#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves
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“Serviço <strong>de</strong> transporte individual <strong>de</strong> passageiro, com prévia contratação entre as partes, não passível <strong>de</strong> benefícios outorga<strong>do</strong>s aos<br />
permissionários <strong>de</strong> condução <strong>de</strong> táxis. Ativida<strong>de</strong> econômica <strong>de</strong>sempenhada pelo postulante que <strong>de</strong>ve observar o princípio da livre<br />
concorrência e a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, encontran<strong>do</strong> previsão nos artigos 3º e 4º da Lei Fe<strong>de</strong>ral nº 12.587/12 (Lei <strong>de</strong> Diretrizes <strong>de</strong><br />
Mobilida<strong>de</strong> Urbana), que admite a natureza <strong>de</strong> serviço <strong>de</strong> transporte individual priva<strong>do</strong>. Po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vigilância e fiscalização outorga<strong>do</strong><br />
aos entes públicos que <strong>de</strong>ve se restringir às condições <strong>de</strong> conservação e <strong>de</strong> segurança <strong>do</strong> veículo, sua regularida<strong>de</strong> <strong>do</strong>cumental,<br />
aplicação das Leis <strong>de</strong> trânsito, coibição <strong>de</strong> embriaguez ao volante etc., não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a Administração Municipal apreen<strong>de</strong>r veículos<br />
apenas porque o motorista não é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> oficialmente taxista. Inteligência <strong>do</strong>s artigos 1º e 22, §§ 1º e 2º, da Lei Municipal nº<br />
13.775/2010, 1º, IV, 30, V, 170, IV e V, parágrafo único, to<strong>do</strong>s da Constituição Fe<strong>de</strong>ral, e 3º, 4º e 12-A da Lei Fe<strong>de</strong>ral nº<br />
12.587/2012, com alterações da Lei nº 12.865/2013. Decisão reformada para conce<strong>de</strong>r a liminar pleiteada. Recurso provi<strong>do</strong>” (TJSP<br />
– Agravo <strong>de</strong> Instrumento 2110453-72.2016.8.26.0000, Campinas – Acórdão 9745297 – Décima Terceira Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Público<br />
– Rel. Des. Djalma Lofrano – j. 24.08.2016 – DJESP 29.09.2016).<br />
Deve ser esclareci<strong>do</strong> o teor <strong>do</strong> art. 732 <strong>do</strong> CC, segun<strong>do</strong> o qual “Aos contratos <strong>de</strong> transporte, em geral, são aplicáveis, quan<strong>do</strong><br />
couber, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não contrariem as disposições <strong>de</strong>ste Código, os preceitos constantes da legislação especial e <strong>de</strong> trata<strong>do</strong>s e<br />
convenções internacionais”. Compreen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o teor <strong>do</strong> coman<strong>do</strong>, não po<strong>de</strong> ele trazer a conclusão <strong>de</strong> que o Código Civil exclui a<br />
incidência <strong>do</strong> CDC, presentes no contrato <strong>de</strong> transporte os elementos da relação <strong>de</strong> consumo. Nesse senti<strong>do</strong>, vejamos o teor <strong>do</strong><br />
Enuncia<strong>do</strong> n. 369 <strong>do</strong> CJF/STJ, aprova<strong>do</strong> na IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil:<br />
“Diante <strong>do</strong> preceito constante no art. 732 <strong>do</strong> Código Civil, teleologicamente e em uma visão constitucional <strong>de</strong> unida<strong>de</strong> <strong>do</strong> sistema,<br />
quan<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> transporte constituir uma relação <strong>de</strong> consumo, aplicam-se as normas <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r que<br />
forem mais benéficas a este”.<br />
Sem prejuízo <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os casos aponta<strong>do</strong>s, nas hipóteses em que o transporte for utiliza<strong>do</strong> com intuito direto <strong>de</strong> lucro, <strong>de</strong>ntro<br />
da máquina produtiva <strong>de</strong> uma empresa, não haverá relação <strong>de</strong> consumo. Nessa linha, vejamos publicação constante <strong>do</strong> Informativo<br />
n. 442 <strong>do</strong> STJ:<br />
“A Turma negou provimento ao recurso especial, manten<strong>do</strong> a <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> tribunal a quo, que enten<strong>de</strong>u inexistir, na espécie, relação<br />
<strong>de</strong> consumo entre, <strong>de</strong> um la<strong>do</strong>, reven<strong>de</strong><strong>do</strong>ra <strong>de</strong> máquinas e equipamentos e, <strong>do</strong> outro, transporta<strong>do</strong>ra. Cui<strong>do</strong>u-se, na origem, <strong>de</strong> ação<br />
