#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves
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pretensão <strong>do</strong> autor, é uma novida<strong>de</strong>, mesmo que, em termos temporais, não seja algo recente .<br />
Esse entendimento muito se assemelha ao conceito da<strong>do</strong>, pela melhor <strong>do</strong>utrina, ao “fato novo” como fundamento da liquidação<br />
<strong>de</strong> sentença por artigos. Também nesse caso o adjetivo “novo” não é utiliza<strong>do</strong> para <strong>de</strong>signar um fato ocorri<strong>do</strong> após o término <strong>do</strong><br />
processo em que se formou o título executivo, mas sim como novida<strong>de</strong> ao Po<strong>de</strong>r Judiciário, por não ter si<strong>do</strong> objeto <strong>de</strong> apreciação<br />
em tal processo. O fato, portanto, assim como a “nova prova” nas ações coletivas, po<strong>de</strong>rá ser anterior, concomitante ou posterior à<br />
<strong>de</strong>manda judicial; para ser adjetiva<strong>do</strong> <strong>de</strong> novo, basta que não tenha si<strong>do</strong> objeto <strong>de</strong> apresentação pelas partes e <strong>de</strong> apreciação pelo<br />
juiz.<br />
Registre-se o pensamento, a respeito <strong>do</strong> tema, exposto por Ada Pellegrini Grinover, que, nos trabalhos para a elaboração <strong>do</strong><br />
Anteprojeto <strong>de</strong> Código Mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Processos Coletivos para a Ibero-América, enten<strong>de</strong>u, com Kazuo Watanabe, que as provas que<br />
já po<strong>de</strong>riam ter si<strong>do</strong> produzidas, mas não o foram, ficam acobertadas pela eficácia preclusiva da coisa julgada. Fato novo, portanto,<br />
seria o superveniente. A regra constava <strong>do</strong> art. 38, § 1.º, <strong>do</strong> Projeto <strong>de</strong> Lei 5.139/2009, que foi arquiva<strong>do</strong> na Câmara <strong>do</strong>s<br />
Deputa<strong>do</strong>s, conforme já analisa<strong>do</strong> no Capítulo 3.<br />
A i<strong>de</strong>ia restritiva <strong>de</strong> conceito <strong>de</strong> “nova prova” sugerida pela processualista não parece ser a mais a<strong>de</strong>quada sob a ótica da<br />
proteção <strong>do</strong>s direitos transindividuais em juízo. Já foi <strong>de</strong>vidamente exposto que uma das razões para admitir a coisa julgada<br />
secundum eventum probationis nas <strong>de</strong>mandas que tenham como objeto direitos difusos ou coletivos é evitar que, por meio <strong>de</strong><br />
conluio fraudulento entre as partes processuais, se obtenha uma <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> improcedência. Consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a relevância <strong>do</strong> direito<br />
material <strong>de</strong>bati<strong>do</strong> e a ausência <strong>do</strong>s legitima<strong>do</strong>s no processo, ao menos essa proteção lhes <strong>de</strong>ve ser concedida, o que não ocorreria se<br />
fosse a<strong>do</strong>tada a visão <strong>de</strong> que somente provas que não existiam à época da <strong>de</strong>manda coletiva permitiriam uma nova <strong>de</strong>manda<br />
judicial.<br />
De qualquer forma, o pensamento ao menos se mostra bastante correto quan<strong>do</strong> sedimenta a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que, ao surgir uma prova<br />
que não existia ou que era impossível <strong>de</strong> obter à época da ação coletiva, sua apresentação será o suficiente para permitir a<br />
propositura <strong>de</strong> um novo processo com os mesmos elementos da ação anterior. Nesse caso, evi<strong>de</strong>ntemente, não será possível<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a corrente <strong>do</strong>utrinária que exige <strong>do</strong> juiz a indicação, expressa ou implícita, <strong>de</strong> ter o julgamento <strong>de</strong> improcedência<br />
<strong>de</strong>corri<strong>do</strong> <strong>de</strong> ausência ou insuficiência <strong>de</strong> provas. Não saben<strong>do</strong> da existência da prova porque não era possível sua obtenção, o que<br />
