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#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves

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po<strong>de</strong>m respon<strong>de</strong>r pelos danos causa<strong>do</strong>s a terceiros. Em suma, o escu<strong>do</strong>, no caso da pessoa jurídica, é retira<strong>do</strong> para atingir quem<br />

está atrás <strong>de</strong>le, o sócio ou administra<strong>do</strong>r. Bens da empresa também po<strong>de</strong>rão respon<strong>de</strong>r por dívidas <strong>do</strong>s sócios, por meio <strong>do</strong> que se<br />

<strong>de</strong>nomina <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração inversa ou invertida, mais à frente estudada.<br />

Como é cediço, o atual Código Civil Brasileiro acolheu expressamente a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração. Prescreve o seu art. 50 que: “Em<br />

caso <strong>de</strong> abuso da personalida<strong>de</strong> jurídica caracteriza<strong>do</strong> pelo <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong>, ou pela confusão patrimonial, po<strong>de</strong> o Juiz <strong>de</strong>cidir,<br />

a requerimento da parte, ou <strong>do</strong> Ministério Público quan<strong>do</strong> lhe couber intervir no processo, que os efeitos <strong>de</strong> certas e <strong>de</strong>terminadas<br />

relações <strong>de</strong> obrigações sejam estendi<strong>do</strong>s aos bens particulares <strong>do</strong>s administra<strong>do</strong>res ou sócios da pessoa jurídica.” Como a<br />

<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica foi a<strong>do</strong>tada pelo legisla<strong>do</strong>r da nova codificação privada, não é recomendável mais<br />

utilizar a expressão teoria, que constitui trabalho <strong>do</strong>utrinário, ampara<strong>do</strong> pela jurisprudência. Tal constatação também é retirada da<br />

leitura <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

O art. 28, caput, da Lei 8.078/1990, enuncia que: “O Juiz po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar a personalida<strong>de</strong> jurídica da socieda<strong>de</strong> quan<strong>do</strong>,<br />

em <strong>de</strong>trimento <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, houver abuso <strong>de</strong> direito, excesso <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação <strong>do</strong>s<br />

estatutos ou contrato social. A <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração também será efetivada quan<strong>do</strong> houver falência, esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> insolvência,<br />

encerramento ou inativida<strong>de</strong> da pessoa jurídica provoca<strong>do</strong>s por má administração”; (…) § 5º: “Também po<strong>de</strong>rá ser <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rada<br />

a pessoa jurídica sempre que sua personalida<strong>de</strong> for, <strong>de</strong> alguma forma, obstáculo ao ressarcimento <strong>de</strong> prejuízos causa<strong>do</strong>s aos<br />

consumi<strong>do</strong>res”. Faz o mesmo o art. 4º da Lei <strong>de</strong> Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998), ao prever que “po<strong>de</strong>rá ser <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rada a<br />

pessoa jurídica sempre que sua personalida<strong>de</strong> for obstáculo ao ressarcimento <strong>de</strong> prejuízos causa<strong>do</strong>s à qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> meio ambiente”.<br />

De qualquer forma, no tocante às duas normas, há uma diferença <strong>de</strong> tratamento, conforme será <strong>de</strong>monstra<strong>do</strong> a seguir.<br />

Tanto em relação à a<strong>do</strong>ção da teoria, quanto à manutenção das leis especiais anteriores, expressa o Enuncia<strong>do</strong> n. 51 <strong>do</strong><br />

CJF/STJ, da I Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, que “a teoria da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica – disregard <strong>do</strong>ctrine – fica<br />

positivada no novo Código Civil, manti<strong>do</strong>s os parâmetros existentes nos microssistemas legais e na construção jurídica sobre o<br />

tema”. Eis o argumento pelo qual não se po<strong>de</strong> mais utilizar a expressão teoria, uma vez que a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração foi abraçada pela<br />

codificação privada.<br />

Aprofundan<strong>do</strong> o tema, a melhor <strong>do</strong>utrina aponta a existência <strong>de</strong> duas gran<strong>de</strong>s teorias fundamentais acerca da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração<br />

da personalida<strong>de</strong> jurídica:3<br />

a)<br />

b)<br />

Teoria maior ou subjetiva – a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, para ser <strong>de</strong>ferida, exige a presença <strong>de</strong> <strong>do</strong>is requisitos: o abuso da<br />

personalida<strong>de</strong> jurídica + o prejuízo ao cre<strong>do</strong>r. Essa teoria foi a<strong>do</strong>tada pelo art. 50 <strong>do</strong> CC/2002.<br />

