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#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves

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instrução probatória (o que, no procedimento ordinário, ocorre na audiência preliminar, prevista no art. 331 <strong>do</strong> CPC, quan<strong>do</strong> o<br />

magistra<strong>do</strong> fixa os pontos controverti<strong>do</strong>s e <strong>de</strong>termina as provas que serão produzidas), inverte-se, se for o caso, o ônus da<br />

prova”. 218<br />

O entendimento consagra<strong>do</strong> no Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça é nesse senti<strong>do</strong>, lembran<strong>do</strong> que, além <strong>de</strong> regra <strong>de</strong> julgamento, o<br />

ônus da prova também é uma regra <strong>de</strong> conduta (ou <strong>de</strong> instrução):<br />

“Inversão. Ônus. Prova. CDC. Trata-se <strong>de</strong> REsp em que a controvérsia consiste em <strong>de</strong>finir qual o momento processual a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong><br />

para que o juiz, na responsabilida<strong>de</strong> por vício <strong>do</strong> produto (art. 18 <strong>do</strong> CDC), <strong>de</strong>termine a inversão <strong>do</strong> ônus da prova prevista no art.<br />

6.º, VIII, <strong>do</strong> mesmo co<strong>de</strong>x. No julgamento <strong>do</strong> especial, entre outras consi<strong>de</strong>rações, observou o Min. Relator que a distribuição <strong>do</strong><br />

ônus da prova apresenta extrema relevância <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m prática, nortean<strong>do</strong>, como uma bússola, o comportamento processual das<br />

partes. Naturalmente, participará da instrução probatória com maior vigor, intensida<strong>de</strong> e interesse a parte sobre a qual recai o<br />

encargo probatório <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> fato controverti<strong>do</strong> no processo. Dessarte, consignou que, influin<strong>do</strong> a distribuição <strong>do</strong> encargo<br />

probatório <strong>de</strong>cisivamente na conduta processual das partes, <strong>de</strong>vem elas possuir a exata ciência <strong>do</strong> ônus atribuí<strong>do</strong> a cada uma <strong>de</strong>las<br />

para que possam produzir oportunamente as provas que enten<strong>de</strong>rem necessárias. Ao contrário, permitida a distribuição ou a inversão<br />

<strong>do</strong> ônus probatório na sentença e inexistin<strong>do</strong>, com isso, a necessária certeza processual, haverá o risco <strong>de</strong> o julgamento ser proferi<strong>do</strong><br />

sob uma <strong>de</strong>ficiente e <strong>de</strong>sinteressada instrução probatória, na qual ambas as partes tenham atua<strong>do</strong> com base na confiança <strong>de</strong> que<br />

sobre elas não recairia o encargo da prova <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> fato. Assim, enten<strong>de</strong>u que a inversão ope judicis <strong>do</strong> ônus da prova <strong>de</strong>ve<br />

ocorrer preferencialmente no <strong>de</strong>spacho sanea<strong>do</strong>r, ocasião em que o juiz <strong>de</strong>cidirá as questões processuais pen<strong>de</strong>ntes e <strong>de</strong>terminará as<br />

provas a serem produzidas, <strong>de</strong>signan<strong>do</strong> audiência <strong>de</strong> instrução e julgamento (art. 331, §§ 2.º e 3.º, <strong>do</strong> CPC). Desse mo<strong>do</strong>, confere-se<br />

maior certeza às partes referente aos seus encargos processuais, evitan<strong>do</strong> a insegurança. Com esse entendimento, a Seção, ao<br />

prosseguir o julgamento, por maioria, negou provimento ao recurso, manten<strong>do</strong> o acórdão que <strong>de</strong>sconstituiu a sentença, a qual<br />

<strong>de</strong>terminara, nela própria, a inversão <strong>do</strong> ônus da prova. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: REsp 720.930/RS – DJe 09.11.2009, e REsp<br />

881.651/BA, DJ 21.05.2007” (REsp 802.832/MG – Segunda Seção – Rel. Min. Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – j. 13.04.2011 –<br />

Informativo STJ 469).219<br />

Não concor<strong>do</strong> plenamente com esse entendimento porque, sen<strong>do</strong> realmente uma regra <strong>de</strong> julgamento, não teria senti<strong>do</strong><br />

invertê-la no saneamento <strong>do</strong> processo. Por ser uma regra <strong>de</strong> julgamento, só se aplican<strong>do</strong> ao final <strong>do</strong> processo, e isso somente no<br />

caso <strong>de</strong> inexistência ou insuficiência <strong>de</strong> prova, cabe sua aplicação, <strong>de</strong> forma invertida ou não, somente no momento <strong>do</strong> julgamento.<br />

