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#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves

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saudável concorrência e que levam o consumi<strong>do</strong>r a optar por uma ou outra instituição financeira. Entretanto, apesar <strong>de</strong> sua<br />

irrefutável importância, nota-se que a maioria da população brasileira ainda não compreen<strong>de</strong> o cálculo <strong>do</strong>s juros bancários. Vê-se<br />

que não há qualquer esclarecimento prévio, tampouco se concretizou o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> educação <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, previsto no art. 4º, IV, <strong>do</strong><br />

CDC. Nesse contexto, a capitalização <strong>de</strong> juros está longe <strong>de</strong> ser um instituto conheci<strong>do</strong>, compreendi<strong>do</strong> e facilmente i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong><br />

pelo consumi<strong>do</strong>r médio comum. A realida<strong>de</strong> cotidiana é a <strong>de</strong> que os contratos bancários, muito embora estejam cada vez mais<br />

difundi<strong>do</strong>s na nossa socieda<strong>de</strong>, ainda são incompreensíveis à maioria <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, que são leva<strong>do</strong>s a contratar e aos poucos<br />

vão apren<strong>de</strong>n<strong>do</strong> empiricamente com suas próprias experiências. A partir <strong>de</strong>ssas premissas, obtém-se o padrão <strong>de</strong> comportamento a<br />

ser espera<strong>do</strong> <strong>do</strong> homem médio, que aceita a contratação <strong>do</strong> financiamento a partir <strong>do</strong> confronto entre taxas nominais ofertadas no<br />

merca<strong>do</strong>. Deve-se ainda ter em consi<strong>de</strong>ração, como medida da atitu<strong>de</strong> objetivamente esperada <strong>de</strong> cada contratante, o padrão <strong>de</strong><br />

conhecimento e comportamento <strong>do</strong> homem médio da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> massa brasileira. Isso porque vivemos numa socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

profundas disparida<strong>de</strong>s sociais, com relativamente baixo grau <strong>de</strong> instrução” (STJ – REsp 1.302.738/SC – Rel. Min. Nancy Andrighi<br />

– Terceira Turma – j. 03.05.2012 – DJe 10.05.2012 – publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 496). Espera-se que outras <strong>de</strong>cisões sigam a<br />

linha esposada no voto.<br />

Em verda<strong>de</strong>, percebeu-se a partir <strong>do</strong> ano <strong>de</strong> 2012 que medidas <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Executivo acabaram por reduzir as taxas <strong>de</strong> juros<br />

bancários em nosso País. Entretanto, diante da mais recente e grave crise financeira que atingiu o País a partir <strong>de</strong> 2014, os juros<br />

voltaram a subir no País. E <strong>de</strong> forma explosiva.<br />

Esperava-se que tal tarefa fosse <strong>de</strong>sempenhada, antes <strong>do</strong> Executivo, pelo Po<strong>de</strong>r Judiciário, o que não acabou ocorren<strong>do</strong> nos<br />

últimos anos, o que po<strong>de</strong> ser percebi<strong>do</strong> pelos julga<strong>do</strong>s anteriormente transcritos. Infelizmente, as premissas constantes <strong>do</strong> voto da<br />

Ministra Nancy Andrighi acabaram não prevalecen<strong>do</strong> em nossas Cortes Superiores, que não cumpriram com sua função jurídica e<br />

social. Todavia, ainda é tempo para a mudança no âmbito <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Judiciário.<br />

Supera<strong>do</strong> esse ponto a respeito <strong>do</strong>s juros, em relação à cláusula penal ou multa moratória, importante <strong>de</strong>corrência <strong>do</strong><br />

inadimplemento, o art. 52, § 1º, <strong>do</strong> CDC enuncia que o seu montante não po<strong>de</strong> ser superior a 2% (<strong>do</strong>is por cento) sobre o valor da<br />

dívida. Não se po<strong>de</strong> esquecer que tal multa somente inci<strong>de</strong> se estiver prevista pelas partes.<br />

Conforme se retira <strong>de</strong> ementa publicada pelo STJ em 2015 pela ferramenta Jurisprudência em Teses (Edição n. 39), “a redução<br />

da multa moratória para 2% prevista no art. 52, § 1º, <strong>do</strong> CDC aplica-se às relações <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong> natureza contratual, não<br />

incidin<strong>do</strong> sobre as sanções tributárias, que estão sujeitas à legislação própria <strong>de</strong> direito público”. De acor<strong>do</strong> com um <strong>do</strong>s arestos que<br />

gerou a ementa, que trata <strong>de</strong> ICMS, “na seara tributária, não é possível reduzir a multa ao percentual <strong>de</strong> 2% (<strong>do</strong>is por cento),<br />

porquanto estabelecidas em legislação pertinente às relações <strong>de</strong> consumo – Lei 9.298/96. Prece<strong>de</strong>ntes” (STJ – REsp 1.164.662/SP –<br />

