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#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves

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Por fim, quanto às ilustrações, a <strong>de</strong>monstrar a incidência <strong>do</strong> princípio em estu<strong>do</strong>, <strong>do</strong> Tribunal <strong>de</strong> Minas Gerais cite-se acórdão<br />

com gran<strong>de</strong> interesse prático, segun<strong>do</strong> o qual os bancos <strong>de</strong>vem <strong>de</strong>talhar aos consumi<strong>do</strong>res, em prol da transparência, todas as<br />

transações que são feitas nas contas <strong>do</strong>s seus correntistas, <strong>de</strong>ver esse que é <strong>de</strong>srespeita<strong>do</strong> muitas vezes:<br />

“Ação <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> contas. Explanação <strong>do</strong>s lançamentos em conta corrente. <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> correntista. Interesse processual<br />

manifesto. In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> fornecimento <strong>de</strong> extratos bancários <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>s a simples conferência, o correntista possui<br />

interesse em propor a ação <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> contas se paira dúvida quanto à correção <strong>do</strong>s valores lança<strong>do</strong>s na sua conta.<br />

Notadamente nos contratos em que há múltiplas e complexas operações <strong>de</strong> crédito e débito, a prestação <strong>de</strong> contas afigura-se<br />

essencial para o reconhecimento <strong>do</strong>s lançamentos que um <strong>do</strong>s contratantes faz à conta <strong>do</strong> outro. A<strong>de</strong>mais, em homenagem aos<br />

princípios da transparência e da informação consagra<strong>do</strong>s no Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, exsurge o <strong>de</strong>ver da instituição<br />

bancária <strong>de</strong> esclarecer <strong>de</strong> forma pormenorizada a administração financeira <strong>do</strong> contrato” (TJMG – Apelação cível 0142839-<br />

61.2008.8.13.0024, Belo Horizonte – Décima Terceira Câmara Cível – Rel. Des. Cláudia Maia – j. 09.12.2010 – DJEMG<br />

01.02.2011).<br />

Concluin<strong>do</strong>, como se nota, pela lei protetiva há uma ampla proteção em matéria <strong>de</strong> informação, inclusive em consonância com<br />

o previsto no art. 5º, XIV, da CF/1988, pelos riscos <strong>de</strong>correntes da exposição das pessoas a um gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s<br />

informativos, próximo ao infinito. Vale citar as palavras <strong>de</strong> Ricar<strong>do</strong> Luis Lorenzetti, que discorre muito bem sobre a informação<br />

nos seguintes termos: “Assinalou-se que o direito à informação é um pressuposto da participação <strong>de</strong>mocrática livre, porque a<br />

<strong>de</strong>mocracia po<strong>de</strong> se frustrar diante da ausência <strong>de</strong> participação, e, para participar, <strong>de</strong>ve-se estar informa<strong>do</strong>. A concepção <strong>do</strong> <strong>Direito</strong><br />

Priva<strong>do</strong> como controle difuso <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r justifica esta afirmação. Com esta finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estabelecer uma norma <strong>de</strong> <strong>de</strong>limitação <strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong>r e <strong>de</strong> participação, tem-se adverti<strong>do</strong> duas fases sobre a informação, o direito à informação importa no direito <strong>de</strong> informar a <strong>de</strong><br />

ser informa<strong>do</strong>”.29<br />

2.7.<br />

PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO<br />

O Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é prova evi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> que não se po<strong>de</strong> aceitar o contrato da maneira como antes<br />

era consagra<strong>do</strong>, regi<strong>do</strong> pelo mo<strong>de</strong>lo estanque da autonomia da vonta<strong>de</strong> e <strong>de</strong> sua consequente força obrigatória (pacta sunt<br />

servanda). A socieda<strong>de</strong> mu<strong>do</strong>u, eis que vivemos sob o <strong>do</strong>mínio <strong>do</strong> capital, e com isso <strong>de</strong>ve-se modificar o mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> se ver e se<br />

analisar os pactos, sobretu<strong>do</strong> os contratos <strong>de</strong> consumo. Como já pronuncia<strong>do</strong> em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> recurso ao Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, o<br />

