nancy Andrighi – j.<br />

22.09.2009.<br />

STJ – 3.ª Turma – REsp 1.475.157/SC – rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – j. 18.09.2014 – DJe 06.10.2014.


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Informativo 485/STJ – 3.ª Turma – REsp 1.019.455/MT – rel. Min. Massami Uyeda – j. 18.10.2011.<br />

BUENO, Cassio Scarpinella. Código <strong>de</strong> Processo Civil anota<strong>do</strong>. In: MARCATO, Antonio Carlos (Coord.). São Paulo: Atlas, 2006. p. 1.413.<br />

THEODORO JR., Humberto. Processo <strong>de</strong> execução e cumprimento <strong>de</strong> sentença. 25. ed. São Paulo: Leud, 2008. n. 474, p. 558.<br />

TALAMINI, Eduar<strong>do</strong>. Tutela relativa aos <strong>de</strong>veres <strong>de</strong> fazer e não fazer. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. n. 9.7, p. 254-255.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória: individual e coletiva. 4. ed. São Paulo: RT, 2006. n. 3.27.1.6, p. 222.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2004. v. 4. n. 1.637, p. 474.<br />

Informativo 546/STJ – Corte Especial – REsp 1.200.856/RS – rel. Min. Sidnei Beneti – j. 1.º.07.2014; Informativo 511/STJ – 4ª Turma –<br />

REsp 1.347.726-RS – rel. Min. Marco Buzzi – j. 27.11.2012.<br />

BUENO, Cassio Scarpinella. Código <strong>de</strong> Processo Civil anota<strong>do</strong>. In: MARCATO, Antonio Carlos (Coord.). São Paulo: Atlas, 2006. p. 1.413;<br />

THEODORO JR., Humberto. Processo <strong>de</strong> execução e cumprimento <strong>de</strong> sentença. 25. ed. São Paulo: Leud, 2008. n. 474, p. 558; TALAMINI,<br />

Eduar<strong>do</strong>. Tutela relativa aos <strong>de</strong>veres <strong>de</strong> fazer e não fazer. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. n. 9.7, p. 254-255.<br />

Informativo 422/STJ – 1.ª Turma – REsp 1.098.028/SP – rel. Min. Luiz Fux – j. 09.02.2010; STJ – 3.ª Turma – AgRg no REsp 1.116.800/RS –<br />

rel. Min. Massami Uyeda – j. 08.09.2009 – DJe 25.09.2009.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória: individual e coletiva. 4. ed. São Paulo: RT, 2006. n. 3.27.1.6, p. 222; RODRIGUES, Marcelo<br />

Abelha. Manual <strong>de</strong> execução civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 230; TALAMINI, Eduar<strong>do</strong>. Tutela relativa aos <strong>de</strong>veres <strong>de</strong><br />

fazer e não fazer. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. n. 9.7.1, p. 255.<br />

Súmula 410/STJ.<br />

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonar<strong>do</strong> Ferres da Silva; MELO, Rogério Licastro Torres <strong>de</strong>.<br />

Primeiros comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015, p. 842; e MEDINA, José Miguel Garcia.<br />

Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2015, p. 797.<br />

Cfr. PERRINI, Raquel Fernan<strong>de</strong>z. Competências da Justiça Fe<strong>de</strong>ral comum. São Paulo: Saraiva, 2001. n. 5.7, p. 90.<br />

CC 1.616/MG – Segunda Seção – Rel. Min. Eduar<strong>do</strong> Ribeiro – j. 24.04.1991 – DJe 20.05.1991, p. 6.504.<br />

STJ 66: “Compete à Justiça Fe<strong>de</strong>ral processar e julgar execução fiscal promovida por Conselho <strong>de</strong> fiscalização profissional”; STJ – CC<br />

40.275/BA – Primeira Seção – Rel. Min. Castro Meira – DJ 15.03.2004, p. 145; CC 36.801/GO – Primeira Seção – Rel. Min. Francisco<br />

Peçanha Martins – DJ 07.06.2004, p. 152; CC 25.355/MG – Segunda Seção – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes <strong>Direito</strong> – DJ 19.03.2001,<br />

p. 72.<br />

REsp 572.906/RS – Primeira Turma – Rel. Min. Luiz Fux – j. 08.06.2004.<br />

Cf. Reven<strong>do</strong> a competência da Justiça Fe<strong>de</strong>ral em matéria <strong>de</strong> relações <strong>de</strong> consumo. Revista <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, São Paulo, RT, n.<br />

40, out.-<strong>de</strong>z. 2001, p. 53.<br />

STJ – REsp 440.002/SE – Primeira Turma – Rel. Teori Albino Zavascki – DJ 06.12.2004, p. 195; STJ – CC 39111/RJ – Primeira Seção – Rel.<br />

Min. Luiz Fux – DJ 28.02.2005.<br />

Essa a previsão <strong>de</strong> foro territorial geral na Itália (art. 18, CPC); Espanha (art. 50.1, LEC); Portugal (art. 85 n. 1 e 86 n. 2); Alemanha (§§ 12.º<br />

e 13.º, ZPO).<br />

Informativo 542/STJ: 2ª Seção – CC 128.079/MT – Rel. Min. Raul Araújo – j. 12.03.2014.<br />

MARQUES, Claudia Lima. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 4. ed. São Paulo: RT, 2013. p. 753-754.<br />

Cfr. WATANABE, Kazuo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011.<br />

v. II, p. 169.<br />

MARCATO, Antônio Carlos. Prorrogação <strong>de</strong> competência, Revista <strong>de</strong> Processo, São Paulo, v. 17, n. 65, 1992, p. 12. Ainda DINAMARCO,<br />

Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001. v. 1, p. 593 e PIZZOL, Patrícia Miranda. A<br />

competência no processo civil. São Paulo: RT, 2003. p. 325.<br />

Cf. GRECO, Leonar<strong>do</strong>. Instituições <strong>de</strong> processo civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2010. v. I, p. 161. No mesmo senti<strong>do</strong>, PIZZOL, Patricia<br />

Miranda. A competência no processo civil. São Paulo: RT, 2003.<br />

NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Competência no processo civil. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2005. p. 24-26.<br />

BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Po<strong>de</strong> o juiz <strong>de</strong>clarar <strong>de</strong> ofício a incompetência relativa? Temas <strong>de</strong> direito processual civil. 5.ª Série. São<br />

Paulo: Saraiva, 1994. p. 68-69.<br />

Conforme bem pon<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> por THEODORO JR., Humberto. O contrato e seus princípios. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Ai<strong>de</strong>, 1999. p. 27, é correto<br />

afirmar “que o <strong>Direito</strong> mo<strong>de</strong>rno não repele o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. Ao contrário, convive amplamente com ele e reconhece-lhe a<br />

eficácia própria <strong>do</strong>s negócios bilaterais, visto que o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, por si só, não se reveste <strong>de</strong> ilicitu<strong>de</strong> nem incorre em<br />

qualquer tipo <strong>de</strong> censura. O que se recrimina é o abuso cometi<strong>do</strong> eventualmente <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são pela parte que<br />

dispõe da força <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminar o conteú<strong>do</strong> <strong>de</strong> suas cláusulas. Se, porém, não se entrevê nenhum <strong>de</strong>svio ético na estipulação <strong>de</strong> tais<br />

condições, o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são é tão jurídico e tão obrigatório para os contratantes como qualquer outro contrato.”


130<br />

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152<br />

STJ – CC 21.433/RN – Quarta Turma. Ainda: STJ – CC 22.000/PE – Segunda Turma – rel. Min. Carlos Alberto Menezes <strong>Direito</strong> – DJ<br />

08.02.1999, p. 246. Na <strong>do</strong>utrina, NERY JR., Nelson e NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>, 10. ed. São<br />

Paulo: RT, 2008. p. 511, com rica indicação bibliográfica e ARAÚJO FILHO, Luiz Paulo da Silva. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 6.<br />

STJ – CC 106.990/SC – Segunda Seção – Rel. Min. Fernan<strong>do</strong> Gonçalves – j. 11.11.2009 – DJe 23.11.2009.<br />

Com relação à aplicação <strong>do</strong> CDC, RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva,<br />

2000. p. 571-572.<br />

O reconhecimento ex officio <strong>do</strong> caráter abusivo da cláusula <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> foro. Leituras complementares para concursos. 2. ed. Salva<strong>do</strong>r:<br />

JusPodivm, 2004. p. 47. No mesmo senti<strong>do</strong> NERY JR., Nelson e NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. 10.<br />

ed. São Paulo: RT, 2008. p. 513.<br />

Já tinha expressa<strong>do</strong> esse entendimento à luz <strong>do</strong> art. 112, parágrafo único, <strong>do</strong> CPC/1973: Competência, n. 3.1.1.3, p. 52-53.<br />

BUENO, Cássio Scarpinella. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 116.<br />

NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Reforma <strong>do</strong> CPC. São Paulo: RT, 2006. p. 415-418.<br />

A curiosida<strong>de</strong> já havia si<strong>do</strong> percebida por CUNHA, Leonar<strong>do</strong> José Carneiro da. Inovações no processo civil. São Paulo: Dialética, 2002. p.<br />

101, e NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. O princípio da comunhão das provas. Revista Dialética <strong>de</strong> direito processual, n. 31, out.<br />

2005, p. 30. A estranheza com a novida<strong>de</strong> levou alguns <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res, inclusive, a rumarem contra a literalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> texto legal,<br />

afirman<strong>do</strong> que por se tratar <strong>de</strong> matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública o juiz po<strong>de</strong>ria conhecer a matéria <strong>de</strong> ofício. Nesse senti<strong>do</strong>, CARVALHO,<br />

Fabiano. Os agravos e a reforma <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. A nova etapa da reforma <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. São Paulo: Saraiva,<br />

2002. p. 285. Para <strong>Flávio</strong> Cheim Jorge (A nova reforma processual. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 171), por se tratar <strong>de</strong> matéria <strong>de</strong><br />

or<strong>de</strong>m pública, se o juiz <strong>de</strong> primeiro grau informar o <strong>de</strong>scumprimento o Tribunal não <strong>de</strong>ve conhecer o agravo, ainda que não haja<br />

manifestação <strong>do</strong> agrava<strong>do</strong>.<br />

MARQUES, José Fre<strong>de</strong>rico. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. Campinas: Millennium, 2000. v. 2, p. 322: “Diz-se que um prazo é<br />

próprio, quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> à prática <strong>de</strong> atos processuais da parte, e que, quan<strong>do</strong> inobserva<strong>do</strong>, produz consequências e efeitos <strong>de</strong><br />

caráter processual. Impróprio é o prazo imposto ao juiz e seus auxiliares (o escrivão e o oficial <strong>de</strong> justiça), e que, se <strong>de</strong>scumpri<strong>do</strong>,<br />

trará consequências não processuais, e sim <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m disciplinar”; DALL’AGNOL, Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

São Paulo: RT, 2000. v. 2, p. 389: “Prazos impróprios, assim <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong>s porque o não atendimento a eles não traz, em princípio,<br />

consequência <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m processual, os previstos pelo art. 189, quan<strong>do</strong> não respeita<strong>do</strong>s pelo juiz, dão ensejo a providências <strong>de</strong><br />

caráter administrativo”; e ARRUDA ALVIM. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. 8. ed. São Paulo: RT, 2003. v. I, p. 454.<br />

SAMPAIO, José Soares. Os prazos no Código <strong>de</strong> Processo Civil. 5. ed. São Paulo: RT, 1999. p. 28: “Por fim, vale acentuar que os atos<br />

processuais pratica<strong>do</strong>s pelo juiz, com excesso injustifica<strong>do</strong> <strong>de</strong> prazo, mantêm valida<strong>de</strong>.”<br />

Cfr. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001. v. 2, p. 550. E assim conclui seu pensamento: “Se ele não profere o<br />

<strong>de</strong>spacho <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> <strong>do</strong>is dias da conclusão <strong>do</strong>s autos, ou a <strong>de</strong>cisão interlocutória em <strong>de</strong>z (art. 189, incs. I-II), ou se não entrega a<br />

sentença nos <strong>de</strong>z dias subsequentes à audiência (art. 456) etc., nem por isso ficará dispensa<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> fazê-lo. Tal é a não<br />

preclusivida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s prazos fixa<strong>do</strong>s para o juiz, ou o seu caráter <strong>de</strong> prazo impróprio.”<br />

FUX, Luiz. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2004. p. 273-274.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 193; NERY JR., Nelson;<br />

NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. 10. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 282; BUENO, Cassio Scarpinella.<br />

Curso sistematiza<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito procesual civil. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 1, p. 500.<br />

BEDAQUE, José Roberto <strong>do</strong>s Santos. Código <strong>de</strong> Processo Civil interpreta<strong>do</strong>. In: MARCATO, Antônio Carlos (Coord.). São Paulo: Atlas,<br />

2004. p. 180-181.<br />

Cf. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. II, p. 123.<br />

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. n. 176, p. 321.<br />

CINTRA, Antonio Carlos <strong>de</strong> Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Teoria geral <strong>do</strong> processo. 24. ed. São Paulo:<br />

Malheiros, 2008. n. 30, p. 79.<br />

GRECO, Leonar<strong>do</strong>. Instituições <strong>de</strong> direito civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2010. v. I, p. 534.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Intervenção <strong>de</strong> terceiros. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. n. 87, p. 149-150; BUENO, Cassio Scarpinella.<br />

Curso sistematiza<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 1, p. 510; BEDAQUE, José Roberto <strong>do</strong>s Santos. Código <strong>de</strong><br />

Processo Civil interpreta<strong>do</strong>. In: MARCATO, Antônio Carlos (Coord.). São Paulo: Atlas, 2004. p. 180.<br />

ARRUDA ALVIM. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. 8. ed. São Paulo: RT, 2003. v. I, n. 73, p. 173.<br />

DIDIER JR., Fredie. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 7. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2007. v. 1, p. 400.<br />

STJ – REsp 925.130-SP – 2.ª Seção – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 08.02.2012 – Informativo 490.<br />

STJ – REsp 605.120/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 27.04.2010 – DJe 15.06.2010.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. 10. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 70; GRECO FILHO,


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Vicente. <strong>Direito</strong> processual civil brasileiro. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 1, n. 22.5, p. 151-156. SANTOS, Ernane Fidélis <strong>do</strong>s. Manual<br />

<strong>de</strong> direito processual civil. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 1, n. 196, p. 98-99. Informativo 346/STJ, 4.ª T., REsp 934.394-PR, rel. Min.<br />

João Otávio <strong>de</strong> Noronha, j. 26.02.2008.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Intervenção <strong>de</strong> terceiros. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 179; THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong><br />

direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. v. 1, p. 144; BEDAQUE, José Roberto <strong>do</strong>s Santos. Código <strong>de</strong> Processo Civil<br />

interpreta<strong>do</strong>. In: MARCATO, Antônio Carlos (Coord.). São Paulo: Atlas, 2004. p. 184-187; FUX, Luiz. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 2.<br />

ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2004. p. 299-300.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Intervenção <strong>de</strong> terceiros. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 177-178; ARRUDA ALVIM. Manual <strong>de</strong><br />

direito processual civil. 8. ed. São Paulo: RT, 2003. v. I, n. 71, p. 166-170; BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematiza<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito<br />

processual civil. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 1, p. 503.<br />

DIDIER JR., Fredie. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 7. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2007. v. 1. p. 401. Parece ter o mesmo entendimento:<br />

THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. vol. 1, n. 124-a, p. 140.<br />

STJ – REsp 1.024.791/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 05.02.2009 – DJe 09.03.2009.<br />

STJ – 1ª Turma – AgRg no REsp 1.196.900/RJ – rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – j. 10.06.2014, DJe 20.06.2014; STJ – 4ª Turma –<br />

EDcl no Ag 1.249.523/RJ – rel. Min. Raul Araújo – j. 05.06.2014 – DJe 20.06.2014.<br />

FUX, Luiz. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2004. p. 304.<br />

ARRUDA ALVIM. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. 8. ed. São Paulo: RT, 2003. v. I, p. 708.<br />

THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. vol. 1, n. 124-a, p. 140.<br />

A favor: THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. v. 1, p. 144; Contra:<br />

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso <strong>de</strong> processo civil. São Paulo: RT, 2008. v. 2, p. 193.<br />

STJ – REsp 699.680/DF – Quarta Turma – Rel. Min. Fernan<strong>do</strong> Gonçalves – j. 29.06.2006 – DJ 27.11.2006; STJ – REsp 275.453/RS –<br />

Terceira Turma – Rel. Min. Humberto Gomes <strong>de</strong> Barros – j. 22.02.2005 – DJ 11.04.2005. Na <strong>do</strong>utrina: BUENO, Cassio Scarpinella. Curso<br />

sistematiza<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito procesual civil. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 1, p. 511.<br />

Súmula 537/STJ: “Em ação <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong> danos, a segura<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>nunciada, se aceitar a <strong>de</strong>nunciação ou contestar o pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

autor, po<strong>de</strong> ser con<strong>de</strong>nada, direta e solidariamente junto com o segura<strong>do</strong>, ao pagamento da in<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>vida à vítima, nos<br />

limites contrata<strong>do</strong>s na apólice”.<br />

No mesmo senti<strong>do</strong>: STJ – REsp 1.245.618-RS – 3.ª Turma – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 22.11.2011; STJ – REsp 401.718 – Quarta Turma<br />

– Rel. Min. Sálvio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong> Teixeira – j. 03.09.2002 – DJ 24.03.2003.<br />

Cfr. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. II, p. 170.<br />

Cf. DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Litisconsórcio. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 391.<br />

MAZZEI, Rodrigo Reis. Litisconsórcio sucessivo: breves consi<strong>de</strong>rações. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; RAMOS, Glauco Gumerato;<br />

SHIMURA, Sergio (Coords.). Atualida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> processo civil <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Litisconsórcio. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 394.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, as lições <strong>de</strong> MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antônio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong><br />

Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: RT, 2004. p. 188-189; RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 131; FILOMENO, José Geral<strong>do</strong> Brito. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos<br />

autores <strong>do</strong> anteprojeto. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 139.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 130; NERY JR., Nelson;<br />

NERY, Rosa Maria Andra<strong>de</strong>. Código Civil comenta<strong>do</strong>. 3. ed. São Paulo: RT, 2005. p. 960; PAULA, Adriano Perácio <strong>de</strong>. <strong>Direito</strong> processual<br />

<strong>do</strong> consumo. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 75.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 131.<br />

WATANABE, Kazuo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. II,<br />

p. 760; ARAÚJO FILHO, Luiz Paulo da Silva. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – <strong>Direito</strong> processual. São Paulo: Saraiva,<br />

2002. p. 109.<br />

MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antônio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, São<br />

Paulo: RT, 2004. p. 240; RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2000. p.<br />

176-177.<br />

FILOMENO, José Geral<strong>do</strong> Brito. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense<br />

Universitária, 1999. p. 169.<br />

Cf. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 176, em complemento: “Ora, e como fica o<br />

consumi<strong>do</strong>r, que teve o filho intoxica<strong>do</strong>, com graves problemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, e sofreu enorme prejuízo financeiro?”.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Litisconsórcio. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 395.


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203<br />

SILVA, Ovídio Baptista da. Responsabilida<strong>de</strong> pela sucumbência no Código <strong>de</strong> Processo Civil. Revista <strong>do</strong> Advoga<strong>do</strong>, São Paulo, AASP, n.<br />

40, p. 56, afirma que “segun<strong>do</strong> este sistema, o litigante somente suportará o pagamento das <strong>de</strong>spesas processuais feitas pelos<br />

adversários quan<strong>do</strong> houver da<strong>do</strong> causa à <strong>de</strong>manda, em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> alguma forma <strong>de</strong> comportamento injustifica<strong>do</strong>, antes da<br />

propositura da ação, ou no curso <strong>do</strong> processo”. E conclui: “sen<strong>do</strong> a jurisdição um serviço público como qualquer outro, aqueles que<br />

o procuram <strong>de</strong>verão arcar com as <strong>de</strong>spesas correspon<strong>de</strong>ntes, a não ser nos casos em que o sucumbente tenha agi<strong>do</strong> com <strong>do</strong>lo ou<br />

culpa, ou tenha se comporta<strong>do</strong> temerariamente no curso da causa, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que se <strong>de</strong>va reconhecer em sua conduta algum tipo <strong>de</strong><br />

abuso <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>mandar”.<br />

NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Ações probatórias autônomas. São Paulo: Saraiva, 2008.<br />

GÓES, Gisele Santos Fernan<strong>de</strong>s. Teoria geral das provas. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2005. p. 53-55.<br />

Cfr. Instituições <strong>de</strong> direito civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. 2, p. 130.<br />

NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Princípio da comunhão das provas. Revista Dialética <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Processual, n. 31; ARRUDA ALVIM.<br />

Manual <strong>de</strong> direito processual civil. 8. ed. São Paulo: RT, 2003. v. I, n. 175, p. 389.<br />

Informativo 418/STJ – 2.ª Turma – REsp 1.060.753/SP – rel. Min. Eliana Calmon – j. 1.º.12.2009.<br />

STJ – 1.ª Turma – RMS 38.025/BA – rel. Min. Sérgio Kukina – j. 23.09.2014 – DJe 01.10.2014.<br />

STJ – 3.ª Turma – EDcl no REsp 1.286.704/SP – rel. Nancy Andrighi – j. 26.11.2013 – DJe 09.12.2013.<br />

STJ – 4.ª Turma – AgRg no AREsp 216.315/RS – rel. Min. Mauro Campbell Marques – j. 23.10.2012 – DJe 06.11.2012.<br />

STJ – 4.ª Turma – REsp 720.930/RS – rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 20.10.2009 – DJe 09.11.2009. No mesmo senti<strong>do</strong>, THEODORO JR.,<br />

Humberto. <strong>Direito</strong>s <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2001. p. 143.<br />

BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematiza<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito procesual civil. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 2, p. 247.<br />

ARRUDA ALVIM. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. 8. ed. São Paulo: RT, 2003. v. I, n. 187, p. 404. STJ – REsp 422.778/SP – Terceira Turma<br />

– Rel. Min. Castro Filho – Rel. p/acórdão Min. Nancy Andrighi – j. 19.06.2007 – DJ 27.08.2007.<br />

Nelson Nery Jr., Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense,<br />

2011. v. I, p. 585. Parece ter o mesmo entendimento RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 583.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2003. v. 3, n. 798, p. 78.<br />

DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonar<strong>do</strong> José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. Salva<strong>do</strong>r:<br />

JusPodvm, 2009. v. 5, n. 13.4, p. 83.<br />

DENARI, Zelmo. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense,<br />

2011. v. I, p. 204.<br />

STJ – REsp 1.178.105/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Massami Uyeda – Rel. p/acórdão Min. Nancy Andrighi – j. 07.04.2011 – DJe<br />

25.04.2011. STJ – REsp 347632/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aguiar – j. 24.06.2003 – DJe 01.09.2003.<br />

Cfr. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 279. No mesmo senti<strong>do</strong>, CÂMARA, Alexandre Freitas. Tutela<br />

jurisdicional <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. In: FARIAS, Cristiano Chaves <strong>de</strong>; DIDIER JUNIOR, Fredie (Coords.). Procedimentos especiais cíveis –<br />

legislação extravagante. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 1.084.<br />

VASCONCELLOS, Antonio Herman <strong>de</strong>. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed.<br />

Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. I, p. 371. No mesmo senti<strong>do</strong> ARRUDA ALVIM. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. 8. ed. São Paulo: RT,<br />

2003. v. I, p. 973; RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 475.<br />

VASCONCELLOS, Antonio Herman <strong>de</strong>. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio<br />

<strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. I, p. 371.<br />

Cfr. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. I, p.<br />

8.<br />

STJ – REsp 951.785/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 15.02.2011 – Informativo 463.<br />

STJ – REsp 720.930/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 20.10.2009 – Informativo 412.<br />

STJ – AgRg no REsp 728.303/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 21.10.2010 – DJe 28.10.2010.<br />

RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 13.2, p. 123; FREIRE E<br />

SILVA, Bruno. Inversão judicial <strong>do</strong> ônus da prova no CDC. In: CARVALHO, Fabiano; BARIONI, Rodrigo (Coords.). Aspectos processuais<br />

<strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 13; PACÍFICO, Luiz Eduar<strong>do</strong> Boaventura. O ônus da prova no direito<br />

processual civil. São Paulo: RT, 2000. n. 5.4.2, p. 157; GÓES, Gisele Santos Fernan<strong>de</strong>s. Teoria geral das provas. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm,<br />

2005. p. 52.<br />

Cfr. Programa <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. n. 180, p. 326.<br />

GIDI, Antonio. Aspectos da inversão <strong>do</strong> ônus da prova no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Revista <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, São<br />

Paulo, RT, n. 13, jan.-mar. 1995, p. 34; CÂMARA, Alexandre Freitas. Tutela jurisdicional <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. In: FARIAS, Cristiano Chaves


204<br />

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206<br />

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231<br />

232<br />

<strong>de</strong>; DIDIER JUNIOR, Fredie (Coords.). Procedimentos especiais cíveis – legislação extravagante. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 1.088.<br />

CÂMARA, Alexandre Freitas. Tutela jurisdicional <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. In: FARIAS, Cristiano Chaves <strong>de</strong>; DIDIER JUNIOR, Fredie (Coords.).<br />

Procedimentos especiais cíveis – legislação extravagante. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 1.088.<br />

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. n. 180, p. 326.<br />

GÓES, Gisele Santos Fernan<strong>de</strong>s. Teoria geral das provas. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2005. p. 52.<br />

NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. n. 14.1.3, p. 407-408.<br />

THEODORO JR., Humberto. <strong>Direito</strong>s <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2001. p. 135.<br />

Cfr. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. p. 8-9.<br />

Cfr. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. p. 10.<br />

Cfr. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2003. v. III, n. 799, p. 79. No mesmo senti<strong>do</strong> THEODORO JR., Humberto.<br />

Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. vol. I, n. 422-c, p. 424.<br />

STJ – REsp 720.930/RS – Quarta Turma.<br />

STJ – REsp 720.930/RS – Quarta Turma. No mesmo senti<strong>do</strong> BARBOSA MOREIRA, Carlos Roberto. Notas sobre a inversão <strong>do</strong> ônus da<br />

prova em benefício <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Doutrina, v. 1, Rio <strong>de</strong> Janeiro: ID, 1996, p. 309 e THEODORO JR., Humberto. <strong>Direito</strong>s <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2001. p. 143.<br />

Cf. Ônus da prova e sua modificação no processo civil brasileiro. Aspectos atuais <strong>do</strong> direito probatório. NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong><br />

Assumpção (Coord.). São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. p. 350-351; WATANABE, Kazuo. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r –<br />

comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. p. 11; Bedaque, <strong>Direito</strong>; Nery e Nery, Código, pp. 608-609; CAVALIERI FILHO, Sergio.<br />

Programa <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 328. STJ – REsp 422.778/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Castro<br />

Filho – Rel. p/acórdão Min. Nancy Andrighi – j. 19.06.2007 – DJ 27.08.2007.<br />

Cfr. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. 10. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 608-609. No mesmo senti<strong>do</strong> ARENHART, Sérgio Cruz. Ônus da<br />

prova e sua modificação no processo civil brasileiro. Aspectos atuais <strong>do</strong> direito probatório. NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção<br />

(Coord.). São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. p. 351 e PACÍFICO, Luiz Eduar<strong>do</strong> Boaventura. O ônus da prova no direito processual civil. São Paulo:<br />

RT, 2000. p. 160.<br />

ARRUDA ALVIM. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. 8. ed. São Paulo: RT, 2003. v. I, p. 974; CÂMARA, Alexandre Freitas. Tutela<br />

jurisdicional <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. In: FARIAS, Cristiano Chaves <strong>de</strong>; DIDIER JUNIOR, Fredie (Coords.). Procedimentos especiais cíveis –<br />

legislação extravagante. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 1.093; RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 126; BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematiza<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo:<br />

Saraiva, 2007. v. 2, p. 247-248.<br />

Cfr. <strong>Direito</strong>s <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2001. p. 141.<br />

Cfr. Tutela jurisdicional <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. In: FARIAS, Cristiano Chaves <strong>de</strong>; DIDIER JUNIOR, Fredie (Coords.). Procedimentos especiais<br />

cíveis – legislação extravagante. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 1.093.<br />

STJ – 2ª Turma – AgRg no REsp 1.450.473/SC – rel. Min. Mauro Campbell Marques – j. 23.09.2014 – DJe 30.09.2014; STJ – 3ª Turma –<br />

REsp 1.395.254/SC – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 15.10.2013 – DJe 29.11.2013; STJ – 2ª Seção – EREsp 422.778/SP – rel. Min. João<br />

Otávio <strong>de</strong> Noronha – rel. p/acórdão Min. Maria Isabel Gallotti – j. 29.02.2012 – DJe 21.06.2012.<br />

CAMBI, Eduar<strong>do</strong>. A prova civil: admissibilida<strong>de</strong> e relevância. São Paulo: RT, 2006. p. 418.<br />

Cfr. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2003. v. 3, n. 801, p. 83.<br />

Cfr. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. p. 12. No mesmo senti<strong>do</strong> CAVALIERI FILHO,<br />

Sergio. Programa <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 329.<br />

Cfr. <strong>Direito</strong>s <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2001. p. 142.<br />

Preocupação levantada por CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 328.<br />

Cfr. Tutela jurisdicional <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res. In: FARIAS, Cristiano Chaves <strong>de</strong>; DIDIER JUNIOR, Fredie (Coords.). Procedimentos especiais<br />

cíveis – legislação extravagante. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 1.093-1.094.<br />

CAMBI, Eduar<strong>do</strong>. A prova civil: admissibilida<strong>de</strong> e relevância. São Paulo: RT, 2006. p. 427.<br />

Cfr. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 126-127.<br />

GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 1, p. 432-433.<br />

STJ – REsp 845.601/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa – j. 06.03.2007 – DJ 02.04.2007; STJ – REsp 435.155/MG –<br />

Terceira Turma – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes <strong>Direito</strong> – j. 11.02.2003 – DJ 10.03.2003.<br />

Cfr. Programa <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 332.<br />

Cfr. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 15.


STJ – 2ª Seção – EREsp 422.778/SP – rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – rel. p/acórdão Min. Maria Isabel Gallotti – j. 29.02.2012 – DJe<br />

21.06.2012. No mesmo senti<strong>do</strong>: STJ – 2ª Turma – AgRg no REsp 1.450.473/SC – rel. Min. Mauro Campbell Marques – j. 23.09.2014 –<br />

DJe 30.09.2014; STJ – 3ª Turma – REsp 1.395.254/SC – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 15.10.2013 – DJe 29.11.2013.


TUTELA COLETIVA DO CONSUMIDOR EM JUÍZO<br />

Sumário: 11.1. Introdução: 11.1.1. Tutela jurisdicional coletiva; 11.1.2. Origem da tutela jurisdicional coletiva;<br />

11.1.3. Microssistema coletivo; 11.1.4. Marcos legislativos – 11.2. Espécies <strong>de</strong> direitos protegi<strong>do</strong>s pela tutela<br />

coletiva: 11.2.1. Introdução; 11.2.2. <strong>Direito</strong>s ou interesses?; 11.2.3. <strong>Direito</strong> difuso; 11.2.4. <strong>Direito</strong> coletivo; 11.2.5.<br />

<strong>Direito</strong>s individuais homogêneos; 11.2.6. I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s e diferenças entre os direitos coletivos lato sensu; 11.2.7.<br />

<strong>Direito</strong>s individuais indisponíveis – 11.3. Competência na tutela coletiva: 11.3.1. Competência absoluta: funcional<br />

ou territorial?; 11.3.2. Competência absoluta <strong>do</strong> foro; 11.3.3. Dano local, regional e nacional – 11.4. Legitimida<strong>de</strong>:<br />

11.4.1. Espécies <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong>; 11.4.2. Cidadão; 11.4.3. Ministério Público; 11.4.4. Pessoas jurídicas da<br />

Administração Pública; 11.4.5. Associação; 11.4.6. Defensoria Pública – 11.5. Relação entre a ação coletiva e a<br />

individual: 11.5.1. Introdução; 11.5.2. Litispendência; 11.5.3. Conexão e continência; 11.5.4. Suspensão <strong>do</strong> processo<br />

individual; 11.5.5. Extinção <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança individual – 11.6. Coisa julgada: 11.6.1. Introdução; 11.6.2.<br />

Coisa julgada secundum eventum probationis; 11.6.3. Coisa julgada secundum eventum litis; 11.6.4. Limitação<br />

territorial da coisa julgada – 11.7. Gratuida<strong>de</strong>: 11.7.1. Introdução; 11.7.2. Isenção <strong>de</strong> adiantamento; 11.7.3.<br />

Con<strong>de</strong>nação em verbas <strong>de</strong> sucumbência – 11.8. Liquidação <strong>de</strong> sentença: 11.8.1. Conceito <strong>de</strong> liqui<strong>de</strong>z e obrigações<br />

liquidáveis; 11.8.2. Natureza jurídica da liquidação; 11.8.3. Legitimida<strong>de</strong> ativa; 11.8.4. Competência; 11.8.5. Espécies<br />

<strong>de</strong> liquidação <strong>de</strong> sentença; 11.8.6. <strong>Direito</strong> difuso e coletivo; 11.8.7. <strong>Direito</strong> individual homogêneo; 11.8.8.<br />

Liquidação individual das sentenças <strong>de</strong> direito difuso e coletivo – 11.9. Execução: 11.9.1. Processo <strong>de</strong> execução e<br />

cumprimento <strong>de</strong> sentença; 11.9.2. Legitimida<strong>de</strong> ativa; 11.9.3. <strong>Direito</strong>s difusos e coletivos; 11.9.4. <strong>Direito</strong>s<br />

individuais homogêneos; 11.9.5. Regime jurídico das <strong>de</strong>spesas e custas processuais.<br />

11.1.<br />

11.1.1.<br />

INTRODUÇÃO<br />

Tutela jurisdicional coletiva<br />

É tradicional a utilização <strong>do</strong> termo “tutela coletiva” no dia a dia forense e acadêmico, mas nem sempre tal uso consi<strong>de</strong>ra com a<br />

<strong>de</strong>vida precisão seu significa<strong>do</strong>. Na maioria das vezes, inclusive, o termo é utiliza<strong>do</strong> para <strong>de</strong>signar uma espécie <strong>de</strong> tutela<br />

jurisdicional cujo objeto é um direito coletivo lato sensu, e nesse caso seria até mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> o nome “tutela jurisdicional<br />

coletiva”.<br />

Para a exata compreensão <strong>do</strong> tema, portanto, é imprescindível que se <strong>de</strong>termine primeiramente o significa<strong>do</strong> <strong>de</strong> “tutela<br />

jurisdicional”. Por tutela jurisdicional enten<strong>de</strong>-se a proteção prestada pelo Esta<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> provoca<strong>do</strong> por meio <strong>de</strong> um processo,<br />

gera<strong>do</strong> em razão da lesão ou ameaça <strong>de</strong> lesão a um direito material. Como se po<strong>de</strong> notar <strong>de</strong>sse singelo conceito, a tutela<br />

jurisdicional é voltada para a tutela <strong>do</strong> direito material; daí ser correta a expressão “tutela jurisdicional <strong>de</strong> direitos materiais”,<br />

empregada por parcela da <strong>do</strong>utrina.<br />

Como existem crises <strong>de</strong> diferentes naturezas, é natural que o sistema crie e disponibilize às partes diferentes formas <strong>de</strong> tutelas<br />

jurisdicionais, com procedimentos distintos e objetivos próprios. De qualquer forma, apesar <strong>de</strong>ssa diversida<strong>de</strong>, haven<strong>do</strong> uma<br />

ameaça ou uma violação a direito, o Esta<strong>do</strong> é provoca<strong>do</strong> – o instrumento <strong>de</strong> provocação é o processo – e, quan<strong>do</strong> há uma solução<br />

da crise jurídica, tem-se a concessão <strong>de</strong> uma tutela jurisdicional <strong>do</strong> direito material.


A tutela jurisdicional po<strong>de</strong> ser dividida <strong>de</strong> diferentes formas, bastan<strong>do</strong> para tanto que se a<strong>do</strong>tem diferentes critérios. Assim,<br />

tem-se a distinção entre jurisdição voluntária e contenciosa, penal e civil, preventiva e ressarcitória, comum e específica etc. Essas<br />

classificações, que têm importância meramente acadêmica, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se a unida<strong>de</strong> da jurisdição, sempre <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rão <strong>do</strong> critério<br />

escolhi<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>utrina, não sen<strong>do</strong> diferente com a classificação distintiva existente entre tutela jurisdicional individual e coletiva,<br />

que a<strong>do</strong>ta como critério a espécie <strong>de</strong> direito material tutela<strong>do</strong>.<br />

A tutela jurisdicional individual é a tutela voltada à proteção <strong>do</strong>s direitos materiais individuais, sen<strong>do</strong> fundamentalmente<br />

regulamentada pelo Código <strong>de</strong> Processo Civil, além, é claro, <strong>de</strong> diversas leis extravagantes, tais como a Lei <strong>de</strong> Locações, Lei <strong>do</strong>s<br />

Juiza<strong>do</strong>s Especiais, Lei <strong>de</strong> Execução Fiscal etc. A tutela jurisdicional coletiva, entretanto, não se resume à tutela <strong>de</strong> direitos<br />

coletivos, ainda que seja aceita a expressão “direitos coletivos lato sensu” para <strong>de</strong>signar as espécies <strong>de</strong> direito material protegi<strong>do</strong>s<br />

por esse tipo <strong>de</strong> tutela.<br />

Dessa forma, a tutela coletiva <strong>de</strong>ve ser compreendida como uma espécie <strong>de</strong> tutela jurisdicional voltada à tutela <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>terminadas espécies <strong>de</strong> direitos materiais. A <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> quais sejam esses direitos é tarefa <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r, não haven<strong>do</strong> uma<br />

necessária relação entre a natureza <strong>do</strong> direito tutela<strong>do</strong> e a tutela coletiva. Significa que mesmo direitos <strong>de</strong> natureza individual<br />

po<strong>de</strong>m ser protegi<strong>do</strong>s pela tutela coletiva, bastan<strong>do</strong> para isso que o legisla<strong>do</strong>r expressamente <strong>de</strong>termine a aplicação <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong><br />

sistema processual – microssistema coletivo – a tais direitos. Essa parece ser a opção <strong>do</strong> sistema pátrio, ainda que parcela da<br />

<strong>do</strong>utrina teça críticas a tal ampliação <strong>do</strong> âmbito <strong>de</strong> aplicação da tutela coletiva1.<br />

Em três passagens legais que versam sobre o direito coletivo lato sensu, e mais precisamente sobre a aplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

microssistema coletivo, encontra-se a tutela <strong>de</strong> direitos individuais puros, <strong>de</strong> natureza indisponível, que po<strong>de</strong>m até mesmo ter<br />

apenas um sujeito como titular. Trata-se <strong>do</strong> art. 201, V, da Lei 8.069/1990 (ECA) e art. 74, I, da Lei 10.741/2001 (Estatuto <strong>do</strong><br />

I<strong>do</strong>so), que expressamente atribuem legitimida<strong>de</strong> ao Ministério Público na tutela <strong>de</strong> direitos individuais indisponíveis por meio <strong>de</strong><br />

instrumentos exclusivos <strong>do</strong> microssistema coletivo: inquérito civil e ação civil pública, e <strong>do</strong> art. 3.º, caput, da Lei 7.853/1989, com<br />

redação dada pelo art. 98 da Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoas com Deficiência), que prevê legitimida<strong>de</strong> ainda mais ampla.<br />

As variadas espécies <strong>de</strong> direito material protegidas pela tutela coletiva, tanto <strong>de</strong> natureza transindividual (difuso e coletivo),<br />

como <strong>de</strong> natureza individual (individual homogêneo e indisponíveis em situações excepcionais), não <strong>de</strong>svirtuam a tutela<br />

jurisdicional coletiva, porque, apesar <strong>de</strong> limitada a <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s direitos, ela é una, sen<strong>do</strong> aplicada a to<strong>do</strong>s eles <strong>de</strong> maneira<br />

basicamente indistinta. É natural que existam algumas particularida<strong>de</strong>s, que <strong>de</strong>vem ser sempre consi<strong>de</strong>radas no caso concreto 2 , mas<br />

nunca aptas a <strong>de</strong>svirtuar o núcleo duro <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> tutela jurisdicional. Significa que, apesar <strong>de</strong> alguma influência em<br />

<strong>de</strong>corrência da espécie <strong>de</strong> direito tutela<strong>do</strong>, as principais regras que compõem o microssistema coletivo serão aplicadas a todas as<br />

ações coletivas, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da espécie <strong>de</strong> direito material tutela<strong>do</strong>.<br />

A tutela jurisdicional coletiva, portanto, nada mais é que um conjunto <strong>de</strong> normas processuais diferenciadas (espécie <strong>de</strong> tutela<br />

jurisdicional diferenciada 3 ), distintas daquelas aplicáveis no âmbito da tutela jurisdicional individual. Institutos processuais tais<br />

como a competência, a conexão e continência, legitimida<strong>de</strong>, coisa julgada, liquidação da sentença etc., têm na tutela coletiva um<br />

trato diferencia<strong>do</strong>, varian<strong>do</strong> o grau <strong>de</strong> distinção <strong>do</strong> tratamento recebi<strong>do</strong> pelos mesmos institutos no Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

Por meio da tutela diferenciada volta-se o processualista às exigências <strong>do</strong> direito material apresentadas no caso concreto. Notase<br />

que, apesar <strong>de</strong> serem ciências autônomas, o direito processual e o direito material estão liga<strong>do</strong>s <strong>de</strong> maneira indissociável,<br />

servin<strong>do</strong> o processo como instrumento estatal <strong>de</strong> efetiva proteção ao direito material. Como as várias crises <strong>de</strong> direito material têm<br />

diversas particularida<strong>de</strong>s, é necessário percebê-las, a<strong>de</strong>quan<strong>do</strong>-se o procedimento no caso concreto para que a tutela jurisdicional<br />

seja efetivamente prestada com a qualida<strong>de</strong> que <strong>de</strong>la se espera. Tutela jurisdicional diferenciada, assim, representa a a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong><br />

procedimentos e técnicas procedimentais distintas à luz das exigências concretas para bem tutelar o direito material4.<br />

Estudar a tutela jurisdicional coletiva é, portanto, estudar as formas e institutos processuais presentes no processo coletivo. O<br />

direito material difuso e coletivo, num maior grau e, mesmo com menor intensida<strong>de</strong>, o direito individual homogêneo, têm uma<br />

riqueza incontestável, em especial no âmbito <strong>do</strong> direito consumerista. O direito material coletivo lato sensu consumerista já foi<br />

<strong>de</strong>vidamente enfrenta<strong>do</strong> na primeira parte <strong>do</strong> livro, sen<strong>do</strong> o presente capítulo volta<strong>do</strong> exclusivamente para os aspectos processuais<br />

<strong>de</strong> tais direitos.<br />

11.1.2. Origem da tutela jurisdicional coletiva<br />

Ainda que se mantenha a conclusão <strong>de</strong> que os direitos protegi<strong>do</strong>s pela tutela coletiva sejam aqueles que o legisla<strong>do</strong>r<br />

<strong>de</strong>terminar, esperan<strong>do</strong>-se, naturalmente, que se faça criterioso juízo <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong> e conveniência ao se incluir nessa tutela um<br />

direito <strong>de</strong> natureza individual, sob pena <strong>de</strong> <strong>de</strong>svirtuamento da tutela coletiva, é preciso reconhecer que, no momento <strong>de</strong> sua criação,<br />

era voltada exclusivamente aos direitos transindividuais. Somente em um momento posterior passa a também tutelar os direitos<br />

individuais viola<strong>do</strong>s ou ameaça<strong>do</strong>s por atos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> escala (direito individual homogêneo), ten<strong>do</strong>, no tocante ao tema, papel


originário o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da natureza <strong>do</strong> bem da vida tutela<strong>do</strong>, e por consequência <strong>do</strong> ramo <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>, será admissível falar em<br />

tutela coletiva. De qualquer forma, enten<strong>do</strong> que continua intocável a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que essa espécie <strong>de</strong> tutela coletiva estará <strong>de</strong>stinada<br />

aos direitos materiais que o legisla<strong>do</strong>r preten<strong>de</strong>r tutelar <strong>de</strong>ssa forma diferenciada. Insisto, entretanto, que a origem da tutela coletiva<br />

está associada aos direitos <strong>de</strong> natureza transindividual, sen<strong>do</strong> a ampliação <strong>do</strong> objeto da tutela uma opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r, certamente<br />

satisfeito com os resulta<strong>do</strong>s práticos gera<strong>do</strong>s pelo novo sistema cria<strong>do</strong>.<br />

Esse <strong>de</strong>senvolvimento da tutela coletiva é compreensível. Os direitos transindividuais não po<strong>de</strong>m ser efetivamente protegi<strong>do</strong>s<br />

pela tutela individual, a qual, no Brasil, está essencialmente prevista pelo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Sem as <strong>de</strong>vidas adaptações <strong>de</strong><br />

alguns institutos processuais, notadamente da legitimida<strong>de</strong> ativa e da coisa julgada5, a efetiva tutela <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> direito seria<br />

inviável. Daí a necessida<strong>de</strong> imprescindível <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> um novo sistema, da criação e disponibilização às partes <strong>de</strong> uma nova<br />

espécie <strong>de</strong> tutela, chamada <strong>de</strong> tutela coletiva.<br />

Não foi a inviabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> proteção por meio da tutela individual que levou os direitos individuais homogêneos para o âmbito<br />

da tutela coletiva, mas uma opção <strong>de</strong> política legislativa fundada em variadas razões. No tocante à tutela <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r,<br />

certamente a massificação da relação consumi<strong>do</strong>r-fornece<strong>do</strong>r foi <strong>de</strong>terminante. O direito individual homogêneo, por exemplo, é<br />

tradicionalmente admiti<strong>do</strong> como protegi<strong>do</strong> pela tutela coletiva, diante <strong>do</strong>s multifacetários obstáculos existentes para sua efetiva<br />

proteção no âmbito da tutela individual. Ainda assim, é inegável que tal espécie <strong>de</strong> direito po<strong>de</strong> ser tutela<strong>do</strong> pela tutela individual, o<br />

que, inclusive, ocorre até hoje, com a existência <strong>de</strong> diversas ações individuais que po<strong>de</strong>riam ser substituídas por uma ação coletiva<br />

fundada em direito individual homogêneo.<br />

O que se preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar claro é que a tutela coletiva é absolutamente imprescindível para a tutela <strong>de</strong> direitos difusos e<br />

coletivos, que, sem ela, jamais po<strong>de</strong>rão ser <strong>de</strong>vidamente atendi<strong>do</strong>s com a aplicação da tutela individual. Nos direitos individuais<br />

homogêneos, a tutela individual é abstratamente apta a tutelar o direito, ainda que na prática, em razão <strong>do</strong>s inúmeros obstáculos<br />

existentes, seja altamente recomendável a aplicação da tutela coletiva.<br />

Fazen<strong>do</strong> uma analogia, se valer da tutela individual para a proteção <strong>de</strong> um interesse coletivo é o mesmo que exigir da parte que<br />

esvazie uma piscina com um garfo. A tarefa, naturalmente, será impossível <strong>de</strong> ser cumprida. No direito individual homogêneo,<br />

disponibiliza-se uma colher para a parte esvaziar a mesma piscina. Será difícil, trabalhoso, cansativo e <strong>de</strong>mora<strong>do</strong>, mas a tarefa po<strong>de</strong><br />

ser cumprida. Aplicar a tutela coletiva nesses direitos é permitir que a parte abra o ralo da piscina, o que fará com que água escoe<br />

<strong>de</strong> maneira mais rápida e eficaz, obten<strong>do</strong>-se o esvaziamento da piscina em menor tempo, menos esforço e <strong>de</strong> forma mais eficiente.<br />

A urgência na criação <strong>de</strong> uma nova forma <strong>de</strong> tutela para proteger os direitos transindividuais é explicada corretamente pela<br />

<strong>do</strong>utrina como forma <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r o princípio da inafastabilida<strong>de</strong> da jurisdição. Consagra<strong>do</strong> pelo art. 5.º, XXXV, da CF/1988 (“a lei<br />

não excluirá da apreciação <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário lesão ou ameaça a direito”), o princípio da inafastabilida<strong>de</strong> tem <strong>do</strong>is aspectos: a<br />

relação entre a jurisdição e a solução administrativa <strong>de</strong> conflitos e o acesso à or<strong>de</strong>m jurídica justa, que dá novos contornos ao<br />

princípio, firme no entendimento <strong>de</strong> que a inafastabilida<strong>de</strong> somente existirá concretamente por meio <strong>do</strong> oferecimento <strong>de</strong> um<br />

processo que efetivamente tutele o interesse da parte titular <strong>do</strong> direito material. Interessa ao presente estu<strong>do</strong> o segun<strong>do</strong> aspecto.<br />

O que realmente significa dizer que nenhuma lesão ou ameaça a direito <strong>de</strong>ixará <strong>de</strong> ser tutelada jurisdicionalmente? Trata-se da<br />

i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> “acesso à or<strong>de</strong>m jurídica justa”, ou, como preferem alguns, “acesso à tutela jurisdicional a<strong>de</strong>quada”. Segun<strong>do</strong> lição<br />

corrente na <strong>do</strong>utrina, essa nova visão <strong>do</strong> princípio da inafastabilida<strong>de</strong> encontra-se fundada em quatro i<strong>de</strong>ais principais, verda<strong>de</strong>iras<br />

vigas mestras <strong>do</strong> entendimento6: acesso ao processo, ampla participação, <strong>de</strong>cisões com justiça e eficácia das <strong>de</strong>cisões.<br />

Interessa à presente análise a primeira <strong>de</strong>ssas vigas mestras. O acesso ao processo <strong>do</strong>s direitos transindividuais seria impossível<br />

com a aplicação <strong>do</strong> sistema cria<strong>do</strong> para a tutela individual. E, nesse senti<strong>do</strong>, o princípio da inafastabilida<strong>de</strong> da jurisdição<br />

consagra<strong>do</strong> constitucionalmente seria flagrantemente <strong>de</strong>srespeita<strong>do</strong>. A única forma <strong>de</strong> fazer valer concretamente o princípio<br />

constitucional nesse caso, portanto, seria – como foi – com a criação da tutela coletiva.<br />

Ainda que <strong>de</strong> maneira mais difícil, <strong>de</strong>morada e cara, para os direitos individuais atualmente protegi<strong>do</strong>s pela tutela coletiva, não<br />

é concebível falar em impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tutela por meio <strong>do</strong> sistema cria<strong>do</strong> pela tutela individual. Conforme já afirma<strong>do</strong>, os<br />

obstáculos são tantos e tão significativos, entretanto, que sacrificam ou tornam extremamente difícil o acesso ao processo, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong><br />

que a inclusão <strong>de</strong> tal espécie <strong>de</strong> direito no microssistema coletivo também po<strong>de</strong> ser explicada como efetivação <strong>do</strong> princípio <strong>do</strong><br />

acesso à or<strong>de</strong>m jurídica justa.<br />

11.1.3.<br />

Microssistema coletivo<br />

A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> microssistema foi muito bem <strong>de</strong>senvolvida no campo <strong>do</strong> direito material, sen<strong>do</strong> os estu<strong>do</strong>s mais<br />

aprofunda<strong>do</strong>s sobre o tema apresenta<strong>do</strong>s por civilistas. Mesmo em outros campos <strong>do</strong> direito material, tais como o direito trabalhista<br />

e penal, existem estu<strong>do</strong>s e aplicação da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> microssistema. Acredito que até mesmo no direito processual tal i<strong>de</strong>ia não se limita


à tutela coletiva, haven<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrina, por exemplo, que fala em microssistema processual cria<strong>do</strong> pelas três leis que regulamentam os<br />

Juiza<strong>do</strong>s Especiais (Lei 9.099/1995; Lei 10.259/2001; Lei 12.153/2009)7.<br />

Essa pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> normas processuais que regulamentam a tutela coletiva no direito pátrio é algo que naturalmente complica<br />

sua aplicação no caso concreto, com discussões por muitas vezes acaloradas sobre qual norma aplicar. É um problema que po<strong>de</strong>ria<br />

ter si<strong>do</strong> resolvi<strong>do</strong>, mas a opção legislativa não seguiu o <strong>de</strong>sejo da maior parte da <strong>do</strong>utrina especializada.<br />

Existe um Código Mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Processos Coletivos para Ibero-América, aprova<strong>do</strong> nas Jornadas <strong>do</strong> Instituto Ibero-Americano <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> Processual, na Venezuela, em outubro <strong>de</strong> 2004. Contribuíram para a elaboração <strong>de</strong>sse Código Mo<strong>de</strong>lo especialistas iberoamericanos<br />

<strong>de</strong> diversos países, sen<strong>do</strong> brasileiros Ada Pellegrini Grinover, Kazuo Watanabe, Antonio Gidi e Aluísio <strong>de</strong> Castro<br />

Men<strong>de</strong>s. Como o próprio nome sugere, entretanto, trata-se apenas <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo, que serve, quan<strong>do</strong> muito, para comparação com o<br />

direito vigente em nosso país. De qualquer forma, trata-se <strong>de</strong> compilação em um só Código <strong>de</strong> todas as normas processuais da<br />

tutela coletiva.<br />

Certamente influencia<strong>do</strong>s pelo Código Mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Processos Coletivos para Ibero-América, teve início em território nacional<br />

um movimento para a elaboração <strong>de</strong> um Código <strong>de</strong> Processo Civil coletivo. Depois <strong>de</strong> muitas idas e vindas, o projeto, que <strong>de</strong>sistiu<br />

da i<strong>de</strong>ia originária <strong>de</strong> novo Código e passou a propor uma revisão substancial da Lei 7.347/1985, para que passasse a ser o diploma<br />

processual coletivo (Projeto <strong>de</strong> Lei 5.139/2009), foi rejeita<strong>do</strong> na Comissão <strong>de</strong> Constituição e Justiça8, sen<strong>do</strong> interposto recurso <strong>do</strong><br />

relator e <strong>de</strong> outros <strong>de</strong>puta<strong>do</strong>s contra tal <strong>de</strong>cisão. Finalmente, em 17 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 2010, o projeto <strong>de</strong> lei foi rejeita<strong>do</strong> pela Câmara <strong>do</strong>s<br />

Deputa<strong>do</strong>s.<br />

Esse brevíssimo histórico é importante porque <strong>de</strong>monstra que houve uma tentativa legislativa <strong>de</strong> reunião <strong>de</strong> todas – ou ao<br />

menos da maioria – as normas processuais da tutela coletiva num só diploma legal. Ocorre, entretanto, que esse objetivo não foi<br />

alcança<strong>do</strong>, <strong>de</strong> forma que, atualmente, o sistema processual da tutela coletiva está espalha<strong>do</strong> por inúmeras leis, o que exige <strong>do</strong><br />

intérprete o reconhecimento <strong>de</strong> que o microssistema <strong>de</strong> processo coletivo resulta da reunião <strong>de</strong> normas distribuídas por tais leis.<br />

Registre-se, antes <strong>de</strong> tu<strong>do</strong>, que o termo microssistema coletivo não é tranquilo na <strong>do</strong>utrina, haven<strong>do</strong> aqueles que preferem falar<br />

em minissistema 9 e outros, em sistema único coletivo 10 . São diferentes nomenclaturas para praticamente o mesmo raciocínio, <strong>de</strong><br />

forma que a a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> uma ou <strong>de</strong> outra não gera qualquer repercussão prática relevante. Prefiro o termo “microssistema coletivo”<br />

por ser o mais utiliza<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong>, inclusive, consagra<strong>do</strong> no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça 11 . O mais importante é a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> como<br />

as leis que compõem o microssistema se relacionam e como esse se relaciona com o Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

São inúmeras as leis que compõem o microssistema coletivo, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser citadas: Lei 4.717/1965 (Ação Popular); Lei<br />

6.938/1981 (Lei da Política Nacional <strong>do</strong> Meio Ambiente); Lei 7.347/1985 (Ação Civil Pública); Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988; Lei<br />

7.853/1989 (Lei das Pessoas Porta<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> Deficiência); Lei 7.913/1989 (Lei <strong>do</strong>s Investi<strong>do</strong>res <strong>do</strong>s Merca<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Valores<br />

Imobiliários); Lei 8.069/1990 (Estatuto da Criança e <strong>do</strong> A<strong>do</strong>lescente); Lei 8.078/1990 (Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r); Lei<br />

8.492/1992 (Lei <strong>de</strong> Improbida<strong>de</strong> Administrativa); Lei 10.471/2003 (Estatuto <strong>do</strong> I<strong>do</strong>so); Lei 10.671/2003 (Estatuto <strong>do</strong> Torce<strong>do</strong>r);<br />

Lei 12.016/2009 (Lei <strong>do</strong> Manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> Segurança); Lei 12.529/2011 (Lei <strong>do</strong> Sistema Brasileiro <strong>de</strong> Concorrência); Lei 12.846/2013<br />

(Lei Anticorrupção); Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência).<br />

Apesar da inegável pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> leis a compor o microssistema coletivo, a <strong>do</strong>utrina parece tranquila no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> indicar que<br />

o núcleo duro <strong>de</strong>sse microssistema é forma<strong>do</strong> pela Lei da Ação Civil Pública e pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r 12 . Para<br />

alguns, inclusive, só existiria o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e a ação civil pública, regulada pela Lei 7.347/1985 e reafirmada,<br />

contrariada ou complementada pelas <strong>de</strong>mais leis mencionadas13. Seja como for, não há como se negar a relevância das Leis<br />

7.347/1985 e 8.078/1990 para o microssistema coletivo.<br />

No tocante à norma que <strong>de</strong>ve ser aplicada no caso concreto, é possível pensar em três interessantes pontos: (i) <strong>de</strong>finir <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong><br />

núcleo duro qual norma <strong>de</strong>ve ser aplicada; (ii) fora <strong>do</strong> núcleo duro, como normas <strong>de</strong> outras leis que compõem o microssistema<br />

<strong>de</strong>vam ser aplicadas; (iii) fora <strong>do</strong> microssistema, como <strong>de</strong>vem ser aplicadas as regras <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

Quanto ao primeiro ponto, há corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> ser prioritariamente aplicáveis as normas da Lei da Ação Civil<br />

Pública, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong>-se a aplicação em segun<strong>do</strong> plano, no que for cabível, das normas previstas no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r 14 , enquanto outra corrente enten<strong>de</strong> que, sen<strong>do</strong> a relação <strong>de</strong> direito material <strong>de</strong> consumo, a aplicação da Lei <strong>de</strong> Ação<br />

Civil Pública <strong>de</strong>ve ocorrer subsidiariamente 15 . Consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> apenas esses <strong>do</strong>is entendimentos, o primeiro é preferível em razão da<br />

expressa previsão contida no art. 21 da Lei 7.347/1985.<br />

Consi<strong>de</strong>ro, entretanto, que não existe propriamente uma or<strong>de</strong>m preestabelecida entre os <strong>do</strong>is diplomas legais. Na realida<strong>de</strong>, são<br />

raras as hipóteses <strong>de</strong> conflito entre suas normas, servin<strong>do</strong> o segun<strong>do</strong> para especificar normas existentes no primeiro, como ocorre,<br />

por exemplo, no caso da competência, ou para incluir novida<strong>de</strong>s, como a expressa previsão <strong>de</strong> tutela coletiva aos direitos<br />

individuais homogêneos. Normas <strong>do</strong> diploma mais antigo, modificadas posteriormente, também são aplicáveis no diploma mais<br />

recente, como o famigera<strong>do</strong> art. 16 da LACP, ainda que atualmente corretamente interpreta<strong>do</strong> pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça,


conforme analisa<strong>do</strong> no item 11.6.4. Como se nota, há uma quase perfeita interação entre os <strong>do</strong>is diplomas que formam o núcleo<br />

duro <strong>do</strong> microssistema coletivo.<br />

Nas raras situações <strong>de</strong> conflito, enten<strong>do</strong> que <strong>de</strong>va sempre prevalecer a norma mais benéfica na tutela <strong>do</strong> direito coletivo lato<br />

sensu, sen<strong>do</strong>, portanto, irrelevante a natureza <strong>do</strong> direito material. Dessa forma, mesmo se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, se a<br />

norma prevista no CDC se mostrar menos favorável ao direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r <strong>do</strong> que aquela prevista na LACP, enten<strong>do</strong> que <strong>de</strong>ve<br />

ser essa segunda aplicada no caso concreto.<br />

Mais complexa é a solução <strong>de</strong> conflito entre o núcleo duro forma<strong>do</strong> pelas duas leis e as <strong>de</strong>mais leis extravagantes que<br />

compõem o microssistema. Para parcela da <strong>do</strong>utrina, primeiro <strong>de</strong>ve-se aplicar o núcleo duro, e somente não haven<strong>do</strong> norma lá<br />

prevista, as <strong>de</strong>mais leis16, enquanto outros enten<strong>de</strong>m que primeiro <strong>de</strong>vam ser aplicadas as leis específicas, e somente na hipótese<br />

<strong>de</strong> omissão se passar à aplicação das regras constantes <strong>do</strong> núcleo duro 17 .<br />

Caso seja necessária a <strong>de</strong>terminação a priori e <strong>de</strong> forma abstrata <strong>de</strong> qual lei <strong>de</strong>ve prevalecer, tem mais lógica o segun<strong>do</strong><br />

entendimento, aplican<strong>do</strong>-se antes a norma prevista em lei específica e, somente diante <strong>de</strong> sua omissão, a norma geral prevista no<br />

núcleo duro <strong>do</strong> microssistema coletivo. Não parece, entretanto, que <strong>de</strong>va ser sempre essa a melhor solução, porque é possível que a<br />

norma específica seja menos benéfica para a tutela <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> que aquela prevista <strong>de</strong> forma genérica na Lei <strong>de</strong> Ação Civil<br />

Pública e/ou no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Prefiro, portanto, conforme já adianta<strong>do</strong>, o entendimento <strong>de</strong> que, <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> microssistema coletivo, <strong>de</strong>ve ser sempre aplicável a<br />

norma mais benéfica à tutela <strong>do</strong> direito material discuti<strong>do</strong> em processo, sen<strong>do</strong> irrelevante se <strong>de</strong>terminada por norma específica ou<br />

geral, anterior ou posterior, ou qualquer outra forma <strong>de</strong> interpretação <strong>de</strong> normas 18 . Esse entendimento tem como mérito uma<br />

proteção mais efetiva ao direito material coletivo lato sensu, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da espécie <strong>de</strong> direito e <strong>do</strong> diploma legal cria<strong>do</strong><br />

pelo legisla<strong>do</strong>r para tutelá-lo, porém gera relativa insegurança jurídica por não criar bases objetivas para aferição da norma<br />

aplicável ao caso concreto, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> sempre da casuística.<br />

Por fim, a aplicação das normas existentes no Código <strong>de</strong> Processo Civil será imprescindível, mas para isso é fundamental que<br />

não exista norma expressa aplicável ao caso concreto <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> próprio microssistema 19 . Além disso, a norma processual presente<br />

no Código <strong>de</strong> Processo Civil não po<strong>de</strong> afrontar os princípios <strong>do</strong> processo coletivo20, o que leva a <strong>do</strong>utrina a afirmar que a<br />

aplicação não <strong>de</strong>ve ser subsidiária, mas sim eventual.<br />

11.1.4. Marcos legislativos<br />

Apesar <strong>de</strong> indiscutível a existência <strong>de</strong> um microssistema coletivo, composto por inúmeras leis é inegável que existem<br />

verda<strong>de</strong>iros marcos legislativos no tocante ao processo coletivo em nosso país, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser indica<strong>do</strong>s quatro momentos, sem<br />

<strong>de</strong>sprezo <strong>do</strong>s <strong>de</strong>mais, que têm relevância mais significativa na sistematização <strong>do</strong> processo coletivo.<br />

O primeiro marco legislativo é a Lei 4.717/1965, conhecida como Lei da Ação Popular. Apesar <strong>de</strong> a <strong>do</strong>utrina enten<strong>de</strong>r que a<br />

ação popular vigorou no perío<strong>do</strong> imperial e início da República, durante a vigência das Or<strong>de</strong>nações <strong>do</strong> Reino, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> bens <strong>de</strong> uso comum pelo cidadão, com o advento <strong>do</strong> Código Civil <strong>de</strong> 1916, mais precisamente em razão<br />

<strong>de</strong> seu art. 76, a <strong>do</strong>utrina majoritária passou a enten<strong>de</strong>r que o sistema jurídico brasileiro não mais admitia a ação popular, ainda que<br />

vozes isoladas continuassem a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a sobrevivência <strong>de</strong>ssa ação coletiva21.<br />

Em 1934 a ação popular é incluída expressamente na Constituição Fe<strong>de</strong>ral, por meio <strong>do</strong> art. 113, § 38, para, três anos <strong>de</strong>pois,<br />

ser suprimida pela Constituição <strong>de</strong> 1937, vin<strong>do</strong> a ser restabelecida pelo art. 141, § 38, da Constituição <strong>de</strong> 1946, manten<strong>do</strong>-se em<br />

todas as Constituições subsequentes (art. 150, § 31, da CF <strong>de</strong> 1967; art. 153, § 31, da ECF <strong>de</strong> 1969 e na atual CF/1988 em seu art.<br />

5.º, LXXIII).<br />

No campo infraconstitucional, a Lei 4.717 <strong>de</strong> 1965, que regulamenta a ação popular, <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada o primeiro marco<br />

legislativo, por ter si<strong>do</strong> a primeira lei que indiscutivelmente tratou <strong>de</strong> tutela coletiva no or<strong>de</strong>namento brasileiro, sen<strong>do</strong> significativas<br />

as inovações por ela propostas, tais como a diferenciada forma <strong>de</strong> legitimação ativa (embora a legitimida<strong>de</strong> ativa <strong>do</strong> cidadão não<br />

tenha influencia<strong>do</strong> leis posteriores que compõe o microssistema coletivo), a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o réu virar autor, a coisa julgada<br />

secundum eventum probationis, a obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> execução da sentença <strong>de</strong> procedência, <strong>de</strong>ntre outras importantes novida<strong>de</strong>s, ao<br />

menos à época.<br />

Apesar da indiscutível relevância da ação popular para o processo coletivo, no âmbito <strong>do</strong> direito consumerista tal ação é<br />

inaplicável, daí o <strong>de</strong>sinteresse <strong>de</strong> sua análise no presente livro. Tentativas no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> tutelar direitos consumeristas por meio da<br />

ação popular vêm sen<strong>do</strong> corretamente rejeitadas pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça22, que limita tal espécie <strong>de</strong> ação coletiva à<br />

proteção <strong>do</strong>s valores constantes expressamente <strong>do</strong> texto constitucional, no qual não se inclui o direito difuso <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

O segun<strong>do</strong> marco legislativo é a Lei 7.347/1985, chamada <strong>de</strong> Lei da Ação Civil Pública. Ainda que seja inegável a importância<br />

<strong>de</strong>ssa lei para o microssistema, inclusive fazen<strong>do</strong> parte <strong>de</strong> seu núcleo duro, é preciso registrar que ela surgiu em nosso or<strong>de</strong>namento


jurídico com abrangência significativamente menor <strong>do</strong> que a que tem atualmente.<br />

Na origem, apesar <strong>de</strong> consagrar a tutela <strong>do</strong>s direitos difusos e coletivos, havia uma expressa previsão no art. 1.º a respeito <strong>de</strong><br />

quais seriam esses direitos: consumi<strong>do</strong>r, meio ambiente, patrimônio histórico e cultural. E esse rol era consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> exaustivo, até<br />

em razão <strong>do</strong> veto ao inciso que previa a tutela <strong>de</strong> “qualquer outro direito difuso e coletivo”. O rol só veio a se tornar<br />

exemplificativo com o advento <strong>do</strong> CDC, mais precisamente <strong>do</strong> inciso IV <strong>do</strong> art. 1.º.<br />

Lamentável, entretanto, que, após um significativo passo rumo à amplitu<strong>de</strong> da tutela coletiva, tenha-se caminha<strong>do</strong> para trás<br />

com a previsão expressa no parágrafo único <strong>do</strong> art. 1.º, <strong>de</strong> vedação a <strong>de</strong>terminadas espécies <strong>de</strong> direitos difusos e coletivos<br />

(pretensões que envolvam tributos, contribuições previ<strong>de</strong>nciárias, o Fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> Garantia <strong>do</strong> Tempo <strong>de</strong> Serviço – FGTS ou outros<br />

fun<strong>do</strong>s <strong>de</strong> natureza institucional, cujos beneficiários po<strong>de</strong>m ser individualmente <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s), em especial quan<strong>do</strong> nota-se a<br />

preocupação <strong>de</strong> salvaguardar o Esta<strong>do</strong> 23 . Tais limitações, entretanto, apesar <strong>de</strong> lamentáveis, não atingem o direito consumerista,<br />

que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a origem da ação civil pública já vinha expressamente consagra<strong>do</strong> como direito tutelável.<br />

De qualquer forma, foi um marco legislativo no <strong>de</strong>senvolvimento <strong>do</strong> processo coletivo, especialmente em razão das novida<strong>de</strong>s<br />

a respeito da legitimida<strong>de</strong> ativa, em opção legislativa consi<strong>de</strong>ravelmente diferente daquela a<strong>do</strong>tada no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r, da amplitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> direitos materiais tutela<strong>do</strong>s com previsão no art. 1.º, previsão <strong>de</strong> inquérito civil, regras <strong>de</strong><br />

competência, previsão <strong>do</strong> Fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>s Difusos, ainda que pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> regulamentação, regras referentes à gratuida<strong>de</strong> para o<br />

autor. Ainda hoje, é uma das leis mais importantes que compõem o microssistema coletivo.<br />

O terceiro marco legislativo é a Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988, conhecida como Constituição Cidadã, a primeira <strong>de</strong> nossa fase<br />

<strong>de</strong>mocrática após os tristes e nebulosos anos <strong>de</strong> ditadura militar. É possível analisar a relevância da Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988<br />

para a tutela coletiva sob <strong>do</strong>is diferentes aspectos.<br />

Na questão <strong>do</strong> direito material coletivo, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que, pela primeira vez, o texto constitucional consagrou a tutela <strong>de</strong><br />

direitos materiais difusos e coletivos, bastan<strong>do</strong> para se chegar a tal conclusão a leitura <strong>do</strong> art. 5.º da Constituição Fe<strong>de</strong>ral. Elevar o<br />

direito material coletivo ao âmbito <strong>do</strong>s direitos fundamentais foi obra da Constituição Fe<strong>de</strong>ral, o que, pelo menos no plano<br />

acadêmico, era o espera<strong>do</strong>. Está lá, quan<strong>do</strong> ele fala em direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, à saú<strong>de</strong>, direito à educação, direito ao patrimônio<br />

histórico-cultural etc.<br />

O segun<strong>do</strong> aspecto é processual, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que a Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988 expressamente consagra regras referentes ao<br />

processo coletivo, ainda que não trate especificamente <strong>do</strong> procedimento <strong>de</strong> tal processo, missão, inclusive, outorgada à legislação<br />

infraconstitucional. Em pelo menos três passagens <strong>do</strong> texto constitucional existe previsão que afeta positivamente o processo<br />

coletivo.<br />

Amplia-se o cabimento da ação popular em razão da previsão contida no art. 5.º, LXXIII, da CF/1988, que passa a admitir tal<br />

espécie <strong>de</strong> ação coletiva para: (a) anulação <strong>de</strong> ato lesivo ao patrimônio público ou <strong>de</strong> entida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que o Esta<strong>do</strong> participe; (b)<br />

anulação <strong>de</strong> ato lesivo à moralida<strong>de</strong> administrativa; (c) anulação <strong>de</strong> ato lesivo ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e<br />

cultural. Essa norma constitucional, conjugada com o art. 1.º, caput, da LAP, em sua redação original, e com seu § 1.º, incluí<strong>do</strong><br />

pela Lei 6.513/1977, que conceitua o patrimônio público a ser protegi<strong>do</strong> como bens e direitos <strong>de</strong> valor econômico, artístico,<br />

estético, histórico ou turístico, ampliam significativamente o âmbito <strong>de</strong> tutela por meio <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> ação coletiva.<br />

Atualmente, e muito em <strong>de</strong>corrência da previsão constitucional, é tranquilo o entendimento <strong>de</strong> que, por meio da ação popular<br />

tutelam-se tanto os bens materiais que compõem o patrimônio público como também os bens imateriais. Essa ação coletiva,<br />

portanto, não se limita mais somente à tutela <strong>do</strong> erário, também prestan<strong>do</strong>-se à tutela <strong>de</strong> bens <strong>do</strong> patrimônio imaterial, tais como a<br />

moralida<strong>de</strong> administrativa, o meio ambiente e o patrimônio cultural, artístico e urbanístico.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, o art. 129, III, da CF/1988, prevê que o Ministério Público tem como função institucional a promoção <strong>do</strong><br />

inquérito civil e a propositura da ação civil pública, para a proteção <strong>do</strong> patrimônio público e social, <strong>do</strong> meio ambiente e <strong>de</strong> outros<br />

interesses difusos e coletivos. Lembre-se que em 1988 ainda havia a limitação <strong>de</strong> tutela a algumas espécies <strong>de</strong> direitos difusos e<br />

coletivos, em razão da previsão <strong>do</strong> art. 1.º da LACP, com a redação da época, <strong>de</strong> forma que a previsão constitucional, ao não atrelar<br />

a atuação ativa <strong>do</strong> Ministério Público às espécies <strong>de</strong> direitos transindividuais, foi inova<strong>do</strong>ra no campo da legitimação ativa.<br />

Na realida<strong>de</strong>, criou-se uma situação anômala, com evi<strong>de</strong>nte quebra <strong>de</strong> isonomia entre os legitima<strong>do</strong>s ativos coletivos.<br />

Enquanto o Ministério Público tinha legitimida<strong>de</strong> constitucional para ingressar com processo coletivo para a tutela <strong>de</strong> qualquer<br />

espécie <strong>de</strong> direito coletivo e difuso, os <strong>de</strong>mais legitima<strong>do</strong>s ativos estavam limita<strong>do</strong>s ao rol exauriente previsto no art. 1.º da LACP.<br />

A anomalia, entretanto, durou pouco, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-se até dizer que a norma constitucional serviu com precursora das mudanças<br />

ocorridas <strong>do</strong>is anos <strong>de</strong>pois no CDC.<br />

Por fim, a Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988, em seu art. 5.º, LXX, “a” e “b”, previu expressamente o manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança<br />

coletivo, <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> sua legitimida<strong>de</strong> ativa. A regulamentação veio somente no ano <strong>de</strong> 2009, por meio da Lei 12.016, mas, <strong>de</strong><br />

qualquer forma <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Constituição Fe<strong>de</strong>ral já se admite o manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança coletivo, no que o texto po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>


uma importante inovação em termos <strong>de</strong> processo coletivo.<br />

O quarto e último marco legislativo é a Lei 8.078/1990, que, apesar <strong>de</strong> conhecida como Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, tem<br />

importantes dispositivos nos Títulos III e V <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>s ao processo coletivo, sen<strong>do</strong> aplicável em qualquer direito <strong>de</strong>ssa espécie, e<br />

não só no direito coletivo consumerista. Como já analisa<strong>do</strong> no presente Capítulo, o CDC, naquilo que couber, forma atualmente<br />

com a LACP o núcleo duro <strong>do</strong> microssistema coletivo.<br />

O Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r teve ao menos <strong>do</strong>is gran<strong>de</strong>s méritos no tocante ao processo coletivo, que merecem um<br />

maior <strong>de</strong>staque e são mais <strong>do</strong> que suficientes para que seja consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> um marco legislativo da tutela coletiva.<br />

Primeiro, o diploma legal passou a prever que qualquer direito difuso ou coletivo po<strong>de</strong>ria ser objeto <strong>de</strong> tutela coletiva,<br />

afastan<strong>do</strong> a i<strong>de</strong>ia restritiva que até então advinha <strong>do</strong> art. 1.º da LACP. O rol legal, portanto, passou a ser meramente<br />

exemplificativo, o que, naturalmente, ampliou consi<strong>de</strong>ravelmente o âmbito <strong>de</strong> proteção coletiva em juízo. Na realida<strong>de</strong>, fez-se pelo<br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, para to<strong>do</strong>s os legitima<strong>do</strong>s ativos, aquilo que <strong>do</strong>is anos antes a Constituição Fe<strong>de</strong>ral já havia feito<br />

para o Ministério Público.<br />

Em segun<strong>do</strong> lugar, e ainda mais importante, foi estendida aos direitos individuais homogêneos a tutela por meio <strong>do</strong> processo<br />

coletivo, com o Capítulo II <strong>do</strong> Título III inteiramente <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> a regulamentar essa tutela. Como a LACP só previa a tutela <strong>de</strong><br />

direito difuso e coletivo, e a LAP só é cabível para a tutela <strong>do</strong> direito difuso à proteção <strong>do</strong> patrimônio público material e imaterial, a<br />

novida<strong>de</strong> <strong>do</strong> CDC realmente po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rada significativa.<br />

Como o presente capítulo tem como precípua missão a análise da tutela coletiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo, serão enfrentadas em<br />

especial as normas constantes da Lei 8.078/1990, e somente supletivamente, naquilo que afetar diretamente o consumi<strong>do</strong>r, as<br />

normas da Lei 7.347/1985.<br />

11.2.<br />

11.2.1.<br />

ESPÉCIES DE DIREITOS PROTEGIDOS PELA TUTELA COLETIVA<br />

Introdução<br />

Conforme afirma<strong>do</strong> no item 11.1, existem fundamentalmente três espécies <strong>de</strong> direitos materiais abrangi<strong>do</strong>s: difusos, coletivos e<br />

individuais homogêneos. As previsões específicas no ECA e no Estatuto <strong>do</strong> I<strong>do</strong>so a respeito da <strong>de</strong>fesa, pelo Ministério Público, <strong>de</strong><br />

direitos individuais indisponíveis por meio <strong>de</strong> ação civil pública não interessam ao estu<strong>do</strong> da tutela coletiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

O art. 81, parágrafo único, da Lei 8.078/1990 conceitua essas três espécies <strong>de</strong> direitos coletivos lato sensu, sen<strong>do</strong> relevante sua<br />

distinção sob a ótica acadêmica e mesmo prática, em especial entre os direitos genuinamente coletivos e aqueles apenas<br />

aci<strong>de</strong>ntalmente coletivos.<br />

11.2.2.<br />

<strong>Direito</strong>s ou interesses?<br />

Há diversas passagens <strong>de</strong> textos legais que, ao se referirem ao objeto <strong>de</strong> tutela <strong>do</strong> processo coletivo, mencionam “direitos” e<br />

“interesses” difusos, coletivos e individuais homogêneos. O art. 81 <strong>do</strong> CDC, responsável pela conceituação <strong>do</strong> que seja difuso,<br />

coletivo e individual homogêneo, faz expressa menção a interesse e direitos; o art. 21 da LACP, ao prever a aplicação subsidiária<br />

<strong>do</strong> CDC, também faz alusão a direitos e interesses; o art. 129, III, da CF prevê como função institucional <strong>do</strong> Ministério Público a<br />

instauração <strong>de</strong> inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção <strong>do</strong> patrimônio público e social, <strong>do</strong> meio ambiente e <strong>de</strong> outros<br />

interesses difusos e coletivos. Nesse mesmo senti<strong>do</strong> o art. 81 <strong>do</strong> Projeto <strong>de</strong> Lei <strong>do</strong> Sena<strong>do</strong> 271/2012.<br />

Há também dispositivos que embaralham os termos, como ocorre no art. 1.º da LACP, que, ao prever o objeto <strong>de</strong> tutela da ação<br />

civil pública, indica, no inciso III, bens e direitos <strong>de</strong> valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e no inciso IV, a<br />

tutela <strong>de</strong> qualquer outro interesse difuso ou coletivo. O mesmo se verifica em <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, que se<br />

referem sem qualquer preocupação a ambos os termos, a cada momento alternan<strong>do</strong>-os como se fossem sinônimos24.<br />

Por fim, o art. 21, parágrafo único, da Lei 12.016/2009 prevê em seus <strong>do</strong>is incisos a tutela <strong>de</strong> direitos coletivos e individuais<br />

homogêneos por meio <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança coletivo, sem qualquer menção ao termo “interesses”.<br />

Afinal, o objeto <strong>de</strong> tutela por meio <strong>do</strong> processo coletivo são os direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, os<br />

interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos ou ambos?<br />

É possível indicar na <strong>do</strong>utrina a existência <strong>de</strong> três correntes sobre o tema: (a) os que enten<strong>de</strong>m tratar-se <strong>de</strong> termos sinônimos 25 ;<br />

(b) os que enten<strong>de</strong>m mais apropriada a a<strong>do</strong>ção <strong>do</strong> termo interesse 26 ; (c) os que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m a utilização <strong>do</strong> termo direito 27 .<br />

Acredito que, para o direito pátrio, a distinção entre direito e interesse não tenha mais a relevância <strong>de</strong> outrora e que até hoje é<br />

mantida em alguns outros países. A necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tutelar a coletivida<strong>de</strong> ou uma comunida<strong>de</strong> surgiu como algo incompreensível<br />

diante da concepção clássica <strong>de</strong> direito subjetivo, dividi<strong>do</strong> entre direitos priva<strong>do</strong> (<strong>de</strong> titularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um indivíduo) e público (<strong>de</strong><br />

titularida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>). Não haven<strong>do</strong> espaço para esses novos titulares (coletivida<strong>de</strong> e comunida<strong>de</strong>), criou-se o termo “interesses”


para <strong>de</strong>signar esse novo fenômeno.<br />

Como bem <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> pela melhor <strong>do</strong>utrina, a exclusão <strong>do</strong> chama<strong>do</strong> “interesse” coletivo e difuso <strong>do</strong> âmbito <strong>do</strong>s direitos só<br />

po<strong>de</strong> ser explicada por uma estreita concepção <strong>de</strong> direito subjetivo, com nítidas marcas <strong>de</strong> um liberalismo individualista, que exigia<br />

a <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> titular como condição para a existência <strong>de</strong> um direito28. E, até mesmo <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ssa visão clássica e ultrapassada,<br />

passou a se admitir uma distinção entre os chama<strong>do</strong>s interesses, que foram <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>s como simples – não tuteláveis<br />

jurisdicionalmente – e legítimos (jurídicos) – tuteláveis da mesma forma que os direitos subjetivos.<br />

Como se po<strong>de</strong> notar, é possível que a distinção pretendida entre direito subjetivo e interesse legítimo tenha alguma importância<br />

em países que mantêm diferentes estruturas jurisdicionais para tutelar cada um <strong>de</strong>les. É o caso, por exemplo, da Itália, país no qual<br />

os direitos subjetivos são postula<strong>do</strong>s perante a Justiça ordinária ou contenciosa civil, enquanto os interesses legítimos são<br />

postula<strong>do</strong>s perante a Justiça administrativa. Não é esse, entretanto, o caso <strong>do</strong> Brasil, que tem uma jurisdição una e indivisível, que<br />

tutelará tanto o interesse legítimo como o direito subjetivo, caso efetivamente existam diferenças entre eles.<br />

Na realida<strong>de</strong>, os valores <strong>de</strong> interesse da coletivida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong>, que um dia foram consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s meros interesses<br />

e <strong>de</strong>pois passaram a ser vistos como interesses legítimos, atualmente <strong>de</strong>vem ser contempla<strong>do</strong>s como direitos subjetivos. Daí a<br />

absoluta <strong>de</strong>snecessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> continuar, tanto no âmbito legislativo como no <strong>do</strong>utrinário e jurispru<strong>de</strong>ncial, a se referir a interesses<br />

quan<strong>do</strong> se tratar <strong>de</strong> tutela coletiva, bastan<strong>do</strong> para a compreensão <strong>do</strong> tema a utilização <strong>do</strong> termo “direito”.<br />

Compreen<strong>de</strong>-se a corrente <strong>do</strong>utrinária que prefere a utilização <strong>do</strong> termo interesse a direito, por consi<strong>de</strong>rar que nesse caso<br />

amplia-se o objeto <strong>de</strong> tutela por meio <strong>do</strong> processo coletivo 29 . Contu<strong>do</strong>, tenho a impressão <strong>de</strong> que essa preocupação, apesar <strong>de</strong><br />

legítima e bem-vinda, não tem qualquer consequência prática, porque não consigo imaginar um “interesse” difuso, coletivo e<br />

individual homogêneo que não possa ser trata<strong>do</strong> como direito subjetivo 30 .<br />

Diante <strong>de</strong> todas as consi<strong>de</strong>rações tecidas a respeito da diferença <strong>de</strong> interesse – em especial, o legítimo – e o direito subjetivo, e<br />

constatada a absoluta irrelevância <strong>de</strong> distinção entre ambos no tocante à tutela jurisdicional no plano coletivo, prefiro me valer<br />

exclusivamente <strong>do</strong> termo direito.<br />

Existem fundamentalmente três espécies <strong>de</strong> direitos materiais tutela<strong>do</strong>s pelo microssistema coletivo: difusos, coletivos e<br />

individuais homogêneos. É preciso também incluir as previsões específicas no Estatuto da Criança e A<strong>do</strong>lescente e no Estatuto <strong>do</strong><br />

I<strong>do</strong>so a respeito da <strong>de</strong>fesa pelo Ministério Público <strong>de</strong> direitos individuais indisponíveis por meio <strong>de</strong> ação coletiva, que também<br />

serão trata<strong>do</strong>s no presente capítulo.<br />

O art. 81, parágrafo único, da Lei 8.078/1990 conceitua essas três espécies <strong>de</strong> direitos coletivos lato sensu, sen<strong>do</strong> relevante sua<br />

distinção sob a ótica acadêmica e mesmo prática, em especial a diferença entre os direitos genuinamente coletivos e aqueles apenas<br />

aci<strong>de</strong>ntalmente coletivos.<br />

11.2.3.<br />

<strong>Direito</strong> difuso<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 81, parágrafo único, I, <strong>do</strong> CDC, os interesses ou direitos difusos são transindividuais, <strong>de</strong> natureza<br />

indivisível, <strong>de</strong> que sejam titulares pessoas in<strong>de</strong>terminadas e ligadas por circunstâncias <strong>de</strong> fato. Como se po<strong>de</strong> notar <strong>do</strong> conceito<br />

legal <strong>de</strong> direito difuso, essa espécie <strong>de</strong> direito é composta por quatro elementos cumulativos.<br />

Afirmar que o direito difuso é transindividual é <strong>de</strong>terminar a espécie <strong>de</strong> direito pelo seu aspecto subjetivo, qual seja, o seu<br />

titular. O direito transindividual, também chama<strong>do</strong> <strong>de</strong> metaindividual ou supraindividual, é aquele que não tem como titular um<br />

indivíduo. Nas corretas lições <strong>de</strong> Teori Albino Zavascki, “é direito que não pertence à administração pública e nem a indivíduos<br />

particularmente <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s. Pertence, sim, a um grupo <strong>de</strong> pessoas, a uma classe, a uma categoria, ou à própria socieda<strong>de</strong>,<br />

consi<strong>de</strong>rada em seu senti<strong>do</strong> amplo”31.<br />

Nota-se que o conceito <strong>de</strong> direito transindividual é residual, aplican<strong>do</strong>-se a to<strong>do</strong> direito material que não seja <strong>de</strong> titularida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

um indivíduo, seja ele pessoa humana ou jurídica, <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong> ou público. No caso específico <strong>do</strong> direito difuso, o titular é a<br />

coletivida<strong>de</strong>, representada por sujeitos in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s e in<strong>de</strong>termináveis. São direitos que não têm por titular um só sujeito nem<br />

mesmo um grupo <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> <strong>de</strong> sujeitos, referin<strong>do</strong>-se a um grupo social, a toda a coletivida<strong>de</strong>, ou mesmo a parcela significativa<br />

<strong>de</strong>la.<br />

O segun<strong>do</strong> elemento é a natureza indivisível, volta<strong>do</strong> para a incindibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> direito, ou seja, o direito difuso é um direito que<br />

não po<strong>de</strong> ser fraciona<strong>do</strong> entre os membros que compõem a coletivida<strong>de</strong>. Dessa forma, haven<strong>do</strong> uma violação ao direito difuso,<br />

to<strong>do</strong>s suportarão por igual tal violação, o mesmo ocorren<strong>do</strong> com a tutela jurisdicional, que, uma vez obtida, aproveitará a to<strong>do</strong>s,<br />

indistintamente.<br />

Nesse senti<strong>do</strong> a melhor <strong>do</strong>utrina:<br />

“1.º) os interesses e direitos difusos são aqueles que dizem respeito aos bens indivisíveis; 2.º) os bens indivisíveis, a seu turno, são


aqueles em que não é viável uma forma diferenciada <strong>de</strong> gozo ou utilização; 3.º) nisto está implica<strong>do</strong> que o tipo <strong>de</strong> interesse <strong>do</strong>s<br />

membros <strong>de</strong> uma dada coletivida<strong>de</strong> são, quantitativa e qualitativamente, iguais; 4.º) a<strong>de</strong>mais, por isso mesmo, esses bens não são<br />

suscetíveis <strong>de</strong> apropriação exclusiva; 5.º) daí é que não se po<strong>de</strong> cogitar <strong>de</strong> atribuir-se a alguém, mais <strong>do</strong> que a outro(s) uma<br />

titularida<strong>de</strong> própria ou mais envergada, <strong>do</strong> que as <strong>do</strong>s <strong>de</strong>mais inseri<strong>do</strong>s no mesmo contexto”32.<br />

Ao prever o terceiro elemento que compõe o direito difuso, o art. 81, parágrafo único, I, <strong>do</strong> CDC, comete um equívoco ao<br />

afirmar que a titularida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse direito é <strong>de</strong> pessoas in<strong>de</strong>terminadas. Na realida<strong>de</strong>, os titulares não são sujeitos in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s, mas<br />

sim a coletivida<strong>de</strong>. Essa coletivida<strong>de</strong>, naturalmente, é formada por pessoas humanas, mas o direito difuso não as consi<strong>de</strong>ra como<br />

indivíduos, mas tão somente como sujeitos que compõem a coletivida<strong>de</strong>, como integrantes <strong>de</strong>sta 33 .<br />

Com essas consi<strong>de</strong>rações <strong>de</strong>ve ser interpreta<strong>do</strong> o dispositivo legal ora menciona<strong>do</strong>, e, nesses termos, compreen<strong>de</strong>-se que o<br />

titular <strong>do</strong> direito difuso é a coletivida<strong>de</strong>, por sua vez composta por sujeitos in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s e in<strong>de</strong>termináveis, ou seja, sujeitos que<br />

não são e nem po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s individualmente. Na realida<strong>de</strong>, como lembra a melhor <strong>do</strong>utrina, admite-se uma<br />

in<strong>de</strong>terminabilida<strong>de</strong> relativa; mesmo que seja possível a <strong>de</strong>terminação, sen<strong>do</strong> a mesma extremamente difícil e trabalhosa, o direito<br />

continua a ser difuso. Como lembra José Carlos Barbosa Moreira, “o conjunto <strong>do</strong>s interessa<strong>do</strong>s apresenta contornos flui<strong>do</strong>s,<br />

móveis, esbati<strong>do</strong>s, a tornar impossível, ou quan<strong>do</strong> muito superlativamente difícil, a individualização exata <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os<br />

componentes” 34 .<br />

Por fim, o último elemento aponta<strong>do</strong> pelo dispositivo legal ora analisa<strong>do</strong> na conceituação <strong>do</strong> direito difuso é a circunstância <strong>de</strong><br />

estarem to<strong>do</strong>s os sujeitos que compõe a coletivida<strong>de</strong> liga<strong>do</strong>s por uma situação <strong>de</strong> fato, sen<strong>do</strong> dispensável que entre eles exista<br />

qualquer relação jurídica. Rizzatto Nunes afirma que, “em matéria <strong>de</strong> direito difuso, inexiste uma relação jurídica base. São as<br />

circunstâncias <strong>de</strong> fato que estabelecem a ligação. Entenda-se bem: são os fatos, objetivamente consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s, o elo <strong>de</strong> ligação entre<br />

todas as pessoas difusamente consi<strong>de</strong>radas e o obriga<strong>do</strong>”35.<br />

Exemplo classicamente da<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito difuso aplicável ao direito consumerista é o da propaganda enganosa 36 . Por meio <strong>de</strong><br />

anúncio que induz o consumi<strong>do</strong>r a erro, um fornece<strong>do</strong>r tenda ven<strong>de</strong>r produto ou serviço que jamais será apto a aten<strong>de</strong>r as<br />

expectativas <strong>de</strong>ixadas pela propaganda. O simples fato <strong>de</strong> ser veiculada uma campanha publicitária enganosa é o suficiente para<br />

que to<strong>do</strong>s os consumi<strong>do</strong>res, potencialmente expostos a tal campanha, passem a compor a coletivida<strong>de</strong> consumerista afrontada pela<br />

violação cometida pelo fornece<strong>do</strong>r.<br />

Outro interessante exemplo é o da colocação no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> produtos com alto grau <strong>de</strong> nocivida<strong>de</strong> ou periculosida<strong>de</strong> à saú<strong>de</strong><br />

ou segurança <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res 37 . Novamente, será uma circunstância <strong>de</strong> fato que reunirá os consumi<strong>do</strong>res numa coletivida<strong>de</strong><br />

afrontada pela conduta <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r.<br />

11.2.4. <strong>Direito</strong> coletivo<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 81, parágrafo único, II, <strong>do</strong> CDC, os interesses ou direitos coletivos são direitos transindividuais, <strong>de</strong> natureza<br />

indivisível, <strong>de</strong> que seja titular grupo, categoria ou classe <strong>de</strong> pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação<br />

jurídica base. Como se po<strong>de</strong> notar <strong>do</strong> conceito legal <strong>de</strong> direito coletivo, essa espécie <strong>de</strong> direito é composta por quatro elementos<br />

cumulativos.<br />

Exatamente como ocorre no direito difuso, o direito coletivo é transindividual (metaindividual ou supraindividual) porque seu<br />

titular não é um indivíduo. Por terem a natureza transindividual como característica comum, o direito difuso e o direito coletivo são<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s direitos essencialmente coletivos38. Há, entretanto, uma diferença. Enquanto no direito difuso o titular <strong>do</strong> direito é a<br />

coletivida<strong>de</strong>, no direito coletivo é uma comunida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>terminada por um grupo, classe ou categoria <strong>de</strong> pessoas.<br />

A natureza indivisível também é elemento <strong>do</strong> direito coletivo, exatamente da mesma forma como ocorre no direito difuso.<br />

Nesse aspecto as duas espécies <strong>de</strong> direito transindividual são idênticas, comungan<strong>do</strong> a característica <strong>de</strong> serem direitos que não<br />

po<strong>de</strong>m ser dividi<strong>do</strong>s e usufruí<strong>do</strong>s particularmente pelos sujeitos que compõem a coletivida<strong>de</strong> ou comunida<strong>de</strong>. Como ocorre no<br />

direito difuso, também no direito coletivo to<strong>do</strong>s os sujeitos que compõem o titular <strong>do</strong> direito – grupo, classe ou categoria <strong>de</strong><br />

pessoas – suportam uniformemente to<strong>do</strong>s os efeitos que atinjam o direito material.<br />

No terceiro elemento <strong>do</strong> direito coletivo, o art. 81, parágrafo único, II, <strong>do</strong> CDC foi extremamente feliz em apontar como titular<br />

<strong>do</strong> direito um grupo, classe ou categoria <strong>de</strong> pessoas, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> claro que não são os sujeitos individualmente consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s os<br />

titulares <strong>do</strong> direito, mas sim o grupo, classe ou categoria da qual façam parte. Essa limitação <strong>do</strong> direito coletivo a sujeitos que<br />

componham uma <strong>de</strong>terminada comunida<strong>de</strong> leva a <strong>do</strong>utrina a corretamente afirmar que esses sujeitos são in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s, mas<br />

<strong>de</strong>termináveis:<br />

“Esses interesses são também inerentes a pessoas in<strong>de</strong>terminadas a princípio, mas <strong>de</strong>termináveis, pois o vínculo entre elas é mais<br />

sóli<strong>do</strong>, <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> uma relação jurídica comum” 39 .