Segunda Turma – Rel. Min. Castro Meira – j. 24.08.2010 – DJe 08.09.2010).<br />

De toda sorte, não resta a menor dúvida <strong>de</strong> que a norma relativa à cláusula penal é <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, sen<strong>do</strong> nula por<br />

abusivida<strong>de</strong> a cláusula contratual que estabeleça limite maior para a multa moratória, nos termos <strong>do</strong> art. 51, incs. IV e XV, <strong>do</strong> CDC<br />

(por todas as centenas <strong>de</strong> julga<strong>do</strong>s encontra<strong>do</strong>s: TJSP – Apelação 9171524-39.2005.8.26.0000 – Acórdão 4995270, São Caetano <strong>do</strong><br />

Sul – Vigésima Sétima Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Berenice Marcon<strong>de</strong>s César – j. 22.02.2011 – DJESP 22.03.2011;<br />

TJMG – Apelação Cível 1661480-65.2004.8.13.0702, Uberlândia – Décima Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Guilherme Luciano<br />

Baeta Nunes – j. 16.11.2010 – DJEMG 02.12.2010; TJPR – Apelação Cível 0491340-8, Curitiba – Sexta Câmara Cível – Rel. Des.<br />

Antônio Renato Strapasson – DJPR 20.03.2009, p. 259; TJRS – Apelação Cível 70015891914, Caxias <strong>do</strong> Sul – Décima Quarta<br />

Câmara Cível – Rel. Des. Judith <strong>do</strong>s Santos Mottecy – j. 14.09.2006 – DOERS 01.10.2008, p. 82; TJDF – Apelação Cível<br />

2000.09.1.004710-8 – Acórdão 274732 – Quarta Turma Cível – Rel. Des. Lecir Manoel da Luz – DJU 21.06.2007, p. 106; e TJSC<br />

– Apelação Cível 1998.002252-5, Rio <strong>do</strong> Sul – Segunda Câmara Comercial – Rel. Des. Maria <strong>do</strong> Rocio Luz Santa Ritta – j.<br />

09.10.2003). Em caso <strong>de</strong> excesso, na esteira da melhor conclusão jurispru<strong>de</strong>ncial colacionada, <strong>de</strong>ve ocorrer a redução <strong>do</strong> negócio<br />

jurídico até o patamar consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> como váli<strong>do</strong> pela legislação consumerista.<br />

Nesse contexto, <strong>de</strong>ve ser vista com gran<strong>de</strong>s ressalvas a chamada cláusula <strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong>, que muitas vezes disfarça, em<br />

contratos <strong>de</strong> consumo, multas exageradas, acima <strong>do</strong> montante permiti<strong>do</strong> pela lei, o que <strong>de</strong>ve ser afasta<strong>do</strong> <strong>de</strong> plano. Sobre o tema,<br />

vejamos as precisas palavras <strong>de</strong> José Fernan<strong>do</strong> Simão, com citação <strong>de</strong> jurisprudência:<br />

“Um <strong>do</strong>s <strong>de</strong>bates mais intensos da <strong>do</strong>utrina e da jurisprudência diz respeito ao chama<strong>do</strong> abono <strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong>. Explica Christiano<br />

Cassettari que muitos con<strong>do</strong>mínios tentaram buscar uma alternativa para resolver o problema <strong>do</strong> aumento da inadimplência, que a<br />

redução <strong>do</strong> percentual da cláusula penal lhe causou. Uma saída muito utilizada por vários con<strong>do</strong>mínios foi a cláusula <strong>de</strong> bonificação<br />

ou abono <strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong>, que é uma sanção premial. O abono <strong>de</strong> pontualida<strong>de</strong> é um <strong>de</strong>sconto, geralmente <strong>de</strong> 10% (<strong>de</strong>z por cento),<br />

para o condômino que pagar a taxa até o dia <strong>do</strong> vencimento. Esse instituto foi cria<strong>do</strong> com intuito <strong>de</strong> estimular os condôminos a<br />

pagarem em dia as <strong>de</strong>spesas mensais <strong>do</strong> con<strong>do</strong>mínio (Multa Contratual – Teoria e prática da cláusula penal. 1ª ed. 2009, Editora RT).<br />

A questão não se limita aos Con<strong>do</strong>mínios, pois vários presta<strong>do</strong>res <strong>de</strong> serviços a incluem em seus contratos. Universida<strong>de</strong>s<br />

particulares, por exemplo, escalonam as datas <strong>de</strong> pagamentos e conce<strong>de</strong>m ‘<strong>de</strong>scontos’ para pagamentos antecipa<strong>do</strong>s. Qual a natureza<br />

<strong>de</strong>sses chama<strong>do</strong>s ‘<strong>de</strong>scontos’? Silvio <strong>de</strong> Salvo Venosa chama o abono pontualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ‘cláusula penal às avessas’. Concordamos

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