Código Consumerista representa forte mitigação <strong>de</strong>ssa obrigatorieda<strong>de</strong> da convenção, mormente nas hipóteses em que o negócio<br />

jurídico celebra<strong>do</strong> encerra uma situação <strong>de</strong> injustiça (STJ – AgRg no REsp 767.771/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Jorge<br />

Scartezzini – j. 05.09.2006 – DJ 20.11.2006, p. 325).<br />

Em prol <strong>de</strong>ssa relativização <strong>do</strong> pacta sunt servanda, o Código <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r traz como princípio fundamental, embora<br />

implícito, a função social <strong>do</strong>s contratos, conceito básico para a própria concepção <strong>do</strong> negócio <strong>de</strong> consumo. O objetivo principal da<br />

função social <strong>do</strong>s contratos é tentar equilibrar uma situação que sempre foi díspar, em que o consumi<strong>do</strong>r sempre foi vítima das<br />

abusivida<strong>de</strong>s da outra parte da relação <strong>de</strong> consumo. Nesse senti<strong>do</strong>, Ada Pellegrini Grinover e Antônio Herman <strong>de</strong> Vasconcellos e<br />

Benjamin apontam que:<br />

“A socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo, ao contrário <strong>do</strong> que se imagina, não trouxe apenas benefícios para seus atores. Muito ao revés, em certos<br />

casos, a posição <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ste mo<strong>de</strong>lo, piorou em vez <strong>de</strong> melhorar. Se antes fornece<strong>do</strong>r e consumi<strong>do</strong>r encontravamse<br />

em situação <strong>de</strong> relativo equilíbrio <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r e barganha (até porque se conheciam), agora é o fornece<strong>do</strong>r que, inegavelmente,<br />

assume a posição <strong>de</strong> força na relação <strong>de</strong> consumo e que, por isso mesmo, ‘dita as regras’. E o direito não po<strong>de</strong> ficar alheio a tal<br />

fenômeno. O merca<strong>do</strong>, por sua vez, não apresenta, em si mesmo, mecanismos eficientes para superar tal vulnerabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r. Nem mesmo para mitigá-la. Logo, imprescindível a intervenção <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> nas suas três esferas: o Legislativo<br />

formulan<strong>do</strong> as normas jurídicas <strong>de</strong> consumo; o Executivo, implementan<strong>do</strong>-as; e o Judiciário, dirimin<strong>do</strong> os conflitos <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong>s<br />

esforços <strong>de</strong> formulação e <strong>de</strong> implementação”.30<br />

Como outrora foi <strong>de</strong>staca<strong>do</strong> em outras obras, a função social <strong>do</strong>s contratos constitui um principio contratual <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública<br />

– conforme consta <strong>do</strong> art. 2.035, parágrafo único, <strong>do</strong> CC/2002 –, pelo qual o contrato <strong>de</strong>ve ser, necessariamente, interpreta<strong>do</strong> e<br />

visualiza<strong>do</strong> <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o contexto da socieda<strong>de</strong>. 31 Trata-se <strong>de</strong> um princípio expresso na codificação geral privada, ao enunciar<br />

o seu art. 421 que a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> contratar será exercida em razão e nos limites da função social <strong>do</strong>s contratos. O senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> último<br />

coman<strong>do</strong> é o <strong>de</strong> que a finalida<strong>de</strong> coletiva <strong>do</strong>s negócios representa clara limitação ao exercício da autonomia privada no campo<br />

contratual.<br />

No âmbito <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, a função social <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong>ve ser reconhecida como princípio implícito,<br />

como bem observam Nelson Nery Jr. e Rosa Maria <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nery, ao lecionarem que a revisão <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> consumo tem

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