O último elemento indispensável ao direito coletivo é a existência <strong>de</strong> uma relação jurídica base. Conforme bem ensina<strong>do</strong> pela<br />

<strong>do</strong>utrina, “essa relação jurídica base é a preexistente à lesão, ou ameaça <strong>de</strong> lesão <strong>do</strong> interesse ou direito <strong>do</strong> grupo, categoria ou<br />

classe <strong>de</strong> pessoas. Não a relação jurídica nascida da própria lesão ou ameaça <strong>de</strong> lesão” 40 . Significa que o direito coletivo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> uma relação jurídica que reúna os sujeitos em um grupo, classe ou categoria antes <strong>de</strong> qualquer violação ou ameaça <strong>de</strong> violação a<br />

um direito indivisível <strong>de</strong>ssa comunida<strong>de</strong>.<br />

A forma mais simples <strong>de</strong> se visualizar a diferença entre essas duas relações jurídicas <strong>de</strong> direito material é imaginan<strong>do</strong> que,<br />

solucionada a crise jurídica envolven<strong>do</strong> o grupo, classe ou categoria <strong>de</strong> pessoas, essa unida<strong>de</strong> entre elas continuará a existir, porque<br />

a relação jurídica base existente entre elas não se confun<strong>de</strong> com aquela relação jurídica resolvida em juízo. Consumi<strong>do</strong>res que<br />

tenham adquiri<strong>do</strong> um mesmo carro e tenham direito a um recall não realiza<strong>do</strong> pela monta<strong>do</strong>ra estarão reuni<strong>do</strong>s numa relação<br />

jurídica base, que preexiste e sobreviverá à solução da relação jurídica conflituosa gerada pelo problema <strong>de</strong>riva<strong>do</strong> da produção <strong>do</strong><br />

veículo e à resistência da monta<strong>do</strong>ra em resolvê-lo espontaneamente.<br />

A relação jurídica base da qual <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> a existência <strong>do</strong> direito coletivo po<strong>de</strong> se dar <strong>de</strong> duas formas distintas: entre os próprios<br />

sujeitos que compõem o grupo, classe ou categoria, ou <strong>de</strong>sses sujeitos com um sujeito comum que viole ou ameace <strong>de</strong> violação o<br />

direito da comunida<strong>de</strong>. Nas palavras da melhor <strong>do</strong>utrina, “cabe salientar que essa relação jurídica base po<strong>de</strong> dar-se entre os<br />

membros <strong>do</strong> grupo affectio societatis ou pela sua ligação com a ‘parte contrária’. No primeiro caso temos os advoga<strong>do</strong>s inscritos na<br />

Or<strong>de</strong>m <strong>do</strong>s Advoga<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Brasil (ou qualquer associação <strong>de</strong> profissionais); no segun<strong>do</strong>, os contribuintes <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> imposto.<br />

Os primeiros liga<strong>do</strong>s ao órgão <strong>de</strong> classe, configuran<strong>do</strong>-se como ‘classe <strong>de</strong> pessoas’ (advoga<strong>do</strong>s); os segun<strong>do</strong>s liga<strong>do</strong>s ao ente<br />

estatal responsável pela tributação, configuran<strong>do</strong>-se como ‘grupo <strong>de</strong> pessoas’ (contribuintes)”41.<br />

É natural imaginar ser o direito coletivo mais coeso que o direito difuso, porque existe uma relação jurídica base que torna<br />

<strong>de</strong>termináveis os sujeitos beneficia<strong>do</strong>s por sua tutela. A coesão <strong>de</strong>sse direito, entretanto, não significa uma necessária organização,<br />

como bem <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> por Kazuo Watanabe:<br />

“Tampouco foi consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> traço <strong>de</strong>cisivo <strong>do</strong>s interesses ou direitos coletivos o fato <strong>de</strong> sua organização, que certamente existirá<br />

apenas na primeira modalida<strong>de</strong> mencionada no texto legal, qual seja, os interesses e direitos pertencentes a grupo, categoria ou<br />

classe <strong>de</strong> pessoas ligadas entre si por uma relação jurídica base, e não na segunda modalida<strong>de</strong>, que diz com os interesses ou direitos<br />

respeitantes a grupo, categoria ou classe <strong>de</strong> pessoas ligadas com a parte contrária por uma relação jurídica base. Mesmo sem<br />

organização, os interesses ou direitos coletivos, pelo fato <strong>de</strong> serem <strong>de</strong> natureza indivisível, apresentam i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> tal que,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> sua harmonização formal ou amalgamação pela reunião <strong>de</strong> seus titulares em torno <strong>de</strong> uma entida<strong>de</strong><br />

representativa, passam a formar uma só unida<strong>de</strong>, tornan<strong>do</strong>-se perfeitamente viável, e mesmo <strong>de</strong>sejável, a sua proteção jurisdicional<br />

em forma molecular”42.<br />

São varia<strong>do</strong>s os exemplos <strong>de</strong> direito coletivo consumerista. Quan<strong>do</strong> se analisa a relação jurídica base <strong>de</strong>rivada <strong>de</strong> uma<br />

vinculação entre os membros <strong>do</strong> grupo, classe ou categoria, po<strong>de</strong> se imaginar os associa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> uma associação <strong>de</strong> proteção aos<br />

direitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Analisada a relação jurídica base com relação “à parte contrária”, um bom exemplo é o grupo <strong>de</strong> alunos <strong>de</strong><br />

uma escola quan<strong>do</strong> discutem a reformulação da gra<strong>de</strong> curricular.<br />

11.2.5. <strong>Direito</strong>s individuais homogêneos<br />

O art. 81, parágrafo único, III, <strong>do</strong> CDC, foi bastante sucinto no conceito <strong>de</strong> direitos individuais homogêneos, preven<strong>do</strong> apenas<br />

como exigência que <strong>de</strong>corram <strong>de</strong> uma origem comum. A singeleza <strong>do</strong> dispositivo, entretanto, limita-se ao aspecto literal, haven<strong>do</strong><br />

sérias divergências a respeito <strong>de</strong> seu conteú<strong>do</strong>.<br />

Diante <strong>do</strong> conceito legal, é imprescindível que se <strong>de</strong>termine o alcance da expressão “origem comum”. Para Kazuo Watanabe,<br />

“a origem comum po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong> fato ou <strong>de</strong> direito, e a expressão não significa, necessariamente, uma unida<strong>de</strong> factual e temporal. As<br />

vítimas <strong>de</strong> uma publicida<strong>de</strong> enganosa veiculada por vários órgãos <strong>de</strong> imprensa e em repeti<strong>do</strong>s dias <strong>de</strong> um produto nocivo à saú<strong>de</strong><br />

adquiri<strong>do</strong> por vários consumi<strong>do</strong>res num largo espaço <strong>de</strong> tempo e em várias regiões têm, como causa <strong>de</strong> seus danos, fatos <strong>de</strong> uma<br />

homogeneida<strong>de</strong> tal que os tornam a ‘origem comum’ <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s eles.”43<br />

Pensan<strong>do</strong> em termos processuais, a origem comum <strong>de</strong>corre <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is elementos que compõe a causa <strong>de</strong> pedir: fato e<br />

fundamento jurídico. Haven<strong>do</strong> um dano a grupo <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res em razão <strong>de</strong> um mesmo fato, ou ainda <strong>de</strong> fatos assemelha<strong>do</strong>s,<br />

po<strong>de</strong>-se afirmar que os direitos individuais <strong>de</strong> cada um <strong>de</strong>les ao ressarcimento por seus danos são <strong>de</strong> origem comum. Da mesma<br />

forma, sen<strong>do</strong> possível que, mesmo diante <strong>de</strong> fatos distintos, um grupo <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res possa postular por um direito com base<br />

num mesmo fundamento jurídico, também se po<strong>de</strong>rá afirmar que seus direitos individuais <strong>de</strong>correm <strong>de</strong> uma origem comum.<br />

Essa origem comum, entretanto, parece não ser o suficiente para que se tenha um direito individual homogêneo. Apesar <strong>de</strong> ser<br />

o único requisito previsto pelo dispositivo legal ora analisa<strong>do</strong>, para que a reunião <strong>de</strong> direitos individuais resulte em um direito<br />

individual homogêneo é necessário que exista entre eles uma homogeneida<strong>de</strong>, não sen<strong>do</strong> suficiente apenas a origem comum. A


homogeneida<strong>de</strong>, portanto, seria o segun<strong>do</strong> elemento <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> direito.<br />

Com amparo <strong>de</strong> realida<strong>de</strong> já existente nas class actions <strong>do</strong> direito norte-americano (regra 23 das Fe<strong>de</strong>ral Rules <strong>de</strong> 1966),<br />

corrente <strong>do</strong>utrinária enten<strong>de</strong> que a homogeneida<strong>de</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá da prevalência da dimensão objetiva sobre a individual. Significa<br />

que, haven<strong>do</strong> tal prevalência, os direitos, além <strong>de</strong> terem origem comum, serão homogêneos e po<strong>de</strong>rão ser tutela<strong>do</strong>s pelo<br />

microssistema coletivo. Por outro la<strong>do</strong>, se, apesar <strong>de</strong> terem uma origem comum, a dimensão individual se sobrepor à coletiva, os<br />

direitos serão heterogêneos e não po<strong>de</strong>rão ser trata<strong>do</strong>s à luz da tutela coletiva.<br />

Nas ações cujo objeto seja o direito individual homogêneo, busca-se uma sentença con<strong>de</strong>natória genérica, que possa aproveitar<br />

a to<strong>do</strong>s os titulares <strong>do</strong> direito, sen<strong>do</strong> que caberá a cada um <strong>de</strong>les ingressar com uma liquidação <strong>de</strong> sentença individual para se<br />

comprovar o nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> e o dano individualmente suporta<strong>do</strong> pelo liquidante. Para Ada Pellegrini Grinover, a prevalência<br />

das questões coletivas sobre as individuais se mostrará sempre que não houver maior dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> o indivíduo provar o nexo <strong>de</strong><br />

causalida<strong>de</strong> e quantificar seu dano:<br />

“Ora, a prova <strong>do</strong> nexo causal po<strong>de</strong> ser tão complexa, no caso concreto, a ponto <strong>de</strong> tornar praticamente ineficaz a sentença<br />

con<strong>de</strong>natória genérica <strong>do</strong> art. 95, a qual só reconhece a existência <strong>de</strong> dano geral. Nesse caso, a vítima ou seus sucessores <strong>de</strong>verão<br />

enfrentar um processo <strong>de</strong> liquidação tão complica<strong>do</strong> quanto uma ação con<strong>de</strong>natória individual, até porque ao réu <strong>de</strong>vem ser<br />

asseguradas as garantias <strong>do</strong> <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> processo legal, e notadamente o contraditório e a ampla <strong>de</strong>fesa. E a via da ação coletiva po<strong>de</strong>rá<br />

ter si<strong>do</strong> ina<strong>de</strong>quada para a obtenção da tutela pretendida”44.<br />

Conforme lição da jurista paulista, quan<strong>do</strong> não for possível <strong>de</strong> forma simples a <strong>de</strong>terminação <strong>do</strong> nexo causal <strong>do</strong> direito<br />

individual e daquele que seria reconheci<strong>do</strong> na sentença coletiva, não haverá interesse <strong>de</strong> agir para a ação coletiva, da<strong>do</strong> que tal ação<br />

não será útil e nem a<strong>de</strong>quada para resolver a crise jurídica enfrentada pelos indivíduos. Por outro la<strong>do</strong>, a sentença não será eficaz,<br />

porque <strong>de</strong> pouco proveito será aos titulares <strong>do</strong>s direitos individuais, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que a liquidação da sentença nesse caso em tu<strong>do</strong><br />

se assemelhará a um verda<strong>de</strong>iro processo <strong>de</strong> conhecimento con<strong>de</strong>natório individual45.<br />

Aparentemente foi essa a tônica da proposta <strong>de</strong> novo conceito legal da espécie <strong>de</strong> direito ora analisa<strong>do</strong>. Segun<strong>do</strong> o art. 81, III,<br />

<strong>do</strong> Projeto <strong>de</strong> Lei <strong>do</strong> Sena<strong>do</strong> 271/2012, os interesses ou direitos individuais homogêneos são aqueles <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> origem<br />

comum, <strong>de</strong> fato ou <strong>de</strong> direito, que recomen<strong>de</strong>m tratamento conjunto pela utilida<strong>de</strong> coletiva da tutela.<br />

Há também outra forma <strong>de</strong> se analisar a prevalência da dimensão coletiva sobre a individual em seu aspecto objetivo: os<br />

fundamentos <strong>de</strong>vem aproveitar a to<strong>do</strong>s os titulares <strong>do</strong> direito, sen<strong>do</strong> inviável a formulação <strong>de</strong> pretensão com fundamentos que se<br />

aplicam somente a um ou mesmo alguns <strong>do</strong>s indivíduos. Essa prevalência da dimensão coletiva sobre a individual po<strong>de</strong> ser mais<br />

bem visualizada por meio <strong>de</strong> um exemplo.<br />

Coopera<strong>do</strong>s <strong>de</strong> um mesmo Con<strong>do</strong>mínio Resi<strong>de</strong>ncial se sentem prejudica<strong>do</strong>s em razão <strong>de</strong> uma cláusula <strong>de</strong> pagamento residual<br />

presente em to<strong>do</strong>s os contratos, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> sua natureza <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. Os fundamentos a serem utiliza<strong>do</strong>s por to<strong>do</strong>s serão os<br />

mesmos para evitar a cobrança abusiva, e por isso o direito ao não pagamento caracteriza-se como individual homogêneo e po<strong>de</strong><br />

ser tutela<strong>do</strong> por meio <strong>de</strong> ação coletiva.<br />

Contu<strong>do</strong>, é possível que a maioria das casas tenha si<strong>do</strong> entregue com algum tipo <strong>de</strong> problema diferente: pare<strong>de</strong> torta,<br />

encanamento mal coloca<strong>do</strong>, pintura mal feita, chão com ondulações, janelas que não abrem etc. Nesse caso, apesar <strong>de</strong> uma origem<br />

comum, que é a péssima prestação <strong>do</strong> serviço, os fundamentos individuais somente aproveitarão os proprietários <strong>de</strong> cada um <strong>do</strong>s<br />

imóveis, o que impe<strong>de</strong> a utilização <strong>de</strong> uma ação coletiva para sua tutela.<br />

Um tradicional exemplo da<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>utrina a respeito <strong>de</strong> direitos individuais homogêneos no campo consumerista diz respeito<br />

à aquisição, por diversos consumi<strong>do</strong>res, <strong>de</strong> veículo <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada marca, ano e série com <strong>de</strong>feitos <strong>de</strong> fabricação46. Nesse<br />

exemplo é facilmente i<strong>de</strong>ntificada a prevalência da dimensão coletiva sobre a individual, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que a tese <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito <strong>de</strong><br />

fabricação aproveita a to<strong>do</strong>s os adquirentes, e para eles será fácil e simples provar o nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>, bastan<strong>do</strong> provar o título<br />

<strong>de</strong> proprietários <strong>do</strong>s veículos.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, se <strong>de</strong>feitos pontuais passarem a prejudicar individualmente cada um <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res (para um a porta não<br />

fecha direito, para outro vaza gasolina, para outro o cheiro <strong>do</strong> ar condiciona<strong>do</strong> lembra urina, e assim por diante), será impossível<br />

uma tutela coletiva que os atenda, porque nesses casos haverá uma nítida prevalência da dimensão individual sobre a coletiva,<br />

sen<strong>do</strong> claro que, no exemplo da<strong>do</strong>, não haverá uma tese geral a beneficiar to<strong>do</strong>s os consumi<strong>do</strong>res. Os problemas po<strong>de</strong>m até ter uma<br />

origem comum, to<strong>do</strong>s advin<strong>do</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>feitos <strong>de</strong> utilização <strong>do</strong>s veículos, mas não terão a homogeneida<strong>de</strong> suficiente para serem<br />

tutela<strong>do</strong>s pelo microssistema coletivo.<br />

A preocupação <strong>de</strong>monstrada pela <strong>do</strong>utrina ao exigir algo mais além da mera origem comum para caracterizar o direito<br />

individual homogêneo se presta essencial para diferenciar essa espécie <strong>de</strong> direito <strong>de</strong> um mero litisconsórcio disfarça<strong>do</strong>. Segun<strong>do</strong><br />

parcela da <strong>do</strong>utrina, “uma ação coletiva para a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> direitos individuais homogêneos não significa a simples soma das ações<br />

individuais. Às avessas, caracteriza-se a ação coletiva por interesses individuais homogêneos exatamente porque a pretensão <strong>do</strong>


legitima<strong>do</strong> concentra-se no acolhimento <strong>de</strong> uma tese jurídica geral, referente a <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s fatos, que po<strong>de</strong> aproveitar a muitas<br />

pessoas. O que é completamente diferente <strong>de</strong> apresentarem-se inúmeras pretensões singularizadas, especificamente verificadas em<br />

relação a cada um <strong>do</strong>s respectivos titulares <strong>do</strong> direito” 47 .<br />

O argumento é comum e impressiona, mas enten<strong>do</strong> que não tenha como prosperar. A origem comum está presente, numa<br />

maior ou menor intensida<strong>de</strong>, nas hipóteses <strong>de</strong> cabimento <strong>do</strong> litisconsórcio, salvo na hipótese prevista no art. 113, I, <strong>do</strong> Novo CPC,<br />

que trata <strong>de</strong> um mesmo direito ou obrigação com pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> titulares. Nesse senti<strong>do</strong> as corretas lições <strong>de</strong> Teori Albino<br />

Zavascki:<br />

“Os direitos individuais homogêneos são, em verda<strong>de</strong>, aqueles mesmos direitos comuns ou afins <strong>de</strong> que trata o art. 46 <strong>do</strong> CPC<br />

(nomeadamente em seus incisos II e IV), cuja coletivização tem um senti<strong>do</strong> meramente instrumental, como estratégia para permitir<br />

sua mais efetiva tutela em juízo”48.<br />

Justamente em razão <strong>de</strong>sta circunstância, tenho dificulda<strong>de</strong> em aceitar o tratamento coletivo <strong>de</strong> qualquer soma <strong>de</strong> direitos<br />

individuais, ainda que <strong>de</strong> origem comum e homogêneos. Penso que, para se justificar a tutela coletiva, <strong>de</strong>ve a violação <strong>do</strong> direito ter<br />

repercussão significativa, atingin<strong>do</strong> um número razoável <strong>de</strong> indivíduos, sob pena <strong>de</strong> se tutelar coletivamente direitos individuais<br />

que não tenham gran<strong>de</strong> repercussão subjetiva 49 .<br />

Para justificar o que se alega, basta imaginar <strong>do</strong>is consumi<strong>do</strong>res que, ao dividirem uma mesma garrafa <strong>de</strong> cerveja, tiveram<br />

sérias complicações médicas em razão <strong>de</strong> <strong>de</strong>feito <strong>do</strong> produto (líqui<strong>do</strong> apodreci<strong>do</strong>). A origem <strong>do</strong>s direitos ao ressarcimento <strong>do</strong>s<br />

danos é naturalmente comum, bem como não há como se negar a homogeneida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s direitos, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a simples prova <strong>do</strong><br />

nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> entre os direitos individuais e a eventual sentença con<strong>de</strong>natória genérica. Mas seria legítimo que uma<br />

associação <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res ingressasse com uma ação civil pública requeren<strong>do</strong> a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r da cerveja<br />

pelos danos suporta<strong>do</strong>s pelos <strong>do</strong>is consumi<strong>do</strong>res lesa<strong>do</strong>s? Teria si<strong>do</strong> esse o objetivo <strong>de</strong> se tutelar coletivamente os direitos<br />

individuais homogêneos?<br />

É preciso concordar que no texto legal não existe qualquer espécie <strong>de</strong> exigência expressa para um número mínimo <strong>de</strong> lesa<strong>do</strong>s,<br />

o que tem leva<strong>do</strong>, inclusive, parcela da <strong>do</strong>utrina a enten<strong>de</strong>r que essa circunstância é irrelevante 50 . Enten<strong>do</strong>, entretanto, que <strong>de</strong>ve<br />

existir um número razoável <strong>de</strong> lesa<strong>do</strong>s a permitir a aplicação <strong>do</strong> microssistema coletivo, única forma <strong>de</strong> compatibilizar o direito<br />

individual homogêneo e a tutela coletiva. No exemplo da cerveja, caso o problema tivesse afeta<strong>do</strong> um número maior <strong>de</strong><br />

consumi<strong>do</strong>res, em razão <strong>de</strong> diversas garrafas com <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> produção, seria a<strong>de</strong>quada a tutela coletiva, mas para somente <strong>do</strong>is<br />

consumi<strong>do</strong>res – ou poucos –, enten<strong>do</strong> como único caminho viável a tutela individual.<br />

No senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> se exigir número razoável <strong>de</strong> lesa<strong>do</strong>s, interessante lição <strong>de</strong> Marcelo Abelha, a partir <strong>de</strong> dispositivos legais <strong>do</strong><br />

próprio CDC:<br />

“Depreen<strong>de</strong>-se a exigência da relevância social para a sua tutela, pelo sistema processual coletivo, pela simples leitura <strong>do</strong>s<br />

dispositivos que cuidam mais diretamente <strong>de</strong>sta modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interesse. Assim, o art. 94 fala em publicação <strong>de</strong> edital para<br />

conhecimento <strong>do</strong>s interessa<strong>do</strong>s (e bem se sabe que as regras que justificam um edital resi<strong>de</strong>m no fato <strong>de</strong> ser <strong>de</strong>sconheci<strong>do</strong> ou incerto<br />

o réu ou interessa<strong>do</strong>). Mas não é só, já que também o art. 95 prevê que a sua sentença seja con<strong>de</strong>natória genérica, admitin<strong>do</strong> que o<br />

pedi<strong>do</strong>, portanto, seja também genérico (não i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong> o titular nem apura<strong>do</strong> ainda o prejuízo <strong>de</strong>ste mesmo titular). Já o art. 100,<br />

parágrafo único, dá ensanchas à compreensão <strong>de</strong> que o interesse que justifica ser trata<strong>do</strong> como individual homogêneo é justamente<br />

aquele que, pela relevância e extensão, não há como se <strong>de</strong>terminar seus titulares individuais e nem mesmo os prejuízos sofri<strong>do</strong>s por<br />

cada um, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> essas tarefas para a ação liquidatória”51.<br />

O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça tem <strong>de</strong>cisões nesse senti<strong>do</strong>, exigin<strong>do</strong> para a configuração <strong>de</strong> direito individual homogêneo, e<br />

consequente utilização da ação coletiva, um número consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong> indivíduos tutela<strong>do</strong>s 52 .<br />

Cumpre finalmente uma consi<strong>de</strong>ração. Diferentemente <strong>do</strong>s direitos difusos e coletivos, o direito individual homogêneo não é<br />

um direito transindividual, já que seu titular não é a coletivida<strong>de</strong> nem uma comunida<strong>de</strong>, mas sim os indivíduos. Teori Albino<br />

Zavascki corretamente afirma que “os direitos individuais homogêneos são, simplesmente, direitos subjetivos individuais. A<br />

qualificação <strong>de</strong> homogêneos não altera nem po<strong>de</strong> <strong>de</strong>svirtuar essa sua natureza. É qualificativo utiliza<strong>do</strong> para i<strong>de</strong>ntificar um<br />

conjunto <strong>de</strong> direitos subjetivos individuais liga<strong>do</strong>s entre si por uma relação <strong>de</strong> afinida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> semelhança, <strong>de</strong> homogeneida<strong>de</strong>, o que<br />

permite a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s eles” 53 .<br />

Justamente por não ser transindividual, o objeto <strong>do</strong> direito individual homogêneo não é indivisível, como ocorre no direito<br />

difuso e coletivo, sen<strong>do</strong> divisível e <strong>de</strong>componível entre cada um <strong>do</strong>s indivíduos. Como não existe a incindibilida<strong>de</strong> natural <strong>do</strong>s<br />

direitos transindividuais, o direito individual homogêneo é apenas a soma <strong>de</strong> direitos individuais, que, funda<strong>do</strong>s numa tese geral,<br />

po<strong>de</strong>m ser trata<strong>do</strong>s conjuntamente como se fossem um só em um processo coletivo.<br />

A <strong>do</strong>utrina majoritariamente enten<strong>de</strong> pela natureza individual <strong>do</strong> direito individual homogênea54, dadas a sua titularida<strong>de</strong> e


divisibilida<strong>de</strong>, haven<strong>do</strong>, inclusive, expressões consagradas na <strong>do</strong>utrina que <strong>de</strong>monstram <strong>de</strong> forma clara essa característica <strong>do</strong>s<br />

direitos individuais homogêneos e a consequente diferença <strong>de</strong>stes com os direitos difusos e coletivos (transindividuais).<br />

José Carlos Barbosa Moreira consagrou a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que os direitos difusos e coletivos são direitos essencialmente coletivos,<br />

enquanto os direitos individuais homogêneos são apenas aci<strong>de</strong>ntalmente coletivos 55 . Teori Albino Zavascki fala em <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong><br />

direitos coletivos para se referir aos direitos difusos e coletivos, e em <strong>de</strong>fesa coletiva <strong>de</strong> direitos para se referir a direitos individuais<br />

homogêneos 56 . As tentativas <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r uma natureza transindividual <strong>do</strong>s direitos individuais homogêneos são raras 57 e<br />

praticamente sem repercussão, não impressionan<strong>do</strong>, por vezes, a menção a tal circunstância em corpo <strong>de</strong> julga<strong>do</strong>s<br />

consi<strong>de</strong>ravelmente <strong>de</strong>spreocupa<strong>do</strong>s com a melhor técnica.<br />

11.2.6. I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s e diferenças entre os direitos coletivos lato sensu<br />

Na <strong>do</strong>utrina é tranquilo o entendimento <strong>de</strong> que nem sempre será fácil ao opera<strong>do</strong>r <strong>do</strong> direito distinguir as diferentes espécies <strong>de</strong><br />

direito coletivo existentes em nosso microssistema processual coletivo. A constatação é corroborada por i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> alguns<br />

elementos comuns a mais <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>ssas espécies <strong>de</strong> direito.<br />

Tanto o direito difuso como o coletivo são transindividuais, já que nenhum <strong>de</strong>les pertence a um indivíduo. Apesar <strong>de</strong> serem<br />

diferentes os titulares <strong>de</strong>sses direitos – a coletivida<strong>de</strong>, no primeiro caso, e uma comunida<strong>de</strong> no segun<strong>do</strong> –, a transindividualida<strong>de</strong> é<br />

característica comum a ambos. Também a indivisibilida<strong>de</strong> é característica presente tanto no direito difuso como no direito coletivo,<br />

não sen<strong>do</strong> possível a fruição <strong>de</strong>sse direito apenas por alguns membros da coletivida<strong>de</strong> ou da comunida<strong>de</strong> e não pelos <strong>de</strong>mais.<br />

As i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s entre o direito difuso e o coletivo, entretanto, se limitam à transindividualida<strong>de</strong> e à indivisibilida<strong>de</strong>, porque<br />

entre ambos há ao menos duas importantes diferenças.<br />

Conforme já analisa<strong>do</strong>, enquanto no direito difuso não existe uma relação jurídica que vincule os indivíduos que compõem a<br />

coletivida<strong>de</strong>, no direito coletivo há, entre os membros da coletivida<strong>de</strong>, uma relação jurídica base, que os vincula entre si ou com a<br />

parte contrária. Portanto, no direito difuso a condição <strong>de</strong> membro da coletivida<strong>de</strong> <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> uma situação <strong>de</strong> fato, enquanto no<br />

direito coletivo existe uma relação jurídica que vincula os indivíduos que compõem a classe, grupo ou categoria <strong>de</strong> pessoas.<br />

Enquanto no direito difuso há uma in<strong>de</strong>terminabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s sujeitos que compõem a coletivida<strong>de</strong> (note-se, não há, como<br />

in<strong>de</strong>vidamente sugere o art. 81, parágrafo único, incisos I e II, <strong>do</strong> CDC, uma in<strong>de</strong>terminabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> titulares, porque o titular é<br />

sempre <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>: a coletivida<strong>de</strong>), ainda que relativa, conforme já analisa<strong>do</strong>, no direito coletivo, os membros que compõem a<br />

comunida<strong>de</strong> são in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s, mas <strong>de</strong>termináveis (novamente o titular <strong>do</strong> direito é <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> – o grupo, classe ou categoria <strong>de</strong><br />

pessoas –, sen<strong>do</strong> in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s, mas <strong>de</strong>termináveis, somente os sujeitos que compõem essa comunida<strong>de</strong>).<br />

A questão mais importante que <strong>de</strong>ve ser respondida, entretanto, diz respeito à utilida<strong>de</strong> prática <strong>de</strong>ssa distinção entre o direito<br />

difuso e coletivo. Para parcela da <strong>do</strong>utrina, a questão se resolve no plano puramente acadêmico, sem gran<strong>de</strong>s consequências<br />

práticas. Nesse senti<strong>do</strong> as lições <strong>de</strong> Teori Albino Zavascki:<br />

“Nem sempre são perceptíveis com clareza as diferenças entre os direitos difusos e os direitos coletivos, ambos transindividuais e<br />

indivisíveis, o que, <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista processual, não tem maiores consequências, já que, pertencen<strong>do</strong> ambos ao gênero direitos<br />

transindividuais, são tutela<strong>do</strong>s judicialmente pelos mesmos instrumentos processuais”58.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, existe corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a precisa distinção <strong>do</strong>s direitos difusos e coletivos não só por uma<br />

questão acadêmica, observan<strong>do</strong> que também existiram consequências práticas relevantes <strong>de</strong>ssa tarefa. Nas palavras <strong>de</strong> Aluisio<br />

Gonçalves <strong>de</strong> Castro Men<strong>de</strong>s,<br />

“A correta distinção se faz necessária e é importante, na medida em que as duas categorias estão submetidas a regime diverso em<br />

termos <strong>de</strong> coisa julgada. A sentença proferida em relação aos interesses difusos produzirá efeitos erga omnes, enquanto na solução<br />

<strong>do</strong>s conflitos envolven<strong>do</strong> interesses coletivos a eficácia estará adstrita ao grupo, categoria ou classe”59.<br />

Feita a distinção entre os direitos que se mostram transindividuais, é ainda necessária a distinção <strong>de</strong>sses com o direito<br />

individual homogêneo, também tutela<strong>do</strong> pelo microssistema coletivo.<br />

A primeira e principal diferença diz respeito ao titular <strong>do</strong> direito, característica essa, inclusive, que <strong>de</strong>monstra <strong>de</strong> forma clara a<br />

opção <strong>de</strong> política legislativa <strong>de</strong> se tratar coletivamente, em termos processuais, os direitos individuais homogêneos. O titular <strong>do</strong><br />

direito individual homogêneo é o indivíduo, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que nesse caso haverá uma soma <strong>de</strong> direitos individuais, sen<strong>do</strong> cada um<br />

<strong>de</strong>sses direitos soma<strong>do</strong>s <strong>de</strong> titularida<strong>de</strong> <strong>de</strong>finida <strong>de</strong> um indivíduo.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, a indivisibilida<strong>de</strong> – ou unitarieda<strong>de</strong> – presente nos direitos transindividuais não é encontrada no direito<br />

individual homogêneo, porque nesse os direitos individuais soma<strong>do</strong>s po<strong>de</strong>m ser fruí<strong>do</strong>s ou sacrifica<strong>do</strong>s individualmente diante <strong>de</strong><br />

cada um <strong>de</strong> seus titulares. Parece ser exatamente nesse ponto o aspecto diferencia<strong>do</strong>r mais importante para fins <strong>de</strong> distinção, na


prática, da natureza <strong>do</strong> direito <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong> em juízo.<br />

Quan<strong>do</strong> uma ação civil pública é proposta para reparar os danos <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res que se vitimaram num aci<strong>de</strong>nte em<br />

transporte ofereci<strong>do</strong> por uma empresa turística, cada qual <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res lesa<strong>do</strong>s terá um direito individual <strong>de</strong> reparação, que,<br />

uma vez soma<strong>do</strong>s, po<strong>de</strong>rão resultar num direito individual homogêneo. Por outro la<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> numa ação civil pública se preten<strong>de</strong><br />

con<strong>de</strong>nar o réu a modificar a propaganda <strong>de</strong> um produto, em razão das informações incorretas que contém, toda a coletivida<strong>de</strong> será<br />

beneficiada com a eventual con<strong>de</strong>nação, sen<strong>do</strong> nítida a natureza transindividual <strong>do</strong> direito tutela<strong>do</strong> nesse caso. E, ainda, se é<br />

buscada numa ação civil pública a mudança na gra<strong>de</strong> curricular <strong>de</strong> uma escola, to<strong>do</strong>s os alunos que lá estudam serão beneficia<strong>do</strong>s<br />

ou prejudica<strong>do</strong>s pela mudança, mas será inviável a modificação curricular somente para alguns <strong>do</strong>s alunos e para outros não.<br />

A distinção entre o direito individual homogêneo e o difuso e coletivo parece ter gran<strong>de</strong>s repercussões práticas: (i) a<br />

legitimida<strong>de</strong> tem pequena diferença no tocante ao Ministério Público, que possui legitimida<strong>de</strong> ampla nos direitos transindividuais e<br />

encontra alguma limitação na <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> direito individual homogêneo; (ii) não se admitirá numa ação individual a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong><br />

direitos difusos e coletivos, o mesmo não ocorren<strong>do</strong> com o direito individual homogêneo; (iii) no direito individual homogêneo é<br />

admissível o ingresso <strong>de</strong> qualquer titular <strong>de</strong> direito como assistente litisconsorcial <strong>do</strong> autor, o que não se admite nos direitos difusos<br />

e coletivos; (iv) a liquidação e execução seguirão regras procedimentais totalmente diferentes, conforme amplamente analisa<strong>do</strong> nos<br />

itens 11.8 e 11.9.<br />

Entretanto, como bem anota<strong>do</strong> pela melhor <strong>do</strong>utrina, não há somente diferenças entre os direitos transindividuais, em especial<br />

o coletivo, e o direito individual homogêneo. Nessas duas espécies <strong>de</strong> direito existirá um grupo, classe e categoria <strong>de</strong> pessoas,<br />

sen<strong>do</strong> a <strong>de</strong>terminação, ou quan<strong>do</strong> muito a <strong>de</strong>terminabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses sujeitos, um elemento comum a essas duas espécies <strong>de</strong><br />

direito60.<br />

Apesar das diferenças entre os direitos tuteláveis pelo microssistema coletivo, conforme ensina a melhor <strong>do</strong>utrina, é possível a<br />

cumulação <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s eles, ou <strong>de</strong> <strong>do</strong>is <strong>de</strong>les, num mesmo processo, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que respeitadas as exigências processuais específicas <strong>de</strong><br />

cada um <strong>de</strong>les 61 . Dessa forma, é possível, por exemplo, numa mesma ação civil pública se pedir a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> réu a parar <strong>de</strong><br />

veicular propaganda enganosa (direito difuso), bem como a con<strong>de</strong>nação ao ressarcimento <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os consumi<strong>do</strong>res que foram<br />

prejudica<strong>do</strong>s por terem acredita<strong>do</strong> na propaganda (direito individual homogêneo).<br />

E, por fim, ainda seguin<strong>do</strong> as lições <strong>de</strong> autorizada <strong>do</strong>utrina, é possível que <strong>de</strong> uma mesma situação fático-jurídica <strong>de</strong>rivem<br />

direitos coletivos lato sensu <strong>de</strong> diferentes espécies:<br />

“Outra confusão recorrente precisa ser <strong>de</strong>sfeita: o mesmo interesse não po<strong>de</strong> ser simultaneamente difuso, coletivo e individual<br />

homogêneo. O que po<strong>de</strong> ocorrer é que uma única combinação <strong>de</strong> fatos, sob uma única relação jurídica, venha a provocar o<br />

surgimento <strong>de</strong> interesses transindividuais <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> uma categoria, os quais po<strong>de</strong>m até mesmo ser <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong>s na mesma ação civil<br />

pública ou coletiva”62.<br />

11.2.7. <strong>Direito</strong>s individuais indisponíveis<br />

Conforme exposto anteriormente, apesar <strong>de</strong> o microssistema coletivo se preocupar com a tutela <strong>de</strong> direitos transindividuais e<br />

individuais, nesse segun<strong>do</strong> caso – direitos individuais homogêneos – há uma prevalência da dimensão coletiva sobre a dimensão<br />

individual, inclusive sob o aspecto subjetivo, o que exigirá uma quantida<strong>de</strong> razoável <strong>de</strong> titulares <strong>de</strong> direitos individuais <strong>de</strong> origem<br />

comum a justificar a aplicação das regras procedimentais <strong>do</strong> microssistema coletivo.<br />

Ocorre, entretanto, que em três passagens legais que versam sobre o direito coletivo lato sensu, e mais precisamente sobre a<br />

aplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> microssistema coletivo, encontra-se a tutela <strong>de</strong> direitos individuais puros, <strong>de</strong> natureza indisponível, que po<strong>de</strong>m<br />

até mesmo ter apenas um sujeito como titular. Trata-se <strong>do</strong> art. 201, V, da Lei 8.069/1990 (ECA) e art. 74, I, da Lei 10.741/2001<br />

(Estatuto <strong>do</strong> I<strong>do</strong>so), que expressamente atribuem legitimida<strong>de</strong> ao Ministério Público na tutela <strong>de</strong> direitos individuais indisponíveis<br />

por meio <strong>de</strong> instrumentos exclusivos <strong>do</strong> microssistema coletivo: inquérito civil e ação civil pública, e <strong>do</strong> art. 3.º, caput, da Lei<br />

7.853/1989, com redação dada pelo art. 98 da Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoas com Deficiência), que prevê legitimida<strong>de</strong> ainda<br />

mais ampla.<br />

Conforme já tive oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> afirmar, será objeto <strong>de</strong> tutela por meio <strong>do</strong> microssistema coletivo a espécie <strong>de</strong> direito que o<br />

legisla<strong>do</strong>r <strong>de</strong>sejar, sen<strong>do</strong> ele transindividual ou individual. Nas hipóteses ora analisadas, entretanto, não vejo qualquer senti<strong>do</strong><br />

lógico ou jurídico que legitime a aplicação das especiais e diferenciadas regras <strong>do</strong> microssistema coletivo a direitos essencialmente<br />

individuais, ainda que indisponíveis e <strong>de</strong> titularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> i<strong>do</strong>sos, crianças e a<strong>do</strong>lescentes. Enten<strong>do</strong> que se trata <strong>de</strong> ampliação in<strong>de</strong>vida<br />

e injustificável, mas não se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> reconhecer a opção legislativa.<br />

O que não parece correto é tentar explicar a tutela processual coletiva <strong>de</strong> direito individual indisponível a<strong>de</strong>quan<strong>do</strong> essa<br />

espécie <strong>de</strong> direito ao direito individual homogêneo. Essa in<strong>de</strong>vida confusão, notada em julgamentos <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça63, é absolutamente in<strong>de</strong>sejável porque não distingue os elementos objetivos e subjetivos <strong>do</strong>s direitos materiais. Ser


indisponível diz respeito ao conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> direito, enquanto ser individual homogêneo concerne aos sujeitos que são seus titulares,<br />

tanto assim que não existe qualquer exigência <strong>de</strong> que essa segunda espécie <strong>de</strong> direito seja indisponível. Há, inclusive, <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong><br />

próprio Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que, corretamente, fazem questão <strong>de</strong> diferenciar direito individual indisponível <strong>de</strong> direito<br />

individual homogêneo 64 .<br />

Há inúmeras <strong>de</strong>cisões reconhecen<strong>do</strong> a legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Ministério Público e o cabimento da ação civil pública para a tutela <strong>de</strong><br />

direito indisponível <strong>de</strong> indivíduo, seja menor 65 ou i<strong>do</strong>so 66 , nos termos <strong>do</strong>s art. 201, V, da Lei 8.069/1990 (ECA) e art. 74, I, da Lei<br />

10. 741/2001 (Estatuto <strong>do</strong> I<strong>do</strong>so).<br />

O problema é a interpretação extensiva que se vem fazen<strong>do</strong> <strong>de</strong> tais dispositivos para admitir a ação civil pública em favor <strong>de</strong><br />

indivíduos, mesmo fora das proteções legais, com fundamento que, apesar <strong>de</strong> interessante, parece não se sustentar. Alega-se que,<br />

indiretamente, a tutela <strong>de</strong>sses indivíduos estará aten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a um interesse difuso da coletivida<strong>de</strong> em ver os hipossuficientes e – com<br />

ainda maior razão – os hipervulneráveis protegi<strong>do</strong>s pela tutela jurisdicional. Dessa forma, apesar <strong>de</strong> se tratar <strong>de</strong> direito individual<br />

indisponível não previsto em lei como tutelável pelo microssistema coletivo, o respeito ao pacto coletivo <strong>de</strong> inclusão social<br />

imperativa <strong>de</strong>sses sujeitos aten<strong>de</strong>ria a um direito difuso, o que justificaria a utilização <strong>do</strong> microssistema coletivo 67 .<br />

Exemplos concretos <strong>de</strong>ssa ampliação, além das hipóteses legais, são encontra<strong>do</strong>s em prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça ao reconhecer a legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Ministério Público para a propositura <strong>de</strong> ação civil pública em favor <strong>de</strong> indivíduo<br />

economicamente hipossuficiente no acesso a medicamento 68 e em favor <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiente físico para a obtenção <strong>de</strong> prótese69, ten<strong>do</strong><br />

essa última hipótese si<strong>do</strong> contemplada pela nova redação dada pelo art. 98 da Lei 13.146/2015 ao art. 3.º, caput, da Lei 7.853/1989.<br />

Não tenho qualquer dúvida <strong>de</strong> que os hipervulneráveis merecem toda a proteção estatal possível, inclusive a jurisdicional, mas<br />

não vejo a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aplicação <strong>do</strong> microssistema coletivo na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> seus direitos individuais indisponíveis. Que se admita a<br />

excepcional legitimida<strong>de</strong> extraordinária <strong>do</strong> Ministério Público para esse caso, uma vez que essa espécie <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> não precisa<br />

<strong>de</strong> previsão expressa em lei, mas para a propositura <strong>de</strong> processo individual.<br />

A opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r <strong>de</strong> incluir direitos individuais indisponíveis <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s sujeitos (i<strong>do</strong>so, criança e a<strong>do</strong>lescente) no<br />

microssistema coletivo já se mostra incongruente e <strong>de</strong>snecessária. Ampliar o âmbito <strong>de</strong>ssa tutela contém o mesmo vício, mas, por<br />

<strong>de</strong>rivar <strong>de</strong> interpretação extensiva, é ainda mais perigoso, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> até, no extremo, <strong>de</strong>scaracterizar o microssistema coletivo. Ao<br />

menos o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça vem resistin<strong>do</strong> a aplicar o entendimento ampliativo a sujeitos que passam longe da<br />

hipossuficiência, como no caso <strong>de</strong> ação civil pública proposta pelo Ministério Público em favor <strong>de</strong> uma administra<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> ramo<br />

imobiliário 70 .<br />

11.3.<br />

11.3.1.<br />

COMPETÊNCIA NA TUTELA COLETIVA<br />

Competência absoluta: funcional ou territorial?<br />

Parece não haver dúvida na <strong>do</strong>utrina e na jurisprudência a respeito da natureza absoluta da competência no âmbito da tutela<br />

coletiva. É natural que a competência da Justiça e <strong>do</strong> juízo no caso concreto será sempre <strong>de</strong> natureza absoluta, mas o traço<br />

distintivo na tutela coletiva é que a competência <strong>do</strong> foro também é absoluta, diferente <strong>do</strong> que ocorre, ao menos como regra, na<br />

tutela individual.<br />

A competência <strong>do</strong> foro (comarca na Justiça Estadual e seção judiciária na Justiça Fe<strong>de</strong>ral) no âmbito da tutela coletiva é<br />

regulada pelos arts. 2.º da LACP e 93 <strong>do</strong> CDC. No art. 93 <strong>do</strong> CDC não há qualquer previsão a respeito da natureza da competência<br />

lá <strong>de</strong>terminada, mas no art. 2.º da LACP há previsão expressa da competência funcional <strong>do</strong> local <strong>do</strong> dano, o que <strong>de</strong>monstra <strong>de</strong><br />

forma indiscutível a natureza absoluta da competência ali prevista.<br />

Uma vez previsto expressamente no art. 2.º da LACP que a competência <strong>do</strong> foro para as <strong>de</strong>mandas coletivas é funcional, po<strong>de</strong>se<br />

afirmar que sua natureza estaria resolvida por <strong>de</strong>terminação legal. Ocorre, entretanto, que a simples previsão <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong><br />

competência não é suficiente para <strong>de</strong>terminar sua natureza, <strong>de</strong> forma que continua a existir a dúvida a respeito <strong>de</strong> ser a regra <strong>de</strong><br />

competência <strong>do</strong> foro <strong>do</strong> local <strong>do</strong> dano <strong>de</strong> competência funcional ou territorial, ainda que, nesse segun<strong>do</strong> caso, excepcionalmente<br />

absoluta.<br />

Para respon<strong>de</strong>r a questão, <strong>de</strong>ve-se partir <strong>de</strong> uma constatação: parece que atualmente há um equívoco claro a respeito <strong>do</strong><br />

conceito da competência funcional. Na verda<strong>de</strong>, toda a confusão a respeito <strong>do</strong> instituto <strong>de</strong>riva das lições <strong>de</strong> Giuseppe Chiovenda,<br />

seguidas por nosso Código <strong>de</strong> Processo Civil e por gran<strong>de</strong> parcela da <strong>do</strong>utrina nacional. Para o mestre italiano, a competência<br />

funcional se baseava em duas características bastante distintas:<br />

“a) quan<strong>do</strong> as diversas funções necessárias num mesmo processo ou coor<strong>de</strong>nadas à atuação da mesma vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> lei são atribuídas a<br />

juízes diversos ou a órgãos jurisdicionais diversos (competência por graus; cognição e execução, medidas provisórias e <strong>de</strong>finitivas, e<br />

outras);


) quan<strong>do</strong> uma causa é confiada ao juiz <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> território pelo fato <strong>de</strong> ser aí mais fácil ou mais eficaz sua função (execução<br />

no lugar <strong>do</strong>s bens; processo <strong>de</strong> falência na se<strong>de</strong> <strong>do</strong> estabelecimento comercial principal)”.71<br />

O problema gera<strong>do</strong> por tal construção é <strong>de</strong>ixar transparecer a i<strong>de</strong>ia – amplamente <strong>do</strong>minante na <strong>do</strong>utrina nacional – <strong>de</strong> que a<br />

fixação <strong>de</strong> competência em um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> território possa ter caráter funcional, o que não se coaduna com o conceito clássico <strong>de</strong><br />

competência funcional. Nem mesmo nas hipóteses em que supostamente a função jurisdicional pu<strong>de</strong>r ser exercida <strong>de</strong> maneira mais<br />

fácil ou eficaz, o entendimento será aceitável. Há uma falha clara nesse raciocínio, <strong>de</strong> se atribuir somente em algumas hipóteses<br />

competência absoluta para <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> lugar em que teoricamente a ativida<strong>de</strong> jurisdicional – em especial no campo probatório –<br />

seria facilitada, o que geraria como consequência uma tutela jurisdicional <strong>de</strong> melhor qualida<strong>de</strong>.<br />

Como então explicar a relativida<strong>de</strong> das diversas hipóteses <strong>de</strong> competência previstas pelo art. 53 <strong>do</strong> Novo CPC, como a <strong>do</strong> local<br />

<strong>do</strong> aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> veículos, que po<strong>de</strong>rá também ser proposta no <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> autor, ou ainda no <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> réu? Alguém duvida que,<br />

nesse caso, o processo tramitan<strong>do</strong> no local <strong>do</strong> aci<strong>de</strong>nte possa gerar um contato mais próximo <strong>do</strong> juiz com a instrução probatória? E<br />

que supostamente tal contato faria com que a função a ser exercida pelo juiz fosse mais fácil ou mais eficaz? Porque então, nesse<br />

caso, não se aplica a competência funcional?<br />

Enten<strong>do</strong> que há um grave equívoco ao se imaginar que tais características sejam efetivamente a razão para que a regra <strong>de</strong><br />

competência tenha caráter funcional. A<strong>de</strong>mais, seria absolutamente inconveniente enten<strong>de</strong>r o critério funcional como sen<strong>do</strong> apto a<br />

<strong>de</strong>terminar uma melhor ou pior forma <strong>de</strong> prestação jurisdicional, quan<strong>do</strong> o mínimo que se espera é que a prestação jurisdicional <strong>de</strong><br />

qualida<strong>de</strong> seja sempre a preocupação da jurisdição, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> local em que é exercida.<br />

Dessa forma, parece que nas situações em que o legisla<strong>do</strong>r fixa uma competência territorial, atribuin<strong>do</strong>-lhe a característica <strong>de</strong><br />

competência absoluta, não o faz levan<strong>do</strong> em conta tão somente a melhor ou pior qualida<strong>de</strong> da prestação jurisdicional, mas sim a<br />

natureza <strong>do</strong> direito material <strong>de</strong>bati<strong>do</strong>. É essa natureza que leva o legisla<strong>do</strong>r a fixar certo território <strong>de</strong> maneira improrrogável para<br />

julgar <strong>de</strong>terminadas <strong>de</strong>mandas judiciais, sen<strong>do</strong> somente possível afirmar que a facilida<strong>de</strong> ou eficácia da função a ser exercida pelo<br />

juiz é apenas algo que motivou o legisla<strong>do</strong>r a criar essas regras <strong>de</strong> competência absoluta, mas nunca sua razão <strong>de</strong> ser.<br />

Nesses termos, irretocável a conclusão <strong>de</strong> Brunela Vieira <strong>de</strong> Vicenzi, em artigo específico sobre o tema:<br />

“A relação <strong>de</strong> direito material influencia diretamente na <strong>de</strong>finição da competência; em <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s casos a relevância <strong>do</strong> direito<br />

tutela<strong>do</strong> impõe a sua diferenciação, quan<strong>do</strong>, então, o legisla<strong>do</strong>r atribui previamente competência absoluta a <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> órgão<br />

jurisdicional. Porém, a questão não vem sen<strong>do</strong> tratada <strong>de</strong> maneira tão simples. Na maioria das vezes o legisla<strong>do</strong>r utiliza-se <strong>de</strong> <strong>do</strong>is ou<br />

mais critérios <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>res da competência simultaneamente, por exemplo, o material e territorial. E aí, não obstante, atribui a essa<br />

competência o rótulo <strong>de</strong> funcional, acreditan<strong>do</strong> que assim ela se tornará absoluta. Em síntese, po<strong>de</strong>ríamos dizer que o conceito está<br />

sen<strong>do</strong> distorci<strong>do</strong> e utiliza<strong>do</strong> para atribuir eficácia ‘absoluta’ à competência <strong>de</strong> um órgão jurisdicional <strong>de</strong>fini<strong>do</strong> em razão <strong>do</strong> território<br />

simplesmente, ou em razão <strong>do</strong> território conjuga<strong>do</strong> a matéria (hipótese em que, aliás, a competência já seria absoluta por força <strong>do</strong>s<br />

critérios utiliza<strong>do</strong>s). Mais simples e coerente seria estabelecer, em vista <strong>do</strong>s direitos tutela<strong>do</strong>s, sempre que estes forem <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m<br />

pública, em cuja tutela o Esta<strong>do</strong> tenha premente interesse, a competência absoluta, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> critério utiliza<strong>do</strong> para a<br />

sua prévia <strong>de</strong>finição. Improrrogável pela vonta<strong>de</strong> das partes, portanto”.72<br />

Essa errônea <strong>de</strong>finição <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> competência funcional po<strong>de</strong> ser sentida em três importantes dispositivos legais: a) art.<br />

47 <strong>do</strong> Novo CPC; b) art. 2.º da Lei 7.347/1985 (Ação Civil Pública); c) art. 80 da Lei 10.741/2003 (Estatuto <strong>do</strong> I<strong>do</strong>so), sen<strong>do</strong> mais<br />

relevante para o presente estu<strong>do</strong> a norma que compõe o núcleo duro <strong>do</strong> microssistema coletivo.<br />

11.3.2. Competência absoluta <strong>do</strong> foro<br />

Assim vem redigi<strong>do</strong> o art. 2.º da LACP: “as ações previstas nesta Lei serão propostas no foro <strong>do</strong> local on<strong>de</strong> ocorrer o dano,<br />

cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa”. Conforme já afirma<strong>do</strong>, o legisla<strong>do</strong>r pensou em evitar<br />

qualquer espécie <strong>de</strong> <strong>de</strong>bate sobre a verda<strong>de</strong>ira espécie <strong>de</strong> competência ao <strong>de</strong>terminar expressamente tratar a regra <strong>de</strong> competência<br />

funcional. Melhor seria simplesmente se manter alheio a tão polêmico <strong>de</strong>bate, consignan<strong>do</strong> somente que a competência é absoluta,<br />

como acertadamente sugeri<strong>do</strong> por Cândi<strong>do</strong> Rangel Dinamarco:<br />

“A Lei <strong>de</strong> Ação Civil Pública, empregan<strong>do</strong> linguagem ina<strong>de</strong>quada, diz ser funcional a competência <strong>de</strong> foro ali estabelecida (art. 2.º).<br />

Enten<strong>de</strong>-se que quis com isso dar por absoluta essa competência, porque a realização <strong>do</strong> processo no foro on<strong>de</strong> se localiza o dano é<br />

<strong>do</strong> interesse público e não <strong>de</strong> indivíduos i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong>s – afastan<strong>do</strong>-se consequentemente a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> eleição <strong>de</strong> outro foro e<br />

mesmo a prorrogação da competência territorial por força <strong>de</strong> omissão em opor exceção <strong>de</strong>clinatória”73.<br />

Há na <strong>do</strong>utrina uma consi<strong>de</strong>rável quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudiosos <strong>do</strong> processo coletivo que já tiveram oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> externar certa<br />

perplexida<strong>de</strong> pela reunião expressa <strong>de</strong> <strong>do</strong>is critérios <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> competência: territorial e funcional (pelo menos é isso que<br />

a lei afirma),74 não obstante to<strong>do</strong>s prestigiem a indicação legal sob o argumento <strong>de</strong> que no local <strong>do</strong> dano haverá possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>


uma proximida<strong>de</strong> física <strong>do</strong> juiz com o evento, e consequentemente a prova po<strong>de</strong>rá ser colhida mais facilmente e <strong>de</strong> maneira mais<br />

eficaz, o que, em última análise, proporcionaria uma tutela jurisdicional <strong>de</strong> melhor qualida<strong>de</strong>.<br />

Merece transcrição a lição <strong>de</strong> Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo Mancuso sobre o tema:<br />

“Ante esses da<strong>do</strong>s, se esmaece o impacto causa<strong>do</strong> à primeira leitura <strong>do</strong> art. 2.º da Lei 7.347/1985, on<strong>de</strong>, como se disse, o legisla<strong>do</strong>r<br />

aproximou critérios que, ordinariamente, conduzem a competências <strong>de</strong> natureza diversa. Seja porque aí se seguiu a regra <strong>de</strong><br />

competência territorial especial (CPC, art. 100, V, a), seja porque a própria letra da lei é no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que o juiz ‘terá competência<br />

funcional para processar e julgar a causa’, não pa<strong>de</strong>ce dúvida <strong>de</strong> que, no caso, trata-se <strong>de</strong> competência absoluta, com as<br />

consequências daí <strong>de</strong>correntes: não se prorroga, não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> exceção para ser conhecida, po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>clarada <strong>de</strong> ofício em<br />

qualquer tempo ou grau <strong>de</strong> jurisdição, é fator <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> absoluta; manejável em ação rescisória (CPC, art. 485, II)”. 75<br />

Mais uma vez se nota a in<strong>de</strong>vida confusão entre a razão <strong>de</strong> ser da fixação da competência absoluta a certo território e os<br />

ganhos práticos que tal fixação provavelmente trará ao processo. Não são, como faz parecer, a facilida<strong>de</strong> da produção da prova e o<br />

maior contato <strong>do</strong> juiz com o evento que motivou o ingresso da <strong>de</strong>manda judicial que fazem com que a competência da ação civil<br />

pública seja obrigatoriamente a <strong>do</strong> local <strong>do</strong> dano. Essas circunstâncias são mera consequência. O que <strong>de</strong>termina a competência<br />

absoluta – e não funcional – <strong>do</strong> local <strong>do</strong> dano é a natureza <strong>do</strong> direito controverti<strong>do</strong> (direitos difusos, coletivos e individuais<br />

homogêneos).<br />

Conforme já afirma<strong>do</strong>, a competência da ação civil pública é <strong>do</strong> foro <strong>do</strong> local <strong>do</strong> dano, sen<strong>do</strong> essa competência <strong>de</strong> natureza<br />

absoluta (no texto legal funcional, mas na realida<strong>de</strong> territorial). Essa é a disposição <strong>do</strong> art. 2.º da Lei 7.347/1985 que, apesar <strong>de</strong> ser<br />

omissa a esse respeito, também se refere ao foro <strong>do</strong> local em que <strong>de</strong>va ser pratica<strong>do</strong> o ato ilícito – e, como consequência, não<br />

necessária, mas natural, gerar-se o dano, nas hipóteses <strong>de</strong> tutela inibitória. É nesse senti<strong>do</strong> o teor <strong>do</strong> art. 93 <strong>do</strong> CDC, ao prever<br />

como competente o foro <strong>do</strong> local em que <strong>de</strong>va ocorrer o dano. O dispositivo tem o mérito <strong>de</strong> prever a competência para ações <strong>de</strong><br />

tutela preventiva, mas ao fixar a competência toman<strong>do</strong> por base o “dano”, afasta-se da melhor <strong>do</strong>utrina, que ensina não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r a<br />

tutela preventiva <strong>do</strong> dano76.<br />

Nas Comarcas maiores, em que existam varas da Justiça Estadual e da Justiça Fe<strong>de</strong>ral, a eventual participação <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s entes<br />

fe<strong>de</strong>rais previstos pelo art. 109, I, da CF/1988 não enseja qualquer problema, já que tanto a vara estadual como a vara fe<strong>de</strong>ral<br />

estarão localizadas no mesmo foro. O mesmo não ocorre, entretanto, em comarcas em que não exista vara fe<strong>de</strong>ral e haja<br />

participação no processo da União, autarquias, fundações, empresas públicas fe<strong>de</strong>rais e Ministério Público Fe<strong>de</strong>ral.<br />

A questão que <strong>de</strong>ve ser levantada nesse caso diz respeito a instituto já estuda<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> se tratou da competência da Justiça<br />

Fe<strong>de</strong>ral: a <strong>de</strong>legação por competência prevista pelo art. 109, § 3.º, da CF/1988. Não haven<strong>do</strong> vara fe<strong>de</strong>ral no local <strong>do</strong> dano, será<br />

possível que o processo tramite perante a Justiça Estadual investida <strong>de</strong> competência fe<strong>de</strong>ral ou será necessário que o processo seja<br />

<strong>de</strong>sloca<strong>do</strong> até a vara Fe<strong>de</strong>ral, ainda que em local diverso daquele em que ocorreu ou em que <strong>de</strong>va ocorrer o dano? A resposta a tal<br />

questão <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá <strong>do</strong> entendimento a respeito <strong>de</strong> o art. 2.º da Lei 7.347/1985 ter efetivamente cria<strong>do</strong> hipótese <strong>de</strong> <strong>de</strong>legação <strong>de</strong><br />

competência, conforme faculta<strong>do</strong> pelo art. 109, § 3.º, da CF/1988, ou não ter cria<strong>do</strong> tal <strong>de</strong>legação por ausência <strong>de</strong> norma expressa<br />

nesse senti<strong>do</strong>.<br />

Nossos tribunais, durante algum tempo, estiveram vacilantes a respeito <strong>do</strong> tema. A 1ª Seção <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça<br />

aprovou, em 12.03.1997, a Súmula 183: “Compete ao Juiz estadual, nas comarcas que não sejam se<strong>de</strong> <strong>de</strong> vara da Justiça Fe<strong>de</strong>ral,<br />

processar e julgar ação civil pública, ainda que a União figure no processo”. Como se po<strong>de</strong> notar <strong>do</strong> teor da súmula transcrita, o<br />

Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça a<strong>do</strong>tou o entendimento <strong>de</strong> que houve, por meio da Lei da Ação Civil Pública, a criação <strong>de</strong> mais uma<br />

hipótese <strong>de</strong> <strong>de</strong>legação <strong>de</strong> competência fe<strong>de</strong>ral ao juiz estadual nos locais em que não existissem varas fe<strong>de</strong>rais.<br />

O entendimento sumula<strong>do</strong> <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça era – e ainda é, embora supera<strong>do</strong> pelo entendimento <strong>do</strong> Supremo<br />

Tribunal Fe<strong>de</strong>ral – o preferi<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>utrina, que sempre enten<strong>de</strong>u que a <strong>de</strong>legação se justificaria em razão da previsão legal e, mais<br />

<strong>do</strong> que isso, em razão da própria necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o processo se <strong>de</strong>senvolver perante o local <strong>do</strong> dano como forma <strong>de</strong> presumidamente<br />

garantir uma tutela jurisdicional <strong>de</strong> melhor qualida<strong>de</strong>. A justificativa para o legisla<strong>do</strong>r ter cria<strong>do</strong> uma regra <strong>de</strong> competência<br />

territorial absoluta (situação excepcional) é justamente o contato mais direto <strong>do</strong> juiz com os elementos probatórios a serem colhi<strong>do</strong>s<br />

e até mesmo com a repercussão <strong>do</strong> ato pratica<strong>do</strong> na comunida<strong>de</strong>. A transferência <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>manda para outra cida<strong>de</strong>, em que exista<br />

vara fe<strong>de</strong>ral, colocaria em xeque tal justificativa, afastan<strong>do</strong> o juiz <strong>do</strong> local <strong>do</strong> dano e, em tese, prejudican<strong>do</strong> a própria entrega da<br />

prestação jurisdicional77.<br />

Assim se manifestou Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros Leonel:<br />

“As peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s interesses metaindividuais dificultam a produção <strong>de</strong> provas no curso da <strong>de</strong>manda judicial. A fixação da<br />

competência no local <strong>do</strong> dano tem por escopo facilitar a instrução, pois a proximida<strong>de</strong> <strong>do</strong> juízo com relação à prova milita em favor<br />

<strong>de</strong> sua elaboração. Como nas <strong>de</strong>mandas coletivas há maior interesse público e preocupação com a busca da verda<strong>de</strong> real, a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong><br />

propiciar a proximida<strong>de</strong> entre o juiz e o dinamismo <strong>do</strong>s atos <strong>de</strong> colheita das provas. Isto implica o respeito máximo ao direito


constitucional <strong>de</strong> ação e a garantia <strong>do</strong> acesso efetivo à justiça e à or<strong>de</strong>m jurídica justa” 78 .<br />

Esse entendimento, entretanto, não foi consagra<strong>do</strong> pelo Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, o que gerou inclusive a revogação da<br />

Súmula 183 <strong>do</strong> STJ. Vale a pena a transcrição <strong>de</strong> trecho <strong>do</strong> voto <strong>de</strong> lavra <strong>do</strong> Min. Ilmar Galvão:<br />

“O dispositivo conti<strong>do</strong> na parte final da CF 109 § 3.º é dirigi<strong>do</strong> ao legisla<strong>do</strong>r ordinário, autorizan<strong>do</strong>-o a atribuir competência (rectius:<br />

jurisdição) ao juízo estadual <strong>do</strong> foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio da outra parte ou <strong>do</strong> lugar <strong>do</strong> ato ou fato que <strong>de</strong>u origem à <strong>de</strong>manda, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não<br />

seja se<strong>de</strong> <strong>de</strong> varas da Justiça Fe<strong>de</strong>ral, para causas específicas <strong>de</strong>ntre as previstas na CF 109, I. A permissão não foi utilizada pelo<br />

legisla<strong>do</strong>r, que se limitou, na LACP 2.º, a estabelecer que as ações nele previstas ‘serão propostas no local on<strong>de</strong> ocorrer o dano, cujo<br />

juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa’. Consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que o juiz fe<strong>de</strong>ral também tem competência<br />

territorial e funcional sobre o local <strong>de</strong> qualquer dano, impõe-se a conclusão <strong>de</strong> que o afastamento da jurisdição fe<strong>de</strong>ral somente<br />

po<strong>de</strong>ria dar-se por meio <strong>de</strong> referência expressa à Justiça Estadual, como a que fez o constituinte na primeira parte <strong>do</strong> menciona<strong>do</strong> §<br />

3.º da CF 109, em relação às causas <strong>de</strong> natureza previ<strong>de</strong>nciária”79.<br />

Com o referi<strong>do</strong> julga<strong>do</strong>, a questão se pacificou, ainda que <strong>do</strong>utrinariamente seja possível a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> tese em senti<strong>do</strong> contrário.<br />

O próprio Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça abdicou <strong>de</strong> seu entendimento originário, passan<strong>do</strong> a enten<strong>de</strong>r, em homenagem ao princípio<br />

da harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s, que a participação <strong>de</strong> ente fe<strong>de</strong>ral previsto pelo art. 109, I, da CF/1988 exige a competência da<br />

Justiça Fe<strong>de</strong>ral, ainda que em cida<strong>de</strong> diversa daquela em que se <strong>de</strong>u o dano ou na qual há a ameaça <strong>de</strong> tal dano ocorrer 80 .<br />

11.3.3. Dano local, regional e nacional<br />

Outra interessante questão que envolve a competência da ação civil pública vem regulada pelo Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r, em seu art. 93, II (Lei 8.078/1990). Trata-se da ocorrência <strong>de</strong> dano regional ou nacional:<br />

“Art. 93. Ressalvada a competência da justiça fe<strong>de</strong>ral, é competente para a causa a justiça local:<br />

I – no foro <strong>do</strong> lugar on<strong>de</strong> ocorreu ou <strong>de</strong>va ocorrer o dano, quan<strong>do</strong> <strong>de</strong> âmbito local;<br />

II – no foro da Capital <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> ou no <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral, para os danos <strong>de</strong> âmbito nacional ou regional, aplican<strong>do</strong>-se as regras <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Processo Civil nos casos <strong>de</strong> competência concorrente”.<br />

Enten<strong>do</strong> que há <strong>do</strong>is graves problemas gera<strong>do</strong>s por esse dispositivo legal, não haven<strong>do</strong> qualquer contribuição <strong>de</strong> suas regras<br />

para a necessária segurança jurídica ou mesmo qualida<strong>de</strong> da prestação jurisdicional.<br />

A primeira crítica dirigida ao dispositivo legal diz respeito a sua total <strong>de</strong>spreocupação em conceituar as diferentes abrangências<br />

<strong>de</strong> dano que menciona (local, regional e nacional). Nem mesmo parâmetros que po<strong>de</strong>riam ajudar na análise <strong>do</strong> caso concreto são<br />

forneci<strong>do</strong>s pelo referi<strong>do</strong> dispositivo. Naturalmente que <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> a missão <strong>de</strong> conceituação <strong>de</strong> tais abrangências exclusivamente à<br />

jurisprudência e à <strong>do</strong>utrina, o resulta<strong>do</strong> seria – como <strong>de</strong> fato o é – a insegurança jurídica. De qualquer forma, tenta-se explicar o que<br />

significa dano local, regional e nacional.<br />

A análise se inicia pelo que <strong>de</strong>ve ser entendi<strong>do</strong> como dano <strong>de</strong> âmbito local. Parece que nesse caso o dano não terá repercussão<br />

muito ampla, estan<strong>do</strong> limita<strong>do</strong> a produtos ou serviços que atingirão tão somente pessoas <strong>do</strong>miciliadas em pequena área territorial,<br />

sen<strong>do</strong> a característica principal a reduzida extensão geográfica <strong>do</strong> dano. Nesse caso, o art. 93, I, <strong>do</strong> CDC indica o foro <strong>do</strong> lugar<br />

como competente, e assim o <strong>de</strong>verá ser. No caso <strong>de</strong> o dano atingir mais <strong>de</strong> uma comarca, a competência entre elas se resolverá pelo<br />

fenômeno da prevenção, ainda que as comarcas pertençam a diferentes Esta<strong>do</strong>s. O mesmo ocorrerá com diferentes seções<br />

judiciárias, mesmo que <strong>de</strong> diferentes regiões.<br />

Os danos <strong>de</strong> maior repercussão po<strong>de</strong>rão ser regionais, quan<strong>do</strong> atingirem pessoas espalhadas por uma inteira região, ou<br />

nacionais, quan<strong>do</strong> atingirem pessoas em praticamente to<strong>do</strong> o território nacional, ainda que a distinção nesse caso seja inócua para a<br />

<strong>de</strong>finição da competência, que seguirá a mesma regra, sen<strong>do</strong> o dano regional ou nacional.<br />

Como se po<strong>de</strong> notar, não é fácil a distinção entre dano local, regional e nacional, ainda que a distinção entre dano regional e<br />

nacional seja inócua para a <strong>de</strong>finição da competência. A dificulda<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser sentida nas lições <strong>de</strong> autoriza<strong>do</strong> especialista no tema,<br />

segun<strong>do</strong> quem o dano local é mais restrito “em razão da circulação limitada <strong>de</strong> produtos ou da prestação <strong>de</strong> serviços circunscritos,<br />

os quais atingirão pessoas resi<strong>de</strong>ntes num <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> local”, enquanto será regional ou nacional o produto ou serviço que<br />

“acarretar prejuízos <strong>de</strong> dimensões mais amplas, atingin<strong>do</strong> pessoas espalhadas por uma inteira região ou por to<strong>do</strong> território<br />

nacional”81.<br />

Para o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, é regional o dano mesmo quan<strong>do</strong> atinge a sujeitos <strong>do</strong>micilia<strong>do</strong>s <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um mesmo<br />

Esta<strong>do</strong> da Fe<strong>de</strong>ração, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que espalha<strong>do</strong>s em vários locais diferentes82, e nacional, o que interessa a três Esta<strong>do</strong>s da Fe<strong>de</strong>ração 83 ,<br />

dan<strong>do</strong> a enten<strong>de</strong>r que o dano local é reserva<strong>do</strong> a uma comarca ou ainda a um pequeno grupo <strong>de</strong> comarcas <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> mesmo Esta<strong>do</strong>,<br />

levan<strong>do</strong> em conta que há <strong>de</strong>cisão que consi<strong>de</strong>ra como dano regional aquele que atinge oito comarcas, mas <strong>de</strong> diferentes Esta<strong>do</strong>s da


Fe<strong>de</strong>ração.<br />

Para os casos <strong>de</strong> dano regional ou nacional, o art. 93, II, <strong>do</strong> CDC apontou como competente o foro da Capital <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> (no<br />

caso <strong>de</strong> dano regional, naturalmente <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s esta<strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s) ou <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral. Haverá nesse caso uma competência<br />

concorrente entre tais foros, sen<strong>do</strong> a competência fixada concretamente por meio <strong>do</strong> fenômeno da prevenção. Registre-se a<br />

existência <strong>de</strong> <strong>do</strong>utrina que enten<strong>de</strong> que, no caso <strong>de</strong> dano nacional, o único foro competente <strong>de</strong>veria ser o <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral. Nesse<br />

senti<strong>do</strong> Ada Pellegrini Grinover:<br />

“Sen<strong>do</strong> o dano <strong>de</strong> âmbito nacional, enten<strong>de</strong>mos que a competência <strong>de</strong>veria ser sempre <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral: isso para facilitar o acesso<br />

à justiça e o próprio exercício <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa por parte <strong>do</strong> réu, não ten<strong>do</strong> senti<strong>do</strong> que seja ele obriga<strong>do</strong> a litigar na capital <strong>de</strong> um<br />

Esta<strong>do</strong>, longínquo talvez <strong>de</strong> sua se<strong>de</strong>, pela mera opção <strong>do</strong> autor coletivo. As regras <strong>de</strong> competência <strong>de</strong>vem ser interpretadas <strong>de</strong> mo<strong>do</strong><br />

a não vulnerar a plenitu<strong>de</strong> da <strong>de</strong>fesa e o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> processo legal” 84 .<br />

O entendimento exposto acima, entretanto, é amplamente minoritário, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a <strong>do</strong>utrina majoritária que haverá<br />

concorrência <strong>de</strong> foros ainda que o dano seja <strong>de</strong> âmbito nacional, sen<strong>do</strong> plenamente possível a propositura da <strong>de</strong>manda em qualquer<br />

das capitais 85 .<br />

Interessante notar a existência <strong>de</strong> <strong>do</strong>utrina 86 e <strong>de</strong> jurisprudência no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a competência em caso <strong>de</strong> dano nacional não<br />

<strong>de</strong>ve ser livremente estabelecida entre as comarcas da capital <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s e <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral, caben<strong>do</strong> uma análise no<br />

caso concreto a respeito <strong>de</strong> qual local seria o mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> a receber as <strong>de</strong>mandas coletivas. Em interessante julgamento que<br />

<strong>de</strong>finiu a competência <strong>de</strong> ação <strong>de</strong> improbida<strong>de</strong> administrativa, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça enten<strong>de</strong>u que, mesmo haven<strong>do</strong> atos <strong>de</strong><br />

improbida<strong>de</strong> em três Esta<strong>do</strong>s da Fe<strong>de</strong>ração, a competência seria da capital <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> no qual a maioria <strong>do</strong>s atos foi pratica<strong>do</strong> e<br />

on<strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os réus eram <strong>do</strong>micilia<strong>do</strong>s87.<br />

A segunda crítica que <strong>de</strong>ve ser feita ao art. 93 <strong>do</strong> CDC diz respeito à regra criada pelo seu inciso II, porque, a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r da<br />

situação concreta e/ou a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> autor, a ação coletiva terá como competente um foro no qual o dano discuti<strong>do</strong> não foi gera<strong>do</strong> e<br />

em algumas situações bem distante <strong>do</strong> local on<strong>de</strong> ocorreu. Enten<strong>do</strong> que nesse caso a regra viola a própria razão <strong>de</strong> ser da<br />

competência absoluta das ações coletivas, porque, se a justificativa para impor a competência <strong>de</strong> um foro é a proximida<strong>de</strong> com as<br />

provas, pessoas e facilitação <strong>do</strong> exercício jurisdicional, como justificar uma regra que permite a competência <strong>de</strong> um foro em que<br />

nenhuma <strong>de</strong>ssas vantagens existirá?<br />

Basta imaginar um dano suporta<strong>do</strong> por consumi<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Sul brasileiro, espalha<strong>do</strong>s por inúmeras comarcas <strong>do</strong> Rio Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

Sul, Santa Catarina e Paraná, inclusive as capitais <strong>de</strong> tais Esta<strong>do</strong>s. Pouco importa se tal dano é local ou nacional porque a regra<br />

aplicável será a mesma: competência corrente <strong>do</strong>s foros da Capital e <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral. Caso o autor escolha qualquer uma das<br />

três capitais <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s afeta<strong>do</strong>s, não haverá violação à regra prevista no art. 2.º da LACP, porque a ação terá como competente<br />

um foro no qual ocorreu o dano. E se a opção for o Distrito Fe<strong>de</strong>ral?<br />

Será ainda mais dramática a hipótese <strong>de</strong> dano que atinja comarcas <strong>de</strong> Esta<strong>do</strong>s diferentes sem, entretanto, afetar suas capitais.<br />

Nesse caso, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da escolha <strong>do</strong> autor – entre as capitais <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s atingi<strong>do</strong>s ou Distrito Fe<strong>de</strong>ral – a ação coletiva<br />

será proposta e seguirá em foro on<strong>de</strong> não ocorreu o dano discuti<strong>do</strong> na <strong>de</strong>manda.<br />

Não é preciso muito esforço para notar que nem to<strong>do</strong>s os foros consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s competentes pelo art. 93, II, <strong>do</strong> CDC, nas ações<br />

coletivas que versam sobre dano regional ou nacional, serão afeta<strong>do</strong>s por tal dano, <strong>de</strong> forma que a aplicação <strong>do</strong> dispositivo legal no<br />

caso concreto po<strong>de</strong>rá significar o <strong>de</strong>srespeito à regra consagrada no art. 2.º da LACP que prevê como competente absoluto<br />

(funcional) o foro <strong>do</strong> local <strong>do</strong> dano.<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 81, § 1.º, <strong>do</strong> Projeto <strong>de</strong> Lei 271/2012, a competência <strong>do</strong> foro é da capital <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, se o dano ou o ilícito<br />

atingir o seu território; e <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral, se o dano ou o ilícito atingir o seu território, concorrentemente com os foros das<br />

capitais atingidas. Além <strong>de</strong> abolir para fins <strong>de</strong> fixação <strong>de</strong> competência a abrangência <strong>do</strong> dano, o dispositivo aparentemente prevê a<br />

competência da capital somente na hipótese <strong>de</strong> seu território ser atingi<strong>do</strong> pelo dano ou pelo ato ilícito, o que é elogiável por evitar<br />

que a <strong>de</strong>manda siga em comarca on<strong>de</strong> não ocorreu o dano.<br />

Também é interessante a previsão contida no art. 81, § 2.º, que fixa a competência da comarca <strong>de</strong> entrância mais elevada<br />

quan<strong>do</strong> o dano atingir diversas comarcas. Registre-se ainda a previsão contida no § 5.º no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> resolver impasse na hipótese<br />

<strong>de</strong> no foro existir vara especializada em razão da matéria e em ações coletivas, fixan<strong>do</strong> a competência naquela em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong>sta.<br />

11.4.<br />

11.4.1.<br />

LEGITIMIDADE<br />

Espécies <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong><br />

Conforme tradicional lição <strong>do</strong>utrinária, a legitimida<strong>de</strong> para agir (legitimatio ad causam) é a pertinência subjetiva da <strong>de</strong>manda<br />

ou, em outras palavras, é a situação prevista em lei que permite a um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> sujeito propor a <strong>de</strong>manda judicial e a um


<strong>de</strong>termina<strong>do</strong> sujeito formar o polo passivo <strong>de</strong>ssa <strong>de</strong>manda88. Tradicionalmente, afirma-se que serão legitima<strong>do</strong>s ao processo os<br />

sujeitos <strong>de</strong>scritos como titulares da relação jurídica <strong>de</strong> direito material <strong>de</strong>duzida pelo <strong>de</strong>mandante 89 , mas essa <strong>de</strong>finição só tem<br />

serventia para a legitimação ordinária, sen<strong>do</strong> ina<strong>de</strong>quada para a conceituação da legitimação extraordinária.<br />

Na tutela individual a regra geral em termos <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> é consagrada no art. 18 <strong>do</strong> Novo CPC, ao prever que somente o<br />

titular <strong>do</strong> alega<strong>do</strong> direito po<strong>de</strong> pleitear em nome próprio seu próprio interesse, consagran<strong>do</strong> a legitimação ordinária, com a ressalva<br />

<strong>de</strong> que o dispositivo legal somente se refere à legitimação ativa, mas é também aplicável à legitimação passiva. A regra <strong>do</strong> sistema<br />

processual, ao menos no âmbito da tutela individual, é a legitimação ordinária, com o sujeito em nome próprio <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>n<strong>do</strong><br />

interesse próprio.<br />

Excepcionalmente admite-se que alguém em nome próprio litigue em <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> interesse <strong>de</strong> terceiro, hipótese em que haverá<br />

uma legitimação extraordinária. Nos termos <strong>do</strong> art. 18, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, essa espécie <strong>de</strong> legitimação <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> autorização<br />

pelo or<strong>de</strong>namento jurídico, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a melhor <strong>do</strong>utrina que, além da previsão legal, também se admite a legitimação<br />

extraordinária quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>correr logicamente <strong>do</strong> sistema90, como ocorre com a legitimação recursal da parte em apelar <strong>do</strong> capítulo<br />

da sentença que versa sobre os honorários <strong>de</strong> seu advoga<strong>do</strong>.<br />

Existe certo dissenso <strong>do</strong>utrinário a respeito da legitimação extraordinária e da substituição processual. Enquanto parcela da<br />

<strong>do</strong>utrina <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> tratar-se <strong>do</strong> mesmo fenômeno, sen<strong>do</strong> substituto processual o sujeito que recebeu pela lei a legitimida<strong>de</strong><br />

extraordinária <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r interesse alheio em nome próprio 91 , outra parcela da <strong>do</strong>utrina enten<strong>de</strong> que a substituição processual é<br />

uma espécie <strong>de</strong> legitimação processual 92 . Há aqueles que associam a substituição processual à excepcional hipótese <strong>de</strong> o substituí<strong>do</strong><br />

não ter legitimida<strong>de</strong> para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r seu direito em juízo, sen<strong>do</strong> tal legitimação exclusiva <strong>do</strong> substituto 93 . Para outros, a substituição<br />

processual só ocorre quan<strong>do</strong> o legitima<strong>do</strong> extraordinário atua no processo sem que o legitima<strong>do</strong> ordinário atue com ele 94 .<br />

As explicações não convencem, sen<strong>do</strong> amplamente superior a corrente <strong>do</strong>utrinária que enten<strong>de</strong> tratar-se a substituição<br />

processual e a legitimação extraordinária <strong>do</strong> mesmo fenômeno. Além disso, no âmbito da tutela coletiva parece não haver qualquer<br />

empecilho para a utilização <strong>do</strong> termo substituição processual, ao menos para aqueles que enten<strong>de</strong>m ser a legitimida<strong>de</strong> ativa uma<br />

legitimação extraordinária. Para tanto, basta lembrar que o titular <strong>do</strong> direito difuso, coletivo ou individual homogêneo não é<br />

legitima<strong>do</strong>, ao menos por meio <strong>de</strong> ação coletiva, à <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> direito em juízo. Portanto, mesmo para a corrente <strong>do</strong>utrinária que<br />

diferencia a legitimação extraordinária da substituição processual, na tutela coletiva não restará dúvida <strong>de</strong> que os legitima<strong>do</strong>s ativos<br />

são substitutos processuais e os titulares <strong>do</strong> direito, substituí<strong>do</strong>s.<br />

Existe corrente <strong>do</strong>utrinária que enten<strong>de</strong> a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> restringir a legitimação extraordinária à tutela individual, afirman<strong>do</strong> que, por<br />

meio <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> legitimação, se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> em juízo um direito subjetivo singular <strong>de</strong> titularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pessoa <strong>de</strong>terminada. Sen<strong>do</strong><br />

o direito difuso, <strong>de</strong> titularida<strong>de</strong> da coletivida<strong>de</strong> (sujeitos in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s e in<strong>de</strong>termináveis) ou coletivo, <strong>de</strong> titularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma<br />

comunida<strong>de</strong> – classe, grupo ou categoria <strong>de</strong> pessoas (sujeitos in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s, mas <strong>de</strong>termináveis) –, seria inaplicável a eles a<br />

legitimação extraordinária.<br />

Sob forte influência <strong>do</strong>s estu<strong>do</strong>s alemães a respeito <strong>do</strong> tema, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m que a legitimação ativa nas ações que têm como objeto<br />

direito difuso ou coletivo é uma terceira espécie <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong>, chamada <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> autônoma para a condução <strong>do</strong> processo.<br />

Trata-se, segun<strong>do</strong> essa corrente <strong>do</strong>utrinária, <strong>de</strong> legitimação diversa da extraordinária porque não se po<strong>de</strong>m i<strong>de</strong>ntificar os titulares <strong>do</strong><br />

direito e na qual a lei elege <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s sujeitos para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rem o direito daqueles que não po<strong>de</strong>rão fazê-lo individualmente95.<br />

No tocante à tutela jurisdicional coletiva <strong>do</strong> direito individual homogêneo, a maior parte da corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a<br />

existência <strong>de</strong>ssa terceira espécie <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> acredita ser aplicável a legitimação extraordinária para explicar a legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s<br />

autores coletivos 96 . Sen<strong>do</strong> a in<strong>de</strong>terminação <strong>do</strong>s titulares e a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tutelá-los individualmente a justificativa <strong>de</strong> a<strong>do</strong>ção<br />

da legitimação autônoma para a condução <strong>do</strong> processo, é uma consequência natural a exclusão <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> legitimação nas<br />

ações coletivas que buscam a tutela <strong>de</strong> direito individual homogêneo.<br />

Nunca fui totalmente convenci<strong>do</strong> da necessida<strong>de</strong> da a<strong>do</strong>ção pelo sistema processual brasileiro <strong>de</strong>ssa terceira forma <strong>de</strong><br />

legitimação, ten<strong>do</strong> a impressão <strong>de</strong> que limitar a legitimação extraordinária a direitos individuais é apenas não admitir sua adaptação<br />

à <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s direitos transindividuais. É natural que a legitimação extraordinária tenha surgi<strong>do</strong> para a tutela <strong>de</strong> direitos individuais,<br />

mas essa origem não a impe<strong>de</strong> <strong>de</strong> atualmente também ser aplicável aos direitos transindividuais. Há <strong>do</strong>utrina nesse senti<strong>do</strong>,<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser extraordinária a legitimação ativa nas ações coletivas97.<br />

Seja como for, trata-se <strong>de</strong> questão meramente acadêmica, sem relevantes consequências práticas. O que mais importa – e isso é<br />

indiscutível, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da teoria a<strong>do</strong>tada – é que os legitima<strong>do</strong>s coletivos não são titulares <strong>do</strong> direito que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rão em<br />

juízo, e tais titulares não têm legitimida<strong>de</strong> ativa para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r seus direitos.<br />

A legitimida<strong>de</strong> ativa para ações coletivas encontra-se prevista pelo art. 82 <strong>do</strong> CDC e pelo art. 5.º da LACP. São diversos os<br />

legitima<strong>do</strong>s, <strong>de</strong> diferentes espécies, opção que multiplica a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s direitos coletivos em juízo.


11.4.2. Cidadão<br />

A legitimida<strong>de</strong> ativa <strong>do</strong> cidadão na tutela coletiva é limitada à ação popular, em <strong>de</strong>corrência da previsão contida no art. 1.º,<br />

caput, da Lei 4.717/1965 (LAP), não haven<strong>do</strong> qualquer indicação <strong>de</strong> tal legitimida<strong>de</strong> em leis subsequentes que versam sobre tutela<br />

coletiva, em especial os arts. 5.º da LACP e 82 <strong>do</strong> CDC. Ao menos no que toca à previsão legal expressa, realmente, o único texto<br />

legal que atribui legitimação ao cidadão é o art. 1.º da Lei 4.717/1965, que inclusive exclui outros sujeitos <strong>de</strong>ssa legitimação, salvo<br />

na excepcional hipótese <strong>de</strong> sucessão processual pelo Ministério Público, nos termos <strong>do</strong> art. 9.º da mesma lei.<br />

Segun<strong>do</strong> parcela da <strong>do</strong>utrina, a opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r foi clara em limitar a legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> cidadão à ação popular, ten<strong>do</strong><br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> que a experiência não teria logra<strong>do</strong> o êxito espera<strong>do</strong> e mesmo experimenta<strong>do</strong> em outros países98. Aponta-se para isso<br />

obstáculos multifacetários, <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m econômica, social, técnica, cultura, política e jurídica. Diante <strong>de</strong> tal quadro, o legisla<strong>do</strong>r<br />

enten<strong>de</strong>u que, em leis subsequentes à da ação popular, o i<strong>de</strong>al seria não só diversificar o rol <strong>de</strong> legitima<strong>do</strong>s, como excluir o cidadão<br />

<strong>de</strong> tal rol, o que efetivamente ocorreu até os dias atuais.<br />

Existe <strong>do</strong>utrina crítica a respeito <strong>de</strong>ssa limitação afirman<strong>do</strong> que o cidadão <strong>de</strong>veria ter uma legitimida<strong>de</strong> mais ampla 99 , haven<strong>do</strong><br />

inclusive parcela <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>, mesmo diante da atual configuração legislativa, a legitimida<strong>de</strong> ativa <strong>do</strong> cidadão para a<br />

propositura <strong>de</strong> qualquer ação coletiva, com fundamento nos princípios da inafastabilida<strong>de</strong> da jurisdição e no <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> processo<br />

legal100. No senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> ampliar a legitimação <strong>do</strong> cidadão <strong>de</strong> forma expressa, foram as sugestões <strong>de</strong> reforma legislativas frustradas,<br />

tanto na criação <strong>de</strong> um Código <strong>de</strong> Processo Civil Coletivo como na reforma da Lei da Ação Civil Pública.<br />

Interessante notar que, além <strong>de</strong> <strong>do</strong>utrina crítica a respeito <strong>de</strong>ssa ampliação, amparada na <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> particularida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> direito compara<strong>do</strong> e <strong>de</strong>sprezo <strong>do</strong>s graves problemas que a legitimação <strong>do</strong> cidadão gera na propositura da ação coletiva, em<br />

especial nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s 101 , existe outra corrente <strong>do</strong>utrinária que, ao invés <strong>de</strong> propugnar pela ampliação da legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

cidadão para outras ações coletivas, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> uma ampliação <strong>do</strong>s legitima<strong>do</strong>s à propositura da ação popular, com a inclusão <strong>de</strong><br />

pessoas jurídicas ou entida<strong>de</strong>s públicas no rol <strong>de</strong> legitima<strong>do</strong>s ativos 102 . Nesse senti<strong>do</strong>, por exemplo, a ação popular portuguesa, que<br />

prevê outros sujeitos além <strong>do</strong> cidadão como legitima<strong>do</strong>s ativos 103 .<br />

Ainda que se concor<strong>de</strong> que a ação popular tem, ao menos abstratamente, gran<strong>de</strong> importância sob a ótica <strong>do</strong>s escopos políticos<br />

<strong>do</strong> processo, incrementan<strong>do</strong> a participação popular <strong>de</strong> controle da administração pública por meio <strong>de</strong> ação judicial, é inegável que<br />

tal ação é privilégio <strong>de</strong> poucos, estan<strong>do</strong> concentrada fundamentalmente nas mãos <strong>de</strong> acadêmicos e opera<strong>do</strong>res <strong>do</strong> direito,<br />

serventuários públicos e políticos. Sem falar em sua utilização <strong>de</strong>turpada com o único e exclusivo objetivo <strong>de</strong> criar algum tipo <strong>de</strong><br />

embaraço a adversários políticos.<br />

A realida<strong>de</strong> mostrou que o cidadão genuíno ainda não tem um grau <strong>de</strong> cidadania suficiente para compreen<strong>de</strong>r e tampouco<br />

disposição para utilizar <strong>de</strong> maneira a<strong>de</strong>quada a ação popular. Nesse senti<strong>do</strong>, foi feliz o legisla<strong>do</strong>r em ampliar o rol <strong>de</strong> legitima<strong>do</strong>s<br />

coletivos em leis que se seguiram à da ação popular, ainda que se possa questionar <strong>do</strong> acerto na exclusão <strong>do</strong> cidadão <strong>de</strong>sse rol <strong>de</strong><br />

legitima<strong>do</strong>s. A substituição pura e simples <strong>do</strong>s legitima<strong>do</strong>s atuais pelo cidadão para todas as ações coletivas está fora <strong>de</strong> cogitação,<br />

po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> significar um retrocesso sem prece<strong>de</strong>ntes no campo da tutela coletiva.<br />

A mera inclusão <strong>do</strong> cidadão, como colegitima<strong>do</strong> para a propositura <strong>de</strong> ações coletivas com os <strong>de</strong>mais sujeitos previstos nos<br />

arts. 5.º da LACP e 82 <strong>do</strong> CDC, seria medida interessante, que po<strong>de</strong>ria inclusive funcionar como incentivo a uma maior<br />

participação <strong>do</strong> cidadão, sem colocar em risco as conquistas obtidas até o momento. De qualquer forma, essa ampliação ou<br />

modificação drástica da legitimida<strong>de</strong> ativa coletiva passa necessariamente por modificação legislativa, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong>, portanto, serem<br />

consi<strong>de</strong>radas apenas como <strong>de</strong> lege ferenda.<br />

A realida<strong>de</strong> legislativa atual cria duas limitações. Primeiro, é limitada ao cidadão a legitimida<strong>de</strong> ativa da ação popular,<br />

haven<strong>do</strong> entendimento sumula<strong>do</strong> que exclui a pessoa jurídica <strong>de</strong>ssa legitimida<strong>de</strong>104, também não se admitin<strong>do</strong> compor o polo<br />

ativo, ao menos não originariamente, Esta<strong>do</strong> membro da Fe<strong>de</strong>ração 105 . Segun<strong>do</strong>, a legitimação <strong>do</strong> cidadão é exclusiva <strong>de</strong>ssa espécie<br />

<strong>de</strong> ação coletiva.<br />

As hipóteses <strong>de</strong> cabimento da ação popular encontram-se previstas no art. 5.º, LXXIII, da CF/1988, sen<strong>do</strong> possível dividi-las<br />

em três: (a) anulação <strong>de</strong> ato lesivo ao patrimônio público ou <strong>de</strong> entida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que o Esta<strong>do</strong> participe; (b) anulação <strong>de</strong> ato lesivo à<br />

moralida<strong>de</strong> administrativa; (c) anulação <strong>de</strong> ato lesivo ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. No art. 1.º, caput, da<br />

Lei da Ação Popular, está consagrada a lesivida<strong>de</strong> ao patrimônio público como fundamento para a ação popular, enquanto o § 1.º<br />

<strong>do</strong> mesmo dispositivo conceitua o patrimônio público a ser protegi<strong>do</strong> como bens e direitos <strong>de</strong> valor econômico, artístico, estético,<br />

histórico ou turístico.<br />

Já se po<strong>de</strong> adiantar a amplitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong>rivada da reunião <strong>do</strong>s dispositivos legais menciona<strong>do</strong>s, sen<strong>do</strong> tranquilo o<br />

entendimento <strong>de</strong> que, por meio da ação popular, tutelam-se tanto os bens materiais que compõem o patrimônio público como<br />

também os bens imateriais. Ao prever a tutela <strong>do</strong> meio ambiente e <strong>do</strong> patrimônio histórico e cultural, o legisla<strong>do</strong>r passou a permitir,<br />

por meio da ação popular, a tutela <strong>de</strong> bens pertencentes não a uma pessoa jurídica <strong>de</strong> direito público específica, mas a toda a


coletivida<strong>de</strong>. Como bem ensina a <strong>do</strong>utrina, é tão lesiva ao patrimônio público a <strong>de</strong>struição <strong>de</strong> um prédio sem valor econômico, mas<br />

<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> relevância artística, como a alienação <strong>de</strong> um imóvel por preço vil, realizada por favoritismo 106 .<br />

Ainda que se admita e elogie a amplitu<strong>de</strong> atual <strong>de</strong> tutela obtenível por meio <strong>de</strong> ação popular, não se po<strong>de</strong> concordar com<br />

corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> seu cabimento para a tutela difusa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, como, por exemplo, a ação promovida contra a<br />

União, por meio <strong>do</strong> Ministério da Saú<strong>de</strong>, em razão <strong>de</strong> propaganda in<strong>de</strong>vida <strong>de</strong> cigarro107. A tentativa vem sen<strong>do</strong> corretamente<br />

rejeitada pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça 108 , que limita a ação popular aos valores constantes expressamente <strong>do</strong> texto<br />

constitucional, no qual não se inclui o direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Sen<strong>do</strong> a ação popular a única espécie <strong>de</strong> ação coletiva que admite a legitimida<strong>de</strong> ativa <strong>do</strong> cidadão, e não sen<strong>do</strong> essa espécie <strong>de</strong><br />

ação admissível no âmbito consumerista, conclui-se que o cidadão não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r, como autor, o direito coletivo consumerista.<br />

11.4.3. Ministério Público<br />

O estu<strong>do</strong> da legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Ministério Público para o ajuizamento das ações coletivas é <strong>de</strong> extrema importância para a tutela<br />

coletiva, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que, mesmo sem da<strong>do</strong>s estatísticos confiáveis, é praticamente unânime a opinião <strong>do</strong>utrinária <strong>de</strong> que o<br />

Ministério Público é o legitima<strong>do</strong> mais atuante, responsável pela propositura da maioria das ações coletivas109. Essa é uma<br />

constatação empírica, e as razões <strong>de</strong> ser <strong>de</strong>ssa realida<strong>de</strong> divi<strong>de</strong>m a comunida<strong>de</strong> jurídica, por vezes em posições radicalmente<br />

antagônicas.<br />

Defen<strong>de</strong>r <strong>de</strong> forma radical essa maior presença <strong>do</strong> Ministério Público no polo ativo <strong>de</strong> ações coletivas como <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> um<br />

maior preparo e disposição, ou <strong>de</strong> um in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> intrometimento em busca <strong>do</strong>s holofotes e <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r, é apequenar o <strong>de</strong>bate.<br />

Naturalmente, é fonte <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r relevante ao Ministério Público não só a legitimida<strong>de</strong> ativa para a propositura da ação coletiva, mas<br />

sua pre<strong>do</strong>minância na propositura <strong>de</strong> tais ações. Por outro la<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ve-se reconhecer que os <strong>de</strong>mais legitima<strong>do</strong>s têm pequena<br />

participação – que na realida<strong>de</strong> vem aumentan<strong>do</strong> –, em razão <strong>de</strong> sua falta <strong>de</strong> preparo e disposição na propositura das ações<br />

coletivas. Enten<strong>do</strong> que o aprimoramento <strong>de</strong> nossa <strong>de</strong>mocracia, com um aumento lento, mas progressivo, da noção <strong>de</strong> cidadania e <strong>de</strong><br />

participação social por meio <strong>do</strong> processo coletivo ten<strong>de</strong> a diminuir a soberania <strong>do</strong> Ministério Público, passan<strong>do</strong> a existir outros<br />

legitima<strong>do</strong>s tão prepara<strong>do</strong>s e dispostos quanto os promotores <strong>de</strong> justiça ao ajuizamento da ação coletiva.<br />

A legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Ministério Público para o ajuizamento das ações coletivas está expressamente consagrada nos arts. 5.º, I da<br />

Lei 7.347/1985 (LACP) e 82, I, da Lei 8.078/1990 (CDC). Esses dispositivos, entretanto, não exaurem o tema, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser<br />

interpreta<strong>do</strong>s à luz das funções institucionais constitucionalmente atribuídas ao Ministério Público por meio <strong>do</strong> art. 129 da CF.<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 129, III, da CF, é função institucional <strong>do</strong> Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública,<br />

para a proteção <strong>do</strong> patrimônio público e social, <strong>do</strong> meio ambiente e <strong>de</strong> outros interesses difusos e coletivos. A expressa previsão<br />

constitucional <strong>de</strong> tutela <strong>do</strong>s direitos difusos e coletivos permite a conclusão <strong>de</strong> que, para a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong>sses direitos em juízo, o<br />

Ministério Público não tem qualquer limitação em sua atuação. Qualquer espécie <strong>de</strong> direito que seja tutelável por meio <strong>de</strong> ação<br />

coletiva po<strong>de</strong>rá ser protegi<strong>do</strong> no caso concreto pelo Ministério Público, não se aplican<strong>do</strong> a esse legitima<strong>do</strong> ativo a regra da<br />

“pertinência temática”110. O texto constitucional é suficientemente claro ao se valer <strong>do</strong> termo “outros” para <strong>de</strong>signar to<strong>do</strong> e<br />

qualquer direito coletivo ou difuso.<br />

Na realida<strong>de</strong>, o tema é totalmente pacifica<strong>do</strong> no tocante à <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s direitos difusos, em razão da in<strong>de</strong>terminabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s<br />

sujeitos que serão beneficia<strong>do</strong>s com a tutela jurisdicional. Não se po<strong>de</strong> dizer o mesmo no tocante aos direitos coletivos, cujos<br />

titulares (grupo, classe ou categoria <strong>de</strong> pessoas) são forma<strong>do</strong>s por sujeitos in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s, mas <strong>de</strong>termináveis. Nesse caso, segun<strong>do</strong><br />

parcela da <strong>do</strong>utrina, caberá ao Ministério Público, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> suas tradicionais limitações institucionais no processo civil, somente a<br />

propositura <strong>de</strong> ações coletivas que <strong>de</strong> alguma forma estejam amparadas em interesse social 111 , haven<strong>do</strong> entendimento, inclusive,<br />

que assemelha a legitimida<strong>de</strong> nesse caso àquela existente na tutela <strong>do</strong>s direitos individuais homogêneos 112 .<br />

Pessoalmente não enten<strong>do</strong> viável a limitação da legitimida<strong>de</strong> ativa <strong>do</strong> Ministério Público na tutela <strong>do</strong>s direitos coletivos em<br />

razão <strong>do</strong> texto constitucional. É inegável que, ao prever expressamente entre as atribuições funcionais <strong>do</strong> Ministério Público a<br />

propositura <strong>de</strong> ações na tutela <strong>de</strong> direitos difusos e coletivos, o legisla<strong>do</strong>r constituinte afasta a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquer<br />

interpretação limitativa.<br />

Um pouco mais polêmica é a legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Ministério Público na <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s direitos individuais homogêneos, até porque<br />

não existe no art. 129 da CF uma expressa previsão legal que trate <strong>de</strong>ssa legitimida<strong>de</strong>, como ocorre com os direitos difusos e<br />

coletivos. A simples exclusão <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Ministério Público pela ausência <strong>do</strong>s direitos individuais homogêneos <strong>do</strong> art. 129,<br />

III, da CF <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ra que o rol previsto em tal dispositivo legal é meramente exemplificativo, como fica claro da previsão<br />

contida no inciso IX <strong>do</strong> menciona<strong>do</strong> dispositivo, ao consi<strong>de</strong>rar função institucional <strong>do</strong> Ministério Público o exercício <strong>de</strong> outras<br />

funções não previstas expressamente nesse artigo, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que compatíveis com sua finalida<strong>de</strong>. A<strong>de</strong>mais, não custa lembrar que a<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s direitos individuais homogêneos por meio <strong>de</strong> ação coletiva só foi consagrada em nosso or<strong>de</strong>namento jurídico no Código


<strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 1990, e nossa Constituição Fe<strong>de</strong>ral data <strong>de</strong> <strong>do</strong>is anos antes (1988)113.<br />

A questão, portanto, não é <strong>de</strong>finir se existe ou não a legitimação <strong>do</strong> Ministério Público na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> direitos individuais<br />

homogêneos em razão <strong>de</strong> previsão constitucional, mas <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir em quais limites se admitirá essa legitimida<strong>de</strong> toman<strong>do</strong>-se por<br />

conta a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quá-la às finalida<strong>de</strong>s institucionais <strong>do</strong> Ministério Público. Mais uma vez enten<strong>do</strong> que a virtu<strong>de</strong> não está<br />

nas soluções extremistas. Sen<strong>do</strong> incorreta a tese que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a ilegitimida<strong>de</strong> nesse caso, tampouco <strong>de</strong>ve se admitir como correta a<br />

tese que advoga a legitimida<strong>de</strong> ampla e irrestrita, qualquer que seja a natureza <strong>do</strong> direito individual homogêneo.<br />

Não obstante <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça nesse senti<strong>do</strong> 114 , a meu ver não é razoável o entendimento <strong>de</strong> que,<br />

somente por se tratar <strong>de</strong> uma ação coletiva, to<strong>do</strong> e qualquer direito veicula<strong>do</strong> já tenha relevância social suficiente a permitir a<br />

propositura da ação pelo Ministério Público. Apesar da opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r por tratar processualmente <strong>de</strong> forma coletiva alguns<br />

direitos materiais essencialmente individuais, é <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar a realida<strong>de</strong> equiparar todas as diferentes espécies <strong>de</strong> direitos<br />

individuais homogêneos reputan<strong>do</strong>-os como <strong>de</strong>tentores <strong>de</strong> repercussão social.<br />

Nem mesmo o fundamento processual <strong>de</strong> que a ação coletiva em qualquer hipótese gera economia processual e harmonização<br />

<strong>de</strong> julga<strong>do</strong>s, valores nitidamente associa<strong>do</strong>s com o interesse social da melhor qualida<strong>de</strong> da prestação jurisdicional115, são<br />

suficientes para convencer <strong>do</strong> acerto da tese. Se assim o fosse, to<strong>do</strong> litisconsórcio seria necessário, bem como as intervenções <strong>de</strong><br />

terceiros seriam obrigatórias, da<strong>do</strong> que, apesar <strong>de</strong> em extensão significativamente menor, nesses casos também se obtém economia<br />

processual macroscópica e harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s.<br />

Concor<strong>do</strong> com a <strong>do</strong>utrina que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a natureza <strong>de</strong> interesse social <strong>do</strong>s direitos difusos e coletivos em razão <strong>de</strong> sua<br />

transindividualida<strong>de</strong> e indivisibilida<strong>de</strong>, o que já é o suficiente para que to<strong>do</strong> direito <strong>de</strong>ssas espécies seja consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong><br />

indisponível 116 . Dessa maneira, o art. 129, III, da CF, com a previsão <strong>de</strong> ampla legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Ministério Público na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong><br />

qualquer direito difuso ou coletivo, é plenamente compatível com o art. 127, caput, da CF, aten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> plenamente a função<br />

institucional prevista constitucionalmente. Reforço, portanto, a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que, nos direitos difusos e coletivos, não existe “pertinência<br />

temática”, sen<strong>do</strong> irrelevantes as circunstâncias <strong>do</strong> caso concreto, entendimento compartilha<strong>do</strong> pela jurisprudência <strong>do</strong>s tribunais<br />

superiores 117 .<br />

Segun<strong>do</strong> entendimento <strong>do</strong>utrinário 118 e jurispru<strong>de</strong>ncial 119 amplamente majoritário, a legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> parquet na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong><br />

direito individual homogêneo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> duas circunstâncias alternativas: (a) direito indisponível; (b) direito disponível que, por<br />

sua importância e/ou extensão, tenha repercussão social. Registre-se a existência <strong>de</strong> corrente <strong>do</strong>utrinária minoritária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a<br />

legitimida<strong>de</strong> somente na hipótese <strong>de</strong> direito individual homogêneo indisponível, nos termos <strong>do</strong> art. 127, caput, da CF120. Se<br />

algumas dificulda<strong>de</strong>s práticas existem na distinção entre direito disponível e direito indisponível, estas se potencializam na aferição<br />

concreta da relevância social exigida na hipótese <strong>de</strong> direito individual homogêneo disponível. De qualquer forma, é corrente a lição<br />

<strong>do</strong>utrinária <strong>de</strong> que a relevância social po<strong>de</strong> se manifestar pela natureza <strong>do</strong> dano (p. ex., à saú<strong>de</strong>, à segurança, ambiental); pelo<br />

número significativo <strong>de</strong> lesa<strong>do</strong>s; pelo interesse social no funcionamento <strong>de</strong> um sistema econômico, social ou jurídico (p. ex.,<br />

questões referentes a servi<strong>do</strong>res públicos, poupa<strong>do</strong>res, segura<strong>do</strong>s) 121 .<br />

O posicionamento foi reafirma<strong>do</strong> pelo Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral:<br />

“A tutela <strong>do</strong>s direitos e interesses <strong>de</strong> beneficiários <strong>do</strong> seguro DPVAT – Danos Pessoais Causa<strong>do</strong>s por Veículos Automotores <strong>de</strong> Via<br />

Terrestre, nos casos <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização paga, pela segura<strong>do</strong>ra, em valor inferior ao <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> no art. 3º da Lei 6.914/1974, reveste-se<br />

<strong>de</strong> relevante natureza social (interesse social qualifica<strong>do</strong>), <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a conferir legitimida<strong>de</strong> ativa ao Ministério Público para <strong>de</strong>fendêlos<br />

em juízo mediante ação civil coletiva” (STF – Tribunal Pleno – RE 631.111/GO – rel. Min. Teori Zavascki – 06 e 07.08.2014 –<br />

Informativo 753).<br />

11.4.4. Pessoas jurídicas da Administração Pública<br />

A legitimida<strong>de</strong> ativa para as ações coletivas da União, Esta<strong>do</strong>, Município e <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral está prevista nos arts. 5.º, III da<br />

Lei 7.347/1985 (LACP) e 82, II da Lei 8.078/1990 (CDC), enquanto nos arts. 5.º, IV da Lei 7.347/1985 (LACP) e 82, III, da Lei<br />

8.078/1990 (CDC) encontra-se a legitimida<strong>de</strong> ativa das empresas públicas, autarquias, fundações e socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> economia mista.<br />

Os dispositivos legais, portanto, versam sobre a legitimida<strong>de</strong> ativa das pessoas jurídicas que compõem a administração pública,<br />

tanto da administração direta como da indireta.<br />

Era <strong>de</strong> se esperar que essas pessoas jurídicas fossem frequentes propositoras <strong>de</strong> ações coletivas, pois em uma socieda<strong>de</strong> séria<br />

supõe-se que o Esta<strong>do</strong> tenha to<strong>do</strong> o interesse no respeito aos direitos transindividuais. A realida<strong>de</strong>, entretanto, não é bem essa,<br />

notan<strong>do</strong>-se a presença <strong>de</strong>sses sujeitos com muito maior frequência no polo passivo da <strong>de</strong>manda judicial, acusa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> violação <strong>de</strong><br />

direitos que teoricamente <strong>de</strong>veriam ser os maiores interessa<strong>do</strong>s em preservar122. De qualquer forma, sempre que preten<strong>de</strong>ram<br />

modificar esse para<strong>do</strong>xo, terão legitimida<strong>de</strong> ativa garantida por lei.<br />

No tocante às pessoas jurídicas <strong>de</strong> direito público da administração direta, existe interessante <strong>de</strong>bate <strong>do</strong>utrinário a respeito da


exigência da pertinência temática, sen<strong>do</strong> necessário se <strong>de</strong>limitar <strong>de</strong> forma correta a discussão a respeito <strong>do</strong> tema.<br />

Para parcela da <strong>do</strong>utrina, esses sujeitos têm legitimida<strong>de</strong> ativa para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r direitos quan<strong>do</strong> sua proteção se revela socialmente<br />

útil e necessária, sen<strong>do</strong> dispensável a análise concreta entre a vinculação <strong>do</strong>s interesses próprios da pessoa jurídica <strong>de</strong> direito<br />

público e o direito <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong> em juízo 123 . A <strong>do</strong>utrina majoritária, entretanto, enten<strong>de</strong> pela aplicação <strong>do</strong> requisito da pertinência<br />

temática para as pessoas jurídicas <strong>de</strong> direito público, ainda que da administração direta, exigin<strong>do</strong> uma ligação entre o interesse<br />

<strong>de</strong>fendi<strong>do</strong> em juízo e os limites territoriais <strong>de</strong> sua atuação ou suas finalida<strong>de</strong>s institucionais 124 .<br />

É interessante observar que gran<strong>de</strong> parte da <strong>do</strong>utrina que afirma existir a exigência <strong>de</strong> pertinência temática para os sujeitos ora<br />

analisa<strong>do</strong>s fundamentam seu entendimento na impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ente público litigar na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> interesses que não digam<br />

respeito à sua área territorial <strong>de</strong> atuação 125 . Assim, não teria legitimida<strong>de</strong> ativa um Município para ingressar com ação coletiva que<br />

só traga benefícios a consumi<strong>do</strong>res localiza<strong>do</strong>s em outro Município, como um Esta<strong>do</strong> não teria legitimida<strong>de</strong> ativa para ingressar<br />

com ação coletiva em favor <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res <strong>do</strong>micilia<strong>do</strong>s em outro Esta<strong>do</strong> da fe<strong>de</strong>ração.<br />

Enten<strong>do</strong> que existe uma in<strong>de</strong>vida confusão entre diferentes condições da ação. A pertinência temática exige a existência <strong>de</strong><br />

uma relação entre o interesse da pessoa jurídica <strong>de</strong> direito público e o direito tutela<strong>do</strong> em juízo, e, nesses termos, consi<strong>de</strong>ro que não<br />

se po<strong>de</strong> exigir tal requisito das pessoas jurídicas <strong>de</strong> direito público da administração direta. Se o objetivo final da União, Esta<strong>do</strong>s,<br />

Municípios e <strong>do</strong> Distrito Fe<strong>de</strong>ral é prover o bem comum, favorecen<strong>do</strong> os administra<strong>do</strong>s, não parece razoável criar uma limitação no<br />

tocante à legitimação ativa nas ações coletivas. Isso não significa que, fora <strong>do</strong>s limites territoriais <strong>de</strong> sua atuação, possa se admitir a<br />

existência <strong>de</strong> interesse <strong>de</strong> agir <strong>de</strong>sses sujeitos. Concor<strong>do</strong> que <strong>de</strong>va existir uma limitação territorial <strong>de</strong> atuação, mas nesse caso não<br />

vejo tal limitação <strong>de</strong>corrente da pertinência temática, matéria afeta à legitimida<strong>de</strong>, mas sim da falta <strong>de</strong> interesse <strong>de</strong> agir126.<br />

A distinção entre pertinência temática e limitação territorial, ainda que não <strong>de</strong>corra <strong>do</strong>s fundamentos apresenta<strong>do</strong>s, não é<br />

estranha à parcela da <strong>do</strong>utrina que enten<strong>de</strong> corretamente pela ausência da exigência da pertinência temática e pela existência <strong>de</strong><br />

uma limitação territorial para a atuação das pessoas jurídicas <strong>de</strong> direito público 127 . Há, inclusive, <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça nesse senti<strong>do</strong> 128 .<br />

No tocante às pessoas jurídicas – públicas ou privadas – que compõem a administração indireta, enten<strong>do</strong> que, se seus objetivos<br />

imediatos são direciona<strong>do</strong>s para <strong>de</strong>terminadas áreas, o que <strong>de</strong>limita sua esfera <strong>de</strong> atuação <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r público, é natural que se<br />

exija não só a vinculação ao território <strong>de</strong> sua atuação, como também a pertinência temática 129 . Não teria muito senti<strong>do</strong>, por<br />

exemplo, admitir que uma empresa pública fe<strong>de</strong>ral voltada à exploração <strong>do</strong> petróleo <strong>do</strong> pré-sal ingresse com ação coletiva<br />

buscan<strong>do</strong> a tutela <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res bancários.<br />

