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#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves

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funcionários a a<strong>de</strong>rir a novo contrato estipula<strong>do</strong> entre a ex-emprega<strong>do</strong>ra e a segura<strong>do</strong>ra” (TJSP – Apelação Cível 1004905-<br />

14.2014.8.26.0625 – Acórdão 9248343, Taubaté – Décima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. César Ciampolini – j. 23.02.2016<br />

– DJESP 01.07.2016).<br />

5.4.3.<br />

Exceptio <strong>do</strong>li<br />

A exceptio <strong>do</strong>li é conceituada como a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> réu contra ações <strong>do</strong>losas, contrárias à boa-fé. Aqui a boa-fé objetiva é utilizada<br />

como <strong>de</strong>fesa, ten<strong>do</strong> uma importante função reativa, conforme leciona José Fernan<strong>do</strong> Simão.45 A exceptio mais conhecida no<br />

<strong>Direito</strong> Civil brasileiro é aquela constante no art. 476 <strong>do</strong> Código Civil, a exceptio non adimpleti contractus, segun<strong>do</strong> a qual, nos<br />

contratos bilaterais, nenhuma das partes po<strong>de</strong> exigir que uma parte cumpra com a sua obrigação se primeiro não cumprir com a<br />

própria. 46 Vale lembrar que os contratos bilaterais ou sinalagmáticos são aqueles que envolvem direitos e <strong>de</strong>veres para ambas as<br />

partes, <strong>de</strong> forma proporcional, sen<strong>do</strong> exemplo típico a compra e venda.<br />

Não resta a menor dúvida <strong>de</strong> que a exceção <strong>de</strong> contrato não cumpri<strong>do</strong> não só po<strong>de</strong> como <strong>de</strong>ve ser aplicada em favor <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, como nas hipóteses <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> consumo. Como primeiro caminho para tal afirmação, po<strong>de</strong> ser citada a<br />

incidência da boa-fé objetiva constante <strong>do</strong> art. 4º, inc. III, da Lei 8.078/1990. Como segun<strong>do</strong> caminho, a teoria <strong>do</strong> diálogo das<br />

fontes permite a conexão pelo art. 476 <strong>do</strong> CC/2002 em benefício <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Não tem si<strong>do</strong> diferente a conclusão da<br />

jurisprudência nacional, nas hipóteses em que o produto ou o serviço não estão a contento ou <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o espera<strong>do</strong>,<br />

especialmente nas hipóteses <strong>de</strong> vício (por to<strong>do</strong>s: TJES – Apelação Cível 35060210016 – Primeira Câmara Cível – Rel. Des.<br />

Arnal<strong>do</strong> Santos Souza – j. 06.07.2010 – DJES 03.09.2010, p. 72; TJSC – Apelação Cível 2003.011376-2, Joinville – Segunda<br />

Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Comercial – Rel. Des. Jorge Luiz <strong>de</strong> Borba – DJSC 03.09.2009, p. 328; e TJSP – Apelação com Revisão<br />

207.759.4/7 – Acórdão 4134137, Barueri – Nona Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Viviani Nicolau – j. 13.10.2009 – DJESP<br />

12.11.2009).<br />

Anote-se, por fim, que a máxima da exceptio tem o condão <strong>de</strong> afastar o direito <strong>de</strong> eventual inclusão <strong>do</strong> nome <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>res<br />

em cadastro <strong>de</strong> inadimplentes, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ainda configurá-la como in<strong>de</strong>vida ou abusiva, a gerar o direito à reparação <strong>de</strong> danos a favor<br />

<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r (TJDF – Recurso 2009.01.1.116487-2 – Acórdão 481.366 – Segunda Turma Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Especiais Cíveis<br />

e Criminais <strong>do</strong> DF – Rel. Juiz Asiel Henrique – DJDFTE 22.02.2011, p. 277; TJSP – Apelação 992.07.044110-2 – Acórdão<br />

4805183, São Carlos – Trigésima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Carlos Russo – j. 10.11.2010 – DJESP 09.12.2010; e<br />