Não é porque se <strong>de</strong>ve consi<strong>de</strong>rar o aspecto subjetivo <strong>do</strong> ônus da prova que se po<strong>de</strong> abdicar <strong>de</strong> seu aspecto objetivo.<br />

Dessa forma, em respeito ao princípio <strong>do</strong> contraditório, o juiz <strong>de</strong>ve, já no saneamento <strong>do</strong> processo, se manifestar sobre<br />

eventual inversão da regra geral contida no art. 373 <strong>do</strong> Novo CPC220. Perceba-se que o juiz não estaria nesse momento inverten<strong>do</strong><br />

o ônus da prova, regra que até mesmo po<strong>de</strong> nem ser utilizada caso a instrução probatória seja suficiente à formação <strong>do</strong><br />

convencimento judicial. O que o juiz fará é apenas sinalizar às partes que, no caso <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aplicação da regra, o fará <strong>de</strong><br />

forma invertida, e não conforme previsto como regra geral em nosso estatuto processual.<br />

Para que o réu não seja surpreendi<strong>do</strong> com a inversão quan<strong>do</strong> já finalizada a instrução probatória, enten<strong>do</strong> que, em respeito ao<br />

princípio <strong>do</strong> contraditório, a sinalização <strong>de</strong> possível inversão – se necessário for – <strong>de</strong>ve ser feita expressamente já na <strong>de</strong>cisão<br />

sanea<strong>do</strong>ra.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, as lições <strong>de</strong> Cândi<strong>do</strong> Rangel Dinamarco:<br />

“Se o juiz preten<strong>de</strong>r inverter o ônus da prova, como em certa medida lhe permite o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r em relação às<br />

causas que disciplina (art. 6.º, VIII – supra, n. 799), <strong>de</strong>ssa possibilida<strong>de</strong> advertirá as partes na audiência preliminar. Mas a efetiva<br />

inversão só acontecerá no momento <strong>de</strong> julgar a causa, pois antes ainda não se conhecem os resulta<strong>do</strong>s mais conclusivos ou menos<br />

conclusivos a que a instrução probatória conduzirá; a própria verossimilhança das alegações <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, eventualmente sentida<br />

pelo juiz em algum momento inicial <strong>do</strong> procedimento, po<strong>de</strong>rá ficar prejudicada em face das provas que vierem a ser produzidas e<br />

alegações levantadas pelo adversário” 221 .<br />

Mesmo <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>res que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m a inversão somente na sentença, como Kazuo Watanabe, afirmam ser “medida <strong>de</strong> boa<br />

política judiciária, na linha evolutiva <strong>do</strong> processo civil mo<strong>de</strong>rno, que confere ao juiz até mesmo atribuições assistenciais, e na<br />

conformida<strong>de</strong> da sugestão <strong>de</strong> Cecília Matos, que, no <strong>de</strong>spacho sanea<strong>do</strong>r ou em outro momento que prece<strong>de</strong> a fase instrutória da<br />

causa, o magistra<strong>do</strong> <strong>de</strong>ixe adverti<strong>do</strong> às partes que a regra <strong>de</strong> inversão <strong>do</strong> ônus da prova po<strong>de</strong>rá, eventualmente, ser aplicada no<br />

momento <strong>do</strong> julgamento final da ação. Com semelhante providência ficará <strong>de</strong>finitivamente afastada a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alegação <strong>de</strong><br />

cerceamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa”222.<br />

A divergência ten<strong>de</strong> a diminuir significativamente em razão <strong>do</strong> novo diploma processual que prevê em seu art. 357, III, <strong>de</strong>ntre<br />

os <strong>de</strong>veres <strong>do</strong> juiz no saneamento e organização <strong>do</strong> processo, a eventual redistribuição <strong>do</strong> ônus da prova. Trata-se <strong>do</strong> momento<br />

mais a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong> para a inversão nos termos da lei, mas não se po<strong>de</strong> afirmar que exista preclusão da matéria, <strong>de</strong> forma que nada<br />

impe<strong>de</strong> que o juiz inverta o ônus da prova após esse momento procedimental. E, assim o fazen<strong>do</strong>, <strong>de</strong>verá respeitar o princípio <strong>do</strong>

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