Conforme já tive a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r, quan<strong>do</strong> da análise da legitimida<strong>de</strong> ativa da Defensoria Pública, enten<strong>do</strong> que o<br />

disposto no art. 82, III da Lei 8.078/1990 (CDC), ao prever a legitimida<strong>de</strong> das entida<strong>de</strong>s e órgãos da administração pública, ainda<br />

que sem personalida<strong>de</strong> jurídica, seja aplicável para todas as espécies <strong>de</strong> direitos coletivos lato sensu. Por essa razão, parece<br />

aceitável a legitimação ativa <strong>do</strong> PROCON, que, apesar <strong>de</strong> não ter personalida<strong>de</strong> jurídica própria, tem personalida<strong>de</strong> judiciária, o<br />

que já é o suficiente para admiti-lo no rol <strong>do</strong>s legitima<strong>do</strong>s ativos <strong>de</strong> ações coletivas.<br />

Por fim, cumpre ressaltar que essas pessoas jurídicas da administração pública, sempre que se valerem <strong>de</strong> uma ação coletiva,<br />

não estarão em juízo em nome próprio na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> interesse próprio. Significa que, sen<strong>do</strong> ordinária a legitimação <strong>de</strong>ssa pessoa<br />

jurídica, ou seja, estan<strong>do</strong> em juízo em nome próprio na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> interesse próprio, a ação será individual, e, nesse caso, o<br />

postulante não terá os benefícios concedi<strong>do</strong>s ao autor <strong>de</strong> uma ação coletiva.<br />

11.4.5.<br />

Associação<br />

11.4.5.1.<br />

Introdução<br />

A legitimida<strong>de</strong> ativa da associação está consagrada no art. 5.º, V, da Lei 7.347/1985 e no art. 82, IV da Lei 8.078/1990, sen<strong>do</strong><br />

entendimento corrente na <strong>do</strong>utrina e jurisprudência a legitimação das associações para todas as espécies <strong>de</strong> direitos tutela<strong>do</strong>s no<br />

microssistema coletivo. Dessa forma, po<strong>de</strong>rão propor ações coletivas na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> direitos difusos, coletivos e individuais<br />

homogêneos, ainda que seja mais comum sua atuação nos <strong>do</strong>is últimos casos.<br />

Existem três requisitos cumulativos exigi<strong>do</strong>s pelos arts. 5.º, V, a e b, da Lei 7.347/1985 e art. 82, IV, da Lei 8.078/1990: (a)<br />

constituição nos termos da lei civil; (b) existência jurídica há pelo menos um ano; e (c) pertinência temática.<br />

Em equivocada interpretação <strong>do</strong> art. 5º, XXI, da CF, o Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong>cidiu que as associações <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong><br />

autorização expressa <strong>de</strong> seus associa<strong>do</strong>s para a propositura da ação coletiva, o que po<strong>de</strong> ocorrer individualmente por manifestação<br />

expressa <strong>de</strong> seus associa<strong>do</strong>s ou por aprovação da propositura da ação em assembleia geral130.<br />

Infelizmente, como já era <strong>de</strong> se esperar, a equivocada <strong>de</strong>cisão, proferida em recurso especial submeti<strong>do</strong> a julgamento <strong>de</strong><br />

recurso repetitivo, logo começou a ser utilizada como razão <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir a questão no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, que passou para<br />

fins <strong>de</strong> atuação da associação no polo ativo da ação coletiva a autorização expressa <strong>de</strong> seus associa<strong>do</strong>s. Interessante notar que ainda


existem <strong>de</strong>cisões daquele tribunal, mesmo posteriores ao prece<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, que continuam a enten<strong>de</strong>r que é<br />

<strong>de</strong>snecessária autorização expressa <strong>do</strong>s associa<strong>do</strong>s.<br />

11.4.5.2.<br />

Constituição há pelo menos um ano<br />

Os <strong>do</strong>is primeiros requisitos são trata<strong>do</strong>s como se fossem um só, quan<strong>do</strong> na realida<strong>de</strong> são requisitos diferentes, mas a<br />

existência <strong>de</strong> um <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> inexoravelmente <strong>do</strong> preenchimento <strong>do</strong> outro. Significa que, antes <strong>de</strong> tu<strong>do</strong>, a associação <strong>de</strong>ve ser<br />

<strong>de</strong>vidamente registrada perante o órgão responsável (Registro Civil <strong>de</strong> Pessoas Jurídicas, nos termos <strong>do</strong> art. 45 <strong>do</strong> CC e arts. 114 e<br />

119 da LRP), <strong>de</strong> forma que uma associação sem o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> registro cartorial não po<strong>de</strong>rá jamais propor ação coletiva. Conforme<br />

ensina a melhor <strong>do</strong>utrina, a exigência legal tem como objetivo evitar a constituição oportunista <strong>de</strong> associações com o propósito<br />

exclusivo <strong>de</strong> propor <strong>de</strong>terminadas ações coletivas131.<br />

O prazo <strong>de</strong> pelo menos um ano, exigi<strong>do</strong> da constituição da associação para permitir seu ingresso com ação coletiva é conta<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>ssa constituição jurídica, perfeita e acabada. Registre-se a acertada opinião <strong>do</strong>utrinária no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que, excepcionalmente, essa<br />

condição da ação passe a existir durante o processo, não haven<strong>do</strong> senti<strong>do</strong> na extinção <strong>do</strong> processo, por carência da ação, se no<br />

momento <strong>de</strong> análise das condições da ação já tiver transcorri<strong>do</strong> um ano da constituição da associação, condição que não estava<br />

preenchida no momento da propositura da <strong>de</strong>manda. Seja em aplicação <strong>do</strong> art. 493 <strong>do</strong> Novo CPC 132 , seja em respeito aos princípios<br />

da economia processual e efetivida<strong>de</strong> da jurisdição, como já reconheceu o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça 133 , essa excepcional forma<br />

<strong>de</strong> legitimação superveniente <strong>de</strong>ve realmente ser admitida.<br />

A exigência <strong>de</strong> existência jurídica há pelo menos um ano, entretanto, po<strong>de</strong> ser excepcionada, nos termos <strong>do</strong>s arts. 5.º, § 4º, da<br />

LACP, e 82, § 1°, <strong>do</strong> CDC 134 . Aparentemente são <strong>do</strong>is requisitos alternativos que justificam a legitimida<strong>de</strong> ativa <strong>de</strong> associação com<br />

menos <strong>de</strong> um ano <strong>de</strong> existência jurídica.<br />

O primeiro requisito é o manifesto interesse social que envolva a causa, que seria evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong>, segun<strong>do</strong> os dispositivos legais<br />

ora comenta<strong>do</strong>s, pela dimensão ou característica <strong>do</strong> dano. Provavelmente por consi<strong>de</strong>rar que toda e qualquer ação coletiva contém<br />

um manifesto interesse social, o legisla<strong>do</strong>r achou por bem qualificar tal circunstância, valen<strong>do</strong>-se, para tanto, <strong>de</strong> conceitos jurídicos<br />

abertos e in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s. O que efetivamente <strong>de</strong>ve se compreen<strong>de</strong>r por dimensão e características <strong>do</strong> dano?<br />

Tu<strong>do</strong> leva a crer que o legisla<strong>do</strong>r tenha consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> o aspecto subjetivo e objetivo <strong>do</strong> dano suporta<strong>do</strong> para justificar a exceção<br />

à regra legal ora analisada.<br />

A dimensão <strong>do</strong> dano, portanto, diz respeito ao número <strong>de</strong> sujeitos que o suportam, e o legisla<strong>do</strong>r <strong>de</strong>u a enten<strong>de</strong>r que danos<br />

coletivos <strong>de</strong> menor extensão, porque limita<strong>do</strong>s a pequeno grupo <strong>de</strong> pessoas e/ou a poucos indivíduos, não justificariam a exceção<br />

ora analisada. Por esse raciocínio, to<strong>do</strong> direito difuso justificaria a aplicação <strong>do</strong>s arts. 5.º, § 4.º, da LACP, e 82, § 1.º, <strong>do</strong> CDC,<br />

consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> sua titularida<strong>de</strong> pela coletivida<strong>de</strong>. A análise restaria limitada aos direitos coletivos e individuais homogêneos.<br />

A característica <strong>do</strong> dano como requisito legitima<strong>do</strong>r da exclusão da exigência legal ora analisada diz respeito ao aspecto<br />

objetivo <strong>do</strong> dano, parecen<strong>do</strong> o legisla<strong>do</strong>r ter cria<strong>do</strong> uma gradação <strong>de</strong> danos, <strong>de</strong> forma que apenas naqueles mais sérios as<br />

associações po<strong>de</strong>riam litigar mesmo antes <strong>de</strong> existirem juridicamente por um ano. Novamente, nas hipóteses <strong>de</strong> direitos difusos,<br />

dada a indisponibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> direito, será difícil criar qualquer tipo <strong>de</strong> gradação <strong>de</strong> dano. O que é pior, a poluição <strong>de</strong> um rio<br />

(violação <strong>do</strong> meio ambiente) ou a <strong>de</strong>struição <strong>de</strong> um prédio <strong>do</strong> século XVIII (patrimônio histórico e cultural)? Somente nos direitos<br />

coletivos e individuais homogêneos seria possível estabelecer uma gradação <strong>de</strong> relevância, ainda assim com alguma dificulda<strong>de</strong>.<br />

O segun<strong>do</strong> requisito previsto pelos arts. 5.º, § 4.º, da LACP, e 82, § 1.º, <strong>do</strong> CDC é a relevância <strong>do</strong> bem jurídico a ser protegi<strong>do</strong><br />

que serve para <strong>de</strong>mandas que não versam sobre dano. Ainda que sem a natureza reparatória própria <strong>do</strong> primeiro requisito, o<br />

legisla<strong>do</strong>r, ao indicar a relevância <strong>do</strong> bem jurídico a ser tutela<strong>do</strong>, cria uma gradação <strong>de</strong> relevância entre os bens da vida que po<strong>de</strong>m<br />

ser tutela<strong>do</strong>s por meio da ação coletiva, permitin<strong>do</strong> a legitimida<strong>de</strong> <strong>de</strong> associação com menos <strong>de</strong> um ano <strong>de</strong> existência jurídica<br />

somente naqueles <strong>de</strong> maior importância e/ou relevância social. Novamente, e pelas mesmas razões já expostas, o requisito <strong>de</strong>ve<br />

ficar limita<strong>do</strong> aos direitos coletivos e individuais homogêneos.<br />

Interessante exemplo a respeito <strong>do</strong> tema na seara consumerista foi da<strong>do</strong> recentemente pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> justiça ao<br />

afastar a exigência legal ora analisada na propositura <strong>de</strong> ação civil pública que tinha como objeto obrigar o fornece<strong>do</strong>r a informar o<br />

consumi<strong>do</strong>r sobre a inexistência <strong>de</strong> glúten nos alimentos:<br />

“<strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r e processual civil. Dispensa <strong>do</strong> requisito temporal para a legitimação ativa <strong>de</strong> associação em ação civil<br />

pública. É dispensável o requisito temporal (pré-constituição há mais <strong>de</strong> um ano) para associação ajuizar ação civil pública quan<strong>do</strong> o<br />

bem jurídico tutela<strong>do</strong> for a prestação <strong>de</strong> informações ao consumi<strong>do</strong>r sobre a existência <strong>de</strong> glúten em alimentos. De fato, o STJ, por<br />

ocasião <strong>do</strong> julgamento <strong>do</strong> REsp 1.479.616-GO (Terceira Turma, DJe 16/4/2015), consignou que: ‘atualmente, o único tratamento<br />

eficaz [para a <strong>do</strong>ença celíaca] é uma dieta isenta <strong>de</strong> glúten durante toda a vida, pois não existem medicamentos capazes <strong>de</strong> impedir<br />

as lesões e que o corpo ataque o intestino na presença <strong>de</strong> glúten. Daí a importância da informação nas embalagens <strong>de</strong> alimentos


comercializa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> que é ‘isento <strong>de</strong> glúten’ ou qual a quantida<strong>de</strong> ministrada da proteína. Isso porque, se porventura uma pessoa com<br />

<strong>do</strong>ença celíaca consumir alimentos com glúten ou traços <strong>de</strong> glúten, a ingestão po<strong>de</strong>rá provocar uma inflamação crônica apta a<br />

impedir a absorção <strong>de</strong> nutrientes. Além <strong>do</strong> art. 31 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, que estatui uma ‘obrigação geral <strong>de</strong><br />

informação’ ao consumi<strong>do</strong>r, a Lei n. 10.674/2003 prevê, em seu art. 1.º, que ‘To<strong>do</strong>s os alimentos industrializa<strong>do</strong>s <strong>de</strong>verão conter em<br />

seu rótulo e bula, obrigatoriamente, as inscrições ‘contém Glúten’ ou ‘não contém Glúten’, conforme o caso’. Dessa forma, por<br />

versar a ação sobre direitos individuais homogêneos, a solução <strong>do</strong> feito não se limita aos membros da associação autora, haja vista<br />

abranger to<strong>do</strong>s os consumi<strong>do</strong>res submeti<strong>do</strong>s às mesmas condições <strong>de</strong>scritas nos autos. Portanto, muito embora o art. 5.º, inciso V,<br />

‘a’, da Lei n. 7.347/1985 disponha que a associação <strong>de</strong>verá estar constituída há pelo menos 1 (um) ano, nos termos da lei civil, o<br />

requisito formal po<strong>de</strong> ser dispensa<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> presente, como na hipótese, interesse social <strong>de</strong> um grupo in<strong>de</strong>terminável <strong>de</strong><br />

interessa<strong>do</strong>s, como prevê o parágrafo 4.º <strong>do</strong> referi<strong>do</strong> dispositivo legal, bem como o art. 82, § 1.º, <strong>do</strong> CDC. O Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça […] já reconheceu a legitimida<strong>de</strong> <strong>de</strong> associação que complete um ano <strong>de</strong> existência no curso <strong>do</strong> processo, conforme o<br />

princípio da economia processual […]. A<strong>de</strong>mais, […] o caso concreto versa acerca <strong>de</strong> interesses individuais homogêneos,<br />

conheci<strong>do</strong>s como transindividuais, referin<strong>do</strong>-se a um grupo <strong>de</strong>terminável <strong>de</strong> pessoas, no caso, os <strong>do</strong>entes celíacos, cujos interesses<br />

exce<strong>de</strong>m sobremaneira o âmbito estritamente individual, ten<strong>do</strong> em vista as circunstâncias <strong>de</strong> fato <strong>de</strong> origem comum (incolumida<strong>de</strong><br />

da saú<strong>de</strong>). Assim, a relação consumerista subjacente e divisível é pertinente a to<strong>do</strong> indivíduo que adquira produtos alimentícios no<br />

merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo e que tenha suscetibilida<strong>de</strong> à referida proteína. Com efeito, atualmente se admite que as ações coletivas,<br />

quan<strong>do</strong> propostas por uma associação, longa manus da coletivida<strong>de</strong>, pressupõem uma legitimação prévia, oriunda <strong>do</strong> fim<br />

institucional relativo à tutela <strong>de</strong> interesses difusos (meio ambiente, saú<strong>de</strong> pública, consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ntre outros), cujos interesses <strong>do</strong>s<br />

seus associa<strong>do</strong>s po<strong>de</strong>m se sobrepor ao requisito da constituição temporal, formalida<strong>de</strong> superável em virtu<strong>de</strong> da dimensão <strong>do</strong> dano ou<br />

relevância <strong>do</strong> bem jurídico a ser protegi<strong>do</strong> e cuja <strong>de</strong>fesa coletiva é ínsita à própria razão <strong>de</strong> ser da requerente. Em verda<strong>de</strong>, cumpre[-<br />

se] um mandamento constitucional, pois o art. 196 prevê que a ‘saú<strong>de</strong> é direito <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s e <strong>de</strong>ver <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, garanti<strong>do</strong> mediante<br />

políticas sociais e econômicas que visem à redução <strong>do</strong> risco <strong>de</strong> <strong>do</strong>enças e <strong>de</strong> outros agravos e ao acesso universal e igualitário às<br />

ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação’. Sob a ótica <strong>do</strong> direito público, o risco da falta <strong>de</strong> informação a que está<br />

submeti<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r celíaco, hipervulnerável por natureza, também já foi objeto <strong>de</strong> julgamento nesta Corte no REsp n. 586.316<br />

(DJe 19/3/2009), <strong>de</strong> relatoria <strong>do</strong> Ministro Herman Benjamim, que consi<strong>de</strong>rou pertinente o pedi<strong>do</strong> formula<strong>do</strong> pelo PROCON quanto à<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> advertência <strong>do</strong>s malefícios <strong>do</strong> glúten em embalagens <strong>de</strong> produtos alimentícios, sob pena <strong>de</strong> sanções administrativas.<br />

Por fim, consigne-se que a concessão da legitimida<strong>de</strong> às associações e entes afins para a propositura da ação civil pública visa, em<br />

última análise, mobilizar a socieda<strong>de</strong> civil para participar <strong>de</strong> questões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, coadunan<strong>do</strong>-se com a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Esta<strong>do</strong><br />

Democrático <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>, ao facilitar, por meio <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário, a discussão <strong>de</strong> eventual interesse público, amplian<strong>do</strong> o acesso da<br />

socieda<strong>de</strong> civil à Justiça. Com efeito, é fundamental assegurar os direitos <strong>de</strong> informação e segurança ao consumi<strong>do</strong>r celíaco, que está<br />

adstrito à dieta isenta <strong>de</strong> glúten, sob pena <strong>de</strong> graves riscos à saú<strong>de</strong>, o que, em última análise, tangencia a garantia a uma vida digna”<br />

(Informativo 591/STJ, 2.ª Turma, REsp 1.600.172/GO, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 15.09.2016, DJe 11.10.2016).<br />

11.4.5.3.<br />

Pertinência temática<br />

O terceiro requisito exigi<strong>do</strong> para a legitimida<strong>de</strong> ativa das associações é a chamada “pertinência temática”, significan<strong>do</strong> que<br />

<strong>de</strong>va existir uma vinculação entre as finalida<strong>de</strong>s institucionais da associação, consagradas em seu estatuto social, e a espécie <strong>de</strong><br />

bem jurídico tutela<strong>do</strong> em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> ação coletiva.<br />

Segun<strong>do</strong> a melhor <strong>do</strong>utrina, o estatuto da associação não precisa <strong>de</strong> um grau <strong>de</strong> especialida<strong>de</strong> que limite <strong>de</strong>masiadamente a sua<br />

atuação como autora <strong>de</strong> ações coletivas, <strong>de</strong> forma que uma previsão genérica, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que relacionada, ainda que <strong>de</strong> maneira indireta,<br />

com o objeto da <strong>de</strong>manda, já é suficiente. O que não se admite, por exemplo, é que uma associação, voltada à <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, queira discutir em juízo a violação ao patrimônio cultural, ou uma associação voltada à <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> meio ambiente<br />

queira <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r em juízo um direito difuso à saú<strong>de</strong> pública.<br />

Aparentemente, o requisito da pertinência temática foi o mais próximo que o legisla<strong>do</strong>r brasileiro chegou da chamada<br />

“representação a<strong>de</strong>quada”, analisada no próximo tópico. Presume que, ao ter em seus estatutos a expressa previsão – ainda que<br />

genérica – da <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> direito coletivo lato sensu, a associação será o representante a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> para sua <strong>de</strong>fesa em juízo em uma<br />

ação coletiva.<br />

11.4.5.4.<br />

Representação a<strong>de</strong>quada (a<strong>de</strong>quacy of representantion)<br />

11.4.5.4.1.<br />

Introdução<br />

O tema da representação a<strong>de</strong>quada como requisito <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong> da ação coletiva, intimamente relaciona<strong>do</strong> à legitimida<strong>de</strong><br />

ativa, é tema que suscita intenso e interessante <strong>de</strong>bate <strong>do</strong>utrinário e jurispru<strong>de</strong>ncial. Enten<strong>do</strong> que o tema é por vezes trata<strong>do</strong> sem o<br />

apuro técnico <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>, o que leva o intérprete a um esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> confusão e incerteza que po<strong>de</strong>ria ser evita<strong>do</strong>, ou ao menos<br />

minimiza<strong>do</strong>.<br />

A <strong>do</strong>utrina nacional parece concordar que o instituto da representação a<strong>de</strong>quada po<strong>de</strong> se dar <strong>de</strong> duas formas distintas: ope<br />

iudicis e ope legis. Tradicionalmente associa-se a primeira forma aos sistemas jurídicos <strong>de</strong> países da common law e o segun<strong>do</strong> aos


sistemas jurídicos <strong>do</strong>s países da civil law. No primeiro caso, caberá ao juiz a análise, no caso concreto, da a<strong>de</strong>quada representação<br />

<strong>do</strong>s interesses em jogo pelo autor que preten<strong>de</strong> conduzir uma ação coletiva, enquanto no segun<strong>do</strong> caso caberia ao legisla<strong>do</strong>r, <strong>de</strong><br />

forma abstrata, <strong>de</strong>terminar quais são os requisitos para se <strong>de</strong>terminarem quais sujeitos têm condições <strong>de</strong> assumir o polo ativo <strong>de</strong><br />

uma ação coletiva.<br />

11.4.5.4.2.<br />

Sistema ope iudicis (sistema da common law)<br />

Nos países <strong>do</strong> sistema da common law, em especial nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, a representação a<strong>de</strong>quada é uma das mais importantes<br />

causas <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong> da ação coletiva, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que a coisa julgada <strong>de</strong>ssa ação atingirá sujeitos que não participarão <strong>do</strong><br />

processo, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> seu resulta<strong>do</strong> (pro et contra). Diante <strong>de</strong>ssa realida<strong>de</strong>, o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> processo legal seria viola<strong>do</strong> se o<br />

autor da ação coletiva não <strong>de</strong>monstrasse concretamente ter efetivas condições <strong>de</strong> exercer a melhor e mais completa <strong>de</strong>fesa que o<br />

direito po<strong>de</strong>ria ter em juízo135.<br />

O raciocínio é até certo ponto simples: como os sujeitos que compõem a coletivida<strong>de</strong> ou comunida<strong>de</strong> serão atingi<strong>do</strong>s sem o<br />

direito a participarem <strong>do</strong> processo coletivo em contraditório, <strong>de</strong>ve se assegurar que sejam “ouvi<strong>do</strong>s” por meio <strong>do</strong> autor, que só terá<br />

condições <strong>de</strong> se tornar esse verda<strong>de</strong>iro “porta-voz” <strong>do</strong>s indivíduos se <strong>de</strong>monstrar concretamente estar plenamente apto a fazer a<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> direito da forma mais perfeita e irrepreensível possível.<br />

Segun<strong>do</strong> precisas lições <strong>do</strong>utrinárias, a representação a<strong>de</strong>quada, nesse caso, além <strong>de</strong> evitar colusões entre as partes, assegura<br />

que o resulta<strong>do</strong> obti<strong>do</strong> por meio <strong>do</strong> processo coletivo seja o mesmo que teria si<strong>do</strong> obti<strong>do</strong> por meio <strong>de</strong> processos individuais, <strong>do</strong>s<br />

quais os indivíduos teriam participa<strong>do</strong> na plenitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> contraditório e da ampla <strong>de</strong>fesa136. É dizer que, apesar <strong>do</strong>s indivíduos não<br />

terem participa<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo coletivo, sua participação teria si<strong>do</strong> inútil e <strong>de</strong>snecessária, já que o resulta<strong>do</strong> seria o mesmo.<br />

Na representação a<strong>de</strong>quada, presente nos países que fazem parte da família da common law, cabe ao juiz a análise concreta <strong>de</strong><br />

elementos que indiquem as efetivas e reais condições <strong>de</strong> o autor cumprir seu papel como <strong>de</strong>le se espera. A <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>do</strong> país <strong>de</strong><br />

origem, variam os fatores relevantes a serem analisa<strong>do</strong>s pelo juiz, ainda que existam alguns fatores que po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s<br />

comuns: as condições <strong>do</strong> autor e <strong>de</strong> seu advoga<strong>do</strong>, a eventual existência <strong>de</strong> conflito entre o autor e/ou advoga<strong>do</strong> e membros <strong>do</strong><br />

grupo, a capacida<strong>de</strong> econômica, a especialida<strong>de</strong> <strong>do</strong> advoga<strong>do</strong>.<br />

In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong>s fatores consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s no caso concreto, um sistema <strong>de</strong> representação a<strong>de</strong>quada, como o existente nos<br />

Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, Inglaterra, Canadá e País <strong>de</strong> Gales, exige <strong>do</strong> juiz uma análise concreta para a aferição da capacida<strong>de</strong> não só <strong>de</strong><br />

representação <strong>do</strong>s sujeitos que compõem o grupo, mas também <strong>de</strong> sua efetiva capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> boa condução <strong>do</strong> processo, <strong>de</strong> seu<br />

preparo e disposição para encarar o processo coletivo.<br />

11.4.5.4.3.<br />

Sistema ope legis (civil law)<br />

Segun<strong>do</strong> lições <strong>do</strong>utrinárias, nos sistemas jurídicos <strong>do</strong>s países da civil law, a representação a<strong>de</strong>quada <strong>do</strong>s autores das ações<br />

coletivas segue uma regra legal, tratan<strong>do</strong>-se, portanto, <strong>de</strong> um sistema ope legis. Nesse entendimento, caberá ao legisla<strong>do</strong>r a<br />

previsão <strong>do</strong>s requisitos necessários para que se admita um sujeito no polo ativo <strong>do</strong> processo coletivo, caben<strong>do</strong> ao juiz tão somente a<br />

análise <strong>do</strong> preenchimento ou não <strong>de</strong> tais requisitos no caso concreto. Há, portanto, uma presunção legal absoluta <strong>de</strong> quais sejam os<br />

representantes a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s, ao que <strong>de</strong>ve se conformar o juiz no caso concreto137.<br />

Ainda que existam exceções, tais como o Uruguai, Argentina e Paraguai (nossos parceiros no Mercosul), que permitem ao juiz<br />

a aferição da representativida<strong>de</strong> a<strong>de</strong>quada no caso concreto 138 , no Brasil a <strong>do</strong>utrina majoritária enten<strong>de</strong> que ao juiz cabe somente<br />

analisar os requisitos já previamente consagra<strong>do</strong>s em lei, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> partir para uma análise no caso concreto das efetivas<br />

condições para a melhor condução <strong>do</strong> processo <strong>do</strong> legitima<strong>do</strong> que preencheu tais requisitos 139 . Na hipótese das associações, por<br />

exemplo, bastará a existência jurídica por mais <strong>de</strong> um ano e a pertinência temática 140 , sen<strong>do</strong> irrelevante qualquer outra consi<strong>de</strong>ração<br />

a respeito da real capacida<strong>de</strong> <strong>do</strong> legitima<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r <strong>de</strong> forma plena e exauriente o direito coletivo lato sensu.<br />

Os críticos a esse sistema <strong>de</strong> aferição da representação a<strong>de</strong>quada afirmam que, sem a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> análise das efetivas<br />

condições <strong>do</strong> autor da ação coletiva no caso concreto, permite-se a existência <strong>de</strong> processos coletivos propostos por autores<br />

<strong>de</strong>sprepara<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>smotiva<strong>do</strong>s, diretamente interessa<strong>do</strong>s em <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> que po<strong>de</strong> não ser o melhor para to<strong>do</strong>s, e por<br />

vezes até imbuí<strong>do</strong>s <strong>de</strong> má-fé 141 . Esses <strong>de</strong>feitos que estariam sen<strong>do</strong> admiti<strong>do</strong>s pelo sistema ope legis, a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> no Brasil, frustrariam<br />

os objetivos da tutela coletiva, permitin<strong>do</strong> que o resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo coletivo não represente o resulta<strong>do</strong> possível se o autor<br />

tivesse outros atributos.<br />

É interessante notar que os <strong>de</strong>fensores <strong>do</strong> sistema atual a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> no direito brasileiro se valem <strong>de</strong> alguns fundamentos, rebati<strong>do</strong>s<br />

<strong>de</strong> forma quase apaixonada pelos críticos <strong>de</strong> tal sistema.<br />

Primeiro argumento amplamente utiliza<strong>do</strong> é a especial maneira <strong>de</strong> formação da coisa julgada material na tutela coletiva.


Conforme analisa<strong>do</strong> no item 11.6, a coisa julgada coletiva só vincula os indivíduos se os beneficiar, não haven<strong>do</strong> sua vinculação<br />

quan<strong>do</strong> o resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo coletivo for negativo. Pelo sistema da coisa julgada secundum eventum litis in utilibus, uma<br />

eventual condução <strong>de</strong>ficitária <strong>do</strong> processo coletivo jamais seria capaz <strong>de</strong> afetar os indivíduos, que, mesmo diante <strong>do</strong> insucesso <strong>do</strong><br />

processo coletivo, po<strong>de</strong>riam obter tutela jurisdicional em ações individuais.<br />

Concor<strong>do</strong> com as críticas lançadas a tal argumento, porque, se é verda<strong>de</strong> que os indivíduos não são prejudica<strong>do</strong>s como titulares<br />

<strong>de</strong> direitos individuais correlatos ao direito coletivo lato sensu discuti<strong>do</strong> no processo coletivo, não há maiores dúvidas <strong>de</strong> que o<br />

serão como membros da coletivida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong>. Diferentemente <strong>do</strong> que enten<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte da <strong>do</strong>utrina, a sentença<br />

<strong>de</strong> improcedência <strong>do</strong> processo coletivo faz coisa julgada material, só sen<strong>do</strong> admitida sua repropositura na hipótese <strong>de</strong> prova nova<br />

em razão da coisa julgada secundum eventum probationis. Pior ainda no direito individual homogêneo, em que a coisa julgada<br />

material se opera <strong>de</strong> forma tradicional, pro et contra e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da motivação da <strong>de</strong>cisão.<br />

Significa que, uma vez conduzi<strong>do</strong> o processo coletivo <strong>de</strong> forma precária ou ten<strong>de</strong>nciosa pelo autor, e sen<strong>do</strong> julga<strong>do</strong><br />

improce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong>, se o problema não tiver si<strong>do</strong> a ausência <strong>de</strong> provas, a <strong>de</strong>cisão tornar-se-á imutável e indiscutível, <strong>de</strong> forma<br />

que aquele direito difuso ou coletivo que foi objeto <strong>do</strong> processo jamais po<strong>de</strong>rá ser tutela<strong>do</strong>142. Esse é um sacrifício que não po<strong>de</strong><br />

ser simplesmente ignora<strong>do</strong>, ainda que diante das diferentes técnicas <strong>de</strong> formação da coisa julgada aplicáveis na tutela coletiva<br />

brasileira.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, argumenta-se que a presença indispensável <strong>do</strong> Ministério Público, seja como autor ou como fiscal da lei,<br />

impe<strong>de</strong> que o autor conduza o processo <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>sidiosa ou ten<strong>de</strong>nciosa. Concor<strong>do</strong> com essa tese, e acredito realmente que a<br />

exigência legal <strong>de</strong> presença obrigatória <strong>de</strong> um órgão tão sério, aparelha<strong>do</strong> e especializa<strong>do</strong> na <strong>de</strong>fesa da tutela coletiva seja uma<br />

salvaguarda interessante no tocante a garantir a efetiva atuação judicial em prol <strong>do</strong> direito <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong> no processo coletivo.<br />

Há, entretanto, restrições. Na ação popular, por exemplo, o Ministério Público só po<strong>de</strong> assumir o polo ativo na hipótese <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sistência ou aban<strong>do</strong>no <strong>do</strong> processo pelo autor popular. Também nos direitos individuais homogêneos haverá limitações no<br />

tocante à legitimação ativa <strong>do</strong> Ministério Público, que só po<strong>de</strong>rá atuar nas hipóteses <strong>de</strong> direito indisponível ou <strong>de</strong> direito disponível<br />

com repercussão social. Nesses <strong>do</strong>is casos, o Ministério Público será obriga<strong>do</strong> a participar como mero fiscal da lei, e mesmo que<br />

sua atuação seja relevante para uma prestação jurisdicional <strong>de</strong> melhor qualida<strong>de</strong>, sempre sofrerá algumas limitações postulatórias.<br />

Por fim, os po<strong>de</strong>res <strong>do</strong> juiz no processo coletivo são aguça<strong>do</strong>s, exigin<strong>do</strong>-se <strong>do</strong> magistra<strong>do</strong> uma atuação ativa e vigilante para<br />

que eventual <strong>de</strong>scompromisso ou má-fé <strong>do</strong> autor não seja <strong>de</strong>terminante no resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo. Ainda que se louve o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> juiz<br />

mais ativo e preocupa<strong>do</strong> com a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua prestação jurisdicional, é preciso reconhecer que existem limitações a essa<br />

atuação, até porque o volume <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> nossos magistra<strong>do</strong>s, atualmente, é muito eleva<strong>do</strong>, o que dificulta a atenção que se<br />

preten<strong>de</strong> exigir. Por outro la<strong>do</strong>, o sistema processual continua, mesmo no processo coletivo, a ser misto, mas com prepon<strong>de</strong>rância<br />

<strong>do</strong> dispositivo, <strong>de</strong> forma que a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> autor ainda tem muita relevância na condução <strong>do</strong> processo.<br />

11.4.5.4.4.<br />

Situação atual no Brasil<br />

A <strong>do</strong>utrina nacional se divi<strong>de</strong> nitidamente em <strong>do</strong>is grupos no tocante à representativida<strong>de</strong> a<strong>de</strong>quada. Um primeiro grupo<br />

enten<strong>de</strong> que o sistema a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> é ope legis, não caben<strong>do</strong>, portanto, ao juiz analisar no caso concreto a efetiva condição/disposição<br />

<strong>do</strong> autor em conduzir o processo coletivo143. Esse grupo se divi<strong>de</strong> em duas correntes: (i) os que enten<strong>de</strong>m que o sistema a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong><br />

por nosso legisla<strong>do</strong>r é o i<strong>de</strong>al, e (ii) os que consi<strong>de</strong>ram que, <strong>de</strong> lege ferenda, o i<strong>de</strong>al seria modificar a lei para a a<strong>do</strong>ção <strong>do</strong> sistema<br />

ope iudicis. E há um segun<strong>do</strong> grupo que enten<strong>de</strong> que o sistema atual já admite a conclusão pela aferição ope iudicis da<br />

representação a<strong>de</strong>quada 144 , afirman<strong>do</strong> que a presunção legal <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação na representação prevista em lei é apenas relativa, sen<strong>do</strong>,<br />

portanto, admissível a produção <strong>de</strong> prova em senti<strong>do</strong> contrário 145 .<br />

Sou partidário da segunda corrente <strong>do</strong>utrinária <strong>do</strong> primeiro grupo, porque enten<strong>do</strong> que o controle da a<strong>de</strong>quada representação <strong>do</strong><br />

autor da ação coletiva evitaria processos coletivos sem condições <strong>de</strong> tutelar o direito <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong>, que atualmente sobrevivem em<br />

manifesto atenta<strong>do</strong> aos princípios da economia processual e segurança jurídica. E ainda evitaria a pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> processos<br />

coletivos que versam sobre o mesmo tema, em muitos casos propostos por autores sem qualquer condição para uma boa condução<br />

<strong>do</strong> processo.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, é preciso lembrar que, mesmo nos sistemas <strong>de</strong> controle ope iudicis, a eventual constatação <strong>de</strong> que o autor não<br />

tem efetivamente condições <strong>de</strong> melhor tutelar o direito discuti<strong>do</strong>, ainda que posterior ao encerramento <strong>do</strong> processo, afasta a<br />

vinculação <strong>do</strong>s membros <strong>do</strong> grupo ao resulta<strong>do</strong> negativo (collateral attack). Na realida<strong>de</strong>, como bem lembra a melhor <strong>do</strong>utrina, a<br />

representação a<strong>de</strong>quada no sistema da common law não é somente um requisito <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong> da ação coletiva, limitada ao<br />

ingresso <strong>do</strong> processo, porque essa matéria não preclui, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o juiz extinguir o processo por ina<strong>de</strong>quação da representação a<br />

qualquer momento, seja por fato superveniente ou pela constatação <strong>de</strong> ter si<strong>do</strong> enganosa a percepção prévia sobre a a<strong>de</strong>quação da<br />

representação146.


Atualmente, com a justificativa da coisa julgada secundum eventum litis in utilibus, não há maiores preocupações com a perda<br />

<strong>de</strong> energia, tempo e dinheiro <strong>de</strong> um processo coletivo fada<strong>do</strong> ao insucesso em razão <strong>do</strong> <strong>de</strong>spreparo e/ou má-fé <strong>do</strong> autor. No sistema<br />

sugeri<strong>do</strong>, o sujeito continuaria a po<strong>de</strong>r discutir em ação individual seu direito, mesmo diante <strong>do</strong> insucesso <strong>de</strong> uma ação coletiva,<br />

mas como a a<strong>de</strong>quação da representação passaria a ser analisada em concreto, as chances <strong>de</strong> isso ocorrer seriam bem menores, o<br />

que po<strong>de</strong>ria até mesmo servir <strong>de</strong> <strong>de</strong>sestímulo à propositura <strong>de</strong> ações individuais. Atualmente, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong><br />

direito realizada pelo autor da ação coletiva, o direito individual não suporta o seu insucesso, não existin<strong>do</strong> qualquer razão para que<br />

o indivíduo <strong>de</strong>ixe <strong>de</strong> ingressar com ação individual na busca da tutela <strong>de</strong> seu direito.<br />

Só enten<strong>do</strong> que esse não é o sistema a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pelo legisla<strong>do</strong>r pátrio e que, por isso, somente uma mudança legislativa permitiria<br />

sua a<strong>do</strong>ção 147 . E não faltaram tentativas para que se chegasse a esse objetivo. Tanto no Projeto <strong>de</strong> Lei <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil<br />

Coletivo, como no <strong>de</strong> mudança da ação civil pública, estava consagrada a representação a<strong>de</strong>quada ope iudicis, mas nenhum <strong>de</strong>sses<br />

projetos vingou no Congresso Nacional. No mesmo senti<strong>do</strong> o art. 3.º <strong>do</strong> Código Mo<strong>de</strong>lo da Ibero-América.<br />

11.4.5.4.5.<br />

Legitimida<strong>de</strong> extraordinária ou representação processual?<br />

O Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral foi chama<strong>do</strong> a <strong>de</strong>cidir, em recurso extraordinário repetitivo, sobre a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sujeitos não<br />

pertencentes à associação autora da ação coletiva, que tem como objeto direito individual homogêneo, po<strong>de</strong>rem se aproveitar da<br />

sentença <strong>de</strong> procedência da ação coletiva. Em tal julgamento, entretanto, o Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral proferiu <strong>de</strong>cisão ainda mais<br />

ampla, já que não versa somente sobre a legitimida<strong>de</strong> ativa da associação em executar a sentença coletiva em favor <strong>de</strong> indivíduos,<br />

mas também estabelece condições para a sua atuação no polo ativo da ação coletiva148.<br />

Em equivocada interpretação <strong>do</strong> art. 5.º, XXI, da CF, o Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong>cidiu que as associações <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong><br />

autorização expressa <strong>de</strong> seus associa<strong>do</strong>s para a propositura da ação coletiva, o que po<strong>de</strong> ocorrer individualmente por manifestação<br />

expressa <strong>de</strong> seus associa<strong>do</strong>s ou por aprovação da propositura da ação em assembleia geral.<br />

A <strong>de</strong>cisão é incorreta porque confun<strong>de</strong> in<strong>de</strong>vidamente os institutos da substituição processual (quan<strong>do</strong> a associação atua em<br />

nome próprio em favor <strong>do</strong>s interesses <strong>de</strong> terceiros) com a representação processual (quan<strong>do</strong> a associação atua em nome <strong>de</strong> seus<br />

associa<strong>do</strong>s em favor <strong>de</strong> seus interesses) 149 .<br />

Segun<strong>do</strong> o dispositivo legal constitucional, “as entida<strong>de</strong>s associativas, quan<strong>do</strong> expressamente autorizadas, têm legitimida<strong>de</strong><br />

para representar seus filia<strong>do</strong>s judicial ou extrajudicialmente”. Ainda que o dispositivo não possa ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> um primor <strong>de</strong><br />

redação legislativa, ao apontar expressamente para a representação <strong>de</strong> seus filia<strong>do</strong>s em juízo, trata <strong>de</strong> hipótese <strong>de</strong> representação<br />

processual, e não <strong>de</strong> substituição processual. O art. 5.º, XXI, da CF, portanto, apesar <strong>de</strong> prever expressamente sobre a legitimida<strong>de</strong><br />

da associação, versa claramente sobre a representação processual, e somente nesse senti<strong>do</strong> po<strong>de</strong>ria ser exigida a autorização <strong>de</strong> seus<br />

associa<strong>do</strong>s para atuar em favor <strong>de</strong> seus direitos.<br />

Para fins <strong>de</strong> atuação da associação na execução da sentença coletiva, até se po<strong>de</strong> admitir sua participação como representante<br />

processual <strong>do</strong> indivíduo beneficia<strong>do</strong>, já que nesse caso estará <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> numa execução individual um direito da mesma natureza,<br />

conforme <strong>de</strong>vidamente exposto no Capítulo 16.4.3. No entanto, para fins <strong>de</strong> participação no polo ativo da ação coletiva, não é o art.<br />

5.º, XXI, da CF que <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> para <strong>de</strong>terminar as condições <strong>de</strong> atuação da associação, mas sim os arts. 5.º, V, da Lei<br />

7.347/1985 e 82, IV, da Lei 8.078/1990.<br />

Significa que a legitimação da associação para a propositura da ação coletiva não exige qualquer preenchimento <strong>de</strong> requisito<br />

constitucional, bastan<strong>do</strong> a comprovação <strong>de</strong> sua existência jurídica há mais <strong>de</strong> um ano e a pertinência temática.<br />

Infelizmente, entretanto, como, inclusive, já era <strong>de</strong> esperar, a equivocada <strong>de</strong>cisão, proferida em recurso especial submeti<strong>do</strong> a<br />

julgamento <strong>de</strong> recurso repetitivo, logo passou a ser utilizada como razão <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir a questão no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, que<br />

passou a exigir para fins <strong>de</strong> atuação da associação no polo ativo da ação coletiva a autorização expressa <strong>de</strong> seus associa<strong>do</strong>s150.<br />

Interessante notar que ainda existem <strong>de</strong>cisões daquele tribunal, mesmo posteriores ao prece<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, que<br />

continuam a enten<strong>de</strong>r pela <strong>de</strong>snecessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> autorização expressa <strong>do</strong>s associa<strong>do</strong>s 151 .<br />

Criou-se nos tribunais superiores uma situação peculiar. Caso se reconheça, como tais tribunais vêm fazen<strong>do</strong>, que a atuação da<br />

associação no polo ativo da ação coletiva <strong>de</strong>ve ser admitida somente nos termos <strong>do</strong> art. 5.º, XXI, da CF, não há mais senti<strong>do</strong> em<br />

falar em legitimida<strong>de</strong> extraordinária, porque o dispositivo claramente trata <strong>de</strong> representação processual. Curiosamente, entretanto,<br />

os tribunais continuam a consi<strong>de</strong>rar o fenômeno como <strong>de</strong> legitimação processual, afirman<strong>do</strong> que sem a autorização expressa <strong>de</strong><br />

seus associa<strong>do</strong>s falta legitimida<strong>de</strong> à associação para a propositura da ação coletiva 152 .<br />

Partin<strong>do</strong>-se <strong>de</strong>ssa incorreta premissa criada pelos tribunais superiores, a autorização expressa <strong>do</strong>s associa<strong>do</strong>s passa a ser mais<br />

um requisito para a associação ter legitimida<strong>de</strong> ativa na propositura da ação coletiva, ao la<strong>do</strong> da existência jurídica há pelo menos<br />

um ano e da pertinência temática.<br />

O equivoca<strong>do</strong> entendimento tem um efeito prático perverso, porque, a partir <strong>do</strong> momento em que se enten<strong>de</strong> que a legitimida<strong>de</strong>


ativa na ação coletiva da associação está condicionada à autorização expressa <strong>de</strong> seus associa<strong>do</strong>s, é natural a conclusão <strong>de</strong> que a<br />

ação só possa aproveitar a quem era associa<strong>do</strong> no momento da propositura da <strong>de</strong>manda judicial e que autorizou a sua propositura.<br />

Ou seja, mesmo sen<strong>do</strong> associa<strong>do</strong>, não ten<strong>do</strong> autoriza<strong>do</strong> a propositura da ação coletiva, não po<strong>de</strong>rá se beneficiar da sentença<br />

coletiva153.<br />

Registrem-se <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, mesmo posteriores ao prece<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, que<br />

continuam a apontar que to<strong>do</strong>s os indivíduos pertencentes à comunida<strong>de</strong>, associa<strong>do</strong>s ou não à autora da ação coletiva, se<br />

beneficiam da sentença coletiva, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> executá-la em seu favor 154 . O tema, portanto, continua polêmico, tanto que a Segunda<br />

Seção <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça afetou recurso especial ao julgamento repetitivo (tema 948) para pacificar o entendimento <strong>do</strong><br />

tribunal a respeito <strong>do</strong> tema.<br />

Essa realida<strong>de</strong> é ruim no caso <strong>do</strong> direito individual homogêneo, porque exigirá daqueles sujeitos na mesma situação fáticojurídica<br />

<strong>do</strong>s associa<strong>do</strong>s a propositura <strong>de</strong> nova <strong>de</strong>manda para a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> seus interesses. Conspira, portanto, contra os valores mais<br />

importantes da tutela coletiva: a economia processual e a harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s, porque exige a propositura <strong>de</strong> novas ações e<br />

abre a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões contraditórias e/ou conflitantes.<br />

Já no caso <strong>do</strong>s direitos difuso e coletivo a realida<strong>de</strong> é péssima, porque viola a própria natureza indivisível <strong>de</strong> tais espécies <strong>de</strong><br />

direitos. Como exatamente compatibilizar a limitação ora analisada com tal indivisibilida<strong>de</strong>? Se a tutela favorece a coletivida<strong>de</strong> ou<br />

uma comunida<strong>de</strong> (grupo, classe ou categoria <strong>de</strong> pessoas), como exatamente <strong>de</strong>ve ser compreendida a limitação <strong>de</strong> benefício<br />

somente à parcela <strong>do</strong>s sujeitos que compõem o titular <strong>do</strong> direito (que não são os indivíduos, mas a coletivida<strong>de</strong> ou comunida<strong>de</strong>)?<br />

Esse problema prático, entretanto, a meu ver, po<strong>de</strong> ser afasta<strong>do</strong> sem violação ao entendimento já pacifica<strong>do</strong> nos tribunais<br />

superiores. Quan<strong>do</strong> a associação atua como autora <strong>de</strong> ação coletiva em benefício da coletivida<strong>de</strong> (direito difuso) ou <strong>de</strong> uma<br />

comunida<strong>de</strong> (direito coletivo), ela claramente não está em juízo na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> seus associa<strong>do</strong>s, <strong>de</strong> forma a ser inaplicável a esses<br />

casos o art. 5.º, XXI, da CF. Nessa hipótese, portanto, a legitimida<strong>de</strong> ativa será analisada exclusivamente à luz das normas<br />

referentes ao tema constantes da Lei <strong>de</strong> Ação Civil Pública e <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Registre-se, por fim, que o prece<strong>de</strong>nte ora analisa<strong>do</strong> <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral trata especificamente <strong>de</strong> tutela coletiva <strong>de</strong><br />

direito individual homogêneo, <strong>de</strong> forma que seus possíveis efeitos vinculantes não po<strong>de</strong>m afetar ações coletivas que tenham como<br />

objeto direito difuso ou coletivo. O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, aparentemente, também assim compreen<strong>de</strong>u os limites <strong>do</strong><br />

prece<strong>de</strong>nte cria<strong>do</strong> no Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, já que continua a consi<strong>de</strong>rar a associação legitimada para a tutela <strong>de</strong> direito<br />

coletivo sem fazer menção à exigência <strong>de</strong> autorização <strong>de</strong> seus associa<strong>do</strong>s155.<br />

11.4.6. Defensoria Pública<br />

Pela Lei 11.448, <strong>de</strong> 15.01.2007, com a alteração <strong>do</strong> art. 5º, II, da Lei 7.347/85 (LACP), houve a expressa inclusão da<br />

Defensoria Pública no rol <strong>de</strong> legitima<strong>do</strong>s à propositura da ação coletiva. Antes <strong>de</strong> analisar a norma legal propriamente dita, é<br />

preciso fazer uma exposição, ainda que breve, da participação da Defensoria Pública no âmbito das ações coletivas antes da Lei<br />

11.448/2007.<br />

É necessário reconhecer que, mesmo antes <strong>de</strong>ssa previsão legal, a Defensoria Pública já participava <strong>de</strong> ações coletivas. Parece<br />

não haver maiores dúvidas a respeito da legitimida<strong>de</strong> da Defensoria Pública como mero assistente judicial <strong>de</strong> associação que<br />

funcionaria como autora da ação coletiva. Como se po<strong>de</strong> notar com relativa facilida<strong>de</strong>, nessa circunstância a Defensoria Pública<br />

não compõe o polo ativo da ação coletiva, servin<strong>do</strong> simplesmente como assistente judicial <strong>de</strong> pessoa jurídica legitimada<br />

expressamente em lei para a propositura <strong>de</strong> tal espécie <strong>de</strong> ação.<br />

Ainda que não seja parte na ação coletiva, a mera atuação da Defensoria Pública já é o suficiente para suscitar relevante<br />

questionamento: auxilian<strong>do</strong> judicialmente o autor da ação coletiva, <strong>de</strong>verá ser <strong>de</strong>monstrada sua situação <strong>de</strong> carência econômica,<br />

inviabiliza<strong>do</strong>ra da atuação em proteção <strong>do</strong> direito transindividual? Importante lembrar que, apesar da gratuida<strong>de</strong> existente para os<br />

autores das ações coletivas, é necessária a presença <strong>de</strong> agente com capacida<strong>de</strong> postulatória, <strong>de</strong> preferência experimenta<strong>do</strong>, o que<br />

nem sempre po<strong>de</strong> ser obti<strong>do</strong> pelas associações menos organizadas.<br />

O mesmo se po<strong>de</strong> dizer da ação popular, na qual o cidadão pobre po<strong>de</strong> não ter condições <strong>de</strong> contratar um advoga<strong>do</strong>. Apesar da<br />

extrema improbabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tal circunstância, é possível imaginar a presença da Defensoria Pública como assistente judicial <strong>do</strong><br />

autor da ação popular. Contu<strong>do</strong>, se o réu tivesse condições <strong>de</strong> arcar com a contratação <strong>do</strong> advoga<strong>do</strong>, ainda assim po<strong>de</strong>ria a<br />

Defensoria Pública atuar na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> assistente judicial?<br />

Para parcela <strong>do</strong>utrinária a comprovação da hipossuficiência econômica <strong>do</strong> autor é indispensável, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser compreendida<br />

essa atuação da Defensoria Pública <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> sua função típica <strong>de</strong> proteção ao economicamente necessita<strong>do</strong>. Outra parcela<br />

<strong>do</strong>utrinária enten<strong>de</strong> que essa comprovação é dispensada, até porque a <strong>de</strong>fesa em juízo não se dá para tutela <strong>de</strong> interesse <strong>do</strong> autor da<br />

ação coletiva, mas sim da coletivida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> um grupo, classe ou categoria <strong>de</strong> pessoas156.


Por outro la<strong>do</strong>, apesar <strong>de</strong> certa divergência, aos órgãos especializa<strong>do</strong>s cria<strong>do</strong>s pela Defensoria Pública já vinha se<br />

reconhecen<strong>do</strong> a legitimida<strong>de</strong> para a propositura <strong>de</strong> ações coletivas em <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> direitos coletivos e individuais homogêneos <strong>do</strong>s<br />

consumi<strong>do</strong>res 157 , ainda que não se possa afirmar que a aceitação era tranquila, existin<strong>do</strong> inclusive <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça em senti<strong>do</strong> contrário 158 , apesar <strong>de</strong> notadamente em menor número.<br />

Não obstante a divergência, enten<strong>do</strong> que a legitimida<strong>de</strong> ora analisada está amparada na previsão contida no art. 82, III, <strong>do</strong><br />

CDC, que ao prever a legitimida<strong>de</strong> ativa inclui expressamente órgãos da administração pública, direta e indireta, ainda que sem<br />

personalida<strong>de</strong> jurídica 159 . Além <strong>de</strong>ssa expressa previsão legal, a referida legitimação encontra amparo nos arts. 6.º, VIII (princípio<br />

da facilitação da <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res), e 83 (princípio da instrumentalida<strong>de</strong> máxima <strong>do</strong> processo <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r), ambos <strong>do</strong><br />

CDC160, e no art. 4.º, XI, da LC 80/1994 161 .<br />

Ainda que a Defensoria Pública, mesmo sem expressa previsão legal, já viesse ingressan<strong>do</strong> com ações coletivas antes da Lei<br />

11.448/2007, sua inclusão no rol <strong>de</strong> legitima<strong>do</strong>s ativos foi um marco expressivo em termos <strong>de</strong> aperfeiçoamento da proteção<br />

jurisdicional <strong>do</strong>s direitos coletivos lato sensu. Contra a expressa inclusão da Defensoria Pública entre os legitima<strong>do</strong>s ativos<br />

coletivos foi proposta ação direta <strong>de</strong> inconstitucionalida<strong>de</strong>, apresentada pela Associação Nacional <strong>do</strong>s Membros <strong>do</strong> Ministério<br />

Público – CONAMP.<br />

Nessa ação direta <strong>de</strong> inconstitucionalida<strong>de</strong> havia uma cumulação <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong>s na forma subsidiária. Como pedi<strong>do</strong> principal, a<br />

<strong>de</strong>claração <strong>de</strong> inconstitucionalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> art. 5.º, II, da Lei 7.347/1985 (LACP), com redução <strong>de</strong> texto e, subsidiariamente, em<br />

interpretação conforme o texto constitucional, que fosse <strong>de</strong>clarada a ilegitimida<strong>de</strong> da Defensoria Pública para a propositura <strong>de</strong><br />

ações coletivas que tivessem como objeto direitos difusos, limitan<strong>do</strong> sua atuação às ações coletivas cujos objetos fossem os direitos<br />

coletivos e individuais homogêneos vincula<strong>do</strong>s a carentes econômicos.<br />

Referida ação foi julgada totalmente improce<strong>de</strong>nte, com expressa menção <strong>de</strong> que o reconhecimento da legitimida<strong>de</strong> ativa da<br />

Defensoria Pública não traz qualquer prejuízo institucional ao Ministério Público 162 .<br />

Estava claro que uma <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> inconstitucionalida<strong>de</strong> com redução <strong>de</strong> texto pelos argumentos utiliza<strong>do</strong>s em referida ação<br />

direta <strong>de</strong> inconstitucionalida<strong>de</strong> não merecia prosperar. A alegada violação aos arts. 5.º, LXXIV, e 134, ambos da CF, tentava extrair<br />

<strong>do</strong> texto constitucional algo que dificilmente ele quis dizer. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s necessita<strong>do</strong>s prevista pelo art. 134 da CF, “na forma <strong>do</strong><br />

art. 5.º, LXXIV”, da CF, que prevê a “assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência <strong>de</strong> recursos”, não<br />

<strong>de</strong>ve ser interpretada restritivamente, limitan<strong>do</strong>-se àqueles que individualmente comprovarem o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> carência financeira.<br />

Ainda que se exija no caso concreto a comprovação <strong>de</strong> hipossuficiência econômica, certamente ela não precisará ser feita<br />

individualmente, o que já seria o suficiente para legitimar a Defensoria Pública a litigar em nome próprio na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> grupo, classe<br />

ou categoria <strong>de</strong> pessoas com notória carência financeira163.<br />

Ações coletivas como a proposta pela Defensoria Pública <strong>de</strong> São Paulo na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> interesse <strong>do</strong>s mora<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Jardim<br />

Pantanal, o qual ficou mais <strong>de</strong> <strong>do</strong>is meses submerso em lo<strong>do</strong> e lama em razão <strong>de</strong> chuvas torrenciais, naturalmente aten<strong>de</strong>m à<br />

exigência constitucional, pois supõe-se que, se as pessoas não fossem economicamente necessitadas, não residiriam em local<br />

frequentemente castiga<strong>do</strong> pelas chuvas. Diga-se o mesmo da ação coletiva proposta pela Defensoria Pública da União em Belém,<br />

na <strong>de</strong>fesa coletiva <strong>de</strong> crianças e a<strong>do</strong>lescentes que vivem em situação <strong>de</strong> risco nas ruas da cida<strong>de</strong> 164 .<br />

Como pedi<strong>do</strong> subsidiário da ação ora analisada, constava a pretensão <strong>de</strong> interpretação conforme a Constituição para que a<br />

Defensoria Pública só tivesse legitimida<strong>de</strong> para a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s direitos coletivos e individuais homogêneos, sempre com vinculação à<br />

hipossuficiência econômica <strong>do</strong>s beneficia<strong>do</strong>s 165 . Esse pedi<strong>do</strong> era mais interessante porque tocava, ainda que indiretamente, no<br />

ponto principal da legitimida<strong>de</strong> da Defensoria Pública: existirá para ela a chamada “pertinência temática”? E, haven<strong>do</strong>, em que<br />

termos será exigida?<br />

No julgamento da referida ação direta <strong>de</strong> inconstitucionalida<strong>de</strong> proposta pela CONAMP a respeito da legitimida<strong>de</strong> da<br />

Defensoria Pública no processo coletivo, o Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral enten<strong>de</strong>u que a presença <strong>de</strong> hipossuficientes econômicos<br />

entre os membros da coletivida<strong>de</strong> ou da comunida<strong>de</strong> (grupo, classe, categoria ou pessoas no direito coletivo ou indivíduos titulares<br />

<strong>do</strong> direito individual homogêneo) já era razão suficiente para legitimar a Defensoria Pública para a propositura da ação coletiva.<br />

A limitação da <strong>de</strong>fesa exclusiva <strong>de</strong> hipossuficientes econômicos no âmbito da tutela <strong>do</strong>s direitos difusos e coletivos seria<br />

significativamente limita<strong>do</strong>ra para a Defensoria Pública, em razão da indivisibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses direitos. No tocante à tutela <strong>de</strong> direito<br />

difuso, o art. 5.º, II, da Lei 7.347/1985 (LACP) seria inaplicável, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que na coletivida<strong>de</strong> tutelada nessa espécie <strong>de</strong><br />

direito sempre haverá sujeitos não carentes <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista econômico166. Resumin<strong>do</strong>, a coletivida<strong>de</strong> per<strong>de</strong>ria mais um<br />

legitima<strong>do</strong> – em algumas localida<strong>de</strong>s extremamente organiza<strong>do</strong> e especializa<strong>do</strong> – na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> seus direitos difusos em juízo.<br />

No tocante à tutela <strong>de</strong> direito coletivo, a limitação também seria significativa, porque, apesar <strong>de</strong> existirem grupos, classes e<br />

categorias <strong>de</strong> pessoas formadas exclusivamente <strong>de</strong> hipossuficientes econômicos, haveria insuperável dificulda<strong>de</strong> na i<strong>de</strong>ntificação<br />

não só <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os sujeitos que compõem esse grupo, classe ou categoria, como também seria extremamente difícil a comprovação


da carência econômica <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s eles. Note-se que, nesse caso, sen<strong>do</strong> indivisível o direito, não se admitiria que essa i<strong>de</strong>ntificação e<br />

comprovação fossem reservadas ao momento da execução, pois seria impossível a <strong>de</strong>cisão favorecer somente parcela <strong>do</strong> grupo,<br />

classe ou categoria.<br />

Há no acórdão ora analisa<strong>do</strong> a menção da impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a Defensoria Pública executar a sentença individualmente em<br />

favor <strong>de</strong> quem não comprovar a hipossuficiência econômica, o que parece razoável, mas em nada interfere em sua legitimida<strong>de</strong><br />

para a propositura da ação coletiva, ainda que a tutela buscada possa tutelar também quem não é hipossuficiente econômico. A<br />

solução é perfeita porque numa tutela individual não po<strong>de</strong> a Defensoria Pública atuar por quem não provar sua situação <strong>de</strong> pobreza<br />

jurídica.<br />

Registre-se que, em voto venci<strong>do</strong> proferi<strong>do</strong> no julgamento <strong>do</strong> Recurso Especial 912.849/RS, o Ministro Teori Albino Zavascki,<br />

seguin<strong>do</strong> entendimento <strong>do</strong> relator da apelação no caso concreto, curiosamente o processualista Araken <strong>de</strong> Assis, já havia entendi<strong>do</strong><br />

pela legitimida<strong>de</strong> da Defensoria Pública para a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> direitos individuais homogêneos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, limitan<strong>do</strong> a proteção<br />

jurisdicional obtida somente àqueles que <strong>de</strong>monstrassem individualmente, em fase <strong>de</strong> execução, sua condição <strong>de</strong> economicamente<br />

necessita<strong>do</strong> 167 .<br />

Como bem <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> por abalizada <strong>do</strong>utrina, essa limitação subjetiva pretendida pelo entendimento ora examina<strong>do</strong> exigiria<br />

<strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, que não são economicamente hipossuficientes, a propositura <strong>de</strong> nova ação – coletiva ou individual –, o que<br />

contraria os princípios da economia processual e da harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s 168 . A<strong>de</strong>mais, o entendimento mistura<br />

in<strong>de</strong>vidamente a questão <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> e da eficácia subjetiva da coisa julgada coletiva, sen<strong>do</strong> irrelevante para a <strong>de</strong>terminação<br />

<strong>do</strong>s beneficia<strong>do</strong>s quem foi o autor da ação coletiva. Se assim não fosse, ação coletiva movida por associação <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s<br />

consumi<strong>do</strong>res não po<strong>de</strong>ria beneficiar individualmente sujeito não consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> tecnicamente consumi<strong>do</strong>r, o que evi<strong>de</strong>ntemente não<br />

acontece nem <strong>de</strong>ve ocorrer.<br />

Nesse senti<strong>do</strong> o entendimento <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral é superior, porque ele não impe<strong>de</strong> que a sentença coletiva<br />

favoreça também quem não é hipossuficiente econômico, apenas retira da Defensoria Pública a legitimida<strong>de</strong> ativa para executar a<br />

sentença em favor <strong>do</strong> indivíduo que não <strong>de</strong>monstrar seu esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> pobreza.<br />

No voto prolata<strong>do</strong> pelo Ministro Barroso, há expressa menção à ilegitimida<strong>de</strong> ativa da Defensoria Pública na hipótese <strong>de</strong> já ser<br />

possível i<strong>de</strong>ntificar que os tutela<strong>do</strong>s, como grupo, classe, categoria ou individualmente, não são hipossuficientes, como ocorreria<br />

numa ação para tutelar os associa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Iate Clube ou os correntistas <strong>do</strong> Itaú Personnalité. Nesse senti<strong>do</strong>, inclusive, há <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong><br />

Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> pela ilegitimida<strong>de</strong> ativa da Defensoria Pública em ação coletiva que visava tutelar<br />

interesses <strong>de</strong> i<strong>do</strong>sos contratantes <strong>de</strong> planos priva<strong>do</strong>s <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>169.<br />

É tradicional na <strong>do</strong>utrina a divisão da função da Defensoria Pública em típica e atípica. Há unanimida<strong>de</strong> em apontar como<br />

função típica a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong>s economicamente necessita<strong>do</strong>s, existin<strong>do</strong> certa divergência no que viria a ser sua função<br />

atípica. Essas divergências são mais <strong>de</strong> forma <strong>do</strong> que <strong>de</strong> conteú<strong>do</strong>, pois atinentes à forma <strong>de</strong> classificação <strong>de</strong>ssa função, mas ainda<br />

assim merecem breves comentários.<br />

Para parcela da <strong>do</strong>utrina, qualquer atuação que, apesar <strong>de</strong> permitida por previsão legal, não seja em <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> economicamente<br />

necessita<strong>do</strong> representa uma atuação atípica 170 , cujos clássicos exemplos são a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> acusa<strong>do</strong>s no processo penal (art. 4.º, XIV e<br />

XV, da LC 80/1994), com amparo nos arts. 261 e 263 <strong>do</strong> CPP, e a cura<strong>do</strong>ria especial nas hipóteses previstas no art. 72, II, <strong>do</strong> Novo<br />

CPC e admitida expressamente pelo art. 4.º, XVI, da LC 80/1994.<br />

Em ambos os casos menciona<strong>do</strong>s a condição econômica <strong>do</strong> sujeito tutela<strong>do</strong> pela Defensoria Pública é irrelevante, pois são<br />

outras as razões que <strong>de</strong>terminam sua participação no processo. Uma eventual legitimida<strong>de</strong> ativa da Defensoria Pública<br />

absolutamente dissociada da hipossuficiência econômica seria possível, portanto, em razão <strong>de</strong> suas funções atípicas.<br />

Outra parcela da <strong>do</strong>utrina, ao especificar a função atípica <strong>de</strong>senvolvida pela Defensoria Pública, divi<strong>de</strong>-a em duas espécies:<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> hipossuficiente jurídico e <strong>do</strong> hipossuficiente organizacional, o que se obtém por meio <strong>do</strong> alargamento <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong><br />

necessita<strong>do</strong>s, alvo constitucional <strong>de</strong> tutela nos termos <strong>do</strong> art. 134 da CF.<br />

Alarga-se o conceito <strong>de</strong> necessita<strong>do</strong>s para, além <strong>do</strong>s tradicionais carentes <strong>de</strong> recursos econômicos, incluírem-se também os<br />

necessita<strong>do</strong>s jurídicos, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que caberia à Defensoria Pública, quan<strong>do</strong> previsto em lei, garantir a <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s sujeitos,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> sua condição econômica, o pleno exercício da ampla <strong>de</strong>fesa e <strong>do</strong> contraditório171. Costuma-se indicar como<br />

exemplos as já citadas atuações em <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> réu no processo penal e da cura<strong>do</strong>ria especial exercida no processo civil.<br />

Também incluem-se entre os necessita<strong>do</strong>s aqueles que têm real dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se organizar para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rem seus direitos em<br />

juízo e fora <strong>de</strong>le. Nesse caso, passa-se a falar em necessita<strong>do</strong>s organizacionais, hipossuficiência <strong>de</strong>rivada da vulnerabilida<strong>de</strong> das<br />

pessoas em face das relações complexas existentes na socieda<strong>de</strong> contemporânea, com especial ênfase aos conflitos próprios da<br />

socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> massa atual 172 . Derivaria <strong>de</strong>ssa função atípica a legitimação da Defensoria Pública nas ações coletivas.<br />

A tese, entretanto, não é pacífica, existin<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrina que, em algum grau, continua a vincular a atuação da Defensoria Pública<br />

173


ao necessita<strong>do</strong> econômico, ainda que no âmbito da tutela coletiva , enquanto outra parcela enten<strong>de</strong> que a legitimação, em razão <strong>do</strong><br />

art. 134 da CF, nunca será tão ampla como a <strong>do</strong> Ministério Público174.<br />

O Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, no julgamento já menciona<strong>do</strong> a respeito da constitucionalida<strong>de</strong> da norma que prevê a<br />

legitimida<strong>de</strong> ativa coletiva para a Defensoria Pública, parece ter se inclina<strong>do</strong> pelo senti<strong>do</strong> mais amplo da atuação da Defensoria<br />

Pública, chegan<strong>do</strong> a afirmar que essa amplitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> atuação era uma exigência <strong>do</strong> acesso à or<strong>de</strong>m jurídica justa e que interessava a<br />

qualquer sujeito preocupa<strong>do</strong> com a prestação <strong>de</strong> tutela jurisdicional.<br />

No entanto, o julgamento não é totalmente claro nesse senti<strong>do</strong>, chegan<strong>do</strong> a mencionar que no exercício <strong>de</strong> sua atribuição<br />

institucional, em respeito ao art. 5.º, LXXIV, da Constituição, reitera<strong>do</strong> no art. 134, a Defensoria Pública <strong>de</strong>ve “sempre averiguar a<br />

compatibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s interesses e direitos que a instituição protege com os possíveis beneficiários <strong>de</strong> quaisquer das ações ajuizadas,<br />

mesmo em ação civil pública”. Na realida<strong>de</strong>, o julgamento não é muito claro, porque ora afirma que não se <strong>de</strong>ve limitar a<br />

legitimida<strong>de</strong> da Defensoria Pública à tutela <strong>do</strong> hipossuficiente econômico e em outro momento aparenta afirmar exatamente o<br />

contrário.<br />

Uma ação civil pública para tutelar porta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> alguma espécie <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiência, sen<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s notoriamente não<br />

hipossuficientes econômicos, po<strong>de</strong> ser proposta pela Defensoria Pública? Um grupo <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res não hipossuficientes<br />

econômicos po<strong>de</strong> ser tutela<strong>do</strong> por ação coletiva proposta pela Defensoria Pública? E um grupo <strong>de</strong> i<strong>do</strong>sos, ainda que não<br />

hipossuficiente econômicos? E <strong>de</strong> crianças e a<strong>do</strong>lescentes?<br />

Conforme aponta<strong>do</strong>, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça já teve a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> afirmar que a tutela <strong>de</strong> i<strong>do</strong>sos consumi<strong>do</strong>res, se<br />

não forem hipossuficientes econômicos, não po<strong>de</strong> ser feita pela Defensoria Pública por meio <strong>de</strong> ação civil pública 175 . Contu<strong>do</strong>, no<br />

mesmo tribunal há julgamento que enten<strong>de</strong>u pela legitimida<strong>de</strong> ativa da Defensoria Pública em tema referente ao direito <strong>de</strong><br />

educação, afirman<strong>do</strong> expressamente que ela po<strong>de</strong> tutelar qualquer interesse individual homogêneo, coletivo stricto sensu ou difuso,<br />

consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que sua legitimida<strong>de</strong> não se <strong>de</strong>termina por critérios objetivos, ou seja, pelas características ou perfil <strong>do</strong> objeto <strong>de</strong><br />

tutela, mas por critérios subjetivos, isto é, pela natureza ou status <strong>do</strong>s sujeitos protegi<strong>do</strong>s, que são os necessita<strong>do</strong>s176.<br />

A par da discussão a respeito da extensão da legitimida<strong>de</strong> ativa da Defensoria Pública na tutela coletiva, o reconhecimento <strong>de</strong><br />

sua legitimação traz algumas interessantes consequências, tais como a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> um litisconsórcio ativo entre<br />

Defensorias Públicas, por aplicação extensiva <strong>do</strong> art. 5.º, § 5.º, da Lei 7.347/1985 (LACP) 177 . Também admite-se que a Defensoria<br />

Pública, órgão público que é, celebre compromisso <strong>de</strong> ajustamento <strong>de</strong> conduta, nos termos <strong>do</strong> art. 5.º, § 6.º, da Lei 7.347/1985<br />

(LACP) 178 . Não terá, entretanto, legitimida<strong>de</strong> para conduzir inquérito civil, atuação privativa <strong>do</strong> Ministério Público (art. 8.º, § 1.º,<br />

da Lei 7.347/1985), também faltan<strong>do</strong> legitimida<strong>de</strong> à Defensoria Pública para a propositura da ação popular, que continua exclusiva<br />

<strong>do</strong> cidadão (art. 1.º, caput, da Lei 4.717/1965), e para a propositura da ação <strong>de</strong> improbida<strong>de</strong> administrativa (art. 17, caput, da Lei<br />

8.429/1992) 179 .<br />

11.5.<br />

11.5.1.<br />

RELAÇÃO ENTRE A AÇÃO COLETIVA E A INDIVIDUAL<br />

Introdução<br />

A pendência <strong>de</strong> ação coletiva que possa vir a favorecer o consumi<strong>do</strong>r não impe<strong>de</strong> a propositura <strong>de</strong> uma ação individual, por<br />

meio da qual o consumi<strong>do</strong>r busque a tutela <strong>de</strong> seu direito individual. Por outro la<strong>do</strong>, é possível que no momento <strong>de</strong> propositura da<br />

ação coletiva já existam ações individuais em trâmite. Questiona-se: como a ação individual <strong>de</strong> autor que po<strong>de</strong>rá vir a se beneficiar<br />

pelo julgamento da ação coletiva será afetada em razão da existência <strong>de</strong>ssa ação <strong>de</strong> natureza coletiva?<br />

11.5.2.<br />

Litispendência<br />

O tema é trata<strong>do</strong> pelo art. 104 <strong>do</strong> CDC, que consagra no or<strong>de</strong>namento pátrio regras procedimentais típicas <strong>do</strong> direito norteamericano,<br />

como o fair notice e o right to opt out. A previsão <strong>de</strong> que as ações coletivas não induzem a litispendência para as ações<br />

individuais é até mesmo <strong>de</strong>snecessária, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se a evi<strong>de</strong>nte diferença <strong>do</strong>s elementos <strong>de</strong>ssas duas espécies <strong>de</strong> ação. Apesar<br />

<strong>de</strong> o artigo mencionar apenas as ações coletivas previstas nos incisos I e II <strong>do</strong> parágrafo único <strong>do</strong> art. 81, que incluiria somente os<br />

direitos difusos e coletivos, é pacífica na <strong>do</strong>utrina sua aplicação também para o direito individual homogêneo previsto no art. 81,<br />

parágrafo único, III, <strong>do</strong> CDC.<br />

O termo “litispendência” é equívoco, e po<strong>de</strong> significar pendência da causa (que começa a existir quan<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua propositura e<br />

se encerra com sua extinção) ou pressuposto processual negativo verifica<strong>do</strong> na concomitância <strong>de</strong> processos idênticos (com a<br />

mesma ação). Parece indiscutível que o dispositivo legal ora comenta<strong>do</strong> se valeu <strong>do</strong> termo em seu segun<strong>do</strong> significa<strong>do</strong>, preven<strong>do</strong><br />

que a existência <strong>de</strong> uma ação coletiva não gerará a extinção das ações individuais, ainda que seu autor possa se beneficiar da futura<br />

e eventual vitória na <strong>de</strong>manda coletiva.


Na hipótese <strong>de</strong> direito difuso e coletivo, é fácil constatar a inexistência <strong>de</strong> litispendência entre a ação coletiva e a ação<br />

individual em razão da diferença <strong>de</strong> partes em ambas as ações. Importante salientar que nessa análise entre diferentes processos<br />

<strong>de</strong>ve-se consi<strong>de</strong>rar a parte no senti<strong>do</strong> material, e não no senti<strong>do</strong> processual, <strong>de</strong> forma que, haven<strong>do</strong> substituição processual em<br />

hipótese <strong>de</strong> legitimação extraordinária concorrente, a propositura <strong>de</strong> novo processo com a mesma parte contrária, mesma causa <strong>de</strong><br />

pedir e mesmo pedi<strong>do</strong>, ainda que com outra parte processual <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o mesmo direito já <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong> anteriormente, não afasta a<br />

existência <strong>de</strong> litispendência.<br />

Na comparação entre ações coletivas em que se busca tutelar direitos difusos e coletivos, a parte material será sempre a<br />

coletivida<strong>de</strong> no primeiro caso e uma comunida<strong>de</strong> (grupo, classe ou categoria <strong>de</strong> pessoas) em outro, e na ação individual será<br />

sempre o indivíduo. Essa diferença <strong>de</strong> titularida<strong>de</strong> <strong>do</strong> direito já é o suficiente para se concluir pela inexistência <strong>de</strong> litispendência,<br />

nos termos <strong>do</strong> art. 104 <strong>do</strong> CDC. Ainda que <strong>de</strong>sinteressante para fins <strong>de</strong> comparação <strong>de</strong> ações, as partes processuais que comporão o<br />

polo ativo também serão diferentes.<br />

Quan<strong>do</strong> a ação coletiva tiver como objeto um direito individual homogêneo, também haverá uma diferença <strong>de</strong> parte, ainda que<br />

parcial. Consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que o direito individual homogêneo é a soma <strong>de</strong> direitos individuais, o titular será cada um <strong>do</strong>s indivíduos<br />

titulares <strong>do</strong>s direitos individuais que, soma<strong>do</strong>s, geram o direito processualmente consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> coletivo. Nesse caso, se existir uma<br />

ação individual, o autor será também titular <strong>do</strong> direito individual homogêneo, ainda que parcialmente. Enten<strong>do</strong> que essa diferença<br />

<strong>de</strong> parte, ainda que parcial, já seja o suficiente para que também nesse caso não exista litispendência. Por outro la<strong>do</strong>, o pedi<strong>do</strong> da<br />

ação coletiva será sempre em favor <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os titulares <strong>do</strong>s direitos individuais, ao passo que na ação individual o pedi<strong>do</strong> só<br />

po<strong>de</strong>rá ser feito em benefício <strong>do</strong> autor, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a inexistência <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> para que pleiteie em juízo direitos <strong>de</strong> terceiros.<br />

Registre-se que, mesmo para a parcela da <strong>do</strong>utrina que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a existência <strong>de</strong> litispendência entre a ação coletiva que versa<br />

sobre direito individual homogêneo e a ação individual, a especialida<strong>de</strong> procedimental consagrada no art. 104 <strong>do</strong> CDC para a tutela<br />

coletiva impe<strong>de</strong> a extinção da ação individual.<br />

Há, entretanto, uma hipótese em que será possível a existência <strong>de</strong> uma ação individual e <strong>de</strong> uma ação coletiva. Conforme<br />

<strong>de</strong>vidamente analisa<strong>do</strong> no item 11.2.7, por opção legislativa é cabível ação civil pública para a tutela <strong>de</strong> direito individual<br />

indisponível <strong>de</strong> i<strong>do</strong>so, criança, a<strong>do</strong>lescente e porta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiência. Nesse caso, como o direito tutela<strong>do</strong> na ação coletiva é<br />

puramente individual, é possível a litispendência com uma ação individual proposta pelo próprio titular <strong>do</strong> direito. Tal<br />

possibilida<strong>de</strong> é apenas mais uma <strong>de</strong>monstração <strong>do</strong> <strong>de</strong>svirtuamento da utilização da ação coletiva para a tutela <strong>de</strong> direito individual<br />

indisponível.<br />

11.5.3.<br />

Conexão e continência<br />

11.5.3.1.<br />

Conceito<br />

O fenômeno da conexão vem previsto no art. 55, caput, <strong>do</strong> Novo CPC: “Reputam-se conexas duas ou mais ações quan<strong>do</strong> lhes<br />

for comum o pedi<strong>do</strong> ou a causa <strong>de</strong> pedir”, e o da continência no art. 56 <strong>do</strong> Novo CPC: “Dá-se continência entre duas ou mais ações<br />

quan<strong>do</strong> houver i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> quanto às partes e à causa <strong>de</strong> pedir, mas o objeto <strong>de</strong> uma, por ser mais amplo, abrange o das <strong>de</strong>mais”. Da<br />

própria <strong>de</strong>finição <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is institutos processuais se percebe com clareza que a continência é uma mera espécie <strong>de</strong> conexão,<br />

consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que, para que exista entre duas ou mais ações o fenômeno da continência, obrigatoriamente <strong>de</strong>verá haver a<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> causa <strong>de</strong> pedir, o que por si só já as torna também conexas. A continência, assim, vai além da conexão, pois exige<br />

mais requisitos para se ver configurada no caso concreto.<br />

Haven<strong>do</strong> duas ações <strong>de</strong> rescisão contratual, cada qual com uma fundamentação diferente (um contratante alega o<br />

<strong>de</strong>scumprimento e o outro, onerosida<strong>de</strong> excessiva), mas em ambas sen<strong>do</strong> pedida a rescisão <strong>do</strong> contrato, haverá conexão (mesmo<br />

pedi<strong>do</strong>). Da mesma forma, duas ações fundadas no mesmo contrato <strong>de</strong> locação com <strong>do</strong>is pedi<strong>do</strong>s diferentes: loca<strong>do</strong>r pedin<strong>do</strong> o<br />

<strong>de</strong>spejo e o locatário pedin<strong>do</strong> consignação em pagamento (mesma causa <strong>de</strong> pedir, ao menos em parte, o que já é o bastante,<br />

conforme veremos). Exemplo típico <strong>de</strong> continência se verifica na hipótese <strong>de</strong> existência <strong>de</strong> duas ações, em que na primeira o autor<br />

pe<strong>de</strong> somente a <strong>de</strong>claração da existência da dívida e na segunda pe<strong>de</strong> a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> réu ao seu pagamento, ou ainda a ação em<br />

que se cobram <strong>de</strong>terminadas parcelas <strong>de</strong> um contrato, e outra em que se cobra o contrato integralmente.<br />

Como se nota, a conexão e a continência são institutos processuais que somente serão compreendi<strong>do</strong>s em sua integralida<strong>de</strong><br />

com a <strong>de</strong>vida noção <strong>do</strong>s elementos da ação, responsáveis por sua i<strong>de</strong>ntificação. Assim, para que se possa analisar a existência ou<br />

não <strong>de</strong> tais fenômenos, o opera<strong>do</strong>r <strong>do</strong> direito <strong>de</strong>verá analisar as partes, causa <strong>de</strong> pedir e pedi<strong>do</strong> das ações judiciais para <strong>de</strong>scobrir se<br />

são totalmente idênticos, apenas pareci<strong>do</strong>s ou absolutamente diferentes. A integralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os elementos<br />

ensejará os fenômenos da litispendência e da coisa julgada, fenômenos alheios ao presente estu<strong>do</strong>. A absoluta diversida<strong>de</strong> entre<br />

to<strong>do</strong>s os elementos ou a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> exclusiva das partes não gerarão qualquer efeito digno <strong>de</strong> nota, também sen<strong>do</strong> excluídas da<br />

presente análise. Restam, portanto, as <strong>de</strong>mandas que contenham i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> causa <strong>de</strong> pedir ou <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> – parecidas, portanto.


Na vigência <strong>do</strong> CPC/1973, sempre entendi que o fenômeno da continência não se justificava no sistema, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que,<br />

estan<strong>do</strong> entre seus elementos a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> da causa <strong>de</strong> pedir, a continência sempre foi uma conexão qualificada. Como o efeito <strong>de</strong><br />

ambos era o mesmo – a reunião <strong>do</strong>s processos perante o juízo prevento –, nunca entendi a razão <strong>de</strong> ser da continência. Na<br />

realida<strong>de</strong>, a continência só servia para ser confundida com a litispendência parcial, confusão essa infelizmente disseminada na<br />

<strong>do</strong>utrina nacional180.<br />

O Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil manteve a continência no art. 56, inclusive com seu conceito previsto anteriormente no art.<br />

104 <strong>do</strong> CPC/1973. Ao menos, <strong>de</strong>u uma utilida<strong>de</strong> ao fenômeno, ao prever que nem sempre a continência terá como efeito a reunião<br />

<strong>do</strong>s processos. Segun<strong>do</strong> o art. 57 <strong>do</strong> Novo CPC, quan<strong>do</strong> houver continência e a ação continente tiver si<strong>do</strong> proposta anteriormente, o<br />

processo relativo à ação contida será extinto por sentença sem resolução <strong>de</strong> mérito; caso contrário, as ações serão necessariamente<br />

reunidas.<br />

Existe uma clara lógica na <strong>de</strong>finição das circunstâncias para a reunião ou extinção <strong>de</strong> ações em continência, inclusive ten<strong>do</strong> o<br />

legisla<strong>do</strong>r toma<strong>do</strong> o cuida<strong>do</strong> <strong>de</strong> não permitir que a extinção da ação contida pu<strong>de</strong>sse permitir a “escolha” <strong>do</strong> juízo pelo autor, já que<br />

manteve a reunião das ações quan<strong>do</strong> a ação contida era <strong>de</strong> competência <strong>do</strong> juízo prevento.<br />

Mais uma vez, entretanto, fica clara a disposição <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r para tutelar exclusivamente o processo individual. No processo<br />

coletivo a extinção não <strong>de</strong>ve ser admitida, salvo se houver a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> autor, o que raramente ocorre. No mais das vezes, os<br />

autores são diferentes, mas, por <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rem o mesmo titular <strong>do</strong> direito, são consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s no plano material como o mesmo<br />

sujeito181, o que permite o fenômeno da continência. Nesse caso, em razão da diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> autores, a reunião é o único efeito<br />

aceitável da continência, sob pena <strong>de</strong> ofensa ao princípio da inafastabilida<strong>de</strong> da jurisdição para o autor que tiver sua ação extinta.<br />

Elucidativa lição <strong>de</strong> Moacyr Amaral Santos a respeito <strong>do</strong> tema ora versa<strong>do</strong>:<br />

“A <strong>do</strong>utrina <strong>de</strong> Pescatore, a que nos mantemos fiéis, pois outra ainda não se construiu com argumentos suficientemente capazes <strong>de</strong><br />

superá-la, parte da observação <strong>de</strong> que as coisas, nas suas relações lógicas, são idênticas, diversas ou análogas, conforme sejam os<br />

seus elementos constitutivos. Duas coisas são idênticas quan<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os seus elementos são os mesmos; são diversas quan<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s<br />

os seus elementos diferem; são análogas quan<strong>do</strong> algum ou alguns <strong>do</strong>s seus elementos são os mesmos e outro ou outros são diversos.<br />

A observação também se aplica às ações. Duas ações são idênticas quan<strong>do</strong> seus elementos são os mesmos; são diversas quan<strong>do</strong><br />

diferentes são os seus elementos; são análogas quan<strong>do</strong> um ou <strong>do</strong>is <strong>de</strong> seus elementos são idênticos e outro ou outros são diversos”. 182<br />

Ainda em caráter introdutório, registre-se que a conexão é fenômeno processual que ocorrerá sempre que, entre duas ou mais<br />

<strong>de</strong>mandas, houver a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> causa <strong>de</strong> pedir ou <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>. Esse é o objeto <strong>do</strong> fenômeno, seu conteú<strong>do</strong>. Não se <strong>de</strong>ve confundir<br />

o fenômeno da conexão com a sua consequência, ou seja, com o seu efeito, que será a da reunião <strong>do</strong>s processos perante um só juízo<br />

para julgamento conjunto, sempre que possível. Como se sabe, o conteú<strong>do</strong> não se confun<strong>de</strong> com o efeito, até mesmo porque o<br />

efeito <strong>de</strong> um instituto é fenômeno externo a ele, enquanto o conteú<strong>do</strong> pertence ao seu interior. Esse esclarecimento inicial se faz<br />

necessário para que não haja in<strong>de</strong>vidas confusões entre a conexão e a reunião <strong>de</strong> processos gerada pela conexão, que são<br />

fenômenos processuais diferentes.<br />

11.5.3.2.<br />

Insuficiência <strong>do</strong> conceito legal <strong>de</strong> conexão<br />

Questão digna <strong>de</strong> relevo diz respeito ao preenchimento <strong>do</strong>s requisitos previstos pelo art. 55, caput, <strong>do</strong> Novo CPC. A i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

exigida pelo legisla<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve ser absoluta? Dividin<strong>do</strong>-se a causa <strong>de</strong> pedir em próxima e remota e o pedi<strong>do</strong> em mediato e imediato,<br />

haverá conexão somente com a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> parcial <strong>de</strong>sses elementos ou exige-se a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> total?<br />

No tocante à causa <strong>de</strong> pedir, a <strong>do</strong>utrina vem enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> bastar que um <strong>de</strong> seus elementos seja coinci<strong>de</strong>nte para que haja<br />

conexão entre as ações (seja <strong>do</strong>s fatos ou <strong>do</strong>s fundamentos jurídicos). Esse entendimento se coaduna com os objetivos traça<strong>do</strong>s pela<br />

conexão (economia processual e harmonia entre julga<strong>do</strong>s), abrangen<strong>do</strong> um número maior <strong>de</strong> situações amoldáveis ao instituto<br />

legal. Seria pernicioso ao próprio sistema a a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> entendimento restritivo, em virtu<strong>de</strong> da rarida<strong>de</strong> em que se verifica na praxe<br />

forense a situação <strong>de</strong> duas ações com pedi<strong>do</strong>s diferentes e exatamente a mesma causa <strong>de</strong> pedir183.<br />

Dessa forma, sen<strong>do</strong> aplicada a regra <strong>do</strong> art. 55 <strong>do</strong> Novo CPC para <strong>de</strong>terminar se existente ou não o fenômeno da conexão entre<br />

duas ou mais <strong>de</strong>mandas, é necessário fazer uma restrição inicial quanto à amplitu<strong>de</strong> aparente <strong>do</strong> dispositivo legal no tocante à<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> da causa <strong>de</strong> pedir. Assim, on<strong>de</strong> se lê causa <strong>de</strong> pedir comum, entendam-se fatos ou fundamentos jurídicos <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong><br />

comum 184 .<br />

Ainda que seja esse o entendimento consagra<strong>do</strong> no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, há <strong>de</strong>cisões que flexibilizam ainda mais o<br />

conceito <strong>de</strong> conexão, afirman<strong>do</strong> não ser necessário que se cui<strong>de</strong> <strong>de</strong> causas idênticas quanto aos fundamentos e objetos, bastan<strong>do</strong><br />

que sejam análogas185.<br />

Acredito que tais flexibilizações sempre tiveram como objetivo a reunião <strong>de</strong> processos não conexos, mas que po<strong>de</strong>riam gerar


<strong>de</strong>cisões conflitantes ou contraditórias. Nada disso é necessário diante <strong>do</strong> art. 55, § 3.º <strong>do</strong> Novo CPC, que disciplina tais situações<br />

sem a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sacrificar-se o conceito legal <strong>de</strong> conexão. Na realida<strong>de</strong>, há no novo diploma legal duas hipóteses <strong>de</strong> reunião<br />

<strong>de</strong> processos perante o juízo prevento, ainda que não haja conexão, se for consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> o conceito legal consagra<strong>do</strong> no art. 55,<br />

caput, <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Em mais uma <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> flexibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> conceito legal da conexão na vigência <strong>do</strong> CPC/1973, o Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça vinha enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> pela existência <strong>de</strong> conexão <strong>de</strong> ações <strong>de</strong> execução fiscal, com ou sem embargos, e a ação anulatória <strong>de</strong><br />

débito fiscal, inclusive com a <strong>de</strong>terminação da reunião das ações perante o juiz prevento para seu julgamento simultâneo 186 .<br />

Na ânsia <strong>de</strong> reunir os processos e disso colher os benefícios da economia processual e harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s, via-se uma<br />

conexão 187 on<strong>de</strong> efetivamente ela não existia, afinal, a causa <strong>de</strong> pedir da execução é o título executivo e o pedi<strong>do</strong> é o <strong>de</strong> satisfação<br />

<strong>do</strong> direito, sempre materialmente impossível haver i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses elementos da ação com os elementos da ação proposta pelo<br />

pretenso <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r para discutir a dívida.<br />

Para permitir a reunião <strong>de</strong> execução <strong>de</strong> título extrajudicial e <strong>de</strong> ação <strong>de</strong> conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico, o art. 55,<br />

§ 2.º, I, <strong>do</strong> Novo CPC, equipara tal situação à conexão, num reconhecimento tácito <strong>de</strong> que realmente nessa hipótese não há<br />

conexão, ao menos não nos termos <strong>do</strong> art. 55, caput, <strong>do</strong> Novo CPC 188 . A técnica legislativa é simplesmente <strong>de</strong>sastrosa, mas <strong>do</strong>s<br />

<strong>de</strong>stroços é possível se chegar a alguma luz, por meio <strong>de</strong> intepretação sistêmica <strong>do</strong>s dispositivos conti<strong>do</strong>s no art. 55 <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

O caput <strong>do</strong> art. 55 <strong>do</strong> Novo CPC prevê o conceito <strong>de</strong> conexão (i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> ou <strong>de</strong> causa <strong>de</strong> pedir) e o § 1.º o seu efeito<br />

(reunião <strong>do</strong>s processos perante o juízo prevento). O § 2.º, caput, prevê que se aplicam a seus incisos o disposto no caput, o que<br />

causa a qualquer leitor atento estranheza. Aparentemente, o legisla<strong>do</strong>r quis dizer que, mesmo não haven<strong>do</strong> conexão nas hipóteses<br />

previstas nos incisos <strong>do</strong> § 2.º <strong>do</strong> Novo CPC, haveria conexão por vonta<strong>de</strong> da lei. Ou seja, a lei transforman<strong>do</strong> a realida<strong>de</strong> das<br />

coisas.<br />

Realmente não consigo enten<strong>de</strong>r, e tampouco explicar a razão <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r para tal previsão, quan<strong>do</strong> tu<strong>do</strong> o que ele queria<br />

po<strong>de</strong>ria ser previsto <strong>de</strong> forma muito mais objetiva e correta: bastava o caput <strong>do</strong> § 2.º <strong>do</strong> art. 55 <strong>do</strong> Novo CPC fazer remissão ao §<br />

1.º ou até mesmo ao § 3.º, e não ao caput <strong>do</strong> dispositivo legal. Ou seja, mesmo não haven<strong>do</strong> conexão haverá seu feito, qual seja, a<br />

reunião <strong>de</strong> ações conexas num mesmo juízo.<br />

Registre-se a <strong>de</strong>snecessida<strong>de</strong> <strong>do</strong> previsto no art. 55, § 2.º, II, <strong>do</strong> Novo CPC, que prevê equiparação à conexão a existência <strong>de</strong><br />

ações <strong>de</strong> execução fundadas no mesmo título executivo. Tal previsão po<strong>de</strong> sugerir que não há conexão entre essas ações <strong>de</strong><br />

execução, mas sen<strong>do</strong> o título executivo a causa <strong>de</strong> pedir executiva, e estan<strong>do</strong> as execuções fundadas no mesmo título executivo, é<br />

inegável a existência <strong>de</strong> conexão, nos exatos termos <strong>do</strong> art. 55, caput, <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Ainda que o art. 55, § 2.º, I, <strong>do</strong> Novo CPC, preveja <strong>de</strong> forma inova<strong>do</strong>ra uma reunião <strong>de</strong> processos não conexos, a gran<strong>de</strong><br />

novida<strong>de</strong> a respeito <strong>do</strong> tema fica por conta <strong>do</strong> § 3.º <strong>do</strong> art. 55 <strong>do</strong> Novo CPC. O dispositivo prevê a reunião <strong>de</strong> processos, mesmo<br />

não conexos, sempre que exista risco <strong>de</strong> prolação <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões conflitantes ou contraditórias caso sejam <strong>de</strong>cidi<strong>do</strong>s separadamente<br />

(diferentes juízos). A reunião nessas circunstâncias já vinha sen<strong>do</strong> aceita pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, ainda que por meio da<br />

extensão <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> conexão189.<br />

Significa dizer que não há mais necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contorcer o conceito legal <strong>de</strong> conexão, bastan<strong>do</strong> para justificar a reunião o risco<br />

aponta<strong>do</strong> pelo dispositivo legal ora comenta<strong>do</strong>. A harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s, afinal, não precisa ser garantida apenas em processos<br />

que tenham o mesmo pedi<strong>do</strong> ou a mesma causa <strong>de</strong> pedir.<br />

11.5.3.3.<br />

Vantagens e <strong>de</strong>svantagens da reunião <strong>do</strong>s processos<br />

Fixa<strong>do</strong>s os limites da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> exigida para que se verifique a conexão entre duas <strong>de</strong>mandas com a interpretação possível da<br />

redação constante no art. 55, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, é importante analisar as razões <strong>de</strong> ser da conexão e, mais especialmente, da sua<br />

consequência: a reunião <strong>do</strong>s processos perante um mesmo juízo. São duas as principais razões: economia processual e<br />

harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s190.<br />

A primeira e inegável vantagem aferida com o fenômeno da conexão é evitar que <strong>de</strong>cisões conflitantes sejam proferidas por<br />

<strong>do</strong>is juízos diferentes. A existência <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões conflitantes proferidas em <strong>de</strong>mandas que tratem <strong>de</strong> situações similares é,<br />

naturalmente, motivo <strong>de</strong> <strong>de</strong>scrédito ao Po<strong>de</strong>r Judiciário, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> inclusive gerar problemas práticos <strong>de</strong> difícil solução.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, é inegável que a reunião <strong>de</strong> duas ou mais <strong>de</strong>mandas perante somente um juiz favoreça, no mais das vezes, a<br />

verificação <strong>do</strong> princípio da economia processual, já que os atos processuais serão pratica<strong>do</strong>s somente uma vez, o que se mostrará<br />

mais cômo<strong>do</strong> ao Po<strong>de</strong>r Judiciário (funcionará apenas uma estrutura – juiz, escrivão, cartorário etc.) e às partes e terceiros que<br />

tenham <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> colaboração com a Justiça (p. ex., testemunhas, que só prestarão <strong>de</strong>poimento uma vez). Com a prática <strong>de</strong> atos<br />

processuais que sirvam a mais <strong>de</strong> um processo, é evi<strong>de</strong>nte que haverá otimização <strong>do</strong> tempo e, em razão disso, respeito ao princípio<br />

da economia processual.


