#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves
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Também <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>stacada a conclusão <strong>do</strong> Tribunal da Cidadania no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> interpretar o contrato <strong>de</strong> seguro-saú<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
maneira mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r, <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> a cobertura por tratamentos experimentais existentes no País, especialmente<br />
quan<strong>do</strong> houver risco <strong>de</strong> vida ao segura<strong>do</strong>. Nos termos da publicação constante <strong>do</strong> Informativo n. 551 da Corte, “a segura<strong>do</strong>ra ou<br />
opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve custear tratamento experimental existente no País, em instituição <strong>de</strong> reputação científica<br />
reconhecida, <strong>de</strong> <strong>do</strong>ença listada na CID-OMS, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que haja indicação médica para tanto, e os médicos que acompanhem o quadro<br />
clínico <strong>do</strong> paciente atestem a ineficácia ou a insuficiência <strong>do</strong>s tratamentos indica<strong>do</strong>s convencionalmente para a cura ou controle<br />
eficaz da <strong>do</strong>ença. Cumpre esclarecer que o art. 12 da Lei 9.656/1998 estabelece as coberturas mínimas que <strong>de</strong>vem ser garantidas aos<br />
segura<strong>do</strong>s e beneficiários <strong>do</strong>s planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Nesse senti<strong>do</strong>, as opera<strong>do</strong>ras são obrigadas a cobrir os tratamentos e serviços<br />
necessários à busca da cura ou controle da <strong>do</strong>ença apresentada pelo paciente e listada na Classificação Estatística Internacional <strong>de</strong><br />
Doenças e Problemas Relaciona<strong>do</strong>s com a Saú<strong>de</strong>, da Organização Mundial <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> (CID-OMS). (…). Desse mo<strong>do</strong>, o tratamento<br />
experimental, por força <strong>de</strong> sua recomendada utilida<strong>de</strong>, embora eventual, transmuda-se em tratamento mínimo a ser garanti<strong>do</strong> ao<br />
paciente, escopo da Lei 9.656/1998, como se vê nos cita<strong>do</strong>s arts. 10 e 12. Isto é, nas situações em que os tratamentos convencionais<br />
não forem suficientes ou eficientes – fato atesta<strong>do</strong> pelos médicos que acompanham o quadro clínico <strong>do</strong> paciente –, existin<strong>do</strong> no País<br />
tratamento experimental, em instituição <strong>de</strong> reputação científica reconhecida, com indicação para a <strong>do</strong>ença, a segura<strong>do</strong>ra ou<br />
opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>ve arcar com os custos <strong>do</strong> tratamento, na medida em que passa a ser o único <strong>de</strong> real interesse para o contratante. Assim,<br />
a restrição contida no art. 10, I, da Lei 9.656/1998 somente <strong>de</strong>ve ter aplicação nas hipóteses em que os tratamentos convencionais<br />
mínimos garanti<strong>do</strong>s pelo art. 12 da mesma Lei sejam <strong>de</strong> fato úteis e eficazes para o contratante segura<strong>do</strong>. Ou seja, não po<strong>de</strong> o<br />
paciente, à custa da segura<strong>do</strong>ra ou opera<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, optar por tratamento experimental, por consi<strong>de</strong>rá-lo mais eficiente<br />
ou menos agressivo, pois lhe é disponibiliza<strong>do</strong> tratamento útil, suficiente para aten<strong>de</strong>r o mínimo garanti<strong>do</strong> pela Lei” (STJ – REsp<br />
1.279.241/SP – Rel. Min. Raul Araújo – j. 16.09.2014).<br />
Acrescente-se que, igualmente interpretan<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> seguro-saú<strong>de</strong> <strong>de</strong> maneira mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r, a mesma<br />
Corte Superior <strong>de</strong>duz a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se cobrir o tratamento <strong>do</strong>miciliar <strong>do</strong> segura<strong>do</strong> (home care). Vejamos o principal aresto que<br />
trata <strong>do</strong> tema, com <strong>de</strong>staque:<br />
“RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. SERVIÇO DE HOME CARE. COBERTURA PELO PLANO DE SAÚDE. DANO<br />