só veio a ser possibilita<strong>do</strong>, por exemplo, pelo avanço tecnológico, não haveria possibilida<strong>de</strong> lógica <strong>de</strong> o juiz consi<strong>de</strong>rar tal<br />
circunstância em sua <strong>de</strong>cisão.<br />
11.6.3.<br />
Coisa julgada secundum eventum litis<br />
No sistema tradicional da coisa julgada, esta se opera com a simples resolução <strong>de</strong> mérito, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong> no<br />
caso concreto (pro et contra). Portanto, é irrelevante saber se o pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> autor foi acolhi<strong>do</strong> ou rejeita<strong>do</strong>, se houve sentença<br />
homologatória ou se o juiz reconheceu a prescrição ou <strong>de</strong>cadência; sen<strong>do</strong> sentença prevista no art. 487 <strong>do</strong> Novo CPC, faz coisa<br />
julgada material.<br />
No entanto, existe outro sistema possível, que, ao menos na tutela individual, é extremamente excepcional: a coisa julgada<br />
secundum eventum litis. Por meio <strong>de</strong>sse sistema, nem toda sentença <strong>de</strong> mérito faz coisa julgada material, tu<strong>do</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />
resulta<strong>do</strong> concreto da sentença <strong>de</strong>finitiva transitada em julga<strong>do</strong>. Por vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r é possível que o sistema crie exceções<br />
pontuais à relação sentença <strong>de</strong> mérito com cognição exauriente e a coisa julgada material.<br />
Po<strong>de</strong>ria o sistema passar a prever que toda sentença <strong>de</strong> mérito fundada em prescrição não fará coisa julgada em ações nas quais<br />
figure como parte um i<strong>do</strong>so, ou, ainda, que a sentença que homologa transação não fará coisa julgada material quan<strong>do</strong> o acor<strong>do</strong><br />
tiver como objeto direito real. Apesar da óbvia irrazoabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s exemplos forneci<strong>do</strong>s, servem para <strong>de</strong>ixar claro que afastar a<br />
coisa julgada material <strong>de</strong> sentença <strong>de</strong> mérito, que em regra se tornariam imutáveis e indiscutíveis com o trânsito em julga<strong>do</strong>, em<br />
fenômeno conheci<strong>do</strong> como coisa julgada secundum eventum litis, é fruto <strong>de</strong> uma opção político-legislativa.<br />
Na tutela individual, a técnica da coisa julgada secundum eventum litis é consi<strong>de</strong>ravelmente excepcional, mas aparentemente<br />
foi aplicada no art. 274 <strong>do</strong> CC, que trata <strong>do</strong>s limites subjetivos da coisa julgada nas <strong>de</strong>mandas cujo objeto seja a dívida solidária,<br />
uma vez que, sen<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> improce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> autor, os <strong>de</strong>mais cre<strong>do</strong>res solidários, que não participaram <strong>do</strong> processo, não<br />
estarão vincula<strong>do</strong>s à coisa julgada material. É na tutela coletiva que a coisa julgada secundum eventum litis passa a ter posição <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>staque.<br />
Segun<strong>do</strong> previsão <strong>do</strong> art. 103, § 1.º, <strong>do</strong> CDC, os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II <strong>do</strong> mesmo dispositivo legal<br />
não prejudicarão interesses e direitos individuais <strong>do</strong>s integrantes da coletivida<strong>de</strong>, <strong>do</strong> grupo, classe ou categoria, em regra também<br />
aplicável ao inciso III223. Significa que, <strong>de</strong>corren<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma mesma situação fática jurídica consequências no plano <strong>do</strong> direito<br />
coletivo e individual, e sen<strong>do</strong> julga<strong>do</strong> improce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong> formula<strong>do</strong> em <strong>de</strong>manda coletiva, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da<br />
fundamentação, os indivíduos não estarão vincula<strong>do</strong>s a esse resulta<strong>do</strong>, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> ingressar livremente com suas ações individuais. A