A questão da economia processual, entretanto, <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada <strong>de</strong> forma secundária, seja pelo maior relevo que se dá à<br />

harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s, seja porque nem sempre a reunião <strong>de</strong> processos conexos representará a concretização <strong>de</strong> tal princípio.<br />

Tanto é assim que a <strong>do</strong>utrina, quan<strong>do</strong> analisa os requisitos para que ocorra a reunião <strong>do</strong>s processos perante um mesmo juízo para<br />

julgamento simultâneo, afirma que a principal razão para que isso ocorra é a harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s, evitan<strong>do</strong> o inegável malestar<br />

cria<strong>do</strong> por <strong>de</strong>cisões conflitantes para situações fáticas afins191.<br />

Os <strong>do</strong>is fundamentos que ensejam a reunião <strong>do</strong>s processos em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> conexão – embora em diferentes graus <strong>de</strong><br />

importância – estão intimamente liga<strong>do</strong>s a razões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, posto interessar ao próprio Esta<strong>do</strong> que os julga<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r<br />

Judiciário sejam harmoniosos e que se gastem o menor tempo e recursos para obtê-los. Justamente em virtu<strong>de</strong> <strong>do</strong>s interesses que<br />

procura preservar (or<strong>de</strong>m pública), essa causa modifica<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> competência é <strong>do</strong>tada <strong>de</strong> maior força <strong>do</strong> que todas as <strong>de</strong>mais.<br />

Apesar das inegáveis vantagens da reunião <strong>de</strong> ações conexas, e até mesmo não conexas, nos termos <strong>do</strong>s § 2.º, I e § 3.º <strong>do</strong> art.<br />

55 <strong>do</strong> Novo CPC, não <strong>de</strong>vem ser <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>radas as <strong>de</strong>svantagens.<br />

A reunião <strong>de</strong> processos perante o juízo prevento po<strong>de</strong> sacrificar o exercício da ampla <strong>de</strong>fesa das partes <strong>do</strong> processo que é<br />

remeti<strong>do</strong> para o juízo prevento. É claro que, por exemplo, tramitan<strong>do</strong> os processos conexos num mesmo foro, a reunião em um<br />

juízo prevento não afetará em nada as partes. Também dificilmente se po<strong>de</strong>rá falar em sacrifício ao exercício da ampla <strong>de</strong>fesa em<br />

processos conexos que tramitem em foros distintos, mas contíguos ou da mesma região metropolitana, porque nesses casos a<br />

modificação <strong>de</strong> competência não afetará <strong>de</strong> forma significativa o exercício da ampla <strong>de</strong>fesa.<br />

O mesmo, entretanto, não se po<strong>de</strong> dizer <strong>de</strong> conexão entre processos que tramitam em foros distantes um <strong>do</strong> outro, ainda mais<br />

em um país <strong>de</strong> dimensões continentais como é o Brasil. Nesse caso, o <strong>de</strong>scolamento <strong>do</strong> processo para foro muito afasta<strong>do</strong> po<strong>de</strong><br />

prejudicar o exercício da ampla <strong>de</strong>fesa, sacrifican<strong>do</strong> em especial o litigante eventual e, <strong>de</strong> forma ainda mais sentida, a parte que não<br />

tem condições econômicas para participar <strong>de</strong> forma a<strong>de</strong>quada <strong>de</strong> um processo que correrá a quilômetros <strong>de</strong> distância. E tu<strong>do</strong> fica<br />

pior se pensarmos que a reunião nesse caso po<strong>de</strong>rá se sobrepor à regra <strong>de</strong> competência criada justamente para proteger o<br />

hipossuficiente, como ocorre, por exemplo, com o art. 101, I, <strong>do</strong> CDC.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, haven<strong>do</strong> uma pluralida<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong> processos conexos, uma eventual reunião <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s eles perante o<br />

juízo prevento inviabilizaria o trabalho judiciário <strong>de</strong> tal juízo. Basta imaginar o que aconteceria se nos processos que envolvem<br />

planos econômicos houvesse um juízo prevento: teria recebi<strong>do</strong> mais <strong>de</strong> um milhão <strong>de</strong> processos! Como vivemos numa socieda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> massa, os conflitos <strong>de</strong> massa são cada vez mais comuns, e sen<strong>do</strong> nosso processo coletivo ainda incipiente, a pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

processos com a mesma matéria jurídica (processos repetitivos) é inevitável. Mas é interessante reuni-los to<strong>do</strong>s num mesmo juízo<br />

prevento, ainda que, com isso, se obtenha a harmonia <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s?<br />

11.5.3.4.<br />

Obrigatorieda<strong>de</strong> ou facultativida<strong>de</strong> na reunião <strong>de</strong> processos em razão da conexão<br />

O art. 55, § 1.º <strong>do</strong> Novo CPC prevê que os processos <strong>de</strong> ações conexas serão reuni<strong>do</strong>s para <strong>de</strong>cisão conjunta, salvo se um <strong>de</strong>les<br />

já houver si<strong>do</strong> sentencia<strong>do</strong>. A impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reunião <strong>de</strong> <strong>de</strong>mandas conexas quan<strong>do</strong> uma <strong>de</strong>las já tiver si<strong>do</strong> sentenciada já vinha<br />

sen<strong>do</strong> reconhecida pela jurisprudência, passan<strong>do</strong> agora a estar prevista em lei. Mas realmente serão reuni<strong>do</strong>s os processos <strong>de</strong> ações<br />

conexas, salvo essa hipótese, haven<strong>do</strong> conexão?<br />

Há corrente <strong>do</strong>utrinária que entendia ser a regra <strong>do</strong> art. 105 <strong>do</strong> CPC/1973 (agora art. 55, § 1.º <strong>do</strong> Novo CPC) <strong>de</strong> natureza<br />

cogente, o que retiraria <strong>do</strong> juiz qualquer liberda<strong>de</strong> a respeito <strong>de</strong> sua aplicação no caso concreto. Haven<strong>do</strong> a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> causa <strong>de</strong><br />

pedir ou <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>, os processos <strong>de</strong>veriam – e não po<strong>de</strong>riam – ser reuni<strong>do</strong>s192. Por outro la<strong>do</strong>, existia corrente <strong>do</strong>utrinária mais<br />

flexível quanto à reunião <strong>do</strong>s processos por conexão, atribuin<strong>do</strong> ao juiz uma maior liberda<strong>de</strong> no caso concreto para analisar a<br />

conveniência <strong>de</strong> realizar tal reunião. Essa liberda<strong>de</strong> variaria conforme a intensida<strong>de</strong> da conexão e os benefícios reais advin<strong>do</strong>s da<br />

reunião das <strong>de</strong>mandas 193 . É lição muito próxima <strong>de</strong> parcela da <strong>do</strong>utrina que entendia ser obrigatória a reunião, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que se<br />

verificasse a efetiva realização <strong>do</strong>s objetivos traça<strong>do</strong>s por tal fenômeno processual, em especial a economia processual 194 .<br />

Apesar <strong>de</strong> toda a polêmica que envolve a questão da obrigatorieda<strong>de</strong> ou não da reunião <strong>de</strong> processos conexos criada na<br />

vigência <strong>do</strong> CPC/1973, e que <strong>de</strong>ve ser mantida na vigência <strong>do</strong> Novo CPC, acredito que uma reunião que não possa alcançar<br />

nenhum <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is objetivos traça<strong>do</strong>s para o instituto está totalmente fora <strong>de</strong> questão. A aplicação automática, sem nenhuma<br />

pon<strong>de</strong>ração a respeito da ratio da norma, não se justifica. E parece concordar com tal posição a jurisprudência, sumulan<strong>do</strong> o<br />

Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça o entendimento <strong>de</strong> que não existe reunião <strong>de</strong> processos conexos quan<strong>do</strong> um <strong>de</strong>les já estiver no<br />

tribunal 195 , circunstância esta em que, obviamente, a reunião <strong>do</strong>s processos não geraria qualquer economia processual ou harmonia<br />

<strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s, visto que em um <strong>de</strong>les a prova já foi produzida e a <strong>de</strong>cisão já foi prolatada.<br />

Há diversos julga<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que afirmam expressamente existir um verda<strong>de</strong>iro juízo <strong>de</strong> conveniência<br />

basea<strong>do</strong> em juízo <strong>de</strong> discricionarieda<strong>de</strong> na reunião <strong>de</strong> ações conexas, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> suficientemente claro não ser obrigatória tal reunião<br />

no caso concreto 196 . Essa facultativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reunião <strong>de</strong> ações conexas está inclusive sumulada quan<strong>do</strong> a conexão se <strong>de</strong>r entre


execuções fiscais propostas contra o mesmo <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r 197 . Tu<strong>do</strong> leva a crer que a reunião nos termos <strong>do</strong> § 3.º <strong>do</strong> art. 55 <strong>do</strong> Novo CPC<br />

seguirá a mesma lógica, ou seja, não será obrigatória, mesmo que haja risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões conflitantes e contraditórias.<br />

Pacificada a não obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> reunião <strong>de</strong> ações conexas, é preciso registrar que, haven<strong>do</strong> ações conexas <strong>de</strong> diferentes<br />

competências absolutas em trâmite, haverá um impedimento legal para sua reunião perante o juízo prevento198. Haven<strong>do</strong> o perigo<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões conflitantes, o máximo que po<strong>de</strong>rá ser feito é a suspensão <strong>de</strong> uma das ações em razão <strong>de</strong> prejudicialida<strong>de</strong> externa (art.<br />

313, V, “a”, <strong>do</strong> Novo CPC) 199 .<br />

Durante certo tempo, houve dúvida acerca <strong>de</strong> como proce<strong>de</strong>r na hipótese <strong>de</strong> ações coletivas conexas em trâmite na Justiça<br />

Fe<strong>de</strong>ral e na Justiça Estadual. Enquanto a 1.ª Seção <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça entendia no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> ser possível a reunião <strong>de</strong><br />

ações coletivas originariamente em trâmite na Justiça Estadual e na Justiça Fe<strong>de</strong>ral perante a segunda, aparentemente <strong>de</strong>sprezan<strong>do</strong><br />

as <strong>de</strong>mais regras que <strong>de</strong>terminam a prevenção <strong>do</strong> juízo 200 , a 2.ª Seção entendia pela inviabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reunião em razão das<br />

diferentes competências <strong>de</strong> Justiça das duas ações coletivas 201 . O primeiro entendimento, pela reunião perante a Justiça Fe<strong>de</strong>ral,<br />

acabou prevalecen<strong>do</strong> e gerou a Súmula 489/STJ.<br />

Segun<strong>do</strong> entendimento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, ainda que exista conexão entre as causas e estas tramitem perante o<br />

mesmo juízo, não há obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão conjunta. De acor<strong>do</strong> com correta <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Egrégio tribunal, notan<strong>do</strong> o juiz que a<br />

solução <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>manda não influenciará a <strong>de</strong>cisão da outra, não existe qualquer nulida<strong>de</strong> em <strong>de</strong>cidi-las em momentos distintos 202 .<br />

Obrigatória ou não a reunião <strong>do</strong>s processos, a conexão tem tratamento processual <strong>de</strong> matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, o que significa<br />

legitimida<strong>de</strong> plena para sua arguição (qualquer <strong>do</strong>s sujeitos processuais po<strong>de</strong>rá fazê-lo: autor, réu, terceiro interveniente, Ministério<br />

Público como fiscal da lei, juiz <strong>de</strong> ofício). Justamente pela natureza <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, não está sujeita à preclusão, não haven<strong>do</strong>,<br />

portanto, um prazo e tampouco uma forma específica para sua alegação no processo. Registre-se somente a improprieda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

alegação <strong>de</strong> tal matéria em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> exceção <strong>de</strong> incompetência, instrumento processual que busca afastar o juízo incompetente, o<br />

que não ocorre na conexão, que busca fixar um entre <strong>do</strong>is ou mais juízos competentes. Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública,<br />

entretanto, a alegação <strong>de</strong>verá ser consi<strong>de</strong>rada, mas não como exceção, o que significa que não haverá suspensão <strong>do</strong> processo para a<br />

apreciação da conexão alegada203.<br />

Por fim, justamente em razão da natureza jurídica <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública atribuída à conexão, surge dúvida a respeito da natureza <strong>do</strong><br />

vício em processo em que <strong>de</strong>veria ter ocorri<strong>do</strong> a reunião, mas a mesma não houve. Apesar <strong>de</strong> – pela lógica sistemática <strong>do</strong>s vícios<br />

<strong>do</strong> ato jurídico – se tratar <strong>de</strong> uma nulida<strong>de</strong> absoluta, sem a prova <strong>do</strong> efetivo prejuízo, não parece que a <strong>de</strong>cisão possa ser anulada,<br />

em respeito ao princípio da instrumentalida<strong>de</strong> das formas. Sen<strong>do</strong> o fenômeno da conexão instituto preocupa<strong>do</strong> com a preservação<br />

da economia processual, não teria senti<strong>do</strong> permitir a anulação da <strong>de</strong>cisão pelo simples <strong>de</strong>scumprimento <strong>do</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> no art. 55,<br />

§ 1.º <strong>do</strong> Novo CPC, o que certamente ensejaria uma afronta clara a tal princípio. Dessa forma, a parte que alegar o vício <strong>de</strong>verá<br />

comprovar seu efetivo prejuízo pela não reunião <strong>do</strong>s processos, que uma vez comprova<strong>do</strong>, gerará a anulação da <strong>de</strong>cisão 204 .<br />

11.5.3.5.<br />

Especificamente na relação entre ação coletiva e individual<br />

Parece não haver maiores dúvidas a respeito da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conexão entre ações coletivas e individuais, senão pelo<br />

pedi<strong>do</strong>, ao menos pela i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> causa <strong>de</strong> pedir205. Há, inclusive, entendimento <strong>do</strong>utrinário que aponta até mesmo para a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> existência <strong>de</strong> continência entre ação coletiva que verse sobre direito individual homogêneo e ação individual.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, Hugo Nigro Mazzilli:<br />

“Ora, a rigor, nem mesmo no caso <strong>de</strong> interesses individuais homogêneos teremos vera e própria litispendência entre ação civil<br />

pública (ou coletiva) e ação individual, uma vez que não coinci<strong>de</strong>m seus objetos: o caso seria antes <strong>de</strong> conexão, ou, sob<br />

circunstâncias específicas, até mesmo <strong>de</strong> continência, quan<strong>do</strong> o objeto da ação civil pública ou coletiva compreen<strong>de</strong>sse, porque mais<br />

abrangente, o objeto da ação individual”206.<br />

Enten<strong>do</strong> que, para se concluir pela continência nesses casos, <strong>de</strong>verá se abrir uma pequena exceção ao requisito exigi<strong>do</strong> pelo art.<br />

56 <strong>do</strong> Novo CPC no tocante à i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> partes. E não as partes no senti<strong>do</strong> processual, que apesar <strong>de</strong> necessariamente serem<br />

diferentes, não interessam quan<strong>do</strong> da comparação entre ações. A parte material da ação coletiva é a soma <strong>de</strong> indivíduos titulares<br />

<strong>do</strong>s direitos individuais que, soma<strong>do</strong>s, resultam no direito individual homogêneo, enquanto na ação individual a parte é somente o<br />

indivíduo que propôs a <strong>de</strong>manda judicial. As partes, portanto, não serão idênticas. Caso se utilize característica própria da<br />

continência, po<strong>de</strong>-se falar que a parte material da ação coletiva, por mais ampla, contém a parte material da ação individual.<br />

Idênticas, entretanto, elas não são.<br />

A discussão, na realida<strong>de</strong>, é mais acadêmica <strong>do</strong> que prática, porque em se consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> não haver a continência, certamente<br />

haverá conexão, o que já é o suficiente para a eventual reunião das ações perante o juízo prevento. Sen<strong>do</strong> a continência apenas uma<br />

conexão qualificada, haven<strong>do</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> da causa <strong>de</strong> pedir – requisito tanto <strong>do</strong> art. 55 quanto <strong>do</strong> art. 56 <strong>do</strong> Novo CPC – já será


caso <strong>de</strong> se analisar a aplicabilida<strong>de</strong> no caso concreto da regra prevista no art. 58 <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Ainda que a efetiva reunião <strong>de</strong> ações conexas sempre <strong>de</strong>penda <strong>de</strong> uma análise casuística, não sen<strong>do</strong> diferente na conexão<br />

existente entre ação coletiva e ação individual, a priori é possível <strong>de</strong>saconselhar tal reunião, em especial quan<strong>do</strong> houver um<br />

número significativo <strong>de</strong> ações individuais.<br />

Para tal conclusão, basta se pensar na concentração <strong>de</strong> trabalho que teria um juízo que recebesse todas as ações coletivas e<br />

individuais em situações como os <strong>do</strong>s planos econômicos Bresser, Collor e Verão. Foram milhares <strong>de</strong> ações individuais e algumas<br />

centenas <strong>de</strong> ações coletivas. Ainda que limitada territorialmente a reunião das ações em respeito ao art. 16 da LACP, que,<br />

atualmente, nem vem mais sen<strong>do</strong> aplica<strong>do</strong> pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, a reunião das <strong>de</strong>mandas criaria um obstáculo<br />

intransponível ao bom andamento <strong>do</strong>s trabalhos cartoriais <strong>do</strong> juízo prevento 207 . Por outro la<strong>do</strong>, ao se <strong>de</strong>terminar o juízo prevento<br />

em foro muito distante e <strong>de</strong> difícil acesso aos indivíduos autores das ações individuais, ter-se-ia inaceitável ofensa ao princípio <strong>do</strong><br />

acesso à or<strong>de</strong>m justa.<br />

Registre-se corrente <strong>do</strong>utrinária que, apesar <strong>de</strong> reconhecer os problemas pragmáticos da eventual reunião das <strong>de</strong>mandas, afirma<br />

ser esse um problema liga<strong>do</strong> à política da administração da justiça no país, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s como razões para a não<br />

reunião das <strong>de</strong>mandas conexas.208 Apesar <strong>de</strong> concordar com a premissa, continuo na percepção <strong>de</strong> que as normas processuais<br />

<strong>de</strong>vem levar em consi<strong>de</strong>ração a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> nosso dia a dia forense, sob pena <strong>de</strong> se criar uma regra acadêmica e outra prática, o<br />

que sempre gerará insegurança jurídica e <strong>de</strong>sprestígio à ciência.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, não se po<strong>de</strong> simplesmente <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar a técnica criada pelo art. 104 <strong>do</strong> CDC, que proporciona os mesmos<br />

ganhos da reunião <strong>de</strong> <strong>de</strong>mandas conexas: economia processual (evitar repetição <strong>de</strong> atos processuais) e harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s<br />

(evitar a prolação <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões contraditórias). A suspensão da ação individual, ainda mais da forma como vem sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>terminada<br />

pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, já é o suficiente para que as vantagens da reunião das ações já sejam sentidas mesmo sem que tal<br />

reunião efetivamente ocorra.<br />

De qualquer forma, partin<strong>do</strong>-se da premissa <strong>de</strong> que <strong>de</strong>va ocorrer a reunião entre as ações individuais e coletiva no caso<br />

concreto, haverá interessante questão a respeito <strong>de</strong> quem será o juízo prevento. Se por um la<strong>do</strong> a reunião <strong>de</strong> ações individuais<br />

conexas tem regras <strong>de</strong> conexão previstas no art. 58, <strong>do</strong> Novo CPC, na reunião <strong>de</strong> ações coletivas existem três outras regras com o<br />

mesmo conteú<strong>do</strong>: art. 5.º, § 3.º, da Lei 4.717/1965; art. 2.º, parágrafo único, da Lei 7.347/1985 e art. 17, § 5.º, da Lei 8.429/1992.<br />

Qual <strong>de</strong>ssas regras seria aplicável, já que a reunião misturaria o plano individual e coletivo?<br />

Haven<strong>do</strong> a concomitância <strong>de</strong> ação individual e coletiva, a prevenção <strong>do</strong> juízo perante o qual tramita a ação coletiva, além <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>correr <strong>de</strong> previsão legal, se justifica no maior alcance da tutela jurisdicional pretendida em tais <strong>de</strong>mandas. Enquanto na ação<br />

individual busca-se tutelar somente o direito individual <strong>do</strong> autor, na ação coletiva busca-se tutelar o direito da coletivida<strong>de</strong>, titular<br />

<strong>do</strong> direito difuso que forma o objeto <strong>do</strong> processo. Natural, portanto, que a tutela da coletivida<strong>de</strong> se imponha, inclusive quanto à<br />

prevenção <strong>do</strong> juízo, à tutela <strong>do</strong> indivíduo.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, as lições da melhor <strong>do</strong>utrina, quan<strong>do</strong> afirma que “apesar da eventual precedência <strong>do</strong> processamento <strong>de</strong> ações<br />

individuais em relação a uma ação coletiva que lhes seja objetivamente pertinente, é o juízo da <strong>de</strong>manda coletiva (fixada pelo local<br />

<strong>do</strong> dano, recor<strong>de</strong>-se) que atrai todas as individuais para fins <strong>de</strong> julgamento simultâneo – ou seja, a prevenção seria firmada, então<br />

pelo <strong>de</strong>spacho na primeira ação coletiva”209.<br />

Registre-se, nesse senti<strong>do</strong>, a lição <strong>do</strong> Ministro <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral Teori Albino Zavascki, que por tanto tempo<br />

enobreceu esse Egrégio Tribunal enquanto atuou como seu ministro. O jurista, ao comentar a relação entre ações individuais e<br />

coletivas, assevera que “entre as duas ações, portanto, não há litispendência e tal resulta claro <strong>do</strong> art. 104 da Lei 8.078, <strong>de</strong> 1990.<br />

Há, isto sim, conexão (CPC, art. 103), a <strong>de</strong>terminar, na medida <strong>do</strong> possível, o processamento conjunto, perante o juízo da ação<br />

coletiva, <strong>de</strong> todas as ações individuais, anteriores ou supervenientes” 210 .<br />

11.5.4. Suspensão <strong>do</strong> processo individual<br />

Conforme previsão <strong>do</strong> art. 104 <strong>do</strong> CDC, se o autor da ação individual não requerer no prazo <strong>de</strong> 30 dias a suspensão <strong>de</strong> sua ação<br />

individual, não po<strong>de</strong>rá se aproveitar <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> da ação coletiva. O dispositivo legal ainda prevê que o termo inicial da contagem<br />

<strong>de</strong>sse prazo será a ciência nos autos da ação individual <strong>do</strong> ajuizamento da ação coletiva.<br />

A regra é facilmente compreendida, apesar <strong>de</strong> não escapar <strong>de</strong> algumas polêmicas, em especial quanto aos <strong>do</strong>is aspectos<br />

essenciais <strong>do</strong> dispositivo legal: a comunicação ao autor da ação individual da existência <strong>de</strong> uma ação coletiva (fair notice) e o<br />

efetivo direito <strong>de</strong> o autor continuar o trâmite <strong>de</strong> sua ação individual, excluin<strong>do</strong>-se da ação coletiva (right to opt out).<br />

Não existe no art. 104 <strong>do</strong> CDC qualquer regra, nem mesmo indício, <strong>de</strong> quem seja o responsável pela informação da existência<br />

da ação coletiva na ação individual. Caberia a informação ao réu <strong>de</strong>ssa ação, que certamente saberá da existência da ação coletiva<br />

porque também nela ocupará o polo passivo? Caberia ao juiz <strong>de</strong> ofício se manifestar a respeito da existência <strong>de</strong>ssa ação coletiva? É


ônus <strong>do</strong> autor individual <strong>de</strong>scobrir a existência <strong>de</strong>ssa ação coletiva, levan<strong>do</strong> tal informação aos autos da ação individual?<br />

Certamente o legisla<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>ria ter si<strong>do</strong> mais claro na previsão legal, o que evitaria toda a divergência criada em torno da<br />

questão. Enten<strong>do</strong> que o ônus <strong>de</strong> informar a existência da ação coletiva é <strong>do</strong> réu, sen<strong>do</strong> este o maior interessa<strong>do</strong> em tal informação.<br />

Tanto a suspensão <strong>do</strong> processo individual como sua continuida<strong>de</strong> com a exclusão <strong>do</strong> autor individual <strong>do</strong>s efeitos da ação coletiva<br />

interessam mais ao réu <strong>do</strong> que ao autor, que teoricamente se manteria em uma situação mais confortável se continuasse com sua<br />

ação individual em trâmite, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ainda se aproveitar <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> positivo <strong>do</strong> processo coletivo.<br />

Apesar <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r que o ônus <strong>de</strong> requerer a informação <strong>do</strong> autor individual pertença ao réu, não vejo qualquer vedação à<br />

atuação oficiosa <strong>do</strong> juiz, até porque a eventual suspensão <strong>do</strong> processo individual gera economia processual e harmonização <strong>do</strong>s<br />

julga<strong>do</strong>s, matérias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública que po<strong>de</strong>m ser preservadas <strong>de</strong> ofício pelo juiz.<br />

O autor, entretanto, não po<strong>de</strong> arcar com o ônus <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir ou saber da existência da ação coletiva para pedir a continuação da<br />

ação individual ou sua suspensão. O próprio art. 104 <strong>do</strong> CDC prevê que o autor será informa<strong>do</strong>, o que permite a conclusão <strong>de</strong> que<br />

há a provocação por parte <strong>de</strong> outro sujeito que não o próprio autor. É natural que, se o autor voluntariamente pedir a suspensão <strong>de</strong><br />

seu processo em <strong>de</strong>corrência da existência <strong>de</strong> uma ação coletiva, o juiz <strong>de</strong>verá acatar o pedi<strong>do</strong>, mas tal postura constituir um ônus<br />

<strong>do</strong> autor seria um verda<strong>de</strong>iro absur<strong>do</strong>.<br />

Realizada a informação <strong>do</strong> autor da ação individual, que socorrerá por meio <strong>de</strong> publicação <strong>do</strong> Diário Oficial na pessoa <strong>de</strong> seu<br />

advoga<strong>do</strong>, caberá a ele uma escolha. Caso o autor opte por se aproveitar <strong>de</strong> uma futura e eventual vitória <strong>do</strong> autor coletivo, <strong>de</strong>verá<br />

requerer a suspensão <strong>de</strong> sua ação individual: (a) no caso <strong>de</strong> sua perspectiva se concretizar, a ação individual per<strong>de</strong> o objeto e o<br />

autor da ação individual terá em seu favor um título executivo judicial (sentença coletiva), sen<strong>do</strong> interessante o posicionamento <strong>do</strong><br />

Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que, em vez <strong>de</strong> extinguir a ação individual por carência superveniente, a converte em liquidação <strong>de</strong><br />

sentença211; (b) <strong>de</strong> outro mo<strong>do</strong>, caso mantenha em trâmite sua ação individual, excluir-se-á <strong>do</strong>s efeitos da ação coletiva, não<br />

po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> se valer da futura e eventual sentença <strong>de</strong> procedência da ação coletiva como título executivo judicial.<br />

Aparentemente, o autor individual teria mais razões para suspen<strong>de</strong>r seu processo individual, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que assim teria duas<br />

chances <strong>de</strong> vitória. Caso o processo coletivo não alcance o sucesso espera<strong>do</strong>, o autor ainda disporá <strong>de</strong> mais uma chance com a<br />

continuação <strong>de</strong> seu processo individual. Ao se auto excluir da ação coletiva, a única possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vitória <strong>do</strong> autor passa a ser a<br />

sua ação individual. Se você po<strong>de</strong> ter duas ou somente uma bala para acertar um alvo, é natural a opção pela manutenção <strong>de</strong> duas.<br />

Ocorre, entretanto, que a suspensão <strong>do</strong> processo individual em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> ação coletiva não se transformou em realida<strong>de</strong>.<br />

Costuma-se dizer que no Brasil existem as leis que pegam e as que não pegam. Por mais triste que seja reconhecer, parece que a<br />

regra estabelecida pelo art. 104 <strong>do</strong> CDC é da segunda espécie. A <strong>de</strong>sconfiança com a ação coletiva, a ausência <strong>de</strong> informação por<br />

parte <strong>do</strong>s réus, o <strong>de</strong>sconhecimento da lei (o silêncio <strong>do</strong> autor <strong>de</strong>ve ser compreendi<strong>do</strong> como a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> continuar com o processo<br />

individual) são razões sentidas na praxe forense para que as ações individuais prossigam durante o trâmite da ação coletiva. Vários<br />

são os motivos que po<strong>de</strong>m ser aponta<strong>do</strong>s, mas o fato é que a suspensão das ações individuais em razão <strong>do</strong> trâmite <strong>de</strong> uma ação<br />

coletiva é fato raro no dia a dia forense.<br />

Certamente notan<strong>do</strong> tal circunstância, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, com entendimento bastante singular da regra estabelecida<br />

pelo art. 104 <strong>do</strong> CDC, <strong>de</strong>cidiu que a suspensão é obrigatória, <strong>de</strong> nada importan<strong>do</strong> a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> autor individual continuar com seu<br />

processo individual:<br />

“Recurso repetitivo. Ação civil pública. Suspensão. Ação individual. A Seção, ao apreciar REsp submeti<strong>do</strong> ao regime <strong>do</strong> art. 543-C<br />

<strong>do</strong> CPC e da Res. 8/2008-STJ, por maioria, firmou o entendimento <strong>de</strong> que, ajuizada a ação coletiva atinente à macro li<strong>de</strong> gera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong><br />

processos multitudinários, admite-se a sustação <strong>de</strong> ações individuais no aguar<strong>do</strong> <strong>do</strong> julgamento da ação coletiva. Quanto ao tema <strong>de</strong><br />

fun<strong>do</strong>, o Min. Relator explica que se <strong>de</strong>ve manter a suspensão <strong>do</strong>s processos individuais <strong>de</strong>terminada pelo Tribunal a quo à luz da<br />

legislação processual mais recente, principalmente ante a Lei <strong>do</strong>s Recursos Repetitivos (Lei 11.672/2008), sem contradição com a<br />

orientação antes a<strong>do</strong>tada por este Superior Tribunal nos termos da legislação anterior, ou seja, que só consi<strong>de</strong>rava os dispositivos da<br />

Lei da Ação Civil Pública. Observa, ainda, entre outros argumentos, que a faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> suspensão nos casos multitudinários abre-se<br />

ao juízo em atenção ao interesse público <strong>de</strong> preservação da efetivida<strong>de</strong> da Justiça, que fica praticamente paralisada por processos<br />

individuais multitudinários, conten<strong>do</strong> a mesma li<strong>de</strong>. Dessa forma, torna-se válida a <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> suspensão <strong>do</strong> processo<br />

individual no aguar<strong>do</strong> <strong>do</strong> julgamento da macro li<strong>de</strong> trazida no processo <strong>de</strong> ação coletiva embora seja assegura<strong>do</strong> o direito ao<br />

ajuizamento individual” (STJ – REsp 1.110.549/RS – Segunda Seção – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 28.10.2009 – Informativo STJ<br />

413).<br />

11.5.5.<br />

Extinção <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança individual<br />

O art. 22, § 1.º, da Lei 12.016/2009, em sua primeira parte, apenas repete a regra consagrada no art. 104 <strong>do</strong> CDC, ao prever<br />

que o manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança não induz litispendência para as ações individuais; se o dispositivo conti<strong>do</strong> na legislação consumerista<br />

já era <strong>de</strong>snecessário, o mesmo ocorre com o dispositivo ora analisa<strong>do</strong>. A novida<strong>de</strong> fica por conta da segunda parte <strong>do</strong> dispositivo


legal agora enfrenta<strong>do</strong>, que cria regra consi<strong>de</strong>ravelmente oposta àquela prevista no art. 104 <strong>do</strong> CDC.<br />

Da simples leitura <strong>do</strong> art. 22, § 1.º, da Lei 12.016/2009 nota-se que a regra é outra, porque o dispositivo legal obriga o autor da<br />

ação individual a <strong>de</strong>sistir <strong>de</strong> sua ação no prazo <strong>de</strong> 30 dias da informação da existência da ação coletiva, caso queira continuar<br />

vincula<strong>do</strong> ao manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança coletivo.<br />

É preciso observar que, como o dispositivo legal menciona <strong>de</strong> forma genérica a “ação individual”, não será apenas aplicável<br />

aos manda<strong>do</strong>s <strong>de</strong> segurança individuais, mas a qualquer espécie <strong>de</strong> ação individual212. Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança<br />

individual, a norma é ainda mais drástica, porque em razão da exiguida<strong>de</strong> <strong>do</strong> prazo para a impetração <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança –<br />

120 dias – nem se po<strong>de</strong>ria abrandar a dureza <strong>do</strong> dispositivo legal com a afirmação <strong>de</strong> que, com a <strong>de</strong>sistência, a repropositura <strong>do</strong><br />

manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança seria admitida em razão da ausência <strong>de</strong> coisa julgada material 213 .<br />

O mais incongruente da obrigatorieda<strong>de</strong> da <strong>de</strong>sistência da ação individual dá-se no caso <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão terminativa ou <strong>de</strong><br />

improcedência no manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança coletivo. Saben<strong>do</strong>-se que a coisa julgada coletiva opera-se para o indivíduo secundum<br />

eventum litis e in utilibus, po<strong>de</strong>rá individualmente ser buscada a tutela <strong>do</strong> direito pelo indivíduo, mas não mais pelo manda<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

segurança, porque, nesse caso, muito provavelmente o prazo <strong>de</strong> 120 dias já terá transcorri<strong>do</strong>. Como o indivíduo não estará nesse<br />

caso vincula<strong>do</strong> à <strong>de</strong>cisão negativa proferida no processo coletivo, e essa realida<strong>de</strong> não foi alterada pelo dispositivo legal ora<br />

comenta<strong>do</strong>, restará a ele as vias ordinárias para a tutela <strong>de</strong> seu direito, o que significa que lhe será retira<strong>do</strong> in<strong>de</strong>vidamente o direito<br />

ao manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança.<br />

Realmente, nesse tocante, o legisla<strong>do</strong>r exagerou na <strong>do</strong>se. Obrigar o indivíduo a optar entre a ação individual e a ação coletiva<br />

por meio da <strong>de</strong>sistência da primeira não se coaduna com o princípio da inafastabilida<strong>de</strong> da tutela jurisdicional, consagra<strong>do</strong> no art.<br />

5º, XXXV, da CF. Enten<strong>do</strong> que não é saudável ao sistema a existência concomitante <strong>de</strong> diversas ações individuais e manda<strong>do</strong>s <strong>de</strong><br />

segurança coletivos que tratem da mesma matéria, mas daí a concordar com a exigência <strong>de</strong> <strong>de</strong>sistência das primeiras para que os<br />

indivíduos possam se aproveitar da tutela coletiva existe uma distância consi<strong>de</strong>rável. O i<strong>de</strong>al seria tornar a suspensão das ações<br />

individuais obrigatória, forçan<strong>do</strong> os indivíduos a esperar a solução da ação coletiva, porém manten<strong>do</strong> seu direito individual <strong>de</strong><br />

ação.<br />

E, quan<strong>do</strong> a ação individual for um manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança, po<strong>de</strong>ria até mesmo ser mantida a obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sistência,<br />

mas com a fixação <strong>do</strong> termo inicial para a repropositura no trânsito em julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança. Dessa forma, os<br />

impetrantes que tivessem <strong>de</strong>sisti<strong>do</strong> <strong>de</strong> seu manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança individual na esperança <strong>de</strong> serem tutela<strong>do</strong>s pela ação coletiva,<br />

caso não obtenham tal tutela, po<strong>de</strong>riam repropor seu manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança individual.<br />

Essa solução evitaria a proliferação <strong>de</strong> manda<strong>do</strong>s <strong>de</strong> segurança individuais, sem retirar arbitrariamente o direito <strong>de</strong> ação <strong>do</strong>s<br />

indivíduos, mas reconhece-se que tal solução exige previsão legal, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser aplicada por meio <strong>de</strong> hermenêutica jurídica.<br />

11.6.<br />

11.6.1.<br />

COISA JULGADA<br />

Introdução<br />

A <strong>do</strong>utrina é tranquila em apontar que a coisa julgada é um <strong>do</strong>s aspectos mais relevantes na distinção da tutela coletiva da<br />

individual. Regras tradicionais presentes na tutela individual, tais como a coisa julgada pro et contra e sua eficácia inter partes, são<br />

simplesmente <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>radas, passan<strong>do</strong>-se a eficácias ultra partes e erga omnes e à coisa julgada secundum eventum probationis<br />

e secundum eventum litis.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, existe ainda a funesta e lamentável regra consagrada no art. 16 da Lei 7.347/1985, que aparentemente cria uma<br />

espécie <strong>de</strong> limitação territorial aos efeitos da sentença e, por consequência, da coisa julgada material.<br />

11.6.2.<br />

Coisa julgada secundum eventum probationis<br />

No tocante aos direitos coletivos e difusos, a coisa julgada, na hipótese <strong>de</strong> julgamento <strong>de</strong> improcedência <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>, tem uma<br />

especialida<strong>de</strong> que a diferencia da coisa julgada tradicional, prevista pelo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Enquanto no instituto<br />

tradicional a imutabilida<strong>de</strong> e a indiscutibilida<strong>de</strong> geradas pela coisa julgada não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>do</strong> fundamento da <strong>de</strong>cisão, nos direitos<br />

difusos e coletivos, caso tenha a sentença como fundamento a ausência ou a insuficiência <strong>de</strong> provas, não se impedirá a propositura<br />

<strong>de</strong> novo processo com os mesmos elementos da ação – partes, causa <strong>de</strong> pedir e pedi<strong>do</strong> –, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a possibilitar uma nova <strong>de</strong>cisão,<br />

o que, naturalmente, afastará, ainda que <strong>de</strong> forma condicional, os efeitos <strong>de</strong> imutabilida<strong>de</strong> e indiscutibilida<strong>de</strong> da primeira <strong>de</strong>cisão<br />

transitada em julga<strong>do</strong>.<br />

Exclui-se da análise os direitos individuais homogêneos porque, nestes, a coisa julgada opera-se secundum eventum litis;<br />

assim, qualquer fundamento que leve à improcedência não afetará os interesses <strong>do</strong>s indivíduos titulares <strong>do</strong> direito (art. 103, III, <strong>do</strong><br />

CDC):


“<strong>Direito</strong> processual civil. Improcedência <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda coletiva proposta em <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> direitos individuais homogêneos e<br />

impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> novo ajuizamento <strong>de</strong> ação coletiva por outro legitima<strong>do</strong>.<br />

Após o trânsito em julga<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão que julga improce<strong>de</strong>nte ação coletiva proposta em <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> direitos individuais homogêneos,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> motivo que tenha fundamenta<strong>do</strong> a rejeição <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>, não é possível a propositura <strong>de</strong> nova <strong>de</strong>manda com o<br />

mesmo objeto por outro legitima<strong>do</strong> coletivo, ainda que em outro Esta<strong>do</strong> da fe<strong>de</strong>ração. Inicialmente, saliente-se que a leitura<br />

precipitada <strong>do</strong> disposto no inciso III <strong>do</strong> art. 103 <strong>do</strong> CDC po<strong>de</strong>ria levar à equivocada conclusão <strong>de</strong> que apenas a procedência da ação<br />

coletiva emanaria efeitos capazes <strong>de</strong> obstar a nova propositura <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda coletiva idêntica. Ocorre que a interpretação <strong>do</strong> referi<strong>do</strong><br />

inciso <strong>de</strong>ve se dar com a observância <strong>do</strong> disposto no § 2.º, que é claro ao estabelecer que, mesmo diante <strong>de</strong> solução judicial pela<br />

improcedência <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> coletivo original, apenas os interessa<strong>do</strong>s que não tiverem intervin<strong>do</strong> na ação coletiva na condição <strong>de</strong><br />

litisconsortes é que po<strong>de</strong>rão propor <strong>de</strong>manda análoga e, ainda assim, única e exclusivamente a título individual. Ciente disso, a<br />

simples leitura <strong>do</strong>s arts. 81, III, e 103, III, § 2.°, <strong>do</strong> CDC evi<strong>de</strong>ncia que, para a aferição da exata extensão <strong>do</strong>s efeitos da sentença<br />

proferida em ação coletiva que tenha por objeto direitos individuais homogêneos – diversamente <strong>do</strong> que ocorre em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

direitos difusos e coletivos –, é juridicamente irrelevante investigar se o provimento judicial <strong>de</strong> improcedência <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> resultou ou<br />

não <strong>de</strong> eventual insuficiência probatória. Isso porque a redação <strong>do</strong> inciso III <strong>do</strong> art. 103 <strong>do</strong> CDC não repete a ressalva (incisos I e II<br />

<strong>do</strong> referi<strong>do</strong> dispositivo) <strong>de</strong> que a sentença <strong>de</strong> improcedência por insuficiência <strong>de</strong> provas seria incapaz <strong>de</strong> fazer coisa julgada. Dessa<br />

forma, para os direitos individuais homogêneos, o legisla<strong>do</strong>r a<strong>do</strong>tou técnica distinta, ressalvan<strong>do</strong> a formação <strong>de</strong> coisa julgada<br />

somente em favor <strong>do</strong>s ‘interessa<strong>do</strong>s que não tiverem intervin<strong>do</strong> no processo como litisconsortes’, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que somente esses<br />

po<strong>de</strong>rão propor ação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização a título individual, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> negativo – <strong>de</strong> improcedência por qualquer<br />

motivo – da <strong>de</strong>manda coletiva anteriormente proposta” (Informativo 575/STJ – 2.ª Seção – REsp 1.302.596/SP – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong><br />

Tarso Sanseverino – Rel. para acórdão Min. Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – j. 09.12.2015, DJe 1.°.02.2016).<br />

A primeira questão a respeito <strong>de</strong>ssa espécie atípica <strong>de</strong> coisa julgada diz respeito à sua constitucionalida<strong>de</strong>. Uma corrente<br />

minoritária vê uma quebra da isonomia em referi<strong>do</strong> sistema e aponta para uma proteção exacerbada <strong>do</strong>s autores das ações coletivas<br />

stricto sensu em <strong>de</strong>sfavor <strong>do</strong>s réus. Apesar <strong>de</strong> mais sentida nas ações que tenham como objeto os direitos individuais homogêneos,<br />

também nas que tratam <strong>de</strong> direitos difusos e coletivos haveria uma disparida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tratamento absolutamente <strong>de</strong>sigual, o que feriria<br />

o princípio constitucional da isonomia214.<br />

Majoritariamente, entretanto, a <strong>do</strong>utrina enten<strong>de</strong> pela constitucionalida<strong>de</strong> da coisa julgada secundum eventum probationis –<br />

como também da coisa julgada secundum eventum litis –, afirman<strong>do</strong> que os sujeitos titulares <strong>do</strong> direito, ao não participarem<br />

efetivamente <strong>do</strong> processo, não po<strong>de</strong>rão ser prejudica<strong>do</strong>s por uma má condução procedimental <strong>do</strong> autor da <strong>de</strong>manda. Não seria justo<br />

ou legítimo impingir a toda uma coletivida<strong>de</strong>, em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> uma falha na condução <strong>do</strong> processo, a perda <strong>de</strong>finitiva <strong>de</strong> seu<br />

direito material. A ausência da efetiva participação <strong>do</strong>s titulares <strong>do</strong> direito em um processo em contraditório é fundamento<br />

suficiente para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r essa espécie <strong>de</strong> coisa julgada material 215 .<br />

A<strong>de</strong>mais, a coisa julgada secundum eventum probationis serve como medida <strong>de</strong> segurança <strong>do</strong>s titulares <strong>do</strong> direito que não<br />

participam como partes no processo contra qualquer espécie <strong>de</strong> <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> conduta <strong>do</strong> autor. A insuficiência ou a inexistência <strong>de</strong><br />

provas po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>correr, logicamente, <strong>de</strong> uma inaptidão técnica <strong>do</strong>s que propuseram a <strong>de</strong>manda judicial, mas também não se po<strong>de</strong>rá<br />

afastar, <strong>de</strong> antemão, algum ajuste entre as partes para que a prova necessária não seja produzida e com isso a sentença seja <strong>de</strong><br />

improcedência216. É bem verda<strong>de</strong> que os po<strong>de</strong>res instrutórios <strong>do</strong> juiz, aguça<strong>do</strong>s nas ações coletivas em razão da natureza <strong>do</strong>s<br />

direitos envolvi<strong>do</strong>s, po<strong>de</strong>riam também funcionar como forma <strong>de</strong> controle para que isso não ocorra, mas é inegável que a maneira<br />

mais eficaz <strong>de</strong> afastar, <strong>de</strong>finitivamente, qualquer ajuste fraudulento nesse senti<strong>do</strong> é a a<strong>do</strong>ção da coisa julgada secundum eventum<br />

probationis.<br />

Outra questão que parece ter si<strong>do</strong> pacificada pela <strong>do</strong>utrina e pela jurisprudência diz respeito aos legitima<strong>do</strong>s à propositura <strong>de</strong><br />

um novo processo com a mesma causa <strong>de</strong> pedir e o mesmo pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> primeiro; estaria legitima<strong>do</strong> o mesmo sujeito que propôs a<br />

primeira <strong>de</strong>manda que foi resolvida <strong>de</strong> forma negativa por ausência ou insuficiência <strong>de</strong> provas? A ausência <strong>de</strong> qualquer indicativo<br />

proibitivo para a repetição <strong>do</strong> polo ativo nas duas <strong>de</strong>mandas parece afastar <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>finitiva a proibição. To<strong>do</strong>s os legitima<strong>do</strong>s<br />

po<strong>de</strong>rão, com base na prova nova, propor a “segunda” <strong>de</strong>manda, mesmo aquele que já havia participa<strong>do</strong> no polo ativo da<br />

“primeira” 217 .<br />

A próxima questão refere-se à formação ou não <strong>de</strong> coisa julgada nas ações coletivas – direitos difusos e coletivos – julgadas<br />

improce<strong>de</strong>ntes por ausência ou insuficiência <strong>de</strong> provas. Fala-se em coisa julgada secundum eventum probationis, mas há<br />

divergência a respeito <strong>de</strong> ser essa uma espécie atípica <strong>de</strong> coisa julgada ou se, nesse caso, a coisa julgada material estaria afastada,<br />

<strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a operar-se, no caso concreto, tão somente a coisa julgada formal.<br />

Há parcela significativa da <strong>do</strong>utrina que enten<strong>de</strong> não se operar, nesse caso, a coisa julgada material, por afirmar que, sen<strong>do</strong><br />

possível a propositura <strong>de</strong> um novo processo com os mesmos elementos da ação – partes, causa <strong>de</strong> pedir e pedi<strong>do</strong> –, a imutabilida<strong>de</strong><br />

e a indiscutibilida<strong>de</strong> próprias da coisa julgada material não se fariam presentes. A possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> existência <strong>de</strong> um segun<strong>do</strong><br />

processo, que, naturalmente, proporcionará uma segunda <strong>de</strong>cisão, afetaria <strong>de</strong> maneira irremediável a segurança jurídica advinda da


coisa julgada material tradicional, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a estar afasta<strong>do</strong> esse fenômeno processual quan<strong>do</strong> os fundamentos que levaram à<br />

improcedência <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> forem a insuficiência ou a inexistência <strong>de</strong> prova218.<br />

Esse entendimento, entretanto, não é o mais correto, parecen<strong>do</strong> configurar-se a mesma confusão a respeito da formação ou não<br />

da coisa julgada nos processos cujo objeto sejam as relações <strong>de</strong> trato continuativo, reguladas pelo art. 505, I, <strong>do</strong> Novo CPC. Em<br />

razão da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que a sentença <strong>de</strong>terminativa seja alterada em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> circunstâncias supervenientes <strong>de</strong> fato e <strong>de</strong><br />

direito, parcela da <strong>do</strong>utrina apressou-se a afirmar que essa “instabilida<strong>de</strong>” da sentença seria incompatível com o fenômeno da coisa<br />

julgada material, que exige a imutabilida<strong>de</strong> e a indiscutibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>.<br />

Aos partidários <strong>do</strong> entendimento <strong>de</strong> que não existe coisa julgada nas ações que tratam <strong>de</strong> direito difuso ou coletivo quan<strong>do</strong> a<br />

improcedência <strong>de</strong>correr da insuficiência ou ausência <strong>de</strong> provas surge uma questão <strong>de</strong> difícil resposta: como <strong>de</strong>verá o juiz proce<strong>de</strong>r<br />

ao receber uma petição inicial <strong>de</strong> um processo idêntico a um processo anterior <strong>de</strong>cidi<strong>do</strong> nessas condições, em que o autor não<br />

indica qualquer nova prova para fundamentar sua pretensão, alegan<strong>do</strong> tão somente não ser possível suportar a extrema injustiça da<br />

primeira <strong>de</strong>cisão? Sem ao menos indícios <strong>de</strong> que existe uma prova nova, ainda que o fundamento da primeira <strong>de</strong>cisão tenha si<strong>do</strong> a<br />

insuficiência ou ausência <strong>de</strong> provas, po<strong>de</strong>rá o juiz dar continuida<strong>de</strong> ao processo?<br />

É evi<strong>de</strong>nte nesse caso que o juiz <strong>de</strong>verá in<strong>de</strong>ferir a petição inicial; não há maiores dúvidas a esse respeito. Mas sob qual<br />

fundamento? O fundamento <strong>de</strong> sua <strong>de</strong>cisão será o art. 485, V, <strong>do</strong> Novo CPC, o qual aponta que, nesse caso, não se po<strong>de</strong>rá afastar a<br />

segurança obtida pela coisa julgada material gerada pela primeira <strong>de</strong>cisão. Essa é a prova maior <strong>de</strong> que existe coisa julgada<br />

material, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> fundamento da <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> mérito da primeira <strong>de</strong>manda que efetivamente ocorreu, embora sua<br />

imutabilida<strong>de</strong> e sua indiscutibilida<strong>de</strong> estejam, no caso da ausência ou insuficiência <strong>de</strong> provas, condicionadas à inexistência <strong>de</strong><br />

prova nova que possa fundamentar a nova <strong>de</strong>manda.<br />

Apesar da <strong>de</strong>fesa veemente da existência <strong>de</strong> coisa julgada material na hipótese ora analisada e da extinção <strong>do</strong> processo quan<strong>do</strong><br />

não houver prova nova em razão justamente <strong>do</strong> fenômeno da coisa julgada material, ainda que seja admitida a inexistência <strong>de</strong> coisa<br />

julgada material quan<strong>do</strong> esta se verifica secundum eventum probationis, como prefere a <strong>do</strong>utrina que tratou <strong>do</strong> tema, a conclusão a<br />

que to<strong>do</strong>s chegam já é o suficiente para os fins busca<strong>do</strong>s no presente trabalho: se não houver prova nova, o processo <strong>de</strong>verá ser<br />

extinto sem julgamento <strong>do</strong> mérito. Seja por falta <strong>de</strong> interesse <strong>de</strong> agir, como prefere a <strong>do</strong>utrina219, seja por força da coisa julgada, o<br />

essencial é a conclusão pacífica <strong>de</strong> que o segun<strong>do</strong> processo não <strong>de</strong>ve ser admiti<strong>do</strong>.<br />

Há outro interessante questionamento a respeito <strong>do</strong> tema que vem suscitan<strong>do</strong> dúvidas na <strong>do</strong>utrina nacional. Os dispositivos<br />

legais que tratam da coisa julgada secundum eventum probationis são omissos a respeito da exigência <strong>de</strong> que, expressa ou<br />

implicitamente, conste da sentença ter si<strong>do</strong> a improcedência gerada pela ausência ou insuficiência <strong>de</strong> provas, ou se tal circunstância<br />

po<strong>de</strong>rá ser estranha à <strong>de</strong>cisão, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a ser <strong>de</strong>monstrada somente na segunda <strong>de</strong>manda. A tomada <strong>de</strong> uma ou <strong>de</strong> outra posição terá<br />

peso fundamental no próprio conceito <strong>de</strong> prova nova, que será fixa<strong>do</strong> a seguir.<br />

A tese restritiva exige que haja na motivação ou no dispositivo da <strong>de</strong>cisão, expressa ou implicitamente, a circunstância da<br />

ausência ou insuficiência <strong>de</strong> provas. Afirma-se que, por ser uma exceção à regra da coisa julgada material prevista em nosso<br />

or<strong>de</strong>namento processual, <strong>de</strong>verá o juiz indicar, ou ao menos ser possível <strong>de</strong>duzir <strong>de</strong> sua fundamentação, que sua <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong><br />

improcedência <strong>de</strong>correu <strong>de</strong> uma insuficiência ou inexistência <strong>de</strong> material probatório. A ausência <strong>de</strong>ssa circunstância<br />

proporcionaria, obrigatoriamente, a geração <strong>de</strong> coisa julgada material tradicional 220 .<br />

Com entendimento contrário, existe corrente <strong>do</strong>utrinária que não vê qualquer necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> constar, expressa ou<br />

implicitamente na sentença, que a improcedência <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong>correu <strong>de</strong> ausência ou insuficiência <strong>de</strong> provas. A <strong>do</strong>utrina que<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong> uma tese mais ampla afirma que não se <strong>de</strong>veria a<strong>do</strong>tar um critério meramente formal <strong>do</strong> instituto, propon<strong>do</strong>-se um critério<br />

mais liberal, nomea<strong>do</strong> <strong>de</strong> critério substancial. Segun<strong>do</strong> essa visão, sempre que um legitima<strong>do</strong> propuser, com o mesmo fundamento,<br />

uma segunda <strong>de</strong>manda coletiva na qual fundamente sua pretensão em uma nova prova, estar-se-á diante da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> obter<br />

uma segunda <strong>de</strong>cisão221.<br />

A segunda corrente <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> o entendimento mais acerta<strong>do</strong>, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que a a<strong>do</strong>ção da tese restritiva limitaria<br />

in<strong>de</strong>vidamente o conceito <strong>de</strong> prova nova. Ao exigir-se <strong>do</strong> juiz uma fundamentação referente à ausência ou à insuficiência <strong>de</strong><br />

provas, será impossível a ele se manifestar sobre o que não existia à época da <strong>de</strong>cisão, o que retiraria a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> propositura<br />

<strong>de</strong> uma nova <strong>de</strong>manda fundada em meio <strong>de</strong> prova não existente à época da prolação da <strong>de</strong>cisão. Nesses casos, haveria um in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong><br />

e in<strong>de</strong>sejável estreitamento <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> nova prova, que também, por não ser tranquilo na <strong>do</strong>utrina, se passa a analisar.<br />

To<strong>do</strong>s os regramentos legais que tratam da coisa julgada secundum eventum probationis são omissos quanto ao conceito <strong>de</strong><br />

“nova prova”, missão legada à <strong>do</strong>utrina. Parcela majoritária da <strong>do</strong>utrina enten<strong>de</strong> que não se <strong>de</strong>ve confundir nova prova com prova<br />

superveniente, surgida após o término da ação coletiva. Por esse entendimento, seria nova a prova, mesmo que preexistente ou<br />

contemporânea à ação coletiva, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não tenha si<strong>do</strong> nesta consi<strong>de</strong>rada. Assim, o que interessa não é se a prova existia ou não<br />

à época da <strong>de</strong>manda coletiva, mas se foi ou não apresentada durante seu trâmite procedimental; será nova porque, no tocante à<br />

222


pretensão <strong>do</strong> autor, é uma novida<strong>de</strong>, mesmo que, em termos temporais, não seja algo recente .<br />

Esse entendimento muito se assemelha ao conceito da<strong>do</strong>, pela melhor <strong>do</strong>utrina, ao “fato novo” como fundamento da liquidação<br />

<strong>de</strong> sentença por artigos. Também nesse caso o adjetivo “novo” não é utiliza<strong>do</strong> para <strong>de</strong>signar um fato ocorri<strong>do</strong> após o término <strong>do</strong><br />

processo em que se formou o título executivo, mas sim como novida<strong>de</strong> ao Po<strong>de</strong>r Judiciário, por não ter si<strong>do</strong> objeto <strong>de</strong> apreciação<br />

em tal processo. O fato, portanto, assim como a “nova prova” nas ações coletivas, po<strong>de</strong>rá ser anterior, concomitante ou posterior à<br />

<strong>de</strong>manda judicial; para ser adjetiva<strong>do</strong> <strong>de</strong> novo, basta que não tenha si<strong>do</strong> objeto <strong>de</strong> apresentação pelas partes e <strong>de</strong> apreciação pelo<br />

juiz.<br />

Registre-se o pensamento, a respeito <strong>do</strong> tema, exposto por Ada Pellegrini Grinover, que, nos trabalhos para a elaboração <strong>do</strong><br />

Anteprojeto <strong>de</strong> Código Mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Processos Coletivos para a Ibero-América, enten<strong>de</strong>u, com Kazuo Watanabe, que as provas que<br />

já po<strong>de</strong>riam ter si<strong>do</strong> produzidas, mas não o foram, ficam acobertadas pela eficácia preclusiva da coisa julgada. Fato novo, portanto,<br />

seria o superveniente. A regra constava <strong>do</strong> art. 38, § 1.º, <strong>do</strong> Projeto <strong>de</strong> Lei 5.139/2009, que foi arquiva<strong>do</strong> na Câmara <strong>do</strong>s<br />

Deputa<strong>do</strong>s, conforme já analisa<strong>do</strong> no Capítulo 3.<br />

A i<strong>de</strong>ia restritiva <strong>de</strong> conceito <strong>de</strong> “nova prova” sugerida pela processualista não parece ser a mais a<strong>de</strong>quada sob a ótica da<br />

proteção <strong>do</strong>s direitos transindividuais em juízo. Já foi <strong>de</strong>vidamente exposto que uma das razões para admitir a coisa julgada<br />

secundum eventum probationis nas <strong>de</strong>mandas que tenham como objeto direitos difusos ou coletivos é evitar que, por meio <strong>de</strong><br />

conluio fraudulento entre as partes processuais, se obtenha uma <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> improcedência. Consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a relevância <strong>do</strong> direito<br />

material <strong>de</strong>bati<strong>do</strong> e a ausência <strong>do</strong>s legitima<strong>do</strong>s no processo, ao menos essa proteção lhes <strong>de</strong>ve ser concedida, o que não ocorreria se<br />

fosse a<strong>do</strong>tada a visão <strong>de</strong> que somente provas que não existiam à época da <strong>de</strong>manda coletiva permitiriam uma nova <strong>de</strong>manda<br />

judicial.<br />

De qualquer forma, o pensamento ao menos se mostra bastante correto quan<strong>do</strong> sedimenta a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que, ao surgir uma prova<br />

que não existia ou que era impossível <strong>de</strong> obter à época da ação coletiva, sua apresentação será o suficiente para permitir a<br />

propositura <strong>de</strong> um novo processo com os mesmos elementos da ação anterior. Nesse caso, evi<strong>de</strong>ntemente, não será possível<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a corrente <strong>do</strong>utrinária que exige <strong>do</strong> juiz a indicação, expressa ou implícita, <strong>de</strong> ter o julgamento <strong>de</strong> improcedência<br />

<strong>de</strong>corri<strong>do</strong> <strong>de</strong> ausência ou insuficiência <strong>de</strong> provas. Não saben<strong>do</strong> da existência da prova porque não era possível sua obtenção, o que<br />

só veio a ser possibilita<strong>do</strong>, por exemplo, pelo avanço tecnológico, não haveria possibilida<strong>de</strong> lógica <strong>de</strong> o juiz consi<strong>de</strong>rar tal<br />

circunstância em sua <strong>de</strong>cisão.<br />

11.6.3.<br />

Coisa julgada secundum eventum litis<br />

No sistema tradicional da coisa julgada, esta se opera com a simples resolução <strong>de</strong> mérito, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> no<br />

caso concreto (pro et contra). Portanto, é irrelevante saber se o pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> autor foi acolhi<strong>do</strong> ou rejeita<strong>do</strong>, se houve sentença<br />

homologatória ou se o juiz reconheceu a prescrição ou <strong>de</strong>cadência; sen<strong>do</strong> sentença prevista no art. 487 <strong>do</strong> Novo CPC, faz coisa<br />

julgada material.<br />

No entanto, existe outro sistema possível, que, ao menos na tutela individual, é extremamente excepcional: a coisa julgada<br />

secundum eventum litis. Por meio <strong>de</strong>sse sistema, nem toda sentença <strong>de</strong> mérito faz coisa julgada material, tu<strong>do</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

resulta<strong>do</strong> concreto da sentença <strong>de</strong>finitiva transitada em julga<strong>do</strong>. Por vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r é possível que o sistema crie exceções<br />

pontuais à relação sentença <strong>de</strong> mérito com cognição exauriente e a coisa julgada material.<br />

Po<strong>de</strong>ria o sistema passar a prever que toda sentença <strong>de</strong> mérito fundada em prescrição não fará coisa julgada em ações nas quais<br />

figure como parte um i<strong>do</strong>so, ou, ainda, que a sentença que homologa transação não fará coisa julgada material quan<strong>do</strong> o acor<strong>do</strong><br />

tiver como objeto direito real. Apesar da óbvia irrazoabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s exemplos forneci<strong>do</strong>s, servem para <strong>de</strong>ixar claro que afastar a<br />

coisa julgada material <strong>de</strong> sentença <strong>de</strong> mérito, que em regra se tornariam imutáveis e indiscutíveis com o trânsito em julga<strong>do</strong>, em<br />

fenômeno conheci<strong>do</strong> como coisa julgada secundum eventum litis, é fruto <strong>de</strong> uma opção político-legislativa.<br />

Na tutela individual, a técnica da coisa julgada secundum eventum litis é consi<strong>de</strong>ravelmente excepcional, mas aparentemente<br />

foi aplicada no art. 274 <strong>do</strong> CC, que trata <strong>do</strong>s limites subjetivos da coisa julgada nas <strong>de</strong>mandas cujo objeto seja a dívida solidária,<br />

uma vez que, sen<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> improce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> autor, os <strong>de</strong>mais cre<strong>do</strong>res solidários, que não participaram <strong>do</strong> processo, não<br />

estarão vincula<strong>do</strong>s à coisa julgada material. É na tutela coletiva que a coisa julgada secundum eventum litis passa a ter posição <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>staque.<br />

Segun<strong>do</strong> previsão <strong>do</strong> art. 103, § 1.º, <strong>do</strong> CDC, os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II <strong>do</strong> mesmo dispositivo legal<br />

não prejudicarão interesses e direitos individuais <strong>do</strong>s integrantes da coletivida<strong>de</strong>, <strong>do</strong> grupo, classe ou categoria, em regra também<br />

aplicável ao inciso III223. Significa que, <strong>de</strong>corren<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma mesma situação fática jurídica consequências no plano <strong>do</strong> direito<br />

coletivo e individual, e sen<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> improce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong> formula<strong>do</strong> em <strong>de</strong>manda coletiva, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da<br />

fundamentação, os indivíduos não estarão vincula<strong>do</strong>s a esse resulta<strong>do</strong>, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ingressar livremente com suas ações individuais. A


única sentença que os vincula é a <strong>de</strong> procedência, porque esta naturalmente os beneficia, permitin<strong>do</strong>-se que o indivíduo se valha<br />

<strong>de</strong>ssa sentença coletiva, liquidan<strong>do</strong>-a no foro <strong>de</strong> seu <strong>do</strong>micílio e posteriormente executan<strong>do</strong>-a, o que o dispensará <strong>do</strong> processo <strong>de</strong><br />

conhecimento. A <strong>do</strong>utrina fala em coisa julgada secundum eventum litis in utilibus, porque somente a <strong>de</strong>cisão que seja útil ao<br />

indivíduo será capaz <strong>de</strong> vinculá-lo a sua coisa julgada material224.<br />

Uma empresa petrolífera causa um gran<strong>de</strong> vazamento <strong>de</strong> óleo em uma <strong>de</strong>terminada baía, o que naturalmente agri<strong>de</strong> o meio<br />

ambiente saudável, mas também prejudica os pesca<strong>do</strong>res <strong>do</strong> local, que têm danos individuais por não mais po<strong>de</strong>rem exercer seu<br />

ofício. Haven<strong>do</strong> uma ação coletiva fundada no direito difuso a um meio ambiente equilibra<strong>do</strong> e sen<strong>do</strong> essa ação julgada<br />

improce<strong>de</strong>nte, os pesca<strong>do</strong>res po<strong>de</strong>rão ingressar e vencer em ações individuais <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização contra a empresa petrolífera. Por<br />

outro la<strong>do</strong>, com a sentença <strong>de</strong> procedência, os pesca<strong>do</strong>res po<strong>de</strong>rão se valer <strong>de</strong>sse título executivo judicial, liquidan<strong>do</strong> seus danos<br />

individuais e executan<strong>do</strong> o valor <strong>do</strong> prejuízo.<br />

Registre-se que esse benefício da coisa julgada material da ação coletiva po<strong>de</strong> ser excepciona<strong>do</strong> em duas circunstâncias:<br />

(a)<br />

(b)<br />

na hipótese <strong>de</strong> o indivíduo ser informa<strong>do</strong> na ação individual da existência da ação coletiva (fair notice), e em um prazo <strong>de</strong> 30 dias<br />

preferir continuar com a ação individual (right to opt out), não será beneficia<strong>do</strong> pela sentença coletiva <strong>de</strong> procedência (art. 104 <strong>do</strong><br />

CDC) 225 . O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça corretamente enten<strong>de</strong> que, não ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> o autor <strong>de</strong>vidamente informa<strong>do</strong> da existência da<br />

ação coletiva, <strong>de</strong> seu resulta<strong>do</strong> se beneficia, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> <strong>de</strong>sfecho <strong>de</strong> sua ação individual 226 ;<br />

nas ações coletivas <strong>de</strong> direito individual homogêneo, o art. 94 <strong>do</strong> CDC admite a intervenção <strong>do</strong>s indivíduos como litisconsortes <strong>do</strong><br />

autor, e nesse caso os indivíduos se vinculam a qualquer resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo coletivo, mesmo no caso <strong>de</strong> sentença <strong>de</strong><br />

improcedência 227 .<br />

11.6.4.<br />

Limitação territorial da coisa julgada<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 16 da LACP, “a sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorial <strong>do</strong> órgão<br />

prolator, exceto se o pedi<strong>do</strong> for julga<strong>do</strong> improce<strong>de</strong>nte por insuficiência <strong>de</strong> provas, hipótese em que qualquer legitima<strong>do</strong> po<strong>de</strong>rá<br />

intentar outra ação com idêntico fundamento, valen<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> nova prova”. A presente redação <strong>do</strong> dispositivo legal <strong>de</strong>correu da<br />

famigerada Lei 9.494/1997, e na primeira regra que consagra é absolutamente lamentável <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> à tentativa <strong>de</strong> se limitar a<br />

abrangência territorial da tutela coletiva. E o que é ainda pior, a norma teria si<strong>do</strong> supostamente criada para a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> interesses<br />

fazendários228.<br />

A referida Lei 9.494/1997 tem norma específica no mesmo senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> limitação <strong>do</strong> alcance da sentença coletiva, no art. 2º-A:<br />

“A sentença civil prolatada em ação <strong>de</strong> caráter coletivo proposta por entida<strong>de</strong> associativa, na <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses e direitos <strong>do</strong>s<br />

seus associa<strong>do</strong>s, abrangerá apenas os substituí<strong>do</strong>s que tenham, na data da propositura da ação, <strong>do</strong>micílio no âmbito da competência<br />

territorial <strong>do</strong> órgão prolator”.<br />

Por um la<strong>do</strong>, a previsão legal é uma clara afronta a todas as tentativas legislativas voltadas à diminuição no número <strong>de</strong><br />

processos, o que em última análise geraria uma maior celerida<strong>de</strong> naqueles que estiverem em trâmite, sen<strong>do</strong> também uma agressão<br />

clara ao próprio espírito da tutela coletiva. Assim se manifestou Ada Pellegrini Grinover:<br />

“Limitar a abrangência da coisa julgada nas ações civis públicas significa multiplicar <strong>de</strong>mandas, o que, <strong>de</strong> um la<strong>do</strong>, contraria toda a<br />

filosofia <strong>do</strong>s processos coletivos, <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>s justamente a resolver molecularmente os conflitos <strong>de</strong> interesses, em vez <strong>de</strong> atomizá-los<br />

e pulverizá-los; e, <strong>de</strong> outro la<strong>do</strong>, contribui para a multiplicação <strong>de</strong> processos, a sobrecarregarem os tribunais, exigin<strong>do</strong> múltiplas<br />

respostas jurisdicionais quan<strong>do</strong> uma só po<strong>de</strong>ria ser suficiente” 229 .<br />

Por outro la<strong>do</strong>, a exigência <strong>de</strong> diversas ações coletivas a respeito da mesma circunstância fática jurídica po<strong>de</strong>rá gerar <strong>de</strong>cisões<br />

contraditórias, o que abalará a convicção da unida<strong>de</strong> da jurisdição, ferin<strong>do</strong> <strong>de</strong> morte o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> harmonização <strong>de</strong> julga<strong>do</strong>s 230 . E uma<br />

vez existin<strong>do</strong> várias <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> diferente teor, também restará macula<strong>do</strong> o princípio da isonomia, com um tratamento jurisdicional<br />

distinto para os sujeitos em situações assemelhadas pela simples razão <strong>de</strong> serem <strong>do</strong>miciliadas em diferentes localida<strong>de</strong>s231.<br />

Até se po<strong>de</strong>ria alegar que nesse caso o Esta<strong>do</strong> – mais precisamente o Executivo, já que a lei <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> conversão da Medida<br />

Provisória 1.570/1997 – apenas a<strong>do</strong>tou a regra que mais lhe pareceu interessante, ainda que computa<strong>do</strong>s os prejuízos <strong>de</strong> sua<br />

a<strong>do</strong>ção. Nesse senti<strong>do</strong>, o Esta<strong>do</strong> teria pesa<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os males advin<strong>do</strong>s da multiplicação <strong>de</strong> processos coletivos – ofensa ao princípio<br />

da economia processual – e das eventuais <strong>de</strong>cisões contraditórias – ofensa ao princípio da harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s – e ainda<br />

assim teria feito a consciente opção pela regra consagrada no dispositivo legal ora comenta<strong>do</strong>.<br />

O alega<strong>do</strong> não <strong>de</strong>ve <strong>de</strong> maneira alguma ser entendi<strong>do</strong> como <strong>de</strong>fesa da opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r, até porque compartilho da corrente<br />

<strong>do</strong>utrinária amplamente majoritária que critica com veemência o art. 16 da LACP. A questão não é precisamente se pessoalmente<br />

gosto ou não da previsão legal, mas reconhecer a possível aplicação prática da regra se a única crítica for principiológica, fundada<br />

em ofensa clara, manifesta e injustificada aos princípios da economia processual e à harmonização <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>s. Nada mais que<br />

uma entre várias opções equivocadas <strong>de</strong> política legislativa.


Entretanto, mesmo nesse caso haverá uma nova e fatal crítica a respeito da conduta estatal: a clara e manifesta ofensa ao<br />

princípio <strong>do</strong> <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> processo substancial (substantive due process of law) 232 . É natural que a liberda<strong>de</strong> legislativa estatal – ainda<br />

mais pelo caminho in<strong>de</strong>vidamente toma<strong>do</strong> das medidas provisórias – encontra limites na proporcionalida<strong>de</strong> e razoabilida<strong>de</strong>, não se<br />

<strong>de</strong>ven<strong>do</strong> admitir a elaboração <strong>de</strong> regras legais que afrontem tais princípios. As mais variadas críticas <strong>do</strong>utrinárias elaboradas contra<br />

a regra legal ora analisada dão uma mostra clara <strong>de</strong> sua irrazoabilida<strong>de</strong>.<br />

Uma crítica mais severa, e não pela maior contundência ou maior acerto, mas porque inviabiliza na prática a aplicação da<br />

regra, é voltada para a impossibilida<strong>de</strong> material <strong>de</strong> se limitar territorialmente a coisa julgada material. Nesse senti<strong>do</strong>, as lições <strong>de</strong><br />

Luiz Guilherme Marinoni e Sergio Cruz Arenhart:<br />

“Quem examinar a<strong>de</strong>quadamente a regra, <strong>de</strong>ten<strong>do</strong> um mínimo <strong>de</strong> conhecimento a respeito da teoria da coisa julgada, concluirá com<br />

tranquilida<strong>de</strong> que a previsão é, em essência, absurda, ou por ser ilógica, ou por ser incompatível com a regência da coisa julgada.<br />

Como já se viu inúmeras vezes, a coisa julgada representa a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> indiscutibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que se reveste o efeito <strong>de</strong>claratório da<br />

sentença <strong>de</strong> mérito. Não se trata- também já foi observa<strong>do</strong>, com a crítica <strong>de</strong> Liebman – <strong>de</strong> um efeito da sentença, mas sim <strong>de</strong><br />

qualida<strong>de</strong> que se agrega a certo efeito. Ora, pensar que uma qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> efeito só existe em <strong>de</strong>terminada porção <strong>do</strong><br />

território, seria o mesmo que dizer que uma fruta só é vermelha em certo lugar <strong>do</strong> país. Ora, da mesma forma que uma fruta não<br />

<strong>de</strong>ixará <strong>de</strong> ter sua cor apenas por ingressar em outro território da fe<strong>de</strong>ração, só se po<strong>de</strong> pensar em uma sentença imutável frente à<br />

jurisdição nacional, e nunca em face <strong>de</strong> parcela <strong>de</strong>ssa jurisdição. Se um juiz brasileiro pu<strong>de</strong>r <strong>de</strong>cidir novamente causa já <strong>de</strong>cidida em<br />

qualquer lugar <strong>do</strong> Brasil (da jurisdição brasileira), então é porque não existe, sobre a <strong>de</strong>cisão anterior, coisa julgada. O pensamento<br />

da regra chega a ser infantil, não se lhe po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> dar nenhuma função ou utilida<strong>de</strong>”233.<br />

E mesmo que se tenda a fugir <strong>de</strong>ssa crítica, interpretan<strong>do</strong>-se o dispositivo legal no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a limitação não <strong>de</strong>ve atingir a<br />

coisa julgada material, conforme previsto, mas na realida<strong>de</strong> os efeitos da <strong>de</strong>cisão, os mesmos <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res <strong>de</strong>monstram a<br />

ina<strong>de</strong>quação da pretendida limitação:<br />

“O objetivo <strong>do</strong> dispositivo é limitar a abrangência <strong>do</strong>s efeitos da sentença (<strong>de</strong>ntre os quais, certamente, não se encaixa a coisa<br />

julgada). Mas nem para isso ele se presta. Os efeitos concretos da <strong>de</strong>cisão (que se operam no mun<strong>do</strong> real) operam-se em senti<strong>do</strong>s<br />

imprevisíveis e não po<strong>de</strong>m ser conti<strong>do</strong>s pela vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r. Assim como uma pessoa divorciada não po<strong>de</strong> ser divorciada<br />

apenas na cida<strong>de</strong> on<strong>de</strong> foi prolatada a sentença <strong>de</strong> seu divórcio (passan<strong>do</strong> a ser casada em outros municípios), uma sentença<br />

proferida em ação coletiva não po<strong>de</strong> ter seus efeitos limita<strong>do</strong>s a certa porção <strong>do</strong> território nacional. Os efeitos da sentença operam-se<br />

on<strong>de</strong> <strong>de</strong>vem operar-se, e não on<strong>de</strong> o legisla<strong>do</strong>r queira que eles se verifiquem” 234 .<br />

A própria indivisibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> direito transindividual também é outro aspecto lembra<strong>do</strong> por gran<strong>de</strong> parte da <strong>do</strong>utrina para<br />

<strong>de</strong>monstrar a incompatibilida<strong>de</strong> lógica da limitação territorial com essas espécies <strong>de</strong> direitos235. Basta imaginar um direito difuso,<br />

<strong>de</strong> toda a coletivida<strong>de</strong>, sen<strong>do</strong> limita<strong>do</strong> a apenas um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> território, o que aniquilaria a própria i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> indivisibilida<strong>de</strong> que é<br />

essencial aos direitos transindividuais. Como po<strong>de</strong> uma propaganda ser consi<strong>de</strong>rada enganosa em um Esta<strong>do</strong> da Fe<strong>de</strong>ração e não<br />

em outro? Um medicamento nocivo à saú<strong>de</strong> em um Esta<strong>do</strong> da Fe<strong>de</strong>ração e não em outro? Um contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são ser nulo em um<br />

Esta<strong>do</strong> da Fe<strong>de</strong>ração e váli<strong>do</strong> em outros?<br />

Trago uma situação que vivi em minha atuação profissional para <strong>de</strong>monstrar que realmente, no que tange aos direitos difusos,<br />

somente quem tem nervos <strong>de</strong> aço consegue interpretar a norma ora criticada <strong>de</strong> forma a dar-lhe operativida<strong>de</strong>. O Ministério Público<br />

Estadual <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada capital ingressou com ação coletiva para obrigar um fornece<strong>do</strong>r a fornecer um telefone 0800 para os<br />

consumi<strong>do</strong>res que, uma vez ten<strong>do</strong> adquiri<strong>do</strong> o produto em telefonemas gratuitos, tinham que posteriormente reclamar por meio <strong>de</strong><br />

telefonemas pagos, inclusive por ligações interurbanas.<br />

Agora basta imaginar uma sentença <strong>de</strong> procedência diante <strong>de</strong> tal pedi<strong>do</strong>. Ela teria efeito somente para os consumi<strong>do</strong>res<br />

<strong>do</strong>micilia<strong>do</strong>s na comarca em que tramitou a <strong>de</strong>manda judicial, ou, ainda, na melhor das hipóteses, no Esta<strong>do</strong> em que a Comarca<br />

está contida? Insta<strong>do</strong> a criar um telefone 0800, ele seria disponível somente para quem provasse ser <strong>do</strong>micilia<strong>do</strong> naquele<br />

<strong>de</strong>termina<strong>do</strong> território? Consumi<strong>do</strong>res <strong>de</strong> outro Esta<strong>do</strong> receberiam uma mensagem gravada afirman<strong>do</strong> que o serviço para eles não<br />

funcionaria porque no seu Esta<strong>do</strong> não teria o fornece<strong>do</strong>r si<strong>do</strong> con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> a oferecer o serviço 0800? Seria, no mínimo,<br />

consi<strong>de</strong>ravelmente complicada a aplicação da regra <strong>do</strong> art. 16 da LACP numa situação como essa.<br />

Igualmente interessante a tese <strong>de</strong> que a modificação legal tenha si<strong>do</strong> ineficaz por ter altera<strong>do</strong> dispositivo que já não mais se<br />

encontrava em vigor 236 . Segun<strong>do</strong> esse entendimento, a partir <strong>do</strong> momento em que o CDC passou a regulamentar, <strong>de</strong> forma<br />

exaustiva, o tema da coisa julgada na tutela coletiva por meio <strong>do</strong> art. 103 <strong>do</strong> diploma legal, o art. 16 da LACP teria si<strong>do</strong> tacitamente<br />

revoga<strong>do</strong>. Como o CDC é <strong>de</strong> 1990 e a mudança <strong>do</strong> art. 16 para a atual redação <strong>de</strong>u-se em 1994, a modificação teria si<strong>do</strong> ineficaz e,<br />

portanto, inaplicável.<br />

Também no plano da ineficácia da modificação trazida ao art. 16 da LACP pela Lei 9.494/1997, mas com outro fundamento,<br />

as lições <strong>de</strong> Hugo Nigro Mazzilli:


“Sobre estar tecnicamente incorreta, a alteração legislativa trazida ao art. 16 da LACP pela Lei 9.494/1997 é ainda inócua, pois o<br />

CDC não foi modifica<strong>do</strong> nesse particular, e a disciplina <strong>do</strong>s arts. 93 e 103 é <strong>de</strong> aplicação integrada e subsidiária nas ações civis<br />

públicas <strong>de</strong> que cuida a Lei 7.347/1985 (art. 21 <strong>de</strong>sta). Acresce que, no tocante à <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> patrimônio público, o sistema <strong>do</strong> art. 18<br />

da Lei <strong>de</strong> Ação Popular continua subsistin<strong>do</strong> na forma original, <strong>de</strong> maneira que, também em matéria <strong>de</strong> ação popular, seria absur<strong>do</strong><br />

sustentar que o <strong>de</strong>cisum só é imutável nos limites territoriais da comarca <strong>do</strong> juiz prolator”237.<br />

Superadas as críticas fundadas na inaplicabilida<strong>de</strong> prática da regra limita<strong>do</strong>ra da coisa julgada material a um limite territorial, a<br />

<strong>do</strong>utrina segue para a tentativa <strong>de</strong> limitar sua aplicação, partin<strong>do</strong>-se da premissa <strong>de</strong> que, se a regra vai ser aplicada, que faça o<br />

menor estrago possível.<br />

As teses nascidas com tais propósitos, apesar <strong>de</strong> sempre terem um objetivo nobre, nem sempre po<strong>de</strong>m ser admitidas, como<br />

aquela que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> não ser a norma aplicável ao direito consumerista em razão da ausência <strong>de</strong> norma nesse senti<strong>do</strong> no CDC 238 . Não<br />

concor<strong>do</strong> com esse entendimento porque, para ampará-lo, seria necessário afastar a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> microssistema coletivo, com a<br />

interação das leis que versam sobre processo coletivo, em especial a LACP e o CDC. Seria indubitavelmente muito positivo para os<br />

consumi<strong>do</strong>res, que teriam afastada a limitação territorial consagrada pelo dispositivo legal ora critica<strong>do</strong>, mas o preço <strong>de</strong> sacrificar a<br />

i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> microssistema coletivo parece ser muito alto.<br />

Há, entretanto, uma teoria que merece <strong>de</strong>staque.<br />

Para Ada Pellegrini Grinover, uma análise conjunta <strong>do</strong>s arts. 16 da LACP e 103 <strong>do</strong> CDC <strong>de</strong>monstra que o dispositivo legal só<br />

po<strong>de</strong> ser aplica<strong>do</strong> aos direitos difusos e coletivos. Segun<strong>do</strong> a fundamentação da processualista, como o art. 16 da LACP, além <strong>de</strong><br />

criar a limitação territorial da coisa julgada material, prevê a coisa julgada secundum eventum probationis, <strong>de</strong>ve se aplicar a norma<br />

somente aos direitos que produzem essa forma especial <strong>de</strong> coisa julgada, o que não é o caso <strong>do</strong> direito individual homogêneo,<br />

conforme já verifica<strong>do</strong>. Conclui seu pensamento, afirman<strong>do</strong>:<br />

“Resulta daí que não se po<strong>de</strong> dar por modifica<strong>do</strong> o art. 103, III, <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, por força <strong>do</strong> acréscimo<br />

introduzi<strong>do</strong> no art. 16 da Lei <strong>de</strong> Ação Civil Pública, nem mesmo pela interpretação analógica, porquanto as situações reguladas nos<br />

<strong>do</strong>is dispositivos, longe <strong>de</strong> serem semelhantes, são totalmente diversas”239.<br />

Essa teoria teve inclusive aceitação em julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, em julgamento cuja relatoria coube à Ministra<br />

Nancy Andrighi:<br />

“Processo civil e direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Ação civil pública. Correção monetária <strong>do</strong>s expurgos inflacionários nas ca<strong>de</strong>rnetas <strong>de</strong><br />

poupança. Ação proposta por entida<strong>de</strong> com abrangência nacional, discutin<strong>do</strong> direitos individuais homogêneos. Eficácia da sentença.<br />

Ausência <strong>de</strong> limitação. Distinção entre os conceitos <strong>de</strong> eficácia da sentença e <strong>de</strong> coisa julgada. Recurso especial provi<strong>do</strong>. – A Lei da<br />

Ação Civil Pública, originariamente, foi criada para regular a <strong>de</strong>fesa em juízo <strong>de</strong> direitos difusos e coletivos. A figura <strong>do</strong>s direitos<br />

individuais homogêneos surgiu a partir <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, como uma terceira categoria equiparada aos primeiros,<br />

porém ontologicamente diversa. – A distinção, <strong>de</strong>fendida inicialmente por Liebman, entre os conceitos <strong>de</strong> eficácia e <strong>de</strong> autorida<strong>de</strong> da<br />

sentença, torna inócua a limitação territorial <strong>do</strong>s efeitos da coisa julgada estabelecida pelo art. 16 da LACP. A coisa julgada é<br />

meramente a imutabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s efeitos da sentença. Mesmo limitada aquela, os efeitos da sentença produzem-se erga omnes, para<br />

além <strong>do</strong>s limites da competência territorial <strong>do</strong> órgão julga<strong>do</strong>r. – O procedimento regula<strong>do</strong> pela Ação Civil Pública po<strong>de</strong> ser utiliza<strong>do</strong><br />

para a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo, porém somente no que não contrariar as regras <strong>do</strong> CDC, que contem, em seu art.<br />

103, uma disciplina exaustiva para regular a produção <strong>de</strong> efeitos pela sentença que <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> uma relação <strong>de</strong> consumo. Assim, não é<br />

possível a aplicação <strong>do</strong> art. 16 da LAP para essas hipóteses. Recurso especial conheci<strong>do</strong> e provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 411.529/SP –<br />

Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 24.06.2008 – DJe 05.08.2008).<br />

Essa <strong>de</strong>cisão, entretanto, foi reformada em julgamento <strong>de</strong> embargos <strong>de</strong> divergência interposto contra o acórdão proferi<strong>do</strong> no<br />

recurso especial:<br />

“Embargos <strong>de</strong> divergência. Ação civil pública. Eficácia. Limites. Jurisdição <strong>do</strong> órgão prolator. 1 – Consoante entendimento<br />

consigna<strong>do</strong> nesta Corte, a sentença proferida em ação civil pública fará coisa julgada erga omnes nos limites da competência <strong>do</strong><br />

órgão prolator da <strong>de</strong>cisão, nos termos <strong>do</strong> art. 16 da Lei 7.347/1985, altera<strong>do</strong> pela Lei 9.494/1997. Prece<strong>de</strong>ntes. 2 – Embargos <strong>de</strong><br />

divergência acolhi<strong>do</strong>s” (STJ – EREsp 411.529/SP – Segunda Seção – Rel. Min. Fernan<strong>do</strong> Gonçalves – j. 10.03.2010 – DJe<br />

24.03.2010).<br />

E <strong>de</strong>cisões posteriores continuaram a confirmar a aplicação absurda e <strong>de</strong>sarrazoada <strong>do</strong> art. 16 da LACP240. Houve, entretanto,<br />

uma memorável e festejada mudança <strong>de</strong> posição a<strong>do</strong>tada recentemente pela Corte Especial, com voto irrepreensível <strong>do</strong> Ministro<br />

Luiz Felipe Salomão, que atuou como relator. Em feliz consi<strong>de</strong>ração, o Ministro relator afirma que a anterior posição a<strong>do</strong>tada pelo<br />

Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, “em hora mais que ansiada pela socieda<strong>de</strong> e pela comunida<strong>de</strong> jurídica, <strong>de</strong>ve ser revista para aten<strong>de</strong>r<br />

ao real e legítimo propósito das ações coletivas, que é viabilizar um coman<strong>do</strong> judicial célere e uniforme – em atenção à extensão <strong>do</strong>


interesse metaindividual objetiva<strong>do</strong> na li<strong>de</strong>” 241 .<br />

Percebeu a histórica <strong>de</strong>cisão que o art. 16 LACP confun<strong>de</strong> institutos distintos – coisa julgada e competência territorial –, o que<br />

po<strong>de</strong> levar à enganosa interpretação <strong>de</strong> que os efeitos da sentença po<strong>de</strong>m ser limita<strong>do</strong>s territorialmente, fazen<strong>do</strong> crer que a coisa<br />

julgada seja um efeito da sentença <strong>de</strong> mérito transitada em julga<strong>do</strong>, em tese absolutamente <strong>de</strong>scartada em dias atuais.<br />

O julga<strong>do</strong> a<strong>do</strong>ta corretas lições <strong>do</strong>utrinárias para reconhecer que nos direitos difusos e coletivos a limitação territorial sugerida<br />

pelo art. 16 da LACP é lógica e juridicamente inviável, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se a natureza indivisível <strong>de</strong> tais direitos materiais 242 .<br />

Reconheceu também o absur<strong>do</strong> da limitação sugerida no dispositivo legal, a permitir que um mesmo contrato possa ser nulo em um<br />

Esta<strong>do</strong> da Fe<strong>de</strong>ração e váli<strong>do</strong> em outro, ou mesmo duas pessoas serem divorciadas apenas no foro da ação <strong>de</strong> divórcio, continuan<strong>do</strong><br />

casadas nos <strong>de</strong>mais foros.<br />

Valen<strong>do</strong>-se <strong>do</strong> microssistema coletivo, a celebrada <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong>terminou a interpretação <strong>do</strong> art. 16 da LACP à luz <strong>do</strong>s arts. 93 e<br />

103 <strong>do</strong> CDC, levan<strong>do</strong>-se em conta a extensão <strong>do</strong> dano e qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s direitos postos em juízo. Conclui que, sen<strong>do</strong> o dano <strong>de</strong><br />

escala local, regional ou nacional, o juízo, no coman<strong>do</strong> <strong>de</strong>cisório, sob pena <strong>de</strong> ser inócua a sua <strong>de</strong>cisão, <strong>de</strong>ve ter capacida<strong>de</strong> para<br />

recompor ou in<strong>de</strong>nizar tais danos em suas abrangências territoriais, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> qualquer limitação.<br />

Durante certo tempo houve fundada esperança <strong>de</strong> que o julgamento significasse uma <strong>de</strong>finitiva modificação <strong>de</strong> entendimento<br />

sobre o tema no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, até porque se tratava <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão da Corte Especial daquele tribunal. Contu<strong>do</strong>, a<br />

segurança jurídica realmente não está na moda no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, já que, mesmo <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> posicionamento da Corte<br />

Especial, continua a haver <strong>de</strong>cisões que aplicam a limitação <strong>do</strong> art. 16 da Lei 7.347/1985243 e outros que seguem a orientação <strong>de</strong><br />

afastar os limites territoriais 244 .<br />

11.7.<br />

11.7.1.<br />

GRATUIDADE<br />

Introdução<br />

A gratuida<strong>de</strong> no microssistema coletivo vem prevista nos arts. 87 <strong>do</strong> CDC, 17 e 18 da LACP, com normas muito próximas em<br />

termos <strong>de</strong> conteú<strong>do</strong>, ainda que, no segun<strong>do</strong> caso, o legisla<strong>do</strong>r tenha in<strong>de</strong>vidamente se preocupa<strong>do</strong> exclusivamente com a condução<br />

das ações coletivas por associações.<br />

De qualquer forma, a tônica principal <strong>do</strong>s dispositivos é a dispensa no adiantamento <strong>de</strong> custas, emolumentos, honorários<br />

periciais e quaisquer outras <strong>de</strong>spesas para os autores da ação coletiva e a isenção <strong>de</strong> pagamento das verbas <strong>de</strong> sucumbência, salvo<br />

em situações excepcionais.<br />

11.7.2.<br />

Isenção <strong>de</strong> adiantamento<br />

A dispensa no adiantamento <strong>de</strong> custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras <strong>de</strong>spesas para os autores da ação<br />

coletiva <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> expressa previsão <strong>do</strong> art. 87, caput, <strong>do</strong> CDC e <strong>do</strong> art. 18 da LACP (mesma redação), justifican<strong>do</strong>-se no<br />

incentivo que a gratuida<strong>de</strong> proporciona para aqueles que preten<strong>de</strong>rem ingressar com uma ação coletiva245.<br />

Além das complicações técnicas que uma <strong>de</strong>manda coletiva po<strong>de</strong> proporcionar, a questão econômica envolvida também po<strong>de</strong><br />

se mostrar um elemento fortemente inibi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> proposituras <strong>de</strong> tais ações, daí serem extremamente importantes as regras ora<br />

comentadas como forma <strong>de</strong> incentivar tais proposituras. Esse objetivo é tão claro e indiscutível que o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça<br />

já teve a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir que a gratuida<strong>de</strong> limita-se ao autor da ação coletiva, não aproveitan<strong>do</strong>, portanto, o sujeito que<br />

compõe o polo passivo da <strong>de</strong>manda 246 . Esse também é o pensamento da melhor <strong>do</strong>utrina a respeito <strong>do</strong> tema:<br />

“Mas, a contrario sensu, os réus serão obriga<strong>do</strong>s a custear antecipadamente as <strong>de</strong>spesas processuais a que eles próprios <strong>de</strong>rem causa<br />

nas ações civis públicas ou coletivas. Essa diferença <strong>de</strong> tratamento explica-se porque foi evi<strong>de</strong>nte intuito <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r facilitar a<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses transindividuais em juízo, <strong>de</strong> forma que tal disposição só aten<strong>de</strong> os legitima<strong>do</strong>s ativos relaciona<strong>do</strong>s no art. 5.º<br />

da LACP ou no art. 82 <strong>do</strong> CDC. É <strong>de</strong>scabi<strong>do</strong> que pessoas físicas, como os réus em ação civil pública ou coletiva, queiram<br />

beneficiar-se <strong>do</strong> estímulo que o legisla<strong>do</strong>r, por meio da ação civil pública, quis dar à socieda<strong>de</strong> civil para <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> patrimônio<br />

público e interesses transindividuais” 247 .<br />

No tocante à gratuida<strong>de</strong>, o aspecto mais interessante diz respeito ao adiantamento <strong>do</strong>s honorários periciais, que, ao menos em<br />

regra, segue as regras estabelecidas pelo art. 95 <strong>do</strong> Novo CPC. Dessa forma, sen<strong>do</strong> a perícia requerida pelo autor, pelo autor e réu,<br />

pelo Ministério Público como fiscal da lei ou <strong>de</strong>terminada <strong>de</strong> ofício pelo juiz, o ônus <strong>de</strong> adiantar os honorários periciais é <strong>do</strong> autor.<br />

Na hipótese <strong>de</strong> apenas o réu pedir a produção da prova pericial é que será seu o ônus <strong>de</strong> adiantar tal verba.<br />

Sen<strong>do</strong> o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> prova pericial elabora<strong>do</strong> exclusivamente pelo réu, não haverá qualquer especialida<strong>de</strong>, caben<strong>do</strong> a ele o<br />

<strong>de</strong>pósito em juízo <strong>do</strong>s honorários advocatícios “sob pena” <strong>de</strong> preclusão da prova pericial. A experiência forense, entretanto, mostra


que, nas ações coletivas, são em geral os autores que requerem a produção da prova pericial, justamente os sujeitos agracia<strong>do</strong>s com<br />

a dispensa no adiantamento das verbas periciais, além <strong>de</strong> outras. Questiona-se: como proce<strong>de</strong>r diante <strong>de</strong> tal situação? Por um la<strong>do</strong>,<br />

não se po<strong>de</strong> exigir <strong>do</strong> autor o adiantamento, e, por outro la<strong>do</strong>, não se po<strong>de</strong> exigir <strong>do</strong> perito que trabalhe sem o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> adiantamento<br />

<strong>de</strong> seus honorários.<br />

Passou a ser prática comum em juízos <strong>de</strong> primeiro grau a simples inversão <strong>do</strong> ônus <strong>do</strong> adiantamento para o réu, com<br />

intimações para que <strong>de</strong>posite o valor referente aos honorários <strong>do</strong> perito, tese <strong>de</strong>fendida por parcela da <strong>do</strong>utrina248. O tema é<br />

controverso, mas o entendimento consolida<strong>do</strong> no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça é no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que não se aplica essa inversão <strong>do</strong><br />

ônus <strong>do</strong> adiantamento <strong>do</strong>s honorários periciais, apesar <strong>de</strong> o réu assumir o risco diante da não produção da prova 249 .<br />

Especificamente no tocante à tutela coletiva, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça enten<strong>de</strong> que tal inversão seria flagrantemente<br />

contrária à regra consagrada no art. 95 <strong>do</strong> Novo CPC, que <strong>de</strong>ve ser aplicada subsidiariamente no microssistema coletivo. Além<br />

disso, afirma que tal inversão criaria a para<strong>do</strong>xal exigência <strong>de</strong> adiantamento <strong>de</strong> uma prova por parte <strong>do</strong> réu que po<strong>de</strong>rá prejudicar a<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> seus interesses, contrarian<strong>do</strong> o postula<strong>do</strong> básico <strong>de</strong> que ninguém é obriga<strong>do</strong> a fazer prova contra si mesmo 250 .<br />

Admitin<strong>do</strong>-se que o autor está isento <strong>do</strong> adiantamento <strong>do</strong>s honorários <strong>do</strong> perito e que não cabe ao réu tal ônus, nos termos <strong>do</strong><br />

art. 95 <strong>do</strong> Novo CPC, resta a pergunta: o perito <strong>de</strong>verá trabalhar sem garantia <strong>de</strong> remuneração? Afirmo que não há garantia <strong>de</strong><br />

remuneração, porque a isenção no pagamento das verbas <strong>de</strong> sucumbência, em caso <strong>de</strong> improcedência <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> ou <strong>de</strong> sentença<br />

terminativa, naturalmente inclui os valores <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s a título <strong>de</strong> honorários periciais. Na melhor das hipóteses, caberá ao Esta<strong>do</strong> arcar<br />

com os honorários ao final da <strong>de</strong>manda, e nesse caso o perito <strong>de</strong>ve aguardar to<strong>do</strong> o tempo <strong>de</strong> duração <strong>do</strong> processo e <strong>de</strong>pois ainda<br />

sofrer mais um tempo na difícil missão <strong>de</strong> executar a Fazenda Pública.<br />

Em um primeiro momento, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça tinha, em meu enten<strong>de</strong>r, chega<strong>do</strong> a mais correta solução, mas pelo<br />

fundamento mais ina<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> possível. Anteven<strong>do</strong> os problemas gera<strong>do</strong>s pela isenção no adiantamento <strong>do</strong>s honorários periciais,<br />

ressaltan<strong>do</strong> até mesmo uma inviabilida<strong>de</strong> na produção da prova técnica e, por consequência, frustração da tutela coletiva, o tribunal<br />

passou a <strong>de</strong>terminar que, no tocante aos honorários periciais, a isenção expressamente prevista em lei não <strong>de</strong>veria ser admitida:<br />

“Processo civil. Ação civil pública. Honorários periciais. Ministério Público. art. 18 da Lei 7.347/1985. 1. Na ação civil pública, a<br />

questão <strong>do</strong> adiantamento <strong>do</strong>s honorários periciais, como estabeleci<strong>do</strong> nas normas próprias da Lei 7.347/1985, com a redação dada ao<br />

art. 18 da Lei 8.078/1990, foge inteiramente das regras gerais <strong>do</strong> CPC. 2. Posiciona-se o STJ no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> não impor ao Ministério<br />

Público con<strong>de</strong>nação em honorários advocatícios, seguin<strong>do</strong> a regra <strong>de</strong> que na ação civil pública somente há con<strong>de</strong>nação em<br />

honorários quan<strong>do</strong> o autor for consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> litigante <strong>de</strong> má-fé. 3. Em relação ao adiantamento das <strong>de</strong>spesas com a prova pericial, a<br />

isenção inicial <strong>do</strong> MP não é aceita pela jurisprudência <strong>de</strong> ambas as turmas, diante da dificulda<strong>de</strong> gerada pela a<strong>do</strong>ção da tese. 4.<br />

Aban<strong>do</strong>no da interpretação literal para impor ao parquet a obrigação <strong>de</strong> antecipar honorários <strong>de</strong> perito, quan<strong>do</strong> figure como autor na<br />

ação civil pública. Prece<strong>de</strong>ntes.5. Recurso especial não provi<strong>do</strong>” (STJ – REsp 891.743/SP – Segunda Turma – j. 13.10.2009 – DJe<br />

04.11.2009)251.<br />

Não posso concordar com o “aban<strong>do</strong>no da interpretação” literal <strong>do</strong>s arts. 87 <strong>do</strong> CDC e 17 da LACP, até porque os honorários<br />

periciais constituem uma das principais <strong>de</strong>spesas a serem adiantadas pelas partes, não ten<strong>do</strong> qualquer senti<strong>do</strong> lógico ou jurídico a<br />

sua exclusão da isenção legal. Por outro la<strong>do</strong>, não se po<strong>de</strong> exigir o trabalho gratuito <strong>do</strong> perito, nem mesmo o exercício <strong>de</strong> seu labor<br />

mediante uma suspeita expectativa <strong>de</strong> algum dia receber pelo trabalho presta<strong>do</strong>.<br />

Enten<strong>do</strong> que, se a lei oferece a gratuida<strong>de</strong>, quem <strong>de</strong>ve arcar com verbas, tal como a <strong>do</strong>s honorários periciais, é o Esta<strong>do</strong>,<br />

justamente o responsável pela criação da gratuida<strong>de</strong>. Colocar uma prerrogativa criada por lei em favor da parte autora da ação<br />

coletiva nas costas <strong>do</strong> perito não parece razoável, tanto quanto não é razoável simplesmente afastar no caso concreto o tratamento<br />

diferencia<strong>do</strong> dispensa<strong>do</strong> pela lei. Daí por que sempre entendi que, em casos como esse, a gratuida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve ser mantida e o ônus <strong>do</strong><br />

adiantamento das verbas periciais <strong>de</strong>ve ser arca<strong>do</strong> pelo Esta<strong>do</strong>.<br />

A 1ª Seção <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça pacificou entendimento no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> caber à Fazenda Pública a qual seja<br />

vincula<strong>do</strong> o Ministério Público o ônus <strong>de</strong> arcar com o encargo financeiro para a produção da prova pericial:<br />

“Administrativo e processual civil. Ação civil pública. Adiantamento <strong>de</strong> honorários periciais. Não cabimento. Incidência plena <strong>do</strong><br />

art. 18 da Lei 7.347/1985. Encargo transferi<strong>do</strong> à Fazenda Pública. Aplicação da Súmula 232/STJ, por analogia.<br />

1. Trata-se <strong>de</strong> recurso especial em que se discute a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> adiantamento, pelo Ministério Público, <strong>de</strong> honorários <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s a<br />

perito em ação civil pública.<br />

2. O art. 18 da Lei 7.347/1985, ao contrário <strong>do</strong> que afirma o art. 19 <strong>do</strong> CPC, explica que na ação civil pública não haverá qualquer<br />

adiantamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>spesas, tratan<strong>do</strong> como regra geral o que o CPC cuida como exceção. Constitui regramento próprio, que impe<strong>de</strong><br />

que o autor da ação civil pública arque com os ônus periciais e sucumbenciais, fican<strong>do</strong> afastada, portanto, as regras específicas <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

3. Não é possível se exigir <strong>do</strong> Ministério Público o adiantamento <strong>de</strong> honorários periciais em ações civis públicas. Ocorre que a<br />

referida isenção conferida ao Ministério Público em relação ao adiantamento <strong>do</strong>s honorários periciais não po<strong>de</strong> obrigar que o perito


exerça seu ofício gratuitamente, tampouco transferir ao réu o encargo <strong>de</strong> financiar ações contra ele movidas. Dessa forma, consi<strong>de</strong>rase<br />

aplicável, por analogia, a Súmula 232 <strong>de</strong>sta Corte Superior (‘A Fazenda Pública, quan<strong>do</strong> parte no processo, fica sujeita à<br />

exigência <strong>do</strong> <strong>de</strong>pósito prévio <strong>do</strong>s honorários <strong>do</strong> perito’), a <strong>de</strong>terminar que a Fazenda Pública à qual se acha vincula<strong>do</strong> o Parquet<br />

arque com tais <strong>de</strong>spesas. Prece<strong>de</strong>ntes: EREsp 981.949/RS – Rel. Min. Herman Benjamin – Primeira Seção – j. 24.02.2010, DJe<br />

15.08.2011; REsp 1.188.803/RN – Rel. Min. Eliana Calmon – Segunda Turma – j. 11.05.2010 – DJe 21.05.2010; AgRg no REsp<br />

1.083.170/MA – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – Segunda Turma – j. 13.04.2010 – DJe 29.04.2010; REsp 928.397/SP – Rel.<br />

Min. Castro Meira – Segunda Turma – j. 11.09.2007 – DJ 25.09.2007 – p. 225; REsp 846.529/MS – Rel. Min. Teori Albino<br />

Zavascki – Primeira Turma – j. 19.04.2007 – DJ 07.05.2007 – p. 288.<br />

4. Recurso especial parcialmente provi<strong>do</strong>. Acórdão submeti<strong>do</strong> ao regime <strong>do</strong> art. 543-C <strong>do</strong> CPC e da Resolução STJ 8/08” (STJ – 1ª<br />

Seção – REsp 1.253.844/SC – rel. Min. Mauro Campbell Marques – j. 13.03.2013 – DJe 17.10.2013).<br />

Nesse caso, inclusive, o Esta<strong>do</strong>, sempre que possível, po<strong>de</strong>rá fornecer o trabalho pericial por meio <strong>de</strong> seus órgãos<br />

especializa<strong>do</strong>s na matéria, somente sen<strong>do</strong> exigi<strong>do</strong> o trabalho <strong>de</strong> peritos priva<strong>do</strong>s se não houver no caso concreto outra<br />

possibilida<strong>de</strong>. Interessante, nesse senti<strong>do</strong>, julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, que tem trecho da ementa que diz respeito ao<br />

tema ora analisa<strong>do</strong>:<br />

“Não concordan<strong>do</strong> o perito nomea<strong>do</strong> em realizar gratuitamente a perícia e/ou aguardar o final <strong>do</strong> processo, <strong>de</strong>ve o juiz da causa<br />

nomear outro perito, a ser <strong>de</strong>signa<strong>do</strong> entre técnicos <strong>de</strong> estabelecimento oficial especializa<strong>do</strong> ou repartição administrativa <strong>do</strong> ente<br />

público responsável pelo custeio da prova, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> a perícia realizar-se com a colaboração <strong>do</strong> Judiciário”252.<br />

Basta imaginar um convênio <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judicial com as Universida<strong>de</strong>s públicas, que po<strong>de</strong>riam oferecer conhecimento suficiente<br />

para cobrir praticamente todas as perícias exigidas nas <strong>de</strong>mandas coletivas. Os professores <strong>de</strong> cada matéria, em conjunto com<br />

alunos <strong>do</strong> último ano, por exemplo, po<strong>de</strong>riam realizar uma perícia judicial como trabalho <strong>de</strong> conclusão <strong>de</strong> curso ou algo<br />

assemelha<strong>do</strong>, com proveito a to<strong>do</strong>s: os estudantes ganhariam experiência e seriam aprova<strong>do</strong>s em seus cursos; o Esta<strong>do</strong> não precisa<br />

<strong>de</strong>sembolsar dinheiro para pagar a perícia; o processo certamente ganharia uma perícia <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> técnica insuspeita, <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> a<br />

excelência <strong>do</strong>s professores e alunos.<br />

Outra solução possível ao impasse, inclusive reconhecida por <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, seria retirar o valor para<br />

o adiantamento das verbas sucumbenciais <strong>do</strong> Fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Difusos, previsto no art. 13 da LACP 253 . O dinheiro, portanto, seria<br />

retira<strong>do</strong> <strong>do</strong> FDD e entregue ao perito para a elaboração <strong>de</strong> seu trabalho, sen<strong>do</strong> o retorno <strong>de</strong>sse dinheiro ao FDD <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> pelo<br />

resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo.<br />

Sen<strong>do</strong> o pedi<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> proce<strong>de</strong>nte, os réus serão con<strong>de</strong>na<strong>do</strong>s ao pagamento das custas e <strong>de</strong>spesas processuais, no que estão<br />

incluí<strong>do</strong>s os honorários periciais, <strong>de</strong> forma que o dinheiro retornará (ao menos potencialmente) ao FDD. Por outro la<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> o<br />

pedi<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> improce<strong>de</strong>nte ou haven<strong>do</strong> extinção <strong>do</strong> processo sem a resolução <strong>do</strong> mérito, o FDD arcará <strong>de</strong>finitivamente com o<br />

prejuízo.<br />

Registre-se, por fim, o teor da Resolução 127 <strong>do</strong> Conselho Nacional <strong>de</strong> Justiça, que dispõe sobre o pagamento <strong>de</strong> honorários <strong>de</strong><br />

perito, tradutor e intérprete, em casos <strong>de</strong> beneficiários da justiça gratuita. No art. 1º, há recomendação dirigida aos tribunais para<br />

que <strong>de</strong>stinem, sob rubrica específica, parte <strong>do</strong> seu orçamento ao pagamento <strong>de</strong>sses honorários. Contu<strong>do</strong>, o mesmo dispositivo<br />

menciona “parte sucumbente”, dan<strong>do</strong> a enten<strong>de</strong>r que o pagamento se realize sempre após o final <strong>do</strong> processo.<br />

A meu ver, por se tratar <strong>de</strong> outra espécie <strong>de</strong> gratuida<strong>de</strong>, as normas consagradas na Resolução 127 <strong>do</strong> CNJ são inaplicáveis ao<br />

processo coletivo. Consi<strong>de</strong>ro, entretanto, que o espírito da resolução possa ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> por nossos tribunais nessa espécie <strong>de</strong><br />

processo, reforçan<strong>do</strong>-se a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ser o Esta<strong>do</strong> o responsável pelo adiantamento e/ou pagamento das verbas periciais em qualquer<br />

espécie <strong>de</strong> gratuida<strong>de</strong>.<br />

Em previsão inova<strong>do</strong>ra, o art. 95 <strong>do</strong> Novo CPC resolve o problema ora analisa<strong>do</strong>: a <strong>de</strong>rrota da parte beneficiária da assistência<br />

judiciária, sen<strong>do</strong> que a parte vence<strong>do</strong>ra adiantou as verbas periciais. Como os honorários periciais têm natureza <strong>de</strong> <strong>de</strong>spesa<br />

processual, é indiscutível a isenção <strong>do</strong> beneficiário da gratuida<strong>de</strong> da justiça <strong>de</strong> seu pagamento. Os §§ 3.º e 4.º <strong>do</strong> dispositivo ora<br />

comenta<strong>do</strong> dão outra solução ao problema. E com a solução dada por previsão legal, afasta-se <strong>de</strong>finitivamente a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

inversão <strong>do</strong> ônus <strong>de</strong> adiantar os honorários periciais somente porque a prova técnica foi pedida por beneficiário da assistência<br />

judiciária.<br />

Antes <strong>de</strong> passar propriamente à análise <strong>do</strong>s dispositivos, cabe um esclarecimento. Apesar <strong>de</strong> o § 3.º <strong>do</strong> dispositivo legal ora<br />

comenta<strong>do</strong> prever regra somente para o pagamento da verba pericial, portanto, um <strong>de</strong>ver <strong>do</strong> venci<strong>do</strong>, a regra ali prevista também se<br />

aplica para o adiantamento <strong>de</strong> tal verba quan<strong>do</strong> a perícia for pedida pelo beneficiário da gratuida<strong>de</strong> da justiça, nos termos <strong>do</strong> art. 98,<br />

§ 7.º <strong>do</strong> Novo CPC).<br />

A forma preferencial será o custeio da perícia com recursos aloca<strong>do</strong>s ao orçamento <strong>do</strong> ente público e realizada por servi<strong>do</strong>r <strong>do</strong><br />

Po<strong>de</strong>r Judiciário ou por órgão público convenia<strong>do</strong>. Como não é <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário, mas sim <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong>


assistência judiciária aos beneficiários da gratuida<strong>de</strong> da justiça, o i<strong>de</strong>al, nesse caso, é que a perícia seja feita pelo próprio Esta<strong>do</strong>,<br />

sempre que existir órgão público que atue no ramo <strong>de</strong> especialida<strong>de</strong> que a prova técnica exigir.<br />

11.7.3.<br />

Con<strong>de</strong>nação em verbas <strong>de</strong> sucumbência<br />

Conforme analisa<strong>do</strong> no item anterior, os autores da ação coletiva têm em seu favor a dispensa <strong>do</strong> adiantamento <strong>de</strong> custas,<br />

emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras <strong>de</strong>spesas, regra que não se confun<strong>de</strong> com a isenção no tocante à con<strong>de</strong>nação<br />

em verbas <strong>de</strong> sucumbência, consagrada nos arts. 87, <strong>do</strong> CDC, e arts. 17 e 18 da LACP. No primeiro caso, a isenção é para<br />

adiantamento durante o processo para a prática <strong>de</strong> atos processuais, enquanto no segun<strong>do</strong> diz respeito à isenção <strong>de</strong> con<strong>de</strong>nação, ao<br />

final <strong>do</strong> processo, nas verbas <strong>de</strong> sucumbência, na hipótese <strong>de</strong> sentença <strong>de</strong> improcedência ou terminativa.<br />

Segun<strong>do</strong> previsão <strong>do</strong> art. 87, caput, <strong>do</strong> CDC, a associação autora só será con<strong>de</strong>nada ao pagamento <strong>de</strong> honorários <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong>s,<br />

custas e <strong>de</strong>spesas processuais quan<strong>do</strong> for comprovada má-fé. A mesma regra é repetida no art. 18 da LACP. No art. 87, parágrafo<br />

único <strong>do</strong> CDC e art. 17 da LACP há previsão <strong>de</strong> que, constatada a má-fé da associação autora, além da con<strong>de</strong>nação ao pagamento<br />

<strong>do</strong>s honorários advocatícios, também será con<strong>de</strong>nada ao pagamento <strong>do</strong> décuplo das custas, sem prejuízo da responsabilida<strong>de</strong> por<br />

perdas e danos.<br />

Como se po<strong>de</strong> notar, há repetição <strong>de</strong>snecessária entre as regras existentes no núcleo duro <strong>do</strong> microssistema coletivo, que<br />

po<strong>de</strong>m ser assim resumidas: sen<strong>do</strong> sucumbente a associação autora e não <strong>de</strong>monstrada a má-fé na propositura da ação, não há<br />

con<strong>de</strong>nação em honorários advocatícios, custas e <strong>de</strong>spesas processuais; comprovada a má-fé, a associação autora e os dirigentes<br />

responsáveis pela propositura da ação serão con<strong>de</strong>na<strong>do</strong>s ao pagamento <strong>de</strong>ssas verbas, apena<strong>do</strong>s com o pagamento <strong>do</strong> décuplo das<br />

custas, e ainda po<strong>de</strong>rão respon<strong>de</strong>r por perdas e danos.<br />

A justificativa para as consequências previstas em lei diante <strong>de</strong> ação coletiva proposta com má-fé é evi<strong>de</strong>nte:<br />

“Fácil reconhecer que a intenção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r é evitar o <strong>de</strong>svirtuamento <strong>de</strong>ssas ações coletivas: teme-se que elas venham propostas<br />

com espírito emulativo, mal dissimulan<strong>do</strong> intenções <strong>de</strong> cunho político ou <strong>de</strong> vingança pessoal. Em tais casos, o interesse público<br />

ficaria duplamente <strong>de</strong>sservi<strong>do</strong>: a ação civil pública se prestaria para fins escusos ou valores subalternos, permanecen<strong>do</strong> <strong>de</strong>sprotegi<strong>do</strong><br />

o interesse metaindividual que <strong>de</strong>veria ser o leitmotiv da ação”254.<br />

A con<strong>de</strong>nação em razão <strong>de</strong> má-fé <strong>de</strong>ve ser bem entendida, até porque, aplicada indistintamente, po<strong>de</strong>rá afastar autores das<br />

ações coletivas, o que <strong>de</strong>ve ser sempre analisa<strong>do</strong> com extremo cuida<strong>do</strong>.<br />

Existe corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que a propositura <strong>de</strong> li<strong>de</strong> temerária, por autor que não tenha toma<strong>do</strong> cuida<strong>do</strong>s<br />

medianos para a propositura da ação, já <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada como propositura com má-fé, passível da sanção processual255.<br />

Inclusive, a primitiva redação <strong>do</strong> art. 17, caput, da LACP previa a “pretensão manifestamente infundada” como causa para a<br />

aplicação da sanção.<br />

Não parece ser a solução mais a<strong>de</strong>quada, até porque a má-fé exigida pelos dispositivos legais ora analisa<strong>do</strong>s parece se referir à<br />

atitu<strong>de</strong> objetivamente pensada <strong>de</strong> utilização da ação coletiva com o único e exclusivo objetivo <strong>de</strong> gerar um prejuízo injustifica<strong>do</strong> ao<br />

réu. O <strong>do</strong>lo, portanto, afigura-se indispensável. O que se pune é o autor <strong>do</strong>loso, e não o <strong>de</strong>sidioso ou ignorante, que, mesmo sem<br />

qualquer objetivo escuso, ingressa com ação coletiva sem qualquer possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ter seu pedi<strong>do</strong> acolhi<strong>do</strong>. Nesse senti<strong>do</strong>, o<br />

entendimento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“Processual civil. Ação civil pública. Ministério Público. Desnecessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Prévio Inquérito Civil. Honorários advocatícios<br />

in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s. Lei 7.347/1985 (arts. 8.º, 9.º e 17). Súmula 7/STJ. 1. Compete ao Ministério Público facultativamente promover, ou não,<br />

o inquérito civil (§ 1.º, art. 8.º, Lei 7.347/1985), procedimento administrativo e <strong>de</strong> caráter pré-processual, com atos e procedimentos<br />

extrajudiciais. Não é, pois, cogente ou impositivo, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a sua necessida<strong>de</strong>, ou não, das provas ou quaisquer elementos<br />

informativos prece<strong>de</strong>ntemente coligi<strong>do</strong>s. Existin<strong>do</strong> prévia <strong>de</strong>monstração hábil para o exercício responsável da ação civil pública, o<br />

alvitre <strong>do</strong> seu ajuizamento, ou não, é <strong>do</strong> Ministério Público, uma vez que o inquérito não é imprescindível, nem condição <strong>de</strong><br />

procedibilida<strong>de</strong>. A <strong>de</strong>cisão sobre a dispensa, ou não, está reservada ao Ministério Público, por óbvio, interditada a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

li<strong>de</strong> temerária ou com o sinete da má-fé. 2. Existente fundamentação razoável, vivifica<strong>do</strong>s os objetivos e funções <strong>do</strong> órgão<br />

ministerial, cuja participação é reputada <strong>de</strong> excepcional significância, tanto que, se não aparecer como autor, obrigatoriamente,<br />

<strong>de</strong>verá intervir como custos legis (§ 1.º, art. 5.º, ref.), não se compatibiliza com o espírito da lei <strong>de</strong> regência, no caso da<br />

improcedência da ação civil pública, atribuir-lhe a litigância <strong>de</strong> má-fé (art. 17, Lei ant., c/c o art. 115, Lei 8.078/1990), com a<br />

con<strong>de</strong>nação em honorários advocatícios. Demais, no caso, a pretensão não se mostra infundada, não revela propósito inadverti<strong>do</strong> ou<br />

clava<strong>do</strong> pelo sentimento pessoal <strong>de</strong> causar dano à parte ré ou que a ação resultante <strong>de</strong> manifestação sombreada por censurável<br />

iniciativa. Grampeia-se que a litigância <strong>de</strong> má-fé sempre reclama convincente <strong>de</strong>monstração. 3. Recurso parcialmente conheci<strong>do</strong> e<br />

provi<strong>do</strong> para <strong>de</strong>rruir a con<strong>de</strong>nação nos honorários advocatícios” (STJ – REsp 152.447/MG – Primeira Turma – Rel. Min. Milton<br />

Luiz Pereira – j. 28.08.2001 – DJ 25.02.2002).


