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#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves

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sistemas jurídicos <strong>do</strong>s países da civil law. No primeiro caso, caberá ao juiz a análise, no caso concreto, da a<strong>de</strong>quada representação<br />

<strong>do</strong>s interesses em jogo pelo autor que preten<strong>de</strong> conduzir uma ação coletiva, enquanto no segun<strong>do</strong> caso caberia ao legisla<strong>do</strong>r, <strong>de</strong><br />

forma abstrata, <strong>de</strong>terminar quais são os requisitos para se <strong>de</strong>terminarem quais sujeitos têm condições <strong>de</strong> assumir o polo ativo <strong>de</strong><br />

uma ação coletiva.<br />

11.4.5.4.2.<br />

Sistema ope iudicis (sistema da common law)<br />

Nos países <strong>do</strong> sistema da common law, em especial nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, a representação a<strong>de</strong>quada é uma das mais importantes<br />

causas <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong> da ação coletiva, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se que a coisa julgada <strong>de</strong>ssa ação atingirá sujeitos que não participarão <strong>do</strong><br />

processo, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> seu resulta<strong>do</strong> (pro et contra). Diante <strong>de</strong>ssa realida<strong>de</strong>, o <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> processo legal seria viola<strong>do</strong> se o<br />

autor da ação coletiva não <strong>de</strong>monstrasse concretamente ter efetivas condições <strong>de</strong> exercer a melhor e mais completa <strong>de</strong>fesa que o<br />

direito po<strong>de</strong>ria ter em juízo135.<br />

O raciocínio é até certo ponto simples: como os sujeitos que compõem a coletivida<strong>de</strong> ou comunida<strong>de</strong> serão atingi<strong>do</strong>s sem o<br />

direito a participarem <strong>do</strong> processo coletivo em contraditório, <strong>de</strong>ve se assegurar que sejam “ouvi<strong>do</strong>s” por meio <strong>do</strong> autor, que só terá<br />

condições <strong>de</strong> se tornar esse verda<strong>de</strong>iro “porta-voz” <strong>do</strong>s indivíduos se <strong>de</strong>monstrar concretamente estar plenamente apto a fazer a<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> direito da forma mais perfeita e irrepreensível possível.<br />

Segun<strong>do</strong> precisas lições <strong>do</strong>utrinárias, a representação a<strong>de</strong>quada, nesse caso, além <strong>de</strong> evitar colusões entre as partes, assegura<br />

que o resulta<strong>do</strong> obti<strong>do</strong> por meio <strong>do</strong> processo coletivo seja o mesmo que teria si<strong>do</strong> obti<strong>do</strong> por meio <strong>de</strong> processos individuais, <strong>do</strong>s<br />

quais os indivíduos teriam participa<strong>do</strong> na plenitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> contraditório e da ampla <strong>de</strong>fesa136. É dizer que, apesar <strong>do</strong>s indivíduos não<br />

terem participa<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo coletivo, sua participação teria si<strong>do</strong> inútil e <strong>de</strong>snecessária, já que o resulta<strong>do</strong> seria o mesmo.<br />

Na representação a<strong>de</strong>quada, presente nos países que fazem parte da família da common law, cabe ao juiz a análise concreta <strong>de</strong><br />

elementos que indiquem as efetivas e reais condições <strong>de</strong> o autor cumprir seu papel como <strong>de</strong>le se espera. A <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>do</strong> país <strong>de</strong><br />

origem, variam os fatores relevantes a serem analisa<strong>do</strong>s pelo juiz, ainda que existam alguns fatores que po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s<br />

comuns: as condições <strong>do</strong> autor e <strong>de</strong> seu advoga<strong>do</strong>, a eventual existência <strong>de</strong> conflito entre o autor e/ou advoga<strong>do</strong> e membros <strong>do</strong><br />

grupo, a capacida<strong>de</strong> econômica, a especialida<strong>de</strong> <strong>do</strong> advoga<strong>do</strong>.<br />

In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong>s fatores consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s no caso concreto, um sistema <strong>de</strong> representação a<strong>de</strong>quada, como o existente nos<br />

Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, Inglaterra, Canadá e País <strong>de</strong> Gales, exige <strong>do</strong> juiz uma análise concreta para a aferição da capacida<strong>de</strong> não só <strong>de</strong><br />

representação <strong>do</strong>s sujeitos que compõem o grupo, mas também <strong>de</strong> sua efetiva capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> boa condução <strong>do</strong> processo, <strong>de</strong> seu<br />

preparo e disposição para encarar o processo coletivo.<br />

11.4.5.4.3.<br />

Sistema ope legis (civil law)<br />

Segun<strong>do</strong> lições <strong>do</strong>utrinárias, nos sistemas jurídicos <strong>do</strong>s países da civil law, a representação a<strong>de</strong>quada <strong>do</strong>s autores das ações<br />

coletivas segue uma regra legal, tratan<strong>do</strong>-se, portanto, <strong>de</strong> um sistema ope legis. Nesse entendimento, caberá ao legisla<strong>do</strong>r a<br />

previsão <strong>do</strong>s requisitos necessários para que se admita um sujeito no polo ativo <strong>do</strong> processo coletivo, caben<strong>do</strong> ao juiz tão somente a<br />

análise <strong>do</strong> preenchimento ou não <strong>de</strong> tais requisitos no caso concreto. Há, portanto, uma presunção legal absoluta <strong>de</strong> quais sejam os<br />

representantes a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s, ao que <strong>de</strong>ve se conformar o juiz no caso concreto137.<br />

Ainda que existam exceções, tais como o Uruguai, Argentina e Paraguai (nossos parceiros no Mercosul), que permitem ao juiz<br />

a aferição da representativida<strong>de</strong> a<strong>de</strong>quada no caso concreto 138 , no Brasil a <strong>do</strong>utrina majoritária enten<strong>de</strong> que ao juiz cabe somente<br />

analisar os requisitos já previamente consagra<strong>do</strong>s em lei, não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> partir para uma análise no caso concreto das efetivas<br />

condições para a melhor condução <strong>do</strong> processo <strong>do</strong> legitima<strong>do</strong> que preencheu tais requisitos 139 . Na hipótese das associações, por<br />

exemplo, bastará a existência jurídica por mais <strong>de</strong> um ano e a pertinência temática 140 , sen<strong>do</strong> irrelevante qualquer outra consi<strong>de</strong>ração<br />

a respeito da real capacida<strong>de</strong> <strong>do</strong> legitima<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r <strong>de</strong> forma plena e exauriente o direito coletivo lato sensu.<br />

Os críticos a esse sistema <strong>de</strong> aferição da representação a<strong>de</strong>quada afirmam que, sem a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> análise das efetivas<br />

condições <strong>do</strong> autor da ação coletiva no caso concreto, permite-se a existência <strong>de</strong> processos coletivos propostos por autores<br />

<strong>de</strong>sprepara<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>smotiva<strong>do</strong>s, diretamente interessa<strong>do</strong>s em <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> que po<strong>de</strong> não ser o melhor para to<strong>do</strong>s, e por<br />

vezes até imbuí<strong>do</strong>s <strong>de</strong> má-fé 141 . Esses <strong>de</strong>feitos que estariam sen<strong>do</strong> admiti<strong>do</strong>s pelo sistema ope legis, a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> no Brasil, frustrariam<br />

os objetivos da tutela coletiva, permitin<strong>do</strong> que o resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo coletivo não represente o resulta<strong>do</strong> possível se o autor<br />

tivesse outros atributos.<br />

É interessante notar que os <strong>de</strong>fensores <strong>do</strong> sistema atual a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> no direito brasileiro se valem <strong>de</strong> alguns fundamentos, rebati<strong>do</strong>s<br />

<strong>de</strong> forma quase apaixonada pelos críticos <strong>de</strong> tal sistema.<br />

Primeiro argumento amplamente utiliza<strong>do</strong> é a especial maneira <strong>de</strong> formação da coisa julgada material na tutela coletiva.

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