Teoria menor ou objetiva – a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração da personalida<strong>de</strong> jurídica exige um único elemento, qual seja o prejuízo<br />

ao cre<strong>do</strong>r. Essa teoria foi a<strong>do</strong>tada pela Lei 9.605/1998, para os danos ambientais, e supostamente pelo art. 28 <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r.<br />

Relativamente ao Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, diz-se supostamente pela redação <strong>do</strong> § 5º <strong>do</strong> seu art. 28, bastan<strong>do</strong> o mero<br />

prejuízo ao consumi<strong>do</strong>r, para que a <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração seja <strong>de</strong>ferida, segun<strong>do</strong> a <strong>do</strong>utrina especializada. 4 Esse entendimento por vezes<br />

é a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> pela jurisprudência, conforme se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong> <strong>de</strong> notória e explicativa ementa <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“Responsabilida<strong>de</strong> civil e <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Recurso especial. Shopping Center <strong>de</strong> Osasco-SP. Explosão. Consumi<strong>do</strong>res.<br />

Danos materiais e morais. Ministério Público. Legitimida<strong>de</strong> ativa. Pessoa jurídica. Desconsi<strong>de</strong>ração. Teoria maior e teoria menor.<br />

Limite <strong>de</strong> responsabilização <strong>do</strong>s sócios. Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Requisitos. Obstáculo ao ressarcimento <strong>de</strong> prejuízos<br />

causa<strong>do</strong>s aos consumi<strong>do</strong>res. Art. 28, § 5º – Consi<strong>de</strong>rada a proteção <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r um <strong>do</strong>s pilares da or<strong>de</strong>m econômica, e<br />

incumbin<strong>do</strong> ao Ministério Público a <strong>de</strong>fesa da or<strong>de</strong>m jurídica, <strong>do</strong> regime <strong>de</strong>mocrático e <strong>do</strong>s interesses sociais e individuais<br />

indisponíveis, possui o Órgão Ministerial legitimida<strong>de</strong> para atuar em <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> interesses individuais homogêneos <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res,<br />

<strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> origem comum. A teoria maior da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, regra geral no sistema jurídico brasileiro, não po<strong>de</strong> ser aplicada<br />

com a mera <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> estar a pessoa jurídica insolvente para o cumprimento <strong>de</strong> suas obrigações. Exige-se, aqui, para além da<br />

prova <strong>de</strong> insolvência, ou a <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong> (teoria subjetiva da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração), ou a <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong><br />

confusão patrimonial (teoria objetiva da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração). A teoria menor da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração, acolhida em nosso or<strong>de</strong>namento<br />

jurídico excepcionalmente no <strong>Direito</strong> <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r e no <strong>Direito</strong> Ambiental, inci<strong>de</strong> com a mera prova <strong>de</strong> insolvência da pessoa<br />

jurídica para o pagamento <strong>de</strong> suas obrigações, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da existência <strong>de</strong> <strong>de</strong>svio <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> confusão patrimonial.<br />

– Para a teoria menor, o risco empresarial normal às ativida<strong>de</strong>s econômicas não po<strong>de</strong> ser suporta<strong>do</strong> pelo terceiro que contratou com<br />

a pessoa jurídica, mas pelos sócios e/ou administra<strong>do</strong>res <strong>de</strong>sta, ainda que estes <strong>de</strong>monstrem conduta administrativa proba, isto é,<br />

mesmo que não exista qualquer prova capaz <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificar conduta culposa ou <strong>do</strong>losa por parte <strong>do</strong>s sócios e/ou administra<strong>do</strong>res da<br />

pessoa jurídica. – A aplicação da teoria menor da <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração às relações <strong>de</strong> consumo está calcada na exegese autônoma <strong>do</strong> § 5º<br />

<strong>do</strong> art. 28 <strong>do</strong> CDC, porquanto a incidência <strong>de</strong>sse dispositivo não se subordina à <strong>de</strong>monstração <strong>do</strong>s requisitos previstos no caput <strong>do</strong><br />

artigo indica<strong>do</strong>, mas apenas à prova <strong>de</strong> causar, a mera existência da pessoa jurídica, obstáculo ao ressarcimento <strong>de</strong> prejuízos<br />

causa<strong>do</strong>s aos consumi<strong>do</strong>res. Recursos especiais não conheci<strong>do</strong>s” (STJ, REsp 279.273/SP – Rel. Ministro Ari Pargendler – Rel.

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