Questão interessante diz respeito à abrangência <strong>do</strong>s dispositivos legais menciona<strong>do</strong>s, porquanto neles existe apenas a previsão<br />

<strong>de</strong> isenção da associação autora no pagamento das verbas sucumbenciais. E os <strong>de</strong>mais autores, também gozariam da mesma<br />

prerrogativa?<br />

Para parcela <strong>do</strong>utrinária, a isenção só aproveita à associação, por expressa previsão legal, e aos sindicatos e às corporações<br />

semelhantes, por aplicação extensiva:<br />

“Os legitima<strong>do</strong>s <strong>de</strong>sprovi<strong>do</strong>s <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> jurídica (como o Ministério Público e órgãos estatais <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> interesses<br />

transindividuais, sem personalida<strong>de</strong> jurídica própria) responsabilizam a entida<strong>de</strong> a que pertencem; os <strong>de</strong>mais legitima<strong>do</strong>s (pessoas<br />

jurídicas <strong>de</strong> direito público, autarquias, empresas públicas, fundações e socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> economia mista) arcam com os encargos da<br />

sucumbência, ressalva feita à situação especial das associações civis, já examinadas acima”256.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, há corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> ser a regra aplicável a to<strong>do</strong> e qualquer legitima<strong>do</strong> ativo, e não somente às<br />

associações ou corporações assemelhadas 257 . Parece ser esse também o entendimento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“Agravo regimental em embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração em recurso especial. Ação civil pública. Honorários advocatícios. Arts. 22 E 24 da<br />

Lei 8.906/1994. Ausência <strong>de</strong> prequestionamento. Enuncia<strong>do</strong> 282 da Súmula <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral. Con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong><br />

Ministério Público. Ausência <strong>de</strong> má-fé. Impossibilida<strong>de</strong>. Prece<strong>de</strong>ntes. 1. Os dispositivos aponta<strong>do</strong>s como viola<strong>do</strong>s no recurso<br />

especial não foram objeto <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão pelo Tribunal a quo, ressentin<strong>do</strong>-se, consequentemente, <strong>do</strong> indispensável prequestionamento,<br />

cuja falta inviabiliza o conhecimento da insurgência especial, a teor <strong>do</strong> que dispõe o Enuncia<strong>do</strong> 282 da Súmula <strong>do</strong> Supremo Tribunal<br />

Fe<strong>de</strong>ral. 2. Esta Corte Superior tem se posiciona<strong>do</strong> no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que, nos casos em que a ação civil pública proposta pelo Ministério<br />

Público for julgada improce<strong>de</strong>nte, somente haverá con<strong>de</strong>nação ao pagamento <strong>de</strong> honorários advocatícios quan<strong>do</strong> comprovada a máfé<br />

<strong>do</strong> órgão ministerial, que, na hipótese, não restou configurada (AgRgREsp 887.631/SP – Rel. Min. Mauro Campbell Marques –<br />

DJe 28.06.2010; REsp 1.099.573/RJ – Rel. Min. Castro Meira – DJe 19.05.2010; EREsp 895.530/PR – Rel. Min. Eliana Calmon –<br />

DJe 18.12.2009; REsp 764.278/SP – Rel. Min. Teori Albino Zavascki – DJe 28.05.2008; e REsp 896.679/RS – Rel. Min. Luiz Fux –<br />

DJe 12.05.2008). 3. Agravo regimental improvi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg nos EDcl no REsp 1.120.390/PE – Primeira Turma – j. 28.09.2010<br />

– DJe 22.11.2010).<br />

Realmente, parece ser o entendimento mais razoável diante <strong>do</strong> princípio da isonomia, que <strong>de</strong>ve nortear tanto as isenções como<br />

as sanções previstas nos arts. 87, caput, e 17 da LACP.<br />

Note-se mais uma vez que a regra <strong>de</strong> isenção <strong>do</strong> pagamento das verbas <strong>de</strong> sucumbência, excepcionada a hipótese <strong>de</strong> má-fé, tem<br />

como justificativa incentivar a propositura <strong>de</strong> ações coletivas, <strong>de</strong> forma que só <strong>de</strong>ve ser aplicada aos autores. Sen<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> o<br />

processo proce<strong>de</strong>nte, caberá normalmente a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> réu ao pagamento <strong>de</strong> todas as verbas <strong>de</strong> sucumbência.<br />

Com relação ao afirma<strong>do</strong>, surge uma interessante hipótese quan<strong>do</strong> o autor é o Ministério Público. Nesse caso, também caberia<br />

a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> réu ao pagamento <strong>do</strong>s honorários advocatícios, quan<strong>do</strong> a capacida<strong>de</strong> postulatória no caso concreto não <strong>de</strong>corre <strong>de</strong><br />

atuação <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong> na <strong>de</strong>manda, mas <strong>de</strong> um promotor <strong>de</strong> justiça?<br />

Segun<strong>do</strong> Hugo Nigro Mazzilli:<br />

“Se o Ministério Público for vitorioso na ação civil pública por ele movida, o réu será con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> nos encargos <strong>de</strong> sucumbência,<br />

excluída, porém, a verba honorária. Primeiro, porque, conforme o art. 22 da Lei 8.906/1994 (Estatuto da OAB), os honorários<br />

advocatícios, fixa<strong>do</strong>s em <strong>de</strong>corrência da sucumbência, constituem direito autônomo <strong>do</strong> advoga<strong>do</strong> e, no caso não haveria porque<br />

cobrar honorários advocatícios <strong>do</strong> réu sucumbente, se ação não foi movida por advoga<strong>do</strong>; em segun<strong>do</strong>, porque são in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s<br />

honorários advocatícios quer ao próprio Ministério Público quer a seus membros, que não <strong>de</strong>sempenham ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> advocacia em<br />

sua atuação; em terceiro, porque a verba honorária não po<strong>de</strong>ria ir para o Esta<strong>do</strong> ou seus procura<strong>do</strong>res, pois estes não propuseram<br />

ação e assim não haveria título jurídico que justificasse a con<strong>de</strong>nação honorária sem que tivesse havi<strong>do</strong> ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> advocacia na<br />

promoção da ação; enfim, porque o custo social da atuação <strong>do</strong> Ministério Público em <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interessa<strong>do</strong>s da coletivida<strong>de</strong> não é<br />

pago pelas custas <strong>do</strong> processo, e sim pelos impostos gerais suporta<strong>do</strong>s pela população”258.<br />

No mesmo senti<strong>do</strong> é o entendimento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“ACP. Honorários advocatícios. MP. Na ação civil pública (ACP) movida pelo Ministério Público, a questão da verba honorária<br />

foge inteiramente das regras <strong>do</strong> CPC, sen<strong>do</strong> disciplinada pelas normas próprias da Lei 7.347/1985. Segun<strong>do</strong> este Superior Tribunal,<br />

em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> ACP, a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> MP ao pagamento <strong>de</strong> honorários advocatícios somente é cabível na hipótese <strong>de</strong> comprovada e<br />

inequívoca má-fé <strong>do</strong> Parquet. Dentro <strong>de</strong> absoluta simetria <strong>de</strong> tratamento e à luz da interpretação sistemática <strong>do</strong> or<strong>de</strong>namento, não<br />

po<strong>de</strong> o Parquet beneficiar-se <strong>de</strong> honorários quan<strong>do</strong> for vence<strong>do</strong>r na ACP. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: AgRg no REsp 868.279/MG – DJe<br />

06.11.2008; REsp 896.679/RS – DJe 12.05.2008; REsp 419.110/SP – DJ 27.11.2007; REsp 178.088/MG – DJ 12.09.2005; e REsp<br />

859.737/DF – DJ 26.10.2006” (EREsp 895.530/PR – Primeira Seção – Rel. Min. Eliana Calmon – j. 26.08.2009 – Informativo 404).<br />

Enten<strong>do</strong> plenamente as razões para que não haja con<strong>de</strong>nação nesse caso, em especial à luz das previsões constantes no Estatuto<br />

da OAB e que regulamentam o FDD (Fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Difusos). De lege ferenda, entretanto, seria interessante a previsão expressa


no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> réu ao pagamento <strong>do</strong>s honorários advocatícios em favor <strong>do</strong> FDD, o que, em última análise,<br />

aproveitaria a toda a coletivida<strong>de</strong> ofendida pelo ato pratica<strong>do</strong> pelo réu sucumbente.<br />

O Projeto <strong>de</strong> Lei 271/2012 se preocupou com a con<strong>de</strong>nação em honorários em favor <strong>de</strong> associação autora <strong>de</strong> ação coletiva. O<br />

art. 87, § 2º, prevê que ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> complexo o trabalho <strong>do</strong> profissional, os honorários não po<strong>de</strong>rão ser arbitra<strong>do</strong>s em valor inferior a<br />

vinte por cento <strong>do</strong> valor da con<strong>de</strong>nação e, não sen<strong>do</strong> possível aplicar essa regra no caso concreto, o valor <strong>de</strong>ve ser arbitra<strong>do</strong> pelo<br />

juiz observan<strong>do</strong>-se os critérios da proporcionalida<strong>de</strong> e razoabilida<strong>de</strong>. Mais inova<strong>do</strong>r é certamente o § 3º, ao prever que, haven<strong>do</strong><br />

relevante interesse público, direta ou indiretamente satisfeito pela <strong>de</strong>manda movida pela associação, o juiz, além da con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong><br />

réu ao pagamento <strong>do</strong>s honorários advocatícios, po<strong>de</strong>rá fixar uma compensação financeira a ser suportada pelo réu, novamente<br />

observa<strong>do</strong>s os critérios da proporcionalida<strong>de</strong> e razoabilida<strong>de</strong>.<br />

11.8.<br />

11.8.1.<br />

LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA<br />

Conceito <strong>de</strong> liqui<strong>de</strong>z e obrigações liquidáveis<br />

Liquidar uma sentença significa <strong>de</strong>terminar o objeto da con<strong>de</strong>nação, permitin<strong>do</strong>-se assim que a <strong>de</strong>manda executiva tenha início<br />

com o executa<strong>do</strong> saben<strong>do</strong> exatamente o que o exequente preten<strong>de</strong> obter para a satisfação <strong>de</strong> seu direito. Apesar <strong>de</strong> ser pacífico na<br />

<strong>do</strong>utrina esse entendimento, há uma séria divergência a respeito <strong>de</strong> quais as obrigações po<strong>de</strong>m efetivamente ser liquidadas.<br />

Segun<strong>do</strong> a corrente ampliativa, a liquidação po<strong>de</strong>rá ter como objeto qualquer espécie <strong>de</strong> obrigação, sen<strong>do</strong> possível liquidar a<br />

obrigação <strong>de</strong> fazer, não fazer, <strong>de</strong> entrega <strong>de</strong> coisa e <strong>de</strong> pagar quantia certa259. Outra corrente <strong>do</strong>utrinária enten<strong>de</strong> serem excluídas<br />

<strong>do</strong> âmbito da liquidação algumas espécies <strong>de</strong> obrigação que materialmente não po<strong>de</strong>m ser liquidadas, porque, sen<strong>do</strong> a certeza da<br />

obrigação prece<strong>de</strong>nte à liqui<strong>de</strong>z, o que faltará a essas obrigações é a certeza, e não a liqui<strong>de</strong>z. Tal circunstância se verifica nas<br />

obrigações <strong>de</strong> fazer e não fazer, porque a certeza <strong>de</strong> uma obrigação <strong>de</strong>ssa espécie é justamente indicar o que <strong>de</strong>ve ser feito ou o que<br />

<strong>de</strong>ve <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser feito 260 .<br />

Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> obrigação alternativa ou <strong>de</strong> entregar coisa incerta, ao título executivo não faltará propriamente liqui<strong>de</strong>z, tanto<br />

que a <strong>de</strong>manda executiva po<strong>de</strong>rá ser imediatamente proposta. A individualização <strong>do</strong> bem, disciplinada pelos arts. 811 a 813 <strong>do</strong><br />

Novo CPC, <strong>de</strong>senvolver-se-á por meio <strong>de</strong> um procedimento inci<strong>de</strong>ntal na própria <strong>de</strong>manda executiva, sem que se confunda com a<br />

liquidação <strong>de</strong> sentença. Fenômeno similar ocorre na obrigação alternativa <strong>de</strong> entrega <strong>de</strong> coisa certa, na qual não se fará necessária a<br />

liquidação <strong>de</strong> sentença, mas a especificação <strong>do</strong> bem a ser entregue ao exequente (art. 800 <strong>do</strong> Novo CPC). Por outro la<strong>do</strong>, na<br />

hipótese contemplada pelo art. 324, § 1.º, I, <strong>do</strong> Novo CPC (<strong>de</strong>manda que tenha como objeto uma universalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> bens), parece<br />

correto concluir pela necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> liquidação, ainda que se trate <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> entrega <strong>de</strong> coisa.<br />

Para a corrente <strong>do</strong>utrinária restritiva, a liquidação <strong>de</strong> sentença é instituto processual privativo das obrigações <strong>de</strong> pagar quantia<br />

certa, inclusive como prevê a redação <strong>do</strong> art. 783 <strong>do</strong> Novo CPC, que expressamente se refere a “cobrança <strong>de</strong> crédito”, quan<strong>do</strong> exige<br />

da obrigação certeza, liqui<strong>de</strong>z e exigibilida<strong>de</strong>261.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, o art. 509 <strong>do</strong> Novo CPC é claro ao prever o cabimento da liquidação quan<strong>do</strong> a sentença con<strong>de</strong>nar ao pagamento<br />

<strong>de</strong> quantia ilíquida, limitan<strong>do</strong>, sem qualquer margem à dúvida, a liquidação ao valor da obrigação, o que naturalmente afasta <strong>de</strong>sse<br />

instituto jurídico o inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> escolha <strong>de</strong> bens ou <strong>de</strong> concentração <strong>de</strong> obrigações 262 . A previsão legal impe<strong>de</strong> que se confunda<br />

liquidação com outros fenômenos processuais, como o inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> concentração <strong>de</strong> obrigação ou a escolha da coisa na obrigação<br />

<strong>de</strong> coisa incerta, mas excepcionalmente é possível a liquidação <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> entrega <strong>de</strong> coisa, que não <strong>de</strong>ve ser a priori excluída<br />

<strong>do</strong> âmbito da liquidação pela interpretação literal <strong>do</strong> art. 509 <strong>do</strong> Novo CPC. Tal circunstância se verifica na con<strong>de</strong>nação ilíquida <strong>de</strong><br />

pedi<strong>do</strong> que tenha como objeto a entrega <strong>de</strong> uma universalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> bens (art. 324, § 1º, I, <strong>do</strong> Novo CPC) 263 .<br />

In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da interessante discussão acadêmica que se coloca sobre o tema, é evi<strong>de</strong>nte que, nas ações coletivas, a<br />

liquidação <strong>de</strong> sentença está invariavelmente – para não dizer sempre – voltada para as obrigações <strong>de</strong> pagar quantia certa.<br />

11.8.2.<br />

Natureza jurídica da liquidação<br />

Não resta dúvida <strong>de</strong> que a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvida na liquidação da sentença tem natureza cognitiva, já que nela não são<br />

pratica<strong>do</strong>s atos <strong>de</strong> execução. Na realida<strong>de</strong>, excepcionalmente a ativida<strong>de</strong> cognitiva é dividida em duas fases: na primeira há a<br />

fixação <strong>do</strong> an <strong>de</strong>beatur e na segunda <strong>do</strong> quantum <strong>de</strong>beatur. A divisão <strong>de</strong>ssa ativida<strong>de</strong> em duas fases não é, naturalmente, capaz <strong>de</strong><br />

afastar a sua natureza jurídica cognitiva.<br />

A lição, tradicional e que não encontra resistência, é importante para justificar a opção <strong>do</strong> Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil em<br />

não prever a liquidação da sentença no Livro II, <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> à execução. A liquidação <strong>de</strong> sentença vem prevista no Capítulo XIV <strong>do</strong><br />

Título I (Do procedimento comum), da Parte Especial <strong>do</strong> Livro I (Do processo <strong>de</strong> conhecimento e <strong>do</strong> cumprimento <strong>de</strong> sentença).<br />

Deve-se atentar para o previsto no art. 515, § 1.º <strong>do</strong> Novo CPC, o qual prevê que, sen<strong>do</strong> o título executivo uma sentença penal


con<strong>de</strong>natória, sentença arbitral, homologação <strong>de</strong> sentença estrangeira e <strong>de</strong>cisão interlocutória estrangeira, após a concessão <strong>do</strong><br />

exequatur pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, o <strong>de</strong>manda<strong>do</strong> será cita<strong>do</strong> para a execução ou para a liquidação. Para alguns<br />

<strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res, esse dispositivo legal é suficiente para que se reconheça a manutenção, ainda que limita<strong>do</strong> a esses casos, <strong>do</strong> processo<br />

autônomo <strong>de</strong> liquidação. Não me parece, entretanto, correto tal entendimento.<br />

É natural que, sen<strong>do</strong> exigida a citação <strong>do</strong> <strong>de</strong>manda<strong>do</strong>, o legisla<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ixe claro que, por meio <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> liquidação, se dará<br />

vida a um novo processo, mas isso não é suficiente para concluir que ele seja um processo autônomo <strong>de</strong> liquidação. Explica-se. A<br />

liquidação nesse caso é a primeira fase procedimental <strong>de</strong> um processo que não se extingue com a <strong>de</strong>finição <strong>do</strong> quantum <strong>de</strong>beatur,<br />

porque após essa <strong>de</strong>finição se passará à fase <strong>de</strong> cumprimento <strong>de</strong> sentença. O processo, portanto, não é <strong>de</strong> liquidação, ao menos não<br />

é somente <strong>de</strong> liquidação, é <strong>de</strong> liquidação e <strong>de</strong> execução, processo sincrético, portanto.<br />

Veja-se que o fato <strong>de</strong> a fase <strong>de</strong> liquidação ter si<strong>do</strong> ou não precedida por uma fase <strong>de</strong> conhecimento é irrelevante, porque não é<br />

a primeira fase <strong>do</strong> processo que <strong>de</strong>termina a sua natureza. Somente na excepcional hipótese <strong>de</strong> essa fase <strong>de</strong> liquidação ser extinta<br />

por sentença que não permita o seu cumprimento estar-se-á diante <strong>de</strong> genuíno processo autônomo <strong>de</strong> liquidação, mas, como não se<br />

po<strong>de</strong> <strong>de</strong>finir a natureza <strong>de</strong> um fenômeno levan<strong>do</strong>-se em conta sua frustração, parece mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> o entendimento <strong>de</strong> que o<br />

processo autônomo <strong>de</strong> execução não existe mais.<br />

Não há qualquer motivo razoável para que essa realida<strong>de</strong> não seja aplicável à liquidação <strong>de</strong> sentença coletiva. Ainda que seja<br />

necessária a extração <strong>de</strong> cópia da sentença para o ingresso <strong>de</strong> liquidações individuais, essa liquidação terá natureza jurídica <strong>de</strong><br />

procedimento, com a distribuição livre <strong>do</strong> requerimento inicial apresenta<strong>do</strong> pelo indivíduo beneficia<strong>do</strong> pela sentença coletiva. A<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> novos autos no juízo em que tramitará a liquidação não prejudica em absolutamente nada a conclusão<br />

ora <strong>de</strong>fendida, até porque a distinção entre processo e autos é conquista antiga da ciência processual. Novos autos, mesmo<br />

processo, nada inova<strong>do</strong>r ou revolucionário.<br />

11.8.3.<br />

Legitimida<strong>de</strong> ativa<br />

Já foi <strong>de</strong>vidamente visto que a liquidação tem como objetivo fixar o quantum <strong>de</strong>beatur, sen<strong>do</strong> uma complementação da<br />

ativida<strong>de</strong> cognitiva já iniciada com a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> réu. Não tem a liquidação qualquer função expropriatória, reservada ao<br />

momento <strong>de</strong> cumprimento da sentença. O interesse em obter o valor exato da con<strong>de</strong>nação não é exclusivo <strong>do</strong> autor, que<br />

naturalmente terá tal interesse para que possa dar início ao cumprimento <strong>de</strong> sentença. Também o réu con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> tem interesse na<br />

liquidação, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que, ciente <strong>do</strong> valor exato <strong>de</strong> sua dívida, po<strong>de</strong>rá quitá-la ou oferecer uma transação com base mais<br />

concreta264.<br />

Sen<strong>do</strong> <strong>de</strong> interesse tanto <strong>do</strong> vence<strong>do</strong>r como <strong>do</strong> venci<strong>do</strong> a fixação <strong>do</strong> valor da con<strong>de</strong>nação, não resta nenhuma dúvida <strong>de</strong> que, ao<br />

menos como regra, tanto o cre<strong>do</strong>r como o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r – assim reconheci<strong>do</strong>s no título executivo – têm legitimida<strong>de</strong> ativa para dar início<br />

à fase procedimental <strong>de</strong> liquidação <strong>de</strong> sentença. Essa constatação, inclusive, resta inalterada em virtu<strong>de</strong> da revogação <strong>do</strong> art. 570 <strong>do</strong><br />

CPC/1973, que tratava <strong>de</strong> uma pseu<strong>do</strong>legitimação ativa para a execução <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, fenômeno processual entendi<strong>do</strong> pela melhor<br />

<strong>do</strong>utrina como uma espécie <strong>de</strong> consignação em pagamento 265 . Insista-se que execução e liquidação são institutos diferentes e, ainda<br />

que revogada a legitimida<strong>de</strong> ativa <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r para aquela, não se po<strong>de</strong> concluir pela vedação à propositura da liquidação da<br />

sentença por ele.<br />

Deveria ser a liquidação <strong>de</strong> sentença oferecida pelo réu con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> em sentença coletiva consi<strong>de</strong>rada uma ação coletiva<br />

passiva, ou mais precisamente, uma fase procedimental coletiva passiva?<br />

Antes propriamente <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r a tal pergunta, é importante bem se compreen<strong>de</strong>r o significa<strong>do</strong> <strong>de</strong> processo coletivo passivo.<br />

A <strong>de</strong>finição <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> processo não tem chama<strong>do</strong> a <strong>de</strong>vida atenção <strong>do</strong>s estudiosos sobre o tema, mas parece ser<br />

imprescindível como premissa <strong>de</strong> qualquer conclusão a seu respeito.<br />

Como bem aponta<strong>do</strong> por parcela da <strong>do</strong>utrina que enfrentou o tema, antes <strong>de</strong> se partir para uma <strong>de</strong>finição <strong>do</strong>s aspectos<br />

processuais, é preciso notar que o processo coletivo passivo <strong>de</strong>riva <strong>de</strong> uma relação jurídica <strong>de</strong> direito material da qual resultem<br />

situações jurídicas passivas coletivas lato sensu266. Dessa forma, quan<strong>do</strong> numa relação jurídica <strong>de</strong> direito material existir um <strong>de</strong>ver<br />

da coletivida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong> ou mesmo <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> indivíduos, será possível se falar em <strong>de</strong>ver coletivo. O mesmo<br />

ocorre com o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> sujeição, também consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> classicamente uma situação jurídica passiva.<br />

O processo coletivo passivo, portanto, é o processo no qual se discute esse <strong>de</strong>ver ou esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> sujeição coletivo. A<br />

conceituação é importante porque afasta <strong>do</strong> âmbito <strong>do</strong> processo coletivo passivo pretensões meramente <strong>de</strong>claratórias que têm como<br />

objeto um direito coletivo, ainda que se possa imaginar nesse caso uma coletivida<strong>de</strong> ou comunida<strong>de</strong> representadas – ou substituídas<br />

processualmente – no polo passivo. Definir-se quem será autor ou réu, ainda mais numa ação dúplice como é o caso da ação<br />

meramente <strong>de</strong>claratória, não é o suficiente para se <strong>de</strong>terminar a espécie <strong>de</strong> processo coletivo – ativo ou passivo. O que interessa é a<br />

situação jurídica <strong>de</strong> direito material que forma o objeto <strong>do</strong> processo.


Uma empresa mover uma ação e colocar o Ministério Público como réu para ver <strong>de</strong>clara<strong>do</strong> que em seu projeto <strong>de</strong> construção<br />

respeitou as normas ambientais 267 não parece ser um exemplo <strong>de</strong> processo coletivo, porque nesse caso o que se busca é a <strong>de</strong>claração<br />

<strong>de</strong> que um direito difuso não foi e nem será viola<strong>do</strong>. A simples circunstância da coletivida<strong>de</strong> em tese ocupar, por meio <strong>do</strong><br />

Ministério Público (ou qualquer outro sujeito processual), o polo passivo da <strong>de</strong>manda não representa existir nesse caso um processo<br />

coletivo passivo.<br />

Numa ação em que se busca a mera <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> inexistência <strong>de</strong> direito coletivo lato sensu, apesar das dificulda<strong>de</strong>s<br />

procedimentais a habitar sua existência, não se estaria diante <strong>de</strong> um genuíno processo coletivo passivo268. Ou ainda no pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>claração <strong>de</strong> empresa <strong>de</strong> regularida<strong>de</strong> na instalação <strong>de</strong> filtros antipoluição 269 . Na feliz expressão <strong>do</strong>utrinária, nesse caso estar-se-á<br />

diante <strong>de</strong> uma ação coletiva às avessas 270 , ou seja, uma ação coletiva ativa iniciada pelo sujeito que <strong>de</strong>veria ser réu, mas<br />

antecipan<strong>do</strong>-se, busca uma certeza jurídica figuran<strong>do</strong> no polo ativo.<br />

Entretanto, existem outros exemplos mais felizes <strong>de</strong> situações jurídicas passivas coletivas, como o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> uma associação <strong>de</strong><br />

mora<strong>do</strong>res <strong>de</strong> bairro em liberar a passagem das vias públicas in<strong>de</strong>vidamente interditadas para a criação <strong>de</strong> pseu<strong>do</strong>con<strong>do</strong>mínios<br />

fecha<strong>do</strong>s, o <strong>de</strong>ver da OAB <strong>de</strong> não distribuir a<strong>de</strong>sivos aos advoga<strong>do</strong>s que <strong>de</strong> alguma forma ofendam outras categorias<br />

profissionais 271 , ou ainda o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s respeitarem os direitos <strong>de</strong> um titular <strong>de</strong> patente 272 . Na Justiça <strong>do</strong> Trabalho é indiscutível<br />

não só a existência <strong>de</strong> situações jurídicas passivas coletivas, sen<strong>do</strong> exemplo claro os interditos possessórios em razão <strong>de</strong> greve<br />

propostos contra Sindicatos, como também a admissão <strong>de</strong> processo duplamente coletivo nesse caso, envolven<strong>do</strong> sindicatos <strong>de</strong><br />

emprega<strong>do</strong>res e emprega<strong>do</strong>s, como no dissídio coletivo, e mesmo o Ministério Público contra Sindicatos com o objetivo <strong>de</strong> manter<br />

os serviços essenciais em casos <strong>de</strong> greve 273 .<br />

Ainda seguin<strong>do</strong> a lição <strong>do</strong>utrinária que parece ser a mais a<strong>de</strong>quada ao conceito <strong>de</strong> processo coletivo passivo 274 , a constatação<br />

<strong>de</strong> que a espécie <strong>de</strong> processo coletivo – ativo ou passivo – <strong>de</strong>riva da relação jurídica <strong>de</strong> direito material, cria interessante situações<br />

quan<strong>do</strong> se analisa o caso concreto à luz da natureza individual ou coletiva das situações jurídicas <strong>de</strong> direito material que cada parte<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rá em juízo. Admitin<strong>do</strong>-se as possíveis variações nas situações jurídicas <strong>de</strong>fendidas por autor ou réu, é possível imaginar-se<br />

uma série <strong>de</strong> diferentes combinações.<br />

A ação será inteiramente individual quan<strong>do</strong> o autor <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r um direito individual diante <strong>de</strong> alega<strong>do</strong> <strong>de</strong>ver individual <strong>do</strong> réu,<br />

como ocorre, por exemplo, numa ação <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> um banco qualquer diante <strong>de</strong> seu correntista. Na hipótese <strong>de</strong> um autor<br />

coletivo pleitear um direito coletivo lato sensu com a alegação <strong>de</strong> um <strong>de</strong>ver individual <strong>de</strong>scumpri<strong>do</strong> por parte <strong>do</strong> réu, tem-se o<br />

processo coletivo ativo, classicamente admiti<strong>do</strong> entre nós. A empresa que viola o meio ambiente e é acionada pelo Ministério<br />

Público é um entre os milhares <strong>de</strong> exemplos possíveis. A situação jurídica ativa (direito) é difusa, porque o meio ambiente<br />

equilibra<strong>do</strong> é direito <strong>de</strong> toda a coletivida<strong>de</strong>, enquanto cada indivíduo é titular <strong>de</strong> uma situação jurídica passiva, consubstanciada no<br />

<strong>de</strong>ver <strong>de</strong> não agredir o meio ambiente.<br />

O processo coletivo passivo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma situação jurídica coletiva passiva, mas <strong>de</strong> forma correlata a essa situação jurídica<br />

passiva é possível que exista tanto uma situação jurídica ativa individual como coletiva. No primeiro caso, tem-se um direito<br />

individual diante <strong>de</strong> um <strong>de</strong>ver coletivo, como ocorre, por exemplo, no <strong>de</strong>ver que to<strong>do</strong>s têm <strong>de</strong> respeitar a patente <strong>do</strong> cria<strong>do</strong>r. Esse<br />

direito individual <strong>do</strong> cria<strong>do</strong>r da patente seria correlato ao <strong>de</strong>ver da coletivida<strong>de</strong> em não praticar atos que agri<strong>de</strong>m tal direito. No<br />

direito americano trata-se das unilaterais <strong>de</strong>fendant class actions. No segun<strong>do</strong> caso, tem-se um direito coletivo diante <strong>de</strong> um <strong>de</strong>ver<br />

coletivo, como ocorre, por exemplo, na pretensão <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> lojistas diante <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> fornece<strong>do</strong>res. No direito<br />

americano trata-se das bilaterais class actions ou <strong>do</strong>uble-edged class actions.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, são da<strong>do</strong>s outros exemplos pela <strong>do</strong>utrina <strong>de</strong> ações que até po<strong>de</strong>riam ser compreendidas como espécies <strong>de</strong><br />

processo coletivo, mas <strong>de</strong>screven<strong>do</strong> relações jurídicas <strong>de</strong> direito material que atualmente são tuteláveis pelas técnicas da tutela<br />

individual. É o caso <strong>de</strong>scrito da invasão <strong>de</strong> prédios públicos por membros <strong>do</strong> movimento organiza<strong>do</strong> <strong>do</strong>s sem-teto ou <strong>de</strong> áreas pelo<br />

movimento organiza<strong>do</strong> <strong>do</strong>s sem-terra275, ou ainda a ação possessória contra o DCE (Diretório Central <strong>do</strong>s Estudantes) em razão <strong>de</strong><br />

esbulho possessório <strong>de</strong> se<strong>de</strong> <strong>de</strong> reitoria276.<br />

Nesses casos é tradicional o ingresso <strong>de</strong> ação possessória fundada na tutela individual prevista no Código <strong>de</strong> Processo Civil,<br />

reconhecen<strong>do</strong>-se a existência <strong>de</strong> réus incertos e sua citação por edital 277 . O que se preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar claro é que nessas situações,<br />

ainda que seja tecnicamente possível se falar em processo coletivo passivo, as técnicas atuais <strong>de</strong> tutela individual são suficientes<br />

para a tutela da situação jurídica.<br />

A par <strong>do</strong>s intensos <strong>de</strong>bates <strong>do</strong>utrinários a respeito da admissão ou não da chamada ação coletiva passiva, aparentemente a<br />

liquidação <strong>de</strong> sentença oferecida pelo réu da ação coletiva não <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada uma ação coletiva passiva, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se<br />

que nesse caso a liquidação funda-se no direito individual <strong>do</strong> réu <strong>de</strong> pagar o débito e no direito coletivo ou difuso <strong>do</strong>s beneficia<strong>do</strong>s<br />

pela <strong>de</strong>cisão. A hipótese, portanto, é <strong>de</strong> direito coletivo ou difuso e não <strong>de</strong> situação jurídica passiva difusa ou coletiva.


11.8.4. Competência<br />

O veta<strong>do</strong> art. 97, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC, além <strong>de</strong> prever a liquidação na forma <strong>de</strong> artigos, previa que a liquidação po<strong>de</strong>ria<br />

ser promovida no foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> liquidante. Lê-se das razões <strong>do</strong> veto: “Esse dispositivo dissocia, <strong>de</strong> forma arbitrária, o foro<br />

<strong>do</strong>s processos <strong>de</strong> conhecimento e <strong>de</strong> execução, rompen<strong>do</strong> o princípio da vinculação quanto à competência entre esses processos,<br />

a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pelo Código <strong>de</strong> Processo Civil (art. 575) e <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong> pela melhor <strong>do</strong>utrina. Ao <strong>de</strong>spojar uma das partes da certeza quanto<br />

ao foro <strong>de</strong> execução, tal preceito lesa o princípio <strong>de</strong> ampla <strong>de</strong>fesa assegura<strong>do</strong> pela Constituição (art. 5.º, LV)”.<br />

Se as razões <strong>do</strong> veto já eram sofríveis à época, atualmente o são ainda mais, pois o art. 575 <strong>do</strong> CPC/1973, menciona<strong>do</strong><br />

expressamente no veto, foi tacitamente revoga<strong>do</strong> pelo art. 475-P, <strong>do</strong> CPC/1973, com especial <strong>de</strong>staque para o parágrafo único <strong>do</strong><br />

dispositivo.<br />

A regra <strong>de</strong> que <strong>de</strong>ve existir obrigatoriamente uma vinculação no mesmo juízo da ativida<strong>de</strong> cognitiva e executiva é fundada em<br />

uma crença, que, durante muito tempo e <strong>de</strong> maneira absolutamente equivocada, foi consi<strong>de</strong>rada como verda<strong>de</strong> absoluta pelo<br />

legisla<strong>do</strong>r: o melhor juízo para executar uma sentença é aquele que a formou. Essa crença, entretanto, foi afastada – ao menos<br />

parcialmente – com a nova disposição contida no parágrafo único <strong>do</strong> art. 516 <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

O mandamento conti<strong>do</strong> no art. 575, II, <strong>do</strong> CPC/1973 era <strong>de</strong> competência funcional, portanto absoluta278, apresentan<strong>do</strong>-se<br />

como justificativa da vinculação obrigatória <strong>de</strong> que o juízo forma<strong>do</strong>r <strong>do</strong> título executivo seria o mais apto a executá-lo. A<br />

vinculação <strong>do</strong> mesmo juízo entre o processo <strong>de</strong> conhecimento e o <strong>de</strong> execução estaria fundada, portanto, na expectativa <strong>de</strong> uma<br />

melhor qualida<strong>de</strong> na prestação da tutela jurisdicional no processo executivo. A aplicação <strong>do</strong> dispositivo legal, entretanto, nem<br />

sempre confirmava essa expectativa; muitas vezes, inclusive, funcionava contra a qualida<strong>de</strong> da prestação jurisdicional executiva.<br />

A realida<strong>de</strong> mostrou que muitas vezes a prática <strong>de</strong> atos materiais executivos é dificultada em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> tal vinculação,<br />

mostran<strong>do</strong>-se muito mais lógico e eficaz permitir que o processo executivo seja proposto no local on<strong>de</strong> se encontram os bens que<br />

servirão <strong>de</strong> garantia ao pagamento <strong>do</strong> crédito exequen<strong>do</strong>, no local em que está a coisa objeto da execução, ou, ainda, no local em<br />

que a obrigação <strong>de</strong> fazer <strong>de</strong>va ser cumprida. Tratan<strong>do</strong>-se a execução <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvida basicamente pela prática <strong>de</strong> atos<br />

materiais que buscam a satisfação <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> <strong>de</strong>mandante, o i<strong>de</strong>al é que a competência executiva seja <strong>do</strong> foro <strong>do</strong> local em que<br />

tais atos <strong>de</strong>vam ser pratica<strong>do</strong>s.<br />

Sensível a essa realida<strong>de</strong>, o legisla<strong>do</strong>r, apesar <strong>de</strong> manter a regra <strong>de</strong> que o juízo competente para a execução da sentença é<br />

aquele que a formou, criou com a Lei 11.232/2005 uma regra <strong>de</strong> competência concorrente entre esse juízo, o foro on<strong>de</strong> se<br />

encontram bens sujeitos às contrições judiciais e, ainda, o foro <strong>do</strong> atual <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> executa<strong>do</strong>, regra ampliada pelo art. 516,<br />

parágrafo único <strong>do</strong> Novo CPC para incluir o local <strong>do</strong> cumprimento da obrigação <strong>de</strong> fazer e <strong>de</strong> não fazer. A modificação <strong>de</strong>ve ser<br />

aplaudida porque a natureza absoluta da competência <strong>do</strong> juízo que formou o título nunca foi garantia <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> da prestação<br />

jurisdicional, o que, na realida<strong>de</strong>, somente po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> em uma análise <strong>do</strong> caso concreto, em especial à luz das facilida<strong>de</strong>s<br />

ao exequente na busca da satisfação <strong>do</strong> seu direito 279 .<br />

Entretanto, a questão que permanece inalterada diz respeito à competência para a liquidação <strong>de</strong> sentença, que continua a ser<br />

ativida<strong>de</strong> cognitiva, não se confundin<strong>do</strong> por essa razão com a ativida<strong>de</strong> executiva, que só terá lugar no momento procedimental <strong>do</strong><br />

cumprimento <strong>de</strong> sentença. Minha crítica ao menciona<strong>do</strong> veto foi confundir a liquidação com a execução, o que constitui erro<br />

primário e contamina in<strong>de</strong>vidamente a conclusão <strong>do</strong> raciocínio.<br />

Em termos <strong>de</strong> direito individual, enten<strong>do</strong> que a competência para a liquidação <strong>de</strong> sentença se resolve <strong>de</strong> tal maneira: (i)<br />

tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> liquidação inci<strong>de</strong>ntal em execução – fase <strong>de</strong> satisfação <strong>de</strong> sentença ou processo autônomo –, é natural que seja<br />

competente para conhecer da liquidação o próprio juízo no qual já tramita a <strong>de</strong>manda executiva; (ii) tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> liquidação que<br />

dá início a processo sincrético que buscará ao final a satisfação <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> <strong>de</strong>mandante, este <strong>de</strong>verá fazer um exercício <strong>de</strong><br />

abstração, <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> qual seria o órgão competente para a execução daquele título caso não fosse necessária a liquidação; (iii)<br />

tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> liquidação entre a fase <strong>de</strong> conhecimento e a fase <strong>de</strong> execução, haverá competência absoluta – <strong>de</strong> caráter funcional –<br />

<strong>do</strong> juízo que proferiu a sentença ilíquida, não se aplican<strong>do</strong> ao caso o permissivo <strong>do</strong> art. 516, parágrafo único, <strong>do</strong> Novo CPC280.<br />

A existência <strong>de</strong> foros concorrentes para o cumprimento <strong>de</strong> sentença busca facilitar a satisfação <strong>do</strong> direito, nada ten<strong>do</strong> a ver com<br />

a liquidação da sentença, entendida como ativida<strong>de</strong> cognitiva integrativa da sentença genérica proferida no encerramento da<br />

primeira fase <strong>de</strong> natureza cognitiva. É natural, portanto, que, haven<strong>do</strong> entendimento corrente no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a sentença ilíquida<br />

que con<strong>de</strong>na e a <strong>de</strong>cisão da liquidação completam um to<strong>do</strong> – tanto é assim que, em regra, haverá uma só <strong>de</strong>cisão, com a exata<br />

<strong>de</strong>terminação <strong>do</strong> an <strong>de</strong>beatur e <strong>do</strong> quantum <strong>de</strong>beatur –, o juízo que exerceu a função judicante nessa primeira fase <strong>de</strong> solução da<br />

li<strong>de</strong> automaticamente se tornará competente para a segunda fase, em nítida ocorrência <strong>de</strong> competência funcional 281 .<br />

Enten<strong>do</strong> que o mesmo raciocínio <strong>de</strong>ve ser aplica<strong>do</strong> à execução coletiva <strong>de</strong> sentença coletiva genérica. Nesse caso, ainda que a<br />

execução se mostre mais a<strong>de</strong>quada em um <strong>do</strong>s foros previstos pelo art. 516, parágrafo único, <strong>do</strong> Novo CPC, não existe qualquer<br />

razão para admitir a liquidação da sentença em outro juízo que não aquele que formou o título executivo. O raciocínio, insisto, é


exatamente o mesmo da tutela individual.<br />

Na liquidação individual da sentença coletiva genérica, entretanto, a regra <strong>de</strong>ve ser outra em razão das particularida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>ssa<br />

espécie <strong>de</strong> liquidação. Primeiro, que a vantagem <strong>de</strong> ter o mesmo juízo nas fases <strong>de</strong> conhecimento e <strong>de</strong> liquidação <strong>de</strong> sentença não<br />

existe no caso apresenta<strong>do</strong>, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que na liquidação imprópria o juízo não se limitará a fixação <strong>do</strong> quantum <strong>de</strong>beatur,<br />

também analisan<strong>do</strong> a titularida<strong>de</strong> <strong>do</strong> direito, o que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá <strong>de</strong> uma análise individualizada da situação <strong>do</strong> liquidante. Por outro<br />

la<strong>do</strong>, há vantagens práticas inegáveis em admitir a liquidação no foro <strong>do</strong> indivíduo: (i) para o indivíduo facilita a propositura da<br />

liquidação, em níti<strong>do</strong> atendimento <strong>do</strong> princípio <strong>do</strong> acesso à or<strong>de</strong>m jurídica justa; (ii) para o Esta<strong>do</strong>, evita-se a concentração em um<br />

mesmo juízo <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong> liquidações individuais, o que po<strong>de</strong>ria até mesmo inviabilizar o andamento <strong>do</strong>s<br />

processos nesse cartório282.<br />

Nas palavras da melhor <strong>do</strong>utrina:<br />

“Não há dúvida, portanto, <strong>de</strong> que o <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> liquidante seja o foro <strong>de</strong> competência mais favorável para o consumi<strong>do</strong>r lesa<strong>do</strong> (art.<br />

6º, VII, VIII, <strong>do</strong> CDC). Além <strong>de</strong> garantir o pleno e efetivo acesso à justiça, viabiliza a distribuição das ações <strong>de</strong> liquidação<br />

individuais entre vários juízos, não sobrecarregan<strong>do</strong> um único que julgou a ação coletiva, que se veria atrela<strong>do</strong> às centenas ou até<br />

milhares <strong>de</strong> liquidações individuais e às execuções <strong>de</strong>las <strong>de</strong>correntes” 283 .<br />

Pelas razões expostas, <strong>de</strong>ve ser elogia<strong>do</strong> o entendimento consagra<strong>do</strong> no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça a respeito <strong>do</strong> tema, no<br />

senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> admitir como competente para a liquidação individual da sentença coletiva o foro <strong>do</strong> <strong>do</strong>micílio <strong>do</strong> liquidante 284 .<br />

11.8.5.<br />

Espécies <strong>de</strong> liquidação <strong>de</strong> sentença<br />

Com a correta exclusão da “liquidação por mero cálculo aritmético” <strong>do</strong> Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil, os <strong>do</strong>is incisos <strong>do</strong> art.<br />

509 <strong>do</strong> Novo CPC preveem apenas a liquidação: (I) por arbitramento e (II) pelo procedimento comum. O legisla<strong>do</strong>r parece ter<br />

acaba<strong>do</strong> com as diferentes espécies <strong>de</strong> liquidação <strong>de</strong> sentença, limitan<strong>do</strong>-se a prever <strong>do</strong>is diferentes procedimentos: liquidação por<br />

arbitramento quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> pela sentença, convenciona<strong>do</strong> pelas partes ou exigi<strong>do</strong> pela natureza <strong>do</strong> objeto da liquidação, e<br />

liquidação pelo procedimento comum, quan<strong>do</strong> houver necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alegar e provar fato novo (antiga liquidação por artigos).<br />

Sempre se enten<strong>de</strong>u que a liquidação prevista pelo CPC/1973, como liquidação por mero cálculo aritmético, era uma<br />

pseu<strong>do</strong>liquidação, já que supostamente estar-se-ia a liquidar o que já era líqui<strong>do</strong>, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que a liqui<strong>de</strong>z da obrigação é sua<br />

<strong>de</strong>terminabilida<strong>de</strong> e não sua <strong>de</strong>terminação. Significa dizer que, sen<strong>do</strong> possível se chegar ao valor exequen<strong>do</strong> por meio <strong>de</strong> um mero<br />

cálculo aritmético, a obrigação já será líquida e, por tal razão, seria obviamente dispensada a liquidação <strong>de</strong> sentença.<br />

O § 2.º <strong>do</strong> art. 509 <strong>do</strong> Novo CPC é extremamente feliz ao prever que quan<strong>do</strong> a apuração <strong>do</strong> valor <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r apenas <strong>de</strong> cálculo<br />

aritmético, o cre<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>rá promover, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, o cumprimento da sentença. Para facilitar a elaboração <strong>de</strong> tal cálculo, o § 3.º <strong>do</strong><br />

mesmo dispositivo prevê que o Conselho Nacional <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong>senvolverá e colocará à disposição <strong>do</strong>s interessa<strong>do</strong>s programa <strong>de</strong><br />

atualização financeira.<br />

In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da espécie <strong>de</strong> liquidação <strong>de</strong> sentença cabível no caso concreto, o art. 509, § 1.º, <strong>do</strong> Novo CPC, consagra a<br />

teoria <strong>do</strong>s capítulos da sentença, permitin<strong>do</strong> à parte, concomitantemente, liquidar capítulo ilíqui<strong>do</strong> e executar capítulo líqui<strong>do</strong>.<br />

Os únicos dispositivos <strong>do</strong> CDC que mencionam a liquidação <strong>de</strong> sentença coletiva estão concentra<strong>do</strong>s no capítulo que trata das<br />

ações coletivas para a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> interesses individuais homogêneos, nada haven<strong>do</strong> em termos <strong>de</strong> previsão legal quanto aos direitos<br />

difusos e coletivos. Nas <strong>de</strong>mais leis que compõem o microssistema coletivo não há preocupação com a regulamentação da<br />

liquidação <strong>de</strong> sentença.<br />

Enten<strong>do</strong> que essa opção legislativa tenha razão <strong>de</strong> ser, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se não haver realmente qualquer especialida<strong>de</strong><br />

procedimental nas liquidações <strong>de</strong> sentença proferidas em ações que versam sobre direitos difusos e coletivos. O interesse maior,<br />

portanto, fica por conta da liquidação das sentenças coletivas que tenham como objeto direito individual homogêneo, que só tem<br />

tutela legal no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Haven<strong>do</strong> sentença <strong>de</strong> procedência ilíquida em ação coletiva que verse sobre direito difuso e coletivo, a liquidação po<strong>de</strong> se dar<br />

por arbitramento, quan<strong>do</strong> for necessária apenas a realização <strong>de</strong> uma prova pericial; ou por artigos, quan<strong>do</strong> forem necessárias a<br />

alegação e a prova <strong>de</strong> um fato novo. Não há, na realida<strong>de</strong>, qualquer especialida<strong>de</strong> nesse tocante.<br />

Na hipótese <strong>de</strong> direito individual homogêneo, existe <strong>de</strong>bate <strong>do</strong>utrinário a respeito da espécie <strong>de</strong> liquidação. Ressalte-se que o<br />

art. 97, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC indicava expressamente a liquidação por artigos, mas, como foi objeto <strong>de</strong> veto presi<strong>de</strong>ncial, não<br />

po<strong>de</strong> ser utiliza<strong>do</strong> na solução <strong>do</strong> impasse.<br />

Há corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> o cabimento <strong>de</strong> ambas as formas genuínas <strong>de</strong> liquidação existentes no sistema processual,<br />

tu<strong>do</strong> a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r das exigências <strong>do</strong> caso concreto. Para essa corrente, será possível tanto <strong>de</strong>terminar o valor mediante a simples<br />

produção <strong>de</strong> uma prova pericial – liquidação por arbitramento – ou pela produção <strong>de</strong> prova referente a fato novo – liquidação por


artigos.<br />

Prefiro o entendimento contrário, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a liquidação será necessariamente por artigos, sen<strong>do</strong> sempre indispensável<br />

a prova <strong>de</strong> fato novo. E essa exigência <strong>de</strong>corre da especial natureza da liquidação <strong>de</strong> sentença nesse caso, que inclusive leva a<br />

melhor <strong>do</strong>utrina a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r ser tal liquidação uma forma <strong>de</strong> “liquidação imprópria”. Nesse senti<strong>do</strong>:<br />

“Acreditamos que, nesse caso, conforme já afirma<strong>do</strong>, a liquidação será sempre por artigos, ten<strong>do</strong> em vista que haverá sempre fato<br />

novo a ser <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> e prova<strong>do</strong>, pois o indivíduo terá que comprovar o nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> entre o dano genérico, a cuja<br />

reparação foi con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> o réu na ação con<strong>de</strong>natória e o prejuízo sofri<strong>do</strong> por ele individualmente, vez que, sem <strong>de</strong>monstrar isso, não<br />

terá legitimida<strong>de</strong> para promover a liquidação”285.<br />

É até possível <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r, diante das razões <strong>do</strong> veto, que, mesmo diante <strong>do</strong> veto presi<strong>de</strong>ncial ao art. 97, parágrafo único, <strong>do</strong><br />

CDC, a regra referente à espécie <strong>de</strong> liquidação sobreviveu implicitamente. A norma tratava da espécie <strong>de</strong> liquidação e da<br />

competência, sen<strong>do</strong> que as razões <strong>do</strong> veto limitaram-se a críticas quanto a parte da regra que tratava da competência, não haven<strong>do</strong><br />

qualquer menção à expressa previsão da forma <strong>de</strong> artigos como a mais a<strong>de</strong>quada à liquidação <strong>de</strong> sentença.<br />

11.8.6.<br />

<strong>Direito</strong> difuso e coletivo<br />

Nas ações <strong>de</strong> direito difuso e coletivo, é plenamente possível que o pedi<strong>do</strong> seja certo e <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> a <strong>de</strong>terminação <strong>do</strong><br />

pedi<strong>do</strong> útil ao juiz na prolação <strong>de</strong> sentença líquida. O sistema processual busca evitar a liquidação <strong>de</strong> sentença, na medida <strong>do</strong><br />

possível, como forma <strong>de</strong> garantir um processo mais rápi<strong>do</strong>, com a dispensa <strong>de</strong> uma fase somente para aferir o an <strong>de</strong>beatur e outra<br />

para a fixação <strong>do</strong> quantum <strong>de</strong>beatur, e não há qualquer razão lógica ou jurídica para tal raciocínio <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser aplica<strong>do</strong> nas ações<br />

coletivas.<br />

A possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o pedi<strong>do</strong> ser feito <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>terminada, entretanto, não obriga o autor da ação coletiva nesse senti<strong>do</strong>,<br />

sen<strong>do</strong> possível o pedi<strong>do</strong> genérico nos termos <strong>do</strong> art. 324, II, <strong>do</strong> Novo CPC. Nesse caso, se proferida uma sentença ilíquida, como<br />

admiti<strong>do</strong> em lei, far-se-á necessária a fase <strong>de</strong> liquidação <strong>de</strong> sentença, mas, justamente por não ter qualquer especialida<strong>de</strong>, seguirá a<br />

forma <strong>de</strong> arbitramento ou artigos, a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r das exigências <strong>do</strong> caso concreto.<br />

11.8.7.<br />

<strong>Direito</strong> individual homogêneo<br />

No tocante às ações coletivas que tenham como objeto um direito individual homogêneo, aparentemente a situação é outra.<br />

Ainda que materialmente possível a elaboração <strong>de</strong> um pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>, tu<strong>do</strong> leva a crer que o pedi<strong>do</strong> nesse tipo <strong>de</strong> ação seja<br />

genérico, até para que os indivíduos beneficia<strong>do</strong>s com a <strong>de</strong>cisão a liqui<strong>de</strong>m no futuro para aferirem os danos individuais suporta<strong>do</strong>s<br />

por cada um <strong>de</strong>les. Conforme já afirma<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> o pedi<strong>do</strong> in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>, admitir-se-á a prolação <strong>de</strong> sentença ilíquida.<br />

A <strong>do</strong>utrina majoritária enten<strong>de</strong> no senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto, por vezes até mesmo afirman<strong>do</strong> que a sentença genérica é a única possível,<br />

nos termos <strong>do</strong> art. 95 <strong>do</strong> CDC286. Essa mesma <strong>do</strong>utrina, entretanto, lembra que na realida<strong>de</strong> a sentença genérica é apenas a regra,<br />

sen<strong>do</strong> admissível, ainda que excepcional, a prolação <strong>de</strong> sentença líquida:<br />

“Pense-se, por exemplo, em sentença que tenha con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> o Instituto <strong>de</strong> Previdência a pagar, a cada um <strong>do</strong>s aposenta<strong>do</strong>s, uma<br />

quantia específica, atualizada a partir <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada data. Evi<strong>de</strong>ntemente, se a apuração <strong>do</strong> valor <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>de</strong> mero cálculo,<br />

não terá lugar a ação <strong>de</strong> liquidação anterior à ação <strong>de</strong> execução, e o direito <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r <strong>de</strong>verá ser processa<strong>do</strong> <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o art.<br />

475-B <strong>do</strong> CPC”287.<br />

Como a chamada “liquidação por mero cálculo aritmético” é uma pseu<strong>do</strong>liquidação, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se ser a obrigação líquida<br />

sempre que possível <strong>de</strong>terminar seu valor pelo mero cálculo, nesse caso não haverá propriamente uma liquidação <strong>de</strong> sentença 288 .<br />

Mesmo que admitida a excepcionalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma sentença líquida, em regra a sentença será genérica e <strong>de</strong>mandará uma fase <strong>de</strong><br />

liquidação. Interessante notar que essa liquidação, a ser realizada pelos indivíduos que se beneficiaram da sentença coletiva, será<br />

mais ampla em termos <strong>de</strong> cognição <strong>do</strong> que uma tradicional liquidação <strong>de</strong> sentença. Tanto assim, que a <strong>do</strong>utrina chama tal<br />

liquidação <strong>de</strong> “liquidação imprópria”.<br />

A especialida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> liquidação é que a mesma não se limitará a revelar o valor <strong>do</strong> débito <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> pelo réu em favor<br />

<strong>do</strong> autor, mas também <strong>de</strong>verá reconhecer a titularida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse direito, única forma da sentença coletiva aproveitar ao indivíduo.<br />

Nesse senti<strong>do</strong> a melhor <strong>do</strong>utrina:<br />

“E não há dúvida <strong>de</strong> que o processo <strong>de</strong> liquidação da sentença con<strong>de</strong>natória, que reconheceu o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nizar e nesses termos<br />

con<strong>de</strong>nou o réu, oferece peculiarida<strong>de</strong>s com relação ao que normalmente ocorre nas liquidações <strong>de</strong> sentença. Nestas, não mais se<br />

perquire a respeito <strong>do</strong> an <strong>de</strong>beatur, mas somente sobre o quantum <strong>de</strong>beatur. Aqui, cada liquidante, no processo <strong>de</strong> liquidação, <strong>de</strong>verá<br />

provar, em contraditório pleno e com cognição exauriente, a existência <strong>de</strong> seu dano pessoal e o nexo etiológico com o dano


globalmente causa<strong>do</strong> (ou seja, o an), além <strong>de</strong> quantificá-lo (ou seja, o quantum)” 289 .<br />

11.8.8.<br />

Liquidação individual das sentenças <strong>de</strong> direito difuso e coletivo<br />

Conforme já afirma<strong>do</strong>, a liquidação coletiva da sentença genérica proferida em ação coletiva <strong>de</strong> direitos difusos e coletivos não<br />

tem qualquer especialida<strong>de</strong>. Ocorre, entretanto, que essa sentença também po<strong>de</strong>rá ser utilizada por indivíduos que foram<br />

prejudica<strong>do</strong>s pela mesma situação fático-jurídica que tenha leva<strong>do</strong> o réu a ser con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> na ação coletiva. Nesse caso, haverá<br />

tantas liquidações individuais quantos forem os indivíduos nessa situação.<br />

Note-se que nos direitos individuais homogêneos a ação coletiva é voltada para a prolação <strong>de</strong> uma sentença que seja<br />

aproveitada individualmente por cada indivíduo lesiona<strong>do</strong>, daí ser uma consequência natural nesse caso o oferecimento <strong>de</strong><br />

liquidações individuais. Como o objetivo é tutelar os indivíduos, a sentença é proferida com a missão <strong>de</strong> servir <strong>de</strong> título executivo,<br />

ainda que representativo <strong>de</strong> obrigação ilíquida, para to<strong>do</strong>s os titulares <strong>do</strong> direito individual homogêneo.<br />

Já nos direitos difusos e coletivos, o objetivo é tutelar a coletivida<strong>de</strong> ou uma comunida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> forma que a sentença é proferida<br />

para ser executada – e eventualmente liquidada – em favor <strong>do</strong>s titulares <strong>de</strong>sses direitos. Significa que o benefício a indivíduos é<br />

somente residual, não sen<strong>do</strong> essa a preocupação da <strong>de</strong>manda judicial. Os indivíduos, portanto, po<strong>de</strong>rão se aproveitar da sentença<br />

coletiva, como se nesse caso houvesse uma con<strong>de</strong>nação implícita <strong>do</strong> réu a ressarci-los.<br />

Nesse caso, a liquidação terá objeto cognitivo muito próximo das liquidações individuais <strong>de</strong> sentença fundada em direito<br />

individual homogêneo. Novamente caberá ao autor da liquidação provar não só o valor <strong>do</strong> dano, mas também a existência <strong>de</strong>sse<br />

dano e a correlação entre o dano individualmente suporta<strong>do</strong> e a situação fático-jurídica reconhecida na sentença coletiva como<br />

fundamento da procedência.<br />

11.9.<br />

11.9.1.<br />

EXECUÇÃO<br />

Processo <strong>de</strong> execução e cumprimento <strong>de</strong> sentença<br />

O direito processual civil passou por significativa modificação no tocante ao sistema aplica<strong>do</strong> à execução <strong>do</strong>s títulos<br />

executivos judiciais em geral e à sentença civil em especial. De um sistema funda<strong>do</strong> na autonomia das ações, no qual a execução <strong>de</strong><br />

sentença exigia um processo autônomo, temos atualmente o sistema <strong>do</strong> sincretismo processual, no qual se <strong>de</strong>staca a chamada ação<br />

sincrética, que se <strong>de</strong>senvolve por um processo dividi<strong>do</strong> em duas fases sucessivas, a primeira <strong>de</strong> conhecimento e a segunda <strong>de</strong><br />

execução.<br />

Foi uma mudança que ocorreu paulatinamente, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1990290, mas atualmente é reconhecida pela melhor <strong>do</strong>utrina que a<br />

execução <strong>do</strong> título executivo judicial ocorre pelo cumprimento <strong>de</strong> sentença, mera fase procedimental posterior à prolação da<br />

sentença con<strong>de</strong>natória (para parcela da <strong>do</strong>utrina, executiva lato sensu).<br />

Seria inexplicável <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> aplicar os avanços <strong>do</strong> sistema executivo à execução da sentença coletiva. É inegável que o sistema<br />

<strong>do</strong> cumprimento <strong>de</strong> sentença, consagra<strong>do</strong> <strong>de</strong>finitivamente pela Lei 11.232/2005, facilita a satisfação <strong>do</strong> direito exequen<strong>do</strong>, e, com a<br />

relevância que tem os direitos tutela<strong>do</strong>s coletivamente, ainda com maior razão admite-se a aplicação <strong>de</strong> um sistema que facilite sua<br />

efetiva tutela em fase executiva.<br />

Portanto, não só a execução dar-se-á por meio <strong>de</strong> cumprimento <strong>de</strong> sentença, como será totalmente aplicável à execução <strong>de</strong><br />

sentença coletiva o procedimento <strong>de</strong>sse cumprimento. Sen<strong>do</strong> a obrigação exequenda <strong>de</strong> fazer ou não fazer, caberá ao juiz aplicar o<br />

arts. 536 e 537 <strong>do</strong> Novo CPC; sen<strong>do</strong> <strong>de</strong> entregar coisa, caberá a aplicação <strong>do</strong> art. 538 <strong>do</strong> Novo CPC e, finalmente, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong> pagar<br />

quantia certa, caberá a aplicação <strong>do</strong>s arts. 523 a 527 <strong>do</strong> Novo CPC. E, em qualquer caso, por mera fase procedimental, sem a<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> instauração <strong>de</strong> uma nova ação judicial.<br />

Naturalmente que, tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> título executivo extrajudicial, a execução coletiva continua a se <strong>de</strong>senvolver por meio <strong>de</strong> um<br />

processo autônomo, sem qualquer especialida<strong>de</strong> procedimental. Assim, por exemplo, na execução <strong>de</strong> tradicional título executivo<br />

extrajudicial no âmbito da tutela coletiva, o termo <strong>de</strong> ajustamento <strong>de</strong> conduta, ou mesmo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões proferidas pelos Tribunais <strong>de</strong><br />

Contas.<br />

11.9.1.1.<br />

Execução por sub-rogação e indireta<br />

Na execução por sub-rogação, o Esta<strong>do</strong> vence a resistência <strong>do</strong> executa<strong>do</strong>, substituin<strong>do</strong> sua vonta<strong>de</strong>, com a consequente<br />

satisfação <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> exequente291. Mesmo que o executa<strong>do</strong> não concor<strong>de</strong> com tal satisfação, o juiz terá à sua disposição<br />

<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s atos materiais que, ao substituir a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> executa<strong>do</strong>, geram a satisfação <strong>do</strong> direito. Exemplos classicamente<br />

lembra<strong>do</strong>s são a penhora/expropriação; <strong>de</strong>pósito/entrega da coisa; atos materiais que são pratica<strong>do</strong>s in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da<br />

concordância ou resistência <strong>do</strong> executa<strong>do</strong>. E to<strong>do</strong>s esses meios executivos por sub-rogação são aplicáveis na execução coletiva.


Registre-se, entretanto, um meio executivo por sub-rogação que parece ter tratamento diferencia<strong>do</strong> no âmbito da execução<br />

coletiva. Segun<strong>do</strong> o art. 833, IV, <strong>do</strong> Novo CPC, os ganhos <strong>de</strong>riva<strong>do</strong>s <strong>do</strong> trabalho (salário, sol<strong>do</strong>, remuneração, honorários) são<br />

absolutamente impenhoráveis, abrin<strong>do</strong>-se uma exceção apenas na execução <strong>de</strong> verba alimentar e em salários superiores a 50<br />

salários mínimos, nos termos <strong>do</strong> art. 833, § 2.º, <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Essa, entretanto, não é a única exceção, como equivocadamente é costume se afirmar. O art. 14, § 3º, da Lei 4.717/1965 prevê<br />

que, quan<strong>do</strong> o réu con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> perceber <strong>do</strong>s cofres públicos, a execução far-se-á por <strong>de</strong>sconto em folha até o integral ressarcimento<br />

<strong>do</strong> dano causa<strong>do</strong>, se assim mais convier ao interesse público. Como se po<strong>de</strong> notar, o dispositivo legal, ao admitir o <strong>de</strong>sconto em<br />

folha, consequentemente afasta a impenhorabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> salário consagrada no art. 833, IV, <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Trata-se, inclusive, <strong>de</strong> meio executivo aplicável a toda espécie <strong>de</strong> ação coletiva, mesmo que a regra esteja consagrada apenas<br />

na Lei <strong>de</strong> Ação Popular. Vale-se para tal conclusão <strong>do</strong> microssistema coletivo.<br />

Na execução indireta, o Esta<strong>do</strong> não substitui a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> executa<strong>do</strong>; pelo contrário, atua <strong>de</strong> forma a convencê-lo a cumprir<br />

sua obrigação, com o que será satisfeito o direito <strong>do</strong> exequente. O juiz atuará <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a pressionar psicologicamente o executa<strong>do</strong><br />

para que ele modifique sua vonta<strong>de</strong> originária <strong>de</strong> ver frustrada a satisfação <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> exequente292. Sempre que a pressão<br />

psicológica funciona, é o próprio executa<strong>do</strong> o responsável pela satisfação <strong>do</strong> direito; a satisfação será voluntária, <strong>de</strong>corrente da<br />

vonta<strong>de</strong> da parte, mas obviamente não será espontânea, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que só ocorreu porque foi exercida pelo juiz uma pressão<br />

psicológica sobre o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r.<br />

Existem duas formas <strong>de</strong> execução indireta. A primeira consubstancia-se na ameaça <strong>de</strong> piorar a situação da parte caso não<br />

cumpra a obrigação, como ocorre com as astreintes, multa aplicável diante <strong>do</strong> <strong>de</strong>scumprimento das obrigações <strong>de</strong> fazer, não fazer e<br />

entregar coisa, ou ainda com a prisão civil na hipótese <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r inescusável <strong>de</strong> alimentos. A segunda forma <strong>de</strong> execução indireta<br />

consubstancia-se na oferta <strong>de</strong> uma melhora na situação da parte caso ela cumpra sua obrigação, como ocorre no art. 827, § 1.º <strong>do</strong><br />

Novo CPC, que prevê um <strong>de</strong>sconto <strong>de</strong> 50% no valor <strong>do</strong>s honorários advocatícios no caso <strong>de</strong> pagamento <strong>do</strong> valor exequen<strong>do</strong> no<br />

prazo <strong>de</strong> três dias da citação. Apesar <strong>de</strong> lições tradicionais <strong>de</strong> direito estrangeiro, os termos “sanções premia<strong>do</strong>ras” ou “sanções<br />

premiais”293, emprega<strong>do</strong>s para <strong>de</strong>signar essa espécie <strong>de</strong> execução indireta, não parecem a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s porque, apesar <strong>de</strong> a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

prêmio concedi<strong>do</strong> a quem cumpre a obrigação estar correta, não se po<strong>de</strong> confundir sanção com pressão psicológica.<br />

Não obstante ser substancialmente igual a execução indireta na execução individual e coletiva, há ao menos uma diferença<br />

digna <strong>de</strong> nota e que merece um breve comentário.<br />

As astreintes, certamente o meio executivo indireto mais importante <strong>do</strong> sistema, são aplicáveis tanto na execução individual<br />

como na coletiva, seguin<strong>do</strong> em ambas fundamentalmente as mesmas características. O tema referente à exigibilida<strong>de</strong> da multa,<br />

entretanto, recebe tratamento distinto.<br />

Para parcela da <strong>do</strong>utrina, a multa é exigível a partir <strong>do</strong> momento em que a <strong>de</strong>cisão que a fixa se torna eficaz, ou porque não foi<br />

recorrida ou porque foi impugnada por recurso sem efeito suspensivo 294 . Essa exigibilida<strong>de</strong> permitiria a execução imediata <strong>de</strong><br />

crédito <strong>de</strong>corrente da multa frustrada fixada em <strong>de</strong>cisão ainda não <strong>de</strong>finitiva, inclusive a <strong>de</strong>cisão interlocutória que conce<strong>de</strong> a tutela<br />

antecipada, o que só po<strong>de</strong> ser compreendi<strong>do</strong> com a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> execução provisória <strong>do</strong> crédito 295 .<br />

Para essa corrente <strong>do</strong>utrinária, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> exigibilida<strong>de</strong> imediata resulta da própria função coercitiva da multa, porque a<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aguardar a <strong>de</strong>finitivida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>cisão, que só ocorrerá com o advento da coisa julgada material, seria extremamente<br />

contrária à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pressionar efetivamente o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r a cumprir a obrigação. Uma perspectiva <strong>de</strong> remota execução não seria<br />

suficiente para exercer a pressão psicológica esperada das astreintes 296 .<br />

Para outra corrente <strong>do</strong>utrinária, <strong>de</strong>ve-se aguardar o trânsito em julga<strong>do</strong> para que se possa exigir o crédito gera<strong>do</strong> pela frustração<br />

da multa. Essa corrente <strong>do</strong>utrinária enten<strong>de</strong> que a mera ameaça <strong>de</strong> aplicação da multa, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> momento em que o<br />

crédito gera<strong>do</strong> por sua frustração passará a ser exigível, já é suficiente para configurar a pressão psicológica pretendida pelo<br />

legisla<strong>do</strong>r297. Por outro la<strong>do</strong>, como só <strong>de</strong>ve pagar a multa a parte <strong>de</strong>finitivamente <strong>de</strong>rrotada na <strong>de</strong>manda judicial – o que só será<br />

conheci<strong>do</strong> com o trânsito em julga<strong>do</strong> –, cabe aguardar esse momento procedimental para admitir a execução da multa 298 .<br />

Concor<strong>do</strong> com a primeira corrente <strong>do</strong>utrinária porque, <strong>de</strong> fato, com o tempo que os processos <strong>de</strong>moram para atingir o trânsito<br />

em julga<strong>do</strong>, muito da natureza coercitiva da multa se per<strong>de</strong>rá se a exigibilida<strong>de</strong> da cobrança <strong>do</strong> crédito gera<strong>do</strong> pela frustração da<br />

multa <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>de</strong>sse momento processual. Trata-se <strong>do</strong> tradicional e frequente choque entre a efetivida<strong>de</strong> (exigibilida<strong>de</strong> imediata,<br />

sem saber ainda se a multa é <strong>de</strong>finitivamente <strong>de</strong>vida) e a segurança jurídica (exigibilida<strong>de</strong> após o trânsito em julga<strong>do</strong> da <strong>de</strong>cisão<br />

que fixa a multa, quan<strong>do</strong> se saberá <strong>de</strong>finitivamente se a parte é ou não titular <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> crédito). Nesse senti<strong>do</strong> era entendimento<br />

<strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça na vigência <strong>do</strong> CPC/1973 299 .<br />

Em uma tentativa <strong>de</strong> se encontrar um meio-termo entre a executabilida<strong>de</strong> imediata, fundada na maior eficácia da multa, e a<br />

executabilida<strong>de</strong> condicionada ao trânsito em julga<strong>do</strong>, em prestígio à segurança jurídica, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça passou a<br />

enten<strong>de</strong>r que a multa fixada em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> tutela antecipada só po<strong>de</strong>ria ser executada após a confirmação da tutela antecipada em


sentença, e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o recurso contra essa <strong>de</strong>cisão não tivesse efeito suspensivo 300 . Registre-se que a ausência <strong>do</strong> efeito suspensivo<br />

não chegava a ser um problema, porque ele só po<strong>de</strong>ria ser obti<strong>do</strong> excepcionalmente no caso concreto (efeito suspensivo ope<br />

iudicis). O equilíbrio busca<strong>do</strong> entre a eficácia da multa e a segurança jurídica foi alcança<strong>do</strong> <strong>de</strong> outra forma pelo art. 537, § 3.º, <strong>do</strong><br />

Novo CPC.<br />

Inicialmente, a previsão <strong>do</strong> dispositivo legal <strong>de</strong>ve ser saudada por duas razões. Primeiro, porque consagra expressamente a<br />

eficácia imediata da multa, em níti<strong>do</strong> prestígio da efetivida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse meio executivo. Segun<strong>do</strong>, porque <strong>de</strong>ixa claro que a execução<br />

<strong>de</strong>finitiva <strong>de</strong>ssa multa <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong> da sentença, afastan<strong>do</strong> in<strong>de</strong>vida confusão entre executabilida<strong>de</strong> e<br />

provisorieda<strong>de</strong> sentida em algumas <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça301.<br />

Apesar <strong>de</strong> consagrar a eficácia imediata da multa, o dispositivo legal ora analisa<strong>do</strong> prevê um cumprimento <strong>de</strong> sentença<br />

incompleto, já que exige para o levantamento <strong>do</strong>s <strong>de</strong>pósitos realiza<strong>do</strong>s em juízo o trânsito em julga<strong>do</strong> <strong>de</strong> sentença favorável à parte.<br />

O único ato veda<strong>do</strong> pela norma comentada na execução provisória da multa é o levantamento <strong>de</strong> valores, <strong>de</strong> forma que, sen<strong>do</strong><br />

penhora<strong>do</strong> qualquer outro bem que não seja dinheiro, <strong>de</strong>verá ocorrer normalmente sua expropriação, permanecen<strong>do</strong> o valor<br />

recebi<strong>do</strong> <strong>de</strong>posita<strong>do</strong> em juízo à espera <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong>.<br />

O legisla<strong>do</strong>r, aparentemente, encontrou uma solução que prestigia a efetivida<strong>de</strong> e a segurança jurídica. A executabilida<strong>de</strong><br />

imediata reforça o caráter <strong>de</strong> pressão psicológica da multa porque o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r sabe que, <strong>de</strong>scumprida a <strong>de</strong>cisão em tempo breve,<br />

po<strong>de</strong>rá sofrer <strong>de</strong>sfalque patrimonial. Por outro la<strong>do</strong>, ao exigir para o levantamento <strong>de</strong> valores em favor <strong>do</strong> exequente o trânsito em<br />

julga<strong>do</strong> ou a pendência <strong>de</strong> recurso que dificilmente reverterá o resulta<strong>do</strong>, o legisla<strong>do</strong>r prestigia a segurança jurídica.<br />

Conforme consta <strong>do</strong> dispositivo ora analisa<strong>do</strong>, é possível o levantamento <strong>do</strong> dinheiro antes <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong>, bastan<strong>do</strong>,<br />

para isso, estar pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> julgamento o agravo contra recurso especial e recurso extraordinário. A permissão legal dá-se em razão<br />

das chances mínimas <strong>de</strong> sucesso <strong>de</strong> tal recurso, assumin<strong>do</strong> o legisla<strong>do</strong>r, nesse caso, o risco por um levantamento antes <strong>do</strong> trânsito<br />

em julga<strong>do</strong>.<br />

Apesar <strong>de</strong> raro, é possível que tal recurso seja provi<strong>do</strong>, e tal situação <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada. Sen<strong>do</strong> por meio <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão<br />

<strong>de</strong>finitiva, <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> não assistir razão à parte que teria si<strong>do</strong> beneficiada pela multa, na hipótese <strong>de</strong> a multa ainda não ter si<strong>do</strong><br />

cobrada, esta per<strong>de</strong>rá seu objeto. Já ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> executada, com a satisfação <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r, caberá a repetição <strong>de</strong> indébito. Ainda que<br />

existisse uma <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> juiz à época da fixação da multa que <strong>de</strong>veria ter si<strong>do</strong> cumprida, se posteriormente essa <strong>de</strong>cisão mostrou-se<br />

contrária ao direito, não há mais justificativa alguma para a manutenção das consequências <strong>do</strong> inadimplemento da obrigação.<br />

As consi<strong>de</strong>rações e conclusões, entretanto, não são aplicáveis quan<strong>do</strong> a multa for utilizada em um processo coletivo, já que,<br />

nesse caso, a exigibilida<strong>de</strong> está condicionada ao trânsito em julga<strong>do</strong> da <strong>de</strong>cisão que a fixar. E por que esse tratamento distinto? Por<br />

opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r. A regra está consagrada na ação civil pública (art. 12, § 2º, da Lei 7.347/1985), nas <strong>de</strong>mandas regidas pelo<br />

Estatuto da Criança e <strong>do</strong> A<strong>do</strong>lescente (ECA) (art. 213, § 3º, da Lei 8.069/1990) e nas <strong>de</strong>mandas reguladas pelo Estatuto <strong>do</strong> I<strong>do</strong>so<br />

(art. 83, § 3º, da Lei 10.741/2003).<br />

Não posso <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> registrar minha profunda lamentação por tal solução, porque no processo coletivo, no qual se tutelam<br />

direitos indisponíveis e disponíveis com repercussão social, a eficácia da multa é ainda mais relevante. Condicionar sua<br />

executabilida<strong>de</strong> ao trânsito em julga<strong>do</strong> é, em gran<strong>de</strong> medida, frustrar a expectativa <strong>de</strong> que a multa cumpra sua função <strong>de</strong> pressionar<br />

psicologicamente o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r a cumprir a obrigação. As regras presentes no microssistema coletivo, entretanto, não <strong>de</strong>ixam margem<br />

a outra interpretação.<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 517 <strong>do</strong> Novo CPC, a <strong>de</strong>cisão transitada em julga<strong>do</strong> po<strong>de</strong>rá ser levada a protesto, nos termos da lei, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

que o executa<strong>do</strong> não realize o pagamento no prazo <strong>de</strong> 15 dias previsto pelo art. 523 <strong>do</strong> mesmo diploma legal. Tal protesto é forma<br />

<strong>de</strong> pressão psicológica pela imposição <strong>de</strong> piora na situação <strong>do</strong> recorrente.<br />

Outra forma <strong>de</strong> execução indireta na execução <strong>de</strong> pagar quantia certa vem prevista no art. 782, § 3.º, <strong>do</strong> Novo CPC, que<br />

estabelece que, a requerimento da parte, o juiz po<strong>de</strong> <strong>de</strong>terminar a inclusão <strong>do</strong> nome <strong>do</strong> executa<strong>do</strong> em cadastros <strong>de</strong> inadimplentes.<br />

Trata-se, evi<strong>de</strong>ntemente, <strong>de</strong> medida <strong>de</strong> execução coercitiva, que por meio <strong>de</strong> ameaça <strong>de</strong> piora na situação <strong>do</strong> executa<strong>do</strong> busca<br />

convencê-lo a cumprir a obrigação.<br />

A segunda forma <strong>de</strong> execução indireta consubstancia-se na oferta <strong>de</strong> uma melhora na situação da parte caso ela cumpra sua<br />

obrigação, como ocorre no art. 827, § 1.º, <strong>do</strong> Novo CPC, que prevê um <strong>de</strong>sconto <strong>de</strong> 50% no valor <strong>do</strong>s honorários advocatícios no<br />

caso <strong>de</strong> pagamento <strong>do</strong> valor exequen<strong>do</strong> no prazo <strong>de</strong> 3 dias da citação. Apesar <strong>de</strong> lições tradicionais <strong>de</strong> direito estrangeiro, os termos<br />

“sanções premia<strong>do</strong>ras” ou “sanções premiais”302 emprega<strong>do</strong>s para <strong>de</strong>signar essa espécie <strong>de</strong> execução indireta não parecem<br />

a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s, porque, afora a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> prêmio concedi<strong>do</strong> a quem cumpre a obrigação estar correta, não se po<strong>de</strong> confundir sanção com<br />

pressão psicológica.<br />

Na execução <strong>de</strong> pagar quantia certa é possível a cumulação <strong>de</strong> medidas <strong>de</strong> execução indireta e <strong>de</strong> execução por sub-rogação,<br />

ainda que tradicionalmente o procedimento executivo esteja funda<strong>do</strong> em atos <strong>de</strong> sub-rogação representa<strong>do</strong>s pela penhora e


expropriação <strong>de</strong> bens, nos termos <strong>do</strong> art. 824 <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Na vigência <strong>do</strong> CPC/1973, parecia não ser possível a execução indireta por meio da aplicação das astreintes para pressionar o<br />

executa<strong>do</strong> a cumprir a obrigação <strong>de</strong> pagar quantia certa. Apesar <strong>de</strong> parcela <strong>do</strong>utrinária <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a possibilida<strong>de</strong> da aplicação <strong>de</strong><br />

multa na obrigação <strong>de</strong> pagar quantia certa303, a jurisprudência <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça era consolidada em senti<strong>do</strong><br />

contrário, admitin<strong>do</strong> a multa na obrigação <strong>de</strong> efetuar crédito em conta vinculada <strong>do</strong> FGTS, justamente por enten<strong>de</strong>r tratar-se <strong>de</strong><br />

obrigação <strong>de</strong> fazer e não <strong>de</strong> pagar 304 .<br />

A previsão contida no inciso IV <strong>do</strong> art. 139 <strong>do</strong> Novo CPC é plenamente capaz <strong>de</strong> afastar essa resistência jurispru<strong>de</strong>ncial, <strong>de</strong><br />

forma a ter si<strong>do</strong> cria<strong>do</strong> o ambiente legislativo propício para a aplicação das astreintes nas execuções que tenham como objeto<br />

obrigação <strong>de</strong> pagar quantia.<br />

No procedimento <strong>de</strong> cumprimento <strong>de</strong> sentença <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> pagar quantia existe a previsão <strong>de</strong> uma multa no valor <strong>de</strong> 10%<br />

<strong>do</strong> valor da con<strong>de</strong>nação na hipótese <strong>de</strong> o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r não realizar o pagamento no prazo <strong>de</strong> 15 dias. Para parcela da <strong>do</strong>utrina, trata-se<br />

<strong>de</strong> medida <strong>de</strong> execução indireta, que busca pressionar psicologicamente o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r a efetuar o pagamento <strong>do</strong> valor <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> 305 .<br />

Não parece, entretanto, tratar-se efetivamente <strong>de</strong> medida <strong>de</strong> execução indireta, sen<strong>do</strong> sancionatória a natureza jurídica <strong>de</strong>ssa<br />

multa 306 . Como se po<strong>de</strong> afirmar que a astreinte é uma multa e que tem o seu valor prefixa<strong>do</strong> em lei, sem nenhuma liberda<strong>de</strong> ao juiz<br />

em aumentar ou diminuir tal valor? Como saber a priori se o valor legal funcionará efetivamente no caso concreto para pressionar<br />

o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r ao cumprimento da obrigação? Por outro la<strong>do</strong>, não se aplica medida <strong>de</strong> execução indireta quan<strong>do</strong> é material ou<br />

juridicamente impossível o cumprimento da obrigação307. Não teria nenhum senti<strong>do</strong> aplicar uma multa diária ao executa<strong>do</strong> que<br />

tem a obrigação <strong>de</strong> entregar coisa que já pereceu. Da mesma forma, não teria senti<strong>do</strong> pressionar alguém a pagar, se essa pessoa não<br />

tem patrimônio suficiente para tornar materialmente possível o cumprimento da obrigação. No entanto, a multa é aplicada<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da situação patrimonial <strong>do</strong> executa<strong>do</strong> 308 , o que <strong>de</strong>ixa claro que, diante <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> pagar <strong>de</strong>scumpri<strong>do</strong>, aplica-se<br />

como sanção a multa no valor <strong>de</strong> 10% sobre o valor da con<strong>de</strong>nação.<br />

O tema, entretanto, é bastante controverti<strong>do</strong>, chegan<strong>do</strong>-se até mesmo a ponto <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar a multa com natureza jurídica<br />

híbrida, sen<strong>do</strong> ao mesmo tempo execução indireta e sanção processual 309 .<br />

Especificamente quanto à execução indireta por meio <strong>de</strong> ameaça <strong>de</strong> piora na situação <strong>do</strong> executa<strong>do</strong> na tutela coletiva, <strong>de</strong>ve ser<br />

lembra<strong>do</strong> o art. 14, § 3.º, da Lei 4.717/1965, ao prever que, quan<strong>do</strong> o réu con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> perceber <strong>do</strong>s cofres públicos, a execução farse-á<br />

por <strong>de</strong>sconto em folha até o integral ressarcimento <strong>do</strong> dano causa<strong>do</strong>, se assim mais convier ao interesse público. Como se po<strong>de</strong><br />

notar, o dispositivo legal, ao admitir o <strong>de</strong>sconto em folha, consequentemente afasta a impenhorabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> salário consagrada no<br />

art. 833, IV, <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Na obrigação <strong>de</strong> entregar coisa é possível a cumulação <strong>de</strong> medidas <strong>de</strong> execução por sub-rogação e indireta, não existin<strong>do</strong><br />

nenhuma or<strong>de</strong>m entre tais medidas, caben<strong>do</strong> ao juiz aplicá-las ao caso concreto como enten<strong>de</strong>r mais eficaz para a efetiva satisfação<br />

<strong>do</strong> direito exequen<strong>do</strong>. Assim, po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>terminar a busca e apreensão ou a imissão na posse (execução por sub-rogação) ou, se<br />

preferir, aplicar uma multa diária diante <strong>do</strong> <strong>de</strong>scumprimento da obrigação <strong>de</strong> entregar a coisa (execução indireta), como também<br />

po<strong>de</strong>rá aplicar ambas as medidas concomitantemente, até que uma <strong>de</strong>las se mostre eficaz, o que levará à revogação da outra.<br />

Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> fazer <strong>de</strong> natureza fungível, ou seja, uma obrigação que po<strong>de</strong> ser cumprida por outros sujeitos além<br />

<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r (por exemplo, pintar uma casa), é possível a cumulação <strong>de</strong> medidas <strong>de</strong> execução indireta e por sub-rogação. Po<strong>de</strong> o juiz<br />

<strong>de</strong>terminar a aplicação <strong>de</strong> multa 310 , como também que a obrigação seja cumprida por terceiro à custa <strong>do</strong> executa<strong>do</strong>, nos termos <strong>do</strong>s<br />

arts. 817 a 820 <strong>do</strong> Novo CPC. Sen<strong>do</strong> a obrigação <strong>de</strong> fazer infungível (personalíssima), na qual somente o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> cumprir a<br />

obrigação, <strong>de</strong> nada adiantará a aplicação <strong>de</strong> medidas <strong>de</strong> execução por sub-rogação, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que nesse caso a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r não po<strong>de</strong> ser substituída pela vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>-Juiz. Nessa espécie <strong>de</strong> execução resta somente a aplicação <strong>de</strong> astreintes<br />

na tentativa <strong>de</strong> convencer o executa<strong>do</strong> a cumprir a obrigação311.<br />

11.9.1.2.<br />

Prescrição<br />

Haven<strong>do</strong> execução coletiva <strong>de</strong> sentença coletiva, não há qualquer <strong>de</strong>bate a respeito <strong>do</strong> prazo prescricional da pretensão<br />

executiva, sen<strong>do</strong> nesse caso aplica<strong>do</strong> o entendimento consagra<strong>do</strong> na Súmula 150/STF, <strong>de</strong> forma que o prazo prescricional para o<br />

exercício da pretensão executiva será o mesmo da pretensão cognitiva.<br />

Não há qualquer previsão expressa a respeito da prescrição da ação civil pública na Lei 7.347/1985 ou no CDC, mas tal<br />

omissão não é suficiente para permitir a conclusão da <strong>do</strong>utrina minoritária <strong>de</strong> não existir prescrição para a propositura <strong>de</strong> tal espécie<br />

<strong>de</strong> ação coletiva.312<br />

Na realida<strong>de</strong>, parece indiscutível que existe prescrição, salvo na hipótese <strong>de</strong> lesão ao meio ambiente, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se não só<br />

sua natureza indisponível, mas em especial sua relevância para a própria sobrevivência da pessoa humana. Conforme já <strong>de</strong>cidi<strong>do</strong><br />

pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, a tutela jurisdicional em razão <strong>do</strong> dano ambiental protege bem jurídico que antece<strong>de</strong> a to<strong>do</strong>s os


<strong>de</strong>mais direitos, já que sem ele não há vida, nem saú<strong>de</strong>, nem trabalho, tampouco lazer. 313<br />

Registre-se, entretanto, que o prescricional para a cobrança <strong>de</strong> multa aplicada em virtu<strong>de</strong> da infração administrativa ao meio<br />

ambiente é <strong>de</strong> cinco anos, nos termos <strong>do</strong> art. 1º <strong>do</strong> Decreto 20.910/1932, conforme entendimento consolida<strong>do</strong> <strong>do</strong> Superior Tribunal<br />

<strong>de</strong> Justiça. 314<br />

A questão mais relevante diz respeito ao prazo prescricional, tanto para a propositura da ação coletiva como para o início <strong>do</strong><br />

cumprimento <strong>de</strong> sentença coletiva. Seria resolvida a omissão legal com a aplicação <strong>do</strong> microssistema coletivo ou o mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong><br />

é se socorrer <strong>do</strong>s prazos prescricionais previstos no Código Civil?<br />

São inúmeras as <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça aplican<strong>do</strong> o microssistema coletivo para concluir que o prazo<br />

prescricional da ação civil pública é <strong>de</strong> cinco anos, em razão da aplicação subsidiária <strong>do</strong> art. 21 da LAP.315<br />

Há corrente <strong>do</strong>utrinária, 316 entretanto, inclusive amparada em julgamento – aparentemente isola<strong>do</strong> – <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça, 317 no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> somente aplicar subsidiariamente o prazo <strong>de</strong> cinco anos previsto no art. 21 da Lei 4.717/1965 à ação civil<br />

pública a direitos materiais tuteláveis pela ação popular. Nessa linha <strong>de</strong> raciocínio, naqueles direitos materiais que só po<strong>de</strong>m ser<br />

tutela<strong>do</strong>s pela ação civil pública <strong>de</strong>ve-se buscar o prazo prescricional fora <strong>do</strong> microssistema, mais precisamente no Código Civil ou<br />

outros diplomas legais que prevejam tal prazo, como, por exemplo, o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

O tema cresce em interesse quan<strong>do</strong> se analisa a execução individual da sentença coletiva. Qualquer que seja a natureza <strong>do</strong><br />

direito reconheci<strong>do</strong> pela sentença coletiva, é possível seu aproveitamento por indivíduos. Tratan<strong>do</strong>-se a sentença coletiva <strong>de</strong> direito<br />

transindividual, é sempre possível haver direitos individuais correlatos, que tenham si<strong>do</strong> viola<strong>do</strong>s pelo mesmo ato ilícito, e, se tratar<br />

<strong>de</strong> direito individual homogêneo, os titulares <strong>do</strong>s direitos individuais que, soma<strong>do</strong>s, resultaram em tal direito, naturalmente terão<br />

interesse em executar a sentença.<br />

Questão interessante concerne ao prazo prescricional para a propositura <strong>de</strong>ssa execução, ou mesmo para a liquidação <strong>de</strong><br />

sentença como medida preparatória à execução. O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, aplican<strong>do</strong> o entendimento consolida<strong>do</strong> na Súmula<br />

150/STF, enten<strong>de</strong>u que o prazo prescricional para as execuções individuais da sentença coletiva é o mesmo da ação coletiva, sen<strong>do</strong>,<br />

portanto, <strong>de</strong> cinco anos. 318<br />

O entendimento consagra<strong>do</strong> no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ra a natureza da ação <strong>de</strong> conhecimento e das execuções,<br />

e para ele o relevante para a fixação <strong>do</strong> prazo prescricional é o prazo previsto em lei para a ação. Consi<strong>de</strong>ro justificável o<br />

entendimento, ainda que no caso concreto possa representar sério prejuízo ao indivíduo, que, se tivesse em seu favor uma sentença<br />

individual, teria, na maioria <strong>do</strong>s casos, mais <strong>do</strong> que cinco anos para a propositura da execução.<br />

Registre-se a existência <strong>de</strong> prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça que enten<strong>de</strong> inaplicável a obrigação <strong>de</strong> publicação <strong>de</strong><br />

editais para a ciência erga omnes da propositura da ação coletiva (art. 94 <strong>do</strong> CDC) como exigência <strong>do</strong> termo inicial para a<br />

contagem <strong>do</strong> prazo prescricional para o cumprimento <strong>de</strong> sentença, que se dará <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong>, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong><br />

publicação <strong>de</strong> editais dan<strong>do</strong> conta a terceiros pretensamente interessa<strong>do</strong>s no resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo coletivo:<br />

“<strong>Direito</strong> processual civil. Termo a quo <strong>do</strong> prazo prescricional das execuções individuais <strong>de</strong> sentença coletiva. Recurso repetitivo (art.<br />

543-C <strong>do</strong> CPC/1973 e Res. STJ n. 8/2008). Tema 877.<br />

O prazo prescricional para a execução individual é conta<strong>do</strong> <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong> da sentença coletiva, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>snecessária a<br />

providência <strong>de</strong> que trata o art. 94 da Lei n. 8.078/1990. O art. 94 <strong>do</strong> CDC dispõe que, ‘Proposta a ação, será publica<strong>do</strong> edital no<br />

órgão oficial, a fim <strong>de</strong> que os interessa<strong>do</strong>s possam intervir no processo como litisconsortes, sem prejuízo <strong>de</strong> ampla divulgação pelos<br />

meios <strong>de</strong> comunicação social por parte <strong>do</strong>s órgãos <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r’. Realmente, essa providência (<strong>de</strong> ampla divulgação<br />

midiática) é <strong>de</strong>snecessária em relação ao trânsito em julga<strong>do</strong> <strong>de</strong> sentença coletiva. Isso porque o referi<strong>do</strong> dispositivo disciplina a<br />

hipótese <strong>de</strong> divulgação da notícia da propositura da ação coletiva, para que eventuais interessa<strong>do</strong>s possam intervir no processo ou<br />

acompanhar seu trâmite, nada estabelecen<strong>do</strong>, porém, quanto à divulgação <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> julgamento. Diante disso, o marco inicial<br />

<strong>do</strong> prazo prescricional aplicável às execuções individuais <strong>de</strong> sentença prolatada em processo coletivo é conta<strong>do</strong>, ante a<br />

inaplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> art. 94 <strong>do</strong> CDC, a partir <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong> da sentença coletiva. Note-se, ainda, que o art. 96 <strong>do</strong> CDC,<br />

segun<strong>do</strong> o qual, ‘Transitada em julga<strong>do</strong> a sentença con<strong>de</strong>natória, será publica<strong>do</strong> edital, observa<strong>do</strong> o disposto no art. 93’, foi objeto <strong>de</strong><br />

veto pela Presidência da República, o que torna infrutífero o esforço <strong>de</strong> interpretação analógica para aplicar a providência prevista<br />

no art. 94 com o fim <strong>de</strong> promover a ampla divulgação midiática <strong>do</strong> teor da sentença coletiva transitada em julga<strong>do</strong>, ante a<br />

impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o Po<strong>de</strong>r Judiciário, qual legisla<strong>do</strong>r ordinário, <strong>de</strong>rrubar o veto presi<strong>de</strong>ncial ou, eventualmente, corrigir erro formal<br />

porventura existente na norma. Assim, em que pese o caráter social que se busca tutelar nas ações coletivas, não se afigura possível<br />

suprir a ausência <strong>de</strong> previsão legal quanto à ampla divulgação midiática <strong>do</strong> teor da sentença, sem romper a harmonia entre os<br />

Po<strong>de</strong>res. Ressalte-se que, embora essa questão não tenha si<strong>do</strong> o tema <strong>do</strong> REsp 1.273.643-PR (Segunda Seção, DJe 4/4/2013, julga<strong>do</strong><br />

no regime <strong>do</strong>s recursos repetitivos) – no qual se <strong>de</strong>finiu que, ‘No âmbito <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>, é <strong>de</strong> cinco anos o prazo prescricional<br />

para ajuizamento da execução individual em pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> cumprimento <strong>de</strong> sentença proferida em Ação Civil Pública’ –, percebe-se que<br />

a <strong>de</strong>snecessida<strong>de</strong> da providência <strong>de</strong> que trata o art. 94 da Lei n. 8.078/1990 foi a premissa <strong>do</strong> julgamento <strong>do</strong> caso concreto no<br />

referi<strong>do</strong> recurso, haja vista que, ao <strong>de</strong>finir se aquela pretensão executória havia prescrito, consi<strong>de</strong>rou-se o termo a quo <strong>do</strong> prazo<br />

prescricional como a data <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong> da sentença coletiva. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: AgRg no AgRg no REsp 1.169.126-RS,


Quinta Turma, DJe 11/2/2015; AgRg no REsp 1.175.018-RS, Sexta Turma, DJe 1º/7/2014; AgRg no REsp 1.199.601-AP, Primeira<br />

Turma, DJe 4/2/2014; e EDcl no REsp 1.313.062-PR, Terceira Turma, DJe 5/9/2013)” (Informativo 568/STJ – 1.ª Seção – REsp<br />

1.388.000/PR – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – Rel. para acórdão Min. Og Fernan<strong>de</strong>s – j. 26.08.2015 – DJe 12.04.2016.<br />

11.9.2.<br />

Legitimida<strong>de</strong> ativa<br />

Naturalmente, o autor da ação coletiva terá legitimida<strong>de</strong> para a execução. É, inclusive, esse sujeito que costuma executar a<br />

sentença, não sen<strong>do</strong> comum que outro legitima<strong>do</strong>, que não tenha participa<strong>do</strong> da fase <strong>de</strong> conhecimento como autor, dê início à fase<br />

executiva. Não é normal que um legitima<strong>do</strong> que teve to<strong>do</strong> o trabalho em obter uma sentença con<strong>de</strong>natória <strong>de</strong>ixe <strong>de</strong> se interessar<br />

justamente no momento da satisfação <strong>do</strong> direito. Apesar <strong>de</strong>ssa realida<strong>de</strong>, é indiscutível que outros legitima<strong>do</strong>s previstos nos arts. 5º<br />

da LACP e 82 <strong>do</strong> CDC, que não tenham composto o polo ativo da ação coletiva na fase <strong>de</strong> conhecimento, também sejam<br />

legitima<strong>do</strong>s ativos para o cumprimento <strong>de</strong> sentença.<br />

O mesmo po<strong>de</strong> se dizer da execução <strong>de</strong> título executivo extrajudicial. Apesar <strong>de</strong> ser comum que o próprio legitima<strong>do</strong> coletivo<br />

que participou da formação <strong>do</strong> título seja o exequente na hipótese <strong>de</strong> inadimplemento obrigacional, não existe qualquer<br />

impedimento para que outro legitima<strong>do</strong> coletivo ingresse com a execução. Nesse senti<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ve-se lamentar a mudança <strong>de</strong><br />

entendimento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça quanto à legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Ministério Público <strong>de</strong> executar <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong><br />

Contas <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> com vista a ressarcir o erário319. O entendimento parte da equivocada premissa <strong>de</strong> que nesse caso o Ministério<br />

Público atuaria em favor <strong>do</strong> órgão público (execução individual), quan<strong>do</strong> na realida<strong>de</strong> sua atuação se dá em prol da coletivida<strong>de</strong><br />

(execução coletiva).<br />

A indisponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> execução <strong>de</strong> título executivo judicial no âmbito da tutela coletiva é a regra, <strong>de</strong> forma que, não sen<strong>do</strong><br />

executada a sentença coletiva <strong>de</strong> procedência pelo autor ou por outro colegitima<strong>do</strong> <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> certo prazo legal, caberá ao Ministério<br />

Público o <strong>de</strong>ver funcional <strong>de</strong> fazê-lo. A justificativa é simples: evitar que um eventual conluio <strong>do</strong> autor com o réu, ou mesmo um<br />

<strong>de</strong>sinteresse <strong>de</strong> outros legitima<strong>do</strong>s em executar a <strong>de</strong>cisão, seja capaz <strong>de</strong> frustrar a proteção <strong>de</strong> um direito transindividual já<br />

reconheci<strong>do</strong> por <strong>de</strong>cisão judicial.<br />

O art. 16 da Lei 4.717/1965, que prevê o <strong>de</strong>ver funcional <strong>do</strong> Ministério Público <strong>de</strong> executar a <strong>de</strong>cisão judicial, <strong>de</strong>corri<strong>do</strong>s 60<br />

dias da publicação da sentença con<strong>de</strong>natória <strong>de</strong> segunda instância (melhor seria dizer acórdão <strong>de</strong> segun<strong>do</strong> grau), em razão da<br />

inércia <strong>do</strong> cidadão autor e <strong>de</strong> outros cidadãos, vai no mesmo senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> art. 15 da Lei 7.347/1985, que prevê ser <strong>de</strong>ver funcional <strong>do</strong><br />

Ministério Público a execução em 60 dias <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong>, caso não a execute o autor ou outro colegitima<strong>do</strong>.<br />

Ainda que a obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> propositura da execução pelo Ministério Público seja a tônica <strong>do</strong> sistema da tutela coletiva, é<br />

preciso observar importante distinção entre as duas regras legais mencionadas. Enquanto na ação popular o prazo <strong>de</strong> 60 dias tem<br />

seu termo inicial na prolação da <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> procedência <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> grau, na ação civil pública a contagem <strong>do</strong> mesmo prazo só tem<br />

início com o trânsito em julga<strong>do</strong> da sentença <strong>de</strong> procedência. Significa que o Ministério Público somente tem o <strong>de</strong>ver funcional <strong>de</strong><br />

executar uma sentença proferida em ação civil pública <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>finitiva, enquanto na ação popular, ainda que pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />

julgamento recurso especial e/ou extraordinário, haverá <strong>de</strong>ver funcional <strong>do</strong> Ministério Público em executar provisoriamente a<br />

sentença.<br />

Mesmo que se reconheça o nobre objetivo <strong>de</strong> se fazer cumprir uma sentença popular a partir <strong>do</strong> momento em que ela passa a<br />

gerar efeitos no processo, mesmo que não seja <strong>de</strong>finitiva em razão da pendência <strong>de</strong> recurso, não enten<strong>do</strong> correto imputar ao<br />

