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#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves

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ilusão, porque, sen<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, as cláusulas serão todas impostas ao a<strong>de</strong>rente. Ainda que se <strong>de</strong>staque a cláusula, ou<br />

mesmo se estabeleça sua redação em separa<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, será difícil imaginar que a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> a<strong>de</strong>rente foi<br />

<strong>de</strong>terminante para sua formulação. Seriam, portanto, cuida<strong>do</strong>s ineptos a tutelar efetivamente o a<strong>de</strong>rente.<br />

Nesse senti<strong>do</strong> as lições <strong>de</strong> Alexandre Freitas Câmara:<br />

“Vale lembrar, porém, que no contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são o a<strong>de</strong>rente simplesmente se submete às cláusulas impostas pelo proponente, o que<br />

leva a crer que, em muitos casos, o contrato só será celebra<strong>do</strong> se o a<strong>de</strong>rente assinar também o <strong>do</strong>cumento anexo que institui a<br />

cláusula compromissória (ou dê sua assinatura ou visto especialmente para a cláusula compromissória constante, em negrito, <strong>do</strong><br />

instrumento <strong>de</strong> contrato)”24.<br />

Deve-se <strong>de</strong>scartar inicialmente a regra <strong>de</strong> hermenêutica que <strong>de</strong>termina a prevalência da norma mais nova sobre a mais antiga,<br />

até mesmo porque as normas <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r têm natureza <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, nos termos <strong>do</strong> art. 1.º da Lei<br />

8.078/1990. A<strong>de</strong>mais, conforme já exposto, não são normas que versam rigorosamente sobre o mesmo tema, haven<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong><br />

muito, pontos <strong>de</strong> contato entre ambas.<br />

Não é difícil imaginar a razão <strong>de</strong> ser da regra prevista no art. 51, VII, <strong>do</strong> CDC. Sen<strong>do</strong> o fornece<strong>do</strong>r aquele que tem mais força<br />

na relação contratual, é fácil presumir a imposição ao consumi<strong>do</strong>r não só da cláusula compromissória, como também a escolha <strong>do</strong><br />

árbitro e a forma <strong>de</strong> solução a ser dada ao conflito, que po<strong>de</strong>rá até mesmo seguir a regra da equida<strong>de</strong>, nos termos <strong>do</strong>s arts. 2.º e 11,<br />

II, da Lei 9.307/1996. A respeito <strong>do</strong> tema, vale a transcrição das lições <strong>de</strong> Joel Dias Figueira Jr.:<br />

“Havemos ainda <strong>de</strong> assinalar que o problema objeto <strong>de</strong>sta análise não resi<strong>de</strong> propriamente no instituto jurídico da arbitragem, mas<br />

sim na sua ina<strong>de</strong>quação, ou melhor, na pouca ou imperfeita compatibilida<strong>de</strong> para solucionar os conflitos <strong>de</strong> consumo, em face das<br />

regras e princípios orienta<strong>do</strong>res <strong>de</strong>ssas relações, notadamente o <strong>de</strong>sequilíbrio que se constata em quase a totalida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s contratos,<br />

em que o consumi<strong>do</strong>r aparece como parte <strong>de</strong>sproporcionalmente mais fraca em relação ao produtor ou fornece<strong>do</strong>r, por razões<br />

multifacetadas (…)” 25 .<br />

Ainda que se <strong>de</strong>svirtue parcialmente o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, há corrente <strong>do</strong>utrinária que enten<strong>de</strong> ser compatível a aplicação <strong>do</strong><br />

art. 4.º, § 2.º, da Lei <strong>de</strong> Arbitragem, ainda que excepcionalmente, a contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são consumeristas. A excepcional hipótese<br />

seria contemplada por se estabelecer uma arbitragem voluntária, o que seria suficiente para afastar a aplicação <strong>do</strong> art. 51, VII, <strong>do</strong><br />

CDC, que prevê ser nula <strong>de</strong> pleno direito apenas a cláusula que estabelece compulsoriamente a arbitragem no contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são.<br />