TJMG – Apelação Cível 1.0024.07.485048-8/0011, Belo Horizonte – Décima Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Elpídio Donizetti –<br />

j. 17.06.2008 – DJEMG 28.06.2008).<br />

5.4.4.<br />

Venire contra factum proprium<br />

Como outrora exposto, pela máxima venire contra factum proprium non potest, <strong>de</strong>terminada pessoa não po<strong>de</strong> exercer um<br />

direito próprio contrarian<strong>do</strong> um comportamento anterior, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> ser mantida a confiança e o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> lealda<strong>de</strong>, <strong>de</strong>correntes da<br />

boa-fé objetiva. O conceito mantém relação com a teoria <strong>do</strong>s atos próprios, muito bem explorada no <strong>Direito</strong> Espanhol por Luís<br />

Díez-Picazo.47<br />

Para An<strong>de</strong>rson Schreiber, que <strong>de</strong>senvolveu excelente trabalho monográfico sobre o tema no Brasil, po<strong>de</strong>m ser aponta<strong>do</strong>s quatro<br />

pressupostos para aplicação da proibição <strong>do</strong> comportamento contraditório: 1º) um fato próprio, uma conduta inicial; 2º) a legítima<br />

confiança <strong>de</strong> outrem na conservação <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> objetivo <strong>de</strong>ssa conduta; 3º) um comportamento contraditório a este senti<strong>do</strong> objetivo;<br />

4º) um dano ou um potencial <strong>de</strong> dano <strong>de</strong>corrente da contradição.48 A relação com o respeito à confiança <strong>de</strong>positada, um <strong>do</strong>s<br />

<strong>de</strong>veres anexos à boa-fé objetiva, é muito clara, conforme consta <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 362 da IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil: “A vedação<br />

<strong>do</strong> comportamento contraditório (venire contra factum proprium) funda-se na proteção da confiança, como se extrai <strong>do</strong>s arts. 187 e<br />

422 <strong>do</strong> Código Civil”. A premissa é a mesma para os contratos <strong>de</strong> consumo, sem qualquer distinção, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> tal conclusão ser<br />

retirada, entre outros, <strong>do</strong> sempre invoca<strong>do</strong> art. 4º, inc. III, <strong>do</strong> CDC.<br />

Ilustran<strong>do</strong> para os contratos <strong>de</strong> consumo, <strong>de</strong>staque-se julga<strong>do</strong> <strong>do</strong> Tribunal Paulista que fez incidir o venire contra uma empresa<br />

administra<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito que mantinha a prática <strong>de</strong> aceitar o pagamento <strong>do</strong>s valores atrasa<strong>do</strong>s. No caso, a empresa,<br />

repentinamente, alegou a rescisão contratual, com base em cláusula contratual que previa a extinção <strong>do</strong> contrato haven<strong>do</strong><br />

inadimplemento. A Corte mitigou a força obrigatória <strong>de</strong>ssa cláusula, ao apontar que a extinção <strong>do</strong> negócio jurídico e a cobrança<br />

integral não seriam possíveis, diante <strong>do</strong>s comportamentos <strong>de</strong> recebimento parcial <strong>do</strong> crédito. O consumi<strong>do</strong>r foi in<strong>de</strong>niza<strong>do</strong> pela<br />

negativação <strong>de</strong> seu nome em cadastro pela cobrança <strong>do</strong> valor integral:<br />

“Dano moral. Responsabilida<strong>de</strong> civil. Negativação no Serasa e constrangimento pela recusa <strong>do</strong> cartão <strong>de</strong> crédito, cancela<strong>do</strong> pela ré.<br />

Caracterização. Boa-fé objetiva. Venire contra factum proprium. Administra<strong>do</strong>ra que aceitava pagamento das faturas com atraso.<br />

Cobrança <strong>do</strong>s encargos da mora. Ocorrência. Repentinamente invoca cláusula contratual para consi<strong>de</strong>rar o contrato rescindi<strong>do</strong>, a

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