in<strong>de</strong>nizatória ajuizada pela ora recorrente sob a alegação <strong>de</strong> que um gera<strong>do</strong>r <strong>de</strong> energia, objeto <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> transporte firma<strong>do</strong><br />
com a empresa recorrida, teria sofri<strong>do</strong> avarias durante o trajeto. O STJ aplica ao caso a teoria finalista, segun<strong>do</strong> a qual se consi<strong>de</strong>ra<br />
consumi<strong>do</strong>r aquele que adquire ou utiliza produto ou serviço como <strong>de</strong>stinatário final. Na espécie, ressaltou-se que o produto não<br />
seria <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> à recorrida, mas a cliente da reven<strong>de</strong><strong>do</strong>ra, motivo pelo qual foi afastada a regra especial <strong>de</strong> competência <strong>do</strong> art. 101,<br />
I, <strong>do</strong> CDC para fazer incidir a <strong>do</strong> art. 100, IV, a, <strong>do</strong> CPC” (STJ – REsp 836.823/PR – Rel. Min. Sidnei Beneti – j. 12.08.2010).<br />
Mais recentemente, <strong>de</strong>cidiu a mesma Corte Superior que, “para efeito <strong>de</strong> fixação <strong>de</strong> in<strong>de</strong>nização por danos à merca<strong>do</strong>ria<br />
ocorri<strong>do</strong>s em transporte aéreo internacional, o CDC não prevalece sobre a Convenção <strong>de</strong> Varsóvia quan<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> transporte<br />
tiver por objeto equipamento adquiri<strong>do</strong> no exterior para incrementar a ativida<strong>de</strong> comercial <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> empresária que não se<br />
afigure vulnerável na relação jurídico-obrigacional. Na hipótese em foco, a merca<strong>do</strong>ria transportada <strong>de</strong>stinava-se a ampliar e a<br />
melhorar a prestação <strong>do</strong> serviço e, por conseguinte, aumentar os lucros. Sob esse enfoque, não se po<strong>de</strong> conceber o contrato <strong>de</strong><br />
transporte isoladamente. Na verda<strong>de</strong>, a importação da merca<strong>do</strong>ria tem natureza <strong>de</strong> ato complexo, envolven<strong>do</strong> (i) a compra e venda<br />
propriamente dita, (ii) o <strong>de</strong>sembaraço para retirar o bem <strong>do</strong> país <strong>de</strong> origem, (iii) o eventual seguro, (iv) o transporte e (v) o<br />
<strong>de</strong>sembaraço no país <strong>de</strong> <strong>de</strong>stino mediante o recolhimento <strong>de</strong> taxas, impostos etc. Essas etapas <strong>do</strong> ato complexo <strong>de</strong> importação,<br />
conforme o caso, po<strong>de</strong>m ser efetivadas diretamente por agentes da própria empresa adquirente ou envolver terceiros contrata<strong>do</strong>s<br />
para cada fim específico. Mas essa última possibilida<strong>de</strong> – contratação <strong>de</strong> terceiros –, por si, não permite que se aplique<br />
separadamente, a cada etapa, normas legais diversas da inci<strong>de</strong>nte sobre o ciclo completo da importação. Desse mo<strong>do</strong>, não há como<br />
consi<strong>de</strong>rar a importa<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>stinatária final <strong>do</strong> ato complexo <strong>de</strong> importação nem <strong>do</strong>s atos e contratos intermediários, entre eles o<br />
contrato <strong>de</strong> transporte, para o propósito da tutela protetiva da legislação consumerista, sobretu<strong>do</strong> porque a merca<strong>do</strong>ria importada irá<br />
integrar a ca<strong>de</strong>ia produtiva <strong>do</strong>s serviços presta<strong>do</strong>s pela empresa contratante <strong>do</strong> transporte. (…). A<strong>de</strong>mais, não se <strong>de</strong>sconhece que o<br />
STJ tem atenua<strong>do</strong> a incidência da teoria finalista, aplican<strong>do</strong> o CDC quan<strong>do</strong>, apesar <strong>de</strong> relação jurídico-obrigacional entre<br />
comerciantes ou profissionais, estiver caracterizada situação <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> ou hipossuficiência. Entretanto, a empresa<br />
importa<strong>do</strong>ra não apresenta vulnerabilida<strong>de</strong> ou hipossuficiência, o que afasta a incidência das normas <strong>do</strong> CDC. Dessa forma,<br />
inexistin<strong>do</strong> relação <strong>de</strong> consumo, circunstância que impe<strong>de</strong> a aplicação das regras específicas <strong>do</strong> CDC, há que ser observada a<br />
Convenção <strong>de</strong> Varsóvia, que regula especificamente o transporte aéreo internacional” (STJ – REsp 1.162.649/SP – Rel. originário<br />
Min. Luis Felipe Salomão – Rel. para acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira – j. 13.05.2014 – publica<strong>do</strong> no seu Informativo n.<br />
541).<br />
Como está claro da última <strong>de</strong>cisum, as <strong>de</strong>duções merecem ser ressalvadas para as hipóteses envolven<strong>do</strong> pessoas vulneráveis ou