Ministério Público um <strong>de</strong>ver funcional em executar a sentença provisoriamente. Ninguém tem o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> executar provisoriamente,<br />

sen<strong>do</strong> sempre admissível que se aguar<strong>de</strong> o momento em que a <strong>de</strong>cisão torna-se <strong>de</strong>finitiva, após o trânsito em julga<strong>do</strong>, em razão da<br />

teoria <strong>do</strong> risco-proveito aplicável ao cumprimento provisório da sentença.<br />

Prevê o art. 520, I, <strong>do</strong> Novo CPC que o cumprimento provisório <strong>de</strong> sentença corre por conta e responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> exequente,<br />

em nítida aplicação da teoria <strong>do</strong> risco-proveito. Significa que o cumprimento provisório <strong>de</strong> sentença é uma opção benéfica ao<br />

exequente, já que permite, senão a satisfação <strong>do</strong> direito, ao menos o adiantamento da prática <strong>de</strong> atos executivos. Entretanto, os<br />

riscos <strong>de</strong> tal adiantamento são totalmente carrea<strong>do</strong>s ao exequente, que estará obriga<strong>do</strong> a ressarcir o executa<strong>do</strong> por to<strong>do</strong>s os danos<br />

(materiais, morais, processuais) advin<strong>do</strong>s da execução provisória na hipótese <strong>de</strong> a sentença ser reformada ou anulada pelo recurso<br />

pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> julgamento. A responsabilida<strong>de</strong>, nesse caso, é objetiva, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que o elemento “culpa” é irrelevante para a sua<br />

configuração, bastan<strong>do</strong> ao executa<strong>do</strong> provar a efetiva ocorrência <strong>de</strong> danos e o nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> com a execução provisória.<br />

Significa que, na ação popular, não se po<strong>de</strong> impor um <strong>de</strong>ver ao Ministério Público que acarretará um risco <strong>de</strong> prejuízo aos<br />

cofres públicos, porque os danos suporta<strong>do</strong>s pelo executa<strong>do</strong> provisório nesse caso serão cobra<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. É até mesmo um<br />

contrassenso, em uma ação em que se busca a tutela <strong>do</strong> patrimônio público, exigir <strong>do</strong> Ministério Público a a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> uma conduta<br />

que po<strong>de</strong>rá resultar em prejuízo a esse mesmo patrimônio que se buscava tutelar. Portanto, ainda que exista expressa previsão a<br />

respeito na Lei 4.717/1965, parece ser preferível a aplicação <strong>do</strong> art. 15 da Lei 7.347/1985.<br />

Reconheço que o entendimento ora <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong> não encontra amparo nos tribunais, e o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça não só


aplica o art. 16 da LAP em sua literalida<strong>de</strong>, como vai além, ao admitir que em sua interpretação também seja incluída a liquidação<br />

da sentença coletiva genérica. Ainda que a liquidação seja inegavelmente cognitiva, como fase preparatória da execução, a <strong>de</strong>cisão<br />

<strong>de</strong>monstra o claro entendimento no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> ser iniciada a persecução executiva a partir da <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> segun<strong>do</strong> grau, ainda que<br />

nesse caso precedida pela liquidação <strong>de</strong> sentença.<br />

O problema, naturalmente, não se coloca na hipótese <strong>de</strong> sentença <strong>de</strong> procedência transitada em julga<strong>do</strong> em razão <strong>de</strong> ausência<br />

<strong>de</strong> interposição <strong>de</strong> apelação por parte <strong>do</strong>s réus. Apesar <strong>de</strong> extremamente rara no caso concreto tal situação, o <strong>de</strong>ver <strong>do</strong> Ministério<br />

Público <strong>de</strong> executar a sentença coletiva só começa, nesse caso, a ser conta<strong>do</strong> <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong>. O mesmo se diga <strong>do</strong> acórdão<br />

que julga a apelação não recorri<strong>do</strong> por recurso especial e/ou recurso extraordinário, <strong>de</strong> ocorrência um pouco mais frequente.<br />

Registre-se, por fim, que o art. 15 da LACP se aplica somente nos casos <strong>de</strong> direito difuso e coletivo, nos quais a execução<br />

coletiva da sentença é o caminho natural <strong>de</strong> satisfação <strong>do</strong> direito reconheci<strong>do</strong> como viola<strong>do</strong> pela <strong>de</strong>cisão. Nos direitos individuais<br />

homogêneos o caminho natural <strong>de</strong>ssa satisfação é a execução individual a ser oferecida pelos interessa<strong>do</strong>s, sen<strong>do</strong> coletiva a<br />

execução <strong>de</strong> maneira subsidiária e eventual, nos termos <strong>do</strong> art. 100 <strong>do</strong> CDC.<br />

11.9.3.<br />

<strong>Direito</strong>s difusos e coletivos<br />

Conforme já tive oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> afirmar, diante <strong>de</strong> uma sentença coletiva fundada em violação a direito difuso e coletivo, o<br />

caminho natural <strong>de</strong> satisfação da <strong>de</strong>cisão é por meio <strong>de</strong> uma execução coletiva, que reverterá em prol da coletivida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> uma<br />

comunida<strong>de</strong>. Não há, na realida<strong>de</strong>, qualquer especialida<strong>de</strong> procedimental nessa execução, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o exequente se valer das regras<br />

previstas na teoria geral da execução e aplicáveis tanto à execução individual como coletiva.<br />

O ponto <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque fica por conta das lições <strong>do</strong>utrinárias que apontam uma preferência nessa execução pela tutela<br />

específica320. Como toda tutela inibitória é específica, fica clara também a opção por essa espécie <strong>de</strong> tutela, restan<strong>do</strong> a tutela<br />

reparatória apenas para aquelas situações em que não será concretamente possível a obtenção da inibitória. E, mesmo quan<strong>do</strong> a<br />

tutela reparatória for a única possível, prefere-se essa espécie <strong>de</strong> tutela in natura, e somente <strong>de</strong> forma residual a tutela pelo<br />

equivalente em dinheiro.<br />

Naturalmente é mais a<strong>de</strong>quada uma tutela que proíba uma <strong>de</strong>terminada empresa <strong>de</strong> cortar ilegalmente milhares <strong>de</strong> árvores,<br />

mas, uma vez ocorri<strong>do</strong> o evento, a tutela preventiva já não será mais possível, restan<strong>do</strong> tão somente a tutela reparatória. Nesse caso,<br />

<strong>de</strong>ve-se preferir a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> réu a alguma compensação ao meio ambiente lesa<strong>do</strong>, como a obrigação <strong>de</strong> replantio das árvores, e<br />

apenas <strong>de</strong> forma residual sua con<strong>de</strong>nação ao pagamento <strong>de</strong> quantia certa.<br />

Haven<strong>do</strong> con<strong>de</strong>nação a pagar quantia certa na hipótese <strong>de</strong> danos causa<strong>do</strong>s ao erário, o valor obti<strong>do</strong> em cumprimento <strong>de</strong><br />

sentença ou processo <strong>de</strong> execução será reverti<strong>do</strong> para a pessoa jurídica <strong>de</strong> direito público que tenha suporta<strong>do</strong> a lesão econômica<br />

reconhecida na sentença ou no título executivo extrajudicial 321 . Em todas as <strong>de</strong>mais hipóteses, o valor em dinheiro obti<strong>do</strong> em<br />

processo <strong>de</strong> execução ou cumprimento <strong>de</strong> sentença <strong>de</strong>verá ser reverti<strong>do</strong> para o Fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>s Difusos, previsto no art. 13 da<br />

LACP322.<br />

11.9.4.<br />

<strong>Direito</strong>s individuais homogêneos<br />

11.9.4.1.<br />

Introdução<br />

Como já tive oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> afirmar, o direito individual homogêneo tem natureza <strong>de</strong> direito individual, e nada mais é <strong>do</strong> que<br />

a soma <strong>de</strong> direitos individuais <strong>de</strong> origem comum. Em um processo coletivo cujo objeto seja um direito individual homogêneo, a<br />

sentença con<strong>de</strong>nará o réu ao pagamento <strong>do</strong>s danos gera<strong>do</strong>s aos sujeitos que sejam titulares <strong>de</strong> cada direito individual que, soma<strong>do</strong>s,<br />

resultaram no direito individual homogêneo.<br />

Essa especial, característica <strong>do</strong> direito individual homogêneo faz que a sentença coletiva seja executada individualmente, por<br />

cada um <strong>do</strong>s indivíduos beneficia<strong>do</strong>s por ela. Muito provavelmente será necessária uma fase <strong>de</strong> liquidação <strong>de</strong> sentença, conforme<br />

analisa<strong>do</strong> no item 11.8, mas a execução subsequente terá natureza individual. Significa que, <strong>de</strong>ntro da normalida<strong>de</strong>, a ação é tratada<br />

como coletiva somente até a prolação da sentença, e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong>sse momento é tratada como individual, seja na liquidação, seja na<br />

execução.<br />

A execução individual não terá qualquer especialida<strong>de</strong> procedimental, sen<strong>do</strong> uma regular execução <strong>de</strong> pagar quantia certa <strong>de</strong><br />

título executivo judicial. Os pontos <strong>de</strong> maior interesse ficam por conta da execução por fluid recovery e da execução<br />

pseu<strong>do</strong>coletiva, temas que serão analisa<strong>do</strong>s a seguir.<br />

11.9.4.2.<br />

Execução por fluid recovery


A execução <strong>de</strong> sentença fundada em direito individual homogêneo será feita individualmente, pelos lesiona<strong>do</strong>s, seus<br />

sucessores ou mesmo pelos legitima<strong>do</strong>s coletivos. In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> exequente, o importante a ressaltar é a natureza<br />

individual <strong>de</strong>ssas execuções, o que, no caso concreto, exigirá a iniciativa <strong>do</strong> indivíduo, seja ingressan<strong>do</strong> com a execução, seja<br />

munician<strong>do</strong> o legitima<strong>do</strong> coletivo <strong>de</strong> informações para que o quantum <strong>de</strong>beatur individual seja estabeleci<strong>do</strong>. O indivíduo, portanto,<br />

é peça fundamental na execução <strong>de</strong> sentença coletiva fundada em direito individual homogêneo.<br />

Como a participação <strong>do</strong> indivíduo é praticamente indispensável na execução ora analisada, surge a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma<br />

sentença praticamente ineficaz, que aproveite concretamente um número ínfimo <strong>de</strong> interessa<strong>do</strong>s que se habilitem na <strong>de</strong>manda para<br />

executar seus créditos. Por vezes, uma sentença com abrangência ampla em termos <strong>de</strong> sujeitos beneficia<strong>do</strong>s po<strong>de</strong> simplesmente<br />

<strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> gerar to<strong>do</strong>s os seus potenciais efeitos, bastan<strong>do</strong> para isso que os beneficia<strong>do</strong>s pela <strong>de</strong>cisão não executem seus créditos<br />

individuais. E nesse caso a execução por reparação fluida evita o enriquecimento sem causa <strong>do</strong> con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> na ação coletiva323.<br />

Po<strong>de</strong>r-se-á questionar por que um sujeito, que tem em seu favor um título executivo judicial, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> executá-lo. Apesar <strong>do</strong>s<br />

mecanismos <strong>de</strong> aviso aos interessa<strong>do</strong>s previstos pela lei, <strong>de</strong>ve-se reconhecer que a publicação <strong>de</strong> editais no início <strong>do</strong> processo, nos<br />

termos <strong>do</strong> art. 94 <strong>do</strong> CDC, po<strong>de</strong> não levar à informação da existência <strong>do</strong> processo para to<strong>do</strong>s os interessa<strong>do</strong>s. E, mesmo que<br />

a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> entendimento <strong>do</strong>utrinário no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> aplicar esse dispositivo legal por analogia para o momento posterior ao trânsito em<br />

julga<strong>do</strong> 324 , difícil acreditar na plena publicida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>cisão. Medida interessante nesse senti<strong>do</strong> seria o autor pedir já na petição<br />

inicial a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> réu a provi<strong>de</strong>nciar a publicação da sentença em meios <strong>de</strong> comunicação <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> alcance, como internet,<br />

televisão e rádio. De qualquer forma, <strong>de</strong>ve-se contar com a ignorância <strong>do</strong>s interessa<strong>do</strong>s a respeito da sentença que os beneficia.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, a própria <strong>de</strong>sinformação <strong>de</strong> muitas partes e seus patronos po<strong>de</strong> colaborar para não haver a execução individual<br />

na dimensão a<strong>de</strong>quada e possível diante da sentença coletiva. A exata compreensão <strong>do</strong> sistema processual existente para a tutela<br />

coletiva ainda está longe <strong>de</strong> ser uma realida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que não é espantoso encontrar advoga<strong>do</strong>s que simplesmente não sabem<br />

que po<strong>de</strong>rão se valer <strong>de</strong> uma sentença coletiva para o benefício <strong>de</strong> seus clientes.<br />

Além das dificulda<strong>de</strong>s apresentadas, é importante lembrar típica hipótese <strong>de</strong> execução por fluid recovery. Como aponta a<br />

melhor <strong>do</strong>utrina 325 , existem danos que individualmente consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s são ínfimos, dificilmente incentivan<strong>do</strong> os indivíduos à<br />

execução. No entanto, quan<strong>do</strong> esses danos individuais são soma<strong>do</strong>s, passan<strong>do</strong> a existir <strong>de</strong> forma global, nota-se que o prejuízo<br />

gera<strong>do</strong> pelo réu foi substancial 326 . Os exemplos são fartos: milhares <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res foram engana<strong>do</strong>s por uma empresa <strong>de</strong><br />

chocolate, que anunciava barras <strong>de</strong> 30 g com somente 29 g; milhares <strong>de</strong> viajantes pagaram pedágio a R$ 10,00 quan<strong>do</strong> o valor<br />

correto seria R$ 9,90; milhares <strong>de</strong> clientes <strong>de</strong> um banco tiveram R$ 0,50 retira<strong>do</strong> in<strong>de</strong>vidamente <strong>de</strong> suas contas. Nesse caso, a falta<br />

<strong>de</strong> interesse nas execuções individuais, em razão <strong>do</strong> ínfimo valor envolvi<strong>do</strong>, po<strong>de</strong>rá liberar o réu <strong>de</strong> arcar com as consequências <strong>de</strong><br />

seu ato danoso, o que, naturalmente, não <strong>de</strong>ve ser bem aceito.<br />

Exatamente por compreen<strong>de</strong>r que a efetivida<strong>de</strong> da sentença fundada em direito individual homogêneo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá antes <strong>de</strong> tu<strong>do</strong><br />

da iniciativa <strong>do</strong> indivíduo, com o que nem sempre se po<strong>de</strong>rá contar, o legisla<strong>do</strong>r consagrou no art. 100 <strong>do</strong> CDC a chamada<br />

execução por fluid recovery, originária <strong>do</strong> direito norte-americano, também chamada <strong>de</strong> reparação fluída. Segun<strong>do</strong> o dispositivo<br />

legal, “<strong>de</strong>corri<strong>do</strong> o prazo <strong>de</strong> um ano sem habilitação <strong>de</strong> interessa<strong>do</strong>s em número compatível com a gravida<strong>de</strong> <strong>do</strong> dano, po<strong>de</strong>rão os<br />

legitima<strong>do</strong>s <strong>do</strong> art. 82 promover a liquidação e execução da in<strong>de</strong>nização <strong>de</strong>vida”.<br />

A execução por fluid recovery se distingue <strong>de</strong> forma significativa da execução individual. Nesta, o indivíduo ou o legitima<strong>do</strong><br />

coletivo como substituto processual litiga para satisfazer o direito individual, enquanto naquela o legitima<strong>do</strong> coletivo busca uma<br />

recomposição em prol da coletivida<strong>de</strong>, tanto assim que, segun<strong>do</strong> o art. 100, parágrafo único, <strong>do</strong> CDC, o produto da in<strong>de</strong>nização<br />

<strong>de</strong>vida reverterá para o fun<strong>do</strong> cria<strong>do</strong> pela Lei 7.347/1985, o Fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Difusos (FDD), in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> nesse<br />

senti<strong>do</strong> na petição inicial da ação coletiva327. Não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser interessante porque o dano gera<strong>do</strong> pelo réu foi individual, enquanto<br />

a execução por fluid recovery tutela a coletivida<strong>de</strong>.<br />

Essa forma diferenciada <strong>de</strong> execução <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada como uma anomalia <strong>do</strong> sistema, só <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> tomar lugar quan<strong>do</strong> as<br />

execuções individuais não tiverem si<strong>do</strong> oferecidas em número compatível com a gravida<strong>de</strong> <strong>do</strong> dano. Insista-se mais uma vez que,<br />

se o direito individual homogêneo tem natureza <strong>de</strong> direito individual, as execuções <strong>de</strong>vem ser individuais, valen<strong>do</strong>-se o sistema da<br />

execução por fluid recovery apenas subsidiariamente 328 .<br />

Apesar <strong>do</strong> silêncio da lei, o termo inicial <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> um ano previsto pelo art. 100 <strong>do</strong> CDC é o trânsito em julga<strong>do</strong> da<br />

sentença 329 , pois ninguém po<strong>de</strong> ser obriga<strong>do</strong> a executar provisoriamente uma sentença assumin<strong>do</strong> os riscos que essa espécie <strong>de</strong><br />

execução proporciona. Caberá aos legitima<strong>do</strong>s coletivos uma primeira aferição <strong>do</strong> número <strong>de</strong> interessa<strong>do</strong>s habilita<strong>do</strong>s diante <strong>do</strong><br />

potencial da sentença, uma vez que, se os próprios legitima<strong>do</strong>s coletivos enten<strong>de</strong>rem que o número <strong>de</strong> interessa<strong>do</strong>s habilita<strong>do</strong>s é<br />

compatível com a gravida<strong>de</strong> <strong>do</strong> dano, não <strong>de</strong>vem ingressar com a execução por fluid recovery. E, mesmo que seja oferecida a<br />

execução, caberá ao juiz a palavra final a respeito <strong>do</strong> cabimento <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> execução, sen<strong>do</strong> nesse caso indispensável, em<br />

respeito ao princípio <strong>do</strong> contraditório, a oitiva <strong>do</strong> réu antes da prolação da <strong>de</strong>cisão. De qualquer forma, o juiz nunca po<strong>de</strong>rá dar<br />

início <strong>de</strong> ofício a tal execução.


Como a lei foi suficientemente clara ao mencionar um número compatível com a gravida<strong>de</strong> <strong>do</strong> dano, não é necessário que<br />

to<strong>do</strong>s os beneficia<strong>do</strong>s tenham se habilita<strong>do</strong> a fim <strong>de</strong> evitar a execução por fluid recovery. Apesar <strong>do</strong> subjetivismo existente no<br />

dispositivo legal ora menciona<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ve restar claro que, mesmo haven<strong>do</strong> interessa<strong>do</strong>s não habilita<strong>do</strong>s, a fluid recovery po<strong>de</strong>rá ser<br />

dispensável. A tese <strong>de</strong> que <strong>de</strong>ve haver um ressarcimento integral <strong>do</strong> dano gera<strong>do</strong> é amparada em vício <strong>de</strong> premissa, porque a<br />

execução por fluid recovery não tem como objetivo complementar as execuções individuais, mas tão somente fazer que a sentença<br />

tenha eficácia prática.<br />

Essa é a razão, inclusive, para que na execução por fluid recovery se busquem outros parâmetros que não somente os danos<br />

individuais não executa<strong>do</strong>s individualmente, pois, sem a colaboração <strong>do</strong>s titulares <strong>do</strong> direito, nem sempre será possível a<br />

<strong>de</strong>terminação <strong>do</strong> valor <strong>de</strong> tal dano. O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça tem interessante julga<strong>do</strong> no qual associou o valor <strong>do</strong>s danos<br />

individuais não executa<strong>do</strong>s e o valor da execução por fluid recovery com fundamento no princípio da menor onerosida<strong>de</strong>330. É<br />

claro que no caso julga<strong>do</strong> era possível e razoavelmente simples se aferir esse valor, o que, entretanto, não é a regra das con<strong>de</strong>nações<br />

fundadas em violação <strong>de</strong> direito individual homogêneo.<br />

Como bem pon<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>utrina:<br />

“A jurisprudência norte-americana criou então remédio da fluid recovery (uma reparação fluida), a ser eventualmente utiliza<strong>do</strong> para<br />

fins diversos <strong>do</strong>s ressarcitórios, mas conexos com os interesses da coletivida<strong>de</strong>: por exemplo, para fins gerais <strong>de</strong> tutela <strong>do</strong>s<br />

consumi<strong>do</strong>res ou <strong>do</strong> ambiente”331.<br />

Para parcela minoritária da <strong>do</strong>utrina, o prazo <strong>de</strong> um ano <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong> é <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial, <strong>de</strong> forma que, se o indivíduo não<br />

se habilitar nesse prazo para executar a sentença coletiva, per<strong>de</strong>rá seu direito <strong>de</strong> crédito. A justificativa para esse entendimento é<br />

evitar um eventual bis in i<strong>de</strong>m:<br />

“De outro mo<strong>do</strong>, o cre<strong>do</strong>r po<strong>de</strong>ria ser obriga<strong>do</strong> a pagar mais <strong>do</strong> que o valor <strong>do</strong> dano por ele gera<strong>do</strong>. Com efeito, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que,<br />

após tal prazo, a diferença entre o valor <strong>do</strong> dano e aquele percebi<strong>do</strong> pelas vítimas é <strong>de</strong>stinada ao fun<strong>do</strong> (fluid recovery) e, <strong>do</strong> fun<strong>do</strong>,<br />

não po<strong>de</strong>rá ser emprega<strong>do</strong> para o ressarcimento individual das vítimas faltantes, a estas só restaria executar diretamente o patrimônio<br />

<strong>do</strong> próprio réu. Ocorre que ele já teria pago a integralida<strong>de</strong> <strong>do</strong> prejuízo causa<strong>do</strong>, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que, se fosse novamente executa<strong>do</strong>,<br />

pagaria mais <strong>do</strong> que <strong>de</strong>via” 332 .<br />

Concor<strong>do</strong> com a <strong>do</strong>utrina majoritária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> execuções individuais mesmo durante ou após o<br />

encerramento da execução por fluid recovery 333 . O prazo <strong>de</strong> um ano previsto pelo art. 100 <strong>do</strong> CDC tem natureza processual, e<br />

simplesmente aponta o momento a partir <strong>do</strong> qual se admitirá uma execução coletiva <strong>de</strong> sentença fundada em violação a direito<br />

individual homogêneo. Esse referi<strong>do</strong> prazo, em razão <strong>de</strong> sua natureza processual, não afeta os prazos prescricionais e <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais<br />

referentes ao direito individual que po<strong>de</strong>rá ser objeto <strong>de</strong> execução 334 .<br />

É evi<strong>de</strong>nte que, ao respon<strong>de</strong>r a to<strong>do</strong>s os beneficia<strong>do</strong>s pela sentença coletiva e também pela fluid recovery, o réu estará sen<strong>do</strong><br />

prejudica<strong>do</strong> em <strong>do</strong>bro, mas não se po<strong>de</strong> falar nesse caso em bis in i<strong>de</strong>m, pois os cre<strong>do</strong>res das duas espécies <strong>de</strong> execução são<br />

diferentes: no primeiro caso o indivíduo e, no segun<strong>do</strong>, a coletivida<strong>de</strong>.<br />

A<strong>de</strong>mais, <strong>de</strong>vemos lembrar que a execução forçada não <strong>de</strong>veria nem mesmo existir se os réus con<strong>de</strong>na<strong>do</strong>s cumprissem sua<br />

obrigação <strong>de</strong> pagar o que foi <strong>de</strong>finitivamente reconheci<strong>do</strong> na sentença con<strong>de</strong>natória. Caso o réu pretenda evitar uma duplicida<strong>de</strong><br />

executiva, terá um ano, a partir <strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong>, para pagar o que <strong>de</strong>ve aos indivíduos beneficia<strong>do</strong>s, <strong>de</strong> forma a evitar a<br />

execução por fluid recovery. Basta procurar tais sujeitos e realizar o pagamento <strong>do</strong> <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> e, haven<strong>do</strong> resistência <strong>do</strong> indivíduo que<br />

<strong>de</strong>ve recebê-lo, ingressar com consignações em pagamento, o que já será suficiente para evitar a execução por fluid recovery.<br />

Ao prever que o produto obti<strong>do</strong> por meio da execução por fluid recovery reverterá para o Fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>s Difusos (FDD), o<br />

art. 100, caput, <strong>do</strong> CDC dá a enten<strong>de</strong>r que toda execução por fluid recovery será realizada, cujo objeto é uma obrigação <strong>de</strong> pagar<br />

quantia certa, em um valor aproxima<strong>do</strong> daquele que <strong>de</strong>veria ter si<strong>do</strong> cobra<strong>do</strong> pelos beneficia<strong>do</strong>s pela sentença que não se<br />

habilitaram para a execução. Enten<strong>do</strong>, entretanto, que nem sempre <strong>de</strong>verá ser assim. Ainda que a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> réu na sentença<br />

coletiva tenha como objeto uma obrigação <strong>de</strong> pagar quantia certa aos lesiona<strong>do</strong>s por sua atuação, para a execução por fluid<br />

recovery será possível a transformação <strong>de</strong>ssa con<strong>de</strong>nação em uma obrigação <strong>de</strong> fazer ou <strong>de</strong> entregar.<br />

Basta imaginar um <strong>do</strong>s exemplos da<strong>do</strong>s neste capítulo para justificar a execução por fluid recovery. Milhões <strong>de</strong> motoristas<br />

pagaram R$ 0,50 a mais <strong>do</strong> que o valor correto <strong>de</strong> um pedágio. Reconhecida tal situação, na sentença coletiva o réu é con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> a<br />

ressarcir cada um <strong>do</strong>s usuários <strong>do</strong> pedágio pela diferença apurada entre o valor cobra<strong>do</strong> e o valor que <strong>de</strong>veria ter si<strong>do</strong> cobra<strong>do</strong>, no<br />

caso, míseros R$ 0,50. Como é <strong>de</strong> esperar, as execuções individuais, se existirem, serão em número insignificante diante <strong>do</strong> dano<br />

gera<strong>do</strong>. Na execução por fluid recovery, entretanto, em vez <strong>de</strong> cobrar o valor total da tungada, o juiz po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>terminar que a<br />

empresa que cuida <strong>do</strong> pedágio passasse a cobrar R$ 0,50 a menos <strong>do</strong> que o preço <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>, até que <strong>de</strong>volvesse aos consumi<strong>do</strong>res,<br />

ainda que <strong>de</strong> forma reflexa e indireta, o valor in<strong>de</strong>vidamente cobra<strong>do</strong>.


De qualquer forma, quan<strong>do</strong> o valor for reverti<strong>do</strong> para o Fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>s Difusos (FDD), é importante notar que o valor<br />

obti<strong>do</strong> não reverterá em favor <strong>do</strong>s indivíduos lesiona<strong>do</strong>s, mas sim em prol da coletivida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser aplica<strong>do</strong> na área <strong>de</strong><br />

interesse que gerou a execução. Nesse senti<strong>do</strong> a lição da melhor <strong>do</strong>utrina:<br />

“A solução, em casos tais, será a aplicação <strong>do</strong> produto pecuniário em que se tenha converti<strong>do</strong> o preceito cominatório (§ 1º <strong>do</strong> art. 84<br />

<strong>do</strong> CDC) numa finalida<strong>de</strong> institucional, compatível com o interesse metaindividual lesa<strong>do</strong>”335.<br />

11.9.4.3.<br />

Legitimida<strong>de</strong><br />

Conforme amplamente afirma<strong>do</strong>, a execução típica diante <strong>de</strong> uma sentença fundada em violação a direito individual<br />

homogêneo é individual, buscan<strong>do</strong> a satisfação <strong>de</strong> um direito <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> e <strong>de</strong> titularida<strong>de</strong> <strong>de</strong>finida. Segun<strong>do</strong> o art. 97, caput, <strong>do</strong><br />

CDC, “a liquidação e a execução <strong>de</strong> sentença po<strong>de</strong>rão ser promovidas pela vítima e seus sucessores, assim como pelos legitima<strong>do</strong>s<br />

<strong>de</strong> que trata o art. 82”.<br />

A primeira parte <strong>do</strong> dispositivo legal não apresenta qualquer dificulda<strong>de</strong> interpretativa, preven<strong>do</strong> típica hipótese <strong>de</strong> legitimação<br />

ordinária das vítimas <strong>do</strong> ato ilícito reconheci<strong>do</strong> na sentença ou <strong>de</strong> seus sucessores. Os indivíduos estarão nesse caso litigan<strong>do</strong> em<br />

nome próprio por um direito individual próprio. A legitimação concedida aos legitima<strong>do</strong>s à propositura da ação coletiva, elenca<strong>do</strong>s<br />

no art. 82 <strong>do</strong> CDC, por sua vez, traz maiores dificulda<strong>de</strong>s ao intérprete, haven<strong>do</strong> até mesmo quem aponte para uma legitimação<br />

anômala nesse caso336.<br />

A análise torna-se ainda mais difícil diante da expressa previsão <strong>do</strong> art. 98 <strong>do</strong> CDC: “A execução po<strong>de</strong>rá ser coletiva, sen<strong>do</strong><br />

promovida pelos legitima<strong>do</strong>s <strong>de</strong> que trata o art. 82, abrangen<strong>do</strong> vítimas cujas in<strong>de</strong>nizações já tiveram si<strong>do</strong> fixadas em sentença <strong>de</strong><br />

liquidação, sem prejuízo <strong>do</strong> ajuizamento <strong>de</strong> outras execuções”.<br />

Para corrente <strong>do</strong>utrinária consi<strong>de</strong>rável, a previsão <strong>do</strong> art. 97, caput, <strong>do</strong> CDC não atribui propriamente uma legitimação ativa<br />

para os legitima<strong>do</strong>s coletivos, mas tão somente autoriza que esses possam litigar em nome das vítimas <strong>do</strong> ato ilícito ou seus<br />

sucessores na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> seus direitos. Significa que, sen<strong>do</strong> a execução individual, a legitimida<strong>de</strong> será exclusiva das vítimas e <strong>de</strong><br />

seus sucessores, limitan<strong>do</strong>-se a participação <strong>do</strong>s legitima<strong>do</strong>s coletivos a uma representação processual <strong>de</strong>sses titulares <strong>do</strong> direito 337 .<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, as lições <strong>de</strong> Ada Pellegrini Grinover:<br />

“E quan<strong>do</strong> a liquidação e a execução forem ajuizadas pelos entes e pessoas enumera<strong>do</strong>s no art. 82? A situação é diferente da que<br />

ocorre com a legitimação extraordinária à ação con<strong>de</strong>natória <strong>do</strong> art. 91. Lá, os legitima<strong>do</strong>s agem no interesse alheio, mas em nome<br />

próprio, sen<strong>do</strong> in<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s os beneficiários da con<strong>de</strong>nação. Aqui, as pretensões à liquidação e execução da sentença serão<br />

necessariamente individualizadas: o caso surge como <strong>de</strong> representação, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> os entes e pessoas enumeradas no art. 82 agirem em<br />

nome das vítimas ou sucessores”338.<br />

O entendimento parece ser realmente o mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se a natureza da execução em favor das vítimas e seus<br />

sucessores. Fica claro nesse caso que, nas execuções, não mais se estará diante <strong>de</strong> um direito individual homogêneo, o que po<strong>de</strong>ria<br />

justificar a legitimida<strong>de</strong> ativa <strong>do</strong>s legitima<strong>do</strong>s coletivos previstos pelo art. 82 <strong>do</strong> CDC. <strong>Direito</strong> puramente individual <strong>de</strong>ve gerar<br />

uma legitimida<strong>de</strong> ordinária para seus titulares o <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rem em juízo, não haven<strong>do</strong> justificativa plausível nesse caso para uma<br />

legitimação extraordinária em favor <strong>do</strong>s legitima<strong>do</strong>s coletivos.<br />

Ocorre, entretanto, que o entendimento <strong>de</strong> que a presença <strong>do</strong>s legitima<strong>do</strong>s coletivos na execução individual da sentença<br />

proferida em violação a direito individual homogêneo se dá por meio da representação processual po<strong>de</strong> causar um embaraço a essa<br />

participação. Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> representação processual, o legitima<strong>do</strong> coletivo necessariamente <strong>de</strong>verá obter uma expressa<br />

autorização da vítima ou <strong>de</strong> seu sucessor para que ajuíze em seu nome a liquidação ou execução, o que, naturalmente, po<strong>de</strong>rá<br />

dificultar no caso concreto tal ajuizamento.<br />

Provavelmente pensan<strong>do</strong> nessas dificulda<strong>de</strong>s práticas, e consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a previsão contida no art. 8.º, III, da CF/1988, o<br />

Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, ao enfrentar o tema, havia pacifica<strong>do</strong> o entendimento <strong>de</strong> que os legitima<strong>do</strong>s coletivos têm legitimida<strong>de</strong><br />

no campo <strong>do</strong>s direitos individuais homogêneos tanto para a fase <strong>de</strong> conhecimento como para a fase <strong>de</strong> liquidação e execução da<br />

sentença. Enten<strong>de</strong>u-se que seria efetivamente caso <strong>de</strong> legitimação extraordinária, por meio da qual o legitima<strong>do</strong> coletivo liquida e<br />

executa a sentença em nome próprio na <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses da vítima <strong>do</strong> ato ilícito e seus sucessores:<br />

“Sindicato e Substituição Processual – 3<br />

Concluí<strong>do</strong> julgamento <strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> recursos extraordinários nos quais se discutia sobre o âmbito <strong>de</strong> incidência <strong>do</strong> inciso III <strong>do</strong><br />

art. 8º da CF/1988 (‘ao sindicato cabe a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões<br />

judiciais e administrativas;’) – v. Informativos 84, 88, 330 e 409. O Tribunal, por maioria, na linha da orientação fixada no MI<br />

347/SC (DJU 08.04.1994), no RE 202.063/PR (DJU 10.10.1997) e no AI 153.148 AgR/PR (DJU 17.11.1995), conheceu <strong>do</strong>s<br />

recursos e lhes <strong>de</strong>u provimento para reconhecer que o referi<strong>do</strong> dispositivo assegura ampla legitimida<strong>de</strong> ativa ad causam <strong>do</strong>s


sindicatos como substitutos processuais das categorias que representam na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> direitos e interesses coletivos ou individuais <strong>de</strong><br />

seus integrantes. Venci<strong>do</strong>s, em parte, os Ministros Nelson Jobim, Cezar Peluso, Eros Grau, Gilmar Men<strong>de</strong>s e Ellen Gracie, que<br />

conheciam <strong>do</strong>s recursos e lhes davam parcial provimento, para restringir a legitimação <strong>do</strong> sindicato como substituto processual às<br />

hipóteses em que atuasse na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> direitos e interesses coletivos e individuais homogêneos <strong>de</strong> origem comum da categoria, mas<br />

apenas nos processos <strong>de</strong> conhecimento, asseveran<strong>do</strong> que, para a liquidação e a execução da sentença prolatada nesses processos, a<br />

legitimação só seria possível mediante representação processual, com expressa autorização <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r” (RE 193.503/SP, RE<br />

193.579/SP, RE 208.983/SC, RE 210.029/RS. RE 211.874/RS, RE 213.111/SP, RE 214.668/ES – Tribunal Pleno – rel. orig. Min.<br />

Carlos Velloso – rel. p/o acórdão Min. Joaquim Barbosa – j. 12.06.2006).<br />

A partir <strong>do</strong> posicionamento <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça também passou a <strong>de</strong>cidir pela<br />

legitimação extraordinária, com a dispensa <strong>de</strong> autorização das vítimas ou sucessores para o ingresso da liquidação e execução.<br />

“Processual civil. Agravo regimental. Agravo <strong>de</strong> instrumento. Ação coletiva. Sindicatos. Legitimida<strong>de</strong>. Atuação. Substituição<br />

processual. 1. Os sindicatos, que atuam na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> substituto processual possuem legitimida<strong>de</strong> para atuar nas fases <strong>de</strong><br />

conhecimento, liquidação e execução <strong>de</strong> sentença proferida em ações versan<strong>do</strong> direitos individuais homogêneos, dispensan<strong>do</strong>,<br />

inclusive, prévia autorização <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res. Prece<strong>de</strong>ntes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento” (STJ – AgRg no Ag<br />

1.049.450/DF – Sexta Turma – Rel. Min. Vasco <strong>de</strong>lla Giustina – j. 21.06.2011 – DJe 01.07.2011)339.<br />

O importante nesses julga<strong>do</strong>s, entretanto, era constatação <strong>de</strong> que, embora se admita uma legitimação extraordinária <strong>do</strong>s<br />

legitima<strong>do</strong>s coletivos, a execução não será coletiva, como sugere o art. 98 <strong>do</strong> CDC. Haven<strong>do</strong> a <strong>de</strong>terminação e individualização <strong>do</strong>s<br />

direitos exequen<strong>do</strong>s, a execução será individual, não obstante o legitima<strong>do</strong> ativo seja coletivo 340 . Como lembra a melhor <strong>do</strong>utrina,<br />

“nesse caso, tem-se aí uma ação pseu<strong>do</strong>coletiva, formada pela soma das parcelas i<strong>de</strong>ntificadas <strong>de</strong> direitos individuais” 341 .<br />

Ocorre, entretanto, que, com a incorreta guinada jurispru<strong>de</strong>ncial a respeito da qualida<strong>de</strong> processual das associações no polo<br />

ativo das ações coletivas que versam sobre direito individual homogêneo 342 , <strong>de</strong>vidamente analisada no item 11.4.5.4.5., é <strong>de</strong> esperar<br />

que na execução individual da sentença coletiva o entendimento também passe a ser <strong>de</strong> que ao menos a associação atue como<br />

representante legal <strong>do</strong>s associa<strong>do</strong>s, e não como substituta processual, <strong>de</strong> forma que a autorização para a execução, por meio <strong>de</strong><br />

aprovação específica em assembleia geral ou individualmente, passará a ser indispensável.<br />

Já há, inclusive, prece<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça nesse senti<strong>do</strong> 343 , ainda que também exista <strong>de</strong>cisão em senti<strong>do</strong><br />

contrário 344 . O tema, portanto, continua polêmico, tanto que a Segunda Seção <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça afetou recurso<br />

especial ao julgamento repetitivo (tema 948) para pacificar o entendimento <strong>do</strong> tribunal a respeito <strong>do</strong> tema.<br />

11.9.5.<br />

Regime jurídico das <strong>de</strong>spesas e custas processuais<br />

As regras <strong>de</strong> sucumbência na fase <strong>de</strong> liquidação e execução da sentença coletiva são as mesmas aplicáveis às liquidações e<br />

execuções em geral. A única especialida<strong>de</strong> diz respeito à presença da Fazenda Pública como executada em razão <strong>do</strong> disposto no art.<br />

1 o -D da Lei 9.494/1997: “Não serão <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s honorários advocatícios pela Fazenda Pública nas execuções não embargadas”.<br />

Na análise da abrangência <strong>do</strong> dispositivo legal ora cita<strong>do</strong>, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça passou a enten<strong>de</strong>r que, diante <strong>de</strong> uma<br />

sentença coletiva, a aplicabilida<strong>de</strong> ou não da regra <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ria da natureza da liquidação e execução: caso fosse coletiva, aplicável a<br />

odiosa previsão legal, <strong>de</strong> forma que, não sen<strong>do</strong> embargada a execução, não seria cabível con<strong>de</strong>nar a Fazenda Pública ao pagamento<br />

<strong>de</strong> honorários advocatícios; caso fosse individual, a norma seria inaplicável em razão das singularida<strong>de</strong>s existentes nesse tipo <strong>de</strong><br />

execução:<br />

“Honorários advocatícios. Execução. Fazenda Pública. MP 2.180-35/2001. Trata-se <strong>de</strong> execução <strong>de</strong> título judicial proferi<strong>do</strong> em ação<br />

ordinária coletiva proposta por sindicato <strong>de</strong> servi<strong>do</strong>res fe<strong>de</strong>rais na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> substituto processual, com o objetivo <strong>de</strong><br />

reconhecimento <strong>de</strong> direito reivindica<strong>do</strong> por eles. Para a Min. Relatora, a ação coletiva ajuizada por sindicato como substituto<br />

processual <strong>de</strong>ve ter o mesmo tratamento dispensa<strong>do</strong> à ação civil pública ajuizada em <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> direitos individuais homogêneos,<br />

porque será necessária a execução individualizada pelos substituí<strong>do</strong>s, o que <strong>de</strong>mandará uma cognição exauriente e contraditório<br />

amplo sobre a existência <strong>do</strong> direito reconheci<strong>do</strong> naquela ação coletiva. Com esse entendimento, a Corte Especial, por unanimida<strong>de</strong>,<br />

<strong>de</strong>u provimento aos embargos <strong>de</strong> divergência para afastar a incidência da MP 2.180-35/2001 (que dispõe: não serão <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s<br />

honorários advocatícios pela Fazenda Pública nas execuções não embargadas) e, consequentemente, embora por outros<br />

fundamentos, manteve o acórdão recorri<strong>do</strong>, o qual fixou os honorários advocatícios em 10% <strong>do</strong> valor <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>. Observou-se, ainda,<br />

que não se aplica à hipótese a Súmula 315 <strong>do</strong> STJ, pois confrontou-se tese jurídica expressa no julgamento <strong>do</strong> REsp, examina<strong>do</strong><br />

duas vezes pelo primevo Min. Relator monocraticamente e pelo colegia<strong>do</strong>, com paradigmas colaciona<strong>do</strong>s pelo recorrente.<br />

Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: EDcl no AgRg no REsp 639.226/RS, DJ 12.09.2005, e AgRg no Ag 675.135/RS, DJ 29.08.2005” (STJ – EAG<br />

654.254/RS – Corte Especial – Rel. Min. Eliana Calmon – j. 19.12.2007 – Informativo 343).<br />

O entendimento, inclusive, encontra-se sumula<strong>do</strong> (Súmula 345 <strong>do</strong> STJ): “São <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s honorários advocatícios pela Fazenda


Pública nas execuções individuais <strong>de</strong> sentença proferida em ações coletivas, ainda que não embargadas”.<br />

Segun<strong>do</strong> a previsão <strong>do</strong> art. 85, § 7.º, <strong>do</strong> Novo CPC, não serão <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s honorários no cumprimento <strong>de</strong> sentença contra a<br />

Fazenda Pública que enseja expedição <strong>de</strong> precatório, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não tenha si<strong>do</strong> impugnada. O dispositivo legal confirma o<br />

entendimento <strong>do</strong>s tribunais superiores a respeito <strong>do</strong> tema, na interpretação <strong>do</strong> art. 1.º-D da Lei 9.494/1997, <strong>de</strong> que sen<strong>do</strong> hipótese<br />

<strong>de</strong> cumprimento <strong>de</strong> sentença por RPV (requisição <strong>de</strong> pequeno valor), ainda que a Fazenda Pública <strong>de</strong>ixe <strong>de</strong> impugnar, serão<br />

<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s honorários advocatícios345. Segun<strong>do</strong> o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, não serão <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>s honorários na hipótese <strong>de</strong> o<br />

cumprimento <strong>de</strong> sentença começar pelo sistema <strong>do</strong> precatório e o exequente renunciar ao exce<strong>de</strong>nte para a<strong>de</strong>quá-la ao sistema da<br />

RPV 346 .<br />

Essa nova realida<strong>de</strong> imposta pelo Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil não <strong>de</strong>ve alterar o entendimento sumula<strong>do</strong> quanto às<br />

execuções individuais <strong>de</strong> sentença coletiva, mas certamente afetará o entendimento consolida<strong>do</strong> na vigência <strong>do</strong> CPC/1973 a<br />

respeito da execução coletiva.<br />

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22<br />

ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo. São Paulo: RT, 2006. p. 40-41.<br />

ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo. São Paulo: RT, 2006. p. 40.<br />

LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. n. 4.10, p. 147.<br />

ARMELIN, Donal<strong>do</strong>. Tutela jurisdicional diferenciada. RePro, São Paulo, n. 65, jan.-mar. 1992, p. 45; CRUZ E TUCCI, José Rogério. Ação<br />

monitória. 2. ed. São Paulo: RT, 1997. p. 14-15; BEDAQUE, José Roberto <strong>do</strong>s Santos. <strong>Direito</strong> e processo. 2. ed. São Paulo: Malheiros,<br />

2001. p. 33.<br />

ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo. São Paulo: RT, 2006. p. 35.<br />

CINTRA, Antonio Carlos <strong>de</strong> Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Teoria geral <strong>do</strong> processo. 24. ed. São Paulo:<br />

Malheiros, 2008. p. 39-41.<br />

CÂMARA, Alexandre Freitas. Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis Estaduais e Fe<strong>de</strong>rais: uma abordagem crítica. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 3-<br />

5.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 35-39.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 33.<br />

GOMES JR., Luiz Manoel; FAVRETO, Rogério. Anotações sobre o projeto da nova lei da ação civil pública: análise histórica e as suas<br />

principais inovações. In: MOREIRA, Alberto Camina; ALVAREZ, Anselmo Pietro; BRUSCHI, Gilberto Gomes (Coords.). Panorama atual<br />

das tutelas individual e coletiva. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 530-531.<br />

STJ – REsp 1.106.515/MG – Primeira Turma – Rel. Min. Arnal<strong>do</strong> Esteves Lima – j. 16.12.2010 – DJe 02.02.2011 (julga<strong>do</strong> que também<br />

menciona o termo minissistema); STJ – AgRg no Ag 1.249.132/SP – Primeira Turma – Rel. Min. Luiz Fux – j. 24.08.2010 – DJe<br />

09.09.2010; STJ – REsp 1.117.453/SP – Segunda Turma – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – j. 24.08.2010 – DJe 30.09.2010.<br />

ANDRIGHI, Fátima Nancy. Reflexões acerca da representativida<strong>de</strong> a<strong>de</strong>quada nas ações coletivas passivas. Panorama atual das tutelas<br />

individual e coletiva. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 338; LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. n.<br />

4.10, p. 148.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 33-34.<br />

CARVALHO FILHO, José <strong>do</strong>s Santos. Ação civil pública. 7. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 479; DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR.,<br />

Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 53.<br />

NERY JR., Nelson. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense,<br />

2011. v. I, p. 221.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 53.<br />

ALMEIDA, Gregório Assagra <strong>de</strong>. <strong>Direito</strong> processual coletivo brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 547; GAJARDONI, Fernan<strong>do</strong> da Fonseca.<br />

Comentários à nova lei <strong>de</strong> Manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> Segurança. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. p. 112-113; KLIPPEL, Rodrigo; NEFFA JR., José.<br />

Comentários à Lei <strong>de</strong> Manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> Segurança. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 340-341.<br />

GAJARDONI, Fernan<strong>do</strong> da Fonseca. <strong>Direito</strong>s difusos e coletivos I. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 51.<br />

GOMES JR., Luiz Manoel; FAVRETO, Rogério. Anotações sobre o projeto da nova lei da ação civil pública: análise histórica e as suas<br />

principais inovações. In: MOREIRA, Alberto Camina; ALVAREZ, Anselmo Pietro; BRUSCHI, Gilberto Gomes (Coords.). Panorama atual<br />

das tutelas individual e coletiva. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 531.<br />

NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção <strong>Neves</strong>. Manual <strong>de</strong> processo coletivo. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2012, capítulo 5.<br />

MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Ação popular. 4. ed. São Paulo: RT, 2001. p. 52-54.<br />

STJ – REsp 818.725/SP – 1.ª Turma – rel. Min. Luiz Fux – j. 13.05.2008 – DJe 16.06.2008.


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NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Manual <strong>de</strong> processo coletivo. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2012, 5.10, p. 108-109.<br />

STJ – 4.ª Turma – REsp 823.063/PR – rel. Min. Raul Araújo – j. 14.02.2012 – DJe 22.02.2012; STJ – 1.ª Turma – AgRg no Ag 1.249.559/RJ –<br />

rel. Min. Arnal<strong>do</strong> Esteves Lima – j. 15.12.2011 – DJe 02.02.2012.<br />

WATANABE, Kazuo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. II,<br />

p. 70; ALMEIDA, Gregório Assagra <strong>de</strong>. <strong>Direito</strong> processual coletivo brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 487; RIZZATTO NUNES, Luiz<br />

Antonio. As ações coletivas e as <strong>de</strong>finições <strong>de</strong> direito difuso, coletivo e individual homogêneo. In: MAZZEI, Rodrigo; NOLASCO, Rita<br />

Dias (Coords.). Processo civil coletivo. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 443-444.<br />

VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Tutela jurisdicional coletiva. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1999. p. 60-61; MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s<br />

interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 62.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 92-93; CARVALHO FILHO,<br />

José <strong>do</strong>s Santos. Ação civil pública. 7. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 28.<br />

WATANABE, Kazuo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. II,<br />

p. 70.<br />

LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2008. n. 3.1, p. 79.<br />

CARVALHO FILHO, José <strong>do</strong>s Santos, Ação civil pública. 7. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 28; VENTURI, Elton. Processo civil<br />

coletivo. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 49; LENZA, Pedro, Teoria geral da ação civil pública. São Paulo: RT, 2003, p. 50.<br />

Cfr. Processo coletivo. São Paulo: RT, 2006. p. 42.<br />

Cfr. Ação civil pública. 7. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 151.<br />

ARRUDA ALVIM. Ação civil pública. Repro, n. 87, São Paulo, RT, jul.-set. 1997, p. 151; GIDI, Antônio. Coisa julgada e litispendência em ações<br />

coletivas. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 24.<br />

Cfr. A ação popular <strong>do</strong> direito brasileiro como instrumento <strong>de</strong> tutela jurisdicional <strong>do</strong>s chama<strong>do</strong>s interesses difusos. Temas <strong>de</strong> direito<br />

processual civil. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 112-113.<br />

Cfr. Ações coletivas e as <strong>de</strong>finições <strong>de</strong> direito difuso, coletivo e individual homogêneo. In: MAZZEI, Rodrigo; NOLASCO, Rita Dias<br />

(Coords.). Processo civil coletivo. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 87.<br />

ARRUDA ALVIM, Eduar<strong>do</strong>. Apontamentos sobre o processo das ações coletivas. In: MAZZEI, Rodrigo; NOLASCO, Rita Dias (Coords.).<br />

Processo civil coletivo. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 28; DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4.<br />

ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 74; WATANABE, Kazuo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong><br />

anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. p. 72; VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Tutela jurisdicional coletiva. 2. ed. São Paulo:<br />

Atlas, 1999. p. 71.<br />

WATANABE, Kazuo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. p. 72.<br />

BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Ação Civil Pública. Revista trimestral <strong>de</strong> direito público, São Paulo, Malheiros, n. 3, 1993, p. 24; MENDES,<br />

Aluisio Gonçalves <strong>de</strong> Castro. Ações coletivas no direito compara<strong>do</strong> e nacional. São Paulo: RT, 2002. p. 210-211.<br />

LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 106; ARRUDA ALVIM, Eduar<strong>do</strong>. Apontamentos sobre o<br />

processo das ações coletivas. In: MAZZEI, Rodrigo; NOLASCO, Rita Dias (Coords.). Processo civil coletivo. São Paulo: Quartier Latin, 2005.<br />

p. 30; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 725.<br />

Cfr. WATANABE, Kazuo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v.<br />

II, p. 73.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 75.<br />

WATANABE, Kazuo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. II,<br />

p. 75.<br />

Cfr. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. II, p. 76.<br />

Cfr. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 135.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 135-136. No<br />

mesmo senti<strong>do</strong> MENDES, Aluisio Gonçalves <strong>de</strong> Castro. Ações coletivas no direito compara<strong>do</strong> e nacional. São Paulo: RT, 2002. p. 221.<br />

ALMEIDA, Gregório Assagra <strong>de</strong>. Manual das ações constitucionais. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 492-49; MAZZILLI, Hugo Nigro. A<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 57; VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Tutela jurisdicional<br />

coletiva. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1999. p. 79.<br />

ARAÚJO FILHO, Luiz Paulo da Silva, apud DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r:<br />

JusPodivm, 2009. v. 4, p. 78. No mesmo senti<strong>do</strong> RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Ações coletivas e as <strong>de</strong>finições <strong>de</strong> direito difuso,<br />

coletivo e individual homogêneo. In: MAZZEI, Rodrigo; NOLASCO, Rita Dias (Coords.). Processo civil coletivo. São Paulo: Quartier Latin,<br />

2005. p. 91.<br />

Cfr. Processo <strong>de</strong> execução: parte geral. 3. ed. São Paulo: RT, 2004. p. 43.


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MENDES, Aluisio Gonçalves <strong>de</strong> Castro. Ações coletivas no direito compara<strong>do</strong> e nacional. São Paulo: RT, 2002. p. 221, fala em “número<br />

expressivo <strong>de</strong> pessoas” e “fenômenos típicos <strong>de</strong> massa”.<br />

VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Ações coletivas. Salva<strong>do</strong>r: Jus Podivm, 2007. p. 52.<br />

Cfr. Ação civil pública. In: DIDIER JR., Fredie (Org.). Ações constitucionais. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. p. 353-354.<br />

Informativo 491/STJ – 4.ª Turma – REsp 823.063/PR – rel. Min. Raul Araújo – j. 14.02.2012; STJ – 3.ª Turma – AgRg no REsp 710.337/SP –<br />

rel. Min. Sidnei Beneti – j. 15.12.2009 – DJe 18.12.2009.<br />

Cfr. Processo <strong>de</strong> execução: parte geral. 3. ed. São Paulo: RT, 2004. p. 42-43.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: RT, 2009. v. 4, p. 726; RODRIGUES,<br />

Marcelo Abelha. Ação civil pública. In: DIDIER JR., Fredie (Org.). Ações constitucionais. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. p. 353;<br />

ALMEIDA, Gregório Assagra <strong>de</strong>. Manual das ações constitucionais. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 492; VIGLIAR, José Marcelo<br />

Menezes. Tutela jurisdicional coletiva. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1999. 79; MENDES, Aluisio Gonçalves <strong>de</strong> Castro. Ações coletivas no direito<br />

compara<strong>do</strong> e nacional. São Paulo: RT, 2002. p. 220-221; MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São<br />

Paulo: Saraiva, 2002. p. 57; ZAVASCKI, Teori Albino. Processo <strong>de</strong> execução: parte geral. 3. ed. São Paulo: RT, 2004. p. 43.<br />

BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A proteção jurídica <strong>do</strong>s interesses coletivos. Temas <strong>de</strong> direito processual (terceira turma). São Paulo:<br />

Saraiva, 1984. p. 42-43.<br />

ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo – tutela <strong>de</strong> direitos coletivos e tutela coletiva <strong>de</strong> direitos. 4. ed. São Paulo: RT, 2009. p. 42-43.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 80-82.<br />

Processo coletivo. São Paulo: RT, 2006. p. 46.<br />

MENDES, Aluisio Gonçalves <strong>de</strong> Castro. Ações coletivas no direito compara<strong>do</strong> e nacional. São Paulo: RT, 2002. p. 218; MAZZILLI, Hugo<br />

Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 60; MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Interesses<br />

difusos. 5. ed. São Paulo: RT, 2000. p. 79.<br />

STJ – 1ª Turma – REsp 799.669/RJ – rel. Min. Luiz Fux – j. 02.10.2007 – DJ 18.02.2008, p. 25.<br />

MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 58.<br />

MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 59.<br />

STJ – 1.ª Turma – AgRg no REsp 1.086.805/RS – Rel. Min. Arnal<strong>do</strong> Esteves Lima – j. 02.08.2011 – DJe 15.09.2011; STJ – 2.ª Turma – AgRg<br />

no Ag 1.156.930/RJ – Rel. Min. Humberto Martins – j. 10.11.2009 – DJe 20.11.2009.<br />

STJ – 2.ª Turma – AgRg no REsp 1.045.750/RS – Rel. Min. Castro Meira – j. 23.06.2009 – DJe 04.08.2009; STJ – 1.ª Seção, EREsp 819.010/SP<br />

– Rel. Min. Eliana Calmon – Rel. p/acórdão Min. Teori Albino Zavascki – j. 13.02.2008 – DJe 29.09.2008.<br />

STJ – 3.ª Turma – REsp 976.021/MG – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 14.12.2010 – DJe 03.02.2011.<br />

STJ – 1.ª TurmavREsp 1.005.587/PR – Rel. Min. Luiz Fux– j. 02.12.2010 – DJe 14.12.2010; STJ – 1.ª Turma – AgRg no Ag 1.131.833/SP – Rel.<br />

Min. Teori Albino Zavascki – j. 18.08.2009 – DJe 26.08.2009.<br />

STJ – 1.ª Seção – REsp 931.513/RS – Rel. Min. Carlos Fernan<strong>do</strong> Mathias – Rel. p/acórdão Min. Herman Benjamin – j. 25.11.2009 – DJe<br />

27.09.2010.<br />

STJ – 2.ª Turma – AgRg no REsp 1.297.893/SE – Rel. Min. Castro Meira – j. 25.06.2013 – DJe 05.08.2013.<br />

STJ – 1.ª Seção – REsp 931.513/RS – Rel. Min. Carlos Fernan<strong>de</strong>s Mathias (<strong>de</strong>sembarga<strong>do</strong>r convoca<strong>do</strong> <strong>do</strong> RTF 1.ª Região) – Rel. p/acórdão<br />

Min. Herman Benjamin – j. 25.11.2009 – DJe 27.09.2010.<br />

STJ – 5.ª Turma – REsp 605.295/MG – Rel. Min. Laurita Vaz – j. 20.10.2009 – DJe 02.08.2010.<br />

CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1969. v. 2, p. 187.<br />

VICENZI, Brunela Vieira <strong>de</strong>. Competência funcional – distorções. Revista <strong>de</strong> Processo, n. 105, 2002, p. 280-281. MARQUES, José Fre<strong>de</strong>rico.<br />

Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. Campinas: Millennium, 2000. v. 2. p. 337, já havia critica<strong>do</strong> os autores que estendiam o conceito<br />

<strong>de</strong> competência funcional aos casos particulares <strong>de</strong> competência territorial improrrogável: “A improrrogabilida<strong>de</strong> ou não da<br />

competência é assunto da divisão da competência em absoluta e relativa, e nada tem a ver com a competência funcional. Impossível<br />

a mistura <strong>de</strong> coisas tão heterogêneas como a que fez Chiovenda”.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2005. v. 2, p. 530. Nesse senti<strong>do</strong> MAZZILLI,<br />

Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 212, lembran<strong>do</strong> que o ECA, art. 209, foi bem<br />

mais técnico ao se referir ao “foro <strong>do</strong> local on<strong>de</strong> ocorreu ou <strong>de</strong>va ocorrer a ação ou omissão, cujo juízo terá competência absoluta<br />

para processar a causa”.<br />

ALMEIDA, Gregório Assagra <strong>de</strong>. <strong>Direito</strong> processual coletivo brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 345-346; LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros.<br />

Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 216-217; MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Ação civil pública em <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> meio<br />

ambiente: a questão da competência jurisdicional. Ação civil pública. 2. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 61.<br />

MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Ação civil pública. 8. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 66.


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NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. n. 1.8.2, p. 32-33.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. 10. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 1.315; GRINOVER,<br />

Ada Pellegrini. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 777; MARQUES, Voltaire<br />

<strong>de</strong> Lima. Dos bens jurídicos tutela<strong>do</strong>s, da legitimação passiva e <strong>do</strong> foro competente na ação civil pública. In: MILARÉ, Édis (Coord.). Ação<br />

Civil Pública – 15 anos. São Paulo: RT, 2002. p. 851; LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p.<br />

219.<br />

Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 220.<br />

STF – RE 228.955/RS – Pleno – DJU 24.03.2000. Esse sempre foi o entendimento <strong>de</strong> MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos<br />

em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 223-224.<br />

Informativo 415/STJ: REsp 1.120.117/AC – Segunda Turma – Rel. Min. Eliana Calmon – j. 10.11.2009.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 808.<br />

STJ – 3.ª Turma – REsp 1.101.057/MT – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 07.04.2011 – DJe 15.04.2011; STJ – 2.ª Turma – REsp 1.120.117/AC –<br />

rel. Min. Eliana Calmon – j. 10.11.2009 – DJe 19.11.2009; STJ – 2.ª Turma – REsp 448.470/RS – rel. Min. Herman Benjamin – j.<br />

28.10.2008 – DJe 15.12.2009.<br />

STJ – 1.ª Seção – CC 97.351/SP – rel. Min. Castro Meira – j. 27.05.2009 – DJe 10.06.2009.<br />

Cf. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 779. Também ARAÚJO FILHO, Luiz<br />

Paulo da Silva. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – direito processual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 126.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, MENDES, Aluísio Gonçalves <strong>de</strong> Castro. Ações coletivas no direito compara<strong>do</strong> e nacional. São Paulo: RT, 2002. p. 237-238;<br />

MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 220-221.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 139.<br />

STJ – CC 97.351/SP – Primeira Seção – Rel. Min. Castro Meira – j. 27.05.2009 – DJ 10.06.2009.<br />

ASSIS, Araken <strong>de</strong>. Substituição processual. Revista Dialética <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Processual, São Paulo, v. 9, 2003, p. 9.<br />

THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. v. 1, n. 53, p. 68; CÂMARA, Alexandre<br />

Freitas. Lições <strong>de</strong> direito processual civil. 17. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. v. 1, p. 116; GRECO, Leonar<strong>do</strong>. A teoria da ação no<br />

processo civil. São Paulo: Dialética, 2003. n. 2.7, p. 41; PINHO, Humberto Dalla Bernardina <strong>de</strong>. Teoria geral <strong>do</strong> processo civil<br />

contemporâneo. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2007. n. 12.5.2, p. 127; FUX, Luiz. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro:<br />

Forense, 2004. p. 160.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria Andra<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. 10. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 178; BARBOSA<br />

MOREIRA, José Carlos. Notas sobre o problema da efetivida<strong>de</strong> <strong>do</strong> processo. Temas <strong>de</strong> direito processual civil. 3.ª série. São Paulo: Saraiva,<br />

1984. p. 33.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2005. v. 2, n. 548, p. 308; THEODORO JR.,<br />

Humberto. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. v. 1. n. 53, p. 68.<br />

ASSIS, Araken <strong>de</strong>. Substituição processual. Revista Dialética <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Processual. São Paulo, v. 9, 2003, p. 16-17; MARINONI, Luiz<br />

Guilherme; MITIDIERO, <strong>Daniel</strong> Francisco. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2010. p. 101.<br />

ASSIS, Araken <strong>de</strong>. Substituição processual. Revista Dialética <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Processual, São Paulo, v. 9, 2003, p. 16.<br />

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições <strong>de</strong> direito processual civil. 17. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. v. 1, p. 118.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria Andra<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. 10. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 178.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. 10. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 1.443; LEONEL,<br />

Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2008. 5.2.2, p. 153. Contra, pela legitimida<strong>de</strong> autônoma mesmo no<br />

direito individual homogêneo: ALMEIDA, Gregório Assagra <strong>de</strong>. <strong>Direito</strong> processual coletivo brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 499.<br />

MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 64-65; ZAVASCKI, Teori Albino.<br />

Processo coletivo. São Paulo: RT, 2006. p. 76.<br />

VENTURI, Elton. Processo civil coletivo. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 169.<br />

FERRARESI, Eurico. A pessoa física como legitimada ativa à ação coletiva. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; MENDES, Aluisio Gonçalves <strong>de</strong><br />

Castro; WATANABE, Kazuo (Coords.). <strong>Direito</strong> processual coletivo e o anteprojeto <strong>de</strong> Código Brasileiro <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>s Coletivos. São Paulo: RT,<br />

2007. p. 137-143.<br />

MENDES, Aluisio Gonçalves <strong>de</strong> Castro. Ações coletivas no direito compara<strong>do</strong> e nacional. São Paulo: RT, 2002. p. 256-257.<br />

GIDI, Antônio. Rumo a um Código <strong>de</strong> Processo Civil coletivo. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2006. p. 224-232.<br />

BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A proteção jurídica <strong>do</strong>s interesses coletivos. Temas <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Processual (Terceira Série). São Paulo:<br />

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Súmula 365/STF.<br />

STF – Pet 3.388/RR – Tribunal Pleno – rel. Min. Carlos Britto – j. 19.03.2009 – DJe 25.09.2009.<br />

MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnal<strong>do</strong>; MENDES, Gilmar Ferreira. Manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança e ações constitucionais. 33. ed. São Paulo:<br />

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ALMEIDA, Gregório Assagra <strong>de</strong>. Manual das ações constitucionais. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 359.<br />

STJ – REsp 818.725/SP – Primeira Turma – rel. Min. Luiz Fux – j. 13.05.2008 – DJe 16.06.2008.<br />

MOREIRA, José Carlos Barbosa. La iniciativa em la <strong>de</strong>fensa judicial <strong>de</strong> los intereses difusos y coletivos (un aspecto <strong>de</strong> la experiencia<br />

brasileña). Repro, São Paulo, RT, n. 68, 1992, p. 57; MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 21. ed. São Paulo:<br />

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STF – Tribunal Pleno – RE 511.961/SP – rel. Min. Gilmar Men<strong>de</strong>s – j. 17.06.2009 – DJe 13.11.2009; STJ – 2ª Turma – REsp 933.002/RJ – rel.<br />

Min. Castro Meira – j. 16.06.2009 – DJe 29.06.2009.<br />

RODRIGUES, Marcelo Abelha; KLIPPEL, Rodrigo. Comentários à tutela coletiva. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 37; COSTA, Susana<br />

Henrique da. Comentários à lei <strong>de</strong> ação civil pública e lei <strong>de</strong> ação popular. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 394-396.<br />

MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 109.<br />

MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 107.<br />

I421/STJ – REsp 910.192/MG – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 02.02.2010; STJ – REsp 637.332/PR – Primeira Turma – rel.<br />

Min. Luiz Fux – j. 24.11.2004 – DJ 13.12.2004. p. 242.<br />

ALMEIDA, Gregório Assagra <strong>de</strong>. <strong>Direito</strong> processual coletivo brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 514.<br />

CARVALHO FILHO, José <strong>do</strong>s Santos. Ação civil pública. 7. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 127.<br />

STF – RE 511.961/SP – Tribunal Pleno – Rel. Min. Gilmar Men<strong>de</strong>s – j. 17.06.2009 – DJe 13.11.2009; STJ – REsp 933.002/RJ – Segunda<br />

Turma – Rel. Min. Castro Meira – j. 16.06.2009 – DJe 29.06.2009.<br />

ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo. São Paulo: RT, 2006. p. 234-234-240; MENDES, Aluisio Gonçalves <strong>de</strong> Castro. Ações coletivas no<br />

direito compara<strong>do</strong> e nacional. São Paulo: RT, 2002. p. 247-248; LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT,<br />

2002. p. 190; ARRUDA ALVIM, Eduar<strong>do</strong>. O MP e a tutela <strong>do</strong>s interesses individuais homogêneos. In: SAMPAIO, Aurisval<strong>do</strong>; CHAVES,<br />

Cristiano (coords.). Estu<strong>do</strong>s <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r: tutela coletiva. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 257-259; ZANELLATO, Marco<br />

Antonio. Sobre a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses individuais homogêneos <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res pelo Ministério Público, In: SAMPAIO, Aurisval<strong>do</strong>;<br />

CHAVES, Cristiano (coords.). Estu<strong>do</strong>s <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r: tutela coletiva. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 398-403.<br />

STF – RE 514.023/AgR/RJ – Segunda Turma – Rel. Min. Ellen Gracie – j. 04.12.2009 – DJe 05.02.2010; STF – RE 472.489/AgR/RS – Rel. Min.<br />

Celso <strong>de</strong> Mello – j. 29.04.2008 – DJe 29.08.2008; STJ – AgRg no REsp 938.951/DF – Rel. Min. Humberto Martins – j. 23.02.2010 – DJe<br />

10.03.2010; STJ – AgRg no REsp 800.657/SP – Quarta Turma – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – j. 05.11.2009 – DJe 16.11.2009.<br />

CARVALHO FILHO, José <strong>do</strong>s Santos. Ação civil pública. 7. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 129-130.<br />

MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 108.<br />

MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Ação popular. 4. ed. São Paulo: RT, 2001. n. 6.3.3, p. 152.<br />

VENTURI, Elton. Processo civil coletivo. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 211.<br />

LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 164-165.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Ação rescisória contra <strong>de</strong>cisão interlocutória. A nova era <strong>do</strong> processo civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros,<br />

2007. p. 257; Vigliar, Ação, p. 83.<br />

Em senti<strong>do</strong> próximo, MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 309.<br />

CARVALHO FILHO, José <strong>do</strong>s Santos. Ação civil pública. 7. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 147.<br />

STJ – REsp 168.051/DF – 3ª Turma – Rel. Min. Antônio <strong>de</strong> Pádua Ribeiro – j. 19.05.2005 – DJ 20.06.2005, p. 263.<br />

RODRIGUES, Marcelo Abelha; KLIPPEL, Rodrigo. Comentários à tutela coletiva. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 41; ALMEIDA,<br />

Gregório Assagra <strong>de</strong>. Manual das ações constitucionais. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 123-124; DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Ação<br />

rescisória contra <strong>de</strong>cisão interlocutória. A nova era <strong>do</strong> processo civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 260-261. Aparentemente no<br />

senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto: STJ – REsp 879.840/SP – Primeira Turma – Rel. Min. Francisco Falcão – j. 03.06.2008 – DJe 26.06.2008. Contra:<br />

CARVALHO FILHO, José <strong>do</strong>s Santos. Ação civil pública. 7. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 149; STJ – REsp 236.499/PB –<br />

Primeira Turma – Rel. Min. Humberto Gomes <strong>de</strong> Barros – j. 13.04.2000 – DJ 05.06.2000, p. 125.<br />

STF – Tribunal Pleno – RE 573.232/SC – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Lewan<strong>do</strong>wski – Rel. p/acórdão Min. Marco Aurélio – j. 14.05.2014 – DJe<br />

19.09.2014.


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COSTA, Susana Henrique da. Comentários à lei <strong>de</strong> ação civil pública e lei <strong>de</strong> ação popular. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 407.<br />

SHIMURA, Sérgio Seiji. Tutela coletiva e sua efetivida<strong>de</strong>. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2006. p. 89.<br />

STJ – REsp 705.469/MS – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 16.06.2005, DJ 01.08.2005, p. 456.<br />

STJ, 3ª Turma, AgRg nos EDcl no REsp 1.384.891/SC, rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino, j. 05.05.2015, DJe 12.05.2015.<br />

WATANABE, Kazuo. <strong>Direito</strong> processual compara<strong>do</strong> – XIII World Congresso of Procedural Law. Org. Ada Pellegrini Grinover e Petrônio<br />

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GIDI, Antônio. A class action como instrumento <strong>de</strong> tutela coletiva <strong>do</strong>s direitos – as ações coletivas em uma perspectiva comparada. São<br />

Paulo: RT, 2007. p. 100.<br />

BUENO, Cassio Scarpinella. As class actions norte-americanas e as ações coletivas brasileiras: pontos para uma reflexão conjunta. Repro,<br />

n. 82, ano 21, abr.-jun. 1996, p. 131.<br />

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ANDRADE, Adriano; MASSON, Cleber; ANDRADE, Lan<strong>do</strong>lfo. Interesses difusos e coletivos esquematiza<strong>do</strong>. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2011. n.<br />

2.2.4, p. 47-48; VENTURI, Elton. Processo civil coletivo. São Paulo: Malheiros, 2007. n. 7.1.8, p. 219-227; NERY JR.; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong><br />

Andra<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> processo civil comenta<strong>do</strong>. 12 ed. São Paulo:RT, 2008, p. 1.144; RODRIGUES, Marcelo Abelha; KLIPPEL, Rodrigo.<br />

Comentários à tutela coletiva. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 35; ALMEIDA, Gregório Assagra <strong>de</strong>. <strong>Direito</strong> processual coletivo<br />

brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 519.<br />

STJ – 1.ª Turma – REsp 876.936/RJ – rel. Min. Luiz Fux – j. 21.10.2008 – DJe 13.11.2008.<br />

STJ, 1ª Turma, AgRg nos EDcl nos EDcl no REsp 1.150.424/SP, rel. Min. Olin<strong>do</strong> Menezes (Desembarga<strong>do</strong>r convoca<strong>do</strong> <strong>do</strong> TRF 1ª Região),<br />

j. 10/11/2015, DJe 24.11.2015; STJ, 1ª Turma, REsp 876.936/RJ, rel. Min. Luiz Fux, j. 21/10/2008, DJe 13.11.2008. GOMES JR., Luiz<br />

Manoel, Curso <strong>de</strong> direito processual coletivo. 2 ed. São Paulo: SRS, 2008, p. 145.<br />

GIDI, Antônio. A class action como instrumento <strong>de</strong> tutela coletiva <strong>do</strong>s direitos – as ações coletivas em uma perspectiva comparada. São<br />

Paulo: RT, 2007. p. 102.<br />

ANDRADE, Adriano; MASSON, Cleber; ANDRADE, Lan<strong>do</strong>lfo. Interesses difusos e coletivos esquematiza<strong>do</strong>. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2011. 2.2.4,<br />

p. 47-48; VENTURI, Elton. Processo civil coletivo. São Paulo: Malheiros, 2007. 7.1.8, p. 219-227; Nery-Nery, Código <strong>de</strong> processo civil<br />

comenta<strong>do</strong>. 12 ed. São Paulo: RT, 2008, p. 1.144; RODRIGUES, Marcelo Abelha; KLIPPEL, Rodrigo. Comentários à tutela coletiva. Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 35; ALMEIDA, Gregório Assagra <strong>de</strong>. <strong>Direito</strong> processual coletivo brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 519.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. Novas questões sobre a legitimação e a coisa julgada nas ações coletivas. O processo – estu<strong>do</strong>s e pareceres.<br />

São Paulo: DPJ, 2006. p. 213-214; GIDI, Antônio. Class actions, p. 3.5.10, p. 129-135; COSTA, Susana Henrique da. Comentários à lei <strong>de</strong><br />

ação civil pública e lei <strong>de</strong> ação popular. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 390-391; DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong><br />

direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 5, p. 209; LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>de</strong> processo coletivo. São<br />

Paulo: RT, 2008. 5.2.6, p. 173.<br />

STJ, 4ª Turma, REsp 1.213.614/RJ, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 01.10.2015, DJe 26.10.2015; STJ, 4ª Turma, REsp 1.405.697/MG, rel.<br />

Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 17.09.2015, DJe 08.10.2015. GOMES JR., Luiz Manoel. Curso <strong>de</strong> direito processual coletivo. 2. ed. São<br />

Paulo: SRS, 2008. p. 145.<br />

GIDI, Antônio. A class action como instrumento <strong>de</strong> tutela coletiva <strong>do</strong>s direitos – as ações coletivas em uma perspectiva comparada. São<br />

Paulo: RT, 2007. p. 102; BUENO, Cassio Scarpinella. As class actions norte-americanas e as ações coletivas brasileiras: pontos para uma<br />

reflexão conjunta. Repro, n. 82, ano 21, abr.-jun. 1996, p. 134.<br />

BUENO, Cassio Scarpinella. As class actions norte-americanas e as ações coletivas brasileiras: pontos para uma reflexão conjunta. Repro,<br />

n. 82, ano 21, abr.-jun. 1996, p. 131-136.<br />

STF – Tribunal Pleno – RE 573.232/SC – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Lewan<strong>do</strong>wski – rel. p/acórdão Min. Marco Aurélio – j. 14.05.2014 – DJe<br />

19.09.2014.<br />

A confusão <strong>do</strong> voto <strong>do</strong> relator foi bem notada no voto vista <strong>do</strong> Ministro Joaquim Barbosa.<br />

STJ – 2.ª Turma – AgRg no REsp 1.546.659/RS – Rel. Min. Humberto Martins – j. 27.10.2015 – DJe 13.11.2015; STJ – 3.ª Turma – REsp<br />

1.405.697/MG – Rel. Min. – j. 17.09.2015 – DJe 08.10.2015.<br />

STJ – 1.ª Turma – AgRg no REsp 1.382.949/SC – Rel. Min. Benedito Gonçalves – j. 16.04.2015 – DJe 24.04.2015.<br />

Essa realida<strong>de</strong> fica clara no voto vista <strong>do</strong> Ministro Teori Albino Zavascki.<br />

STJ – 2.ª Turma – AgRg no AREsp 664.713/RJ – Rel. Min. Herman Benjamin – j. 01.12.2015 – DJe 04.02.2016; STJ – 5.ª Turma – REsp<br />

1.129.023/SC – Rel. Min. Felix Fischer – j. 16.02.2016 – DJe 23.02.2016; STJ – 6.ª Turma – EDcl no AgRg no REsp 1.185.789/GO – Rel.<br />

Min. Sebastião Reis Júnior – j. 03.12.2015 – DJe 01.02.2016.<br />

STJ – 2.ª Turma – AgRg no REsp 1.423.791/BA – Rel. Min. Og Fernan<strong>de</strong>s – j. 17.03.2015 – DJe 26.03.2015.


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STJ – 2.ª Seção – REsp 1.084.640/SP – Rel. Min. Marco Buzzi – j. 23.09.2015 – DJe 29.09.2015; STJ – 4.ª Turma – REsp 1.166.054/RN – Rel.<br />

Min. Luis Felipe Salomão – j. 28.04.2015 – DJe 18.06.2015; STJ – 4.ª Turma – REsp 1.374.678/RJ – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j.<br />

23.06.2015, DJe 04.08.2015.<br />

PEREIRA, Marival<strong>do</strong> <strong>de</strong> Castro; BOTTINI, Pierpaolo Cruz. A Defensoria Pública perante a tutela <strong>do</strong>s interesses transindividuais: atuação<br />

como parte legitimada ou como assistente judicial. In: SOUSA, José Augusto Garcia <strong>de</strong> (Coord.). A <strong>de</strong>fensoria pública e os processos<br />

coletivos – comemoran<strong>do</strong> a Lei Fe<strong>de</strong>ral 11.448, <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2007. 2. tir. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 266-273.<br />

STJ – 4.ª Turma – AgRg no REsp 1.000.421/SC – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – j. 24.05.2011 – DJe 01.06.2011; STJ – 3.ª Turma –<br />

AgRg no AgRg no Ag 656.360/RJ – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 15.03.2011 – DJe 24.03.2011; STJ, 3.ª Turma – REsp<br />

555.111/RJ – Rel. Min. Castro Filho – j. 05.09.2006 – DJ 18.12.2006, p. 363.<br />

STJ – 1.ª Turma – EDcl no REsp 734.176/RJ – Rel. Min. Francisco Falcão – j. 17.08.2006 – DJ 28.09.2006, p. 203; STJ – 2.ª Turma – AgRg no<br />

Ag 500.644/MS – Rel. Min. Francisco Peçanha Martins – j. 01.03.2005 – DJ 18.04.2005.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. p. 217; LIMA, Fre<strong>de</strong>rico Viana<br />

<strong>de</strong>. Defensoria pública. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2010. n. 7.3.3.1.2, p. 229.<br />

SOUSA, José Augusto Garcia <strong>de</strong>. A nova Lei 11.448/2007, os escopos extrajurídicos <strong>do</strong> processo e a velha legitimida<strong>de</strong> da Defensoria<br />

Pública para as ações coletivas. In: SOUSA, José Augusto Garcia <strong>de</strong> (Coord.). A <strong>de</strong>fensoria pública e os processos coletivos –<br />

comemoran<strong>do</strong> a Lei Fe<strong>de</strong>ral 11.448, <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2007. 2. tir. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 235-236.<br />

STJ – 1.ª Turma – REsp 912.849-RS – Rel. Min. José Delga<strong>do</strong> – j. 26.02.2008 – DJe 28.04.2008.<br />

STF – Tribunal Pleno – ADI 3.943/DF – Rel. Min. Cármen Lúcia – j. 07.05.2015 – DJe 06.08.2015.<br />

PEREIRA, Marival<strong>do</strong> <strong>de</strong> Castro; BOTTINI, Pierpaolo Cruz. A Defensoria Pública perante a tutela <strong>do</strong>s interesses transindividuais: atuação<br />

como parte legitimada ou como assistente judicial. In: SOUSA, José Augusto Garcia <strong>de</strong> (Coord.). A <strong>de</strong>fensoria pública e os processos<br />

coletivos – comemoran<strong>do</strong> a Lei Fe<strong>de</strong>ral 11.448, <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2007. 2. tir. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 266.<br />

ORDACGY, André da Silva. Primeiras impressões sobre a Lei 11.448/2007 e a atuação da Defensoria Pública da União na tutela coletiva.<br />

In: SOUSA, José Augusto Garcia <strong>de</strong> (Coord.). A <strong>de</strong>fensoria pública e os processos coletivos – comemoran<strong>do</strong> a Lei Fe<strong>de</strong>ral 11.448, <strong>de</strong> 15<br />

<strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2007. 2. tir. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 93.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, CARVALHO FILHO, José <strong>do</strong>s Santos. Ação civil pública. 7. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 157.<br />

CARVALHO FILHO, José <strong>do</strong>s Santos. Ação civil pública. 7. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 157, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a impossibilida<strong>de</strong>.<br />

Contra, no senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto, FERRARESI, Eurico. Ação popular, ação civil pública e manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança coletivo – instrumentos<br />

processuais coletivos. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2009. p. 208.<br />

STJ – 1.ª Turma – REsp 912.849/RS – Rel. Min. José Delga<strong>do</strong> – j. 26.02.2008 – DJe 28.04.2008.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. p. 218<br />

STJ – 4.ª Turma – REsp 1.192.577/RS – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 15.05.2014 – DJe 15.08.2014.<br />

MORAES Humberto Peña <strong>de</strong>; SILVA, José Fontenelle Teixeira da. Assistência judiciária: sua gênese, sua história e a função protetiva <strong>do</strong><br />

Esta<strong>do</strong>. 2. ed. rev. e ampl. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Liber Juris Ltda., 1984. p. 156; ORDACGY, André da Silva. Primeiras impressões sobre a Lei<br />

11.448/2007 e a atuação da Defensoria Pública da União na tutela coletiva. In: SOUSA, José Augusto Garcia <strong>de</strong> (Coord.). A <strong>de</strong>fensoria<br />

pública e os processos coletivos – comemoran<strong>do</strong> a Lei Fe<strong>de</strong>ral 11.448, <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2007. 2. tir. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris,<br />

2008. p. 230-231.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. Novas tendências <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Processual. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 1990. p. 246.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. Novas tendências <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Processual. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 1990. p. 245; BRITTO, Adriana. A evolução da<br />

Defensoria Pública em direção à tutela coletiva. In: SOUSA, José Augusto Garcia <strong>de</strong> (Coord.). A <strong>de</strong>fensoria pública e os processos<br />

coletivos – comemoran<strong>do</strong> a Lei Fe<strong>de</strong>ral 11.448, <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2007. 2. tir. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 18; LIMA,<br />

Fre<strong>de</strong>rico Viana <strong>de</strong>. Defensoria pública. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2010. n. 7.3.3.3.1, p. 234.<br />

WAMBIER; Luiz Rodrigues; WAMBIER; Teresa Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. Breves comentários à nova sistemática<br />

processual civil 3. São Paulo: RT, 2007. p. 312-313; CARVALHO FILHO, José <strong>do</strong>s Santos. Ação civil pública. 7. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen<br />

Juris, 2009. p. 156-157; PEREIRA, Marival<strong>do</strong> <strong>de</strong> Castro; BOTTINI, Pierpaolo Cruz. A Defensoria Pública perante a tutela <strong>do</strong>s interesses<br />

transindividuais: atuação como parte legitimada ou como assistente judicial. In: SOUSA, José Augusto Garcia <strong>de</strong> (Coord.). A<br />

<strong>de</strong>fensoria pública e os processos coletivos – comemoran<strong>do</strong> a Lei Fe<strong>de</strong>ral 11.448, <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2007. 2. tir. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen<br />

Juris, 2008. p. 273-278.<br />

PINHO, Humberto Dalla Bernardina <strong>de</strong>. A legitimida<strong>de</strong> da Defensoria Pública para a propositura <strong>de</strong> ações civis públicas: primeiras<br />

impressões e questões controvertidas. In: SOUSA, José Augusto Garcia <strong>de</strong> (Coord.). A <strong>de</strong>fensoria pública e os processos coletivos –<br />

comemoran<strong>do</strong> a Lei Fe<strong>de</strong>ral 11.448, <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2007. 2. tir. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 185.<br />

STJ – 4.ª Turma – REsp 1.192.577/RS – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 15.05.2014 – DJe 15.08.2014.<br />

STJ – 2.ª Turma – REsp 1.264.116/RS – Rel. Min. Herman Benjamin – j. 18.10.2011 – DJe 13.04.2012. Com o mesmo entendimento<br />

amplo: STJ – 1ª Turma – REsp 912.849/RS – Rel. Min. José Delga<strong>do</strong> – j. 26.02.2008 – DJe 28.04.2008.


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DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. p. 219; ORDACGY, André da<br />

Silva. Primeiras impressões sobre a Lei 11.448/2007 e a atuação da Defensoria Pública da União na tutela coletiva. In: SOUSA, José<br />

Augusto Garcia <strong>de</strong> (Coord.). A <strong>de</strong>fensoria pública e os processos coletivos – comemoran<strong>do</strong> a Lei Fe<strong>de</strong>ral 11.448, <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong><br />

2007. 2. tir. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 96-97, Séguin, Defensoria, p. 157.<br />

LIMA, Fre<strong>de</strong>rico Viana <strong>de</strong>. Defensoria pública. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2010. n. 7.3.3.1.2, p. 245-246.<br />

CÂMARA, Alexandre Freitas, Legitimida<strong>de</strong> da Defensoria Pública para ajuizar ação civil pública: um possível primeiro pequeno passo<br />

em direção a uma gran<strong>de</strong> reforma. In: SOUSA, José Augusto Garcia <strong>de</strong> (Coord.). A <strong>de</strong>fensoria pública e os processos coletivos –<br />

comemoran<strong>do</strong> a Lei Fe<strong>de</strong>ral 11.448, <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2007. 2. tir. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 49.<br />

NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção <strong>de</strong>. Manual <strong>de</strong> processo coletivo. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2014. p. 285-286.<br />

NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção <strong>de</strong>. Manual <strong>de</strong> processo coletivo. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2014. p. 277-278.<br />

Cf. Primeiras linhas <strong>de</strong> direito processual civil. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 1, p. 259. No mesmo senti<strong>do</strong> as lições <strong>de</strong> OLIVEIRA,<br />

Wal<strong>de</strong>mar Mariz <strong>de</strong>. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 1971. v. I, p. 182-183.<br />

THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. v. 1. p. 169; NERY JR., Nelson; NERY,<br />

Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 503-504; PIZZOL, Patrícia Miranda. A competência no<br />

processo civil. São Paulo: RT, 2003. p. 293.<br />

Informativo 480/STJ – 4.ª Turma – REsp 967.815/MG – rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – j. 04.08.2011.<br />

Informativo 466/STJ – 3.ª Turma – REsp 1.226.016/RJ – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 15.03.2011.<br />

STJ – 2.ª Turma – REsp 754.941/RS – rel. Min. Eliana Calmon – j. 12.06.2007 – DJ 29.06.2007 – p. 537.<br />

Informativo 559/STJ – 4ª Turma – REsp 1.221.941-RJ – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 24.02.2015, DJe 14.04.2015.<br />

BUENO, Cássio Scarpinella. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 115.<br />

STJ – 1.ª Seção – CC 55.584/SC – rel. Min. Luiz Fux – j. 12.08.2009 – DJe 05.10.2009.<br />

ARRUDA ALVIM. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. 8. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 398-399; PIZZOL, Patrícia Miranda. A competência no<br />

processo civil. São Paulo: RT, 2003. p. 297; SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas <strong>de</strong> direito processual civil. 23. ed. São Paulo:<br />

Saraiva, 2004. v. 1. p. 258.<br />

FUX, Luiz. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2004. p. 210. Também: THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong><br />

direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. v. 1. p. 170; SANTOS, Ernane Fidélis <strong>do</strong>s. Manual <strong>de</strong> direito processual civil.<br />

10. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 1. p. 165.<br />

NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código Civil anota<strong>do</strong>. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 505; BARBI, Celso Agrícola.<br />

Comentários ao Código <strong>de</strong> Processo Civil. 11. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2002. v. 1. p. 350; BERMUDES, Sérgio. Introdução ao processo<br />

civil. 3. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2002. p. 73.<br />

ARRUDA ALVIM. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. 8. ed. São Paulo: RT, 2003. v. I. p. 404; GRECO FILHO, Vicente. <strong>Direito</strong> processual civil<br />

brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 161.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2005. v. 2. p. 578-579.<br />

Súmula 235 <strong>do</strong> STJ.<br />

STJ – 4.ª Turma – REsp 1.278.217/MG – rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 16.02.2012 – DJe 13.03.2012; STJ – 3.ª Turma – REsp<br />

1.226.016/RJ – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 15.03.2011 – DJe 25.03.2011.<br />

Súmula 515/STJ.<br />

Informativo 504/STJ – CC 119.090/MG – rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 12.09.2012.<br />

Informativo 496/STJ – 2.ª Seção – AgRg no CC 112.956/MS – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 25.04.2012.<br />

CC 78.058/RJ – Conflito <strong>de</strong> Competência 2007/0013713-0 – 1.ª Seção – rel. Min. Herman Benjamin (1132) – j. 24.11.2010 – DJe<br />

01.02.2011; CC 90.722/BA – Conflito <strong>de</strong> Competência 2007/0244194-7 – 1.ª Seção – rel. Min. José Delga<strong>do</strong> (1105) – rel. p/Acórdão<br />

Min. Teori Albino Zavascki (1124) – j. 25.06.2008 – DJe 12.08.2008.<br />

CC 111.727/SP – Conflito <strong>de</strong> Competência 2010/0073662-0 – 2.ª Seção – rel. Min. Raul Araújo (1143) – j. 25.08.2010 – DJe 17.09.2010;<br />

CC 53.435/RJ – Conflito <strong>de</strong> Competência 2005/0136633-6 – 2.ª Seção, rel. Min. Castro Filho (1119) – j. 08.11.2006 – DJ 29.06.2007 – p.<br />

481.<br />

Informativo 478/STJ – REsp 1.126.639/SE – rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 21.06.2011.<br />

STJ – 6.ª Turma – REsp 42.197/SP – rel. Min. Hamilton Carvalhi<strong>do</strong> – DJ 04.02.2002 – p. 575.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, ARRUDA ALVIM. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. 8. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 404; PIZZOL, Patrícia Miranda. A<br />

competência no processo civil. São Paulo: RT, 2003. p. 306.<br />

ZAVASCKI, Teori Albino. Processo <strong>de</strong> execução: parte geral. 3. ed. São Paulo: RT, 2004. p. 191; MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s<br />

interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 253.


206<br />

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229<br />

230<br />

Cfr. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 253.<br />

LUCON, Paulo Henrique <strong>do</strong>s Santos; GABBAY, <strong>Daniel</strong>a Monteiro; ALVES, Rafael Francisco; ANDRADE, Tathyana Chaves <strong>de</strong>. Interpretação<br />

<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> e da causa <strong>de</strong> pedir nas <strong>de</strong>mandas coletivas (conexão, continência e litispendência). Tutela coletiva: 20 anos da Lei da Ação<br />

Civil Pública e <strong>do</strong> Fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> Defesa <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>s Difusos. 15 anos <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Coord. Paulo Henrique <strong>do</strong>s<br />

Santos Lucon. São Paulo: Atlas, 2006. p. 196.<br />

VENTURI, Elton. Processo civil coletivo. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 361.<br />

VENTURI, Elton. Processo civil coletivo. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 362.<br />

ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo. São Paulo: RT, 2006, p. 191.<br />

STJ – 4ª Turma – AgRg no Ag 1.144.374/RS – rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – j. 14.04.2011 – DJe 03.05.2011; STJ – 2ª Seção – REsp<br />

1.189.679/RS – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 24.11.2010 – DJe 17.12.2010.<br />

REDONDO, Bruno Garcia; OLIVEIRA, Guilherme Peres <strong>de</strong>; CRAMER, Ronal<strong>do</strong>, Manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009, p. 155.<br />

MEDINA; José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas <strong>de</strong>. Manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança individual e coletivo. São Paulo: RT, 2009. n. 22.2, p. 221;<br />

GAJARDONI, Fernan<strong>do</strong> da Fonseca. Comentários à nova Lei <strong>de</strong> Manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> Segurança. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. p. 114.<br />

BOTELHO DE MESQUITA, José Ignácio. Na ação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> ser inútil a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> fornece<strong>do</strong>r. Revista <strong>do</strong> Advoga<strong>do</strong>, São Paulo,<br />

AASP, n. 33, 1990. p. 81 e ss.; CRUZ E TUCCI, José Rogério. Devi<strong>do</strong> processo legal e tutela jurisdicional. São Paulo: RT, 1993. p. 120-121;<br />

CASTRO MENDES, Aluisio Gonçalves. Ações coletivas no direito compara<strong>do</strong> e nacional. São Paulo: RT, 2003. p. 263-264.<br />

MARCATO, Ana Cândida Menezes. O princípio <strong>do</strong> contraditório como elemento essencial para a formação da coisa julgada material na<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses transindividuais. In: MAZZEI, Rodrigo; NOLASCO, Rita Dias (coord.). Processo coletivo. São Paulo: Quartier Latin, 2005.<br />

p. 317; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 781.<br />

VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Ação civil pública. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 117; NERY JR. Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>.<br />

Código <strong>de</strong> processo civil comenta<strong>do</strong>. 10. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 1.348; MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo Camargo. Ação civil pública. 8. ed. São<br />

Paulo: RT, 2002. p. 276.<br />

BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A ação popular <strong>do</strong> direito brasileiro como instrumento <strong>de</strong> tutela jurisdicional <strong>do</strong>s chama<strong>do</strong>s<br />

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coletiva. São Paulo: RT, 2003. p. 412.<br />

LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 273-274; MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses<br />

difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 427; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso <strong>de</strong> direito<br />

processual civil. São Paulo: RT, 2009. v. 4. NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> processo civil comenta<strong>do</strong>. 10 ed.<br />

São Paulo: RT, 2008. p. 1.347-1.348.<br />

GIDI, Antônio. Coisa julgada e litispendência em ações coletivas. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 135-136, RODRIGUES, Marcelo Abelha. Ação<br />

civil pública. In: DIDIER JR., Fredie (Org.). Ações constitucionais. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. p. 329.<br />

SILVA, José Afonso da. Ação popular. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 273; MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Ação civil pública. 8. ed.<br />

São Paulo: RT, 2002. p. 284; ARRUDA ALVIM, Notas sobre algumas das mutações verificadas com a Lei 10.352/2001. In: NERY JR.,<br />

Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais <strong>do</strong>s recursos e outros meios <strong>de</strong> impugnação às <strong>de</strong>cisões<br />

judiciais. São Paulo: RT, 2002. v. 6. p. 37; ALMEIDA, Gregório Assagra <strong>de</strong>. <strong>Direito</strong> processual coletivo brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003.<br />

p. 377-378.<br />

GIDI, Antônio. Coisa julgada e litispendência em ações coletivas. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 131-138; GRINOVER, Ada Pellegrini. Novas<br />

tendências <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Processual. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 1990. p. 222-224; LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo.<br />

São Paulo: RT, 2002. p. 274.<br />

RODRIGUES, Marcelo Abelha. Ação civil pública. In: DIDIER JR., Fredie (Org.). Ações constitucionais. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. p.<br />

327; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 781-782.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 781-782. p. 747;<br />

THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. v. 1. n. 1.688, p. 547.<br />

GIDI, Antônio. Rumo a um Código <strong>de</strong> Processo Coletivo. Ações coletivas no Brasil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2008, p. 289-290.<br />

THEODORO JR., Humberto. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 47. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. v. 1. n. 1.688, p. 547; MARINONI, Luiz<br />

Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 747.<br />

Informativo 585/STJ – 1.ª Turma – REsp 1.593.142/DF – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – j. 07.06.2016 – DJe 21.06.2016.<br />

MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 563; VENTURI, Elton. Processo civil<br />

coletivo. São Paulo: Malheiros, 2007. n. 11.4.4, p. 403.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. A ação civil pública refém <strong>do</strong> autoritarismo. O processo – estu<strong>do</strong>s & pareceres. São Paulo: DPJ, 2006. p. 241;<br />

LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 283.<br />

Cfr. A ação civil pública refém <strong>do</strong> autoritarismo. O processo – estu<strong>do</strong>s & pareceres. São Paulo: DPJ, 2006. p. 241.


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MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 291.<br />

LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 284; DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong><br />

direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 148.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 147-148.<br />

Cfr. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 748. No mesmo senti<strong>do</strong> ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo. São<br />

Paulo: RT, 2006. p. 78-79.<br />

Cfr. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 749.<br />

LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 284; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio<br />

Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 749; MENDES, Aluisio Gonçalves <strong>de</strong> Castro. Ações coletivas no<br />

direito compara<strong>do</strong> e nacional. São Paulo: RT, 2002. p. 265.<br />

MENDES, Aluisio Gonçalves <strong>de</strong> Castro. Ações coletivas no direito compara<strong>do</strong> e nacional. São Paulo: RT, 2002. p. 264.<br />

Cfr. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 293.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 748.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. A ação civil pública refém <strong>do</strong> autoritarismo. O processo – estu<strong>do</strong>s & pareceres. São Paulo: DPJ, 2006. p. 242.<br />

Com a mesma conclusão, mas por razões diversas, ZAVASCKI, Teori Albino. Processo <strong>de</strong> execução: parte geral. 3. ed. São Paulo: RT,<br />

2004. p. 79-80.<br />

STJ – EDcl no REsp 167.328/SP – Terceira Turma – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 01.03.2011 – DJe 16.03.2011; STJ – REsp<br />

600.711/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 18.11.2010 – DJe 24.11.2010.<br />

STJ – Corte Especial – REsp 1.243.887/PR – rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 19.10.2011 – DJe 12.12.2011.<br />

STJ – 3ª Seção – CC 109.435/PR – rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – j. 22.09.2010 – DJe 15.12.2010.<br />

AgRg no REsp 767965/PR – 6.ª Turma – Rel. Min. Nefi Cor<strong>de</strong>iro – j. 15.09.2015 – DJe 01.10.2015; REsp 1350169/SC – 1.ª Turma – Rel. Min.<br />

Marga Tessler (Juíza Fe<strong>de</strong>ral Convocada <strong>do</strong> TRF 4.ª Região) – Rel. p/Acórdão Min. Benedito Gonçalves – j. 05.02.2015 – DJe<br />

06.08.2015; STJ – 3.ª Turma – REsp 1.304.953/RS – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 26.08.2014 – DJe 08.09.2014.<br />

AgInt nos EDcl no AgRg no REsp 1431200 – 2.ª Turma – Rel. Min. Herman Benjamin – j. 13.09.2016 – DJe 07.10.2016; STJ – 2.ª Turma –<br />

AgRg no REsp 1.380.787/SC – rel. Min. Og Fernan<strong>de</strong>s – j. 19.08.2014 – DJe 02.09.2014; STJ – 2ª Seção – REsp 1.391.198/RS – rel. Min.<br />

Luis Felipe Salomão – j. 13.08.2014 – DJe 02.09.2014.<br />

A ação civil pública refém <strong>do</strong> autoritarismo. O processo – estu<strong>do</strong>s & pareceres. São Paulo: DPJ, 2006. p. 334; ANDRADE, Adriano;<br />

MASSON, Cleber; ANDRADE, Lan<strong>do</strong>lfo. Interesses difusos e coletivos esquematiza<strong>do</strong>. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2011. p. 247.<br />

STJ – AgRg no REsp 1.096.146/RJ – Segunda Turma – Rel. Min. Herman Benjamin – j. 19.02.2009 – DJe 19.03.2009.<br />

MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 620.<br />

MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 621.<br />

STJ – REsp 781.446/RN – Terceira Turma – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 03.04.2008 – DJe 15.04.2008; AgRg no REsp 1042919/SP –<br />

Segunda Turma – Rel. Min. Humberto Martins – j. 05.03.2009 – DJe 31.03.2009.<br />

STJ – REsp 891.743/SP – Segunda Turma – Rel. Min. Eliana Calmon – j. 13.10.2009 – Informativo 411.<br />

No mesmo senti<strong>do</strong>: STJ – REsp 733.456/SP – Primeira Turma – Rel. Min. Luiz Fux – j. 20.09.2007 – DJ 22.10.2007.<br />

REsp 935.470/MG – Segunda Turma – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – j. 24.08.2010 – DJe 30.09.2010.<br />

STJ – RMS 30.812/SP – Segunda Turma – Rel. Min. Eliana Calmon – j. 04.03.2010 – DJe 18.03.2010.<br />

MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Ação civil pública. 8. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 362.<br />

MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Ação civil pública. 8. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 365-366; ARAÚJO FILHO, Luiz Paulo da Silva.<br />

Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – direito processual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 105.<br />

MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 622.<br />

WATANABE, Kazuo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. II,<br />

p. 122; NERY JR., Nelson. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense,<br />

2011. v. I, p. 259; DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 335;<br />

ANDRADE, Adriano; MASSON, Cleber; ANDRADE, Lan<strong>do</strong>lfo. Interesses difusos e coletivos esquematiza<strong>do</strong>. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2011. p.<br />

247; ARAÚJO FILHO, Luiz Paulo da Silva. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – direito processual. São Paulo: Saraiva, 2002.<br />

p. 102.<br />

MAZZILLI, Hugo Nigro. A <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s interesses difusos em juízo. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 627.<br />

ASSIS, Araken <strong>de</strong>. Manual <strong>do</strong>s recursos. 2. ed. São Paulo: RT, 2008. n. 52.1.2, p. 271; MAZZEI, Rodrigo Reis. Reforma <strong>do</strong> CPC. São Paulo: RT,<br />

2007. p. 155-158.


261<br />

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282<br />

283<br />

284<br />

285<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001. v. 4, n. 1.745, p. 634-635.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 615; THEODORO JR., Humberto.<br />

Processo <strong>de</strong> execução e cumprimento <strong>de</strong> sentença. 25. ed. São Paulo: Leud, 2008. v. 4, n. 534, p. 623.<br />

BUENO, Cassio Scarpinella. A nova etapa da reforma <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 39; CARNEIRO, Athos<br />

Gusmão. Cumprimento da sentença civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2006. p. 33.<br />

ASSIS, Araken <strong>de</strong>. Cumprimento <strong>de</strong> sentença. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2006. p. 93 e WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria<br />

Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonar<strong>do</strong> Ferres da Silva; MELO, Rogério Licastro Torres <strong>de</strong>. Primeiros comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo<br />

Civil artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015, p. 837, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m o cabimento <strong>de</strong> liquidação para <strong>de</strong>finir a extensão da obrigação não<br />

pecuniária.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2008. v. 4, p. 620; ASSIS, Araken <strong>de</strong>. Manual<br />

<strong>do</strong>s recursos. 2. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 305; PONTES DE MIRANDA, Francisco. Comentários ao Código <strong>de</strong> Processo Civil. Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro: Forense, 1974. v. 9, p. 502-503.<br />

No senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto, THEODORO JR., Humberto. As novas reformas <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2007. p.<br />

189; MAZZEI, Rodrigo. Reforma <strong>do</strong> CPC. São Paulo: RT, 2007. p. 195-197. Em senti<strong>do</strong> contrário, RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual<br />

<strong>de</strong> execução civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 451.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 399-400.<br />

DINAMARCO, Pedro. Ação civil pública. São Paulo: Saraiva, 2001. n. 15.1, p. 273.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 405-406.<br />

Exemplo <strong>de</strong> MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Interesses difusos. 5. ed. São Paulo: RT, 2000. p. 167-168.<br />

GIDI, Antônio. A class action como instrumento <strong>de</strong> tutela coletiva <strong>do</strong>s direitos – as ações coletivas em uma perspectiva comparada. São<br />

Paulo: RT, 2007. p. 392.<br />

Exemplos da<strong>do</strong>s por Kazuo Watanabe e cita<strong>do</strong> por GRINOVER, Ada Pellegrini. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro:<br />

Forense Universitária, 1999. p. 102.<br />

GIDI, Antônio. A class action como instrumento <strong>de</strong> tutela coletiva <strong>do</strong>s direitos – as ações coletivas em uma perspectiva comparada. São<br />

Paulo: RT, 2007. p. 400.<br />

WATANABE, Kazuo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. II,<br />

p. 103.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 392; ANDRIGHI, Fátima<br />

Nancy. Reflexões acerca da representativida<strong>de</strong> a<strong>de</strong>quada nas ações coletivas passivas. Panorama atual das tutelas individual e<br />

coletiva. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 337.<br />

WATANABE, Kazuo. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. II,<br />

p. 104-105.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4, p. 404.<br />

NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. n. 10.5.3.3, p. 334.<br />

Dinamarco, Execução civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 207-208; ZAVASCKI, Teori Albino. Processo <strong>de</strong> execução. 3. ed. São Paulo:<br />

RT, 2004, p. 127-128; FUX, Luiz. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2004. p. 1.303.<br />

ASSIS, Araken <strong>de</strong>. Manual <strong>do</strong>s recursos. 2. ed. São Paulo: RT, 2008. n. 81.2, pp. 352-353; WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Teresa<br />

Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. Breves comentários à nova sistemática processual civil 2. São Paulo: RT, 2007. p. 193;<br />

BUENO, Cassio Scarpinella. A nova etapa da reforma <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2006. v. 2. p. 165.<br />

Contra: NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Código <strong>de</strong> processo civil comenta<strong>do</strong>. 10. ed. São Paulo: RT, 2008, p. 722.<br />

LUCON, Paulo Henrique <strong>do</strong>s Santos. Código <strong>de</strong> Processo Civil interpreta<strong>do</strong>. 3. ed. Coord. Antonio Carlos Marcato. São Paulo: Atlas, 2005.<br />

p. 1.789; DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonar<strong>do</strong> José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso <strong>de</strong> direito processual civil.<br />

Salva<strong>do</strong>r: JusPodvm, 2009. v. 5. p. 395-396; RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual <strong>de</strong> execução civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense<br />

Universitária, 2006. p. 451-452.<br />

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Atlas, 2008. p. 360. No mesmo senti<strong>do</strong>: LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 379.<br />

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 360. No mesmo senti<strong>do</strong> LEONEL, Ricar<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 379.<br />

Informativo 452/STJ: REsp 1.098.242/GO – Terceira Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 21.10.2010; Informativo 422/STJ: CC 96.682/RJ<br />

– Terceira Seção – Rel. Min. Arnal<strong>do</strong> Esteves Lima – j. 10.02.2010.<br />

PIZZOL, Patrícia Miranda. Liquidação nas ações coletivas. São Paulo: Lejus, 1998. p. 194; WAMBIER, Luiz Rodrigues. Sentença civil:<br />

liquidação e cumprimento. 3. ed. São Paulo: RT, 2006. n. 3.2.1, p. 380.


