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#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves

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uma proximida<strong>de</strong> física <strong>do</strong> juiz com o evento, e consequentemente a prova po<strong>de</strong>rá ser colhida mais facilmente e <strong>de</strong> maneira mais<br />

eficaz, o que, em última análise, proporcionaria uma tutela jurisdicional <strong>de</strong> melhor qualida<strong>de</strong>.<br />

Merece transcrição a lição <strong>de</strong> Ro<strong>do</strong>lfo <strong>de</strong> Camargo Mancuso sobre o tema:<br />

“Ante esses da<strong>do</strong>s, se esmaece o impacto causa<strong>do</strong> à primeira leitura <strong>do</strong> art. 2.º da Lei 7.347/1985, on<strong>de</strong>, como se disse, o legisla<strong>do</strong>r<br />

aproximou critérios que, ordinariamente, conduzem a competências <strong>de</strong> natureza diversa. Seja porque aí se seguiu a regra <strong>de</strong><br />

competência territorial especial (CPC, art. 100, V, a), seja porque a própria letra da lei é no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que o juiz ‘terá competência<br />

funcional para processar e julgar a causa’, não pa<strong>de</strong>ce dúvida <strong>de</strong> que, no caso, trata-se <strong>de</strong> competência absoluta, com as<br />

consequências daí <strong>de</strong>correntes: não se prorroga, não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> exceção para ser conhecida, po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>clarada <strong>de</strong> ofício em<br />

qualquer tempo ou grau <strong>de</strong> jurisdição, é fator <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> absoluta; manejável em ação rescisória (CPC, art. 485, II)”. 75<br />

Mais uma vez se nota a in<strong>de</strong>vida confusão entre a razão <strong>de</strong> ser da fixação da competência absoluta a certo território e os<br />

ganhos práticos que tal fixação provavelmente trará ao processo. Não são, como faz parecer, a facilida<strong>de</strong> da produção da prova e o<br />

maior contato <strong>do</strong> juiz com o evento que motivou o ingresso da <strong>de</strong>manda judicial que fazem com que a competência da ação civil<br />

pública seja obrigatoriamente a <strong>do</strong> local <strong>do</strong> dano. Essas circunstâncias são mera consequência. O que <strong>de</strong>termina a competência<br />

absoluta – e não funcional – <strong>do</strong> local <strong>do</strong> dano é a natureza <strong>do</strong> direito controverti<strong>do</strong> (direitos difusos, coletivos e individuais<br />

homogêneos).<br />

Conforme já afirma<strong>do</strong>, a competência da ação civil pública é <strong>do</strong> foro <strong>do</strong> local <strong>do</strong> dano, sen<strong>do</strong> essa competência <strong>de</strong> natureza<br />

absoluta (no texto legal funcional, mas na realida<strong>de</strong> territorial). Essa é a disposição <strong>do</strong> art. 2.º da Lei 7.347/1985 que, apesar <strong>de</strong> ser<br />

omissa a esse respeito, também se refere ao foro <strong>do</strong> local em que <strong>de</strong>va ser pratica<strong>do</strong> o ato ilícito – e, como consequência, não<br />

necessária, mas natural, gerar-se o dano, nas hipóteses <strong>de</strong> tutela inibitória. É nesse senti<strong>do</strong> o teor <strong>do</strong> art. 93 <strong>do</strong> CDC, ao prever<br />

como competente o foro <strong>do</strong> local em que <strong>de</strong>va ocorrer o dano. O dispositivo tem o mérito <strong>de</strong> prever a competência para ações <strong>de</strong><br />

tutela preventiva, mas ao fixar a competência toman<strong>do</strong> por base o “dano”, afasta-se da melhor <strong>do</strong>utrina, que ensina não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r a<br />

tutela preventiva <strong>do</strong> dano76.<br />

Nas Comarcas maiores, em que existam varas da Justiça Estadual e da Justiça Fe<strong>de</strong>ral, a eventual participação <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s entes<br />

fe<strong>de</strong>rais previstos pelo art. 109, I, da CF/1988 não enseja qualquer problema, já que tanto a vara estadual como a vara fe<strong>de</strong>ral<br />

estarão localizadas no mesmo foro. O mesmo não ocorre, entretanto, em comarcas em que não exista vara fe<strong>de</strong>ral e haja<br />

participação no processo da União, autarquias, fundações, empresas públicas fe<strong>de</strong>rais e Ministério Público Fe<strong>de</strong>ral.<br />