Para Luiz Antonio Rizzatto Nunes, quan<strong>do</strong> o consumi<strong>do</strong>r for pessoa jurídica <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> porte e negociar, por meio <strong>de</strong> seu<br />

corpo <strong>de</strong> advoga<strong>do</strong>s ou assessoria jurídica as condições da cláusula compromissória, não se po<strong>de</strong>ria apontar qualquer nulida<strong>de</strong> na<br />

avença entre as partes. Para o jurista, “esse é o mínimo da equivalência necessária entre as partes para que se possa discutir <strong>de</strong><br />

forma equilibrada e consciente as cláusulas contratuais relativas à arbitragem”26.<br />

Não vejo como discordar <strong>de</strong> tais lições, embora seja necessário se consi<strong>de</strong>rar que a situação <strong>de</strong>scrita é <strong>de</strong> extrema rarida<strong>de</strong>. O<br />

mais comum é o consumi<strong>do</strong>r ser praticamente obriga<strong>do</strong> a assinar o contrato, sen<strong>do</strong> esse <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são ou não. E nesses casos, que são<br />

os mais comuns, <strong>de</strong>ve se consi<strong>de</strong>rar nula <strong>de</strong> pleno direito a cláusula compromissória?<br />

O Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça vem enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> que, sen<strong>do</strong> a cláusula imposta ao consumi<strong>do</strong>r, o que ordinariamente se<br />

verifica nos contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, aplica-se o art. 51, VII, <strong>do</strong> CDC, admitin<strong>do</strong> a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pleno direito da cláusula<br />

compromissória 27 . No mesmo senti<strong>do</strong> existem lições <strong>do</strong>utrinárias, sempre preocupadas com a imposição <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> unilateral <strong>do</strong><br />

fornece<strong>do</strong>r, a afastar a jurisdição como forma <strong>de</strong> solução <strong>do</strong>s conflitos consumeristas 28 . Mas já há <strong>de</strong>cisão daquele tribunal que<br />

enten<strong>de</strong> ser inviável apenas a celebração <strong>de</strong> cláusula compromissória, <strong>de</strong> forma que o compromisso arbitral po<strong>de</strong> ser livremente<br />

celebra<strong>do</strong>. 29<br />

Por outro la<strong>do</strong>, existe corrente <strong>do</strong>utrinária que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a inaplicabilida<strong>de</strong> da regra prevista no art. 51, VII, <strong>do</strong> CDC, sempre<br />

que restar comprova<strong>do</strong> que a cláusula não foi imposta unilateralmente pelo fornece<strong>do</strong>r. Para Nelson Nery Jr., o art. 4.º, § 2.º, da<br />

Lei <strong>de</strong> Arbitragem “não é incompatível com o CDC, art. 51, VII, razão pela qual ambos os dispositivos legais permanecem<br />

vigoran<strong>do</strong> plenamente. Com isso queremos dizer que é possível, nos contratos <strong>de</strong> consumo, a instituição <strong>de</strong> cláusula <strong>de</strong> arbitragem,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> que obe<strong>de</strong>cida, efetivamente, a bilateralida<strong>de</strong> na contratação e a forma da manifestação da vonta<strong>de</strong>, ou seja, <strong>de</strong> comum<br />

acor<strong>do</strong> (gré à gré)”30.<br />

Nesse senti<strong>do</strong>, interessante <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça:<br />

“<strong>Direito</strong> processual civil e consumi<strong>do</strong>r. Contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são. Convenção <strong>de</strong> arbitragem. Limites e exceções. Arbitragem em contratos<br />

<strong>de</strong> financiamento imobiliário. Cabimento. Limites.<br />

1. Com a promulgação da Lei <strong>de</strong> Arbitragem, passaram a conviver, em harmonia, três regramentos <strong>de</strong> diferentes graus <strong>de</strong><br />

especificida<strong>de</strong>: (i) a regra geral, que obriga a observância da arbitragem quan<strong>do</strong> pactuada pelas partes, com <strong>de</strong>rrogação da jurisdição

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