286<br />

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WAMBIER, Luiz Rodrigues. Sentença civil: liquidação e cumprimento. 3. ed. São Paulo: RT, 2006. n. 3.2.1, p. 371; GRINOVER, Ada<br />

Pellegrini. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 152; MARINONI, Luiz<br />

Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 740; CAVALIERI FILHO, Sérgio.<br />

Programa <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 358.<br />

WAMBIER, Luiz Rodrigues. Sentença civil: liquidação e cumprimento. 3. ed. São Paulo: RT, 2006. n. 3.2.1, p. 373.<br />

NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. n. 41.12.1, p. 938.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 154. No<br />

mesmo senti<strong>do</strong>: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p.<br />

741; MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Manual <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 181-182.<br />

NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2009. n. 34.2, p. 749-753.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2004. v. 4, n. 1.330, p. 47; THEODORO JR.,<br />

Humberto. Processo <strong>de</strong> execução e cumprimento <strong>de</strong> sentença. 25. ed. São Paulo: Leud, 2008. n. 13, p. 53.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2004. v. 4, n. 1.330, p. 47-48.<br />

BERMUDES, Sérgio. A reforma <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 175-176, apontan<strong>do</strong> para lições <strong>de</strong><br />

Carnelutti ao falar em “sanções premia<strong>do</strong>ras”.<br />

BUENO, Cassio Scarpinella. Código <strong>de</strong> Processo Civil anota<strong>do</strong>. In: MARCATO, Antonio Carlos (Coord.). São Paulo: Atlas, 2006. p. 1.413.<br />

THEODORO JR., Humberto. Processo <strong>de</strong> execução e cumprimento <strong>de</strong> sentença. 25. ed. São Paulo: Leud, 2008. n. 474, p. 558.<br />

TALAMINI, Eduar<strong>do</strong>. Tutela relativa aos <strong>de</strong>veres <strong>de</strong> fazer e não fazer. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. n. 9.7, p. 254-255.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória: individual e coletiva. 4. ed. São Paulo: RT, 2006. n. 3.27.1.6, p. 222.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições, n. 1.637, p. 474.<br />

Informativo 422/STJ: 1.ª Turma – REsp 1.098.028-SP – Rel. Min. Luiz Fux – j. 09.02.2010; STJ – 3.ª Turma – AgRg no REsp 1.116.800/RS –<br />

Rel. Min. Massami Uyeda – j. 08.09.2009 – DJe 25.09.2009.<br />

Informativo 546/STJ – Corte Especial – REsp 1.200.856/RS – rel. Min. Sidnei Beneti – j. 1.º.07.2014; Informativo 511/STJ – 4.ª Turma –<br />

REsp 1.347.726-RS – rel. Min. Marco Buzzi – j. 27.11.2012.<br />

Informativo 422/STJ – 1.ª Turma – REsp 1.098.028/SP – rel. Min. Luiz Fux – j. 09.02.2010; STJ – 3.ª Turma – AgRg no REsp 1.116.800/RS –<br />

rel. Min. Massami Uyeda – j. 08.09.2009 – DJe 25.09.2009.<br />

BERMUDES, Sérgio. A reforma <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 175-176, apontan<strong>do</strong> para lições <strong>de</strong><br />

Carnelutti ao falar em “sanções premia<strong>do</strong>ras”.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, <strong>Daniel</strong> Francisco. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2010. p. 462-463.<br />

REsp 1.036.968/DF – 1.ª Turma – Rel. Min. Teori Albino Zavascki – j. 13.05.2008; REsp 893.484/RS – 2.ª Turma – Rel. Min. Herman<br />

Benjamin – j. 15.03.2007.<br />

WAMBIER; Luiz Rodrigues; WAMBIER; Teresa Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. Breves comentários à nova sistemática<br />

processual civil 3. São Paulo: RT, 2007. p. 144-145; CARNEIRO, Athos Gusmão. Cumprimento da sentença civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense,<br />

2006. p. 61.<br />

STJ – 3.ª Turma – MC 14.258/RJ – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 17.06.2008; NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção. Reforma <strong>do</strong> CPC. São<br />

Paulo: RT, 2006. p. 218-220; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, <strong>Daniel</strong> Francisco. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. São Paulo:<br />

RT, 2010. p. 464; SHIMURA, Sérgio. Cumprimento da Sentença. In: ______; NEVES, <strong>Daniel</strong> <strong>Amorim</strong> Assumpção (coords.). Execução no<br />

Processo Civil. Novida<strong>de</strong>s e Tendências. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2005. p. 246.<br />

STJ – 1.ª Turma – REsp 634.775/CE – Rel. Min. Teori Albino Zavascki – j. 21.10.2004.<br />

CARNEIRO, Athos Gusmão. Cumprimento da sentença civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2006. p. 59.<br />

Informativo 437/STJ – 3.ª Turma – REsp 1.111.686/RN – rel. Min. Sidnei Beneti – j. 1.º.06.2010.<br />

STJ – 1.ª Turma – REsp 893.041/RS – Rel. Min. Teori Albino Zavascki – j. 05.12.2006.<br />

ASSIS, Araken <strong>de</strong>. Manual <strong>do</strong>s recursos. 2. ed. São Paulo: RT, 2008. n. 19, p. 132.<br />

SOBRANE, Sérgio Turra. Improbida<strong>de</strong> administrativa: Aspectos materiais, dimensão difusa e coisa julgada. São Paulo: Atlas, 2010. p. 198.<br />

STJ – 2.ª Turma – REsp 1.120.117/AC – Rel. Min. Eliana Calmon – j. 10.11.2009 – DJe 19.11.2009.<br />

STJ – 2.ª Turma – REsp 1.225.489/SP – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – j. 22.02.2011 – DJe 04.03.2011.<br />

STJ, 4ª Turma, AgRg no REsp 1.173.874/RS, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, j. 17.03.2015, DJe 24.03.2015; STJ, 3ª Turma, EDcl no REsp<br />

1.276.072/PR, rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino, j. 19.09.2013, DJe 24.09.2013; STJ, 2ª Turma, AgRg no REsp 1.185.347/RS, rel. Min.<br />

Humberto Martins, j. 17.04.2012, DJe 25.04.2012.<br />

GAJARDONI, Fernan<strong>do</strong> da Fonseca. <strong>Direito</strong>s difusos e coletivos I. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 161; BUENO, Cassio Scarpinella. Curso


317<br />

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344<br />

345<br />

346<br />

sistematiza<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo, Saraiva, 2007. v. 2, p. 246-247.<br />

STJ – 3ª Turma – REsp 995.995/DF – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 19.08.2010 – DJe 16.11.2010.<br />

Informativo 515/STJ: 3.ª Turma – REsp 1.273.643-PR – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 27.02.2013; STJ – 4.ª Turma – EDcl no AREsp 99.533/PR<br />

– Rel. Min. Raul Araújo – j. 19.06.2012 – DJe 29.06.2012.<br />

STJ – 2ª Turma – AgRg no REsp 1.541.385/MA – Rel. Min. Herman Benjamin – j. 05.11.2015 – DJe 03.02.2016; STJ – 1ª Seção – EDcl no<br />

REsp 1.194.670/MA – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – j. 03.09.2013 – DJe 20.09.2013.<br />

RODRIGUES, Marcelo Abelha. Ação civil pública. In: DIDIER JR., Fredie (Org.). Ações constitucionais. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. p.<br />

322.<br />

LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 374.<br />

RODRIGUES, Marcelo Abelha, Ação civil pública. In: DIDIER JR., Fredie (coord). 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: Jus Podivm, 2009, p. 321.<br />

STJ – 4ª Turma – REsp 1.156.021/RS – rel. Min. Marco Buzzi – j. 06.02.2014 – DJe 05.05.2014.<br />

MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Manual <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 186.<br />

STJ, 4ª Turma, REsp 1.187.632/DF, rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha, rel. p/acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira, j. 05.06.2012, DJe<br />

06.06.2013. GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p.<br />

163; MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Manual <strong>de</strong> direito <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 183.<br />

STJ – 4.ª Turma – REsp 1.187.632/DF – Rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – Rel. p/acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira – j. 05.06.2012 –<br />

DJe 06.06.2013.<br />

STJ – 4.ª Turma – REsp 996.771/RN – rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 06.03.2012 – DJe 23.04.2012.<br />

STJ – 4.ª Turma – REsp 1.156.021/RS – rel. Min. Marco Buzzi – j. 06.02.2014 – DJe 05.05.2014.<br />

ANDRADE, Adriano; MASSON, Cleber; ANDRADE, Lan<strong>do</strong>lfo. Interesses difusos e coletivos esquematiza<strong>do</strong>. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2011. p.<br />

239; LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 381.<br />

REsp 1.187.632-DF – 4.ª Turma – rel. originário Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha, rel. p/acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira – j. 05.06.2012<br />

– Informativo 499/STJ.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 163.<br />

ANDRADE, Adriano; MASSON, Cleber; ANDRADE, Lan<strong>do</strong>lfo. Interesses difusos e coletivos esquematiza<strong>do</strong>. São Paulo: Méto<strong>do</strong>, 2011. p.<br />

238-239.<br />

DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 4. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2009. v. 4. p. 389; LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. p. 381.<br />

GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 154.<br />

MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Manual <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 193.<br />

MANCUSO, Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo. Manual <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r em juízo. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 189.<br />

LEONEL, Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros. Manual <strong>do</strong> processo coletivo. São Paulo: RT, 2002. 379; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz.<br />

Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 741; GRINOVER, Ada Pellegrini. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong><br />

Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 157-158.<br />

Cfr. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. 6. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 157-158.<br />

STJ – AgRg no Ag 1.391.935/SC – Segunda Turma – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – j. 19.05.2011 – DJe 31.05.2011; STJ – AgRg no<br />

REsp 1.206.708/RS – Primeira Turma – Rel. Min. Benedito Gonçalves – j. 14.04.2011 – DJe 19.04.2011.<br />

STJ – EREsp 760.840/RS – Corte Especial – Rel. Min. Nancy Andrighi – j. 04.11.2009 – Informativo 414.<br />

RODRIGUES, Marcelo Abelha. Pon<strong>de</strong>rações sobre a fluid recovery <strong>do</strong> art. 100 <strong>do</strong> CDC. In: MAZZEI, Rodrigo; NOLASCO, Rita Dias (Coord.).<br />

Processo civil coletivo. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 462.<br />

STF – Tribunal Pleno – RE 573.232/SC, Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Lewan<strong>do</strong>wski – Rel. p/acórdão Min. Marco Aurélio – j. 14.05.2014 – DJe<br />

19.09.2014.<br />

STJ – 2.ª Turma – AgRg no AREsp 664.713/RJ – Rel. Min. Herman Benjamin – j. 01.12.2015 – DJe 04.02.2016; STJ – 5.ª Turma – REsp<br />

1.129.023/SC – Rel. Min. Felix Fischer – j. 16.02.2016, DJe 23.02.2016; STJ – 6.ª Turma – EDcl no AgRg no REsp 1.185.789/GO – Rel. Min.<br />

Sebastião Reis Júnior – j. 03.12.2015, DJe 01.02.2016.<br />

STJ – 2.ª Turma – AgRg no REsp 1.423.791/BA – Rel. Min. Og Fernan<strong>de</strong>s – j. 17.03.2015 – DJe 26.03.2015.<br />

STF – Tribunal Pleno – RE 420.816 ED/PR – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – j. 21.03.2007 – DJe 27.04.2007; STJ – 2.ª Turma – AgRg no<br />

AREsp 361.400/RS – Rel. Min. Assusete Magalhães – j. 09.12.2014 – DJe 16.12.2014.<br />

STJ – 1.ª Seção – REsp 1.406.296/RS – Rel. Min. Herman Benjamin – j. 26.02.2014 – DJe 19.03.2014.


ASPECTOS PROCESSUAIS DA<br />

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE<br />

JURÍDICA NO CÓDIGO DE DEFESA DO<br />

CONSUMIDOR<br />

Sumário: 12.1. Introdução – 12.2. Responsabilida<strong>de</strong> patrimonial secundária – 12.3. Forma procedimental da<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica: 12.3.1. Introdução; 12.3.2. Momento; 12.3.3. Procedimento; 12.3.4.<br />

Forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> sócio (ou da socieda<strong>de</strong> na <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração inversa); 12.3.5. Recorribilida<strong>de</strong>; 12.3.6. Frau<strong>de</strong> à<br />

execução – 12.4. Desconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica <strong>de</strong> ofício.<br />

12.1.<br />

INTRODUÇÃO<br />

A <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica tem como objetivo permitir atos <strong>de</strong> constrição e futura expropriação <strong>de</strong> bens <strong>do</strong><br />

patrimônio <strong>de</strong> sócios diante da satisfação <strong>de</strong> uma dívida contraída pela socieda<strong>de</strong> empresarial. Trata-se, portanto, <strong>de</strong> construção <strong>de</strong><br />

direito material que só terá aplicabilida<strong>de</strong> no processo, mais precisamente na execução ou falência, quan<strong>do</strong> serão pratica<strong>do</strong>s os atos<br />

<strong>de</strong> constrição/expropriação <strong>de</strong> bens. Os aspectos processuais, portanto, são indispensáveis na exata compreensão da<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica.<br />

12.2.<br />

RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL SECUNDÁRIA<br />

A responsabilida<strong>de</strong> patrimonial é indiscutivelmente instituto <strong>de</strong> direito processual1, compreendida como a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

sujeição <strong>de</strong> um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> patrimônio à satisfação <strong>do</strong> direito substancial <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r. Por outro la<strong>do</strong>, a obrigação é instituto <strong>de</strong><br />

direito material, representa<strong>do</strong> por uma situação jurídica <strong>de</strong> <strong>de</strong>svantagem. Contraída a obrigação, uma parte tem o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong><br />

satisfazer o direito da outra, e quan<strong>do</strong> isso não ocorre surge a dívida, instituto atinente ao direito material. Também existe a<br />

responsabilida<strong>de</strong> patrimonial para o caso <strong>de</strong> inadimplemento, ou seja, quan<strong>do</strong> a dívida não é satisfeita voluntariamente pelo<br />

<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, surge a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sujeição <strong>do</strong> patrimônio <strong>de</strong> algum sujeito – geralmente o próprio <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r – para assegurar a<br />

satisfação <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> cre<strong>do</strong>r na execução 2 . Em razão <strong>de</strong>ssa distinção, fala-se que a obrigação é estática, geran<strong>do</strong> uma mera<br />

expectativa <strong>de</strong> satisfação, enquanto a responsabilida<strong>de</strong> patrimonial é dinâmica, representada pela forma jurisdicional <strong>de</strong> efetiva<br />

satisfação <strong>do</strong> direito 3 .<br />

A distinção é interessante e ganha importância sempre que existe dívida e não responsabilida<strong>de</strong> e vice-versa 4 . Tome-se como<br />

exemplo a dívida <strong>de</strong> jogo, situação em que existe a dívida, mas o patrimônio <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r não respon<strong>de</strong> por sua satisfação. É certo<br />

que existe dívida, tanto que, se houver quitação voluntária, não caberá ação <strong>de</strong> repetição <strong>de</strong> indébito, mas não haverá<br />

responsabilida<strong>de</strong> patrimonial <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r <strong>de</strong>rivada <strong>do</strong> inadimplemento. Por outro la<strong>do</strong>, por exemplo, em <strong>de</strong>terminadas situações<br />

expressamente previstas em lei, o sócio po<strong>de</strong> ter seu patrimônio afeta<strong>do</strong> por uma dívida da socieda<strong>de</strong>, justamente por ter<br />

responsabilida<strong>de</strong> patrimonial, mesmo que o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r seja outrem (no caso, a socieda<strong>de</strong>).


É o patrimônio <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r que geralmente respon<strong>de</strong> por sua dívida, mas em algumas situações específicas mesmo aquele que<br />

não participou da relação <strong>de</strong> direito material obrigacional se vê responsável por sua satisfação. Seguin<strong>do</strong> as lições <strong>de</strong> Liebman, a<br />

<strong>do</strong>utrina nacional qualifica tal situação como “responsabilida<strong>de</strong> executória secundária”, prevista no art. 790 <strong>do</strong> Novo CPC. Dessa<br />

forma, a responsabilida<strong>de</strong> patrimonial <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r é primária, enquanto nas situações previstas em lei a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> sujeito<br />

que não é obriga<strong>do</strong> (plano <strong>do</strong> direito material) é secundária5.<br />

O art. 790 <strong>do</strong> Novo CPC é responsável pelo tratamento das hipóteses <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> secundária, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong> interesse para<br />

o presente tema o inciso II <strong>do</strong> dispositivo legal, ao prever a responsabilida<strong>de</strong> patrimonial <strong>do</strong>s sócios nos termos da lei. Sempre me<br />

pareceu ser nesse dispositivo incluídas as hipóteses <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, a partir da qual o patrimônio <strong>do</strong><br />

sócio (não <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r) passa a respon<strong>de</strong>r pela satisfação da dívida contraída pela socieda<strong>de</strong> empresarial (<strong>de</strong>ve<strong>do</strong>ra).<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 790, VII, <strong>do</strong> Novo CPC, é responsável secundário o responsável pela dívida da socieda<strong>de</strong> empresarial na<br />

hipótese da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> sua personalida<strong>de</strong> jurídica.<br />

O art. 137 <strong>do</strong> Novo CPC prevê que, sen<strong>do</strong> acolhi<strong>do</strong> o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, a alienação ou oneração <strong>de</strong> bens, havida em<br />

frau<strong>de</strong> <strong>de</strong> execução, será ineficaz em relação ao requerente. Como se po<strong>de</strong> notar <strong>do</strong> dispositivo legal, somente após o acolhimento<br />

<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração haverá frau<strong>de</strong> à execução, em previsão que aparentemente contraria com o disposto no art. 792, §<br />

3.º, <strong>do</strong> Novo CPC, que estabelece haver frau<strong>de</strong> à execução nos casos <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica a partir da<br />

citação da parte cuja personalida<strong>de</strong> se preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar.<br />

Essa contrarieda<strong>de</strong> foi minha primeira impressão, mas numa análise mais cuida<strong>do</strong>sa, enten<strong>do</strong> viável a convivência <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is<br />

dispositivos legais. Para tanto, <strong>de</strong>ve-se enten<strong>de</strong>r que o art. 137 <strong>do</strong> Novo CPC não prevê o termo inicial da frau<strong>de</strong> à execução,<br />

limitan<strong>do</strong>-se a afirmar que somente haverá tal espécie <strong>de</strong> frau<strong>de</strong> se o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração for acolhi<strong>do</strong>. A questão <strong>do</strong> termo<br />

inicial <strong>de</strong> tal frau<strong>de</strong>, portanto, seria resolvida exclusivamente pelo § 3.º <strong>do</strong> art. 792 <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

E esse dispositivo não parece ter fixa<strong>do</strong> o termo inicial mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> ao prever que haverá frau<strong>de</strong> à execução a partir da<br />

citação da parte cuja personalida<strong>de</strong> se preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar. Não se trata, portanto, da citação <strong>do</strong>s “réus” no inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, mas sim <strong>do</strong> <strong>de</strong>manda<strong>do</strong> originário6.<br />

O que, entretanto, não parece o mais correto, porque nesse caso cria-se uma presunção absoluta <strong>de</strong> ciência <strong>do</strong>s sujeitos que<br />

serão atingi<strong>do</strong>s pela <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica que não <strong>de</strong>veria existir. A norma protege o cre<strong>do</strong>r, mas <strong>de</strong>ixa o<br />

terceiro em gran<strong>de</strong> risco, bastan<strong>do</strong> pensar na hipótese <strong>de</strong> um terceiro adquirir um imóvel sem qualquer gravame, <strong>de</strong> ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r sem<br />

qualquer restrição, mas que venha, muito tempo <strong>de</strong>pois, a ser atingi<strong>do</strong> pela <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica. É realmente<br />

legítimo falar-se, nesse caso, <strong>de</strong> frau<strong>de</strong> à execução?<br />

O legisla<strong>do</strong>r teria si<strong>do</strong> mais técnico se tivesse se aproveita<strong>do</strong> <strong>do</strong> disposto no art. 134, § 1.º, <strong>do</strong> Novo CPC, que prevê a<br />

comunicação da instauração <strong>do</strong> inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica ao distribui<strong>do</strong>r para as anotações <strong>de</strong>vidas.<br />

Nesse momento, os nomes <strong>do</strong>s sujeitos que po<strong>de</strong>rão ser afeta<strong>do</strong>s pela <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração se tornarão públicos, sen<strong>do</strong> esse o momento<br />

mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> para se configurar a frau<strong>de</strong> à execução. Infelizmente, entretanto, não foi essa a opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r.<br />

De qualquer forma, po<strong>de</strong> surgir questionamento a respeito da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse dispositivo legal, já que a responsabilida<strong>de</strong><br />

patrimonial <strong>do</strong> sócio já está consagrada no art. 790, II, <strong>do</strong> Novo CPC (cópia <strong>do</strong> art. 592, II <strong>do</strong> CPC/1973). Enten<strong>do</strong> que o<br />

dispositivo foi cria<strong>do</strong> visan<strong>do</strong> as espécies atípicas <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica criadas pelo Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça, porque tanto na <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração entre socieda<strong>de</strong>s <strong>do</strong> mesmo grupo econômico como na <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração inversa a<br />

responsabilida<strong>de</strong> patrimonial secundária não é <strong>do</strong> sócio, não sen<strong>do</strong> tais situações, portanto, contempladas no inciso II <strong>do</strong> art. 790<br />

<strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Outra interpretação possível é <strong>de</strong>ixar que o inciso II <strong>do</strong> art. 790 <strong>do</strong> Novo CPC cui<strong>de</strong> <strong>de</strong> toda responsabilida<strong>de</strong> patrimonial <strong>de</strong><br />

sócio que não <strong>de</strong>rive da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, enquanto o inciso VII <strong>do</strong> mesmo dispositivo cuidaria <strong>de</strong> todas<br />

as espécies <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica 7 . É uma interpretação viável, e quem sabe para aqueles que estudarão<br />

somente o novo diploma processual, sem se preocupar com o passa<strong>do</strong>, parecerá até a solução mais lógica. Mas será o<br />

reconhecimento tácito que durante toda a vigência <strong>do</strong> CPC/1973 não havia regra <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> patrimonial secundária <strong>de</strong><br />

sócio em razão da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica.<br />

Os artigos que tratam da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica não criam propriamente a responsabilida<strong>de</strong> secundária <strong>do</strong>s<br />

sócios, apenas completan<strong>do</strong> a previsão <strong>do</strong> art. 790, II (ou VII), <strong>do</strong> Novo CPC, ao prever as condições para que os sócios passem a<br />

respon<strong>de</strong>r com seus patrimônios pela dívida da socieda<strong>de</strong> empresarial.<br />

Registre-se, por fim, que nem só <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica vive o art. 790, II, <strong>do</strong> Novo CPC. Nas leis<br />

societárias é possível a criação <strong>de</strong> regras que concebam a responsabilida<strong>de</strong> patrimonial <strong>do</strong> sócio, existin<strong>do</strong> atualmente<br />

<strong>de</strong>terminadas espécies <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>, nas quais este respon<strong>de</strong> com o seu patrimônio pelas dívidas da socieda<strong>de</strong> em qualquer<br />

situação <strong>de</strong> inadimplemento. É o caso da socieda<strong>de</strong> em nome coletivo (art. 1.039 <strong>do</strong> CC) e <strong>do</strong> sócio comandita<strong>do</strong> na socieda<strong>de</strong> em


comandita simples (art. 1.045, caput, <strong>do</strong> CC). Ocorre, entretanto, que nesse caso não parece ser a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s sócios<br />

secundária, porque o texto legal é claro ao prever uma solidarieda<strong>de</strong> passiva entre o sócio e a socieda<strong>de</strong> pelas dívidas contraídas<br />

por esta. Parece tratar-se, portanto, <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> primária subsidiária. O mesmo fenômeno verifica-se nas hipóteses <strong>de</strong><br />

socieda<strong>de</strong> irregular e <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> fato, nas quais a responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> sócio é solidária e ilimitada (art. 990 <strong>do</strong> CC)8.<br />

O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça já <strong>de</strong>cidiu nesse senti<strong>do</strong>, conforme julga<strong>do</strong> assim publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 468:<br />

“In casu, a socieda<strong>de</strong> empresária recorrida ajuizou, na origem, ação <strong>de</strong> cobrança e ressarcimento em <strong>de</strong>sfavor das recorrentes sob a<br />

alegação <strong>de</strong> que o contrato <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> serviços celebra<strong>do</strong> com a socieda<strong>de</strong> civil da qual elas eram sócias – extinta pelo <strong>de</strong>curso<br />

<strong>do</strong> prazo – não foi cumpri<strong>do</strong>. Esse contrato previa a elaboração pela recorrida <strong>do</strong> marketing <strong>do</strong> texto que seria entregue ao comitê<br />

olímpico quan<strong>do</strong> da apresentação da candidatura <strong>de</strong> cida<strong>de</strong> brasileira para sediar os jogos olímpicos <strong>de</strong> 2004. Nos recursos<br />

especiais, as sócias sustentaram, entre outras questões, sua ilegitimida<strong>de</strong> passiva ad causam, a irregularida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da<br />

personalida<strong>de</strong> jurídica e a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se comprovar a prestação <strong>do</strong> serviço por prova exclusivamente testemunhal. Nesse<br />

contexto, a Turma negou-lhes provimento por enten<strong>de</strong>r que, nas socieda<strong>de</strong>s cuja responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s sócios é ilimitada – como na<br />

hipótese, em que se trata <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> simples –, uma vez exauri<strong>do</strong> o patrimônio da pessoa jurídica, não é necessário <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar<br />

sua personalida<strong>de</strong> para que se atinjam os bens <strong>do</strong>s sócios, conforme o art. 1.023 <strong>do</strong> CC/2002, o que evi<strong>de</strong>ncia a legitimida<strong>de</strong> das<br />

recorrentes para figurar na <strong>de</strong>manda. Ressaltou-se ainda que a vedação para utilizar prova exclusivamente testemunhal <strong>de</strong>scrita nos<br />

arts. 401 <strong>do</strong> CPC e 227 <strong>do</strong> CC/2002 restringe-se à <strong>de</strong>monstração da existência <strong>do</strong> negócio jurídico em si, não alcançan<strong>do</strong> a<br />

verificação <strong>do</strong>s fatos e circunstâncias atinentes ao contrato. Prece<strong>de</strong>nte cita<strong>do</strong>: EREsp 263.387-PE, DJ 17.03.2003” (STJ – REsp<br />

895.792-RJ – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 07.04.2011).<br />

Sen<strong>do</strong> o objetivo da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica reconhecer-se a responsabilida<strong>de</strong> patrimonial secundária <strong>do</strong>s<br />

sócios, <strong>de</strong> forma que seus bens passem a respon<strong>de</strong>r pela satisfação da obrigação contraída pela socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>ra, não há<br />

qualquer restrição acerca da execução, contra os sócios, ser limitada às suas respectivas quotas sociais9.<br />

12.3.<br />

12.3.1.<br />

FORMA PROCEDIMENTAL DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE<br />

JURÍDICA<br />

Introdução<br />

O Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil prevê um inci<strong>de</strong>nte processual para a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, finalmente<br />

regulamentan<strong>do</strong> seu procedimento. Ten<strong>do</strong> seus requisitos previstos em diversas normas legais (art. 50, CC; art. 28, CDC; art. 2.º, §<br />

2.º da CLT; art. 135 <strong>do</strong> CTN; art. 4.º da Lei 9.605/98; art. 18, § 3.º da Lei 9.847/99; art. 34 da Lei 12.529/2011; arts. 117, 158, 245<br />

e 246 da Lei 6.404/76), faltava uma previsão processual a respeito <strong>do</strong> fenômeno jurídico, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser saudada tal iniciativa.<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 1.062 <strong>do</strong> Novo CPC, o inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica aplica-se ao processo <strong>de</strong><br />

competência <strong>do</strong>s juiza<strong>do</strong>s especiais.<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 795, § 4.º, <strong>do</strong> Novo CPC, para a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica é obrigatória a observância <strong>do</strong><br />

inci<strong>de</strong>nte previsto no Código. A norma torna o inci<strong>de</strong>nte obrigatório, em especial na aplicação <strong>de</strong> suas regras procedimentais, mas<br />

o art. 134, § 2.º, <strong>do</strong> Novo CPC consagra hipótese <strong>de</strong> dispensa <strong>do</strong> inci<strong>de</strong>nte.<br />

A criação legal <strong>de</strong> um inci<strong>de</strong>nte processual afasta dúvida <strong>do</strong>utrinária a respeito da forma processual a<strong>de</strong>quada à<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica e à sua natureza: trata-se <strong>de</strong> um inci<strong>de</strong>nte processual e não <strong>de</strong> ação autônoma10.<br />

A <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração tem natureza constitutiva, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que por meio <strong>de</strong>la tem-se a criação <strong>de</strong> uma nova situação<br />

jurídica. Sempre houve intenso <strong>de</strong>bate <strong>do</strong>utrinário a respeito da possibilida<strong>de</strong> da criação <strong>de</strong> uma nova situação jurídica <strong>de</strong> forma<br />

inci<strong>de</strong>ntal no processo/fase <strong>de</strong> execução, ou se caberia ao interessa<strong>do</strong> a propositura <strong>de</strong> uma ação inci<strong>de</strong>ntal com esse propósito.<br />

Havia corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fendia – e mesmo com o texto legal po<strong>de</strong> continuar a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r 11 , mas apenas num plano<br />

acadêmico – a existência <strong>de</strong> um processo <strong>de</strong> conhecimento com os pretensos responsáveis patrimoniais secundários compon<strong>do</strong> o<br />

polo passivo para se discutir os requisitos indispensáveis à <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica 12 .<br />

Por outro la<strong>do</strong>, havia <strong>do</strong>utrina que afirmava que, estan<strong>do</strong> presentes os pressupostos para a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong><br />

jurídica, e conseguin<strong>do</strong> o cre<strong>do</strong>r prová-los <strong>de</strong> forma inci<strong>de</strong>ntal, seria <strong>de</strong>snecessário o processo autônomo, sen<strong>do</strong> esse entendimento<br />

prestigia<strong>do</strong> pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça 13 .<br />

É compreensível que o entendimento consagra<strong>do</strong> no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça esteja funda<strong>do</strong> nos princípios da celerida<strong>de</strong> e<br />

da economia processual, até porque exigir um processo <strong>de</strong> conhecimento para se chegar à <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong><br />

jurídica atrasaria <strong>de</strong> forma significativa a satisfação <strong>do</strong> direito, além <strong>de</strong> ser claramente um caminho mais complexo que um mero<br />

inci<strong>de</strong>nte processual na própria execução ou falência. E tais motivos certamente influenciaram o legisla<strong>do</strong>r a consagrar a natureza<br />

<strong>de</strong> inci<strong>de</strong>nte processual ao pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica.<br />

Reconhecen<strong>do</strong> que o inci<strong>de</strong>nte cria<strong>do</strong> se limita a tratar <strong>do</strong> procedimento para a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, o §


1.º <strong>do</strong> art. 133 <strong>do</strong> Novo CPC prevê que a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica observará os pressupostos estabeleci<strong>do</strong>s em<br />

lei. A opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve ser saudada porque os pressupostos para a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica são tema <strong>de</strong><br />

direito material e <strong>de</strong>ssa forma não <strong>de</strong>vem ser trata<strong>do</strong>s pelo Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

Na <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica clássica, expressamente prevista pelos arts. 50 <strong>do</strong> CC e 28 <strong>do</strong> CDC, a socieda<strong>de</strong><br />

empresarial figura como <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>ra e os sócios, como responsáveis patrimoniais secundários, ou seja, mesmo não sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>res,<br />

respon<strong>de</strong>rão com o seu patrimônio pela satisfação da dívida.<br />

A jurisprudência, entretanto, valen<strong>do</strong>-se da ratio das normas legais referidas, vem as interpretan<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma extensiva e<br />

crian<strong>do</strong> novas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> jurídica, não previstas expressamente em lei. Há a<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica entre empresas <strong>do</strong> mesmo grupo econômico14, bem como a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da<br />

personalida<strong>de</strong> jurídica inversa 15 .<br />

Na hipótese <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica inversa, o sócio figura como <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r e a socieda<strong>de</strong> empresarial,<br />

como responsável patrimonial secundária, quan<strong>do</strong> se constata que o sócio transferiu seu patrimônio pessoal para a socieda<strong>de</strong><br />

empresarial com o objetivo <strong>de</strong> frustrar a satisfação <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> seus cre<strong>do</strong>res. O § 2.º <strong>do</strong> art. 133 <strong>do</strong> Novo CPC não consagra<br />

legislativamente essa espécie atípica <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, limitan<strong>do</strong>-se a prever que o inci<strong>de</strong>nte cria<strong>do</strong> também a ela será aplica<strong>do</strong>.<br />

12.3.2.<br />

Momento<br />

Na <strong>do</strong>utrina muito se discutiu a respeito <strong>do</strong> momento a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> para a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica. Segun<strong>do</strong> o<br />

Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração po<strong>de</strong> ocorrer em qualquer fase <strong>do</strong> processo, não haven<strong>do</strong> que falar em <strong>de</strong>cadência<br />

<strong>de</strong> um direito potestativo16. A dúvida é resolvida pelo art. 134, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, ao prever que o inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração<br />

é cabível em todas as fases <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento, no cumprimento <strong>de</strong> sentença e na execução fundada em título executivo<br />

extrajudicial.<br />

12.3.3.<br />

Procedimento<br />

O art. 133, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, prevê expressamente que a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> da<br />

parte ou <strong>do</strong> Ministério Público, com o que afasta a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o juiz instaurar o inci<strong>de</strong>nte ora analisa<strong>do</strong> <strong>de</strong> ofício17. Já era<br />

nesse senti<strong>do</strong> a previsão <strong>do</strong> art. 50 <strong>do</strong> CC. A legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Ministério Público, apesar <strong>de</strong> o artigo ora menciona<strong>do</strong> sugerir ser<br />

ampla, <strong>de</strong>ve ser limitada à hipótese em que participa <strong>do</strong> processo como autor, não haven<strong>do</strong> senti<strong>do</strong> em se admitir tal pedi<strong>do</strong> quan<strong>do</strong><br />

funciona no processo como fiscal da or<strong>de</strong>m jurídica 18 .<br />

Como toda petição postulatória, a petição que veicula o pedi<strong>do</strong> para a instauração <strong>do</strong> inci<strong>de</strong>nte processual <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração<br />

da personalida<strong>de</strong> jurídica <strong>de</strong>ve conter fundamentação (pressupostos legais para a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração) e pedi<strong>do</strong> (<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração e<br />

penhora sobre o bem <strong>do</strong>s sócios). Nesse senti<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ve-se compreen<strong>de</strong>r o § 4.º <strong>do</strong> art. 134 <strong>do</strong> Novo CPC, que não foi feliz em<br />

prever que no requerimento cabe à parte <strong>de</strong>monstrar o preenchimento <strong>do</strong>s pressupostos legais para a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, o que po<strong>de</strong><br />

passar a equivocada impressão <strong>de</strong> que o requerente terá que apresentar prova pré-constituída e liminarmente <strong>de</strong>monstrar o<br />

cabimento da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração.<br />

Na realida<strong>de</strong>, o requerente não <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>monstrar, mas apenas alegar o preenchimento <strong>do</strong>s requisitos legais para a<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, ten<strong>do</strong> o direito à produção <strong>de</strong> prova para convencer o juízo <strong>de</strong> sua alegação, inclusive conforme previsto nos arts.<br />

135 e 136 <strong>do</strong> Novo CPC, ao indicarem expressamente a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> instrução probatória no inci<strong>de</strong>nte ora analisa<strong>do</strong>.<br />

Apesar da previsão <strong>do</strong> art. 795, § 4.º, <strong>do</strong> Novo CPC, a criação <strong>de</strong> um inci<strong>de</strong>nte processual não será sempre necessária, pois,<br />

nos termos <strong>do</strong> art. 134, § 2.º, <strong>do</strong> Novo CPC, a instauração <strong>do</strong> inci<strong>de</strong>nte será dispensada se o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da<br />

personalida<strong>de</strong> jurídica for requeri<strong>do</strong> na petição inicial, hipótese em que será cita<strong>do</strong> o sócio ou a pessoa jurídica. Nesse caso, o<br />

Enuncia<strong>do</strong> 248 <strong>do</strong> Fórum Permanente <strong>de</strong> Processualistas Civis (FPPC) indica que “incumbe ao sócio ou à pessoa jurídica, na<br />

contestação, impugnar não somente a própria <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, mas também os <strong>de</strong>mais pontos da causa”.<br />

A instauração <strong>do</strong> inci<strong>de</strong>nte será imediatamente comunicada ao distribui<strong>do</strong>r para as anotações <strong>de</strong>vidas (art. 134, § 1.º, <strong>do</strong> Novo<br />

CPC), não suspen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o processo, salvo na hipótese <strong>de</strong> o pedi<strong>do</strong> ser formula<strong>do</strong> na petição inicial (art. 134, § 3.º, <strong>do</strong> Novo CPC).<br />

Trata-se <strong>de</strong> suspensão imprópria, já que o processo <strong>de</strong>ve ser suspenso apenas naquilo que <strong>de</strong>penda da solução da controvérsia<br />

criada com a instauração <strong>do</strong> inci<strong>de</strong>nte19.<br />

Há controvérsia <strong>do</strong>utrinária a respeito <strong>do</strong> momento em que ocorre a instauração <strong>do</strong> inci<strong>de</strong>nte ora analisa<strong>do</strong>: para parcela da<br />

<strong>do</strong>utrina, o mero pedi<strong>do</strong> da parte já é o suficiente 20 , enquanto para outra, somente quan<strong>do</strong> o juízo admite o pedi<strong>do</strong>, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong><br />

preenchi<strong>do</strong>s os requisitos exigi<strong>do</strong>s pela lei, estará instaura<strong>do</strong> o inci<strong>de</strong>nte 21 . Em termos <strong>de</strong> segurança jurídica, em especial para fins<br />

<strong>de</strong> configuração <strong>de</strong> frau<strong>de</strong> à execução, é mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> enten<strong>de</strong>r-se que o mero pedi<strong>do</strong> da parte já seja o suficiente para a


instauração <strong>do</strong> inci<strong>de</strong>nte, até mesmo porque, infelizmente, a <strong>de</strong>cisão judicial po<strong>de</strong> <strong>de</strong>morar a ser proferida, o que <strong>de</strong>ixará tempo<br />

para manobras fraudulentas <strong>do</strong> sujeito que po<strong>de</strong>rá ser atingi<strong>do</strong> pela <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração.<br />

Ainda que não haja a instauração <strong>do</strong> inci<strong>de</strong>nte processual, as regras procedimentais previstas nos dispositivos ora analisa<strong>do</strong>s<br />

serão aplicáveis, no que couber, à <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, e nunca será exigi<strong>do</strong> um processo autônomo para tal<br />

finalida<strong>de</strong>.<br />

Ao prever que, instaura<strong>do</strong> o inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, o sócio ou a pessoa jurídica serão cita<strong>do</strong>s<br />

para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo <strong>de</strong> 15 dias, o art. 135 <strong>do</strong> Novo CPC consagrou a exigência <strong>do</strong><br />

contraditório tradicional para a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, exigin<strong>do</strong> a intimação e a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> manifestação<br />

<strong>do</strong>s sócios e da socieda<strong>de</strong> antes <strong>de</strong> ser proferida a <strong>de</strong>cisão. Aten<strong>de</strong>u, assim, parcela da <strong>do</strong>utrina que, mesmo sem previsão expressa,<br />

já se posicionava nesse senti<strong>do</strong>22.<br />

O tema não era tranquilo no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, haven<strong>do</strong> <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong>cretan<strong>do</strong> a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica proferidas sem a observação <strong>do</strong> contraditório tradicional 23 , enquanto outras admitiam o<br />

contraditório diferi<strong>do</strong> 24 .<br />

É preciso registrar que a previsão legal que exige o contraditório tradicional não afasta peremptoriamente o contraditório<br />

diferi<strong>do</strong> na <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, apenas torna-o excepcional. Dessa forma, sen<strong>do</strong> preenchi<strong>do</strong>s os requisitos<br />

típicos da tutela <strong>de</strong> urgência e <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> antecipação <strong>do</strong>s efeitos da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, enten<strong>do</strong><br />

admissível a prolação <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão antes da intimação <strong>do</strong>s sócios e da socieda<strong>de</strong> 25 . Nesse senti<strong>do</strong>, inclusive, mencionan<strong>do</strong> o po<strong>de</strong>r<br />

geral <strong>de</strong> cautela <strong>do</strong> juiz, existe <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça 26 .<br />

Ao prever a citação <strong>do</strong> sócio ou da socieda<strong>de</strong>, o art. 135 <strong>do</strong> Novo CPC parece distinguir a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração tradicional da<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração inversa. Significa que o <strong>de</strong>manda<strong>do</strong> no processo em que se instaura o inci<strong>de</strong>nte processual não será intima<strong>do</strong> a se<br />

manifestar, sen<strong>do</strong> tal direito franquea<strong>do</strong> apenas aos terceiros que po<strong>de</strong>rão passar a ser responsáveis patrimoniais com a concessão<br />

<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>. A utilização da conjunção “ou”, e não “e”, e a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> “citação” corroboram a conclusão.<br />

Consi<strong>de</strong>ro, entretanto, que o legisla<strong>do</strong>r não foi bem ao excluir o <strong>de</strong>manda<strong>do</strong> <strong>do</strong> contraditório, porque este também tem<br />

legitimida<strong>de</strong> e interesse no pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica. Na <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração clássica, o Superior Tribunal<br />

<strong>de</strong> Justiça enten<strong>de</strong> que a pessoa jurídica tem legitimida<strong>de</strong> para impugnar <strong>de</strong>cisão interlocutória que <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ra sua personalida<strong>de</strong><br />

com o intuito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a sua regular administração e autonomia27.<br />

Sen<strong>do</strong> necessária a produção da prova, que po<strong>de</strong>rá ser requerida por qualquer das partes envolvidas no inci<strong>de</strong>nte processual,<br />

to<strong>do</strong>s os meios <strong>de</strong> prova em <strong>Direito</strong> serão admiti<strong>do</strong>s em respeito ao princípio <strong>do</strong> contraditório. E apenas após a produção da prova<br />

o juiz <strong>de</strong>cidirá o inci<strong>de</strong>nte por meio <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão interlocutória, confirman<strong>do</strong>-se mais uma vez a opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r pela a<strong>do</strong>ção <strong>do</strong><br />

contraditório tradicional para a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica.<br />

Tratan<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> questão meramente patrimonial <strong>de</strong> interesse das partes envolvidas no processo, <strong>de</strong>ve ser elogia<strong>do</strong> o Enuncia<strong>do</strong><br />

123 <strong>do</strong> Fórum Permanente <strong>de</strong> Processualistas Civis (FPPC): “É <strong>de</strong>snecessária a intervenção <strong>do</strong> Ministério Público, como fiscal da<br />

or<strong>de</strong>m jurídica, no inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, salvo nos casos em que <strong>de</strong>va intervir<br />

obrigatoriamente, previstos no art. 178”.<br />

12.3.4.<br />

Forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> sócio (ou da socieda<strong>de</strong> na <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração inversa)<br />

O Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil per<strong>de</strong>u uma excelente oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> colocar fim à polêmica a respeito da forma<br />

processual <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong>s sócios na execução após a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica.<br />

O sócio (ou a socieda<strong>de</strong> na <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração inversa) passa, a partir da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, a ser<br />

responsável patrimonial secundário pela dívida da socieda<strong>de</strong> empresarial. Será o sócio legitima<strong>do</strong> a formar um litisconsórcio<br />

passivo ulterior, transforman<strong>do</strong>-se em executa<strong>do</strong> junto à socieda<strong>de</strong> empresarial, ou continuará como um terceiro no processo? A<br />

resposta a esse questionamento é resultante da <strong>de</strong>finição da qualida<strong>de</strong> processual <strong>do</strong> responsável patrimonial secundário.<br />

O responsável patrimonial secundário, com hipóteses previstas pelo art. 592 <strong>do</strong> CPC/1973 e art. 790 <strong>do</strong> Novo CPC, mesmo<br />

não sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, respon<strong>de</strong> com seus bens pela satisfação da obrigação em juízo. É preciso atentar que, no tocante a algumas<br />

hipóteses <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> secundária, a questão da legitimida<strong>de</strong> passiva era totalmente superada pelo art. 568 <strong>do</strong> CPC/1973, e<br />

continua a ser pelo art. 779 <strong>do</strong> Novo CPC. A questão, entretanto, remanesce relativamente aos <strong>de</strong>mais responsáveis secundários,<br />

em especial àquele indica<strong>do</strong> pelo art. 790, II, <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Parte da <strong>do</strong>utrina entendia que não se <strong>de</strong>via consi<strong>de</strong>rar o responsável patrimonial como parte na <strong>de</strong>manda executiva, ainda que<br />

sejam os seus bens que respondam pela satisfação da obrigação, em interpretação que limita a legitimação passiva da execução aos<br />

sujeitos previstos no art. 568 <strong>do</strong> CPC/1973. Por esse entendimento, não se <strong>de</strong>vem confundir a legitimida<strong>de</strong> passiva e a<br />

responsabilida<strong>de</strong> secundária, uma vez que o sujeito passivo é o executa<strong>do</strong>, enquanto o responsável não é executa<strong>do</strong>, tão somente


fican<strong>do</strong> seus bens sujeitos à execução28. O entendimento <strong>de</strong>ve ser manti<strong>do</strong> com o Novo CPC, pois a legitimida<strong>de</strong> passiva na<br />

execução continua a ser expressamente prevista, agora pelo art. 779.<br />

Para outra corrente <strong>do</strong>utrinária, o legisla<strong>do</strong>r in<strong>de</strong>vidamente separou o tema da legitimida<strong>de</strong> passiva da responsabilida<strong>de</strong><br />

patrimonial, não se po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> admitir que o sujeito que potencialmente per<strong>de</strong>rá seu bem em virtu<strong>de</strong> da expropriação judicial não<br />

seja consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> parte na <strong>de</strong>manda executiva 29 .<br />

Sen<strong>do</strong> o sujeito responsável por dívida que não é sua – responsabilida<strong>de</strong> patrimonial secundária –, é natural que seja<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> parte na <strong>de</strong>manda executiva, visto que será o maior interessa<strong>do</strong> em apresentar <strong>de</strong>fesa para evitar a expropriação <strong>de</strong> seu<br />

bem. O <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, que também <strong>de</strong>verá estar na <strong>de</strong>manda como litisconsorte passivo, po<strong>de</strong>rá não ter tanto interesse assim na<br />

apresentação da <strong>de</strong>fesa, imaginan<strong>do</strong> que, em razão da proprieda<strong>de</strong> <strong>do</strong> bem penhora<strong>do</strong>, naquele momento o maior prejudica<strong>do</strong> será<br />

o responsável secundário, e não ele. Trata-se <strong>de</strong> legitimação extraordinária, porque o responsável secundário estará em juízo em<br />

nome próprio e na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> interesse <strong>de</strong> outrem, o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r.<br />

Para os responsáveis patrimoniais que não têm sua legitimida<strong>de</strong> passiva expressamente prevista em lei, como no caso <strong>do</strong>s<br />

sócios diante da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, a legitimação extraordinária apresenta uma particularida<strong>de</strong><br />

interessante, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que para esses sujeitos ela só surgirá no caso concreto quan<strong>do</strong> ocorrer a efetiva constrição judicial <strong>do</strong><br />

bem <strong>do</strong> responsável secundário. Não teria qualquer senti<strong>do</strong> a citação <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os sócios da pessoa jurídica, se na execução não<br />

houver qualquer tipo <strong>de</strong> constrição judicial, <strong>de</strong>sejada pelo exequente ou efetivamente ocorrida, <strong>de</strong> bens <strong>de</strong>sses sócios. Há, portanto,<br />

uma condição para que a legitimida<strong>de</strong> extraordinária nesse caso exista: o patrimônio <strong>do</strong> responsável secundário efetivamente<br />

responda no caso concreto pela execução, o que passa a ocorrer com a penhora <strong>de</strong> seus bens em consequência da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração<br />

da personalida<strong>de</strong> jurídica.<br />

A importância prática <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir a qualida<strong>de</strong> processual <strong>do</strong> sócio após a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica é a <strong>de</strong>fesa<br />

a<strong>de</strong>quada a apresentar na execução: sen<strong>do</strong> terceiro, a <strong>de</strong>fesa parece ser mais a<strong>de</strong>quadamente apresentada por meio <strong>de</strong> embargos <strong>de</strong><br />

terceiro; sen<strong>do</strong> parte, a <strong>de</strong>fesa será elaborada por meio <strong>de</strong> embargos à execução (ou mesmo impugnação, no caso <strong>de</strong> cumprimento<br />

<strong>de</strong> sentença).<br />

O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça a<strong>do</strong>ta o segun<strong>do</strong> entendimento, ao apontar a citação <strong>do</strong> sócio30 e sua integração à relação<br />

jurídica processual executiva, bem como a inadmissão <strong>do</strong>s embargos <strong>de</strong> terceiro, indican<strong>do</strong> os embargos à execução como via<br />

a<strong>de</strong>quada <strong>do</strong>s sócios diante da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica 31 .<br />

Enten<strong>do</strong> que está correto o posicionamento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, até porque consi<strong>de</strong>ro que to<strong>do</strong>s os responsáveis<br />

patrimoniais secundários, ao terem bem <strong>de</strong> seu patrimônio constrito em processo alheio, automaticamente passam a ter<br />

legitimida<strong>de</strong> passiva, e, uma vez sen<strong>do</strong> cita<strong>do</strong>s ou integran<strong>do</strong>-se voluntariamente ao processo, formarão um litisconsórcio passivo<br />

ulterior com o <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r. E que, mesmo sem previsão legal nesse senti<strong>do</strong>, nada mudará.<br />

Po<strong>de</strong>r-se-á afirmar que a <strong>de</strong>fesa a<strong>de</strong>quada são os embargos <strong>de</strong> terceiro, porque, não concordan<strong>do</strong> o sócio com a<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, <strong>de</strong>ve alegar que não tem responsabilida<strong>de</strong> patrimonial secundária e, <strong>de</strong>ssa forma, <strong>de</strong>ve ser trata<strong>do</strong> como um mero<br />

terceiro no processo. O problema, entretanto, é a distância entre a qualida<strong>de</strong> real que o sócio adquire no processo ao ser cita<strong>do</strong> e a<br />

qualida<strong>de</strong> que ele gostaria <strong>de</strong> ter.<br />

Importante notar que o conceito <strong>de</strong> parte na <strong>de</strong>manda ou no processo não se confun<strong>de</strong> com o conceito <strong>de</strong> parte material, que é<br />

o sujeito que participa da relação <strong>de</strong> direito material que constitui o objeto <strong>do</strong> processo. Dessa forma, mesmo que não seja o titular<br />

<strong>de</strong>ssa relação <strong>de</strong> direito material, mas participe <strong>do</strong> processo, o sujeito será consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> parte processual, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da<br />

legalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua presença no processo. É por isso que, mesmo sen<strong>do</strong> parte ilegítima, o sujeito é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> parte processual pelo<br />

simples fato <strong>de</strong> participar <strong>do</strong> processo. Significa que o sócio será parte, queren<strong>do</strong> ou não, ten<strong>do</strong> ou não legitimida<strong>de</strong> para participar<br />

da execução.<br />

Concluo afirman<strong>do</strong> que, nos embargos à execução, caberá ao sócio alegar, em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> preliminar <strong>de</strong> ilegitimida<strong>de</strong> passiva, a<br />

eventual incorreção da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, até porque, se não foi <strong>de</strong>vida, não existe responsabilida<strong>de</strong><br />

patrimonial secundária e, por consequência, o sócio é parte ilegítima. O acolhimento <strong>de</strong>ssa <strong>de</strong>fesa, além <strong>de</strong> excluir o sócio da<br />

execução por ilegitimida<strong>de</strong> <strong>de</strong> parte, ainda resultará na imediata liberação da constrição judicial sobre o seu bem. Além da<br />

alegação <strong>de</strong> ilegitimida<strong>de</strong> <strong>de</strong> parte, o sócio po<strong>de</strong>rá alegar todas as outras <strong>de</strong>fesas típicas <strong>do</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>r, firme no princípio da<br />

eventualida<strong>de</strong>.<br />

Registre-se que essa alegação <strong>de</strong> ilegitimida<strong>de</strong> vinculada à ina<strong>de</strong>quação da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica é a única<br />

forma <strong>de</strong> preservar o princípio <strong>do</strong> contraditório, ainda que diferi<strong>do</strong>. Como nessa forma <strong>de</strong> contraditório a informação e a reação são<br />

posteriores à <strong>de</strong>cisão judicial, não será legítimo exigir da parte a interposição <strong>de</strong> agravo <strong>de</strong> instrumento contra a <strong>de</strong>cisão que<br />

<strong>de</strong>termina a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, sob pena <strong>de</strong> preclusão. Naturalmente, o sócio po<strong>de</strong>rá se valer <strong>de</strong> tal recurso, conforme já exposto no<br />

item anterior, mas, se preferir, po<strong>de</strong>rá aguardar os embargos à execução para se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r. Condicionar a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> sócio ao agravo


<strong>de</strong> instrumento seria suprimir um grau <strong>de</strong> jurisdição no exercício <strong>de</strong> seu contraditório.<br />

12.3.5.<br />

Recorribilida<strong>de</strong><br />

O inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica será resolvi<strong>do</strong> por meio <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>cisão interlocutória recorrível por<br />

agravo <strong>de</strong> instrumento, nos termos <strong>do</strong> art. 1.015, IV, <strong>do</strong> Novo CPC. O conteú<strong>do</strong> da <strong>de</strong>cisão para fins <strong>de</strong> recorribilida<strong>de</strong> é<br />

irrelevante, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ter si<strong>do</strong> o pedi<strong>do</strong> acolhi<strong>do</strong>, rejeita<strong>do</strong> ou mesmo <strong>de</strong>cidi<strong>do</strong> sem a análise <strong>do</strong> mérito em razão <strong>de</strong> alguma<br />

imperfeição formal.<br />

Na vigência <strong>do</strong> CPC/1973, o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça não conseguia encontrar um entendimento uníssono a respeito da<br />

legitimida<strong>de</strong> para recorrer da <strong>de</strong>cisão interlocutória <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, em mais uma triste<br />

<strong>de</strong>monstração da aparente <strong>de</strong>spreocupação da Corte Superior com a uniformização <strong>de</strong> jurisprudência. Enquanto a 1.ª Seção<br />

entendia não haver legitimida<strong>de</strong> da socieda<strong>de</strong>, porque nesse caso estar-se-ia diante <strong>de</strong> uma legitimação extraordinária não prevista<br />

em lei32, a 3.ª Turma admitia tal legitimida<strong>de</strong> recursal, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que a socieda<strong>de</strong> recorresse para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a sua regular administração<br />

e autonomia – isto é, a proteção da sua personalida<strong>de</strong> –, sem se imiscuir in<strong>de</strong>vidamente na esfera <strong>de</strong> direitos <strong>do</strong>s sócios ou<br />

administra<strong>do</strong>res incluí<strong>do</strong>s no polo passivo por força da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração33.<br />

Como o Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil prevê que os sócios (ou a socieda<strong>de</strong> na <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração inversa) são terceiros<br />

intervenientes ou partes (quan<strong>do</strong> o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração é formula<strong>do</strong> na petição inicial), a questão da legitimida<strong>de</strong> estará<br />

superada, mas po<strong>de</strong>rá ser perfeitamente transferida para outro pressuposto <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong> recursal: o interesse recursal. Da<br />

causa <strong>de</strong> pedir recursal da parte que teve sua personalida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rada se concluirá pela presença ou não <strong>de</strong> tal pressuposto.<br />

Deixan<strong>do</strong> claro que a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica po<strong>de</strong> ocorrer no tribunal, o parágrafo único <strong>do</strong> art. 136 <strong>do</strong><br />

Novo CPC prevê o cabimento <strong>de</strong> agravo interno caso a <strong>de</strong>cisão seja proferida pelo relator. Enten<strong>do</strong> que o inci<strong>de</strong>nte ora analisa<strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong> ser instaura<strong>do</strong> em processo <strong>de</strong> competência originária <strong>do</strong> tribunal e também em grau recursal, diante da previsão <strong>do</strong> art. 134,<br />

caput, <strong>do</strong> Novo CPC, que permite sua instauração em todas as fases <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento.<br />

Questão interessante nesse caso surge diante da prolação <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão interlocutória pelo relator sobre questão inci<strong>de</strong>ntal, ou<br />

seja, durante o inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica. Há <strong>do</strong>utrina que enten<strong>de</strong> que, nesse caso, a <strong>de</strong>cisão será<br />

irrecorrível, por analogia à irrecorribilida<strong>de</strong> por agravo <strong>de</strong> instrumento das <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> mesma natureza proferida pelo juízo <strong>de</strong><br />

primeiro grau 34 . Discor<strong>do</strong> <strong>de</strong>sse entendimento diante da literalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> art. 1.021 <strong>do</strong> Novo CPC, que não excluiu tais <strong>de</strong>cisões<br />

monocráticas <strong>do</strong> relator <strong>do</strong> cabimento <strong>do</strong> agravo interno.<br />

12.3.6.<br />

Frau<strong>de</strong> à execução<br />

O art. 137 <strong>do</strong> Novo CPC prevê que, sen<strong>do</strong> acolhi<strong>do</strong> o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, a alienação ou oneração <strong>de</strong> bens, havida em<br />

frau<strong>de</strong> <strong>de</strong> execução, será ineficaz em relação ao requerente. Como se po<strong>de</strong> notar <strong>do</strong> dispositivo legal, somente após o acolhimento<br />

<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração haverá frau<strong>de</strong> à execução, em previsão que aparentemente contraria o disposto no art. 792, § 3.º, <strong>do</strong><br />

Novo CPC, que estabelece haver frau<strong>de</strong> à execução nos casos <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica a partir da citação da<br />

parte cuja personalida<strong>de</strong> se preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar.<br />

Essa contrarieda<strong>de</strong> foi minha primeira impressão, mas numa análise mais cuida<strong>do</strong>sa enten<strong>do</strong> viável a convivência <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is<br />

dispositivos legais. Para tanto, <strong>de</strong>ve-se enten<strong>de</strong>r que o art. 137 <strong>do</strong> Novo CPC não prevê o termo inicial da frau<strong>de</strong> à execução,<br />

limitan<strong>do</strong>-se a afirmar que somente haverá tal espécie <strong>de</strong> frau<strong>de</strong> se o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração for acolhi<strong>do</strong>. A questão <strong>do</strong> termo<br />

inicial <strong>de</strong> tal frau<strong>de</strong>, portanto, seria resolvida exclusivamente pelo § 3.º <strong>do</strong> art. 792 <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

E esse dispositivo não parece ter fixa<strong>do</strong> o termo inicial mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> ao prever que haverá frau<strong>de</strong> à execução a partir da<br />

citação da parte cuja personalida<strong>de</strong> se preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar. Não se trata, portanto, da citação <strong>do</strong>s “réus” no inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, mas sim <strong>do</strong> <strong>de</strong>manda<strong>do</strong> originário35.<br />

O que, entretanto, não parece o mais correto, porque nesse caso cria-se uma presunção absoluta <strong>de</strong> ciência <strong>do</strong>s sujeitos que<br />

serão atingi<strong>do</strong>s pela <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica que não <strong>de</strong>veria existir. A norma protege o cre<strong>do</strong>r, mas <strong>de</strong>ixa o<br />

terceiro em gran<strong>de</strong> risco, bastan<strong>do</strong> pensar na hipótese <strong>de</strong> um terceiro adquirir um imóvel sem qualquer gravame, <strong>de</strong> ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r sem<br />

qualquer restrição, mas que venha, muito tempo <strong>de</strong>pois, a ser atingi<strong>do</strong> pela <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica. É realmente<br />

legítimo falar-se, nesse caso, <strong>de</strong> frau<strong>de</strong> à execução?<br />

O legisla<strong>do</strong>r teria si<strong>do</strong> mais técnico se tivesse se aproveita<strong>do</strong> <strong>do</strong> disposto no art. 134, § 1.º, <strong>do</strong> Novo CPC, que prevê a<br />

comunicação da instauração <strong>do</strong> inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica ao distribui<strong>do</strong>r para as anotações <strong>de</strong>vidas.<br />

Nesse momento, os nomes <strong>do</strong>s sujeitos que po<strong>de</strong>rão ser afeta<strong>do</strong>s pela <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração se tornarão públicos, sen<strong>do</strong> esse o momento<br />

mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> para se configurar a frau<strong>de</strong> à execução. Infelizmente, entretanto, não foi essa a opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r.


12.4. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DE OFÍCIO<br />

Interessante questão atinente à <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica no âmbito <strong>do</strong> direito consumerista diz respeito à<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> ofício. É natural que o exequente, sen<strong>do</strong> o maior interessa<strong>do</strong> em aplicar as chances <strong>de</strong><br />

satisfazer seu direito, o que obterá com a ampliação <strong>de</strong> sujeitos que respondam com seu patrimônio por tal satisfação,<br />

invariavelmente faz pedi<strong>do</strong> nesse senti<strong>do</strong>. Mas a pergunta permanece interessante, ainda que relegada à excepcionalida<strong>de</strong>: não<br />

haven<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> interessa<strong>do</strong>, po<strong>de</strong> o juiz atuar <strong>de</strong> ofício?<br />

Existem <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> Tribunais Estaduais no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> ser viável tal ato <strong>de</strong> ofício pelo juiz:<br />

“Civil. Processual civil. Embargos <strong>de</strong> terceiro. Execução. Parte executada (socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> fato ‘PRO4 Produções’) constituída<br />

irregularmente e representada pelos recorrentes. Utilização <strong>de</strong> CNPJ <strong>de</strong> outra empresa (‘Multi Util Comércio e Representações<br />

LTDA. ME’, representada também pelos recorrentes). Confusão patrimonial que gera obstáculos ao ressarcimento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r.<br />

Desconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica <strong>de</strong>vidamente aplicada pelo juízo <strong>de</strong> origem. Incidência da ‘teoria menor’, que possibilita<br />

a <strong>de</strong>cretação, <strong>de</strong> ofício, da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica. Artigo 28, § 5.º, <strong>do</strong> CDC. Ausência <strong>de</strong> julgamento extra<br />

petita. Legitimida<strong>de</strong> passiva <strong>de</strong> ambos os recorrentes confirmada. Bloqueio <strong>de</strong> numerário <strong>de</strong>vi<strong>do</strong>. Citação válida (F. 11). Recurso<br />

improvi<strong>do</strong>. Sentença mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, com Súmula <strong>de</strong> julgamento servin<strong>do</strong> <strong>de</strong> acórdão, na forma<br />

<strong>do</strong> artigo 46 da Lei n.º 9.099/1995. Honorários advocatícios fixa<strong>do</strong>s em 10% <strong>do</strong> valor da con<strong>de</strong>nação, mais custas processuais, a<br />

cargo <strong>do</strong>s recorrentes” (TJDF – Recurso 2006.01.1.078794-9 – Acórdão 480.320 – Segunda Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais<br />

Cíveis e Criminais <strong>do</strong> DF – Rel. Juiz José Guilherme <strong>de</strong> Souza – DJDFTE 18.02.2011 – p. 214).<br />

“Agravo <strong>de</strong> instrumento. Execução <strong>de</strong> sentença. Desconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica. Impossibilida<strong>de</strong>. Depreen<strong>de</strong>-se <strong>do</strong> art.<br />

28 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, que o juiz po<strong>de</strong>rá, a requerimento ou <strong>de</strong> ofício, <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar a personalida<strong>de</strong> jurídica da<br />

socieda<strong>de</strong> sempre que houver prejuízo ao consumi<strong>do</strong>r, abuso <strong>de</strong> direito, excesso <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, infração da Lei, fato ou ato ilícito ou<br />

violação <strong>do</strong>s estatutos ou contrato social. Mencionada faculda<strong>de</strong> também é conferida nos casos <strong>de</strong> falência, insolvência,<br />

encerramento ou inativida<strong>de</strong> da pessoa jurídica, os quais tenham si<strong>do</strong> causa<strong>do</strong>s pela má administração. Consagrou-se a teor <strong>do</strong> art.<br />

20 <strong>do</strong> Código Civil, que as pessoas jurídicas têm existência distinta da <strong>do</strong>s seus sócios, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong>, pois, ser <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rada a teoria da<br />

personalida<strong>de</strong> jurídica somente em casos extremos, ou seja, quan<strong>do</strong> exaustivamente <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> <strong>do</strong>lo ou frau<strong>de</strong> pratica<strong>do</strong>s pela<br />

pessoa física, que usa como escu<strong>do</strong> a personalida<strong>de</strong> jurídica da empresa. Sem que se prove ter agi<strong>do</strong> as representantes legais ao<br />

arrepio <strong>do</strong>s estatutos sociais, em abuso <strong>de</strong> direito, não é possível atribuir a responsabilida<strong>de</strong> com a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong><br />

jurídica da empresa” (TJMG – Agravo <strong>de</strong> Instrumento 2.0000.00.353986-8/000 – Juiz <strong>de</strong> Fora – Quarta Câmara Civil – Rel. Des.<br />

Alvimar <strong>de</strong> Ávila – j. 12.12.2001 – DJMG 22.12.2001).<br />

O tema <strong>do</strong> reconhecimento <strong>de</strong> ofício <strong>de</strong> matérias referentes ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r será <strong>de</strong>vidamente analisa<strong>do</strong><br />

no Capítulo 13, inclusive haven<strong>do</strong> divergência entre os autores da presente obra quanto à interpretação a ser dada ao art. 1.º da Lei<br />

8.078/1990. Pessoalmente não consigo retirar <strong>do</strong> art. 28, § 5.º, <strong>do</strong> CDC a permissão para a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> ofício, conforme<br />

serviu <strong>de</strong> fundamento <strong>do</strong>s julgamentos menciona<strong>do</strong>s. Se realmente fosse possível a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> ofício, o responsável seria<br />

o art. 1.º <strong>do</strong> CDC, jamais o art. 28, § 5.º, <strong>do</strong> CDC, responsável apenas pela a<strong>do</strong>ção da teoria menor da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração às relações<br />

consumeristas.<br />

Será reafirma<strong>do</strong> no Capítulo 13 que o reconhecimento <strong>de</strong> matérias <strong>de</strong> direito material <strong>de</strong> ofício <strong>de</strong>ve respeitar outros valores<br />

relevantíssimos <strong>do</strong> processo, tais como o princípio da inércia da jurisdição e da correlação entre pedi<strong>do</strong> e sentença. No tocante à<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, entretanto, enten<strong>do</strong> ser possível a atuação <strong>de</strong> ofício pelo juiz, porque vejo nessa forma<br />

<strong>de</strong> esten<strong>de</strong>r a responsabilida<strong>de</strong> patrimonial aos sócios uma matéria <strong>de</strong> direito processual ou, quan<strong>do</strong> menos, uma matéria<br />

processual.<br />

Conforme já tive a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> afirmar, com amparo em tranquila <strong>do</strong>utrina, a responsabilida<strong>de</strong> patrimonial é matéria<br />

exclusivamente processual, porque trata <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> que só será exigida na execução ou falência. Dessa forma, a<br />

responsabilida<strong>de</strong> patrimonial secundária é regulada por norma <strong>de</strong> direito processual, mais precisamente o art. 790 <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Tem-se, portanto, uma matéria <strong>de</strong> direito processual. Partin<strong>do</strong> <strong>de</strong>ssa premissa, é importante se <strong>de</strong>terminar se a matéria processual é<br />

reconhecível <strong>de</strong> ofício ou somente po<strong>de</strong> ser reconhecida mediante a alegação da parte interessada.<br />

Nessa análise, apesar <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r que realmente exista a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> da parte na maioria das vezes, no caso<br />

particular <strong>do</strong> direito consumerista enten<strong>do</strong> ser possível a atuação <strong>de</strong> ofício <strong>do</strong> juiz, justamente em razão <strong>do</strong> previsto no art. 1.º <strong>do</strong><br />

CDC. Nesse caso, não vejo como ofensa ao princípio da inércia da jurisdição e tampouco da correlação, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que na<br />

execução o juiz é provoca<strong>do</strong> a satisfazer o direito <strong>do</strong> exequente, sen<strong>do</strong> justamente isso que tentará fazer ao <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar a<br />

personalida<strong>de</strong> jurídica da socieda<strong>de</strong> empresarial.<br />

Po<strong>de</strong>r-se-ia alegar que, nesse caso, o juiz estaria redirecionan<strong>do</strong> a execução contra novo exequente, já que o pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

exequente não foi dirigi<strong>do</strong> contra o sócio da socieda<strong>de</strong> empresarial. De fato, tal redirecionamento ocorrerá, mas apenas porque o


juiz concluirá que o sócio é parte legítima no processo <strong>de</strong> execução, já que será tão responsável quanto o executa<strong>do</strong>. Esse<br />

litisconsórcio, entretanto, além <strong>de</strong> ulterior, será facultativo, não sen<strong>do</strong> lícito o juiz formar um litisconsórcio iussu iudicis nos<br />

termos <strong>do</strong> art. 91 <strong>do</strong> CPC <strong>de</strong> 1939. Mas no direito consumerista essa matéria po<strong>de</strong>rá ser conhecida <strong>de</strong> ofício, justamente em razão<br />

da previsão <strong>do</strong> art. 1.º da Lei 8.078/1990.<br />

Conforme já analisa<strong>do</strong>, o Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil prevê um inci<strong>de</strong>nte processual para a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da<br />

personalida<strong>de</strong> jurídica, finalmente regulamentan<strong>do</strong> seu procedimento. O art. 133, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, prevê expressamente que a<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> da parte ou <strong>do</strong> Ministério Público, com o que afasta a possibilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> o juiz instaurar o inci<strong>de</strong>nte ora analisa<strong>do</strong> <strong>de</strong> ofício36. Já era nesse senti<strong>do</strong> a previsão <strong>do</strong> art. 50 <strong>do</strong> CC.<br />

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MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, <strong>Daniel</strong> Francisco. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2008. p. 606; ZAVASCKI,<br />

Teori Albino. Processo <strong>de</strong> execução: parte geral. 3. ed. São Paulo: RT, 2004. p. 190; FUX, Luiz. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 2. ed. Rio<br />

<strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2004. p. 1.284. Contra, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ser instituto <strong>de</strong> direito material: GRECO, Leonar<strong>do</strong>. O processo <strong>de</strong> execução.<br />

Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 1999. n. 6.3, p. 7-8.<br />

THEODORO JR., Humberto. Processo <strong>de</strong> execução e cumprimento <strong>de</strong> sentença. 25. ed. São Paulo: Leud, 2008. n. 103, p. 160; GRECO,<br />

Leonar<strong>do</strong>. O processo <strong>de</strong> execução. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 1999. n. 6.3, p. 6.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2004. v. IV, n. 1.523, p. 325.<br />

FARIAS-ROSENVALD, Chaves <strong>de</strong>. <strong>Direito</strong>, n. 10.10.7, p. 453.<br />

THEODORO JR., Humberto. Processo <strong>de</strong> execução e cumprimento <strong>de</strong> sentença. 25. ed. São Paulo: Leud, 2008. n. 104, p. 161; ZAVASCKI,<br />

Teori Albino. Processo <strong>de</strong> execução: parte geral. 3. ed. São Paulo: RT, 2004. p. 193-195; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, <strong>Daniel</strong><br />

Francisco. Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2008. p. 606.<br />

Enuncia<strong>do</strong> 52 da ENFAM: “A citação a que se refere o art. 792, § 3º, <strong>do</strong> CPC/2015 (frau<strong>de</strong> à execução) é a <strong>do</strong> executa<strong>do</strong> originário, e não<br />

aquela prevista para o inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica (art. 135 <strong>do</strong> CPC/2015) ”. Contra: MEDINA, José<br />

Miguel Garcia. Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>, São Paulo: RT, 2015. p. 1070.<br />

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonar<strong>do</strong> Ferres da Silva; MELO, Rogério Licastro Torres <strong>de</strong>.<br />

Primeiros comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015. p. 1.140.<br />

ASSIS, Araken <strong>de</strong>. Manual <strong>do</strong>s recursos. 2. ed. São Paulo: RT, 2008. n. 36.3.1, p. 206; THEODORO JR., Humberto. Processo <strong>de</strong> execução e<br />

cumprimento <strong>de</strong> sentença. 25. ed. São Paulo: Leud, 2008. n. 106, p. 164.<br />

STJ – 4ª Turma – AgRg no AREsp 462.831/PR – rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 19.08.2014 – DJe 25.08.2014.<br />

MEDINA, José Miguel Garcia. Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2015. p. 237.<br />

Enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> tratar-se <strong>de</strong> ação inci<strong>de</strong>ntal, CAMARGO, Luiz Henrique Volpe. In: CABRAL, Antonio <strong>do</strong> Passo e CRAMER, Ronal<strong>do</strong> (Coords.)<br />

Comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2015. p. 235.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Desconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica, frau<strong>de</strong> e ônus da prova. Fundamentos <strong>do</strong> processo civil<br />

mo<strong>de</strong>rno. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 1.194.<br />

STJ – 4.ª Turma – REsp 1.096.604/DF – rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 02.08.2012 – DJe 16.10.2012.<br />

Informativo 513/STJ – 4.ª Turma – AgRg no REsp 1.229.579/MG – rel. Min. Raul Araújo – j. 18.12.2012.<br />

Informativo 440/STJ – 3.ª Turma – REsp 948.117/MS – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 22.06.2010.<br />

STJ – REsp 1.180.191/RJ – rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 05.04.2011.<br />

YARSHELL <strong>Flávio</strong> Luiz. In: CABRAL, Antonio <strong>do</strong> Passo e CRAMER, Ronal<strong>do</strong> (Coords.) Comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro: Forense, 2015. p. 234; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonar<strong>do</strong> Ferres da Silva;<br />

MELO, Rogério Licastro Torres <strong>de</strong>. Primeiros comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015. p. 252.<br />

DIDIER JR., Fredie. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 7. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2007. p. 519. Contra: MARINONI, Luiz Guilherme;<br />

ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, <strong>Daniel</strong>. Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>, São Paulo: RT, 2015, p. 208.<br />

YARSHELL, <strong>Flávio</strong> Luiz. In: CABRAL, Antonio <strong>do</strong> Passo e CRAMER, Ronal<strong>do</strong> (Coords.) Comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro: Forense, 2015. p. 233. Contra: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonar<strong>do</strong> Ferres da<br />

Silva; MELO, Rogério Licastro Torres <strong>de</strong>. Primeiros comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015.<br />

p. 252.<br />

YARSHELL, <strong>Flávio</strong> Luiz. In: CABRAL, Antonio <strong>do</strong> Passo e CRAMER, Ronal<strong>do</strong> (Coords.) Comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro: Forense, 2015. p. 238.<br />

YARSHELL, <strong>Flávio</strong> Luiz. In: CABRAL, Antonio <strong>do</strong> Passo e CRAMER, Ronal<strong>do</strong> (Coords.) Comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro: Forense, 2015. p. 239.<br />

CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2015. p. 98; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO,


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Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonar<strong>do</strong> Ferres da Silva; MELO, Rogério Licastro Torres <strong>de</strong>. Primeiros comentários ao Novo Código <strong>de</strong><br />

Processo Civil artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015. p. 253.<br />

THEODORO JR. Processo <strong>de</strong> execução e cumprimento <strong>de</strong> sentença. 25. ed. São Paulo: Leud, 2008. p. 164: ZAVASCKI, Teori Albino. Processo<br />

<strong>de</strong> execução. São Paulo: RT. p. 199.<br />

STJ – 4.ª Turma – RMS 29.697/RS – rel. Min. Raul Araújo – j. 23.04.2013 – DJe 01.08.2013.<br />

STJ – 4.ª Turma – REsp 686.112/RJ – rel. Min. João Otávio <strong>de</strong> Noronha – j. 08.04.2008 – DJe 28.04.2008.<br />

YARSHELL, <strong>Flávio</strong> Luiz. In: CABRAL, Antonio <strong>do</strong> Passo e CRAMER, Ronal<strong>do</strong> (Coords.) Comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro: Forense, 2015. p. 239; CAMARGO, Luiz Henrique Volpe. In: CABRAL, Antonio <strong>do</strong> Passo e CRAMER, Ronal<strong>do</strong> (Coords.)<br />

Comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2015. p. 240; DIDIER JR., Fredie. Curso <strong>de</strong> direito processual civil.<br />

7. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2007; CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2015. p. 105 e p. 521.<br />

STJ – 4.ª Turma – REsp 1.182.620/SP – rel. Min. Raul Araújo – j. 10.12.2013, DJe 04.02.2014.<br />

Informativo 544/STJ – 3.ª Turma – REsp 1.421.464/SP – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 24.04.2014.<br />

LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo <strong>de</strong> execução. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1963. p. 68.<br />

ASSIS, Araken <strong>de</strong>. Manual <strong>do</strong>s recursos. 2. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 398-399; FUX, Luiz. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 2. ed. Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro: Forense, 2004. p. 1.288.<br />

STJ – 4.ª Turma – REsp 1.096.604/DF – rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 02.08.2012 – DJe 16.10.2012.<br />

STJ – 4.ª Turma – AgRg no Ag 1.378.143/SP – rel. Min. Raul Araújo – j. 13.05.2014 – DJe 06.06.2014.<br />

Informativo 530/STJ – 1.ª Seção – REsp 1.347.627/SP – rel. Min. Ari Pargendler – j. 09.10.2013.<br />

Informativo 544/STJ – 3.ª Turma – REsp 1.421.464/SP – rel. Min. Nancy Andrighi – j. 24.04.2014.<br />

CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2015. p. 104.<br />

Enuncia<strong>do</strong> 52 da ENFAM: “A citação a que se refere o art. 792, § 3.º, <strong>do</strong> CPC/2015 (frau<strong>de</strong> à execução) é a <strong>do</strong> executa<strong>do</strong> originário, e não<br />

aquela prevista para o inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica (art. 135 <strong>do</strong> CPC/2015)”. Contra: MEDINA, José Miguel<br />

Garcia. Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>. São Paulo: RT, 2015. p. 1070.<br />

YARSHELL, <strong>Flávio</strong> Luiz. In: CABRAL, Antonio <strong>do</strong> Passo e CRAMER, Ronal<strong>do</strong> (Coords.) Comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil. Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro: Forense, 2015. p. 234; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonar<strong>do</strong> Ferres da Silva;<br />

MELO, Rogério Licastro Torres <strong>de</strong>. Primeiros comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015. p. 252;<br />

DIDIER JR., Fredie. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 7. ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2007. p. 519. Contra: MARINONI, Luiz Guilherme;<br />

ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, <strong>Daniel</strong>. Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil comenta<strong>do</strong>, São Paulo: RT, 2015.


ORDEM PÚBLICA E TUTELA PROCESSUAL DO<br />

CONSUMIDOR<br />

Sumário: 13.1. Matérias <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa – 13.2. Preclusão temporal – 13.3. Preclusão consumativa – 13.4. Objeções e<br />

natureza <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública das normas consumeristas.<br />

13.1.<br />

MATÉRIAS DE DEFESA<br />

Ainda que o termo exceção seja invariavelmente utiliza<strong>do</strong> como sinônimo <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa, existe uma clássica classificação das<br />

matérias <strong>de</strong>fensivas que as divi<strong>de</strong> em exceções e objeções. Enquanto a primeira só po<strong>de</strong> ser conhecida pelo juiz em sua <strong>de</strong>cisão se<br />

for alegada pela parte interessada, a segunda po<strong>de</strong> ser conhecida <strong>de</strong> ofício pelo juiz, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente, portanto, <strong>de</strong> alegação da<br />

parte. Segun<strong>do</strong> a melhor <strong>do</strong>utrina, trata-se <strong>de</strong> classificação surgida na Ida<strong>de</strong> Média:<br />

“A partir da Ida<strong>de</strong> Média, começou a ser feita uma distinção entre exceções e objeções. As primeiras eram matérias que somente o<br />

réu podia alegar; eram <strong>de</strong>fesas indiretas cuja arguição cabia exclusivamente ao réu, sen<strong>do</strong> veda<strong>do</strong>, portanto, o seu reconhecimento<br />

<strong>de</strong> ofício pelo juiz. As segundas eram matérias <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa que podiam ser conhecidas pelo magistra<strong>do</strong> ex officio”1.<br />

A exceção po<strong>de</strong> ser processual, como ocorre com a incompetência relativa e com a convenção <strong>de</strong> arbitragem, matérias que só<br />

po<strong>de</strong>rão ser conhecidas se alegadas tempestivamente pela parte interessada, salvo a excepcional hipótese prevista pelo art. 63, §<br />

3.º, <strong>do</strong> Novo CPC, que admite o reconhecimento da incompetência territorial <strong>de</strong> ofício pelo juiz. Po<strong>de</strong>, também, ser substancial,<br />

como ocorre, por exemplo, com o direito <strong>de</strong> retenção e a exceção <strong>de</strong> contrato não cumpri<strong>do</strong>2.<br />

Também a objeção po<strong>de</strong> ser processual ou substancial. No primeiro caso tem-se, por exemplo, todas as <strong>de</strong>fesas preliminares<br />

previstas pelo art. 337 <strong>do</strong> Novo CPC, salvo a convenção <strong>de</strong> arbitragem. No segun<strong>do</strong> caso tem-se, por exemplo, a prescrição, que<br />

po<strong>de</strong> ser conhecida <strong>de</strong> ofício pelo juiz nos termos <strong>do</strong> art. 487, parágrafo único <strong>do</strong> Novo CPC, bem como a <strong>de</strong>cadência legal.<br />

A distinção entre exceção e objeção encontra importante divisor <strong>de</strong> águas nas matérias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, sen<strong>do</strong> tradicional<br />

associar esse tipo <strong>de</strong> matéria à atuação oficiosa <strong>do</strong> juiz no caso concreto 3 . O problema, entretanto, é que existem matérias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m<br />

pública <strong>de</strong> natureza processual e substancial, sen<strong>do</strong> divergente a <strong>do</strong>utrina a respeito <strong>de</strong> tratá-las <strong>de</strong> forma homogênea ou<br />

heterogênea.<br />

O art. 1.º <strong>do</strong> CDC prevê que todas as normas contidas na Lei 8.078/1990 são <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública e interesse social, sen<strong>do</strong><br />

especialmente interessantes os questionamentos a respeito da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se tratar a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pleno direito das cláusulas<br />

contratuais previstas no art. 51 <strong>do</strong> CDC, como objeções substanciais no processo. Antes, entretanto, <strong>de</strong> enfrentar o problema, é<br />

importante uma <strong>de</strong>scrição das consequências processuais <strong>de</strong> se ter tal matéria como exceção ou objeção substancial.<br />

13.2.<br />

PRECLUSÃO TEMPORAL<br />

Além <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>do</strong> juiz conhecer ou não <strong>de</strong> ofício a matéria, a distinção traz outra interessante consequência processual, qual<br />

seja a existência ou não <strong>de</strong> preclusão a respeito da matéria <strong>de</strong>fensiva. Nas exceções, enten<strong>de</strong>-se que existe preclusão, <strong>de</strong> forma que<br />

cabe à parte interessada alegar a matéria no momento procedimental a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>, sob pena <strong>de</strong> a matéria não po<strong>de</strong>r ser posteriormente


alegada. Nas objeções, como a matéria po<strong>de</strong> ser conhecida <strong>de</strong> ofício, existe a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alegação a qualquer tempo <strong>do</strong><br />

procedimento, com ressalva <strong>do</strong>s recursos excepcionais, tema trata<strong>do</strong> a seguir. Significa dizer que as exceções sofrem preclusão<br />

temporal, inaplicável às objeções.<br />

Diz-se preclusão temporal quan<strong>do</strong> um ato não pu<strong>de</strong>r ser pratica<strong>do</strong> em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> ter <strong>de</strong>corri<strong>do</strong> o prazo previsto para sua prática<br />

sem a manifestação da parte. Ao <strong>de</strong>ixar a parte interessada <strong>de</strong> realizar o ato <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> prazo previsto, ele não mais po<strong>de</strong>rá ser<br />

realiza<strong>do</strong>, já que extemporâneo. Ten<strong>do</strong> o réu quinze dias para contestar, e as partes cinco dias para falar nos autos, por exemplo,<br />

não respeita<strong>do</strong> o lapso temporal traça<strong>do</strong> pela lei, estarão impedi<strong>do</strong>s <strong>de</strong> praticar o ato.<br />

As exceções, portanto, <strong>de</strong>vem ser arguidas na primeira oportunida<strong>de</strong> em que a parte interessada em seu reconhecimento se<br />

manifestar nos autos, regra preclusiva não aplicável às objeções, nos termos <strong>do</strong> art. 278 <strong>do</strong> Novo CPC. A afirmação <strong>de</strong> que a<br />

objeção po<strong>de</strong> ser alegada a qualquer momento <strong>do</strong> processo, entretanto, <strong>de</strong>ve ser vista com reservas no tocante aos recursos<br />

excepcionais.<br />

A <strong>do</strong>utrina parece estar <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> que a matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública po<strong>de</strong>rá sempre ser apreciada pelos juízes <strong>do</strong>s Tribunais <strong>de</strong><br />

segun<strong>do</strong> grau quan<strong>do</strong> fizer parte <strong>do</strong> objeto <strong>do</strong> recurso. Nenhum problema haveria, já que, <strong>de</strong>volvida a matéria por meio <strong>do</strong> recurso,<br />

o Tribunal não teria tão somente liberda<strong>de</strong> para apreciá-la, mas sim obrigação, sob pena <strong>de</strong> proferir uma <strong>de</strong>cisão citra petita. No<br />

tocante aos recursos excepcionais, entretanto, há o problema <strong>de</strong> alegação originária à luz da exigência <strong>do</strong> prequestionamento.<br />

Para os recursos dirigi<strong>do</strong>s aos tribunais <strong>de</strong> segun<strong>do</strong> grau, e mesmo no caso <strong>do</strong> recurso ordinário constitucional para os<br />

tribunais superiores4, a ausência <strong>de</strong> exigência <strong>de</strong> prequestionamento das matérias alegadas em se<strong>de</strong> recursal permite à parte alegar<br />

em tais recursos uma objeção, seja ela <strong>de</strong> natureza processual ou material. Na realida<strong>de</strong>, mesmo que a parte não alegue sem seu<br />

recurso tal matéria, o tribunal po<strong>de</strong>rá conhecê-la <strong>de</strong> ofício.<br />

Não se tratará mais <strong>do</strong> efeito <strong>de</strong>volutivo, que exige a iniciativa da parte para que a matéria possa ser reexaminada pelo órgão<br />

jurisdicional competente para o julgamento <strong>do</strong> recurso, mas sim <strong>do</strong> efeito translativo, reflexo <strong>do</strong> princípio inquisitivo 5 . A aplicação<br />

<strong>de</strong> tal efeito aos recursos ordinários mostra-se incontestável, sen<strong>do</strong> praticamente unânime a <strong>do</strong>utrina nesse senti<strong>do</strong>, embora nem<br />

sempre com os mesmos fundamentos, já que, para parcela da <strong>do</strong>utrina, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o tribunal conhecer matérias <strong>de</strong> ofício<br />

<strong>de</strong>riva da profundida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>volução, e não <strong>do</strong> efeito translativo, efeito consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> inexistente por essa parcela <strong>do</strong>utrinária6.<br />

In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> efeito que permita ao tribunal o conhecimento da objeção <strong>de</strong> ofício, o que importa para o presente<br />

estu<strong>do</strong> é que, sen<strong>do</strong> admissível o reconhecimento ex officio, naturalmente não se po<strong>de</strong>rá falar em preclusão temporal, admitin<strong>do</strong>-se<br />

à parte a alegação da objeção nas razões recursais ou mesmo antes <strong>de</strong> seu julgamento, por meio <strong>de</strong> mera petição.<br />

O gran<strong>de</strong> problema quanto à aplicação <strong>do</strong> efeito translativo diz respeito aos recursos extraordinário e especial. Há divergência<br />

<strong>do</strong>utrinária e jurispru<strong>de</strong>ncial. Essa divergência naturalmente refletirá na possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a parte alegar a objeção originariamente<br />

nesses recursos extraordinários, já que, sen<strong>do</strong> admissível o conhecimento <strong>de</strong> ofício pelo tribunal, não haverá preclusão temporal e a<br />

parte po<strong>de</strong>rá alegar a matéria como é admiti<strong>do</strong> nos recursos ordinários.<br />

A corrente que enten<strong>de</strong> ser incabível ao Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça ou Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral conhecer <strong>de</strong> ofício matéria<br />

<strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública encontra fundamento para tal posicionamento na ausência <strong>de</strong> prequestionamento <strong>de</strong> tal matéria, o que impediria<br />

sua análise pelos órgãos <strong>de</strong> superposição. Não ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> essa questão enfrentada e tampouco <strong>de</strong>cidida pelo Tribunal, não po<strong>de</strong>ria<br />

ser objeto <strong>de</strong> apreciação pelos órgãos <strong>de</strong> superposição.<br />

Nas palavras <strong>de</strong> Nelson Nery Jr., “não há o efeito translativo nos recursos excepcionais (extraordinário, especial e embargos <strong>de</strong><br />

divergência) porque seus regimes jurídicos estão no texto constitucional que diz serem cabíveis das causas <strong>de</strong>cididas pelos<br />

Tribunais inferiores (arts. 102, n. III, e 105, n. III, CF). Caso o tribunal não tenha se manifesta<strong>do</strong> sobre a questão <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública,<br />

o acórdão somente po<strong>de</strong>rá ser impugna<strong>do</strong> por ação autônoma (ação rescisória), já que inci<strong>de</strong>m na hipótese os verbetes n. os 282 e<br />

356 da Súmula <strong>do</strong> STF, que exigem o prequestionamento da questão constitucional ou fe<strong>de</strong>ral suscitada, para que seja conheci<strong>do</strong> o<br />

recurso constitucional excepcional. Além disso, a lei autoriza o exame <strong>de</strong> ofício das questões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública a qualquer tempo e<br />

grau <strong>de</strong> jurisdição (art. 485, § 3.º, Novo CPC). Ocorre que a instância <strong>do</strong>s recursos extraordinário e especial não é ordinária, não se<br />

lhe aplican<strong>do</strong> o texto legal referi<strong>do</strong>”7.<br />

Da mesma forma, <strong>de</strong> nada adiantaria à parte alegar a objeção originariamente nesses recursos porque, nesse caso, também<br />

faltará o prequestionamento da matéria. Esse é o entendimento a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pelo Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral no tocante à análise <strong>de</strong><br />

matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública originariamente alegada pelo recorrente em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso extraordinário:<br />

“Repercussão geral. Vícios processuais e formais que impe<strong>de</strong>m a regular formação e tramitação <strong>do</strong> recurso. Prejuízo <strong>do</strong> exame das<br />

questões <strong>de</strong> fun<strong>do</strong>. Invocação <strong>do</strong> <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> conhecimento por ofício <strong>de</strong> matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública e social. Não cabimento no exame<br />

<strong>do</strong> recurso extraordinário. Pretensão <strong>de</strong> anular a cobrança <strong>de</strong> conta <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> energia elétrica. Incontáveis argumentos.<br />

Argumento parcial relativo ao ICMS. Imunida<strong>de</strong> tributária. Razões <strong>de</strong> agravo que não atacam fundamento suficiente da <strong>de</strong>cisão<br />

agravada. Inépcia. 1. A existência <strong>de</strong> vícios processuais e formais que tornam inviável o conhecimento e o julgamento <strong>de</strong> recurso


prejudica o exame da matéria <strong>de</strong> fun<strong>do</strong>, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que é <strong>de</strong>snecessário aguardar o julgamento <strong>de</strong> matéria similar à qual foi<br />

reconhecida a repercussão geral (art. 323/RISTF). 2. A invocação <strong>de</strong> normas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública ou social não supera <strong>de</strong>ficiência<br />

recursal, como a falta <strong>de</strong> prequestionamento ou a omissão <strong>do</strong> argumento nas razões recursais (art. 317, § 1.º <strong>do</strong> RISTF). 3. As razões<br />

<strong>de</strong> agravo regimental não atacam um <strong>do</strong>s fundamentos suficientes em si para manter a <strong>de</strong>cisão agravada, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a relação<br />

mantida entre a cooperativa <strong>de</strong> eletrificação e o município resolvia-se no plano cível ou no plano administrativo, e não em termos<br />

tributários. Insistência na tese tributária da imunida<strong>de</strong>. Inépcia. Agravo regimental ao qual se nega provimento” (STF – AI-AgR<br />

601.767/SC – Segunda Turma – Rel. Min. Joaquim Barbosa – j. 15.02.2011 – DJe 23.03.2011) 8 .<br />

Existe uma segunda corrente <strong>do</strong>utrinária, que parece ser a mais a<strong>de</strong>quada, que aponta o prequestionamento apenas como um<br />

requisito especial <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> recurso, que tem como característica seu conhecimento, e não o julgamento <strong>de</strong> seu mérito.<br />

Dessa forma, uma vez preenchi<strong>do</strong> o requisito <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong>, ou seja, prequestionada a matéria objeto <strong>do</strong>s recursos, o mesmo<br />

será conheci<strong>do</strong> pelos órgãos <strong>de</strong> superposição, e após esse momento, aplica-se <strong>de</strong> forma irrestrita o efeito translativo <strong>do</strong> recurso.<br />

Tal entendimento acaba por exigir tanto o prequestionamento quanto a aplicação <strong>do</strong> efeito translativo. As matérias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m<br />

pública, portanto, somente po<strong>de</strong>rão ser conhecidas, ainda que ex officio, se o recurso for conheci<strong>do</strong>, ou seja, se o recurso especial<br />

ou extraordinário tiver como objeto justamente a pretensa ofensa a uma matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública que não tenha si<strong>do</strong> discutida e<br />

<strong>de</strong>cidida pelo Tribunal, o recurso não <strong>de</strong>verá ser conheci<strong>do</strong>, e assim tal matéria jamais chegará a ser analisada9.<br />

A<strong>do</strong>tada essa teoria, a parte po<strong>de</strong>rá alegar uma objeção originariamente em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso excepcional, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que também<br />

alegue outra matéria fe<strong>de</strong>ral que tenha si<strong>do</strong> prequestionada, ou seja, que tenha si<strong>do</strong> objeto <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão no pronunciamento judicial<br />

impugna<strong>do</strong>. É nesse senti<strong>do</strong> o entendimento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“Administrativo. Processual civil. Agravo regimental no recurso especial. Servi<strong>do</strong>r público. Violação aos arts. 2.º e 47 <strong>do</strong> CPC.<br />

Prequestionamento. Ausência. Conhecimento <strong>de</strong> ofício. Impossibilida<strong>de</strong>. Agravo não provi<strong>do</strong>. 1.’O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça,<br />

com base no art. 257 <strong>de</strong> seu Regimento Interno e na Súmula 456/STF, tem-se posiciona<strong>do</strong> no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que, supera<strong>do</strong> o juízo <strong>de</strong><br />

admissibilida<strong>de</strong> e conheci<strong>do</strong> por outros fundamentos, o recurso especial produz o efeito translativo, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a permitir o exame <strong>de</strong><br />

ofício das matérias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública’ (AgRg nos EDcl na DESIS no REsp 1.123.252/SP – Segunda Turma – Rel. Min. Mauro<br />

Campbell Marques – DJe 15.10.2010). 2. ‘É entendimento pacífico nesta Corte Superior que quan<strong>do</strong> a matéria controvertida não foi<br />

apreciada pela instância originária, ainda que tenha surgi<strong>do</strong> no próprio acórdão recorri<strong>do</strong>, obsta-se o conhecimento <strong>do</strong> apelo<br />

extremo’ (REsp 842.056/PR – Primeira Turma – Rel. Min. Luiz Fux – DJe 19.06.2008). 3. Sen<strong>do</strong> inadmissível o recurso especial,<br />

torna-se inviável o exame, <strong>de</strong> ofício, da tese <strong>de</strong> afronta aos arts. 2.º e 47 <strong>do</strong> CPC. 4. Agravo regimental não provi<strong>do</strong>” (STJ – AgRg<br />

no REsp 1.209.528/MG – Primeira Turma – j. 03.02.2011 – DJe 18.02.2011).<br />

Ressalte-se que a mera alegação originária <strong>de</strong> matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso especial, <strong>de</strong>sacompanhada <strong>de</strong> outra<br />

matéria fe<strong>de</strong>ral que tenha si<strong>do</strong> efetivamente <strong>de</strong>cidida no acórdão recorri<strong>do</strong>, não admite seu reconhecimento pelo Superior Tribunal<br />

<strong>de</strong> Justiça10.<br />

A terceira corrente, <strong>de</strong>fendida por número consi<strong>de</strong>ravelmente pequeno <strong>de</strong> <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res, é aquela que sustenta o<br />

reconhecimento da matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública em qualquer circunstância, ainda que não exista prequestionamento, ao menos não<br />

explícito. Receben<strong>do</strong> o recurso especial ou extraordinário, ainda que não presente o requisito <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> recurso,<br />

po<strong>de</strong>ria o juiz conhecê-lo apenas para acolher ex officio uma matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública 11 .<br />

Ao <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r tal tese, Nelson Luiz Pinto afirma que “as condições da ação e os pressupostos processuais <strong>de</strong>vem, necessária e<br />

obrigatoriamente, ser objeto <strong>de</strong> exame ex officio por qualquer juiz ou Tribunal, antes <strong>de</strong> se a<strong>de</strong>ntrar no julgamento <strong>do</strong> mérito,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> ter havi<strong>do</strong> ou não requerimento das partes. Assim, po<strong>de</strong>-se dizer que essas matérias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública<br />

estariam, por força <strong>de</strong> lei, implicitamente prequestionadas em toda e qualquer <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> mérito” 12 .<br />

A<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> esse entendimento, não admiti<strong>do</strong> em nenhum <strong>do</strong>s tribunais superiores, seria possível a parte alegar somente uma<br />

objeção <strong>de</strong> forma originária em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso especial ou extraordinário, e ainda assim, pela mera possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecimento<br />

<strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> matéria <strong>de</strong> ofício, o tribunal a reconheceria.<br />

O panorama jurispru<strong>de</strong>ncial forma<strong>do</strong> na vigência <strong>do</strong> CPC/1973 ten<strong>de</strong> a ser modifica<strong>do</strong> em razão <strong>do</strong> parágrafo único <strong>do</strong> art.<br />

1.034 <strong>do</strong> Novo CPC. Segun<strong>do</strong> a melhor <strong>do</strong>utrina, o dispositivo consagra a geração <strong>do</strong> efeito translativo aos recursos excepcionais<br />

ao prever a possibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> tribunal superior, após a admissão <strong>do</strong> recurso especial ou extraordinário, <strong>de</strong> conhecer fundamentos não<br />

alega<strong>do</strong>s para a solução <strong>do</strong> capítulo impugna<strong>do</strong> 13 .<br />

13.3.<br />

PRECLUSÃO CONSUMATIVA<br />

Além <strong>de</strong> as objeções po<strong>de</strong>rem ser conhecidas <strong>de</strong> ofício, e em razão disso não suportarem a preclusão temporal, a <strong>de</strong>cisão<br />

judicial que <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> a respeito <strong>de</strong> uma objeção não suporta preclusão consumativa, sen<strong>do</strong> admissível ao próprio juízo que altere sua<br />

<strong>de</strong>cisão sobre aquela matéria, mediante provocação da parte interessada ou mesmo <strong>de</strong> ofício.