A questão que <strong>de</strong>ve ser levantada nesse caso diz respeito a instituto já estuda<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> se tratou da competência da Justiça<br />

Fe<strong>de</strong>ral: a <strong>de</strong>legação por competência prevista pelo art. 109, § 3.º, da CF/1988. Não haven<strong>do</strong> vara fe<strong>de</strong>ral no local <strong>do</strong> dano, será<br />

possível que o processo tramite perante a Justiça Estadual investida <strong>de</strong> competência fe<strong>de</strong>ral ou será necessário que o processo seja<br />

<strong>de</strong>sloca<strong>do</strong> até a vara Fe<strong>de</strong>ral, ainda que em local diverso daquele em que ocorreu ou em que <strong>de</strong>va ocorrer o dano? A resposta a tal<br />

questão <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá <strong>do</strong> entendimento a respeito <strong>de</strong> o art. 2.º da Lei 7.347/1985 ter efetivamente cria<strong>do</strong> hipótese <strong>de</strong> <strong>de</strong>legação <strong>de</strong><br />

competência, conforme faculta<strong>do</strong> pelo art. 109, § 3.º, da CF/1988, ou não ter cria<strong>do</strong> tal <strong>de</strong>legação por ausência <strong>de</strong> norma expressa<br />

nesse senti<strong>do</strong>.<br />

Nossos tribunais, durante algum tempo, estiveram vacilantes a respeito <strong>do</strong> tema. A 1ª Seção <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça<br />

aprovou, em 12.03.1997, a Súmula 183: “Compete ao Juiz estadual, nas comarcas que não sejam se<strong>de</strong> <strong>de</strong> vara da Justiça Fe<strong>de</strong>ral,<br />

processar e julgar ação civil pública, ainda que a União figure no processo”. Como se po<strong>de</strong> notar <strong>do</strong> teor da súmula transcrita, o<br />

Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça a<strong>do</strong>tou o entendimento <strong>de</strong> que houve, por meio da Lei da Ação Civil Pública, a criação <strong>de</strong> mais uma<br />

hipótese <strong>de</strong> <strong>de</strong>legação <strong>de</strong> competência fe<strong>de</strong>ral ao juiz estadual nos locais em que não existissem varas fe<strong>de</strong>rais.<br />

O entendimento sumula<strong>do</strong> <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça era – e ainda é, embora supera<strong>do</strong> pelo entendimento <strong>do</strong> Supremo<br />

Tribunal Fe<strong>de</strong>ral – o preferi<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>utrina, que sempre enten<strong>de</strong>u que a <strong>de</strong>legação se justificaria em razão da previsão legal e, mais<br />

<strong>do</strong> que isso, em razão da própria necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o processo se <strong>de</strong>senvolver perante o local <strong>do</strong> dano como forma <strong>de</strong> presumidamente<br />

garantir uma tutela jurisdicional <strong>de</strong> melhor qualida<strong>de</strong>. A justificativa para o legisla<strong>do</strong>r ter cria<strong>do</strong> uma regra <strong>de</strong> competência<br />

territorial absoluta (situação excepcional) é justamente o contato mais direto <strong>do</strong> juiz com os elementos probatórios a serem colhi<strong>do</strong>s<br />

e até mesmo com a repercussão <strong>do</strong> ato pratica<strong>do</strong> na comunida<strong>de</strong>. A transferência <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>manda para outra cida<strong>de</strong>, em que exista<br />

vara fe<strong>de</strong>ral, colocaria em xeque tal justificativa, afastan<strong>do</strong> o juiz <strong>do</strong> local <strong>do</strong> dano e, em tese, prejudican<strong>do</strong> a própria entrega da<br />

prestação jurisdicional77.<br />

Assim se manifestou Ricar<strong>do</strong> <strong>de</strong> Barros Leonel:<br />

“As peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s interesses metaindividuais dificultam a produção <strong>de</strong> provas no curso da <strong>de</strong>manda judicial. A fixação da<br />

competência no local <strong>do</strong> dano tem por escopo facilitar a instrução, pois a proximida<strong>de</strong> <strong>do</strong> juízo com relação à prova milita em favor<br />

<strong>de</strong> sua elaboração. Como nas <strong>de</strong>mandas coletivas há maior interesse público e preocupação com a busca da verda<strong>de</strong> real, a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong><br />

propiciar a proximida<strong>de</strong> entre o juiz e o dinamismo <strong>do</strong>s atos <strong>de</strong> colheita das provas. Isto implica o respeito máximo ao direito

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