MORAL. 1. Polêmica em torno da cobertura por plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>do</strong> serviço <strong>de</strong> home care para paciente porta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> <strong>do</strong>ença pulmonar<br />
obstrutiva crônica. 2. O serviço <strong>de</strong> ‘home care’ (tratamento <strong>do</strong>miciliar) constitui <strong>de</strong>s<strong>do</strong>bramento <strong>do</strong> tratamento hospitalar<br />
contratualmente previsto que não po<strong>de</strong> ser limita<strong>do</strong> pela opera<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. 3. Na dúvida, a interpretação das cláusulas <strong>do</strong>s<br />
contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são <strong>de</strong>ve ser feita da forma mais favorável ao consumi<strong>do</strong>r. Inteligência <strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong> normativo <strong>do</strong> art. 47 <strong>do</strong> CDC.<br />
Doutrina e jurisprudência <strong>do</strong> STJ acerca <strong>do</strong> tema. 4. Ressalva no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que, nos contratos <strong>de</strong> plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> sem contratação<br />
específica, o serviço <strong>de</strong> internação <strong>do</strong>miciliar (home care) po<strong>de</strong> ser utiliza<strong>do</strong> em substituição à internação hospitalar, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />
observa<strong>do</strong>s certos requisitos como a indicação <strong>do</strong> médico assistente, a concordância <strong>do</strong> paciente e a não afetação <strong>do</strong> equilíbrio<br />
contratual nas hipóteses em que o custo <strong>do</strong> atendimento <strong>do</strong>miciliar por dia supera o custo diário em hospital. 5. Dano moral<br />
reconheci<strong>do</strong> pelas instâncias <strong>de</strong> origem. Súmula 07/STJ. 6. Recurso especial a que se nega provimento” (STJ – Resp. 1.378.707/RJ –<br />
Rel. Ministro Paulo <strong>de</strong> Tarso Sanseverino – Terceira Turma – j. 26.05.2015 – DJe 15.06.2015).<br />
Expostas todas essas ilustrações, a encerrar o presente tópico, consigne-se a existência <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões jurispru<strong>de</strong>nciais<br />
<strong>de</strong> aplicação <strong>do</strong> art. 47 <strong>do</strong> CDC que, em prol da função social <strong>do</strong> contrato, têm consagra<strong>do</strong> uma nova visualização <strong>do</strong> contrato, da<br />
maneira a beneficiar com justiça a parte vulnerável da relação negocial. Do mesmo mo<strong>do</strong>, o princípio da boa-fé objetiva também<br />
tem realiza<strong>do</strong> milagres no mun<strong>do</strong> contratual, como se po<strong>de</strong> perceber <strong>do</strong> próximo tópico <strong>do</strong> presente capítulo.<br />
5.4.<br />
A FORÇA VINCULATIVA DOS ESCRITOS E A BOA-FÉ OBJETIVA NOS<br />
CONTRATOS DE CONSUMO (ART. 48 DA LEI 8.078/1990). A APLICAÇÃO DOS<br />
CONCEITOS PARCELARES DA BOA-FÉ OBJETIVA<br />
Além <strong>do</strong> princípio da função social <strong>do</strong> contrato, como antes se expôs nesta obra <strong>de</strong> forma exaustiva, a boa-fé objetiva constitui<br />
outro pilar fundamental <strong>do</strong> Código Brasileiro <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r. Sem prejuízo <strong>do</strong> art. 4º, inc. III, da Lei 8.078/1990, merece<br />
<strong>de</strong>staque, no capítulo referente à proteção contratual, o art. 48 <strong>do</strong> CDC, in verbis:<br />
“Art. 48. As <strong>de</strong>clarações <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> constantes <strong>de</strong> escritos particulares, recibos e pré-contratos relativos às relações <strong>de</strong> consumo<br />
vinculam o fornece<strong>do</strong>r, ensejan<strong>do</strong> inclusive execução específica, nos termos <strong>do</strong> art. 84 e parágrafos”.<br />
Pelo teor <strong>do</strong> preceito, fica evi<strong>de</strong>nciada a função <strong>de</strong> integração da boa-fé objetiva em todas as fases contratuais: fase précontratual,<br />
fase contratual e fase pós-contratual. Nessa linha, não se olvida o teor <strong>do</strong> Enuncia<strong>do</strong> n. 26, aprova<strong>do</strong> na I Jornada <strong>de</strong><br />
<strong>Direito</strong> Civil <strong>do</strong> Conselho da Justiça Fe<strong>de</strong>ral, segun<strong>do</strong> o qual “a cláusula geral contida no art. 422 <strong>do</strong> novo Código Civil impõe ao