A questão <strong>do</strong> reconhecimento <strong>de</strong> matérias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública <strong>de</strong> ofício é tema que sempre <strong>de</strong>spertou a atenção da <strong>do</strong>utrina<br />

processualista. Fazen<strong>do</strong> a análise sob a ótica das nulida<strong>de</strong>s, dividin<strong>do</strong>-as em absolutas, relativas e anulabilida<strong>de</strong>s, Galeno Lacerda<br />

conclui que “a preclusão no curso <strong>do</strong> processo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>, em última análise, da disponibilida<strong>de</strong> da parte em relação à matéria<br />

<strong>de</strong>cidida. Se indisponível a questão, a ausência <strong>de</strong> recurso não impe<strong>de</strong> o reexame pelo juiz. Se disponível, a falta <strong>de</strong> impugnação<br />

importa concordância tácita à <strong>de</strong>cisão. Firma-se o efeito preclusivo não só para as partes, mas também para o juiz, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

que vedada se torna a retratação”14.<br />

Uma vez <strong>de</strong>cidida a questão em sentença, não haverá possibilida<strong>de</strong> material <strong>de</strong> o juiz reconsi<strong>de</strong>rar sua <strong>de</strong>cisão, reputan<strong>do</strong> que,<br />

não haven<strong>do</strong> recurso, a <strong>de</strong>cisão transitará em julga<strong>do</strong> e, sen<strong>do</strong> recorrida a sentença, o juízo <strong>de</strong> retratação é excepcional, sen<strong>do</strong><br />

cabível somente nas hipóteses <strong>de</strong> in<strong>de</strong>ferimento da petição inicial (art. 331 <strong>do</strong> Novo CPC) e julgamento liminar <strong>de</strong> improcedência<br />

(art. 332 <strong>do</strong> Novo CPC). O tema é mais interessante quan<strong>do</strong> aplica<strong>do</strong> às <strong>de</strong>cisões interlocutórias irrecorridas.<br />

É da própria concepção da preclusão temporal a conclusão <strong>de</strong> que as <strong>de</strong>cisões interlocutórias não recorridas impossibilitam<br />

posterior discussão. Se a parte interessada não exerceu o ônus <strong>de</strong> recorrer, <strong>de</strong>ve então sofrer as consequências prejudiciais <strong>de</strong> sua<br />

omissão. Com relação a isso, nenhuma dúvida po<strong>de</strong> ser posta, sob pena <strong>de</strong> extinção <strong>do</strong> próprio instituto da preclusão.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, tratan<strong>do</strong> da temática apresentada, Arruda Alvim conclui que “com recurso especificamente estabeleci<strong>do</strong> para as<br />

hipóteses <strong>de</strong> inconformismo com a mesma, <strong>de</strong>corre imediatamente a consequência <strong>de</strong> que, em princípio e como regra geral, o que<br />

foi objeto <strong>de</strong> apreciação no sanea<strong>do</strong>r sofre preclusão. Significa-se com isto que a matéria expressamente <strong>de</strong>cidida no sanea<strong>do</strong>r não<br />

po<strong>de</strong>rá – salvo recurso – ser reexaminada no processo”15.<br />

A <strong>do</strong>utrina majoritária é concor<strong>de</strong> com tal conclusão, já que, sempre que se <strong>de</strong>bate acerca da ausência <strong>de</strong> efeito preclusivo <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>cisão interlocutória, as questões na esfera <strong>de</strong> disponibilida<strong>de</strong> da parte não são objeto <strong>de</strong> controvérsia, e sim aquelas matérias<br />

imperativas, <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, que se situam, portanto, acima <strong>do</strong> interesse das partes e localizam-se, na verda<strong>de</strong>, no campo <strong>do</strong><br />

interesse da própria prestação jurisdicional 16 . Também esse parece ser o entendimento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, que vem<br />

quase uniformemente <strong>de</strong>cidin<strong>do</strong> pela não preclusão das questões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública 17 .<br />

13.4.<br />

OBJEÇÕES E NATUREZA DE ORDEM PÚBLICA DAS NORMAS<br />

CONSUMERISTAS<br />

Conforme já afirma<strong>do</strong>, o art. 1.º da Lei 8.078/1990 prevê que todas as normas previstas no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r<br />

são <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública e <strong>de</strong> interesse social. A questão que <strong>de</strong>ve ser respondida é se <strong>de</strong>vem ser tratadas no processo como objeções<br />

substanciais, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong>, nesse caso, serem conhecidas <strong>de</strong> ofício, não suportan<strong>do</strong> a preclusão.<br />

Não são poucos os <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m esse tratamento processual para as matérias consumeristas:<br />

“Tanto assim que toda a matéria constante da legislação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve ser examinada pelo juiz ex officio,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> requerimento expresso da parte. Além <strong>do</strong> que, a respeito <strong>de</strong>sta matéria <strong>de</strong>batida judicialmente, não ocorre<br />

preclusão, circunstância que permite a sua apreciação a qualquer tempo e grau <strong>de</strong> jurisdição. E por se tratar <strong>de</strong> matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m<br />

pública, aberta está ao juízo recursal a possibilida<strong>de</strong> até mesmo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir com a reformatio in pejus, justamente em atenção a este<br />

estágio na hierarquia normativa <strong>do</strong> qual goza o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r”18.<br />

O tema tem enorme interesse prático no que se refere às cláusulas contratuais abusivas, porque a<strong>do</strong>tada a tese ora exposta a<br />

nulida<strong>de</strong> po<strong>de</strong>ria ser <strong>de</strong>cretada <strong>de</strong> ofício pelo juiz, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da provocação da parte nesse senti<strong>do</strong>. Para Nelson Nery Jr.,<br />

“no regime jurídico <strong>do</strong> CDC, as cláusulas abusivas são nulas <strong>de</strong> pleno direito porque contrariam a or<strong>de</strong>m pública <strong>de</strong> proteção ao<br />

consumi<strong>do</strong>r. Isso quer dizer que as nulida<strong>de</strong>s po<strong>de</strong>m ser reconhecidas a qualquer tempo e grau <strong>de</strong> jurisdição, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> o juiz ou<br />

tribunal pronunciá-las ex officio, porque normas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública insuscetíveis <strong>de</strong> preclusão” 19 .<br />

Registre-se, entretanto, a existência <strong>de</strong> corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que, apesar da natureza <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública das normas<br />

consumeristas, elas não serão tratadas como objeções substanciais no processo, caben<strong>do</strong> à parte interessada sua alegação<br />

tempestiva sob pena <strong>de</strong> preclusão, além <strong>de</strong> não ser permiti<strong>do</strong> ao juízo seu reconhecimento <strong>de</strong> ofício.<br />

Nas palavras <strong>de</strong> Ricar<strong>do</strong> Aprigliano, “a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cláusulas em contratos <strong>de</strong> consumo configura matéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, o<br />

que significa que as partes não po<strong>de</strong>m celebrar negócios que contenham conteú<strong>do</strong>s veda<strong>do</strong>s pela lei, que a interpretação <strong>de</strong>stes<br />

contratos será sempre realizada visan<strong>do</strong> o sistema <strong>de</strong> proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, para afastar seus efeitos em todas as <strong>de</strong>mandas<br />

judiciais que tenham por objeto o contrato, em que discuta justamente o caráter abusivo <strong>de</strong>stas mesmas cláusulas”20.<br />

Esse, portanto, o senti<strong>do</strong> da natureza <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública prevista pelo art. 1.º da Lei 8.078/1990 aplicável ao art. 51 <strong>do</strong> mesmo<br />

diploma legal. Não significa que o juiz possa <strong>de</strong>cidir a esse respeito sem a <strong>de</strong>vida provocação <strong>do</strong> interessa<strong>do</strong>, porque, assim o<br />

fazen<strong>do</strong>, estaria violan<strong>do</strong> uma quantida<strong>de</strong> razoável <strong>de</strong> matérias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública <strong>de</strong> natureza processual, o que não parece, à luz da<br />

<strong>do</strong>utrina exposta, sustentável:


“Outras matérias, que não integrem o pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> autor e, portanto, não se enquadrem nos limites objetivos da <strong>de</strong>manda, caso fossem<br />

conhecidas espontaneamente, acarretariam violação ao princípio processual da adstrição ou congruência, previsto nos art. 128 e 460<br />

<strong>do</strong> CPC. Disso resulta que aplicar a or<strong>de</strong>m pública substancial mesmo sem requerimento da parte, ainda que a matéria não integre o<br />

objeto <strong>do</strong> processo, equivaleria à violação <strong>de</strong> princípios processuais tais como a correlação, a inércia, contraditório e <strong>de</strong>vi<strong>do</strong><br />

processo legal, entre outros, os quais compõem o núcleo das normas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública processual” 21 .<br />

O principal problema, portanto, não é <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar a natureza jurídica <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública das normas <strong>de</strong> direito material<br />

consumerista, mas a<strong>de</strong>quar tal realida<strong>de</strong> a princípios fundamentais <strong>do</strong> processo, em especial o princípio da adstrição entre pedi<strong>do</strong> e<br />

sentença. Para José Roberto <strong>do</strong>s Santos Bedaque, “não obstante questões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, como nulida<strong>de</strong>s absolutas, possam ser<br />

conhecidas <strong>de</strong> ofício pelo julga<strong>do</strong>r, inadmissível consi<strong>de</strong>rá-las para efeito <strong>de</strong> acolhimento <strong>de</strong> uma pretensão, se não integrarem os<br />

limites objetivos da <strong>de</strong>manda. Esta não comporta ampliação por iniciativa <strong>do</strong> juiz” 22 .<br />

Nota-se da lição <strong>do</strong> notável processualista a preocupação em manter a natureza <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública <strong>de</strong> matérias substanciais,<br />

inclusive com seu reconhecimento <strong>de</strong> ofício, mas sem permitir que isso amplie sem a provocação da parte os limites objetivos <strong>do</strong><br />

processo. Dá um exemplo <strong>de</strong> como compatibilizar os <strong>do</strong>is valores:<br />

“É possível a rejeição <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> funda<strong>do</strong> em contrato, se o juiz vislumbrar a existência <strong>de</strong> incapacida<strong>de</strong> absoluta <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s<br />

contratantes, ainda que tal fundamento não seja invoca<strong>do</strong> pelo réu. Mas não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>clarar nulo esse mesmo contrato, por<br />

incapacida<strong>de</strong> absoluta, em <strong>de</strong>manda versan<strong>do</strong> sua anulabilida<strong>de</strong> por vício <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>”.<br />

No centro da presente polêmica encontra-se a Súmula n. 381 <strong>do</strong> STJ, publicada em 5 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 2009, com a seguinte<br />

redação: “Nos contratos bancários, é veda<strong>do</strong> ao julga<strong>do</strong>r conhecer, <strong>de</strong> ofício, da abusivida<strong>de</strong> das cláusulas”. O coautor da presente<br />

obra <strong>Flávio</strong> <strong>Tartuce</strong> já se manifestou em momento oportuno <strong>de</strong> forma crítica quanto à opção sumulada pelo Superior Tribunal <strong>de</strong><br />

Justiça, inclusive citan<strong>do</strong> valorosos civilistas que já tiveram a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se manifestar sobre o tema.<br />

1 Cfr. GRECO, Leonar<strong>do</strong>. Instituições <strong>de</strong> direito civil. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. 2. p. 56.<br />

2<br />

3<br />

4<br />

5<br />

6<br />

7<br />

8<br />

9<br />

10<br />

11<br />

12<br />

13<br />

FUX, Luiz. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2004. p. 543; DIDIER JR., Fredie. Curso <strong>de</strong> direito processual civil. 7.<br />

ed. Salva<strong>do</strong>r: JusPodivm, 2007. v. 1. p. 504.<br />

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual <strong>do</strong> processo <strong>de</strong> conhecimento. São Paulo: RT, 2006. p. 145.<br />

STJ – RMS 25.558/PB – Segunda Turma – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – j. 15.03.2011 – DJe 22.03.2011.<br />

NERY JR., Teoria geral <strong>do</strong>s recursos. 6. ed. São Paulo: RT, 2004. n. 3.5.4, p. 482; BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematiza<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito<br />

procesual civil. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 5, p. 81; STJ – EDcl nos EDcl no REsp 645.595/SC – Primeira Turma – Rel. Min. Luiz Fux – j.<br />

21.08.2008.<br />

BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código <strong>de</strong> Processo Civil. 11. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2003. v. 5, n. 244, p. 444; ASSIS,<br />

Araken <strong>de</strong>. Manual <strong>do</strong>s recursos. 2. ed. São Paulo: RT, 2008. n. 24.8, p. 226; JORGE, <strong>Flávio</strong> Cheim. Teoria geral <strong>do</strong>s recursos cíveis. 3. ed.<br />

São Paulo: RT, 2007. p. 242; STJ – REsp 830.392/RS – Segunda Turma – Rel. Min. Castro Meira – j. 04.09.2007.<br />

Cfr. Princípios fundamentais: teoria geral <strong>do</strong>s recursos. 5. ed. São Paulo: RT, 2000. p. 420. No mesmo senti<strong>do</strong> BARBOSA MOREIRA, José<br />

Carlos. Comentários ao Código <strong>de</strong> Processo Civil. 11. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2003. v. 5, p. 594; MEDINA, José Miguel Garcia. O<br />

prequestionamento nos recursos extraordinário e especial. 3. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 76-77; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim.<br />

Nulida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> processo e da sentença. 6. ed. São Paulo: RT, 2007. p. 420 e ORIONE NETO, Luiz. Recursos cíveis. São Paulo: Saraiva, 2002.<br />

p. 135-136.<br />

STF – AI-AgR 633.188/MG – Primeira Turma – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Lewan<strong>do</strong>wski – j. 02.10.2007; AI-AgR 505.029/MS – Segunda Turma – Rel.<br />

Min. Carlos Velloso – j. 12.04.2005.<br />

CARNEIRO, Athos Gusmão. Requisitos específicos <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> recurso especial. Aspectos polêmicos e atuais <strong>do</strong>s recursos cíveis<br />

<strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a Lei 9.756/98. São Paulo: RT, 1999. p. 119; OLIVEIRA, Gleydson Kleber Lopes <strong>de</strong>. Recurso Especial. São Paulo: RT, 2002.<br />

p. 339-342 e FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima. Condições <strong>de</strong> ação: enfoque sobre o interesse <strong>de</strong> agir. 3. ed. São Paulo: RT, 2005. p. 89.<br />

STJ – AgRg no REsp 943.682/PA – Sexta Turma – Rel. Min. Harol<strong>do</strong> Rodrigues – j. 22.03.2011 – DJe 09.05.2011.<br />

PINTO, Nelson Luiz. Recurso especial para o STJ. São Paulo: Malheiros, 1992. p. 145.<br />

Cfr. Recurso especial para o STJ. São Paulo: Malheiros, 1992. p. 146.<br />

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonar<strong>do</strong> Ferres da Silva; MELO, Rogério Licastro Torres <strong>de</strong>.<br />

Primeiros comentários ao Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015. p. 1.504; OLIVEIRA, Pedro Miranda <strong>de</strong>. In:<br />

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DIDIER JR., Fredie; TALAMINI, Eduar<strong>do</strong> e DANTAS, Bruno (Coords.) Breves Comentários ao Novo<br />

Código <strong>de</strong> Processo Civil. São Paulo: RT, 2015. p. 2.310. Contra: BUENO, Cássio Scarpinella. Manual <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo:<br />

Saraiva, 2015.


14<br />

15<br />

16<br />

17<br />

18<br />

19<br />

20<br />

21<br />

22<br />

Cfr. Despacho sanea<strong>do</strong>r. 3. ed. Porto Alegre: Fabris, 1990; BARBOSA, Antônio Alberto Alves. Da preclusão processual civil. 2. ed. São<br />

Paulo: RT, 1994. p. 197.<br />

Curso <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Processual Civil, op. cit., p. 174. Ressalta em outro trecho da mesma obra as situações em que não ocorreria a preclusão,<br />

chegan<strong>do</strong> à conclusão <strong>de</strong> que “quan<strong>do</strong> a própria sentença transitada em julga<strong>do</strong> não tem a virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> impedir a rediscussão das<br />

questões, que se po<strong>de</strong> fazer pela ação rescisória, não há que se falar em preclusão pela circunstância <strong>de</strong> o sanea<strong>do</strong>r ter-se referi<strong>do</strong> à<br />

matéria”, p. 177.<br />

BARROSO, Alexandre <strong>de</strong> Alencar. Acesso à justiça e preclusão civil. Dissertação para obtenção <strong>do</strong> grau <strong>de</strong> mestre no curso <strong>de</strong> Pós-<br />

Graduação da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> da USP, 1996. p. 147-148; ARRUDA ALVIM. Dogmática jurídica e o novo Código <strong>de</strong> Processo Civil.<br />

São Paulo: RT, 1985. p. 128; SILVA, Ovídio Baptista da. Curso <strong>de</strong> processo Civil. 5. ed. São Paulo: RT, 2000. v. I, p. 163; WAMBIER, Luiz<br />

Rodrigues. Despacho sanea<strong>do</strong>r irrecorri<strong>do</strong>. Revista <strong>de</strong> Processo, n.º 67, p. 227-231; GRECO FILHO, Vicente. <strong>Direito</strong> processual civil<br />

brasileiro. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. II, p. 123; GRINOVER, Ada Pellegrini. Interesse da União. Preclusão. A preclusão e o órgão<br />

jurisdicional. A marcha <strong>do</strong> processo. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense Universitária, 2000. p. 230-241.<br />

REsp 59.978/PR – Primeira Turma – Rel. Min. Milton Luiz Pereira – j. 08.08.1996; REsp 174.356/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Sálvio <strong>de</strong><br />

Figueire<strong>do</strong> Teixeira – j. 23.05.2000; REsp 56.171 – Segunda Turma – Rel. Min. Eliana Calmon – j. 06.04.2000. No REsp 117.321/ES,<br />

julga<strong>do</strong> em 04.05.1999, cujo relator foi o Min. Cesar Asfor Rocha, da Quarta Turma, não foi <strong>de</strong>cidi<strong>do</strong> por unanimida<strong>de</strong>, já que o<br />

relator tem entendimento diverso da maioria <strong>de</strong> seus companheiros <strong>de</strong> Turma. Utilizan<strong>do</strong>-se das lições <strong>do</strong> processualista baiano<br />

Calmon <strong>de</strong> Passos, o ministro assim <strong>de</strong>finiu seu voto: “No caso em tabla<strong>do</strong>, a questão referente à ilegitimida<strong>de</strong> ad causam da<br />

ré/recorrida, foi agitada logo na contestação, e não acolhida, pelo menos implicitamente, pelo <strong>do</strong>uto magistra<strong>do</strong> que presidia o<br />

processo, ao proferir o <strong>de</strong>spacho sanea<strong>do</strong>r <strong>de</strong> fls. 60. V, não ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> contra essa <strong>de</strong>cisão interposto recurso algum. Com efeito,<br />

operou-se preclusão em face <strong>do</strong> que essa questão já não mais po<strong>de</strong>ria ser examinada na apelação, quer <strong>de</strong> ofício quer por<br />

provocação da parte.” Em senti<strong>do</strong> diverso votaram os ministros Sálvio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong> Teixeira, Barros Monteiro e Ruy Rosa<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

Aguiar.<br />

PAULA, Adriano Perácio <strong>de</strong>. O consumi<strong>do</strong>r equipara<strong>do</strong> e o processo civil. Revista <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, n. 34, abr.-jun. 2000, p. 62.<br />

Cfr. Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – comenta<strong>do</strong> pelos autores <strong>do</strong> anteprojeto. 10. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2011. v. I, p.<br />

536-537. No mesmo senti<strong>do</strong> RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. São Paulo: Saraiva,<br />

2000. p. 569.<br />

APRIGLIANO, Ricar<strong>do</strong>. Or<strong>de</strong>m pública e processo. São Paulo: Atlas, 2011. p. 33.<br />

APRIGLIANO, Ricar<strong>do</strong>. Or<strong>de</strong>m pública e processo. São Paulo: Atlas, 2011. p. 38.<br />

Cfr. Os elementos objetivos da <strong>de</strong>manda à luz <strong>do</strong> contraditório. In: CRUZ E TUCCI, José Rogério; BEDAQUE, José Roberto <strong>do</strong>s Santos<br />

(Coords.). Causa <strong>de</strong> pedir e pedi<strong>do</strong> no processo civil (questões polêmicas). São Paulo: RT, 2002. p. 47.


HABEAS DATA E DIREITO DO CONSUMIDOR<br />

Sumário: 14.1. Introdução – 14.2. <strong>Direito</strong> à informação e habeas data – 14.3. Hipóteses <strong>de</strong> cabimento: 14.3.1.<br />

Introdução; 14.3.2. <strong>Direito</strong> à informação; 14.3.3. <strong>Direito</strong> à retificação <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s; 14.3.4. Anotação sobre da<strong>do</strong><br />

verda<strong>de</strong>iro – 14.4. Fase administrativa: 14.4.1. Interesse <strong>de</strong> agir; 14.4.2. Procedimento – 14.5. Liminar – 14.6.<br />

Legitimida<strong>de</strong>: 14.6.1. Legitimida<strong>de</strong> ativa; 14.6.2. Legitimida<strong>de</strong> passiva – 14.7. Competência – 14.8. Recursos.<br />

14.1.<br />

INTRODUÇÃO<br />

O direito ao habeas data vem expressamente consagra<strong>do</strong> no art. 5.º, LXXII, da CF/1988, sen<strong>do</strong> que o dispositivo legal trata<br />

tão somente das hipóteses <strong>de</strong> cabimento <strong>de</strong>ssa ação constitucional, sen<strong>do</strong> missão da Lei 9.507/1997 o tratamento<br />

infraconstitucional <strong>de</strong> seu procedimento, ainda que, em seu art. 7.º, III, também crie uma nova hipótese <strong>de</strong> cabimento, não prevista<br />

expressamente na Constituição Fe<strong>de</strong>ral. Eventuais discussões a respeito da autoaplicabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> dispositivo legal per<strong>de</strong>ram<br />

senti<strong>do</strong> com o advento da Lei 9.507/1997.<br />

Como se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>preen<strong>de</strong>r <strong>do</strong> texto constitucional, o habeas data é ação constitucional voltada à garantia <strong>do</strong>s direitos <strong>de</strong><br />

intimida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> acesso à informação. O acesso a informações constantes <strong>de</strong> registros ou banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s<br />

governamentais ou <strong>de</strong> caráter público e a eventual retificação <strong>de</strong> informações equivocadas constituem o objeto <strong>de</strong> tutela <strong>do</strong> habeas<br />

data; o que inclui os bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e cadastros <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res.<br />

Ainda que a ultrapassada época ditatorial vivida pelo Brasil tenha motiva<strong>do</strong> fortemente a ação <strong>de</strong> habeas data, é importante<br />

que se dê ao cidadão uma ação específica, com respal<strong>do</strong> constitucional, para que possa ter conhecimento <strong>de</strong> seus da<strong>do</strong>s cadastra<strong>do</strong>s<br />

e para exigir eventual correção, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que, atualmente, a captação e armazenamento <strong>de</strong> informações são realiza<strong>do</strong>s com<br />

extrema facilida<strong>de</strong>, em especial por conta <strong>do</strong>s meios tecnológicos à disposição daqueles que formam e mantêm esses bancos <strong>de</strong><br />

da<strong>do</strong>s.<br />

Cumpre registrar que, embora possível a tutela <strong>do</strong>s direitos protegi<strong>do</strong>s pelo habeas data por meio <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança, a<br />

opção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r constituinte em criar uma ação específica para a tutela <strong>do</strong> direito à informação <strong>de</strong>ve ser respeitada. Não tenho<br />

dúvida <strong>de</strong> que se tratou <strong>de</strong> uma opção, e a ausência <strong>de</strong> previsão específica não sacrificaria qualquer interesse atualmente tutela<strong>do</strong><br />

pelo habeas data, to<strong>do</strong>s contempla<strong>do</strong>s <strong>de</strong> forma genérica pelo manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança. Ainda assim, e isso fica claro no art. 1.º,<br />

caput, da Lei 12.016/2009, quan<strong>do</strong> cabível o habeas data, não caberá manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança, o que confirma o prestígio que a<br />

ação específica consagrada no art. 5.º, LXXII, da CF/1988 tem em nosso sistema.<br />

14.2.<br />

DIREITO À INFORMAÇÃO E HABEAS DATA<br />

A análise das hipóteses <strong>de</strong> cabimento <strong>do</strong> habeas data é o suficiente para se compreen<strong>de</strong>r que o direito à informação,<br />

consagra<strong>do</strong> no art. 5.º, XXXIII, da CF/1988, é mais amplo que aquele tutela<strong>do</strong> por meio da ação constitucional ora analisada. No<br />

habeas data, a informação requerida será sempre voltada à pessoa <strong>do</strong> requerente, mais precisamente a da<strong>do</strong>s pessoais seus que<br />

constem <strong>de</strong> arquivos ou bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s. Nas palavras <strong>de</strong> festejada <strong>do</strong>utrina, da<strong>do</strong>s <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>res da situação da pessoa nas diversas<br />

searas <strong>de</strong> sua existência1. O direito à informação, consagra<strong>do</strong> no dispositivo constitucional menciona<strong>do</strong>, tem um objeto mais


amplo, abrangen<strong>do</strong> outras espécies <strong>de</strong> informações que, apesar <strong>de</strong> interessarem ao requerente <strong>de</strong> um eventual pedi<strong>do</strong>, não dizem<br />

respeito a seus da<strong>do</strong>s pessoais 2 .<br />

Por outro la<strong>do</strong>, o art. 5.º, XXXIII, da CF/1988 prevê que o direito à informação diz respeito a da<strong>do</strong>s manti<strong>do</strong>s por órgãos<br />

públicos, condicionan<strong>do</strong> o exercício <strong>de</strong>sse direito constitucional à espécie <strong>do</strong> órgão, e não à natureza da informação. Como será<br />

analisa<strong>do</strong> um pouco adiante, no item 14.3.2 <strong>de</strong>ste mesmo capítulo, para o habeas data, o órgão que mantém o cadastro <strong>de</strong><br />

informações não precisa ser necessariamente público, bastan<strong>do</strong> que torne públicas as informações que <strong>de</strong>tenha.<br />

Um candidato <strong>de</strong> concurso público, por exemplo, tem o direito <strong>de</strong> analisar sua prova com a respectiva correção, e, caso o<br />

órgão público se negue a prestar essa informação, não resta dúvida <strong>de</strong> que um direito será viola<strong>do</strong> e <strong>de</strong> que uma tutela jurisdicional<br />

po<strong>de</strong>rá ser obtida. Na realida<strong>de</strong>, até mesmo administrativamente o problema po<strong>de</strong>rá ser resolvi<strong>do</strong>, por meio <strong>do</strong> exercício <strong>do</strong> direito<br />

<strong>de</strong> petição, consagra<strong>do</strong> no art. 5.º, XXXIV, da CF/1988. Em termos jurisdicionais, por um manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança ou mesmo uma<br />

ação <strong>de</strong> conhecimento pelo rito comum, provavelmente com pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> urgência.<br />

Essa importante distinção tem ao menos uma relevante consequência prática. O direito à informação, consagra<strong>do</strong> no art. 5.º,<br />

XXXIII, da CF/1988, é excepciona<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> o sigilo for imprescindível à segurança da socieda<strong>de</strong> e <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. Num juízo <strong>de</strong><br />

proporcionalida<strong>de</strong>, o legisla<strong>do</strong>r constitucional enten<strong>de</strong>u mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> prestigiar os valores preserva<strong>do</strong>s pelo sigilo <strong>do</strong> que o<br />

direito à informação. Para a melhor <strong>do</strong>utrina, as razões que fundamentam o sigilo não se aplicam ao habeas data, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que<br />

as informações, nesse caso, sempre dirão respeito a da<strong>do</strong>s pessoais <strong>do</strong> impetrante, não sen<strong>do</strong> possível se exigir sigilo para com o<br />

titular <strong>de</strong> informações e da<strong>do</strong>s3. Esse é o entendimento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça 4 .<br />

14.3.<br />

14.3.1.<br />

HIPÓTESES DE CABIMENTO<br />

Introdução<br />

A Constituição Fe<strong>de</strong>ral, em seu art. 5.º, LXXII, ao consagrar constitucionalmente o habeas data, limita-se a prever duas<br />

hipóteses <strong>de</strong> cabimento: a) para assegurar o conhecimento <strong>de</strong> informações relativas à pessoa <strong>do</strong> impetrante, constantes <strong>de</strong> registros<br />

ou banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s governamentais ou <strong>de</strong> caráter público; b) para retificação <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, quan<strong>do</strong> não se prefira fazê-lo<br />

por processo sigiloso, judicial ou administrativo. Essas duas hipóteses <strong>de</strong> cabimento são praticamente repetidas pelos <strong>do</strong>is<br />

primeiros incisos <strong>do</strong> art. 7.º da Lei 9.507/1997, sen<strong>do</strong> que no inciso III <strong>de</strong> referida norma encontra-se uma terceira hipótese <strong>de</strong><br />

cabimento: para a anotação, nos assentamentos <strong>do</strong> interessa<strong>do</strong>, <strong>de</strong> contestação ou explicação sobre da<strong>do</strong> verda<strong>de</strong>iro, mas<br />

justificável, e que esteja sob pendência judicial ou amigável.<br />

14.3.2.<br />

<strong>Direito</strong> à informação<br />

A primeira hipótese <strong>de</strong> cabimento <strong>do</strong> habeas data, prevista no art. 5.º, LXXII, a, da CF/1988 e repetida no art. 7.º, I, da Lei<br />

9.507/1997, regulamenta o direito <strong>do</strong> impetrante à obtenção <strong>de</strong> informações mantidas em registro ou banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s.<br />

O cabimento <strong>do</strong> habeas data, nesse caso, está condiciona<strong>do</strong> à natureza das informações que se preten<strong>de</strong> obter, sen<strong>do</strong> incabível<br />

o pedi<strong>do</strong> por meio <strong>de</strong>ssa ação constitucional se as informações que se tenciona conseguir são <strong>de</strong> interesse público, prestan<strong>do</strong>-se à<br />

fiscalização <strong>de</strong> prática a<strong>do</strong>tada por órgão público5.<br />

Interessante notar que a criação e manutenção <strong>de</strong>sses cadastros ou bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s não precisa necessariamente ser <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> órgão público, como inclusive sugere o próprio texto constitucional. Ao prever que os responsáveis pela<br />

criação e manutenção serão órgãos governamentais ou <strong>de</strong> caráter público, o próprio art. 5.º, LXXII, a, da CF/1988 sugere a<br />

interpretação <strong>de</strong> que também órgãos <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong> possam ser <strong>de</strong>manda<strong>do</strong>s por meio <strong>do</strong> habeas data.<br />

A impressão foi confirmada pelo parágrafo único <strong>do</strong> art. 1.º da Lei 9.507/1997, ao prever que se consi<strong>de</strong>ra <strong>de</strong> caráter público<br />

to<strong>do</strong> registro ou banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s conten<strong>do</strong> informações que sejam ou possam ser transmitidas a terceiros ou que não sejam <strong>de</strong> uso<br />

privativo <strong>do</strong> órgão ou entida<strong>de</strong> produtora ou <strong>de</strong>positária das informações. Em interpretação ao dispositivo legal, a melhor <strong>do</strong>utrina<br />

bem aponta que o caráter público das informações não se confun<strong>de</strong> com a natureza pública <strong>do</strong> órgão que as mantém em cadastro 6 .<br />

O caráter público, portanto, diz respeito à possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> as informações se tornarem públicas, no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> chegarem ao<br />

conhecimento <strong>de</strong> terceiros. É absolutamente irrelevante, portanto, saber se o órgão que mantém tais informações é <strong>de</strong> direito<br />

público ou priva<strong>do</strong>; o que se exige é o caráter público da informação. Sen<strong>do</strong> a informação disponibilizada somente pelo órgão que<br />

mantém o cadastro, não caberá habeas data 7 . O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça já teve oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir pelo não cabimento <strong>de</strong><br />

habeas data diante <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> exibição <strong>de</strong> extratos <strong>de</strong> conta corrente mantida pelo impetrante junto à Caixa Econômica Fe<strong>de</strong>ral,<br />

asseveran<strong>do</strong> que, nesse caso, as informações são confi<strong>de</strong>nciais, franqueadas somente aos contratantes, e não a terceiros8.<br />

É certamente nesse aspecto que o habeas data mais interessa ao consumi<strong>do</strong>r, especialmente diante da popularização <strong>do</strong>s<br />

chama<strong>do</strong>s registros <strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>res. Conforme a melhor <strong>do</strong>utrina, “no mun<strong>do</strong> da prestação <strong>de</strong> serviços, e, logicamente, <strong>do</strong>s negócios


em geral, as informações são instantâneas e volumosas, me<strong>de</strong>m-se hoje em gigabytes. Nesse aspecto vivemos também a era da<br />

informação, ou, o que é pior, na era <strong>do</strong>s bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, que assumem as mais variadas formas e finalida<strong>de</strong>s, como o CADIN,<br />

SERASA, SPC, SEPROC, Ví<strong>de</strong>o Cheque e Tele Cheque”. 9<br />

Não resta qualquer dúvida <strong>de</strong> que esses cadastros contêm informações <strong>de</strong> natureza pública, não obstante sejam <strong>de</strong> empresas<br />

privadas; daí ser cabível o habeas data em tal circunstância pelo consumi<strong>do</strong>r. Nesse senti<strong>do</strong>, o art. 43, § 4.º da Lei 8.078/1990, ao<br />

prever que “os bancos <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s e cadastros relativos a consumi<strong>do</strong>res, os serviços <strong>de</strong> proteção ao crédito e congêneres são<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> caráter público”.<br />

14.3.3.<br />

<strong>Direito</strong> à retificação <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s<br />

Haven<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> com fundamento na hipótese <strong>de</strong> cabimento ora analisada, é importante observar que só po<strong>de</strong> pedir a<br />

retificação <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s o sujeito que tem conhecimento <strong>de</strong> quais sejam esses da<strong>do</strong>s, o que significa que não caberá cumulação <strong>de</strong><br />

pedi<strong>do</strong>s, num mesmo habeas data, <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> informações e correções <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s.<br />

Conforme <strong>de</strong>cidiu o Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, só tem direito a retificar da<strong>do</strong>s o sujeito que aponta <strong>de</strong>terminada incorreção<br />

nos mesmos, e, para isso, por questão <strong>de</strong> evi<strong>de</strong>nte lógica, <strong>de</strong>verá ter conhecimento <strong>de</strong> quais sejam tais da<strong>do</strong>s10. Esse entendimento,<br />

entretanto, é duramente critica<strong>do</strong> por consi<strong>de</strong>rável parcela <strong>do</strong>utrinária, que consi<strong>de</strong>ra mais a<strong>de</strong>quada, à luz <strong>do</strong> princípio da<br />

economia processual, a elaboração <strong>de</strong> pedi<strong>do</strong>s em cumulação sucessiva num mesmo habeas data, ao invés <strong>de</strong> <strong>do</strong>is habeas data<br />

sucessivos 11 .<br />

14.3.4.<br />

Anotação sobre da<strong>do</strong> verda<strong>de</strong>iro<br />

A primeira hipótese <strong>de</strong> cabimento <strong>do</strong> habeas data limita-se à ciência, enquanto a segunda permite a retificação <strong>de</strong> informações<br />

incorretas, sen<strong>do</strong> ambas previstas no texto constitucional, conforme já analisa<strong>do</strong>. O art. 7.º, III, da Lei 9.507/1997 inova ao criar<br />

uma terceira hipótese <strong>de</strong> cabimento, admitin<strong>do</strong>-se que o impetrante exija que, mesmo diante da veracida<strong>de</strong> da informação<br />

constante <strong>do</strong> cadastro ou <strong>do</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, seja averbada uma contestação ou explicação sobre tais da<strong>do</strong>s, bastan<strong>do</strong> para tanto<br />

que a informação esteja sen<strong>do</strong> discutida judicialmente ou extrajudicialmente.<br />

Exemplo perfeito <strong>de</strong>ssa hipótese <strong>de</strong> cabimento diz respeito ao pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> inclusão <strong>de</strong> explicação sobre da<strong>do</strong>s constantes <strong>de</strong><br />

cadastros <strong>de</strong> <strong>de</strong>ve<strong>do</strong>res (tais como Serasa, SPC etc.), quan<strong>do</strong> a dívida que <strong>de</strong>u ensejo à anotação for objeto <strong>de</strong> questionamento,<br />

como, por exemplo, uma ação <strong>de</strong>claratória <strong>de</strong> inexistência da dívida. É natural que, nesse caso, a parte requeira uma tutela<br />

antecipada para retirada imediata da anotação, o que, para ela, se mostrará até mais vantajoso, mas, não haven<strong>do</strong> a concessão <strong>de</strong> tal<br />

espécie <strong>de</strong> tutela, a indicação <strong>de</strong> que o pretenso débito está sen<strong>do</strong> discuti<strong>do</strong> po<strong>de</strong> ser bastante útil à parte.<br />

Como bem lembra<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>utrina, a hipótese <strong>de</strong> cabimento ora analisada não justifica meros caprichos <strong>do</strong> impetrante, <strong>de</strong><br />

forma que a existência <strong>de</strong> discussão judicial ou extrajudicial a respeito da informação constante <strong>do</strong>s registros públicos não é razão,<br />

por si só, para habilitar a parte ao habeas data. Como em qualquer outra ação judicial, o autor <strong>de</strong>verá <strong>de</strong>monstrar a existência <strong>de</strong><br />

interesse <strong>de</strong> agir, o que justificará a intervenção jurisdicional. No caso específico <strong>do</strong> habeas data nessa hipótese <strong>de</strong> cabimento,<br />

haverá interesse <strong>de</strong> agir sempre que o autor <strong>de</strong>monstrar que a ausência da anotação po<strong>de</strong> lhe gerar um dano concreto, <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m<br />

material ou moral12.<br />

Esse interesse <strong>de</strong> agir, entretanto, não guarda qualquer relação com a probabilida<strong>de</strong> e/ou serieda<strong>de</strong> com que a anotação vem<br />

sen<strong>do</strong> questionada, seja em se<strong>de</strong> judicial ou extrajudicial. Significa dizer que não caberá ao órgão jurisdicional uma análise <strong>do</strong><br />

mérito <strong>do</strong> questionamento, nem mesmo por meio <strong>de</strong> cognição sumária, para se <strong>de</strong>terminar se o autor tem ou não direito ao habeas<br />

data. Tal exigência implicaria na criação <strong>de</strong> um obstáculo inexistente na lei e contrário ao espírito da ação constitucional ora<br />

analisada.<br />

14.4.<br />

14.4.1.<br />

FASE ADMINISTRATIVA<br />

Interesse <strong>de</strong> agir<br />

A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> interesse <strong>de</strong> agir, também chama<strong>do</strong> <strong>de</strong> interesse processual, está intimamente associada à utilida<strong>de</strong> da prestação<br />

jurisdicional que se preten<strong>de</strong> obter com a movimentação da máquina jurisdicional13. Cabe ao autor <strong>de</strong>monstrar que o provimento<br />

jurisdicional pretendi<strong>do</strong> será capaz <strong>de</strong> lhe proporcionar uma melhora em sua situação fática, o que será o suficiente para justificar o<br />

tempo, energia e dinheiro que serão gastos pelo Po<strong>de</strong>r Judiciário na resolução da <strong>de</strong>manda.<br />

Não se <strong>de</strong>ve analisar se o autor tem efetivamente o direito que alega ter e que, portanto, se sagrará vitorioso na <strong>de</strong>manda,<br />

porque esse é tema pertinente ao mérito, e não às condições da ação. O juiz <strong>de</strong>ve analisar em abstrato e hipoteticamente se o autor,<br />

sagran<strong>do</strong>-se vitorioso, terá efetivamente a melhora que preten<strong>de</strong>u obter com o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong> tutela jurisdicional que


formulou por meio <strong>do</strong> processo. Ter ou não razão em suas alegações e pretensões é irrelevante nesse tocante, não afastan<strong>do</strong> a<br />

carência da ação por falta <strong>de</strong> interesse <strong>de</strong> agir.<br />

Segun<strong>do</strong> parcela da <strong>do</strong>utrina, o interesse <strong>de</strong> agir <strong>de</strong>ve ser analisa<strong>do</strong> sob <strong>do</strong>is diferentes aspectos: a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> obtenção da<br />

tutela jurisdicional reclamada e a a<strong>de</strong>quação entre o pedi<strong>do</strong> e a proteção jurisdicional que se preten<strong>de</strong> obter 14 . No tocante à fase<br />

pré-processual, consagrada nos arts. 2.º, 3.º e 4.º da Lei 9.507/1997, cabe a análise tão somente da necessida<strong>de</strong> na impetração <strong>do</strong><br />

habeas data.<br />

Haverá necessida<strong>de</strong> sempre que o autor não pu<strong>de</strong>r obter o bem da vida pretendi<strong>do</strong> sem a <strong>de</strong>vida intervenção <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r<br />

Judiciário. Em regra, haven<strong>do</strong> a lesão ou ameaça <strong>de</strong> lesão a direito, consubstanciada na li<strong>de</strong> tradicional, haverá interesse <strong>de</strong> agir,<br />

porque, ainda que exista a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> obtenção <strong>do</strong> bem da vida por meios alternativos <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos, ninguém é<br />

obriga<strong>do</strong> a resolver suas crises jurídicas por essas vias alternativas. É natural que, no habeas data, a pretensão resistida <strong>de</strong>penda<br />

tanto <strong>de</strong> seu exercício no âmbito extrajudicial como da resistência ao pedi<strong>do</strong> formula<strong>do</strong>. Nesse senti<strong>do</strong>, inclusive, há entendimento<br />

sumula<strong>do</strong> pelo Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça15.<br />

Não se po<strong>de</strong> antever nessa exigência qualquer ofensa ao princípio da inafastabilida<strong>de</strong> da tutela jurisdicional, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se<br />

que o direito <strong>de</strong> ação não é ilimita<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> condiciona<strong>do</strong> seu exercício à presença das condições da ação no caso concreto. Nesses<br />

termos, os dispositivos conti<strong>do</strong>s na Lei 9.507/1997 que versam sobre a fase pré-processual <strong>do</strong> habeas data, fixan<strong>do</strong> prazos para a<br />

resposta ao pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> informações, retificações ou averbações, em nada contrariam a previsão <strong>do</strong> art. 5.º, LXXVIII, da CF/1988,<br />

apenas regulamentan<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma objetiva o interesse <strong>de</strong> agir nessa ação constitucional.<br />

Cumpre lembrar que, num <strong>do</strong>s aspectos <strong>do</strong> princípio da inafastabilida<strong>de</strong> da jurisdição, enten<strong>de</strong>-se que o interessa<strong>do</strong> em<br />

provocar o Po<strong>de</strong>r Judiciário, em razão <strong>de</strong> lesão ou ameaça <strong>de</strong> lesão a direito, não é obriga<strong>do</strong> a procurar antes disso os possíveis<br />

mecanismos administrativos <strong>de</strong> solução <strong>de</strong> conflitos. Ainda que seja possível a instauração <strong>de</strong> um processo administrativo, isso não<br />

será impedimento para a procura <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário. E mais. O interessa<strong>do</strong> também não precisa esgotar a via administrativa <strong>de</strong><br />

solução <strong>de</strong> conflitos, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> perfeitamente procurá-la e, a qualquer momento, buscar o Po<strong>de</strong>r Judiciário. Naturalmente, como<br />

observa a melhor <strong>do</strong>utrina, a exigência <strong>de</strong> um pedi<strong>do</strong> recusa<strong>do</strong> não se confun<strong>de</strong> com a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se instaurar um processo<br />

administrativo, tampouco <strong>de</strong> se exaurir a via administrativa <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos 16 .<br />

14.4.2.<br />

Procedimento<br />

14.4.2.1.<br />

Fase pré-processual<br />

A fase pré-processual, que tem seu procedimento disciplina<strong>do</strong> pelos arts. 2.º, 3.º e 4.º da Lei 9.507/1997, <strong>de</strong>ve ser analisada<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> <strong>do</strong> objetivo <strong>do</strong> solicitante perante o órgão ou entida<strong>de</strong> <strong>de</strong>positária <strong>do</strong> registro ou banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s. Os vetos<br />

presi<strong>de</strong>nciais ao parágrafo único <strong>do</strong> art. 3.º e aos arts. 5.º e 6.º, apesar <strong>de</strong> não po<strong>de</strong>rem ser elogia<strong>do</strong>s, não sacrificam<br />

substancialmente a compreensão e <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>ssa fase prévia ao eventual processo judicial.<br />

No art. 2.º da Lei 9.507/1997, há previsão para o requerimento, quan<strong>do</strong> o objetivo <strong>do</strong> solicitante é exclusivamente tomar<br />

conhecimento <strong>de</strong> informações pessoais mantidas em registros ou banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s. Segun<strong>do</strong> o dispositivo legal, a partir <strong>do</strong> momento<br />

em que o requerimento é apresenta<strong>do</strong> perante o órgão ou entida<strong>de</strong> <strong>de</strong>positária <strong>do</strong> registro ou banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, haverá um prazo <strong>de</strong><br />

48 horas para a resposta. O parágrafo único <strong>do</strong> dispositivo legal prevê que a comunicação da resposta ao solicitante <strong>de</strong>ve ser feita<br />

em 24 horas. Numa mera conta aritmética, chega-se ao prazo <strong>de</strong> 72 horas entre o pedi<strong>do</strong> e a informação <strong>de</strong> que ele foi acolhi<strong>do</strong>,<br />

tardan<strong>do</strong> um pouco mais o efetivo acesso aos da<strong>do</strong>s, conforme previsão <strong>do</strong> art. 3.º da Lei 9.507/1997.<br />

Seria <strong>de</strong> se presumir que, <strong>de</strong>corri<strong>do</strong> qualquer <strong>de</strong>sses prazos, passaria a ser cabível o habeas data, mas a previsão contida no<br />

art. 8.º, parágrafo único, I, da Lei 9.507/1997 parece sugerir algo diverso. Segun<strong>do</strong> o dispositivo legal menciona<strong>do</strong>, o impetrante<br />

<strong>de</strong>ve instruir sua petição inicial com prova da recusa ou <strong>do</strong> <strong>de</strong>curso <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> <strong>de</strong>z dias sem <strong>de</strong>cisão. Ora, se órgão tem o prazo <strong>de</strong><br />

48 horas para respon<strong>de</strong>r e 24 para informar sua resposta, a necessida<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>de</strong>curso <strong>de</strong> <strong>de</strong>z dias sem resposta alonga<br />

injustificavelmente o prazo necessário para que o impetrante passe a ter interesse <strong>de</strong> agir no habeas data17.<br />

Diante <strong>do</strong> in<strong>de</strong>sejável conflito entre os dispositivos legais menciona<strong>do</strong>s, a tendência é pela aplicação, ao menos no tocante ao<br />

interesse <strong>de</strong> agir para a impetração <strong>de</strong> habeas data, <strong>do</strong>s prazos <strong>de</strong> <strong>de</strong>z e quinze dias previstos no art. 8.º da Lei 9.507/1997. Há<br />

<strong>do</strong>utrina que, apesar <strong>de</strong> reconhecer a estranheza da solução, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que, no tempo entre o vencimento <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> 72 horas e <strong>de</strong>z<br />

ou quinze dias, seja cabível o manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança 18 .<br />

Interessante notar que o legisla<strong>do</strong>r permite o ingresso <strong>de</strong> habeas data diante da <strong>de</strong>mora em respon<strong>de</strong>r o requerimento<br />

extrajudicial, não sen<strong>do</strong> necessário esperar, por vezes in<strong>de</strong>finidamente, pela recusa. Nesse caso, entretanto, surge a possibilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> a informação ser prestada a <strong>de</strong>stempo, quan<strong>do</strong> já em trâmite o habeas data, hipótese em que a ação per<strong>de</strong> supervenientemente<br />

seu objeto, sen<strong>do</strong> caso <strong>de</strong> extinção terminativa por carência superveniente (falta <strong>de</strong> interesse).


De qualquer forma, os prazos <strong>do</strong> art. 2.º da lei ora comentada não são inutiliza<strong>do</strong>s pelos prazos mais dilata<strong>do</strong>s <strong>do</strong> art. 8.º da<br />

mesma lei. Servem, ao menos, para alguma espécie <strong>de</strong> responsabilização <strong>do</strong> agente público que <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> cumprir sua função, com<br />

a a<strong>do</strong>ção das penalida<strong>de</strong>s administrativas cabíveis. Na hipótese <strong>do</strong> órgão priva<strong>do</strong>, entretanto, a norma realmente per<strong>de</strong> seu senti<strong>do</strong>,<br />

não haven<strong>do</strong> muito a se fazer diante <strong>do</strong> vencimento <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> 72 horas <strong>do</strong> art. 2.º, caben<strong>do</strong> ao interessa<strong>do</strong> esperar os <strong>de</strong>z ou<br />

quinze dias, conforme o caso, e ingressar com habeas data19.<br />

Sen<strong>do</strong> o pedi<strong>do</strong> in<strong>de</strong>feri<strong>do</strong>, não restará outra saída ao solicitante que não a via judicial, sen<strong>do</strong> cabível, nesse caso, o habeas<br />

data. Sen<strong>do</strong> acolhi<strong>do</strong> o pedi<strong>do</strong>, nos termos <strong>do</strong> art. 3.º da Lei 9.507/1997, o <strong>de</strong>positário <strong>do</strong> registro ou banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s marcará dia e<br />

hora para que o requerente tome conhecimento das informações. Como não há na lei previsão <strong>de</strong> prazo para que essa exibição<br />

ocorra após o <strong>de</strong>ferimento <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>, enten<strong>do</strong> que a <strong>de</strong>signação <strong>de</strong> data em tempo longínquo, sem qualquer justificativa, enseja o<br />

ingresso <strong>de</strong> habeas data, com uma interessante particularida<strong>de</strong>, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong> tutela da evidência nos termos <strong>do</strong><br />

art. 311, I, <strong>do</strong> Novo CPC, ainda que nesse caso o parágrafo único <strong>do</strong> artigo menciona<strong>do</strong> não admita a concessão <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong><br />

tutela provisória <strong>de</strong> ofício.<br />

O art. 4.º da Lei 9.507/1997 dá a enten<strong>de</strong>r que o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> correção <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s será necessariamente uma fase posterior à sua<br />

exibição por via extrajudicial. Ocorre, entretanto, que é possível que o solicitante já tenha ti<strong>do</strong> acesso às informações por outros<br />

meios que não o previsto nos arts. 2.º e 3.º da Lei 9.507/1997, sen<strong>do</strong> também nessa hipótese aplicável o procedimento previsto pelo<br />

artigo ora comenta<strong>do</strong> 20 . É possível que um cliente <strong>de</strong> banco, por exemplo, fique saben<strong>do</strong> <strong>de</strong> um incorreto apontamento junto aos<br />

serviços <strong>de</strong> proteção ao crédito sem necessariamente precisar pedir a esse órgão a informação sobre seus da<strong>do</strong>s pessoais manti<strong>do</strong>s<br />

em registro ou cadastro.<br />

Basta ao pedi<strong>do</strong>, nos termos <strong>do</strong> art. 4.º, caput, da Lei 9.507/1997, que o requerimento – a lei fala em “petição” – esteja<br />

<strong>de</strong>vidamente instruí<strong>do</strong> com <strong>do</strong>cumentos comprobatórios, caben<strong>do</strong> investigar que <strong>do</strong>cumentos seriam esses indica<strong>do</strong>s pela norma<br />

legal. Enten<strong>do</strong> que os <strong>do</strong>cumentos que <strong>de</strong>vem instruir o requerimento têm dupla função: (a) <strong>de</strong>monstrar a existência das<br />

informações reputadas incorretas e mantidas no registro ou cadastro <strong>do</strong> órgão ou entida<strong>de</strong> chamada administrativamente a corrigir<br />

tais da<strong>do</strong>s, o que constituiria o interesse e a<strong>de</strong>quação <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>; (b) <strong>de</strong>monstrar <strong>do</strong>cumentalmente a incorreção <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s, o que<br />

constituiria propriamente o mérito da pretensão administrativa.<br />

Conforme previsto no art. 4.º, § 1.º, da Lei 9.507/1997, feita a retificação em, no máximo, <strong>de</strong>z dias após a entrada <strong>do</strong><br />

requerimento, a entida<strong>de</strong> ou órgão <strong>de</strong>positário <strong>do</strong> registro ou da informação dará ciência ao interessa<strong>do</strong>. Segun<strong>do</strong> o art. 8.º,<br />

parágrafo único, II, da mesma lei, é peça essencial <strong>de</strong> instrução da petição inicial a prova da recusa em fazer-se a retificação ou <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>curso <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> quinze dias sem <strong>de</strong>cisão. Na conjugação <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is dispositivos legais, a conclusão é que o interesse <strong>de</strong> agir só<br />

passa a existir após o décimo quinto dia <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> até então não houver resposta. Novamente <strong>de</strong>ve-se consi<strong>de</strong>rar a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> perda superveniente <strong>do</strong> objeto <strong>do</strong> habeas data, na hipótese <strong>de</strong> retificação extemporânea.<br />

Por fim, na terceira hipótese <strong>de</strong> cabimento <strong>do</strong> habeas data, o art. 4.º, § 2.º, da Lei 9.507/1997 não prevê qualquer prazo para a<br />

resposta e/ou atendimento <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> feito extrajudicialmente. No silêncio <strong>do</strong> dispositivo legal, resta ainda mais tranquila a<br />

aplicação <strong>do</strong> prazo previsto no art. 8.º, parágrafo único, II, da Lei 9.507/1997, sen<strong>do</strong> condiciona<strong>do</strong> o interesse <strong>de</strong> agir à recusa ou<br />

omissão por tempo superior a quinze dias <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>.<br />

14.4.2.2.<br />

Fase processual<br />

14.4.2.2.1.<br />

Introdução<br />

Conforme ensina a melhor <strong>do</strong>utrina, há consi<strong>de</strong>rável semelhança entre o procedimento <strong>do</strong> habeas data e <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

segurança21, inclusive com algumas regras legais que simplesmente copiam a lei <strong>de</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança. Termos como<br />

autorida<strong>de</strong> coatora, notificação e impetração po<strong>de</strong>m ser encontra<strong>do</strong>s no procedimento <strong>do</strong> habeas data, com inegável influência da<br />

lei <strong>de</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança. Antes <strong>de</strong> ser uma mera coincidência, a constatação tem relevância prática na aplicação subsidiária da<br />

Lei 12.016/2009 ao procedimento <strong>de</strong> habeas data, bem como na utilização <strong>de</strong> interpretações <strong>do</strong>utrinárias e jurispru<strong>de</strong>nciais a<br />

respeito <strong>de</strong> temas polêmicos <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança que sejam aplicáveis ao habeas data.<br />

14.4.2.2.2.<br />

Petição inicial<br />

Sen<strong>do</strong> indiscutível a natureza <strong>de</strong> ação <strong>do</strong> habeas data, aplica-se o princípio da inércia da jurisdição, <strong>de</strong> forma que o Po<strong>de</strong>r<br />

Judiciário se movimentará quan<strong>do</strong> provoca<strong>do</strong> pelo interessa<strong>do</strong>. Essa provocação se dá por meio da petição inicial, ato processual<br />

solene que dá início ao procedimento.<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 8.º, caput, da Lei 9.507/1997, a petição inicial <strong>do</strong> habeas data seguirá as regras formais <strong>do</strong>s arts. 319 a 321<br />

<strong>do</strong> Novo CPC, <strong>de</strong> forma a serem consagra<strong>do</strong>s nessa espécie <strong>de</strong> ação constitucional não só os requisitos formais que <strong>de</strong>vem ser


espeita<strong>do</strong>s na elaboração da petição inicial (art. 319 <strong>do</strong> Novo CPC), mas também a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> instrução da peça com<br />

<strong>do</strong>cumentos indispensáveis à propositura da ação (art. 320 <strong>do</strong> Novo CPC) e a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> emenda no prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z dias, na<br />

hipótese <strong>de</strong> vício sanável (art. 321 <strong>do</strong> Novo CPC).<br />

Dos requisitos formais da petição inicial previstos pelo art. 319 <strong>do</strong> Novo CPC, o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> citação <strong>do</strong> réu <strong>de</strong>ve ser<br />

compreendi<strong>do</strong> como pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> notificação da autorida<strong>de</strong> coatora, formalismo inútil, como sempre. O pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> produção <strong>de</strong><br />

provas não se justifica em razão da natureza sumário-<strong>do</strong>cumental <strong>do</strong> procedimento consagra<strong>do</strong> pela Lei 9.507/1997. O valor da<br />

causa, conforme correto ensinamento <strong>do</strong>utrinário, <strong>de</strong>ve ser meramente estimativo, ainda que sua relevância seja praticamente<br />

inexistente em razão da gratuida<strong>de</strong> da ação e da isenção <strong>de</strong> con<strong>de</strong>nação ao pagamento <strong>de</strong> honorários advocatícios22.<br />

No tocante à forma <strong>de</strong> apresentação da petição inicial, prevê o dispositivo legal ora analisa<strong>do</strong> que ela <strong>de</strong>ve ser apresentada no<br />

prazo em duas vias, regra que não foge à normalida<strong>de</strong> com relação às petições iniciais em geral, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a necessida<strong>de</strong> da<br />

existência <strong>de</strong> contrafé para ser entregue ao <strong>de</strong>manda<strong>do</strong>. E, exatamente como ocorre nas ações em geral, quan<strong>do</strong> o número <strong>de</strong> vias<br />

suplementares respeitar o número <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda<strong>do</strong>s, no habeas data se exigirá <strong>do</strong> autor tantas vias quanto forem as autorida<strong>de</strong>s<br />

apontadas como coatoras 23 .<br />

O mesmo dispositivo ainda prevê que a instrução exigida por lei <strong>de</strong>verá ser realizada com a juntada <strong>de</strong> <strong>do</strong>cumentos originários<br />

para a primeira via e cópia para a segunda. Ainda que a norma silencie, tais cópias dispensam autenticação.<br />

O aspecto mais interessante e peculiar da petição inicial <strong>do</strong> habeas data encontra-se consagra<strong>do</strong> no parágrafo único <strong>do</strong> art. 8.º<br />

da Lei 9.507/1997. Os três incisos preveem <strong>do</strong>cumentos indispensáveis à propositura da ação, exigin<strong>do</strong> o autor a instrução da<br />

petição inicial com prova (leia-se <strong>do</strong>cumento) que <strong>de</strong>monstra o interesse <strong>de</strong> agir na postulação. Em outros termos, o autor <strong>de</strong>ve<br />

comprovar que passou <strong>de</strong> forma infrutífera pela fase pré-processual, sen<strong>do</strong>, portanto, necessária a propositura da ação.<br />

14.4.2.2.3.<br />

Posturas <strong>do</strong> juiz diante da petição inicial<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 10, caput, da Lei 9.507/1997, a petição inicial será <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo in<strong>de</strong>ferida em duas hipóteses: quan<strong>do</strong> não for o<br />

caso <strong>do</strong> habeas data e quan<strong>do</strong> lhe faltar os requisitos previstos em lei. A preocupação <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r em prever uma <strong>de</strong>cisão liminar<br />

que já extingue o processo é elogiável, sen<strong>do</strong> sempre preferível colocar-se um fim o mais rápi<strong>do</strong> possível à ação que não reúna<br />

mínimas condições <strong>de</strong> prosseguimento. Duas observações, entretanto, se impõem na análise <strong>do</strong> dispositivo.<br />

Em primeiro lugar, as formas <strong>de</strong> extinção previstas pelo dispositivo legal ora comenta<strong>do</strong> não sofrem os efeitos da preclusão,<br />

<strong>de</strong> forma que, embora não <strong>de</strong>sejável, também caberá a extinção <strong>do</strong> habeas data por ina<strong>de</strong>quação <strong>do</strong> meio ou vício formal após a<br />

notificação e/ou apresentação <strong>de</strong> informações pela autorida<strong>de</strong> coatora. Em segun<strong>do</strong> lugar, como consagra<strong>do</strong> pelo art. 8.º, caput, da<br />

Lei 9.507/1997, é admissível a emenda da petição inicial <strong>do</strong> habeas data, <strong>de</strong> forma que nem toda irregularida<strong>de</strong> formal levará à sua<br />

extinção liminar, somente aquelas que sejam insanáveis. Não parece ser esse o caso, por exemplo, da instrução <strong>de</strong>ficitária da peça<br />

inicial, vício plenamente sanável pela emenda da petição inicial.<br />

Registre-se, ainda, a inútil previsão contida no art. 10, parágrafo único, da Lei 9.507/1997, que, além <strong>de</strong> se valer<br />

in<strong>de</strong>vidamente <strong>do</strong> termo “<strong>de</strong>spacho” ao se referir à sentença, <strong>de</strong>termina que tal <strong>de</strong>cisão será impugnável pelo recurso previsto pelo<br />

art. 15 da mesma lei, que, por sua vez, prevê o recurso <strong>de</strong> apelação. Como se po<strong>de</strong> notar, bastaria que o legisla<strong>do</strong>r tivesse<br />

silencia<strong>do</strong> a respeito para se aplicar o art. 1.009, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, sem maiores complicações.<br />

Estan<strong>do</strong> em or<strong>de</strong>m a petição inicial, o art. 9.º da Lei 9.507/1997 <strong>de</strong>termina que o juiz or<strong>de</strong>ne a notificação da autorida<strong>de</strong><br />

coatora, que receberá a segunda via da petição inicial e as cópias <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos que a instruíram. Ainda segun<strong>do</strong> o dispositivo<br />

legal, o coator terá um prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z dias para apresentar as informações que julgar necessárias. É inegável a influência exercida<br />

pelo art. 7.º, I, da Lei 1.533/1951, em regra atualmente consagrada no mesmo dispositivo pela Lei 12.016/2009. Não causa<br />

surpresa, portanto, que as mesmas polêmicas existentes no manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança sejam transportadas para o habeas data, como a<br />

i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> quem <strong>de</strong>va ser o réu na <strong>de</strong>manda. A notificação, como forma <strong>de</strong> comunicação <strong>de</strong> ato processual, é bastante<br />

polêmica, estan<strong>do</strong> atualmente reservada à forma <strong>de</strong> comunicação à autorida<strong>de</strong> coatora da existência da petição inicial <strong>do</strong> habeas<br />

data e manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança. Há parcela <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> sua natureza <strong>de</strong> citação, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que, nesse caso, o réu<br />

terá si<strong>do</strong> integra<strong>do</strong> à relação jurídica processual24. Outra parcela, entretanto, prefere o entendimento <strong>de</strong> que a notificação é uma<br />

espécie sui generis <strong>de</strong> comunicação <strong>do</strong> ato processual, <strong>de</strong> forma a ser consi<strong>de</strong>rada uma terceira e excepcional forma <strong>de</strong><br />

comunicação, ao la<strong>do</strong> da citação e intimação 25 . Qualquer que seja a natureza da notificação, ela <strong>de</strong>ve se dar por correio ou oficial<br />

<strong>de</strong> justiça, na forma da lei processual 26 .<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 11 da Lei 9.507/1997, uma vez realizada a notificação, caberá ao serventuário que cuida <strong>do</strong> processo juntar aos<br />

autos cópias autenticadas <strong>do</strong> ofício en<strong>de</strong>reça<strong>do</strong> ao coator, bem como a prova <strong>de</strong> sua entrega a este ou da recusa em recebê-lo ou <strong>de</strong><br />

dar recibo. Enten<strong>do</strong> que a certificação da recusa em receber a segunda via da petição inicial e a recusa em dar recibo só têm<br />

alguma eficácia jurídica quan<strong>do</strong> realizadas por oficial <strong>de</strong> justiça, <strong>de</strong>tentor <strong>de</strong> fé pública, o que faltará ao carteiro. Dessa forma,


sen<strong>do</strong> a notificação realizada pelo correio, e haven<strong>do</strong> tais recusas por parte da autorida<strong>de</strong> coatora, a notificação <strong>de</strong>verá ser realizada<br />

por oficial <strong>de</strong> justiça. Nesta hipótese, a certidão narran<strong>do</strong> o ocorri<strong>do</strong> será o suficiente para se dar a autorida<strong>de</strong> coatora como<br />

<strong>de</strong>vidamente notificada.<br />

O dispositivo tem ao menos um aspecto intrigante, em especial quan<strong>do</strong> compara<strong>do</strong> com o art. 8.º, caput, da mesma lei.<br />

Enquanto o art. 11 prevê que será juntada aos autos <strong>do</strong> processo cópia autêntica <strong>de</strong> ofício, o art. 8.º, caput, ao fazer expressa<br />

remissão ao art. 285 <strong>do</strong> CPC/1973, indica a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> expedição <strong>de</strong> manda<strong>do</strong>, inclusive com a informação <strong>de</strong> que a ausência<br />

<strong>de</strong> contestação levará à presunção <strong>de</strong> veracida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s fatos alega<strong>do</strong>s pelo autor. Pergunta-se: o coator é notifica<strong>do</strong> mediante ofício<br />

ou manda<strong>do</strong>? A <strong>do</strong>utrina se divi<strong>de</strong> sobre o tema, haven<strong>do</strong> os que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m a expedição <strong>de</strong> um manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> notificação, nos mol<strong>de</strong>s<br />

<strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> citação 27 , e outros que enten<strong>de</strong>m ser o procedimento menos formal que uma citação, bastan<strong>do</strong>, portanto, a<br />

expedição <strong>de</strong> um ofício 28 .<br />

14.4.2.2.4.<br />

Prestação <strong>de</strong> informações<br />

Uma vez notificada, a autorida<strong>de</strong> coatora terá, nos termos <strong>do</strong> art. 9.º da Lei 9.507/1997, um prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z dias para a<br />

apresentação das informações em juízo. Trata-se <strong>de</strong> prazo próprio, <strong>de</strong> forma que, <strong>de</strong>corri<strong>do</strong>s os <strong>de</strong>z dias e não apresentadas as<br />

informações, não mais se admitirá a manifestação da autorida<strong>de</strong> coatora, <strong>de</strong> forma a restar preclusa a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reação.<br />

O conteú<strong>do</strong> das informações é <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>ira contestação, inclusive com a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> arguição <strong>de</strong> matéria processual <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>fesa, bem como matéria <strong>de</strong> mérito, tais como a ausência <strong>de</strong> caráter público <strong>do</strong> banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, ausência <strong>de</strong> <strong>do</strong>cumento essencial<br />

à propositura da ação ou <strong>de</strong> recusa <strong>do</strong> órgão público, sigilo das informações que se preten<strong>de</strong> obter, <strong>de</strong>ntre outras29.<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 12 da Lei 9.507/1997, fin<strong>do</strong> o prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z dias para a prestação das informações, será ouvi<strong>do</strong> o<br />

representante <strong>do</strong> Ministério Público, o que <strong>de</strong>ixa claro que, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da efetiva apresentação <strong>de</strong> informações, o<br />

procedimento prosseguirá. A prestação <strong>de</strong> informação, portanto, é um ônus da autorida<strong>de</strong> coatora, haven<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrina, inclusive, que<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a geração da revelia e <strong>de</strong> seu principal efeito – presunção <strong>de</strong> veracida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s fatos alega<strong>do</strong>s pelo autor – diante da ausência<br />

da prestação <strong>de</strong> informações 30 .<br />

Apesar <strong>de</strong> ser interessante o entendimento, não consigo ver gran<strong>de</strong> repercussão prática, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> que o direito à exibição<br />

ou retificação persegui<strong>do</strong> pelo habeas data é essencialmente matéria <strong>de</strong> direito, haven<strong>do</strong> somente ônus da prova ao autor no<br />

tocante à admissibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tal ação constitucional, o que se fará por meio <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos que <strong>de</strong>monstrarão a realização da fase<br />

pré-processual e que, por exigência legal, <strong>de</strong>vem instruir a petição inicial. De qualquer forma, e esse é o aspecto principal, o<br />

seguimento <strong>do</strong> procedimento não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da efetiva apresentação das informações em juízo.<br />

14.4.2.2.5.<br />

Intimação da pessoa jurídica <strong>de</strong> direito público?<br />

Como já afirma<strong>do</strong>, há uma inegável proximida<strong>de</strong> <strong>do</strong> procedimento regula<strong>do</strong> pela Lei 9.507/1997 com aquele previsto pela Lei<br />

1.533/1951, que regulamentou o procedimento <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança até o ano <strong>de</strong> 2009, quan<strong>do</strong> a Lei 12.016 a revogou. É<br />

natural, portanto, que a aplicação <strong>de</strong> novida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>ssa lei ao procedimento <strong>do</strong> habeas data seja objeto <strong>de</strong> questionamentos<br />

<strong>do</strong>utrinários. No caso, trata-se da aplicação ou não <strong>do</strong> art. 7.º, II, da nova Lei <strong>de</strong> Manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> Segurança, em previsão ausente da<br />

legislação anterior, que <strong>de</strong>termina que o juiz dê ciência <strong>do</strong> processo ao órgão <strong>de</strong> representação judicial da pessoa jurídica,<br />

envian<strong>do</strong>-lhe cópia da petição inicial, sen<strong>do</strong> dispensa<strong>do</strong> o envio <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos que a instruem.<br />

Enten<strong>do</strong> que a mesma justificativa existente para a consagração da ciência da pessoa jurídica <strong>de</strong> direito público, presente no<br />

manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança, aplica-se também ao habeas data, <strong>de</strong> forma a ser aplicável tal regra ao procedimento <strong>do</strong> segun<strong>do</strong>. As<br />

discussões a respeito da forma <strong>de</strong> comunicação, que passam pela premissa <strong>de</strong> se <strong>de</strong>finir a legitimida<strong>de</strong> passiva <strong>do</strong> habeas data, são<br />

exatamente as mesmas referentes ao manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança31.<br />

14.4.2.2.6.<br />

Participação <strong>do</strong> Ministério Público<br />

De acor<strong>do</strong> com o art. 12 da Lei 9.507/1997, fin<strong>do</strong> o prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z dias para a prestação das informações, será ouvi<strong>do</strong> o<br />

representante <strong>do</strong> Ministério Público, parecen<strong>do</strong>, nesse caso, ser indiscutível a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua intimação para participar como<br />

fiscal da lei. Aplica-se subsidiariamente o art. 12 da Lei 12.016/2009, que veio a pacificar polêmico tema a respeito da necessida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> manifestação <strong>do</strong> Ministério Público quan<strong>do</strong> intima<strong>do</strong> a participar como custos legis. O parágrafo único <strong>do</strong> dispositivo legal<br />

menciona<strong>do</strong> é claro ao prever que, com ou sem o parecer <strong>do</strong> Ministério Público, os autos serão conclusos ao juiz para a <strong>de</strong>cisão,<br />

em previsão <strong>de</strong> to<strong>do</strong> aplicável ao procedimento <strong>do</strong> habeas data.<br />

Parece natural essa conclusão, diante da sumarieda<strong>de</strong> <strong>do</strong> rito procedimental e <strong>do</strong> claro objetivo <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r em fazer com que<br />

o procedimento seja o mais célere possível. Não se po<strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r que um procedimento com tais características fique


obrigatoriamente reti<strong>do</strong> por largo lapso temporal, à espera <strong>de</strong> um parecer ministerial. Essa possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o procedimento seguir<br />

sem a manifestação <strong>do</strong> Ministério Público, entretanto, não torna o prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z dias para manifestação num prazo próprio, <strong>de</strong><br />

forma que a única preclusão que se opera para a admissão <strong>de</strong> tal manifestação é a mista (temporal-lógica), verificada após a<br />

<strong>de</strong>cisão já ter si<strong>do</strong> proferida. Antes disso, não há que se falar em preclusão temporal 32 .<br />

14.4.2.2.7.<br />

Instrução<br />

Demonstran<strong>do</strong> claramente ser o procedimento <strong>do</strong> habeas data sumário-<strong>do</strong>cumental, a exemplo <strong>do</strong> que ocorre com o manda<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong> segurança, após o <strong>de</strong>curso <strong>do</strong> prazo <strong>de</strong> manifestação <strong>do</strong> Ministério Público, os autos serão conclusos para a prolação da <strong>de</strong>cisão.<br />

A par da discussão <strong>de</strong> existência ou não da exigência <strong>de</strong> direito líqui<strong>do</strong> e certo no habeas data – melhor enten<strong>de</strong>r que não, por<br />

ausência <strong>de</strong> expressa previsão nesse senti<strong>do</strong> –, não parece haver no procedimento previsto pela Lei 9.507/1997 espaço para<br />

produção <strong>de</strong> qualquer outra espécie <strong>de</strong> prova que não a <strong>do</strong>cumental33quan<strong>do</strong> muito será admitida uma prova <strong>do</strong>cumentada.<br />

Justamente sob essa perspectiva <strong>de</strong>ve ser compreendida a regra consagrada pelo art. 17 da Lei 9.507/1997, ao prever que, no<br />

caso <strong>de</strong> habeas data <strong>de</strong> competência originária <strong>do</strong>s tribunais, caberá ao relator a instrução <strong>do</strong> processo. Só se po<strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r que<br />

essa “instrução” seja na realida<strong>de</strong> a prática <strong>do</strong>s atos preparatórios para o julgamento, <strong>de</strong> forma que caberá ao relator da ação a<br />

notificação da autorida<strong>de</strong> coatora, a cientificação da pessoa jurídica <strong>de</strong> direito público e a intimação <strong>do</strong> Ministério Público como<br />

fiscal da lei.<br />

14.4.2.2.8.<br />

Decisão<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 12 da Lei 9.507/1997, após o encerramento <strong>do</strong>s atos preparatórios, o juiz terá um prazo <strong>de</strong> cinco dias para<br />

<strong>de</strong>cidir o processo. Segun<strong>do</strong> o art. 19, caput, da mesma lei, sen<strong>do</strong> a ação <strong>de</strong> competência originária <strong>do</strong> tribunal, o julgamento <strong>de</strong>ve<br />

ocorrer na primeira sessão que se seguir à data em que, feita a distribuição, os autos forem conclusos ao relator. Trata-se <strong>de</strong> prazos<br />

impróprios, <strong>de</strong> forma que seu vencimento não gerará preclusão temporal, <strong>de</strong> forma que a <strong>de</strong>cisão proferida após os cinco dias<br />

legais ou em sessão subsequente será tão válida e eficaz quanto aquela proferida respeitan<strong>do</strong>-se o prazo legal. A indicação <strong>de</strong> um<br />

prazo mais exíguo que o comum – <strong>de</strong>z dias – <strong>de</strong>ixa claro que o legisla<strong>do</strong>r, apesar <strong>de</strong> não criar um <strong>de</strong>ver processual no dispositivo<br />

legal, preten<strong>de</strong> que o juiz seja o mais rápi<strong>do</strong> possível na prolação <strong>de</strong> sua <strong>de</strong>cisão.<br />

A celerida<strong>de</strong>, como importante característica <strong>do</strong> procedimento <strong>do</strong> habeas data, também se encontra consagrada no art. 19 da<br />

Lei 9.507/1997. No caput está previsto o direito <strong>de</strong> preferência no julgamento sobre os <strong>de</strong>mais processos, salvo os habeas corpus e<br />

manda<strong>do</strong>s <strong>de</strong> segurança, enquanto no parágrafo único há previsão <strong>de</strong> um prazo máximo <strong>de</strong> 24 horas para a conclusão <strong>do</strong>s autos<br />

após sua distribuição, mais um prazo impróprio. Parcela da <strong>do</strong>utrina, inclusive, diante da gran<strong>de</strong> preocupação <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r com a<br />

celerida<strong>de</strong> <strong>do</strong> procedimento, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que, a exemplo <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança, o habeas data tenha trâmite durante as férias<br />

forenses coletivas 34 .<br />

To<strong>do</strong>s os resulta<strong>do</strong>s possíveis no julgamento <strong>de</strong> uma ação judicial são admissíveis no habeas data. Qualquer que seja o teor da<br />

<strong>de</strong>cisão, não haverá con<strong>de</strong>nação ao pagamento <strong>de</strong> custas ou <strong>de</strong> honorários advocatícios, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se a gratuida<strong>de</strong> consagrada<br />

no art. 21 da Lei 9.507/1997. Ainda que in<strong>de</strong>sejável, é cabível a extinção <strong>do</strong> processo sem resolução <strong>de</strong> mérito por meio <strong>de</strong><br />

sentença terminativa, nos termos <strong>do</strong> art. 485 <strong>do</strong> Novo CPC. Nesse particular, anote-se a absoluta inutilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> art. 18 da Lei<br />

9.507/1997 ao prever que o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> habeas data po<strong>de</strong>rá ser renova<strong>do</strong> se a <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong>negatória não lhe houver aprecia<strong>do</strong> o<br />

mérito. Não havia necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma regra consagrar a regra geral. Na resolução <strong>do</strong> mérito, ainda que seja possível uma<br />

homologação <strong>de</strong> renúncia ou até mesmo o reconhecimento jurídico <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> (exibição das informações <strong>de</strong>sejadas), o mais<br />

comum é o acolhimento ou rejeição <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>, nos termos <strong>do</strong> art. 487, I, <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 13 da Lei 9.507/1997, o acolhimento <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> autor levará o juiz a <strong>de</strong>terminar ao coator a tomada <strong>de</strong> duas<br />

providências, tu<strong>do</strong> a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> formula<strong>do</strong>. Se a pretensão for o acesso às informações, o juiz marcará data e horário para<br />

que o coator as exiba em juízo. Se a pretensão for a modificação <strong>de</strong> informações, o juiz marcará data e horário para que o coator<br />

apresente em juízo a prova da retificação ou da anotação feita nos assentamentos <strong>do</strong> autor. Enten<strong>do</strong> que a natureza da <strong>de</strong>cisão é<br />

mandamental35, apesar <strong>de</strong> reconhecer a divergência <strong>do</strong>utrinária 36 , <strong>de</strong> forma que a recusa injustificada <strong>do</strong> coator em proce<strong>de</strong>r<br />

conforme a or<strong>de</strong>m <strong>do</strong> juiz constitui, nos termos <strong>do</strong> art. 77, IV, <strong>do</strong> Novo CPC, ato atentatório à dignida<strong>de</strong> da justiça.<br />

Para importante parcela da <strong>do</strong>utrina, o <strong>de</strong>scumprimento da or<strong>de</strong>m pela autorida<strong>de</strong> coatora permite a aplicação da multa<br />

prevista no art. 537 <strong>do</strong> Novo CPC, como forma <strong>de</strong> pressioná-la psicologicamente ao cumprimento da obrigação 37 . Enten<strong>do</strong>,<br />

entretanto, que a aplicação ou não das astreintes como forma <strong>de</strong> execução indireta, nesse caso, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá da <strong>de</strong>finição <strong>de</strong><br />

importante premissa <strong>de</strong> quem é a legitimida<strong>de</strong> passiva no habeas data. A única possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a aplicação das<br />

astreintes à autorida<strong>de</strong> coatora é consi<strong>de</strong>rar-se a premissa <strong>de</strong> que ela é o réu, porque, admitin<strong>do</strong>-se ser a pessoa jurídica <strong>de</strong> direito


público o legitima<strong>do</strong> passivo, somente a ela po<strong>de</strong>rá ser aplicada a multa <strong>do</strong> art. 537 <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Em cumprimento <strong>do</strong> princípio <strong>do</strong> contraditório, a autorida<strong>de</strong> coatora <strong>de</strong>ve ser informada <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo, em especial<br />

<strong>do</strong> acolhimento <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>, porque, nesse caso, há providências que <strong>de</strong>verão ser tomadas por ela. Cuida <strong>do</strong> tema da informação da<br />

autorida<strong>de</strong> coatora o art. 14 da Lei 9.507/1997, exigin<strong>do</strong>, nos termos <strong>do</strong> caput, a intimação pessoal <strong>do</strong> coator, a ser realizada por<br />

correio com aviso <strong>de</strong> recebimento, telegrama, radiograma ou telefonema, conforme requerer o impetrante.<br />

14.5.<br />

LIMINAR<br />

Não há na Lei 9.507/1997 previsão expressa a respeito <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong> liminar, contrarian<strong>do</strong> tanto a antiga como a atual Lei<br />

<strong>do</strong> Manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> Segurança, que expressamente consagra a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> urgência. A<br />

omissão legal leva a um <strong>de</strong>bate <strong>do</strong>utrinário a respeito da aplicação extensiva ou não das regras <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança ao<br />

habeas data. E, mesmo que nada houvesse na lei <strong>de</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança, po<strong>de</strong>r-se-ia questionar a respeito da aplicabilida<strong>de</strong> da<br />

tutela antecipada ao procedimento <strong>do</strong> habeas data. A questão é: a par <strong>do</strong> silêncio legal, cabe tutela <strong>de</strong> urgência satisfativa no<br />

procedimento <strong>de</strong> habeas data?<br />

Enten<strong>do</strong> que, num primeiro momento, é indispensável traçar <strong>de</strong> forma clara e segura a distinção entre satisfativida<strong>de</strong> e<br />

irreversibilida<strong>de</strong>. Discor<strong>do</strong> daqueles que tratam quase como sinônimos os termos satisfativida<strong>de</strong> e irreversibilida<strong>de</strong>38, porque, em<br />

meu entendimento, são características distintas da tutela <strong>de</strong> urgência. O grau <strong>de</strong> satisfativida<strong>de</strong> me<strong>de</strong>-se pela i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> da situação<br />

fática criada pela tutela <strong>de</strong> urgência com aquela que seria criada com a concessão da tutela <strong>de</strong>finitiva, enquanto a irreversibilida<strong>de</strong><br />

me<strong>de</strong>-se pela possibilida<strong>de</strong> ou não <strong>de</strong> se retornar a situação fática anterior a concessão da tutela <strong>de</strong> urgência na hipótese <strong>de</strong> sua<br />

revogação. Prova maior é a constatação <strong>de</strong> que toda tutela antecipada é satisfativa, e, ao menos em tese, só será inadmissível<br />

quan<strong>do</strong> irreversível (art. 300, § 3.º, <strong>do</strong> Novo CPC).<br />

O que se preten<strong>de</strong> afirmar é que, se alguma característica da tutela <strong>de</strong> urgência impedir a concessão da liminar da tutela<br />

antecipada, não será sua satisfativida<strong>de</strong>, mas sua irreversibilida<strong>de</strong>. Conforme bem nota<strong>do</strong> pela melhor <strong>do</strong>utrina que já tratou <strong>do</strong><br />

tema, o gran<strong>de</strong> problema <strong>de</strong> uma tutela <strong>de</strong> urgência na ação <strong>de</strong> habeas data é sua irreversibilida<strong>de</strong>, fenômeno que, ao menos em<br />

tese, é incompatível com as tutelas <strong>de</strong> urgência satisfativas, naturalmente provisórias. Provisorieda<strong>de</strong> e irreversibilida<strong>de</strong> realmente<br />

não são fenômenos que possam conviver <strong>de</strong> forma pacífica.<br />

É preciso observar, entretanto, que a irreversibilida<strong>de</strong>, quan<strong>do</strong> prevista expressamente como requisito negativo para concessão<br />

<strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> urgência satisfativa, não se constitui como obstáculo instransponível para a tutela urgente <strong>de</strong> direito da parte. Na tutela<br />

antecipada, ainda quan<strong>do</strong> sua concessão for faticamente irreversível, o juiz po<strong>de</strong>rá excepcionalmente concedê-la, lembran<strong>do</strong> a<br />

<strong>do</strong>utrina que um direito em perigo <strong>do</strong> autor não po<strong>de</strong> ser sacrifica<strong>do</strong> pela vedação legal. Interessante lembrar-se da viabilida<strong>de</strong> da<br />

concessão <strong>de</strong> tutelas liminares <strong>de</strong> urgência nas cautelares probatórias, quan<strong>do</strong> a prova será produzida <strong>de</strong> forma irreversível sem a<br />

participação <strong>do</strong> réu.<br />

A <strong>do</strong>utrina enten<strong>de</strong> <strong>de</strong> forma uníssona que, em situações excepcionais, a par <strong>do</strong> silêncio da lei, caberá ao juiz conce<strong>de</strong>r a tutela<br />

<strong>de</strong> urgência satisfativa liminarmente, antes mesmo da notificação da autorida<strong>de</strong> coatora para prestar as informações39.<br />

14.6.<br />

14.6.1.<br />

LEGITIMIDADE<br />

Legitimida<strong>de</strong> ativa<br />

Não há qualquer indicação na Lei 9.507/1997 sobre a legitimida<strong>de</strong> ativa na ação <strong>de</strong> habeas data, sen<strong>do</strong> entendimento<br />

<strong>do</strong>utrinário que qualquer pessoa po<strong>de</strong>rá ingressar com tal ação. Em razão <strong>de</strong> garantia constitucional, não se po<strong>de</strong>ria admitir<br />

tratamento diverso entre pessoas nacionais e estrangeiras, sen<strong>do</strong> ampla nesse senti<strong>do</strong> a legitimida<strong>de</strong> ativa40. Por outro la<strong>do</strong>, tanto a<br />

pessoa humana como a pessoa jurídica po<strong>de</strong>m ter interesse em tutelar os direitos garanti<strong>do</strong>s pelo habeas data, não parecen<strong>do</strong> haver<br />

qualquer justificativa válida para qualquer espécie <strong>de</strong> limitação quanto à legitimação ativa nesse caso 41 . Acredito que tanto a<br />

pessoa jurídica <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong> como a <strong>de</strong> direito público têm legitimida<strong>de</strong> ativa para o habeas data, ainda que, em se tratan<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong> pessoa jurídica <strong>de</strong> direito público, seja mais comum a solução <strong>de</strong> eventual impasse por via administrativa, por meio <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m<br />

superior aos órgãos envolvi<strong>do</strong>s no conflito.<br />

Essa espécie <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> é ordinária, por meio da qual a parte <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> em juízo em nome próprio o seu próprio interesse.<br />

O caráter pessoal das informações acessadas e/ou corrigidas, inclusive, leva ao único <strong>de</strong>bate <strong>do</strong>utrinária a respeito da legitimação<br />

ativa no habeas data: são legitima<strong>do</strong>s os her<strong>de</strong>iros e sucessores <strong>do</strong> titular <strong>do</strong> interesse? Naturalmente, nesse caso, estar-se-á diante<br />

<strong>de</strong> legitimação ordinária superveniente, o que mantém longe da legitimida<strong>de</strong> ativa no habeas data a legitimação extraordinária,<br />

mas a pergunta remanesce: admite-se essa transferência da legitimida<strong>de</strong> ativa?


Enquanto parcela <strong>do</strong>utrinária <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a impossibilida<strong>de</strong> da transmissão <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> aos her<strong>de</strong>iros e sucessores, forte na<br />

i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> intransmissibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> direito à informação/retificação protegi<strong>do</strong> pelo habeas data42, há <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m a<br />

legitimida<strong>de</strong> superveniente <strong>do</strong> cônjuge ou her<strong>de</strong>iros, quan<strong>do</strong> o habeas data versar sobre informações que importem em direitos<br />

mortis causa 43 . O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça já teve a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a<strong>do</strong>tar essa segunda corrente <strong>do</strong>utrinária, atribuin<strong>do</strong><br />

legitimida<strong>de</strong> ativa à viúva <strong>de</strong> militar no acesso às informações funcionais <strong>do</strong> <strong>de</strong> cujus 44 .<br />

Por fim, ao se afastar a legitimação extraordinária <strong>do</strong> polo ativo <strong>do</strong> habeas data, também afastada estará a legitimida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

Ministério Público ingressar com tal ação 45 , salvo na excepcionalíssima hipótese <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>de</strong> interesse <strong>do</strong> próprio órgão.<br />

14.6.2.<br />

Legitimida<strong>de</strong> passiva<br />

A <strong>do</strong>utrina, praticamente <strong>de</strong> forma uníssona, enten<strong>de</strong> que a legitimida<strong>de</strong> passiva no habeas data é <strong>do</strong> órgão ou entida<strong>de</strong> que<br />

<strong>de</strong>tém a informação46. Conspira para essa conclusão o art. 2.º, caput, da Lei 9.507/1997, que, mesmo preven<strong>do</strong> o procedimento<br />

extrajudicial <strong>do</strong> habeas data, consigna expressamente que o requerimento será apresenta<strong>do</strong> ao órgão ou entida<strong>de</strong> <strong>de</strong>positária <strong>do</strong><br />

registro ou banco <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s, em previsão que já antecipa quem será o réu da ação judicial, se a mesma se fizer indispensável em<br />

razão da frustração da fase pré-processual.<br />

O órgão ou entida<strong>de</strong> não precisa ter necessariamente natureza pública para ser legitima<strong>do</strong> passivo na ação <strong>de</strong> habeas data. O<br />

próprio art. 5.º, LXXII, a, da CF/1988, prevê que basta aos órgãos ou entida<strong>de</strong>s terem “caráter público”, o que permite a conclusão,<br />

pela <strong>do</strong>utrina majoritária, <strong>de</strong> que esse caráter público diz respeito à possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> as informações se tornarem públicas, no<br />

senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> chegarem ao conhecimento <strong>de</strong> terceiros. É, portanto, absolutamente irrelevante saber se o órgão que mantém tais<br />

informações é <strong>de</strong> direito público ou priva<strong>do</strong>; o que se exige é o caráter público da informação.<br />

O aspecto mais interessante da legitimida<strong>de</strong> passiva <strong>do</strong> habeas data, que não po<strong>de</strong> passar <strong>de</strong>spercebi<strong>do</strong>, é o papel que a<br />

autorida<strong>de</strong> coatora <strong>de</strong>sempenha na relação jurídica processual que será formada na <strong>de</strong>manda judicial. Como já <strong>de</strong>vidamente<br />

analisa<strong>do</strong>, a notificação será dirigida ao coator, não haven<strong>do</strong> nenhuma menção na Lei 9.507/1997 a qualquer espécie <strong>de</strong><br />

cientificação da pessoa jurídica à qual pertença. Afinal, quem terá legitimida<strong>de</strong> passiva: a autorida<strong>de</strong> coatora ou a pessoa jurídica à<br />

qual pertence?<br />

É interessante notar que, apesar da proximida<strong>de</strong> procedimental <strong>do</strong> habeas data com o manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança, a questão da<br />

legitimida<strong>de</strong> passiva no primeiro não suscitou <strong>de</strong> forma tão intensa <strong>de</strong>bates <strong>do</strong>utrinários como no segun<strong>do</strong>. De qualquer forma, o<br />

<strong>de</strong>bate é váli<strong>do</strong>.<br />

Não vejo porque concluir, no tocante ao habeas data, diferentemente <strong>do</strong> que já se havia concluí<strong>do</strong> no manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança:<br />

o réu nessas duas ações é a pessoa jurídica que, no primeiro caso, <strong>de</strong>tenha as informações e que, no segun<strong>do</strong>, tenha em seus<br />

quadros o sujeito responsável pela violação ou ameaça <strong>de</strong> violação a direito líqui<strong>do</strong> e certo. Nesse senti<strong>do</strong>, concor<strong>do</strong> com parcela<br />

<strong>do</strong>utrinária que enten<strong>de</strong> ser a autorida<strong>de</strong> coatora mero representante ou presentante da pessoa jurídica47.<br />

14.7.<br />

COMPETÊNCIA<br />

A competência para julgamento <strong>do</strong> habeas data está prevista no art. 20 da Lei 9.507/1997, que, em singular opção, prevê não<br />

só a competência originária em seu inciso I, como a competência recursal em seu inciso II.<br />

Da mesma forma que ocorre para a fixação da competência <strong>do</strong> manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança, no habeas data interessa saber o status<br />

da pessoa humana responsável pela exibição, anotação ou correção <strong>de</strong> informações. A ação constitucional po<strong>de</strong> tanto ser <strong>de</strong><br />

competência <strong>do</strong> primeiro grau, e nesse caso po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> tramitar na Justiça Fe<strong>de</strong>ral, como originária <strong>do</strong>s tribunais <strong>de</strong> segun<strong>do</strong> grau<br />

(Tribunal <strong>de</strong> Justiça e Tribunal Regional Fe<strong>de</strong>ral) e <strong>do</strong>s órgãos <strong>de</strong> superposição (Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça e Supremo Tribunal<br />

Fe<strong>de</strong>ral).<br />

Nos termos <strong>do</strong> art. 20, I, a, da Lei 9.507/1997, será competente originariamente o Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral na hipótese <strong>de</strong><br />

impugnação a ato <strong>do</strong> Presi<strong>de</strong>nte da República, das Mesas da Câmara <strong>do</strong>s Deputa<strong>do</strong>s e <strong>do</strong> Sena<strong>do</strong> Fe<strong>de</strong>ral, <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Contas da<br />

União, <strong>do</strong> Procura<strong>do</strong>r-Geral da República e <strong>do</strong> próprio Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral. Em termos recursais, a competência <strong>do</strong><br />

Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral é prevista em <strong>do</strong>is dispositivos. No art. 20, II, a, da Lei 9.507/1997, há previsão <strong>de</strong> competência recursal<br />

quan<strong>do</strong> a <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong>negatória for proferida em única instância pelos tribunais superiores (recurso ordinário constitucional, nos<br />

termos <strong>do</strong>s arts. 1.027, I, <strong>do</strong> Novo CPC e art. 102, II, a, da CF/1988), enquanto o art. 20, III, da mesma lei prevê a competência<br />

para o julgamento <strong>do</strong> recurso extraordinário nos casos previstos na Constituição Fe<strong>de</strong>ral.<br />

A competência originária <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça está prevista no art. 20, I, b, da Lei 9.507/1997: habeas data contra<br />

ato <strong>de</strong> Ministro <strong>de</strong> Esta<strong>do</strong> ou <strong>do</strong> próprio Tribunal. Em termos recursais, caberá ao Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, nos termos <strong>do</strong> art.<br />

20, II, b, da mesma lei, o julgamento, quan<strong>do</strong> a <strong>de</strong>cisão for proferida em única instância pelos Tribunais Regionais Fe<strong>de</strong>rais. Essa


previsão é apontada como inconstitucional pela melhor <strong>do</strong>utrina48, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que não existe regra nesse senti<strong>do</strong> na<br />

Constituição Fe<strong>de</strong>ral, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a lei infraconstitucional, no caso, a Lei 9.507/1997, alargar a competência <strong>do</strong> Superior Tribunal<br />

<strong>de</strong> Justiça, quer crian<strong>do</strong> um recurso inomina<strong>do</strong>, quer simplesmente preven<strong>do</strong> a competência para o recurso ordinário<br />

constitucional.<br />

Caberá aos Tribunais Regionais Fe<strong>de</strong>rais julgar habeas data contra atos <strong>do</strong> próprio tribunal ou <strong>de</strong> juiz fe<strong>de</strong>ral, nos termos <strong>do</strong><br />

art. 20, I, c, da Lei 9.507/1997, sen<strong>do</strong> sua competência recursal prevista pelo art. 20, II, c, da mesma lei: <strong>de</strong>cisão proferida por juiz<br />

fe<strong>de</strong>ral. Segun<strong>do</strong> o art. 20, I, e, da Lei 9.507/1997, a competência <strong>do</strong>s Tribunais <strong>de</strong> Justiça para o julgamento <strong>do</strong> habeas data será<br />

disciplinada pela Constituição Estadual, o mesmo ocorren<strong>do</strong> no tocante à competência recursal (art. 20, II, d, da Lei 9.507/1997).<br />

Em primeiro grau <strong>de</strong> jurisdição, a competência será da Justiça Fe<strong>de</strong>ral, quan<strong>do</strong> o habeas data impugnar ato pratica<strong>do</strong> por<br />

autorida<strong>de</strong> fe<strong>de</strong>ral, excetua<strong>do</strong>s os casos <strong>de</strong> competência <strong>do</strong>s tribunais fe<strong>de</strong>rais (art. 20, I, d, da Lei 9.507/1997), sen<strong>do</strong> a<br />

competência da Justiça Estadual residual, nos termos <strong>do</strong> art. 20, I, f, da mesma lei.<br />

14.8.<br />

RECURSOS<br />

Não cabem elogios ao legisla<strong>do</strong>r no tocante ao tratamento recursal dispensa<strong>do</strong> ao procedimento <strong>do</strong> habeas data, regula<strong>do</strong> pela<br />

Lei 9.507/1997. O tema é trata<strong>do</strong> pelos arts. 10, parágrafo único, e 15 da referida lei, e bem melhor seria se o legisla<strong>do</strong>r tivesse<br />

simplesmente silencia<strong>do</strong> a respeito <strong>do</strong> tema.<br />

O art. 10, parágrafo único, prevê que <strong>do</strong> “<strong>de</strong>spacho <strong>de</strong> in<strong>de</strong>ferimento” cabe o recurso <strong>de</strong> apelação, fazen<strong>do</strong> remissão ao art. 15<br />

<strong>do</strong> mesmo diploma legal. Não existe no sistema processual pátrio um <strong>de</strong>spacho capaz <strong>de</strong> in<strong>de</strong>ferir a petição inicial, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>se<br />

<strong>de</strong>spachos os pronunciamentos judiciais sem caráter <strong>de</strong>cisório, volta<strong>do</strong>s tão somente ao andamento procedimental. Sen<strong>do</strong> a<br />

petição inicial in<strong>de</strong>ferida, o ato judicial será uma sentença que extingue o processo, recorrível por apelação nos termos <strong>do</strong> art.<br />

1.009, caput, <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Segun<strong>do</strong> o art. 15, caput, da Lei 9.507/1997, da sentença que conce<strong>de</strong>r ou negar o habeas data cabe o recurso <strong>de</strong> apelação. Por<br />

alguma razão incompreensível, o dispositivo só tratou da sentença <strong>de</strong> mérito, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> <strong>de</strong> indicar que também da sentença<br />

terminativa será cabível o recurso <strong>de</strong> apelação, conclusão a que se chega pela aplicação <strong>do</strong> art. 1.009, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, que<br />

corretamente não qualifica a espécie <strong>de</strong> sentença para <strong>de</strong>terminar sua recorribilida<strong>de</strong> pela apelação. Dessa forma, qualquer que seja<br />

a sentença proferida no habeas data, o recurso cabível será a apelação, além, é claro, <strong>do</strong>s embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração para as hipóteses<br />

<strong>de</strong> omissão, obscurida<strong>de</strong> e contradição.<br />

O recurso <strong>de</strong> apelação, nos termos <strong>do</strong> art. 15, parágrafo único, da Lei 9.507/1997 não terá efeito suspensivo, quan<strong>do</strong> a<br />

sentença conce<strong>de</strong>r o habeas data, <strong>de</strong> forma que a <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> exibição ou correção <strong>de</strong>verá ser cumprida imediatamente, ainda<br />

que interposto o recurso <strong>de</strong> apelação. Sen<strong>do</strong> o julgamento <strong>de</strong> improcedência, e na ausência <strong>de</strong> regra expressa nesse caso, a apelação<br />

será recebida no duplo efeito, nos termos <strong>do</strong> art. 1.012, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, ainda que, nesse caso, a imediata geração da <strong>de</strong>cisão<br />

<strong>de</strong>negatória não produza qualquer transformação prática no plano <strong>do</strong>s fatos, o que torna <strong>de</strong>simportante a ausência <strong>de</strong> efeito<br />

suspensivo.<br />

Ainda que não exista efeito suspensivo próprio (ope legis) à apelação contra <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> procedência no habeas data, o<br />

sucumbente po<strong>de</strong>rá, ao apelar da sentença, requerer a concessão <strong>de</strong> efeito suspensivo impróprio (ope legis), com fundamento no<br />

art. 995, parágrafo único <strong>do</strong> Novo CPC. Dessa forma, <strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> serem relevantes seus fundamentos e o perigo <strong>de</strong> lesão<br />

irreparável ou <strong>de</strong> difícil reparação, caso a <strong>de</strong>cisão recorrida gere imediatamente seus efeitos, po<strong>de</strong>rá requerer a excepcional<br />

concessão <strong>de</strong> efeito suspensivo ao recurso.<br />

Registre-se nesse tocante o disposto no art. 1.012, § 4.º <strong>do</strong> Novo CPC, que prevê os requisitos para a concessão <strong>de</strong> efeito<br />

suspensivo a apelação que não o tenha por previsão legal. Segun<strong>do</strong> o dispositivo legal, a eficácia da sentença po<strong>de</strong>rá ser suspensa<br />

pelo relator se o apelante <strong>de</strong>monstrar a probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> provimento <strong>do</strong> recurso ou se, sen<strong>do</strong> relevante a fundamentação, houver<br />

risco <strong>de</strong> dano grave ou <strong>de</strong> difícil reparação.<br />

Como se po<strong>de</strong> notar da leitura <strong>do</strong> dispositivo legal, a concessão <strong>de</strong> efeito suspensivo não está exclusivamente condicionada<br />

aos requisitos da tutela <strong>de</strong> urgência, como ocorre no art. 995, caput <strong>do</strong> Novo CPC, mas também aos requisitos da tutela <strong>de</strong><br />

evidência, já que basta ao apelante provar a probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> provimento <strong>do</strong> recurso para que o efeito suspensivo seja<br />

concedi<strong>do</strong>49.<br />

O dispositivo capta <strong>de</strong> uma forma mais a<strong>de</strong>quada a nova realida<strong>de</strong> inaugurada pelo Novo Código <strong>de</strong> Processo Civil quanto às<br />

diferentes espécies <strong>de</strong> tutela provisória, e bem por isso não <strong>de</strong>ve ter sua aplicação limitada ao recurso <strong>de</strong> apelação. Enten<strong>do</strong> que,<br />

mesmo que haja previsão genérica <strong>de</strong> efeito suspensivo ope iudicis no art. 995, caput, <strong>do</strong> Novo CPC, o art. 1.012, § 4.º, <strong>do</strong> NCPC<br />

<strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> norma da teoria geral <strong>do</strong>s recursos 50 , o que não chegaria a ser uma novida<strong>de</strong>, consi<strong>de</strong>rada a natureza <strong>de</strong>


ecurso padrão da apelação, que tem vários dispositivos aplicáveis a todas as espécies recursais.<br />

No tocante a esse pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong> efeito suspensivo impróprio, é preciso observar que, começan<strong>do</strong> o procedimento da<br />

apelação em primeiro grau <strong>de</strong> jurisdição, e sen<strong>do</strong> <strong>de</strong> competência <strong>do</strong> relator <strong>de</strong>sse recurso a concessão <strong>do</strong> efeito suspensivo, nos<br />

termos <strong>do</strong> art. 995, parágrafo único <strong>do</strong> Novo CPC, o apelante terá que pleitear junto ao tribunal a concessão <strong>do</strong> efeito suspensivo,<br />

sem que os autos <strong>do</strong> processo e, por consequência lógica, a apelação tenham chega<strong>do</strong> fisicamente ao tribunal.<br />

Enten<strong>do</strong> que bastaria, nesse caso, ingressar com uma petição autônoma <strong>de</strong>vidamente instruída perante o tribunal competente,<br />

requeren<strong>do</strong> a concessão <strong>de</strong> efeito suspensivo à apelação no tocante ao capítulo da sentença que conce<strong>de</strong>u a tutela antecipada, com<br />

fundamento no art. 995, parágrafo único. Uma vez distribuída a petição, o órgão colegia<strong>do</strong> que a receber torna-se prevento para a<br />

apelação, que será a ele encaminhada quan<strong>do</strong> finalmente os autos chegarem ao tribunal. É a melhor forma entre todas as possíveis,<br />

sem a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interposição <strong>de</strong> recursos ou <strong>de</strong> outras ações judiciais: forma mais rápida, simples, barata e em sintonia com o<br />

sincretismo processual. Esse entendimento resta consagra<strong>do</strong> no art. 1.012, § 3.º <strong>do</strong> Novo CPC.<br />

Por fim, <strong>de</strong>ve se registar que o art. 15, caput, da Lei 9.507/1997 prevê tão somente a recorribilida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>cisão que resolve o<br />

habeas data em primeiro grau <strong>de</strong> jurisdição, esquecen<strong>do</strong>-se da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tal ação ser <strong>de</strong> competência originária <strong>do</strong> tribunal.<br />

Nesse caso, naturalmente não haverá sentença e tampouco recurso <strong>de</strong> apelação. Sen<strong>do</strong> um acórdão o julgamento que <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> as<br />

ações <strong>de</strong> competência originária <strong>do</strong> tribunal, o recurso cabível, além <strong>do</strong>s embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração, será o recurso especial e/ou<br />

recurso extraordinário, a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>do</strong> caso concreto.<br />

Defen<strong>do</strong> a aplicação subsidiária no habeas data das regras recursais previstas pelo Código <strong>de</strong> Processo Civil, sen<strong>do</strong>, por<br />

exemplo, cabível o recurso <strong>de</strong> agravo <strong>de</strong> instrumento contra <strong>de</strong>cisão que verse sobre o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> tutela <strong>de</strong> urgência, bem como o<br />

agravo interno para <strong>de</strong>cisões monocráticas proferidas pelo relator em se<strong>de</strong> recursal ou originária. Também me parece indiscutível o<br />

cabimento <strong>do</strong>s recursos <strong>de</strong> embargos <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração, especial e extraordinário.<br />

1 BASTOS, Habeas, p. 85.<br />

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18<br />

19<br />

PIOVESAN, O “habeas”, p. 99; BASTOS, Habeas, p. 91.<br />

PIOVESAN, O “habeas”, p. 99.<br />

STJ – REsp 781.969/RJ – Primeira Turma – Rel. Min. Luiz Fux – j. 08.05.2007 – DJ 31.05.2007, p. 395.<br />

STJ – Pet 1.318/MA – Primeira Turma – Rel. Min. Francisco Falcão – j. 19.02.2002 – DJ 12.08.2002, p. 164.<br />

BUENO, Cassio Scarpinella. Habeas, p. 74.<br />

STJ – HD 56/DF – Terceira Seção – Rel. Min. Felix Fischer – j. 10.05.2000 – DJ 29.05.2000, p. 108.<br />

STJ – REsp 1.128.739/RJ – Segunda Seção – Rel. Min. Castro Meira – j. 17.12.2009 – DJe 10.02.2010.<br />

MARINS, James. Habeas data, antecipação <strong>de</strong> tutela e cadastros financeiros à luz <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Revista <strong>de</strong> <strong>Direito</strong><br />

<strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, n. 26, abr.-jun. 1998.<br />

STJ – HD 160/DF – Primeira Seção – Rel. Min. Denise Arruda – j. 27.08.2008 – DJe 22.09.2008.<br />

BUENO, Cassio Scarpinella. Habeas data, p. 97-98.<br />

MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnal<strong>do</strong>; MENDES, Gilmar Ferreira. Manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança e ações constitucionais. 33. ed. São Paulo:<br />

Malheiros, 2010. p. 354.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, n. 544, p. 302; CÂMARA, Alexandre Freitas.<br />

Lições <strong>de</strong> direito processual civil. 17. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. v. 1, p. 118.<br />

DINAMARCO, Cândi<strong>do</strong> Rangel. Instituições <strong>de</strong> direito processual civil. São Paulo: Malheiros, n. 544, p. 302-303; MARINONI, Luiz<br />

Guilherme. Teoria geral <strong>do</strong> processo. São Paulo: RT, 2006. p. 173; PINHO, Humberto Dalla Bernardina <strong>de</strong>. Teoria geral <strong>do</strong> processo civil<br />

contemporâneo. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2007. n. 12.5.2, p. 128; CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições <strong>de</strong> direito processual civil. 17.<br />

ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Lumen Juris, 2008. v. 1, p. 118-119; FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima. Condições da ação: enfoque sobre o interesse<br />

<strong>de</strong> agir. 3. ed. São Paulo: RT, 2005. n. 4.15, p. 130-131; STJ – REsp 954.508/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Fernan<strong>do</strong> Gonçalves – j.<br />

28.08.2007.<br />

Súmula 2/STJ: “Não cabe habeas data (CF, art. 5.º, LXXII, letra a) se não houve recusa <strong>de</strong> informações por parte da autorida<strong>de</strong><br />

administrativa”.<br />

NOVELINO, Marcelo. <strong>Direito</strong>, p. 476-477; MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnal<strong>do</strong>; MENDES, Gilmar Ferreira. Manda<strong>do</strong> <strong>de</strong> segurança e<br />

ações constitucionais. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 354.<br />

Apontan<strong>do</strong> a incoerência: BARBOSA MOREIRA, Habeas, p. 133; MEDINA, Análise, p. 158-159; ALMEIDA, Habeas, p. 108.<br />

MEDINA, Análise, p. 158.


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41<br />

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Responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> fabricante <strong>do</strong> produto, direito a ressarcimento <strong>do</strong>s danos materiais e morais, sejam preventivos,<br />

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